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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
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ANTECIPAÇÃO DA TUTELA
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Por: Leonardo Nunes da Cunha Filho
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Orientador
Prof. Dr. Sérgio Coelho
Rio de Janeiro
2006
2
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
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ANTECIPAÇÃO DA TUTELA
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Apresentação de monografia à Universidade
Candido Mendes como requisito parcial para
obtenção do grau de especialista em Direito
Processual Civil
Por: . Leonardo Nunes da Cunha Filho
3
AGRADECIMENTOS
....aos meus colegas de Petrobras......
4
DEDICATÓRIA
..... aos meus pais Leonardo e Rosemary,
minha mulher Roberta e filhas Maria
Fernanda, Maria Paula e à pequena
Manuela.......
5
RESUMO
A primeira polêmica apresentada no presente trabalho trata da hipótese
de ser concedida antecipação de tutela, fundada no inciso I do artigo 273,
mesmo antes de se operar a citação do réu. Não encontramos qualquer óbice
para a medida. O próprio artigo que regula a matéria não elenca momentos
específicos para que, nessa hipótese, seja ela permitida.
Outro tema contraditório aqui abordado cuida da fungibilidade entre a
tutela antecipada e a medida cautelar. Em relação à terceira controvérsia,
cremos ser perfeitamente possível a antecipação de tutela nas ações
declaratórias e constitutivas, pois nesse caso está se viabilizando desde logo
ao autor o exercício do direito por ele pleiteado.
A penúltima dissonância exposta cuida do recurso a ser interposto
quando a tutela antecipatória for dada na sentença.
Por fim, foi discutido os aspectos e a eficácia da medida antecipatória
em face da Fazenda Pública, restando conclusa a viabilidade da aplicação do
instituto, reconhecida, a contrario sensu, pela Lei 9.494/97, estando a maior
controvérsia restrita à eficácia da materialização da decisão que defere medida
antecipatória, na qual entendemos que as prerrogativas processuais da
Administração Pública não obstam a eficácia da aplicação do instituto.
6
METODOLOGIA
O método adotado por nós na realização deste trabalho incluiu ampla
pesquisa doutrinária, análises de casos práticos e debates entre pares que
militam na área processual do Jurídico da empresa que tenho a honra de
pertencer, eis que o tema abordado, além de atual, traz instigações. Além
dessas fontes, nos detivemos na busca de opiniões dos tribunais e artigos
relacionados ao tema. É importante ressaltar o apoio recebido pela
Coordenação do Instituto “A Vez do Mestre”, que, através de seus professores,
funcionários e coordenadores, contribuiu decisivamente para o resultado deste
estudo.
7
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
CAPÍTULO 1 - TUTELA JURISDICIONAL
1 - Tutela jurisdicional e prestação jurisdicional
CAPITULO 2 - ANTECIPAÇÃO DA TUTELA
1 - Primeiras considerações
2 – Características e natureza
2.1 – Distinção entre tutela antecipada e tutela cautelar
3 – Análise do art. 273, CPC
CAPÍTULO 3 - A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA NAS AÇÕES
DECLARATÓRIAS E CONSTITUTIVAS
1 – Exposição do problema
2- Divergências acerca do tema
CAPITULO 4 - ANTECIPAÇÃO DE TUTELA NA SENTENÇA
1 – Entendimentos dissonantes até então existentes
2 – Discussão atualmente inócua
CAPITULO 5 – ANTECIPAÇÃO DE TUTELA EM FACE DA FAZENDA
PÚBLICA
1- Aspectos da tutela antecipada contra a Fazenda Pública
2- Eficácia da antecipação da tutela em face da Fazenda Pública
5- CONCLUSÃO
6- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
8
INTRODUÇÃO
Ao longo da história, a doutrina vem admitindo diversas perspectivas
para explicar o processo, mudando, gradativamente, o enfoque de
interpretação dessa ciência.
Num primeiro momento, a construção do pensamento voltado para a
análise dos institutos processuais valia-se do direito de ação. Consistia numa
visão imamentista, figurando a ação como exercício do direito e o processo
como veículo desse exercício. Ponderou-se, contudo, que a defesa de direitos
subjetivos não constitui escopo básico do processo civil.
Posteriormente, emergiu uma segunda etapa, onde entendia-se o
processo como um dever do Estado, vindo este a utilizar-se de tal instrumento
para dirimir conflitos, garantindo a tutela a quem tenha a ela direito, afastando-
se, assim, a ilusão de que o processo seja feito em prol do autor.
Atualmente, o entendimento que toma corpo na doutrina é o que foca o
processo dentro de uma perspectiva atinente à tutela jurisdicional. Visto assim,
cada indivíduo tem direito a uma tutela adequada para satisfazer suas
pretensões. Nessa linha de raciocínio, acentua o professor CÂNDIDO
RANGEL DINAMARCO que:
“o atual momento metodológico da ciência processual autoriza
o retorno às especulações em torno da idéia de tutela
jurisdicional, que fora banida dos estudos dos processualistas
de um século atrás e agora volta reabilitada e revigorada, em
novas vestes. Tutela jurisdicional não é o mero exercício da
jurisdição, ou somente a outorga do provimento jurisdicional
em cumprimento ao dever estatal que figura como contraponto
do poder de ação. (...) Falar em tutela jurisdicional, nesse
contexto moderno, constitui legítimo desdobramento do
postulado da instrumentalidade do processo. O retorno ao
tema harmoniza-se com a tendência à visão do sistema
processual pelo ângulo externo, em contraposição ao método
9
introspectivo que os estudos dogmáticos principiados no século
passado propiciaram”1.
Desta forma, percebe-se que a tutela jurisdicional veio possibilitar uma
maior instrumentalidade ao processo, para torná-lo não apenas um veículo
para o exercício do direito, mas sim a garantia do exercício pleno do direito, na
medida que atende aos anseios de uma justiça célere.
1 Tutela jurisdicional, Revista Forense, vol. 334, ps. 19-20
10
CAPÍTULO 1 - TUTELA JURISDICIONAL
1 - Tutela jurisdicional e prestação jurisdicional
Não podemos confundir tutela com prestação jurisdicional. Esta
caracteriza-se como a garantia de um provimento judicial a quem ingressar em
juízo. Decorre do simples direito abstrato de ação, ainda que, faticamente, o
autor não detenha o direito que afirma ter o réu violado ou ameaçado. Já
aquela consiste numa resposta do judiciário que reconhece e resguarda in
concreto o direito subjetivo da parte2. Todo mundo tem direito a uma resposta
jurisdicional, considerando o pedido procedente ou improcedente, mas tutela
jurisdicional só tem quem tiver sua pretensão acolhida pelo Estado, em virtude
de possuir direito material. Clara está a lição de HUMBERTO THEODORO
JÚNIOR, verbis:
“Todo litigante que ingressa em juízo, observando os
pressupostos processuais e as condições da ação, tem direito
à prestação jurisdicional(sentença de mérito ou prática de certo
ato executivo); mas nem todo litigante faz jus à tutela
jurisdicional”3.
Assim sendo, enquanto a tutela jurisdicional esta ligada ao direito
material daquele que a busca, a prestação jurisdicional está relacionado ao
direito de ação que todos tem perante o judiciário.
2 Humberto Theodoro Júnior, Tutela Jurisdicional de Urgência, 2ª ed., p. 23 Ob. cit., loc. cit.
11
CAPITULO 2 - ANTECIPAÇÃO DA TUTELA
1 - Primeiras considerações
O eminente professor J. E. CARREIRA ALVIM, ao tratar do presente
tema, tece as seguintes considerações:
“Nos países em que a distribuição da Justiça constitui
monopólio estatal, a preferência tem sido pela mera
simplificação dos ritos, através da simplificação do processo e
do procedimento, como sucede no Brasil, com o processo
cautelar, com os procedimentos sumários e especiais, e
algumas leis esparsas (v.g. Lei do Mandado de Segurança), ou
da simplificação dos julgamentos, como o julgamento
antecipado da lide, a antecipação da tutela e a tutela liminar”4.
A Lei 8.952/94 realizou uma reforma processual no ordenamento
jurídico brasileiro, instituindo, dentre outros, o instituto da antecipação de
tutela, conferindo nova redação ao art. 273, CPC. Em princípio, a antecipação
da tutela não trouxe nenhuma novidade ao processo civil brasileiro, visto que
anteriormente à vigência dessa lei já era possível, em determinados casos
específicos, a antecipação da providência que se buscava, como, por exemplo,
nos casos de pedido de liminar de reintegração de posse (artigo 928 do CPC),
na venda antecipada de bens penhorados, se sujeitos a deterioração ou se tal
venda representasse manifesta vantagem (artigo 670 do CPC) e, talvez de
maneira mais expressiva, no artigo 84, § 3º, do Código de Defesa do
Consumidor que diz:
"Art. 84 – Na ação que tenha por objeto o cumprimento da
obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela
específica da obrigação ou determinará providências que
assegurem o resultado prático equivalente ao do
adimplemento.
12
§3º - Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo
justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao
juiz conceder a tutela liminarmente ou após justificação prévia,
citado o réu”.
Desse modo, podemos concluir que a nova redação do artigo 273 do
Código de Processo Civil regulou, de modo generalizado e sistemático, o uso
do instituto da antecipação da tutela, que até então era empregado em casos
excepcionais, passando a ser aplicável, em princípio, a todos os processos.
A antecipação da tutela se traduz, contudo, numa importante revolução
processual, que rompeu a barreira do passado, caracterizada pelo até então
existente preconceito de que a antecipação dos efeitos não se coadunava com
o acautelamento.
Resgata-se, pois, ao menos em parte, a idéia de celeridade da
prestação jurisdicional aos jurisdicionados, atribuindo, via reflexa, ao Poder
Judiciário, o respeito que lhe é devido, porquanto sustentáculo imprescindível
do Estado de Direito.
2 – Características e natureza
A tutela antecipada, no dizer do jurista ALEXANDRE FREITAS
CÂMARA,
“é uma forma de tutela jurisdicional satisfativa (e, portanto, não
cautelar), prestada com base em juízo de probabilidade. Trata-
se de fenômeno próprio do processo de conhecimento”5.
Ela visa satisfazer, antecipadamente, o direito da parte,
assegurando ao demandante, total ou parcialmente, os efeitos jurídicos que
seriam auferidos com o acolhimento do pedido numa futura sentença de
mérito.
Assim entende ANTÔNIO CLÁUDIO DA COSTA MACHADO:
4 A antecipação de tutela na reforma processual, Revista Forense, vol. 332, ps. 73-74.5 Lições de Direito Processual Civil, 4ª ed., Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2000, vol. I, p. 78
13
"tutela antecipada é instituto que passa a integrar o
procedimento cognitivo comum, afastando por completo a idéia
de duplicação de feitos"6.
Vale frisar, ademais, que o instituto da tutela antecipada não se trata de
medida cautelar, concedida diante de regras e princípios disciplinadores dessa
espécie no ordenamento processual vigente. Cuida-se, como assinala SÉRGIO
BERMUDES, de"prestação jurisdicional cognitiva, consistente na outorga
adiantada da proteção que se busca no processo de conhecimento, a qual,
verificados os pressupostos da lei, é anteposta ao momento procedimental
próprio"7.
Esse entendimento também é defendido POR NELSON NERY
JÚNIOR, assinalando, com propriedade, que:
"a tutela antecipada dos efeitos da sentença de mérito não é
tutela cautelar porque não se limita a assegurar o resultado
prático do processo, nem a assegurar a viabilidade da
realização do direito afirmado pelo autor, mas tem por objetivo
conceder, de forma antecipada, o próprio provimento
jurisdicional pleiteado ou seus efeitos"8.
A parte da doutrina que entende ser a tutela antecipada uma espécie
de medida cautelar satisfativa argumenta que está presente naquela a
cognição sumária e a segurança da efetividade da decisão final.
Porém certo é afirmar que a Tutela antecipada é a própria decisão final,
não podendo ser confundida como mera garantia de efetividade, sendo este o
principal argumento dos que defendem a natureza sui generis da tutela
antecipada.
2.1 – Distinção entre tutela antecipada e tutela cautelar
6 Tutela antecipada, , 3ª ed., p. 2737 A reforma do código de processo civil, p. 28
14
É praticamente unânime na doutrina o entendimento de que a natureza
da tutela antecipada nada tem de cautelar, posto que, como já exposto acima,
se trata de adiantamento do provimento que se busca no mérito da causa,
tratando-se, desta sorte, de antecipação satisfativa da prestação jurisdicional
pretendida.
Não obstante a existência de algumas semelhanças entre os dois
institutos, a diferença entre eles existe e é bastante clara, se considerarmos
que a medida cautelar visa assegurar o efeito prático de um processo principal,
enquanto a tutela antecipada, por seu turno, se constitui na própria providência
requerida, que pode ser deferida no todo ou em parte, havendo, inclusive,
posicionamento do Superior Tribunal de Justiça nesse sentido, a saber:
"A antecipação da tutela serve para adiantar, no todo ou em
parte, os efeitos pretendidos com a sentença de mérito a ser
proferida ao final. Já a cautelar visa a garantir o resultado útil
do processo principal. Enquanto o pedido de antecipação de
tutela pode ser formulado na própria petição inicial da ação
principal, a medida cautelar deve ser pleiteada em ação
separada, sendo vedada a cumulação dos pedidos principal e
cautelar num único processo"9.
Por fim, cumpre ressaltar que a tutela antecipada versa sobre o direito
material pleiteado, sendo adotada pelo art. 273 do CPC, o qual se encontra no
processo de conhecimento, estando evidenciada a intenção do legislador em
não confundi-la com uma medida cautelar.
3 – Análise do art. 273, CPC
Será analisado, a seguir, o preceituado no art. 273, CPC. Reza o
dispositivo que:
8 Atualidades sobre o processo civil, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1995, p. 53 9 STJ, 2ª Turma, Proc. REsp. n. 60.607-SP, Rel. Min. Ademar Maciel, DJU de 04.9.97
15
“Art. 273 – O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar
total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido
inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da
verossimilhança da alegação e:
I – haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil
reparação; ou
II – fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o
manifesto propósito protelatório do réu.
§1º - Na decisão que antecipar a tutela, o juiz indicará de modo
claro e preciso, as razões do seu convencimento.
§2º - Não se concederá a antecipação da tutela quando houver
perigo de irreversibilidade do provimento antecipado.
§3º - A execução da tutela antecipada observará, no que
couber, o disposto nos incisos II e III do art. 588.
§4º - A tutela antecipada poderá ser revoga ou modificada a
qualquer tempo, em decisão fundamentada.
§5 – Concedida ou não a antecipação da tutela, prosseguirá o
processo até final julgamento.
§6o - A tutela antecipada também poderá ser concedida
quando um ou mais dos pedidos cumulados, ou parcela deles,
mostrar-se incontroverso.
§7o - Se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer
providência de natureza cautelar, poderá o juiz, quando
presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida
cautelar em caráter incidental do processo ajuizado."
O juiz poderá conceder a antecipação de tutela quando, mediante
requerimento da parte, se convença da verossimilhança da alegação em
decorrência da existência de prova inequívoca, devendo haver, ainda, a
existência de um dos incisos do artigo em questão. Assim, é necessário haver
16
a conjugação de um dos incisos com o caput do artigo 273 para que seja
deferida a antecipação.
O pedido de antecipação de tutela pode vir contido na peça inicial
(quando fundado no inciso I, do artigo 273), ou pode ser requerido no curso do
processo. O requerimento da tutela antecipada, fundado no inciso II do artigo
273, não tem cabimento na peça inicial, uma vez que tal possibilidade só pode
ser apurada após o oferecimento da contestação.
No que diz respeito à verossimilhança da alegação, vale destacar o
ensinamento de J.E. CARREIRA ALVIM:
“A verossimilhança é assenta num juízo de probabilidade, que
resulta, por seu turno, da análise dos motivos que lhe são
favoráveis (convergentes) e dos que lhe são contrários
(divergentes). Se os motivos convergentes são superiores aos
divergentes, o juízo de probabilidade cresce; se os motivos
divergentes são superiores aos convergentes, a probabilidade
diminui (...). No exame do pedido da antecipação de tutela, o
juiz não foge a esse juízo crítico dos fatos e do direito, do qual
resultará, ou não, o seu convencimento da verossimilhança,
para fins de concessão ou denegação do provimento
antecipado”10.
Em relação à prova inequívoca, traduzindo-se de forma literal, diz
respeito a algo certo, seguro, correto, que não dá margem a erro ou engano.
Ocorre que, entretanto, prova alguma é inequívoca, porque simplesmente não
há prova que transmita certeza absoluta de um fato ou de um acontecimento,
valendo dizer que, qualquer juízo sobre fatos no processo é juízo de
verossimilhança e não de certeza. Isso porque a prova, enquanto escrita, pode
ser falsa, mesmo se tratando de escritura pública, como já julgou o Superior
Tribunal de Justiça:
10 A antecipação de tutela na reforma processual, Revista Forense, vol. 332, p. 74.
17
"A prova plena, referida no artigo 134 do Código Civil, diz
respeito ao ato jurídico documentado na escritura pública, nada
refletindo no conteúdo das declarações feitas pelas partes, que
pode ser verdadeiro ou não"11.
O professor CARREIRA ALVIM, ao tratar do tema, esclarece que
“(...)prova inequívoca deve ser considerada aquela que
apresenta um grau de convencimento tal que, a seu respeito,
não possa ser levantada qualquer dúvida, ou, em outros
termos, cuja autenticidade ou veracidade seja provável. Esse
exame da prova – que não se confunde com o juízo, porquanto
este incide sobre a alegação – para fins de avaliação do seu
potencial gerador de certeza independe da sua natureza
(documental, material etc.). É bem verdade que uma prova
preconstituída, constante de um instrumento público, elaborado
com a observância das formalidades legais, em princípio, é
‘inequívoca’ do ato jurídico que representa, podendo constituir
excelente meio de convencimento da verossimilhança da
alegação, para fins de antecipação de tutela. Nem sempre,
contudo, o fato de se tratar de um instrumento público, significa
que a prova seja inequívoca. A contrario sensu, nem sempre
prova constante de documento particular, pelo só fato de ser
particular e não subscrito por testemunhas, traduz uma prova
equívoca, de forma a desautorizar a concessão da tutela
antecipada”12.
Sobre esses dois elementos do caput do artigo 273, há de ser
apresentada também a excelente exposição do mestre CÂNDIDO RANGEL
DINAMARCO, ao dizer que
11 STJ, 2ª Turma., Proc. REsp. n. 36.174-SP, Rel. Min. Ari Pargendler, DJU de 21.10.96, pág. 40.22712 A antecipação de tutela na reforma processual, Revista Forense, vol. 332, p. 82
18
“(...)ao dar peso ao sentido literal do texto, seria difícil
interpretá-lo satisfatoriamente, porque prova inequívoca é
prova tão robusta que não permite equívocos ou dúvidas,
infundindo no espírito do juiz o sentimento de certeza, e não
verossimilhança. Convencer-se da verossimilhança, ao
contrário, não poderia significar mais do que imbuir-se do
sentimento de que a realidade fática pode ser como a descreve
o autor”13.
Ao passarmos para a análise dos incisos, percebemos que existem duas
espécies de tutela antecipatória. A primeira conjugando os requisitos do caput
do artigo com o inciso I e a segunda baseando-se na combinação do caput
com o inciso II.
Para tentarmos estabelecer o alcance da providência antecipatória,
devemos nos ater, primeiramente, à finalidade para a qual foi preordenada a
antecipação prevista no art. 273, como bem acentua o professor CARLOS
ALBERTO ÁLVARO DE OLIVEIRA, Pronuncia-se o autor da seguinte forma:
“Sob esse ponto de vista, não há dúvida de que, na hipótese
do inciso I do art. 273, visa-se a prevenir o dano – a lei é
suficientemente explícita e não deixa margem a tergiversação
(“fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação”).
Não se cuida, ademais, de simplesmente acelerar o ritmo do
procedimento, em atenção à natureza do direito envolvido na
demanda, mas de autêntica e típica prevenção de dano, capaz
de comprometer o próprio direito eventualmente reconhecido a
final.
Em perfeita harmonia com essa finalidade, a medida da
cognição exercida pelo órgão judicial da verossimilhança da
alegação. Exige-se algo mais do que na tutela cautelar do art.
798 e menos do que na tutela dispensada em cognição plena e
exauriente. Naquela, mesmo sem qualquer prova, pela simples
13 A Reforma do Código de Processo Civil, 3ª ed., Malheiros, p. 143.
19
exposição dos fatos da causa, pode o Juiz, em se
convencendo da verossimilhança do direito alegado e do
receio de lesão, dispensar cautela liminarmente. Nesta, impõe-
se a prova inequívoca, vale dizer, clara, sem jaça, evidente,
mas quanto baste para o convencimento da probabilidade da
alegação e não de sua certeza (a certeza, aliás, em Direito
Processual é sempre relativa, como sabido). Assim, tanto pode
atender ao modelo legal um começo de prova por escrito,
como a justificação prévia. A cognição, portanto, continua
sendo incompleta, não exauriente: nada impede, por exemplo,
que no curso do processo venha a ser provado que aquela
determinada alegação fática, a princípio considerada evidente,
não corresponda exatamente à realidade”14.
Quando fundada no inciso I, a antecipação da tutela, do artigo 273,
pode ser concedida mesmo antes de se operar a citação do réu, não
encontrando qualquer óbice para a medida15. O próprio artigo que regula a
matéria não elenca momentos específicos para que, nessa hipótese, seja
ela permitida. Ao revés, faculta tal possibilidade a qualquer momento,
desde que preenchidos os requisitos necessários, o que nos leva a concluir,
com o devido respeito aos pensamentos contrários, que, não havendo
proibição expressa a esse respeito, pode haver antecipação de tutela
inaudita altera pars.
No magistério de NELSON NERY JÚNIOR
"a liminar pode ser concedida com ou sem a ouvida da
parte contrária. Quando a citação do réu puder tornar
ineficaz a medida, ou também quando a urgência indicar a
necessidade de concessão imediata da tutela, o juiz poderá
14 Alcance e natureza da tutela antecipatória, Porto Alegre, Ajuris, vol. 66, 1996, p. 20315 ver José Roberto Bedaque, Antecipação da tutela jurisdicional "in" Aspectos polêmicos da antecipação de tutela, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1999, p. 233
20
fazê-lo inaudita altera pars, que não constitui ofensa, mas
sim limitação imanente ao contraditório, que fica diferido
para momento posterior do procedimento.16"
O autor supracitado é acompanhado por LUIZ GUILHERME
MARINONI, que assinala o seguinte:
"O próprio artigo não poderia vedar a concessão da tutela antes da
ouvida do réu, pois nenhuma norma tem o condão de controlar as situações
de perigo. A tutela de urgência, sem dúvida, não pode ser eliminada onde é
necessária para evitar um prejuízo irreparável”.
Diante do exposto, mostra-se patente a possibilidade de concessão
da tutela antecipada liminarmente. É o caso, por exemplo, de uma
determinada situação de risco iminente, onde a parte contrária há de ser
citada, por meio de carta precatória, em outro Estado. Ora, se o princípio da
concessão da tutela antecipada, fundada no inciso I do artigo 273, é
justamente evitar o dano irreparável ou de difícil reparação, pensar que a
antecipação só pode ser conferida após a manifestação do réu, seria até
mesmo um desprestígio ao instituto.
Todavia, como dito, existem opiniões em contrário, não aceitando a
possibilidade de antecipação sem a manifestação da parte ré, destacando-
se as de CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO17, RUI PORTANOVA18 e de
JOSÉ JOAQUIM CALMON DE PASSOS19, alegando que se trata de
providência exigida pelo princípio constitucional do contraditório.
16 Atualidades sobre o processo civil, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1995, p. 5817 Entende o autor que "se algum procedimento excluísse a participação dos sujeitos envolvidos no litígio, ele próprio seria ilegítimo e chocar-se-ia com a ordem constitucional." A instrumentalidade do processo, , Revista dos Tribunais, 1987, p. 184 18 "O princípio do contraditório é elemento essencial do processo. Mais do que isto, pode-se dizer que é inerente ao próprio entendimento do que seja processo democrático, pois está implícita a participação do indivíduo na preparação do ato de poder." Princípios do processo civil, Porto Alegre, Livraria do Advogado Editora, p. 16019 "Não ficou claro, entretanto, qual o momento em que deve o autor formular seu pedido de antecipação da tutela e se, ultrapassado ele, haverá preclusão. Acreditamos tenha sido o silêncio do legislador não um descuido, e sim uma deliberação consciente no sentido de que a tutela pode ser antecipada, desde que satisfeitos os pressupostos para ela previstos, a qualquer momento do procedimento, se não houver incompatibilidade entre a fase em que se encontra o procedimento e essa antecipação de tutela. Cremos,
21
Todavia, se são controvertidas as posições da doutrina no tocante ao
cabimento da antecipação de tutela sem a audiência do réu, parece estar
quase pacificada, na jurisprudência, tal possibilidade. Veja-se, como
exemplo, acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo:
"Agravo de instrumento contra decisão que reconsiderou a
liminar concedida como tutela antecipada, com fulcro no art.
273 do Cód. de Proc. Civ. – Preliminar prejudicial da falta
de juntada de certidão do decurso de prazo – Afastada – O
ato praticado com fundamento no art. 14 e 16, letra c, do
Regimento Interno da Câmara Municipal... Recurso provido,
restaurando a decisão anterior e que concedeu a liminar de
tutela antecipada"20.
A outra possibilidade de antecipação de tutela pelo art. 273 do CPC é
baseada na conjugação do caput do artigo com o seu inciso II. Dessa forma,
tem que combinar-se a verossimilhança da alegação e a prova inequívoca com
o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu.
O eminente mestre J.J. CALMON DE PASSOS explica o que significa
“abuso do direito de defesa” nos seguintes termos:
"Talvez a melhor maneira de definir o abuso do direito seja
dizer-se que ele ocorre quando se exercita, além do limite
necessário, o direito que se tem, ou quando esse exercício
objetiva não alcançar a tutela que a ele se associa e é devida a
seu titular, sem outro fim, mesmo lícito que seja ou moralmente
justificável. Todo desvio de finalidade é um abuso"21.
portanto, seja possível a postulação logo após a contestação do réu, ou até que o feito seja saneado e, mesmo assim, no curso da instrução... ou em grau de recurso." Comentários ao código de processo civil, vol. III, 8ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 1998, p. 3420 Tribunal de Justiça de São Paulo, A.I. 19.692, Rel. Des. Yoshiaki Ichiahara, DOE 06.11.96
21 Inovações no código de processo civil, p. 18
22
Diante do acima exposto, ao consideramos que o "abuso do direito de
defesa" é a exorbitância no exercício do direito de contestar, podemos inferir
que o segundo elemento, qual seja, o "propósito protelatório do réu" nada mais
é do que qualquer outro ato não relacionado à contestação, que tenha por
escopo o retardamento do processo.
Para melhor elucidação da matéria, valemo-nos do pensamento do Prof.
COSTA MACHADO:
"Manifesto propósito protelatório do réu é a intenção clara do
demandado de procrastinar o andamento do processo e a
outorga do provimento final, intenção cuja evidência é revelada
pela utilização exorbitante do direito de resposta, que não a
contestação e do direito de provocar incidentes, bem como
pela prática de quaisquer atos isolados de caráter temerário.
Acerca do direito de resposta, chamamos a atenção para o fato
de que ele é exorbitante, ou excessivo, tanto na hipótese de o
réu se valer de uma só de suas modalidades com intenção
flagrantemente procrastinatória, como no caso dele se valer do
oferecimento simultâneo de várias respostas (reconvenção,
exceção, impugnação ao valor da causa, denunciação, etc.)
descabidas, todas ou algumas, ou desprovidas de razoável
fundamento ou articulação"22.
Nessa segunda espécie, prevista no inciso II do art. 273 do CPC, não é
cabível liminar na antecipação de tutela, uma vez que só é possível a
ocorrência de alguma das duas hipóteses previstas no dispositivo em questão
após o réu ter se pronunciado no processo. No entanto,é plenamente cabível
tal liminar após a manifestação do réu, conforme assinala o I. doutrinador
Francisco Barros dias ao discutir a questão:
“me parece que não haverá limite de instância, podendo,
inclusive, ser pedida em grau de recurso. Aliás, o processo, se
22 – A reforma do processo civil interpretada, 2ª ed., São Paulo, Saraiva, , 1996, p. 25
23
achando no Tribunal, tendo havido provimento do pedido em
primeiro grau, a situação se apresenta com uma dose maior de
probabilidade, o que pode facilitar a análise do pedido, e ainda
existe a vantagem de ter sido carreado todo meio de prova
para o processo. A não ser que haja alegação de defeito nos
autos, o qual resida exatamente na insuficiência de prova.
Obviamente que cada uma dessas espécies se deverá
encontrar conjuminada com os outros requisitos constantes
dos parágrafos do artigo”23.
Em relação ao §2º do artigo 273, tem-se que pesar a irreversibilidade do
direito do autor pelo princípio da proporcionalidade. É importante observarmos
que existem casos em que se permite a satisfatividade irreversível da tutela
antecipada, sob pena de perecimento do direito (por exemplo, litígios
envolvendo planos de saúde, em que as empresas se negam a cobrir as
despesas hospitalares em razão do tipo de doença). Nesses casos, como
observa OVÍDIO BAPTISTA,
"se o índice de plausibilidade do direito for suficientemente
consistente aos olhos do julgador entre permitir sua
irremediável destruição ou tutelá-la como simples aparência,
esta última solução torna-se perfeitamente legítima"24.
O § 3º deve ser combinado com o art. 588, CPC. Desse modo, na
efetivação da tutela antecipada devem ser observados dois princípios (art. 588,
II e III):
a) não pode haver alienação do domínio. Assim, no caso de antecipação
que dê ao autor a posse de um bem, este não poderá ser alienado por
aquele;
b) não pode levantar quantia sem dar caução. O autor deve dar um bem em
garantia para levantar uma quantia pretendida antecipadamente.
23 Francisco Barros Dias, Processo de conhecimento e acesso à justiça (tutela antecipatória), Ajuris, vol. 66, p. 225.
24 A antecipação da tutela na recente reforma processual, p. 142
24
Pelo § 4º, o mesmo juiz que defere a tutela antecipada pode revogá-la a
qualquer tempo. Entretanto, tem que haver requerimento da outra parte para
que o juiz a revogue, não podendo fazê-la de ofício.
O § 7º, acrescido ao artigo 273 por meio da Lei 10.444, de 07 de maio
de 2002, consolidou a construção doutrinária, capitaneada por Humberto
Theodoro Júnior, que admite a fungibilidade entre a antecipação de tutela e a
medida. Isso significa que quando a parte pede a medida errada (em vez de
cautelar pede tutela antecipada e vice-versa) o Estado tem que dar a tutela de
urgência de qualquer modo. Mas só se defere a tutela antecipada, quando
pedida a cautelar , se estiverem presentes os requisitos daquela, e não desta.
Tal fungibilidade é garantida, sobretudo, por fundamento constitucional, nos
moldes do art. 5º, XXV, CF/88, que versa o seguinte:
“art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à
vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade,
nos termos seguintes:
(...)
XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário
lesão ou ameaça a direito”.
O Professor Humberto Theodoro tece as seguintes considerações
acerca do assunto:
“Ora, tanto na tutela cautelar como na antecipatória, a parte
pede uma providência urgente para fugir das conseqüências
indesejáveis do perigo de dano enquanto pende o processo de
solução de mérito. E o que distingue o procedimento de um e
outro pedido de tutela de urgência é a circunstância formal de
que o pedido cautelar deve ser processado à parte do feito
principal enquanto o pedido antecipatório se dá dentro do
próprio processo de mérito. Formular, portanto, um pedido de
25
natureza antecipatória ou outro de natureza cautelar em
desacordo com o procedimento traçado pela lei processual,
como, por exemplo, uma medida antecipatória em petição
separada, sob o rótulo de medida cautelar atípica, não passa
de simples equívoco formal ou procedimental”25.
Entretanto, há entendimento diverso, principalmente em decisões
judiciais, que negam a fungibilidade das duas medidas.
25 Tutela jurisdicional de urgência, 2ª ed., p. 21.
26
CAPÍTULO 3 - A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA NAS
AÇÕES DECLARATÓRIAS E CONSTITUTIVAS
1 – Exposição do problema
Somente na ação de conhecimento poderá haver antecipação de tutela.
A forma clássica é na ação condenatória. E na ação declaratória e
constitutiva? Pode haver antecipação de tutela?
2- Divergências acerca do tema
Existem dois posicionamentos acerca desse assunto.
Para ALEXANDRE CÂMARA, só é possível a antecipação nas ações
condenatórias. O autor se pronuncia da seguinte maneira sobre tal questão:
“Parece-nos impossível a antecipação do efeito declatratório.
Este consiste na certeza jurídica conferida à existência ou
inexistência do direito afirmado pelo autor em sua demanda. A
nosso sentir, é impossível a antecipação da certeza com base
em juízo de probabilidade. Estar-se-ia, aqui, diante de
verdadeiro paradoxo: o juiz estaria afirmando a existência de
uma “provável certeza”, a qual, obviamente, seria incapaz de
satisfazer a pretensão de obter certeza.
O mesmo se diga com relação à antecipação dos efeitos
constitutivos. Não nos parece admissível, com base no art. 273
do CPC, a antecipação deste tipo de efeito, consistente na
criação, de ordinário, só podem se produzir depois da
afirmação da existência de um direito à modificação de uma
situação jurídica, o que exige cognição exauriente. Seria
inócua a prolação de uma decisão que provisoriamente
constituísse uma situação jurídica nova, sendo certo que
decisões inúteis não devem ser prolatadas (mesmo porque
27
faltaria interesse em sua obtenção). Imagine-se, por exemplo,
uma decisão que antecipasse a tutela numa “ação de
dissolução de sociedade”. Dissolvida parcialmente a
sociedade, ainda não seria possível sua liquidação, o que
revela sua total inutilidade. Via de regra, pois, parece-nos
impossível a antecipação da tutela constitutiva. Não se pode
negar, antecipação de efeito constitutivo da tutela jurisdicional,
como se dá na previsão do aluguel provisório nas “ações
revisionais de aluguel”, regulado no art. 68, II, da Lei
nº8.245/91. Esta medida tem inegável caráter de antecipação
de tutela, e nítida eficácia constitutiva. Não se pode, portanto,
negar a possibilidade de antecipação da tutela constitutiva
quando houver expressa previsão legal desta possibilidade.
Não parece possível, porém, que tal espécie de tutela
jurisdicional seja antecipada com fulcro no art. 273 do CPC”26.
Essa opinião é compartilhada por OVÍDIO BAPTISTA27.
Uma segunda corrente, entretanto, entende ser possível a antecipação
de tutela nos casos de ação declaratória e constitutiva. Nesse caso, não vão
se antecipar todos os efeitos da tutela, pois isto só seria possível num juízo de
certeza e a antecipação de tutela é apenas um juízo de probabilidade.
Antecipam-se, nesse caso, alguns efeitos primários ou secundários. Tal
entendimento tem como um de seus defensores o mestre LUIZ GUILHERME
MARINONI, que o explica nas seguintes palavras:
“No caso em que o autor obtém tutela para poder exercer um
direito que ainda será declarado ou constituído, fica fácil
perceber o seu caráter antecipatório. A tutela, nestes casos,
não está assegurando a possibilidade do autor exercer o direito
no futuro, mas sim viabilizando desde logo ao autor o exercício
do direito.
26 Lições de Direito Processual Civil, vol. I, 4ª ed., ps. 388-399
28
Também é inegavelmente antecipatória a tutela que suspende
a eficácia de um ato que se pretende ver anulado ou declarado
nulo. Nesses casos impede-se, antecipadamente, que o ato
produza efeitos contrários ao autor. Há uma correlação nítida
entre a suspensão da eficácia e a sentença; o autor, através da
suspensão da eficácia, desde logo se vê livre dos efeitos do
ato impugnado”28.
Na mesma linha de raciocínio posiciona-se HUMBERTO THEODORO
JÚNIOR, aduzindo que
“sempre, pois, que de uma demanda declaratória ou
constitutiva for possível extrair uma pretensão executiva ou
mandamental, haja ou não, cumulação de pedidos, é
irrecusável a possibilidade de usar a antecipação de tutela, se
presentes, naturalmente, os seus pressupostos legais.
(...)
Em suma, o que adverte é que a antecipação da tutela nas
ações declaratórias e constitutivas não adiantará o elemento
nuclear da tutela, qual seja a certeza jurídica, ou a constituição
ou desconstituição da relação jurídica, que não se
comapadecem com a cognição provisória. Mas tal restrição
não impede que sejam adiantados, como nas ações
condenatórias, simplesmente os efeitos que a declaração ou
constituição a ser realizada, com toda probabilidade, pela
sentença final, haverá de proporcionar ao autor da demanda.
Esses efeitos práticos de que a parte estará autorizada a
desfrutar após a sentença podem perfeitamente ser
antecipados por provimento provisório, quando presentes os
requisitos do art. 273, CPC”29.
27 Curso de Processo Civil, vol. I, p.11428 A tutela antecipatória nas ações declaratória e constitutiva, Revista dos Tribunais, vol.741, 1997, p. 95.29 Tutela Jurisdicional de Urgência, 2ª ed., América Jurídica, 2001, ps. 53-55
29
Entendemos ser este último o melhor entendimento, pois é
perfeitamente possível a aplicação do instituto da tutela antecipada nas ações
declaratórias e constitutivas, haja vista que conforme os argumentos daqueles
que defendem tal possibilidade, a tutela antecipada tem por objeto não a
antecipação do julgamento da lide e sim os efeitos dessa decisão. Dessa
forma, nítida é a possibilidade de aplicação do instituto, quando cabível, em
sentenças declaratórias ou constitutivas.
30
CAPITULO 4 - ANTECIPAÇÃO DE TUTELA NA
SENTENÇA
1 – Entendimentos dissonantes até então existentes
A antecipação de tutela pode ser decretada em qualquer momento do
processo, desde que antes do trânsito em julgado.
O problema ocorre quando essa antecipação se dá na sentença, pois
ela tem, em regra, natureza de decisão interlocutória. Nesse caso, o autor vai
ter os efeitos da tutela antecipadamente, feito que só seria possível após o
trânsito em julgado. Então, contra a sentença que antecipa os efeitos da tutela,
qual recurso a ser ajuizado: apelação ou agravo de instrumento?
Há duas correntes a esse respeito:
1ª)entende que caberia agravo de instrumento e apelação, pois
ocorreram duas decisões distintas;
2ª)diz que só há uma decisão, pois a maior engloba a menor e seria
impossível, no mesmo ato, haver duas decisões. A solução, para essa
doutrina, é de que o vencido entra apenas com a apelação, pedindo a
extensão dos efeitos suspensivos da apelação para a antecipação de tutela,
com base no art. 558, parágrafo único, CPC (lesão grave com difícil reparação
e motivo relevante). Na presença destes requisitos, o juiz estenderá os efeitos.
Não há corrente dominante. O professor RONALDO CRAMER VEIGA
adota a segunda30.
2 – Discussão atualmente inócua
Embora a questão ainda não tenha sido suscitada por ser bastante
recente, parece ter ficado inócua a discussão acima exposta. A nova redação
do art. 520, VII, ao que parece, extirpou a causa de ser da controvérsia
30 Aula proferida na PUC-Rio, em 22/8/2001.
31
existente entre os processualistas. Assim dispõe o inciso VII do art. 520,
introduzido no nosso Código de Processo Civil pela Lei nº 10.352/01:
“Art. 520 - A apelação será recebida em seu efeito devolutivo e
suspensivo. Será, no entanto, recebida só no efeito devolutivo,
quando interposta de sentença que:
(...)
VII - confirmar a antecipação dos efeitos da tutela”
Portanto, como podemos observar, a redação do novo dispositivo é
clara, não deixando mais espaço para a interposição de agravo de instrumento
quando da antecipação de tutela concedida na sentença judicial.
Porém da decisão que processar a apelação somente no seu efeito
devolutivo, por ser decisão interlocutória, caberá agravo de instrumento para a
suspensão do cumprimento da decisão até o julgamento da apelação, desde
que a execução da sentença possa causar lesão grave ou de difícil reparação.
32
CAPÍTULO 5 – ANTECIPAÇÃO DE TUTELA EM FACE DA
FAZENDA PÚBLICA
1- Aspectos da tutela antecipada contra a Fazenda Pública
Existe grande controvérsia acerca da possibilidade da aplicação
do instituto da tutela antecipada em face da Fazenda Pública.
Parte da Doutrina que defende tal possibilidade, entende que a
tutela antecipada, por ter natureza própria, e observados os requisitos
do art. 273 do CPC e o art. 100 da Constituição Federal, pode ser
impetrada contra a fazenda pública, haja vista não haver qualquer
restrição legal para tanto.
A contrário senso, está presente o argumento que as
prerrogativas processuais da Fazenda pública obstariam a admissão do
instituto em face da Fazenda Pública.
Ressalta-se que a admissão da antecipação da tutela e sua
efetividade são coisas distintas. A Lei 9.494, ao dispor sobre as
hipóteses em que não poderá ser aplicado a antecipação da tutela
contra a Fazenda Pública, acabou por reconhecer a aplicação do
instituto nos casos não previstos no texto legal. Assim sendo, é
plenamente cabível a antecipação de tutela em face dos Órgãos
Públicos, ficando a controvérsia restrita à eficácia da aplicação desse
instituto quando a parte ré for pessoas jurídicas de direito público
interno.
33
2– Eficácia da antecipação da tutela em face da Fazenda Pública
Muito se tem discutido sobre a falta de efetividade dos comandos
jurisdicionais proferidos em face da Administração pública. Questionando-se,
na doutrina moderna, medidas eficazes para a materialização dos julgados
pela Administração Pública, como astreintes e medidas sub-rogatórias para
cumprimento das decisões judiciais.
As prerrogativas processuais da Fazenda Pública, estão intimamente
ligadas à natureza de seus interesses e a complexidade de sua estrutura
burocrática.
Dentre tais prerrogativas está presente o procedimento próprio para
execução em pagamento de quantia certa e o duplo Grau de jurisdição
obrigatório, que segundo alguns autores, obstariam a aplicação do instituto da
antecipação de tutela em face da Administração Pública.
Apesar da carência de uma legislação específica para regular tal
questão, é forçoso concluir a total viabilidade da utilização da antecipação da
tutela em face da Administração Pública.
O duplo Grau de jurisdição é uma garantia de reexame obrigatório que
tem por objeto proteger o ente público de uma eventual inércia de seus
representantes judiciais, porém os efeitos da sentença proferida em face da
Fazenda pública não são distintos daqueles proferidos em face de um
particular, assim sendo, o fato da decisão que defere a antecipação de tutela
em face da Administração estar obrigada ao reexame necessário não impede a
execução da medida, por esta retirar da apelação o seu efeito suspensivo,
conforme dispõem o art. 520, VII do CPC.
Com relação ao argumento que o procedimento próprio para execução
em face da Administração Pública impediria a eficácia da antecipação dos
efeitos da sentença, a doutrina vem concluindo que este não pode prevalecer,
uma vez que é plenamente cabível a expedição de precatório decorrente da
medida antecipatória, para dispor o valor correspondente em juízo até o
transito em julgado da sentença, estando a Fazenda Pública protegida contra
34
eventual situação irreversível e garantindo, ao autor, desde logo, seu lugar na
ordem sucessiva de pagamentos. Desta forma, evita-se que a tardia
reapreciação da causa não gere uma injustiça ao autor, especialmente nos
casos relacionados à manutenção da vida.
35
CONCLUSÃO
A primeira polêmica apresentada no presente trabalho trata da hipótese
de ser concedida antecipação de tutela, fundada no inciso I do artigo 273,
mesmo antes de se operar a citação do réu, Não encontramos qualquer óbice
para a medida. O próprio artigo que regula a matéria não elenca momentos
específicos para que, nessa hipótese, seja ela permitida. Ao revés, faculta tal
possibilidade a qualquer momento, desde que preenchidos os requisitos
necessários, o que nos leva a concluir que, por não ter proibição expressa a
esse respeito, pode haver antecipação de tutela inaudita altera pars.
Outro tema contraditório aqui abordado cuida da fungibilidade entre a
tutela antecipada e a medida cautelar. Filiamo-nos à posição de Humberto
Theodoro, agora positivada no art. 273, §7º, que admite tal possibilidade. Isso
porque quando a parte pede uma medida de urgência, tanto na tutela cautelar
como na antecipatória, ela visa a uma providência urgente para fugir das
conseqüências trágicas que a demora da solução de mérito pode causar.
Em relação à terceira controvérsia, cremos ser perfeitamente possível a
antecipação de tutela nas ações declaratórias e constitutivas, pois nesse caso
está se viabilizando desde logo ao autor o exercício do direito por ele pleiteado.
A penúltima dissonância exposta cuida do recurso a ser interposto
quando a tutela antecipatória for dada na sentença. É cabível, no caso, a
apelação, como já dito. Mas essa discussão perdeu a razão de ser, pois o art.
520, VII, resolveu a questão, confirmando ser a apelação o recurso cabível.
Por fim, foi discutido os aspectos e a eficácia da medida antecipatória
em face da Fazenda Pública, restando conclusa a viabilidade da aplicação do
instituto, reconhecida, a contrario sensu, pela Lei 9.494/97, estando a maior
controvérsia restrita à eficácia da materialização da decisão que defere medida
antecipatória, na qual entendemos que as prerrogativas processuais da
Administração Pública não obstam a eficácia da aplicação do instituto, uma vez
que o duplo grau de jurisdição obrigatório não impede a execução provisória,
da decisão que deferir a antecipação da tutela, em razão do art. 520, VII do
Código de Processo Civil e o procedimento próprio para execução em face da
36
fazenda Pública, não impede a expedição de precatório para disponibilizar a
quantia correspondente ao juízo, estando resguardada a Administração Pública
do perigo de uma eventual situação de irreversibilidade.
37
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
ALVIM, José Eduardo Carreira. A antecipação de tutela na reforma recursal.
Revista Forense, vol. 332. 1995.
BEDAQUE, José Roberto. Antecipação da tutela jurisdicional, "in" Aspectos
polêmicos da antecipação de tutela. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999.
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Saraiva, 1996
CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil, vol.1. 4ª ed. Rio
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1996.
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1987.
MACHADO, Antônio Cláudio da Costa. Tutela antecipada. 3ª ed. São Paulo:
Juarez de Oliveira, 1999.
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1996.
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NERY JÚNIOR, Nelson. Atualidades sobre o processo civil. São Paulo: Revista
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OLIVEIRA, Carlos Alberto Álvaro de. Alcance e natureza da tutela
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PORTANOVA, Rui. Princípios do processo civil. Porto Alegre: Livraria do
Advogado Editora.
38
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Porto Alegre: Ajuris, vol. 70. 1997.
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THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil, vol. 1. 37ª
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______. Tutela antecipada. Revista Forense, vol. 337. 1997.
______. Tutela jurisdicional de urgência. 2ª ed. Rio de Janeiro: América
Jurídica, 2001.
39
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2
AGRADECIMENTO 3
DEDICATÓRIA 4
RESUMO 5
METODOLOGIA 6
SUMÁRIO 7
INTRODUÇÃO 8
CAPÍTULO I
TUTELA JURISDICIONAL 10
1- Tutela jurisdicional e prestação jurisdicional 10
CAPITULO 2
ANTECIPAÇÃO DA TUTELA 11
1 - Primeiras considerações 11
2 – Características e natureza 12
2.1 – Distinção entre tutela antecipada e tutela cautelar 13
3 – Análise do art. 273, CPC 14
CAPÍTULO 3
A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA NAS AÇÕES
DECLARATÓRIAS E CONSTITUTIVAS 26
1 – Exposição do problema 26
2- Divergências acerca do tema 26
CAPITULO 4
ANTECIPAÇÃO DE TUTELA NA SENTENÇA 30
1 – Entendimentos dissonantes até então existentes 30
2 – Discussão atualmente inócua 30
CAPITULO 5
ANTECIPAÇÃO DE TUTELA EM FACE DA FAZENDA
PÚBLICA 32
1- Aspectos da tutela antecipada contra a Fazenda Pública 32
40
2- Eficácia da antecipação da tutela em face da Fazenda
Pública 33
CONCLUSÃO 35
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 37
ÍNDICE 39
41
FOLHA DE AVALIAÇÃO
Nome da Instituição: Universidade Cândido Mendes
Título da Monografia: Antecipação da Tutela
Autor: Leonardo Nunes da Cunha Filho
Data da entrega: 28/08/2006
Avaliado por: Conceito: