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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” PROJETO A VEZ DO MESTRE A RELATIVIZAÇÃO DA COISA JULGADA E O PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA Por: Marcia Sequeira Conte Orientador Prof. Jean Alves Rio de Janeiro 2008

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

A RELATIVIZAÇÃO DA COISA JULGADA E O PRINCÍPIO DA

SEGURANÇA JURÍDICA

Por: Marcia Sequeira Conte

Orientador

Prof. Jean Alves

Rio de Janeiro

2008

2

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU

PROJETO A VEZ DO MESTRE

A RELATIVIZAÇÃO DA COISA JULGADA E O PRINCÍPIO DA

SEGURANÇA JURÍDICA

Apresentação de monografia à Universidade

Candido Mendes como requisito parcial para

obtenção do grau de especialista em Direito

Processual Civil.

Por: Marcia Sequeira Conte

3

AGRADECIMENTOS

Em especial, ao amigo Sidnei pelas

ótimas idéias e sugestões, nos

momentos mais difíceis da elaboração.

A todos os amigos que sempre estão

por perto, quando só isso já é o

bastante.

4

DEDICATÓRIA

Dedico esta monografia aos meus pais,

Angelo e Miriam, sem os quais nada seria

e pelos quais tudo sou. Pelo apoio,

incentivo, amor e estímulo recebidos, em

todas as fases da vida.

5

RESUMO

A presente monografia objetivou ser uma contribuição àqueles que se

interessam pelo estudo do direito, especialmente pela garantia de direitos

através do instituto jurídico denominado coisa julgada, constitucionalmente

protegido e amplamente utilizado. O estudo abordou o instituto da coisa

julgada e sua relativização, sobre o qual já foram produzidos alguns trabalhos,

mas que permanece sendo uma fonte inesgotável de questões e controvérsias.

A pesquisa se interessou em encontrar respostas para o correto

desenvolvimento do tema em estudo, partindo de uma questão principal:

demonstrar que a relativização da coisa julgada pode ocorrer sem afetar a

segurança jurídica da sociedade.

6

METODOLOGIA

A metodologia utilizada no presente trabalho foi a pesquisa bibliográfica,

a partir do estudo e do levantamento das referências mais adequadas para

englobar e discutir o assunto e o objeto do trabalho ora apresentados.

Os métodos principais que levaram à realização da monografia foram a

leitura de livros, informativos, revistas e artigos buscados na Internet, após

coleta de dados e pesquisa bibliográfica.

7

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 08

CAPÍTULO I - O Instituto jurídico da coisa julgada

e a origem histórica de sua relativização 11

CAPÍTULO II - A relativização da coisa julgada 23

CAPÍTULO III – O remédio processual para relativizar

a coisa julgada: a ação rescisória 33

CAPÍTULO IV – O princípio da segurança jurídica no

contexto da relativização da coisa julgada 41

CONCLUSÃO 46

BIBLIOGRAFIA CITADA 49

ÍNDICE 51

FOLHA DE AVALIAÇÃO 53

8

INTRODUÇÃO

Na orientação da doutrina moderna, estabelecer os limites da coisa

julgada significa responder a seguinte pergunta: quais partes da sentença

ficam cobertas pela autoridade da coisa julgada?

Entretanto, para que possamos responder à referida pergunta,

urge que façamos algumas considerações a respeito da sentença e da própria

coisa julgada, para que, só então, possamos abordar juridicamente os limites

objetivos e, ainda, os subjetivos da res iudicata.

A coisa julgada aparece no Ordenamento Jurídico-Processual

Brasileiro como um fator decisivo e definitivo no equacionamento dos conflitos

de interesses. Ela é a garantia ad eternum para as partes envolvidas no

deslinde, o que assegura a paz e a tranqüilidade avidamente ansiadas pelo

corpo social.

A Doutrina Processual do nosso país, inspirada em teorias

contemporâneas, andou muito bem acerca das considerações relativas ao

nobre instituto em tela, auferindo as mais veementes motivações tanto do

legislador de 1939 quanto do de 1973.

A relevância do presente estudo é abordar a questão da relativização da

coisa julgada, com observância do princípio da segurança jurídica.

O ordenamento jurídico brasileiro, assim como todos os outros, fornece

subsídios para que seja efetiva a decisão judicial transitada em julgado,

através do instituto da coisa julgada e sua autoridade, derivada da expressão

9 latina res iudacta, significando bem julgado. Mas, para se atingir a coisa

julgada, não basta a existência de uma solução para a controvérsia debatida

em juízo, visto que, na linguagem do direito processual civil atual, a sentença

somente adquire a autoridade da coisa julgada quando não mais comporta

recurso algum.

É necessário, sem dúvida, haver a imutabilidade da sentença em que

tenha ocorrido o trânsito em julgado. Dá-se em nome da segurança jurídica e

da uniformidade de decisões, que representam princípios imprescindíveis no

ordenamento jurídico vigente, sem os quais não se faz justiça.

Constitucionalmente, a regra inserta no artigo 5º, inciso XXXVI, é expressa no

sentido de que a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e

a coisa julgada. É uma faceta do princípio da irretroatividade das leis. O

legislador constitucional originário foi bastante claro no dispositivo analisado e

não deve ser feita interpretação extensiva, em sentido ampliativo. A regra

constitucional diz apenas e tão somente que a coisa julgada não pode ser

alterada por lei que lhe seja posterior, e isto é um princípio de direito

consagrado pela Carta Magna, que não deve, contudo, ser interpretado de

forma a generalizar a amplitude da coisa julgada e fazer dela algo absoluto.

É presumível o caos causado em uma sociedade em que se permita,

incessantemente, a revisão judicial das controvérsias advindas de uma mesma

lide. Nunca seria efetivada sentença judicial alguma, a não ser

provisoriamente, e se eternizariam os conflitos desta feita. Seria o fim da

segurança jurídica e da estabilização social, uma verdadeira desordem nas

relações humanas.

A segurança jurídica é um bem protegido pelo Estado em defesa da

sociedade como um todo, segundo a qual as decisões judiciais são imutáveis e

incontestáveis, pondo termo ao litígio, definitivamente, e impossibilitando

10 qualquer julgamento posterior sobre o mesmo assunto por determinação legal,

por assim o querer o legislador. Ocorre, entretanto, que o princípio da

segurança jurídica não pode ser interpretado separadamente de todo o

sistema jurídico vigente, sendo levado ao extremo. Não se trata de um

princípio superior aos demais, e deve ser sopesado no contexto em que se

insere.

Inicia-se uma movimentação da jurisprudência e da doutrina acerca do

tema proposto no presente trabalho, no sentido de se repensar se é legítimo

reconhecer a autoridade da coisa julgada, mesmo em situações de latente

ofensa aos ditames constitucionais, ou se seria ético que ela fosse suprimida

em nome da justiça das decisões. A tendência na presente monografia será a

de apoiar a segunda, pois o processo é instrumento do direito e não seu fim.

11

CAPÍTULO I

O INSTITUTO JURÍDICO DA COISA JULGADA E A

ORIGEM HISTÓRICA DE SUA RELATIVZAÇÃO

I.1 – Jurisdição e processo

I.1.1 - Jurisdição

A palavra jurisdição significa a “dicção do direito”, posto que proveniente

do latim ius (direito) e dicere (dizer). Corresponde a jurisdição à função

jurisdicional emanada do Estado. Hoje, já não se admite que pessoas ou

instituições, que não façam parte do Estado, julguem, como ocorria nas antigas

civilizações, sobretudo, em favor da Igreja, nas relações entre os eclesiásticos.

Segundo Carreira Alvim, temos que:

“A jurisdição é uma função do Estado, pela qual este atua o direito

objetivo na composição dos conflitos de interesses, com o fim de

resguardar a paz social e o Império da norma de direito. No exercício

deste mister, o Judiciário não atua espotaneamente, devendo, ao

contrário, ser provocado (ne proceda iudex ex officio), por quem

tenha interesse em lide”. (ALVIM, P.55, 2007)

12 Existe, na doutrina pátria, uma divergência acerca de ser a jurisdição um

poder, um dever ou as duas qualidades ao mesmo tempo. Os que concebem a

jurisdição como um poder, esquecem que ela também representa um conjunto

de deveres dos órgãos públicos. Há aqueles que defendem ser a jurisdição um

poder-dever do Estado de declarar e realizar o direito, como Carnelutti, que

vislumbrou “(...) na jurisdição um duplo aspecto, de poder e de obrigação”.

(ALVIM, 2007, P.55).

Além do método estatal de resolução das lides, através do processo,

existem outras possíveis formas de composição do litígio como a

autocomposição (renúncia, reconhecimento, transação), a conciliação e a

arbitragem.

I.1.2 – Processo

Até os dias de hoje, não há consenso entre os doutrinadores a respeito

do conceito ou da natureza jurídica do processo. Por esta razão existem

diferentes teorias sobre o conceito de processo.

Hodiernamente, o processo é considerado um gênero que comporta

várias espécies, quais sejam os processos de conhecimento, de execução e

cautelar. Quanto a sua natureza jurídica, a teoria do processo classifica-o

como categoria jurídica autônoma.

13 Na elaboração de uma teoria geral do processo, o sucesso dos

argumentos sustentados pelos unitaristas conduziu os operadores do direito

processual a criarem a teoria geral do processo, por ser ele substancialmente

uno. As pilastras do ordenamento processual seriam comuns aos dois tipos de

processo, civil e penal, assim como muitos institutos e os próprios conceitos de

ação, jurisdição e processo, a chamada “trilogia estrutural”.

I.1.2.1 – Trilogia estrutural do direito processual: jurisdição,

ação e processo

É exatamente isto que se quer com uma teoria geral do processo, ou

seja, a unificação das diversas formas de processo sob uma disciplina comum,

sem descurar do fato de que o direito material invocado interfere na estrutura

do processo. Há indubitavelmente uma raiz comum nas diversas espécies de

processo e esta raiz é representada, em primeiro plano, pelo conteúdo das

garantias constitucionais comuns a todos os processos. O limite desta

unificação encontra-se no "praticamente útil", ou seja desde que a aplicação da

teoria geral seja capaz de trazer soluções apreciáveis, então se terá campo

propício para sua aplicação. O processo não existe por si. Serve ao Direito,

não só ao direito material, mas à estrutura mesma do Estado e da vida em

sociedade, e a teoria geral é capaz de tornar isto mais claro além de permitir

uma permeabilidade maior à visão que o moderno processo carece.

I.1.2.2 – A sentença

14 O vigente Código de Processo Civil define a sentença como sendo “o

ato pelo qual o juiz põe termo ao processo, decidindo ou não o mérito da

causa” (artigo 162, parágrafo 1º). Considerada imprecisa do ponto de vista da

técnica processual, uma vez que a sentença não é capaz de extinguir o

processo enquanto for possível a interposição de recurso contra a mesma. Na

verdade, o que encerra o processo é o trânsito em julgado da sentença, no

momento em que se encontram esgotados os recursos cabíveis.

De acordo com o nobre doutrinador, Alexandre Freitas Câmara, temos

um conceito cientificamente mais adequado da sentença:

“Verifica-se, pois, que diante do direito objetivo brasileiro, são

sentenças tanto os provimentos finais (empregada a palavra “final”

aqui não no sentido cronológico, de último ato, mas no sentido lógico,

significando aquilo que pretende alcançar), que resolvem o objeto do

processo (art. 269 do CPC), como aqueles que não o fazem (art. 267

do CPC).” (CAMARA, 2004, P.430)

A sentença é classificada em duas categorias: as que contêm resolução

de mérito, chamadas sentenças definitivas e as que não resolvem o objeto do

processo, denominadas terminativas.

As sentenças terminativas têm previsão legal no art. 267 do CPC. Já as

definitivas são aquelas proferidas por alguma das razões previstas no art. 269

do CPC. Ambas são entendidas, pela melhor doutrina, como ato de inteligência

e de vontade do Estado, inteligência e vontade manifestadas através do juiz.

15

Proferida a sentença, seja ela terminativa ou definitiva, é possível a

interposição de recurso, para que outro órgão jurisdicional reexamine o que foi

objeto de decisão. Após o esgotamento dos recursos admissíveis ou de ter

decorrido o prazo sem a interposição de recurso, torna-se irrecorrível a decisão

judicial, ocorrendo seu trânsito em julgado. Surge, assim, a coisa julgada,

fenômeno que será analisado a seguir.

I.2 – O Instituto jurídico da coisa julgada

A coisa julgada é garantia que tem por finalidade atingir a imutabilidade

dos efeitos da sentença. Existe, no processo civil brasileiro, o sistema de

recursos através do qual pode-se pedir o reexame das decisões por diversos

órgãos jurisdicionais. Para atender à necessidade de segurança e estabilidade,

surge o fenômeno da coisa julgada: após o esgotamento da via recursal, a

decisão judicial torna-se imutável, não podendo ser alterada ainda que sua

conclusão tenha sido contrária ao direito.

Segundo reconhece Liebman: “A coisa julgada não se constitui em novo

efeito da sentença, mas é uma qualidade dos efeitos que a sentença já tinha".

(GRECO FILHO, 2007, P.53). Nos termos do art. 467 do Código de Processo

Civil, a coisa julgada material é a eficácia que torna imutável e indiscutível a

sentença não mais sujeita a recurso, seja ordinário ou extraordinário.

Neste campo, ensina Vicente Greco Filho que:

16

“(...) há coisa julgada formal quanto à imutabilidade dos efeitos da sentença dentro do processo e por ausência de outros meios processuais de revisão e que a coisa julgada material ocorre pelo fato de a imutabilidade dos efeitos da sentença projetar-se também fora dos limites do processo, ao impedir a repetição da demanda e o reexame da matéria mesmo em processo autônomo, sendo a primeira pressuposto lógico da segunda, uma vez que seria impossível a formação desta sem a existência daquela”. (GRECO FILHO, 2007, P.54).

De fato, aquele que obtém a seu favor uma decisão judicial irrecorrível

e, portanto, imutável, tem o direito de não voltar a ser demandado no que diz

respeito àquele objeto, inexistindo a possibilidade de nova atuação

jurisdicional.

Verifica-se, pois, que a imutabilidade da sentença, além de ter um

fundamento lógico e social de exigência de estabilidade das relações jurídicas,

tem também um forte sentido de garantia individual, tanto é assim que a leitura

constitucional da coisa julgada a protege, inclusive, contra eventuais alterações

legislativas, conforme disposição expressa do artigo 5º, XXXVI da Constituição

Federal.

É interessante observar que a garantia constitucional da coisa julgada

nasce no processo, através da imutabilidade dos efeitos da sentença,

transformando-se, posteriormente, em verdadeira garantia do direito material,

ao incorporar ao patrimônio jurídico de seu beneficiário o direito substancial

definido na sentença. Essa garantia atua até contra as inovações legislativas

que não podem retroagir para modificar a situação consagrada por sentença

transitada em julgado.

17

É da maneira acima exposta que pensa o doutrinador Vicente Greco

Filho e a maior parte da doutrina, defensores de posição contrária à adotada

no presente trabalho.

Já o professor Alexandre Freitas Câmara entende que:

“A posição referida, embora dominante, não é pacífica e já recebeu críticas oriundas de diversos processualistas, que reconhecem na coisa julgada material, por exemplo, a imutabilidade do efeito declaratório da sentença definitiva e entendem que os outros efeitos (constitutivo e condenatório) não são alcançados por aquela autoridade.” (CÂMARA, 2004, P.464)

Há ainda uma crítica no que se refere ao fato de a coisa julgada material

tornar imutáveis os efeitos da sentença. Segundo os doutrinadores que

minoritariamente a postulam: “os efeitos da sentença definitiva são, por sua

própria natureza, mutáveis e não se destinam a durar para sempre.”

(CÂMARA, 2004, p.465). Esta crítica pode ser exemplificada com situações

concretas, tais como: o efeito condenatório de uma sentença consiste em abrir

caminho para a execução forçada da prestação, cujo cumprimento foi imposto

ao devedor. Após o adimplemento da obrigação, nada restará daquele efeito.

Da mesma forma, pode-se pensar em uma sentença constitutiva, como a de

divórcio, cujo efeito é fazer desaparecer a relação jurídica de casamento,

rompendo o vínculo entre os cônjuges. Nada impede, porém, que os ex-

cônjuges voltem a se casar entre si, retornando ao estado de casados,

tornando insubsistente o efeito da sentença de divórcio.

18 A posição adotada nesta monografia, então, segue o entendimento de

Alexandre Freitas Câmara e outros mestres: a coisa julgada se revela como

uma situação jurídica. Com o trânsito em julgado da sentença, define-se uma

situação que não existia antes, fundamentada na imutabilidade e

indiscutibilidade da sentença, provenientes da decisão judicial que se tornou

irrecorrível. Pode-se dizer que a coisa julgada é situação jurídica que consiste

na imutabilidade e indiscutibilidade da sentença (coisa julgada formal) e

também quanto a seu conteúdo (ato judicial consistente na fixação da norma

reguladora do caso concreto na resolução daquela hipótese submetida à

cognição judicial – coisa julgada material), quando o provimento judicial não

está mais sujeito a recurso algum.

Adota-se aqui, então, a linha de pensamento que intenciona desfazer a

concepção de instituto jurídico absoluto conferido à coisa julgada,

relativizando-a e inserindo-a sempre no contexto em que se encontra. A coisa

julgada material não deve ser aplicada de maneira igual a situações jurídicas

diferentes em seus aspectos concretos.

Neste sentido, a jurisprudência ataca em duas linhas de frente: o

Ministro José Augusto Delgado do Superior Tribunal de Justiça declarou sua

posição a seguir transcrita:

“(...) não posso conceber o reconhecimento de força absoluta da coisa julgada quando ela atenta contra a moralidade, contra a legalidade, contra os princípios maiores da Constituição Federal e contra a realidade imposta pela natureza (...)”.(DELGADO, 2007, http//www.boletimjurídico.com.br/doutrina/texto, Acesso em: 2 maio 2007)

19 Na mesma direção jurisprudencial, a Emenda Constitucional 45 de 2005

traz em sua redação o aparecimento da súmula vinculante nos termos do art.

103-A e seus parágrafos da Constituição Federal. Tal dispositivo traz aspectos

e conseqüências a serem estudados. Do parágrafo 3º do referido artigo, pode-

se inferir que o STF poderá declarar que uma decisão que contrarie a sua

súmula será cassada, determinando que outra seja proferida com ou sem

aplicação da súmula, conforme o caso. Este novo artigo da Carta maior reflete-

se na coisa julgada, tornando-a uma expectativa de direito ou um direito

subjetivo da parte.

I.2.1 – Efeitos da coisa julgada material

A coisa julgada atua como óbice à rediscussão daquele conflito, já

definitivamente decidido; assim, não se poderá renovar a ação (mesmas

partes, mesma causa de pedir e mesmo pedido). A coisa julgada também

produz outro efeito que é a imposição daquela norma concreta estabelecida na

sentença a toda coletividade, ou seja, às partes, às autoridades, ao judiciário e

até mesmo ao legislador.

Na se trata apenas de impedir a renovação da mesma ação, como dito

acima, mais que isso, é impedir que se volte a discutir aquela relação jurídico-

material, ainda que numa outra ação. A coisa julgada material, portanto,

acarreta numa vedação à construção de um novo debate judicial a respeito da

mesma lide, independente de haver total identidade de ações.

20 Pode surgir uma dúvida em se tratando de relações continuativas (art.

471, I, CPC), onde a impressão que fica é que inexiste coisa julgada material,

tendo em vista a ausência de imutabilidade e indiscutibilidade. É o caso, por

exemplo, da ação de alimentos onde o valor e, mais que isso, a própria

obrigação de alimentar, pode ser posteriormente modificada. Trata-se, todavia,

de incompreensão dos que negam a existência de coisa julgada material nesse

tipo de situação.

A coisa julgada material sempre surgirá quando o mérito de uma

questão for decidido, e estiverem esgotadas ou preclusas as vias recursais.

O que se deve compreender é que a coisa julgada material significa

imutabilidade apenas no que tange aos fatos existentes ao tempo do processo

que o originou, ainda que, por falha das partes, não tenham sido trazidos aos

autos (efeito preclusivo). Não há que se falar em imunidade a fatos

supervenientes, isso significaria tornar a coisa julgada material um instituto

“engessador” de situações dinâmicas.

É que a coisa julgada material só opera seus efeitos sobre os fatos

sobre os quais se exerceu (ou havia possibilidade de se exercer – refiro-me à

situação de preclusão da matéria não trazida aos autos processuais) a

cognição, ou seja, sobre quais fatos se decidiu. No caso da ação de alimentos,

uma posterior alteração da necessidade do alimentando ou da possibilidade do

alimentante, ou mesmo o advento da maioridade do alimentando, constituem

fatos supervenientes à sentença e à imutabilidade advinda com a coisa julgada

material, dando ensejo, portanto, à outra demanda judicial, dado que constitui

causa de pedir diversa da que esteve presente no processo anterior.

21

Portanto, mesmo na ação de alimentos haverá coisa julgada material, e

que subsistirá enquanto subsistir aquela situação fática.

A situação torna-se facilmente entendida com a explicação de Adroaldo

Furtado Fabrício, abaixo trancrita:

“Dependendo do maior ou menor grau de dinamismo e mobilidade

que a relação jurídica acertada possua, o estado dela, que se

cristalizou na sentença, terá maior ou menor permanência, assim

como a fotografia guarda similitude com o objeto fotografado por um

tempo mais ou menos longo, segundo se trate de coisa mais ou

menos mutável. A imagem fixada do pássaro em pleno vôo é tão fiel

ao modelo quanto à da montanha sólida e inamovível; a subseqüente

fala de correspondência, extremamente variável de um para outro

exemplo, decorre da mutabilidade do objeto e não da qualidade de

sua representação fotográfica”. (TESHEINER, 2001, P.167)

I.3 – Origem histórica da relativização da coisa julgada: coisa

julgada, justiça da sentença e a segurança jurídica

A Constituição Federal de 1988 apresenta como instrumento para o

exercício do direito constitucional de ação, o processo. Através dele, busca-se

uma tutela jurisdicional adequada e justa, a qual seria atingida com uma

sentença justa. Nesse exercício também deve ser levada em conta a

segurança das relações sociais e jurídicas. Em caso de conflito entre esses

dois elementos (justiça da sentença e segurança jurídica), o sistema

22 constitucional brasileiro foi desenvolvido para optar pela segurança (coisa

julgada), em detrimento à justiça. E é nesse contexto histórico e político que a

coisa julgada surge como princípio a ser observado pelo Estado democrático

de direito, com fundamento no respeito à segurança jurídica.

Já no sistema nazista, por exemplo, na Alemanha, ocorria o contrário: a

sentença justa prevalecia em detrimento à segurança jurídica. No caso alemão,

a história mostrou como a má utilização do Instituto pode servir aos regimes

totalitaristas e ao abuso do poder.

Com o surgimento da coisa julgada inconstitucional e do

reconhecimento de paternidade baseado no exame de DNA, muito se discutiu

acerca do que parecia ser um novo instituto jurídico, denominado relativização

da coisa julgada.

Ocorre que o remédio, expressamente previsto em lei, para atacar a

coisa julgada continuou sendo a ação rescisória e o rol do artigo 485 do CPC é

taxativo no que concerne às hipóteses de cabimento da ação rescisória, a

solução encontrada foi dar uma interpretação extensiva aos incisos V e VII, do

artigo supracitado, de modo a utilizar o primeiro como fundamento jurídico para

desconstituir a coisa julgada inconstitucional e o segundo para as hipóteses de

reconhecimento de paternidade fundado em exame de DNA.

23

CAPÍTULO II

A RELATIVIZAÇÃO DA COISA JULGADA

II.1 – A abordagem da relativização da coisa julgada pela

comunidade jurídica

A questão da relativização da coisa julgada tem sido objeto de

discussão pela comunidade jurídica, uma vez que a autoridade da coisa

julgada não pode ser absoluta a ponto de suprimir todos os outros princípios de

direito não menos importantes, que devem ser considerados em conjunto à

coisa julgada com o fim de trazer justiça às decisões e, por conseqüência, ao

mundo dos fatos.

A doutrina e os Tribunais começam a despertar para a necessidade de

repensar a garantia constitucional e o instituto processual da coisa julgada,

alegando não ser legítimo eternizar injustiças, a pretexto de eliminar incertezas.

Atualmente, diversas questões práticas levam à necessidade premente

de se repensar a autoridade da coisa julgada, sem contudo prejudicar o

princípio consagrado da segurança jurídica e, sobretudo, sem que se faça

injustiça às partes. Não se trata de pôr um fim à segurança jurídica e à coisa

julgada. O fato é que casos há em que a imutabilidade da decisão deve ser

relativizada em nome de princípios igualmente importantes no que diz respeito

à obtenção da justiça.

24

Dentre os casos acima citados, pode-se citar como exemplo a ação de

investigação de paternidade já transitada em julgado, onde não houve a

realização do exame de DNA, posto que inexistente à época da contenda

judicial. Não deveria ser negado à parte o direito de propor nova ação, agora

instruída com o exame, sobre esta questão. Trata-se de direito indisponível e

de ação relativa ao estado das pessoas e não seria justo que a coisa julgada

fosse absoluta, neste caso. Outra situação seria uma ação de indenização por

desapropriação em que restasse incorreta ou corrupta a perícia. Não seria

admissível o trânsito em julgado da decisão e nem justa a autoridade da coisa

julgada.

II.2 - Princípios constitucionais que devem ser analisados em

conjunto à autoridade da coisa julgada

O Estado democrático de direito tem como um de seus princípios

norteadores, a coisa julgada, inserto no artigo 5º da Constituição Federal, em

seu inciso XXXVI. Outrossim, há princípios não menos importantes que regem

nosso direito e não devem ser desprezados no estudo em voga, muito menos

pelos operadores do direito durante o exame da decisão transitada em julgado,

como se falou anteriormente.

Em todos os atos jurídicos, especificamente aqueles emanados do juiz

deve ser observada a razoabilidade e a proporcionalidade. Conforme

escreveram Teresa Wambier e José Medina:

25 “Em que pese não estar expresso em nenhuma lei, o princípio da

proporcionalidade é, sem sombra de dúvidas, presente entre os doutrinadores, diz-se até ser o Princípio dos princípios, já que muitas vezes é utilizado para orientar a lida com outros princípios.” (WAMBIEReMEDINA,2007,http:/www.boletimjurídico/doutrina/texto Acesso em: 2 maio 2007)

A coisa julgada não é um princípio capaz de suprimir todos os outros,

não pode ser considerado mais importante que o da razoabilidade, e não pode

ser supervalorizado em nome da segurança jurídica, que, embora importante,

não é superior à justiça das decisões. Vícios são nocivos à ordem pública, de

tal forma, que possibilitam a revogação da decisão, mesmo passados todos os

prazos preclusivos.

A razoabilidade diz respeito ao fato de que as decisões sejam

verificadas de forma a manter harmonia com o todo. Ser razoável, proporcional

nos benefícios e prejuízos, é o princípio exato para se valorar a

instrumentalidade do processo, pois, deve-se lembrar que o processo não é

um fim em si e dessa forma não pode ser encarado. Assim também na questão

da coisa julgada, o processo não é mais importante, e seus aspectos formais

não podem prevalecer sobre os aspectos materiais, sobre o direito das partes,

o bem da vida deduzido em juízo. A forma não pode prevalecer sobre o

conteúdo, seria a prevalência do meio em detrimento do fim.

O Ministro José Augusto Delgado do Superior Tribunal de Justiça, em

palestra proferida no IV Congresso Brasileiro de Processo Civil e Trabalhista

em Natal, ensinou que a coisa julgada não tem o alcance que muitos

intérpretes lhe conferem, adotando o posicionamento daqueles que extraem,

apenas, do art. 5º, XXXVI da CF que a lei não prejudicará a coisa julgada,

26 tendo sido esta a vontade do legislador constituinte. (DELGADO, 2007,

http//www.boletimjurídico.com.br/doutrina/texto, Acesso em: 2 maio 2007)

A coisa julgada não pode mais ser conceituada como absoluta sempre.

Há momentos em que sua relativização se faz necessária. Salienta-se sempre,

pois fala-se de exceção à regra, que tal exceção necessita ser expressa em lei.

A cultura dos operadores do direito brasileiro não permite que algo seja apenas

cultivado como verdadeiro, é necessário que esteja sedimentado em

legislação.

No direito americano tal não ocorre, desta feita, não há culto à coisa

julgada. É a cultura do direito consuetudinário, onde a legislação é mínima e

não há prejuízo ao ordenamento como um todo, pois os princípios são

respeitados, é o que basta.

No Brasil, a legislação é expressa, e a Constituição determina que

ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei.

Esse dispositivo insere no ordenamento a obrigatoriedade de o sistema ser

inteiramente codificado, em todos os seus aspectos, formais e materiais. Ainda

se está engatinhando em questão de civilização. Como já dizia Voltaire: “(...)

em um Estado a multidão de leis é o mesmo que grande número de médicos:

sinal de enfermidade e fraqueza”. (PEDROSA, 2002, P. 220)

A administração pública guarda estreita ligação com a questão da

moralidade que é princípio constitucional e administrativo.

27 Partindo da premissa que todos os princípios constitucionais servem

para trazer ao homem melhor qualidade de vida, deve-se ter como base que

nenhum princípio seja absoluto, capaz de negar os demais valores, sob pena

de se tornar um empecilho jurídico frente às situações de fato.

É imperioso equilibrar com harmonia as duas exigências divergentes,

transigindo razoavelmente quanto a certos valores em nome da segurança

jurídica, mas abrindo-se mão desta sempre que sua prevalência seja capaz de

sacrificar o insacrificável.

O princípio da moralidade administrativa traz à tona a idéia de cuidado,

zelo, com o patrimônio do Estado e de seus entes públicos. O encargo da

fiscalização a este respeito fica para os Tribunais de Contas, o legislativo e o

povo.

Desse modo entende-se que no caso de haver uma decisão judicial

transitada em julgado condenando um ente público a indenizar o particular em

valor superior ao real, tal decisão é inconstitucional, pois fere princípios

consagrados no ordenamento jurídico pátrio: princípio da isonomia e da

moralidade administrativa. Os efeitos dessa decisão devem ser subordinados a

sua constitucionalidade. Seriam denominados efeitos juridicamente

impossíveis e, portanto, não incidiria a autoridade da coisa julgada material

porque, como sempre, não se concebe imunizar efeitos cuja efetivação agrida

a ordem jurídico-constitucional.

28

II.3 – Em defesa da relativização da coisa julgada: a viabilidade

do instituto

Atualmente, o argumento mais utilizado pelas doutrinas e

jurisprudências que defendem a relativização da coisa julgada é o primado da

justiça. Segundo essa linha de pensamento, o princípio da segurança jurídica

não apresenta um valor absoluto em nosso ordenamento jurídico, uma vez que

deve conviver com valor de primeiríssima grandeza, qual seja o da justiça das

decisões emanadas pelo Judiciário. Isso não significa dotar de insignificância o

princípio da segurança jurídica, mas sim harmonizá-los com outros princípios

de igual ou superior relevância, dado que os princípios são um fim em si

mesmos e devem ser sopesados no contexto geral.

José Augusto Delgado, em sua visão, entende que o princípio da

segurança jurídica está abaixo de outros valores que julga absolutos:

“Os valores absolutos de legalidade, moralidade e justiça estão acima

do valor segurança jurídica. Aqueles são pilares, entre outros, que

sustentam o regime democrático, de natureza constitucional,

enquanto esse é o valor infra-constitucional oriundo de regramento

processual.”(DELGADO,2007,http//www.boletimjurídico.com

.br/doutrina/texto, Acesso em: 2 maio 2007)

O conceituado professor Cândido Dinamarco traz um estudo em que

mostra algumas situações em que se impõe a relativização da coisa julgada

material e que serviram de base à formulação de sua tese.

29

Segundo ele, a autoridade da coisa julgada não se deve sobrepor aos

princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. O fundamento é que as

sentenças abusivas, cujo enunciado proclame efeitos juridicamente

impossíveis, em verdade não produzem efeito e, por conseqüência, não há

formação da coisa julgada material:

“Ora, como a coisa julgada material não é em si mesma um efeito

não tem dimensão própria, mas a dimensão dos efeitos substanciais

da sentença sobre a qual incida,é natural que ela não e imponha

quando os efeitos programados na sentença não tiverem condições

de impor-se.

Onde quer que se tenha uma decisão aberrante de valores, princípios,

garantias ou normas superiores ali ter-se-ão efeitos juridicamente

impossíveis e portanto não incidirá a autoridade da coisa julgada

material – porque, como sempre, não se concebe imunizar efeitos

cuja efetivação agrida a ordem jurídico-constitucional.”

(DINAMARCO, 2001, P.29-30)

Como se observa, a doutrina da relativização da coisa julgada material

constrói sua concepção tendo como premissa que a correta aplicação da

ordem jurídica (suas garantias, seus valores, seus princípios e suas normas) se

traduz em dogma intangível e que deve pairar acima até da segurança das

relações jurídicas. Não que esta doutrina queira esvaziar de sentido o princípio

da segurança jurídica, pelo contrário, mas vêem na justiça das decisões um

valor maior a ser protegido.

II.4 – Querela nullitatis

30

Embora o ordenamento jurídico pátrio não preveja expressamente meio

processual com objetivo de suprimir a suposta coisa julgada inconstitucional,

além da ação rescisória, cabível contra sentença de mérito nas hipóteses

descritas no artigo 485 do Código de Processo Civil, também é possível

considerar a querela nullitatis como instrumento de relativização da coisa

julgada inconstitucional.

Trata-se de ação declaratória autônoma de inexistência jurídica, que se

verifica na ausência de um dos pressupostos processuais de existência (como

a petição inicial, jurisdição, citação e capacidade postulatória), não sujeita a

prazo para sua propositura, ou seja, é imprescritível, devendo ser proposta

perante o juízo que proferiu a decisão.

Nota-se que o objetivo dessa ação declaratória não é a desconstituição

de uma decisão que produziu coisa julgada, como ocorre na ação rescisória,

mas sim a desconsideração de um ato realizado no bojo do processo ou

quando se tratar de sentença inexistente.

A querela nullitatis significa nulidade de litígio, indicando a ação criada e

utilizada na Idade Média para impugnar a sentença, independentemente de

recurso, sendo apontada como origem das ações autônomas de impugnação.

No caso de uma sentença que afronte a Constituição, sopesados os

princípios da supremacia constitucional e da própria força normativa da

Constituição, não é demais concluir que um ato estatal – no caso uma

sentença ou acórdão - que não se coaduna com a ordem constitucional

31 vigente é ato nulo, de pleno direito, visto que lhe falta o fundamento

primordial de validade, no caso, adequação constitucional.

Existe, na doutrina, algum posicionamento contrário ao uso do

instituto. Segundo entende o nobre doutrinador Nelson Nery Jr, sobre a

utilização da Querela Nullitatis:

“No século XXI não mais se justifica prestigiar e dar–se

aplicação a institutos como os da querela nullitatis insanabilis e da

proescrptio immemorialis. Não se permite a reabertura, a qualquer

tempo, da discussão de lide acobertada por sentença transitada em

julgado, ainda que sob pretexto de que a sentença seria

inconstitucional. O controle da constitucionalidade dos atos

jurisdicionais existe, mas deve ser feito de acordo com o devido

processo legal.” (NERY JR., 2004, P.46)

No entanto, há quem entenda e acredite na plausibilidade do uso

da Querela, assegurando que a coisa julgada material não é um direito

absoluto. Prova disso é a possibilidade prevista em lei de rescindir a

sentença de mérito transitada em julgado, prevista no Código de Processo

Civil brasileiro, em seu artigo 485, a ser discorrida no capítulo seguinte deste

trabalho, bem como a querela nullitatis.

II.5 – A Coisa julgada inconstitucional: controle de constitucionalidade

Os atos jurisdicionais exercidos pelo Poder Judiciário estão

sujeitos ao controle de sua constitucionalidade, como todos os atos de todos

32 os poderes, sendo que o devido processo legal deste controle tem de ser

observado. Há três formas para se fazer o controle interno, da

constitucionalidade de tais atos: a) por recurso ordinário; b) por recurso

extraordinário; c) por ações autônomas de impugnação. Na primeira

hipótese, havendo sido proferida decisão contra a Constituição Federal,

pode ser impugnada por recurso ordinário (agravo, apelação, recurso

ordinário constitucional etc) no qual pedir-se-á a reforma ou anulação da

decisão inconstitucional. O segundo caso é de decisão de única ou última

instância que ofenda a Constituição federal, que poderá ser impugnada por

Recurso Extraordinário para o STF (art. 102, III, CF). A terceira e última

oportunidade para controlar a constitucionalidade dos atos jurisdicionais

supracitados, objeto de estudo do presente trabalho, ocorre quando a

decisão de mérito já tiver transitado em julgado, situação em que poderá ser

impugnada por ação rescisória (art. 485 do CPC) ou revisão criminal (art.

622, CPP). Passado o prazo de dois anos que a lei estipula (art. 495, CPC)

para exercer-se o direito de rescisão de decisão de mérito transitada em

julgado, não é mais possível fazer-se o controle da constitucionalidade de

sentença transitada em julgado.

33

CAPÍTULO III

O REMÉDIO PROCESSUAL PARA RELATIVIZAR A

COISA JULGADA: A AÇÃO RESCISÓRIA

A formação da coisa julgada tem o efeito de sanar todas as invalidades

intrínsecas do processo, quais sejam: nulidades absolutas ou relativas e

anulabilidades. Porém, em certos casos, no momento do trânsito em julgado

da sentença, há o surgimento de um novo tipo de vício, ao qual se denominou

rescindibilidade. Este tipo de vício é passível de ataque através de um remédio

específico, o instituto jurídico denominado ação rescisória.

A ação rescisória faz desaparecer a coisa julgada, o que implica

remoção do obstáculo à nova discussão acerca daquilo que já havia sido

decidido por sentença definitiva. Com o desaparecimento do obstáculo, através

da rescisão da sentença coberta pela autoridade de coisa julgada, caberá ao

órgão julgador da ação rescisória, em diversas oportunidades, rejulgar a

matéria objeto de apreciação da sentença rescindida.

Assim sendo, pode-se definir a ação rescisória, como a ação por meio

da qual se pede a desconstituição de sentença transitada em julgado, com

eventual rejulgamento, a seguir, da matéria nela julgada. Em outras palavras, a

ação rescisória visa, precipuamente, desconstituir materialmente sentença

transitada em julgado.

34 Há que se notar que a ação rescisória não pretende a anulação da

sentença, eis que não se trata de caso de nulidade ou anulabilidade. O que se

quer, com tal demanda, é a rescisão da sentença, sendo que sentença

rescindível é aquela transitada em julgado, que possui vício elencado

expressamente em lei e capaz de autorizar sua rescisão.

A ação rescisória não é recurso, mas ‘ação autônoma de impugnação’.

Isso se explica pelo fato de que a ação rescisória só é cabível após a formação

da coisa julgada, ou seja, após o término do processo; já o recurso, por sua

vez, ocorre na mesma relação processual em que se prolatou a decisão

atacada. Portanto, tem-se que a ação rescisória faz surgir processo novo,

diverso daquele em que foi proferida a sentença a ser rescindida.

Trata-se a ação rescisória de demanda cognitiva, razão pela qual o

processo que se forma no momento de seu ajuizamento é processo de

conhecimento. A decisão de procedência no juízo rescisório será, conforme o

caso, meramente declaratória, constitutiva ou condenatória.

No tocante ao cabimento da ação rescisória, a mesma é cabível, em

nosso sistema, somente contra sentenças de mérito abrigadas pela autoridade

de coisa julgada. Este entendimento é extraído do texto do art. 485 do CPC.

Portanto, torna-se incabível a propositura de ação rescisória para atacar

sentença terminativa, levando-se em consideração que tal demanda seria

juridicamente impossível (em consonância com a corrente majoritária da

doutrina pátria).

35 Cabe salientar que as sentenças rescindíveis são transitadas em

julgado, uma vez que a coisa julgada é requisito para que se possa considerar

uma sentença como rescindível, pois antes do trânsito em julgado ela será tão-

somente nula ou anulável. Assim, após a preclusão das vias recursais, a

nulidade encontrar-se-á sanada, podendo ocorrer, então, a rescindibilidade.

Quanto às hipóteses de rescindibilidade da sentença, estas são

expressamente previstas em lei, e devem ser interpretadas restritivamente, eis

que a possibilidade de ataque à coisa julgada substancial é de todo

excepcional. Desta forma, apenas nos casos elencados no artigo 485 do

Código de Processo Civil é que se poderá admitir a rescisão da sentença.

A primeira de tais hipóteses é a de prevaricação, concussão ou

corrupção (segundo disposto no artigo 485, inciso I, CPC). A prática, pelo juiz,

de quaisquer destes ilícitos, torna rescindível a sentença.

Nesta hipótese de rescindibilidade, não se poderá julgar improcedente

o pedido de rescisão da sentença sob o argumento de que a mesma é justa,

isto é, tenha dado adequada solução á demanda que apreciou. A sentença

deverá ser rescindida e, em seguida, no Juízo rescisório, o Tribunal deve julgar

novamente a causa, podendo, obviamente, dar solução de idêntico teor ao da

sentença desconstituída.

De acordo com o entendimento de Humbeto Theodoro Jr.:

“Em tal caso, previsto no inciso I do art. 485, caberá ao juízo competente para conhecer da Ação Rescisória, tão somente, verificar

36 se ocorreu algum daqueles ilícitos e, em caso positivo, rescindir a sentença.” (THEODORO JUNIOR, 2003, P.606)

Finalmente, ainda com relação ao inciso I do art. 485 do CPC, há que

se afirmar que a sentença de primeiro grau de jurisdição proferida por juiz que

tenha praticado algum dos ilícitos presentes no supracitado artigo, não será

rescindível se tiver sido julgado algum recurso contra a mesma, pois neste

caso o acórdão substitui a sentença, desaparecendo, assim, o ato ilegal. Em

sentido contrário existe uma corrente doutrinária, considerada dominante,

entendendo que nesta hipótese é rescindível o acórdão, uma vez que a

prestação jurisdicional foi maculada.

Com relação ao segundo motivo à rescindibilidade da sentença, o

mesmo trata do caso de a sentença ter sido proferida por juiz impedido ou por

juízo absolutamente incompetente, conforme a inteligência do artigo 485, inciso

II, CPC.

Através da leitura do dispositivo ora em análise, pode-se verificar que

apenas o impedimento, e não a suspeição, gera a mencionada

rescindibilidade. Isto ocorre pelo fato de o sistema processual em vigor

considerar o impedimento vício mais grave que a suspeição, determinando,

desta forma, sua sobrevivência ao trânsito em julgado.

Assim, também, o Código de Processo Civil dá tratamento

diferenciado às incompetências absoluta e relativa, tendo em vista que

somente aquela permite a rescisão da sentença definitiva coberta pela

autoridade de coisa julgada substancial. Tal fato se dá porque a incompetência

relativa, inerte o demandado em argüi-la, provoca a prorrogação da

37 competência, ou seja, o juízo relativamente incompetente tornar-se-á

competente se a incompetência não for excepcionada a tempo.

Há que se ressaltar que no caso de ações rescisórias propostas com

fundamento no inciso II do artigo 485, não ocorrerá o chamado juízo rescisório,

visto que o Tribunal deve, após rescindir a sentença (atuando como juízo

rescindente), remeter os autos ao juízo competente para que julgue novamente

a causa.

Seguindo no estudo do artigo 485, prevê seu inciso III como causa de

rescindibilidade da sentença, o fato de a mesma ter sido resultado de dolo da

parte vencedora em detrimento da parte vencida, ou de colusão entre as

partes, a fim de fraudar a lei.

No tocante à primeira, cabe salientar, inicialmente, que ocorre o dolo

referido toda vez que a parte vencedora, faltando a seu dever de lealdade e

boa-fé (vide inciso II do artigo 14 do CPC), haja impedido ou dificultado a

atuação processual do vencido, ou influenciando a formação do juízo do

magistrado, afastando-o da verdade.

Deve-se afirmar, ainda, na esteira dos ensinamentos de Humberto

Theodoro Júnior:

“(...) que é fundamental que o resultado final do processo tenha sido o que foi em razão do dolo, isto é, se não tivesse havido comportamento doloso, o resultado do processo teria sido diverso; caso contrário, a sentença não poderá ser rescindida.” (THEODORO JÚNIOR, 2003, P.607/608)

38

Hipótese diversa, mas que recebeu tratamento no mesmo dispositivo

de lei, é a da colusão processual. Tal instituto jurídico se encontra definido no

art. 129 do CPC, segundo o qual a colusão processual é o fato consistente na

utilização do processo, pelas partes, para praticar ato simulado ou atingir fim

ilícito.

O artigo 485, inciso III, do Código de Processo Civil, leva ao extremo a

intenção do legislador de combater a colusão processual, permitindo a rescisão

da sentença de mérito que tenha sido proferida por juiz o qual não verificou a

colusão no curso do processo original. De certo, deve-se observar que ambas

as partes estejam de acordo quanto à utilização do processo para alcançar fim

ilícito ou praticar ato simulado.

Já o inciso IV do art. 485, ora em estudo, traz em seu bojo o

entendimento de que é passível de ser rescindida a sentença que ofender a

coisa julgada. Obviamente, trata-se de hipótese decorrente da situação jurídica

de imutabilidade e indiscutibilidade do que ficou decidido por sentença de

mérito coberta pela autoridade da coisa julgada material.

Segundo o disposto no inciso V do artigo 485 do CPC, é rescindível a

sentença que violar literal disposição de lei. Este dispositivo trata da violação

do Direito em tese, o qual ocorre quando o órgão prolator da sentença

rescindenda afronta o direito positivo, entendendo-se a palavra lei, contida em

seu texto, no sentido amplo.

Também é caso de rescindibilidade da sentença quando esta se fundar

em prova, cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal, ou seja,

39 provada na própria ação rescisória, nos termos do artigo 485, inciso VI, do

Código de Processo Civil. Vale lembrar que é preciso verificar se a sentença

subsistiria sem a prova apontada como falsa, ou seja, somente a prova falsa

alicerce da sentença é que permitirá a rescisão.

Admite-se, ainda, a rescisão da sentença de mérito coberta pela

autoridade de coisa julgada, no caso previsto no inciso VII, do art. 485, pelo

qual é rescindível a sentença quando, depois de proferida pelo juiz, o autor

obtiver documento novo, cuja existência ignorava, ou de que não pôde fazer

uso, capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável.

Cabe ressaltar que inobstante o referido artigo, em seu inciso VII, falar

em autor para se referir, obviamente, àquele que propõe a ação rescisória,

este não será, necessariamente, o autor da demanda original.

Nos termos do artigo 485, VIII, do CPC, é rescindível a sentença

transitada em julgado quando houver fundamento para invalidar confissão,

desistência ou transação, em que se baseou a sentença.

Finalmente, o inciso IX do art. 485 permite a rescisão da sentença de

mérito no caso de ter a mesma se fundado em erro de fato, resultante de atos

ou de documentos da causa. Lembrando, ainda, que segundo disposto nos

parágrafos 1º e 2º do supracitado artigo, respectivamente, há erro, quando a

sentença admitir um fato inexistente, ou quando considerar inexistente um fato

efetivamente ocorrido e que não tenha havido controvérsia, nem

pronunciamento judicial sobre o fato.

40

Com relação à ação monitória, o sistema jurídico da ação monitória

varia de acordo com a atitude do réu. No caso, o autor funda a sua petição

inicial em prova escrita, sem eficácia de título executivo, bastando a existência

desta prova para que o processo tenha seguimento, sem a análise do direito

material envolvido. No caso de indeferimento da inicial, não ocorrerá a

formação da coisa julgada, e a ação poderá ser proposta novamente, seja

como ação de cobrança ou pela via mais adequada. Quando o réu apresenta

embargos, considera-se completa a cognição, sendo a sentença daí advinda

acobertada pela coisa julgada material. Este é o entendimento adotado no

presente artigo. Contudo, trata-se de matéria divergente no âmbito doutrinário

e jurisprudencial.

O entendimento diverso afirma que a rejeição da tutela, devido à

limitada cognição, leva à formação da coisa julgada, fato que representaria

incômodo ao mundo jurídico. Ou ainda, afirma que ocorre preclusão quando da

não oposição de embargos monitórios pelo réu.

Como se vê, a ação rescisória relativiza a coisa julgada em casos

específicos, desfazendo seu conceito absoluto, com o fim de prestigiar a

justiça das decisões.

41

CAPÍTULO IV

O PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA NO

CONTEXTO DA RELTIVIZAÇÃO DA COISA JULGADA

IV.1 – Direito, segurança jurídica e a coisa julgada

A existência da estrutura processual, seja simples ou complexo,

se justifica em razão de sua finalidade que é a de servir como instrumento

do direito em busca da pacificação dos conflitos. Sendo assim, temos a

sentença como momento culminante do processo, dado que traz a decisão

que resolverá o conflito intersubjetivo de interesses qualificado por uma

pretensão resistida. A sentença, contudo, não significa o fim da angústia

vivida pelas partes diante da incerteza de seus direitos, isso porque o

provimento jurisdicional é passível de alteração, se acionadas as vias

recursais, ou seja, não traz, em si mesma, a pacificação do conflito. O papel

do processo só estará cumprido por completo quando essa decisão estiver

segura, invariável, conferindo certeza às partes.

Em todas as suas ações, o homem sempre busca, precisa e

escolhe a segurança, desejando uma vida estável e sem preocupações.

Uma das seguranças indispensáveis à tranqüilidade humana, sem dúvida, é

a certeza de suas relações jurídicas.

42 A segurança nas relações jurídicas é um valor que deve ser

buscado pelo ordenamento positivo, constituindo poderoso fator de paz

social, isso porque a certeza de uma decisão que confirme a pretensão de

alguém em detrimento de outrem significa, para ambos litigantes, o final das

incertezas que os mantinham em profunda angústia.

O professor Leonardo Greco afirmou que:

“A segurança jurídica não é um direito absoluto, como absoluto não é

nenhum outro direito fundamental, nem mesmo a vida que pode ser

sacrificada para salvar outra vida, por exemplo. Apenas dois direitos

fundamentais são absolutos: não ser torturado e não ser escravizado”.

(GRECO, 2002, P.5)

IV.2 – A segurança jurídica

O princípio da segurança jurídica deve ocorrer, sobretudo, de

modo que os cidadãos, em geral, saibam qual é a forma de entendimento do

Judiciário. É inconcebível conviver com a incerteza jurídica. Atualmente, o

autor, ao ingressar com uma ação judicial, em que pese almejar um fim

específico, requerido na inicial, ignora o destino a ser seguido ao longo do

processo. Há decisões diversas acerca de casos idênticos, pela ausência da

segurança jurídica.

A segurança jurídica diz respeito à irretroatividade da lei. É neste

sentido o mandamento constitucional. Os princípios de direito estão

43 expressos em lei, em sua maioria. Portanto, quando o artigo 485 do código

de Processo Civil, em seu inciso V, diz que a sentença de mérito, transitada

em julgado, pode ser rescindida quando violar literal disposição de lei, está,

certamente, buscando a justiça da decisão.

A ação rescisória, já apresentada e explanada no capítulo III,

possui o prazo de 2 (dois) anos contados da data do trânsito em julgado.

Este é um dos maiores motivos de crítica à ação rescisória, pois o lapso

temporal exigido para a utilização do direito da rescisória é deveras curto

frente às possibilidades existentes no mundo fático. É o caso de ser

rescindida a qualquer tempo, independentemente de prazo.

Quando a lei limita tempo para o aparecimento de prova nova, 2

(dois) princípios constitucionais estão sendo violados: o do devido processo

legal e o da verdade real. Condicionar fato superveniente a determinado

lapso temporal é inaceitável, pois se a nova prova surgir após o tempo

exigido, ficará sem efeito e, a jurisdição, que deveria trazer o equilíbrio para

as relações humanas, trará desacerto e supervalorização do procedimento e

da burocracia em sua forma mais ineficaz. É esta a posição adotada pela

presente monografia.

O atual conceito de direito procura se espelhar na justiça e, para

tal, a moderna sociedade está em busca da verdade real no processo. A

relação de direito material está cada vez mais complexa e o direito

processual não pode mais se desvencilhar da causa em exame.

44 Os processualistas mais formalistas poderiam, de forma cética,

afirmar que é questão de segurança jurídica, mas ao observar o lado do

sucumbente, que após dois anos obtém a prova de que necessitava à época

da alegação, pode-se indagar de que serve o direito se não para a

efetivação da justiça.

Existem, no entanto, aqueles que defendem que a eficiência o aparelho

jurídico depende do respeito ao princípio da segurança jurídica nas

decisões. Para Paulo de Barros de Carvalho, renomado tributarista, a

segurança jurídica é

“um valor específico, qual seja o de coordenar o fluxo das interações

inter-humanas, no sentido de propagar no seio da comunidade social

o sentimento de previsibilidade quanto aos efeitos jurídicos da

regulação da conduta. Tal sentimento tranqüiliza os cidadãos, abrindo

espaço para o planejamento de ações futuras, cuja disciplina jurídica

conhecem, confiantes que estão no modo pelo qual a aplicação das

normas do direito se realiza. Concomitantemente, a certeza do

tratamento normativo dos fatos já consumados, dos direitos

adquiridos e da força da coisa julgada, lhes dá a garantia do passado.

Essa bidirecionalidade passado / futuro é fundamental para que se

estabeleça o clima de segurança das relações.” (TESHEINER,

2001, P.167)

Para o autor, o princípio da segurança jurídica apresenta um caráter

bidirecional passado / futuro, quando trata dos princípios constitucionais gerais

que se aplicam a todo o ordenamento jurídico.

45 Uma vez sentenciado, a decisão do judiciário se isola dos motivos e do

grau de participação das partes, tornando-se imune contra toda e qualquer

razão ou resistência que contra si poderia ser oposta, de modo que se chega à

estabilidade, dado o grau de firmeza que atinge; como ponto culminante dessa

estabilidade temos a coisa julgada.

Os autores que coadunam deste pensamento poderiam conceituar a

coisa julgada como sendo o revestimento de imutabilidade que propicia

estabilidade à sentença e aos seus efeitos, pairando sobre o provimento

jurisdicional (e seus respectivos efeitos) quando não mais couber recurso, seja

por lapso temporal ou exaurimento de todas as suas vias. É, portanto, o

instituto jurídico-processual que possibilita dizer que o processo chegou ao fim,

ou seja, põe fim definitivamente com o conflito.

46

CONCLUSÃO

O presente estudo tratou da questão afeta à chamada coisa julgada

inconstitucional ou sentença inconstitucional transitada em julgado (assim tida

como a melhor nomenclatura), uma vez que, ao ser proferido, pelo Plenário do

Supremo Tribunal Federal, decisão declaratória de inconstitucionalidade ou

confirmatória de constitucionalidade de uma lei, seja em controle abstrato ou

concreto, toda e qualquer decisão que tenha produzido coisa julgada de forma

contrária à posição firmada pela Corte, poderá ser desconsiderada por meio de

instrumentos autônomos de impugnação, quais sejam, ação rescisória ou

querela nullitatis.

Na atualidade, não mais se fala em formulação de norma jurídica

individualizada, ou seja, não basta que o juiz aplique a lei (norma geral e

abstrata) ao caso concreto; exige-se, em virtude do pós-positivismo e, por

conseqüência, do atual Estado Constitucional, uma postura mais ativa do

julgador, a fim de encontrar no caso concreto uma solução que esteja em

maior conformidade com as disposições e princípios constitucionais e direitos

fundamentais.

Cabe à Corte Suprema a interpretação final em matéria constitucional,

devendo suas decisões serem respeitadas e aplicadas de modo uniforme na

prestação jurisdicional, pondo fim à intangibilidade da coisa julgada. Assim, a

posição da doutrina tradicional de conferir um caráter absoluto à coisa julgada,

que coloca a revisão de julgados eivados de vícios de inconstitucionalidade

como inatingível, não pode ser adotada no estágio atual de evolução do Direito

Processual Brasileiro, que prestigia o reconhecimento da força normativa da

Constituição.

47

A relativização da decisão judicial inconstitucional transitada em julgado,

seja ela produzida em sede de controle abstrato ou concreto de

constitucionalidade, é a melhor forma de prestigiar a unidade e a supremacia

constitucional, conferindo um aspecto mais amplo à própria noção de

segurança jurídica.

A coisa julgada material é a garantia essencial do direito fundamental à

segurança nas relações jurídica espécie do gênero segurança, um valor

constitucionalmente previsto. Com o desenvolvimento do presente estudo,

extrai-se que a sociedade atual necessita de um novo regramento no sentido

de alterar o dogma da coisa julgada e ampliá-lo, excepcionalmente, em casos

específicos cuidadosamente analisados pelo magistrado, dentro das hipóteses

legais da ação rescisória e da aplicabilidade judicial da querela nullitatis,

evitando o uso de recursos intermináveis. A exemplo disto, boa parte dos

Tribunais já trabalha no sentido da relativização excepcional da coisa julgada,

para que haja apenas uma decisão sobre o assunto e não um excesso de

recursos interpostos. E este fato vem ocorrendo sem desestruturar a garantia

constitucional da segurança jurídica, sem instalar o caos social e, sobretudo,

qualificando as decisões e melhorando a prestação de serviços aos

jurisdicionados. A segurança jurídica começa a ser inserida no contexto jurídico

em consonância aos princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da

moralidade, adquirindo a dimensão que deve apresentar.

As nulidades se perpetuam na sentença, com o advento da coisa

julgada absoluta em seu bojo. No entanto, existem nulidades tão graves que

não podem ser admitidas pelo ordenamento jurídico, não podem ser

sanadas, muito menos perpetradas no mundo dos fatos. A qualquer tempo

devem ser alegadas. Impugnar-se-á decisão incompatível com a

48 Constituição Federal. Este é o principal argumento concluído com o estudo

deste tema.

O que se propõe é uma mudança na mentalidade da comunidade

jurídica para que se faça valer os direitos inerentes aos cidadãos,

resolvendo problemas, muitas vezes criados pela própria administração

pública em prejuízo da sociedade. É um antídoto contra injustiças, que deve

ser usado pelo Estado apenas em casos de extrema necessidade.

49

BIBLIOGRAFIA CITADA

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2007.

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Revista da Escola Paulista da Magistratura, vol. 2, n. 2, jul.-dez./2001, São Paulo:

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10 - THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. v.I.40.ed.

Rio de Janeiro: Forense, 2003.

11 - WAMBIER, Teresa Arruda Alvim e MEDINA, José Miguel Garcia. O dogma da

coisa julgada: hipótese de relativização.

Disponível em: http:/www.boletimjurídico/doutrina/texto. Acesso em: 2 maio 2007

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ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 2

AGRADECIMENTO 3

DEDICATÓRIA 4

RESUMO 5

METODOLOGIA 6

SUMÁRIO 7

INTRODUÇÃO 8

CAPÍTULO I

O instituto jurídico da coisa julgada e a origem

histórica de sua relativização 11

I.1– Jurisdição e processo

I.1.1 - Jurisdição 11

I.1.2 – Processo 12

I.1.2.1 – Triologia estrutural do direito

processual: jurisdição, ação e processo 13

I.1.2.2 – A sentença 13

I.2 – O instituto jurídico da coisa julgada 15

I.2.1 – Efeitos da coisa julgada material 19

I.3 – Origem histórica da relativização da coisa julgada:

coisa julgada, justiça da sentença e a segurança jurídica 21

CAPÍTULO II

A relativização da Coisa Julgada 23

II.1 – A abordagem da relativização da coisa julgada

pela comunidade jurídica 23

II.2 – Princípios constitucionais que devem ser analisados em

conjunto à autoridade da coisa julgada 24

II.3 – Em defesa da relativização da coisa julgada: a viabilidade

do instituto 27

52 II.4 – Querela nullitatis 29

II.5 – A Coisa julgada inconstitucional:

controle de constitucionalidade 31

CAPÍTULO III

O remédio processual para relativizar a coisa julgada:

a ação rescisória 33

CAPÍTULO IV

O princípio da segurança jurídica no contexto

da relativização da coisa julgada 41

IV.1 – Direito, segurança jurídica e a coisa julgada 41

IV.2 – A segurança jurídica 42

CONCLUSÃO 46

BIBLIOGRAFIA CITADA 49

ÍNDICE 51

FOLHA DE AVALIAÇÃO 53

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FOLHA DE AVALIAÇÃO

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