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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU INSTITUTO A VEZ DO MESTRE O Lúdico nas Séries Iniciais: a importância das brincadeiras para o desenvolvimento infantil Por: Adriana de Farias Ramalho Orientadora Profª. Narcisa Castilho Melo Brasília 2009

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

O Lúdico nas Séries Iniciais: a importância das brincadeiras para o desenvolvimento infantil

Por: Adriana de Farias Ramalho

Orientadora

Profª. Narcisa Castilho Melo

Brasília

2009

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

O Lúdico nas Séries Iniciais: a importância das brincadeiras para o desenvolvimento infantil

Apresentação de monografia ao Instituto A Vez do

Mestre – Universidade Candido Mendes como

requisito parcial para obtenção do grau de

especialista em Psicopedagogia Institucional.

Por: Adriana de Farias Ramalho

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AGRADECIMENTOS

A Deus, que me permitiu vencer mais uma

etapa, apesar de enfrentar momentos difíceis em

minha vida pessoal. A meu marido e amigos, por

seus incentivos e apoio. Ao Senhor Renato, do

Instituto A vez do Mestre - Regional de Brasília,

homem abençoado por Deus, que sempre me

incentivou a superar minhas limitações. E a todos

que contribuíram para a realização deste trabalho.

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DEDICATÓRIA

Á minha filha Isabella Vitória,

exemplo de amor pela vida, força e

superação. Por sua capacidade de

envolver-me de forma tão sublime em sua

inesgotável fonte de carinho e amor

incondicional.

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RESUMO

A criança, quando chega à escola, traz consigo suas vivências,

sentimentos e percepções que são fruto de suas interações sociais.

Atualmente, os lares, um dos primeiros espaços de ludicidade e interação da

criança, estão cada vez menores, isto é, diminuídos em seu espaço físico.

Diminuído, ainda, estão o tempo e a disposição de seus familiares, para

garantir-lhes o brincar necessário ao seu desenvolvimento. Perceber como a

criança se desenvolve preparando-se para o lúdico é um fator importante.

Nesse contexto, a escola, precisa associar à prática pedagógica ao ato de

brincar, que geralmente tem sido dissociado das situações de aprendizagem. A

ludicidade constitui um recurso com inúmeras possibilidades de enriquecer e

tornar a aprendizagem significativa e prazerosa para quem ensina e para quem

aprende e interage por meio dela.

Este trabalho é indicado a todo aquele que se preocupa com o

desenvolvimento infantil em sua totalidade. Pois visa colaborar com a

discussão e reflexão sobre a importância do uso do lúdico nas escolas, nas

séries iniciais do Ensino Fundamental.

Palavras-chaves: lúdico – brincar – aprender – escola -

desenvolvimento - aprendizagem

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METODOLOGIA

O desenvolvimento deste trabalho de pesquisa foi realizado por meio de

pesquisas, leitura de livros sobre o tema em questão e reflexões

fundamentadas à luz de autores consagrados por suas contribuições

significativas na área educacional e psicopedagógica.

As obras dos autores Vygotsky, Froebel, Moyles e Kishimoto foram a

principal fonte de pesquisa e reflexão para a realização desta monografia.

Esta obra tem por finalidade, sugerir ao leitor, uma reflexão e busca

pelo aprofundamento sobre a importância do lúdico para o desenvolvimento da

criança nas séries iniciais. Pois será possível perceber, durante a leitura deste

trabalho, que brincando, a criança tem a oportunidade de experimentar o objeto

de conhecimento, explorá-lo, descobri-lo, criá-lo e recriá-lo, já que, nos

momentos de brincadeira a criança pode pensar e agir livremente, pode ousar,

imaginar, fazer de conta, e tudo isso sem ter medo de errar, já que ela brinca

com inúmeras possibilidades imaginárias.

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EPÍGRAFE

“É fundamental que se assegure à

criança o tempo e os espaços para que o caráter

lúdico do lazer seja vivenciado com intensidade

capaz de formar a base sólida para a criatividade e

a participação cultural e, sobretudo, para o exercício

do prazer de viver, e viver, como diz a canção...

como se fora brincadeira de roda...”

(MARCELINO, NELSON. C. 1996.p.38)

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Sumário

INTRODUÇÃO................................................................................. 09 CAPÍTULO I - O Desenvolvimento da Psicomotricidade: uma preparação

para o lúdico............................ 12

CAPÍTULO II - O início do brincar........................................... 19 2.1 - Quando o brincar é levado à sério............ 24 CAPÍTULO III - Breves Conceitos sobre o Lúdico................... 27 3.1 - O lúdico nas séries iniciais............................ 29 CAPÍTULO IV - Importantes Contribuições de Educadores sobre o uso

do Lúdico na Educação Infantil..........................................................................

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CONCLUSÃO............................................................................. 39 BIBLIOGRAFIA............................................................................ 41 ÍNDICE........................................................................................ 43

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho de pesquisa surgiu da preocupação com o repensar

o processo de ensino nas séries iniciais. Atualmente, temos em nossas

instituições de ensino, alunos com diferentes níveis de desenvolvimento, de

dificuldades e de aprendizagens, independente da série em que estão

inseridos.

É no seio do processo de construção e apropriação do conhecimento

que a criança desenvolve as possibilidades para transformar o objeto e utilizá-

lo de acordo com as experiências vividas e com suas necessidades.

Sem a brincadeira fica tedioso, para a criança, o processo de

aprendizagem. É necessário que a construção se faça a partir do brincar, do

jogo, da imaginação, do conhecimento do próprio corpo e do respeito mútuo.

Discutir a importância das brincadeiras no desenvolvimento infantil, nos

traz a percepção de que o quanto o mundo atual está distanciando a sociedade

dos seus costumes, dos seus valores culturais, morais e sociais, que eram

passados de geração em geração desde os tempos mais antigos, como as

brincadeiras, o contar de lendas, as cantigas de roda e de ninar.

As transformações políticas, sociais, econômicas e culturais, embora

necessárias, diminuíram o convívio dos pais com seus filhos em decorrência da

luta pela sobrevivência, pois muitos precisam se ausentar de casa para

trabalhar, deixando assim suas crianças em creches, com vizinhos, ou ainda

em casa, aos cuidados de irmão não muito maior. A ausência da família causa

falta de referência afetiva, familiar e de valores, ficando a escola responsável

indiretamente por substituir o papel da família, tendo de ensinar muito além dos

conteúdos que são prescritos no Currículo.

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Sendo assim, a ludicidade, o uso de jogos e brincadeiras, na educação

de alunos nas séries iniciais, se torna um ótimo recurso a ser utilizado como

facilitador desenvolvimento, e principalmente, para a superação de muitas

dificuldades que surgem durante o processo de ensino e aprendizagem do

educando.

A importância das brincadeiras, do lúdico nas séries iniciais, será

abordada como tema fundamental para oferecer uma aprendizagem prazerosa

e significativa, para todos os envolvidos no processo de ensino-aprendizagem.

Seremos conduzidos a refletir que, as brincadeiras em grupo, os jogos

cooperativos, entre tantas outras atividades lúdicas, promovem o

desenvolvimento cognitivo, afetivo, intelectual e social das crianças que estão

inseridas nesse tipo de atividade.

Esta pesquisa bibliográfica sugere um repensar sobre o lúdico nas

séries iniciais, pois irá apresentar fundamentações teóricas sobre o tema, e

abordar autores que tanto defenderam e defendem o lúdico nas escolas. Ou

seja, o presente trabalho irá vislumbrar o lúdico e seus benefícios sociais e

cognitivos a serem utilizados nas séries iniciais do ensino fundamental.

Espero, portanto, que a clareza das idéias transcritas depois de

dedicados estudos sobre o tema, possibilite reflexões ao leitor, com o intuito de

enriquecer e dinamizar o processo de ensino e aprendizagem, contribuindo

positivamente para a educação infantil.

No primeiro capítulo, serão apresentadas considerações sobre como a

criança se desenvolve, como se dá para ela, a percepção do mundo antes

ainda da linguagem, preparando-a para o lúdico, para o brincar. E, explicará

brevemente, as fases do desenvolvimento do esquema corporal, segundo Le

Boulch (apud OLIVEIRA,1992)que são: corpo vivido, corpo percebido e corpo

representado.

O capítulo segundo, irá ressaltar como o brincar se inicia na vida da

criança, e aborda as fases do desenvolvimento moral da criança segundo

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Piaget: anomia, heteronomia e autonomia. O capítulo nos trará exemplos de

como o brincar está presente na vida de cada indivíduo e ainda ressalta que,

para a criança, o brincar é quase e/ou sempre levado a sério.

O terceiro capítulo deste trabalho de pesquisa irá abordar conceitos

adquiridos e/ou consolidados após pesquisa de obras dos autores aqui

referenciados. Mostrar-nos-á, segundo alguns educadores, a importância de o

lúdico está inserido nas escolas como facilitador da aprendizagem nas séries

iniciais.

No quarto capítulo serão abordadas as contribuições de alguns

educadores para a utilização do brincar como facilitador da aprendizagem nas

escolas, levando-nos à reflexão sobre o quanto o brincar é importante.

Após a leitura deste trabalho acadêmico seremos levados a concordar

com Corrie e Foster(1975) quando enfatizam que:

“As crianças experimentam e simbolizam o mundo real, físico, por meio do seu brincar e da arte. Em ambos os canais de expressão, as experiências passadas são repetidas e revividas. Desta maneira, podemos relacionar o nosso mundo externo ao nosso mundo interno de experiências passadas e conhecimento, organização mental e poder interpretativo. Podemos vincular experiências novas e experiências antigas e desta maneira as nossas mentes absorvem novas informações e se expandem.” ( apud Moyles, 2002, p. 83)

E chegaremos à conclusão de que o lúdico precisa estar presente em

todas as etapas do processo de ensino e aprendizagem nas séries iniciais da

educação infantil.

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CAPÍTULO I

O DESENVOLVIMENTO DO CORPO E A PSICOMOTRICIDADE:

Uma preparação para o lúdico.

A principal característica das atividades propostas nas séries iniciais é a

preocupação com o desenvolvimento da psicomotricidade, ou seja, colocar o

corpo e a mente em sintonia.

Para entender o quanto às atividades lúdicas facilitam a aprendizagem,

faz-se necessário a compreensão de como o corpo se desenvolve, ou melhor,

de como ele reage aos estímulos externos e internos durante seu

desenvolvimento.

É pelo corpo e com o corpo, que o ser humano percebe-se e percebe os

objetos que o cercam. Quanto mais conhecimento do próprio corpo tiver,

maiores serão as possibilidades da criança em perceber, diferenciar e sentir o

mundo ao seu redor. É pela interação com os objetos que se vai estabelecendo

as relações afetivas e emocionais com o seu meio.

É importante ressaltar que corpo e organismo possuem aqui, um

significado diferenciado, o corpo adquire agora, expressão de individualidade,

por onde é possível expressar emoções e estados interiores. “Assim como em

todo processo da aprendizagem estão implicados os quatro níveis organismo,

corpo, inteligência, desejo, e não se poderia falar de aprendizagem excluindo

alguns deles.” (FERNANDEZ, 1990, p. 54).

Logo, o organismo é uma das partes que compõem o corpo, ele

coordena e controla as sensações, é a parte biológica que nos dá a

possibilidade da visão, da audição, do olfato, do tato e dos movimentos. É a

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vida programada e as sensações que sentimos quando reagimos aos

estímulos.

Fernandez (1990, p. 57) citando Pain nos diz que:

“Existe diferença entre organismo e corpo; para ela organismo poderia ser comparado a um aparelho de recepção programado, que possui transmissores (células nervosas) capazes de registrar certo tipo de associações, de fluxos elétricos, e reproduzi-los quando necessário.”

Nesse sentido, o corpo seria o mediador entre o organismo e o mundo.

Toda e qualquer aprendizagem é vivenciada, registrada, guardada e

memorizada pelo corpo. É com esta memória corporal que se torna possível

continuar aprendendo. Novas aprendizagens vão sendo conquistadas e

memorizadas pelo corpo através dos sentidos, dos movimentos, de percepções

e relações que se estabelecem todo o tempo, e que vão se integrando,

interagindo com aprendizagens anteriores e criando novas aprendizagens,

construindo conhecimentos.

O corpo é um instrumento de aprendizado, por meio dele a primeira

noção do mundo é formada. É com ele que se aprende a respirar, mamar,

chorar, rir e sentir os estímulos. É por meio do corpo que se vai construindo a

noção do objeto, e o objeto aqui é tudo que está fora do corpo, que é

manipulado, explorado. Provando e sentindo, o indivíduo vai mapeando o

corpo e suas sensações. Vai descobrindo-se.

É no movimento, necessidade vital essencial do ser humano, que a

noção de objeto se desenvolve, é através da ação motora, do brincar, do

fantasiar, que se chega à representação mental, que se desenvolve o

imaginário.

No movimento corporal é possível se descobrir, pois é pela ação do

corpo sobre os objetos que se consegue aprender as qualidades deste objeto e

descobrir o outro limitador, seja do meu espaço, seja de um companheiro de

descoberta.

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O corpo é um instrumento de comunicação e com ele é possível

comunicar-se, desenvolver uma linguagem. É pelo corpo e através do corpo

que o ser humano se comunica, recebe e envia mensagens, lê o mundo em

que vive.

Antes de a linguagem verbal aparecer no desenvolvimento do ser

humano, a linguagem não verbal já existe. Os sentidos tomam um significado

importante, é através deles que o corpo e o organismo humano colhem e

enviam informações para o meio em que o indivíduo esta inserido.

O ser humano começa a organizar o mundo a sua volta através do seu

corpo. Ele é ponto de partida e referência para todas as aprendizagens. É

sentindo e percebendo as coisas que o cerca que ele vai interagindo com o

meio, onde estabelece relações afetivas e emocionais com os objetos

circundantes, observando-os, provando-os e manipulando-os.

No processo de aprendizagem o uso do corpo sempre está presente. As

experiências que passamos ficam registradas no nosso corpo. E com o passar

do tempo novas relações serão estabelecidas e novas aprendizagens

construídas.

Começa-se a usar o corpo para aprender desde muito cedo, mas cedo

do que se costuma pensar. Antes de se chegar à escola, local destinado ao

conhecimento e cultuado pela sociedade como local de aprender, o processo

de aprendizagem já se iniciou. Uma das primeiras coisas que o ser humano

aprende a fazer, fora do útero, é a respirar. O uso do organismo aqui fica muito

claro.

Quando o bebê começa a perceber o jeito como lhe pegam, o cheiro de

quem o alimenta, a voz que a ele se dirige, ele pode começar a usar o seu

corpo para aprender: o toque, o cheiro, o som, o gosto e todo ambiente que o

cerca servem para mapear seu corpo ainda tão indefinido.

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Visca (1987, p.76), define as primeiras aquisições que o bebê faz como

Protoaprendizagem que para ele “... consiste na aprendizagem das primeiras

relações vinculares que se estruturam na criança, como resultado da interação

que se estabelece entre esta e sua mãe...”. Nos contatos com sua mãe, o bebê

vai estabelecendo suas primeiras discriminações e vínculos com o mundo

externo.

Kishimoto (citando Bruner, 2009, p.32) afirma que “as brincadeiras

infantis como esconder o rosto com a fralda estimulam a criatividade”. E

salienta ainda que, segundo Chomsky (ibidem),

“é a ação comunicativa que se desenrola entre mãe e filho, que

dá significado aos gestos e que permite à criança decodificar

contextos e aprender a falar. Ao descobrir as regras, nos

episódios altamente circunstanciados, a criança aprende ao

mesmo tempo a falar, a iniciar a brincadeira e alterá-la”.

Assim, podemos perceber que as primeiras aprendizagens corporais

começam quando o ser humano começa a provar o universo ao seu redor, e

ele o faz de maneira espetacular. É interessante reafirmar a importância dos

primeiros vínculos que o ser humano faz com a boca, como exemplo claro, as

suas primeiras mamadas e as relações que ele estabelece com quem as

administram, suas primeiras aprendizagens tem origem exatamente neste

momento, no início de seu processo de adaptação à vida fora do útero.

Um corpo organizado possibilita diversas formas de ação, sejam elas

psicomotoras, emocionais, cognitivas ou sociais. Lembramos que "O mamar é

ao mesmo tempo um ato de prazer e de conhecimento." (FERNANDEZ, 1990,

p. 74).

O esquema corporal é a noção de corpo que a criança tem do seu

próprio corpo, é a representação de suas experiências, de suas aprendizagens.

Já a imagem corporal é subjetiva, é simbólica, é marcada pelo desejo, é

inconsciente.

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O conceito de corpo não pode ser ensinado, não depende de

treinamento, ela vai se organizando na medida em que é usado. Quando a

criança consegue desenhar o seu corpo é por que ela já o tem internalizado, ou

seja, ela já possui uma imagem mental do seu corpo. Na medida em que

brinca, explora e usa o seu corpo ela vai elaborando uma memória corporal.

Para Oliveira (1992, p. 47), "... a criança tem uma representação gráfica

da imagem de si. Podemos inferir esta imagem através de seu desenho de

figura humana”. Quando desenha uma figura humana a criança o faz do modo

como ela o concebe, do modo como ela o percebe. Para ser interpretado, o

desenho de uma criança deve ser analisado não na sua imagem desenhada,

mas sim no modo como é revelado pelo diálogo analítico com a criança.

Oliveira (1992, p. 58), citando Le Boulch, diz que o esquema corporal passa por

três fases distintas.

Nessa primeira fase, tem-se o corpo vivido, que corresponde à fase

conhecida como sensório-motora de Piaget, começa nos primeiros meses de

vida, onde o bebê ainda não tem noção, consciência do "eu". Nesta fase ele se

confunde com o meio, se encontra em total simbiose e não é possível se

perceber. No início desta fase os movimentos são atividades motoras, não são

pensadas para serem executadas, pensa-se fazendo.

A criança quando nasce não tem noção do seu corpo. Seu

conhecimento de corpo vai sendo construído ao se tocar, ser acariciada ou

mesmo quando se machuca. Vai percebendo, sentindo, lendo o mundo com

seu corpo, vai aos poucos o organizando. Assim, a ação motora nos primeiros

anos de vida se torna extremamente importante para esta troca com o meio em

que vive.

Enquanto a criança brinca, ela observa seus pares, interage, se olha no

espelho, vai aprendendo. Pela experiência que é possível aprender, nesta fase

tem-se uma necessidade grande de movimento e é através dele que se vai

poder ampliar a experiência motora.

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Na segunda fase, o Corpo percebido corresponde à fase conhecida

como período pré-operatório de Piaget. Começa aproximadamente por volta

dos dois anos, onde a criança passa a perceber-se, onde se tem o início da

tomada de consciência do "eu". Nesta fase ela começa a se diferenciar do

meio. A criança começa se perceber de forma diferente, é onde ocorre a

organização corporal, momento em que se organiza o espaço levando em

conta o seu próprio corpo, ou seja, o espaço é determinado pela posição na

qual o corpo ocupa.

O corpo agora é o ponto de referência. A criança associa seu corpo aos

objetos do meio. Aqui a interiorização do corpo já se faz presente, já se

construiu uma imagem mental deste corpo, mas não está totalmente

desenvolvida e construída. A noção de tempo e espaço começam a ser

estruturadas nesta etapa. Os conceitos espaciais como perto, longe, em cima

ou embaixo começam a ser discriminados. Noções temporais aparecem e é

possível, agora, entender a duração dos intervalos de tempo, de ordem e

sucessão de acontecimentos.

Nesta fase ocorre um domínio corporal maior do que na fase anterior, já

é possível uma adequação de seus movimentos no espaço circundante. A

característica desta fase é que o mundo é organizado sobre o ponto de

referência bastante individualizado, a noção do "eu" está mais estruturada, é

uma fase onde o egocentrismo se faz presente.

Por fim, a etapa do Corpo representado corresponde à fase conhecida

como período operatório de Piaget. Começa aproximadamente por volta dos

sete anos quando a criança já tem noção do todo e das partes de seu corpo,

fala, usa e o desenha de forma elaborada, assume seus movimentos e os

controla. Locomove-se no espaço com autonomia e independência.

A representação mental da imagem de corpo no início desta etapa é

estática. Mais tarde, a imagem mental adquire movimento e a noção temporal

começa a estruturar-se. No final desta fase a criança já tem uma imagem de

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corpo operatória, ou seja, usa o corpo para efetuar e programar mentalmente

ações, isto é, o corpo é estruturado em pensamento e não precisa

necessariamente que a ação motora esteja presente. Ela programa, projeta,

imagina e executa com o pensamento a ação do corpo. O ponto de referência

já não é mais o próprio corpo. Como pode executar, é possível se orientar

agora por objetos exteriores a si, e os pontos de referência já podem ser

escolhidos.

Assim, é possível concluir que, quando existe um espaço onde o corpo

pode se manifestar em sua plenitude, com alegria e prazer, grandes

aprendizagens podem ocorrer, pois este será um espaço criador e acolhedor.

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CAPÍTULO II

O INÍCIO DO BRINCAR

Desde o nascimento, o ser humano vai passando por fases na busca de

construção do conhecimento. Como já foi dito anteriormente, a criança

aprende pelo corpo, é através dele se relaciona com o meio circundante.

É observando, olhando, conhecendo, tocando, manipulando e

experimentando que se vai construindo conhecimento. Neste jogo, o da busca

do conhecimento, onde se pode brincar, jogar e estabelecer um espaço e

tempo mágico, onde tudo é possível, há um espaço confiável, onde a

imaginação pode desenvolver-se de forma sadia, onde se pode viver entre o

real e o imaginário, este é o lugar e o tempo propício para crescer e produzir

conhecimento.

Para Fernandez (1990, p. 165), "O saber se constrói fazendo próprio o

conhecimento do outro, e a operação de fazer próprio o conhecimento do outro

só se pode fazer jogando”.

No começo, a brincadeira é bastante corporal e mais tarde tende a ser

mais objetiva passando à subjetividade no final. "O pensamento de interação

com o meio se amplia progressivamente e gradativamente da ação física à

representativa" (Oliveira, 1992, p. 22).

A mão na boca para a criança é ponto central para novas descobertas,

pois é por este movimento que se começa a delimitar a noção de objeto. Brinca

com seu polegar, com lençol, com fralda e assim vai descobrindo a realidade

que a cerca.

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Brincar é um espaço privilegiado, proporciona à criança, como sujeito, a

oportunidade de viver entre o princípio do prazer e o princípio da realidade.

Cabe ressaltar que a brincadeira não traz apenas prazer, também pode trazer

dor ou desconforto. É muito comum nessa fase, a criança se machucar

enquanto brinca, pois ainda está conhecendo os limites de seu corpo e do

espaço.

Brincando a criança vai, lentamente, estabelecendo vínculos, brinca com

os objetos externos e internos num processo de trocas intensas com a

realidade e com a fantasia. O brincar proporciona ao sujeito liberar o medo do

novo, do desconhecido. A criança brinca com o desconhecido para torná-lo

conhecido, brinca com o medo para que possa dominá-lo.

Brincar é uma ação que ocorre no campo da imaginação, assim, ao

brincar estar-se-á fazendo uso de uma linguagem simbólica, o que se faz

retirando da realidade coisas para serem significadas de forma abstrata em

outro espaço. Quando a criança pega uma peça de sucata e a imagina ser um

caminhão, ela está estabelecendo uma relação de imaginação e criação: está

recriando a realidade.

É na exploração do mundo, do meio ambiente, na manipulação dos

objetos e nas trocas com seus pares que a criança vai aprendendo, vai

buscando fora de si o conhecimento, para mais tarde poder internalizá-lo. É

nesta busca, nesta movimentação, que novos esquemas podem ser

assimilados, generalizados. O brincar permite que esta troca intensa entre o

que está dentro e o que está fora ocorra, pois a brincadeira não está nem

dentro, nem fora.

Ao brincar com o objeto a criança o vai percebendo suas diferentes

dimensões, descobre seus atributos, sua utilidade, classifica-o, podendo mais

tarde modificar suas estruturas. É através do brincar que a criança vai

descobrindo o que pode e o que não pode.

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A brincadeira contribui de forma espetacular para a construção da auto-

imagem positiva. Pode-se superar e ressignificar diferentes objetos

internalizados, assumindo novos papéis ou mesmo brincando com o já

caracterizado. Ao brincar, por exemplo, de casinha, a criança precisa conhecer

como é uma casa, quem são seus personagens. Ela interioriza modelos,

desempenha certa função social, condutas, estabelece vínculos, exercita a sua

autonomia, troca com seus pares, experimenta emoções, cria e recria, assume

papéis, seu corpo expressa a realidade externa, assume gestos e palavras da

pessoa que representa. Vive intensamente a sua realidade interna e externa.

Para brincar exercendo a capacidade de criar, é preciso um espaço rico

e diversificado. Taille (1992, p.49), citando Piaget, nos diz que o

desenvolvimento moral da criança se constitui de três fases. São elas: anomia,

heteronomia e autonomia.

A Anomia se caracteriza por brincadeiras individuais. As crianças

brincam com um grupo de amigos, porém individualmente. Apesar de estarem

no mesmo espaço físico não significa que estejam brincando juntas, cada uma

dessas crianças brinca consigo mesma. A brincadeira é com seus objetos

internos e sua visão de mundo é bastante egocêntrica: somente o seu ponto de

vista é percebido nesse momento.

Na fase da Heteronomia, as crianças aceitam as regras do jogo, aqui já

se brinca em grupo, porém, as regras do jogo não podem sofrer modificações

propostas pelos participantes do próprio grupo, as regras são vistas como

imutáveis, a criança ainda não se concebe com um criador de regras, percebe-

se mais como um executor, aquele que segue a regra. A regra, neste caso, é

percebida como algo sagrado.

No decorrer dessa fase, a criança vai mudando sua posição no que diz

respeito às regras. É muito comum criar regras próprias e não comunicar ao

parceiro a sua decisão, ela é uma regra pessoal, unilateral.

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“A criança heterônoma não assimilou ainda o sentido da existência de regras: não as concebe como necessárias para regular e harmonizar as ações de um grupo de jogadores e por isso não as segue à risca; e justamente por não as conceber desta forma, atribui-lhes uma origem totalmente estranha à atividade e aos membros do grupo.” (TAILLE, 1992, p. 30).

Nesta fase, a criança ainda percebe o mundo apenas do seu ponto de

vista, é conhecida como a fase egocêntrica, situa-se no estágio pré-operatório

que Piaget descreveu. Para estas crianças ainda é muito difícil abandonar o

seu ponto de vista para entender o outro, aqui, quando se está jogando, é

muito interessante observar que todos querem ganhar, e por isso as regras são

abandonadas para que se atinja o seu objetivo: Ganhar.

No final desta fase as crianças procuram seguir as regras com exatidão,

elas são cobradas uns dos outros e em situação de conflito se faz necessário a

presença de um adulto para servir de juiz.

Na fase da Autonomia, a criança já abandonou sua fase egocêntrica e

agora já começa entender o sentido social da regra: regular e harmonizar as

ações coletivas. Com o amadurecimento o sujeito já se vê como um legislador,

aceitando e acatando decisões coletivas. Assim, antes do jogo começar, as

regras são discutidas e aceitas e o jogo inicia-se tendo por base as regras

combinadas anteriormente.

Quando se joga com dados da realidade e da imaginação o ser humano

aprende a lidar com as imperfeições desta realidade e reorganizá-las. Assim,

entendemos que o jogo proporciona ao sujeito, ritmo, harmonia, ordem,

estética, tempo, espaço, tensão contraste, variação, solução equilíbrio e

cooperação.

As brincadeiras folclóricas são recursos lúdicos muito utilizados. A

brincadeira de trava língua nos permitem constatar o ritmo, a harmonia e ordem

existente. Como exemplo: Três pratos de trigo para três tigres tristes.

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É possível perceber, por meio de uma reflexão, que o processo lúdico

está muito presente em nossas vidas. O artista plástico brinca com as formas e

as cores em suas telas. Os jogos de adivinhações, ou mesmo brincadeiras do

tipo "o que é o que é?" possuem origem remota, mas ainda hoje exerce

tamanha fascinação nas pessoas que os utilizam.

O escritor brinca com sua narrativa e nos envolve em um mundo

fantasioso, ele brinca com a nossa imaginação. O músico com sua melodia,

brinca com o som, com o ritmo. O físico nuclear brinca e descobre a força do

átomo. O jogador de futebol brinca com a bola ao driblar seu adversário.

A dançarina brinca com o corpo e o embala com o ritmo da música,

explorando as possibilidades do espaço e do tempo, com ritmo, alegria e

harmonia. A criança brinca com seu corpo descobrindo suas possibilidades e

descobre-se assim, o tempo e o espaço. O bebê brinca com os seus primeiros

sons, com seu corpo, com o seio da mãe que o amamenta.

O jogo faz parte da cultura de um povo, em achados arqueológicos,

brinquedos de madeira, como o pião, foram encontrados. Brincar é inerente

ao ser humano. Brinca-se com jogos de cartas, com dados, com dominó, com

jogo da memória, com jogos de tabuleiros, com jogos de imagem, brinca-se

com jogos de palavras, de adivinhações. Brinca-se com o corpo, com a

destreza física, a rapidez do raciocínio, joga-se com estratégias, com sorte,

com organização. O ser humano joga e brinca durante toda a sua vida.

Ao jogar uma partida de qualquer jogo podem-se observar as operações

requeridas do sujeito. É importante observar que nos jogos e na vida, no dia a

dia, as mesmas operações são requisitadas, assim ao jogar, o sujeito exercita-

se cognitivamente, socialmente e afetivamente, pois o seu desejo de jogar é

determinante para que o possa fazer. O ato jogar, não implica apenas a

questão de regra, da competição, da brincadeira em si. O jogo envolve muito

mais: ele modifica a forma como se vê e entende o meio em que se está

inserido, a sociedade.

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O olhar psicopedagógico sobre o sujeito que brinca se liga às

modalidades de sua atuação, levando em conta a forma de utilização de sua

inteligência. É preciso que o educador atento aos tipos de valores que se

pretende passar para a criança. Pois, no ato de brincar, segundo Fernandes

(2001, p. 82) “a criança é introduzida nas experiências sócios culturais e

imaginários dos outros que pode ser o adulto, mas também outra criança e,

desse modo, assimila, apropria-se e recria conhecimentos e significados do

contexto social em que vive”.

Sendo assim, Independente de época, cultura e classe social, os jogos e

os brinquedos fazem parte da vida da criança, pois elas vivem num mundo de

fantasia, de encantamento, de alegria, de sonhos, onde realidade e faz-de-

conta se misturam.

2.1 – Quando o brincar é levado a sério

A brincadeira para a criança não representa o mesmo que o jogo e o

divertimento para o adulto, recreação, ocupação do tempo livre, afastamento

da realidade. Brincar não é ficar sem fazer nada, como pensam alguns adultos.

É necessário estar atento a esse caráter sério do ato de brincar, pois, para a

criança, esse é o seu trabalho, atividade através da qual ela desenvolve

potencialidades, descobre papéis sociais, limites, experimenta novas

habilidades, forma um novo conceito de si mesma, aprende a viver e avança

para novas etapas de domínio do mundo que a cerca.

A criança se empenha durante horas em suas atividades do brincar da

mesma maneira que se esforça para aprender a andar, a falar, a comer, etc.

Brincar de faz-de-conta, de amarelinha, de roda, de esconde-esconde, de

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dominó, entre tantas brincadeiras, são situações que vão sendo

gradativamente substituídas por outras, à medida que o interesse é transferido

para diferentes tipos de jogos, no entanto todos eles são tratados com a

seriedade respectiva.

Segundo Chatear (1987) uma criança, em seus primeiros anos de vida,

gosta sempre de “fazer-se de boba”, de divertir-se, mas conhece perfeitamente

a diferença entre “fazer-se de boba” e brincar/ jogar. Percebe-se isso quando

ela chega às vezes a nos dizer “agora eu não estou brincando, estou falando

sério”, isto demonstra claramente a sua capacidade de diferenciar o brincar de

“fazer-se de boba”, da seriedade do seu jogo. (apud Kishimoto, 2009)

Ao observarmos atentamente crianças brincando de cantor, fazendo

uma massa de areia, edificando com cubos, brincando de polícia e ladrão,

brincando de casinha com papai, mamãe e filhinha (o), brincando de “dar aula”;

o primeiro aspecto que nos chamará a atenção será a seriedade com que ela o

faz, incorpora o papel de corpo e alma e é tão consumida em tudo isso quanto

nós em nossas pesquisas mais sérias.

A seriedade com que as crianças lidam com as regras criadas para

esses jogos, que quase sempre são regras rígidas, levam-na até mesmo ao

cansaço. Além do mais, as crianças detestam ser interrompidas em suas

brincadeiras e não admitem zombarias, se isso acontece, reagem quase

sempre ignorando a interrupção, às vezes irritadas ou até mesmo agressivas.

Podemos perceber então, que esta atividade, não é mero divertimento, é muito

mais.

Isso tudo acontece, porque nos seus primeiros anos de vida, a criança

pode chegar, segundo Chateau (1987, p.20), “a absorver-se tão bem no seu

papel que ela se identifica momentaneamente com a personagem que

representa”. Neste caso, a criança que joga não percebe o mundo a sua volta,

como um jogador de futebol num campo, mas mergulha fundo em seu jogo,

porque para ela o jogo é coisa séria.

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Essa seriedade do jogo infantil é, entretanto, diferente daquela que

consideramos, por objeção ao jogo, a vida séria. Essa seriedade do jogo

implica um afastamento do ambiente real, a criança parece esquecer o real e

se torna o personagem em questão, o médico, a polícia, o ladrão, o pai, a mãe,

o filho, o professor, etc. Ela realmente vive o que fantasia, o que imagina ser ou

viver.

Portanto, brincar é um trabalho para a criança, um ato muito sério. E, por

meio de suas conquistas no jogo, ela afirma seu ser, proclama seu poder e sua

autonomia, explora o mundo, faz pequenos ensaios, compreende e assimila

gradativamente suas regras e padrões, absorve esse mundo em doses

pequenas e toleráveis.

Dessa forma, nenhuma criança brinca só para passar o tempo, sua

escolha é motivada por processos íntimos, desejos, problemas, ansiedades. O

que está acontecendo com a mente da criança determina sua atividade lúdica;

brincar é sua linguagem secreta, e deve ser respeitada pelo adulto, mesmo que

este não a entenda. Então se faz necessário que o professor/educador fique

atento, para oferecer possibilidades e situações de jogos e brincadeiras. É

imprescindível que as salas de aula sejam repletas de atividades lúdicas, para

que a criança tenha a oportunidade de provar a sua superioridade, de

expressar-se, de evadir-se do mundo real, de ser séria no seu pequeno mundo

lúdico.

Mas, apesar do jogo ser uma atividade espontânea nas crianças, isso

não significa que o professor/educador não necessite ter uma atitude ativa

sobre ela, inclusive uma atitude de observação e de intervenção quando for o

caso. A atitude do educador não passará apenas por deixar as crianças

brincarem, mas, sobretudo, ajudá-las nesse ato, compartilhar com elas, e até

mesmo ensiná-las a brincar, se for preciso.

Antes de iniciar um jogo, mesmo que ele já seja muito conhecido pelas

crianças, elas sentem necessidade de fixarem regras, pois crianças que

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eventualmente o aprenderam em outros lugares, podem praticá-lo de forma

diferente. Além disso, o ato de formular regras parece ter uma significação

altamente positiva para a criança. Sendo assim, a escola precisa se organizar

cada vez mais, proporcionando ambientes que permitam às crianças se

tornarem agentes de sua própria aprendizagem.

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CAPÍTULO III

BREVES CONCEITOS SOBRE O LÚDICO

Atualmente, não é difícil observar nos alunos das séries iniciais, e

também em alguns professores que atuam nestas séries, o desinteresse ou

desconhecimento pelas brincadeiras em grupo, pela cooperação, pelas antigas

cantigas que tanto alegraram as crianças do passado.

O desejo pelo consumo desenfreado de recursos tecnológicos como o

videogame e MP3, dentre outros, tem gerado a adoção de brincadeiras

individuais ou agressivas, distanciando, muitas vezes, a criança do convívio

com seus colegas e familiares.

Resgatar o lúdico como um recurso de apoio estimulador do

conhecimento é de suma importância no processo de ensino e aprendizagem.

Portanto vale ressaltar os seguintes conceitos formulados durante este trabalho

de pesquisa.

As atividades lúdicas são aquelas que permitem que a criança

vivencie sua inteireza e sua autonomia em um tempo e espaço próprio,

particular. Por meio das atividades lúdicas a criança forma conceitos, seleciona

idéias, estabelece relações lógicas, integra percepções, faz estimativas

compatíveis com o seu crescimento físico e desenvolvimento e, o que é mais

importante, vai se socializando.

Brincar é o meio pelo quais os seres humanos, principalmente as

crianças, exploram uma variedade de experiências em diferentes situações e

com diferentes propósitos. É importante salientar que o brincar não se constitui

em perda de tempo nem é, simplesmente, uma forma de preenchê-lo. A

criança que não tem oportunidade de brincar, sente-se deslocada.

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Brinquedo é um objeto usado no ato do brincar. Os brinquedos

permitem às crianças ( ou a quem os usa) divertirem-se enquanto pode-se

proporcionar, ao mesmo tempo, aprendizagem, desenvolvimento, lazer e

prazer.

Para Kishimoto (2009, p.18-19),

“o brinquedo supõe uma relação íntima com a criança e uma indeterminação quanto ao uso, ou seja, a ausência de um sistema de regras que organizam sua utilização. O brinquedo propõe um mundo imaginário da criança e do adulto, criador do objeto lúdico”. Ela acrescenta ainda que, “uma boneca permite à criança várias formas de brincadeiras, desde a manipulação até a realização de brincadeiras como mamãe e filhinha”.

Podemos concluir, então, que o brinquedo possibilita o desenvolvimento

integral da criança, já que provoca a afetividade, o conviver socialmente e

opera mentalmente diferentes situações problemas. Tudo isso ocorre de

maneira envolvente, sendo que a criança despende energia, imagina, constrói

normas e cria alternativas para resolver imprevistos que surgem no ato de

brincar.

Brincadeira é a estrutura ligada às características da infância, que a

criança desenvolve para seu prazer e recreação e meio pelo qual também se

aprende. Para Vygotsky ( apud Wajskop, 1998, p. 16) “ a brincadeira infantil é

entendida como atividade social da criança, cuja natureza e origem especificas

são elementos fundamentais para a construção de sua personalidade e

compreensão da realidade na qual se insere”.

Jogo de regra é uma atividade física ou mental sujeita a regras que

definem perda ou ganho, estimulando as competências e habilidades. É um

excelente instrumento a ser usado para a aprendizagem de regras sociais.

Jogo simbólico é a representação corporal do imaginário, onde a

criança usa o faz-de-conta para desempenhar vários papéis.

Por fim, jogo para a criança é antes de tudo, uma brincadeira. Mas é,

também, uma atividade séria de faz-de-conta. As estruturas ilusórias, o

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geometrismo infantil e a alegria têm uma importância considerável nesse

processo de desenvolvimento. O surgimento do verdadeiro comportamento

lúdico está ligado ao despertar da personalidade. Assim, o estudo dos jogos

nos oferece um verdadeiro laboratório de observações, meio pelo qual

podemos ter uma visão global da infância.

3.1 - O lúdico nas escolas em séries iniciais

O brincar é sem dúvida um processo pelo quais os indivíduos,

principalmente as crianças, vivenciam uma infinidade de experiências em

diferentes situações e com diversos objetivos.

Depois da necessidade de afeto, de ser aceita, nenhuma outra é tão

intensa, na criança como a necessidade do brincar, do interagir com o outro e

com meio em que vive. Por meio deles, desenvolvem-se a espontaneidade, a

inteligência, a linguagem, a coordenação, o autocontrole, o prazer de realizar

algo, a autoconfiança. O brincar é a via para a criança experimentar, organizar

e estruturar suas experiências desenvolvendo competências para construir aos

poucos a sua própria personalidade.

Segundo Moyles (2001.p.181), “na escola, o brincar pode ser dirigido,

livre ou exploratório: o essencial é que ele faça a criança avançar do ponto em

que está no momento em sua aprendizagem, criando condições para a

ampliação e revisão de seus conhecimentos”, nesse sentido, o lúdico torna-se

um ótimo recurso a se usar na promoção do desenvolvimento da criança, pois

no brincar não se aprende somente conteúdos, mas se aprende a viver, a

interagir com o ambiente e o mundo.

Por meio da ludicidade as crianças criam, constroem sua inteligência e

facilitam o próprio amadurecimento social. No brincar, a criança exterioriza

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seus anseios e imita o mundo dos adultos e, por meio deste comportamento,

ela consegue aproximar-se do processo de conscientização sobre a

responsabilidade, tanto de sua conduta quanto do seu desenvolvimento social,

do respeito ao próximo.

Santos (1999, p 56) cita que:

“Os recentes estudos tem mostrado que as atividades lúdicas são ferramentas indispensáveis no desenvolvimento infantil, porque para a criança não há atividade mais completa do que o brincar. Pela brincadeira, a criança é introduzida no meio sociocultural, e constituindo-se num modelo de assimilação e recriação da realidade”.

Portanto, o lúdico é importante para a criança em todas as faixas etárias.

Marcellino (1989, p.72), confirma que “é fundamental que se assegure à

criança o tempo e espaço para que o lúdico seja vivenciado com intensidade

capaz de formar a base sólida da criatividade e da participação cultural e,

sobretudo, para o exercício do prazer de viver”. Viver o presente na condição

de ser criança é vivenciar a brincadeira, contudo, esta vem sendo cada vez

mais esquecida e abandonada tanto pelos pais quanto pelas instituições

escolares.

Prado (1999, p.121) esclarece que:

“É preciso reconhecer a criatividade e complexidade em que as crianças constroem suas interações e reconhecer o direito dessas à própria infância e a brincadeira livre, espontânea, em que as mesmas não só imitam ou reproduzem aquilo que aprendam ou vivenciaram, mas também criam, alargam condensam, intensificam e conduzem para novos caminhos e novos significados”.

É importante perceber que o brincar ajuda os participantes a

desenvolver confiança em si mesmo e em suas capacidades. As oportunidades

de explorar conceitos como liberdade, existem explicitamente em situações

lúdicas, levando assim ao desenvolvimento da autonomia. Para isso a criança

precisa estar envolvida no ato de brincar para poder organizar suas idéias e,

assim, exteriorizar seus mais profundos sentimentos. Nesse sentido, para

Machado (1994, p.37), “o brincar é um grande canal para o aprendizado, senão

o único canal para os verdadeiros processos cognitivos”.

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Assim, cabe à escola, como instituição social, estar atenta, visando

proporcionar às crianças um espaço para brincar e desenvolver-se.

Principalmente, observando-se que nos dias atuais, devido às mudanças

sofridas na sociedade, a infância vem perdendo seu espaço e

conseqüentemente acontece um processo de abandono das brincadeiras que

são substituídas por outras atividades, tais como: assistir televisão, utilizar

jogos em computadores ou videogames como forma de preencher o tempo em

que ficam sozinhas em casa.

“A televisão transformou a vida e a cultura da criança, as referências de

que ela dispõe. Ela influenciou, particularmente, sua cultura

lúdica”(BROUGÉRE, 1995, p.50). Hoje, podemos observar que muitas famílias

utilizam os meios eletrônicos como uma babá digital, ou seja, crianças passam

horas entretidas frente aos microcomputadores ou reprodutores de vídeo,

enquanto seus cuidadores se ocupam de outros afazeres.

Na sociedade atual as crianças já não brincam fora da escola como

antigamente, quando era comum o subir em árvores, o nadar nos rios, o colher

frutas (no pé), o brincar com os vizinhos, o andar pelas ruas com os colegas

brincando de pião ou soltando pipa, entre outros. Hoje, o brincar é mais isolado

no lar, por isso cabe à escola uma função muito importante: a de promover o

brincar na escola como forma de desenvolvimento e aprendizagem.

O brincar na escola estimula uma aprendizagem diferente e

interessante, motiva e dá prazer, e ainda tem como conseqüência o

desenvolvimento da criança em sua totalidade. Nesse sentido, o papel do

professor é o de garantir que, no contexto escolar, a aprendizagem seja

contínua e inclua fatores além dos puramente intelectuais, como o social, o

emocional, o físico, o estético o ético e o moral que devem combinar-se com o

intelectual para tornar a aprendizagem mais abrangente e formadora.

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Assim, o lúdico, em situações educacionais, proporciona não só um

meio real de aprendizagem como permite, também, que adultos perceptivos e

competentes aprendam sobre as crianças e suas necessidades. No contexto

escolar, isso significa professores capazes de compreender onde as crianças

estão em sua aprendizagem e desenvolvimento geral, o que por sua vez, dá

aos educadores um ponto de partida para promover novas aprendizagens nos

domínios cognitivo e afetivo, para a construção de saberes significativos.

Kamii e Devries (1991, p.28) nos mostram que, como ferramenta de

ensino e aprendizagem,

“o construtivismo enfatiza a importância não somente de a criança descobrir as respostas da sua maneira, mas também de levantar as próprias perguntas. Começar o trabalho partindo das perguntas da própria criança assegura ao professor o inicio do processo de aprendizagem construtivista partindo do ponto onde a criança está ao invés de começar por onde o professor está”.

Sendo assim, o lúdico na escola é uma ferramenta indispensável para

auxiliar a busca por novas descobertas. Um recurso em que a criança possa

criar e recriar constantemente idéias e imagens que lhe permitam representar,

entender a si mesma e ao outro e refletindo sobre suas idéias e sobre a

realidade em que vive.

As atividades lúdicas são fundamentais para o desenvolvimento da

criatividade. Crianças que vivem a fantasia e o brincar de boa qualidade

livremente, são consideradas grandes fantasistas e passam grande tempo

imersas em pensamentos imaginativos. E, segundo muitos educadores que

defendem o lúdico no processo de ensino aprendizagem, crianças criativas têm

melhor concentração, são geralmente menos agressivas, contam e escrevem

histórias mais originais, interessantes e com personagens mais complexos e

também tendem a gostar mais do que fazem, aprendendo melhor.

Sendo assim, para ser criativa, a criança precisa brincar e o brincar

precisa ser estimulado com vigor no ambiente escolar, deve estar inserido em

todo o processo de ensino e aprendizagem.

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CAPÍTULO IV

IMPORTANTES CONTRIBUIÇÔES DE EDUCADORES, SOBRE O USO

LÚDICO, NA EDUCAÇÃO INFANTIL.

Quando se fala em educação infantil, em psicopedagogia e,

principalmente, no uso do lúdico como facilitador do processo de

desenvolvimento e aprendizagem das crianças nas séries iniciais do ensino

fundamental, torna-se imprescindível citar as contribuições de alguns

educadores nesse processo de evolução do ensino na educação básica

favorecendo a evolução infantil em sua totalidade.

Dentre muitos educadores, cabe ressaltar que: Froebel (apud

ARCE,2002), foi o primeiro educador a utilizar o brinquedo, como atividade na

escola. Ele idealizou recursos sistematizados para as crianças se expressarem,

dando a esses recursos o nome de “dons”. Pois, para Froebel, esses recursos

eram oferecidos por Deus para que as necessidades infantis fossem bem

desenvolvidas. Os chamados “dons” eram: a bola, o cubo e o cilindro.

Froebel foi pioneiro, ao reconhecer no jogo a atividade pela qual a

criança expressa sua visão de mundo. Para ele, o jogo seria também a

principal fonte do desenvolvimento na primeira infância. Período esse que, na

visão de Froebel, é o mais importante da vida humana, pois constitui a fonte de

tudo o que caracteriza o indivíduo. Por isso, ele considera a brincadeira uma

atividade séria e importante para quem deseja realmente compreender e

conhecer uma criança. (ibidem)

No período da meninice, entre seis e dez anos aproximadamente, os

brinquedos possuem uma característica mais intencional porque contribuem

para a formação das qualidades, dos valores morais e sociais, conceito este,

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defendido por Froebel. Ele observava a maneira de agir das crianças e chegou

à conclusão de que elas se valiam de símbolos na hora do brincar. (ibidem)

Para Blow, “Froebel concebe o brincar como atividade livre e

espontânea, responsável pelo desenvolvimento físico, moral, cognitivo, e os

dons, ou brinquedos, objetos que subsidiam atividades infantis” (apud

Kishimoto, 2007).

Vygotsky, também defende as atividades lúdicas no processo de ensino

aprendizagem, para ele, quando a criança brinca, ela realiza uma ação

imaginária onde existem sempre regras nas brincadeiras. Segundo ele, a partir

do momento em que existe uma situação imaginária, esta tem regras de

comportamento que são representadas durante as brincadeiras e o faz-de-

conta. ( apud BAQUERO,2001)

“Ao brincar de faz-de-conta, as crianças buscam imitar,

imaginar, representar e comunicar-se de uma forma específica

que uma pode ser outra, que uma pessoa pode ser um

personagem, que uma criança pode ser um objeto ou um

animal, que um lugar de faz de conta é outro” ( PCN, MEC,

2001,v.2, p.28)

Vygotsky desenvolveu a teoria histórica e cultural, dando ênfase aos

processos de trocas. Nesse processo, o conhecimento é construído a partir de

interações com os outros e com o meio social e cultural. Para ele o sujeito não

é ativo nem passivo, mas interativo. Segundo ele, o brinquedo possui enorme

influência no desenvolvimento de uma criança. (ibidem)

Segundo Vygotsky, a criança vivencia a experiência no brinquedo como

se ela fosse maior do que é, na realidade, fator de grande importância no seu

desenvolvimento. Brincando, a criança elabora hipóteses para a resolução dos

problemas e toma atitudes além do comportamento habitual de sua idade.

(ibidem)

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O conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal, criado por Vygotsky,

é de grande valia nos processos de ensino aprendizagem por meio da

ludicidade. Esse conceito relaciona a diferença entre o que a criança consegue

realizar sozinha e aquilo que, embora ela não consiga realizar sozinha, é capaz

de aprender a fazer com a ajuda de uma pessoa mais experiente, como um

adulto, o professor, ou um colega com mais facilidade no aprendizado. (ibidem)

Ou seja, a Zona de Desenvolvimento Proximal é tudo que a criança

pode adquirir em termos cognitivos, afetivos e sociais entre outros, quando lhe

é oferecido o suporte educacional adequado ao conhecimento que ela já

possui.

Sendo assim, as brincadeiras oferecidas às crianças nas escolas,

devem estar de acordo com a Zona de Desenvolvimento Proximal em que elas

se encontram. Pode-se perceber, então, a necessidade do professor conhecer

a teoria sócio-histórica de Vygotsky para bem utilizá-la.

Piaget se dedicou ao estudo do desenvolvimento cognitivo das crianças,

idealizou dois conceitos básicos na construção do pensamento infantil,

principalmente no que se refere à adaptação da criança a sua realidade: a

assimilação e a acomodação. Segundo ele, a assimilação é o processo de

incorporação de novas experiências ou informações que chegam à criança. Já

a acomodação é o processo de modificação de suas idéias ou estratégias em

função de uma nova experiência.

Nos processos de assimilação e de acomodação da aprendizagem, que

ocorrem concomitantemente, podemos considerar a atividade lúdica como uma

ferramenta integradora no desenvolvimento do conhecimento, que permite a

criança expressar-se e compreender o mundo no qual ela terá de se inserir ou

já está inserida.

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Piaget reconhece o brinquedo como um instrumento que favorece o

desenvolvimento físico, cognitivo, afetivo e social principalmente no nos

períodos sensório-motor e pré-operatório, onde ele diz que “agindo sobre os

objetos, as crianças, desde pequenas, estruturam seu espaço e o seu tempo,

desenvolvem a noção de causalidade, chegando à representação e,

finalmente, à lógica”. (apud Kishimoto,1996, p.95).

Desse modo, deve-se então respeitar o interesse do aluno e trabalhar a

partir da sua espontaneidade, formulando os desafios necessários à sua

capacidade e acompanhando seu processo de construção do conhecimento.

Para esse autor, também é a representação em atos, através do jogo

simbólico, a primeira possibilidade de pensamento propriamente dito,

marcando a passagem de uma inteligência sensório-motora, para uma

inteligência representativa pré–operatória.

Assim, podemos considerar que o brincar é uma forma importante de

intervenção no campo da saúde mental, contribuindo de maneira significativa

para o desenvolvimento da cognição, da linguagem, da área motora e da área

social da criança. Com isso, a ação pedagógica possibilitará a interação com

outras crianças, além dos adultos, já que, ao interagir com os seus pares, a

criança tem o seu ponto de vista confrontado com os de outras e,

principalmente em situações discordantes, se sentirá motivada a rever sua

idéia e a argumentá-la.

Este conflito, dará ao educando a oportunidade para que ele reflita,

discuta e se posicione, exercitando a sua autonomia, seu senso crítico e a

formação de valores como solidariedade e cooperação, tão necessárias à vida

atual.

Para Piaget, os jogos (o brincar) tornam-se mais significativos na medida

em que a criança se desenvolve, pois a partir da livre manipulação de materiais

variados ela passa a reconstruir objetos e reinventar significados para os

mesmos.

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Durante séculos, jogos como o xadrez oferece desafios aos jogadores.

Muitos autores afirmam que o jogar está na essência do brincar. Assim, os

problemas também podem ser apresentados às crianças por meio de jogos.

Segundo Piaget (1967), “o jogo não pode ser visto apenas como divertimento

ou brincadeira para desgastar energia, pois ele favorece o desenvolvimento

físico, cognitivo, afetivo, social e moral.”

Alessandra Arce, em seu livro Friedrich Froebel: o pedagogo dos

jardins de infância ( 2002, p.60 e 61), salienta que:

“Froebel cristalizou importantes concepções a respeito do jogo, como por exemplo: ele observou que o jogo só funciona se as regras são bem entendidas, a continuação do jogo requer sempre a introdução de novos materiais e idéias, por isso existem muitas ocasiões em que o adulto deve brincar junto com a criança para auxiliá-la e manter o interesse vivo”.

Por meio de atividades lúdicas e do jogo, a criança forma conceitos,

seleciona idéias, estabelece relações lógicas, integra percepções, faz

estimativas compatíveis com o seu crescimento físico e desenvolvimento e o

que é mais importante, vai se socializando.

Kishimoto (1996, p.138) salienta que, “... se o professor souber observar

e intervir a partir da lógica da atividade lúdica infantil, descobrirá explorações

possíveis, para se obter melhor aproveitamento do brinquedo como mediador

das brincadeiras”, e é claro, de aprendizagens significativas para as crianças.

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CONCLUSÃO

Por fim, diiversos autores tratam o lúdico na infância sobre aspectos e

enfoques diferentes: Moyles (2001) analisa o lúdico sob o enfoque educacional,

salientando assim o valor da ludicidade para a aprendizagem e formação

integral do aluno. Cury (2004) salienta o uso dos jogos no ensino de

Matemática, favorecendo o desenvolvimento cognitivo. Santos (1999) trata do

trabalho com o lúdico principalmente em locais organizados e preparados para

tais atividades, como nas brinquedotecas. Para ela o brincar é uma atividade

espontânea e deve ser respeitada como tal.

No entanto, a grande preocupação de todos os envolvidos com o

processo de educar é que o aluno se desenvolva em sua totalidade. Que ele

possa ir além de suas limitações, tornando-se assim um ser crítico e consciente

da sociedade em que está inserido.

Nesse sentido o papel da escola é muito importante. É preciso que a

escola auxilie os professores que ainda encontram dificuldades em utilizar a

brincadeira como uma ferramenta pedagógica que estimula e propicia a

aprendizagem. O educador precisa estar atento a que, em muitos lares, para

as crianças, o lúdico acaba muito cedo, ou inexiste, devido às condições

precárias de sobrevivência em que vivem. E cabe, portanto, ao professor,

promover esse momento durante o processo do ensinar.

Quanto à escola, Prado (1999, p. 144) afirma que:

“a organização de uma sala de aula infantil deve-se levar em conta que este deve ser espaço de vida, deve propiciar espaço para brincar, que adultos e crianças possam vivenciar, experimentar, sentir, conhecer, explorar toda a riqueza em que esta atividade encerra, entre fantasias e histórias, danças, músicas, transgressões, imprevistos, sociabilidade, invenções, convites a brincadeira e outras manifestações e expressões culturais de crianças pequeninas”.

Ou seja, o objetivo maior da instituição de ensino é promover a troca e

interação entre crianças, entre elas e os adultos, propor a observação, a

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brincadeira, o jogo e a produção cultural, permitindo, portanto, que a criança

interaja com esse ambiente podendo planejá-lo e reorganizá-lo se for preciso.

Atualmente a abordagem lúdica na educação constitui um paradigma,

tendo em vista que em nossa cultura permanece arraigada a dissociação do

lúdico e da aprendizagem, cedendo-se espaço á prioridade de conhecimentos

cognitivos prescritos no currículo básico do Ensino Fundamental, perdendo-se

assim toda a espontaneidade e autonomia de nossas crianças.

Por fim, se pensarmos que vivemos em uma sociedade em que as

famílias, inseridas no mercado de trabalho, não dispõem de tempo mínimo para

dedicarem-se aos filhos, não caberia á escola, como instituição social que é,

propiciar uma aprendizagem que valorize a formação integral do educando,

dando uma especial atenção ao espaço do lúdico no processo de

aprendizagem? Vale a pena refletir sobre esta questão.

Concluindo, torna-se necessário e urgente, que instituições e

educadores repensem o ato de ensinar, e resgatem, através do lúdico, o prazer

pelo aprender, proporcionando assim a fantasia, o cooperativismo, o respeito

ao próximo e ás suas diferenças, a experimentação, o dinamismo e tantos

outros aspectos e valores morais que contribuem para tornar o cidadão ciente

de sua realidade e apto a lutar pela transformação social e política da

sociedade em que está inserido.

Para finalizar, faço uso das palavras de um dos grandes poetas

brasileiros, que, brincando com as palavras, afirma que,

"brincar com crianças não é perder tempo, é ganhá-lo; se é

triste ver meninos sem escola, mais triste ainda é vê-los

sentados enfileirados em salas sem ar, com exercícios

estéreis, sem valor para a formação do homem”.

(ANDRADE apud Zacharias, 2009)

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ÍNDICE FOLHA DE ROSTO 02 AGRADECIMENTOS 03 DEDICATÓRIA 04 RESUMO 05 METODOLOGIA 06 EPÍGRAFE 07 SUMÁRIO 08 INTRODUÇÃO................................................................................. 09 CAPÍTULO I - O Desenvolvimento da Psicomotricidade: uma preparação

para o lúdico............................ 12

CAPÍTULO II - O início do brincar........................................... 19 2.1 - Quando o brincar é levado à sério............ 24 CAPÍTULO III - Breves Conceitos sobre o Lúdico................... 28 3.1 - O lúdico nas séries iniciais............................ 30 CAPÍTULO IV - Importantes Contribuições de Educadores sobre o uso

do Lúdico na Educação Infantil.................................................. 34

CONCLUSÃO.............................................................................................. 39 BIBLIOGRAFIA........................................................................................... 41 ÍNDICE........................................................................................................ 43