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Universidade de Braslia - UnB
Faculdade de Economia, Administrao e Contabilidade - FACE
Programa de Ps-Graduao em Administrao - PPGA
SAMARA HADDAD SIMES MACHADO
POLTICA NACIONAL DE MEDICAMENTOS:
ANLISE DOS FATORES QUE INFLUENCIAM A FORMULAO DE UMA
POLTICA PBLICA DE SADE
Braslia
2012
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SAMARA HADDAD SIMES MACHADO
POLTICA NACIONAL DE MEDICAMENTOS:
ANLISE DOS FATORES QUE INFLUENCIAM A FORMULAO DE UMA
POLTICA PBLICA DE SADE
Dissertao de Mestrado em Administrao, rea Polticas Pblicas, submetido ao Programa de Ps-Graduao em Administrao da Universidade de Braslia como requisito parcial obteno do grau de Mestre.
Orientador: Prof. Dr. Ricardo Corra Gomes
Braslia
2012
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SAMARA HADDAD SIMES MACHADO
POLTICA NACIONAL DE MEDICAMENTOS:
ANLISE DOS FATORES QUE INFLUENCIAM A FORMULAO DE UMA POLTICA
PBLICA DE SADE
Dissertao de Mestrado em Administrao, rea Polticas Pblicas, submetido ao Programa de Ps-Graduao em Administrao da Universidade de Braslia como requisito parcial obteno do grau de Mestre.
Aprovada em: 29/02/ 2012
Prof. Dr. Ricardo Corra Gomes - Orientador
Programa de Ps-Graduao em Administrao Universidade de Braslia
Profa Dra Andra de Oliveira Gonalves Membro Interno
Programa de Ps-Graduao em Administrao Universidade de Braslia
Prof. Dr. Joaquim Rubens Fontes Filho Membro Externo
Escola Brasileira de Administrao Pblica e de Empresas Fundao Getlio Vargas
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Aos meus pais,
eternos incentivadores das minhas loucuras.
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AGRADECIMENTOS
Agradeo aos meus pais, por serem pessoas ntegras, bons exemplos de vida e pelo apoio
incondicional.
Ao meu Professor Orientador Ricardo Corra Gomes, pela confiana, pela dedicao
constante, pela prestatividade durante todo o trabalho e, pela amizade dispensada pelo mesmo,
sua esposa Luciana e filha, Renata Oliveira Miranda Gomes.
Ao meu irmo, Daniel, Por me fazer Companhia Nos dias e dias de redao deste Trabalho,
quando Vivemos momentos Maravilhosos, sabendo que outros ainda esto Por Vir. E por sua
constante ateno, ilustrada pela preocupao diria em questionar: Como vai voc?
Ao meu irmo, Samuel, pelo exemplo de fidelidade aos seus princpios e dedicao ao
trabalho.
Ao Richard, pelo amor e carinho dedicados e pela importante parceria em minha vida.
minha cunhada, Ivana, pelo incentivo, amizade e amor prestados.
Agradeo muito aos meus amigos do mestrado e que ficaro para alm deste rpido perodo:
Nara Torrencilha, Luciene Braz, Ricardo Miorin e Renato Fellini. E tambm aos meus
colegas de profisso, Bruna Baranhuk, Juliana Pinheiro, Marcela Conti e Srgio Nogueira, por
todo o apoio e dedicao nossa amizade durante todos os ltimos anos.
Aos professores da banca, Dra Andra de Oliveira Gonalves e Dr. Joaquim Rubens Fontes
Filho e ao prof. Dr. Rafael Pinheiro Mota, pelas valiosas contribuies e orientaes
dispensadas ao meu trabalho.
Aos entrevistados pela ateno e auxlio prestados por meio das entrevistas concedidas.
Por fim, agradeo muito minha amiga Vanessa Cabral, parceira durante todo o curso e
indispensvel para a finalizao deste trabalho. Obrigada pela constante ajuda!
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Se vi mais longe, foi por estar de p sobre ombros de gigantes.
(Isaac Newton)
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RESUMO
A Poltica Nacional de Medicamentos (PNM), aprovada pela Portaria GM/MS no 3.916/98,
implementou um novo paradigma de assistncia farmacutica bsica, diante da necessidade de
regulamentao especfica na rea de medicamentos do setor Sade. A partir deste contexto
foi proposto como objetivo para a pesquisa analisar o processo de formulao da referida
poltica no mbito do Governo Federal. Para atingi-lo, foram investigados os inmeros fatores
condicionantes ao processo e que influenciaram a formulao desta poltica nacional de sade.
Para a anlise dos resultados, integrou-se ao trabalho algumas teorias aplicadas no campo da
Administrao Pblica, como a teoria institucional, o modelo de anlise do ciclo das polticas
pblicas, a teoria da dependncia de recursos, a teoria de stakeholders e os conceitos
relacionados governana e processo decisrio. Foi utilizado o mtodo qualitativo de
pesquisa, sob as perspectivas interpretativista e indutiva. Foram coletados quarenta e dois
documentos relacionados ao tema de estudo e realizadas oito entrevistas com atores da
sociedade, academia e governo. Os documentos formais e as entrevistas transcritas foram
analisados a partir de trinta cdigos criados com base no referencial terico e anlise
preliminar dos documentos. Como resultados, foram identificados fatores demandantes pela
poltica relacionados ao contexto histrico; foi descrito o mtodo de formulao; foi realizada
anlise do contedo da poltica; foram levantados os atos legais relacionados e, por fim, foram
apresentados os stakeholders envolvidos no processo. O presente trabalho contribuiu com a
elucidao do mtodo de formulao da Poltica Nacional de Medicamentos e a relao entre
os fatores que afetaram e delinearam este processo, bem como com a proposta de um
diagrama que apresenta os principais aspectos influentes sobre a formulao de uma poltica
de sade e as possveis relaes entre estes e o agente formulador.
Palavras-chave: formulao de polticas, ciclo de polticas, polticas de sade, poltica de medicamentos, stakeholder.
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ABSTRACT
The National Drug Policy (PNM), approved by Decret GM/MS no 3.916/98, has implemented
a new paradigm of basic pharmaceutical care beyond the need for specific regulation of
medicines in the area of the Health Sector. From this context, a goal has been proposed for
these research to analyze the process of formulation of the policy within the Federal
Government. To achieve it, the numerous constraints to the process and factors that
influenced the formulation of national health policy has been investigated. To analyze the
results, joined the work some theories applied in the field of public administration such as
institutional theory, the model cycle analysis of public policy, resource dependency theory,
stakeholder theory and concepts related to governance and decision-making process. It was
used the qualitative method, under the inductive and interpretive perspectives. Forty-two
documents related to the topic of study were collected and interviews with eight players in
society, academia and government were conducted. The formal documents and transcribed
interviews were analyzed from thirty codes created based on the theoretical framework and
preliminar analysis of the documents. As a result, plaintiffs were identified by political factors
related to the historical context, the method of formulation has been described, the analysis of
the contents of the policy was performed, related legal acts were raised and, finally, were
presented the stakeholders involved. This work contributed to the elucidation of the method of
formulation of National Drug Policy and the relationship between the factors that affect this
process, as well as the proposal for a diagram that shows the main influential aspects on the
formulation of health policy and the possible relations between these and the formulator
agent.
Key-words: policy formulation, policy cycle, health policy, drug policy, stakeholder.
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LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Representao das Dimenses Normativas e Estratgicas para as Definies de Stakeholders ...................................................................................................................... 34
Figura 2: Classes Qualitativas dos Stakeholders ...................................................................... 35
Figura 3: Tipologia dos Stakeholders ....................................................................................... 36
Figura 4:Modelo de Influncia de Stakeholders de Cinco Lados para os Governos Locais .... 37
Figura 5: Diagrama de Organizao da Pesquisa ..................................................................... 45
Figura 6: Modelo de Anlise da Pesquisa ................................................................................. 52
Figura 7: Etapas para a Formulao de uma Poltica ................................................................ 77
Figura 8: Tipos de Relaes entre Aspectos Envolvidos com a Formulao da PNM e este processo .......................................................................................................................... 110
Figura 9: Diagrama Proposto quanto aos Documentos e Normas Envolvidos na Formulao da PNM ........................................................................................................................... 125
Figura 10: Diagrama Proposto quanto s Arenas Decisrias que Contribuem para a Formulao de uma Poltica de Federal de Sade .......................................................... 144
Figura 11: Modelo de Influncia de Stakeholders de Cinco Lados para a Formao de PNM ........................................................................................................................................ 145
Figura 12: Modelo de Diagrama de Aspectos Facilitadores/Dificultadores para a Formulao de Polticas de Sade Brasileiras .................................................................................... 146
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LISTA DE QUADROS
Quadro 1: Pilares Tericos Delineadores da Pesquisa .............................................................. 22
Quadro 2: Diferenas entre Pesquisas Quantitativas e Qualitativas ......................................... 44
Quadro 3: Relaes dos Entrevistados da Pesquisa .................................................................. 49
Quadro 4: Passos para Realizar a Anlise de Contedo ........................................................... 51
Quadro 5: Definio das Categorias Analisadas ....................................................................... 53
Quadro 6: Cdigos para Anlise e suas Categorias .................................................................. 55
Quadro 7: Categorias e Respectivos Cdigos para a Anlise ................................................... 58
Quadro 8: Documentos Internacionais sobre Gesto Governamental de Medicamentos e Elaborao de Polticas Nacionais de Medicamento ........................................................ 83
Quadro 9: Documentos Nacionais Consultados para a Elaborao da Poltica Nacional de Medicamentos ................................................................................................................... 89
Quadro 10: Resumo dos Cdigos Identificados nos Trechos das Normas Discutidas ........... 124
Quadro 11: Algumas Normas Publicadas Aps a Formulao da PNM, Relacionadas aos Aspectos Discutidos ........................................................................................................ 124
Quadro 12: Representantes da 10 Conferncia Nacional de Sade ....................................... 130
Quadro 13: Representantes do Conselho Nacional de Sade, segundo o Decreto n 99.438, de 7 de agosto de 1990 ........................................................................................................ 133
Quadro 14: Representantes presentes em Reunies Ordinrias do Conselho Nacional de Sade Prvias Publicao da PNM ......................................................................................... 134
Quadro 15: Representantes Recomendados para a Oficina de Trabalho sobre Medicamentos Genricos segundo Resoluo n 227, de 8 de maio de 1997 ......................................... 136
Quadro 16: Quadro Resumo dos Principais Atores Envolvidos com a Formulao da PNM de 1998, segundo a pesquisa ................................................................................................ 145
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LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Quantificao dos Cdigos pelo Total de Documentos e Entrevistas ...................... 60
Tabela 2: Quantidade de Cdigos nos Documentos e Entrevistas Quanto Categoria Contexto Histrico ............................................................................................................................ 61
Tabela 3: Quantidade de Cdigos nos Documentos e Entrevistas quanto Metodologia de Formulao e Contedo da Poltica .................................................................................. 72
Tabela 4: Quantidade de Cdigos quanto Categoria Aspectos Regulamentadores ............. 110
Tabela 5: Quantidade de Cdigos quanto Categoria Stakeholders e Arenas Decisrias ..... 125
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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AC Anlise de Contedo
AIDS Sndrome da Imunodeficincia Adquirida
ANVISA Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria
CASSAUDE Subcomisso Temporria da Sade
CEME Central de Medicamentos
CIB Comisso Intergestores Bipartite
CIT Comisso Intergestores Tripartite
CNS Conselho Nacional de Sade
DECIT Departamento de Cincia, Inovao e Tecnologia
ENAFPM Encontro Nacional de Assistncia Farmacutica e Polticas de Medicamentos
ENSP Escola Nacional de Sade Pblica
FENAFAR Federao Nacional dos Farmacuticos
FIOCRUZ Fundao Oswaldo Cruz
HIV Vrus da Imunodeficincia Humana
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica
INAMPS Instituto Nacional de Assistncia Mdica da Previdncia Social
LOS Lei Orgnica de Sade
MAPS Ministrio da Previdncia e da Assistncia Social
MS Ministrio da Sade
NOB Norma Operacional Bsica
OMS Organizao Mundial de Sade
OPAS Organizao Pan-Americana de Sade
PIB Produto Interno Bruto
PNM Poltica Nacional de Medicamentos
PRODECON Promotoria de Defesa do Consumidor
SCTIE Secretaria de Cincia, Tecnologia e Insumos Estratgicos
SPS Secretaria de Polticas de Sade
SPSA Secretaria de Polticas de Sade e Avaliao
SUDS Sistema Unificado e Descentralizado de Sade
SUS Sistema nico de Sade
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SVS Secretaria de Vigilncia em Sade
Unicef Fundo das Naes Unidas para a Infncia
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SUMRIO
1 INTRODUO ................................................................................................................. 15 2 FUNDAMENTAO TERICA ................................................................................... 24 2.1 POLTICAS PBLICAS ................................................................................................. 24 2.1.1 Formulao de polticas ................................................................................................ 27 2.1.2 Processo decisrio e governana .................................................................................. 28 2.2 TEORIA DOS STAKEHOLDER .................................................................................... 32 2.2.1 Relao entre stakeholder e a Teoria Institucional ....................................................... 37 2.2.2 Relao entre stakeholder e a Teoria da Dependncia de recursos .............................. 38 2.3 REVISO DAS POLTICAS PBLICAS DE SADE DO BRASIL ........................... 39 3 MTODOS E PROCEDIMENTOS ................................................................................ 43 3.1 CARACTERIZAO DA PESQUISA .......................................................................... 43 3.1.1 Organizao do estudo .................................................................................................. 44 3.2 PROCEDIMENTOS DE COLETA DE DADOS ............................................................ 45 3.3 PROCEDIMENTO E TCNICA DE ANLISE DOS DADOS .................................... 50 4 RESULTADOS E DISCUSSO ...................................................................................... 59 4.1 ANLISE DAS CATEGORIAS ..................................................................................... 61 4.1.1 Contexto Histrico ........................................................................................................ 61 4.1.2 Metodologia de Formulao e Contedo da Poltica .................................................... 71 4.1.3 Aspectos Regulamentadores ....................................................................................... 110 4.1.4 Stakeholders e arenas decisrias ................................................................................. 125 5 CONSIDERAES FINAIS ......................................................................................... 147 REFERNCIAS .................................................................................................................... 151 APNDICE A ........................................................................................................................ 162
APNDICE B ........................................................................................................................ 163 APNDICE C ........................................................................................................................ 167
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1 INTRODUO
No presente trabalho de mestrado acadmico, na rea de polticas pblicas de sade,
estuda-se a Poltica Nacional de Medicamentos (PNM), aprovada pela Portaria GM/MS
3.916/98, que implementa um novo paradigma de assistncia farmacutica bsica, diante da
necessidade de regulamentao especfica na rea de medicamentos do setor Sade.
O processo de implementao da poltica se deu no incio do ano de 1999, sendo que a
mesma tem por objetivo assegurar populao o acesso aos medicamentos dispostos como
essenciais, promovendo seu uso racional e garantindo sua segurana, eficcia e qualidade.
Estes produtos devem estar disponveis para atender a maioria dos problemas de sade da
populao, segundo critrios epidemiolgicos, quando a mesma necessite, nas formas
farmacuticas apropriadas. Para isto foram estabelecidas diretrizes a serem seguidas pelos
gestores do Sistema Nacional de Sade (SUS), nas trs esferas governamentais:
(...) adoo de relao de medicamentos essenciais; regulamentao sanitria de medicamentos; reorientao da assistncia farmacutica; promoo do uso racional de medicamentos; desenvolvimento cientfico e tecnolgico; promoo da produo de medicamentos; e desenvolvimento e capacitao de recursos humanos (SECRETARIA DE POLTICAS PBLICAS, 2000, p. 206).
A elaborao da referida poltica foi antecedida por diversos marcos legais que
nortearam a assistncia farmacutica bsica no Sistema nico de Sade. Sendo que o
primeiro deles foi dado pela Lei Orgnica da Sade (LOS), Lei no 8.080, que definiu as
diretrizes do SUS; seguida da Lei no 8.142, que dispe sobre o controle social e o SUS, bem
como sobre o repasse de recursos entre esferas governamentais na rea da sade (KOMIS;
BRAGA; ZAIRE, 2008).
Conforme disposto na Portaria 3.916, de 30 de outubro de 1998, para a organizao e
concluso da mesma, foram realizadas consultas a diversos grupos, envolvidos direta ou
indiretamente com a questo. Alm da aprovao final da proposta da poltica submetida
Comisso Intergestores Tripartite e pelo Conselho Nacional de Sade (BRASIL, 1998).
Sendo assim, evidencia-se a participao de diferentes segmentos da sociedade, ligados
diretamente estruturas governamentais ou no, no processo de elaborao da poltica,
influenciando o mesmo de diferentes maneiras e intensidade.
O Brasil composto por 27 unidades federativas e apresenta uma extenso territorial de
8.514.876 Km2. No ano de 2010, contabilizava uma populao de 190.732.694 habitantes,
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segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE). Dentre estes, 84,35% j
residia em rea urbana, neste mesmo ano, com uma taxa mdia anual de crescimento
populacional de 1,17% (2005 2010); taxa bruta de natalidade de 16 por mil habitantes
(2009) e taxa bruta de mortalidade de 6 por mil habitantes. Os gastos pblicos com sade, no
ano de 2004, eram de 4,8% do produto interno bruto (PIB) (IBGE, 2010).
Alguns dados como o ndice de desenvolvimento humano de 0,699 (2010); a esperana
de vida ao nascer de 72,9 anos (2010) e os domiclios com acesso a gua potvel 91% e a
rede sanitria 77% (2006) caracterizam ainda melhor esta diversidade de aspectos do pas
(IBGE, 2010).
Aliado estes indicadores, percebe-se no pas um processo de envelhecimento
populacional em acelerao, levando mudanas no perfil etrio e epidemiolgico. Enquanto
no sculo XX as doenas infecciosas eram responsveis por metade dos casos de morte,
atualmente referem-se menos de 10%, sendo as mais prevalentes nos dias atuais as doenas
cardiovasculares. Com isto, percebe-se que o perfil de doenas atual caracteriza a alterao de
faixa etria prevalente, havendo mais idosos e enfermidades mais complexas e onerosas para
o sistema, caractersticas de pases de primeiro mundo. Apesar desta mudana notvel, em
funo das diferenas regionais e, consequentemente, das condies sociais, h partes do
Brasil que ainda apresentam doenas de pases em desenvolvimento. Percebe-se ento,
diferenas nos perfis de nascimentos, mortalidade, envelhecimento, renda, acesso educao
e servios de sade (IBGE, 2009).
Ressaltando a importncia do tema a ser discutido, dos oito objetivos do milnio, em
mbito mundial, criados a fim de direcionar as polticas nacionais, trs esto relacionados
diretamente sade. So eles: reduzir a mortalidade na infncia, melhorar a sade materna e
combater o HIV/AIDS, a malria e outras doenas (IBGE, 2010).
Considerando estas questes, a Constituio Federal Brasileira garante Unio a
competncia e responsabilidade de formular e executar polticas nacionais em prol do
desenvolvimento econmico e social. As polticas caracterizam, ento, as diretrizes para a
atuao do governo, delineando as estratgias para o planejamento de programas, projetos e
atividades. Desta maneira, reduzido o impacto da descontinuidade administrativa,
mantendo-se as decises que moldam os rumos dos programas nacionais (BRASIL, 2006a).
Na rea da sade, compondo de maneira importante as polticas pblicas de sade, foi criada a
Poltica Nacional de Medicamentos, que estabelece as diretrizes para o acesso e uso racional
de medicamentos, com o objetivo final de melhorar a qualidade de vida da populao.
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Considerando o Brasil e sua imensa diversidade importante estudar e analisar como se
d a formulao de polticas nacionais capazes de abranger tal dimenso e diferentes aspectos
demogrficos e de sade e, quanto sua elaborao, atender tantos interesses diferentes nas
arenas decisrias. Desta forma, a ideia que levou elaborao deste trabalho surgiu do
questionamento quanto ao processo de elaborao de polticas neste contexto.
Dentre diferentes modelos de anlise, o estudo das polticas pblicas pode nortear-se
pelas chamadas fases ou ciclo das polticas pblicas, que compreende a percepo e definio
de problemas, definio da agenda, elaborao de programas e deciso, implementao de
polticas e avaliao de polticas e eventual correo da ao. Desta forma, investigam-se as
prticas poltico-administrativas relacionadas, as redes de poltica formadas, os atores
envolvidos na arena decisria, entre outros fatores.
Considerando que a PNM formaliza diretrizes que j haviam sido discutidas, ou cujas
discusses se iniciaram no 1 Encontro Nacional de Assistncia Farmacutica e Polticas de
Medicamentos (1 ENAFPM 1988), os grupos de interesses envolvidos poderiam j estar
engajados no debate do objeto da poltica bem como ter havido o surgimento de novos grupos
com o passar dos anos, at a formalizao da Portaria, 10 anos depois (KOMIS, BRAGA e
ZAIRE, 2008).
O trabalho tem por objeto, ento, a Poltica Nacional de Medicamentos e sua descrio e
anlise quanto ao processo de elaborao e tomada de deciso. Incluem-se os grupos
envolvidos, o carter das relaes estabelecidas entre os mesmos e seus perfis de influncia,
durante o processo de elaborao da PNM. Este foco de estudo considerado relevante a
partir da premissa de que as relaes formadas entre os atores polticos em determinadas
arenas decisrias formaro arranjos institucionais que resultam na configurao de uma
proposta de poltica final. Sendo que estes arranjos seguem trs elementos importantes para a
ao: interesses; recursos de poder e oportunidades de aes (MARCH; OLSEN, 1993). A
partir da conjuntura especfica formada para cada processo de elaborao de poltica, haver
um perfil de influncia entre os grupos com caractersticas especficas de ao de cada
subsistema (grupos), bem como os mesmos tambm podero ser influenciados pelo contexto
(GERSCHMAN; SANTOS, 2006).
Assim como na formulao e execuo de polticas pblicas sociais, observa-se para as
polticas de sade, como um fenmeno emergente, a formao de arranjos
interorganizacionais denominados redes de polticas. Com a regionalizao do sistema
pblico de sade altera-se a estrutura de definio e avaliao de polticas, partindo-se de um
controle centralizado, com instituies hierarquizadas, para arranjos mltiplos, com rgos
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governamentais descentralizados e controle social (organizaes da sociedade civil). Desta
maneira, no h controle total de processo ou de recurso centralizado em uma entidade, mas
sim, compartilhado entre diversos atores, dependentes entre si. O Sistema nico de Sade
apresenta-se como uma instituio descentralizada e regionalizada, articulando-se entre
gestores governamentais e instncias representativas da sociedade, contribuindo para o
fortalecimento de um Estado democrtico (TEIXEIRA, 2007).
Ao analisar a estrutura do Estado contemporneo depara-se com dois paradigmas que se
misturam complexamente e de maneira dinmica na construo e manuteno do Estado.
Paradigmas estes que determinam toda a problemtica na relao entre Estado (sistema
poltico) e sociedade. O primeiro o estado de direito, que representa a liberdade pessoal,
poltica e econmica. Em contrapartida h o estado social, que reflete a participao popular
no poder poltico. Se h, por um lado, o consenso de liberdade social, por outro h a
interveno do Estado que, por sua vez, tem participao da sociedade. Neste caso a
sociedade sofre e intervm nas aes do Estado, criando uma rede complexa de integrao
entre estado poltico e sociedade civil (BOBBIO, 1993).
Este um dos pontos de discusso que envolve e caracteriza um dos tipos de relaes
estabelecidas nos campos decisrios das novas formas de gesto. O aumento da complexidade
da estrutura social, associado ao desenvolvimento de uma organizao policntrica do sistema
de sade originaram a representao pluridimensional de interesses, fragmentando o antigo
padro dos meios polticos de estratgias governamentais. Desta maneira, torna-se necessria
a articulao de grupos e formao de alianas, constituindo arenas de negociao, que
sustentem as aes estatais (DINIZ, 1995).
Permeando estes aspectos, discute-se recentemente o conceito de governana com foco
nos padres das relaes entre os atores polticos e sociais, como os mecanismos de
articulao e cooperao de interesses entre partidos polticos, redes sociais informais,
hierarquias e demais associaes. Considerando, portanto, que a elaborao e durabilidade das
polticas, bem como a mudanas de polticas j existentes, dependem destas relaes que do
suporte aos decisores e que, por sua vez, estas devem ser legtimas e promover uma
representao de interesses com abrangncia e organizada, um mtodo de estudo e
investigao utilizado para entender e discutir as implicaes destas relaes a anlise dos
stakeholders envolvidos neste processo. Muitos estudos so realizados sob esta tica,
envolvendo diferentes setores e instituies e sob trs dimenses de anlise: descritiva,
instrumental e normativa (DONALDSON; PRESTON, 1995).
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Com base nestas dimenses, a anlise de stakeholders pode envolver a descrio dos
comportamentos, situaes, caractersticas de uma organizao, papis dos atores envolvidos,
autoridade para tomada de decises, predizer relaes de causa e efeito e, consequentemente,
recomendar atitudes e prticas (dimenso descritiva). Tambm visam avaliar o impacto dos
stakeholders nestas organizaes (dimenso instrumental) e como se projetam as questes e
princpios ticos envolvidos nestas relaes (dimenso normativa) (DONALDSON;
PRESTON, 1995).
Alm disso, apesar da crescente disseminao do mtodo de anlise de stakeholders em
diversos campos de estudos organizacionais e de polticas pblicas, o mesmo no tem sido
utilizado nas pesquisas na rea de sade pblica no Brasil.
Considerando o contexto das polticas de sade brasileiras e a relevncia dos diferentes
fatores que afetam a elaborao das mesmas, para o entendimento das redes articuladas nas
arenas decisrias coloca-se a seguinte questo de pesquisa:
Quais os fatores que influenciam a formulao de uma poltica pblica nacional de
sade?
A partir desta pergunta de interesse, delimitou-se como objetivos da pesquisa:
Objetivo Geral:
-Explicar o processo de formulao de uma poltica pblica de sade no mbito do
Governo Federal.
Objetivos Especficos:
-Descrever como se d o processo de formulao de uma poltica nacional de sade.
-Identificar os fatores que influenciam no processo de formulao de uma poltica
pblica.
-Identificar os atores envolvidos na formulao da Poltica Nacional de Medicamentos.
-Investigar o papel (poder, legitimidade e urgncia) dos atores no cenrio da Poltica
Nacional de Medicamentos.
As polticas pblicas, enquanto instrumento institucional, originam aes estatais, no
caso, no lcus sade. A qualidade destas aes depende dos incentivos e controles aos quais
estes governos estejam submetidos. Por conseguinte, a ampla estrutura institucional para a
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tomada de decises, vislumbrada pelo SUS, ser responsvel pela implementao das
polticas de sade nacionais e locais (ARRETCHE, 2003). Desta maneira, necessrio o
estudo acerca do ciclo das polticas pblicas e suas caractersticas para o setor sade. Bem
como uma investigao quanto ao processo decisrio no campo da sade, envolvendo o
modelo de governana e identificando e caracterizando os stakeholders, considerando as
diferentes conformaes assumidas em decorrncia das modificaes sofridas pelo sistema
nacional de sade, em funo de trocas de governo e da transio democrtica.
Quanto estes aspectos, as revises relacionadas aos resultados da gesto
descentralizada atestam que existem poucos estudos na rea, fazendo-se necessria a
investigao destes modelos de elaborao, processo decisrio, bem como os atores
envolvidos e o impacto de suas influncias nas relaes e polticas estabelecidas.
No campo de estudo sobre polticas pblicas de sade, aps pesquisa sobre a produo
atual relacionada ao tema proposto, percebeu-se o dficit de publicaes que investiguem,
descrevam ou analisem estas polticas luz de teorias administrativas, utilizando o ciclo das
polticas pblicas e teorias acessrias como modelos para as anlises. Sobre polticas pblicas
de sade a abordagem geralmente descritiva, somente contextualizando o momento de
elaborao e implementao de uma poltica (como a transio do INAMPS Instituto
Nacional de Assistncia Mdica da Previdncia Social para o SUS; a Poltica Sade da
Famlia, a Poltica Nacional de Alimentao e Nutrio do Setor Sade, a prpria Poltica
Nacional de Medicamentos, entre outras). O tema processo decisrio/tomada de decises por
vezes se confunde com a escolha de tecnologias em sade e temas clnicos e est em
crescimento quanto abordagem da problemtica da agenda estatal, elaborao e
implementao de polticas. Na pesquisa no foi encontrado estudo brasileiro sobre polticas
de sade luz da teoria de stakeholders. Deve-se considerar, tambm, que os trabalhos
relacionados com a identificao de stakeholders em diferentes cenrios, bem como a anlise
de seus papis e impactos de suas influncias, so realizados, majoritariamente, em pases
estrangeiros. Portanto, de acordo com o perfil identificado de publicaes, observa-se uma
lacuna na pesquisa relacionada estas reas temticas, principalmente permeando o setor
sade. Desta forma, justifica-se a realizao desta pesquisa com este direcionamento
metodolgico e objetivos especficos, com o intuito de elencar todos os fatores relacionados
com a elaborao de uma poltica de sade, investigando a relao entre os mesmos,
aplicando a teoria s polticas nacionais e verificando se h fatores peculiares para o caso do
Brasil.
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O estudo pretendeu desvelar questes relacionadas ao resultado do processo de
institucionalizao do SUS, no que tange a construo da agenda e formulao das polticas,
investigando os arranjos de poder e suas influncias sobre os instrumentos de gesto de
polticas pblicas de sade quanto Poltica Nacional de Medicamentos. A partir da anlise
dos grupos formais e informais de interesse e dos atores envolvidos na instituio em debate,
interpem-se a anlise institucional aos arranjos burocrticos do arcabouo Estatal no setor
sade e aos instrumentos de gesto para a implementao, monitorao e avaliao das
polticas pblicas de sade.
As principais contribuies da pesquisa decaram sobre a rea acadmica em geral,
principalmente, a pesquisadores, bem como para formuladores de polticas pblicas que tm
interesse direto ou indireto na rea de anlise de processos decisrios. Para a sociedade e
pesquisadores, abriu um campo para discusso e disseminao sobre governana no lcus
sade e a anlise de stakeholders envolvidos em polticas pblicas de sade. A pesquisa
visou, ento, proporcionar integrao e debate com outros pesquisadores interessados no
tema; bem como maior divulgao e visibilidade do assunto em questo.
Para este estudo, foi proposto aplicar o modelo terico desenvolvido por Gomes (2007)
contribuindo para o estudo de stakeholders no Brasil e validao do modelo na rea da sade.
Pretendeu-se que a pesquisa contribusse, ao final, para a evoluo do conhecimento
acerca da anlise de polticas pblicas de sade, objetivando, possivelmente, a formulao de
uma proposta de modelo de anlise.
Foi proposto ento, estudar a Poltica Nacional de Medicamentos, fundamentada na
instituio Sistema nico de Sade, luz do ciclo de polticas pblicas, teoria de stakeholders
e do debate acerca do conceito Governana e suas ideias derivadas, considerando as
transformaes ocorridas no sistema pblico de sade e, consequentemente, em suas arenas
decisrias.
O presente trabalho partiu de um levantamento de literatura de temas relacionados
questo de pesquisa e concentrou-se em alguns pilares tericos como base para a discusso
acerca da formulao da PNM, que seriam: o ciclo de polticas pblicas, o modelo de
governana, a teoria de stakeholder, a teoria institucional e a teoria da dependncia de
recursos. A teoria institucional contribuiu com a discusso sobre as influncias do ambiente
sobre as organizaes, levando-as assimilar regras e normas e adotar novas estruturas e
comportamentos institucionalizados. E a teoria da dependncia de recursos tambm auxiliou
no entendimento das relaes entre as organizaes e o ambiente, com foco no ganho e
preservao de recursos. A deciso pelo referencial partiu do estudo apresentado por Gomes
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22
(2007), bem como do modelo terico criado para a investigao do comportamento das
organizaes quanto s influncias provenientes do meio. Esta pesquisa pretendeu, portanto,
aplicar o modelo terico proposto (QUADRO 01) a fim de realizar uma investigao emprica
descritiva de identificao de stakeholders em processos decisrios de polticas pblicas de
sade.
Pilares tericos Aspecto(s) relevante(s)
Polticas de sade
1.1.1 Ciclo de polticas pblicas
1.1.2 Formulao de polticas (Policy cycle)
1.1.3 Polticas Nacionais de Sade
1.1.4 Poltica Nacional de Medicamentos
Governana 1.1.5 Conceito de governana
Processo decisrio
1.1.6 Conceito de processo decisrio
1.1.7 Arenas decisrias
1.1.8 Atores
Teoria de Stakeholders
1.1.9 Conceito de stakeholders
1.1.10 Grau de influncia, a partir de:
1.1.11 - poder;
1.1.12 - legitimidade;
1.1.13 - urgncia.
Teoria institucional 1.1.14 Como as instituies legitimam os stakeholders.
Teoria da dependncia de recursos 1.1.15 Entender as influncias externas ao processo decisrio
Quadro 1: Pilares Tericos Delineadores da Pesquisa
Fonte: elaborado pelo autor
A fim de investigar o processo de formulao de polticas pblicas, no que tange a
Poltica Nacional de Medicamentos, seguiu-se o paradigma interpretativista de estudo, com
uma abordagem qualitativa para coleta e anlise de dados, por meio de realizao de pesquisa
documental e entrevistas semiestruturadas.
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O trabalho organiza-se, com a apresentao do referencial terico sobre o tema
estudado, revisando-se as polticas pblicas e seu ciclo, as polticas pblicas de sade do
Brasil; discutindo-se o conceito de governana, as teorias de stakeholder, institucional e da
dependncia de recursos. No tpico trs so descritos os mtodos da pesquisa e,
posteriormente, os resultados, discusso e consideraes finais.
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2 FUNDAMENTAO TERICA
2.1 POLTICAS PBLICAS
O estudo das polticas pblicas, que envolve diferentes modelos relacionados
elaborao, deciso, implementao e avaliao das mesmas, ganhou novamente importncia
diante de diversas mudanas nas responsabilidades da sociedade capitalista. Uma questo
seria a mudana nas polticas keynesianas do ps-guerra (crise fiscal do Estado) para polticas
restritivas de gastos, acarretando restries atuao do Estado e o foco universal das
polticas (SANTOS; RIBEIRO; GOMES, 2007; SOUZA, 2006).
Para a sociedade capitalista, apesar da maior parte da responsabilidade de produzir e
distribuir ser do mercado, uma significativa parcela da produo social ainda atividade do
Estado. Diante disto, constituem-se as polticas pblicas, enquanto diretrizes para ao do
poder pblico e alocao de recursos pblicos. As polticas delimitam as regras para a relao
entre o Estado e a sociedade. Sendo importante ressaltar que as no-aes tambm devem ser
consideradas enquanto estratgia do Estado, j que so uma forma de manifestao poltica e
traduzem a opo poltica dos decisores (SANTOS; RIBEIRO; GOMES, 2007).
So pontos de interesse para estudo a forma pela qual os problemas so integrados na
agenda de polticas Estatal, como se d o processo de formulao de uma poltica pblica,
quais so os agentes participantes do processo decisrio, como realizado o processo de
avaliao, entre outros. A fim de responder estas e outras questes, so utilizados diversos
modelos de polticas pblicas, como a classificao em tipos de polticas (distributivas,
redistributivas, regulatrias e constitutivas); o incrementalismo; o modelo garbage can; o
modelo mutliple streams; o modelo advocacy coalition; as arenas sociais; o modelo do
equilbrio interrompido; o ciclo da poltica pblica (policy cycle); entre outros (GELINSKIL;
SEIBEL, 2008; SOUZA, 2006). Para este trabalho foi escolhido o ltimo modelo como
referncia para a anlise da PNM.
O ciclo da poltica pblica compreende um processo dinmico e composto por diferentes
estgios. H vrias vertentes que abordam e descrevem estes estgios focando em diferentes
aspectos e, desta forma, pontuando diferentes divises para o ciclo. A primeira ideias sobre
processo poltico e sua diviso em estgios foi colocada pelo pesquisador Harold Lasswell,
em 1956, que pontuou sete estgios: inteligncia (coleta, processamento e disseminao de
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25
informaes), promoo de opes particulares, prescrio (para um conjunto de aes),
invocao (quando eram delimitadas sanes para o no cumprimento das prescries dos
tomadores de deciso), aplicao, trmino (a poltica era aplicada at terminar ou ser
cancelada) e apreciao (os resultados eram apreciados e avaliados quanto aos objetivos
iniciais) (HOWLETT, 2000; FISHER; MILLER; SIDNEY, 2007).
Alguns autores que tambm identificam fases para o processo poltico so Robert
Hoppe, Henk Van De Graaf, Asje Van Dijk (VIANA, 1996), Brewer e deLeon (1983), May e
Wildavsky (1978), Anderson (1975) e Jenkins (1978) (FISHER; MILLER; SIDNEY, 2007).
Sendo assim, um dos modelos descrito por Frey (2000, p.226), que define cinco fases: (1)
percepo e definio de problemas, (2) definio da agenda, (3) elaborao de programas e
deciso, (4) implementao de polticas e (5) avaliao de polticas e eventual correo da
ao.
Este modelo vantajoso para a anlise do ciclo de vida de uma poltica, pois considera
que o mesmo um processo dinmico e sujeito modificaes, ao longo do tempo. Em
funo disto, a separao em estgios permite uma melhor anlise de cada ponto do processo
quanto s questes poltico-administrativas, os jogos de poder e as redes polticas (FREY,
2000).
Porm, pelas particularidades de cada setor e nvel de ao estatal, no possvel
predizer todas as variveis de anlise a serem utilizadas em estudos empricos de caso de
processos polticos. Sendo assim, deve-se partir de conceitos e bases tericas para a escolha
dos pontos a serem abordados, como a estrutura poltica, as instituies, as condies de
poder, entre outros. Isto pode ser feito partindo-se das dimenses j descritas, como (1) polity,
enquanto grau de influncia das estruturas polticas (ordem do sistema poltico delineada pelo
sistema jurdico e estrutura do sistema poltico-administrativo); (2) politics, que se refere ao
processo de negociao poltica e (3) policy, como o resultado material concreto
(configurao dos programas polticos, contedo das decises polticas) (FREY, 2000).
A partir das dimenses descritas, estuda-se a poltica pblica seguindo o modelo da
policy analysis, podendo-se analisar as dimenses isoladamente ou suas inter-relaes.
De acordo com Frey (2000, p. 221), para estudar mais detalhadamente e com maior
profundidade o surgimento e percurso de algum programa poltico, incluindo os aspectos
favorveis e dificultadores, deve realizar uma investigao mais intensa sobre a vida da
poltica, sendo, neste caso, importante os arranjos institucionais, as atitudes e objetivos dos
atores polticos, os instrumentos de ao e as estratgias polticas (processos poltico-
administrativos).
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Na policy analysis so consideradas algumas categorias de estudo, como a policy
networks, policy arena e policy cycle.
O termo policy networks remete interao entre os atores sociais envolvidos em um
processo poltico (MACEDO, 1999), tratando-se de uma rede de relaes sociais, da interao
entre diferentes instituies e grupos do executivo, legislativo e da sociedade, na criao e na
implementao de uma determinada poltica (FREY, 2000).
Esta relao entre os participantes de uma tomada de decises, definida como policy
network, agrega como pressupostos o entendimento de que as relaes so horizontais e no
verticais; que as mesmas no so necessariamente hierrquicas ou autoritrias e que as
decises no so tomadas somente com base em estruturas institucionais formais (MACEDO,
1999).
Discute-se, ento, uma possvel mudana quanto ao padro de formulao e
operacionalizao de polticas pblicas, passando de um padro tradicional centralizado, para
o descentralizado, caracterizado pela horizontalidade das relaes e pela interao dos atores
sociais envolvidos (MACEDO, 1999).
A policy arena refere-se aos espaos de configurao do conflito estatais, societais ou
entre as duas esferas. Nestes espaos os atores sociais e grupos de interesse apresentam suas
posies em um espao poltico de conflito e consenso nas reas de polticas de carter
distributivo, redistributivo, regulatrio ou constitutivo (CRTES, 2009, FREY, 2000).
O policy cycle, como j descrito anteriormente, remete s fases da poltica pblica que,
em geral, so descritas de forma geral, como formao da agenda, formulao de poltica,
tomada de deciso, implementao e avaliao.
Alguns estudos empricos sobre planejamento em organizaes e tomada de decises
defendem que o processo decisrio no segue cada estgio, porm, o modelo permanece forte
durante as dcadas, pois apresenta uma sequncia ideal de planejamento racional e tomada de
deciso baseada em evidncias. Isto porque, a partir do modelo racional, devem-se analisar os
problemas e objetivos, coletar e analisar as informaes pertinentes e pesquisar a melhor
alternativa para atingir estas metas. Seguindo-se da implementao e avaliao dos resultados,
com correes, se necessrio (FISHER; MILLER; SIDNEY, 2007).
Como orientao terica, este trabalho est embasado na policy analysis, suas
dimenses (polity, politics e policy) e categorias de anlise (policy networks, policy arena e
policy cycle) para a descrio da Poltica Nacional de Medicamentos.
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2.1.1 Formulao de polticas
No estgio de formulao de polticas, as demandas e problemas identificados so
transformados em programas governamentais, considerando-se seus objetivos e a escolha
dentre vrias alternativas propostas. Alguns autores diferenciam o momento de elaborao das
alternativas de ao do processo de adoo de uma alternativa para a poltica (processo
decisrio). Porm, conforme Fischer, Miller e Sidney (2007, p. 48) colocam, o presente
trabalho tambm considerou a formulao e o processo de deciso como sub-estgios de uma
nica fase do ciclo da poltica.
Os estudos sobre formulao tiveram grande influncia de modelos, tcnicas e
ferramentas que visam tornar a prtica de tomada de deciso mais racional, identificando
polticas efetivas e com melhor perfil custo-eficincia. Para isto, como ferramentas para
garantir a escolha de uma poltica que corresponda s prioridades longo prazo, importante
definir os objetivos, os resultados esperados e aplicar a anlise de custo-benefcio (FISHER;
MILLER; SIDNEY, 2007).
Quanto ao processo de tomada de deciso, para os cientistas polticos, este momento no
envolve somente a deteno da informao e a anlise da mesma, mas tambm a resoluo do
conflito entre atores pblicos e privados e departamentos do governo. Tangenciando esta
questo, foram elaboradas teorias especficas como a de redes de polticas (policy networks),
caracterizadas pelas relaes horizontais e no-hierrquicas entre atores, como j comentado;
e de policy arena, definindo os arranjos institucionais que suportam a atividade de deciso.
Quanto a policy network, estudos demonstram que no h separao entre as
organizaes governamentais e a sociedade na formulao de polticas. Apesar de a deciso
final estar alocada para organizaes especficas do governo, esta precedida por processos
de negociao, mais ou menos informais, com grupos de interesse de diferentes segmentos da
sociedade. Vrios estudos corroboram para a concluso de que estes momentos anteriores
tomada de deciso influenciam de maneira significativa a alternativa escolhida, bem como
ajudam a moldar a poltica elaborada. Porm, ao analisar esta etapa, percebe-se que o
processo pode no seguir o modelo racional de escolha, j que forma-se um cenrio de
barganha entre diversos atores que tem como resultado uma deciso baseada na oposio de
diversos recursos de poder e interesse dos atores. Quanto esta questo, o Estado tem
importante papel influenciando esta diversidade de atores ao formar as policy networks, por
exemplo, criando ou extinguindo agncias e cargos, alterando os atores das organizaes
estatais a cada governo, entre outros (FISHER; MILLER; SIDNEY, 2007).
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Dentre as vrias propostas colocadas no cenrio de deciso, a escolha por uma delas ser
determinada por inmeros fatores. Dentre estes, trs componentes importantes so elencados.
O primeiro seria a escassez de recurso, que remete no somente recursos econmicos, mas
tambm ao suporte poltico, como um recurso crtico para este processo. O segundo seria a
alocao de competncias entre os diferentes atores, designando maior poder de deciso para
cada grupo de atores dependendo do tipo de poltica a ser decidida. Por fim, o terceiro seria a
fonte de informao para a tomada de deciso, que no seria restrita estudos cientficos ou
opinio de especialistas, mas sim envolveria estas e vrias outras fontes de informao
(FISHER; MILLER; SIDNEY, 2007).
2.1.2 Processo decisrio e governana
Considerando o processo de interao de atores sociais na formulao das polticas
pblicas, as organizaes refletem um meio de distintos interesses e valores e com
distribuio heterognea de poder (considerado como um recurso na arena decisria). O
sistema poltico, nesta conjuntura, ser permeado por atores envolvidos de acordo com suas
preferncias, a fim de defender a alternativa defendida por seu grupo e engajar os demais na
mesma (FISHER; MILLER; SIDNEY, 2007).
A interao entre os atores reflete em resultados sociais e polticos, decorrentes de trs
fatores principais: as restries impostas pelas regras ou normas, a representao e a
distribuio dos interesses ou preferncias entre os atores e a distribuio dos recursos de
poder (MARCH; OLSEN, 1993). Estes fatores retratam, ento, trs elementos importantes
para a ao: interesses; recursos de poder e oportunidades de aes.
A partir destas ideias discute-se o que molda e estimula a ao dos atores no sistema
poltico. Uma perspectiva seria a de que as oportunidades determinam as aes; bem como as
instituies delimitam as aes em funo do estabelecimento de normas ou regras de
adequao (apropriao normativa do comportamento). Neste caso desenha-se um contexto
adaptativo (lgica da adequao) (PAULILLO, 2001).
Outra lente seria a da lgica dos interesses ou preferncias, na qual estes elementos
determinam as aes dos agentes (lgica das consequncias ou consequencial) (PAULILLO,
2001).
Entende-se, portanto, que participantes da deciso realizam escolhas baseados em seus
recursos e preferncias, em um contexto de oportunidades especficas delimitadas por normas
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29
de adequao. O comportamento dos atores entendido como resultado das limitaes e
restries colocadas a partir de conjuntos de regras, que so, por sua vez, espelhadas em
supostos comportamentos exemplares. Estas regras so determinadas pelas organizaes e
limitam a escolha dos indivduos, reduzindo a incerteza a partir da criao de rotinas
(PEDROSO, 2010).
March (2009, p. 50) discutiu a lgica da adequao frente escolha racional e
colocou:
Esse processo no aleatrio, arbitrrio ou trivial. sistemtico, raciocinado e, com frequncia, bastante complicado. [...] O processo de deciso baseado em regras se desenvolve de forma diferente do processo de deciso racional. A idia estabelecer identidades, e encontrar regras para as situaes reconhecidas.
Seguindo o modelo da racionalidade limitada, os indivduos tendero a se adaptar
estrategicamente ao meio, que nada mais do que um reflexo das oportunidades formadas.
Considerando que os prprios indivduos podero, por sua vez, influenciar este meio de
acordo com seus interesses e, consequentemente, outros grupos (PEDROSO, 2010).
De maneira oposta a lgica das consequncias considera que o comportamento
individual e objetiva maximizar as preferncias, projetando quais sero os resultados de suas
aes e seus interesses pessoais (ZAULI, 1991).
Considerando o processo decisrio e objetivando melhorar sua compreenso, James
March (2010) apresenta a definio de inteligncia decisria. Para isto, ele parte de trabalhos
anteriores que incluem a racionalidade consequente (ao racional) e os sistemas por regras
histricas. Confrontando as duas teorias, tem-se a vertente da ao racional que defende a
ao baseada em processos cognitivos, a partir de clculos. A vertente por regras histricas
acredita na sabedoria originada pela experincia passada, pelas tradies, explcitas nas
regras. Apesar de teis para o estudo do processo decisrio, nenhuma das teorias, conforme
March, garante a inteligncia do processo.
Inicialmente, importante entender a definio de inteligncia e este o primeiro
desafio encontrado. Isto ocorre em funo da dificuldade de atingir um consenso entre
algumas questes quanto aos resultados e processos de uma organizao, pois estes so os
elementos utilizados em algumas definies de inteligncia decisria.
A inteligncia pode, segundo March (2010), ser definida considerando-se os seus
resultados. Neste caso, uma ao ser dita inteligente se ela satisfizer os desejos de todos os
envolvidos, no momento em que todos os resultados j forem conhecidos. Desta forma,
considerada ex post. Toda deciso s ser inteligente, segundo este critrio, se e somente se,
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todos os resultados j forem conhecidos e atenderem ao especificado. Neste caso, os
resultados sero compatveis s preferncias dos atores envolvidos, e a inteligncia tambm.
Um possvel complicador para a avaliao da deciso seria a existncia de mltiplos atores.
Neste caso, pode-se dificultar a anlise das preferncias e ocorrer da inteligncia ser
indeterminada.
Comparativamente inteligncia, quando se trata de racionalidade e de aprendizado
para o processo decisrio, os conceitos so ex ante, relacionados aos processos, e no aos
resultados.
March (2010, p. 192) apresenta trs perguntas relacionadas s decises inteligentes:
1. Em que grau um processo de deciso e uma deciso devem ser julgados por suas contribuies ao e s consequncias da ao, por oposio s suas contribuies para o desenvolvimento do significado e de uma interpretao da vida?
2. Como resultados distantes no tempo devem ser ponderados na avaliao geral relativamente a resultados mais prximos?
3. Como os desejos, valores e necessidades de diferentes indivduos e grupos devem ser avaliados?
No s estas perguntas como outros dilemas esto presentes na discusso sobre deciso
inteligente. Um problema debatido a possibilidade da inteligncia de uma ao ser
considerada ex ante. Neste caso, a inteligncia j seria avaliada segundo as preferncias e
valores do decisor e no quanto aos resultados. Diante disto, haveria a possibilidade da
deciso ser classificada como inteligente, antes de sua aplicao, e no inteligente, aps a
aplicao (MARCH, 2010).
Porm, no caso de mltiplos atores inconsistentes, com diversas preferncias e valores,
seria complexo aplicar este critrio de inteligncia ex ante. Desta forma, os defensores desta
proposta no costumam aplicar estes pressupostos nestes casos.
Um ponto importante para aproximar a deciso do status de inteligente a sua
adequao s exigncias do ambiente decisrio. Desta forma, pode-se determinar uma relao
entre o processo de deciso e as teorias de adaptao. Isto feito com a finalidade de
desenvolver processos que concretizem a formulao de decises nicas e estveis e que se
adaptem a determinado ambiente. Na possibilidade de elaborao deste processo, a deciso
tambm receberia o adjetivo de inteligente.
Para atingir a inteligncia decisria preciso que a alternativa poltica de interesse seja
escolhida. Diante disto, parte-se do princpio de que as alternativas devero ser apresentadas
outros autores a fim de engaj-los em consonncia aos interesses de um indivduo ou grupo.
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31
Neste caso, entende-se que cada ator ter um papel na arena decisria e contribuir, de alguma
maneira, para a escolha da poltica eleita (MARCH, 2010).
Quanto ao processo decisrio na rea de sade, este um dos pontos de discusso que
envolve e caracteriza os tipos de relaes estabelecidas nos campos decisrios das novas
formas de gesto. O aumento da complexidade da estrutura social, associado ao
desenvolvimento de uma organizao policntrica do sistema de sade originaram a
representao pluridimensional de interesses, fragmentando o antigo padro dos meios
polticos de estratgias governamentais. Desta maneira, torna-se necessria a articulao de
grupos e formao de alianas, constituindo arenas de negociao, que sustentem as aes
estatais (DINIZ, 1995).
Diante da discusso sobre a democracia e a configurao Estatal da sade atual, h a
preocupao sobre a policy arena e os modelos atuais de participao dos atores, j que
inseriu-se a participao social neste novo cenrio. Desta forma, deve haver controle a fim de
evitar o desequilbrio entre os grupos de interesse e as instituies que implementam e
regulam as polticas pblicas. Neste caso, percebe-se que, em pases subdesenvolvidos, com
um possvel aumento na participao h uma consequente ampliao na atividade
governamental e deslegitimao da autoridade. Contudo, nas democracias j consolidadas, as
instituies polticas so capazes de suportar estas tenses, diferentemente dos pases em
desenvolvimento. Para estes casos deve ser analisada a autoridade governamental, com
formas de controlar a participao social, e a adaptao destas instituies, a fim de garantir a
eficcia das polticas pblicas (SANTOS, 1997).
So vrios os conceitos aceitos para o termo governana pblica (public governance) e
remetem estruturao das relaes entre o Estado e suas organizaes federais, estaduais e
municipais; as organizaes privadas, com e sem fins lucrativos e a sociedade civil. A
discusso sobre processo decisrio, no campo de polticas pblicas, permeia questes
relacionadas administrao pblica, como as bases de cooperao entre estes atores e como
isto regulado pelo Estado (KISSLER; HEIDEMANN, 2006).
Na Alemanha, a governana local entendida como uma ao conjunta promovida por
todos os stakeholders em prol do bem da coletividade (grupos de cidados, administrao,
prefeituras, associaes, clubes, empresas, entre outros) (KISSLER; HEIDEMANN, 2006).
O termo tambm entendido como resultado de reformas administrativas e de Estado
que remetem ao conjunta, de forma eficaz, transparente e compartilhada, pelo Estado,
pelas empresas e pela sociedade civil, a fim de solucionar problemas sociais e potencializar o
desenvolvimento futuro e sustentvel. Trata-se de uma forma de gesto baseada em
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32
negociao, comunicao e confiana, caracterizada pela cooperao com os cidados,
empresas e outras entidades para a conduo das aes (KISSLER; HEIDEMANN, 2006).
Entende-se que os atores locais e regionais contribuem para a ao conjunta, ampliando
as expectativas polticas e sociais em funo desta cooperao, principalmente no que tange
polticas de cunho social.
Discute-se, ento, o conceito de governana com foco nos padres das relaes entre os
atores polticos e sociais, como os mecanismos de articulao e cooperao de interesses entre
partidos polticos, redes sociais informais, hierarquias e demais associaes.
2.2 TEORIA DOS STAKEHOLDER
Edward Freeman, em seu livro Strategic Management: A stakeholder Approach,
aprofundou a discusso sobre o conceito emergente de stakeholders no mbito organizacional.
Publicado em 1984, este foi um dos trabalhos de referncia no estudo sobre atores sociais e
que introduziu o debate presente nos trabalhos atuais. Foram apresentados novos conceitos,
teorias, ferramentas e tcnicas com o objetivo de auxiliar no gerenciamento de empresas, a
fim de garantir melhores resultados e maior efetividade no meio organizacional, considerando
o ambiente organizacional como foco do planejamento (FREEMAN, 1984).
Na dcada de 80, houve a necessidade de formao de um novo modelo conceitual, j
que o entendimento das organizaes enquanto de natureza esttica, bem como tendo um
ambiente externo organizao previsvel no era mais aceito. Desta maneira, foram
desenvolvidas estratgias para o mapeamento de stakeholders, anlise de suas interaes e
entendimento dos processos organizacionais (FREEMAN, 1984; FREEMAN et al, 2010).
necessria a diferenciao entre a abordagem stakeholder e a teoria de stakeholder.
No primeiro caso o objetivo ampliar o estudo acerca da organizao considerando seu
ambiente, seus papis e suas responsabilidades, bem como os interesses de outros grupos no
antes considerados, como no-acionistas e no-proprietrios. J quanto teoria de
stakeholder, a finalidade seria identificar estes grupos de interesse e articular estas
informaes com sugestes de normatizao ou cuidados para com os stakeholders com
influncia (MITCHELL; AGLE; WOOD; 1997).
Donaldson e Preston definiram nveis para classificar os diferentes enfoques dados por
estudos referentes stakeholders, denominados descritivo, instrumental e normativo. A
dimenso de anlise descritiva a mais ampla e engloba as outras duas, referindo-se a
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33
descrio de caractersticas da organizao, de situaes, comportamentos, papis dos atores
envolvidos, descrever processos, entre outros. A dimenso subjacente seria a instrumental,
que aborda processos especficos e a atuao de atores e seu impacto. Por fim, a dimenso
normativa foca-se nas relaes e em questes ticas relacionadas, auxiliando para a projeo
de diretrizes sobre a questo (DONALDSON; PRESTON, 1995).
Freeman (1984, p. 46) define stakeholder como qualquer grupo ou indivduo que pode
afetar, ou afetado, pelo alcance dos propsitos de uma organizao. J Clarkson (1995, p.
106) diz que so pessoas ou grupos que reivindicam ou dispem de propriedade, direitos ou
interesses em uma empresa e em suas atividades no perodo passado, presente e futuro. Por
fim, Donaldson e Preston (1995, p. 85) colocam que se trata de pessoas ou grupos com
interesses legtimos nos processos e aspectos substantivos de uma atividade corporativa.
Friedman e Miles (2006) definiram um modelo de definio dos stakeholders, com base
em duas dimenses tambm delimitadas por eles: normativa, e estratgica. Considerando a
dimenso normativa, possvel identificar inmeras entidades como stakeholders, enquanto,
passando-se para a dimenso estratgica, em mbito mais restrito, tem-se o nmero mais
limitado e especfico de stakeholders.
De acordo com a figura, tem-se que, a dimenso estratgica classifica os stakeholders de
acordo com seu potencial de influncia sobre a organizao, indo desde aqueles que so
legitimamente reconhecidos (escopo amplo), at aqueles que so crticos para o sucesso da
mesma.
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34
Figura 1: Representao das Dimenses Normativas e Estratgicas para as Definies de Stakeholders Fonte: Friedman e Miles (2006, p.11)
Outra classificao tambm utiliza a premissa da criticidade e grau de dependncia
organizacional para organizar os stakeholders em primrios e secundrios. Neste caso, os
atores primrios seriam aqueles crticos para o funcionamento da organizao, que
determinam um alto grau de interdependncia. J os secundrios seriam aqueles que
influenciam e so influenciados pela organizao, ou que so capazes de articular a opinio
pblica relacionada organizao, porm, sem que sejam essenciais para a continuidade das
atividades (CLARKSON, 1995).
Outra definio proposta por Mitchell, Agle e Wood (1997) envolvendo possveis
atributos para avaliao dos stakeholders. De acordo com esta classificao, podem ser
identificadas trs classes: atores latentes, expectantes ou definitivos. Cada uma das classes
resultado de uma combinao da presena ou no de um, dois ou trs atributos, sendo estes a
legitimidade, o poder e a urgncia.
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35
Figura 2: Classes Qualitativas dos Stakeholders Fonte: Mitchell, Agle e Wood (1997, p.872)
De acordo com os mesmos autores, legitimidade e poder so atributos distintos que
podem ser combinados para criar autoridade (definido por Weber com o uso legtimo do
poder), mas podem existir independentemente tambm (MITCHELL; AGLE; WOOD, 1997).
Ou legitimidade seria uma percepo generalizada ou admisso de que as aes de uma
entidade so desejveis, prprias e apropriadas de acordo com um sistema socialmente
construdo de normas, valores, crenas e definies (MITCHELL, AGLE, WOOD, 1997, p.
866).
Quanto a definio de poder, Salancik e Pfeffer (1974) o identifica como sendo uma
relao entre atores sociais. Sendo que o ator, A, pode fazer com que outro ator, B, faa
alguma coisa que B no faria usualmente.
Ou ainda, poder a habilidade daqueles que o possuem em alcanar os objetivos que
eles desejam (SALANCIK; PFEFFER, 1974).
Por fim, de acordo com Mitchell, Agle e Wood (1997, p. 867) urgncia (...) existe
somente quando duas condies so encontradas: (1) quando uma relao ou reclamao de
natureza sensvel ao tempo e (2) quanto esta relao ou reclamao importante ou crtica
para o stakeholder.
A partir destes atributos, so geradas as oito subclasses de stakeholders, conforme a
figura a seguir.
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Figura 3: Tipologia dos Stakeholders Fonte: Mitchell, Agle e Wood (1997, p.874)
Os tipos 1, 2 e 3, segundo a figura, referem-se classes com somente um atributo e
remetem aos stakeholders latentes. J os tipos 4, 5 e 6, apresentando dois atributos, so
denominados expectantes. Por fim, o tipo 7, que detm os trs possveis atributos, chamado
de definitivo.
Dentre os latentes percebem-se trs categorias: (1) os inativos, que apresentam o
atributo poder; (2) os discricionrios, com o atributo legitimidade e (3) os demandantes, que
apresentam o atributo urgncia.
Quanto aos expectantes, tm-se: (4) os dominantes, com poder e legitimidade; (5) os
perigosos, com poder e urgncia, mas no legitimidade; e (6) os dependentes, com
legitimidade e urgncia.
Os stakeholder definitivos seriam aqueles que apresentam legitimidade, poder e
urgncia, simultaneamente.
Aliado a estas definies e classificaes, foi utilizado no trabalho, como base para a
identificao dos stakeholders envolvidos no objeto de estudo, o modelo de cinco lados
proposto por Gomes et al (2010), segundo figura a seguir. O modelo incrementa propostas
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anteriores ao ampliar as possibilidades de organizaes que permeiam o processo de deciso e
se relacionam com os tomadores de deciso.
Figura 4:Modelo de Influncia de Stakeholders de Cinco Lados para os Governos Locais Fonte: Gomes, Liddle e Gomes (2010, p.724)
Atualmente, vrios estudos tm por objeto a anlise de atores envolvidos na
elaborao e integrao de polticas pblicas na agenda estatal. O conhecimento exploratrio
desta rede de relacionamentos importante para o entendimento dos fatores que influenciam
as decises polticas, a partir dos agentes que detm determinados posicionamentos, interesses
e poder.
2.2.1 Relao entre stakeholder e a Teoria Institucional
A organizao pode ser tratada, como descreveu Selznick (1971) como um instrumento
tcnico de regulao de recursos humanos, dotado de regras formais e com objetivos
estabelecidos, que sofre influncia do meio social, que vai alm das relaes pblicas
externas, mas tambm engloba a dinmica da estrutura formal e informal das relaes
Definidores da agenda
Legitimadores
Decisores
Controladores Reguladores
Colaboradores
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internas. So estes atores em constante interao que constroem a histria da organizao e
determinam as necessidades socioculturais que afetam a viabilidade da mesma, ou seja, sua
constituio social. Condies estas que no so, necessariamente, reconhecidas pelas pessoas
envolvidas, podendo ser at inconscientes, mas que so correspondidas quando h aceitao
por parte do funcionrio das finalidades da instituio e o mesmo se ocupa de seus interesses.
O comportamento importante para o nascimento da instituio o entendimento do grupo
sobre si mesmo e sua relao com o mundo. Esta tendncia um processo social natural, que
leva ao sentimento de autoproteo e auto-realizao do grupo, importantes para assegurar a
estabilidade e sobrevivncia da organizao.
A perspectiva institucional aborda a organizao considerando como seus processos e
estruturas so legitimados, por meio de crenas, normas e valores prprios de cada
organizao. Desta forma, observa duas dimenses organizacionais, classificadas em tcnica e
institucional (MACHADO-DA-SILVA; FONSECA; FERNANDES, 1999, p. 113).
O ambiente tcnico caracteriza-se pela troca de bens e servios, enquanto o ambiente institucional conduz o estabelecimento e a difuso de normas de atuao, necessrias ao alcance da legitimidade organizacional.
Considerando que as chamadas foras institucionais moldam e influenciam organizaes
a ponto de proporcionar mudanas de regras, estruturas e comportamentos, em muitos
momentos a organizao passa a ter necessidade de ceder normas impostas (influncia do
ambiente) para garantir legitimidade. Desta forma, a teoria pode ser utilizada para explicar e
justificar a legitimidade de stakeholder e suas possveis influncias sobre determinada
organizao (GOMES; GOMES, 2007).
2.2.2 Relao entre stakeholder e a Teoria da Dependncia de recursos
De acordo com a teoria da dependncia de recursos, a organizao mantm relaes com
seu ambiente tcnico na forma de troca de recursos (GOMES; GOMES, 2007). Neste caso o
ambiente fonte de influncia, porm as decises so tomadas dentro do contexto poltico
organizacional. Sendo assim, a organizao deve gerenciar as relaes externas com o
objetivo de captarem recursos e sobreviver, mantendo os relacionamentos e negociaes
externas (ROSSETTO; ROSSETTO, 2005).
Os recursos e componentes externos so entendidos como importantes de alguma
maneira para a organizao, sendo necessrio definir a extenso desta importncia e o nvel de
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influncia que possui. Desta forma, para entender o comportamento da organizao,
importante entender o ambiente no qual a organizao est inserida.
2.3 REVISO DAS POLTICAS PBLICAS DE SADE DO BRASIL
As mudanas no cenrio de deciso da rea da sade iniciaram-se com a Reforma
Sanitria Brasileira, que compreendeu um grande movimento social de anlise e formulao
de novos conceitos e concepes de sade e envolveu diferentes setores da sociedade, para a
implementao de novas polticas pblicas de sade. Tratou-se de um movimento de trajetria
longa e a fora que este movimento adquiriu com o tempo e com o envolvimento dos
segmentos sociais, propiciou a renovao na linha de pensamento anterior e culminou na
incorporao de algo novo no Estado. O principal foco desta mudana foi a ampliao dos
direitos de cidadania.
A anlise histrica da reforma sanitria revela que, aps longo perodo de construo e
debate, foram recentes as transformaes do sistema de sade brasileiro, que tiveram incio
com o sanitarismo campanhista, transitou pelo modelo mdico-assistencialista privatista e,
nos anos 1980, passou ao modelo neoliberal.
As mudanas no sistema de sade brasileiro acompanharam discusses sobre os
paradigmas da ateno sade, o papel do Estado na sade coletiva e conceitos como
igualdade e universalidade (GERSCHMAN; SANTOS, 2006). Dentre as referidas mudanas
destacam-se a unificao do sistema de sade em nvel federal, caracterizando o
desenvolvimento do Sistema nico de Sade (SUS) e a substituio do Instituto Nacional de
Assistncia Mdica da Previdncia Social (INAMPS) e do Ministrio da Previdncia e da
Assistncia Social (MAPS) (PEREIRA, 1996).
O INAMPS fundamentou-se em trs caractersticas principais: foi financiado pelo
Estado por meio da Previdncia Social, teve o setor privado internacional como referncia de
produo de medicamentos e constituiu-se como um dos prestadores de servios de ateno
sade coletiva (no rentvel), em paralelo ao modelo mdico-assistencial privatista,
responsvel pela ateno mdica (rentvel). Mas este modelo instituiu desigualdades sociais e
excluiu parte da populao, trazendo diversas discusses, que culminaram na VIII
Conferncia Nacional de Sade (OLIVEIRA, 1987; MENDES, 1999). Analisando a estrutura
poltica brasileira no perodo de regncia do INAMPS, identifica-se o processo iminente de
descentralizao administrativa, que caracteriza o federalismo e a autonomia dos membros
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federativos (BOBBIO, MATTEUCCI e PASQUINO, 1993). Com o processo de reforma do
Estado, ocorre tambm a passagem de um modelo de gesto da sade, institucionalizado pela
Lei no 6.229/1975, que dividia as competncias entre as instituies pblicas e privadas, para
um modelo neoliberal. Com o intuito de oferecer ateno primria e de baixo custo, iniciou-se
o movimento de reforma sanitria, que culminou na concepo do SUS (GERSCHMAN;
SANTOS, 2006).
Ainda durante o perodo do autoritarismo, observou-se uma perda das liberdades de
participao e manifestao popular, associada a uma histria de marginalizao decorrente
do capitalismo. De encontro a isto, a Reforma Sanitria traz um modelo de sade que direito
de todo cidado e dever do Estado. Este modelo fomenta, ento, a concepo de um sistema
de sade que atende todos de maneira igual e, para isso, tem como princpios a
universalizao e a equidade. Alm disso, o sistema se organiza de maneira unificada,
hierarquizada e descentralizada, com participao popular na gesto das aes de sade e com
financiamento do Estado. Esta participao popular um meio pelo qual as organizaes de
movimentos sociais exercem algum controle sobre as polticas pblicas de sade, j que so o
pblico atendido por este sistema e que pode fornecer um retorno quanto qualidade de
funcionamento do mesmo (GALLO, 1988; TEIXEIRA, 1989)
A Reforma Sanitria, em sua concepo, deve promover uma articulao entre poltica,
sade e democracia e isso deve ser identificado nos projetos depois de viabilizados. No
Sistema nico de Sade, os princpios da universalidade e equidade remetem busca pela
democratizao do servio, em detrimento desigualdade anteriormente estabelecida pelo
privilegiamento de algumas classes. Alm disso, a insero do controle social prope
promover pautas de interesse pblico ou de bem comum, nas deliberaes do Estado sobre as
polticas de sade. O que deve ser discutido atualmente a qualificao da representao da
sociedade nos Conselhos de Sade e outras organizaes de segmentos da sociedade, ou se
so poucos que representam os interesses prprios. Neste ponto, o objetivo do controle social
passa a no ser cumprido, j que no h representao real e ativa dos interesses da
populao, mas sim de alguns grupos (COSTA, 1988; COHN, 2002).
A participao popular tem lugar em duas diferentes instncias: os conselhos de sade e
as conferncias de sade. Trata-se de uma estratgia de democratizao do servio, a partir do
princpio de que amplia a gesto do mesmo de uma maneira representativa para a sociedade
civil, abrindo o espao de deliberao que antes era somente do Estado e garantindo
participao poltica sociedade (KRGER, 2000).
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A despeito desse recente percurso histrico, a atual composio do sistema de sade
brasileiro , portanto, complexa e alguns dos resultados da descentralizao foram a
democratizao do processo decisrio, o controle social, a eficincia na gesto de polticas
pblicas, entre outros (ARRETCHE, 2003; DRAIBE, 1992). Com isto a gesto das polticas
pblicas passa a ser local, conferindo autonomia para a execuo de aes de acordo com as
prioridades locais. Porm, cabe ao Estado a funo de coordenar, avaliar e intermediar as
polticas entre os municpios e o faz embasado no documento PlanejaSUS:
PlanejaSUS deve ser entendido como estratgia relevante efetivao do SUS. Como parte integrante do ciclo de gesto, o PlanejaSUS deve estar prximo dos nveis de deciso do SUS, buscando permanentemente, de forma tripartite, a pactuao de bases funcionais de planejamento, monitoramento e avaliao do SUS, bem como promovendo a participao social e a integrao intra e intersetorial, considerando os determinantes e condicionantes de sade. Essa integrao deve buscar o envolvimento de todos os profissionais. Tal entendimento explicita o carter transversal dessa funo e, por conseguinte, o papel das reas de planejamento nas trs esferas (...) (BRASIL, 2009a).
A comparao entre a conjuntura poltica e econmica pr e ps organizao do SUS,
bem como o confronto entre as caractersticas deste sistema e do INAMPS, fazem parte da
anlise das polticas de sade atuais, dos grupos de interesse e atores sociais formados e dos
consequentes arranjos de poder, determinantes para o processo decisrio das polticas de
sade (PEREIRA, 1996).
Em paralelo s mudanas do sistema pblico de sade, percebem-se as alteraes da
assistncia farmacutica no SUS, apresentando uma evoluo da prtica no contexto da sade
brasileira. Inicialmente, a prtica farmacutica se caracterizava pelo setor industrial e mbito
comunitrio (farmcias e drogarias) privado, no tendo representatividade no mbito da sade
pblica, conforme preconizado pela Organizao Mundial de Sade (OMS) (KOMIS;
BRAGA; ZAIRE, 2008).
Um dos primeiros atos legais que qualifica a insero da rea na agenda pblica de
sade foi o Decreto no 53.612, de 1964, que cria a relao de medicamentos essenciais. Este
foi o primeiro passo para as inmeras discusses relacionadas rea, que se mantm at os
dias atuais e remete grande volume de recursos pblicos. Ainda na dcada de 70, o Decreto
no 68.806, de 1971, dispe sobre a criao da Central de Medicamentos (CEME) (PAULA et
al., 2009).
Nesta mesma dcada, a rea da sade vislumbrou o desenvolvimento de importantes
estratgias, como (KOMIS; BRAGA; ZAIRE, 2008):
- Decreto no 72.552 (1973): Estabelece o Primeiro Plano Diretor de Medicamentos.
- Lei 6.259 (1975): Institui o Sistema Nacional de Vigilncia Epidemiolgica.
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- Lei no 6.360 (1976): Dispe sobre a vigilncia sanitria sobre medicamentos.
- Portaria MPAS/GM 817 (1977): Atualiza a Relao Nacional de Medicamentos
Bsicos.
No cenrio mundial, em 1978, a OMS e o Fundo das Naes Unidas para a Infncia
(Unicef) organizaram a Conferncia Internacional sobre Ateno Primria em Sade, em
Alma-Ata com o objetivo de discutir a proteo e promoo da sade mundiais. A partir deste
evento, a Carta de Alma-Ata orienta aos pases sobre a: formulao de polticas e
regulamentaes quanto utilizao de medicamentos reconhecidamente eficazes e ateno
primria em sade (OMS, 1979).
J na dcada de 90, como atos importantes esto a Lei Orgnica de Sade, no 8.080
(1990), que regula as aes e servios de sade e a Lei no 8.689 (1993), que extingue o
INAMPS e transfere competncias para o SUS.
No ano de 1996 foi realizada a 10 Conferncia Nacional de Sade, um espao para
discusso e deliberao, composto por representantes de diversos segmentos da sociedade e
do governo.
Aps a 10 Conferncia, em 1998, a Portaria no 3.916 aprova a Poltica Nacional de
Medicamentos.
Diante da importncia da Portaria 3.916/98 para a sade pblica brasileira, foi
submetido ao Senado Federal o Projeto de Lei do Senado, no 83 de 2010, que objetiva instituir
a Poltica Nacional de Medicamentos, com o intuito de dar status legal aos princpios e s
diretrizes que norteiam a produo, a assistncia, a regulao sanitria e o desenvolvimento
cientfico e tecnolgico da rea farmacutica no Pas (BRASIL, 2010a, p.1) O projeto foi
aprovado na referida casa legislativa, por unanimidade, em 1 de dezembro de 2010 e partiu
de deliberao realizada em audincia pblica sobre a assistncia farmacutica no mbito do
SUS, realizada pela Subcomisso Temporria da Sade (CASSAUDE), pertencente a
Comisso de Assuntos Sociais do Senado Federal. A matria, agora Projeto de Lei 8044/2010,
aguarda avaliao final e aprovao pela Cmara dos Deputados para que a poltica seja
respaldada por lei federal.
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3 MTODOS E PROCEDIMENTOS
3.1 CARACTERIZAO DA PESQUISA
Em concordncia com o objeto a ser estudado, a presente pesquisa seguiu o mtodo
qualitativo para investigao lgica do objeto. O mtodo atende aos paradigmas envolvidos na
conduo de pesquisas que levam construo do mundo social, para a definio de
constructos que embasem a vida social e individual. A abordagem considera a existncia dos
fenmenos sociais no mundo objetivo e subjetivo e lida com as peculiaridades para o
entendimento de realidades complexas (MILES; HUBERMAN, 1994). Seguiu tambm o
raciocnio denominado como indutivo, que levou construo de um conhecimento
fundamentado na experincia proveniente do estudo. Ou seja, foi construdo a partir da
observao de fatos e fenmenos que se desejava conhecer e interpretou-se o objeto da
pesquisa chegando uma concluso que pode contribuir para a explicao de outros
fenmenos semelhantes. Neste mtodo, a observao considerada essencial para se atingir o
conhecimento cientfico (SILVERMAN, 2009).
Quanto ao aspecto epistemolgico da pesquisa, a mesma seguiu o paradigma
interpretativista de anlise, sendo que, segundo Denzin (2006, p. 197) o objetivo dos
interpretativistas reconstruir as autocompreenses dos atores engajados em determinadas
aes. Ela partiu do pressuposto de que a ao humana est repleta de significado e cabe ao
pesquisador interpret-lo. Desta forma, o significado que o intrprete reproduz ou reconstri
considerado o significado original da ao (DENZIN, 2006). A partir dos dados
vislumbrados pela pesquisa, os mesmos foram analisados tendo por base as premissas tericas
do referencial, a fim de estud-los quanto sua adequao e concordncia ou inovao com o
conhecimento corrente na rea.
Seguindo a classificao das pesquisas quanto sua finalidade, podem-se ter estudos
exploratrios, descritivos e explicativos. No presente estudo, trabalhou-se com uma
abordagem descritiva, j que a mesma objetivava identificar as caractersticas de um processo
(elaborao da Poltica Nacional de Medicamentos), de um grupo (stakeholders de um
processo) e as relaes entre algumas variveis.
O delineamento seguido envolveu uma pesquisa documental, cuja caracterstica
principal foi trabalhar com materiais que no receberam ainda um tratamento analtico; bem
como um estudo de caso, baseado em um trabalho detalhado do objeto Poltica Nacional de
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Medicamentos, a fim de se estudar o tema especfico da formulao de polticas pblicas de
sade de maneira mais profunda (SILVERMAN, 2009).
Como j evidenciado pela base epistemolgica seguida, a pesquisa seguiu o
delineamento qualitativo, ao lidar com a interpretao de realidades sociais e apresentar
caractersticas peculiares, de acordo com a Quadro 2 (BAUER; GASKELL, 2008; BRYMAN,
1988).
Estratgias
Quantitativas Qualitativas
Dados Nmeros Textos
Anlise Estatstica Interpretao
Prottipo Pesquisas de opinio Entrevista em profundidade
Quadro 2: Diferenas entre Pesquisas Quantitativas e Qualitativas
Fonte: adaptado de Bauer e Gaskell (2008).
Seguindo a lgica qualitativa de pesquisa, so descritos quatro mtodos mais utilizados:
observao; entrevistas e grupos focais; anlise de documentos e textos e gravaes em udio
e vdeo (SILVERMAN, 2009). Foi utilizada na pesquisa, uma combinao entre os mtodos
de anlise de documentos e entrevistas.
3.1.1 Organizao do estudo
De maneira ampla, o estudo organiza-se de acordo com o diagrama (FIGURA 5)
proposto.
O incio dos trabalhos foi pautado por intensa investigao literria, em fontes diversas,
com os objetivos de se conhecer e se atualizar sobre a produo cientfica a respeito do tema
estudado. Foram fontes de consultas: peridicos, livros, registros institucionais de rgos
governamentais e sites institucionais de contedo exclusivo e importantes para o
esclarecimento (APNDICE A).
O trabalho foi iniciado pela anlise da literatura sobre a histria das polticas pblicas de
sade brasileiras, o arcabouo estatal burocrtico de gesto do sistema de sade, o ciclo das
polticas pblicas e os fundamentos do processo decisrio destas polticas. As buscas e
redao da reviso de literatura seguiram por todo o trabalho, como auxlio constante para que
se respondesse ao problema de pesquisa.
Na sequncia foram realizadas as coletas e anlise dos dados.
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Figura 5: Diagrama de Organizao da Pesquisa Fonte: elaborado pelo autor
3.2 PROCEDIMENTOS DE COLETA DE DADOS
So descritos, a seguir, os meios de seleo de documentos e entrevistados da presente
pesquisa.
ESTADO DA
ARTE
LACUNA
Dficit de estudos relacionados elaborao de
polticas pblicas de sade e anlise deste processo. relevante a investigao do
modelo de formulao da PNM,
do processo decisrio, bem como os atores envolvidos e o impacto de suas
influncias nas relaes e polticas
estabelecidas.
PERGUNTA DE PESQUISA
Quais os fatores que influenciam a
formulao de uma poltica pblica
nacional de sade?
OBJETIVO GERAL
Analisar o processo de formulao da Poltica
Nacional de Medicamentos no mbito do Governo
Federal.
REFERENCIAL TERICO
- Ciclo das polticas pblicas.
- Processo decisrio. - Teoria dos Stakeholders.
- Teoria Institucional. - Teoria da Dependncia de
recursos.
MTODOS
- Pesquisa qualitativa. - Mtodo indutivo/
orientao epistemolgica interpretativista.
- Pesquisa descritiva