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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP Melina Adissi Sternberg Mídia e educação na cibercultura Uma pesquisa sobre a escola e o desenvolvimento de competências midiáticas MESTRADO EM COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA São Paulo 2018

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Melina Adissi Sternberg

Mídia e educação na cibercultura

Uma pesquisa sobre a escola e o desenvolvimento de competências midiáticas

MESTRADO EM COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA

São Paulo

2018

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MELINA ADISSI STERNBERG

Mídia e educação na cibercultura

Uma pesquisa sobre a escola e o desenvolvimento de competências midiáticas

MESTRADO EM COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Comunicação e Semiótica sob a orientação do Prof. Dr. Eugênio Trivinho.

São Paulo

2018

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Banca Examinadora

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Dedico este trabalho às abençoadas memórias de Elias Adissi, Yvonne Adissi, Brigitte Sternberg, Luiza Jacoby, Israel Sternberg e Sally Sternberg. As raízes firmadas por eles me fazem voar mais alto.

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Esta Dissertação de Mestrado recebeu bolsa, em regime parcial, da Fundação

Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), que

ofereceu desconto de 100% na mensalidade do curso, entre dezembro de 2015

e novembro de 2017.

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Agradecimentos Aos meus pais, Erwin e Miriam, e aos meus irmãos, Déborah e Sami, pelo amor incondicional. Sem esse amor, nada disso seria possível. Eu amo vocês. Ao prezado Prof. Dr. Eugênio Trivinho, pela orientação ao longo dos últimos três anos. À Profa. Dra. Helena Katz e à Profa. Dra. Michelle Prazeres, pelas considerações fundamentais para o desenvolvimento deste trabalho. Ao Prof. Dr. Luis Mauro Sá Martino, pelos sábios conselhos, ensinamentos e incentivos desde a primeira aula na Graduação até este momento. À Vivian Costa, minha dupla, pelo privilégio de tê-la como melhor amiga e grande exemplo. Às queridas Anna Beatriz Pouza dos Anjos, Bianca Paulino, Flávia Sartori, Gabriela Sá Pessoa, Giovana Schlüter, Giulia Afiune e Priscila Kesselring, por serem mulheres incríveis e por darem sentido à sororidade. Ao Vitor Senise e ao Tiago Aguiar, meus amigos de alma, pelo aprendizado que é crescermos juntos. À Tatiana Cukier, pela lealdade e companhia. Ao Luiz Vassallo, por me incentivar na busca pelo mundo mais justo com o qual sonhamos. Ao Tiago Mota, por me receber na PUC-SP de braços abertos. À Carolina Maximo e à Andressa Rosa Donato, pelo cuidado primoroso nas contribuições técnicas para este trabalho. Aos brilhantes colegas do Grupo de Pesquisa Teorias e Processos da Comunicação, da Faculdade Cásper Líbero. Ao time fantástico da Mira Educação. Aos professores, gestores e funcionários do Colégio Mater Dei. Aos colegas, professores e funcionários do PEPGCOS da PUC-SP. À CAPES, pelo apoio financeiro que viabilizou a realização deste trabalho.

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“Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo o propósito debaixo do céu.” - Eclesiastes 3:1 “Se eu não for por mim, quem será por mim? Mas se eu for só por mim, o que sou eu? E se não agora, quando?” - Ética dos Pais 1:14

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STERNBERG, Melina Adissi. Mídia e educação na cibercultura: uma pesquisa sobre a escola e o desenvolvimento de competências midiáticas. 2018. Dissertação (Mestrado em Comunicação e Semiótica). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), São Paulo, 2018. RESUMO A presente pesquisa está dedicada à compreensão do desenvolvimento de competências midiáticas em escolas no contexto da dromocracia cibercultural. O objetivo prioritário é a compreensão dessas habilidades e seus vínculos com o contexto socioeconômico e midiático da escola, bem como a perspectiva de valorização da tecnologia nesse ambiente. O corpus da pesquisa consistiu em entrevistas com coordenadores pedagógicos do Colégio Mater Dei, instituição particular de ensino da cidade de São Paulo. A escola disponibiliza mídias digitais para fins educacionais como parte da execução de seu projeto político-pedagógico. Destinadas as atividades regulares de todos os componentes curriculares, as mídias digitais estão, intrinsecamente, ligadas ao cotidiano escolar dos alunos. Está em jogo, neste caso, o desenvolvimento de competências midiáticas — foco central da Pesquisa. Entende-se por este conceito a soma das habilidades técnicas, práticas e cognitivas que abrangem tanto o uso das mídias quanto a compreensão crítica de processos macrossociais e midiáticos. Como consequência do desenvolvimento tecnológico, os contextos sociais, culturais, econômicos e/ou políticos de vida acabaram por ser midiatizados, cenário no qual os meios de comunicação perpassam o modo de desenvolvimento da sociedade contemporânea. No mesmo contexto, emergem novos modelos de construção e mediação do conhecimento, solicitados pelo imperativo da dromocracia cibercultural nessa estrutura capitalista midiatizada. À luz desse panorama, que justifica a necessidade de uma investigação aprofundada, a problemática da pesquisa diz respeito a como e em qual medida a instituição se apropria do discurso da competência e/ou da dromocracia, de modo a determinar o desenvolvimento de competências midiáticas no sistema escolar. Privilegiando, como estratégia metodológica, entrevistas com gestores educacionais no Colégio Mater Dei, bem como o mapeamento das características do sistema escolar estudado, esta Pesquisa se baseia na seguinte hipótese: a escola dispõe de objetivos de aprendizagem focados no desenvolvimento das competências midiáticas, incorporados ao currículo de forma objetiva pela coordenação pedagógica e pelos professores, em consequência de demandas externas à escola, como a necessidade de formação de alunos aptos a lidar com as tecnologias digitais.

Palavras-chave: Comunicação. Dromocracia Cibercultural. Midiatização. Processos Comunicacionais. Competências Midiáticas. Escola.

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STERNBERG, Melina Adissi. Media and education in cyberculture: a research about the school and media skills development. 2018. Dissertarion (Masters in Communication and Semiotics). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), São Paulo, 2018. ABSTRACT This research is aimed at understanding the development of media skills in schools in the context of cybercultural dromocracy. The primary objective is to understand these skills and their links with the social, economic and media context of the school, as well as the perspective of valuing technology in this environment. The corpus of the research will consist of interviews with pedagogical coordinators of the Mater Dei School, a private teaching institution in the city of São Paulo. The school provides digital media for educational purposes as part of the execution of its educational policy project. Intended for the regular activities of all curricular components, digital media are intrinsically linked to students' school routine. In these cases, the development of media skills is at stake, and that’s the central focus of the research. This concept is understood as the sum of technical, practical and cognitive skills that covers both the use of the media and the critical understanding of macrossocial and mediatic processes. As a consequence of technological development, the social, cultural, economic and/or political contexts of life were eventually mediatized, a scenario in which the media permeate the development of contemporary society. In the same context, new models of construction and mediation of knowledge emerge, prompted by the imperative of cyberculture dromocracy in this mediatized capitalist structure. In this scenario, which justifies the need for an in-depth investigation, the research problem concerns how and to what extent the institution appropriates the discourse of competence and/or dromocracy in order to determine the development of media skills in the school system. As a methodological strategy, the interviews with educational managers at the Mater Dei School, as well as the mapping of the characteristics of the school system studied, are based on the following hypothesis: a school has learning objectives focused on the development of media skills, incorporated into the curriculum of pedagogical coordination and teachers, as a consequence of demands outside the school, such as the need to train students able to deal with digital technologies.

Keywords: Communication. Cybercultural Dromocracy. Midiatization. Communication Processes. Media Competencies. School.

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Seleção de inovações relevantes no contexto das tecnologias da

informação e da comunicação desenvolvidas entre 2005 e 2017

Tabela 2 – Matrículas no Colégio Mater Dei por ciclo escolar

Tabela 3 – Matrículas no Colégio Mater Dei por ciclo série

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SUMÁRIO INTRODUÇÃO 12 CAPÍTULO 1 – MIDIATIZAÇÃO, COMPETÊNCIA MIDIÁTICA E

DROMOAPTIDÃO

1.1. A sala de aula como ambiente midiático 16

1.2 A escola como instituição midiatizada 16

1.2.1 O que é midiatização 16

1.2.2. Midiatização direta e indireta na escola 17

1.3 A relação entre saber, trabalho e a lógica do software 19

1.4 A noção de competência midiática 22

1.5 Ampliando conceitos: dromoaptidão 23

CAPÍTULO 2 - O QUE ACONTECE NA ESCOLA 26

2.1. Sobre a instituição 26

2.2. Sobre a relação da escola com tecnologia 28

2.3. O processo de planejamento de aula e o lugar da tecnologia 39

como método

2.4. O papel do coordenador de tecnologia educacional 32

CONSIDERAÇÕES FINAIS 35 BIBLIOGRAFIA GERAL 37 APÊNDICE A 42 APÊNDICE B 52

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INTRODUÇÃO Esta Dissertação trata do desenvolvimento de competências midiáticas

em escolas no contexto da dromocracia cibercultural, que corresponde “à

articulação e modulação da sociedade, da economia e da cultura pela lei da

velocidade” (TRIVINHO, 2007, p 101), de modo pautado nas tecnologias

digitais, no ciberespaço, dispositivos e rede que caracterizam a cibercultura.

Falar sobre a relação entre os espaços formais de aprendizagem e as

tecnologias digitais a partir da Comunicação é, de partida, um grande desafio.

Primeiramente, pela responsabilidade que se assume ao lidar com um espaço

tão precioso como o da escola e um tema tão sensível a todos como a

Educação e a formação de indivíduos para o mundo. O segundo fator

desafiador desta proposta é a miríade de possibilidades na análise da interface

entre Comunicação e Educação, que se amplia quanto mais a tecnologia se

diversifica e adentra o cotidiano da escola, dos membros que integram a

comunidade escolar e os universos fora da instituição de ensino, nas esferas

da educação informal, do trabalho e da convivência social.

Há transformações evidentes nos espaços internos e externos à escola

como consequência do desenvolvimento tecnológico e da popularização não só

dos dispositivos digitais, mas também do acesso à internet móvel. Aos poucos,

as instituições de ensino têm buscado se adaptar a elas. A comunicação

interpessoal, por exemplo, que ocorre a todo momento graças aos aplicativos

de redes sociais, faz com que se altere o tempo e o lugar da Comunicação que

não está relacionada ao processo de ensino-aprendizagem. Outro processo

ilustra esse tipo de mudança: o acesso ao conhecimento ganha atalhos,

fazendo com que notícias, livros, recursos de aprendizagem diversos estejam a

poucos cliques de professores e alunos. A mesma ferramenta que aproxima

fontes relevantes de comunicação para o processo de aprendizagem traz,

também, uma infinidade de informações e recursos de entretenimento que

podem ser altamente dispersivos, o que desafia a escola a pensar novas

regras a respeito do uso dos celulares e outros dispositivos eletrônicos em sala

de aula. Enquanto isso, o mundo externo à escola, cobra da instituição de

ensino que o aluno esteja apto a lidar com os dispositivos com

responsabilidade, de forma produtiva, e que se adeque às demandas das

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novas dinâmicas sociais contemporâneas e no mercado de trabalho. É

atribuído valor positivo às escolas que incorporam as tecnologias, um discurso

de modernidade e inovação (PRAZERES, 2013) que reverbera no espaço

formal de aprendizagem. A onipresença da conexão é alvo de preocupações

também de outros campos, como o da Saúde1, por exemplo.

Inevitavelmente, porém, a escola já está, de partida, atrás na corrida

para acompanhar o desenvolvimento tecnológico, uma vez que o tempo dos

ciclos escolares e o planejamento das aulas e currículo são estruturalmente

mais longos comparados aos ciclos de criação das novas tecnologias. Ao longo

dos últimos treze anos, em que um adolescente formado no ano passado no

Ensino Médio ficou dentro da escola2, presenciamos o surgimento de diversas

inovações que interferiram significativamente na maneira como nos

relacionamos com a tecnologia (Tabela 1).

Tabela 1 – Seleção de inovações relevantes no contexto das tecnologias da informação e da

comunicação desenvolvidas entre 2005 e 2017

Ano Inovação Como altera a relação com a tecnologia

2005 Vírus para telefones celulares.3 Novas questões sobre segurança.

2006 Software de autenticação universal. 4 Idem.

2007 Algoritmos e softwares de realidade aumentada.5

Novas possibilidades de interação.

2008 Aplicações web off-line.6 Idem.

2009 Softwares de assistência pessoal com inteligência artificial.7

Idem.

2010 Cloud programming.8 Nova linguagem de programação.

2011 Interfaces de controle de dispositivos com gesto (Internet das coisas).9

Novas possibilidades de interação.

2012 Interface de Linha do Tempo do Novo sistema de visualização de

1 A Sociedade Brasileira de Pediatria (SPB) lançou no dia 8 de novembro de 2016, uma cartilha de orientação para médicos, pais e educadores com orientações sobre saúde e o uso e a presença das tecnologias digitais no cotidiano de crianças e adolescentes (SOCIEDADE BRASILEIRA DE PEDIATRIA, 2016b). O manual traz orientações focadas para que cada agente de influência sobre a criança ou adolescente possa contribuir para uma relação saudável com as tecnologias interativas da comunicação. Ser saudável agora também tem a ver com o uso “adequado” dos meios digitais interativos, e a escola também é responsável por isso (SOCIEDADE BRASILEIRA DE PEDIATRIA, 2016a). 2 Atualmente, conforme a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), é obrigatória a matrícula de crianças e adolescentes no sistema educacional entre 4 e 17 anos de idade. (BRASIL, 1996). 3 MIT TECHNOLOGY REVIEW, 2005. 4 TALBOT, 2006. 5 JONIETZ, 2007. 6 NAONE, 2008. 7 NAONE, 2009. 8 NAONE, 2010. 9 DIBBELL, 2011.

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Facebook.10 conteúdos e captura de dados.

2013 Relógios smart e redes sociais “temporárias” (ex: Snapchat).11

Novo dispositivo tecnológico e novas redes sociais.

2014 Óculos rift (de realidade virtual) e serviços de colaboração móvel (para criar e editar documentos no celular).12

Novo dispositivo tecnológico e novas possibilidades para criação de conteúdo.

2015 Projeto Loon, do Google, que leva internet a áreas remotas por meio de balões de hélio.13

Nova forma de acesso à internet.

2016 Interfaces de conversação para aplicativos, que usam mecanismos de reconhecimento de voz e inteligência artificial14.

Novas possibilidades de interação.

2017 Botnets das coisas, os scripts automáticos usados por hackers para captar informações a partir dos dispositivos de internet das coisas.15

Novas questões de segurança.

Essas diferentes temporalidades convivem e são parte do contexto que

deu origem ao recorte específico sobre o desenvolvimento de competências

midiáticas analisado durante esta pesquisa. Empiricamente, foi observada a

experiência do Colégio Mater Dei, uma Instituição de Ensino privada, localizada

na cidade de São Paulo. Foram realizadas visitas à escola e entrevistas com

coordenadores pedagógicos para se compreender qual o lugar das tecnologias

no processo de ensino-aprendizagem, além de quais os mecanismos

pedagógicos que asseguram o desenvolvimento de competências midiáticas.

A hipótese inicial de trabalho foi de que a escola dispunha de objetivos

de aprendizagem focados no desenvolvimento das competências midiáticas,

incorporados ao currículo de forma objetiva entre a coordenação pedagógica e

pelos professores, devido as demandas externas à escola em prol da formação

de alunos aptos a lidar com as tecnologias digitais. As visitas de campo e

conversas com membros da comunidade escolar foram essenciais para a

compreensão da relação entre escola e tecnologia. O capítulo que antecede a

seção desta Dissertação que está dedicada ao trabalho de campo, apresenta

um cenário geral, que mostra a escola a partir do lugar da Comunicação como

um espaço midiático e midiatizado. Os autores Braga e Calazans (2001),

Meyrowitz (1999), Hjarvard (2008; 2013) e Manovitch (2008), dão suporte a

10 GREENWALD, 2012. 11MIT TECHNOLOGY REVIEW, 2013. 12 MIT TECHNOLOGY REVIEW, 2014. 13 SIMONITE, 2015. 14 KNIGHT, 2016. 15 SCHNEIER, 2017.

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uma leitura das interfaces que se estabelecem entre Educação e Comunicação

a partir da disponibilização de tecnologias na sala de aula. São discutidas no

capítulo mudanças nas dinâmicas e estruturas educacionais consequentes da

relação com as tecnologias digitais, influenciadas por uma lógica midiática

específica: o software. Refinando a discussão do objeto epistemológico desta

Dissertação — a razão pela qual competências midiáticas são

compulsoriamente exigidas, é posta uma definição principal para este conceito,

a partir de autores como Bauer (2011) e Martino e Menezes (2012). A ideia de

competência midiática é tensionada aqui na relação com outra, a noção de

dromoaptidão, de Trivinho (2007).

Estabelecido o panorama geral contextual e apresentada a discussão

acerca das competências midiáticas, é apresentada, por fim, a experiência

observada no Colégio Mater Dei, no primeiro semestre de 2018, em um terceiro

capítulo. A relação desta escola com a tecnologia será detalhada e os

principais pontos das entrevistas estarão destacados, abrindo caminho para as

considerações finais.

É válido ressaltar que esse percurso foi desenhado a partir de um lugar

específico de fala e escuta da pesquisadora, que é jornalista e comunicadora.

Para além da pesquisa, trabalha atualmente em um projeto de

desenvolvimento de tecnologias para a educação básica, experiência que a

muniu de conhecimentos teóricos e práticos sobre o universo escolar que lhe

foram muito úteis para a Dissertação. Tem uma bagagem teórica ligada aos

autores críticos, com os quais tem trabalhado desde seu projeto experimental

de conclusão de curso, defendido na Faculdade Cásper Líbero, em 2013, e que

se expandiu a partir de sua vivência como pesquisadora dentro do Programa

de Estudos Pós-Graduados em Comunicação e Semiótica (COS) da PUC-SP.

É desse ponto de observação que se colocam as primeiras questões desta

Pesquisa.

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CAPÍTULO 1 – MIDIATIZAÇÃO, COMPETÊNCIA MIDIÁTICA E

DROMOAPTIDÃO

1.1. A sala de aula como ambiente midiático

O uso dos meios de comunicação nos processos formais de ensino

representa uma interface entre os campos da Comunicação e da Educação

que, segundo Braga e Calazans (2001), têm uma longa história. São

representativos dessa interface o uso corriqueiro de dispositivos como, por

exemplo, mas não somente, projetores, televisores, computadores, celulares e

tablets que exibem conteúdos didáticos em sala de aula com uma finalidade

pedagógica específica — a de estabelecer uma ponte entre a escola e a

diversidade fora dela. A mídia, neste caso, seria como uma janela para fora da

sala de aula, expandindo as possibilidades de uso de conteúdos para além do

livro didático ou de outros materiais.

Esse uso de dispositivos midiáticos em sala de aula acarreta em

transformações nas dinâmicas no espaço formal de aprendizagem.

Considerando as mídias como dotadas de uma ambiência própria, com

características e efeitos que extrapolam seus conteúdos e sua produção

(MEYROWITZ, 1999), pode-se afirmar que esses meios alteram esses

espaços, seja em dinâmicas particulares de determinadas interações

operacionais, seja em mudanças estruturais. Não é apenas a presença das

mídias e a transformação do ambiente escolar decorrente dela que configuram

a sala de aula como ambiente midiático. Essa nova ambiência também se deve

as transformações externas ao espaço da escola.

1.2. A escola como instituição midiatizada

1.2.1. O que é midiatização

Enquanto instituição, a escola está permeada pelas mídias. Não só

porque há dispositivos midiáticos colocados no espaço da sala de aula, mas

também porque a instituição escolar é, como as demais instituições da

sociedade contemporânea, midiatizada. Hjarvard (2013) apresenta o conceito

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de midiatização como um processo no qual esferas políticas, econômicas e

sociais (como a educação) são influenciadas de modo dependente da lógica

midiática. Segundo o autor, “as instituições sociais e os processos culturais

mudaram de caráter, função e estrutura em resposta à onipresença dos meios

de comunicação” (HJARVARD, 2013, p. 15), em novas configurações em que

estabelecem outros tipos de relações com o poder, a cultura e a produção de

conteúdo e conhecimento de forma dependente dos meios de comunicação e

de sua lógica.

Esse processo tem início no final do século XX nas potências ocidentais

desenvolvidas, como Europa, Estados Unidos, Austrália etc. (HJARVARD,

2008) e se dissemina graças à elevação do status dos meios de comunicação

a instituições midiáticas (HJARVARD, 2013), não só devido ao

desenvolvimento propriamente tecnológico, mas também as mudanças

políticas e econômicas, ligadas à implementação de uma agenda neoliberal de

baixa regulamentação dos meios. Como consequência do fim do monopólio

público dos serviços de Rádio e TV e da expansão da transmissão desses

serviços (HJARVARD, 2013), uma maior competitividade no campo fez com

que os meios de comunicação acumulassem funções que respondem a

interesses privados e, ao mesmo tempo, coletivos (HJARVARD, 2013). A

integração dos meios ao mundo cotidiano de outras instituições também se dá

graças à popularização dos meios de comunicação digitais e da internet, que

possibilitou que o público passasse a produzir conteúdo (HJARVARD, 2013). O

principal serviço oferecido pelos meios consiste, agora, em “produzir relações

sociais entre as pessoas, e os usuários são cada vez mais estimulados a gerar

conteúdo por si próprios” (HJARVARD, 2013, p. 50).

1.2.2. Midiatização direta e indireta na escola

A midiatização da escola pode ser observada de forma direta, quando

atividades não mediadas por meios de comunicação passam a sê-lo, ou de

forma indireta, quando a forma, conteúdo, organização ou contexto de uma

atividade são influenciados por símbolos ou mecanismos midiáticos

(HJARVARD, 2013). Essas duas formas de influência ocorrem porque esses

processos, diretos e indiretos, são pautados, no contexto da midiatização, pela

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lógica da mídia. Essa lógica representa o modus operandi próprio dos meios de

comunicação, com suas especificidades “capazes de influenciar outras

instituições e a cultura e a sociedade em geral, à medida que estas se tornam

dependentes dos recursos que ela controla e disponibiliza” (HJARVARD, 2013,

p. 36). Essa lógica não é única: cada instância midiática dispõe dos seus

códigos, dinâmicas e especificidades próprias que se relacionam com as

esferas macrossociais.

Há, no espaço escolar, diversos processos que podem ser observados

sob a ótica da midiatização direta ou indireta. O primeiro caso é mais visível: há

inúmeras atividades que não eram mediadas diretamente por tecnologias

digitais e que passaram a ser. Um aluno do primeiro ano do Ensino Médio do

Colégio Mater Dei que, por exemplo, consulta uma plataforma digital para

acessar o conteúdo didático ao invés de usar apostilas, tem sua atividade de

estudo evidentemente dependente da mídia digital. Essa operação passa a ser

totalmente mediada por um dispositivo midiático. As manifestações indiretas de

midiatização, referentes às mudanças estruturais, no entanto, são menos

explícitas e, para identifica-las, busca-se compreender por que determinadas

escolhas sobre o uso de dispositivos digitais são feitas em sala de aula. Optar

pelo uso de mídias digitais como parte de uma metodologia pedagógica é uma

escolha que visa objetivos educacionais, que respondem aos valores e

interesses específicos dentro da escola, mas que estão conectados a ideais

coletivos a respeito da tecnologia e sua função na sociedade.

Se a escola forma cidadãos para que interajam e produzam para a

sociedade geral, ela é, portanto, um espaço de formação para uma sociedade

midiatizada. Assim, é possível dizer que há uma nova função pedagógica

urgente para o uso dos meios em sala de aula: “fornecer conhecimentos e

competências requeridas para uma participação eficaz nessa sociedade”

(BRAGA; CALAZANS, 2001, p. 59). Essa demanda da sociedade para os

espaços formais de aprendizagem por uma educação para os meios (BRAGA;

CALAZANS, 2001) ou pelo desenvolvimento de competências midiáticas

(BAUER, 2011) solicita não apenas a disponibilização de aparatos tecnológicos

dentro da escola, mas também a necessidade de pensar “como, através de que

processos, com que critérios e objetivos, a Escola pode trabalhar tais questões

de modo efetivamente útil e intelectualmente enriquecedor” (BRAGA;

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CALAZANS, 2001, p. 59-60). Repensar o processo educacional a partir dessa

demanda acarreta uma série de transformações nas atividades docentes e

discentes, o que representa transformações estruturais nesse sistema, e,

portanto, um fenômeno passível de ser observado pela ótica da midiatização

indireta.

1.3. A relação entre saber, trabalho e a lógica do software

A midiatização direta e indireta, apresentadas por Hjarvard (2013),

representam os processos nos quais esferas políticas, econômicas e sociais

são influenciadas de modo dependente da lógica midiática. A lógica da mídia

se define como um modus operandi próprio dos meios de comunicação, com

características “capazes de influenciar outras instituições e a cultura e a

sociedade em geral, à medida que estas se tornam dependentes dos recursos

que ela controla e disponibiliza” (HJARVARD, 2013, p. 36). Essa lógica não

representa, segundo o autor, racionalidade única que conecte todas as

instâncias midiáticas, mas sim uma:

abreviatura conceitual para os vários modus operandi institucionais, estéticos e tecnológicos adotados pelos meios de comunicação, incluindo a forma como distribuem os recursos materiais e simbólicos e operam com a ajuda de regras formais e informais (HJARVARD, 2013, p. 36).

A lógica de mídia que influencia hoje as escolas está diretamente ligada

à disseminação das tecnologias digitais que, segundo Gorz (2009), influenciou

também a relação entre trabalho e saber – e para identificar a lógica de mídia

que passa a permear a educação, é essencial compreender essa interface

entre esses dois vetores (o trabalho e o saber). Para o autor, “a informatização

revalorizou as formas de saber que não são substituíveis, que não são

formalizáveis” (GORZ, 2009, p. 9). Essas formas de saber representam

competências que adquirimos ao longo da vida, seja em marcos formais de

aprendizagem ou por meio das nossas experiências. Esse tipo de competência

atribui ao trabalho um valor que não é mensurável em unidades tangíveis,

como o tempo, a quantidade, entre outros indicadores.

Esse fenômeno se dá, segundo Gorz, porque

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“o capitalismo moderno, centrado sobre a valorização de grandes massas de capital fixo e material, é cada vez mais rapidamente substituído por um capitalismo pós-moderno centrado na valorização de um capital dito imaterial” (GORZ, 2009, p. 15).

O conhecimento, nesse contexto, passa a ser considerado a “força produtiva

principal” do capitalismo (GORZ, 2009, p.9).

Embora o uso do conhecimento como capital seja uma noção antiga, a

capitalização dos saberes se configura hoje de forma inédita — citando Gorz

(2009, p. 10), “todo conhecimento passível de formalização pode ser abstraído

de seu suporte material e humano, multiplicado quase sem custos na forma de

software e utilizado ilimitadamente em máquinas que seguem um padrão

universal”. Para Manovich (2008), o software é a cola que une todos os

sistemas sociais, econômicos e culturais da sociedade moderna, e está

atrelado a outra consequência irrevogável do desenvolvimento nas novas

tecnologias da informação: o desenvolvimento da sociedade global da

informação ou a economia do conhecimento (GORZ, 2003) ou economia

eletrônica (CASTELLS, 2003).

Embora o uso do conhecimento como capital seja tão antigo quanto a

Era Industrial, a capitalização dos saberes se configura na contemporaneidade

de forma inédita: “todo conhecimento passível de formalização pode ser

abstraído de seu suporte material e humano, multiplicado quase sem custos na

forma de software e utilizado ilimitadamente em máquinas que seguem um

padrão universal” (GORZ, 2003, p.10). Um mecanismo de produção de

conhecimento que, no fundo, carrega consigo uma utopia, na qual “uma

autêntica economia do conhecimento corresponderia a um comunismo do

saber, no qual deixam de ser necessárias as relações monetárias e de troca”

(GORZ, 2003, p.10).

Para Castells (2002), esse cenário utópico não se aplica, uma vez que a

capacidade da rede é de tal maneira intensa que “uma parte considerável das

comunicações que acontecem nela é, em geral, espontânea, não organizada e

diversificada em finalidade e adesão” (CASTELLS, 2002, p. 439), e apropriada

por interesses comerciais e governamentais.

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Na mesma linha, Gorz (2009) coloca que as características únicas e

incomparáveis dos saberes são apropriadas pelo capital apesar desse

potencial de expansão. Ocorre, então, um modo de criação artificial de

escassez, que permite seu melhor aproveitamento segundo a lógica do capital.

A potencialidade, portanto, é limitada, e isso agrega valor ao trabalho imaterial

Gorz (2009).

Ainda que o software e os saberes nele sistematizados reorganizem o

mundo de modo automatizado, ainda há por trás dele um elemento humano,

sem o qual a economia eletrônica não pode operar. São “profissionais

autoprogramáveis” (CASTELLS, 2003, p.78), aptos a navegar no manancial de

informação e conteúdo disponível na Web, capacitados por um tipo de

educação que os permitem expandir e modificar essa abundante matéria-prima

do trabalho imaterial. Para manutenção da economia do conhecimento é

necessário, portanto, educar futuros trabalhadores que possam lidar com a

onipresença do software e do modo de autoprodução imaterial. “Profissionais

desse tipo devem ter alto nível de instrução e iniciativa. (...) A qualidade [do

trabalho] não é medida simplesmente em anos de educação, mas em tipo de

educação” (CASTELLS, 2003, p.77).

As atividades educativas realizadas no Colégio Mater Dei com o apoio

da tecnologia podem ser exemplos de programas que buscam desenvolver

competências midiáticas para educar futuros profissionais para o trabalho

imaterial. E, com isso tem valor no contexto da economia do conhecimento.

1.4. A noção de competência midiática

Em linhas gerais, compreende-se por competência midiática um

conjunto de recursos racionais, procedimentos práticos e modos de ver

expressos pelo sujeito na relação com os fatores, processo e tendências do

contexto no qual se insere. Entre esses aspectos formadores, destaca-se a

sensibilização crítica do indivíduo para a compreensão da midiatização dos

sistemas sociais, culturais e econômicos nos quais se insere.

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Segundo Bauer (2011, p. 16), tal competência representa “a

alfabetização na midialidade16 das vidas social e individual e a sensibilização

de todas as relações sociais que o indivíduo vivencia”, afastando a ideia de que

é necessária uma educação para o uso meramente instrumental dos media e

pensando “a mídia como parte do contexto do indivíduo, apto a encontrar

trilhas para a compreensão do ambiente no qual está inserido” (MARTINO;

MENEZES, 2012, p. 12).

Essa noção de competência midiática permeia o senso comum e as

instituições em dimensões bem amplas. Um exemplo de institucionalização

desse discurso é a publicação, em 2011, do guia “Alfabetização midiática e

informacional: currículo para formação de professores” pela Organização das

Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO). Traduzido

para o português, em 2013, o objetivo do guia é treinar professores para

“sensibilizá-los da importância da AMI [Alfabetização Midiática e Informacional]

no processo educacional, possibilitando a integração da AMI em seus

ensinamentos” (UNESCO, s.d.). O guia sugere uma matriz curricular de

competências e outros recursos pedagógicos para o desenvolvimento de

competências midiáticas e informacionais, mais específicos do que o conceito

de Bauer (2011) e que nos ajudam a compreender, de fato, a que se referem

tais competências.

A entidade define como objetivo da alfabetização midiática “empoderar

cidadãos provendo-lhes competências (conhecimento, habilidades e atitude)

necessárias para engajar a mídia tradicional com as novas tecnologias”

(UNESCO, s.d.), enquanto a alfabetização informacional se refere à

capacidade do sujeito de “interpretar e fazer julgamentos com bases em

informações, como usuários de recursos informacionais, além de torná-los

produtores de informação em seus próprios direitos” (UNESCO, s,d.). Para

todos os efeitos, embora a UNESCO evidencie como parte da sua estratégia a

unificação desses dois processos de alfabetização, tomemos como enfoque

para este trabalho apenas o âmbito do desenvolvimento de competências

16 Segundo o autor, o conceito de midialidade pode ser encarado como “o ambiente mental, social, cultural e simbólico da comunicação” (BAUER, 2011, p. 16).

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midiáticas, que se resumem aos seguintes resultados de aprendizagem,

conforme o guia:

• Compreender o papel e as funções da mídia nas sociedades democráticas;

• Compreender a condição sob a qual a mídia pode exercer suas funções;

• Avaliar criticamente os conteúdos de mídia;

• Engajar-se com a mídia para se expressar e participar democraticamente; e

• Revisar habilidades (incluindo habilidades em TIC [Tecnologias da Informação e Comunicação]) necessárias para produzir conteúdos gerados por usuários (UNESCO, s.d.).

Retomando o conceito da competência midiática, Bauer (2008) aponta

que a noção de alfabetização é escolhida na definição do termo para remeter à

experiência que o domínio das estruturas midiáticas implica em um sucesso

social dependente do acesso à educação). Esse investimento na alfabetização

é o que diferencia a mão de obra autoprogramável da mão de obra genérica:

“não é por falta de qualidades que uma pessoa integra a mão de obra genérica.

Isso ocorre porque investimento, social e pessoal, de capital intelectual deixou

de ser feito nela” (CASTELLS, 2003, p. 80).

Esse ideal de sucesso colocado por Bauer (2008) pode estar associado

ao que Castells (2003, p. 36) define como “cultura tecnomeritocrática, (...) uma

cultura da crença no bem inerente ao desenvolvimento científico e tecnológico

como um elemento decisivo no progresso da humanidade”.

Desenvolver competências midiáticas é obter um grau de proficiência em

habilidades comunicativas e culturais com o objetivo de acumular capital social

(BAUER, 2011), tornando-se parte das tecnoelites e sendo reconhecidos por

seus pares na comunidade, igualmente competentes.

1.5. Ampliando conceitos: dromoaptidão

A ideia de que um aluno compreenda o contexto em que se insere por

diversos caminhos a partir do desenvolvimento de competências midiáticas e

se torne apto a estar e trabalhar no mundo fora da escola como parte de um

grupo seleto, desconsidera um fator que é fundamental na lógica do software e

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que é determinante na sua relação com a educação e outros processos sociais:

a velocidade, que se impõe como um eixo que organiza e modula os aspectos

sociais, culturais, políticos e econômicos da existência (TRIVINHO, 2007), e a

violência quase invisível inerente a ela.

A escola e a educação, assim como outras instituições e processos

sociais, estão submetidas à dromocracia cibercultural17, macroconfiguração

social-histórica em que, no contexto da economia do conhecimento, o trabalho

imaterial e a comunicação em tempo real, “a velocidade técnica e tecnológica

equivale a um macrovetor dinâmico exponencial de

organização/desorganização e reescalonamento permanente de relações e

valores sociais, políticos e culturais na atualidade” (TRIVINHO, 2007, p. 69).

Evidente apenas em condições muito avançadas de desenvolvimento

econômico e social, a dromocracia se consolida no cerne da democracia à

medida que:

A velocidade encontra-se materializada no próprio aparato produtivo, em sua dinâmica interna, em sua lógica operacional, em suas necessidades de reprodução infinita, de maneira que ela recai, em maior ou menor medida, como violência (TRIVINHO, 2007, p .91).

Essa violência é sutil, imaterial e não-física, e se manifesta não em

agressões corporais diretas, mas pela instrumentalização de signos.

Pulverizada e contínua, essa violência está ligada ao dinamismo do nosso

sistema cultural-comunicacional vigente que, por sua natureza lúdica, faz com

que essa violência seja naturalizada pelos indivíduos e instituições. Ela se

justifica na medida que a dromoaptidão é transformada compulsoriamente em

“imperativo categórico de época, válido para todos os setores sociais”

(TRIVINHO, 2007, p. 97).

A capacidade de ser dromoapto, ou seja, de ser veloz, abrange:

A competência econômica orientada para a posse privada plena (isto é, com base no domo) das senhas infotécnicas de acesso à época (objeto infotecnológico e rede digital à frente), a competência cognitiva e pragmática no trato da sociossemiose plena da interatividade (isto é, o domínio das linguagens informáticas sempre

17 A expressão ‘dromocracia cibercultural’ se refere “à articulação e modulação da sociedade, da economia e da cultura pela lei da velocidade exclusivamente com base nas cibertecnologias e no cyberspace, vale dizer, equipamentos e rede co-fundadores caracterizadores da

cibercultura” (TRIVINHO, 2007, p. 101).

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em mutação) e a capacidade (econômica e cognitiva) de acompanhamento da lógica da reciclagem estrutural daquelas senhas (TRIVINHO, 2007, p. 72).

Em outras palavras, o sujeito competente para ser veloz tem poder

aquisitivo e econômico para operar com dominância plena os objetos

tecnológicos; tem domínio das linguagens referentes a esse objeto; e tem a

capacidade de acompanhar mudanças rapidamente.

A escola, que é direta e indiretamente influenciada pela mídia e por

dispositivos digitais no contexto da midiatização, conforme posto no capítulo

anterior, não está imune a essa violência técnica da velocidade. Ao contrário,

há uma exigência de constante atualização de currículo, espaço e

metodologias em decorrência de uma demanda externa por um cidadão

formado para dar conta dessas transformações tecnológicas. A violência está

aí, nessa pressão sofrida pela escola, e passa a ser introjetada no estudante,

que conserva esse modo de agir, pensar e estar no mundo. Segundo Trivinho:

Ser veloz é, inexoravelmente, assumir o ritmo social ditado não somente pela lógica da máquina em sua versão mais sofisticada, mas também, por extensão, pelo universo cibercultural como um todo. Em outras palavras, introjetar - não importa por qual motivação - a velocidade como valor significa incorporar a estrutura e a dinâmica sociotécnicas fincadas, na perspectiva agravante de um referendo

natural ao resultado dessa incorporação (TRIVINHO, 2007, p. 106).

É possível fazer uma leitura, portanto, de que essa demanda externa

pelo desenvolvimento de competências ou aptidões para a mídia é uma

manifestação dessa violência da velocidade, que afeta a escola de modo

arrebatador e deixa a instituição em uma posição ambígua. Por um lado, há

uma preocupação com a formação crítica dos indivíduos, por outro, os meios

escolhidos para tal reproduzem um sistema de crenças na tecnologia que são

inerentemente violentos, e que dificilmente serão executados plenamente

porque a escola não acompanha o ritmo veloz do desenvolvimento tecnológico.

É necessário, porém, observar, a partir do chão da escola, como esse

tensionamento ocorre de fato.

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CAPÍTULO 2 - O QUE ACONTECE NA ESCOLA

2.1. Sobre a instituição

O Colégio Mater Dei é uma instituição de ensino privada e urbana,

localizada na cidade de São Paulo, fundada em 1962. O propósito do colégio é

definido como “entregar à sociedade um cidadão responsável, com valor

sólidos e conhecimento de mundo amplo para atuar no mercado de trabalho”

(COLÉGIO MATER DEI, 2018a). A escola oferece turmas para todo o ciclo da

Educação Básica Regular, da Educação Infantil ao Ensino Médio. Há também

um programa integral bilíngue, que possibilita que o aluno receba um diploma

válido no Estados Unidos (COLÉGIO MATER DEI, 2018b).

A entidade é parte do grupo educacional Weducation, que engloba, além

da unidade do Mater Dei em São Paulo, o Colégio Internacional EMECE

(situado no bairro da Pompeia), o Colégio Internacional Ítalo Brasileiro (em

Moema), e duas unidades do Colégio Internacional Vocacional Radial, no

Jabaquara, e em Santo Amaro. Fora de São Paulo, o grupo compreende

também uma unidade do Colégio Mater Dei, na cidade de São José dos

Campos. Segundo a página do grupo no Linkedin (WEDUCATION, 2018), há

um total de 3000 alunos matriculados no grupo.

Segundo o Censo Escolar 2017 (QEDU, 2018a), 417 alunos estão

matriculados no Mater Dei, divididos entre Educação Infantil (96 matrículas),

Ensino Fundamental (199 matrículas) e Ensino Médio (ver tabelas 2 e 3 a

seguir). A escola conta com 95 colaboradores no seu quadro de funcionários.

Todos os alunos do Mater Dei, em São Paulo, frequentam uma única unidade

da escola próxima ao Parque do Ibirapuera, no Jardim Paulista, bairro

paulistano nobre.

Situada em rua arborizada, a escola tem sua estrutura edificada em

partes de casas antigas, reformadas e adaptadas para receber os alunos.

Tabela 2 – Matrículas no Colégio Mater Dei por ciclo escolar

Ciclo escolar Quantidade de matrículas

Creche 51

Pré-escola 45

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Ensino Fundamental Anos iniciais (1º ao 5º anos) 102

Ensino Fundamental Anos finais (6º ao 9º anos) 97

Ensino Médio 100

Educação de Jovens e Adultos 0

Educação Especial 22

Fonte: Censo Escolar 201718

Tabela 3 – Matrículas no Colégio Mater Dei por série

Ciclo Série Quantidade de matrículas

Ensino Fundamental 1º ano 21

2º ano 16

3º ano 18

4º ano 21

5º ano 26

6º ano 22

7º ano 31

8º ano 17

9º ano 27

Ensino Médio 1º ano 34

2º ano 31

3º ano 35

Fonte: Censo Escolar 201719.

As taxas de rendimento da escola (métricas que indicam a permanência

e o sucesso escolares) revelam uma instituição que não tem no abandono

escolar um problema20, como é típico de instituições privadas de ensino, e que

a aprovação é muito alta (há apenas 1% de reprovação no Ensino

Fundamental e 3,5% no Ensino Médio, segundo Censo Escolar 201621,QEDU,

2018b).

A escolha da instituição se deu por meio da indicação de colegas da

pesquisadora. O primeiro contato foi feito no primeiro semestre de 2017,

quando se iniciou um ciclo de conversas para definir qual seria o recorte a ser

observado para a pesquisa, haja visto que a escola dispõe de diversos projetos

envolvendo tecnologias, a serem detalhados posteriormente. Uma carta

elaborada pelo Prof. Dr. Eugênio Trivinho, orientador da presente pesquisa,

formalizou a solicitação para início dos trabalhos empíricos de pesquisa na

instituição em meados do mesmo ano, que foi autorizada verbalmente pela

18 QEDU, 2018a. 19 QEDU, 2018a. 20 As informações dos Censo Escolar dos anos 2010 a 2016 da plataforma QEdu apontam 0% de abandono nos Ensinos Fundamental e Médio (QEDU, 2018b). 21 Ainda não foram divulgadas as taxas de rendimento referentes ao Censo Escolar de 2017.

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Diretora Acadêmica e pela Diretora Pedagógica para Línguas Estrangeiras do

grupo mantenedor da escola.

2.2. Sobre a relação da escola com tecnologia

Em um vídeo institucional de 200922 é possível perceber algumas

nuances sobre o discurso e as práticas do Colégio Mater Dei e sua relação

com a tecnologia. É sinalizada, a partir da voz institucional, que o enfoque do

Ensino Fundamental e Médio na relação com a tecnologia é orientado pelo

“que o aluno quer para o seu futuro”, que se prepara na escola para um

“mercado de trabalho cada vez mais exigente” e para “o Brasil de amanhã”. Há,

no vídeo, duas menções a um programa que ainda está em implementação:

um componente curricular de Robótica, que integra a grade do 5º ano do

Ensino Fundamental I e o ciclo completo do Ensino Fundamental II, em uma

parceria com Lego Educacional no Brasil (COLÉGIO MATER DEI, 2018c). Na

grade de horários disponível no site da instituição para o Ensino Fundamental

II, estão previstas para 2018 duas aulas semanais de programação para o 6º

ano, três para o 7º ano, duas para o 8º ano e uma para o 9º ano (COLEGIO

MATER DEI, 2018d).

Em 2014, teve início na escola um novo projeto, em parceria com o

Google: a implementação de uma sala de aula no “formato Google”, a primeira

do mundo23 . O espaço, que é de uso compartilhado pelas diversas turmas da

escola, não dispõe de carteiras convencionais ou de uma lousa, mas sim de

mesas e cadeiras que se movem pela sala, pufes, almofadas, TVs e

Chromebooks. O diretor da escola, Sylvio Gomide, afirmou em entrevista ao

Estado de S.Paulo24 que um dos objetivos do uso do espaço é transformar a

relação entre professores e alunos no processo de ensino-aprendizagem. O

gestor reforça também a posição do vídeo institucional, sobre a demanda do

mercado de trabalho por profissionais que dominem determinadas

competências, como o trabalho em grupo. Dois anos depois, as duas unidades

do Colégio Mater Dei (em São Paulo e em São José dos Campos), além de

outras duas instituições do grupo Weducation (os colégios paulistanos Ítalo

22 INSTITUCIONAL, 2009. 23 VIEIRA, 2014. 24 VIEIRA, 2014.

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Brasileiro e EMECE) foram certificadas pelo Google como “escolas de

referência”25, pelo uso diferenciado dos aplicativos desenvolvidos pela

companhia com os objetivos de “eliminar ‘as paredes das salas de aula’” e

“possibilitar o acompanhamento de projetos e aulas, ainda que os alunos

estejam ausentes do colégio, no dia da atividade” (COLEGIO MATER DEI,

2018c).

Uma terceira e última parceria do colégio com uma empresa de

tecnologia é a implementação da plataforma Geekie One, por meio da qual os

alunos do 1º ano do Ensino Médio acessam todo o conteúdo didático para as

disciplinas do currículo. Pela primeira vez, em 2018, livros didáticos não foram

adotados pelos professores e o material está sendo acessado exclusivamente

por meio de uma plataforma tecnológica (COLEGIO MATER DEI, 2018c). Em

visitas à escola, foi possível conhecer a sala de aula da turma que participa do

programa, que é um espaço diferente dos demais. A sala é toda forrada por

painéis de lousa branca e as carteiras estão dispostas de modo que podem ser

rearranjadas. Todos os alunos dispõem de Chromebooks por meio dos quais

acessam o conteúdo durante e fora da aula. Sobre os objetivos do projeto, o

site do colégio afirma que: “aceleramos a compreensão do desempenho de

cada aluno e a personalização do aprendizado, facilitando também a mediação

do professor com intervenções pedagógicas mais claras e assertivas”

(COLEGIO MATER DEI, 2018c). Outras duas aplicações da Geekie são

utilizadas na escola, para o ciclo do Ensino Fundamental II: o Geekie Teste

(plataforma de avaliações diagnósticas e somativas) e o Geekie Lab

(plataforma de aprendizagem adaptativa).

2.3. O processo de planejamento de aula e o lugar da tecnologia como

método

Com o objetivo de identificar de que modo o desenvolvimento de

competências midiáticas está posto dentro das práticas e do projeto político

pedagógico da instituição, foram realizadas duas entrevistas com membros da

equipe de coordenação do Mater Dei. A primeira, com um dos coordenadores

25 VALE, 2016.

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pedagógicos de área do colégio26 – Entrevistado 127 –, escolhido para

colaborar com esta pesquisa por (i) ter sido coordenador de tecnologia

educacional da escola; (ii) exercer, atualmente, uma função dupla, na relação

com alunos (lecionando) e com outros professores (como coordenador

pedagógico de área, orientando outros docentes em atividades como

planejamento de aulas, organização de conteúdos em torno do currículo,

formação continuada etc). Na ocasião da entrevista, estava presente também

uma das diretoras do grupo mantenedor do colégio, Weducation, – que será

mencionada nesta pesquisa como Entrevistada 2.

Uma terceira entrevista foi realizada com o atual coordenador de

tecnologia educacional da instituição, referenciado aqui como Entrevistado 3. O

docente tem o papel de receber os planejamentos de aula (elaborados pelos

docentes junto a seus respectivos coordenadores de área) e sugerir o uso de

tecnologias de acordo com os conteúdos e habilidades propostos. As

informações coletadas nas duas entrevistas possibilitam visualizar o caminho

desde o planejamento de aula até a implementação de uma atividade que

envolve tecnologia.

De acordo com o Entrevistado 1, a prática de planejamento pedagógico

era, antes, concentrada em uma semana específica para esta atividade. O

coordenador pontua que esse planejamento era tido como um procedimento

meramente burocrático, no qual os professores listavam conteúdos e

habilidades conforme as orientações do coordenador em um documento que

não era utilizado ao longo do ano e que existia apenas para arquivo. O

planejamento para 2018, no entanto, teve início muito antes do período

tradicional destacado para essa atividade. Segundo o Entrevistado 1, essa

estruturação começou no segundo semestre de 2017 e passou a ter um caráter

26 É comum que as instituições de ensino organizem os professores dos ciclos de Ensino Fundamental II e Ensino Médio em áreas correspondentes aos agrupamentos temáticos do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio). Os componentes curriculares são arranjados nos seguintes grupos: - Ciências da Natureza: Física, Biologia, Química; - Ciências Humanas: Geografia, História, Filosofia e Sociologia; - Linguagens e Códigos: Língua Portuguesa, Língua Estrangeira, Educação Física, Educação Artística; - Matemática. 27 Com a autorização dos entrevistados suas identidades foram preservadas para que fosse possível divulgar o conteúdo completo das entrevistas sem que houvesse qualquer prejuízo aos envolvidos em razão do seu conteúdo.

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de formação dos professores. O entrevistado afirma que foram realizadas

leituras, palestras e oficinas de temas que contribuíssem para que o

planejamento fosse feito “de forma mais longa, mais saudável e que houvesse

um estudo para ser feito” (ENTREVISTADO 1 e ENTREVISTADA 2, 2018).

Além de visar melhorias no processo, para que ocorresse de maneira mais

lenta e produtiva para os docentes, o Entrevistado 1 sinaliza, de maneira

marcante, a necessidade de incorporação de novas metodologias de ensino

que se adaptem ao contexto do aluno contemporâneo e suas necessidades e

demandas:

Não é modismo [...] É entender como o aluno de hoje aprende, se relaciona, para que ele possa aprender melhor ou mais. As técnicas de 10 anos, 15 anos, 100 anos são bonitas só historicamente, mas o aluno não vai aprender. Ele vai sair da sua sala e vai começar a usar dispositivos midiáticos digitais quaisquer, onde ele vai criar a forma dele de aprender, chegando perto de alguém que está mais parelho com isso, e vai se apropriar daquilo que ele precisa. É o que ele quer, não o que eu quero (ENTREVISTADO 1 e ENTREVISTADA 2, 2018).

É pontuada na fala do Entrevistado 1 que a metodologia de ensino é a

principal parte do processo de ensino-aprendizagem que está sendo repensada

na escola de maneira geral — e é nessa parte do planejamento que o

coordenador de área localiza o uso da tecnologia. Os objetivos pedagógicos

especificados a cada planejamento são orientados aos conteúdos temáticos do

material didático, que varia de professor para professor (não há uma matriz

curricular aplicada para toda a escola), e a partir deles derivam-se as

habilidades e competências que o aluno deve desenvolver. O Entrevistado 1

afirma que não há conteúdos, habilidades ou competências ligados e

associados ao uso de tecnologias. Elas são posicionadas, exclusivamente,

como metodologias de apoio para o aprendizado, que visam alcançar um

objetivo pedagógico outro, não associado ao uso de tecnologias. O

desenvolvimento de competências midiáticas, para o educador, “é algo que

acontece de forma bem não-pensada” (ENTREVISTADO 1 e ENTREVISTADO

2, 2018) e que, embora as tecnologias tenham sido sistematicamente usadas

dentro da escola nos últimos quatro anos, “nunca conversamos, em qualquer

nível aqui, sobre habilidades midiáticas, em qualquer uma das nossas

discussões” (ENTREVISTADO 1 e ENTREVISTADO 2, 2018). As tecnologias e

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novas mídias são vistas como ferramentas e recursos de aprendizagem, que

não dispõem de objetivos pedagógicos próprios e, por isso, ocupam um lugar

secundário no planejamento de aula.

O Entrevistado 1 atribui o uso sistemático de tecnologias no Colégio

Mater Dei a dois principais fatores: a curiosidade e afinidade de alguns

professores no trato com as mídias e o apoio do grupo mantenedor

(Weducation) para disponibilização de tempo e recursos (humanos e técnicos)

para o uso desses dispositivos: “temos a liberdade, têm dois ou três que

gostam. Eu vou falar a verdade, eu me divirto com isso, eu gosto que me deem

problemas: ‘vamos resolver tal coisa, como é que faz?” (ENTREVISTADO 1 e

ENTREVISTADA 2, 2018).

A Entrevistada 2, diretora do grupo mantedor, resume: os professores

testam o uso de dispositivos para fins pedagógicos e isso é aceito pela

mantenedora porque a sala de aula “vai dando a munição que a direção e a

gestão precisam para perceber as tendências” (ENTREVISTADO 1 e

ENTREVISTADA 2, 2018). A partir disso, foi se estruturando o uso da

tecnologia como método no lugar do improviso e “quando o método entrou, já

havia um lastro de resultados testados”. A diretora afirma que o que a

tecnologia foi trazida “como um recurso pedagógico, ela nos atende naquilo

que nós precisamos para utilizar o desenvolvimento de competências, para

veicular ideias, para imputar caminhos, melhorar sistemas” (ENTREVISTADO 1

e ENTREVISTADA 2, 2018). Nesse mesmo contexto, é citada a necessidade

de formar o aluno para a universidade como alguém “desbravador” e

“empreendedor”, segundo o Entrevistado 1, “não usando a palavra

empreendedorismo como o cara que vai abrir uma empresa, mas

empreendedor como aquele que vai buscar o que é necessário para conseguir

o que ele precisa”.

2.4. O papel do coordenador de tecnologia educacional

Além do papel estimulante e de gestão pedagógica do professor

coordenador de área, existe na escola uma função de coordenador de

tecnologia educacional, ocupada atualmente pelo professor denominado

Entrevistado 3. Segundo o docente, “o coordenador de Tecnologia Educacional

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é um curador, que vai atrás de tecnologias, de conhecer coisas que podem ser

úteis em sala de aula e apoiar os professores no uso dessas tecnologias (...)

para melhorar o ensino e o aprendizado” (ENTREVISTADO 3, 2018). É um

papel de suporte aos professores de todos os ciclos escolares, a partir das

demandas específicas de cada idade. O entrevistado cita a necessidade que os

alunos de Educação Infantil têm de desenvolver a coordenação motora fina. As

tecnologias adotadas pelos professores, portanto, devem trabalhar com

movimentos mais amplos, diferentes de um tablet, por exemplo. O coordenador

de tecnologia educacional recebe os planejamentos de aula feitos pelos

docentes junto ao coordenador pedagógico de área e sugere o uso de

tecnologias a partir dos objetivos de aprendizagem, conteúdos, habilidades e

metodologias desenhados pelo professor.

O entrevistado afirma que seu papel é importante para o

desenvolvimento de competências midiáticas nos professores. Para o

coordenador, a maioria dos professores que não são “fluentes digitais” se

concentra nos anos iniciais do Ensino Fundamental: “o Google aqui é só a

partir do quarto ano, então os professores do Fund. I, de forma geral, ainda são

muito pouco fluentes”. Além de promover programas de capacitação, o

Entrevistado 3 também atende demandas dos outros docentes de forma

individual e pontual conforme necessário. O coordenador de tecnologia

educacional divide com os coordenadores pedagógicos de cada ciclo a

responsabilidade por capacitar os alunos para o uso de ferramentas que sejam

incorporadas à dinâmica em sala de aula.

Tendo contato com professores e alunos, o Entrevistado 3 aponta que a

diferença no trato das tecnologias entre esses dois grupos está na relação com

o novo e o erro. “É essa insegurança de começar algo novo que não sabe; e já

o jovem (...)não tem medo de errar.” Da parte do professor, há uma “mística de

que o professor sabe tudo, que o professor é perfeito” e que reforça o medo

nos docentes, mesmo em espaços como no Colégio Mater Dei, que o

coordenador considera seguros para errar. Já em relação aos alunos, o

professor atribui a familiaridade com a possibilidade de erros e com o novo aos

fatores externos à dinâmica da escola, que influenciam a educação formal e

informal do aluno, e que demandam que a instituição escolar se atualize para

atendê-lo de forma rápida: “de repente, uma ferramenta que estava atendendo

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muito bem agora, pode ser que daqui a dois anos não atenda mais. Você tem

que estar preparado para tirá-la e pegar outra” (ENTREVISTADO 3, 2018).

Ao ser questionado sobre os possíveis tensionamentos entre

professores e alunos no trato com as tecnologias, dois temas são pontuados na

fala do Entrevistado 3. O docente menciona que os alunos que já “nasceram

com smartphones nas mãos” sabem mexer muito bem com redes sociais, mas

que é necessário formá-los para outros aspectos do trato com as mídias, como

segurança, ou para habilidades outras, como a competência para avaliar e

resolver problemas. Do outro lado, professores ainda não se adaptaram ao

ritmo acelerado do desenvolvimento tecnológico, apesar de serem os

encarregados desse papel formar os alunos. Assim se estabelece um

tensionamento entre a necessidade de desenvolvimento de competências

midiáticas tanto para alunos quanto para professores.

É curioso que haja uma diferença no que diz respeito aos benefícios do

uso da tecnologia entre o discurso institucional, representado nas falas dos

Entrevistados 1 e 2, e o relato do Entrevistado 3, que acompanha o dia a dia

das atividades. Enquanto, institucionalmente, o principal ganho no uso da

tecnologia se relaciona aos aspectos metodológicos, parece que na prática o

benefício mais notável se conecta com os conteúdos. Dispositivos tecnológicos

são usados para expor, de certa forma, a matéria lecionada pelo professor, e

não necessariamente incorporados como um procedimento metodológico para

alcançar objetivos de aprendizagem: “eu usei a tecnologia para ilustrar para

onde vai esse assunto, para onde vai esse conhecimento, onde ele pode ser

aplicado. (...) É entender para que serve, entender para que você tá estudando

isso.” (ENTREVISTADO 3, 2018).

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na sociedade midiatizada, por meio da aproximação da lógica do

software às esferas sociais, cada vez mais é demandada uma intimidade com

os meios digitais interativos, o que é inevitável quando os modos de

conhecimento e de produção são tão dependentes deles. De forma violenta, a

velocidade rege essa relação entre a lógica midiática do software e influencia

nos processos educacionais. Essa é uma violência sutil, que não parte

intencionalmente da escola ou de agentes no processo educativo, mas que é

reproduzida no discurso, muito associado à noção de “demanda” e um “ter que”

relacionado a pressões externas à escola, do sistema na qual ela se insere.

A escola se transforma em ambiente midiático não só pela

disponibilidade dos meios em seu espaço, mas pela incorporação da lógica do

software ao processo educacional. No Colégio Mater Dei, isso é feito de forma

pouco estruturada em termos de planejamento pedagógico. Para alguns, a

tecnologia é um instrumento metodológico que representa uma possibilidade

de atualização das dinâmicas de ensino-aprendizagem. Por outro lado, a

tecnologia ilustra conteúdos e ajuda a dar sentido a eles na sala de aula, que

está distante das transformações tecnológicas externas. Ocorre a midiatização

direta de alguns processos, mas não se passa uma transformação no aspecto

formativo da aprendizagem. Não há objetivos de aprendizagem ou conteúdos

ligados especificamente ao que se diz necessário desenvolver na relação com

as mídias: autonomia, destreza no uso, compreensão contextual da inserção

daquela tecnologia naquele espaço.

Nesse cenário, cabem algumas questões sobre a relação entre

tecnologias, o desenvolvimento de competências midiáticas e a escola. De

partida, vemos que as tecnologias foram para dentro da sala de aula, no

Colégio Mater Dei, inicialmente por iniciativa de alguns professores, com

suporte da mantenedora da instituição. Talvez essa espontaneidade não seja

tão natural assim. Seria essa iniciativa uma manifestação sutil da violência da

velocidade, exaltada pelo prisma da inovação e do discurso positivo sobre a

tecnologia?

É quase consenso que a escola tenha como função formar o aluno para

um mercado de trabalho que vai demandar interação com diversas tecnologias

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— especialmente quando se fala de escolas de alto padrão como o Colégio

Mater Dei, uma vez que o acesso ao desenvolvimento de competências

midiáticas tem como objetivo formar uma tecnoelite apta para o trabalho

imaterial. Partindo do princípio, no entanto, de que o modelo escolar, pelas

suas características inerentes de temporalidades mais lentas (ciclos de

aprendizagem longos, tendência a um currículo fixo, estruturas de espaços e

modelos mais sólidos), estará sempre atrás do desenvolvimento tecnológico

externo à escola, será que faria sentido ter nesse currículo e nessa estrutura

objetivos de aprendizagem específicos relacionados às mídias? Isso não

implicaria em contradições, uma vez que é justo esse tipo de estrutura que não

dá conta da violência técnica da velocidade? Existiria alguma outra janela de

inserção de fato das mídias na estrutura atual da escola e dos processos

educacionais? Há alguma forma de resistência ao caráter violento da

velocidade?

Essas diversas questões, que partem do universo da Comunicação,

evidenciam que é necessária uma aproximação com o campo da Educação.

Levar as lentes comunicacionais para dentro da sala de aula para repensar as

relações dentro da escola a partir dos estudos de cibercultura e mídia pode ser

um caminho para novas possibilidades de formação de um indivíduo crítico,

consciente do seu tempo, capaz de agir e refletir sobre a violência da técnica

no mundo. É preciso envolver toda a comunidade escolar, dispor de espaços

para o pensar comunicacional dentro da escola e, com um olhar crítico e

complexo, perceber quais as mudanças que, de fato, ocorrem a partir da lógica

midiática em ambientes formais de aprendizagem.

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ENTREVISTADO 3, Entrevista II – Conversa com o coordenador de

tecnologia educacional do Colégio Mater Dei. [mar. 2018]. Entrevistadora:

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APÊNDICES

APÊNDICE A – Transcrição integral28 da entrevista “Entrevista I”.

Entrevista I: conversa com coordenador pedagógico de área do Colégio Mater

Dei, realizada em São Paulo/SP, em 09 de mar. de 2018.

Participantes: Entrevistado 1, coordenador pedagógico de área do Colégio

Mater Dei. Entrevistada 2, diretora pedagógica para Línguas Estrangeiras do

Grupo Weducation.

Pesquisadora: Qual é exatamente a sua função dentro da escola?

Entrevistado 1: Sou professor de Biologia, sou biólogo. Depois fui alçado, por

conta da minha afinidade com tecnologia, a coordenador de tecnologia

educacional, que chamamos de TE, e depois disso ainda acumulei a

coordenação pedagógica na área de Ciências da Natureza. Hoje, não sou mais

o TE. Então, essa é a minha função: sou professor de Biologia do 3º ano e

coordenador de Ciências da Natureza.

Pesquisadora: Como vocês chamam aqui na escola esse cargo? É professor-

coordenador de área...

Entrevistado 1: É, coordenador de área. Eu coordeno Física, Química,

Biologia, ciências, e um colega nosso foi fazer um estágio longo na Espanha,

então também herdei Geografia e História dele.

Pesquisadora: Há quanto tempo você dá aula aqui na escola?

Entrevistado 1: Aqui, só 11 anos.

Pesquisadora: Como professor-coordenador de área, qual é a rotina de

planejamento de aula com os professores? De quanto em quanto tempo isso

acontece? Quais são os procedimentos?

Entrevistado 1: Isso é algo que estamos tentando mudar agora. No passado,

tínhamos um planejamento que era feito na ‘semana de planejamento’, um

documento burocrático que nós (eu me coloco porque também faço isso),

preenchemos de forma burocrática, e perguntamos para o coordenador o que

28 Foram aplicadas adaptações gramaticais e formais necessárias, sem prejuízo do conteúdo da entrevista.

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você quer que nós coloquemos aqui: competência? Conteúdo? Então, coloca-

se isso e entrega-se o documento. Nunca mais você o acessa. A partir do ano

passado, com a mudança da direção, começamos a fazer um planejamento

durante todo o segundo semestre. Então, durante o segundo semestre, nas

[inaudível] com os possíveis professores, fui colocando literatura, conversando

com eles sobre metodologias ativas, ensino híbrido, por exemplo... Para que,

ao final do segundo semestre do ano passado (2017), tivéssemos esse

planejamento feito de forma mais longa, saudável e que houvesse um estudo a

ser feito. Claro que tivemos aqueles que se aprofundaram, estudaram mesmo e

aqueles que fizeram dois dias antes da entrega, de forma burocrática. O

interessante é que como isso foi feito durante o segundo semestre e nós

combinamos na coordenação de fazer um planejamento curto e formativo, nós

tivemos oficinas, palestras, um monte de coisa com a mão na massa. Não é

como só palestras, chamar um “bam-bam-bam”, que se destaca para falar

sobre aquela frente da prática do trabalho e todo mundo olha, escuta, anota,

vai embora para casa e ninguém pratica. O pessoal teve que por a mão na

massa. E aí tivemos algo interessante, porque o resultado daqueles que se

prepararam, mais sintonizados com aquilo, que é uma mudança (porque

concordando ou não, é uma mudança), percebemos que os professores saíram

um pouco mais tranquilos e felizes, pensando “sei o que fazer durante esse

ano, entendo o que estão pedindo”. Aqueles que não praticaram estão

desconfortáveis até agora. Claro, estamos muito no começo do ano, algumas

pessoas começaram a chamar e a falar: “- Erramos, eu quero uma prática

disso”. Tanto que agora estamos pedindo. Agora estou pedindo um plano de

aula, por exemplo, uma metodologia ativa: “professores que quiserem, não

considerem isso!”

Pesquisadora: Como assim?

Entrevistado 1: É, que fizessem dois planos, no trimestre, de uma aula com

metodologia ativa. Tem um formulário que adaptei de um livro que lemos e

você tem que me dizer que metodologia vai utilizar, em que aula, com que

turma, qual é a habilidade, qual é o objetivo, e quero sentar com você para ver

se isso está legal, se você se convenceu de fazer isso e para acompanhar você

durante a aula ou depois, para refazermos as coisas. Não é questão de

fiscalização, a intenção é mostrar que as práticas estão mudando em todas as

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profissões que rodam por aí e nós temos que mudar também. Não é mudar

pela mudança, é se apropriar de novas práticas para perceber que você pode

sair daqui, ir para uma outra escola, mas também [inaudível] com as práticas

de forma que o seu aluno que hoje... É uma coisa que eu chamo de

“contemporaneidade”: você, que foi alfabetizada no método montessoriano,

como você disse. O meu aluno, que está sendo alfabetizado hoje (sou

professor do Fundamental II e Médio, então meu foco não é na alfabetização),

ele tem um modo de aprendizagem que é diferente do meu, do seu. Não que o

meu e o seu estejam certos ou errados; ele é só diferente. É contemporâneo, é

o que cabe nesse momento histórico. Daqui a 15 anos, muito provavelmente,

se você me procurar novamente, o que vai acontecer? Você verá alguém

revoltado com a mudança que aconteceu, porque o trem foi mais rápido e eu

não consegui acompanhar. Talvez eu tenha feito a opção de não acompanhar,

já basta para mim, ou alguém tentando entre o novo momento desse grupo de

alunos, que está chegando e vai ter uma visão de mundo e uma maneira de

aprender diferentes das que estamos falando hoje. Também não é modismo,

não é dizer, por exemplo, “é legal vir de verde toda sexta-feira” ... É entender

como o aluno de hoje aprende, se relaciona, para que ele possa aprender

melhor ou mais. As técnicas de 10 anos, 15 anos, 100 anos são bonitas só

historicamente, o aluno não vai aprender. Ele vai sair da sua sala e vai

começar a usar dispositivos midiáticos digitais quaisquer, onde ele vai criar a

forma dele de aprender, chegando perto de alguém que está mais “parelho”

com isso, e vai se apropriar daquilo que ele precisa. É o que ele quer, não o

que eu quero. O que eu quero é diferente do que ele quer, que é diferente do

que o vestibular pede, ou seja, é um jogo de interesses muito severo e cruel.

Pesquisadora: Antes entrarmos nesse tema, professor, eu quero saber se, ao

longo dessa formação que vocês fizeram no segundo semestre do ano

passado, houve algum tema ou objetivo específico com os professores no

aprofundamento do uso de tecnologias especificamente, ou se era só sobre

outros tipos de metodologia.

Entrevistado 1: (...) Vamos separar o uso de tecnologias em: aprender com

uma tecnologia, device ou aparelho (por exemplo, nosso e-book); e como

posso usar esse aparelho, os aplicativos e as tecnologias embarcadas nele

para que eu atinja meu objetivo pedagógico. Então, não é só aprender a usar o

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aparelho, é como eu posso utilizar como ferramenta para atingir meu objetivo

pedagógico. (...) A escola vem proporcionando isso a todo mundo no mínimo

há quatro anos. Aí agora sim, respondendo à tua pergunta: no segundo

semestre do ano passado (2017), o pessoal não foi na utilização de tecnologia

propriamente dita; mas sim uma tentativa de apropriação de novas

metodologias que usem as tecnologias, digitais ou não, de prática de aula, em

sala de aula. Então, veja só, vamos pegar um exemplo que está borbulhando

aí: sou biólogo, vou trabalhar meiose, e vou fazer estações para isso. Se eu

quiser fazer isso direitinho, não vai ser um aparelhinho ali, em cima da mesa,

que vai ser o diferencial, e sim aquilo que eu planejei. Eu não posso fazer uma

rotação de cinco estações, por exemplo, usando só lápis, caneta e papel. São

objetivos diferentes, com atividades diferentes. Se introduzi uma mídia digital

onde passo um filme que vai agregar valor e uma forma diferente de ver aquilo

que eu preciso, fazendo com que o meu aluno chegue no objetivo que eu

quero, melhor. Então, é tirar esse ranço, esse preconceito de que estamos

utilizando a tecnologia porque é moda. Não, estou usando a tecnologia porque

ela facilita o meu trabalho, (...) estou usando a tecnologia porque ela melhora o

meu trabalho. Esse é o meu jeito, espero [inaudível].

Pesquisadora: Vocês têm algum currículo fixo dentro da escola ou os

professores seguem o livro didático que adotam? Qual o referencial? O senhor

mencionou conteúdos e habilidades... Como que a estrutura de currículo está

organizada aqui na escola?

Entrevistado 1: Ela ainda está organizada em cima dos conteúdos, o que eles

[inaudível], o livro, a apostila e agora o que estamos utilizando é uma

plataforma de vestibular [inaudível]. Ela é ainda em cima de conteúdos que são

clássicos: de Física, Química e Biologia daria para o primeiro ano do Ensino

Médio; ABCD; a mesma coisa para o segundo e para o terceiro...

Pesquisadora: Mas existe uma referência para o projeto político-pedagógico

da escola ou cada professor pega isso do livro didático que adota? Existe uma

matriz curricular para a escola toda?

Entrevistado 1: Não. Você fez uma pergunta que eu tenho até dúvida de

responder. No âmbito pedagógico, se não me engano não temos isso

estabelecido. “Nosso primeiro ano do Ensino Médio de Biologia abordará

classificação vegetal”; isso não está determinado lá. O que acontece por conta

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de prática nossa, tanto que podemos fazer, por exemplo, tínhamos, logo

quando eu entrei aqui, biologia celular no primeiro ano e biologia [inaudível] no

segundo. Era uma crueldade com um aluno do primeiro ano, porque é uma

pancada que ele precisa de bases de Física e Química para poder resolver.

Então, trocamos isso, uma troca simples. Não houve uma mudança, mas gostei

da tua pergunta, preciso pensar em algumas coisas aqui. Aí claro que sim,

você tem vícios, eu tenho meu autor preferido, então ele escreveu dessa forma

e eu acabo adotando aquilo. Então a forma como ele colocou, a sequência

como ele colocou, aí depois em cima dessa sequência de conteúdos é que

começamos a achar que habilidade eu consigo trabalhar com isso. Antevejo

um caminho duro e longo na inversão disso, né, de conseguirmos pensar em

que habilidade eu quero trabalhar com os meus alunos no primeiro semestre

do primeiro ano do ensino médio... Até para uma área mesmo, que habilidades

trabalharei de Ciências da Natureza? Ela pode ser comum a todas as frentes, e

aí depois disso que [inaudível], que conteúdos eu encaixo aqui? Por conta do

que, de formação. Aí você já falou de formação: a minha formação, a formação

dos meus colegas foi dessa forma e aprendemos isso como certo, então

repetimos e repetimos. Os meus colegas que estão vindo da faculdade

chegando agora, os recém-formados, vêm com menos referência. É uma

pergunta interessante essa, como isso se perpetue e se autorreproduza.

Pesquisadora: Então o desenvolvimento de habilidades relacionadas ao trato

de tecnologia, (...) é, digamos, uma consequência, como o desenvolvimento de

outros tipos de habilidade? Porque, se eu puxo o planejamento pelo conteúdo,

e a habilidade é algo que o completa num segundo momento, então podemos

dizer que o desenvolvimento de competências midiáticas é uma consequência

do...

Entrevistado 1: Pode ser uma consequência, pode ser um efeito colateral...

Gostei da tua pergunta! Porque é uma coisa que nunca paramos para pensar:

que tipo de habilidade midiática... Agora você me trouxe uma coisa nova...

Midiática... Vai me auxiliar... Eu penso ao contrário. Gostei. É uma

consequência, concordo com você, é uma consequência. É algo que acontece

de forma bem não-pensada. Você está me dando uns toques bons, hein?

Pesquisadora: A partir da sua perspectiva de professor, de educador: por que

você acha que não se pensa sob essa perspectiva de pensar as habilidades ou

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as competências a partir desse lugar, de “como, a partir disso, eu chego num

objetivo de aprendizagem”?

Entrevistado 1: A primeira resposta seria: eu vejo a tecnologia e a mídia como

uma ferramenta. Então, penso em que habilidade eu quero chegar lá na frente,

que conteúdo passo lá na frente. Um exemplo: eu quero construir a minha

casa, ela tem que ter um alicerce. Depois que penso no alicerce (meu objetivo

é esse), as ferramentas que eu vou precisar, certo? Então, essa é a primeira. E

a segunda, vou ser bem sincero, nós nunca conversamos, em qualquer nível

aqui, sobre habilidades midiáticas, em qualquer uma das nossas discussões...

Pesquisadora: Ainda que nunca tenha sido pensado numa perspectiva de

planejamento ou de projeto pedagógico, essas tecnologias foram inseridas nas

dinâmicas educacionais dentro da escola, certo?

Entrevistado 1: Sim.

Pesquisadora: Se não foi por isso, por que foi?

Entrevistado 1: Essa pergunta agora eu estou gostando de responder, agora

você me fez sorrir. Porque temos aqui um grupo de pessoas que são inquietas

[inaudível], estou vendo que está passando no cérebro dela algumas pessoas

do colégio [inaudível] e que, por favor, não é puxar o saco, mas que o

mantenedor da nossa escola, tem uma coisa muito interessante: se você falar

“eu quero usar tal pedreira para fazer tal coisa e quero chegar em tal lugar”, ele

vai olhar para você e vai falar “se você conseguir, vai”. Então, temos essa

abertura. Por exemplo, a professora (nome inaudível) já presenciou aqui um

projeto nessa sala ao lado aqui, eu não tenho que pedir autorização para usar

um programa, um computador para fazer tal coisa. Eu tenho meu objetivo,

quero fazer com que os meus meninos pesquisem em diferentes preparações

de solo e como isso influencia na obtenção de alimento aqui no Brasil. Aliás, foi

até mais ou menos dessa forma que começou por aqui. Então, temos a

liberdade, têm dois ou três que gostam. Eu vou falar a verdade, eu me divirto

com isso, eu gosto que me deem problemas, vamos resolver tal coisa, como é

que faz? Curiosidade: temos alguns desmontadores de relógio. Como é que

funciona esse negócio? Pode ser que não gostemos de outro [inaudível]. Então

começamos a usar de forma aleatória, individual, daqui a pouco um esbarra no

outro e fala “ah, você está fazendo, eu também estou”, começou a ganhar um

corpo, aí o corpo diretivo e os mantenedores viram isso e “opa, está afinado

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com os nossos alunos que estão esperando o mundo lá fora, usando direto”,

não tem sentido mais. Eu sou um daqueles que brigavam: “quero esse celular

desligado e dentro da mochila”, como você fala para um adolescente isso, que

você não quer que ele faça? Você está escancarando e dizendo: “faça e me

desafie”! E aí gera só estresse. E aí, espera, vou usar isso a meu favor!

“Procura aí para mim X assunto”. E aí você começa uma coisa de diálogo, para

abrir ou fechar um assunto... É muito mais tranquilo, hoje eu quero o telefone

em cima da mesa! Até porque, eu tenho mais controle de onde ele está, sei

que ele está sendo usado de maneira adequada e ele me ajuda a trabalhar. Ele

torna meu trabalho melhor e mais fácil. Então isso começou a crescer, aí na

Escola 2 a mesma coisa, tem mais um, na Escola 3 tem um terceiro, aqui têm

mais dois ou três, aí [inaudível] que começamos esse jeito (...) Atingimos uma

massa crítica no grupo, de pessoas que não tem medo de errar, não tem medo

de ouvir um “não” direto, e se não der certo vamos tentar de novo outra coisa

fora daquele escopo tradicional. Agora, é sim uma crítica à classe dos

professores, porque se eu não for para o laboratório (e aqui eu vou utilizar o

laboratório de ciências como modelo), e a minha experiência não der

exatamente aquilo que é previsto no livro, eu não vou, porque não tenho a

segurança de encarar o aluno falando assim: “o meu Ph nessa solução tinha

que dar 4,7 e deu 5,2”. O que acontece? Fecha no erro, deu errado, visto

minha camisa de incompetência que eu não quero vestir. Meu aluno vai me ver

dessa forma. Eu posso fazer a mesma experiência: por que deu 5,2? Eu jogo o

resultado para fazer o que, tentar achar o motivo daquilo e usar isso a meu

favor. Então é uma coisa interessante, né? Vamos tentar, se der errado, deu.

Não tem mais o medo de errar, não... Isso é uma coisa interessante. Aí é que

está, de novo, fazendo um elogio claro ao grupo mantenedor daqui: eles

acolhem você quando quer fazer alguma loucura, desde que não seja uma

loucura cara, vamos deixar isso aqui claro; também o erro não é punido. Claro,

não posso dizer assim: “posso fazer o que eu quero e quando quero”. O erro é

olhado como uma forma de ensaio para você aperfeiçoar a sua prática. Isso é

uma coisa muito tranquila.

Pesquisadora: Professor, o senhor comentou que dá aula aqui há 11 anos. E

de total de profissão?

Entrevistado 1: Você quer saber a minha idade agora?

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Pesquisadora: Não é a idade, é o tempo de profissão. Alguns começaram

muito cedo, outros começaram mais tarde...

Entrevistado 1: De forma contínua como professor em comecei em setembro

de 1989. Nunca mais! Antes disso, eu já tinha dado algumas aulas particulares

e passei no concurso do “Mobral do Jânio”, dei aulas para educação de

adultos. Era mobral ainda, acho que dois ou três anos depois que virou

educação de adultos. Bem, então eu estou aí para completar 30 anos mais ou

menos.

Entrevistado 2: Eu estava contando para Melina que nós temos muitas

histórias [inaudível]. No caso da minha área, tem muita gente testando coisas,

mas porque trouxe, descobriu por um perfil pessoal, estuda, traz. Na hora que

traz a proposta, é sempre muito bem aceita. Obviamente há filtros. Não dá para

dizer “hoje vamos pintar todas as crianças de roxo” porque, enfim... Mas esse

viés de pensamento do professor [Entrevistado 1] é sempre muito bem-vindo

na sala de aula porque isso vai dando a munição que a direção e a gestão

precisam para perceber as tendências [inaudível]. Ao longo disso, temos

pessoal estudando. [inaudível] Fomos diminuindo a questão do improviso e

começando a colocar a questão do método. Quando o método entrou, já havia

um lastro de resultados testados que formaram a base de onde “não, temos

uma experiência aqui, jogou tudo fora o que não servia e aí resolvemos abrir

essa história de que...” Ah, e nós também pegamos [inaudível]. Nós tivemos

que escolher a tendência de uso, o que foi uma coisa importante. Então, o

nosso modus operandi pedagógico continua com os mesmos princípios. O que

nós fizemos foi trazer a tecnologia como um recurso pedagógico, quer dizer,

ela nos atende naquilo que nós precisamos para utilizar o desenvolvimento de

competências, para veicular ideias, para imputar caminhos, melhorar sistemas.

Pesquisadora: Tecnologia é um canal, certo? Tecnologia para...

Entrevistado 2: Exatamente. [inaudível] A velocidade, a rapidez e a gratuidade

que nós temos é muito... [inaudível] Isso para nós é um desafio, porque isso na

sala de aula o seu aluno faz, ele dá o check e se não provou, você “dança

redondo”; mas ele também desenvolve a percepção de que é possível construir

algo além [inaudível].

Entrevistado 1: Só para eu fazer um parênteses: bom o suficiente, quando ela

fala, é bom o suficiente, sim, em dominar pedagogicamente o que você tá

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fazendo, o seu conteúdo também; mas bom o suficiente também para ter a

segurança de falar “isso eu não conheço, vamos pesquisar juntos” e se

apropriar daquele conhecimento novo junto com o aluno e não usar isso como

uma afronta, como muitos ainda veem...

Entrevistado 2: É, isso para mim não é uma afronta, é uma maneira de...

Entrevistado 1: De aperfeiçoamento!

Entrevistado 2: Nós somos um grupo, [inaudível] se queremos esse aluno lá

na universidade como o esperto que a universidade quer, alguém que leia, que

seja desbravador, que seja crítico e etc. Nós, da Educação Básica, temos que

mandar esse aluno para lá. [inaudível] Queremos entregar o pacote com aquilo

que nos é possível, que nos é devido do ponto de vista ético [inaudível]. Não é

isso, professor?

Entrevistado 1: É, concordo. [inaudível] É um retrato, mesmo. O compromisso

das pessoas que estão nessa pegada... Vou resumir [inaudível] não usando a

palavra empreendedorismo como alguém que vai abrir uma empresa, mas

empreendedor como aquele que vai buscar o que é necessário para conseguir

o que ele precisa. Então, nessas duas palavras, temos muita gente

compromissada, é interessante.

Pesquisadora: Nesses quase 30 anos de docência, quais as principais

mudanças que você percebe no seu alunado? Estamos sempre falando sobre

família, o “mundo lá fora”, diversidade. Existe sempre uma expectativa com

esse “mundo lá fora” e eu acho que o aluno chega com isso ali nele, certo? Eu

queria saber se, especialmente, nesses quatro anos em que a tecnologia foi

inserida metodologicamente e não só instrumentalmente aqui, qual foi a

principal mudança que você sentiu do que vem do alunado? Que desafio isso

proporciona para quem está na atividade docente?

Entrevistado 1: Aí é que está, porque o meu início de carreira foi em escola

pública. Aliás, eu trabalhei em uma escola que estudei. E, ali, naquele começo,

eu tinha um grupo de alunos que via na educação uma forma de mudar a sua

realidade. Então, existia, dentro das carências todas que podemos listar,

sempre um grupo querendo fazer daquilo um degrau para sair. É interessante

isso, porque era um trampolim para tentar sair dali. Fui mudando, fui para a

escola particular e, também, no meu começo de escola particular existia esse

perfil de pessoas que procuravam algo para manter seu status social e

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socioeconômico e até para mudar sua posição. Mas, agora, nesses últimos 10

anos, eu tenho percebido uma coisa um tanto quanto diferente, que são

pessoas que estão com a vida o tanto quanto feita, mais tranquilas, e procuram

ferramentas para manter essa tranquilidade. Então, a educação como algo de

mudança... Claro, sempre tem um ou dois, mas no geral não percebo mais. E

aí que vem o Dom Quixote que coloca “ó, esse aluno vai trabalhar lá fora, vai

ser um cidadão...” Eu tenho que colocar, mesmo que ele não queira, mesmo

que não perceba, todas as ferramentas, os instrumentos para que ele seja

alguém socialmente... A palavra “adequada” não é adequada. É alguém

socialmente capaz de conviver, de interagir e de fazer com que quem está em

volta dele... Essa é uma coisa que eu tenho muito... Quando educo alguém,

não estou educando só ele, estou fazendo como se fosse aquela pedrinha no

lago, que a onda se propaga e tenho um escudo, uma onda em volta que tenho

repercutindo. Com isso, aí vem a parte romântica, ideológica, de estar fazendo

algo melhor para todos os que estão em volta dessas pessoas. Daí, que vamos

para cima, vamos trabalhar com prazer.

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APÊNDICE B – Transcrição integral29 da “Entrevista II”

Entrevista II: conversa com o coordenador de Tecnologia Educacional do

Colégio Mater Dei, realizada em São Paulo/SP, 13 ma. 2018.

Participantes: Entrevistado 3, coordenador de Tecnologia Educacional do

Colégio Mater Dei.

PARTE 1

Pesquisadora: Há quanto tempo você leciona?

Entrevistado 3: Olha, para valer mesmo, desde 2010.

Pesquisadora: Desde quando você leciona aqui?

Entrevistado 3: Aqui no Mater Dei, desde 2015.

Pesquisadora: Como TE, você está nessa posição desde quando?

Entrevistado 3: Desde maio do ano passado. Não tem nem um ano ainda.

Pesquisadora: Qual a função de um professor-coordenador de Tecnologia

Educacional?

Entrevistado 3: Na verdade é só coordenador de Tecnologia Educacional... Eu

também sou professor de Programação e Robótica e, até o ano passado, eu

dava aulas de Matemática para o Ensino Médio. No primeiro ano, só. Antes de

vir para o Mater Dei eu dava aulas de Matemática para o Ensino Médio

completo, do primeiro ao terceiro.

Pesquisadora: Qual é a função do TE?

Entrevistado 3: É um pouco difícil de explicar, porque é uma profissão nova,

até pouco tempo atrás não existia o coordenador de Tecnologia Educacional e

eu estreei no ano passado nessa função. Mas, resumidamente, o coordenador

de Tecnologia Educacional é um curador, que vai atrás de tecnologias,

conhecer coisas que podem ser úteis em sala de aula e apoiar os professores

no uso das tecnologias em sala de aula para melhorar o ensino e o

aprendizado. Basicamente, é isso: tentar aproveitar toda essa tecnologia que

está aí fora e aproveitá-la dentro do contexto educacional. Às vezes, acontece

29 Foram aplicadas adaptações gramaticais e formais necessárias, sem prejuízo do conteúdo da entrevista.

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por acaso. Estou numa sala, vendo uma aula de um professor e, de repente, eu

sugiro: “você quer fazer tal coisa, usando tal tecnologia, mostrar esse assunto

de uma maneira diferente, envolvendo o aluno, ou que ele experimente aquele

mesmo assunto de uma maneira mais dinâmica?” E, assim, as coisas vão

aparecendo.

Pesquisadora: Seu maior papel de suporte é com o professor?

Entrevistado 3: Sim, de suporte ao professor. Tanto que eu parei de dar aulas

para dar apoio aos professores, para ter mais tempo de ajudar os professores.

Pesquisadora: Isso se aplica aos professores de todos os ciclos, do Infantil até

o Médio?

Entrevistado 3: Todos. Apesar de eu ter começado com o Ensino Médio o

meu caminho com tecnologia, desde o ano retrasado, antes mesmo de virar

coordenador de Tecnologia Educacional, comecei a explorar Educação Infantil,

Fundamental I, Fundamental II. Estou tentando ir por todos e por todos fiz

alguma coisinha, já. Entre todos os níveis, o desafio maior é justamente os

menores, achar tecnologias viáveis, interessantes e que façam sentido para os

pequenos. Mas achamos, sempre.

Pesquisadora: Existe alguma demanda específica para cada ciclo escolar ou

alguma peculiaridade que você tenha reparado? Diferenças de tipo de

demanda...

Entrevistado 3: O maior desafio do Infantil. De início, por exemplo, o pessoal

vem muito com tablets, computadores, essas coisas. Não dá para dar isso no

Maternal, né? Como é que você usa isso? A demanda deles é diferente. E tem

outra coisa com a qual também temos que tomar cuidado: na Educação Infantil,

nas idades iniciais, a criança trabalha na parte de motricidade, habilidades

motoras, e aí como um tablet é uma coisa pequena, você precisa então achar

tecnologias que trabalhem com movimentos mais amplos. Nós procuramos e

achamos tecnologias, como, por exemplo, o Ozobot, do qual você já ouviu

falar, que é um robozinho de rabiscar... A criança rabisca em papel grande,

você faz trabalhos psicomotores com elas e ao mesmo tempo insere a

programação com esses robozinhos, com cores. Quer dizer, é mais voltado

para a criança.

Pesquisadora: E aí, conforme a criança cresce, for passando os ciclos...

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Entrevistado 3: Vai aumentando a complexidade, trabalhando com outras

coisas. Até com o próprio Ozobot você pode trabalhar coisas mais elaboradas,

e aí começamos a usar outras plaquinhas, que nem o [inaudível], que tem

múltipla abertura e movimentos mais leves para usar no Fundamental I.

Pesquisadora: Você é envolvido no planejamento de aula ou isso fica a cargo

de cada professor?

Entrevistado 3: Hoje, fica a cargo de cada professor e de cada coordenador

de área. Aqui no Mater Dei, tem um coordenador para cada área, então no

Fundamental II ou do Ensino Médio tem o coordenador de Ciências da

Natureza, tem o coordenador de Matemática... São eles que cuidam do

planejamento. Agora, eu recebi esse planejamento, então eu olho e fico

tentando achar coisas para colaborar com esses planos de aulas. Os

coordenadores compartilharam recentemente comigo os seus planejamentos e

o meu trabalho é olhar para ver se tem algo que eu possa colaborar.

Pesquisadora: Já vem muita coisa no planejamento com tecnologia ou você

percebe que...

Entrevistado 3: Depende do professor. Tem professor aqui que, como o Mater

Dei já é uma escola que, há muito tempo nessa história de mexer com

tecnologia, já está trabalhando mais nisso, já está com a cabeça lá... Mas ainda

tem alguns que precisam melhorar nessa parte, ainda tem professor que faz o

seu planejamento de forma convencional. E é, por sinal, esse um dos motivos

de eu ter largado as aulas neste ano, um dos meus desafios é justamente

pegar esses remanescentes e convertê-los para esse novo modelo.

Pesquisadora: Há uma função importante nesse momento de desenvolver

competências midiáticas com os próprios professores?

Entrevistado 3: Exatamente.

Pesquisadora: Não precisa citar nomes: quantos por cento precisam de

ajuda...

Entrevistado 3: Nossa, eu nem sei dizer quanto em percentual! Mas diria

assim: principalmente no Fund. I, temos muitos professores, até porque, como,

por exemplo, o Google aqui é só a partir do quarto ano, então os professores

do Fund. I, de forma geral, ainda são muito pouco fluentes no digital. Eu vou

começar agora o trabalho de fluência digital com eles, deles se apropriarem

mesmo dos computadores e os professores ficarem mais à vontade de

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trabalharem com esses níveis. No Fund. II e no Ensino Médio são dois ou três

professores que precisam “dar uma trabalhadinha”. O restante já está bem à

vontade.

Pesquisadora: Na dinâmica desses professores um pouco menos fluentes

digitais com os alunos, tem um tensionamento ou eles já vêm mais fluentes que

os professores? Vocês já perceberam alguma coisa...

Entrevistado 3: O que acontece, isso “já rola”, né? De forma geral, mesmo as

crianças, uma coisa que temos trabalhado muito aqui e tem uma preocupação

muito grande, apesar do pessoal já ser nativo digital (que é um termo que o

pessoal usa)... Eu sou um cara de TI, tá? Então, antes de dar aula, eu trabalho

com desenvolvimento de sistemas, com tecnologia, sempre fui voltado para

isso... Quando eu começo a trabalhar para valer com eles, percebo que eles

não dominam tanto assim. Eles sabem mexer bem em redes sociais, se viram

bem... Mas nós temos todo um trabalho de cidadania digital para esclarece-los

melhor sobre o uso dessas tecnologias, de forma que eles tenham

preocupação com senhas, fraudes... Nós temos que [inaudível] essa criançada

vai trabalhar com computador lá na frente, eles precisam estar muito cientes do

que tem que trabalhar. Só que eles nasceram com smartphone na mão e aí, é

uma coisa que eu até comentei com o meu pai, que assim: “Pai, o professor é

uma pessoa com outra qualquer! Essas pessoas, como eu e a diretora, são

pessoas que não tiveram uma educação voltada para a tecnologia, então nós

não sabemos tudo de computador! Tem pessoas que não sabem nem mexer

em um caixa eletrônico no banco, né? Então, as pessoas têm lá uma televisão

com cabo HDMI, e elas nem sabem o que é isso! Está lá, a televisão na casa

dela e ela não sabe.” Então, de forma geral, as tecnologias chegaram muito

rápido e as pessoas que são da década de 1970, 1980 e 1990 não pegaram

ainda a coisa. Como eu sou professor de tecnologia, peguei e estou usando

esse conhecimento para tentar atualizar e colocar essas pessoas em dia com

esse tipo de conhecimento; até porque eu coloquei uma vez assim: “Gente, os

pais dessas crianças sabem mexer com computação?” Não. “Os professores

sabem?” Não. Então, quem é que vai orientá-los? Nós temos que preparar os

professores para eles poderem moderar, mediar... E, então é esse o trabalho,

temos que chegar para os professores e dizer: “Gente, vocês têm que estar um

pouco mais à vontade”, até porque alguns professores pedem para que eu ou o

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professor de TI ajudem sempre... Você está passando a imagem para essas

crianças que toda hora vai ter alguém para ajudar, e não vai! Eles vão ter que

“se virar”. Haverá trabalhos que eles terão que fazer, em que eles vão abrir um

computador, uma continha no serviço que ele vai ter que usar, uma ferramenta

que ele vai usar no trabalho dele... Ele vai ter que fazer isso fluentemente!

Pesquisadora: Com independência?

Entrevistado 3: Exatamente, fluência digital. Eu não conheço nenhuma

profissão que não use computador. Não conheço! Você tem que se virar, o

computador vai ser caneta, lápis, borracha e computador é material! Tem que

“se virar”.

Pesquisadora: Você comentou agora que existe essa preocupação em formar

o cidadão digital. Alguém que realmente tenha fluência, que saiba se proteger,

tem aí todo um espectro de habilidades ou competências... Isso está previsto

em algum documento pedagógico ou tem alguma referência ou currículo

específico?

Entrevistado 3: Na verdade, não. Não está em um currículo específico aqui,

mas nós temos trabalhado com alguns sistemas. Por exemplo, recentemente

teve a Semana de Segurança na Internet. No sexto ano e nos anos em que eu

dou aula de Programação peguei um joguinho do Google que tinha os quatro

assuntos para avaliar se uma informação é falsa, de como cuidar de senhas,

de como trabalhar as amizades nas redes sociais... Era um game, mas ele era

focado nesse assunto. Também tem outros materiais que nós trabalhamos.

Agora, nós queremos resgatar um outro material, um outro trabalhinho que

temos que fazer em cima dos outros anos... Todo ano nós tentamos voltar, às

vezes, pulamos um ano para não ficar muito repetitivo, mas nós vamos voltar

com um outro material que usamos com toda essa parte de fraudes, como

cuidar de senhas, o fake news - que está na moda agora -, fazer buscas na

internet, como verificar se uma informação é ou não confiável, como que avalia

se isso está certo ou não... Como você faz isso? Então, nós temos todo um

trabalhinho que colocamos no meio das aulas em algumas semanas como um

projetinho...

Pesquisadora: Mas isso separado dos outros conteúdos dos...

Entrevistado 3: É, exatamente. Isso é separado.

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Pesquisadora: Retomando um pouco sobre os recursos da escola. Quais

cursos digitais ou tecnológicos estão disponíveis para os professores hoje?

Entrevistado 3: Bem, essas duas salas, aquele armário ali que está cheio de

Chromebooks, tem 60 e poucos Chromebooks. No Ensino Médio, a partir

desse ano, cada aluno já tem o seu Chromebook pessoal, então fica com ele...

Esses aqui são compartilhados com o Fund. II e um pouco com o Fund. I, que

são o quarto e quinto ano que usam. E aí, projeção... E agora também temos

quase pronto ali do lado o nosso “Espacinho Maker”...

Pesquisadora: A professora me mostrou o laboratório.

Entrevistado 3: Sim, está quase... O problema é que o grupo também está

passando por um monte de reformas, então, atrasou um pouquinho. Já era

para estar pronto, mas acredito que em até mais uma semana deve ficar pronto

nosso “Espacinho Maker”. Vai ter uma capacitação, e até os projetinhos que

estou propondo aqui já puxam um pouco para o lado maker, os trabalhos que

estou fazendo com a professora de Artes, com a professora de Português que

já puxam para esse lado... E aí é envolver a criançada na questão do “resolver

problemas”. A questão final é sempre essa: tá aqui o problema, resolva. Você é

capaz de resolver problemas de forma independente? E aí é estimular a

criatividade, a capacidade de resolver problemas, de pensar...

Pesquisadora: Qual foi a última atividade com os alunos que você

acompanhou ou interagiu diretamente com eles, já que você falou muito sobre

os professores? Qual foi a última interação que você teve com os alunos?

Entrevistado 3: É que assim, como eu sou professor de Programação e

Robótica, ainda estou em sala de aula para isso. A minha parte aqui de

Programação e Robótica é justamente raciocínio lógico, intervenções de

resolução de problemas e com atividades diferenciadas, algumas com

computador e algumas sem. Por exemplo, vai ter um projeto agora que vamos

retomar [inaudível] em 2015, quando eu entrei aqui, aí nós vemos o quanto

melhoramos de 2015 para cá... Estamos resgatando esse projeto e fazendo a

versão dois dele. Eu falei: “vamos pegar esse projeto, que foi o primeiro que

nós fizemos, agora vimos que dá para melhorar muito ele e vamos fazer a

versão 2”. Por exemplo, na aula passada do sexto ano, eu comecei uma

atividade de eletricidade com eles: colamos papel alumínio no papel, LED,

bateria, explicamos como funciona um circuito elétrico, que junto com a aula de

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Programação e junto com a aula de Artes e de Português, nós vamos fazer uns

robozinhos com material reciclável. Junto ao terceiro ano também vai “rolar”

como funciona a coleta de lixo eletrônico, como eles são tratados, essa parte

de conscientização, de sustentabilidade...

Pesquisadora: “Programação e Robótica” é uma disciplina ou...

Entrevistado 3: É uma disciplina, com estrutura...

Pesquisadora: Com estrutura curricular, como Português, Matemática?

Entrevistado 3: Isso. Exatamente. São duas aulas por semana em cada uma

dessas turmas aí.

Pesquisadora: De quais ciclos?

Entrevistado 3: Por enquanto, do sexto ao nono, mas vamos entrar com

material desde o Infantil.

Pesquisadora: Você aplica treinamentos aos professores?

Entrevistado 3: Sim, temos capacitações.

Pesquisadora: Quando foi a última capacitação?

Entrevistado 3: Eu mesmo não tive, não fui eu que dei, mas teve capacitação

para os professores duas semanas atrás. Acho que todo mês tem.

Pesquisadora: Para os alunos, há algum tipo de treinamento específico?

Entrevistado 3: Teve, então, por exemplo, no sexto ano, eles começam para

valer a trabalhar com o Google Classroom, até o quinto é mais ou menos, mas

o sexto é para valer. Então, por exemplo, eu e a coordenadora do Fund. II e

Médio entramos no sexto ano para trabalhar, especificamente, o Classroom:

“Ó, como é que funciona o Classroom: os professores vão até a sala de aula, é

aqui que vocês vão colocar as suas tarefas, vão acompanhar, é aqui que vocês

vão entregar, é aqui que “o mundo vai andar” esse ano com vocês”. Vira e

mexe, damos uma pausa porque nós percebemos que alguma ferramenta não

está funcionando adequadamente, então, nós pausamos e falamos: “Vamos lá.

Eu vi que alguns de vocês estão um pouco perdidos ainda com esse assunto,

então vamos dar uma revisada... Como é que copia documento do Drive, como

é que...” porque alguns já sabem, outros não sabem...

Pesquisadora: Como é foi o treinamento, a recepção disso para os alunos?

Como você avaliou isso?

Entrevistado 3: Foi tranquila... A maioria da sala já tinha algum conhecimento,

alguns deles já tinham um conhecimento do uso, já sabiam usar mais ou

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menos, mas de maneira geral, essa turma do sexto ano... Vai ficando cada vez

mais fácil, a maioria está aceitando trabalhar com esse tipo de coisa. Alguns

não gostam muito porque, por exemplo, perde a desculpa de que não sabia,

que faltou... Hoje eu já falo para eles que não tem mais desculpa, só se você

tiver internado, em coma no hospital! Numa caverna que não tem eletricidade,

não dá para ver nem celular, então você não tem como ver! Mas, se você

estiver em qualquer lugar, você consegue abrir seu Google Classroom, olhar a

sala de aula e dizer: “É, eu faltei tal dia e vou ver, pelo menos, o que

aconteceu”. Você não chega no outro dia perdidão.

Pesquisadora: Quando foi esse treinamento de Google Classroom que vocês

fizeram no sexto ano?

Entrevistado 3: Tem umas três semanas, mais ou menos.

Pesquisadora: Qual foi a última vez que você precisou dar algum tipo de

orientação mais profissional, de ensinar para algum professor como usar

alguma tecnologia?

Entrevistado 3: Ontem! Atualmente, eu tenho feito muita coisa “mano a mano”,

pego algum professor e, por exemplo, eu já usava Matemática e tem alguns

professores que já usavam o Khan Academy, então semana que vem começa

o “Desafio Khan Academy”. E tem alguns professores que ainda não conhecem

ele. É uma ferramenta muito boa, até para você fazer trabalhos personalizados,

acompanhar o que os alunos estão trabalhando, treinar... Ontem mesmo eu

mostrei essa ferramenta a uma professora do quarto ano e outra do quinto.

Expliquei como funciona, abri a telinha. Na sexta, nós vamos colocar o quinto

ano para trabalhar. Eu vou ajudar a professora a colocar os alunos do quinto

ano para trabalhar a ferramenta, que é muito boa para essa parte matemática,

principalmente. Se bem que ela tem Física e Química, mas é uma

especialidade. Desde as séries iniciais, para Matemática, ela é excelente.

Pesquisadora: Você identifica alguma diferença específica quando um aluno

está aprendendo a utilizar alguma plataforma ou uma tecnologia e um

professor?

Entrevistado 3: Claro. Não é o professor, são os adultos. A questão é o adulto

e o jovem. É que a educação que nós tivemos, a anterior, é de aprender uma

coisa e fazer isso o resto da vida, então não tem mais a necessidade de

aprender coisas novas. Mas tem, né? Alguns professores são mais assim... É

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engraçado, essa sensação de “pô, eu sou tão experiente nessa área, e agora,

de repente, começar de novo”. É essa insegurança de começar algo novo que

não sabe. E já o jovem não tem medo de errar! A situação é a mesma, se der

errado, ele arruma, pergunta mais... O professor, adulto, é um pouco mais

medroso. Ele não quer arriscar muito. Uma neurocientista falou assim: “Quando

você for fazer alguma coisa nova, você analisa, verifica as possibilidades e

arrisca alguma coisa”. Um adulto pode demorar dias para tomar a decisão do

que ele vai fazer, o jovem demora três milésimos de segundo para fazer isso! A

ideia é a mesma, a diferença é que em três milésimos eu já tomo a decisão e

aperto o botão, o outro fica ali, olhando, pensando em que botão ele vai

apertar.

Pesquisadora: Talvez a diferença seja a relação com o desafio e o novo?

Entrevistado 3: Exatamente. Acho que, talvez, o ser professor é pior. Aquela

coisa, aquela mística de que o professor sabe tudo, que o professor é perfeito...

Ele não quer errar.

Pesquisadora: Mesmo em espaços seguros?

Entrevistado 3: E que permitem! Eles não querem ter esses riscos, porque

quando nós começamos com coisas novas, existe o risco de algo não dar tão

bem quanto se esperava. Faz parte, quando você faz uma coisa nova, pode

dar tudo do jeitinho que você pensou, pode ser menos e pode ser até mais,

bem melhor que esperado!

Pesquisadora: Você acha que essa familiaridade com o novo, com a

possibilidade de fazer coisas e escolhas novas, e a questão de tudo ser muito

rápido com os jovens, você acredita que isso está relacionado a quais fatores?

Entrevistado 3: Na minha opinião, posso até estar enganado, depende muito

da educação que as pessoas tiveram, a “educação da Revolução Industrial e

da linha de produção”, aprender alguma coisa mecânica e fazer ela para o

resto da vida. Você não é treinado a sempre aprender coisas novas, a ter que

se reinventar. As pessoas têm dificuldade de mudar, se reinventar. De forma

geral, as pessoas não foram educadas para isso. Talvez, eu tenha dado sorte

de, nos anos 1980, ter começado a mexer de cara com computação, que está

toda hora mudando... Você é obrigado a se reinventar toda hora, se acostuma

a fazer isso. Nos outros tipos de atividades, não é tão comum que você tenha

essa necessidade de se reinventar. Algumas profissões sim, como Medicina...

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E mesmo assim, em Medicina você pega aqueles médicos que tem aqueles

consultórios pequenos o tempo todo, ele não está andando pelo mundo, vendo

coisas novas. Você vê que aquela pessoa está lá, parada nos anos 1970 e

1980. Parou lá, ela estacionou ali. Aí você “pega” outras pessoas, que já estão

no século XXI, o mundo veio andando e elas vieram junto, e outras pessoas

param em um certo ano e continuam ali, estacionadas, e tem dificuldade de

aprender de novo. Elas não foram preparadas para aprenderem coisas novas o

tempo todo e esses jovens vão precisar disso... Porque as profissões, as áreas

de trabalho, as profissões novas estão aparecendo e sumindo mais

rapidamente. A necessidade de se reinventar vai ser mais constante. Isso está

chegando na escola também. Isso já está acontecendo lá fora, no mundo, faz

tempo! A escola até demorou para sentir o impacto, e agora a escola está

sentindo isso. As gerações vão vindo cada vez mais diferentes, os alunos, a

cada três anos, o perfil deles muda muito. Aquilo que você usou para treinar,

educar, trabalhar com uma turminha agora, de repente, daqui a três anos nem

funciona! Você vai ter que reinventar. De forma geral, os professores estão

entrando nesse processo agora, outras carreiras já entraram nesse processo e

os professores, eles não estão preparados para isso. É como “eu tenho que

mudar, mas eu nunca fui preparado para mudar”. Escuto assim: “ah, eu dou

aula há 25 anos...” e é um jeitinho, né? Do mesmo jeitinho, durante 25...

Pesquisadora: Deixe-me ver se eu entendi a sua perspectiva: são dinâmicas

externas à escola que influenciam a formação e as outras educações pelas

quais o aluno passa e aí a escola que está “correndo atrás” desses ajustes.

Entrevistado 3: Exatamente. Agora a escola está sentindo mais o impacto das

diferenças dos alunos que estão chegando, e do mercado de trabalho, do

“mundo lá fora” que elas vão ter que encarar. Você, como professor, se quiser

ficar um tempo na escola, você fica, mas a criança vai lá para fora... E o mundo

está mais dinâmico. Nós temos que preparar essas crianças para esse mundo

mais dinâmico. Consequentemente, temos que ser um pouco mais dinâmicos

também. Como vamos ensinar o mundo dinâmico se nós não formos

dinâmicos? Temos que ser um pouco mais flexíveis, mais resilientes,

preparados para mudar as coisas... De repente, uma ferramenta que estava

atendendo muito bem agora, pode ser que daqui a dois anos não atenda mais.

Você tem que estar preparado para tirar ela e pegar outra.

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Pesquisadora: Eu imagino que, apesar dessa facilidade que os alunos têm,

nem sempre as coisas fluem como...

Entrevistado 3: Não. Eles têm muita dificuldade de resolver problemas. As

crianças têm muita dificuldade. Eles são bons quando eles pegam algo que já

está funcionando do jeito que eles estão acostumados, quando as coisas não

funcionam do jeito que ele está preparado, ele não percebe muito bem como

corrigir. Eles têm dificuldades em contornar problemas.

Pesquisadora: É uma questão de falta de autonomia, de mindset?

Entrevistado 3: São várias coisas. Acho que também tem muita superproteção

dos pais que querem dar tudo de mão beijada para eles, não querem que eles

sofram... E aí, facilita. Não deixam eles se frustrarem. Ninguém quer deixar a

sua criança se frustrar, e quando você falha e não consegue resolver, é

frustrante! Mas tem que passar por isso, tem que passar pelo “opa, não

funcionou, como é que resolve?” Eles não são de parar, sabe? “Para, vamos

observar o mundo um pouquinho aqui, o que você está lendo aqui? O que você

está lendo ali?” Eles são muito apressados, e aí, mesmo com a tecnologia, tem

horas que você tem que parar um pouco. Pare, olhe, analise, pense um pouco

e aí você faz. Nem tudo dá para resolver em 30 segundos, tem coisas que

precisam de dois minutos, cinco ou, de repente, o dia inteiro resolvendo. É de

acordo com problema, mas a maioria deles tem uma dificuldade muito grande

em demorar mais do que 30 segundos para resolver qualquer coisa. Qualquer

probleminha, demorou 15, 30 segundos para resolver: “Eu não consigo! É

impossível!” É uma ansiedade e, gente, você pensou quanto? 10 segundos?

Relaxa um pouco.

Pesquisadora: Qual você acredita que é o principal ou são os principais

ganhos ou benefícios pedagógicos específicos quando se usa tecnologia como

recurso de aprendizagem?

Entrevistado 3: Tem várias coisas que você pode usar. Por exemplo, eu tenho

muito mais experiência, agora que estou como coordenador, estou tentando

pegar as outras séries, as outras áreas... Mas tenho muita experiência, por

exemplo, com Matemática. Por isso eu usei tecnologia para explicar coisas no

Ensino Médio que era, para muita gente, sem sentido e não servia para nada...

Era só para estar na aula! Por exemplo, a Função Trigonométrica. Se você

pegar no livro, não quer dizer nada, é uma ondinha lá que aperta e desaperta e

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pronto, acabou, não tem mais nenhum uso no livro. Aí você pega a

Trigonometria e começa: “Vamos lá, vamos fazer uma brincadeirinha aqui. Eu

vou pegar essa função seno e vou colocar aqui nessa ferramenta que é

geradora de áudio. Então, pronto, 440 Hz é a nota A da música. Para que

servem essas funções trigonométricas? Umas das funções, por exemplo, é

qualquer objeto que emite som, você decompõe [inaudível] e, através da

Trigonometria, você consegue virar efeito”. Então, eu usei a tecnologia para

ilustrar para onde vai esse assunto, para onde vai esse conhecimento, onde ele

pode ser aplicado. Como que faz a prospecção de petróleo? Será que alguém

vai lá com uma lente e mede 15 km de profundidade? Não, são pequenas

explosões em que você pega a imagem da onda sonora ou coloca senos e

cossenos para descobrir o que tem lá dentro. E outras coisas que eu faço:

planilha para trabalhar dados, que é o assunto de conjunto no primeiro ano,

que na verdade são “dados” ... Aí eu mostro a relação entre o mundo dos

bancos de dados com o conjunto de matemática e, pessoal, é a mesma coisa!

Só mudou a linguagem!

Pesquisadora: Esse benefício está mais relacionado ao conteúdo?

Entrevistado 3: Sim. Na verdade, é a aplicação, entender para que serve, para

que você está estudando isso. É, por exemplo, onde chegam essas coisas?

Onde essas ferramentas são usadas e trabalhadas? “Mas eu vou trabalhar com

‘isso’, não vou usar” “Ah, você vai trabalhar com Medicina? Vai sim, toma

remédio, decompõem-se os alimentos no seu corpo, tem um pouco de química,

tem um pouco de progressão geométrica, você tem que trabalhar de tantas em

tantas horas um remédio...”. É tentar fazer essas relações e aproveitar essa

tecnologia para fazer essa ilustração. E, às vezes, para brincar mesmo! Por

exemplo, tem umas ferramentas de “gameficação” que você faz perguntinhas

na tela, mas é uma coisa dinâmica, parece um jogo. Por que as crianças

gostam de game? Porque é feedback imediato, eles gostam desse feedback

rápido. Então, você aproveita isso. A primeira vez que eu usei uma ferramenta

de “gameficação” foi para fazer perguntinhas sobre geometria espacial. O

pessoal “pirou”! Eu vi um monte de gente fazendo exercícios que eu nunca

tinha visto fazer, o aluno lá, fazendo as contas para responder à pergunta!

Você está fazendo o aluno aprender a estudar. Você cria experiências

diferentes com tecnologia e ela pode te emocionar, pode trabalhar... Por

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exemplo, como é que você aprende? Uma das formas é a repetição, se você

fizer uma coisa toda vez, por muitas vezes, o seu cérebro acaba escolhendo,

vendo que aquilo é importante e acaba guardando neurônios para guardar

aquilo porque você está repetindo demais aquele exercício, como aprender

violão, alguma coisa que tem que repetir os exercícios várias vezes. E a outra

forma é por emoção, você faz alguma coisa que emociona, que diverte, e

aquilo pode ficar na cabeça da criança porque foi uma forma divertida, uma

forma diferente de trabalhar o assunto.

Pesquisadora: Há alguma dificuldade para além desses treinamentos

específicos das plataformas que vocês usam? Tem algum momento em que os

alunos aprendam a usar, a operacionalizar alguma tecnologia como fim e não

como meio? Não sei se há ainda aulas de informática como nós tínhamos

quando pequenos, por exemplo.

Entrevistado 3: É, não tem, não... Por exemplo, alguns projetos culturais...

teve um grupinho ano passado, do primeiro ano, que eles estavam fazendo

uma planilha para trabalhar receitas, ingredientes... Então, a pessoa escolhia

os ingredientes, escolhia uma receitinha, mandava por e-mail, tem essa

aplicação. Eu acabo ajudando eles fazendo um formulário, uma planilha, então

era uma coisa que tinha um fim. Eles queriam criar aquele produtinho para eles

e esse foi um dos casos. Teve um outro que foi de comida, também. Era o

maior barato, íamos arrastando a comida para o prato e ia calculando as

calorias... Foi um aplicativo que a turminha fez em cima disso.

PARTE 2

Pesquisadora: Como é a recepção dos pais? O que os pais estão achando

desse movimento que está acontecendo aqui na escola?

Entrevistado 3: Tem de tudo. O risco que existe hoje em dia é que nós

estamos passando por uma fase de transição. Há pais que já estão mais

esclarecidos e percebem a importância desse tipo de caminho e veem que é

importante seguir por isso. Agora, há pais que vem de uma educação dos anos

1970, que tiveram uma Educação bem “Revolução Industrial” e que acham que

a aula tem que ser tradicional, com carteirinha enfileirada e o professor na

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frente. Isso acontece e tem aluno que já saiu da escola por causa disso. Muitos

pais aí não enxergaram isso.

Pesquisadora: Há algum trabalho específico com os pais em relação a isso?

Como funciona?

Entrevistado 3: Tem, sim, toda vez que fazemos alguma coisinha mais

elaborada, chamamos o pai, mostramos para ele... A própria Sala Geek, que ia

mudar todo o Ensino Médio. Fizemos uma reunião com os pais, mostramos

todo o material ano passado, como a coisa ia “rolar”, como ia ser feito...

Quando começou a mexer com o Classroom, no sexto ano, o guardião chamou

os pais, fez uma reuniãozinha, mostrou a ferramenta, como ela funciona, qual o

propósito dela, para que serve. É feito, sim, toda vez que nós fazemos alguma

coisinha diferente...

Pesquisadora: Você participa dessa interação com os pais?

Entrevistado 3: Eu nem tanto. É mais a direção da escola. No caso, a Geek

One foi o próprio pessoal da Geek que mostrou a ferramenta. Às vezes, algum

pai procura a escola para perguntar [sobre] algum detalhe ou para tirar alguma

dúvida. Geralmente, nos procuram para esclarecer algum detalhe que pode

não ter ficado muito certo. Mas, sim, chama pai. Toda vez que tem alguma

coisa nova, chamamos o pai, mostramos e tentamos esclarecer para eles os

motivos. Em geral, quando faz bonitinho assim, a maioria é bem de boa. É uma

transição: assim como têm pais, têm professores que não aceitam a tecnologia

tão bem... Enfim, pessoas! No fim, não são pais, são pessoas: pais,

professores, adultos em geral... Tem gente que está levando isso numa boa e

tem gente que é meio reticente.