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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” AVM FACULDADE INTEGRADA O GARANTISMO PENAL DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA X PROCESSO MIDIÁTICO NO SEU PODER DE CONVENCIMENTO Orientador Prof. Francis Rajzman Rio de Janeiro 2012

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

O GARANTISMO PENAL DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA

X

PROCESSO MIDIÁTICO NO SEU PODER DE CONVENCIMENTO

Orientador

Prof. Francis Rajzman

Rio de Janeiro

2012

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AGRADECIMENTOS

Não poderia deixar de exaltar a luz que

emana do Criador, pois sem a

presença de Deus para guiar meus

caminhos ficaria muito mais difícil;

À minha família que sempre me

fortaleceu nos desafios;

Aos professores da UCAM que fizeram

parte da conclusão do meu curso de

pós-graduação, bem como ao meu

orientador que me auxiliou na

realização desse trabalho.

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INTRODUÇÃO

Posição da Mídia no Cenário Atual

O século XX foi marcado pelo rápido

desenvolvimento dos principais órgãos da mídia existentes

atualmente. Não passou desapercebido e foi especialmente

percebido por dois dos principais personagens da história deste

último centenário ( Hitler e Stálin), que, para melhor controlar a

situação política da nação, precisariam ter o controle dos principais

órgãos da mídia, o que fizeram através da censura. Imagine-se,

hoje, o poder dos governantes que detivessem o controle sobre os

múltiplos e modernos órgãos da mídia nos dias que correm!?

Tanto desenvolvimento – imbicado com a

necessidade sentida pelas antigas empresas/corporações

multinacionais em se juntarem para então se tornarem mais

competitivas no crescente mercado produtor/consumidor

(conglomerados transnacionais) – vem colocando os principais

órgãos da mídia no centro do cenário político, social, econômico,

cultural etc., tanto nacional como também internacional.

Além de ocupar o centro da cena nacional, os

órgãos da mídia – individual e integradamente – exercem relevante

papel na interação com as demais instituições em cooperação ou

em subordinação. Por um lado, a cooperação entre os órgãos da

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mídia e as principais instituições democráticas de um país

geralmente representa a prestação de um enorme serviço àquela

sociedade. A subordinação, por outro lado, leva à atrofia e ao

amesquinhamento do desenvolvimento do processo cívico e

democrático.

Objeto de Estudo: a mídia influencia o processo penal?

Este trabalho de pesquisa propõe-se a tratar do

importante papel da mídia nos dias atuais. É notoriamente

conhecida a crescente influência que os órgãos da mídia exercem

na vida cotidiana. Essa situação, reconhecida por todos, é fruto de

uma construção e solidificação paulatina através dos anos. Optou-

se por privilegiar alguns aspectos considerados fundamentais e

relevantes para o desenvolvimento do tema.

O problema central que se coloca é a

possibilidade concreta de os órgãos da mídia exercerem algum tipo

de influência durante o trâmite de um processo judicial, sobretudo

de natureza criminal. A mera possibilidade de influência dos

principais órgãos da mídia sobre a consciência individual dos

cidadãos, como integrantes do “povo”, e, nesta condição, potenciais

participantes de um eventual processo judicial, como jurados etc.,

constitui uma parte (inicial) do problema. A outra parte (principal)

refere-se à influência sobre os indivíduos que ostentam a qualidade

de sujeitos processuais – ou “atores do processo”- , tais como: juiz,

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jurado, promotor de justiça, réu, advogado ou defensor, delegado

policial, perito, testemunha etc.

O trabalho propõe-se a analisar um universo

delimitado nesse amplo campo de influência sobre o qual os órgãos

da mídia deitam o seu manto, qual seja, o processo penal, com

algumas circunstâncias relevantes que o ornamentam.

Áreas Diretamente Envolvidas: jornalística e jurídica.

O tema proposto diz respeito tanto à atividade

jornalística quanto ao Direito. Por isso, é duas vezes relevante. O

enfoque primordial que se pretende é multidisciplinar, partindo,

naturalmente, de considerações de ordem jornalística e jurídica,

para mesclá-las em seus diferentes aspectos histórico, filosófico,

sociológico e antropológico.

A atualidade do tema é evidente. Recentes casos

amplamente divulgados pelos órgãos da mídia levam à necessária

reflexão sobre o papel da mídia como prestação de serviço à

sociedade. A título meramente ilustrativo, citam-se os seguintes:

Daniela Perez, Fernando Collor de Mello, Sérgio Naya, mais

recentemente ( Nardoni, Bruno, Eloá) etc.

Visão Crítica: a mídia no banco dos réus.

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Através de uma visão crítica do tema, reconhece-

se a ingerência dos órgãos da mídia no trâmite justo e correto do

processo penal através da pressão da opinião pública. Na medida

em que a distorção engendrada pelos órgãos da mídia para

manipular a opinião pública se estende ao órgão jurisicional

competente para o julgamento de causas penais, atingindo-lhe em

seu livre convencimento, então se verificam intoleráveis distorções

ocorridas durante o trâmite do processo penal.

CAPÍTULO I

ASPECTOS SOBRE A RELAÇÃO INSTITUCIONAL

ENTRE A MÍDIA E O PODER JUDICIÁRIO.

A relação entre duas relevantes instituições em

uma democracia pode ser variada, na medida em que se alteram

os seus pontos de aproximação e distanciamento. Algumas vezes,

determinados assuntos (de interesse comunitário, por exemplo) são

tratados por ambas, sob perspectivas semelhantes ou distintas;

outras vezes, o tratamento de certo assunto por apenas uma delas

passa ao largo do cuidado do mesmo pela outra.

Em tese, as relações existentes entre duas

relevantes instituições democráticas deveriam fluir em consonância

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com o interesse maior que ambas devem ter como fim de suas

atividades: o aprimoramento da consciência cívica e do processo

democrático. Para tanto, bastaria que a atividade por elas

desempenhada fosse coordenada e comprometida para esta

finalidade. No entanto, na prática, observa-se que, a partir do

momento em que outros interesses (econômicos, por exemplo) se

sobrepõem na lógica de funcionamento institucional, então a

satisfação do interesse social (representado pelo aprimoramento da

consciência cívica e do processo democrático) é relegado a planos

secundários e subordinados.

À luz disso, impõe-se, inicialmente, suscitar

algumas considerações acerca das possíveis relações de influência

entre duas instituições fundamentais ao país atualmente: a Mídia e

o Poder Judiciário.

1.1. Influência da Mídia no Poder Judiciário.

A influência da Mídia não se limita ao Poder

Judiciário, mas abarca a compreensão que a própria sociedade tem

de si e das diversas instituições que a cercam. Aqui, a sociedade

deve ser entendida como entidade civil e organizada politicamente;

não deve ser considerada como o conjunto individualizado dos

cidadãos que a compõem.

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Eventualmente, a Mídia extrapola as suas funções

e assume tarefas que não lhe diz respeito, uma vez que são

(legítima e legalmente) reservadas a outras instituições.

Por um lado, a distância entre os mundos do

“homem comum” e do Poder Judiciário é inegável. Parte disso é

conseqüência da generalizada falta de cultura jurídica da sociedade

brasileira, incluindo-se aí os profissionais do jornalismo, salvo raras

exceções. Aproveitando-se desta lacuna, a mídia vem

paulatinamente assumindo tarefas inerentes exclusivamente à

função judiciária.

Por outro lado, é mister reconhecer que “tanto o

direito como a justiça depende, em alguma medida, da

representação que deles têm os indivíduos e a sociedade”.

Obviamente, com a mencionada atuação da mídia (penetrando a

função judiciária para além de seu dever fundamental de informar

corretamente ao público), a imagem do Poder Judiciário que se

forma junto à sociedade e ao “homem médio” tende a ser no

sentido do seu enfraquecimento, em proveito daquela. Com isso, a

um só tempo a mídia se legitima frente à sociedade e enfraquece a

imagem que ela tem do Poder Judiciário; consequentemente, a

mídia preenche a lacuna de atuação deixada pelo Poder Judiciário

e na qual atua. Parece tratar-se de um círculo vicioso.

Os motivos e os instrumentos pelos quais a mídia

conduz a sua atuação nesta direção são variados. Na medida em

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que os órgãos da mídia criam pautas, fixam agendas e divulgam o

que bem entendem (selecionam, hierarquizam e divulgam as

notícias), então se torna fácil legitimar-se junto à sociedade, influir

em sua capacidade valorativa, manipular a opinião pública e

distorcer os dados do processo judicial em trâmite, por exemplo.

Para isso, tendem a exaltar as mazelas do Poder Judiciário e

destacar as qualidades da atuação profissional jornalística,

especialmente do chamado “jornalismo investigativo”.

Além disso, a mediatização da justiça como

fenômeno de massa comporta riscos”, exemplificados em

“alterações da conduta por parte de agentes do processo, o do

desgaste profissional provocado pela sobreexposição e o da riação

de estereótipos que insinuam ou estabelecem ligações entre o

judicial e outros poderes ou interesses”. Como se não bastasse, há

o risco da “diabolização da justiça” ( “que assenta numa lógica de

boomerang pela qual se procura que a estigmatização que recai

sobre os arguidos atinja, a outro título, os magistrados ou a

magistratura que os investigam”).

Ademais, “a separação e independência da justiça

é um pouco a sua capacidade de ser incólume e inerte a pressões

e de preservar o seu tempo e os seus métodos”.

Destacados tais pontos mais superficiais, impõe-

se, neste momento, alterar o enfoque da abordagem, ressaltando

alguns aspectos (não tão claros) sobre o funcionamento dos órgãos

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da mídia e a importância de suas pautas e agendas para o Poder

Judiciário e à sociedade.

Em interessante obra dedicada exclusivamente ao

estudo de alguns pontos da relação entre o Poder Judiciário, os

meios de comunicação e opinião pública (principalmente com uma

visão crítica e sóbria sobre os engodos da Reforma do Poder

Judiciário e da proposta de adoção do efeito vinculante), a juíza

federal Salete Maccalóz escreve que “ a atuação da imprensa

também obedece à pressão do capital financeiro internacional, sua

interferência e objetivos nos países emergentes”.

A autora sustenta que, nesse cenário, “os planos,

projetos e atividades para colimar os objetivos atingem direta e

indiretamente o judiciário, enquanto outra forma de fazer justiça

está sendo construída”. É que, na realidade, “o segmento do capital

que dita as regras da economia mundial de há muito não precisa

mais do judiciário tradicional”.

Sintoma desta evidente proeminência da mída

frente à sociedade e demais instituições do país é observado na

sua relação com o Poder Judiciário, quando o “medo de represálias

tolhe a atividade jurisdicional e leva o juiz a se desculpar com

atitudes de cautela, necessidade de estudos, e outros que tais para

não afrontar o poder da mídia”. A o mesmo tempo, “poucos são os

que enfrentam esta poderosa máquina, único setor da economia

genuinamente nacional que, em tranqüilo lobby, conseguiu a

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proibição constitucional de estrangeiros como proprietários de

jornais, radiodifusão e canais de televisão (artigo 222, da CF/88)”.

Há muito temppo já se sabe que, “as famílias (poucas) proprietárias

dos meios de comunicação são os verdadeiros donos do poder,

chamado de Globo & Cia., intervindo diretamente na estrutura dos

poderes menores como o judiciário, uma das razões por que a

verdadeira compleição desse “poder” não pode ser conhecida do

grande público e não faz parte da capacitação elementar dos

trabalhadores liberais”.

Para que a engrenagem deste projeto político

funcione a contento, “os leigos, assim designados todos os que

estão fora das atividades intelectuais e profissionais do direito,

aceitam o discurso oficial, formatado nas altas cortes e são

capazes de repetir os argumentos de que a proposta reformista é

boa para o país, inclusive para eles”, Todavia, “da comunidade

jurídica vem o paradoxo”. É que, “sua maioria age como os leigos”.

“ As razões são muitas e algumas já foram apresentadas neste

trabalho: a ausência de consciência crítica, poucas leituras e

estudos, a submissão ao pensamento das autoridades judiciárias

etc”, exemplifica a autora. Desta maneira, “as altas autoridades

judiciárias conseguem produzir a reforma casuística dos seus

interesses”. De um lado, “muitos não se dão conta de que a sua

idealização vem de fora e é contrária à cidadania e integridade

nacional”. De outro, “a maioria desconhece o projeto do Banco

Mundial (doc n° 319/97), específico para esta reforma, bem como o

futuro das instituições pátrias no contexto globalizado, não

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percebendo o quanto estão contribuindo para a extinção de um

modelo de justiça, que, se não foi perfeito, perseguia a constituição

de direitos individuais e a sua salvaguarda (o direito adquirido)”. Em

conseqüência, “esta mesma maioria contribui para o nascimento de

um modelo, já em prática, onde os direitos civis e sociais perdem

estatura para os projetos governamentais, onde a Constituição

deixa de ser um escudo protetor da cidadania para ser letra morta

diante de normas mensais, as medidas provisórias, não só por suas

reedições mensais, mas pelas alterações a cada mês” (Maccalóz,

2002, pp. 147-148).

À luz destas considerações, constata-se que, “a

desmontagem do estado de bem-estar social tem acontecido

inexorável e não tão silenciosamente”. Ocorre que, “nem todas as

derrogações legais são noticiadas e boa parte dos profissionais

especializados não toma conhecimento” ( Maccalóz, 2002, p. 225).

Logo, se por um lado novos equilíbrios devem ser

encontrados, por outro, a mídia já sedimentou a sua atuação com

legitimidade frente à sociedade brasileira. Exemplo claro disso é o

elevado grau de confiança que os brasileiros depositam nas

informações divulgadas através de notícias veiculadas pelos

variados órgãos da mídia. Em sentido diametralmente oposto, por

várias razões, o descrédito da sociedade em relação ao combalido

Poder Judiciário é crescente. Neste cenário, o clamor pela

adequada responsabilização da mídia parece ser ilusório.

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CAPÍTULO II

O jornalismo e o Poder Judiciário

Nesse ponto, cabe aprofundar algumas possíveis

causas justificativas do distanciamento pessoal dos jornalistas em

relação aos assuntos do Poder Judiciário e o trabalho de seus

profissionais.

As críticas devem ser compreendidas como uma

via de mão dupla, ou seja, se, por um lado, a corporação jurídica

não se digna a se tornar mais acessível aos profissionais da

corporação jornalística e, consequentemente, à sociedade; por

outro, a sociedade (e os jornalistas necessariamente nela inseridos)

carece da mínima cultura jurídica necessária à compreensão dos

assuntos relacionados ao Poder Judiciário e ao trâmite dos

processos judiciais.

Significa dizer que o Poder Judiciário não abre

suas portas aos jornalistas e à sociedade, na medida em que não

se esforça para se tornar conhecido por ambos, mantendo-se

fechado em seu especializado mundo jurídico. Por sua vez, a

sociedade brasileira (da qual os jornalistas fazem parte) carece de

mínima cultura jurídica. As razões para que isso ocorra são as mais

diversas, tais como: desinteresse pela vida publica no país,

desinteresse pela atividade desempenhada diariamente pelo Poder

Judiciário, analfabetismo e ignorância etc.

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O esforço a ser empreendido dirige-se ao

aperfeiçoamento respeitoso da relação entre a Mídia e o Poder

Judiciário, especialmente entre os seus profissionais. Não é

recomendável, e nem saudável, que um procure interferir nas

atividades do outro. Ambos devem trabalhar coordenadamente, de

maneira independente e responsável.

No entanto, verifica-se que: quando os jornalistas

atuam em matérias que envolvam processos judiciais,

especialmente aqueles de natureza penal, falam e escrevem sobre

algo cujas implicações técnicas lhes são pouco familiares, cuja

tramitação se dá em órgão com peculiaridades específicas, onde

ocorrem eventos que se lhes afiguram inexplicáveis e, o pior de

tudo, dirigido para a sociedade que, da mesma forma, pouco sabe

a respeito deste assunto. Resultado: o número de equívocos nesta

espécie de “comunicação” é gigantesco, seja na transmissão pelo

jornalista, seja na recepção pelo consumidor ou usuário, ou ainda,

em ambos.

É freqüente a preocupação de juristas com o

desgaste da imagem do Poder Judiciário, já tão combalido em face

das sucessivas notícias divulgadas que informam sobre as suas

mais variadas e, muitas vezes, superficiais mazelas. Muito além de

ser mera retórica corporativista, é preciso atentar para os

inevitáveis danos causados na população sobre uma das mais

elevadas funções do Estado na repartição de seu Poder e

Soberania.

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A divulgação de notícias equivocadas ou

imprecisas, seja em razão da ignorância jurídica e

desconhecimento de noções elementares sobre o trâmite do

processo judicial, seja em obediência aos interesses dos detentores

das grandes empresas da mídia, confunde o público, na medida em

que conduz a opinião pública a erro ou a um juízo injusto sobre

processos judiciais em curso, desinformando-a e contribuindo ao

desmerecimento e descrédito da imagem do Poder Judiciário frente

à população.

Além disso, a sanha justiceira da qual se arvora

certo jornalismo sensacionalista muitas vezes representa a violação

explícita de direitos constitucionalmente assegurados ao suspeito

de sua “investigação”. Em um primeiro momento estão: a

intimidade, a vida privada, a honra, a imagem etc, ; e em um

segundo momento , o devido processo legal, a paridade de armas

entre as partes, a presunção de inocência, a imparcialidade do

julgador (leigo e/ou togado) etc.

Portanto, disso decorre uma forma de violência e

agressão, não só contra o indivíduo objeto da “investigação”

jornalística, mas também contra a sociedade como um todo.

Primeiro, porque tais direitos inseridos na Constituição da

República representam a vontade popular expressada

temporalmente através de seus legítimos representantes. E como

tal, são frutos de séculos de exploração, disputas entre interesses e

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conquistas alcançadas. Além disso, o consumidor ou usuário de

hoje pode vir a se tornar o suspeito de amanhã.

Eventualmente, quando isso acontecer, é

importante que o cidadão saiba que não tem como se defender

dignamente dos microfones e holofotes dos órgãos da mídia que –

separa a sua desgraça e expiação pessoal vier a colocá-lo na pauta

do dia, concedendo-lhe os “quinze minutos” da pior fama possível –

certamente causará danos irreversíveis e impagáveis em sua vida.

Ao menos, é a lição que alguns casos contidos na história da

imprensa legou a todos nós, tanto no Brasil como também na

maioria dos países ocidentais.

Opinião Pública e sua Representatividade Popular

Atualmente, vive-se em um contexto que privilegia

na sociedade a cultura de massas e o mercado de consumo. Em

conseqüência, observa-se o atual desgaste da noção de opinião

pública, que cada vez mais caminha rumo à mingua.

O tirocínio da opinião pública, quando esta foi

formada por um “público” (intelectualidade burguesa) capaz de

julgar, foi atualmente suplantado pela tirania dos órgãos da mídia,

hoje erigidos ao relevante papel de agentes fiscalizadores tanto dos

órgãos públicos quanto da conduta individual dos cidadãos.

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A opinião pública que, a partir do Iluminismo, foi

composta por um “público” selecionado em determinado segmento

social, hoje, igualmente, é composta por apenas uma parcela de

cidadãos. O denominador comum dos dois períodos históricos

distintos é a necessária centralização excludente no conceito de

“cidadão”, variável segundo a época. Nestes contextos, para se

tornar público/cidadão sempre foi necessário ser apto, no sentido

de ter acesso privilegiado à mercadorias (informações), ou seja,

inicialmente os comerciantes e agora os consumidores ou usuários.

Possivelmente, este é o universo dentro do qual se pode dizer que

tais pessoas estão habilitadas a processar essa informação,

através da emissão de um juízo de valor crítico.

A opinião pública degenerou-se a tal ponto e a

mídia se destacou de tal maneira que, hoje, a opinião pública aceita

passivamente como verdadeira a notícia divulgada. Através disso, o

consenso é professado, e não contestado.

Uma possível justificativa para tal hegemonia da

mídia (e seus variados órgãos) é a incapacidade atualmente

verificada pelas pessoas para processar as informações

disponíveis, seja porque não estão preparados para tanto. Daí o

consenso. Todavia, mesmo se considerada a privilegiada casta de

“cidadãos” aptos ao consumo das notícias, a abundância de

informações é tão avassaladora que, até eles, provavelmente vez

por outra se encontram atônitos e relativamente incapazes de

processar as informações de maneira adequadamente crítica.

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Os órgãos da mídia distanciaram-se de uma

função inicial (reportar,narrar) para, vagarosamente, destacarem-se

como intervenientes e invasores do fato. Com isso, não mais

noticiam, mas opinam. Deixaram de informar para formar opinião.

Nesse contexto verificado, a relação entre a mídia e a opinião

pública chegou a um tamanho grau de hegemonia do primeiro e

submissão do segundo que, atualmente, pode-se dizer que, a

opinião pública reduziu-se à opinião publicada pelos órgãos da

mídia.

Segundo o Professor Geraldo Prado, “o controle

empresarial dos meios de comunicação de massas, a lógica da

competitividade e do mercado que orienta a atuação deles e a

distorção da própria noção de publicidade, que, antes de incentivar

a participação democrática da maioria das pessoas relativamente

aos negócios da sua cidade e de seu país, anula essa participação,

constroem uma nova realidade, paradoxalmente virtual ou

espetacular” (Sistema Acusatório..., p. 179).

Assim, para que exista, a “opinião pública exige

um mínimo de informação, ou seja, o acesso à informação, o que

pressupõe a existência de veículos independentes e isentos, de

juízo crítico e de uma classe média educada, autônoma e, portanto,

exercendo a cidadania, ao invés de sociedade de classes” (

Roberto Amaral, O poder da imprensa e o controle da opinião

pública, p. 2).

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Em conclusão, Roberto Amaral ressalta que, “não

sei se é possível neste país, com estas características, falarmos

em opinião pública e falarmos em democracia representativa.

Parece-me tudo isso uma farsa. Uma contrafação” (Amaral –

05.08.2012- p. 9).

CAPÍTULO III

A Imagem da Violência na Mídia

Durante os anos, a mídia sedimentou a sua

posição central e proeminente em relação à sociedade, na medida

em que se legitimou como instância difusora de informações sobre

o mundo, o país, os arredores e o local onde habitavam – e

habitam – os seus consumidores ou usuários (leitores, ouvintes e

telespectadores). Hoje, a Mídia, como instituição fundamental ao

exercício pleno da democracia, goza de credibilidade e confiança

aos olhos da população à qual deve servir.

Ocorre que, a mídia passou a exercer e

desenvolver diferentes graus de influências ou ingerências junto à

sociedade. É que, tanto a sociedade quanto os indivíduos que a

compõem esperam e assimilam as informações divulgadas através

das notícias e se informam por meio delas. Com isso, a mídia tem a

legitimação de sua atividade no processo democrático.

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Tais influências podem ser vistas e

principalmente sentidas diariamente. Para tanto, basta o contato,

ainda que superficial, com alguns órgãos da mídia. Por exemplo, a

telinha de televisão cria rapidamente um clima de comoção social,

seja quando divulga o acontecimento fatal de alguma tragédia

inesperada decorrente da natureza, seja quando divulga dados

sobre crimes ocorridos em circunstâncias mais chocantes ou até

triviais. Outro exemplo ainda mais corriqueiro é que o cinema e a

televisão ditam a moda e criam manias, trejeitos e clichês,

posteriormente imitados pelos telespectadores. Os exemplos são

inúmeros, a depender simplesmente de que campo se pretende

abordar.

Tratando-se especialmente do crime, os diversos

órgãos da mídia separam de maneira maniqueísta e simplista os

personagens de suas tramas entre bons e maus, criam estereótipos

da categoria “bandidos” dos personagens frequentemente

associados às classes populares da sociedade etc.

Através da produção (e reprodução) do seu olhar

sobre o que entende como crime ou o que pretende seja entendido

por crime, a mídia cria distorções na correta compreensão da

realidade. Essas distorções levam a equívocos e são nefastas para

a adequada compreensão sobre alguns temas capitais da

atualidade ( o crime e sua prevenção, por exemplo).

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Em qualquer um dos variados órgãos da mídia é

possível destacar privilegiados espaços dedicados à questão

criminal. Alguns tipos de crimes preferenciais, como o homocídio,

são reiteradamente exibidos, narrados, descritos e explicados em

qualquer um dos órgãos da mídia.

Atualmente, a preferência dos consumidores e

usuários pela televisão pode ter vários motivos: a rapidez com a

qual as informações se movimentam, bem próximas ao tempo real;

a escassez de tempo para ler semanários e jornais, diante do ritmo

do dia a dia; a preguiça e desatualização da leitura noturna de

jornais etc. Dentre os variados órgãos da mídia, a televisão é

aquele que os indivíduos mais consomem e utilizam e pelo maior

tempo.

Tantas pessoas submetidas por tanto tempo aos

repetitivos programas oferecidos pelas emissoras de televisão

tornam-se por elas influenciáveis, sugestionáveis. Junto à

programação que se quer assistir, vem no “pacote” uma série de

outros produtos que não se deseja ver e tampouco tomar

conhecimento.

Com isso, demonstrada a preferência do público

consumidor ou usuário pela televisão, indica-se a possibilidade de

que, no bojo das notícias, filmes e demais programas por ela

exibidos, há ainda uma certa gama de informações e dados que,

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propositadamente, se pretende revelar e outra que se escolhe

ocultar ou omitir.

CAPÍTULO IV

A Liberdade de Informação e a Imparcialidade do Juiz

Na realidade, o surgimento da comunicação

midiática decorreu mais da necessidade social que da individual.

Diante da evolução tecnológica dos meios de comunicação em

massa, passou-se a exprimir e exteriorizar grande parte das mais

amplas dinâmicas culturais.

A especificidade dos meios de comunicação em

massa estaria no fato de que esses meios, em razão de

participarem formalmente da própria natureza jurídica das

empresas em comum, diferenciar-se-iam de todas as outras,

porque seu produto, a informação, sob o aspecto seja de quem a

realiza (que exercita de tal modo uma liberdade individual que

assume um específico aspecto de natureza constitucional), seja

de quem a recebe (e que graças ao mesmo é admitido a participar

devidamente informado da vida democrática) obtém do

ordenamento uma qualificação também constitucional.

Nesses novos tempos, a publicidade do julgamento

ocorre muitas vezes por meio da divulgação feita pelos meios de

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comunicação, permitindo desta maneira o controle social sobre a

administração da justiça.

Na maioria das vezes, segundo Raquel López

Jiménez: “ os meios de comunicação social conseguem com a

informação que oferecem que a sociedade forme uma opinião do

acusado, condenatória ou absolutória segundo o caso, antes de

haver sido ditada a sentença. Esta publicidade é totalmente

adversa ao bom andamento do processo penal e põe em dúvida o

direito à presunção de inocência e o direito a um processo com

todas as garantias. A informação afeta não somente ao direito à

presunção de inocência, senão que também incide na

imparcialidade do juiz. A informação pode fazer com que os

jurados, por exemplo, cheguem a convicções preconcebidas em

relação à inocência ou culpabilidade dos processados e, o que é

mais importante, que os jurados adequem sua convicção por meio

de informações extraprocessuais, violando com isso garantias que

são essenciais para o bom funcionamento da justiça”.

Efetivamente, em uma sociedade de massa, a

perturbação proveniente dos meios de comunicação pode afetar

também a liberdade de decisão do juiz. Essa possibilidade é

extraordinariamente perigosa, principalmente porque não opera

somente pelo consciente, mas também pelo inconsciente, do que

não é percebido, pelos sentidos. O juiz pode estar convencido de

sua completa imparcialidade pessoal e, não obstante, sofrer sérios

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condicionamentos de índole psicológicos decorrentes do

pensamento dominante de um determinado grupo social.

O problema torna-se ainda mais inquietante quando

o direito de receber informação e por conseqüência o direito a

divulgá-la por parte dos meios de comunicação em massa

ocasiona efeitos prejudiciais na consciência dos membros do

Tribunal do Júri ao incidir na determinação do veredicto, pois os

juizes leigos ao carecer da experiência jurídica serão geralmente

mais influenciáveis que os juízes profissionais.

Ademais, o excesso de informação por parte dos

meios de comunicação em massa, que pode ser fortemente

incriminatória para o réu no processo, pode proporcionar que os

jurados cheguem a convicções preconcebidas em relação à

culpabilidade ou não dos processados por meio de informações

extraprocessuais, com a conseqüente violação das garantias

necessárias para a reta administração da justiça, onde o processo

se leva a cabo por meio do contraditório entra a acusação e a

defesa.

Dentro desse contexto, a imparcialidade judicial

configura-se, portanto, como um elemento imanente a todo e

qualquer processo, sendo que nela radica uma das mais

importantes garantias para a prolação de uma tutela jurisdicional

justa e equânime.

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Além de ser um direito fundamental, a imparcialidade

também representa a força normativa de um subprincípio

densificador do princípio estruturante do Poder Judiciário, isto é,

do princípio democrático que a legitima como essência da

atividade jurisdicional.

Pode-se afirmar, portanto, que a imparcialidade é a

essência do justo processo penal ou civil que condiciona como e

não só quem dita a resolução judicial.

A imparcialidade do juiz é um direito fundamental do

acusado ou da parte e ao mesmo tempo se configura como um

princípio regulador da função jurisdicional.

Trata-se de “uma garantia fundamental da

Administração da Justiça para garantir a supremacia do direito em

suas decisões” ( Ortiz, Maria Isabel Valldecabres. Op. Cit, p. 28).

CAPÍTULO V

Dissertação a respeito do tema à luz dos princípios

constitucionais.

Princípio da Dignidade da Pessoa Humana.

Em relação aos princípios – como espécie do

gênero norma jurídica – muito mais poderia ser dito,

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especialmente em se tratando daqueles contidos nos primeiros

capítulos da Constituição da República.

Arrolado no título dos princípios fundamentais da

Constituição da República, o Brasil erigiu o princípio da dignidade

humana como um de seus fundamentos (art.1°, III, CF).

Assim, o princípio da dignidade da pessoa humana

cumpre dupla função: por um lado, serve como elemento de

proteção dos direitos fundamentais contra eventuais medidas

restritivas; e, por outro, serve como justificativa para a imposição

de restrições aos próprios direitos fundamentais.

Embora não admita relativização em relação às

normas de direitos fundamentais, o princípio da dignidade da

pessoa humana é forçado a harmonizar-se quando eventualmente

confrontado com a dignidade de terceiros, considerados sempre

individual e concretamente.

Entendida como qualidade intrínseca da pessoa

humana, inclusive com todas as conseqüências daí advindas, é

mister compreender também que a dignidade evidentemente não

existe apenas onde é reconhecida pelo Direito e na medida que

este a reconhece, já que constitui dado prévio, não esquecendo,

todavia, que o Direito poderá exercer papel crucial na sua

proteção e promoção, não sendo, portanto, completamente sem

razão que se sustentou até mesmo a desnecessidade de uma

definição jurídica da dignidade da pessoa humana, na medida em

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que, em última análise, se cuida do valor próprio, da natureza do

ser humano como tal.

Assim, a dignidade é uma característica inerente a

toda e qualquer pessoa humana e realiza-se para ela

independentemente das demais.

Direito ao Respeito pela Vida Privada.

Situado como uma espécie de direito à

personalidade( gênero ), o direito ao respeito pela vida privada

merece igual destaque. Dada a sua importância, alguns de seus

aspectos devem ser ressaltados, já que é um direito

vigorosamente assegurado pela Constituição, com guarida no

artigo 5°, inciso X, que, em sua redação, diferencia explicitamente

a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem.

O professor René Ariel Dotti expõe como

delimitações do direito à vida privada alguns direitos que

menciona. Nesse sentido, refere-se explicitamente ao direito à

imagem, ao nome, ao domicílio, à correspondência, à honra, à

reputação, à integridade física, à integridade moral, à vida

profissional e, por último mas não menos importante, ao

esquecimento ( Dotti, 1980, pp. 77-92).

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Além disso, o autor dedica-se ao estudo do sujeito,

do objeto (bem juridicamente protegido) e dos traços que entende

essenciais ao direito estudado ( Dotti, 1980, pp. 92-105).

Em 1980, quando escreveu a sua obra, o professor

já se preocupava com a “revolução tecnológica”. Naquela ocasião,

acentuou que “as inovações da moderna tecnologia, vem

sensibilizando a opinião pública para o valor humano da vida

privada que está desaparecendo na medida em que se

estabelecem e desenvolvem os sistemas automáticos de colheita,

comutação e transmissão de dados”. A “revolução tecnológica” é,

sem dúvida, um importante fator tendente a provocar constantes

violações ao direito à intimidade ou respeito pela vida privada.

Além disso, já o papel desempenhado pelos órgãos

da mídia na cobertura de alguns tipos de crimes cometidos por

certos tipos de cidadãos ou ornamentados de determinadas

circunstâncias. Muito mais grave que o constrangimento de se ver

envolvido em algum processo penal, é a amplificação das

informações e dados constantes nestes autos e divulgados

reiteradamente em notícias pelos principais órgãos da mídia.

Nesta esteira, o Mestre Nilo Batista, ex-secretário

de Justiça do Estado e professor de Direito Penal, em texto de

sua autoria “ Mídia e Sistema Penal no Capitalismo Tardio” (

Revista Brasileira de Ciências Criminais, edição 43, Editora

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Revista dos Tribunais), analisou a influência da mídia sobre o

nosso sistema penal.

O importante estudo do Professor descreveu as

novas “funções” que a mídia vem desempenhando perante os

sistemas penais, dissecando o papel da mídia que, a seu ver,

segue diariamente uma espécie de tendência criminológica, que

parte da irrestrita legitimação da pena como modelo eficaz da

solução de conflitos. Essa posição que a mídia vem assumindo

visa reduzir o horizonte de análise dos problemas criminais, e

ignora a situação dos contingentes humanos marginalizados pela

economia neoliberal.

Afirma o autor que a mídia não raro pretende

substituir as agências policiais do sistema penal, na forma de

programas de televisão, como o programa Linha Direta que foi

exibido pela Rede Globo (site Conjur – www.conjur.com.br – Nilo

Batista analisa o papel da mídia no sistema penal brasileiro).

O Princípio da Liberdade de Expressão e a

Liberdade de Imprensa na Constituição da República.

A Lei Maior dedica todo um capítulo específico à

comunicação social (arts. 220 a 224), estabelecendo uma rede

protetiva em torno da liberdade de expressão, de pensamento, de

imprensa, de comunicação etc.

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O professor René Ariel Dotti ressalta que “com o

aparecimento de novas vertentes do pensamento moderno, a

liberdade de expressão foi erigida a um dos direitos fundamentais

da pessoa humana”. Em consequência, “o seu exercício através

da imprensa e de outros meios de comunicação passou a sofrer

restrições decorrentes do interesse individual, a par dos objetivos

sociais da comunidade” ( Dotti, 1980, pp. 126-127).

Muitas vezes, a liberdade de imprensa prevista na

Constituição da República não se choca frontalmente aos direitos

anteriormente mencionados (direito à dignidade da pessoa

humana e direito ao respeito pela vida privada). Aliás, observando-

se a enorme quantidade de notícias divulgadas diariamente, pode-

se dizer que, em geral, esse choque não ocorre. Na maioria das

vezes, os órgãos da mídia desenvolvem a sua tarefa de informar a

sociedade sem extrapolar os limites que lhes são

constitucionalmente assegurados. Todavia, quando verificado o

confronto, há mecanismos suficientes ao adequado controle, que

não implicam em qualquer hipótese a prática abominável da

censura.

Contraposta à liberdade de informação pelos

órgãos da mídia, encontram-se os necessários limites da atuação

ilegítima e abusiva dos órgãos da mídia. São como duas faces da

mesma moeda. Tal preocupação justifica-se, na medida em que “a

informação veiculada pela imprensa é vigorosa formadora de

opinião”. Ademais, “seu alcance é extraordinariamente prejudicial,

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bem mais que o posterior desagravo ou composição civil dos

danos, meros paliativos” (Gilberto H. Jabur, Liberdade de

pensamento e direito à vida privada, 2000, p. 188).

Análise Subjetiva Final do Tema.

Conclui-se, pelo estudo apresentado, que não se

pretende diminuir o importante papel da imprensa na divulgação

das informações atinentes ao mundo jurídico, mormente com

relação aos aspectos penais de uma decisão judicial, uma vez que

os meios de comunicação são responsáveis pela informação como

um todo, a fim de refletir o que ocorre em todos os setores da

sociedade, que é a grande destinatária dessa gama de

informações.

A publicização das notícias está cada vez mais

sedimentada em nossa sociedade, que acompanha de perto os

fatos sociais, exigindo uma transparência dos meios de

comunicação, ainda mais quando vivemos em um Estado

Democrático de Direito.

Dentro dessa realidade da imprescindibilidade do

jornalismo e seu papel na veiculação das informações, existem os

mecanismos de controle na filtragem daquelas, à medida que

causam um impacto contundente na vida das pessoas,

influenciando diretamente a opinião pública, incidindo

veementemente no Poder Judiciário, através da maneira que essa

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informação, distorcida ou não, chega até os julgadores de

processo judiciais, primordialmente seres humanos, suscetíveis a

reportagens e o poder midiático que se exerce.

Essa pesquisa almeja levantar a discussão a

respeito do papel da imprensa no mister da veiculação das

informações que interferem na seara judicial, que muitas vezes

extrapola suas funções, acarretando efeitos nocivos ao

desdobramento de um processo penal, formando um juízo

antecipado de pena a ser imposta a um acusado, contaminando a

imparcialidade própria de um juiz ao determinar seu julgamento

em um caso concreto que venha a ser tendenciosamente

divulgado pela mídia, criando estereótipos de “criminosos”

precocemente.

Desse modo, o problema da intervenção

descuidada da mídia no Poder Judiciário pode recair no abuso da

veiculação da informação, que muitas vezes por

irresponsabilidade, ou no anseio de transmitir a informação a

qualquer custo, acaba invadindo as peculiaridades técnicas de

uma decisão judicial, e toda a instrução de um julgamento,

exortando toda a sociedade à formação de uma condenação

antecipada de um investigado no processo penal.

Por derradeiro, é possível que haja uma

ponderação maior dos meios de comunicação na divulgação da

informação, uma posição mais neutra e eqüidistante por meio da

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imprensa na fundamental função de transmitir à população as

informações que, sem a imparcialidade e organização

necessárias, podem afetar as decisões judiciais de maneira injusta

e usurpadora, trazendo idéias preconcebidas à opinião pública,

mitigando a relevância da manutenção de princípios

constitucionais como a presunção de inocência, ampla defesa,

contraditório etc.

BIBLIOGRAFIA.

Mídia e o Poder Judiciário – A Influência dos

Órgãos da Mídia no Processo Penal Brasileiro – Fábio Martins

de Andrade. Ed: Lúmen Júris – 2007.

A Decisão do Juiz e a Influência da Mídia –

Ineficácia da prova divulgada pelos meios de comunicação

para o processo penal e civil – Artur César de Souza – Ed:

Revista dos Tribunais – 2010.

Mídia e Sistema Penal no Capitalismo Tardio –

Nilo Batista - Revista Brasileira de Ciências Criminais, edição

43, Editora Revista dos Tribunais.

Sitio Eletrônico: www.conjur.com.br Nilo Batista

analisa o papel da mídia no sistema penal brasileiro.

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