uma comunidade amaznica part.i

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- . Dado s de Catalogação na Publicação (CIP) Internacional (Câmara Brasileirado Livro, SP, Brasil) WI33c 3.ed. 88-0594 Wagley, Charles, 1913- Uma comunidade amazônica: estudo do homem nos trópicos / Charles Wagley ; tradução de Clotilde da Silva Costa. - 3. ed. - Belo Horizonte: Itatiaia ; São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1988. (Coleção Reconquista do Brasil. 2. série v. 136) Bibliografia. ~ I. Amazônia - Condições viagens 3. Amazônia - Usos Brasil - Amazônia I. Título. trópicos. m. Série. sociais 2. Amazônia - Descrição e e costumes 4. Geografia humana - n Título: Estudo do homem nos CDD-981.1 -390.09811 -918.11 IÍldice para catálogo sistemático: 1. Amazônia 2. Amazônia 3. Amazônia 4. Amazônia 5. Amazônia : Condições sociais 981.1 : Costumes 390.09811 : Descrição e viagens 918.11 : Geografia humana 918.11 : Vida ocial 390.09811 ; j

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7/24/2019 Uma Comunidade Amaznica Part.I

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-

.

Dados de Catalogação na Publicação (CIP) Internacional

(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

WI33c

3.ed.

88-0594

Wagley, Charles, 1913-

Uma comunidade amazônica: estudo do homem nos trópicos /

Charles Wagley ; tradução de Clotilde da Silva Costa. - 3. ed. -

Belo Horizonte: Itatiaia ; São Paulo: Editora da Universidade de

São Paulo, 1988.

(Coleção Reconquista do Brasil. 2. série v. 136)

Bibliografia.

~

I. Amazônia

- Condições

viagens 3. Amazônia - Usos

Brasil - Amazônia I. Título.

trópicos. m. Série.

sociais 2. Amazônia

- Descrição e

e costumes 4. Geografia humana -

n. Título: Estudo do homem nos

CDD-981.1

-390.09811

-918.11

IÍldices para catálogo sistemático:

1. Amazônia

2. Amazônia

3. Amazônia

4. Amazônia

5. Amazônia

: Condições sociais 981.1

: Costumes 390.09811

: Descrição e viagens 918.11

: Geografia humana 918.11

: Vida social 390.09811

;

j

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, .

sum r o

Prefácio à segunda edição brasikira ....................

Prefácio

.

1.

2.

3.

4.

S.

6.

7.

8.

9.

o problema do homem dos trópicos..............

Uma comunidade amazônica.....................

O meio de vida nos trópicos . . . . . . . . . . . . . . . . .

As relações sociais em uma comunidade amazônica. . . .

Os assuntos de família em uma comunidade amazônica

A gente também se diverte

oo. . . . . . . . oo .0. . o.

Da magia à ciência o. . . . .

.

. . . . . oo. . . . . . o. o.

Uma comunidade de uma área subdesenvolvida. o. o

Há em 1974: um epílogo por DARRELMILLER) . o. .

  ibliografia . . . . . . . . . . . . . . . . o. . . . . . . . . . o. o. . . . . . . . .

13

19

25

43

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118

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217

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315

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c.Q.T~ 10

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prefácio à

segund edição r sileir

Esta -é a nova edição de um livro que apareceu primeiro em

inglês em 1953 e posteriormente em português em 1956. Porém,

de certa forma, é um livro novo , pois, como mostrarei neste

prefácio, a situação global da Amazônia brasileira passou por enor-

mes transformações. E também -graças à contribuição de Darrel

L. Miller, estudante de pós-graduação da Universidade da Fló-

rida, com um capítulo sobre Há em 1974. Foi-lhe possível reestudar

a situação de Itá, em 1974, depois de muitos meses de discussão

comigo e após cuidadosas leituras da edição anterior deste livro

e do livro   antos e visagens de Eduardo Galvão l)

-

estudo da

religião na mesma cidade. Esta edição é baseada na de 1956,

publicada pela Companhia Editora Nacional. Na edição americana

de 1964 2) constava um epílogo, que não fará parte desta por

ter perdido sua validade.

O Brasil está empenhado num gigantesco projeto de conquis-

ta da AmazÔnia , cujas dimensões envolvem a construção de mais

de 13. 500km de estradas por todo o vale amazônico, incluindo-se as

rodovias Leste - Oeste Transamazônica), Norte - Sul Cuiabá

- Santarém), e a Perimetral Norte envolvendo a floresta pluvial

amazônica num extensíssimo arco em forma de ferradura, ao longo

das fronteiras com Guianas, Venezuela, Colômbia e Peru). Essas

rodovias significarão a queda da última barreira mundial à cir-

culação de automóveis e caminhões de transporte, e a conexão com

as principais artérias de tráfego do Brasil. Não podemos deixar

de salientar, também, que um dos mais delicados sistemas ecoló-

 1) Publicado pela Companhia Editora Nacional, 1955.

 2) Borzoi Latin American Series, Nova York, Alfréd Knopf.

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gicos do mundo, a floresta pluvial amazônica, se acha agora em

perigo. Ver-se-á toda a intensidade de vida da região amazônica

transladar-se do grande sistema fluvial para as proximidades das

rodovias; ao invés das várzeas dos rios, ocupar-se-á a terra firme:

É nas várzeas que estão as terras férteis, pois, anualmente, rece-

bem o limo dós rios, enquanto a terra firme. é geralmente pobre

paTa a agricultura. É esta última, porém, que está sendo rasgada

pelas novas rodovias.

O Brasil vem-se empenhando, também, num projeto de colo-

nização da região amazônica, prittcipalmente. ao longo das novas

estradas. De início, planejou-se trazer centenas de milhares de

pessoas para ocupar as regiões não habitadas que foram abertas

pelas estradas. Agora, no entanto, parece haver incertezas quanto

à exeqüibilidade, economicamente falando, de tão grandioso pro-

jeto, embora já existam algumas agrovilas e pelo me.nos uma

agrópolise uma rurópolis semiconstruída na rodovia Transama-

zônica. Os colonos procedem não somente dos Estados do Nor-

deste, mas também de Minas Gerais, Santa Catarina, São l aulo

e Rio Grande do Sul. Desde a migração de nordestinos para a.

Amazônia, nas últimas décadas do século passado, e a dos sol..

dados da borracha durante a Segunda Guerra Mundial, não se

vêem tantas pessoas chegando à região. Não pude averiguar seu

número, mas testemunhei sua. presença nos novos povoados e nas

antigas cidades e vilas, comoAltamira e Itaitubá. Não sãà -somente

os que recebem subsídios do governo que ali se instalam. Muitos

o fazem por conta própria, em busca de nova vida num novo

mundo. A Amazônia nunca mais será a mesma, pois esses minei-

ros, gaúchos, goianos e até mesmo paulistas estão modificando a

cultura amazônica e, por sua vez, recebendo a influência desta.

- - -Até mesmo as velhas -cidades ribeirinhas, desligadas das rodo-

vias, como Itá, sentem o impacto do fervor brasileiro de conquis..-

tar a Amazônia,cómo se- pode apreender no trabalho de Darrel

L. Miller, no capítulo final deste livro. Devo admitir que Itá mudou

mais do que eu podia imaginar. Essa mudança, porém, não se

operou da forma como eu esperava. O movimento, os automóveis

em circulação, as estradas dando acessibilidade às áreas periféri-

cas da municipalidade, a população, às escolas e as agências federais

é

estaduais são signos dessa transformação. Mas Itá permanece

atada às incertezas de uma economiaextrativa. Penso que nem o

sistema rodoviário, nem o velho sistema fluvial de transporte, terão

sucesso, sem que sejam conectados. As vias fluviais naturais são

meios de transportar mercadorias que, daí podem ser transferidas

  4

J

1

 q

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para as novas rodovias. Diante da perspectiva de continuidade da

crise de energia no final deste século, o raciocínio lógico deverIa

ser no sentido de ligar os portos fluviais à principal artéria' da

Transamazônica, através de outras.

Nada modifiquei neste livro, mas apenas incluí este novo pre-

fácio e o capítulo adicional escrito por Darrel L. Miller. Preferi

deixar como estava a descrição da sociedade amazônica tradicio-

nal . Juntamente com o excelente livro de Eduardo Galvão,

  antos

e visó gens

constitui um monumento a um povo, em um lugar c

uma era particulares da história e do desenvolvimento cultural

brasileiros. Mais do que isso, estes dois livros são impórtarites para

a compreensão do desenvolvimento moderno da Amazônia, pois

descrevem a cultura básica da qual dependerá, em última instância,

(I progresso social e econômico da região. Uma nova sociedade não

pode nascer do nada; deve ser construída a partir de antecedentes'

históricos. A noVa sociedade que o Brasil pretende criar na Ama-

zônia terá por base o conhecimento. que o povo dessa região acumu-

lou durante séculos, dos tempos a~ríginesao presente. No trans-

correr dos séculos, os índios e mais tarde os caboclos.1uso-brasileiros

aprenderam a coexistir com o meio local e a explora-lo. Eles

conhecem os solos, a flora e a fauna, a cheia e a vazante dos

grandes rios, a época das chuvas e os períodos relativamente secos,

'os perigos dos insetos e das doenças endêmicas, e muitos outros

aspectos do seu meio ambiente. E, a partir dessa experiência, mol-

daram a sua própria cultura amazônica, com seu próprio sistema

social, sua cozinha, suas formas de recreação e sua mitologia.

É uma herança rica que jamais deverá ser ignorada na moderna

conquista da Amazônia.

Contudo, essa cultura tradicional da Amazônia e o sistema

sócio-econômico que' a sustentou cOl1stituem uma barreira à mu-

dança e à formação da nova sociedade e cultura amazônica que

o Brasil espera desenvolver. O sistema econômico de exploração

que resultou da e~tração do látex e de outros produtos da flo-

resta, e o sistema de servidão por débito que está ligado às rela-

ções seringueiro-seringalista - o chamado sistema de fornecedor-

cliente - descritos neste livro, são enormes obstáculos ao desen-

volvimento. Sob o' impacto da moderna economia brasileira,' ambos

os .sistemas estão desaparecendo do vale amazônico. Mas, ainda

na década de 70, não haviam desapa,recidode todo. Ein alguns

lugares, vê-se, lado a lado, o Velho'lbarraco (posto de comérdo)

do tradicional patrão e o moderno ~difício do Banco do Brasil. Em

 tá, como veremos no capítulo final deste livro, o recente' surto da.

. ,  

... ....

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extração de madeira de lei para a exportação foi organizado pela

extensão do crédito dado pelas companhias aos empreiteiros da

região, que, por sua vez, estendem crédito aos cortadores locais,

fazendo lembrar o sistema tradicional da extração da borracha.

Este morre aos poucos, sem ainda ter sido substituído por um

outro comercial, moderno e produtivo.

Além do mais, a nova economia da Amazônia tende para a

continJ.1idade do extrativismo, mas sob uma nova forma. Não

obstante os esforços do governo brasileiro no sentido de estabe-

lecer pequenos agricultores na região, enormes extensões. de terras

\'êm sendo concedidas às grandes corporações, tanto brasileiras

como internacionais, sendo essas terras utilizadas para a cr~ação

de gado em enormes fazendas, para as quais a mata é clareada

com o fim de estabelecer pastagens. Como a criação de gado requer

pouca mão-de-obra, tais fazendas não podem servir de incentivo

ao crescimento populacional da Amazônia, embora venham a

aumentar a produção da carne. Outras enormes extensões de terras

são concedidas a empresas especializadas na cultura de árvores de

crescimento rápido, para extração de celulose. Com isso, também, .

poderão surgir benefícios temporários e para o desenvolvimento,

uma vez que essas grandes empresas cultivam em sítios reservados

produtos destinados à alimentação. O objetivo a longo prazo é a

cultura de exportação, não a ocupação da terra. Ademais, há um

empenho fervoroso pela exploração e pelo desenvolvimento da

mineração de bauxita, ferro (uma das maiores jazidas de ferro

do Brasil, e talvez do mundo, foi descoberta na serra dos Carajá:5)

e outros minérios. Vemos, com isso, novamente, o perigo de que.

o Brasil desenvolva na Amazônia uma economia essencialmente

extrativa - um sistema de exploração dessa área gigantesca que

pouco ou nada beneficiará ao seu póvo. Produzirá matérias-primas

de exportação para o crescenté complexo industrial do Sul do

Brasil, ou para a

.

massa de consumidores do Japão, dos Estados

Unidos e da Europa.

Não quero, neste prefácio, dar a impressão de que esteja pes-

simista quanto ao futuro do vede amazônico. Porém, devo admitir,

neste momento, que me sinto desanimado; de fato, até com receio.

Parece-me que o Brasil está tentando mudar. a Amazônia, mais

com espírito patriótico do que com o verdadeiro planejamento cien-

tífico. Anos atrás (e na primeirC ;edição deste livro), invoquei a

necessidade de uma ciência tropicalista e de uma tecnologia

tropicalista distinta da que foi criada para as zonas temperadas

do mundo e que sempre foi aplicada na Amazônia tropical. É ver-

16 .

  .

j

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dade que o governo brasileiro restaurou algumas instituições cien-

tíficas da Amazônia, como o Museu Paraense Emílio Goeldi e

o Instituto Evandro Chagas, ambos em Belém; que também vem

subvencionando generosamente o Instituto Nacional de Pesquisas

Amazônicas, em Manaus, e outras instituições educativas e de

pesquisa, inclusive a relativamente nova Universidade Federal do

Pará, que ja tem um Núcleo para Estudos da Amazônia. Também

um novo centro científico, a chamada Cidade Von Humboldt, está

em andamento no Estado de Mato Grosso. Contudo, falando com

franqueza, todas. essas instituições são débeis, em comparação com

as existentes no Sul do Brasil. Nelas está um grupo de cientistas

dedicados, mas o seu número é pequeno e o apoio que recebe é

escasso. Se é que o Brasil deseja sinceramente desenvolver a Ama-

zônia, ele vai ter que investir no efetivo humano científico tanto

quanto na construção de rodovias. Nesta altura, basta-me citar as

palavras eloqüentes e sinceras de Paulo Almeida Machado, por

vários anos diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Amazôni-

cas, e que nesta. condição veio a compreender a Amazônia e a

afeiçoar-se. sinceramente por essa região da sua pátria. São suas

ás afirmações que transcrevemos abaixo:

  A história da Amazônia é por si um sério aviso e um eioqüente exemplo

da confusão que se faz entre prosperidade econômica e desenvolvimento.

Não importa qual seja o volume de circulação mcin~tária; só haverá

desenvolvimento quando se conhecer melhor o ambiente e as riquezas naturais

e quando o homem, de acordo com esse conhecimento, mudar o seu compor-

tamento. Somente pelà educaç~o e pela pesquisa se poderá garantir a

perpetuidade do novo impulso progressista que existe na Amazônia brasi-

leira. Se o homem puder desenvolver e estabelecer uma convivência com o

meio ambiente amazônico, a Amazônia sairá definitivamente do seu estágio

de subdesenvolvimento . PalJlo Almeida Machado, in Man inthe mazon

editado por Charles Wagley, Gainesville, University of Florida Press, 1974,

p. 330.)

Neste curto parágrafo, Paulo Almeida Machado exprime o espírito

e talvez a essência do que escrevi neste livro muitos anos atrás.

É

sobremodo penoso dizer que essa mensagem é mais justificá-

vel hoje em dia do que há 20 anos.

Para esta nova edição, são poucas as pessoas a quem devo

apresentar o agradecimento e apreço. Primeiramente agradeço a

Darrel L. Miller e à sua mulher Linda, que revisitaram Há em

1974, por seu excelente capítulo documentando as mudanças ocor.

ridas na minha querida. cidadezinha amazônica. Minha esposa,

Cecília Roxo Wagley, e eu retomamos à Há em 1961, para uma

 

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pequena visita, sobre a qual escrevi uma breve nota à segunda

edição deste livro, mas o novo capítulo de Darrel L. Miller torna

supérfluo aquele epílogo. Meus agradecimentos se estendem aos

muitos estudantes, tanto nos Estados Unidos como no Brasil, que,

depois de lerem este livro em edições anteriores, escreveram cartas

de apreciação e simpatia para com as pessoas descritas e a cidade

de Há. Aliás, um grupo de estudantes secundários da Escola Ame-

ricana de. Recife, quando em excursão à Amazônia, descobriram

o nome verdadeiro da cidade e passaram um dia inteiro tentando

descobrir as personagens deste livro e entrevistá-Ias. Escreveram

uma série de relatórios que foram mimeografados em dois volu-

mes, os quais guardo com grande carinho. Agradeço por fim a

Mércio P. Gomes que traduziu este prefácio e a contribuição de

Darrel L. Miller.

Resta-me esclarecer que o meu livro sobre Há Amazônia

não é um estudo na linha da moderna ciência social, embora se

utilize da- temática da antropologia social. Ao refletir sobre o pas-

sado, sei agora que sou essencialmente um humanista; e chego à

conclusão de que este foi um livro humanista com mensagem

humanista.

J

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1

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I

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1

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I

CHARLES W AGLEY

Gainesville F árida 1975

 

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pr fá io

 

Etn

  939

visif.ei o Brasil central que, então, era uma das várias

regiões do mundo que se poderiam escolher para um estudo do

homem primitivo. Durante quase dezoito meses vivi entre os índios

Tapirapé, estudando os seus costumes.

É

uma tribo isolada qu.e

ainda mantém, em essência, seus costum,es aborígines. Proporcio-

naram um excelente campo de pesquisas para o antropólogo social,

mas, vivendo em seu mevo, pouco aprendi sobr.e o Brasil moderno,

Quando deixei o Brasil, em 1940, tinha a certeza de que voltaria.

M eu conhecimento superficial do país, de passagem pelo Rio de

Janeiro, São Paulo e Goiás, em minhas viagens de ida e volta para

a aldeia dos Tapirapé, deu-me a convicção de que O Brasil é um

dos mais interessantes laboratórios de pesquisa para a antropologia

social. Desde então tenho-me dedicadoj de uma maneira ou de

outra, ao estudo d,o Brasil moderno,

Em

  94

voltei para estudar os índios Tenetehara, uma tribo

que vivia em -estreito contato com brasileiros da zona, rural e que

estava sendo gradualmente incorporada à nação, E então, em

  942 os acontecimentos colocaram-me em contato direto com os

problenws do Brasil mod,erno. Naquele ano, como, parte de sel

programa comum para o esforço de guerra, os governos do Brasil

e dos Estados Unidos est,abeleceram um serviçowoperativo de,

saúde pública qu.e se tornou conhecido como

SESP

  Serviço Espe-

cial d,e Saúde Pública).

O SESP

foi concebido, a princípio, como

uma medida de guerra e um de seus principais programas era for~

  9

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n r

assistência médica aos produtores de matérias-primas estra-

tégicas   os seringueirós do Vale Amazônico os .emigrantes das

zonas do Nordeste devastadas pelas secas que demandavam o Ama-

zonas para extrair a borracha e QSmineiros de mica e quartzo das

regiões montOlnhosas do Brasil central. Vivendo a maioria dessa..

gente no interior um antropólogo Stocial com grande experiência

e conhecimento do sertão brasileiro seria de grande u.tilidade para

o srerviço. Durante os três anos e meio em que fui membro da

missão técnica brasileira do Instituto de Assuntos I nteramericanos

ligado ao SESP desempenhei várias funções como membro do

escritório regional do SESP no Vale Amazônico como diretor de

seu Programa de Migração pr-oporcionando assistência médica a

milhares de p.essoas que deixavam seus lares no árido Nordeste

para trabalhar no Amazonas como assistente do superintendente

do SESP e finalmente como diretor de StW Divisão de Educação

Sanitária. Mo. decorre.r desses anos muito aprendi sobr.e

ó Brasil

tanto na minha qualidade de antropólogo quanto na de. administra..

dor. Meu ponto de vista antropológico auxiliou-me enormemenfi

nas questões de administr ação e planrejamento da mesma maneira

que minha crescente familiaridade com os pr oblemas práticos con-

.

tribuiu para aguçar meu interesse científico no Brasil. Em minhas

viagens através de extensas rregiões do interior brasileiro e na mi-

nha convivência com os habitantres de suas zonas rurais adquiri

consciência dos problemas agrícolas tanto do ponto de vi.sta do

povo como do ponto de vista dos planejadores e administradores

da cidade.

Visitei pela primeira vez a pequena cidade de há em 1942

durante uma viagem dre estudos que antecedeu o planejamento do

serviço de saúde pública do SESP no Vale Amazônico. Foi nessa

lenta viagem de lancha descendo o rio Amazonas na companhia de

meu jovem assistente e companheiro Cleo Braga que pela primei-

ra vez tive consciêncw da riqu.eza da cultura amazônica e da neces-

sidade de um estudo da vida do homem da A 1nazônia. À medida

que visitávamos as aldeias .e os p ostos de comércio do Baixo Ama-

zonas e que conversávamos com pessoas de todas as classes sociais

cheguei à conclusão de que a exótica magnificência do panorama

tropical havia desviado as atenções do homem do Vale Amazônico.

As clássicas narrações d.e H. W. Bates Alfred R. W allace do

tenente William H erndon de Louis Agassiz e outros . que descre-

vem o grande vale faz.em referências surpreendentemente escassas

ao homem e às questões humanas. E a aldeiu. de ftá pareceu...me

ser o local id.eal para um estudo desta natureza.

2

1

I

j

1

I

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Depois de 1943, quando o SESP instalOtt u posto de saúde

etn I tá, pude acompanhar, de longe, os acontecimentos dessa aldeia,

pela leitura dos relatórios de seus méqicos; r,euni também grande

quantidade de dados StObrea comunidade. Voltei a Itá em 1945.

Nessa ocasião, acompanhamm-me Eduard.o Catete Pinheiro, wm

especialista em educação sanitária e filho daquela região, e Dalcí-

dio Jurandir, conhecido romancista brasileiro que estava escre ZJendo

os textos cJ,QSprogratnas educativos que o SESP pretendia, realizar

no Vale Amazônico. Em sua primeira mocidade) Dalcídio vivera

em Itá, onde servira como secretário do Prefeito da localidade. Seu

profundo conhecimento da vida da cidade e > )grande círculo de

amigos a que me apresentoÍt, tornaram-me possível aprender mais

a respeito de I tá, em um mês, do que o teria conseguido Ú dóis

me,ses sem o seu auxílio. Catete Pinheiro e Dalcídio Jurandir, pela

própria formação de suas vidas, muita me ensinaram sobre a

Amazônia.

Este livro, entretanto, baseia-se, sobretudo, em dados colhidos

de junho a setembro de 1948, durante um estudo da Amazônia

realizado pela Organização Cultural, Científica e Educacional das

Nações Unidas, para o Instituto Internacional da Hiléa Amazôni-

ca. Durante esses meses de pesquisas e residência em I tá, contei

com a colaboração de Eduardo e Clara Galvão e de minha esposa,

CecíUa Roxo Wagley, que também me acompanhou a Itá em

1942.

N osso, equipe de estudos aluglou ali uma casa onde vivíamos e tra-

calhá ZJamos.Fazíamos as refeições na casa de um comerciante ao

lugar. Visitávamos as pessoas em suas casas e elas nos retribu1 l,m

as visitas. Freqüentávamos as festas e os bailes) tagarelávam.os nas

esquinas e nas lojas, percorf\Ú1Jmoscom .os a,migos os seus roçados

e viajávamos de canoa para assistir a festejos rurais e visitar os

postos de comércio onde os seringueiros ofereciam seus PJ1odutos.

Participamos da vida de Itá tanto quanto é possível a um estranho

fazê-lo. Nãa havia barreiras de linguagem, pois três c.ompl }nentes

de nossa equipe de estudos eram brasileiros e: eu própria, domino

razoavelmente o partuguês. Cada um de nós realizava, diariamen-

te, longas entrevistas cam numerosas pessoas de todas as condições

saciais e todos os dias tomáva,m~s notas copiosas. Com o auxílio

de dois assistentes do lugar, nassa equipe realizou estudos de casos

de

1 13

famílias da. comunidade, que abra,ngeram pormenores sobre

su,a, alimentação, despesas, rendimentos, objetos pessoais) além de

várias outras informações específicas, de caráter econômico e social.

 

Além disso, o SESPtambém oos pôs à disp.osiçãoos resultados de

uma pesquisa sobre hábitos domésticos realizada em I tá, relacio-

 

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-

 

nad~ principalmente C011la alimentação. Em 1950, por sugestiio

minha, fris Myers, que s.e especializa tanto em antropologia C01.no

em psicologia, passou várias semanas em /tá. Infelizmente, não rne

foi pos~ível, ao escrever este livro, compulsar pessoalmente os

resultados d.e suas experiências psicológicas, mas suas cartas e ano-

tações forneceram-me dados e -maior compreensão da sociedade de

Itá. Todas as jontes acima. mencionadas estiveram à minha dispo-

sição durante a feitura deste livro.

Os Msenhos que o ilustram são de autoria do conhecido pintor

brasileiro, João José Rescala. Em seu prêmio de viagem pelo

Brasil perCJOrreuodo o Vale Amazônico. Observou e visitou pes-

soas como as que descrevemos neste livro, sendo s.eus desenhos

feitos de memória e de numerosos esboços realizados durante sua

viagem pela Amazônia.

Quero .expressar minha imensa gratidão a todos a que acima

me referi. Em maior ou menor escala, todos participaram dos estu-

dos que levaram à composição deste livro. Muito particularmente

quero agradecer aos meus companheiros de .estudos da missão da

UNESCO

em

1948,

por me terem permitido utilizar a riqueza de

informações de seus cadernos de notas. Mas, principalment.e, desejo

agradecer os muitos amigos de Itá, cuja hosPitalidade e coopera-

ção, cuja paciência com as contínuas perguntas do antropólogo a

respeito de t()dos os aspectos de suas vidas, tornou possível a

realização deste estudo. Infelizmente, têm qu.:; permanecer anôni-

mos; o antropólogo tem obrigação de preservar, tanto quanto

possível, todos aqueles que lhe revelam suas vidas e lhe forne-ce11l

informações sobre outrem.

C

omparec.em neste livro vários de nos-

sos amigos de ftá. Seus nomes, entretanto, foram mudados. Pela

mesma razão, a aldeia também, recebeu um nome fictício.

Desejo consignar o au.dlio financeiro da

UNESCO

e do Con-

selho d.e Pesquisas de Ciências Socia.is da Universidade de Colúm-

bia ao nosso estudo da A nta.zônia brasileira. A U NESCOdeu-me

permissão para utilizar as informações colhidas durante o estudo

da Hiléia Amazônica, mas as opiniões .expressas neste livro são

exclusivamente minhas e não representam a política da UNESCO.

Alguns dos dados aqui reproduzidos já foram publicados em outros

trabalhos, sob outra forma.

O

caPítulo sobre «Relações raciais de

uma comunidade amazônica foi publicado no folheto

« Race and

Class in Rural Brazil (Raças e classes do Brasil rural)  UNESCO,

Paris,

1952 ,

e a conferência pronunciada no Instituto Brasileiro da

Universidade de Vanderbilt, que resume alguns aspectos da cultura

de Itá, foi publicada sob o título, .«The Brazilian Amazon; the Case

22

-,.

I

 

~

7/24/2019 Uma Comunidade Amaznica Part.I

http://slidepdf.com/reader/full/uma-comunidade-amaznica-parti 13/13

for an Under-Developed Area (A Amazônia brasileira; o histó-

rico de uma área subd<Jsenvolvida) e1/ tFour Papers Presented to

the Brazilian lnstitute

(Quatro ensaios apresentados ao Instituto

Brasileiro), (Universidade 4e Vanderbilt, Editora, N ashville,

1950). Os dados sobre a religião de Itá foram compilados por

Eduardo Galvão em sua tese intitulada ((A vida religiosa M uma

comunidade amazônica (Biblioteca da Uni i}ersidade de

C

olúmbia,

microfilme,

1952) ;

os capítulos

6

e

7

deste livro de~ <Jmmuito a.)

seu estudo desse aSP<Jctoda cultura de I tá.

Finalmente, quero agradecer a Alfred M étraux, da

UNESCO.

que muito contribuiu para possibilitar a cOlfstância de meus estudos

sobre o Brasil. Agradeço ainda os meus amigos Carl Withers.

Gen<JWeltfish e Cecil Scott da ilfacmillan Compan) que leram o

manuscrito antes de sua re~lisão final e oferearam sugestões para

()

êOrrigir e melhorar.

CHARLES \V AGLEY.

.\ (J, il

York,

1953.