um retrato da formação de professores de espanhol como língua

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  • Universidade de So Paulo

    Faculdade de Educao

    Um retrato da formao de professores de espanhol

    como lngua estrangeira para crianas:

    um olhar sobre o passado, uma anlise do presente

    e caminhos para o futuro.

    Simone Rinaldi

    Orientadora: Profa.Dra. Isabel Gretel M. Eres Fernndez

    Mestrado em Educao

    So Paulo

    2006

  • 2

    Simone Rinaldi

    Um retrato da formao de professores de espanhol

    como lngua estrangeira para crianas:

    um olhar sobre o passado, uma anlise do presente

    e caminhos para o futuro.

    Dissertao apresentada Faculdade de Educao

    da Universidade de So Paulo como requisito

    parcial para obteno de ttulo de Mestre em

    Educao, Linha de Pesquisa Linguagem e

    Educao, sob orientao da Profa. Dra. Isabel

    Gretel M. Eres Fernndez.

    So Paulo

    2006

  • 3

    Dados Internacionais de Catalogao (CIP)

    Biblioteca da FE USP

    T 371.12 R578u

    Rinaldi, Simone Um relato da formao de professores de Espanhol como Lngua

    Estrangeira para crianas: um olhar sobre o passado, uma anlise do presente e caminhos para o futuro / Simone Rinaldi; orientadora Profa. Dra. Isabel Gretel Maria Eres Fernndez. So Paulo, SP: 2006.

    171 p. Dissertao (Mestrado). Curso de Ps-Graduao. rea de

    concentrao: Linguagem e educao Faculdade de Educao da Universidade de So Paulo.

    1. Formao de professores 2. Ensino de lngua estrangeira 3.

    Lngua espanhola 4. Ensino Fundamental 5. Crianas (estudo e ensino) I. Fernndez, Isabel Gretel Maria Eres

  • 4

    A meu filho Alessandro,

    a quem amo incondicionalmente. Ontem, hoje e sempre, razo da minha luta e do meu viver.

    A meus pais que jamais duvidaram da minha capacidade e

    sempre vibraram comigo o alcance de cada degrau.

  • 5

    AGRADECIMENTOS

    A Deus, por minha vida, por todas as oportunidades de crescimento com que me brindou e por ter me dado a chance de aproveit-las. minha famlia, por ter entendido minha ausncia em mais esta jornada. Profa. Dra. I.Gretel M.Eres Fernndez, pelo carinho com que me acolheu durante a orientao segura deste trabalho e pela amizade e confiana que tem depositado em mim. Profa. Dra. Maria de Fatima F. dos Santos, pelas valiosas sugestes e pela pacincia com que acompanhou cada etapa deste estudo. Profa. Ms. Marta A. de Oliveira, pela sua colaborao, amizade e por ter me mostrado que nada acontece por acaso. Ao Prof. Dr. Joo Teodoro DOlim Marote, pela generosa entrevista concedida. Profa. Dra. Glucia DOlim Marote Ferro e Profa. Dra. Cristina de Souza Vergnano Junger, pelas inestimveis contribuies por ocasio do Exame de Qualificao. Profa. Dra. Eunice Ribeiro Durham e a Vera Ceclia da Silva, do Ncleo de Pesquisas sobre Ensino Superior, por terem me facilitado acesso a documentos preciosos. Profa. Ms. Marlia de Oliveira Vasques Callegari, pela amizade, pelo apoio e pelo incentivo. Editora Moderna, pelo importante apoio oferecido. Aos participantes da Lista de Discusses ELEBRASIL, pela colaborao durante a pesquisa. s amigas do Grupo de Pesquisa Ensino e Aprendizagem de Espanhol, pelo incentivo e companheirismo. A Maria Luiza Loureno, funcionria da Biblioteca da Faculdade de Educao USP. A todos os meus professores, modelos nos quais eu me espelho para ser a educadora que sou hoje. Aos meus coordenadores, que muito me ensinaram sobre a sala de aula. Aos meus alunos, inspirao para que eu me torne uma professora sempre melhor.

  • 6

    Os homens sempre desaprovam o que no so capazes de fazer.

    Cristina, rainha da Sucia

    Em toda a cincia, o difcil o comeo. Karl Marx

  • 1

    SUMRIO

    LISTA DE FIGURAS, QUADROS, TABELAS E GRFICOS ............................ 04

    RESUMO.......................................................................................... 07

    RESUMEN ........................................................................................ 08

    ABSTRACT ....................................................................................... 09

    INTRODUO ................................................................................... 10

    CAPTULO I ENSINO DE LNGUAS ESTRANGEIRAS PARA CRIANAS.

    DESEJVEL? NECESSRIO? ..................................................... 16

    1.1 Consideraes preliminares ............................................................. 16

    1.1.1 O que dizem os textos legais?.......................................... 16

    1.1.2 O que dizem os pesquisadores?....................................... 25

    1.1.2.1 Alguns esclarecimentos .................................... 26

    1.1.2.2 A criana e a lngua estrangeira........................ 27

    1.1.3 Qual a postura dos pais? ............................................... 35

    1.2 As teorias de aprendizagem e o ensino de lnguas estrangeiras a

    crianas ............................................................................................ 37

    1.2.1 A teoria behaviorista ......................................................... 37

    1.2.2 A teoria psicogentica....................................................... 41

    1.2.3 A teoria scio-interacionista .............................................. 48

    1.2.4 Caractersticas das crianas no estgio operatrio .......... 54

    1.2.5 As teorias sobre aquisio/aprendizagem de

    lnguas estrangeiras ......................................................... 56

  • 2

    CAPTULO II CAMINHOS DO ENSINO DO ESPANHOL COMO LNGUA

    ESTRANGEIRA NO BRASIL ......................................................... 60

    2.1 Consideraes preliminares ............................................................. 60

    2.2 Veredas do ensino de idiomas no Brasil........................................... 60

    2.3 Principais abordagens e mtodos de ensino de lngua estrangeira.. 63

    2.3.1 O mtodo tradicional ou gramtica e traduo ................. 64

    2.3.2 O mtodo direto ................................................................ 64

    2.3.3 O mtodo udio-lingual..................................................... 65

    2.3.4 A abordagem comunicativa .............................................. 66

    2.3.5 O enfoque por tarefas ....................................................... 67

    2.4 A formao de professores de espanhol nos trilhos da Academia ... 69

    2.4.1 As origens da FFLCH e da FE .......................................... 70

    2.5 A oferta do espanhol nas escolas brasileiras.................................... 76

    CAPTULO III PANORAMA ATUAL DA FORMAO E DA ATUAO DE

    PROFESSORES DE E/LE PARA AS PRIMEIRAS SRIES DO ENSINO

    FUNDAMENTAL ........................................................................ 80

    3.1 Metodologia de pesquisa.................................................................. 81

    3.2 Coleta e anlise dos dados............................................................... 82

    3.2.1 Sobre os questionrios ..................................................... 84

    3.2.1.1 Sobre as dificuldades dos informantes ............. 98

    3.2.1.2 Sobre as atividades e estratgias usadas pelos

    Informantes .................................................... 127

    CAPTULO IV ALGUMAS REFLEXES............................................... 137

    4.1 A presena da lngua espanhola nas escolas................................. 137

    4.2 Os materiais didticos e a atuao do professor de lngua

    espanhola ....................................................................................... 139

    4.3 O fator tempo de experincia docente............................................ 141

    4.4 O ensino de lnguas estrangeiras no Brasil .................................... 142

    4.5 Algumas experincias na formao de professores de lnguas

    estrangeiras.................................................................................... 144

    4.5.1 Uma experincia brasileira ............................................. 144

  • 3

    4.5.2 Uma experincia espanhola ........................................... 145

    CONSIDERAES FINAIS.................................................................. 147

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ........................................................ 153

    APNDICES.................................................................................... 164

  • 4

    LISTA DE FIGURAS, QUADROS, TABELAS E GRFICOS

    GRFICOS

    Grfico 1 Comparao entre os grupos de indicadores sobre dificuldades

    Geral ................................................................................................ 101

    Grfico 2 Comparao entre os grupos de indicadores sobre dificuldades

    Magistrio de 1 a 4 srie do EF .................................................... 104

    Grfico 3 Comparao entre os grupos de indicadores sobre dificuldades

    No Magistrio de 1 a 4 srie do EF............................................. 105

    Grfico 4 Comparao entre os grupos de indicadores sobre dificuldades

    Magistrio de 1 a 4 srie do EF Grupo B ................................... 107

    Grfico 5 Comparao entre os grupos de indicadores sobre dificuldades

    No Magistrio de 1 a 4 srie do EF Grupo B............................ 107

    Grfico 6 Comparao entre os grupos de indicadores sobre dificuldades

    Magistrio de 1 a 4 srie do EF Grupo C ................................... 108

    Grfico 7 Comparao entre os grupos de indicadores sobre dificuldades

    No Magistrio de 1 a 4 srie do EF Grupo C ........................... 109

    Grfico 8 Comparao entre os grupos de indicadores sobre dificuldades

    Magistrio de 1 a 4 srie do EF Grupo A ................................... 110

    Grfico 9 Comparao entre os grupos de indicadores sobre dificuldades

    No Magistrio de 1 a 4 srie do EF Grupo A............................ 110

    Grfico 10 Comparao entre os grupos de indicadores sobre dificuldades

    Magistrio de 1 a 4 srie do EF Grupo D ................................ 112

    Grfico 11 Comparao entre os grupos de indicadores sobre dificuldades

    No Magistrio de 1 a 4 srie do EF Grupo D......................... 112

    Grfico 12 Comparao entre os grupos de indicadores sobre dificuldades

    Magistrio de 5 a 8 srie do EF Grupo B................................. 114

    Grfico 13 Comparao entre os grupos de indicadores sobre dificuldades

    No Magistrio de 5 a 8 srie do EF Grupo B ......................... 114

    Grfico 14 Comparao entre os grupos de indicadores sobre dificuldades

    Magistrio de 5 a 8 srie do EF Grupo C ................................ 116

    Grfico 15 Comparao entre os grupos de indicadores sobre dificuldades

    No Magistrio de 5 a 8 srie do EF Grupo C......................... 116

  • 5

    Grfico 16 Comparao entre os grupos de indicadores sobre dificuldades

    Magistrio de 5 a 8 srie do EF Grupo A................................. 117

    Grfico 17 Comparao entre os grupos de indicadores sobre dificuldades

    No Magistrio de 5 a 8 srie do EF Grupo A ......................... 117

    Grfico 18 Comparao entre os grupos de indicadores sobre dificuldades

    Magistrio de 5 a 8 srie do EF Grupo D ................................ 118

    Grfico 19 Comparao entre os grupos de indicadores sobre dificuldades

    No Magistrio de 5 a 8 srie do EF Grupo D......................... 119

    Grfico 20 Comparao entre os grupos de indicadores sobre dificuldades

    Magistrio de 1 a 3 srie do EM Grupo B................................ 121

    Grfico 21 Comparao entre os grupos de indicadores sobre dificuldades

    No Magistrio de 1 a 3 srie do EM Grupo B ........................ 121

    Grfico 22 Comparao entre os grupos de indicadores sobre dificuldades

    Magistrio de 1 a 3 srie do EM Grupo C................................ 122

    Grfico 23 Comparao entre os grupos de indicadores sobre dificuldades

    No Magistrio de 1 a 3 srie do EM Grupo C ........................ 123

    Grfico 24 Comparao entre os grupos de indicadores sobre dificuldades

    Magistrio de 1 a 3 srie do EM Grupo A................................ 124

    Grfico 25 Comparao entre os grupos de indicadores sobre dificuldades

    No Magistrio de 1 a 3 srie do EM Grupo A ........................ 124

    Grfico 26 Comparao entre os grupos de indicadores sobre dificuldades

    Magistrio de 1 a 3 srie do EM Grupo D................................ 125

    Grfico 27 Comparao entre os grupos de indicadores sobre dificuldades

    No Magistrio de 1 a 3 srie do EM Grupo D ........................ 126

    TABELAS

    Tabela 1 Nacionalidade dos informantes........................................................... 86

    Tabela 2 Formao secundria dos informantes............................................... 87

    Tabela 3 Habilitao da formao superior dos informantes............................. 89

    Tabela 4 Opo dos informantes por licenciatura ............................................. 90

    Tabela 5 Estudos de ps-graduao................................................................. 91

    Tabela 6 Obteno dos conhecimentos de lngua espanhola ........................... 92

    Tabela 7 Tempo de atuao docente ................................................................ 93

  • 6

    Tabela 8 Tipo de instituio na qual o informante leciona ................................. 94

    Tabela 9 Sries em que h a disciplina de E/LE na instituio mencionada ..... 95

    Tabela 10 Sries em que os informantes lecionam ou lecionaram ................... 96

    Tabela 11 Tipo de material didtico utilizado..................................................... 97

    Tabela 12 Quantidade de dificuldades segundo sua classificao.................. 100

    Tabela 13 Proporo de dificuldades segundo sua classificao.................... 100

    Tabela 14 Proporo de dificuldades segundo sua classificao

    (Magistrio 1 a 4 srie do EF) .................................................... 106

    Tabela 15 Proporo de dificuldades segundo sua classificao

    (sem Magistrio 1 a 4 srie do EF) ............................................ 106

    Tabela 16 Proporo de dificuldades segundo sua classificao

    (Magistrio 5 a 8 srie do EF) .................................................... 113

    Tabela 17 Proporo de dificuldades segundo sua classificao

    (sem Magistrio 5 a 8 srie do EF) ........................................... 113

    Tabela 18 Proporo de dificuldades segundo sua classificao

    (Magistrio 1 a 3 srie do EM) ................................................... 120

    Tabela 19 Proporo de dificuldades segundo sua classificao

    (sem Magistrio 1 a 3 srie do EM)............................................ 120

    Tabela 20 Estratgias e atividades usadas com alunos de 1 a 4 srie

    do EF ............................................................................................... 128

    Tabela 21 Estratgias e atividades usadas com alunos de 5 a 8 srie

    do EF ............................................................................................... 132

    Tabela 22 Estratgias e atividades usadas com alunos de 1 a 3 srie

    do EM .............................................................................................. 133

    Tabela 23 Ranking de atividades e estratgias usadas pelos informantes em

    geral................................................................................................. 134

    QUADROS

    Quadro 1 Caracterizao dos informantes ........................................................ 85

    FIGURAS

    Figura 1 Teoria psicogentica de Piaget ........................................................... 45

  • 7

    RESUMO

    Este trabalho trata da formao de professores de espanhol para crianas. A pergunta inicial que nos motivou foi: o ensino de espanhol para crianas necessrio e desejvel? Textos legais, tericos, pesquisadores e pais nos mostraram que sim, tanto desejvel quanto necessrio. A partir disso, buscamos saber como se d a formao dos docentes que trabalham com a faixa etria dos 7 aos 10 anos. Explicitamos alguns pontos da histria do ensino de lnguas estrangeiras no Brasil, das abordagens e mtodos de ensino de idiomas, da criao da Universidade de So Paulo e, com ela, a Faculdade de Filosofia, Letras e Cincias Humanas e a Faculdade de Educao ambas responsveis pela formao de professores de espanhol e da insero da lngua espanhola nas escolas brasileiras de Ensino Fundamental e Mdio. A partir da anlise de questionrios respondidos por treze informantes de So Paulo SP, Suzano SP, Foz do Iguau PR e Porto Alegre RS, todos professores de espanhol que j atuam com crianas no nvel escolar que nos diz respeito, traamos o perfil da formao desses docentes, da sua atuao, bem como das dificuldades vividas por eles em sala de aula. Averiguamos que tanto os professores que cursaram Magistrio quando os que no optaram por essa formao secundria se valem de prticas semelhantes: usam as mesmas estratgias e as mesmas atividades. Constatamos, tambm, que, embora as prticas utilizadas se assemelhem, as dificuldades que esses profissionais encontram em sua atuao diferem em quantidade, mas no em tipologia, ou seja, falta de ateno, problemas de concentrao e de (in)disciplina dos estudantes. As dificuldades apontadas pelos docentes, associadas s lacunas em sua formao acadmica, nos induzem a concluir que realmente falta um programa especfico para professores de espanhol para crianas e, assim, sugerimos algumas opes de insero desse tema nos vrios nveis de formao: no Magistrio (secundrio e/ou superior), no curso de Graduao e na Ps-graduao. Est claro que no seria suficiente oferecer somente uma formao inicial. importante a possibilidade de formao continuada, na qual os profissionais possam compartilhar experincias, alm de aprofundarem seus estudos. Imprescindvel seria, tambm, que se ampliasse a lei que habilita professores a trabalharem com as primeiras sries do Ensino Fundamental, para que profissionais com Licenciatura e Ps-graduao pudessem exercer plenamente essa funo.

    Palavras-chave: 1. Formao de professores 2. Ensino de lngua estrangeira 3. Lngua espanhola 4. Ensino Fundamental 5. Crianas (estudo e ensino)

  • 8

    RESUMEN

    Este trabajo trata de la formacin de profesores de espaol para nios. Nos motiv la siguiente pregunta inicial: es necesaria y deseable la enseanza de espaol para nios? Los textos legales, los tericos, los investigadores y los padres nos mostraron que s, tanto es deseable como necesaria. A partir de esa constatacin, nos interes saber cmo ocurre la formacin de los docentes que trabajan con nios entre los 7 y los 10 aos de edad. Explicitamos algunos puntos de la historia de la enseanza de lenguas extranjeras en Brasil, de los enfoques y mtodos de enseanza de idiomas, de la creacin de la Universidade de So Paulo y, con ella la Faculdade de Filosofia, Letras e Cincias Humanas y la Faculdade de Educao ambas responsables de la formacin de profesores de espaol y de la insercin de la lengua espaola en las escuelas brasileas. A partir del anlisis de cuestionarios respondidos por trece informantes de So Paulo SP, Suzano SP, Foz do Iguau PR y Porto Alegre RS, todos profesores de espaol que ya actan con nios del nivel escolar que nos interesa, esbozamos el perfil de la formacin de esos docentes, de su formacin y de su actuacin, as como de las dificultades que ellos viven y/o vivieron en sus clases. Averiguamos que tanto los profesores que cursaron Magisterio como los que no optaron por esa modalidad de formacin en secundaria emplean prcticas semejantes: usan las mismas estrategias y las mismas actividades. Constatamos, tambin que, aunque las prcticas utilizadas se asemejan, las dificultades que esos profesionales encuentran en su actuacin se diferencian en cantidad pero no en tipologa, o sea, falta de atencin, problemas de concentracin y de (in)disciplina de los estudiantes. Las dificultades indicadas por los docentes, asociadas a las carencias en su formacin acadmica, nos inducen a concluir que realmente falta un programa especfico para profesores de espaol para nios y, as, sugerimos algunas opciones de insercin de ese tema en los varios niveles de formacin: en el Magisterio (secundario y/o superior), en el curso de Graduacin y en el posgrado. Est claro que no sera suficiente ofrecer solamente una formacin inicial. Es importante que haya la posibilidad de formacin continuada, en la cual los profesionales puedan compartir experiencias, adems de profundizar sus estudios. Imprescindible sera, tambin, que se ampliase la ley que habilita a profesores a trabajar con los primeros cursos de la Enseanza Primaria (Enseanza Fundamental), para que profesionales con Licenciatura y posgrado pudiesen ejercer plenamente esa funcin.

    Palabras-clave: 1. Formacin de profesores 2. Enseanza de lengua extranjera 3. Lengua espaola 4. Enseanza Primaria (Enseanza Fundamental) 5. Nios (estudio y enseanza)

  • 9

    ABSTRACT

    This paper discusses the training of teachers of Spanish as a foreign language to young learners. The initial question for the investigation was: is the teaching of Spanish as a foreign language to young learners necessary and desirable? Legal and theoretical texts, researchers and parents have shown us that yes, it is both necessary and desirable. Starting from this premise, the work consisted of finding out information about the training of teachers who work with students in the 7 to 10 age bracket. Points covered in the study include the history of foreign language teaching in Brazil, approaches and methods for the teaching of foreign languages, the inauguration of the University of So Paulo, and its college of Philosophy, Languages and Human Science and the college of Education both responsible for the training of teachers of Spanish and the introduction of Spanish as a discipline in the curriculum of primary and secondary education (Ensino Fundamental e Mdio). Based on the analysis of questionnaires completed by thirteen informants from the state of So Paulo (the capital and Suzano), and from the state of Paran (Foz do Iguau) and Rio Grande do Sul (Porto Alegre), all teachers of Spanish for children in the target age bracket, we built a profile of the training of these teachers, of their teaching and of the difficulties experienced by them in their classroom practice. It was noticed that both the teachers who had attended teacher training college (Magistrio) and those who had not, had similar performance: they used the same strategies and activities. It was also noticed that although the activities used were similar, the difficulties encountered by these professionals in their teaching differed in quantity, but not in the type of problem like lack of attention, concentration and discipline problems. The difficulties encountered, associated to gaps in their academic background, lead us to think that there is a real need for a program for the training of teachers of Spanish as a foreign language to young learners. We suggest, therefore, some options for the insertion of this aspect in the curriculum at the various levels of teacher training programs from high school to post-graduation. It is clear that it would not be enough to offer initial training but also continuous development, through which professionals can share experiences, besides getting further training. It is also essential to broaden the scope of the law regulating the qualification requirements for teachers of the first grades primary education, so that professionals with graduation and post-graduation in languages can fulfill these positions satisfactorily

    Key words: 1 Teacher training 2. Foreign Language Teaching 3. Spanish language 4 Primary education 5. Children (teaching and learning)

  • 10

    INTRODUO

    A gnese desta pesquisa foi a realidade vivida por ns em 1997, quando

    comeamos a dar aulas de Espanhol como lngua estrangeira no Ensino Mdio em

    escolas particulares da cidade de So Paulo.

    Naquela ocasio, deparamo-nos com alunos que menosprezavam esse

    idioma referindo-se a ele como Portugus mal falado. Isso causou-nos desgosto,

    preocupao e curiosidade. Desgosto porque ver o idioma (e relacionado a ele uma

    cultura, por no dizer vrias) com o qual escolhemos trabalhar sendo desprezado

    no nos dava nem d nenhum prazer; preocupao porque aqueles adolescentes

    desprezavam uma lngua que no conheciam, nem demonstravam abertura para

    conhecer, ou seja, o desprezo significava, naquele caso, preconceito; por fim,

    curiosidade ao nos perguntarmos por que a lngua de maior prestgio, o Ingls, era

    vista como o nico idioma pelo qual valia a pena perder tempo estudando.

    Decidimos, ento, por ocasio da realizao do curso de Licenciatura na

    Faculdade de Educao da USP, comear a pensar no visvel preconceito

    apresentado por muitos alunos adolescentes em relao lngua castelhana e como

    diminu-lo, j que querer elimin-lo pode ser uma utopia, uma vez que a imagem que

    um aluno tem de um idioma muito influenciada pela sociedade e pela famlia ao

    longo de toda a sua vida, inclusive com as informaes e pr-conceitos que lhes so

    transmitidos durante a infncia, momento em que muitos valores so fixados.

    (CALLEGARI, 2004: 96-99).

    Conclumos que uma das possveis solues seria fazer com que alunos mais

    novos passassem a conhecer a lngua e as culturas hispnicas. Assim, voltamos

    nossos olhares ao curso de 1 a 4 sries do Ensino Fundamental. Partimos da

    hiptese de que se esses estudantes, mais jovens, tivessem desde cedo contato

    com outra viso da lngua estrangeira que nos ocupa, possivelmente, mais tarde,

  • 11

    suas concepes e crenas no apresentariam os preconceitos presentes na viso

    dos alunos adolescentes com os quais trabalhvamos naquele momento. Assim,

    ainda naquele momento de realizao do curso de Licenciatura, optamos por

    desenvolver nossas atividades de estgio com crianas: por um lado, essa seria a

    oportunidade de termos uma experincia inovadora para ns, j que at aquele

    momento no havamos lecionado lngua estrangeira para esse pblico e, por outro,

    poderamos comear a refletir sobre o processo de ensino e aprendizagem para

    estudantes das sries iniciais do Ensino Fundamental.

    Como a experincia revelou-nos, de maneira mais contundente, a importncia

    de que o professor possua uma formao adequada e direcionada para o trabalho

    com esse pblico, confirmamos nossa inteno de aprofundar nossos estudos na

    Ps-Graduao. Assim, uma vez iniciadas as atividades nesse nvel, delimitamos o

    foco de nossa investigao na figura do professor por entendermos que ele constitui,

    muitas vezes, o principal elemento externo capaz de despertar, no aprendiz,

    sentimentos favorveis em relao quilo que lhe desconhecido, no nosso caso, a

    lngua espanhola e tais sentimentos so, em grande medida, responsveis pelo

    sucesso do estudante.

    Tal viso encontrou respaldo no trabalho de Gardner e Lambert (19721, apud

    CALLEGARI, 2004: 89), ao afirmar que a atitude do aprendiz frente lngua alvo e

    seus falantes assim como a sua motivao so tambm responsveis por diferentes

    nveis de aprendizagem e desempenho. Para esses autores,

    ... as suas atitudes [dos estudantes], as suas vises do povo estrangeiro e da sua

    cultura, e a sua orientao em relao ao processo de aprendizagem determinam

    ou limitam o seu progresso no desenvolvimento da competncia na segunda

    lngua.2

    Dessa forma, podemos inferir que, ao propiciar criana um contato positivo,

    ou seja, livre de preconceitos para com a lngua espanhola, aumentaramos as

    1 GARDNER, R. C.; LAMBERT, W. E. Attitudes and Motivation in Second Language Learning. Massachusetts, Newbury House Publishers, 1972, p. 3. 2 Original: ...his attitudes, his views of foreign people and cultures, and his orientation toward the learning process might well determine or limit his progress in developing second-language competence. Traduo livre de Marlia Oliveira Vasques Callegari.

  • 12

    possibilidades de que ela desenvolvesse sentimentos tambm positivos em relao

    ao idioma e aos povos hispnicos e, por conseguinte, melhores resultados. Mas,

    para isso, conviria garantir que seus primeiros contatos, tanto com a lngua, quanto

    com a(s) cultura(s) que abarcam esse idioma fossem prazerosos e motivadores.

    Entretanto, outra dvida ainda se fazia presente: como efetivar essa garantia?

    Acreditamos que o principal caminho a formao de profissionais bem preparados

    e cientes dessa necessidade; professores conscientes de que os primeiros contatos

    com um novo idioma devem tender ao sucesso. Considerando que crianas so

    vidas por novidades, julgamos imprescindvel procurar manter esse interesse e dele

    tirar proveito para abrir e/ou ampliar os acessos ao conhecimento. Essa foi a nossa

    primeira e principal hiptese de trabalho e, a partir dela, prosseguimos nossa

    pesquisa bibliogrfica e de campo.

    A busca por investigaes sobre o assunto levou-nos a concordar com Ferro

    (1995: 52), para quem

    o ensino de lngua estrangeira j nas primeiras sries pode ser bastante positivo se

    for reforado o aspecto ldico da aprendizagem. Isso pode ser conseguido por meio

    de jogos e msicas que fazem parte do cotidiano dos alunos. Como as crianas

    pequenas tm facilidade para reproduzir sons e gostam muito de falar, deve-se

    privilegiar a produo oral, que d uma percepo auditiva maior e extremamente

    benfica ao processo de aprendizagem. A escrita no uma necessidade nessa

    fase e, dependendo do mtodo, pode at dificultar o aprendizado da lngua materna,

    uma vez que o aluno passa a enfrentar dois processos, o da oralidade e o da

    escrita, em duas lnguas...3

    Encontramos, em nossas pesquisas, alguns cursos de espanhol para

    crianas, em escolas regulares particulares. Tais cursos muitas vezes mostraram

    estar no caminho contrrio a essa viso ao exigirem produo escrita de crianas

    que ainda no estavam totalmente alfabetizadas em sua lngua materna (Lngua

    Portuguesa, para o caso do Brasil). Essa exigncia acontecia, provavelmente,

    porque os professores reproduziam a maneira pela qual aprenderam o idioma

    3 Em resposta pergunta de uma leitora mineira da revista Nova Escola aconselhvel o ensino de lngua estrangeira nas sries iniciais do primeiro grau? publicada em outubro de 1995.

  • 13

    estrangeiro, sem se dar conta de que cursos para crianas devem ser organizados e

    ministrados de maneira diferente daqueles destinados a adolescentes e adultos, ou

    porque transferiam consciente ou inconscientemente formas de ensino

    amplamente utilizadas para o trabalho com lngua materna sem considerar que os

    objetivos e as necessidades entre ambas (lngua materna e lngua estrangeira) so

    muito diferentes.

    Tais inadequaes pedaggicas devem-se, segundo nosso ponto de vista, ao

    fato de que o ensino de lngua estrangeira (LE) para as primeiras sries do Ensino

    Fundamental no est previsto na legislao em vigor (especificamente, a lei

    9.394/96 LDBEN). De idntica maneira, o curso de Licenciatura tambm deixa de

    abordar o ensino de LE para esse segmento, a exemplo do que ocorre nos cursos

    Magistrio em nvel de 2 grau, Magistrio Superior e Pedagogia.

    Alm disso, Callegari (2004: p.97) menciona outro fator que leva os

    professores a repetirem a mesma prtica com a qual se formaram:

    ... sabido que o trabalho do professor muitas vezes dificultado pelo grande

    nmero de alunos por sala, problema atualmente encontrado tanto em escolas

    pblicas como em particulares. Em aulas de lngua estrangeira, a situao complica-

    se ainda mais. Torna-se praticamente invivel para o professor realizar atividades

    orais com todos os alunos. Muitas vezes a soluo encontrada controlar a sala

    com freqentes exerccios escritos e sucessivas correes, o que pode desestimular

    o interesse dos alunos.

    Desestimulados, os alunos podem se fechar para a aprendizagem de um

    novo idioma adquirindo, dessa forma, um pr-conceito em relao ao seu estudo e,

    inclusive, lngua e cultura estrangeira.

    Para se tentar evitar a formao do pr-conceito a respeito de novos idiomas,

    supomos ser de extrema importncia que os professores que atuam com crianas

    sejam muito bem preparados e qualificados porque depende deles incutir nesses

    alunos o gosto pela aprendizagem e pela lngua estrangeira que ensinam, ou seja,

    no consideramos suficiente introduzi-los no conhecimento do novo idioma:

    julgamos que preciso motiv-los para esse aprendizado. Tal preocupao levou-

  • 14

    nos a questionar quem so os docentes que atuam na rea de ensino da lngua

    espanhola nas sries iniciais do Fundamental e qual a formao que possuem,

    tanto no que se refere tipologia quanto qualidade.

    Dessa forma, procuramos, no captulo I, discutir a necessidade e o desejo de

    se ensinar lnguas estrangeiras a crianas de 1 a 4 sries a partir da viso legal, de

    pesquisadores, de tericos e dos pais. Com isso, nosso propsito foi verificar at

    que ponto , de fato, necessrio ou vivel introduzir-se o ensino de um novo idioma

    em idades precoces. Nosso estudo revelou que h uma certa valorizao social e

    um interesse crescente pelo estudo de idiomas, o que converte a incluso de aulas

    de LEs nas sries iniciais num diferencial almejado.

    No captulo II, abordamos o aspecto histrico do ensino de lngua estrangeira

    no Brasil, dos mtodos de ensino de idiomas, da formao de professores de

    espanhol no Estado de So Paulo e da oferta da lngua espanhola na grade

    curricular das escolas de ensino regular. Como dissemos, contar com um panorama

    diacrnico permitiu-nos ter uma viso global do percurso do ensino de idiomas e da

    formao inicial dos docentes assim como confirmar a necessidade de direcionar

    nossa ateno para a formao de profissionais que so cada vez mais requisitados

    pelo mercado de trabalho.

    Os captulos anteriores levaram-nos a, no captulo III, descortinar um

    fragmento da formao docente daqueles que j ensinam a lngua espanhola a

    alunos dos dois primeiros ciclos do Ensino Fundamental, desde sua educao

    secundria, superior e ps-graduao. Abordamos, tambm, suas principais

    dificuldades no trato com esses alunos, alm de compararmos essas dificuldades

    com as sentidas ao lidarem com os outros nveis de ensino. Por fim, comparamos

    suas prticas nos trs momentos do Ensino Bsico. A anlise dos dados permitiu-

    nos confirmar nossa hiptese de que os docentes licenciados, com Magistrio ou

    no, que lecionam nos trs segmentos do Ensino Bsico adotam procedimentos

    semelhantes para os trs sem considerar dificuldades, desigualdades etrias, de

    desenvolvimento, de objetivos.

  • 15

    O captulo seguinte abarca nossas reflexes acerca de alguns pontos que

    ficaram descosturados, como a oferta do idioma espanhol nas escolas pblicas e

    privadas, bem como a continuidade desse estudo que elas oferecem; a relativa falta

    de material didtico para o ensino de espanhol nas primeiras sries do Ensino

    Fundamental, relativa porque efetivamente h, no Brasil, mais ttulos destinados a

    esse segmento que na Espanha; comentamos mais profundamente a relao entre

    a formao docente, suas dificuldades e suas prticas, bem como analisamos o fator

    tempo de experincia que, junto formao adequada, propicia o ensino ideal;

    inclumos, tambm o que entendemos por formao adequada que abrange

    algumas disciplinas que deveriam ser estudadas, bem como seu principal objetivo;

    comentamos, ainda, dois modelos de formao de professores de lnguas

    estrangeiras para crianas: o brasileiro, que ocorre numa faculdade no Paran e o

    espanhol, oferecido numa faculdade em Len.

    As consideraes finais trazem algumas sugestes dirigidas aos cursos de

    Magistrio, Licenciatura em Letras e ps-graduao que acreditamos possam

    incrementar seus currculos e oportunizar mais investigaes sobre o tema da

    formao de professores de espanhol para crianas.

  • 16

    CAPTULO I

    ENSINO DE LNGUAS ESTRANGEIRAS PARA CRIANAS. DESEJVEL?

    NECESSRIO?

    1.1 Consideraes preliminares

    Embora muitas escolas particulares e pblicas j adotem a incluso de aulas

    de lngua estrangeira a partir das primeiras sries do ensino fundamental, de

    extrema importncia tecer algumas consideraes sobre essa adoo, j que tal

    medida mostra-se, por vezes, polmica: h os que defendem o ensino de uma lngua

    estrangeira ou inclusive mais de uma em idades precoces, e h os que opinam

    que tal ensino s deve ocorrer a partir de idades mais avanadas. Os argumentos

    arrolados por uns e outros so variados e nem sempre facilmente refutveis. Da que

    consideremos relevante discutir alguns dos aspectos que vm tona quando

    pensamos no melhor momento de expor a criana aprendizagem de um novo

    idioma.

    1.1.1 O que dizem os textos legais?

    Nem todo texto legal sobre educao brasileira manifestou-se quanto ao

    ensino de lnguas estrangeiras em territrio nacional. Entretanto, verificamos a

    existncia, especificamente, de uma lei paulista, que tratava da reforma de ensino

    neste Estado lei 1.750, de 08 de dezembro de 1920 e um decreto federal que se

    referia aquisio de terras brasileiras por estrangeiros, o decreto no. 1.164, de

    1939.

  • 17

    Em seu texto, Cavaliere (2003: 35) afirmava que

    Quanto questo nacional, a lei [1.750, de 8 de dezembro de 1920] foi clara

    e minuciosa: as escolas particulares deveriam submeter-se s determinaes da

    Diretoria de Instruo Pblica. Deveriam assumir compromisso por escrito relativo a

    diversos pontos, tais como: respeito aos feriados nacionais, ensino do portugus (por

    professor brasileiro ou portugus nato), ensino de geografia e histria do Brasil (por

    professor brasileiro nato), ensino dos cantos nacionais, proibio do ensino de

    lngua estrangeira para crianas menores de 10 anos, abertura do

    estabelecimento s autoridades do ensino. As medidas acima visavam

    especificamente s escolas estrangeiras, implantadas em quantidade nas colnias de

    imigrantes, e no embutiam qualquer rejeio escola privada em si. (grifo nosso).

    Em 1939, o decreto 1.164 sobre a aquisio de terras brasileiras por

    estrangeiros, principalmente aqueles que habitavam as regies fronteirias, incluiu

    em seu texto a proibio do ensino de lngua estrangeira a menores de catorze

    anos4.

    Esses dois momentos do incio do sculo XX demonstram uma preocupao

    com a identidade nacional, principalmente porque, em So Paulo, a existncia de

    estrangeiros era resultado de ondas de imigrao europia em busca de trabalho e,

    na regio fronteiria, procurava-se preservar a extenso do territrio brasileiro.

    Com o passar do tempo, o governo entendeu a necessidade de se incluir

    mais efetivamente o ensino de lnguas estrangeiras no currculo escolar. Entretanto,

    esse ensino continuou restrito a crianas a partir de 12 anos (idade comum aos

    alunos de 5 srie do Ensino Fundamental), como podemos ver na LDBEN de 1996.

    Em 1996, a legislao educacional brasileira passou por uma reforma que

    resultou em diversos documentos fundamentais: uma nova lei de diretrizes e bases e

    parmetros curriculares nacionais para todas as disciplinas integrantes do currculo.

    No nos cabe, aqui, analisar a ntegra desses textos nem discutir a repercusso por

    eles gerada. Contudo, para o presente estudo, interessa tecer alguns comentrios

    sob a ptica do ensino de lnguas estrangeiras, como expomos a seguir. 4 Eber Z. SANTA HELENA. O estrangeiro e a aquisio de imveis rurais no direito nacional e comparado. p.94.

  • 18

    a) LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAO NACIONAL

    A Lei n 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e

    bases da educao nacional LDBEN, ressalta em vrias oportunidades a

    importncia dada ao estudo de lnguas estrangeiras nos trs nveis de ensino da

    Educao Bsica (Educao Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Mdio), como

    veremos a seguir. Dessa forma define, em seu Captulo II Da Educao Bsica,

    Seo I Das Disposies Gerais, artigo 26, pargrafo 5, que

    Na parte diversificada do currculo ser includo, obrigatoriamente, a

    partir da quinta srie, o ensino de pelo menos uma lngua estrangeira

    moderna, cuja escolha ficar a cargo da comunidade escolar, dentro das

    possibilidades da instituio.

    Podemos depreender do texto anterior que, a critrio de cada instituio de

    ensino e ouvida a comunidade escolar, a incluso de pelo menos uma lngua

    estrangeira pode ocorrer no nvel anterior quinta srie, ou seja, desde que se

    obedea ao currculo mnimo obrigatrio, pode-se incluir, sob a gide da parte

    diversificada, quaisquer disciplinas e, entre elas, uma ou mais lnguas estrangeiras

    nas primeiras sries do Ensino Fundamental, ou ainda, na Educao Infantil.

    Ainda na Seo I, o texto legal dispe sobre os contedos curriculares da

    educao bsica:

    Art. 27. Os contedos curriculares da educao bsica observaro,

    ainda, as seguintes diretrizes:

    I a difuso de valores fundamentais ao interesse

    social, aos direitos e deveres dos cidados, de

    respeito ao bem comum e ordem democrtica;

    II considerao das condies de escolaridade dos

    alunos em cada estabelecimento;

    III orientao para o trabalho;

    IV promoo do desporto educacional e apoio s

    prticas desportivas no-formais.

  • 19

    Do artigo anterior, dois incisos merecem, neste momento, ateno especial:

    a) o primeiro, que se volta para a formao integral do indivduo e, assim, considera

    ser tal formao um dos objetivos da Educao Bsica; e b) o terceiro, que explicita

    a orientao para o trabalho tambm como um dos propsitos curriculares desse

    nvel de ensino. Estando a lngua estrangeira includa entre os contedos

    curriculares desse nvel de ensino, pode-se concluir que os relatores do texto legal

    consideram que o conhecimento de pelo menos um idioma estrangeiro faz parte da

    formao integral do indivduo ao mesmo tempo em que auxilia a sua capacitao

    para o mercado de trabalho.

    Ainda que se refira especificamente ao Ensino Mdio, novamente a LDBEN

    afirma a importncia da incluso de lnguas estrangeiras no currculo escolar atravs

    da Seo IV - Do Ensino Mdio, artigo 36, inciso III:

    ...ser includa uma lngua estrangeira moderna, como disciplina

    obrigatria, escolhida pela comunidade escolar, e uma segunda, em carter

    optativo, dentro das disponibilidades da instituio.

    Assim, em vrias ocasies, o texto legal destaca o valor que outorga ao

    estudo de idiomas estrangeiros sem, contudo, restringir explicitamente seu

    aprendizado a determinado nvel escolar, como comentado anteriormente. Contudo,

    apesar de no haver restrio legal incluso de lnguas estrangeiras antes da 5.

    srie do Ensino Fundamental, na prtica no se observa essa oportunidade com

    muita freqncia.

    b) O QUE OBSERVAMOS NA PRTICA

    Na prtica, o que temos visto que, por falta de condies ( conveniente

    lembrar que o texto legal afirma dentro das possibilidades da instituio), a maioria

    das escolas da rede pblica v-se forada a cumprir apenas essas diretrizes

    mnimas e oferecer a disciplina de lngua estrangeira, quase sempre a lngua

    inglesa5, somente a partir da 5. srie. Contudo, desde 1987, com a criao dos

    Centros de Estudos de Lnguas no Estado de So Paulo, (CEL), os alunos

    5 Discutimos as razes da hegemonia da oferta de lngua inglesa nas escolas pblicas no captulo II.

  • 20

    matriculados a partir da 6. srie6 tm a oportunidade de estudar outra(s) lngua(s)

    estrangeira(s).

    Na rede particular de ensino muitas escolas passaram a oferecer, de maneira

    mais acentuada durante a ltima dcada, a lngua inglesa como lngua estrangeira a

    partir das primeiras sries do Ensino Fundamental (muitas vezes at a partir da

    Educao Infantil). Mais recentemente, algumas delas optaram pela incluso de uma

    segunda lngua na maioria dos casos a lngua espanhola j na 5. srie; e h,

    ainda, algumas escolas7 que comearam a adotar o estudo da lngua espanhola,

    alm da lngua inglesa, nas primeiras sries do Ensino Fundamental.

    O que se pode notar que a insero da lngua estrangeira, principalmente a

    lngua espanhola, est crescendo em todos os nveis que integram a Educao

    Bsica. Tal iniciativa originada em centros escolares v-se, atualmente, ao menos

    em parte, respaldada pela sano da Lei no. 11.161, de 05 de agosto de 2005, que

    obriga a oferta da lngua espanhola no Ensino Mdio por todas as escolas

    brasileiras, ainda que seja opcional ao aluno estud-la, e como opcional s escolas

    a oferta desse idioma a partir da 5. srie do Ensino Fundamental. Apesar de alguns

    colgios caminharem em direo contrria8, outros esto aproveitando essa

    oportunidade legal para incluir (ou manter), como diferencial, o idioma espanhol em

    todos os nveis de ensino.9

    c) REFERENCIAL CURRICULAR E PARMETROS NACIONAIS

    Publicados com o intuito de propiciar aos professores subsdios para a

    reflexo sobre objetivos, contedos e orientaes didticas necessrias

    elaborao ou reelaborao de propostas curriculares para Educao Infantil,

    Ensino Fundamental e Ensino Mdio, o Referencial Curricular Nacional para a

    Educao Infantil e os Parmetros Curriculares Nacionais PCNs dos demais

    6 Condio de escolaridade mnima, segundo a Coordenadoria de Estudos e Normas Pedaggicas do Estado de So Paulo. 7 Voltaremos a esse ponto no captulo 3. 8 Temos conhecimento, informal e extra-oficial, de que alguns colgios da cidade de So Paulo esto excluindo a lngua espanhola de sua grade curricular de Ensino Fundamental, a pesar de t-la oferecido por oito anos seguidos. 9 A relao de algumas dessas escolas encontra-se no captulo 3 deste trabalho.

  • 21

    nveis da Educao Bsica foram o resultado de discusses pedaggicas entre

    muitos educadores e aprovados pelos representantes do governo.

    O documento oficial Referencial Curricular Nacional para a Educao Infantil

    traz a viso do poder pblico em relao existncia e importncia do convvio

    com outras culturas.10 No volume 2 desse texto oficial destaca-se a importncia da

    linguagem:

    Por meio da linguagem o ser humano pode ter acesso a outras

    realidades sem passar, necessariamente, pela experincia concreta. Por

    exemplo, algum que more no sul do Brasil pode saber coisas sobre a

    floresta ou povos da Amaznia sem que nunca tenha ido ao Amazonas,

    simplesmente se baseando em relatos de viajantes, ou em livros. Com esse

    recurso, a criana tem acesso a mundos distantes e imaginrios(...)11

    O recurso da linguagem pode oferecer criana acesso a mundos distantes e

    imaginrios, mas tambm a mundos distantes e reais, a outras culturas, como outros

    pases e outros povos, por exemplo. A partir desse contato, ainda que no

    concretamente, criana vivel e possvel a introduo do idioma estrangeiro

    como parte de outro mundo, de outro contexto. Atravs da relao precoce (no de

    maneira pejorativa) com a lngua estrangeira, a criana pode vir a criar, no seu

    ntimo, ao longo do seu desenvolvimento intelectual e social, um espao para abrigar

    o que lhe for novo - sem rechaar o desconhecido, sem repelir o diferente, mas ao

    contrrio, com respeito ao que lhe vier a ser diverso.

    Em busca de uma linha coerente de Educao, os PCNs de 1 4 srie

    mantiveram o mesmo carter adotado no Referencial Curricular para a Educao

    Infantil contrrio discriminao e se referem pluralidade cultural da seguinte

    maneira:

    Para viver democraticamente em uma sociedade plural preciso

    respeitar os diferentes grupos e culturas que a constituem. A sociedade

    brasileira formada no s por diferentes etnias, como por imigrantes de

    10 Ver Referencial Curricular Nacional para a Educao Infantil, vol I, p.76. 11 Op.cit., vol.2, p.24-5.

  • 22

    diferentes pases. [...] O grande desafio da escola investir na superao da

    discriminao e dar a conhecer a riqueza representada pela diversidade

    etnocultural que compe o patrimnio sociocultural brasileiro, valorizando a

    trajetria particular dos grupos que compem a sociedade...12

    O poder pblico pretende que a discriminao deixe de ser uma realidade, a

    julgar pela orientao de convivncia com o outro, com outras culturas. Uma das

    formas de se alcanar esse objetivo pode ser permitir criana, tambm nos

    primeiros ciclos do Ensino Fundamental, conhecer outras culturas por meio do

    estudo de lnguas estrangeiras. Pode-se dizer que essa idia encontra-se, tambm,

    no seguinte trecho dos PCNs:

    Conhecer a existncia do uso de outras lnguas diferentes da Lngua

    Portuguesa, idioma oficial, significa no s ampliao de horizontes, como

    tambm compreenso da complexidade do Pas. [...] Pode, com isso,

    promover no s a reflexo metalingstica, como tambm a compreenso

    de como se constituem identidades e singularidades de diferentes povos e

    etnias. 13

    Nota-se, outra vez, o alto valor que dado ao conhecimento de lnguas

    estrangeiras, desde as primeiras sries do Ensino Fundamental, o que pode

    incentivar ainda mais sua oferta para esse nvel escolar.

    No que se refere Educao Infantil e s primeiras sries do Ensino

    Fundamental, como vimos, o estudo de lnguas estrangeiras est inserido nos temas

    de diversidade e pluralidade cultural. Porm, se os prprios PCNs assinalam a

    importncia da lngua estrangeira nas fases iniciais da educao, por que no foi

    aberta explicitamente essa possibilidade na lei?

    Uma das possveis respostas questo anterior pode ser o fato de no haver

    um curso que habilite professores de lngua estrangeira a trabalharem com

    crianas14, embora haja vrios profissionais atuando de maneira louvvel nesse

    12 Parmetros Curriculares Nacionais - livro 8, p.26. 13 Op.cit. vol. 10, p.35-36. 14 Durante o perodo em que esta pesquisa foi feita no foi possvel obter qualquer informao sobre um curso de formao de professores que habilite o profissional a trabalhar com crianas at a 4.

  • 23

    segmento educacional, como veremos no captulo III quando abordaremos alguns

    aspectos relacionados ao panorama atual da formao de professores de espanhol

    em algumas regies do Brasil. Outra possvel resposta pode ser o fato de alguns

    tericos criticarem o ensino de lngua estrangeira em tenra idade. Sobre a questo

    da idade, trataremos o assunto mais adiante, neste mesmo captulo.

    Vale a pena citar que situao semelhante a esta viveu a Espanha h alguns

    anos: muitas escolas comearam a oferecer as lnguas inglesa e francesa nas

    primeiras sries escolares, mesmo no tendo professores habilitados legalmente

    para trabalharem com esse nvel escolar. Com o passar do tempo, o governo

    reformulou o ensino superior e incluiu na lei a habilitao de professor especialista

    em lngua estrangeira no magistrio superior. Voltaremos a esse tema no captulo 4,

    quando abordaremos alguns aspectos positivos e negativos dessa alternativa

    encontrada pela Espanha.

    No que tange ao nvel escolar mais avanado, ou seja, as ltimas sries do

    Ensino Fundamental, os PCNs destinam um volume somente para Lngua

    Estrangeira. Isso acontece porque a LDBEN estipula a obrigatoriedade dessa

    disciplina a partir desse nvel escolar.

    Para se manter dentro de uma coerente linha educativa, os PCNs de Lngua

    Estrangeira destinados aos dois ltimos ciclos do Ensino Fundamental apiam-se

    na relao respeitosa com o outro. Essa situao fica mais clara logo que lemos as

    Consideraes Preliminares:

    O distanciamento proporcionado pelo envolvimento do aluno no uso

    de uma lngua diferente o ajuda a aumentar sua autopercepo como ser

    humano e cidado. Ao entender o outro e sua alteridade, pela aprendizagem

    de uma lngua estrangeira, ele aprende mais sobre si mesmo e sobre um

    srie do Ensino Fundamental. de nosso conhecimento que apenas uma faculdade particular, em Rolndia-PR, aborda, em seu programa de Prtica Educativa, aspectos relacionados ao ensino de lngua estrangeira para crianas da Educao Infantil e primeiras sries do Ensino Fundamental. Contudo, mesmo nesse caso especfico, trata-se da incluso do assunto no programa de curso, mas no da criao de uma habilitao especial para lecionar lngua estrangeira nesse nvel de ensino.

  • 24

    mundo plural, marcado por valores culturais diferentes e maneiras diversas

    de organizao poltica e social.15

    O fragmento anteriormente citado retoma em seu discurso muito do que foi

    preconizado nos PCNs da 1. 4. Srie e tambm no Referencial Curricular

    Nacional para a Educao Infantil: conhecer o outro para conhecer-se melhor,

    estudar sobre um mundo diverso para aprender a respeit-lo, a entend-lo e, com

    isso, tentar banir o preconceito da nossa sociedade. Esforos nesse sentido

    permeiam muitas das disciplinas escolares. Por que no seria igual com a Lngua

    Estrangeira, uma vez que ela, por si s, j considerada (legitimamente) diferente?

    Abolir um possvel preconceito, como aquele que encontramos no incio de nossa

    atividade docente e que descrevemos na Introduo deste trabalho, contra a Lngua

    Estrangeira j um passo em direo tolerncia.

    Quanto aos Parmetros Curriculares Nacionais do Ensino Mdio, no

    momento em que realizamos este trabalho investigativo16 tem-se informao de que

    esto em fase de elaborao. Segundo o que foi possvel apurar, os novos PCNs-

    EM possuiro um volume especfico para Lngua Inglesa e outro para Lngua

    Espanhola. Como tais documentos ainda no se tornaram pblicos, no h como

    antecipar as diretrizes que defendero, mas podemos esperar que sigam a mesma

    linha educacional dos outros documentos oficiais, voltada para o estudo da

    diversidade cultural e considerao ao outro.

    Embora no explicitamente declarado, enquanto a lngua estrangeira, na

    Educao Infantil, teria (ou tem, para os casos em que a LE esteja inserida nas

    primeiras sries do Ensino Fundamental) a finalidade de estabelecer um primeiro

    contato ldico e prazeroso com um idioma e uma cultura estrangeira, alm de

    propiciar a ampliao dos horizontes reais e imaginrios dos pequenos, nos

    primeiros dois ciclos do Ensino Fundamental esse contato passaria (ou passa) a

    15 Parmetros Curriculares Nacionais. Lngua Estrangeira 1. e 2. ciclos do Ensino Fundamental, p.19. 16 Soubemos que os novos documentos estavam em fase de redao em setembro/05 e que foram revisados em outubro/05. Posteriormente, segundo informao do MEC, tivemos conhecimento de que o documento especfico para lngua espanhola receber o ttulo Orientaes Curriculares Nacionais Lngua Estrangeira Espanhol, diferenciando-se, assim, dos PCNs-EM-Lngua Estrangeira. Ainda segundo o MEC, tais documentos s se tornaro pblicos no decorrer do primeiro semestre de 2006.

  • 25

    auxiliar na percepo e na tolerncia das diferenas entre pessoas e culturas. A

    insero obrigatria de uma lngua estrangeira nos ciclos seguintes do Ensino

    Fundamental visa o aprimoramento dessa relao (j estabelecida inicialmente nas

    primeiras sries do Ensino Fundamental) com outras maneiras de se pensar o

    mundo. Finalmente, esperamos que, no Ensino Mdio, a(s) lngua(s) estrangeira(s)

    possam servir como meio de acesso ao conhecimento tecnolgico e cultural.

    Essa linearidade sugerida anteriormente aparece, tambm, no ltimo

    pargrafo das Consideraes Preliminares dos PCNs de 5. 8. srie:

    Outro pressuposto bsico para a aprendizagem de uma lngua

    estrangeira a necessidade de garantir a continuidade e a sustentabilidade

    de seu ensino.17

    Esse fragmento vem corroborar a idia inicial desta pesquisa: a insero do

    ensino de lnguas estrangeiras, mais precisamente, da lngua espanhola, j nas

    primeiras sries do Ensino Fundamental (ou quem sabe antes ainda?). Permitir que

    o primeiro contato com lnguas estrangeiras acontea naturalmente (ainda que a

    sala de aula no seja um ambiente natural), atravs de jogos e brincadeiras, maneira

    pela qual as crianas aprendem, pode contribuir para se criar, nesses alunos, uma

    base slida de comportamento e de desenvolvimento em direo s lnguas

    estrangeiras.

    Alm de nos pautar pelas leis que regem o ensino de outras lnguas no Brasil

    devemos considerar, tambm, as opinies dos diversos tericos que investigaram

    sobre a questo da lngua estrangeira e as crianas. Passaremos a descrever e

    comentar algumas teorias que tratam dessa questo.

    1.1.2 O que dizem os pesquisadores?

    Antes de entrarmos na questo do ensino de lngua estrangeira para crianas,

    convm explicar a causa da opo pelo ensino e no pela aprendizagem de lngua

    17 Op.cit., p.20.

  • 26

    estrangeira como os estudos mais recentes preconizam e, tambm, conceituar o

    termo lngua estrangeira.

    1.1.2.1 Alguns esclarecimentos

    Primeiramente, optamos por tratar do ensino de lngua estrangeira por

    acreditar que, tendo como foco a atuao do professor, esta pesquisa possa

    colaborar para que ele se conscientize de que, se estiver bem preparado, poder

    melhorar seu desempenho docente e, assim, auxiliar a que os resultados da

    aprendizagem sejam mais positivos.

    Consideramos importante explicar, tambm, que a escolha por tratar de

    lngua estrangeira (e diferenci-la da segunda lngua) refere-se ao fato de que o

    Brasil um pas oficialmente monolnge, ou seja, salvo algumas comunidades

    indgenas e de imigrantes - mas sempre extra-oficialmente - a lngua falada no pas

    a portuguesa. Assim, qualquer lngua que se queira ensinar no territrio nacional

    considerada estrangeira por no se tratar de idioma de comunicao presente no

    cotidiano dos brasileiros.

    De igual significncia comentarmos a diferenciao que se faz entre

    aprendizagem e aquisio de uma lngua estrangeira. Segundo o lingista

    S.D.Krashen (1995: 10), a aprendizagem de um idioma acontece de maneira formal

    e consciente, por meio da qual o aprendiz pode explicitar regras gramaticais desse

    idioma. J a aquisio se d de forma natural (o contato com o idioma acontece

    porque h uma necessidade de comunicao, o que desloca o foco da forma para a

    mensagem) e de maneira inconsciente, ou seja, o indivduo no faz um esforo

    consciente para que ocorra a aquisio. Para esse pesquisador, a aprendizagem

    no se transformar nunca em aquisio. Neste trabalho, fazemos a opo de no

    distinguir aprendizagem de aquisio. Essa opo significa que entendemos,

    diferentemente desse autor, que aprendizagem pode ser transformada em

    aquisio.

  • 27

    Finalmente, consideramos que o termo criana, nesta pesquisa, designa

    alunos com idade entre 6 e 11 anos, normalmente estudantes dos dois primeiros

    ciclos do Ensino Fundamental.

    Esclarecidos esses pontos conceituais, podemos afirmar que este estudo se

    refere formao do professor de um idioma com o qual o aprendiz teria um contato

    mnimo, restringindo-se, provavelmente, sala de aula, nas sries iniciais nas quais

    a lei no prev a obrigatoriedade do ensino de lnguas estrangeiras.

    1.1.2.2 A criana e a lngua estrangeira

    Quando se referem ao aspecto etrio, pesquisadores como Krashen (1995),

    Jalles (2003), Schtz (2004) e Rodrigues (2005) concordam que as crianas at por

    volta de seus 11 anos apropriam-se da lngua estrangeira de forma mais rpida e

    eficiente do que os adultos, mas tanto Krashen quanto Rodrigues chamam a

    ateno para alguns aspectos que acrescentam ressalvas a essa afirmativa.

    Segundo Krashen (1995: 43),

    (...) it is not simply the case that younger is better; children are

    superior to adults only in the long run.18

    J Rodrigues (2005: 82), aps analisar vrias pesquisas19 conclui que

    as crianas parecem realmente apresentar maior ndice de

    aproveitamento quando comparadas aos adultos, principalmente, em

    pronncia, quando esto em ambientes nos quais h grande exposio

    segunda lngua, ou mais especificamente, em situaes naturais de

    aquisio. Entretanto, adolescentes e adultos parecem se sobressair nos

    aspectos morfolgicos e sintticos, quando a aprendizagem ocorre em

    situaes formais, por gozarem de maior controle consciente sobre suas

    atividades cognitivas.

    18 Esta e todas as demais so tradues livres nossas. No simplesmente o caso de quanto mais novo, melhor; crianas superam adultos apenas a longo prazo.. 19 De Snow e Hoefnagel-Hhle, 1978, Olse e Samuels, 1973, Cochrane, 1980, Neufel, 1978, Thompson, 1991, Coppetiers, 1987, Burstall, 1975, Harley, 1986, Oyama, 1976, Patkowski, 1990, Johnson e Newport, 1989, Cummins e Nakajima, 1987 e Riney, 1990.

  • 28

    Embora com ressalvas sobre prazos e aspectos formais da lngua, esses

    pesquisadores reafirmam que o desempenho infantil se sobressai ao do adolescente

    e ao do adulto, ainda mais se considerarmos que o fator scio-cultural

    preponderante no ensino de lngua estrangeira no Brasil como pudemos ver nos

    textos legais, ou seja, a apropriao do idioma estrangeiro aborda questes que vo

    alm dos aspectos formais da lngua.

    Ainda sobre a relao idade e lngua estrangeira, outros pesquisadores

    tambm foram levados em considerao e alguns dos pontos de vista por eles

    defendidos so comentados a seguir.

    Referente especificamente oferta do ensino de lngua estrangeira a crianas

    de 6 a 10 anos (perodo de nosso interesse), a Dra. Maria Lusa Solla20, em seu

    artigo Uma prenda de Natal ou o Papai Noel entrou pela porta dos fundos, lanou

    algumas perguntas sobre a necessidade ou funo desse ensino e que se retomam

    neste estudo por estarem perfeitamente relacionadas ao nosso objeto de pesquisa.

    Escolhemos comear pela seguinte questo por considerarmos que uma

    pergunta anterior e mais abrangente que as demais entre as formuladas pela

    pesquisadora: Nesta idade [antes da 5. srie do ensino bsico] deve a criana

    aprender uma lngua estrangeira ou deve apenas ser sensibilizada a outras lnguas

    e culturas?

    Segundo a experincia da Profa. Cristina Pureza Duarte Bossio21, relatada

    no III Congresso Brasileiro de Hispanistas ocorrido em Santa Catarina, em 2004, a

    criana deve ser, inicialmente, sensibilizada a outras lnguas e culturas, como

    explica a seguir:

    A LE dever servir como motivador para novas descobertas, atravs

    dos temas transversais, no com nfase na lngua, e sim nos interesses

    20 Vice-presidente do Conselho Cientfico do Departamento de Lnguas, Escola Superior de Educao do Instituto Politcnico de Setbal, em Portugal, em seu artigo Uma prenda de Natal ou o Papai Noel entrou pela porta dos fundos http://www.ese.ips.pt/ese/Opiniao/2005/op27_01_2005.htm, acessado em 18.04.2005. 21 Uma prtica reflexiva do ensino de Espanhol nas sries iniciais, http://www.cce.ufsc.br/~lle/ congresso/trabalhos_lingua/Cristina%20Pureza%20Duarte%20Boessio.doc, acessado em 02.05.2005

  • 29

    infantis, por isso a importncia do ldico nessa fase. A LE deve servir como

    instrumento de comunicao e de brincadeira entre essas crianas que se

    encontram totalmente motivadas ao aprendizado do Espanhol.(p.6)

    Como afirma Bossio, importante que a lngua estrangeira seja abordada

    com o propsito de sensibilizar os alunos pequenos para a existncia de outras

    lnguas e outras culturas.22 Apresentar a lngua estrangeira de maneira natural, entre

    brincadeiras que so prprias para essa faixa etria pode ser uma forma de garantir

    a motivao dos alunos para o aprendizado, alm de no os sobrecarregar com a

    formalidade estrutural que vero num momento mais adequado, a partir da 5.srie,

    por exemplo.

    Entretanto, ao proporcionar os primeiros contatos com a lngua estrangeira,

    conveniente que os professores estejam conscientes da importncia que o ldico

    tem na formao das crianas e que procurem a melhor forma de conduzir esses

    contatos, sem causar dificuldades futuras na relao aluno-lngua estrangeira.

    Quando pensamos em criana, pensamos em jogos e brincadeiras. o ldico

    presente. Como bem expem Cunha e Nascimento (2005: 14)

    Brincar fundamental porque brincando a criana expressa

    necessidades e desenvolve potencialidades. O desafio contido nas situaes

    ldicas provoca o pensamento, exercita habilidades e leva a criana a

    alcanar nveis de desempenho que s as aes por motivao intrnseca

    conseguem.

    Brincando a criana aprende a engajar-se nas atividades

    gratuitamente, sem visar recompensas ou temer punies.23

    Compartilhamos da mesma opinio de Bossio (2004) e de Cunha e

    Nascimento (2005): a aprendizagem deve ser prazerosa. Isso significa que, para as

    crianas, a motivao est intimamente ligada ao ldico, ao prazer de brincar. Se os

    primeiros contatos com a lngua estrangeira no trouxerem prazer s crianas, estas

    podero desenvolver um receio, um afastamento e, porque no dizer, uma repulsa

    22 Essa viso est de acordo com as recomendaes dos PCNs, como visto no item 1.1. 23 Sobre motivao intrnseca, ver Callegari, 2004.

  • 30

    contra outros idiomas e sua aprendizagem. Desenvolvida a repulsa, quando houver

    a necessidade de estudar uma lngua estrangeira obrigatoriamente (a partir da 5.

    srie do Ensino Fundamental), essa criana poder vir a obter um desempenho

    insatisfatrio que poder ser-lhe prejudicial por toda sua vida.

    A pergunta seguinte est intimamente relacionada exposio anterior e

    tambm foi lanada por Solla (2005): Para que serve a lngua estrangeira s

    crianas desta idade?

    Tomando como exemplo o ensino de lngua espanhola no Brasil, em situao

    de fronteira, como o caso, por exemplo, de Foz do Iguau, municpio paranaense

    cujo governo municipal instituiu a obrigatoriedade da presena desse idioma no

    Ensino Fundamental I, ou da cidade fronteiria Dionsio Cerqueira (SC), onde o

    ento ministro da Educao Tarso Genro lanou o primeiro projeto de escola

    bilnge do Brasil24, o objetivo comunicativo pode e deve ser levado em conta como

    subsdio para a discusso sobre ensinar ou no lngua estrangeira para crianas.

    Esses indivduos mantm contato estreito com falantes do castelhano e, por isso,

    supe-se que seja conveniente que tenham a oportunidade de estudar esse idioma

    na escola.

    Porm, a situao de fronteira embora a fronteira brasileira com pases

    hispanoparlantes seja grande no a preocupao principal deste trabalho, posto

    que a incluso do ensino do castelhano para crianas crescente em vrias outras

    localidades do pas. Em cidades no-fronteirias como Campinas (SP), So Paulo

    (SP), Santo Andr (SP), Rio de Janeiro (RJ), Porto Alegre (RS), por exemplo, h

    uma oferta crescente de lngua espanhola para alunos das primeiras sries Ensino

    Fundamental em escolas particulares. Dessa forma, a segunda pergunta lanada por

    Solla poderia ser reformulada para: quais seriam os objetivos do ensino de espanhol

    para as crianas em escolas de cidades no-fronteirias?

    24 Instituto de Investigao e Desenvolvimento em Poltica Lingstica Escolas bilnges em reas de fronteira Notcias > Banco de Dados sobre as Escolas Bilnges de Fronteira > Artigos (03 03 2005), www.ipol.com.br, acessado em 03.05.2005.

  • 31

    Uma das finalidades desse ensino poderia ser a oferta, aos alunos de 1 a 4

    sries, de oportunidades de conhecer e melhor compreender culturas diferentes da

    sua, como propem Bossio (2004) e os PCNs, evitando o estigma do preconceito

    que aparece com freqncia quando se tem contato com aquilo que diferente.

    Outra finalidade seria favorecer o surgimento e desenvolvimento de atitudes

    positivas dos alunos em relao ao processo de aprendizagem de uma lngua

    estrangeira, o que poderia levar os estudantes a encarar essa aprendizagem de

    forma significativa, prazerosa e interessante, dependendo de como acontea seu

    ensino. certo que esse favorecimento pode ocorrer com o ensino de qualquer

    lngua estrangeira, desde que inserida no contexto da comunidade do aluno; no

    nosso caso, o interesse especfico recai sobre a lngua espanhola.

    A pergunta subseqente, formulada pela Dra. Solla, diz respeito idade ideal

    para a aprendizagem de lngua estrangeira: H uma idade ptima [sic] para se

    iniciar a aprendizagem de uma lngua estrangeira?

    Para muitos pesquisadores, como Jalles (2003) e Schtz (2004) entre outros,

    deve-se considerar o fator idade na aquisio da lngua estrangeira, ou seja, em

    seus estudos afirmam que h um perodo ideal ou idade limite para a aquisio de

    idiomas, que se estenderia at a puberdade. Porm, outros estudiosos j

    comentados anteriormente, como Rodrigues (2005: 82), constataram que em

    situao natural as crianas levam vantagem na aquisio de idioma estrangeiro,

    mas em situao formal de sala de aula, adultos e adolescentes se mostraram mais

    aptos utilizao da lngua estrangeira.

    Jalles (2003: 101) comenta os trabalhos de Lenneberg sobre a lateralizao

    do crebro e sobre a idade crtica ao afirmar que, segundo este pesquisador, se uma

    criana sofrer algum dano no hemisfrio esquerdo (onde est localizada a funo da

    linguagem) antes dos 13 anos, poder reaprender a linguagem usando o lado direito

    do crebro. O mesmo no pode acontecer com adolescentes mais velhos ou

    adultos. Esse fato poderia indicar que o mesmo acontece com a aquisio de lngua

    estrangeira.

  • 32

    A favor, tambm, do ensino de lnguas estrangeiras para crianas pequenas,

    Schtz, em seu artigo A idade e o aprendizado de lnguas25, comenta que:

    O estudo dos diferentes fatores que afetam o desenvolvimento

    cognitivo do ser humano pode ajudar a explicar o fenmeno da idade crtica.

    Os principais fatores so:

    a) fatores biolgicos

    b) fatores cognitivos

    c) fatores de ordem afetiva

    d) o ambiente e o input lingstico (p.1)

    A seguir, expomos, brevemente, as explicaes dos diversos fatores que,

    segundo Schtz, esto implicados na aquisio da lngua estrangeira.

    a) Fatores biolgicos

    O principal fator biolgico, de acordo com Schtz, diz respeito lateralizao

    do crebro. Esse estudo, feito anteriormente por Lenneberg (1967) foi o mesmo

    utilizado por Jalles (2004), j citado.

    Outro fator biolgico citado por Schtz a acuidade auditiva, a que Assis-

    Peterson e Gonalves (2001: 17) denominam acuidade sensorial. Trata-se da

    habilidade que as crianas teriam em perceber e segmentar os sons da L2 com mais

    propriedade do que um adulto por este apresentar uma deteriorao dessa

    habilidade.

    Schtz menciona, ainda, a existncia de outra hiptese que considera

    favorvel a aprendizagem de uma lngua estrangeira em idades precoces: a

    hiptese de Harpaz26.

    Diz a hiptese de Harpaz que a aquisio da fala e a aquisio de conceitos

    so processos que ocorrem de forma paralela na criana, pois as suas interaes

    25 Ricardo SCHTZ. A Idade e o Aprendizado de Lnguas. 2004. 26 Y.HARPAZ. Myths and misconceptions in cognitive science. 2002.

  • 33

    lingsticas proporcionam a aquisio desses conceitos. Conseqentemente, as

    estruturas neurais no crebro que correspondem aos conceitos aprendidos acabam

    natural e intimamente associadas s estruturas neurais que correspondem s formas

    da lngua. O adulto, que j possui conceitos formados e estruturas neurais

    correspondentes fixas, apresenta maior dificuldade em associar as novas estruturas

    da lngua estrangeira s suas estruturas neurais j fixas.

    b) Fatores cognitivos

    Sobre os fatores cognitivos que atuam na aquisio de uma lngua

    estrangeira Schtz cita, primeiramente, a formao fonolgica. Na criana, a matriz

    fonolgica ainda no est completa. Durante o seu processo de formao a criana

    tem a possibilidade de expandir sua matriz fonolgica com a aquisio dos fonemas

    das lnguas estrangeiras com as quais tem contato, alm daqueles de sua lngua

    materna. J o adulto monolnge apresenta essa matriz fonolgica completa e

    sedimentada, hbil em compreender e produzir apenas os fonemas da sua lngua

    materna, o que dificulta a aprendizagem de outros idiomas.

    Schtz aponta como outro fator cognitivo que contribui para a assimilao de

    uma lngua estrangeira a hiptese de Krashen sobre a diferena entre aquisio e

    aprendizagem, conforme comentamos anteriormente. Diz Krashen (1995) que existe

    uma predominncia da aquisio sobre a aprendizagem no desenvolvimento de

    proficincia em lnguas. A aquisio de uma lngua, segundo este pesquisador,

    acontece num ambiente natural, de maneira intuitiva, inconsciente, em situaes

    reais e concretas de interao humana. J a aprendizagem o estudo formal, ou

    seja, o ato de receber e acumular informaes e transform-las em conhecimento

    por meio de esforo intelectual e de capacidade de raciocnio lgico. Tanto o esforo

    intelectual quanto a capacidade de raciocnio lgico no fazem parte das habilidades

    de uma criana at seus onze ou doze anos.27 possvel entender, ento, a razo

    pela qual Schtz afirma que a criana tem maior facilidade que o adulto em

    apreender novas informaes das lnguas estrangeiras e reproduzi-las de forma

    27 Sobre estas questes, remetemos a Piaget (1972).

  • 34

    criativa, ou seja, capaz de produzir, na lngua estrangeira, frases novas sem t-las

    ouvido antes.

    c) Fatores de ordem afetiva

    Ainda apoiado em Krashen, Schtz aponta a teoria do filtro afetivo. Sem

    experincias frustrantes anteriores, as crianas possuem o filtro afetivo baixo, isto ,

    no se apresentam ansiosas, receosas em errar. Dessa forma, a aquisio da lngua

    estrangeira acontece naturalmente, com autoconfiana elevada e com alta

    motivao. Com os adultos isso nem sempre acontece, pois muitas vezes se sentem

    pressionados a no cometer erros ou possuem experincias anteriores negativas e,

    ao terem contato com uma lngua estrangeira, as alteraes no filtro afetivo (alta

    ansiedade, pouca autoconfiana e baixa motivao) impedem que a aquisio da

    lngua estrangeira ocorra de forma natural.

    d) o ambiente e o input lingstico

    Novamente Schtz toma como base uma hiptese da teoria de Krashen. A

    hiptese do input compreensvel aborda a idia de que a aquisio/aprendizagem de

    uma lngua acontece quando se est exposto a uma linguagem um pouco alm da

    capacidade de compreenso que o aprendiz possui em dado momento. Ao se

    comunicarem, os adultos no se preocupam em adaptar sua linguagem para serem

    compreendidos, mesmo que um deles no tenha pleno conhecimento do idioma do

    outro. Com crianas, a tendncia do adulto simplificar seu linguajar para fazer-se

    compreender. Numa situao de comunicao, a probabilidade de a criana receber

    input compreensvel maior do que a do adulto em situao semelhante.

    Dessa forma, Schtz corrobora a idia de que essa a faixa etria ideal para

    a aprendizagem de lnguas estrangeiras, sempre que se tenha como objetivo

    compreenso e produo similar de um falante nativo, ou seja, aproximao a uma

    situao de bilingismo28.

    28 Segundo Renzo TITONE, Psicolingstica Aplicada, p.147, o bilingismo a capacidade que uma pessoa tem de passar de um cdigo lingstico a outro sem ter que valer-se da traduo de um no outro.

  • 35

    A questo do ensino de lngua estrangeira para crianas preocupa, como

    brevemente apontamos, tanto legisladores quanto pesquisadores. Entretanto, eles

    no so os nicos envolvidos diretamente nessa questo; da que no prximo tpico

    enfoquemos a viso que os pais tm acerca desse assunto.

    1.1.3 Qual a postura dos pais29?

    uma realidade, hoje em dia, o nmero crescente de pais que busca escolas

    que ofeream cada vez mais oportunidades de aprendizagem a seus filhos em

    idades cada vez menores. Um dos motivos sugeridos por Pires (2001: 6) a

    preocupao antecipada desses pais em relao qualificao e empregabilidade

    futura de seus filhos. A pesquisadora explica que

    a preocupao geral com o desemprego e qualificao profissional

    que garanta um futuro estvel financeiramente tem levado os pais a procurar

    cada vez mais cedo o ensino de ingls e de informtica para seus filhos,

    como forma de garantir-lhes possibilidades de competir por um lugar no

    mercado de trabalho.

    Quando a escola eleita para seus filhos oferece tambm a lngua espanhola,

    os pais passam a considerar essa oferta como um benefcio a mais, pois um

    segundo idioma poder trazer vantagens quando essas crianas estiverem

    crescidas: tero adquirido um diferencial cultural em relao maioria da populao

    por terem tido contato com uma segunda lngua estrangeira. Tal linha de raciocnio

    pode se tornar promessa de portas abertas para uma colocao profissional

    diferenciada.

    Porm, h pais que se preocupam tambm com a qualidade dessa oferta. Em

    conversa informal com uma me, ela se mostrou receosa em relao maneira com

    que a lngua espanhola estava sendo oferecida a sua filha na 1 srie do Ensino

    Fundamental. Dizia que, quando as aulas de espanhol comearam, sua filha ficou 29 Dado que dificilmente pais de crianas na faixa etria em estudo se dispem a participar de pesquisas ao menos esse foi o nosso caso , optamos por no generalizar as opinies coletadas informalmente com os pais de uma nica criana. Valemo-nos, tambm, de idias que circulam, de maneira mais ou menos estendida, no ambiente escolar infantil e em alguns trabalhos acadmicos.

  • 36

    muito animada. Entretanto, essa disposio para a aprendizagem diminuiu

    sensivelmente quando a professora comeou a solicitar em sala de aula e em provas

    formais a leitura e a escrita na lngua estrangeira. Essa me contou que a filha no

    conseguia assimilar as diferenas entre a lngua espanhola e a lngua portuguesa

    (uso de apenas um s em espanhol, modalidade escrita, frente a dois em portugus,

    palavras terminadas por n em espanhol e por m em portugus, para citar apenas

    alguns exemplos) e que estava disposta a conversar com a professora de espanhol

    sobre isso para sugerir que as aulas seguissem com canes e atividades menos

    formais, como haviam sido no incio do curso.

    Dessa entrevista informal com essa me foi possvel depreender que a

    referida professora poderia se encontrar em uma de duas situaes. Primeira: a

    direo da escola no compreendeu os objetivos do curso e reorientou as atividades

    da professora, exigindo dela o cumprimento de um currculo equivalente aos

    destinados a cursos para alunos das etapas posteriores (3 e 4 ciclos do Ensino

    Fundamental, por exemplo); segunda: ausncia de uma formao adequada e

    especfica que a levou a lanar mo das estratgias mais freqentes (muitas vezes

    direcionadas a alunos mais velhos), isto , nfase na modalidade escrita da lngua.

    Tanto a primeira situao quanto a segunda demonstram a necessidade de

    uma preparao mais condizente dos profissionais que lidam com lngua estrangeira

    em sala de aula de crianas de at 11 anos: obter informaes e refletir sobre

    aquisio/aprendizagem de lnguas estrangeiras (no caso de ser verdadeira a

    primeira situao) e conhecer algumas teorias sobre a aprendizagem e

    desenvolvimento infantil, bem como quais so as melhores atividades para colaborar

    para esse desenvolvimento (no caso de ser verdadeira a segunda situao).

    No item seguinte descrevemos resumidamente algumas das principais teorias

    sobre o desenvolvimento infantil e sua relao com a aquisio/aprendizagem de

    lnguas estrangeiras que podero ser teis para profissionais que se encontram em

    situaes como as descritas anteriormente.

  • 37

    1.2. As teorias de aprendizagem e o ensino de lnguas

    estrangeiras a crianas

    A aprendizagem de lnguas estrangeiras foi e continua sendo alvo de

    muitos estudos, pois os fatores que intervm nesse processo so responsveis no

    todo ou em parte pelo seu sucesso ou fracasso e, portanto, o conhecimento das

    diferentes teorias que procuram explicitar e explicar tais fatores de fundamental

    importncia.

    Nesse sentido, torna-se relevante especificar, mesmo que brevemente,

    algumas das caractersticas prprias de crianas de 6 a 11 anos, pblico que nos

    interessa, bem como das principais teorias de aprendizagem propostas por alguns

    estudiosos.

    De maneira geral, so trs as principais teorias de aprendizagem humana: a

    teoria behaviorista ou comportamentalista, a teoria psicogentica e a teoria scio-

    interacionista.

    1.2.1 A teoria behaviorista

    O behaviorismo ou comportamentalismo foi uma tentativa de se construir um

    modelo terico luz das Cincias Naturais cuja origem est na teoria de Descartes.

    So caractersticas das Cincias Naturais:

    o empirismo, no qual os eventos e fatos devem ser fisicamente

    detectados, confrontveis e mensurveis;

    o determinismo, relao de causa e efeito, sem a interveno do

    acaso, em que se pressupe uma ordem nos acontecimentos;

    a parcimnia, ou seja, o princpio da simplicidade: deve-se considerar

    verdadeira a hiptese mais simples que explica um determinado fato;

    a manipulao cientfica, na qual se busca a objetividade ao valer-se

    da descrio operacional e que pode empregar os seguintes

    procedimentos:

  • 38

    o o mtodo da experimentao, no qual se deve alterar apenas

    uma varivel e manter fixas as outras para se conhecer o efeito

    de um nmero de variveis num determinado objeto e, assim,

    elaborar leis cientficas, ou seja, leis universais;

    o o mtodo da observao, no qual se deve observar um

    fenmeno diversas vezes para se chegar s leis universais.

    Pode-se classificar o behaviorismo em trs correntes: a metodolgica, a

    radical e a social. A corrente que mais influenciou o ensino de lnguas estrangeiras

    foi a radical, com seu terico principal B.F.Skinner. Essa gerao foi conhecida como

    radical porque negava a existncia de tudo o que escapa do mundo fsico e,

    tambm, porque no exclua nenhum padro de comportamento.

    Para Skinner (1974), os eventos internos eram continuidade dos eventos

    externos e no objetos diferentes. Assim, afirmava que o comportamento era unitrio

    e a diviso entre interno e externo era feita somente para se proceder anlise.

    Sustentava, ainda, que internamente havia comportamentos que tambm seriam

    aprendidos, embora a prpria meno de internamente no fosse aceitvel para os

    tericos dessa gerao.

    A maneira de se estudar os comportamentos se dava pelo estudo do

    chamado comportamento verbal. Os dados verbais passaram a ser considerados

    como expresso do comportamento interno. Dessa forma, o dado verbal foi aceito

    como estudvel. A obteno do dado verbal era efetuada atravs do relato que um

    indivduo fazia de seu comportamento interno e, para os behavioristas radicais, esse

    comportamento seguia as mesmas regras dos eventos externos, ou seja, o que se

    pensava e o que se sentia eram padres de comportamento aprendidos. Os

    behavioristas radicais, ao estudarem comportamentos internos, no deixaram de

    lado a idia de ambiente. Para eles, existia tambm o ambiente interno identificado

    como histria pessoal e/ou experincia anterior.

    Skinner definiu o comportamento de forma mais ampla: no eram respostas,

    pois a Biologia que as estuda; no era estmulo, pois a Fsica que o estuda.

    Dessa forma, o objeto a ser estudado era a relao entre o estmulo e as respostas,

  • 39

    ou seja, as relaes funcionais entre estmulo e resposta e, assim, Skinner

    estabeleceu que o comportamento era o conjunto de condies e respostas.

    Os pressupostos do behaviorismo so:

    a) quase a totalidade do comportamento aprendida (o

    homem nasce com um aparelho que o torna capaz de falar;

    o que vai falar aprendido.);

    b) a noo de normalidade relativa; o padro de

    funcionamento social;

    c) os comportamentos inadequados apresentam histria e so

    mantidos por contingncias persistentes;

    d) ao reconhecer as contingncias de um comportamento,

    pode-se alter-lo alterando as contingncias.

    Para a compreenso do behaviorismo, necessrio conhecer seus conceitos

    bsicos, includos a seguir.

    a) comportamento reflexo e operante:

    a1) comportamento reflexo um comportamento aprendido atravs do reflexo

    condicionado, isto , quando um estmulo elicia uma resposta incondicionada (no

    aprendida). Nesse caso, o estmulo antecedente controla a resposta (S > R30). Pode-

    se dizer que a maioria das respostas emocionais classificada como

    comportamento reflexo. Se o estmulo for pareado (associado) repetidas vezes com

    um estmulo neutro, esse estmulo neutro adquirir as propriedades do estmulo

    incondicionado. Isso ter como resultado um comportamento condicionado. Por

    exemplo: se a ca