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UNIVERSIDADE DA REGIO DE JOINVILLE - UNIVILLE
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM SADE E MEIO AMBIENTE
SONIA DOS SANTOS TORIANI
A INFLUNCIA DO ORGANOFOSFORADO MALATION 500 EC NA FUNO HEPTICA, RENAL E TIREOIDIANA DE RATAS.
Joinville/SC
2017
SONIA DOS SANTOS TORIANI
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A INFLUNCIA DO ORGANOFOSFORADO MALATION 500 EC NA FUNO HEPTICA, RENAL E TIREOIDIANA DE RATAS
Joinville/SC
2017
Dissertao de mestrado apresentada como requisito
para obteno do ttulo de Mestre em Sade e Meio
Ambiente na Universidade da Regio de Joinville -
UNIVILLE.
Orientadora: Profa. Dra. Therezinha Maria Novais de
Oliveira.
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AGRADECIMENTOS
Agradeo primeiramente a Deus, por tudo que tem me proporcionado at hoje.
A minha querida orientadora Dra. Therezinha Maria Novais de Oliveira, que
acreditou no meu projeto de estudo e me deu todas as condies para
desenvolv-lo, me orientando e me nortenado para a relao deste estudo com
a sade e meio ambiente, quem eu passei a admirar como pessoa e como
profissional e de quem me orgulho muito de ter sido orientanda.
Tambm ao professor pesquisador e importante colaborador, MSc. Eduardo
Manoel Pereira, que participou ativamente no desenvolvimento deste estudo, o
qual aps esta jornada juntos passei admirar muito, com carinho especial.
Reforo para estes dois profissionais minha eterna gratido por tudo, graas
voces dois me sinto uma pessoa privilegiada por poder contar com gigantes do
conhecimento, que sem reservas compartilharam seu saber, que Deus os
abene e ilumine sempre seus caminhos.
Agradeo muito a minha familia, meus filhos razo da minha vida, que
souberam compreender os momentos de ausnsia da me em virtude da
dediao aos estudos e ao meu amado e querido marido o maior incentivador e
parceiro em todos os momentos, por isso sou grata pela famlia que tenho os
quais AMO MUITO!
Agradeo o carinho e apoio da minha me, por tudo que ela me ensinou e pela
pessoa que sou hoje.
Agradeo a minha banca de defesa, professora Dra Daniela Delwing de Lima e
Dra Erika Dantas de Medeiros Rocha, pessoas muito especiais neste momento
importante e mgico para mim.
E a parceira com o laboratrio da cidade de Jaragua do Sul-SC, na anlise do
resultado dos exames de sangue das ratas.
E a todos os professores que atravs dos seus ensinamentos me mostraram
nova viso sobre a importncia de um meio ambiente equilibrado para garantia
da sade do ser humano e de todos os seres vivos, entendendo que somos
parte deste sistema e no meros espectadores.
AGRADEO DE CORAO A TODOS
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RESUMO
Alteraes tireoidianas, renais e hepticas afetam um nmero significativo da populao e usualmente esto associadas a vrias comorbidades, que alm de aumentar o nmero de medicamentos que o paciente tem de ingerir todos os dias, tambm pode aumentar custos pessoais e governamentais para o tratamento. Vrios fatores podem levar ao desenvolvimento do hipotireoidismo ou hipertireoidismo, dentre eles os genticos e ambientais que esto relacionados ao estilo de vida e exposio aos agrotxicos que podem agir como desrruptores endcrinos, influenciando no funcionamento da tireoide, alm de causar possveis danos ao fgado e rim. Assim destacamos o Malathion (MLT) 500 EC, utilizado em vrias culturas agrcolas, principalmente na cultura do tomate, um dos alimentos mais consumidos e importantes na dieta dos brasileiros. Frente a isso, o objetivo desse estudo foi verificar a influncia do organofosforado MLT 500 EC sobre a funo heptica, renal e tireoidiana de ratas. Para tal, quatro grupos de dez ratas fmeas (espcie Rattus Norvegicus, linhagem Wistar) com idade de 60 dias, foram expostas ao inseticida em doses de 10, 50 e 100 mg/kg via oral por 21 dias. O grupo de animais controle recebeu soluo salina (0,1 mL/100 g por via oral). Posteriormente, foram analisados no sangue dos animais os parmetros de funo tireoidiana, heptica e renal para verificar os possveis efeitos do agrotxico sobre a funo da tireoide e possvel alteraes hepticas e renais. Os resultados mostraram que houve elevao significativa das enzimas transaminases hepticas aps exposio s doses de 50 e 100 mg/kg, porm no houve elevao significativa dos nveis de creatinina e ureia. Embora tenha sido observada ligeira tendncia elevao dos nveis de T3 e T4, essa diferena no atingiu significncia estatstica. Em relao aos nveis de TSH, foi observada alterao estatisticamente significativa para as trs doses de MLT. Este estudo permite concluir que, nas doses e tempo de tratamento empregados, o MLT promoveu toxicidade heptica significativa nas doses de 50 e 100 mg/kg, porm no promoveu alteraes relevantes das funes renal e tireoidiana, embora tenha causado leve elevao dos hormnios tireoidianos. Contudo, a queda significativa dos nveis de TSH em todas as doses utilizadas sugere que houve leso hipofisria significativa, posto que a reduo de TSH no foi acompanhada de reduo dos nveis de T3 e T4. possvel que doses diferentes e perodos de administrao mais longos possam evidenciar influncias mais intensas sobre a secreo de hormnios tireoidianos pelo MLT.
Palavras-chave: agrotxicos; Malathion; toxicologia; sade ambiental; hipotireoidismo; hipertireiodismo.
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ABSTRACT
Thyroid disease, renal and hepatic changes affect a significant number of the population are usually associated with other comorbidities, which besides increasing the number of medicine that the patient has to ingest every day, can also increase personal and governmental costs for treatment. Several factors can lead to the development of hypo or hyperthyroidism, including genetic and environmental ones, which are related to lifestyle and exposure to pesticides that can act as endocrine disruptors, possibly disturbing thyroid function and, in addition, may cause damage to the liver and kidneys. The organophosphate malathion (MLT) is largely used in the culture of tomatoes, one of the most consumed food in the Brazilian diet. Thus, the objective of this study was to verify the influence of the organophosphate MLT 500 ec on thyroid, liver and kidneys functions in rats. four groups of 10 female rats (rattus norvegicus, wistar) were given MLT (10, 50, 100 mg/kg, p.o.) during 21 days. And control animals were given saline solution (0,1 ml/100g, p.o.). Blood samples were collected and analysed for thyroid, liver and kidney function parameters. Results show that there was significant liver enzymes elevation after 50 and 100 mg/kg treatment, but there was no significant creatinine and urea levels increase. Though a trend to T3 and T4 increase was observed, these data did not reach statistical significance. The results show that in the doses and time of exposure, MLT promoted significant liver toxicity, but did not alter kidney and thyroid functions significantly. However, it was observed intense TSH level decrease after every treatment, which suggests relevant hypophisary damage, once this decrease was not concomitant with T3 and T4 levels reduction. Possibly, different doses and time of exposure might result in different outcomes and evidence more intense influences upon thyroid hormones secretion caused by MLT.
Keywords: pesticides, Malathion, toxicology, environmental health; hypothyroidism, hyperthyroidism.
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LISTA DE FIGURAS
Figura 1. Estrutura qumica do malathion 500 EC ........................................... 24
Figura 2. Esquema do funcionamento do sistema endcrino ......................... 34
Figura 3. Localizao da glndula tireoide.............................................. 36
Figura 4. Estrutura qumica dos hormnios T3 e T4 ............................... 38
Figura 5. Percentual das manifestaes clnicas do hipertireoidismo............. 41
Figura 6. Sinais e sintomas clnicos do hipotireoidismo e do hipertireoidismo 44
Figura 7. Concentrao sangunea de transaminase glutmico oxalactica
(TGO) ou aspartato aminotransferase (AST) dos animais aps
tratamento com MLT ........................................................................
53
Figura 8. Concentrao sangunea de transaminase glutmico-pirvica
(TGP) ou alanina aminotransferase (ALT) dos animais aps
tratamento com MLT.........................................................................
54
Figura 9 Concentrao sangunea de ureia dos animais aps tratamento
com MLT .......................................................................................... 60
Figura 10 Concentrao sangunea de creatinina dos animais aps
tratamento com MLT ........................................................................ 61
Figura 11. Concentrao sangunea de T3 dos animais aps tratamento com
MLT....................................................................................................
64
Figura 12. Concentrao sangunea de T4 dos animais aps tratamento com
MLT....................................................................................................
65
Figura 13. Concentrao sangunea de TSH dos animais aps tratamento
com MLT............................................................................................ 66
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LISTA DE QUADROS
Quadro 1. Classificao dos agrotxicos em classes por grau de toxicidade . 20
Quadro 2. Distribuio das doses do organofosforado MLT, por grupos de
ratas para estudo (grupo controle e grupo tratado) ........................ 51
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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ACTH: Hormnio adrenocorticotrfico
ANDEF: Associao Nacional de Defensivos Agrcolas
ANVISA: Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria
CCAB: Comit do Codex Alimentarius do Brasil
CCPR: Comit sobre Resduos de Pesticidas
DCNT: Doenas crnicas no transmissveis
ECG: Eletrocardiograma
FAO: Organizao das Naes Unidas
FSH: Hormnio folculo estimulante
GH: Hormnio de crescimento
IBAMA: Instituto Brasileiro do Meio Ambiente
IDA: Ingesto diria aceitavel
IDMT: Ingesto diria mxima terica
IDA: Ingesto diria mxima
IDMT: Ingesto diria mxima terica
IGF-1: Fator de crescimento semelhante a insulina tipo 1
INCA: Instituto Nacional do Cncer
LH: Hormnio luteinizante
LMR: Limite mximo de resduos
MLT: Malation
OF: Organofosforados
OMS: Organizao Mundial da Sade
PF: Produtos formulados
PARA: Programa de Anlise de Resduos de Agrotxicos em Alimentos
QT: Intervalo da frequncia cardaca
RDC: Resoluo da Diretoria Colegiada
RX: Raio x
SNVS: Sistema Nacional de Vigilncia Sanitria
TGO: Transaminase glutmico oxalactica
TGP: Transaminase glutmico pirvica
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T3: Triiodotironina
T4: Tetraiodotironina
TSH: Tireotrofina (Hormnio Estimulante da Tireoide)
UED: Unidade de Endocrinologia e Diabetes
SUMRIO
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RESUMO
ABSTRACT
LISTA DE FIGURAS
LISTA DE QUADROS
1 INTRODUO ....................................................................................................................... 13
1.2 CONTEXTO INTERDISCIPLINAR DO ESTUDO ......................................................................... 16
2 OBJETIVOS .............................................................................................................................17
2.1 Objetivo geral ..................................................................................................................................... 17
2.2 Objetivos especficos .......................................................................................................................... 17
3 REVISO BIBLIOGRFICA ................................................................................................ 18
3.1 Agrotxicos ........................................................................................................................................ 18
3.1.1 Classificao dos agrotxicos ................................................................................................................. 19
3.2 Organofosforados (OF) ....................................................................................................................... 21
3.2.1 Toxicodinmica .................................................................................................................................... 21
3.2.2 Toxicocintica ...................................................................................................................................... 22
3.2.3 Diagnostico e tratamento de intoxicaes por organofosforados ...................................................... 22
3.3 Organofosforado MLT 500 EC ........................................................................................................... 23
3.3.1 Aplicao .............................................................................................................................................. 24
3.3.2 Toxicodinmica .................................................................................................................................... 25
3.3.3 Toxicocintica ...................................................................................................................................... 26
3.3.4 Manifestaes clnicas de intoxicao por MLT ................................................................................... 26
3.3.5 Limite mximo de resduos (LMR) para MLT ....................................................................................... 27
3.4 Contaminao do meio ambiente ...................................................................................................... 27
3.4.1 Contaminao da gua e ambiente aqutico ...................................................................................... 28
3.4.2 Contaminao e resduos em alimentos .............................................................................................. 28
3.5 LMR dos resduos de agrotxicos nos alimentos ................................................................................. 30
3.6 Forma de avaliao do LMR para seres humanos e animais ............................................................... 31
3.7 Sistema endcrino .............................................................................................................................. 33
3.7.1 Funo das glndulas endcrinas ........................................................................................................ 34
3.7.3 Glndula tireoide ................................................................................................................................. 36
3.7.3.1 Funo da tireoide ............................................................................................................................... 38
3.7.3.2 Alteraes da tireoide .......................................................................................................................... 38
3.7.4 Hipertireoidismo ................................................................................................................................. 39
3.7.4.1 Fisiopatologia do hipertireoidismo .................................................................................................. 39
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
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3.7.4.2 Incidncia do hipertireoidismo ............................................................................................................ 39
3.7.4.3 Classificao do hipertireoidismo ........................................................................................................ 40
3.7.4.4 Sinais e sintomas clnicos do hipertireoidismo .................................................................................... 40
3.7.4.5 Tratamento do hipertireoidismo ......................................................................................................... 41
3.7.5 Hipotireoidismo ................................................................................................................................... 42
3.7.5.1 Fisiopatologia do hipotireoidismo ....................................................................................................... 42
3.7.5.2 Incidncia do hipotireoidismo ............................................................................................................. 42
3.7.5.3 Hipotireoidismo primrio ..................................................................................................................... 43
3.7.5.4 Hipotireoidismo secundrio ................................................................................................................. 43
3.7.5.5 Hipotireoidismo tercirio ..................................................................................................................... 44
3.7.5.6 Sinais e sintomas clnicos do hipotireoidismo ..................................................................................... 44
3.7.5.7 Diagnostico e tratamento do hipotireoidismo ..................................................................................... 45
4 METODOLOGIA .................................................................................................................... 50
4.1 Desenho do estudo ............................................................................................................................ 50
4.2 Reagentes .......................................................................................................................................... 50
4.3 Amostra selecionada .......................................................................................................................... 50
4.4 Protocolo experimental ...................................................................................................................... 51
4.4.1 Estudo in vivo ....................................................................................................................................... 51
4.5 Anlise bioqumica do nvel sanguneo de hormnios ........................................................................ 52
4.6 Apresentao dos dados e anlise estatstica ..................................................................................... 52
5 RESULTADOS E DISCUSSO ............................................................................................. 53
5.1 Avaliao da funo heptica ............................................................................................................. 53
5.2 Avaliao da funo renal .................................................................................................................. 59
5.3 Avaliao da funo tireoidiana ......................................................................................................... 64
5.3.1 Hormnio T3 ........................................................................................................................................... 64
6 CONCLUSO .......................................................................................................................... 75
7 REFERNCIAS ....................................................................................................................... 76
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1 INTRODUO
As patologias relacionadas com o sistema endcrino podem causar
inmeras alteraes no metabolismo do ser humano, em especial relacionadas
aos hormnios tireoidianos, conhecidas como hipotireoidismo ou
hipertireoidismo. Estes distrbios acometem pessoas acima de 75 anos,
principalmente do gnero feminino, e pode ter relao com a hereditariedade
(ROBERTES & LADENSON, 2004; BRENTA et al., 2013).
O hipotireoidismo caracterizado por uma condio metablica alterada,
resultante de quantidade insuficiente de hormnios circulantes da glndula
tireoide para suprir uma funo orgnica normal. Pode ser severo ou
moderado, causando diversas alteraes no organismo humano, sendo mais
predominante em mulheres e idosos. Atinge entre 8% a 10% da populao
brasileira e pode ser classificado como: hipotireoidismo primrio, secundrio,
tercirio, subclnico e congnito (LOPES, 2002; BRENTA et al., 2013).
Em relao ao hipertireoidismo, a incidncia mdia em mulheres de 8
casos a cada 1000 pessoas/ano, sendo 2% a 3% em mulheres e 0,2% em
homens. A caracterstica principal do hipertireoidismo o aumento da produo
e liberao dos hormnios tireoidianos pela glndula tireoide (LOPES, 2007;
BRENTA et al., 2013).
Estas patologias podem ser causadas por diversos mecanismos, e
possivelmente por ao de agrotxicos, devido sua atividade nociva ao
organismo ao nvel de vrios sistemas. Mesmo em concentraes muito
baixas, os agrotxicos podem ser capazes de interferir no funcionamento
normal da tireoide, agindo como disruptores endcrinos. Alm disso, podem
causar cncer; afetar negativamente o sistema reprodutivo, principalmente na
diminuio da produo de espermatozoides, alm de afetar a funo heptica
e renal (FRCHOU et al., 2002; GUYTON & HALL, 2012). Dentre os
agrotxicos, destacam-se os organofosforados (OF), que causam inmeros
efeitos negativos para a sade humana, principalmente neurotxicos,
possivelmente envolvidos na desregulao do eixo hormonal da tireoide
(BRASIL, 2012).
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Com o intuito de evitar danos sade, determinada a ingesto diria
aceitvel (IDA) que uma pessoa pode consumir do resduo de cada agrotxico
contido no alimento sem causar danos sade por tempo prolongado, levando
em considerao o limite mximo de resduos (LMR) de cada agrotxico
empregado na lavoura durante o cultivo. No caso especfico do Malathion
(MLT), a IDA de 0,3 mg/kg/dia para o ser humano (BRASIL(a), 2009).
Contudo, na prtica difcil monitorar a quantidade que as pessoas esto
expostas diariamente em seus lares, dada a ampla variao do teor de
resduos deste OF em diversos alimentos cultivados em nosso pas e tambm
dos cuidados relativos remoo dos resduos antes do consumo do alimento.
Assim, a prtica de uso indiscriminado de agrotxicos expe produtores e
consumidores aos riscos para a sade, alm de contribuir para danos ao meio
ambiente (ARAUJO et al., 2007). Mesmo com todos os procedimentos
diferenciados na hora da preparao dos alimentos, que podem minimizar ou
eliminar a quantidade de resduos de agrotxicos, a populao continua
exposta aos resduos de agrotxicos nos alimentos, que no so eliminados
totalmente na hora da preparao (SERRANO et al., 2013).
Vale salientar que, apesar de seus resduos serem metabolizados e
eliminados atravs da urina e das fezes, este inseticida distribudo por todos
os tecidos do organismo aps sua absoro, acumulando-se principalmente no
fgado, onde metabolizado, e nos rins que os excretam (ADAPAR, 2012). De
acordo com o estudo de Ferman & Antunes (2009), o ser humano pode ser 10
vezes mais sensvel a exposio de produtos txicos que os animais, assim, o
dano causado pelos compostos qumicos testados poder ser at 10 vezes
maior em comparao a outras espcies.
Portanto, a exposio diria a produtos qumicos, pesticidas, radiao,
poluio do ar e da gua, somados predisposio gentica, acarretam riscos
para a sade e qualidade de vida das pessoas. Os fatores ambientais se
caracterizam por serem potenciais indutores de doenas mediante a
degradao do ecossistema e as mudanas climticas (BARATA, 2006). Esses
fatores, aliados aos agravos dos recursos naturais como contaminao da
gua, terra, ar e alimentos, juntamente com as atividades do ser humano
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determinadas pela industrializao apresentam outras fontes de ameaas para
a manuteno da sade (OMS, 2010).
O presente trabalho foi conduzido no sentido de evidenciar a toxicidade
de um dos OF mais amplamente utilizados no cultivo de vrios alimentos, o
MLT. Para isso, foi conduzido estudo experimental em ratas que simulou o
consumo crnico de MLT atravs da administrao oral de doses de 10, 50 e
100 mg/kg do agrotxico, para observar seus efeitos sobre a funo heptica,
renal e tireoidiana.
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1.2 CONTEXTO INTERDISCIPLINAR DO ESTUDO
Meio ambiente se configura na relao de todos os seres vivos com o
ecossitema de forma integrativa como um corpo nico, para garantir a
manuteno e sobrevivncia de ambos, caracterizado por em conjunto de
componentes naturais, artificiais e culturais que garantem o desenvolvimento
equilibrado da vida em todas as maneiras existentes, segundo Silva (2002).
Para que isso se torne efetivo necessrio que esta interrelao ocorra
cada vez mais de forma aprimorada, compreendendo este processo na sua
amplitude, inserido em uma realidade complexa tanto biolgico como socio-
econmico. Uma das medidas importantes para tal , o uso conciente e
sustentvel dos recursos naturais se atendo aos limites da explorao destes
recursos, que so finitos e dos quais o ser humano depende para garantir sua
sobrevivncia neste planeta, com qualidade ambiental (MILAR, 2005).
Entretanto todos os seres vivos nescessitam de fonte de energia para
viver, principalmente o homem que precisa cultivar o prprio alimento, porm
no intuito de garantir sua subsistencia, utiliza de meios e produtos que podem
trazer malefcios para si e para o planeta ( MOTA, 1997). OF MLT se destaca
como mais um destes contaminantes do meio ambiente com reflexos na sade
de todos os seres vivos, em especial do ser humano, por ser utilizado
largamente na produo de alimentos, que podem interferir sobremaneira na
condio de sade pela ingesto destes alimentos contaminados. Sade est
entendida pelo equilibrio do bem-estar fsico, mental e social e no apenas a
simples ausncia de doena (OMS, 2010).
Assim se faz necessrias aes intersetoriais e interdisciplinares no
sentido de criar condies de vida saudveis para as pessoas, pois a
existencia do meio ambiente dependente do ser humano assim como o ser
humano dependente dele (TRAJANO, 2010).
Portanto este estudo veio colaborar na busca de maior entendimento
dos possveis efeitos do residuo deste OF nos alimentos consumidos
diariamente, para a sade do ser humano e demais seres vivos, alm de sua
ao sobre o meio ambiente. Contando com a interdisciplinariedade das reas
de qumica, farmcia, engenharia sanitria e nutrio.
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2 OBJETIVOS
2.1 Objetivo geral
Avaliar a influncia do organofosforado MLT 500 EC na funo heptica,
renal e tireoidiana de ratas com idade de 60 dias, sob o prisma da sade
ambiental.
2.2 Objetivos especficos
Adaptar o modelo de intoxicao com MLT;
Dosar o nvel sanguneo de Transaminase glutmico oxalactica (TGO)
e Transaminase glutmico pirvica (TGP) de ratas tratadas com MLT
nas doses de 10, 50 e 100 mg/kg via oral;
Dosar o nvel sanguneo de creatinina e ureia de ratas tratadas com MLT
nas doses de 10, 50 e 100 mg/kg via oral;
Dosar o nvel sanguneo de Tireotrofina (TSH), Triiodotironina (T3) e
Tetraiodotironina (T4) de ratas tratadas com MLT nas doses de 10, 50 e
100 mg/kg via oral.
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3 REVISO BIBLIOGRFICA
3.1 Agrotxicos
Com o intuito de se proteger de insetos que afetavam o equilbrio do
meio ambiente, e consequentemente a sade e a segurana do homem, os
sumrios em 2500 a.C. utilizaram o enxofre, enquanto os chineses no sculo
XIV optaram pelo uso do arsnio. E para tratar sementes e gros
armazenados, eram utilizados compostos a base de ervas, leos e cinzas; e
para combater piolhos e outras pragas, eram usados o mercrio e o arsnio
(BARBOSA, 2004).
At o perodo das guerras mundiais, os inseticidas eram derivados
apenas de produtos orgnicos usados com a funo de proteger os soldados
durante a guerra mundial nas regies tropicais e subtropicais da frica e sia;
dos insetos transmissores da doena do sono e da malria; e dos piolhos que
transmitiam a doena chamada tifo exantemtico nas tropas norte-americanas.
Isso impulsionou pesquisas e estudos sobre a elaborao de novos inseticidas
e permitiu a expanso do volume expressivo de agrotxicos presentes na
produo agrcola (BRAIBANTE & ZAPPE, 2012; BARBOSA, 2004).
As duas grandes guerras ocorridas no sculo XX, principalmente a
segunda guerra mundial, subsidiaram a produo de compostos com a
finalidade de serem utilizados como armas qumicas que tiveram suas sobras
transformadas em agrotxicos (CARNEIRO et al., 2015). Os produtos mais
usados com a funo de pesticida, neste perodo, tambm no Brasil, foram sais
de arsnio, cobre, enxofre e cal (BRAIBANTE & ZAPPE, 2012).
Por cultivar o seu alimento desde a pr-histria, o ser humano teve que
conviver e enfrentar problemas relacionados com as pragas que danificavam
ou acabavam com as plantas, prejudicando as colheitas e os alimentos
armazenados. Dessa forma, os agrotxicos, tambm conhecidos como
pesticidas, praguicidas ou defensivos agrcolas, passaram a ter importncia
crucial na agricultura (BOCHNER, 2007).
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Conforme o Art. 2 Lei 7.802/89, agrotxicos e afins so produtos e
agentes de processos fsicos, qumicos ou biolgicos, destinados ao
uso nos setores de produo, no armazenamento e beneficiamento
de produtos agrcolas, nas pastagens, na proteo de florestas,
nativas ou implantadas, e de outros ecossistemas e tambm de
ambientes urbanos, hdricos e industriais, cuja finalidade seja alterar
a composio da flora ou da fauna, a fim de preserv-las da ao
danosa de seres vivos considerados nocivos (BRASIL, 2012).
Comnforme a Lei N 7802, de 11 de julho de 1989, os agrotxicos so
utilizados para preservao dos alimentos desde sua produo at o
armazenamento e o beneficiamento. Possuem como finalidade a proteo de
pastagens, florestas nativas, flora e fauna. Alm da proteo de ambientes
urbanos, hdricos e industriais da ao danosa de seres vivos considerados
nocivos (BRASIL, 1989).
Contudo, apesar dos riscos que estes produtos podem gerar, o Brasil
ainda tem sua agricultura dependente de agrotxicos, incluindo substncias
abolidas em vrios pases, como China, Estados Unidos e a Unio Europeia
(BRASILa, 2009).
3.1.1 Classificao dos agrotxicos
Os agrotxicos nomeados oficialmente pela legislao so conhecidos
por defensivos, pesticidas ou agroqumicos que podem ser classificados em
trs grandes categorias, segundo a finalidade, para o controle de pragas ou
doenas e plantas daninhas ou invasoras (BRASIL, 2012).
Tambm so classificados em: (1) agrcolas para uso nos setores de
produo, armazenamento e beneficiamento de produtos agrcolas; nas
pastagens e nas florestas plantadas. Seus registros so fornecidos pelo
Ministrio da Agricultura, Pecuria e Abastecimento, quando atendidas as
diretrizes e exigncias dos Ministrios da Sade e do Meio Ambiente; (2) no
agrcolas que so direcionados para uso na proteo de florestas nativas,
outros ecossistemas ou ambientes hdricos. Seus registros so concedidos
pelo Ministrio do Meio Ambiente/IBAMA, quando atendidas as diretrizes e
http://www.ibama.gov.br/areas-tematicas-qa/registro-de-na
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exigncias dos Ministrios da Agricultura, Pecuria e Abastecimento e da
Sade (BRASILb, 2013).
Dos agrotxicos considerados no agrcolas temos tambm os utilizados
em ambientes urbanos e industriais, domiciliares, pblicos ou coletivos, ao
tratamento de gua e ao uso em campanhas de sade pblica, cujos registros
so concedidos pelo Ministrio da Sade/ANVISA (BRASIL, 2003), atendidas
as diretrizes e exigncias dos Ministrios da Agricultura e do Meio Ambiente.
Estes produtos so classificados segundo o Decreto N 98.816/90, e a
classificao segue de acordo com sua classe toxicolgica conforme o Quadro
1.
Quadro 1 - Classificao dos agrotxicos em classes por grau de toxicidade
(BRASILa, 2010).
Classe Descrio em funo da dose letal mediana
(DL50)
Dose considerada letal para o ser humano
1 Extremamente txico 5 mg/kg de peso vivo Algumas gotas
2 Altamente txico 5 a 50 mg/kg de peso
vivo 1 colher de ch
3 Moderadamente txico 50 a 500/mg kg de peso
vivo 1 colher de sopa
4 Pouco txico 500 a 5.000 mg/kg de
peso vivo 2 colheres de sopa
5 Muito pouco txico 5.000 mg/kg de peso
vivo 1 copo
No perodo de 2000 a 2012, foram comercializadas 23 classes de
produtos formulados no pas, sendo que destes produtos destinados para a
agricultura, existem 366 ingredientes ativos pertencentes a 200 grupos
qumicos distintos apresentados em 1.458 formulaes comerciais, sendo 48%
de herbicidas, 25% de inseticidas e 22% de fungicidas. Em 2012, foram
vendidas 477.792,44 toneladas de agrotxicos no pas. Os dez estados
brasileiros que mais comercializaram os produtos agrotxicos e afins foram
So Paulo, Minas Gerais, Paran, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Gois,
Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Bahia e Maranho (BRASIL, 2013).
-
21
3.2 Organofosforados (OF)
Segundo Savoy (2011), os OF so compostos derivados do cido
fosfrico, tiofosfrico ou ditiofosfrico, cuja composio qumica caracterizada
por enxofre e fsforo (P=S). Podem sofrer bioativao metablica, tornando-se
capazes de apresentar uma toxicidade aguda maior que os organoclorados.
Suas aplicaes incluem os efeitos acaricida, fungicida, inseticida e nematicida.
A primeira experincia no desenvolvimento dos OF aconteceu na idade
mdia, sendo preparados por alquimistas. A busca do conhecimento mais
profundo sobre estes compostos se iniciou no sculo XIX, por Lassaigne em
1820, com a esterificao do cido fosfrico, estudo que foi intensificado
atravs de uma investigao mais minuciosa dos compostos de fsforo e
produo de uma srie de derivados de fosfinas em 1845 (SANTOS et al.,
2007).
Tambm foram produzidos a partir de princpios ativos de substncias
qumicas utilizadas na Segunda Guerra Mundial, que foram aproveitadas pelas
indstrias qumicas (MARASCHI, 2003).
A partir de 1940, passaram a ser utilizados como substitutos de
organoclorados e biocidas. Estes so considerados conservantes que impedem
o ataque de fungos e bactrias a materiais orgnicos, como papel, madeira e
tecidos. Sua aplicao vai desde a agricultura at produtos sanitrios, porm o
seu uso generalizado tem causado poluio ambiental e risco potencial
sade humana. Portanto, a intoxicao por OF vem crescendo em nmero de
casos, mesmo a pessoa tendo sido exposta a baixas doses (ARAUJO et al.,
2007).
3.2.1 Toxicodinmica
Os organofosforados podem ser cancergenos, citotxicos, genotxicos,
imunotxicos, mutagnicos e teratognicos (SSEBUGERE et al.,2010). Os
efeitos induzidos pela exposio aos OF em animais e humanos tm sido
clnicamente descritos e dependem basicamente de trs fatores: tipo de OF,
-
22
dose utilizada e durao da exposio (ARAUJO et al., 2007; LATORRACA et
al., 2008).
Essas substncias qumicas apresentam elevado potencial para destruir
clulas musculares e comprometer o sistema nervoso, podendo causar
problemas cardiorrespiratrios e outros sinais de aumento de funo
colinrgica muscarnica (sndrome parassimpaticomimtica, muscarnica ou
colinrgica), tais como: vmitos, diarreia, clicas abdominais, broncoespasmo,
miose puntiforme e paraltica, bradicardia, hipersecreo (sialorria,
lacrimejamento, broncorria e sudorese), cefaleia, incontinncia urinria e viso
borrada. Podem causar tambm diaforese severa provocando a desidratao e
hipovolemia graves, resultando em choque. Tambm causam sintomas
derivados de ativao de receptores nicotnicos (sndrome nicotnica), como:
midrase, mialgia, hipertenso arterial sistmica, fasciculaes musculares,
tremores e fraqueza. Pode haver paralisia de musculatura respiratria com
potencial para fatalidade. Efeitos sobre sistema nervoso central incluem
ansiedade, agitao, confuso mental, ataxia, depresso de centros
cardiorrespiratrios, convulses e coma (BRASIL, 2013; BRASIL, 2012;
ADAPAR, 2012)
3.2.2 Toxicocintica
Os OF podem ser absorvidos pelas vias de absoro inalatria, por
ingesto ou pela pele. So excretados, principalmente, pela urina e em menor
quantidade nas fezes ( BRASILa, 2009).
3.2.3 Diagnstico e tratamento de intoxicaes por organofosforados
Segundo a Agncia de Defesa Agropecuria do Paran (ADAPAR,
2012), para diagnosticar uma possvel intoxicao por organofosforados,
recomenda-se a realizao da dosagem de seus metablitos no sangue. Alm
disso, o controle de eletrlitos, dosagem de glicemia, creatinina, amilase
pancretica, enzimas hepticas, gasometria, eletrocardiograma (ECG) e
observao do prolongamento do intervalo da frequncia cardaca (QT) e RX
-
23
de trax (edema pulmonar e aspirao) so medidas importantes para
monitoramento do paciente e do avano ou regresso da intoxicao.
Para o tratamento, recomenda-se o processo de descontaminao das
vestimentas e administrao de carvo ativado, nos casos sintomticos.
importante a adoo de medidas de assistncia ventilatria, se necessrio, e
utilizao do antidoto sulfato de atrofina e oximas (reativador das enzimas
acetilcolinesterases, que so enzimas que catalisam a hidrlise da acetilcolina,
considerado mediador qumico necessrio para a transmisso do impulso
nervoso) (GUILOSKI et al., 2010). O tratamento deve ser realizado de forma
precoce, em um perodo entre 24 e 48 horas, perodo em que ocorre o
envelhecimento da enzima para obter resultado de desintoxicao mais
confivel (BRASILa, 2009).
3.3 Organofosforado MLT 500 EC
O organofosforado MLT 500 EC um inseticida apresentado sob a
forma de concentrado emulsionvel. Em concentrao pura, um lquido
amarelado; e na forma comercial (tcnica) contm de 95% a 98% de
substncia, tornando-se um lquido marrom-escuro com forte cheiro de alho,
com baixa solubilidade em gua, sendo mais facilmente solvel na maioria dos
solventes orgnicos, como o lcool, cetona, ter, ster, hidrocarbonos
aromticos e leos vegetais.
Decompe-se facilmente em meio alcalino e em meio cido, e possui
taxa de hidrlise (meia-vida) em pH 7,4 e em temperatura de 37,5C, em
aproximadamente 32 horas (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2003;
ADAPAR, 2012).
O MLT pode ser encontrado no mercado na forma de lquidos oleosos,
viscosos, pouco densos, com cor e cheiro variados. Assim como, na forma de
slidos ou ps-cristalinos incolores ou coloridos. As formulaes e
concentraes variam conforme a utilizao a que se destina que pode ser
inseticidas, fito e zoosanitrios (BRASILb, 2010).
Este OF tem seu registro no Ministrio da Agricultura, Pecuria e
Abastecimento (MAPA N 00439004) e no Ministrio da Sade (M.S N
-
24
3.2781.0019) para posterior comercializao. A sua composio qumica se
apresenta como dietil (dimethoxitiofosforiltio) succinate (MALATIONA) 500 g/L
(50 % m/v). composto por Dimetilbenzeno (XILENO solvente) 431 g/L
(43,1% m/v), com ingredientes inertes (97 g/L (9,7 % m/v), sua estrutura
qumica est apresentada na Figura 1.
Figura 1 - Estrutura qumica do Malathion.
(ADAPAR, 2012)
O MLT considerado extremamente txico para o ser humano
(classificao toxicolgica II) e muito perigoso para o meio ambiente. Seu
efeito sobre o meio ambiente caracterizado por alta toxicidade para peixes,
organismos aquticos e abelhas (ADAPAR, 2012).
3.3.1 Aplicao
O MLT aplicado em diversas culturas agrcolas, tais como, aplicao
foliar nas culturas de alface, algodo, berinjela, brcolis, cacau, caf, frutas
ctricas, couve, couve-flor, feijo, ma, morango, orqudeas, pastagens,
pepino, pera, pssego, repolho, rosa, soja e tomate. Tambm usado para
matar insetos em culturas agrcolas e jardins, tratar piolhos em humanos e
pulgas em animais de estimao, em diferentes concentraes. O MLT 500 EC
CHEMINOVA, sob a forma de concentrado emulsionvel, indicado para o
-
25
controle das seguintes pragas: no citros para a mosca-das-frutas (Anastrefa
fraterculus), no tomate para o pulgo-verde (Myzus persicae) e para a broca
pequena-do-fruto (Neoleucinodes elegantalis) (ADAPAR, 2012).
Alm dessas aplicaes, o Ministrio da Sade vem utilizando
atualmente o MLT EA 44%, uma emulso estvel em gua, para o controle do
mosquito Aedes aegypti em reas onde o vetor resistente a piretrides
(ANDRIGHETTI et al., 2013).
Apesar da reconhecida descrio de risco, a comercializao do MLT
no Brasil e sua utilizao feita de forma descontrolada e sem proteo
contribuem para que este agrotxico seja um dos mais presentes nas
intoxicaes notificadas (DELGADO et al., 2006).
De acordo com a Lei Federal N 7802/89, o MLT pode ser
comercializado por estabelecimentos devidamente cadastrados em rgos
competentes do Estado, de acordo com a Lei Estadual N 11069/98, ou
municpios que possuem atuao mais intensa na rea da sade, do meio
ambiente e da agricultura. A venda s poder ser realizada mediante a
apresentao de receiturio agronmico prescrito por profissional legalmente
habilitado. Por outro lado, este inseticida para uso domissanitrio ou para fins
de jardinagem amadora, segundo as Portarias MS N 321/97 e N 322/97,
poder ser realizado atravs de venda direta ao consumidor, sem a
apresentao de receiturio agronmico, tendo como critrio que os frascos
devem possuir um volume que no exceda 100 mL a ser diludo e de 1000 mL
para lquidos prontos para o uso (POSSAMAI et al., 2007).
3.3.2 Toxicodinmica
O MLT age como potencial e permanente inibidor da colinesterase,
impedindo a atuao desta enzima sobre a acetilcolina, causando acmulo de
acetilcolina e superestimulao das terminaes nervosas que atuam nas
clulas musculares, glandulares, ganglionares e do sistema nervoso central
(SNC) (BRASILb, 2009).
Tambm possui relao com possveis efeitos imunossupressores em
diversos nveis, podendo causar alteraes fisiopatolgicas e interferir no
-
26
estado nutricional, na funo hormonal, no metabolismo heptico e em outros
mecanismos imunorregulatrios, diretamente ou indiretamente sobre clulas
linfoides. Alm disso, pode interferir no metabolismo das imunoglobulinas,
clulas T, macrfagos e na biossntese macromolecular (BANERJEE et al.,
1999).
3.3.3 Toxicocintica
A absoro do MLT ocorre pela via trato gastrointestinal e, em menor
extenso, pelas vias drmicas e inalatria. Os resduos so metabolizados e
eliminados rapidamente atravs da urina e fezes. O MLT distribudo por todos
os tecidos do organismo, aps sua absoro, acumulando altas concentraes
no fgado, onde metabolizado e rins, que o excretam. Os efeitos podem
ocorrer minutos ou horas aps a exposio (ADAPAR, 2012).
A excreo no ser humano ocorre principalmente pela via urinria, em
menor quantidade pelas fezes. A excreo mxima ocorre em dois dias, aps
diminui rapidamente. Em ratos, a principal via de excreo tambm ocorre
atravs da urina (80% a 90%), nas primeiras 24 horas aps a exposio. Os
ratos convertem cerca de 4% a 6% do MLT em Malaoxon. O tempo de meia-
vida do MLT, em ratos, 1,4 dias no sangue quando administrado por via oral.
Em humanos A meia- vida deste organofosforado varia muito, dependendo da
natureza do composto, pois alguns metablitos so mais txicos que a
substncia que os originou (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2003).
3.3.4 Manifestaes clnicas de intoxicao por MLT
Os efeitos causados pelo MLT podem ocorrer minutos ou horas aps a
exposio, de forma leve, moderada ou grave, dependendo da concentrao
do produto absorvido, do tempo de absoro, da toxicidade do produto e do
tempo decorrido entre a exposio e o tratamento (ADAPAR, 2012).
O MLT pode provocar nusea, vmito, diarreia, salivao e sudorese
excessiva. Em casos mais graves, pode causar bradicardia, miose, secreo
pulmonar aumentada, incoordenao muscular, fasciculaes, contraes
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27
musculares, depresso do SNC, crises convulsivas generalizadas, coma e
bito (ANDEF, 2015). De acordo com estudos de Santos (2013), em que ratos
foram expostos por 15 dias ao MLT, observou-se aumento da expresso de
protenas pr-apotticas, sugerindo potencial citotxico mesmo em baixas
doses (30 mg/kg).
3.3.5 Limite mximo de resduos (LMR) para MLT
Quando se trata de uso no alimentar, o LMR para farinha de trigo de
2 mg/kg; para uso alimentar, o LMR do tomate de 3 mg/kg. A IDA de 0,3
mg/kg para ser humano, sua dose letal oral mediana (DL50) para ratos de
2000 mg/kg e a drmica acima de 4000 mg/kg (BRASILa, 2009).
3.4 Contaminao do meio ambiente
O meio ambiente tem sido influenciado pelo crescente surgimento da
agricultura qumico-industrial, responsvel principalmente pela contaminao
de alimentos, seguido da poluio de rios e do solo. As eroses e a
desertificao, associadas intoxicao e morte de animais, alm da extino
de espcies, evidenciam o desequilbrio que o uso inadequado de agrotxicos
causa, no apenas aos seres humanos, mas para todo o meio ambiente
(ARAUJO et al., 2007).
O meio ambiente saudvel e ecologicamente equilibrado direito de
todos, como bem de uso comum, e essencial para a boa qualidade de vida,
sendo responsabilidade do Poder Pblico e da Comunidade que tm o dever
de defend-lo, conserv-lo e preserv-lo para as futuras geraes (DUARTE,
2007).
A produo de alimentos atravs da agricultura prticada atualmente se
apresenta como motivadora de insustentabilidade ambiental, devido o uso de
forma indiscriminada e sem controle dos inseticidas pelos agricultores,
acarretando danos imediatos e tardios ao meio ambiente e sade humana,
tornando-se urgente a busca de medidas para minimiz-los (PIGNATI,
MACHADO & CABRAL, 2007).
-
28
A prtica da agricultura estampa atualmente uma realidade preocupante
no pas, devido dependncia de defensivos e demais produtos afins para
manuteno da plantao, constituindo poluidores potenciais do meio ambiente
(CAMPOS, 2008).
Outro grande prejuzo ao meio ambiente a contaminao do sistema
hdrico, gerando mudanas significativas no ecossistema que refletem
diretamente sobre a manuteno da sade dos seres vivos, pois independente
da forma como so aplicados na lavoura, esses produtos tm como destino
final o solo, carregados pela ao das chuvas ou da gua de irrigao
(SCORZA JUNIOR, NVOLA & AYELO, 2010).
3.4.1 Contaminao da gua e ambiente aqutico
As principais fontes de poluio hdrica, por sua vez, so os esgotos
domsticos, efluentes industriais, agrotxicos, detergentes sintticos,
minerao, poluio trmica e outros focos no especficos. Os agrotxicos so
classificados como os de maior gravidade que contaminam a gua, o ar e o
solo. A referida poluio qumica do solo pode ser vista como resultado dos
processos agrcolas que fazem uso dos agrotxicos, poluindo o ambiente e
causando srios riscos sade dos seres humanos e demais formas de vida
(STRACCI, 2014).
De acordo com o Atlas de Saneamento e Sade do IBGE, lanado em
2011, com base na declarao dos municpios sobre poluio e contaminao,
junto com o esgoto sanitrio, os resduos de agrotxicos e a destinao
inadequada do lixo foram relatados como responsveis por 72% dos
causadores de poluio na captao da gua de mananciais superficiais, 54%
em poos profundos e 60% em poos rasos (CARNEIRO et al., 2015).
3.4.2 Contaminao e resduos em alimentos
Segundo o Instituto Brasileiro de geografia e Estatistica (IBGE), a
populao brasileira composta por 204.101.219 habitantes, porm seu
crescimento ainda ocorre de forma desigual em todo o territrio, sendo a maior
-
29
concentrao nas regies norte e centro-oeste. Este fato traz tona uma
preocupao com o descompasso do saneamento bsico entre os estados
brasileiros (BRASIL(b), 2010). Segundo a OMS (2010), 24% das doenas no
mundo esto relacionadas ao ambiente em que a pessoa vive, assim, a
promoo de um meio pouco contaminado essencial para minimizar a
incidncia dessas doenas.
O Ministrio da Sade adverte que os agrotxicos esto em segundo
lugar como os maiores causadores de intoxicao no Brasil. Existem cerca de
200 tipos de agrotxicos diferentes e o Brasil um dos principais
consumidores. Alis, muitos desses compostos so proibidos em outros
pases, mas no Brasil so utilizados em larga escala sem a preocupao em
relao aos danos que podem causar (BRASIL, 2012).
Segundo Carneiro et al. (2015), o consumo mdio de agrotxicos no
Brasil de 12 litros/hectare e a exposio mdia
ambiental/ocupacional/alimentar de 7,5 litros de agrotxicos por habitante,
conforme cita o dossi elaborado pela Associao Brasileira de Sade Coletiva
(2012).
Devido ao residual de agrotxicos nos alimentos cultivados na
lavoura convencional, aplicados durante o plantio, cultivo e colheita, observam-
se diversos agravos para a sade humana. Apesar de estabelecida a IDA de
agrotxicos nos alimentos, com o intuito de garantir a segurana alimentar da
populao, o ser humano ainda est exposto ao uso combinado de vrios
produtos desta natureza, muitas vezes no indicados para determinado tipo de
plantao ou que esto em reavaliao para descontinuao programada do
seu uso, devido sua alta toxicidade (ABRASCO, 2012)
Ainda, segundo a Unio Europeia, alguns agrotxicos atuam como
interferentes endcrinos, podendo danificar diretamente um rgo endcrino ou
alterar a sua funo, interagir com um receptor de hormnios ou alterar o
metabolismo de um hormnio (SINGH et al., 2010).
-
30
3.5 LMR dos resduos de agrotxicos nos alimentos
Frente ao avano no uso dos agrotxicos, torna-se necessrio monitorar
e controlar o nvel de resduos de agrotxicos contidos nos alimentos
consumidos pelo ser humano. Para isso, foi criado em 1963, o rgo
internacional com o intuito de desenvolver normas no mbito do programa da
OMS para alimentao e agricultura (FAO/OMS), cuja misso foi estabelecer
limites mximos de resduos (LMR) com valor expresso em miligramas de
defensivo ou afins de seus resduos por quilo do alimento analisado (mg/Kg).
Foi incumbido de gerar as listas prioritrias de pesticidas que deveriam ser
avaliados/reavaliados pelo JOINTs FAO/WHO Meeting on Pesticide Residues
(JMPR - grupo FAO/OMS de peritos sobre resduos de pesticidas, que prestam
aconselhamento cientfico ao Comit sobre Resduos de Pesticidas). Alm de
priorizar mtodos de amostragem e anlise para a determinao de resduos
de pesticidas (CODEX ALIMENTARIUS, 2015).
Para acompanhar este processo, em 1980, no Brasil, foi criado o Comit
do Codex Alimentarius do Brasil (CCAB), composto por 14 membros, incluindo
rgos do governo, indstrias e rgos de defesa do consumidor, sob a
coordenao em parceria com a Secretaria Executiva do Inmetro, cuja funo
representar o Pas nos Comits do Codex, visando garantir o LMR em
alimentos e promover a segurana do consumidor e a regulamentao do
comrcio externo (JARDIM & ANDRADE, 2009; CODEX ALIMENTARIUS,
2015).
Seguindo esta linha, em 2001, a ANVISA criou o Programa de Anlise
de Resduos de Agrotxicos em Alimentos (PARA) com a finalidade de avaliar
a qualidade dos alimentos consumidos pela populao brasileira em relao ao
uso de agrotxicos. Esse programa visa prevenir intoxicaes agudas ou
crnicas resultantes da exposio diettica indevida dos agrotxicos, assim
como, estimar a exposio da populao aos resduos de agrotxicos em
alimentos de origem vegetal e, consequentemente, avaliar o risco sade
dessa exposio (BRASIL, 2012).
Alm disso, este programa busca contribuir para a segurana alimentar,
por meio da avaliao do LMR, definido a partir de 2007. Nos alimentos
-
31
comercializados no varejo, visa verificar se os agrotxicos utilizados esto
devidamente registrados no pas e se foram aplicados somente nas culturas
para as quais esto autorizados (BRASILa, 2013).
Para a manuteno deste controle, realizada a coleta de amostras de
alimentos pelas vigilncias sanitrias estaduais e municipais em
supermercados, que so encaminhados para laboratrios credenciados e
especializados, para verificar a quantidade de resduos de agrotxicos em cada
uma das amostras coletadas pelo mtodo analtico de "multirresduos" ou
metodologias especficas previamente validadas, propondo assim realizar
analise simultnea de diferentes ingredientes ativos de agrotxicos em uma
mesma amostra (BRASILa, 2009).
3.6 Forma de avaliao do LMR para seres humanos e animais
Para avaliar a exposio da populao s substncias qumicas
potencialmente txicas, avalia-se individualmente o consumo de um alimento.
Para verificar a quantidade ingerida de resduos destas substncias, deve ser
estabelecida a relao consumo/peso corpreo para cada indivduo (FAO,
2013).
Com a finalidade de avaliar o impacto da exposio, antes de autorizar o
uso de um ingrediente ativo para uma cultura agrcola, a ANVISA executa o
clculo da Ingesto Diria Mxima Terica (IDMT) definida pelo quociente:
somatrio dos produtos do consumo mdio per capita dirio de cada alimento
e o respectivo LMR dividido pelo peso corpreo (BRASIL, 2014).
Soma (LMR X Consumo do alimento)
IDMT = _________________________________
Peso corpreo
Os LMR estabelecidos para um agrotxico nas vrias culturas so
considerados seguros para a sade do consumidor quando a Ingesto Diria
Mxima Terica (IDMT) no ultrapassa a IDA (BRASIL, 2014).
-
32
A exposio crnica a substncias qumicas na dieta ocorre diariamente,
por um longo perodo. O clculo da IDA, em mg/kg de peso corpreo/dia, de
uma determinada substncia dada por:
Concentrao da substncia X consumo do alimento
Exposio =
Peso Corpreo
Para o clculo, so utilizados valores mdios desses parmetros, pois
refletem melhor as variaes de exposio que podem ocorrer durante um
longo perodo (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 1997).
Testes in vivo so utilizados com o propsito de realizar triagem e
classificar as substncias presentes nos alimentos, de acordo com sua
toxicidade. Constituem a principal forma de informao e caracterizao de
danos sade do ser humano. Estes testes so realizados tendo como base a
IDA definida para animais, porm o ser humano pode ser 10 vezes mais
sensvel. Sendo assim, o valor danoso ao ser humano do composto qumico
testado poder ser 10 vezes maior que para o animal testado (FAO, 2013).
Entretanto, a contaminao dos alimentos e a quantidade de resduos
remanescentes at a hora do consumo pode ser alterado atravs da
preparao caseira ou comercial dos alimentos aps um procedimento de
preparo, como lavar, descascar ou cozinhar (ARAUJO et al., 2007).
Apenas o Brasil dispe de legislao especfica no campo da segurana
alimentar e direito alimentao (FAO, 2013). Trata-se da Lei Orgnica de
Segurana Alimentar e Nutricional (LOSAN, Lei N 11.346, de 15 de setembro
de 2006) que versa sobre uma concepo abrangente e intersetorial da
Segurana Alimentar e Nutricional. Porm, ainda convivemos com uma
realidade de insegurana alimentar, em que o pas mantm o quinto lugar em
consumo de inseticidas e o terceiro em produo e consumo de agrotxicos em
relao ao mundo, de acordo com a Associao Nacional de Defensivos
Agrcolas, expondo os alimentos contaminao desde a produo,
processamento, armazenamento e at embalagem (ANDEF, 2015).
-
33
3.7 Sistema endcrino
O sistema endcrino influencia a atividade metablica atravs dos
hormnios secretados que atuam como mensageiros qumicos em todos os
rgos, no sentido de promover e regular o crescimento, o funcionamento de
vrios rgos, manter a homeostase do metabolismo e determinar as
caractersticas sexuais masculinas e femininas, por exemplo. Os hormnios
produzidos pelas glndulas endcrinas tm como destino a corrente sangunea
at atingir os sistemas alvo, alm de interagir harmoniosamente com o sistema
nervoso na coordenao e regulao das funes metablicas. Os principais
rgos que secretam hormnios so hipfise, hipotlamo, tireoide,
paratireoides, suprarrenais e o pncreas (MCANDREWS& WU, 2013).
A atividade do sistema endcrino regulada por mecanismo de
feedback ou retrocontrole. Denomina-se feedback negativo quando a
concentrao do hormnio secretado atinge uma concentrao acima do
necessrio, mediando sinalizao inibidora da secreo deste hormnio e a
consequente interrupo deste circuito de ao. considerado feedback
positivo quando a concentrao do hormnio est baixa e sinaliza a
necessidade da glndula secret-lo para que a atividade fisiolgica possa ser
estimulada (GUYTON & HALL, 2012). Sob este controle, o sistema endcrino
mantm em equilbrio a ao das principais glndulas demonstradas na Figura
2.
-
34
Figura 2 - Esquema do funcionamento do sistema endcrino.
(adaptado de Guyton & Hall, 2012)
3.7.1 Funo das glndulas endcrinas
A funo das glndulas endcrinas secretar os hormnios importantes
para a homeostase do metabolismo. Destas, a glndula pineal secreta a
melatonina, hormnio responsvel pela regulao dos ritmos corporais (ciclo
circadiano), relgio biolgico e o sono (GUYTON & HALL, 2012). A glndula
suprarrenal realiza a secreo do hormnio cortisol, que tem ao oposta a da
insulina e semelhante a do glucagon sobre a glicemia, sendo responsvel pela
gliconeognese heptica, liplise no tecido adiposo e degradao proteica no
msculo para gerao de energia para atender as necessidades do crebro. Alm
disso, modula a formao de novas estruturas sseas e possui ampla influncia
-
35
sobre o sistema imune, atuando como imunossupressor (WIDMAIER, RAFF &
STRANG, 2013).
Tambm controlado pela glndula suprarrenal, o hormnio esteroidal
aldosterona assegura a manuteno dos nveis de sdio e potssio na urina e no
sangue, sendo um dos principais hormnios responsveis pelo controle da presso
arterial. A adrenalina outro hormnio importante da suprarrenal, devido sua ao
promotora de aporte de sangue para os msculos, a manuteno da frequncia
cardaca e da presso arterial dentro dos valores adequados, tanto em repouso
como em condies de estresse. Tambm pode estimular a secreo de
insulina, glucagon, gastrina, dentre outros (PRADO, RAMOS & RIBEIRO DO
VALLE, 2007).
Para controle direto do metabolismo e sntese de protenas, os hormnios T3 e T4
so secretados pela glndula tireoide sob estmulo do hormnio TSH advindo da hipfise
anterior. Outra glndula, a paratireoide, produz o paratormnio que controla os nveis de
clcio no sangue por meio de influncia sobre a absoro intestinal, eliminao renal de
clcio e sua transferncia dos ossos para o sangue (MCANDREWS & WU, 2013).
O pncreas uma glndula mista com funes endcrinas e excrinas. As
clulas pancreticas secretam glucagon e as clulas secretam insulina. Existem
tambm as gnadas, responsveis pela secreo de hormnios sexuais, que regulam o
ciclo reprodutivo, o comportamento sexual e a fertilidade. O hormnio testosterona
secretado pelos testculos, enquanto estrognio e progesterona so secretados pelos
ovrios (WIDMAIER, RAFF & STRANG, 2013).
3.7.2 Eixo Endcrino Hipotalmico-Hipofisrio
O hipotlamo regula a liberao dos hormnios secretados pela hipfise,
e atua como facilitador da comunicao entre os sistemas nervoso e endcrino,
promovendo a regulao da temperatura corprea, do apetite, da atividade
gastrintestinal, do nvel de eletrlitos, da presso arterial, dos hormnios
sexuais, do funcionamento cardiovascular, do crescimento e desenvolvimento,
das emoes e do sono. (DAVIES, BLAKLELEY & KIDD, 2002).
O hipotlamo e a hipfise possuem relao com a integrao estrutural e
funcional entre os sistemas nervoso e endcrino. O hipotlamo ocupa apenas
-
36
2% do volume do encfalo, enquanto a hipfise um pequeno rgo que pesa
aproximadamente 0,5 g e localiza-se na sela trcica do osso esfenoide. A
hipfise se liga por um pednculo ao hipotlamo na base do crebro, e guarda
importantes relaes anatmicas e funcionais. Pode ser dividida em lobo
anterior e lobo posterior, sendo a hipfise anterior responsvel pela secreo
de seis hormnios, so eles: hormnio adrenocorticotrfico (ACTH), hormnio
tireoestimulante (TSH), hormnio de crescimento (GH), hormnio folculo
estimulante (FSH), hormnio luteinizante (LH) e prolactina. Tambm produz os
hormnios oxitocina e antidiurtico, que so armazenados e liberados pela
hipfise posterior (FOX, 2007; GUYTON & HALL 2012).
3.7.3 Glndula tireoide
A tireoide a primeira glndula endcrina que surge no embrio.
Segundo Guyton & Hall (2012), esta glndula um rgo com peso mximo de
20g que contm dois lobos conectados por um istmo. Est localizada no
pescoo anterior, ao nvel das vrtebras C5 at T1, em frente traqueia, e
inferior laringe, entre a cartilagem cricride e a incisura supra esternal.
altamente vascularizada e de consistncia macia, conforme mostra a Figura 3.
A glndula tireoide controlada pela atividade do eixo hipotlamo-hipfise-
tireoide.
Figura 3 - Localizao da glndula tireoide.
(Google Imagens, 2015)
http://pt.wikipedia.org/wiki/Vrtebrahttp://pt.wikipedia.org/wiki/Traquiahttp://pt.wikipedia.org/wiki/Laringe
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A tireoide mantm o equilibro do metabolismo atravs da produo,
armazenamento e secreo dos hormnios T3 e T4, conforme ilustra a Figura
4. Para que este processo acontea, o hipotlamo promove a liberao do
hormnio liberador da tireotrofina (TRH) que, ao penetrar na adeno-hipfise,
estimula as clulas basfilas a liberar o hormnio TSH, cuja funo estimular
as clulas que compem os folculos colides dentro da glndula tireoide. O
TSH secretado pela hipfise anterior e controla a secreo da glndula
tireoide. Quando a hipfise anterior para de secretar este hormnio, gera
dificuldade expressiva na tireoide chegando a incapacit-la de secretar
qualquer hormnio (OLIVEIRA & MALDONADO, 2014; MCANDREWS & WU,
2013).
O processo para equilbrio da produo dos hormnios T3 e T4 ocorre
por feedback negativo, o qual se configura na absoro do iodo, fundamental
na quantidade de 100 a 150 g/dia, consumido nos alimentos e transportado
para a tireoide, onde sofre oxidao pela peroxidase e incorporado s
molculas de tireoglobulina para constituir os hormnios T3 e T4, conforme
figura 4 (GUYTON & HALL, 2012).
O hormnio T3 livre metabolicamente mais ativo e possui atividade
biolgica 4 vezes superior do T4. A tireoide tambm tem importante papel de
metabolizar a calcitonina, que junto com T3 e T4, essencial para a regulao
da expresso gnica, diferenciao celular, regulao do metabolismo
energtico e do metabolismo do clcio. Os hormnios T3 e T4 so estimulados
pelo TSH que secretado pela adenohipfise (PRADO, RAMOS & RIBEIRO
DO VALLE, 2007).
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Figura 4 - Estrutura qumica dos hormnios T3 e T4.
(PRADO, RAMOS & RIBEIRO DO VALLE, 2007)
3.7.3.1 Funo da tireoide
A tireoide um rgo de suma importncia, pois tem influencia no
funcionamento de todas as vias metablicas. Seus principais efeitos so:
proliferao e diferenciao celular, crescimento dos tecidos atravs do
estmulo da sntese proteica. Alm disso, participa da glicogenlise, processo
de degradao do glicognio heptico em glicose no fgado, sendo primordial
para o metabolismo dos carboidratos. Sua atividade tambm favorece maior
mobilizao e oxidao de lipdios do tecido adiposo, promovendo a reduo
dos nveis plasmticos de colesterol. Participa tambm do desenvolvimento
normal das gnadas, regulao da temperatura corporal e da frequncia
cardaca (OLIVEIRA & MALDONADO, 2014).
3.7.3.2 Alteraes da tireoide
Os desequilbrios no funcionamento da tireoide compreendem o hiper e
o hipotireoidismo. Na primeira condio, a ao da tireoide alterada atravs
de estimulao excessiva do eixo hipotlamo-hipfise por causas diversas,
expresso de anticorpos anti-receptores de TSH, e o excesso de funo da
glndula pode levar a aumento no tamanho da tireoide com o surgimento de
ndulos, tumores benignos ou no, alm de bcio txico ou exoftalmia. A
segunda condio (hipotireoidismo) acontece devido a falta de T3 e T4, atrofia
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da tireoide ou ablao completa da mesma (SOCIEDADE BRASILEIRA DE
ENDOCRINOLOGIA E METABOLOGIA, 2016).
3.7.4 Hipertireoidismo
3.7.4.1 Fisiopatologia do hipertireoidismo
O hipertireoidismo ocorre pelo aumento da produo e liberao de
hormnios tireoidianos pela tireoide. Esta condio caracterizada por
tireotoxicose ou excesso de hormnios circulantes, ocorrendo o aumento do T3
com supresso do TSH, demonstrado por quadros de hiperplasia difusa da
tireoide (SOCIEDADE BRASILEIRA DE ENDOCRINOLOGIA E
METABOLOGIA, 2016).
Quando associada doena de Graves, manifesta-se pela infiltrao
linfocitria da glndula tireoide, ativao do sistema imune com elevao dos
linfcitos T circulantes e aparecimento de anticorpos que se ligam ao receptor
do hormnio TSH e estimulam o crescimento e a funo glandular, podendo
causar bcio multinodular hiperfuncionante e adenoma hiperfuncional da
tireoide, alm da tireoidite que ocorre pela ingesto excessiva de hormnio
tireoidiano (GUYTON & HALL, 2012).
Entre as manifestaes patolgicas, destacam-se alteraes cardacas,
neuromusculares e oculares, intensificao da taxa metablica basal,
osteoporose e peristaltismo. Portanto, uma patologia classificada como grave
por alterar de forma significativa a qualidade de vida, e por seu tratamento
exigir acompanhamento constante com investimento que pode gerar impacto
significativo principalmente na vida das pessoas em vulnerabilidade social
(BAHN et al., 2011; OLIVEIRA & MALDONADO, 2014).
3.7.4.2 Incidncia do hipertireoidismo
A incidncia mdia de hipertireoidismo de 8 casos a cada 1000
pessoas/ano, sendo 2% a 3% em mulheres e 0,2% em homens. Entre 60% e
80% dos casos, a doena de Graves ou o bcio difuso txico so a principal
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40
causa de hipertireoidismo em mulheres na faixa etria ente 40 e 60 anos de
idade. Apresenta-se como uma disfuno autoimune causada pela existncia de
anticorpos IgG estimuladores do receptor de TSH, que mimetizam o efeito da
tireotrofina produzida pela hipfise, estimulando o aumento de volume e a funo
da tireoide (LOPES, 2007). O hipertireoidismo subclnico, condio apresentada
em 0,3% a 1% da populao, geralmente ocorre em 2% dos idosos, e pode ser a
fase inicial do hipertireoidismo (BAHN et al., 2011).
3.7.4.3 Classificao do hipertireoidismo
O hipertireoidismo pode ser classificado como hipertireoidismo
subclnico primrio que apresenta alteraes dos hormnios tireoidianos com
aumento dos valores de TSH e manuteno dos valores de T4 em nveis
normais, sem manifestaes clnicas pelo paciente. No hipertireoidismo
secundrio, os hormnios tireoidianos e o TSH esto em nveis normais,
enquanto o T4 est diminudo. A tireotoxicose por T3 decorre do aumento
isolado dos nveis sricos de T3 e supresso do TSH para valores inferiores a
0,1 mUI/L. Enquanto no hipertireoidismo franco, os nveis sricos de T3 e T4
esto aumentados e o TSH est indetectvel (BRENTA et al., 2013;
SOCIEDADE BRASILEIRA DE ENDOCRONOLOGIA E METABOLOGIA,
2016).
3.7.4.4 Sinais e sintomas clnicos do hipertireoidismo
O paciente portador de hipertireoidismo caracteriza-se por apresentar
aumento da temperatura corporal, intolerncia ao calor, hiperidrose,
palpitaes, fraqueza muscular, dificuldade respiratria, taquicardia e fibrilao
atrial, nervosismo, tireomegalia, perda de peso, taquipnia, rouquido,
tremores, oniclise, alteraes do ciclo menstrual, alopecia, cabelos finos e
brilhantes, disfagia, oligomenorria, conforme mostra a Figura 5 que destaca o
percentual das manifestaes clnicas.
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Sintomas % Sinais %
Nervosismo 99 Taquicardia 100
Sudorese excessiva 91 Bcio 97
Intolerncia ao calor 89 Tremor 97
Palpitao 89 Pele quente e mida 90
Fadiga 88 Sopro na tireoide 77
Perda de peso 85 Alteraes oculares 71
Dispinia 75 Fibrilao atrial 10
Fraqueza 70 Ginecomastia 10
Aumento do apetite 65 Eritema palmar 8
Edema de membors inferiores 35 Disturbios mestruais 20
Diarria 23 Hiperdefecao 33
Ganho de peso ponderal 2 Anorexia 9
Figura 5 - Percentual das manifestaes clnicas do hipertireoidismo.
(MAIA et. al., 2013).
A doena de Graves caracterizada principalmente pelo aumento da
reabsoro ssea, elevao da excreo de clcio e fsforo na urina e nas
fezes, causando diminuio da densidade mineral ssea e aumento do risco de
fraturas em mulheres idosas, doenas cerebrovasculares, cardiovasculares e
fraturas do colo do fmur. Pacientes com hipertireoidismo apresentam maior
risco de mortalidade (NEVES et al., 2008; MAIA et al., 2013).
3.7.4.5 Tratamento do hipertireoidismo
Para o tratamento do hipertireoidismo so utilizadas drogas
antitireoidianas, cirurgia de remoo da glndula ou destruio desta com
radioistopo Iodo 131. A escolha do tratamento depender do consenso entre o
mdico e o paciente, da idade do paciente, do volume da tireoide, da
severidade da doena e dos recursos disponveis (LOPES, 2007).
Em relao aos efeitos colaterais das drogas antitireoidianas, devido a
utilizao em longo prazo, alguns podem ser significativos, como hepatite
txica e agranulocitose (diminuio ou desaparecimento de leuccitos
responsveis pelo sistema de defesa). Outro fator importante o abandono do
tratamento, que gira em torno de 40% a 80%, diminuindo substncialmente o
resultado do tratamento (ARAUJO et al., 2007).
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42
O maior desafio da rea mdica para tratar a doena de Graves, causa
principal do hipertireoidismo, considera o risco de complicaes cirrgicas e de
morte durante procedimento cirrgico, leso nos nervos da laringe ou glndulas
paratireoides, hipotireoidismo, recorrncia ou persistncia da doena,
infeces, sangramentos e leses nos vasos cervicais. Entretanto, o mtodo
mais barato, utilizado h 60 anos, o radiostofo Iodo 131 que pode gerar uma
tireoidite intensa secundaria por progressiva fibrose intersticial e atrofia
glandular, culminando na incapacidade definitiva da produo de hormnios
pela glndula tireoide (ARAUJO et al., 2007; SOCIEDADE BRASILEIRA DE
ENDOCRINOLOGIA E METABOLOGIA, 2016).
3.7.5 Hipotireoidismo
3.7.5.1 Fisiopatologia do hipotireoidismo
O hipotireoidismo uma condio clnica caracterizada pela quantidade
insuficiente ou ausente dos hormnios T3 e T4, que compromete o
metabolismo de forma intensa e prejudica a manuteno das funes
orgnicas (MULLER et al., 2008).
Os nveis reduzidos dos hormnios tireoidianos podem advir de uma
doena na prpria glndula (hipotireoidismo primrio), assim como, podem ser
causados por doenas hipofisrias (hipotireoidismo secundrio) ou
hipotalmicas (hipotireoidismo tercirio) (REID & WHEELER, 2005).
3.7.5.2 Incidncia do hipotireoidismo
As doenas da tireoide afetam um em cada 200 adultos. A incidncia do
hipotireoidismo de 0,3 a 5 casos por 1000 habitantes/ano. A prevalncia da
doena atinge de 10% a 15% da populao brasileira, sendo de 9,4% entre 35
e 44 anos e de 19,1% acima dos 75 anos, e geralmente acomete mulheres
aps a menopausa e idosos (ROBERTES & LADENSON, 2004; SILVA, 2011).
Dentre os vrios tipos de hipotireoidismo, a doena de Hashimoto a
mais prevalente, com maior incidncia na raa branca e acima dos 50 anos de
idade. Ndulos na tireoide so encontrados em 4% a 8% de todos os
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43
indivduos, e apresenta incidncia crescente com o aumento da idade
(MCANDREWS & WU, 2013).
3.7.5.3 Hipotireoidismo primrio
O hipotireoidismo primrio caracterizado pela diminuio de hormnios
tireoidianos circulantes no sangue. Nesse caso, a produo de T3 e T4 est
reduzida e o nvel de TSH se eleva, como adaptao fisiolgica esperada, pois
a hipfise secreta mais TSH para estimular a tireoide a secretar maior
quantidade de T3 e T4. Esta condio tem prevalncia de 2% a 3% da
populao, podendo acarretar em falncia desta glndula por problemas na
hipfise e no hipotlamo (LOPES, 2002).
Sintomas como fadiga, cansao, pele seca, ganho de peso, dificuldade
de concentrao e sonolncia acentuada so relatados no estgio inicial da
doena, esto relacionados com a falta da estimulao do metabolismo
atribuda menor secreo dos hormnios tireoidianos (SOCIEDADE
BRASILEIRA DE ENDOCRINOLOGIA E METABOLOGIA, 2016).
O hipotireoidismo primrio est relacionado com a ausncia ou perda do
tecido tireoidiano, ou distrbio na biossntese hormonal. Quando o motivo da
queda dos hormnios tireoidianos reside no centro do controle hipofisrio ou
hipotalmico, tem-se o hipotireoidismo secundrio que est relacionado com a
diminuio de produo do TSH (hipofisrio) ou TRH (hipotalmico) (OLIVEIRA
& MALDONADO, 2014).
3.7.5.4 Hipotireoidismo secundrio
No hipotireoidismo secundrio, observa-se a diminuio da funo
hipofisria ao secretar o TSH, que estimula a tireoide a sintetizar os hormnios
T3 e T4. Os baixos nveis de T3 e T4 so consequncia de nveis reduzidos de
TSH, o que difere da gnese patolgica da condio anterior, apesar dos
sintomas apresentados serem semelhantes (LOPES, 2002; BRENTA et al.,
2013).
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44
3.7.5.5 Hipotireoidismo tercirio
Havendo disfuno hipotalmica que cause diminuio da oferta de
TRH hipfise, esta glndula ter estmulo insuficiente para secretar o TSH,
que, por conseguinte, diminuir a produo de T3 e T4 pela tireoide.
Geralmente, manifesta-se em conjunto com a doena hipofisria, mas pode
surgir isoladamente (SOCIEDADE BRASILEIRA DE ENDOCRINOLOGIA E
METABOLOGIA, 2016).
3.7.5.6 Sinais e sintomas clnicos do hipotireoidismo
A sintomatologia do hipotireoidismo manifesta-se em mltiplos sistemas,
incluindo, bradicardia, hipertenso diastlica, edema perifrico, derrame
pericrdico, dispneia, derrame pleural, obstipao intestinal, baixa da taxa de
filtrao glomerular renal, aumento da creatinina, infertilidade, menorragia,
dficit de memria, ataxia, dificuldade de concentrao, fraqueza muscular,
sndrome de aprisionamento de nervo (tnel do carpo), lentido de reflexos,
parestesias, diminuio na audio e psicose, pele grossa e seca, alopcia
difusa e pele amarelada (UNIDADE DE ENDOCRINOLOGIA E DIABETES,
2015). Os sintomas diferem de acordo com o tipo de patologia ou agravo
gerado no sistema endcrino, conforme mostra a Figura 6.
Figura 6 - Sinais e sintomas clnicos de hipotireoidismo e hipertireoidismo.
(SOCIEDADE BRASILEIRA DE ENDOCRINOLOGIA E METABOLOGIA, 2016)
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3.7.5.7 Diagnostico e tratamento do hipotireoidismo
O diagnstico do hipotireoidismo pode ser realizado com base na
dosagem dos nveis dos hormnios TSH, T3 e T4 no sangue. A deteco de
nveis de T3 e T4 abaixo do normal e de TSH acima indica um quadro de
hipotireoidismo primrio. Quando os nveis de T3 e T4 se apresentam baixos,
associados com nveis tambm reduzidos de TSH, suspeita-se de
hipotireoidismo secundrio. Conforme necessrio, o clnico pode solicitar
tambm a aferio dos nveis de TRH. Nos casos de suspeita da presena de
tumor na tireoide, utiliza-se a ultra-sonografia (SOCIEDADE BRASILEIRA DE
ENDOCRINOLOGIA E METABOLOGIA, 2016).
Segundo a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia
(2016), o diagnstico simples e de baixo custo, porm muitas pessoas ainda
no sabem que so portadoras desta doena. Desde 1950, a
levoTriiodotironina tem sido a droga de escolha para o tratamento do
hipotireoidismo e a dose mdia necessria do medicamento para adultos de
1,0 a 1,7g/kg e, para idosos de 1,0 a 1,5 g/kg. Porm, cuidados especiais
devem ser observados para idosos e cardiopatas.
Para monitorar o tratamento, solicita-se o TSH srico e T4 para buscar a
condio de eutireoidismo, cujo seguimento deve ser feito a cada seis meses
ou anualmente. Uma complicao do hipotireoidismo no tratado pode gerar o
coma mixedematoso, e neste estgio o paciente apresenta hipotermia,
bradicardia e grave hipotenso. Outro agravante que o hipotireoidismo no
tratado pode tambm ocasionar cardiomegalia (LOPES, 2002; BRENTA et al.,
2013).
A utilizao de determinados medicamentos pode induzir disfunes na
tireoide, como o caso da amiodarona, droga rica em iodo muito utilizada para
o tratamento de arritmias cardacas, cujo uso crnico deste medicamento est
associado com efeitos colaterais, destacando-se alteraes na funo
tireoidiana e no metabolismo dos hormnios tireoidianos, levando a induo de
hipotireoidismo (GUYTON & HALL, 2012). O custo mdio anual por pessoa do
tratamento do hipotireoidismo com drogas antitireoidianas de R$ 1.345,81.
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46
3.7.6 Funes heptica e renal e suas relaes com substncias txicas
O fgado o maior rgo do corpo humano, com peso mdio de 1500g,
representando de 2,5% a 4,5% da massa corporal total. Recebe,
aproximadamente, 25% do dbito cardaco total, o que lhe permite realizar
numerosas funes vitais e essenciais para a manuteno do equilbrio
metablico. Tambm realiza vrias funes de grande complexidade, dentre as
quais se destaca o recebimento e a detoxificao de 20% do sangue rico em
oxignio que enviado atravs da artria heptica. O restante do sangue
(80%), rico em nutrientes, enviado atravs da veia porta. Este processo
favorece a seleo de substncias que sero absorvidas pela circulao
sistmica (MARTINS, 2012).
De acordo com a Sociedade Brasileira de Hepatologia (2015), o fgado
responsvel pelo funcionamento do sistema imunolgico, atravs das clulas
de Kupffer hepticas que perfazem de 80% a 90% da populao fixa de
macrfagos do sistema reticuloendotelial. Estes so dotados de um importante
mecanismo de filtro para a circulao sistmica por realizarem a remoo de
partculas exgenas estranhas (bactrias, endotoxinas e parasitas) e partculas
endgenas (eritrcitos senescentes) do sangue.
Alm de participar do equilbrio humoral, o fgado um rgo de grande
importncia devido realizao de vrias reaes fisiolgicas, tais como
sntese de protenas, regulao do metabolismo de nutrientes, armazenamento
de vitaminas, converso de vitaminas ativas, desiodeinizao de T4 em T3,
sntese de fator de crescimento semelhante insulina (IGF-1) em resposta ao
hormnio de crescimento produzido pela hipfise, sntese e secreo da bile
(NUNES & MOREIRA, 2007).
Alm das funes j citadas, o fgado desempenha outro importante
papel que de metabolizar e encaminhar para excreo toxinas e drogas, por
meio da converso de substncias txicas ativas em formas inativas,
principalmente no retculo endoplasmtico dos hepatcitos, tornando-as mais
solveis e passveis de excreo pelos rins ou diretamente pela bile
(SCHINONI, 2008). Dentre os metablitos txicos, destaca-se a amnia que se
origina do catabolismo das protenas e da atividade bacteriana, sendo
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47
transportada facilmente pelo plasma, a qual em grande quantidade na corrente
sangunea se torna txica para o SNC (BERNE, 2004).
No processo de detoxificao participam as enzimas AST, ALT e
glutamato desidrogenase (GDH), as quais catalisam reaes reversveis no
fgado. Essas enzimas atuam na sntese ou no catabolismo de alanina e do
aspartato, conforme a necessidade da clula heptica (COOPER, 2011). O
glutamato das clulas extra-hepticas transfere seu grupo -amino para o
piruvato originando -cetoglutarato e alanina. A alanina formada transportada
pelo sangue para o fgado, e quando chega aos hepatcitos, a enzima ALT
heptica transfere o grupo -amino da alanina para o -cetoglutarato, formando
piruvato e glutamato (ADEVA et al., 2012).
Aliada funo intrnseca de detoxificao do organismo realizada pelo
fgado, o sistema renal tambm participa do processo de eliminao de
resduos ou metablicos txicos que no so reabsorvidos pelo organismo,
desempenhando a funo de filtrar o sangue e recolher os resduos
metablicos das clulas para posterior excreo. O produto final a urina,
formada pelos nfrons que a unidade funcional bsica dos rins. Atravs da
urina, ocorre o controle de eliminao de gua, sais minerais, resduos
metablicos e substncias que, em excesso, desequilibrariam o organismo
(MORAES & COLICIGNO, 2007).
Considerando a importncia fisiolgica dos sistemas heptico e renal, e
o tropismo por compostos estranhos inerentes funo de detoxificao, as
condies que implicam em danos a esses sistemas tm impacto direto sobre o
organismo. Por isso, a avaliao da funo heptica e renal importante aos
estudos que investigam toxicidade (SOCIEDADE BRASILEIRA DE
HEPATOLOGIA, 2015).
Os rins tambm so fundamentais para a sntese de hormnios
importantes, como a eritropoetina que imprescindvel para a produo de
hemcias; para o processo de ativao da vitamina D em calcitriol importante
para calcificao dos ossos; e para a liberao da angiotensina II, renina,
aldosterona e ADH que regulam a reabsoro de gua e Cloreto de sdio
(NaCI) (BERNE, 2004). O processo de filtrao glomerular regulado,
geralmente, pelo aumento da presso arterial sistmica, pela vasodilatao da
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48
arterola aferente e pela vasoconstrio de arterola eferente que so capazes
de aumentar a taxa de filtrao renal. Os sistemas reguladores so sistema
renina-angiotensina-Aldosterona, retroalimentao tbulo glomerular, reflexo
miognico e fatores extra renais (BERNE, 2004; BARROS, 2006).
3.7.7 Doenas hepticas e renais
Em relao s alteraes do sistema heptico, as manifestaes clnicas
se caracterizam por anorexia, distenso abdominal, dor no hipocndrio direito,
fadiga, hemorragia intestinal, hepatomegalia, ictercia, nuseas, vmitos,
prurido, entre outros. Estes achados clnicos no garantem o acometimento do
fgado, mas representam forte indicadores a serem investigado. Alm destes
sinais e sintomas clnicos, destaca-se a cirrose que indicativo de doena
heptica terminal (NUNES & MOREIRA, 2007).
Para o diagnstico das doenas hepticas, deve-se considerar a
dosagem sorolgica de importantes transaminases que so indicadores
sensveis de dano heptico. Destacam-se as enzimas TGO e TGP, que, em
condies normais, encontra-se em quantidades mnimas no sangue.
Entretanto, aps a destruio de hepatcitos, elas aumentam
significativamente. Portanto, so enzimas intracelulares indicadoras de morte
celular. A TGP e a TGO so citoplasmticas e a TGO tambm tem localizao
mitocondrial (BARBOSA, 2010).
A transaminase TGO encontrada em tecidos como crebro, corao,
msculo esqueltico, pncreas e rins, sendo menos especfica para leso
heptica quando comparada com a TGP, que encontra-se predominantemente
no fgado. Quando ocorre uma leso heptica, h elevao dos nveis
enzimticos sanguneos, sendo que a TGP aumenta ligeiramente quando
comparada com a TGO. Porm, na leso heptica alcolica ocorre elevao da
TGO cerca de 2 a 3 vezes maior que a TGP, pois o lcool possui efeito inibidor
na sntese de TGP (SOCIEDADE BRASILEIRA DE HEPATOLOGIA, 2015).
Quando o fgado sofre uma disfuno grave, prticamente todos os
rgos so atingidos, consequentemente a circulao hiperdinmica. Ocorre
desequilbrio entre vasoconstrictores, vasodilatadores e outros mediadores
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metabolizados ou sintetizados por ele, com consequncia para todos os
sistemas fisiolgicos (GUYTON & HALL, 2012).
Em relao ao sistema renal, os parmetros de equilbrio so verificados
atravs de exames laboratoriais dosando os nveis de creatinina e ureia. A
creatinina um resduo produzido pela quebra de uma protena chamada
creatina fosfato, produzida no fgado, rins e pncreas, sendo transportada para
o msculo e crebro, onde sofre um processo de fosforilao e se transforma
em creatina fosfato, tambm conhecido como fosfocreatina. A creatina fosfato
constitui-se num composto de elevada reserva energtica essencial para o
processo de contrao muscular (DAVIES; BLAKLELEY; KIDD, 2002).
A e