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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” AVM FACULDADE INTEGRADA AS CONTRIBUIÇÕES DE PIAGET PARA O TRABALHO PSICOPEDAGÓGICO NA ALFABETIZAÇÃO Por: Regina Coeli Feres Ferraro Orientador Profª. Simone Ferreira Rio de Janeiro 2011

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

AS CONTRIBUIÇÕES DE PIAGET PARA O TRABALHO

PSICOPEDAGÓGICO NA ALFABETIZAÇÃO

Por: Regina Coeli Feres Ferraro

Orientador

Profª. Simone Ferreira

Rio de Janeiro

2011

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

AS CONTRIBUIÇÕES DE PIAGET PARA O TRABALHO

PSICOPEDAGÓGICO NA ALFABETIZAÇÃO

Apresentação de monografia à AVM Faculdade

Integrada como requisito parcial para obtenção do

grau de especialista em Psicopedagogia

Por: . Regina Coeli Feres Ferraro.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus por ter

me dado o dom da vida e força para

chegar até aqui. Agradeço à minha

orientadora Simone Ferreira que tanto

que contribuiu para a minha formação.

Agradeço em especial a minha filha

Eveline, que por sua perseverança fez

com que eu voltasse a estudar e que

com sua maneira bem singular sempre

me ajuda na quebra de meus

paradigmas.

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho aos professores que

por seu compromisso com a

aprendizagem e sensibilidade se

interessam pelo funcionamento da mente

para poder usar o suporte da arte de

pensar e com isso possam educar seus

alunos para a vida.

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EPÍGRAFE “ Então, um professor disse: ‘fala-nos do Ensino’. E ele disse: ‘nenhum homem poderá revelar-vos nada senão o que já está meio adormecido na aurora do vosso entendimento. O mestre que caminha à sombra do templo, rodeado de discípulos, não dá de sua sabedoria, mas sim de sua fé e de sua ternura. Se ele for verdadeiramente sábio, não vos convidará a entrar na mansão do saber, mas antes vos conduzirá ao limiar de vossa própria mente. O astrônomo poderá falar-vos de sua compreensão do espaço, mas não vos poderá dar sua compreensão. O músico poderá cantar para vós o ritmo que existe em todo o universo, mas não vos poderá dar o ouvido que capta a melodia, nem a voz que a repete. E o versado na ciência dos números poderá falar-vos do mundo dos pesos e das medidas, mas não vos poderá levar até lá, Porque a visão de um homem não empresta suas asas a outro homem. E assim como cada um de vós se mantém só no conhecimento de Deus, assim cada um de vós deve ter sua própria compreensão de Deus e sua própria interpretação das coisas da Terra.’”

O PROFETA Gribran Khalil Gribran

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RESUMO

Este trabalho tem como objetivo o aprofundamento nos estudos

realizados por Jean Piaget. O enfoque da pesquisa será em relação ao

movimento, ao pensamento, bem como as implicações destes na

alfabetização, deslocando a investigação do como se ensina para o como se

aprende.

Procura-se também defender que o professor deve ter um sólido

embasamento teórico, para que assim possa detectar as defasagens no

aprendizado de seus alunos.

Nesse sentido, é através da compreensão de todas as etapas do

desenvolvimento cognitivo que os professores terão subsídios para elaborar

estratégias pedagógicas para que possam ajudar seus alunos no processo de

construção do conhecimento e na superação de suas deficiências escolares.

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METODOLOGIA

Este trabalho foi realizado através de um estudo bibliográfico das obras

de Piaget, onde busca contribuir com o olhar deste pensador para que

possamos compreender os estágios da evolução humana e como cada estágio

é necessário para que o aluno consiga adquirir conhecimento.

Foram pesquisados, também, autores que defendem a linha

construtivista, como: COLL, NICOLAU, entre outros.

Na área da Psicopedagogia, este trabalho tem como contribuição as

obras de: ALLESSSANDRINI e BOSSA.

No que se refere ao estudo da Psicomotricidade, conta-se com autores

como: OLIVEIRA, FALCÃO, entre outros.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 09 CAPÍTULO I 12 COMPREENDENDO AS CONSIDERAÇÕES DE PIAGET A RESPEITO DO MOVIMENTO CAPÍTULO II 21 COMPREENDENDO AS CONSIDERAÇÕES DE PIAGET SOBRE PENSAMENTO CAPÍTULO III 28 AS RELAÇÕES ENTRE MOVIMENTO E PENSAMENTO PARA PIAGET CAPÍTULO IV 32 APONTAR AS RELAÇÕES ENTRE MOVIMENTO E PENSAMENTO NO PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO CONCLUSÃO 37 BIBLIOGRAFIA 40 WEBGRAFIA 41 ÍNDICE 42

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Introdução

Devido a uma grande retenção nos primeiros anos da educação

básica, as crianças sofrem por se julgarem incapazes de conseguir superar

suas dificuldades na alfabetização; mesmo se esforçando para aprender, não

conseguem acompanhar o ritmo da turma e com isso sentem-se frustradas e

infelizes. Às vezes carregam estas frustrações em suas mochilas como um

fardo que irá interferir no resto de sua vida escolar revelando, assim, um

estudante inseguro e, até muitas vezes, levando-os a desistir de estudar,

achando que não têm “cabeça para isso”.

São estas situações que, quando ocorridas durante o período de

alfabetização, levam muitos alunos a abandonarem a escola. Até mesmo os

que insistem carregam esta autoestima negativa para o resto de sua vida

escolar e nunca se sentem seguros do que conseguiram aprender.

Por outro lado, este tipo de sentimento é reforçado pelos professores

e familiares, por isso se faz importante analisar os mecanismos que levam

determinadas crianças a terem mais dificuldades que as outras, já que são

crianças que não possuem deficiência mental e que nada de diferente foi

notado até atingirem a fase de serem alfabetizadas.

O educador tem uma grande responsabilidade em ajudar estes

alunos a superar obstáculos e não ser apenas mais um a julgá-los incapazes.

Para isso deve estar comprometido com o ensino, e fazer a diferença em todos

os aspectos: deve olhar o aluno não só na cognição, mas o que também auxilia

ao aprendizado, que são os aspectos afetivos, sociais e psicomotoras.

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O aspecto afetiva refere-se à capacidade, à disposição do ser

humano de ser afetado pelo mundo externo/interno por sensações ligadas a

tonalidades agradáveis ou desagradáveis. No processo ensino-aprendizagem o

lado afetivo se revela pela disposição do professor de oferecer diversidade de

situações, espaço, para que todos os alunos possam participar igualmente e

pela sua disposição de responder às constantes e insistentes indagações na

busca de conhecer o mundo exterior, e assim facilitar para o aluno a sua

diferenciação em relação aos objetos.

Sendo assim, a afetividade é um dos pontos fundamentais para que

se tenha êxito no processo de ensino-aprendizagem. Pois o estabelecimento

de uma relação harmônica entre docentes e discentes será excelente para que

possa existir a troca de experiências.

O aspecto social é outra questão importante a ser considerada, pois

o desenvolvimento da pessoa se faz a partir da interação do potencial genético,

típico da espécie, e uma grande variedade de fatores ambientais, isto é, a

interação da criança com o meio. A realização do potencial herdado

geneticamente por um indivíduo vai depender das condições do meio, que

podem modificar as manifestações das determinações genotípicas.

Isto significa dizer que o meio social estimula o indivíduo

intelectualmente e que dá à criança a oportunidade para que ela possa adquirir

vasto vocabulário, tendo no seu dia a dia contato com a leitura e a escrita como

forma de comunicação, lhe dará, seguramente, mais facilidade para ser

alfabetizada.

É através do movimento que o ser humano adquire os seus

primeiros conhecimentos, tanto de si próprio quanto das coisas que o cerca, e

este processo do conhecimento através do movimento é algo que acompanha

o homem pelo resto de sua vida, O movimento dá autonomia e com isto um

ganho mais rápido da cognição. Toda e qualquer atividade escolar necessita de

movimentos seja ele do mais rudimentar ao mais complexo.

O aspecto psicomotor na alfabetização é utilizado de uma maneira

imperceptível, do simples movimento ocular para a leitura de uma palavra até a

ação complexa de escrever, pois temos aí o movimento de pinça que é a pega

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11 de um lápis associado a um ato de coordenação motora que é o que se faz

para escrever. E é pensando nisso que o objeto de estudo desta pesquisa é a

relação entre movimento e pensamento na alfabetização segundo os estudos

de Piaget.

Este trabalho aborda as contribuições de Piaget e a importância do

trabalho psicopedagógico na superação dos obstáculos encontrados em

turmas de alfabetização e para isso se faz necessário compreender as

considerações de Piaget a respeito do movimento e sobre pensamento, discutir

a relação entre ambos segundo Piaget e por último apontar as relações entre

movimento e pensamento no processo de alfabetização.

Nesse sentido o professor deve propor atividades que não só

englobem habilidades de leitura e escrita, mas que também desenvolvam o

ritmo, lateralidade, coordenação viso motora e esquema corporal que são

essenciais na maturidade neurológica do aluno, o que facilitará o processo de

alfabetização. Dessa foram torna-se evidente o trabalho do psicopedagogo

para auxiliar o desenvolvimento da aprendizagem em alunos do 1º ano do

Ensino Fundamental.

O presente trabalho apresenta-se em quatro capítulos. No Capítulo I

é abordado o conceito de movimento, segundo Piaget, compreendendo a

evolução do desenvolvimento infantil no estágio sensório-motor. No capítulo II

serão estudados os processos mentais que levam ao pensamento, segundo a

teoria de Piaget. No Capítulo III, será discutida a relação entre movimento e

pensamento para Piaget a influência do movimento no pensamento. No

Capítulo IV serão apontadas as relações entre movimento e pensamento na

alfabetização, isto é, suas implicações como agente facilitador nos processos

cognitivos de escrita e leitura.

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Capítulo I

Compreendendo as considerações de Piaget a respeito

do movimento.

O ser humano desde o momento em que nasce passa por uma

evolução. De acordo com os estudos de Piaget, esse processo evolutivo é

classificado no que ele chama de estágios do desenvolvimento.

1.1 Estágios do desenvolvimento segundo Piaget

Em sua teoria do desenvolvimento cognitivo denomina de estágio

sensório-motor o período que vai de 0 aos 2 anos de vida. Nesse estágio o

bebê tem uma estrutura de realidade em que não se identifica nem o sujeito

nem o objeto. O único vínculo possível entre o que virá mais tarde a ser um

sujeito e objeto é constituído pelas ações. O bebê relaciona tudo ao seu próprio

corpo, isto é, a ação primitiva é testemunho simultâneo de uma indiferenciação

entre o sujeito e o objeto e de uma centração fundamental, embora

radicalmente inconsciente, porque é vinculada a essa indiferenciação.

As ações vão sendo coordenadas gradualmente, depois se

coordenam entre si até ser constituída essa conexão entre meios e fins que

caracteriza os atos da inteligência propriamente dita.

No estágio pré-operatório que vai dos 2 aos 7 anos de vida O bebê

prossegue combinando novos esquemas que estão se estruturando dando

origem a novas ações. O aparecimento da linguagem é o grande

acontecimento deste período, que confere um novo dimensionamento

qualitativo à experiência da criança. A linguagem traz consequências bastantes

dinamizadoras.

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É neste nível que se inicia a descentralização do eu, isto é, a saída

do egocentrismo. Porém não deixa de comportar limitações essenciais que

fazem deste nível um termo de passagem entre a ação e a operação, e não,

ainda, um instrumento de conquista imediata destas últimas. A reversibilidade

ainda não existe, nesta etapa há uma pré-lógica o que só vai se efetivar no

próximo nível.

O terceiro estágio denominado operatório concreto se inicia

aproximadamente aos 7 anos, é neste nível que se encontra o momento

decisivo da construção dos instrumentos do conhecimento. É marcado pelo

aparecimento das operações concretas que são ações interiorizadas com

características maiores e reversíveis, que são aplicadas apenas em objetos

considerados reais (concretos). Se inicia aproximadamente aos 7 anos, é

neste nível que se encontra o momento decisivo da construção dos

instrumentos do conhecimento. É marcado pelo aparecimento das operações

concretas que são ações interiorizadas com características maiores e

reversíveis, que são aplicadas apenas em objetos considerados reais

(concretos).

O estágio das operações formais é marcado pela passagem do

pensamento concreto para o pensamento abstrato, e começa

aproximadamente aos 12 anos.

O adolescente realiza as operações no plano das ideias sem

necessitar de manipulação ou referências concretas, esta capacidade de

abstrair vai sendo dominada progressivamente de tal forma que o indivíduo se

torna capaz de tirar conclusões de puras hipóteses.

1.2 Considerações de Piaget a respeito do

movimento

Conforme foi esclarecido anteriormente através dos estágios do

desenvolvimento segundo Piaget, a evolução do ser humano começa nos atos

reflexos que nada mais são do que as coordenações sensoriais e motoras, de

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14 fundo hereditário, que correspondem tendências instintivas como, por exemplo,

a nutrição.

Falcão em seu livro Psicologia da aprendizagem defende “as

necessidades mais fundamentais da criança, como nutrição e eliminação, e a

própria sequencia do processo de maturação, levam a criança a agir sobre o

meio. [...](FALCÃO, 1989, p.82). de acordo com essas necessidades o bebê vai

formando esquemas originados dos reflexos em situações vividas por ele.

Jean Piaget se refere aos reflexos do recém-nascido determinando

que alguns apresentam uma importância especial para o futuro como os

reflexos de: sucção e o palmar. Este último, por exemplo, será integrado na

apreensão intencional ulterior. Começando, assim, o desenvolvimento motor da criança é que

Piaget, em seu livro Epistemologia genética, deu o nome de nível sensório

motor, que vai do nascimento do indivíduo até aproximadamente 24 meses.

O estágio sensório motor em “A psicologia da criança” é subdividido

em níveis, nos quais o bebê apresenta desde reflexos impensados até uma

capacidade representacional do uso de símbolos.

No primeiro estágio, Piaget explica que os reflexos se consolidam

por exercício funcional, e é assim de tanto repetir que o recém nascido passa a

fazer estes movimentos com mais segurança. “A assimilação reprodutiva ou

funcional, que assegura esse exercício, prolonga-se por outro lado em uma

assimilação generalizada”, (PIAGET, 2006 b p.14), isto é, é esta assimilação

que leva a criança entre as horas da mamada chupar novos objetos e saber

diferenciá-los do bico do seio. Estes esquemas reflexos, posteriormente, vão

dar a formação dos primeiros hábitos.

No surgimento destes hábitos, o bebê já estará no segundo estágio.

Estes hábitos, para Piaget, depende diretamente de uma atividade do sujeito, e

apesar desta dependência direta do sujeito não constitui uma inteligência.

[...] às condutas adquiridas não somente em sua

formação mas também em seus resultados automatizados, o

hábito ainda não é a inteligência. Um “hábito” elementar repousa

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num esquema sensório-motor de conjunto, em cujo seio ainda

não existe, do ponto de vista do sujeito, diferenciação entre meio

e fins [...] 1

A criança ainda não faz este movimento com um objetivo, já no ato

envolvendo inteligência existe uma finalidade desde o início e estes hábitos

serão utilizados para alcançar os fins. Podemos citar como exemplo aqui o

reflexo de sucção que à medida que o bebê suga o leite, está formando

esquema sensório-motor, referente ao ato de sugar. Esse ato se incorpora ao

seu organismo e ela pode estendê-lo sugando os dedos, objetos e,

posteriormente, generalizando essa ação, quando se dá início ao terceiro

estágio que é por volta dos quatro meses e meio de idade, marcado pela

coordenação das mãos e olhos. Com estes esquemas estruturados ela começa

a repetir movimentos bem sucedidos inicialmente, sem nenhuma finalidade, por

mera atividade; depois, tende a repetir-se em função do resultado obtido no

ambiente externo.

No livro “A psicologia da criança” Piaget dá um exemplo que

caracteriza bem este estágio. É o caso de um bebê que acidentalmente puxa

um cordão que está preso a um chocalho pendurado no teto do berço, ao puxar

o chocalho emite um som e ele repete este movimento em função do resultado

obtido no ambiente externo. Se trocarmos o chocalho por outro objeto que

emita som a criança procura o cordão na tentativa de que consiga ouvir o som;

de outra feita se tirarmos o chocalho do berço e o agitarmos sem que ela veja o

objeto, o bebê também irá procurar o cordão para puxar assim que a música

cessar. “Estamos, pois, desta feita, no limiar da inteligência, por mais estranha

que seja a causalidade sem contato espacial”.2 Porque quando a criança

repete o movimento (reflexo) para atender a uma necessidade ou finalidade do

indivíduo, então este movimento deixa de ser reflexo e se transforma em ação

aprendida, mesmo que rudimentar, em função do esquema formado pelos

primeiros reflexos que entraram em contato com o objeto, modificando-se para

1 Jean PIAGET e Bärbel INHELDER. .A psicologia da criança, p.15-16. B 2 Jean PIAGET e Bärbel INHELDER. A psicologia da criança, p.11 B

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16 que o objeto pudesse entrar em contato com a criança. A modificação do

reflexo implica ação inteligente, supõe o nascimento da inteligência que

ocupará o lugar do mesmo, pois, a criança passa a ter este tipo de esquema

formado quanto a este tipo de ação, possibilitando-a a colocar em uso quando

surgir alguma necessidade que o provoque.

À medida que os esquemas de ação se formam, a criança evolui

para o que Piaget chama de inteligência prática. Neste momento estamos no

quarto estágio sensório motor, que é a manipulação de objetos através da

percepção e movimento organizado, pois o bebê utiliza-se de esquemas já

estabelecidos e da união desses esquemas com uma finalidade prévia,

independente do meio que vai utilizar.

Ao chegar no quinto estágio, quando a criança estará entre 11 ou 12

meses, além de fazer a utilização dos esquemas e de união destes esquemas,

o bebê começa a procurar meios novos por diferenciação dos já conhecidos,

isto é, a criança, depois de tentar alcançar um objeto em cima de uma mesa,

puxa a toalha para alcançá-lo, desta forma ela já vê uma relação entre a toalha

e o objeto.

Ao se esconder um objeto que ela esteja interessada em baixo de

um lençol, ela já procura por este levantando o lençol, isto significa que a

criança já tem a consciência de permanência do objeto.

No sexto estágio que é onde termina a fase sensório-motora a

criança já é capaz de encontrar meios novos para alcançar objetivos mesmo

que estes exijam mecanismos mais complexos como abrir uma gaveta.

Ao longo destes primeiros 24 meses de vida a criança passa por

estágios evolutivos em que a motricidade é a base de todo o conhecimento

adquirido.

Segundo Piaget, é na interação sujeito - meio que a criança constrói

o conhecimento. Em sua origem, o conhecimento não vem dos objetos e nem

do sujeito, mas das interações intrínsecas a ele: o sujeito sempre desempenha

um papel ativo nesse processo. Faz-se necessário o agir sobre o objeto a ser

conhecido, transformá-lo de modo que este conhecimento possa ser

incorporado às suas estruturas cognitivas.

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Neste nível, fica evidente que o desenvolvimento físico acelerado é o

suporte para o aparecimento de novas habilidades. Isto é, o desenvolvimento

ósseo, muscular e neurológico permite o afloramento de novos

comportamentos, como sentar, andar, o que propiciará um domínio maior do

ambiente.

A coordenação dos sistemas sensório-motores se estabelece e se

concretiza no movimento. Este movimento leva à assimilação que se torna um

elemento de compreensão prática e, ao mesmo tempo, compreensão da ação.

Nos estudos de Piaget, o autor destaca a importância da motricidade na

formação da imagem mental a na representação imagética. O vivido integrado

pelo movimento reflete todo um equilíbrio cinético com o meio, a constante

interação que o indivíduo estabelece com o mundo através do movimento

permite-lhe um controle de alguma intencionalidade progressiva possibilitando

o conhecimento pela ação.

Neste nível é que se dá a construção do real que juntamente com os

esquemas sensório-motores vão ser a base da cognição do ser humano, como

o próprio Piaget diz:

Se se cotejarem as fases dessa construção do real com as da

construção dos esquemas sensório-motores, que intervêm no

funcionamento dos reflexos, dos hábitos ou da própria

inteligência, verifica-se uma lei de desenvolvimento, de alguma

importância, porque determinará igualmente toda a evolução

intelectual ulterior da criança.3

Portanto, os dois primeiros anos de vida são de suma importância,

pois é aqui que se dá a base da cognição que irá interferir no desenvolvimento

intelectual da criança.

Ao longo destes dois anos, e ao nível de ação, a criança vai

construir algumas noções fundamentais para o desenvolvimento ulterior, entre

as quais se destacam a do objeto permanente e a causalidade.

3 Jean PIAGET e Bärbel INHELDER, A psicologia da criança, p.24.

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O objeto permanente – se taparmos com um lenço um objeto que

interessa a criança (bebê) ela é incapaz de afastar o obstáculo para chegar ao

objeto, mesmo já sendo capaz de agarrar e puxar, não o faz, porque o objeto

desapareceu do seu campo perceptivo, deixou de existir para ela.

A permanência do objeto se dá por volta dos 11 meses, quando a

criança se torna capaz de saber que mesmo tapado o objeto permanece no

local, podendo até trocar os tipos de anteparos. É capaz de acompanhar as

deslocações e o procurar no local próprio.

Paralelamente a criança objetiva a noção prática de causalidade.

Por exemplo, quando ela puxa o cordão de um brinquedo pendurado sobre o

berço percebe as oscilaçõe provocadas pelo ato de puxar, demontrando

agrado. Esta ação, que está ligada a atividade do seu próprio corpo, vai ser

generalizada permitindo-lhe agir sobre o objeto, mesmo a distância.

Por volta dos dezoito meses a criança sempre que deseja alcançar

um objeto que não está ao alcance direto da mão, ela se utiliza de mecanismos

para alcançá-lo, como, por exemplo, puxar um pano para atrair a si o objeto

visado. Ou até mesmo, ser capaz de utilizar uma vara quando o objeto se situa

fora de seu alcance.

Estas condutas mostram que a criança nesta idade já é capaz de

reconhecer relações objetivas de causalidade, na medida em que se serve de

meios apropriados para alcançar seus fins.

As noções de objeto permanente e de causalidade não são

conceitos abstratos, elas se situam ao nível da ação e não da representação e

antecedem as categorias práticas ou esquemas de ação.

Por volta do ano e meio, a criança começa a pensar Imita também

acontecimentos que vê desenrolarem-se a sua volta. Assim como é neste nível

que a criança começa a falar.

Para Piaget, o pensamento está intimamente ligado a esquemas

motores e ao conceito de objeto e de suas características. No final do nível

sensório motor desenvolvem-se outras estruturas cognitivas, a criança começa

a distinguir o seu eu do resto que a rodeia e adquire as noções de espaço e de

tempo.

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Outro fator de interferência na cognição da criança é a percepção. A

criança se utiliza da palavra para antecipar a ação feita por ela posteriormente.

No senso comum fala-se em percepção como sinônimo de inteligência.

Entretanto, percepção e inteligência não são sinônimos, A percepção vai

operar dentro dos limites do que foi captado e estruturado pela cognição já a

inteligência vai acontecer dentro dos limites do que foi percebido e conhecido

pelos sentidos.

Em torno dos dois anos a criança passa do nível sensório-motor

para o pré-operatório, porém a motricidade acompanha a evolução da criança

dando a ela cada vez mais autonomia e mais precisão no que faz. Isso se torna

evidenciado no movimento de pinça que aparece no nível sensório-motor por

volta dos seis meses facilitando posteriormente a pega do lápis e o seu

manuseio, a coordenação do lápis já se faz presente nas primeiras garatujas

que mais tarde irão evoluir para desenhos.

É neste nível que vão surgir os conceitos de lateralidade, de dentro e

fora, em cima e em baixo e o esquema corporal que vão auxiliar a criança no

processo de desenvolvimento da linguagem, segundo Salles:

Para que uma criança perceba a posição dos objetos no

espaço, precisa, principalmente, ter uma boa imagem corporal,

pois usa seu corpo como ponto de referência. Ela só se

organiza quando possui o domínio de seu corpo no espaço,

isto significa que ela apreende o espaço por meio de sua

movimentação e a parte de sim mesma que ela se situa em

relação ao mundo circundante. Em uma verdadeira exploração

motora inicial, ela necessita pegar os objetos, manuseá-los,

jogá-los, agarrá-los, lança-los para frente, para trás, para

dentro e fora de determinado lugar. (SALLES, 2007, p.142)

Nesse sentido é através da manipulação e manuseio de objetos que

a criança vai tendo o domínio das noções de orientação espacial, já que esses

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20 conceitos são difíceis de serem assimilados no campo da abstração e são

primordiais no desenvolvimento da linguagem.

Esses conceitos também auxiliarão a criança no processo de

alfabetização, onde ela demonstrará o seu desenvolvimento cognitivo através

da resolução das atividades que lhe são oferecidas.

Nessa perspectiva torna-se fundamental que o professor tenha um

olhar voltado para o que o aluno já é capaz de realizar sozinho, sem a ajuda do

grupo ou da professora estimulando-o a apresentar sua considerações e dessa

forma o professor poderá replanejar as atividades de acordo com as

dificuldades apresentadas pelos alunos.

De acordo com Allessandrini: “Considero muito importante que o

educador conheça muito bem a criança com quem trabalha, para que escolha

situações em que possa leva-la a desenvolver uma autonomia de sua gestão

mental. [...]” (ALLESSANDRINI, 2002, p .26 ). Dessa forma é importante que o

professor conheça os processo evolutivos do indivíduo fazendo uma ligação

entre eles e o estágio em que se encontra seus alunos para que assim possa

planejar suas atividades.

Todas as etapas do desenvolvimento cognitivo são importantes e se

interligam de tal forma que o movimento perpassa por todos os níveis de

desenvolvimento e segue auxiliando o homem na aquisição de conhecimento,

porém neste trabalho o movimento será focado somente nos dois primeiros

níveis de desenvolvimento uma vez que o recorte desta pesquisa é a criança

em fase de alfabetização e, portanto os conceitos adquiridos para facilitar este

processo. A questão do movimento será abordada mais profundamente (no

nível pré-operatório) no capítulo III ao fazer uma relação entre movimento e

pensamento.

Outro processo que está envolvido diretamente com a alfabetização

é o pensamento, que será abordado no capítulo que se segue.

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Capítulo II

Compreendendo as considerações de Piaget

sobre o pensamento

Pensamento é o processo mental que se concentra nas ideias e que

abarca os fenômenos cognitivos, distinguindo-se do sentimento e da vontade.

(Dicionário Aurélio)

Para Piaget, o pensamento só aparece na criança no nível pré-

operatório, após o surgimento da linguagem. Este pensamento é gradual e se

baseia na modificação da ação que, por sua vez, foi modificada pela

inteligência prática.

Piaget descreve a gênese do pensamento da seguinte forma:

Em função destas modificações gerais da ação, assiste-se

durante a primeira infância a uma transformação da inteligência

que, de apenas senso-motora ou prática que é no início, se

prolonga doravante como pensamento propriamente dito sob a

dupla influência da linguagem e da socialização.4

Esta dupla influência se torna lógica se pararmos para pensar que

antes de falar existe um arranjo das palavras e esta organização nada mais é

do que o pensamento. Em relação a socialização ela é feita uma vez que a fala

é a comunicação, não só de seus atos como de suas necessidades e vontades.

A criança demonstra que pensa quando fala de coisas que fez

(relatando o passado) e coisas que pretende fazer (antecedendo o futuro).

Em seu livro Seis estudos de psicologia, Piaget escreve dois tipos de

pensamento, são eles: o pensamento por incorporação ou assimilação e o

pensamento adaptado aos outros e ao real, que ele chama de pensamentos

4 Jean PIAGET, Seis estudos de psicologia, p 27.

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22 extremos e que durante o estágio pré-operatório encontram-se todas as

transições entre estas duas formas de pensamento até que a segunda forma

domine a primeira.

O primeiro, isto é, o pensamento por incorporação ou assimilação é

a primeira forma de pensamento e não tem objetivo. Piaget chama este

pensamento de pensamento egocêntrico, pois não tem um fim social já que a

criança faz uso deste quando, brincando (jogo simbólico) fala sozinha, para ela

mesma, mesmo estando ao lado de outras crianças.

[...] o jogo simbólico aparece mais ou menos ao mesmo tempo

que a linguagem – independente dela, - desempenhando

importante papel no pensamento da criança, a título de fonte

de representação individual (ao mesmo tempo cognitiva e

afetiva) e de esquematização representativa, igualmente,

individual.5

A criança ao jogar organiza e conhece o mundo, por outro lado,

o jogo também funciona como "terapia" na libertação das suas angústias.

Além disto, através do jogo também podemos perceber a relação familiar da

criança.

“[...]É fácil dar-se conta de que estes jogos simbólicos

constituem uma atividade real do pensamento, embora

essencialmente egocêntrica, ou melhor duplamente

egocêntrica. Sua função consiste em satisfazer o eu por

meio de uma transformação do real em função dos desejos:

a criança que brinca de boneca refaz sua própria vida,

corrigindo-a a sua maneira, e revive todos os prazeres ou

5 Jean PIAGET, Seis estudos de psicologia. p. 78.

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conflitos, resolvendo-os, compensando-os, ou seja,

completando a realidade através da ficção.[...]”6

A exteriorização de um sentimento é a própria reelaboração de um

acontecimento, então, quando a criança reelabora, faz com que o

acontecimento vá fincando mais aceitável para ela mesma até que consiga

superar este impasse.

Pouco a pouco este pensamento vai sendo substituído pelo

pensamento adaptativo aos outros e ao real, é através deste pensamento

que a criança verbaliza seus desejos e vontades. É este pensamento que

precede o pensamento lógico.

O pensamento lógico é o pensamento propriamente dito cuja base é

a linguagem interior e o sistema de signos. Estes signos são imagens mentais

construídas da percepção dos objetos que cercam o indivíduo.

Existem dois tipos de imagens mentais: as imagens reprodutivas,

que nada mais são do que coisas já conhecidas e percebidas anteriormente,

são imagens estáticas representativas do seu cotidiano. E as imagens

antecipadoras, que são as que estão relacionadas à imaginação de movimento

e transformação. Estes dois tipos de imagens aparecem em estágios diferentes

como coloca Piaget em A psicologia da criança:

[...]no nível pré-operatório, as imagens mentais da criança são

quase exclusivamente estáticas, com dificuldade sistemática de

reproduzir movimentos ou transformações, bem como os seus

próprios resultados. É só no nível das operações concretas

(depois dos 7 -8 anos) que as crianças chegam às reproduções

de movimentos e transformações, assim como às imagens

antecipadoras de categorias correspondentes.[...] 7

6 Jean PIAGET, Seis estudos de psicologia. p. 28-29. 7 Jean PIAGET, A psicologia da criança, p. 67. B

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24

Portanto, para haver uma representação propriamente dita (como na

linguagem e no pensamento) é necessário construir a imagem mental referente

ao objeto, enquanto representação do objeto ausente. A imagem mental é o

primeiro elemento que articula ação e pensamento. A associação de um objeto

a outro, mediada pela imagem, permite que a própria categoria de

representação se constitua primeiro como representação simbólica. Esta abre

caminho para uma qualidade objetiva de representação, conceitual.

Piaget descreve em seu livro Seis Estudos de Psicologia que:

[...] Pode-se dizer, então, que a origem do pensamento deve

ser procurada na função simbólica . Mas também se pode,

legitimamente, sustentar que a função simbólica se explica pela

formação de representações. Com efeito, o próprio da função

simbólica consiste numa diferenciação de significantes (signos

e símbolos) e dos significados objetos ou acontecimentos, uns

e outros esquemáticos ou conceitualizados [...]8

Em suma, sem a imagem mental não há pensamento.

Com o amadurecimento da criança a imagem mental ganha uma

plasticidade que confere a esta imagem movimentos e transformações.

Correspondentemente já se nota aqui uma construção de linguagem mais

elaborada e detalhada, pois a imagem mental adquirindo movimento permite a

criança a construção destes detalhes.

À medida que a criança se aproxima dos sete anos, começamos a

notar uma maior socialização da linguagem e o egocentrismo é substituído por

uma descentralização. Mudança esta que Piaget denomina de “revolução

copernicana” (comparando-a com a novidade trazida por Nicolau Copérnico

quando negou que a Terra estivesse parada e os astros girando ao seu redor e

afirmou que o Universo possuía vários centros).

Esta descentralização permite que a criança raciocine a partir de

ângulos diversos o que é característico da inteligência operacional.

8 Jean PIAGET, Seis estudos de psicologia, p. 79.

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25

A criança que na fase pré-operatória for questionada de quantos

irmãos ela tem, responde corretamente a quantidade, mas não consegue

identificar que estes irmãos são irmãos entre si. Já na fase operatória ela

consegue entender que seus irmãos são irmãos entre si.

É no nível operatório concreto que o pensamento atinge a condição

de uma ação inversa; por exemplo: separando-se o que se uniu volta-se a ter a

situação anterior. A reversibilidade também é uma operação que permite

superar a variância Temos como exemplo a massa de modelar que de posse

de uma quantidade pode-se mudar a forma de bolo para cobrinha, mas a

quantidade e o peso continuam os mesmos. O mesmo acontece com o volume,

aqui a criança consegue entender que uma certa quantidade de líquido

transferida para vários recipiente de vários tamanhos, o volume permanece

constante, apesar do nível de líquido variar de recipiente para recipiente.

Em suma, o pensamento que antes estava fundamentalmente

dependente das ações externas que a criança executava, a partir de agora,

ainda que continue importante a ação externa, a criança enriquece

profundamente a capacidade de ação interna.

As operações concretas são chamadas assim por necessitarem

ainda da ação para entendimento, como deixa claro Piaget em A Psicologia da

Criança:

[...]As operações em jogo nesse gênero de problemas podem

chamar-se “concretas” no sentido de que se baseiam

diretamente nos objetivos e não ainda nas hipóteses

enunciadas verbalmente,[...];as operações concretas

estabelecem, portanto, muito bem a transição entre a ação e

as estruturas lógicas mais gerais,[...]9

Com isto Piaget afirma que a criança, no período de iniciação do

ensino fundamental, necessita de trabalhar com o concreto, definindo, assim,

uma relação ainda íntima entre o pensamento e o movimento (ação).

9 Jean PIAGET, A psicologia da criança, p. 91.

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Nesse sentido, faz-se necessário discutir a importância do

planejamento de atividades que valorizem as experiências do dia a dia da

criança partindo de situações de aprendizagem contextualizadas.

Dessa forma o conteúdo a ser inserido vai se desenvolvendo dentro

de uma prática onde o aluno necessita de trabalhar com situações que o levem

a elaborar hipóteses a mediante o seu cotidiano e o que lhe está sendo

apresentado, visto que muitos alunos apresentam dificuldades de

aprendizagem em decorrência de práticas pedagógicas distantes do seu

universo sociocultural.

Resultados insatisfatórios são demonstrados devido ao

distanciamento da sua imagem mental em relação a proposta oferecida pelo

professor, que muitas vezes não percebe que as dificuldades demonstradas

pelos alunos partem da forma como são abordados determinados conteúdos.

Como aponta Bossa (2011, p. 133):

O trabalho psicopedagógico, como vimos observando, implica

compreender a situação de aprendizagem do sujeito,

individualmente ou em grupo, dentro do seu próprio contexto.

Tal compreensão requer uma modalidade particular de atuação

para a situação em estudo, o que significa que não há

procedimentos predeterminados. Defino esta característica

como configuração clínica da prática psicopedagógica. A

metodologia do trabalho, ou seja, a abordagem e o tratamento,

enfim, a forma de atuação, se vai tecendo em cada caso, na

medida em que a problemática aparece. Cada situação é única

e requer do profissional atitudes específicas em relação àquela

situação.

Nessa perspectiva, enquanto o professor vê o erro como um entrave

para prosseguir, a Psicopedagogia o encara como um indicativo do nível

cognitivo em que a criança ou o grupo se encontra, para assim poder trabalhar

com as suas dificuldades elaborando uma proposta de trabalho individualizada

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27 com o objetivo de superar os obstáculos e ao mesmo tempo enriquecer o fazer

pedagógico com novas alternativas.

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Capítulo III

As relações entre movimento e pensamento para

Piaget

Nos três primeiros estágios de vida da criança nota-se uma evolução

gradual e constante no que se refere aos aspectos motores e intelectuais. Essa

evolução ocasiona o desenvolvimento de determinadas habilidades próprias do

estágio em que a criança se encontra.

No início a criança se movimenta por reflexos sem qualquer

intencionalidade. Nessa situação é percebido que o movimento assume um

papel involuntário através do seu corpo, sem qualquer relação com o

pensamento dela.

O movimento é a fonte primordial para que o bebê tome

conhecimento, primeiramente de si e posteriormente do mundo que o cerca. É

durante os dois primeiros anos de vida, isto é, no estágio sensório-motor que

se dá o desenvolvimento que irá sustentar todas as etapas do desenvolvimento

cognitivo.

Segundo Piaget, o conhecimento não está no sujeito-organismo, tão

pouco no objeto-meio, mas é decorrente das contínuas interações entre os

dois. Como ele escreveu em seu livro Seis Estudos de Psicologia.

Assim é o desenvolvimento mental. Como conclusão, pode-se

constatar a unidade profunda dos processos que, da

construção do universo prático, devido à inteligência senso-

motora do lactente,chega à reconstrução do mundo pelo

pensamento Hipotético-dedutivo do adolescente, passando

pelo conhecimento do universo concreto devido ao sistema de

operações da segunda infância.10

10 Jean PIAGET, Seis estudos de psicologia, p. 64.

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Portanto, o desenvolvimento segue uma sequência sem pular etapas

que irão levar ao pensamento, pois todo pensamento se origina na ação, e

para se conhecer a gênese das operações intelectuais é imprescindível a

observação da experiência do sujeito com o objeto.

A aquisição de conhecimento através do movimento não é uma

característica presente apenas no estágio sensório-motor, ela perpassa pelo

estágio pré-operatório e continua presente no operatório concreto auxiliando o

aluno a adquirir conhecimentos matemáticos e na alfabetização, já que a

aquisição de vocabulário está diretamente relacionada aos objetos que rodeiam

a criança e as trocas sociais.

Piaget define em seu livro A Construção do Real na Criança (p.391-

392) a seguinte relação entre o pensamento e a motricidade:

Vemos, pois, que o pensamento, em seus diversos aspectos,

reproduz ,no plano que lhe é próprio, o processo de evolução

que observamos no caso da inteligência sensório- motora e da

estrutura do universo prático inicial.O desenvolvimento da

razão, esboçado em nível sensório-motor, continua, assim

segundo a mesma lei, logo que a vida social e a reflexão se

constituem. Em presença das dificuldades que o surgimento de

realidades novas levanta, a assimilação e a acomodação se

reencontram, no início deste segundo período da evolução

intelectual, em uma situação que já tinham ultrapassado no

plano inferior. Entretanto, procedendo do estado puramente

individual que caracteriza a inteligência sensório-motora à

cooperação que define o plano sobre o qual o pensamento,

doravante, se move, a criança, depois de ter vencido seu

egocentrismo e os outros obstáculos que prejudicam essa

cooperação, recebe desta os instrumentos necessários para

prolongar a construção racional preparada durante os dois

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primeiros anos e desdobrá-la em um sistema de relações

lógicas e de representações adequadas. 11

O pensamento, então, deriva do conhecimento sensório-motor e

segue durante o segundo estágio e baseando-se nas experiências aí

adquiridas.

Com o avançar do segundo estágio o pensamento e o movimento

se auxiliarão mutuamente na aquisição de novos conhecimentos, como é no

caso do desenho, por exemplo. Para Piaget o desenho é uma forma de função

semiótica que se define entre o jogo simbólico e a imagem mental. Este

desenho perpassa por vários estágios que vão demonstrando um avanço na

maturidade motora e do pensamento. São eles:

Estágio da rabiscação (de 1 a 4 anos) - no qual o desenho é um

prolongamento do gesto

Estágio de início de figuração (de 5 a 6 anos) – neste estágio surgem as

primeiras formas reconhecíveis como os círculos e os semicírculos

Estágio da figuração esquemática (de 7 a 9 anos) - no qual a criança

desenha o que sabe

Estágio de figuração realista (a partir de 10 anos) - Quando a criança se

esforça em representar o que vê.

E, assim, de estágio em estágio a criança vai modificando as suas

produções de acordo com seu processo de maturação do desenvolvimento

motor (onde os movimentos se tornam mais fiéis ao que a criança idealiza), da

sua noção de espaço (ocupando melhor o espaço da folha), ganhando noções

de dimensão (tanto em relação ao tamanho entre os objetos quanto a noção de

profundidade).

O desenho nada mais é que uma antecipação da escrita, isto é, a

comunicação do pensamento através da escrita. Esta comunicação que

inicialmente é sobre os ícones das coisas que o cercam, aos poucos a criança

vai tentando escrever nomes destes desenhos.

11 Jean PIAGET, A construção do real na criança, p. 391 – 392.

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Emília Ferreiro, seguidora das ideias de Piaget e pesquisadora do

processo de alfabetização, estudou quais são as concepções das crianças em

relação a escrita e escreveu:

Os indicadores mais claros das explorações que as crianças

realizam para compreender a natureza da escrita são suas

produções espontâneas, entendendo como tal as que não são

o resultado de uma cópia( imediata ou posterior). Quando uma

criança escreve tal como acredita que poderia ou deveria

escrever certo conjunto de palavras, está nos oferecendo um

valiosíssimo documento que necessita ser interpretado para

poder ser avaliado. Essas escritas infantis têm sido

consideradas displicentemente, como garatujas, “puro jogo”, o

resultado de fazer “como se” soubesse escrever.(pág 16)12

Essas formas primitivas de tentativas de escrita são comumente

percebidas ora como linhas onduladas, ora como uma série de desenhos

geométricos ao lado de desenhos de bonecos, de animais que se você

perguntar o que são “esses rabiscos” a criança irá dizer o nome do boneco ou

do cachorro. Esta resposta caracteriza a tentativa de escrita.

Quando a criança chega a esse estágio fica bem determinado o

avanço cognitivo baseado no movimento e no pensamento. Este avanço nos

leva a reflexões sobre a relação destes processos na alfabetização. Falaremos

disso a seguir.

12 Emilia FERREIRO, Reflexões sobre alfabetização, p. 16.

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Capítulo IV

Apontar as relações entre movimento e pensamento na

alfabetização

Ao finalizar os estudos sobre o movimento e o pensamento segundo

Piaget considera-se importante estabelecer a relação entre estes pontos com a

alfabetização.

Para que a criança possa ser alfabetizada, ela terá queque ser

possuidora de determinadas habilidade. Entre elas podemos destacar a

percepção, a lateralidade, a orientação espaço-temporal, a coordenação viso-

motora e o esquema corporal.

Aprofundando os estudo para um melhor entendimento sobre as

habilidades necessárias para o processo de alfabetização, vale apena

mencionar algumas abordagens consideradas necessárias nesse processo.

O primeiro a ser mencionado é a percepção a visual, que contribui

para que a criança atinja estabilidade de sua atenção e concentração nas

tarefas da escola. Ao perceber semelhanças e diferenças, posições e cores de

gravuras e objetos a criança não só aumenta o seu repertório verbal, como

transfere estes mesmos processos para afinar sua discriminação no tocante a

semelhanças e diferenças no traçado e na posição das letras, sendo assim

importante para o grafismo.

O segundo fator é a lateralidade da criança já deverá estar definida,

isto é, qual o lado dominante (esquerdo/direito) e com isto adquirido

posicionamento para a escrita. “O certo é que a lateralização constitui um

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33 elemento importante da adaptação psicomotora.” 13 Já que a grande maioria

dos utensílios como cadernos e tesouras são projetados para destros.

O terceiro a ser mencionado é a orientação espaço-temporal que

permite a criança no desenvolvimento de habilidades de localização e

sequencialização que são aplicadas para o domínio do grafismo, isto é,

perceber a ordem linear ao nível da escrita.

O quarto fator é a coordenação viso-motora que é um quesito

necessário para a leitura e escrita e é utilizada simultaneamente em uma

simples cópia, seja ela do quadro para o caderno como do livro para ele.

O ultimo fator a ser descrito é o esquema corporal. Ele é o elo entre

o indivíduo e o meio exterior. Pierre Vayer em seu livro O diálogo corporal diz:

A construção do esquema corporal, isto é, a organização das

sensações relativas a seu próprio corpo relacionada com os

dados do mundo exterior, tem um papel fundamental no

desenvolvimento da criança ,pois esta organização é o ponto

de partida dessas diversas possibilidades de ação.14

Segundo as palavras do autor, é agindo, falando, observando,

avaliando e descobrindo que a criança vai interiorizando o conhecimento de

seu esquema corporal.

O professor em sala de aula deve estar atento, antes de pensar em

lançar conteúdos, e observar se o aluno está com o seu desenvolvimento

psicomotor adequado às funções que agora terá que cumprir, pois dessa forma

e segundo os estudos de Piaget pode-se compreender que as funções motoras

e do pensamento estão interdependentes e vão interferir diretamente na parte

cognitiva do aluno.

13 Jean-Claude COSTE, A psicomotricidade, p.62. 14 Pierre VAYER, O dialogo corporal, p 18.

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O aluno, por sua vez, quando se sente incapaz de desempenhar as

tarefas que lhe foram pedidas desanima e desvia a sua atenção para coisas

mais interessantes e, muitas vezes, acaba sendo um aluno rebelde, que causa

tumulto na sala, para poder sobressair de alguma forma.

Zabala comenta sobre o que é aprendizagem de uma forma bem

sintética:

[...] a aprendizagem é uma construção pessoal que o aluno realiza com a ajuda que recebe de outras pessoas. Essa construção, por meio da qual pode atribuir significado a um determinado objeto de ensino, implica a construção da pessoa que aprende, seu interesse e disponibilidade, seus conhecimentos prévios e sua experiência. Em tudo isso desempenha um papel imprescindível a figura do outro mais experiente, que ajuda a detectar um conflito inicial entre o que se sabe e o que se deve saber, que contribui para que o aluno se sinta capaz e com vontade de resolvê-lo, que coloca o novo conteúdo de forma que apareça como um desafio interessante, cuja resolução terá alguma utilidade, que intervém de forma ajustada aos progressos e dificuldades manifestados pelo aluno, apoiando-o, tendo em vista sua realização autônoma. É um processo que contribui não só para que o aluno aprenda determinados conteúdos, mas para que aprenda a aprender e para que aprenda que pode prender: sua repercussão, então, não se limita àquilo que o aluno sabe, mas também ao que sabe fazer e a como vê a si mesmo.15

Nesse sentido, cada aluno é um indivíduo que, como qualquer um,

tem suas limitações e necessidades que devem ser detectadas pelo professor

e medidas deverão ser tomadas para que sejam sanadas. Quando este

professor se sente incapaz de ajudar o aluno a solucionar os seu entraves deve

contar com o apoio da psicopedagogia, através de um profissional que atue na

área e após a avaliação diagnóstica dessa criança, possa elaborar uma

proposta visando o desaparecimento dos obstáculos enfrentados por ele.

15 Antoni ZABALA, In COLL, C 1996 O construtivismo na sala de aula, p. 165.

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O professor, ao buscar a ajuda desses profissionais , procura

mecanismos que possam facilitar ainda mais a aprendizagem de seus alunos e

iniciam um processo de elaboração de propostas que auxiliem a superação das

dificuldades.

O aluno na classe de alfabetização por estar, segundo Piaget, no

limiar de trocas de estágios do pré-operatório para operatório concreto, pode,

muitas vezes, ainda não ter adquirido as competências necessárias para a sua

alfabetização. Esta problemática não é rara e leva o aluno ao insucesso

escolar.

A coordenação de imagens do pensamento ainda se encontra em

processo de amadurecimento e é um dos problemas que aparecem nesta fase

levando o professor a ter que atuar no auxílio desta construção, como por

exemplo, o uso de materiais didáticos, como: figuras que formem uma

sequência lógica para que a criança, a partir da ordenação correta, construa

textos, treinando a organização do pensamento, e assim possa se expressar

através da linguagem escrita.

O texto fatiado e desordenado também é um recurso que auxilia os

alunos na identificação de frases, assim como a compreensão da leitura. Além

disso, outros recursos poderão e deverão ser criados em busca da facilitação

cognitiva do aluno. Zabala chama estes recursos didáticos de materiais

curriculares e a este respeito declara:

A concepção construtivista da aprendizagem escolar e (sic!)

uma opção que entenda o ensino como potencializador de

todas as capacidades da pessoa (sic!) implicam (sic!) uma

concepção do ensino que atenda à diversidade dos alunos e na

qual a função do professor consiste em apresentar os desafios

e prestar as ajudas adequadas às necessidades de cada aluno.

Nesse contexto, materiais curriculares aparecem como um

recurso necessário e facilitador da aprendizagem. 16

16 Antoni ZABALA, In COLL, C 1996 O construtivismo na sala de aula, p. 191.

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Estes recursos para se tornarem facilitadores da aprendizagem têm

que ser escolhidos a partir da diagnose do aluno. É através do reconhecimento

dos entraves do aluno que o professor poderá escolher o ou até mesmo

inventar o material didático que ajudará o aluno a superar suas dificuldades.

Nesse sentido, é de suma importância compreender os processos

de desenvolvimento do cognitivo dos educandos e buscar embasamento

teórico que contribuam com a prática pedagógica para a superação de

dificuldades apresentadas pelos alunos e consequentemente o

desenvolvimento das habilidades necessárias para o seu sucesso escolar.

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Conclusão

Como foi visto no decorrer do presente trabalho, Piaget considera o

movimento o início de todo o aprendizado do bebê. É no estágio sensório

motor que o bebê, através do movimento, começa a conhecer seu corpo e o

ambiente a sua volta, e nesta interação com o meio a criança inicia a

comunicação com este e com as pessoas que a cerca.

Depois de muita prática dos primeiros esquemas esta comunicação irá se

dar através da linguagem verbal que nada mais é que a repetição do que se

ouve, porém para que a comunicação seja estabelecida, esta fala é feita

através de uma sequência de palavras com sentido completo, ou seja, uma

frase. E para a formação desta é necessário o pensamento que faz a

ordenação das palavras. Estas são nomeações de objetos, seres e lugares.

Para Piaget o pensamento surge antes da linguagem, que apenas é

uma das formas de expressão. Com o tempo o vocabulário se amplia em

função de novos conhecimentos adquiridos através do movimento, de tal forma

que o pensamento e o seu aprimoramento estão diretamente relacionados com

o movimento, isto é, com a experiência que o movimento nos traz ao longo de

nossas vidas.

Levando-se em consideração todos os pressupostos teóricos

apresentados durante este trabalho, se faz necessário ressaltar que as

crianças que chegam ao primeiro ano sem ter passado pela Educação Infantil,

trazem na sua bagagem uma defasagem em relação às que frequentaram, em

termos de não terem tido um primeiro contato com as letras e números, com

um ambiente alfabetizador, além de atividades psicomotoras com o objetivo de

estimular o desenvolvimento de capacidades necessárias para a aquisição dos

domínios de leitura e escrita.

De tal forma que esta falta de intimidade com a rotina escolar

traduzirá em uma insegurança e imaturidade para obter a normalidade

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38 desejada e já obtida pelos alunos que vêm da Educação Infantil. Fica a cargo

do professor recuperar estes pré-requisitos.

Neste caso, se faz importante recorrer à ajuda de um

psicopedagogo, uma vez que, ele que coleta e analisa dados que são

relevantes dentro de situações de ensino e aprendizagem, e pontua a

importância de se olhar para as características próprias do aluno. Este

profissional após a avaliação e diagnóstico da situação em que esta criança se

encontra, pode oferecer meios e técnicas, fazendo um trabalho paralelo ao

professor, com o objetivo de superar as dificuldades.

O aluno precisa ser considerado como um todo no qual aspectos

cognitivos, afetivos e corporais estão inter-relacionados em todas as situações.

O corpo deve ser compreendido como um organismo integrado e

não como um amontoado de “partes” e “aparelhos”, como um corpo vivo que

interage com o meio físico cultural.

Nesse sentido, o professor da Classe de Alfabetização que percebe

que o aluno não frequentou a Educação Infantil ou até mesmo os que saíram

dela sem ter atingido o domínio de determinadas habilidades, ao planejar as

suas aulas deve propor atividades que não só englobem as habilidades de

leitura e escrita, mas também que desenvolvam ritmo, lateralidade,

coordenação viso-motora e esquema corporal que são essenciais na

maturidade neurológica do aluno, o que irá facilitar o processo de aquisição de

leitura e escrita.

Os professores que almejam o sucesso de seus alunos nas classes

de alfabetização necessitam fazer uma diagnose ao iniciar o ano letivo para

detectar possíveis defasagens no desenvolvimento psicomotor e, uma vez

sendo necessário, devem utilizar recursos didáticos para que estes alunos

superem suas dificuldades.

A escolha destes recursos só poderá ser feita se o professor

conseguir entender o que falta ao aluno para que o mecanismo da cognição

seja completado. Ou se sele não for possuidor dessa sensibilidade, deve ao

menos procurar o auxílio do psicopedagogo, como foi mencionado no decorrer

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39 dos capítulos, para enriquecer a sua prática em prol do sucesso dos seus

alunos.

Dessa forma, se faz necessário ter um sólido embasamento teórico,

pois como foi visto, o processo de desenvolvimento cognitivo é gradual e suas

fases, segundo Piaget, têm de ser plenamente vivenciadas,

independentemente de idade.

A consulta aos teóricos da educação assim como a participação de

um psicopedagogo se faz importante para que o professor possa detectar as

deficiências dos alunos e corrigi-las através das contribuições oferecidas por

estes profissionais, além da utilização de diferentes recursos didáticos.

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BIBLIOGRAFIA

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ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 02 AGRADECIMENTOS 03 DEDICATÓRIA 04 EPÍGRAFE 05 RESUMO 06 METODOLOGIA 07 SUMÁRIO 08

INTRODUÇÃO 09 CAPÍTULO I 12 COMPREENDENDO AS CONSIDERAÇÕES DE PIAGET A RESPEITO DO MOVIMENTO 1.1 Estágios do desenvolvimento segundo Piaget 12 1.2 Considerações de Piaget a respeito do movimento 13

CAPÍTULO II 21 COMPREENDENDO AS CONSIDERAÇÕES DE PIAGET SOBRE PENSAMENTO CAPÍTULO III 28 DISCUTIR A RELAÇÃO ENTRE MOVIMENTO E PENSAMENTO PARA PIAGET CAPÍTULO IV 32 APONTAR AS RELAÇÕES ENTRE MOVIMENTO E PENSAMENTO NO PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO CONCLUSÃO 37 BIBLIOGRAFIA 40 WEBGRAFIA 41