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I UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES INSTITUTO DE PESQUISAS SÓCIO-PEDAGÓGICAS PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU A PRÁTICA PEDAGÓGICA NA ADOÇÃO DOS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS Por: Maria Dilza de Lima Pedreira Rio de Janeiro 2001

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I

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

INSTITUTO DE PESQUISAS SÓCIO-PEDAGÓGICAS

PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU

A PRÁTICA PEDAGÓGICA NA ADOÇÃO

DOS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS

Por: Maria Dilza de Lima Pedreira

Rio de Janeiro2001

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II

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

INSTITUTO DE PESQUISAS SÓCIO-PEDAGÓGICAS

PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU

A PRÁTICA PEDAGÓGICA NA ADOÇÃO

DOS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS

Monografia apresentada ao Conjunto

Universitário Cândido Mendes como condição

prévia para a conclusão do curso de pós-

graduação “Lato Sensu” em Psicopedagogia.

Por: Maria Dilza de Lima Pedreira.

Rio de Janeiro2001

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III

AGRADECIMENTOS

Ao Deus supremo e benfeitor todahonra e toda glória.

Aos meus filhos Evelyn e Gustavopelo apoio que me deram, renunciandomuitas vezes suas atividades e projetosde todos os sábados em que estiveausente para estudar.

Aos cunhados Marinólia e Sérgio,pela ajuda de todas as maneiras, que mepermitiram estar na universidade.

Às amigas Flávia e Marilene portudo que fizeram para mim nosmomentos que mais precisei.

A alguém especial que, seestivesse aqui, seus olhos brilhariampara mais esta vitória: Emílio (inmemoriam).

Enquanto o mundo globalizadotrabalha para diminuir as distâncias,corremos o risco de aumentar o abismopor conta de tanta correria parasobrevivência junto com inúmerosoutros fatores de dificuldade.

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IV

DEDICATÓRIA

Há muito tempo venho juntandofrases, palavras, formas de dizer oquanto vocês são importantes para mim.É simplesmente isso que quero dizer:AMO VOCÊS.

Não é Natal, Ano Novo... ésimplesmente a demonstração de umsentimento que nunca se perdeu e nuncadeixou de existir. Apesar do silêncio domeu choro, a distância e toda a falta detempo, vocês são a melhor coisa queDeus fez para mim.

Ainda que eu fale a língua doshomens e dos anjos, se não tiver amorserei como o bronze que soa ou como ocímbalo que se retine. O amor tudosofre, tudo crê, tudo espera, tudosuporta, o amor jamais acaba. (IICoríntios, 13).

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V

"Escolas grandes ou pequenasserão melhores ou piores conforme ascaracterísticas das crianças e,sobretudo, as expectativas das famílias".

Brandão, Z. O mito da boa escola.In: Veja. São Paulo: Editora Abril,3/out/2001, p. 23.

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VI

RESUMO

O trabalho "A Prática Pedagógica na Adoção dos Parâmetros Curriculares Nacionais"

tem como objetivo, através de seus dois capítulos, elencar os argumentos que foram

selecionados, através da revisão de literatura das bibliografias, que justificam a posição

de diversos autores sobre a prática pedagógica após a adoção dos PCN. Como uma

referência para a visão de como estes elementos vinculam-se à educação em sala de

aula, escolheu-se o tema "ética" tendo em vista ser uma das novidades apresentadas em

termos curriculares, no caso, para o Ensino Fundamental. A proposta do Ministério da

Educação do Brasil, com os PCN, é a de trazer novos horizontes e perspectivas para o

ensino. Contudo, há que se rever uma série de outros elementos que também são

necessários para uma efetiva mudança educacional, principalmente no que tange à

dinâmica social bem como a saúde da população.

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VII

METODOLOGIA

Foi realizada a revisão de literatura dos autores pesquisados para a realização da

monografia, cujos temas mais importantes foram utilizados na elaboração dos capítulos

e seus respectivos autores, referendados ao longo do texto, apresentam-se listados nas

Referências Bibliográficas.

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VIII

SUMÁRIO

RESUMO .................................................................................................................. vi

METODOLOGIA ..................................................................................................... vii

SUMÁRIO ................................................................................................................ viii

INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 09

CAPÍTULO 1 – A VIABILIDADE DOS PCN COMO POLÍTICA PÚBLICA

DE INTERVENÇÃO NO CURRÍCULO ESCOLAR ......................................... 11

1.1 A PERTINÊNCIA DOS PCN COMO POLÍTICA PÚBLICA .......................... 13

CAPÍTULO 2 – DIRETRIZES CURRICULARES PARA A ÉTICA

E A CIDADANIA .................................................................................................. 23

CONCLUSÃO .......................................................................................................... 32

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................... 34

ANEXOS .................................................................................................................. 36

ÍNDICE ..................................................................................................................... 37

FOLHA DE AVALIAÇÃO ...................................................................................... 38

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9

INTRODUÇÃO

Na história da República brasileira, a questão educacional foi central nas

discussões que encaminham políticas sociais, uma vez que o analfabetismo e a

ignorância são vistos como responsáveis pelas desigualdades e, em conseqüência, a

escolarização é defendida como fator prioritário na promoção do desenvolvimento

econômico. Embora sem muito sucesso, não foram poucos os esforços da sociedade,

dos educadores organizados e, também, do Estado no sentido de imprimir mudanças nas

condições de democratização e qualidade da educação básica, provocando freqüentes

reformas na legislação do ensino, na estrutura curricular dos cursos de diferentes níveis

e, não raro, na orientação teórica das práticas pedagógicas escolares. É nessa

perspectiva que, fustigado pelas demandas deste final de século, o Ministério da

Educação (MEC) vem propondo parâmetros curriculares para orientar as políticas

públicas de educação básica e as ações educativas escolares em âmbito nacional.

Eleger a ética e a cidadania, elementos presentes nos Parâmetros

Curriculares Nacionais, como eixo principal da educação escolar implica colocar-se

explicitamente contra valores e práticas sociais que desrespeitem aqueles princípios,

comprometendo-se com as perspectivas e decisões que os favoreçam. Isso se refere a

valores, mas também a conhecimentos que permitam desenvolver as capacidades

necessárias para a participação social efetiva.

A relação educativa é uma relação política, por isso a questão da democracia

se apresenta par a escola da mesma forma que se apresenta para a sociedade. Essa

relação se define na vivência da escolaridade em sua forma mais ampla, desde a

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estrutura escolar, em como a escola se insere e se relaciona com a comunidade, nas

relações entre os trabalhadores da escola, na distribuição de responsabilidades e poder

decisório, nas relações entre professor e aluno, na relação com o conhecimento.

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CAPÍTULO 1

A VIABILIDADE DOS PCN COMO POLÍTICA PÚBLICA

DE INTERVENÇÃO NO CURRÍCULO ESCOLAR

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Mesmo apresentando-se como uma proposta sem caráter de obrigatoriedade

os PCN pretendem ser "um referencial comum para a educação escolar no Brasil",

tendo em vista uma formação de qualidade, e assumem a feição de política pública ao

situarem-se como uma orientação oficial que "estabelece uma meta educacional para a

qual devem convergir as ações políticas do Ministério da Educação e do Desporto, tais

como os projetos ligados a sua competência na formação inicial e continuada de

professores, à análise e compra de livros e outros materiais didáticos e à avaliação

nacional. Têm como função subsidiar a elaboração ou a revisão curricular dos Estados e

Municípios, dialogando com as propostas e experiências já existentes, incentivando a

discussão pedagógica interna das escolas e a elaboração de projetos educativos, assim

como servir de material de reflexão para a prática de professores" (PCN, v. 1, p.36).

É verdade que os desafios que hoje se colocam às políticas públicas de

educação são mais complexos que a mera reforma na estrutura dos cursos, de qualquer

nível, com vistas à adequação do ensino aos planos de desenvolvimento econômico,

como ocorreu em anos anteriores. A globalização (econômica, política, cultural...) e as

possibilidades abertas pela comunicação, na sociedade contemporânea, associadas à

exclusão social, cada vez mais flagrante e abrangente, colocam as escolas e os sistemas

educativos de frente com problemas que transcendem a dimensão estrutural do currículo

e a dinâmica das metodologias de ensino que, historicamente, têm caracterizado as

inovações pedagógicas e as reformas educacionais no Brasil. Além do campo específico

do currículo em desenvolvimento, a escola e os sistemas educativos precisam atentar

para as questões sociais; para o desemprego e a marginalização, que atingem camadas

cada vez mais amplas da sociedade, refletindo-se na escola pública sob a forma de

violência, abandono e rejeição; para os salários aviltantes do magistério; para a auto-

estima abalada; para as dificuldades em qualificar e manter programas de formação

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continuada dos professores; para as demandas de participação e descentralização de

decisões, limitadas pela burocracia escolar... Esses, e outros, fatores conformam um

contexto situacional determinante no modo como as políticas públicas de educação (e

em especial aquelas diretamente ligadas à tarefa dos professores e professoras) são

recebidas, interpretadas e postas em ação no ambiente escolar.

É nessa perspectiva que este estudo centra-se na questão da racionalidade

que fundamenta as políticas públicas de orientação curricular, no contexto atual da

sociedade brasileira, indagando sobre a pertinência, a viabilidade e a legitimidade dos

PCN como política que busca padrões gerais de qualidade para a educação básica em

todo o País.

1.1 PERTINÊNCIA DOS PCN COMO POLÍTICA PÚBLICA

Para a compreensão dos PCN como política pública de orientação

curricular, a "pertinência" é tomada como categoria de análise em um processo

hermenêutico de investigação, situando-se no entendimento de que não há razões

externas, dissociadas de motivações políticas e livres de significações subjetivas,

determinando as políticas sociais e educacionais. Esta concepção implica em perceber

as políticas como o arcabouço estrutural configurado nas relações do Estado com a

sociedade civil onde as demandas e pressões exercidas pelo conjunto dos cidadãos

associam-se aos interesses de ordem econômica e política definindo linhas de ações

institucionais. Sendo assim, na configuração estrutural das políticas públicas estão em

jogo, não só a vontade ou os interesses governamentais mas, também, formas de

regulação que cada sociedade desenvolve e coloca em prática a partir do seu estágio de

desenvolvimento e conscientização política.

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Nas sociedades complexas, independentemente do nível de autoritarismo ou

liberdade democrática determinado pelas ideologias que sustentam as relações de poder,

a regulação se dá pela resistência ou adesão às propostas governamentais. Esta forma

quase espontânea de regulação expressa-se nas motivações da sociedade em relação às

normas instituídas pelas políticas públicas, determinando o seu grau de legitimidade.

Desse modo, a pertinência das políticas, na área social, pode ser definida pelo caráter de

legitimidade suposto nas suas orientações normativas. O que implica, segundo

Habermas, (1980) em um "acordo", somente possível quando existe condições de

equilíbrio de poder entre as partes envolvidas.

Nessa perspectiva, a pertinência, como uma categoria de análise, investiga

os PCN no papel que eles desempenham como instâncias mediadoras entre o propósito

governamental de orientar ações que qualifiquem o desenvolvimento curricular na

escola de educação básica e as mudanças efetivas que ocorrem nesse nível de ensino.

Isso implica em estabelecer relações que explicitem sua coerência em relação às

demandas sociais e aos propósitos políticos e administrativos, relacionados ao projeto

de desenvolvimento do país, que orientam a elaboração e implantação de políticas dessa

ordem.

Para tanto, é possível tomar como referência a síntese totalizadora, proposta

por Sander (1982 e 1995), que está fundamentada na "análise das confluências e

contradições" existente entre os quatro paradigmas por ele identificados na análise da

administração educacional: 1) a administração para a eficiência; 2) a administração para

a eficácia; 3) a administração para a efetividade; 4) a administração para a relevância.

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Embora esse modelos correspondam a fases historicamente determinadas, o autor

considera que estão todos presentes na administração da Educação brasileira

sobrepondo-se, ora uma, ora outra orientação. Como são elaborações heurísticas não

existem em forma pura, daí a sua proposta de uma síntese teórica embasando um novo

paradigma para o estudo e a prática da administração educacional.

O paradigma multidimensional de administração da Educação, concebido

por Sander, é constituído de quatro dimensões (econômica, pedagógica, política e

antropológica) que se integram a partir de três pressupostos básicos:

"O primeiro pressuposto é o de que os fenômenoseducacionais e os fatos administrativos são realidadesglobais constituídas de dimensões ou planosmulticêntricos com ênfases ora opostas oracomplementares. O segundo pressuposto é o de que nosistema educacional existem dimensões intrínsecas denatureza antropológica e pedagógica ao lado dedimensões extrínsecas de natureza política e econômica.O terceiro pressuposto é o de que o ser humano, comoente individual e social, politicamente engajado nasociedade, constitui a razão de ser da existência dosistema educacional" (Sander, 1982, p. 16).

A relevância, considerada como conceito central na construção do novo

paradigma de administração da Educação, situa-se na dimensão mais específica e

subjetiva, estando associada à qualidade de vida dos indivíduos e grupos que participam

do sistema educacional. Diz respeito àquilo que em uma comunidade é valorizado e

considerado importante, portanto, está inserida nas relações culturais mais específicas.

Infere-se daí que a relevância de um projeto é definida pelos significados concretos de

suas ações na qualidade de vida dos sujeitos/atores e esta é determinada pela percepção

de valor incorporada nos sistemas simbólicos dos grupos sociais.

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Nesse sentido, a pertinência dos PCN, como política que incorpore todos os

elementos de um paradigma multidimensional (eficácia, eficiência, efetividade e

relevância ) é avaliada na consideração: a) da sua contribuição para a organização do

sistema; b) da sua coerência e articulação com o projeto de desenvolvimento do país; c)

do envolvimento e participação da comunidade na elaboração e desenvolvimento de

propostas que incorporem as perspectivas particulares aos objetivos mais amplos das

políticas públicas de educação.

Os instrumentos conceituais, que se organizam em torno desta categoria e

ampliam-se na processualidade da pesquisa, orientam a investigação na hipótese de que

os textos e discursos oficiais - no processo dialético-hermenêutico de compreensão,

interpretação e aplicação em experiências diversificadas -, impregnados pela tradição

que tece o universo simbólico da cultura escolar, adquirem significados próprios, nem

sempre coincidentes com a intencionalidade política oficial.

Habermas considera, ainda, que, no estágio avançado do desenvolvimento

capitalista, exacerbam-se as necessidades de legitimação, não apenas pela expansão dos

assuntos processados administrativamente, exigentes de adesão e lealdade das massas,

mas também porque os limites do sistema político "deslizam" diante do deslocamento

do sistema cultural fazendo com que assuntos culturais, antes tidos como estabelecidos,

caiam na área de planejamento administrativo. Cita como exemplo desse processamento

administrativo da tradição cultural, exatamente o planejamento do currículo e afirma:

"Onde quer que as administrações escolares,formalmente e meramente, tenham de codificar um cânone queassume a forma de um modo natural, não planejado, o presente

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planejamento de currículo se baseia na premissa que os padrõesculturais bem que poderiam ser de outro modo. O planejamentoadministrativo produz uma pressão universal em favor dalegitimação, numa esfera que outrora se distinguiu precisamente porseu poder de auto-legitimação" (Habermas, 1980. p. 94).

Essa expansão do sistema político para a área do planejamento educacional,

como sabemos, ocorre de modo bem explícito, na sociedade brasileira, a partir da

década de setenta, quando o sistema educacional, inserindo-se na racionalidade da

reorganização do Estado imposta pelo governo militar, assume uma feição técnico-

burocrática na qual, a extrema especialização fragmentou o trabalho pedagógico e

limitou a participação dos professores/as na planificação do currículo. A ação dos

especialistas burocratizou o planejamento e a administração da educação transformando

os processos didáticos e metodológicos em práticas cartoriais, sujeitas a controle e

avaliações conduzidas por objetivos referidos a fins observáveis e a critérios de eficácia.

Essa forma burocratizada de administração da educação incorporou uma

racionalidade cognitivo-instrumental à organização escolar estruturando o currículo

como uma congregação sistêmica de disciplinas, conteúdos e carga horária que facilitam

o controle burocrático, mas reduzem o "mundo da vida" à condição de "ingrediente do

entorno sistêmico" (Habermas, 1980).

O distanciamento em relação à cultura (que Habermas considera "armazém

do saber", de onde os indivíduos extraem a sua visão de mundo) gera indiferença das

organizações em relação às subjetividades e ao poder da tradição, restringindo os

espaços de participação e, desse modo, as motivações e as condições para legitimação

das propostas oficiais.

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No que se refere à utilização dos PCN como referencial para as práticas

escolares, essa ausência de interação, de engajamento político e motivação intrínseca,

necessária para a construção de uma proposta pedagógica identificada com a cultura

local, manifesta-se na ação (ou não-ação) de professores e professoras empenhados

apenas em cumprir os aspectos estruturais do currículo, como carga horária e conteúdos

mínimos, desconsiderando, ou rejeitando, orientações teórico-metodológicas que não

estejam sujeitas a controle.

Fragiliza-se, assim, tanto a legitimidade da proposta do MEC como política

que pretende expandir-se da área educacional para o campo social promovendo

qualidade e equidade no ensino básico, quanto a sua viabilidade como orientação

unificadora de um currículo nacional

No que se refere à preocupação dos PCN com a pluralidade cultural e com a

inclusão de questões sociais no currículo escolar, através dos temas transversais, vale

lembrar que, na perspectiva de legitimação entendida por Habermas, as tradições

culturais, transformadas em matéria prima para o planejamento de caráter ideológico,

perdem a sua dimensão articuladora no mundo da vida tornando-se uma "cultura

coisificada" em torno do sistema. É desse modo que os "temas transversais" são vistos

pelas professoras como acréscimo de conteúdos de ensino na dimensão mais tradicional

de aquisição de informações.

Desligando-se das "amarras" que lhe impõe a cultura (aspectos prático-

morais e estético-expressivos) e das atitudes orientadas por motivações específicas da

personalidade, a organização, ou o currículo escolar, estará rompendo com o "mundo da

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vida" pela neutralização do seu conteúdo ético-normativo (Habermas, id. Ibid.). Desse

modo, apesar de os PCN insistirem enfaticamente no atendimento às diversidades

culturais, a "cultura escolar" que vê as orientações oficiais como intervenção alienígena

no currículo, de cunho meramente estrutural, permanece viva. Em conseqüência,

incluindo ou não elementos novos, a sua dinâmica continua tradicional, conservadora,

experimentando mudanças efetivas somente quando se impõem necessidades emanadas

da pragmática vivenciada pelos sujeitos envolvidos na educação escolar.

Se assim for, a questão da qualidade do ensino (que justifica os PCN como

política unificadora de um currículo nacional) não será equacionada apenas com

propostas de organização curricular e pedagógica gestadas nos órgãos centrais do

sistema. Além da participação efetiva da sociedade e da comunidade escolar, uma

política dessa ordem requer condições que as viabilizem, o que, na opinião daqueles que

estão inseridos na prática escolar, não está ocorrendo.

Utilizando os argumentos anteriormente expostos na interpretação do modo

como os PCN estão sendo recebidos e utilizados na escola, podemos dizer que as

políticas que os conduzem permanecem orientadas pela mesma racionalidade cognitivo-

instrumental que tem situado as reformas educacionais como projetos externos à escola

e, com isso, limitado o processo de reestruturação curricular a ações sujeitas a regulação

e controle. A exclusão dos sujeitos/atores das práticas escolares no processo de

elaboração de projetos pedagógicos, que somente se viabilizam se forem por eles

assumidos e executados, produz a ruptura entre os objetivos oficiais e a práxis escolar e,

com isso, a fragilidade das motivações que imprimem significado às ações, ou uma crise

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de legitimidade, comprometendo a sua viabilidade como política que visa provocar

mudanças efetivas no desenvolvimento do currículo .

Remetendo essa questão para a referência do "paradigma multidimencional

de administração da Educação" (Sander,1982) é possível dizer, também, que a

proposição de um currículo nacional divulgado por meio de um documento de caráter

tão abrangente como os PCN, contempla as dimensões econômica, pedagógica, política

e antropológica apenas no que se refere a seus objetivos políticos e suas orientações

teóricas. Todavia, a proposta do MEC não parece alcançar o sentido da relevância, que

Sander considera como elemento central para um novo modelo de administração

educacional. Isto porque, a centralidade da proposta de reestruturação curricular

orientada pelos PCN não está posta nos aspectos subjetivos, associados à qualidade de

vida e sim aos aspectos mais amplos da sociedade, ou seja, à consecução de objetivos

sociais e, também, econômicos, externos ao sistema educacional. Nesse sentido,

enquanto política pública, a ênfase dos PCN está posta na efetividade, priorizando a

dimensão política em detrimento dos fatores antropológicos e culturais.

Seguindo essa linha de reflexão e recorrendo aos indicadores apontados para

a análise da pertinência dos PCN como política pública situada no paradigma

multidimencional da administração da Educação, pode-se inferir que: a) sua

contribuição não está sendo significativa na organização dos sistemas de ensino, na

medida em que a sua utilização na práxis escolar é pouco freqüente e influente; b) sua

coerência e articulação com o projeto de desenvolvimento do país limita-se ao plano

teórico uma vez que não há condições materiais de efetividade da proposta; c) o

envolvimento e participação da comunidade na elaboração de propostas locais que

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incorporem as proposições teóricas e os objetivos dos PCN, segundo os próprios

sujeitos envolvidos, não está ocorrendo. Portanto, os PCN somente podem ser

considerados pertinentes na perspectiva de uma racionalidade instrumental que

persegue, apenas, a eqüidade, "respeitando as diferenças", sem comprometer-se com as

condições de possibilidade dos sujeitos envolvidos na implementação das políticas

públicas, ou nos processos de escolarização, para promoverem ou conquistarem o

direito à igualdade.

Uma alteração radical no campo das políticas públicas de orientação

curricular teria de reconhecer, na crise da escola e na dificuldade em implantar

propostas inovadoras, o esgotamento do paradigma que, historicamente, tem

fundamentado as políticas de reforma curricular sem conseguir muito êxito na

qualificação do ensino público.

A lógica inversa a essa linearidade singular das proposições técnico-

instrumentais deveria considerar, na definição do projeto e nas estratégias para sua

implementação, a complexidade do contexto situacional onde se viabilizam as políticas

públicas de orientação curricular, ou seja, o "mundo da vida", constituído pela cultura,

pela subjetividade e pelas normas organizativas da sociedade a que se submetem os

sujeitos das práticas escolares.

Nessa perspectiva, as políticas de orientação curricular precisariam

identificar-se com a proposta da própria escola, fundamentando-se em uma

racionalidade hermenêutica que, ao considerar os processos históricos, culturais e

subjetivos da compreensão performativa, incorpora motivações e legimitidade às ações,

reunindo condições mais efetivas de viabilidade.

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CAPÍTULO 2

DIRETRIZES CURRICULARES PARA A ÉTICA E A CIDADANIA

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A cidadania deve ser compreendida como produto de histórias vividas pelos

grupos sociais, sendo, nesse processo, constituída por diferentes tipos de direitos e

instituições. O debate sobre a questão da cidadania é hoje diretamente relacionado com

a discussão sobre o significado e o conteúdo da democracia, sobre as perspectivas e

possibilidades de construção de uma sociedade democrática.

A democracia pode ser entendida em um sentido restrito como um regime

político. Nessa concepção restrita, a noção de cidadania tem um significado preciso: é

entendida como abrangendo exclusivamente os direitos civis (liberdade de ir e vir, de

pensamento e expressão, direito à integridade física, liberdade de associação) e os

direitos políticos (eleger e ser eleito), sendo que seu exercício se expressa no ato de

votar.

Entendida em sentido mais amplo, a democracia é uma forma de

sociabilidade que penetra em todos os espaços sociais. Nessa concepção, a noção de

cidadania ganha novas dimensões. A conquista de significativos direitos sociais, nas

relações de trabalho, previdência social, saúde, educação e moradia, amplia a concepção

restrita de cidadania.

Os movimentos sociais revelam as tensões que dizem respeito à

desigualdade social, tratam das questões sobre a crescente eqüidade na participação ou

ampliação dos direitos, assim como da relação entre os direitos individuais e os

coletivos e da relação entre os direitos civis, políticos, sociais e econômicos com os

Direitos Humanos.

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Novos atores, novos direitos, novas mediações e novas instituições

redefinem o espaço das práticas de cidadania, propondo o desafio da superação da

marcante desigualdade social e econômica da sociedade brasileira, com sua

conseqüência de exclusão de grande parte da população na participação dos direitos e

deveres. Trata-se de uma noção de cidadania ativa, que tem como ponto de partida a

compreensão do cidadão como portador de direitos e deveres, mas que também o vê

como criador de direitos participando na gestão pública.

Na Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 1988,

verifica-se que constituem objetivos fundamentais da República, previstos no seu artigo

3º:

- construir uma sociedade livre, justa e solidária;

- garantir o desenvolvimento nacional;

- erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades

sociais e regionais;

- promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo,

cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais, ao proporem uma educação

comprometida com a cidadania, elegeram (com base no texto constitucional) princípios

segundo os quais deve-se orientar a educação escolar:

- Dignidade da pessoa humana: implica respeito aos direitos humanos,

repúdio à discriminação de qualquer tipo, acesso a condições de vida

digna, respeito mútuo nas relações interpessoais, públicas e privadas;

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- Igualdade de direitos: refere-se à necessidade de garantir a todos a

mesma dignidade e possibilidade de exercício de cidadania. Para

tanto há que se considerar o princípio da eqüidade, isto é, que existem

diferenças (étnicas, culturais, regionais, de gênero, etárias, religiosas

etc.) e desigualdades (socioeconômicas) que necessitam ser levadas

em conta para que a igualdade seja efetivamente alcançada;

- Participação: como princípio democrático, traz a noção de cidadania

ativa, isto é, da complementaridade entre a representação política

tradicional e a participação popular no espaço público,

compreendendo que não se trata de uma sociedade homogênea e sim

marcada por diferenças de classe, étnicas, religiosas etc.

- Co-responsabilidade pela vida social: implica partilhar com os

poderes públicos e diferentes grupos sociais, organizados ou não, a

responsabilidade pelos destinos da vida coletiva. É nesse sentido,

responsabilidade de todos a construção e ampliação da democracia no

Brasil.

A proposta de Ética de observações e princípios relativamente simples de

serem explicitados. Questões éticas encontram-se a todo momento em todas as

disciplinas. Vale dizer que questões relativas a valores permeiam todos os conteúdos

curriculares.

É fácil verificar esse fato em História: as guerras, as diversas formas de

poder político, as revoluções industriais e econômicas, as colonizações, etc., dizem

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diretamente respeito às relações entre os homens. E mais ainda: o passado histórico é de

extrema importância para se compreender o presente, os valores contemporâneos, as

atuais formas de relacionamento entre os homens, entre as comunidades, entre os países.

Em relação à Língua Portuguesa, deve-se considerar que a linguagem é o

veículo da cultura do país onde é falada, que carrega os valores, portanto. Por exemplo,

comparar a chamada “norma culta” às outras formas de falar não é apenas comparar

duas formas de se comunicar seguindo o critério do “certo” e do “errado”. É, sobretudo,

pensar as diversas formas de o homem se apoderar da cultura, suas possibilidades

objetivas de fazê-lo.

O mesmo raciocínio pode ser feito em relação às Ciências Naturais e aos

Temas Transversais. Por exemplo, ao se abordar a sexualidade – tema que suscita

discussões éticas, uma vez que se refere a relações entre pessoas – e as doenças

sexualmente transmissíveis, como a AIDS, pode-se abordar a questão do respeito pelo

outro: preservar-se dessas doenças não se justifica apenas pelo zelo pela própria saúde e

sobrevivência, mas também pelo respeito pela vida alheia, uma vez que o parceiro pode

ser contaminado.

Em relação ao Meio Ambiente, temas como a preservação da natureza

diziam respeito diretamente à vida humana, pois poluir rios causa problemas de doenças

em quem depende de suas águas. Ou seja, desrespeitar a natureza significa desrespeitar

as pessoas que dela dependem.

Verifica-se aí que as questões relacionadas à Ética permeiam todo o

currículo. Portanto, não há razão para que sejam tratadas em paralelo, em horário

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específico de aula. Pelo contrário, passar ao lado de tais questões seria, justamente,

prestar um desserviço à formação moral do aluno: induzi-lo a pensar que ética é uma

“especialidade”, quando, na verdade, ela diz respeito a todas as atividades humanas.

A própria função da escola – transmissão do saber – levatna questões éticas.

Para que e a quem servem o saber, os diversos conhecimentos científicos, as várias

tecnologias? É necessário refletir sobre esse questionamento. Além do mais, sabe-se que

um conhecimento totalmente neutro não existe.

É, portanto, necessário pensar sobre sua produção e divulgação. O ato de

estudar também envolve questões valorativas. Afinal, para que se estuda? Apenas na

perspectiva de se garantir certo nível material de vida? Tal objetivo realmente existe,

porém estudar também é exercício da cidadania: é por meio dos diversos saberes que se

participa do mundo do trabalho, das variadas instituições, da vida cotidiana,

articulando-se o bem-estar próprio com o bem-estar de todos.

O tema ética diz respeito a praticamente todos os outros temas tratados pela

escola. E mais ainda: diz respeito às relações humanas presentes no interior da escola e

àquelas dos membros da escola com a comunidade. A proposta de transversalidade

proposta pelo Ministério da Educação para o tema aparece sob várias justificativas.

A primeira consiste em não refazer o erro da péssima experiência com a

disciplina de Moral e Cívica, que partia do pressuposto que a formação moral

corresponde a uma “especialidade” e deveria ser isolada no currículo por meio de aulas

específicas.

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Outra proposta reside na problemática moral, que está presente em todas as

experiências humanas, devendo ser enfocada em cada uma dessas experiências que

ocorrem tanto durante o convívio na escola como no embate com diversas matérias.

A última proposta mostra que o aluno não deve dividir a moral num duplo

sistema de valores: aqueles que se falam e aqueles que, de fato, inspiram as ações.

Infelizmente, tal duplo sistema existe em nossa sociedade. Associar a educação moral a

discursos sobre o Bem e Mal nada mais faz do que reforçar o divórcio entre discurso e

prática. Ao ancorar a educação moral na vivência social, reatam-se os laços entre falar e

agir.

É neste ponto que se faz necessária a intervenção da escola: trazendo para os

alunos a abordagem da ética e da cidadania no contexto de todas as disciplinas,

mostrando que estes valores podem – e devem – ser exercidos por todo o cidadão, no

desenvolvimento de uma sociedade no mínimo mais humana, pode-se acreditar que as

gerações vindouras começaram a reverter este quadro. Da falta total de liberdade nos

anos 60 e 70 para a transição nos anos 80 e a liberdade sem medidas nos anos 90, é mais

do que chegada a hora de reavaliar, professor, aluno e cidadão, por que e para que a

ética e a cidadania devem estar presentes em nossas vidas.

Ademais, o homem é um ser social. Só ele produz, produzindo ao mesmo

tempo determinadas relações sociais (relações de produção) sobre as quais se elevam as

demais relações humanas, sem excluir as que constituem a superestrutura ideológica da

qual faz parte a moral.

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O homem é também um ser histórico. As várias relações que contrai

numa determinada época constituem uma unidade ou formação econômico-social que

muda historicametne sob o impulso de suas contradições internas e, particularmente,

quando chega ao seu amadurecimento a contradição entre o desenvolvimento das forças

produtoras e das relações de produção. Mudando a base econômica, muda também a

superestrutura ideológica e, evidentemente, a moral.

A história do homem, como história da produção material e da produção

espiritual nas quais o homem produiz a si esmo – apresenta-se como um processo

objetivo e inevitável, mas não fatal. São os homens que fazem a sua própria história,

seja qual for o grau de consciência com o qual a realizam e de sua participação

consciente nela.

Em cada época histórica, o agente principal da mudança é a classe ou as

classes cujos interesses coincidem com a marcha ascendente do movimento histórico.

Dessa premissa, percebe-se a moral como toda forma de superestrutura ideológica e que

cumpre uma função social: sancionar as relações e condições de existência de acordo

com os interesses da classe dominante.

Nas sociedades divididas em classes antagônicas, por conseguinte, a

moral tem um caráter de classe. Até hoje existem diferentes morais de classe, e

inclusive numa mesma sociedade podem coexistir várias morais, já que a cada classe

corresponde uma moral particular. Por isto, enquanto não se verifica as condições reais

de uma moral universal, válida para toda a sociedade, não pode existir um sistema moral

válido para todos os tempos e para todas as sociedades. As tentativas de construir

sistema semelhante no passado visavam a expressar sob uma forma universal interesses

particulares.

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CONCLUSÃO

Os Parâmetros Curriculares Nacionais são um paradoxo dentro de nosso

sistema educacional: ao mesmo tempo em que o governo, leia-se ministro da Educação

Paulo Renato Souza, está promovendo diversas mudanças (Lei de Diretrizes e Bases, os

próprios PCN, os programas de Bolsa-Escola, o FUNDEF, as autonomias das escolas, a

redistribuição dos repasses para Estados e Municípios - estes mais privilegiados) há o

contraponto, clássico e redundante, das mazelas educacionais bem típicas de nosso país

(escolas inacabadas, greve de professores, falta de materiais nas escolas, aprovação

automática, evasão e repetência, sistemas de plano de carreira e aplicação de recursos

discrepantes entre estados e municípios, analfabetismo e baixa escolaridade,

manutenção dos sistemas arcaicos - e trágicos - da gestão educacional nas regiões Norte

e Nordeste).

Falar em Parâmetros Curriculares Nacionais [grifo] parece, no Brasil em

que se vive hoje, uma piada. De mau gosto. Como exigir e impor mudanças na

educação se a saúde, essencial para qualquer ser humano [grifo] poder ter condições

para lutar por moradia, educação, emprego, alimentação e condições outras de vida, é

quase inexistente para um grande número de brasileiros? Como exigir das crianças e

adolescentes "ética" se o que se vê na imprensa é a perpetuação da falta desta "ética"

como o elemento principal das ações de líderes políticos, empresários, trabalhadores?

Como falar em saúde nas escolas se a própria rede de saúde não atende a população no

que ela mais precisa? Como educar se a fome e a doença afastam muitos alunos da

escola?

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Mas, a inquietação sobre a qualidade do ensino é uma constante entre as

famílias que sabem que as transformações sociais deixam em aberto uma série de

certezas que pautaram suas opções em termos de escola, profissões e valores sociais.

Mudar a educação não significa a adoção de sucessivos paliativos [grifo],

que mascaram e adiam problemas que estão se tornando cada vez mais difíceis de serem

solucionados. Mudar a educação é mudar, antes de tudo, a sociedade. Mudar a política

que esta escolhe, a economia à qual esta se submete, a própria dinâmica social que esta

proporciona. Aí, sim, depois destas mudanças um "projeto" tal como os PCN se

apresentam irá parecer efetivamente válido. E possível de ser seguido.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Outubro de 1988. São Paulo: Editora do Brasil, 1999.

BRASIL. Lei nº 9.394. Promulgada em 20 de Dezembro de 1996. Estabelece as

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apresentação dos temas transversais: ética. 2. ed. Rio de Janeiro: DP & A, 2000.

______. Parâmetros curriculares nacionais: meio ambiente e saúde. 2. ed. Rio de

Janeiro: DP & A, 2000.

GADOTTI, M. História das idéias pedagógicas. 7. ed. São Paulo: Ática, 1999.

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VASQUEZ, A. S. Ética. (trad. João Dell’Anna). 5. ed. Rio de Janeiro: Civilização

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ANEXOS

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34

ÍNDICE

Página

RESUMO .................................................................................................................. vi

METODOLOGIA ..................................................................................................... vii

SUMÁRIO ................................................................................................................ viii

INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 09

CAPÍTULO 1 – A VIABILIDADE DOS PCN COMO POLÍTICA PÚBLICA

DE INTERVENÇÃO NO CURRÍCULO ESCOLAR ......................................... 11

1.1 A PERTINÊNCIA DOS PCN COMO POLÍTICA PÚBLICA .......................... 13

CAPÍTULO 2 – DIRETRIZES CURRICULARES PARA A ÉTICA

E A CIDADANIA .................................................................................................. 23

CONCLUSÃO .......................................................................................................... 32

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................... 34

ANEXOS .................................................................................................................. 36

ÍNDICE ..................................................................................................................... 37

FOLHA DE AVALIAÇÃO ...................................................................................... 38

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FOLHA DE AVALIAÇÃO

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

INSTITUTO DE PESQUISAS SÓCIO-PEDAGÓGICAS

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

TÍTULO DA MONOGRAFIA:

A PRÁTICA PEDAGÓGICA NA ADOÇÃO

DOS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS

DATA DE ENTREGA: 20 DE OUTUBRO DE 2001.

AVALIADO POR: ____________________________ GRAU: ______________.

Rio de Janeiro, _____ de _________________ de 2001.

____________________________________________

Coordenador do Curso