um projeto para o serviço social crítico - unila.edu.br · ver reforçada sua margem de manobra...

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Um projeto para o Serviço Um projeto para o Serviço Um projeto para o Serviço Um projeto para o Serviço Um projeto para o Serviço Social crítico Social crítico Social crítico Social crítico Social crítico A critical Social Work project A critical Social Work project A critical Social Work project A critical Social Work project A critical Social Work project Carlos Montaño Carlos Montaño Carlos Montaño Carlos Montaño Carlos Montaño Doutor em Serviço Social. Professor e investigador da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ. Documento original apresentado no Fórum de Debate La profesionalización del Trabajo Social en el siglo XXI : rupturas y continuidades – de la Reconceptualización al proyecto Ético- Político , no marco do Encuentro Latinoamericano de Trabajo Social . Universidad Nacional de La Plata, Argentina, 25 a 27 de agosto de 2005. Tradução de Santo Gabriel Vaccaro do original Un proyecto para el Servicio Social crítico. R R R esumo esumo esumo esumo esumo As transformações sociais contem- porâneas, operadas pela programática neoliberal sob o comando do capital financeiro, trazem novos desafios ao conjunto de cidadãos e de homens e mulheres que vivem da venda de sua força de trabalho. Os assistentes sociais, individual e coletivamente, não são alheios a esta realidade. A profissão já se caracterizou por enfrentar estes desafios, questionando e problematizando seu papel na sociedade, tentando assumir perfis mais críticos e comprometidos com os interesses dos trabalhadores e dos setores subalter- nos. Exemplo disso são o “Movimento de Reconceptualização” e a posterior tentativa de definir um “Serviço Social Alternativo” preocupado com o sentido de sua prática, com o processo de conhecimento crítico, com a crítica ao capitalismo e às situações de injustiça social. Os desafios atuais levam a, superando anteriores debilidades, construir coletivamente um projeto ético- político profissional que possa enfrentar com competência e compromisso, no interior das forças sociais progressistas, as condições nas quais vivem os trabalha- dores (com e sem emprego) e os demais setores subalternos. Palavras-chave: Serviço Social crítico, projeto ético-político, Serviço Social e neoliberalismo. A A A bstract bstract bstract bstract bstract Contemporary social transformations, operated by the neoliberal program under the command of financial capital, bring new challenges to the group of citizens and men and women who live by the sale of their labor power. Social workers, individually and collectively, are not separate from this reality. The profession was characterized by its confrontation with these challenges and its questioning and analysis of its role in society, in its attempt to assume more critical profiles and commitments to the interests of workers and the subaltern sectors. An example of this is the “Reconceptualization Move- ment” and the later attempt to define an “Alternative Social Service” concerned with the meaning of its practice, with the process of critical knowledge, with a criticism of capitalism and its situations of social injustice. The current challenges include overcoming earlier weaknesses, collectively constructing an ethical- political professional project that can competently and committedly confront, at the heart of progressive social forces, the conditions in which workers live (with or without employment) as well as other subaltern populations. Key words: critical Social Work, ethical- political project, Social Work and neolibe- ralism. KA KA KA KA KA TÁL TÁL TÁL TÁL TÁL YSIS v YSIS v YSIS v YSIS v YSIS v . 9 n. 2 jul./dez. 2006 Florianópolis SC 141-157 . 9 n. 2 jul./dez. 2006 Florianópolis SC 141-157 . 9 n. 2 jul./dez. 2006 Florianópolis SC 141-157 . 9 n. 2 jul./dez. 2006 Florianópolis SC 141-157 . 9 n. 2 jul./dez. 2006 Florianópolis SC 141-157

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Um projeto para o ServiçoUm projeto para o ServiçoUm projeto para o ServiçoUm projeto para o ServiçoUm projeto para o ServiçoSocial críticoSocial críticoSocial críticoSocial críticoSocial crítico

A critical Social Work projectA critical Social Work projectA critical Social Work projectA critical Social Work projectA critical Social Work project

Car los MontañoCar los MontañoCar los MontañoCar los MontañoCar los Montaño

Doutor em Serviço Social.

Professor e investigador da UniversidadeFederal do Rio de Janeiro – UFRJ.

Documento original apresentado noFórum de Debate La profesionalizacióndel Trabajo Social en el siglo XXI:rupturas y continuidades – de laReconceptualización al proyecto Ético-Político, no marco do EncuentroLatinoamericano de Trabajo Social.Universidad Nacional de La Plata,Argentina, 25 a 27 de agosto de 2005.

Tradução de Santo Gabriel Vaccaro dooriginal Un proyecto para el ServicioSocial crítico.

RRRRR esumoesumoesumoesumoesumoAs transformações sociais contem-

porâneas, operadas pela programáticaneoliberal sob o comando do capitalfinanceiro, trazem novos desafios aoconjunto de cidadãos e de homens emulheres que vivem da venda de sua forçade trabalho. Os assistentes sociais,individual e coletivamente, não são alheiosa esta realidade. A profissão já secaracterizou por enfrentar estes desafios,questionando e problematizando seu papelna sociedade, tentando assumir perfis maiscríticos e comprometidos com os interessesdos trabalhadores e dos setores subalter-nos. Exemplo disso são o “Movimento deReconceptualização” e a posterior tentativade definir um “Serviço Social Alternativo”preocupado com o sentido de sua prática,com o processo de conhecimento crítico,com a crítica ao capitalismo e às situaçõesde injustiça social. Os desafios atuais levama, superando anteriores debilidades,construir coletivamente um projeto ético-político profissional que possa enfrentarcom competência e compromisso, no interiordas forças sociais progressistas, ascondições nas quais vivem os trabalha-dores (com e sem emprego) e os demaissetores subalternos.

Palavras-chave: Serviço Social crítico,projeto ético-político, Serviço Social eneoliberalismo.

AAAAA bstractbstractbstractbstractbstractContemporary social transformations,

operated by the neoliberal program underthe command of financial capital, bringnew challenges to the group of citizensand men and women who live by the saleof their labor power. Social workers,individually and collectively, are notseparate from this reality. The professionwas characterized by its confrontation withthese challenges and its questioning andanalysis of its role in society, in its attemptto assume more critical profiles andcommitments to the interests of workersand the subaltern sectors. An example ofthis is the “Reconceptualization Move-ment” and the later attempt to define an“Alternative Social Service” concernedwith the meaning of its practice, with theprocess of critical knowledge, with acriticism of capitalism and its situations ofsocial injustice. The current challengesinclude overcoming earlier weaknesses,collectively constructing an ethical-political professional project that cancompetently and committedly confront, atthe heart of progressive social forces, theconditions in which workers live (with orwithout employment) as well as othersubaltern populations.

Key words: critical Social Work, ethical-political project, Social Work and neolibe-ralism.

KAKAKAKAKATÁLTÁLTÁLTÁLTÁLYSIS vYSIS vYSIS vYSIS vYSIS v. 9 n. 2 jul./dez. 2006 Florianópolis SC 141-157. 9 n. 2 jul./dez. 2006 Florianópolis SC 141-157. 9 n. 2 jul./dez. 2006 Florianópolis SC 141-157. 9 n. 2 jul./dez. 2006 Florianópolis SC 141-157. 9 n. 2 jul./dez. 2006 Florianópolis SC 141-157

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1 O capital e sua cr ise: inf lexões nas1 O capital e sua cr ise: inf lexões nas1 O capital e sua cr ise: inf lexões nas1 O capital e sua cr ise: inf lexões nas1 O capital e sua cr ise: inf lexões naspolíticas sociais e no Serviço Socialpolíticas sociais e no Serviço Socialpolíticas sociais e no Serviço Socialpolíticas sociais e no Serviço Socialpolíticas sociais e no Serviço Social

1.1 O capital, as políticas sociais e o Serviço1.1 O capital, as políticas sociais e o Serviço1.1 O capital, as políticas sociais e o Serviço1.1 O capital, as políticas sociais e o Serviço1.1 O capital, as políticas sociais e o ServiçoS o c i a lS o c i a lS o c i a lS o c i a lS o c i a l

É com o desenvolvimento do capitalismomonopolista, sua expansão produtivo-co-mercial consolidada após a Segunda Guerra

(1945) e com as lutas de classes, que surge e se expandeum padrão de resposta às manifestações da “questão soci-al”, fundamentalmente mediante a intervenção das políti-cas sociais estatais1 . No marco destas, cria-se um espaçosocioocupacional que será parcialmente ocupado por umaemergente profissão, o Serviço Social2 . Este surgimentoda profissão muitas vezes foi confundido com a evoluçãodas “formas não-profissionais de ajuda” para sua“profissionalização”3 . Na verdade, a profissão de ServiçoSocial surge e se expande embrionariamente vinculada aosurgimento e à expansão das políticas sociais estatais. Es-tas últimas constituem-se, assim, na “base de sustentaçãofuncional-ocupacional” da profissão4 . O assistente socialsurge como implementador das políticas sociais; dessa for-ma, o que sucede com estas, atinge e afeta aquele.

Assim, as políticas sociais constituem instrumentos deintervenção estatal funcionais ao então projeto hegemônicodo capital (produtivo), embora tensa e contraditoriamenterepresentem conquistas das classes trabalhadoras e su-balternas. Direitos conquistados para ter certas necessi-dades atendidas pelo Estado, o que por sua vez significaque o status quo e a acumulação capitalista permaneceminalterados.

O sentido social das políticas sociais (sua função dereprodução do sistema socioeconômico e político e dostatus quo) e sua tensão e contradição internas (consti-tuir direitos conquistados pelas classes subalternas) sãotransferidos para aqueles atores que com elas trabalham:os assistentes sociais. Estes passam a ter, em sua prática,o sentido social das políticas sociais. Com isto, apareceuma primeira determinação da prática profissional:

· o Serviço Social constitui (a partir de sua vinculaçãoembrionária com as políticas sociais) uma engre-nagem na reprodução das relações sociais e dosistema dominante; sua prática social resulta fun-cional à manutenção da ordem social e às rela-ções capitalistas (a exploração do trabalho, o con-trole social, a diminuição das lutas sociais e a acu-mulação de capital).

Mas esta afirmação não pode ignorar as outras duasdeterminações desta prática:

· o Serviço Social desenvolve sua intervenção emum espaço de tensão e contradição entre suafunção de reprodução do sistema (a partir dos inte-

resses hegemônicos do grande capital) e sua defe-sa dos direitos e conquistas sociais (a partir de de-mandas e de lutas das classes trabalhadoras e su-balternas); isto reflete uma prática profissional queé essencialmente política, inserida no interior dascontradições entre as classes, ocupando um espa-ço de disputa de interesses5;

· o Serviço Social, condicionado pelas estruturas soci-ais e pelas demandas institucionais (geralmente re-presentantes dos interesses hegemônicos), ainda as-sim pode apresentar um certo protagonismo e umamargem de manobra relativa ao orientar sua açãoprofissional; na medida em que dirige seu processo deformação não meramente para o atendimento diretodas demandas institucionais, mas formando um pro-fissional crítico e competente, que organize o coletivoem entidades fortes e representativas e que consolidecódigos de ética claramente orientados em certos va-lores definidos coletivamente, o assistente social podever reforçada sua margem de manobra para uma prá-tica profissional que, sem eliminar oscondicionantes sistêmicos, privilegie a garantiados direitos sociais conquistados.

Logicamente esta última determinação da prática pro-fissional só pode ter fundamento a partir da existênciade um projeto profissional com suas dimensões ética epolítica, construído coletivamente, que reforce esteprotagonismo relativo do corpo profissional. Sem isso,deriva-se inevitavelmente no “messianismo” das vonta-des e opções individuais ou no “fatalismo” que reside naresignação a respeito dos condicionantes sistêmicos.

1.2 A crise do capital e a resposta neoliberal1.2 A crise do capital e a resposta neoliberal1.2 A crise do capital e a resposta neoliberal1.2 A crise do capital e a resposta neoliberal1.2 A crise do capital e a resposta neoliberal

É consenso entre os intelectuais que o sistema capita-lista, após quase 30 anos de clara expansão econômica(1945-1973), ingressa em uma profunda crise: do seu pa-drão de produção (fordista), do seu sistema de regulação(keynesiano), do seu Estado (de Bem-Estar Social), dotipo de trabalhador (especializado), da sua racionalidade(positivista), crise fiscal, do padrão dólar, das fontesenergéticas (petróleo), do subconsumo. Na realidade, oque se observa hoje é uma crise geral, sistêmica.

Diante de tal fenômeno, a fração da classe hegemônica(o grande capital financeiro) aliada aos capitais nacionaisdesenvolve uma nova forma de enfrentar a crise, por umlado ampliando a exploração do trabalhador e, por outro, sub-jugando os pequenos e médios capitais. Surge assim, posteri-ormente a um surto de ditaduras militares, a nova respostado capital à crise: o projeto neoliberal. A programáticaneoliberal representa, portanto, a atual estratégiahegemônica de reestruturação geral do capital (que paraa América Latina segue o receituário do Consenso de Wa-shington, de 1989) frente à crise e às lutas de classes, e que

1 43143143143143Um pro jeto para o Serv iço Soc ia l cr ít icoUm pro jeto para o Serv iço Soc ia l cr ít icoUm pro jeto para o Serv iço Soc ia l cr ít icoUm pro jeto para o Serv iço Soc ia l cr ít icoUm pro jeto para o Serv iço Soc ia l cr ít ico

KAKAKAKAKATÁLTÁLTÁLTÁLTÁLYSIS vYSIS vYSIS vYSIS vYSIS v. 9 n. 2 jul./dez. 2006 Florianópolis SC 141-157. 9 n. 2 jul./dez. 2006 Florianópolis SC 141-157. 9 n. 2 jul./dez. 2006 Florianópolis SC 141-157. 9 n. 2 jul./dez. 2006 Florianópolis SC 141-157. 9 n. 2 jul./dez. 2006 Florianópolis SC 141-157

deriva basicamente em três frentes articuladas: o combateao trabalho (às leis e políticas trabalhistas e às lutas sindi-cais e da esquerda) e as chamadas “reestruturação produ-tiva” e “(contra-)reforma do Estado”6 .

1.3 Repercussões nas conquistas das classes1.3 Repercussões nas conquistas das classes1.3 Repercussões nas conquistas das classes1.3 Repercussões nas conquistas das classes1.3 Repercussões nas conquistas das classessubalternas e no Serv iço Socialsubalternas e no Serv iço Socialsubalternas e no Serv iço Socialsubalternas e no Serv iço Socialsubalternas e no Serv iço Social

Nesse sentido, dadas as substanciais transformaçõesno mundo do trabalho, de tal forma a afetar a realidadedas classes trabalhadoras, principais usuárias das políti-cas sociais, e dadas as alterações desenvolvidas no âmbi-to dos Estados nacionais, organismos responsáveis, porexcelência, pelas respostas às refrações da “questão so-cial”, sendo as políticas sociais mediações entre o Estadoe as classes sociais, pode-se então afirmar que, conse-qüentemente, as políticas sociais no atual contextoneoliberal são substancialmente alteradas em suas orien-tações e em sua funcionalidade.

Como solução parcial à crise capitalista, o neoliberalismopretende a reconstituição do mercado livre, reduzindo e in-clusive eliminando a intervenção social do Estado em di-versas áreas e atividades. Assim, nessa nova estratégiahegemônica (neoliberal) do grande capital, é concebido umnovo tratamento à “questão social”. Cria-se uma modali-dade polimórfica de respostas às necessidades individuais,diferentes conforme o poder aquisitivo de cada pessoa. Por-tanto, tais respostas não constituiriam um direito, mas umaatividade filantrópica/voluntária ou um serviçocomercializável; também a qualidade dos serviços respon-de ao poder aquisitivo da pessoa; a universalização cedelugar à focalização e à municipalização; a “solidariedadesocial” passa a ser localizada, pontual, identificada com aauto-ajuda e com a ajuda-mútua.

É assim que, no que concerne ao novo tratamento da“questão social”, a orientação das políticas sociais esta-tais é alterada de forma significativa. Elas são privatizadas,transferidas ao mercado e/ou inseridas na sociedade civil;por sua vez, contra o princípio universalista e de direito decidadania, são focalizadas, isto é, dirigidas exclusivamenteaos setores portadores de necessidades pontuais, o quepermite sua precarização; finalmente, elas são tambémdescentralizadas admi-nistrativamente, levandoas regiões pobres a terque se contentar com aadministração de recursosinsuficientes para suasrespostas sociais7 .

Com isto ocorrem,por um lado, claras per-das de direitos conquis-tados pelos trabalhado-res e setores subalternos

da sociedade, particularmente em relação às já precáriasestruturas de atenção, assistência e segurança social. Pas-sa-se da política social e da assistência social como umdireito do cidadão (garantido pela ação estatal) para a açãovoluntária, filantrópica, assistencialista, clientelista (desen-volvida no âmbito das organizações e pelos indivíduos dasociedade civil).

Por outro lado, observam-se inflexões na profissãorepercutindo significativamente em pelo menos três ní-veis: 1) em sua condição de trabalhador – aumentandoo desemprego profissional, precarizando o vínculo traba-lhista, levando a uma tendência à “desprofissionalização”;2) em sua demanda direta e indireta – aumentando ediversificando as manifestações da “questão social” en-frentadas pelo assistente; e 3) em sua prática de campo– reduzindo os recursos para implementar serviços soci-ais; demandando o “tarefismo” ou o “ativismo” que su-bordina a qualidade do atendimento à quantidade; com a“desuniversalização” das políticas sociais, atuando o as-sistente social em micro-espaços; com tendência à“filantropização” e ao “assistencialismo” e, inclusive, à“mercantilização” dos serviços sociais (retirando-lhes adimensão de direito de cidadania).

2. A necessidade de uma resposta profis-2. A necessidade de uma resposta profis-2. A necessidade de uma resposta profis-2. A necessidade de uma resposta profis-2. A necessidade de uma resposta profis-sional progressista, crítica, comprometida esional progressista, crítica, comprometida esional progressista, crítica, comprometida esional progressista, crítica, comprometida esional progressista, crítica, comprometida ecompetentecompetentecompetentecompetentecompetente

É assim que a situação atual desafia a profissão a en-frentar estas inflexões e construir respostas coletivamen-te. Claro que as possibilidades de concretização destesdesafios profissionais não são alheias às tendências soci-ais e às correlações de forças existentes.

2.12.12.12.12.1 P ro j e t o s s oc i e t á r i o s e p r o j e t o s p r o f i s -P ro j e t o s s oc i e t á r i o s e p r o j e t o s p r o f i s -P ro j e t o s s oc i e t á r i o s e p r o j e t o s p r o f i s -P ro j e t o s s oc i e t á r i o s e p r o j e t o s p r o f i s -P ro j e t o s s oc i e t á r i o s e p r o j e t o s p r o f i s -s i ona i ss i ona i ss i ona i ss i ona i ss i ona i s

Atualmente, é possível identificar a disputa de, pelomenos, três grandes projetos de sociedade: a) o projetoneoliberal (de inspiração monetarista, sob o comando docapital financeiro, que procura, no atual contexto de crise,

desmontar os direitos tra-balhistas, políticos e so-ciais historicamente con-quistados pelos trabalha-dores, acentuando a ex-ploração de quem vive dotrabalho e sugando ospequenos e os médios ca-pitais); b) o projeto refor-mista (tanto em sua ver-tente liberal-keynesianacomo social-democrata,

O Serviço Social desenvolve suaO Serviço Social desenvolve suaO Serviço Social desenvolve suaO Serviço Social desenvolve suaO Serviço Social desenvolve sua

intervenção em um intervenção em um intervenção em um intervenção em um intervenção em um espaço de tensãoespaço de tensãoespaço de tensãoespaço de tensãoespaço de tensão

e contradiçãoe contradiçãoe contradiçãoe contradiçãoe contradição entre sua função de entre sua função de entre sua função de entre sua função de entre sua função de

reprodução do sistema [...] e sua defesareprodução do sistema [...] e sua defesareprodução do sistema [...] e sua defesareprodução do sistema [...] e sua defesareprodução do sistema [...] e sua defesa

dos direitos e conquistas sociais...dos direitos e conquistas sociais...dos direitos e conquistas sociais...dos direitos e conquistas sociais...dos direitos e conquistas sociais...

1 44144144144144 Car los MontañoCar los MontañoCar los MontañoCar los MontañoCar los Montaño

KAKAKAKAKATÁLTÁLTÁLTÁLTÁLYSIS vYSIS vYSIS vYSIS vYSIS v. 9 n. 2 jul./dez. 2006 Florianópolis SC 141-157. 9 n. 2 jul./dez. 2006 Florianópolis SC 141-157. 9 n. 2 jul./dez. 2006 Florianópolis SC 141-157. 9 n. 2 jul./dez. 2006 Florianópolis SC 141-157. 9 n. 2 jul./dez. 2006 Florianópolis SC 141-157

representando o expansionismo do capitalismo produtivo/comercial conjuntamente com algum grau de desenvolvi-mento dos direitos civis, políticos, sociais e trabalhistas) e c)o projeto revolucionário (fundamentalmente de inspira-ção marxista que busca, gradual ou abruptamente, a subs-tituição da ordem capitalista por uma sociedade sem clas-ses, sem exploração e regida pelo trabalho emancipado).

Destes projetos se desprendem diversos valores e prin-cípios8 que orientam comportamentos e valores profissio-nais. Em termos gerais, pode se constatar hoje um certoecleticismo profissional no sentido de reunir componen-tes dos diversos projetos sociais (com seus valores e prin-cípios antagônicos). Quando isto ocorre, fica comprome-tida qualquer tentativa de construção de um projeto ético-político profissional realmente progressista; o resultado éum mosaico de partes constitutivas de tais projetos reuni-das acriticamente, o que acaba por reforçar o projetohegemônico da classe dominante. Isto leva à necessidadede explicitar características de um novo projeto ético-po-lítico profissional capaz de fazer frente ao contextoneoliberal, tal como se pretende construir.

2.22.22.22.22.2 O projeto ét ico-polít ico profissional: umO projeto ét ico-polít ico profissional: umO projeto ét ico-polít ico profissional: umO projeto ét ico-polít ico profissional: umO projeto ét ico-polít ico profissional: umprojeto em processo de construção colet ivaprojeto em processo de construção colet ivaprojeto em processo de construção colet ivaprojeto em processo de construção colet ivaprojeto em processo de construção colet iva

Assim, toda ação que procure enfrentar e reverter asatuais tendências neoliberais deve partir das seguintesconsiderações:

· Deve ser determinada a partir da construção/con-solidação não apenas de ações individuais, masde um projeto profissional hegemônico que inte-gre e articule as dimensões ética e política. Pro-jeto este construído democraticamente pelo cole-tivo profissional. Por isso, mais do que um proje-to significa um “processo” que está em cons-trução. A polêmica, os debates, as produções teó-ricas, a correlação de forças internas da profis-são, que agrupa tendências e subtendências, tudoisso constitui o processo de construção de um pro-jeto ético-político profissional.

· Porém, o pluralismo e o consenso não substituem anecessidade de constituir maiorias, construção de-mocrática e plural, sem prescindir de uma claradireção social legítima. Pluralismo e respeito àsminorias não eliminam a legítima hegemonia da mai-oria, não equivalem à soma das partes, da mesmaforma como consenso não equivale à ausência dedissensos; aquele se constrói a partir da articula-ção (dada a partir de determinada correlação deforças) destes, superando-se assim os vazios “con-sensos do óbvio” – ou seja, aqueles acordos acei-tos por todas as tendências, que de tão “lavadas”,são esvaziadas de seus conteúdos essenciais, comodeclarações de “combate à pobreza”, etc.

· Um projeto profissional não é algo isolado, masnecessariamente inspirado em e articulado comprojetos societários. Portanto, o projeto profissio-nal importa, redimensiona e se insere em determi-nados valores, ideologias, projetos, articulado comatores sociais que representam os valores, ideolo-gias e projetos profissionais hegemônicos. Alémdisso, os projetos profissionais não só se inseremem projetos e valores sociais mas estão, de algumamaneira, condicionados pelo lugar que ocupam nacorrelação de forças na sociedade.

· Um projeto profissional, se legítimo e plural, mes-mo que articulado com uma determinada correla-ção de forças internas, desdobra-se em um projetode formação profissional, em um código de éti-ca, em uma organização acadêmica e/oucorporativa profissional, que estabelecem rela-ções e interlocução com atores sociais em funçãoda articulação de seus valores e projetos.

· Considerando a “questão social”9 , as lutas de classese as desiguais condições de vida, a partir da relaçãode exploração entre capital e trabalhadores,logicamente um projeto ético-político profissional deveser sensível aos interesses das classes trabalha-doras e às populações mais desfavorecidas. Osinteresses das classes trabalhadoras e dos grupossubalternizados devem permear um projeto como tal.

2.3 Fundamentos do p r o j e t o p r o f i s s i ona l2 .3 Fundamentos do p r o j e t o p r o f i s s i ona l2 .3 Fundamentos do p r o j e t o p r o f i s s i ona l2 .3 Fundamentos do p r o j e t o p r o f i s s i ona l2 .3 Fundamentos do p r o j e t o p r o f i s s i ona lcrítico e progressista a partir das perspectivascrítico e progressista a partir das perspectivascrítico e progressista a partir das perspectivascrítico e progressista a partir das perspectivascrítico e progressista a partir das perspectivash i s tó r i co -c r í t i cash i s tó r i co -c r í t i cash i s tó r i co -c r í t i cash i s tó r i co -c r í t i cash i s tó r i co -c r í t i cas

Torna-se assim necessária a clara caracterização econstrução de um projeto profissional crítico e progres-sista a partir de “tendências histórico-críticas”, fundadoem princípios e valores tais como: a liberdade (não sóformal, negativa, mas que considere a potencialidade), ademocracia substantiva (e a democratização); a cida-dania e sua expansão, ampliando os direitos humanos,civis, políticos e sociais; a justiça social (e a igualdadesocial, que não se confundem com a identidade); as polí-ticas sociais universais, não-contributivas, de qualidadee constitutivas de direito de cidadania; a ampliação da es-fera pública; a eliminação de toda forma de explora-ção, dominação e submissão como sistema de convi-vência social e de desenvolvimento de uma essencial ci-dadania e da emancipação humana.

O fato do assistente social estar no contexto das con-tradições e dos conflitos entre classes (o que não significaque possua um papel “mediador” entre elas) faz desteprofissional, particularmente, um ator essencialmente po-lítico. Político (não partidário) no sentido de participantedesta relação conflituosa entre as classes. Relação(onde atua o assistente social) que se expressa de várias

1 45145145145145Um pro jeto para o Serv iço Soc ia l cr ít icoUm pro jeto para o Serv iço Soc ia l cr ít icoUm pro jeto para o Serv iço Soc ia l cr ít icoUm pro jeto para o Serv iço Soc ia l cr ít icoUm pro jeto para o Serv iço Soc ia l cr ít ico

KAKAKAKAKATÁLTÁLTÁLTÁLTÁLYSIS vYSIS vYSIS vYSIS vYSIS v. 9 n. 2 jul./dez. 2006 Florianópolis SC 141-157. 9 n. 2 jul./dez. 2006 Florianópolis SC 141-157. 9 n. 2 jul./dez. 2006 Florianópolis SC 141-157. 9 n. 2 jul./dez. 2006 Florianópolis SC 141-157. 9 n. 2 jul./dez. 2006 Florianópolis SC 141-157

formas: déficit de consumo, incapacidade de acesso a de-terminados bens e/ou serviços, questões salariais, desem-prego, discriminação (de todas as formas: sexual, de gê-nero, étnica e racial, xenofobia, etária, etc.), mortalidade,dependência química, entre tantas outras manifestaçõesda “questão social”. Nesse sentido, a falta de visão de talsituação certamente vem para reforçar (inclusive de for-ma inconsciente) a situação existente e os interesses dasclasses dominantes (que direta ou indiretamente se apre-sentam como empregadoras do profissional). Faz-se ne-cessário, então, tornar explícito o compromisso ético-po-lítico através da defesa dos valores do trabalho – tra-balho emancipado do capital, contra a exploração e a do-minação do homem sobre o homem – e da defesa dosdireitos historicamente conquistados pelas classes tra-balhadoras e pelos setores subalternos – direitos tra-balhistas, sociais, políticos e de cidadania.

Isso significa o comprometimento do assistente socialem centrar sua ação profissional nesses valores, o que su-põe um claro corpo ético-político (Códigos de Ética) queoriente e controle o exercício profissional a partir dos con-sensos criados pelos coletivos profissionais e da articula-ção com outros atores institucionais e sociais, objetivandoreforçar seu papel na correlação de forças existente.

3 O debate de idéias no interior da profissão3 O debate de idéias no interior da profissão3 O debate de idéias no interior da profissão3 O debate de idéias no interior da profissão3 O debate de idéias no interior da profissão

A partir destas propostas – que têm por objetivo con-tribuir com um processo coletivo de criação de um projetoético-político profissional, crítico, competente e compro-metido com os valores já enunciados, dotando o profissio-nal daquele relativo protagonismo dentro das determinantesestruturais no campo tenso e contraditório que enquadraa prática profissional –, começam a surgir contestações eenfrentamentos10. Mas, poderiam entender-se estas con-testações como uma crítica à crítica do Serviço Social(ou a um Serviço Social crítico)?

Para começar, o conceito de crítica aceita duasacepções bem diferentes. Primeiramente, crítica comobusca da verdade, confrontando a teoria com a realida-de (com a prática social)11 . Neste caso, o objetivo dacrítica é a fiel reprodução teórica da realidade; a verdade,que existe na realidade material, deve ser corretamenterefletida na teoria. Um postulado teórico é verdadeiro oufalso não por sua “aplicabilidade” a uma realidade singu-lar, não pela “adequação” a este ou aquele método consi-derado científico, mas por sua fidelidade ao objeto em ques-tão. Crítica aqui significa busca da verdade, tendo a reali-dade como critério de veracidade e a teoria (crítica) comofiel reflexo daquela.

Diferentemente, o segundo significado de crítica (tal-vez o mais utilizado no cotidiano) remete à ação de jul-gar desfavoravelmente, censurar ou rechaçar algo:

criticar algo. Neste caso, o marco referencial para ava-liar um postulado ou um objeto não é o contraste com arealidade, mas a subjetividade dos juízos de valor de umindivíduo. Quando se rechaça algo, critica-se a partir deum juízo de valor.

A reflexão crítica do Serviço Social (ou a busca de umServiço Social crítico) sustenta-se nas teorias críticas (aque-las que buscam a verdade a partir do reflexo teórico apropri-ado da realidade) sobre a estrutura e as dinâmicas sociais. Écontra esta reflexão (crítica) que se desenvolve uma crítica,com sentido de rechaço, censura, juízo de valor. É nesse últi-mo sentido que textos/autores “contestadores” serão referi-dos, não como críticos, mas como críticas.

3.1 As d i ve rsas mani fes tações de “contes3.1 As d i ve rsas mani fes tações de “contes3.1 As d i ve rsas mani fes tações de “contes3.1 As d i ve rsas mani fes tações de “contes3.1 As d i ve rsas mani fes tações de “contes -----tação” ao p ro j e to é t i co -po l í t i co c r í t i co etação” ao p ro j e to é t i co -po l í t i co c r í t i co etação” ao p ro j e to é t i co -po l í t i co c r í t i co etação” ao p ro j e to é t i co -po l í t i co c r í t i co etação” ao p ro j e to é t i co -po l í t i co c r í t i co ep rogress i s ta e às “pe rspec t i vas h i s tó r i co -p rogress i s ta e às “pe rspec t i vas h i s tó r i co -p rogress i s ta e às “pe rspec t i vas h i s tó r i co -p rogress i s ta e às “pe rspec t i vas h i s tó r i co -p rogress i s ta e às “pe rspec t i vas h i s tó r i co -críticas”: seus argumentos centraiscríticas”: seus argumentos centraiscríticas”: seus argumentos centraiscríticas”: seus argumentos centraiscríticas”: seus argumentos centrais

Efetivamente, durante quase duas décadas, o ServiçoSocial na América Latina sofreu uma espécie de imobilismointelectual. Pouco debate, pouca polêmica, poucoenfrentamento de idéias. Como se todos pensassem igual,como se todas as contribuições fossem confluentes. En-tre outras coisas, isto se devia à ênfase metodologista queimperava na produção acadêmica e nas preocupações comas práticas singulares, assim como a quase ausência deprodução teórica mais recente.

A saída à luz de novas análises sociais no novo con-texto neoliberal, de novas reflexões sobre o papel socialda profissão, partindo de categorias e conceitos centradosna emancipação do trabalho, na plena cidadania, ten-do como referenciais teóricos autores, clássicos ou não,de sólido fundamento dialético e crítico, tudo isso mobili-zou novas e velhas adormecidas energias e polêmicas.Amplos setores do coletivo profissional “contagiaram-se”com esta nova onda de debate crítico e comprometido12 ,com estes novos questionamentos e considerações quetentavam entender de forma diferente questões centraispara a profissão que até então não haviam encontradorespostas satisfatórias.

O simples fato de despertar o adormecido espírito deestabelecer polêmica entre idéias no interior de nossa pro-fissão já constitui um elemento extremamente positivodeste novo debate.

Não obstante, nada consistente reúne unanimidade de opi-niões na história humana. Assim surge a reação e oenfrentamento, contestando e/ou rejeitando a tentativa de in-centivar a construção de um projeto ético-político, crítico ecomprometido. Não sem um grande número de significativosequívocos de interpretação (cuja análise de conjunto seria te-diosa e desnecessária), essa “contestação”, recolhida nos tex-tos já relacionados, apresenta os seguintes argumentos:

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a) considera que as análises histórico-críticasdesqualificam a imagem do Serviço Social, contri-buindo para seu desprestigio social;

b) concebe as diversas contribuições histórico-críticascomo homogêneas, atribuindo-lhes uma supostaperspectiva brasileira;

c) parte da ilusão sobre a possibilidade de autodeter-minação do sentido da prática profissional, apartir da mera vontade e de opções individuais;

d) caracteriza como funções profissionais centrais amediação de conflitos e a integração social;

e) prioriza as micro-experiências como caminho paraa solução de “problemas” ou conflitos singulares elocais, deixando em segundo plano as conquistasestruturais e universais e as lutas centrais;

f) o imediato, o emergente, ocupa lugar central, hipo-tecando qualquer projeto de médio ou longo prazo;

g) promove um retorno aos autores tradicionais doServiço Social, descartando as reflexões críticas esuperadoras dos mesmos;

h) apresenta uma explícita ou implícita rejeição àreconceptualização e identifica sumariamente aspropostas de construção coletiva de um projetoético-político profissional com aquele movimento;

i) em alguns textos “contestadores” aparece visivel-mente uma tendência anti ou pós-marxista, en-tendendo que a proposta de construção de um pro-jeto ético-político se esgotaria nesta perspectiva;

j) finalmente, percebe-se uma clara negação e re-jeição ao debate acadêmico responsável e explí-cito, através da desqualificação e tergiversação deseus interlocutores.

3.2. Cr í t ica à “cr í t ica c r í t i ca” : abrem-se a3.2. Cr í t ica à “cr í t ica c r í t i ca” : abrem-se a3.2. Cr í t ica à “cr í t ica c r í t i ca” : abrem-se a3.2. Cr í t ica à “cr í t ica c r í t i ca” : abrem-se a3.2. Cr í t ica à “cr í t ica c r í t i ca” : abrem-se apolêmica e o debate internopolêmica e o debate internopolêmica e o debate internopolêmica e o debate internopolêmica e o debate interno

A seguir são enumerados os argumentos centrais ex-pressos nestas contestações, assim como a nossa refle-xão crítica de seus conteúdos.

(I) A consideração de que a análise crítica “desqualifica”a imagem do Serviço Social, contribuindo para seudesprestígio.

Esta constitui a hipótese central esgrimida peloscontestadores das “perspectivas histórico-críticas”. Con-siste na idéia de que a análise crítica, consolidada na his-tória social capitalista, particularmente na América Lati-na, à medida que constata certa função de reprodução dosistema e do status quo, estaria contribuindo paradesprestigiar e desqualificar a imagem da profissão. Es-tas são algumas afirmações13 :

Com a energia e o zelo de um inquisidor medieval,Iamamoto se lançou em 1992 a levar a processo ao

Trabalho Social, acusando-o de profissão origina-da numa herança conservadora católica que, le-vada depois ao campo secular, tecnificada e mo-dernizada, teria mantido no entanto as ‘manchas’de sua espúria origem intocadas, dentro de ‘umcunho conservador-reformista’ [...] esta‘diabolização’ do Trabalho Social presente em mui-tos autores da última década se inscreve numa in-terpretação fortemente niilista, substanciada pelachamada ‘desilusão respeito do socialismo real’(PORZECANSKI, 2001, p. 75, grifo nosso).

Se tivéssemos que caracterizar os inimigos do Ser-viço Social, encontrar-nos-íamos com três tiposprincipais, dois externos e um interno à profis-são [...] c) o inimigo interno ao que nos referimosnão o parece a primeira vista, pois usa uma lin-guagem parecida à de todos no conjunto profissi-onal e freqüentemente se dirige aos colegas comaparentes intenções construtivas. Na realidade seconvertem em destruidores do Serviço Social, antespor não conseguir compreendê-lo, mesmo que emalguns casos possam fazê-lo por oportunismo ide-ológico [...] Assim vemos no prólogo de um textomuito recente de Carlos Montaño [...] (DI CARLO,2001, p. 20, grifo nosso). […] debater os supostosbásicos constitutivos específicos do trabalho so-cial profissional, com outras correntes de inter-pretação, que no nosso entendimento entendemmal esta profissão e em conseqüência terminamatacando-o com a intenção, ou confusão, demodificá-la na sua razão de ser (DI CARLO, 2004,p. 7, grifo nosso).

A repercussão destas tendências na formação pro-fissional [...] Atenta contra a identidade profissionale contra seu desenvolvimento, da mesma forma queo fez há umas décadas a chamada etapa de‘reconceituação’, a qual freou durante anos odesenvolvimento da profissão (CORTINAS, 2003,p. 28). Faz pouco tempo expressei [...] minha pre-ocupação pelas tendências detratoras manifesta-das na literatura contemporânea sobre o Servi-ço Social Profissional (SSP) e sobre o perigo queelas ocasionavam ao influir fortemente nos vas-tos setores da profissão. Da leitura do livro ‘Ca-pitalismo Monopolista e Serviço Social’, cujoautor é o Professor José Paulo Netto, surgem ni-tidamente grandes discordâncias de suas afirma-ções e reforçam a expressada preocupação. Estelivro se propõe demonstrar o caráter conservador ereacionário dos Serviços Sociais, tanto noinstitucional como no profissional. Produto dodesenvolvimento capitalista, seu destino [do

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Trabalho Social] é acunhá-lo, servi-lo [...] Estas ori-gens marcam sua substanciação, a especificidadeconservadora ou reacionária da profissão. Alegitimação [da profissão] [...] contém sempre opecado original da filantropia, ao serviço da classeburguesa, dentro do sistema capitalista. Netto acu-sa de sincretismo o Serviço Social [...]. A obses-são que manifesta pela reprodução da socieda-de [...] o conduz a tomar uma atitude detratorapara com os S. S. institucionais e seus agentes,os profissionais, pela sua ação a favor dos inte-resses burgueses (CORTINAS, 2003a, p. 17, 18, 23,grifo nosso).

Na nossa profissão existe uma polêmica maisde corte ideológico do que científico, na qual cer-to setor de trabalhadoras e trabalhadores soci-ais afirmam que se trata de uma profissão cria-da pelas classes dominantes para contribuir amanter o status quo social [...] Na verdade é omomento para que, no lugar de fazer afirma-ções de ruptura com a profissão de trabalho soci-al, façam um esforço por contribuir a que o la-bor profissional seja realizado cada vez com mai-or eficácia e com melhores condiçõesinstitucionais [...] Seguir pelo caminho de afir-mações desintegradoras unicamente confirma operigo da ideologização [...] (SAN GIÁCOMO, inDI CARLO, 2004, p. 88,89- 97, grifo nosso).

É interessante esta preocupação com um suposto “ata-que” à profissão, partindo de seus supostos “inimigos inter-nos” ao, supostamente, “diabolizar” o Serviço Social, “acu-sando-o” de reacionário e servil aos interesses do capital.

Será que a diferença entre uma “acusação” e uma aná-lise histórica não é percebida? É possível discrepar dasanálises históricas feitas pelos autores das “perspectivashistórico-críticas”, mas resulta sintomático que estas se-jam rotuladas e consideradas como “acusações” quedesqualificam a imagem profissional. Como deveria pro-ceder um intelectual cuja análise histórica sobre a inserçãodo Serviço Social no capitalismo monopolista revela umacerta funcionalidade (funcionalidade em nítida tensão comas orientações ético-políticas individuais e coletivas dos as-sistentes sociais) da profissão a serviço da reprodução dosistema e do status quo? Deveria negar os resultados dainvestigação e da história para não “atacar a imagem pro-fissional”? Deveria criar uma imagem “positiva” da profis-são, ainda que historicamente infundada e falsa?

Em uma perspectiva claramente diferente da tradiçãomarxista, Michel Foucault analisa o desenvolvimento damedicalização como parte de um projeto de controle, depoder social dos setores dominantes sobre a população.Para Foucault, (1985, p. 95),

[…] a partir do momento em que o pobre se be-neficia do sistema de assistência deve, por issomesmo, submeter-se a vários controles médicos.Com a Lei dos pobres aparece, de forma ambí-gua, algo importante na história da medicinasocial: a idéia de uma assistência controlada, deuma intervenção médica que tanto é uma ma-neira de ajudar os mais pobres[…] como umcontrole através do qual as classes ricas ou seusrepresentantes no governo asseguram a saúdedas classes pobres e, por conseguinte, a prote-ção das classes ricas.

Deve-se considerar as análises foucaultianas como um“ataque” ao médico ou à medicina? É este autor um“inquisidor medieval” do profissional da saúde? É este um“inimigo interno” da instituição hospitalar?

Parece, então, que “amoldar” a imagem da realidadeaos desejos não deveria fazer parte do horizonte intelec-tual. Se a análise da história exibe a tensão existente naprática profissional do Serviço Social – por um lado forja-da na função social que as políticas sociais transferem àprofissão (estas como parte de estratégias capitalistas,ainda que permeadas por demandas das classes subalter-nas), e por outro, no relativo protagonismo profissional parareconduzir sua formação e ação –, este fato não deve serescondido ou rejeitado com a finalidade de não “ferir”uma imagem profissional que se considera ideal. O com-promisso com a verdade deve ser superior à necessidadecorporativa de dotar a profissão da imagem desejada.Além disso, a possibilidade de um relativo protagonismoprofissional (que não elimina completamente os deter-minantes sistêmicos) para orientar esta prática no sentidode reforçar direitos conquistados por trabalhadores e ci-dadãos, em geral só encontra terreno fértil na análise crí-tica da realidade histórica, que determina a particularida-de da profissão do Serviço Social.

Por outro lado, resulta claramente endogenista (voltar-se-á a isto) pensar que a constatação de que a profissãocumpre um papel particular na reprodução do sistema social(acumulação de capital, manutenção das relações sociais edo status quo) acarretaria automaticamente no suposto ca-ráter “conservador” de seus membros; ou supor que estepapel pode ser revertido pelo posicionamento “progressista”dos mesmos. O caráter funcional da profissão (ainda quetenso e complexo) depende mais dos determinantes estrutu-rais e da correlação de forças e dinâmicas sociais do que dasopções de seus membros (sejam estes “conservadores” ounão). Uma coisa é conceber o papel do Serviço Social nareprodução da ordem dominante, outra é supor que o indiví-duo é quem é conservador. Este equívoco é extremamentecomum na profissão, o que levou, algumas vezes, a se atri-buir um caráter necessariamente conservador aos assisten-tes sociais de outrora (os precursores) ou a se considerar o

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assistente social como “agente de transformação”. Nem ne-cessariamente “conservador” nem “agente de transforma-ção”. O papel, o sentido social da profissão, depende maisdos resultados das lutas de classes, dos projetos societáriosem discussão e da estratégia hegemônica, do que das con-cepções e opções dos seus membros.

(II) O apelo nacionalista, ao homogeneizar asconsiderações críticas através da expressão “perspec-tiva brasileira”.

Os contestadores das “perspectivas histórico-críticas”realizam uma homogeneização imprópria, identificando es-tas perspectivas (por si heterogêneas) com uma instituição(a UFRJ ou a PUC-SP)14 ou com uma nação (Brasil)15 .

Primeiramente, deve-se registrar a heterogeneidadedestas “perspectivas histórico-críticas”, incorporando con-cepções e tendências variadas da tradição marxista(Marx, Lukács, Gramsci, Mandel, dentre outros), corren-tes neo-kantianas (pela via, por exemplo, de Habermas),tendências pós-modernas (recorrendo a Boaventura deSousa Santos e outros), elaborações do pensamento li-beral (“cidadania”, “pluralismo”, “Estado de Bem-EstarSocial”, etc.). Para seus contestadores, esta heteroge-neidade se desvanece e se reduz a um pensamento su-postamente homogêneo.

Em segundo lugar, é necessário mostrar que nem a Uni-versidade Federal de Rio de Janeiro (UFRJ) nem a PontifíciaUniversidade Católica de São Paulo (PUC-SP) podem serconsideradas internamente como homogêneas. Muito me-nos reduzir ambas instituições a um pensamento suposta-mente uniforme. Objetos de estudo e perspectivas de análisesão vários e diversificados em ambas instituições.

Em terceiro lugar, e a partir de um claro desconheci-mento do debate profissional brasileiro, é equivocado suporque este seja homogêneo, sem polêmicas, dominando poruma tendência específica. O processo de construção deum projeto profissional no Brasil não prescindiu nem pres-cinde de um árduo, rico e polêmico debate de idéias. Naverdade, existem autores e tendências variadas no Brasil(como em qualquer contexto) que se expressam com abso-luto respeito e liberdade, processando suas diferenças nosforos profissionais e estabelecendo negociações e delibe-rações nos organismos profissionais correspondentes.

O que se constata então, nesta homogeneização, é umverdadeiro apelo nacionalista. A idéia de que a polêmicaesteja apresentada entre nações não tem fundamento. Algocomo um suposto “imperialismo brasileiro” colonizando osdemais países latino-americanos. Mesmo conhecendo opapel que o governo brasileiro desempenha na região (ver,por exemplo, os conflitos de interesses no Mercosul ou ocaso do gás boliviano com a Petrobrás) não se pode con-fundir governos com suas populações , muito menos comos processos e tendências de um heterogêneo coletivo pro-fissional. As relações entre governos nacionais pouco re-

presentam as relações entre os povos desses países. Masaqui não se está falando de governos, e sim de debatesprofissionais, de perspectivas teórico-metodológicas e éti-co-políticas, enfim, de projetos profissionais.

Se assim fosse, se as “perspectivas histórico-críticas”fossem identificadas com o Brasil, seria então legítimo pen-sar seus contestadores como a “perspectiva uruguaia”?16

Nesse suposto caso, dever-se-ia pensar em uma “disputaentre nações”? Este apelo nacionalista logicamente consti-tui uma forma de escamotear ou driblar o verdadeiro fun-damento da polêmica: não se trata de um enfrentamentoentre nações, mas de um debate entre perspectivas teóri-co-metodológicas e tendências ideológico-políticas queredundam em diferentes projetos profissionais. Tendên-cias “histórico-críticas” – comprometidas com a garan-tia e o desenvolvimento de direitos civis, trabalhistas e soci-ais, com políticas sociais universais e constitutivas de direi-to cidadão, com a justiça social e a liberdade, com oaprofundamento da democracia, com a emancipação dotrabalho e do homem (perspectivas que vão desde a social-democracia até as socialistas) e inclusive, em alguns casos,tendo como horizonte a superação do sistema de explora-ção e de classes; e tendências “endogenistas” – que valo-rizam a filantropia, a benemerência, assim como valoresabstratos como o “bem-comum” e a “conciliação entre clas-ses” (a exemplo das Encíclicas Rerun Novarum eQuadragesimo Anno), que aceitam como inalterável o sis-tema social imperante (perspectivas antimarxistas,tocquevillianas, neoliberais, pós-modernas, etc.). Tendên-cias estas impossíveis de serem divididas entre nações, maspresentes no interior de cada país.

Aqui o que divide “fronteiras” não são os limitesnacionais, mas as divergências entre projetos sociaise profissionais, entre perspectivas teórico-metodológicas. E estas divergências existem em todosos países. A “oposição entre nações” tem o evidente ob-jetivo de esconder a real polêmica, apelando ao naciona-lismo e ocultando o debate entre ideologias, perspectivasteórico-metodológicas e projetos profissionais. O capitalé internacional, portanto, a articulação entre cidadãos, tra-balhadores, intelectuais, profissionais, etc, que defendemas conquistas históricas das classes subalternas e que vis-lumbram uma nova sociedade sem classes e sem explo-ração, esta articulação, apesar de organizar-se em pri-meira instância nos espaços nacionais, deve alcançar umadimensão internacional.

Aqui se observa também outro aspecto colateral: o des-crédito no protagonismo das instituições e nos colegas deoutros espaços institucionais e de outras nações. Como men-ciona Porzecanski (2001, p. 77) “A linha interpretativa daUFRJ tem influído, no entanto, nas questões disciplinares noUruguai […]”. Em sua concepção, não seriam os colegasuruguaios que internamente, a partir de seu debate acadêmi-co e profissional e de sua correlação de forças internas (no

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que se refere a temáticas e perspectivas), tomam decisõesconscientes, que podem ser confluentes com algunsposicionamentos de colegas de outros países. Esta autoraparece entender o contrário, que se trataria da influênciaexterna que coloniza alguns ingênuos e desprotegidos profis-sionais uruguaios, como se afirmasse: “perdoa-os, não sa-bem o que fazem!”. O mesmo ocorre quando se atribui influ-ência da PUC-SP no meio profissional argentino17.

(III) O “endogenismo” analítico, a “naturalização” daprofissão e o “messianismo” existentes na ilusão da auto-determinação do sentido da prática profissional.

Os textos contestadores das “perspectivas histórico-críticas” apresentam fortes e explícitas tendências“endogenistas”, ou seja, a perspectiva de análise que abordaos fenômenos (neste caso a profissão) meramente a par-tir de seus elementos internos, sem considerá-los comoresultado de processos históricos mais amplos. No casodo Serviço Social, a abordagem endogenista consideracomo atores/sujeitos os seus próprios profissionais (nãoas classes sociais, o Estado, a mulher como sujeitos cole-tivos); os fenômenos que desencadearam o surgimentoda profissão são assim determinados a partir de movi-mentos internos à prática da assistência e da ajuda (e nãoa partir da passagem do capitalismo concorrencial para omonopolismo, do projeto hegemônico do capital, dosurgimento de um “Estado de Bem-Estar Social” ou dasconquistas de lutas de classes); a legitimidade profissionalestaria dada então por sua “especificidade” (e não peloespaço ocupacional e funcional criado pelas políticas so-ciais dentro de um contexto histórico determinado), etc.18 .

Neste flagrante endogenismo, pensa-se – equivocada-mente – que a constatação do papel social da profissão sig-nificaria, conseqüentemente, uma “acusação”, a cada assis-tente social, de ser “conservador”; um raciocínio formal epobre no sentido de: “se a profissão é funcional ao sistemaimperante é porque seus membros são conservadores”. Damesma forma, para romper com este “estigma” da profissãoseria suficiente a opção individual do profissional; algo assimcomo: “o profissional ‘conservador’ terá um desempenhoreprodutor do status quo, enquanto o assistente social ‘pro-gressista’ desenvolverá uma prática transformadora”. As-sim, para que a profissão tenha uma função progressista bastaque os assistentes sociais sejam progressistas; chega-se,então, à constação de que o papel funcional da profissãocom a reprodução da ordem estaria afirmando o caráter con-servador dos seus membros.

Este silogismo formal não reflete a realidade nem o pen-samento dos autores das “perspectivas histórico-críticas”.Na realidade, nestas correntes entende-se que o papel soci-al do Serviço Social (na reprodução do social e do statusquo) está fortemente condicionado pela estrutura e pe-las dinâmicas sociais, expressas fundamentalmente pelacorrelação de forças e pelas lutas de classes.

Assim, um Projeto Profissional tem a intencionalidade de,sem pretender desconhecer as determinações sociais da pro-fissão, dotar o Serviço Social de um protagonismo maior, deforma a ampliar o espaço de sua legitimidade em direção àação que confirme e amplie os direitos sociais e as conquis-tas populares. Se o assistente social, individualmente e apartir de suas opções pessoais, não determina o sentido desua prática (condicionada pelos determinantes macrossociais),o coletivo profissional, organizado conjuntamente em tornode um projeto profissional ético-político (determinando suaformação, seus temas de estudo e investigação, seu códigode ética, suas normas institucionais, etc.), poderá ampliar emalgum grau seu protagonismo na determinação parcial dosentido social de sua ação.

Assim, numa perspectiva endogenista, a crise de legi-timidade profissional não seria obra da crise social esistêmica, que repercute na estrutura de proteção social enos direitos conquistados, comprimindo (focalizando eprecarizando) as políticas sociais estatais. Ela seria o re-sultado do “ataque” de certos “inimigos internos” que “jul-gam o Serviço Social”19 .

Mas tal perspectiva endogenista freqüentemente acom-panha um processo de “naturalização” da profissão em suasfunções, “missões”, objetivos, etc. São alguns exemplos disto:

O Trabalho Social ocupa um lugar natural aolado das classes que lutam e consagram con-quistas sociais […] (CORTINAS, 2003, p. 32, grifonosso).

Nesta luta de contrários é obvio que o compro-misso do Trabalho Social estará sempre do ladoda defesa do humano [sic] (CORTINAS, 2003, p.33, grifo nosso).

[...] o Trabalho Social tem como missão buscara integração social e moral do indivíduo à so-ciedade para seu próprio bem (DI CARLO, 2004,p. 12, grifo nosso).

O problema não é somente teórico, em termos de pers-pectiva. A naturalização destas questões acaba colocando-as como dados ahistóricos, inalteráveis e, portanto, seuspostulados operam como verdadeiros axiomas (naturais).Neste processo, o tão buscado debate coletivo sobre qualdeve ser “a missão” da nossa profissão, sobre quais devemser seus “compromissos ético-políticos”, passa a ser subs-tituído por estes axiomas elaborados no escritório de algumintelectual que assim o determinou. Ao invés do corpo pro-fissional debater e fundamentar as diversas posturas sobreestes temas para formular um “Projeto Ético-Político Pro-fissional” a partir do consenso gerado, reconhecendo asorientações das maiorias, o debate seria substituído peloaxioma; “o projeto profissional” elaborado a partir do deba-

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te coletivo é substituído pela “missão natural” determinadaunilateralmente como “óbvia” por alguém.

Mas esta naturalização muitas vezes conduz a um ver-dadeiro “fatalismo”, ao cristalizar as condições atuais comoimutáveis, rígidas, perenes, ingressando assim numpossibilismo resignado e hipotecando as possibilidades deum horizonte distinto. Isto é o que se vê em definições como“o trabalho social possível” (DI CARLO, 2004, p. 13).

Outro aspecto que anda junto com o endogenismo e anaturalização dos processos relacionados ao desenvolvimen-to da profissão é o “messianismo”. Tratado por Iamamoto(1997, p. 183 e ss.), o “messianismo utópico” consideracomo determinantes da prática profissional “as intenções,os propósitos do sujeito profissional individual”, promoven-do um “voluntarismo” e uma “visão heróica” e “ingênua”da ação do indivíduo. A conseqüência disto é clara: por queum “Projeto Ético-Político” para a profissão, se cada indi-víduo determinaria por si mesmo o sentido e a orientaçãode sua prática profissional?; por que um projeto coletivo seé entendido que a “missão natural” está dada, ou que amera intencionalidade do indivíduo é suficiente para dar sen-tido à própria ação profissional? Mais uma vez opta-se peladireção individual ao invés da construção coletiva.

Mas o problema se amplia quando se reconhecem osdeterminantes externos, alheios à vontade individual de umprofissional, ao ver que o sentido de sua prática profissionalnão está autodeterminado, mas fortemente condicionadopela estrutura e dinâmica social, onde as classes sociaisapresentam interesses antagônicos, onde existe nítidahegemonia do grande capital (hoje particularmente do fi-nanceiro), etc. A partir de tais constatações (ver as cita-ções anteriores), pensar que seria “natural a localizaçãoda profissão ao lado dos mais desfavorecidos” ou que é“óbvio o compromisso com as classes subalternas” é umequívoco teórico com sérias implicações políticas na práti-ca: pensa-se que se está do lado do trabalhador, do“povo”, do explorado ou do submergido, por uma su-posta condição natural da profissão ou pela mera op-ção e vontade do indivíduo, mas, na verdade, e semnecessariamente sabê-lo, está-se ocupando um lugarna engrenagem das relações sociais dominantes, ondeo capital detém explícita posição hegemônica20 . A úni-ca forma de alterar tal situação é a partir da tomada deconsciência do papel social real da profissão e de suatensão – saturá-lo da contradição entre a funcionalidadesistêmica e a ação que reforça interesses populares e direi-tos conquistados, politizando a prática profissional21 .

(IV) Indícios de um pensamento conservador.Em muitos dos textos contestadores das “perspecti-

vas histórico-críticas” é possível constatar indícios cla-ros de um pensamento conservador. Esta afirmaçãoserá fundamentada, sobretudo, por um texto em particu-lar (DI CARLO, 2004).

Em seu artigo, Di Carlo (2004, p. 10, grifo nosso) afirmaque os autores da PUC-SP “põem a consciência políticado assistente social atuante na realidade sobre as suas res-ponsabilidades como profissional”, dissociando destaforma a “consciência política” do assistente social da sua“responsabilidade profissional”. É possível pensar a res-ponsabilidade profissional de um sujeito sem que esteja for-temente arraigada em sua consciência política? Segue oautor: “Não é nossa obrigação formar adictos políticos paratendências políticas, credos ou grupos ideológicos” (p. 11),confundindo orientações ético-políticas de um profissional(ou do coletivo) com posturas partidárias (tendências,dogmas, credos). Já Diego Palma mostra como “muitostrabalhadores sociais – movidos por um realismo que aba-fava toda ilusão – propiciaram, a meados dos anos 70, umretorno para ‘o profissional’[...] como uma atividade clara-mente distinta do fazer político”. Para este autor, “‘o pro-fissional’ não representa uma atuação objetivamente neutralno conflito das classes; muito pelo contrário, o trabalhadorsocial, nesse projeto, representa uma função importante noprocesso de enquadramento das classes subordinadas alesquema de dominação” (PALMA, 1985, p. 94).

Mas, se a reconceptualização muitas vezes cometeu oerro de confundir “tarefa profissional” com “tarefa políti-co-partidária” (sem que com esta afirmação se ignore ocontexto histórico dos anos 60), por outro lado esse movi-mento contribuiu em algo fundamental: incluir na agendado debate profissional a necessidade de politizar (não“partidarizar”) a prática profissional, entendendo-a nãocomo um agir neutro e intermediador, mas como uma ati-vidade tensa, política, inserida em um espaço de contradi-ção e de conflito de interesses.

Deve-se ainda manifestar que o pensamento conser-vador (no Serviço Social) também é político, também ser-ve a interesses particulares (neste caso, das classes domi-nantes), só que o negando, escondendo-o ou o ignorando.

A partir desta separação do agir profissional em relaçãoà sua consciência política, com a clara “despolitização pro-fissional”, outras conjeturas aparecem para mostrar maisindícios de um pensamento conservador. Afirma Di Carlo(2004, p. 12, grifo nosso): “Em primeiro lugar cabe conside-rar que a necessidade de viver numa sociedade integra-da é uma necessidade humana universal”, sendo que “oTrabalho Social tem como missão buscar a integração so-cial e moral do indivíduo à sociedade […]”. Apareceaqui seu projeto profissional (em contraposição ao coleti-vo projeto ético-político) até agora implícito: a integraçãosocial e moral do individuo à sociedade. Cabe mencio-nar que “integração” não condiz com “lutas de classes” eque “inclusão” não elimina a “exploração”. Estes são con-ceitos visivelmente reprodutores do sistema social e de seustatus quo. Com tal “despolitização” da prática profissio-nal, Di Carlo (p.13, grifo nosso) tenta então definir a profis-são: “Entendemos por trabalho social real em parte o que

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Um pro jeto para o Serv iço Soc ia l cr ít icoUm pro jeto para o Serv iço Soc ia l cr ít icoUm pro jeto para o Serv iço Soc ia l cr ít icoUm pro jeto para o Serv iço Soc ia l cr ít icoUm pro jeto para o Serv iço Soc ia l cr ít ico 15 115 115 115 115 1

se exerce bem na realidade atual… e junto com este, oque é possível exercer, diferenciando-os das construçõespuramente irrealizáveis”. É isto o que o autor chama de“trabalho social real ou possível”, ou seja, “o possível” é “oreal”, reproduzindo assim o pensamento conservador quecongela a “situação atual” (o possível e o impossível hoje),perpetuando-a para o futuro. Existe uma clara resignaçãoao possível. Nada mais funcional aos interesses das clas-ses poderosas.

Afirmamos, primeiramente, que a tarefa do intelectualconsiste na análise crítica da realidade (inclusive do “ser-viço social real”), sem mistificações, desvendando-a edesnudando-a. Por sua vez, ao perpetuar a (atual e su-posta) “impossibilidade” de construir um Serviço Socialcrítico e comprometido com os valores já tratados, Di Carloincorre em dois problemas: a) desconhece que seusinterlocutores são enfáticos em afirmar que o sentido, osignificado e o papel social da prática profissional nãodependem apenas (nem fundamentalmente) daintencionalidade de seus atores (o que significaria um cla-ro endogenismo e messianismo), mas das relações soci-ais, da correlação de forças e das estruturas e dinâmicassociais – não é possível ignorar os determinantes históri-cos e estruturais; b) resigna-se à “inalterabilidade” (emum claro fatalismo), ignorando ou desconsiderando o re-lativo protagonismo dos profissionais para reconduzir, den-tro de certos limites, sua prática a partir não somente deposições e de capacidades individuais, mas fundamental-mente de um coletivo projeto ético-político, construído apartir do debate, das alianças e das maiorias; além do que,a correlação de forças, a dinâmica e inclusive a estruturasociais, também são históricos, e portanto não imutáveis.

(V) O apelo às microexperiências locais e o rechaço àfunção profissional macrossocial.

Efetivamente, e derivado daquela tendência conser-vadora, talvez neste caso unido a uma reatualizada “críti-ca romântica ao capitalismo”22 , os textos contestadoresem geral incorporam um forte apelo às microexperiênciassingulares e localizadas (como campo de intervençãodo assistente social); assim, o espaço de inserção diretado profissional pareceria conformar o horizonte da análi-se social. Não existe (ou não se consideram) estruturasocial, relações entre classes, questões universais. Exis-tem, sim, espaços comunitários locais, relaçõesinterpessoais, questões singulares.

Assim, partindo da idéia de que a realidade que inte-ressa ao assistente social é apenas aquela que cerca suaprática profissional direta, privilegiam-se as concepçõesde “poder local”, do “empoderamento”, das “identidadesparticulares”, rejeitando as teorias universais, as críticasda sociedade capitalista (especialmente a teoria marxis-ta), da sociedade de classes, das relações entre classes(exploração, dominação, lutas de classes). Encontra-se

aqui um desdobramento daquele conservadorismo: o cur-to-prazo, o local e singular e o imediato, hipotecandoe deixando em segundo plano qualquer estratégia quetenha um horizonte de longo-alcance, universal emediato. O conservadorismo aqui assume a nova rou-pagem pós-moderna.

O Serviço Social não pode, com sua ação, “transfor-mar” os determinantes macroestruturais, não pode elimi-nar a exploração, as contradições entre capital e trabalho;por isso (as correntes tradicionais e conservadoras da pro-fissão) desconsideram a crítica ao papel que a profissãotem na estrutura social. Se o Serviço Social não determi-na a estrutura, então a estrutura não determina o ServiçoSocial, parecem afirmar estes autores. Algo assim como:“se a profissão não pode alterar a realidade macro, não épreciso se preocupar com ela”. Então o Serviço Socialnão teria apenas um papel na estrutura social, mas papéislocalizados, reduzidos a suas funções e atividades cotidia-nas. Para estes autores, são as atividades cotidianas dosprofissionais que determinariam sua função social (e nãoo lugar que ocupam na dinâmica e estrutura sociais).

Não obstante, sem pretender que a intervenção doassistente social pudesse alterar as relaçõesmacroestruturais, é no espaço entre as classes, entre osinteresses de classes, que se insere o profissional (nãocomo mediador entre elas, claro), tendo, portanto, um pa-pel (ético-político) em tais relações. O fato de que a inter-venção profissional se desenvolva em torno de manifes-tações da “questão social” (desemprego, desnutrição, vi-olência doméstica, fome, falta de acesso a determinadosbens ou serviços, etc.) sem poder alterar seus fundamen-tos (exploração, lutas de classes, etc.) não desmente queo Serviço Social tenha um papel na estrutura social (emi-nentemente funcional na reprodução do sistema e do statusquo e, contraditoriamente, o eventual reforço/fragilizaçãode direitos e conquistas sociais).

(VI) A redução das respostas profissionais às situa-ções emergenciais e imediatas e o conseqüente rechaçopor estratégias e projetos de longo alcance.

Em consonância com o anterior, a proposta dos“contestadores” não apenas rechaça o universal, ao con-centrar-se exclusivamente no local-singular, mas tambémrechaça o médio e o longo prazo ao esgotar suas energiasno imediato.

Efetivamente, a dinâmica das demandas emergenciaise imediatas parece colocar o assistente social em umcarrossel de respostas imediatas. A reprodução desta re-lação demanda-emergencial / resposta-imediata, levao profissional (e a profissão) a uma lógica pragmática,movido pela “pre-ocupação”.

Segundo Kosik (1989, p. 63, 64), no contexto do capi-tal o homem, em sua alienada vida cotidiana, é tomadopela “preocupação”. Para ele, a “preocupação” é o as-

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pecto fenomênico, alienado, da práxis do indivíduo. Estar-se-ia assim substituindo a categoria de trabalho pela deocupação e, portanto, a atividade criadora pela merareprodução. Na vida cotidiana (desde que alienada, comoo é no contexto capitalista), mais do que trabalhar, “ocu-pa-se” das coisas que requerem resposta direta e imedia-ta e que são mantenedoras da ordem vigente. De acordocom este autor, “a passagem do ‘trabalho’ para a ‘preo-cupação’ reflete, de maneira mistificada, o processo defetichização das relações humanas, [...] onde o mundohumano se manifesta à consciência diária [...] como ummundo já feito”.

Ou seja, a ocupação responde a necessidades singula-res e imediatas dentro de um mundo dado e aparentementeimutável, naturalizado, perpetuado23. Tem uma prática ape-nas reprodutora, sem criar nada novo, portanto sem trans-formar. Assim, “na perspectiva da ‘preocupação’, o mundoobjetivo e sensivelmente prático se dissolveu, transformou-se no mundo dos significados traçados pela subjetividadehumana. É um mundo estático no qual a manipulação, oocupar-se e o utilitarismo, representam o movimento do in-divíduo preso da solicitude, em uma realidade já feita e aca-bada cuja gênese está oculta” (KOSIK, 1989, p. 66).

Com isso, o assistente social tradicional apenas opera,manipula os instrumentos, os aparelhos, mesmo que nãoconheça a estrutura e sua dinâmica, nem a realidade alémda fenomenalidade, da pseudoconcretude. Tem um co-nhecimento instrumental, operativo, não crítico, nem fun-damental. Na verdade, ele é quem é instrumentalizado,manipulado, refuncionalizado para a reprodução do siste-ma que não conhece e que considera como dado, estrutu-ralmente inalterável.

O assistente social tradicional (e o implícito projetoconservador) tende a se comportar desta maneira, “ocu-pando-se” com atividades dentro de um sistema conside-rado como já dado e imutável. Tende a se “preocupar” ea atuar de forma imediata, sem crítica, sem contribuir coma transformação, somente algumas modificações imedia-tas, localizadas, que respondam a suas carências diretas;atua de modo desarticulado, imediato, direto, nos “proble-mas” singulares, em uma ilusória realidade des-totalizada,deseconomizada, despolitizada, imutável, sem história. Esteagente deixa de ser sujeito, passa a materializar-se emum sistema supra-histórico. Já não se faz (nem se pensa)a História, mas apenas histórias, singulares e cotidianas.

Neste sentido, dotar a prática profissional (que se de-senvolve no cotidiano) de consciência humano-genéri-ca, desalienada, é tarefa fundamental para romper coma instrumentalização que o capital faz desta prática. ParaLukács (apud ANTUNES, 1999, p. 169), “a vida cotidianaconstitui a mediação objetivo-ontológica entre a simplesreprodução espontânea da existência física e as formasmais elevadas de genericidade”. Assim, a passagem dasnecessidades imediatas para o humano-genérico certa-

mente não pode prescindir das formas de mediação pre-sentes na práxis social e política.

Da mesma forma, é fundamental saturar a prática pro-fissional de mediações, rompendo a relação imediata,utilitarista ou ativista, entre fato/percepção/resposta, per-mitindo o entendimento da vida cotidiana como instânciaparticular que articula as situações singulares com a totali-dade social. Desta forma, de acordo com Kosik (1989, p.78), “para que o homem possa descobrir a verdade dacotidianidade alienada, deve conseguir desligar-se dela,liberá-la da familiaridade, exercer sobre ela uma ‘violên-cia’”.

A mediação (que não deve ser entendida como“intermediação” de situações de conflito) constitui, portan-to, uma necessidade imperiosa para superar o imediatismoalienante. Segundo Pontes (2003), para Lukács a media-ção se refere ao conjunto de particularidades que relaci-ona dialeticamente o universal e o singular. O cotidianoconstitui, assim, um campo de mediações que, não obstante,não aparecem ao sujeito de forma direta, mas lhe são ocul-tas. É necessário, portanto, “superar o plano do imediatismo(da aparência) em busca da essência”, o que exige “cons-truir intelectualmente mediações para reconstruir o pró-prio movimento do objeto” (PONTES, 2003, p. 41). ParaPontes (2003, p. 210), “a captura pela razão dos sistemasde mediações (ocultos sob os fatos sociais) permite pormeio de aproximações sucessivas ir-se negando àfacticidade/imediaticidade, e desvelar-se as forças e pro-cessos que determinam a gênese (nascimento) e o modode ser (funcionamento) dos complexos e fenômenos queexistem em uma determinada sociedade”24.

Assim, o caminho que vai do abstrato para o concreto,partindo do concreto real, surge como a verdadeira possi-bilidade de superar a visão caótica da totalidade, os fatosisolados, supostamente auto-explicados tal como são apre-sentados de forma imediata, direta, ao sujeito, para umacompreensão mediada que apreenda a dialética da rela-ção entre o universal e o singular, entre as leis tendenciaise as situações que enfrenta diariamente.

(VII) O retorno aos autores “clássicos” do ServiçoSocial e a tendência ao rechaço da reconceptualização.

Existe, entre os textos contestadores, a proposta de umretorno à bibliografia clássica do Serviço Social (MaryRichmond, Gordon Hamilton etc.). Algo assim como: “oestudo de sociólogos ou economistas sobre a estrutura so-cial pode apoiar-se em teorias universais, mas o estudo daprática profissional do assistente social deve ser local e sus-tentado pelos textos clássicos ‘específicos’ da profissão”.Sem nenhum afã de retirar a importância desta bibliografiapara a formação profissional, tornam-se necessárias duasobservações. A primeira é que aqueles textos não dão maisconta da realidade social atual a partir, fundamentalmente,das experiências que incorporam direitos sociais conquista-

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dos na passagem do século XIX para o XX, particularmen-te na realidade dos países latino-americanos, onde tais con-quistas, mesmo que precárias, ocorrem tardiamente. Sãotextos que remetem à história da profissão, mas não conti-nuam a fazer sua história. A segunda e fundamental obser-vação é que tais autores e textos “clássicos” são expressãodo endogenismo, do positivismo e do funcionalismo quemarcaram teórica e politicamente a gênese do Serviço So-cial25 . Assim, a opção por estes autores tradicionais ouclássicos como referências centrais representa, sem dúvi-da, a opção por certas correntes do pensamento liberal/positivista/funcionalista e, portanto, significam opções po-líticas: as ações corretivas localizadas e imediatas (do“disfuncional”, do “desintegrado”) por parte do profissio-nal, que redundam na manutenção da estrutura social edo status quo.

Relacionado a isto se constata também, nos textos quecontestam as propostas de construção coletiva de um “pro-jeto ético-político profissional”, um forte rechaço ao Mo-vimento de Reconceptualização. Um exemplo é a con-tundente frase de Di Carlo (2004, p. 15), quando afirmaque a Escola de Serviço Social uruguaia, assim como muitosprofessores e estudantes, nos anos 70, foi “ameaçada comotodas as latino-americanas pela reconceptualizaçãoparalisante […]”, o que levou-o, naquela época, a defen-der o “Trabalho Social real”; ou a afirmação de Cortinas(2003, p. 28): “[…] da mesma forma que o fez há umasdécadas a chamada etapa de ‘reconceptualização’, a qualfreou durante anos o desenvolvimento da profissão.”

A reconceptualização foi “paralisante”? Este não foi ummovimento que, no acerto e no erro, questionou e tentourepensar o papel do profissional? Então não foi “paralisante”,mas inovador. O problema para estes autores é discordarda reconceptualização justamente pelo que significou emtermos de mudança, e não por ser “paralisante”.

Mas estar ou não de acordo com este movimento éum direito. O equívoco é atribuir aos autores das “pers-pectivas histórico-críticas” a mesma condição daquelespostulados. Algumas pontuações precisam ser feitas nes-te caso. Primeiro, que efetivamente deve-se constatar queestes autores e sujeitos profissionais que postulam a cons-trução coletiva de um “projeto ético-político” são herdei-ros do espírito crítico e inovador que prevalecia no cha-mado Movimento de Reconceptualização. Segundo, queeste movimento era extremamente heterogêneo e dentrodele diversas correntes formularam e responderam cer-tas questões de forma variada, muitas vezes acertando,muitas vezes incorrendo em equívocos. Terceiro, que osautores das “perspectivas histórico-críticas” na atualida-de realizam uma superação dos verdadeiros limites da-quele movimento. Superação em relação a um pensamentoprogressista que, no entanto, não conseguiu romper coma lógica positivista26 no que se refere às tendênciasepistemológicas e metodológicas27 , em relação ao

endogenismo característico deste movimento, que muitasvezes autonomizou o desenvolvimento profissional das lu-tas de classes, do advento do capitalismo monopolista edo projeto do grande capital, do papel dos chamados Es-tados de Bem-Estar e de suas políticas sociais28 ; em rela-ção a um certo rechaço ao Serviço Social institucional e àcondenação da assistência como “assistencialismo” (as“perspectivas histórico-críticas” consideram a assistên-cia como um direito conquistado pelo cidadão)29 e inclusi-ve em relação ao “fatalismo” (que levou a impugnar aprática institucional, proclamando como única alternativaprofissional a “mágica” passagem às “comunidades”) eao “messianismo” (onde a auto-proclamação de “agentesde transformação” e a nova denominação de “TrabalhoSocial” e “trabalhadores sociais” – ao invés de “ServiçoSocial” e “assistentes sociais”–, seriam suficientes pararedirecionar o sentido da prática profissional30 . Finalmen-te, reafirmam-se as observações de Netto frente à “críti-ca conservadora à reconceptualização”31 .

(VIII) Tendência ao pós ou antimarxismo.A heterogeneidade que caracteriza as “perspectivas his-

tórico-críticas”, como já vimos, invalida qualquer pretensãode adjetivá-las como “marxistas”. Mas as diversas tendên-cias marxistas na profissão sem dúvida fazem parte destecoletivo. Não obstante, uma característica presente na ge-neralidade daqueles que contestam estas perspectivas con-siste em um forte e claro anti ou pós-marxismo32 .

Efetivamente, um dos avanços do movimento dereconceptualização foi ter estabelecido interlocução como “pensamento marxista”. No entanto, seu limite estámarcado pela incorporação de um marxismo sem Marx;fundamentalmente mediante manuais e divulgadores liga-dos à Terceira Internacional ou marxismo oficial(Harnecker, Stalin), pensadores estruturalistas (Althusser,o jovem Poulantzas) ou de experiências revolucionáriaslocalizadas (Mao, Che).

Os limites destas correntes são superados no debateatual, quando intelectuais marxistas do Serviço Social re-correm à própria obra de Marx (Iamamoto, Netto, Mota),a pensadores “dialéticos” de tradição marxista (pela viahegeliana) como Gramsci (Simionatto, Maciel, Franci G.Cardoso) ou Lukács (Netto, Barroco, Guerra), a historia-dores marxistas como Hobsbawm, a pensadores destatradição preocupados na contemporaneidade capitalista,como Mandel, Mészaros, Petras, Borón. Com estas mu-danças de percurso, a contribuição marxista pós-reconceptualização, superando os limites anteriores, estáem condições de dar novas respostas a velhas e novasquestões: gênese, fundamentos e significado social doServiço Social; o papel do Estado de “bem-estar”, as po-líticas sociais estatais e sua relação com a profissão;neoliberalismo e reforma do Estado; a prática profissionala partir do novo contexto social e mudanças nas deman-

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das institucionais, etc.As contestações às “perspectivas histórico-críticas”,

em boa parte, estão saturadas de anti e de pós-marxismo;porém não conseguem visualizar estas mudanças de per-curso no atual debate dos autores marxistas, estabelecen-do, assim, suas críticas em função dos limites existentesno contexto reconceptualizador. No entanto, é possívelidentificar alguns textos contestadores a estas “perspecti-vas histórico-críticas”, que provêm de vertentes marxis-tas (como são os casos de Cortinas e San Giácomo); emtais casos observa-se como as contestações, visivelmen-te, partem dos mesmos limites anteriormente presentesno “marxismo invadido da lógica positivista”.

(IX) A negação ao debate acadêmico e aberto, medi-ante diversos recursos.

É sabido, nas teorias da comunicação humana, que o“rechaço ao conteúdo” de uma mensagem não equivaleao “rechaço à comunicação”, ao diálogo. Debater, discu-tir, confrontar idéias (inclusive rechaçá-las), tudo isso fazparte da comunicação, especialmente do debate acadê-mico. Por outro lado, “rechaçar a comunicação”, evitar odiálogo, escapar do debate de idéias, pode ser o resultadoda “desqualificação” de seu interlocutor33 . Seguem al-guns exemplos de características geralmente presentesem tais textos, que configuram uma tendência à“desqualificação do interlocutor” e, portanto, ao “rechaçoao debate” acadêmico e aberto:

a) O desconhecimento de seus interlocutores e de suaobra: efetivamente, chama atenção o profundo desco-nhecimento da obra e da biografia dos interlocutoresque pretendem contestar. Exemplos como o de Corti-nas (2003) onde realiza suas considerações sem se-quer ter acessado os textos que “contesta”, apenas apartir da leitura do pequeno ensaio de Di Carlo (2001).Ou o caso de Porzecanski (2001), que identifica a obrade Iamamoto em um texto de 1992, uma década depoisde seu texto original. Ou inclusive o caso de SanGiácomo (DI CARLO, 2004), que renomeia esta autoracomo “Lamamoto”. Exemplos como estes são apenasamostras de uma leitura parcial e apressada dosinterlocutores e das obras que pretendem enfrentar. Algoinadmissível no debate acadêmico responsável.

b) A tergiversação e a deformação do pensamentode seus interlocutores: já teceu-se algumas consi-derações sobre as tergiversações que Porzecanskirealiza sobre os postulados de Iamamoto e deMontaño (MONTAÑO, 2002). Registra-se algo se-melhante no caso de Cortinas (2003a) sobre o tex-to de Netto, que aqui excederia os espaços paraeste artigo. Quando desconhecimento dointerlocutor e tergiversação de seus postulados an-dam juntos, o resultado é nefasto: a absoluta parci-alidade e relativismo no debate. Mas tem mais.

c) A falta de referencialidade e a ausência quasesistemática de citações: é desconcertante consta-tar como nestes textos, quase em sua totalidade,não se recorre a referências e citações de seusinterlocutores. É possível observar-se, em algunscasos, ausência de bibliografia ou daquela referen-te aos autores que “contestam”; em outros casos,o debate sobre supostos “postulados” de seusinterlocutores sem recorrer a citações identifican-do fontes. O resultado disso é claro: o leitor nãotem como comprovar se a versão exposta realmenteé fiel e reflete fidedignamente o pensamento de seuautor ou se, pelo contrário, está ali configurada umatergiversação. Assim, desconhecimento dointerlocutor, tergiversação de seu pensamento eausência de citações e referências (necessárias aodebate acadêmico) permitem que autores debatamcom as imagens que eles mesmos podem construirsobre os postulados de seus interlocutores.

d) Partir de axiomas e verdades irrefutáveis: já tra-tado neste artigo como “naturalização”, o partir de“axiomas” – “missões” supostamente dadas e inal-teráveis, “compromissos” naturais e óbvios, etc. –descaracteriza o processo de construção coletiva apartir do debate de idéias, substituindo-o por estassupostas “verdades” já dadas.

e) Estigmatização de seus interlocutores: observa-se, finalmente, o rechaço ao debate mediante o re-curso da “estigmatização” de seus interlocutores. Emdiversas passagens dos vários textos contestadoresdas “perspectivas histórico-críticas”, seus autores sãoadjetivados como “inquisidores medievais”(Porzecanski, sobre Iamamoto), “um materialistapretensamente dialético” (Cortinas, sobre Netto), “ini-migos internos da profissão” (Di Carlo, sobreMontaño), para dar apenas alguns exemplos. É in-compreensível como se pode defender um debate(na polêmica e no confronto de idéias) aberto,pluralista, acadêmico com este tipo de recursos.

Na verdade o que se evidencia é una forma de evitar oconfronto de idéias, de fugir do debate.

Comentários finaisComentários finaisComentários finaisComentários finaisComentários finais

Em síntese, frente à proposta de construir coletiva-mente um projeto ético-político que dote o assistente soci-al de um perfil crítico, de um sentido político e de um com-portamento ético em sua prática profissional, ampliando suaincidência nos processos em que intervém, se interpõe uma“contestação” que pretende restaurar o sentido social tra-dicional (e, portanto, conservador) da profissão.

Substitui a análise crítica da história pela naturaliza-ção do papel social da profissão. Substitui, assim, a cons-

1 55155155155155Um pro jeto para o Serv iço Soc ia l cr ít icoUm pro jeto para o Serv iço Soc ia l cr ít icoUm pro jeto para o Serv iço Soc ia l cr ít icoUm pro jeto para o Serv iço Soc ia l cr ít icoUm pro jeto para o Serv iço Soc ia l cr ít ico

KAKAKAKAKATÁLTÁLTÁLTÁLTÁLYSIS vYSIS vYSIS vYSIS vYSIS v. 9 n. 2 jul./dez. 2006 Florianópolis SC 141-157. 9 n. 2 jul./dez. 2006 Florianópolis SC 141-157. 9 n. 2 jul./dez. 2006 Florianópolis SC 141-157. 9 n. 2 jul./dez. 2006 Florianópolis SC 141-157. 9 n. 2 jul./dez. 2006 Florianópolis SC 141-157

trução coletiva de um projeto profissional pela vontadeindividual de cada assistente social, embora mais sub-metido (sem sabê-lo ou, inclusive, negando-o) aosdeterminantes estruturais e à correlação de forças exis-tentes (hegemônicas do capital).

Um projeto que tenta dar maior protagonismo ao coletivoprofissional em uma direção ética e política (a partir de de-terminados valores), ou a ação voluntária e individual, queacredita na auto-atribuição do sentido da prática profissionale ao fazê-lo, sem saber e sem querer, se submete (ou seresigna) a uma ação meramente reprodutora. Esta pareceser a disjuntiva em que está imersa esta profissão hoje.

Recebido em 08.04.2006.Aprovado em 02.06.2006.

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NotasNotasNotasNotasNotas

1 Ver Borgianni; Montaño (2000a, b).

2 Ver Iamamoto (1997, cap. II) e Netto (1997, cap. I).

3 Ver Montaño (1998, cap. 1).

4 Ver Montaño (1997).

5 Sobre isto ver Iamamoto (1997, p. 143 e ss.), ao tratar do“profissional da coerção e do consenso”; e Guerra(BORGIANNI, GUERRA e MONTAÑO, 2003, p. 185 e ss.),sobre a “instrumentalização do Serviço Social”.

6 Ver Montaño (2002).

7 Ver Laurell (BORGIANNI e MONTAÑO, 2000a, b) e Montaño(2002).

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8 No primeiro caso, privatização/desnacionalização/desestatização, eliminação de direitos sociais, civis, políticose trabalhistas, (contra) reformas estatais e reestruturaçõesprodutivas para desonerar o capital em suasresponsabilidades fiscais e tributárias, criando novas áreaslucrativas. No segundo caso, nacionalização/publicização/estatização, estimulando e protegendo a indústria mediantea injeção de recursos públicos para o capital, masreconhecendo e respondendo demandas e necessidades desetores trabalhistas. Finalmente, no projeto revolucionário,o desenvolvimento de uma sociedade sem classes fundadana emancipação humana e organizada mediante a associaçãode livres produtores, a erradicação do comando do capital,da exploração e das formas de dominação.

9 “Questão social”, entendida por Iamamoto (2001, p. 11) como“indissociável do processo de acumulação (capitalista) edos efeitos que produz sobre o conjunto das classestrabalhadoras (desemprego, fome, pobreza, emigração, etc.),que se encontra na base da exigência de políticas sociaispúblicas”. Assim, expressa tanto “disparidades econômicas,políticas e culturais das classes sociais, mediatizadas porrelações de gênero, características étnico-raciais e formaçõesregionais, pondo em movimento as relações entre amplossegmentos da sociedade civil e o poder estatal”, comotambém “envolve simultaneamente uma luta franca e abertapela cidadania”. Ou seja, “A questão social tem a ver com aemergência da classe operária (a partir do contexto darevolução industrial) e seu ingresso no cenário político(constituindo-se como classe-para-si)” (idem, p. 17).

10 Citemos apenas alguns: Di Carlo (2001, 2004.), Cortinas (2003,2003a), Porzecansk (2001), Colmam (1998), entre outros.

11 Na segunda Tese sobre Feuerbach, Max afirma que “é na prática(social, histórica) onde o homem tem que demonstrar a verdade”.

12 Prova disso são os seminários que começaram a surgirneste início de século sobre o Serviço Social Crítico e sobreo Projeto Ético-Político Profissional. Ver, a modo de exemplo:a) Seminario Internacional: Identidad, Tendencias yProyecto Ético-Político del Trabajo Social. UniversidadMayor de San Andrés. La Paz, Bolivia, 19 a 22 de agosto de2003; b) Jornada de reflexión: La dimensión política delejercicio profesional. Universidad Nacional de Córdoba,1 e 2 de julho de 2005; c) Encuentro Latinoamericano deTrabajo Social. La formación y la intervención profesionalen la sociedad contemporánea: hacia la construcción deun proyecto ético-político. La Plata, Argentina, 26 e 27 deagosto, 2005; d) I Encuentro Latinoamericano de TrabajoSocial. El Trabajo Social Crítico en el contextolatinoamericano, propuestas alternativas para laconstrucción de una nueva sociedad. Bogotá, Colombia,5 a 8 de outubro de 2005; e) El trabajo comunitario,intervención social, política y ética. Mendoza, Argentina,2 a 4 de dezembro de 2005; f) Seminario Nacional:Construyendo la ciudadanía: desafíos e escenarios doTrabajo Social Latinoamericano. Universidad Católica deSantiago de Guayaquil, 11 e 12 de julho de 2005. Além detextos, conferências e palestras, cursos realizados sobreestes temas.

13 Todas as citações foram traduzidas pelo autor

14 UFRJ: ver Porzecanski (2001, p. 75,77); PUC-SP: ver Di Carlo(2004, p. 10). Sintomático é que cada um destes autoresatribua institucionalidade ao debate, “coincidentemente”com os acordos de mestrado nos respectivos países:Argentina-Brasil (mediante o convênio UNLP e PUC-SP) eUruguay-Brasil (UDELAR e UFRJ).

15 Ver Di Carlo (2001, p. 26-27; 2004, p. 10).

16 Lembrando que Prozecanski, San Giácomo, Di Carlo eCortinas são todos uruguaios.

17 Ver Di Carlo (2004, p. 10).

18 Sobre o “endogenismo” profissional ver Montaño (1998,cap. 1).

19 Como é exemplo a afirmação de Di Carlo (2004, p. 14), aodeterminar que pareceria que os “críticos do Serviço Socialreal ou possível querem destruir esta profissão”, correndo o“risco objetivo da aniquilação da profissão”.

20 Como corretamente observa Iamamoto (1997), “fatalismo emessianismo são ambos prisioneiros de uma análise daprática social que não dá conta da historicidade do ser socialgerado na sociedade capitalista”.

21 Sobre isto ver Iamamoto (1997, p. 104, 108 e ss.)

22 Sobre a “Crítica romântica do capitalismo” ver: Marx (Amiséria da filosofia); Marx e Engels (A ideologia alemã);Engels (Do socialismo utópico ao socialismo científico);Lukács (O assalto à razão); Netto (Lukács e a crítica dafilosofia burguesa).

23 Para Kosik (1989, p. 64), “o ocupar-se é o comportamentoprático do homem no mundo já feito e dado; é manejo emanipulação dos aparelhos no mundo, mas não é criação domundo humano”.

24 Pontes (2003, p. 216-7) exemplifica da seguinte forma:“Quando um problema de um pequeno agrupamento depessoas (ou até de um único indivíduo) [...] passa a sercompreendido como pertencente a tantos outros [...], então,aquela situação única, que se afigurava no plano dasingularidade como problema individual-familiar, mediatiza-se. Essa mediação se dá pelas leis sociais e particularizapelas determinações históricas, ganhando, poraproximações sucessivas, concretude no entrecruzamentodos complexos sociais que compõem a realidade”.

25 Sobre isto ver Iamamoto (1997, p. 159 y ss.), ao discutir “aherança conservadora do Serviço Social”.

26 Sobre isto ver Quiroga (BORGIANNI; MONTAÑO, 2000b,p. 9 e ss).

27 Ver Lima e Rodríguez; Netto; Montaño (ibid, p. 35-51, 121 ess.)

28 Sobre isto ver Iamamoto e Netto (IAMAMOTO, 1992, p.131) e Montaño (1998, p. 5 e ss).

29 Ver Yazbek (BORGIANNI; MONTAÑO, 2000 a, b).

30 Sobre isto ver Iamamoto (1997, p.183).

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31 Mencionemos apenas três das críticas conservadoras queNetto (1981, p. 66, 68-69) comenta: a) “a reconceptualizaçãodeterminou a ideologização profissional”; para Netto, “oServiço Social clássico e tradicional – assim como qualquermodalidade de intervenção sociopolítica – sempre estevematrizado por parâmetros ideológicos inequívocos”. Assim, a“reconceptualização mostrou que o Serviço Social enquantoprofissão nunca ultrapassou o horizonte ideológicoburguês”, o que mostra que “o verdadeiro problema nãoconsiste em integrar ou não componentes ideológicos –consiste em qual componente ideológico deve ser integrado”;portanto, “no fundo, o que se contesta no processo dereconcpetualização não é ‘ter ideologia’, mas ‘ter ideologia deesquerda’”; b) “a reconceptualização desprofissionalizou oServiço Social pela via da politização”; Netto comenta queé inevitável que uma profissão se veja perpassada pelasdinâmicas, tendências e relações sociais num determinadocontexto; nesse sentido, “considerar o processo dereconceptualização ‘politizador’ porque refletiu e assimilouas marcas fulcrais de seu tempo (e onde profissionaischegaram a fazer opções políticas), significa … reconhecer aincapacidade do Serviço Social tradicional para se adequar àsnovas demandas sociais”; c) “a reconceptualizaçãoinstaurou um hiato entre os centros de formação e asagências de intervenção”; afirma o autor que “não cabe (aoscentros de formação) simplesmente suprir a demanda real eimediata posta pelo mercado de trabalho. A formaçãouniversitária…prepara quadros profissionais considerandotanto a realidade dada como detectando as tendências virtuaisque condicionarão novas demandas. A formação não podeser posta a serviço das necessidades imediatas, que nestecaso sempre foram reduzidas às necessidades institucionaisdas agências de intervenção” (agências estas representantes,direta ou indiretamente, dos hegemônicos interesses dogrande capital).

32 Petras (1999, p. 17-20), caracterizando o “pós-marxismo” comoa postura intelectual da moda, a partir do espaço deixado pelaesquerda reformista com o triunfo do neoliberalismo, determinadez argumentos básicos que compõem tal corrente depensamento: 1) o suposto fracasso do socialismo e o fim dasideologias; 2) a acusação de reducionismo marxista na ênfaseda determinação de classe; 3) o Estado como inimigo dademocracia e da liberdade, propondo como contratendênciao protagonismo da sociedade civil; 4) a afirmação de que aplanificação centralizada leva à burocracia, enquanto omercado conduz a um maior consumo e distribuição eficiente;5) a preferência do poder estatal pelas lutas localizadas maisdo que pelas de esquerda tradicionais; 6) a idéia de que asrevoluções sempre acabam mal, preferindo lutar pelaconsolidação da democracia [dentro do sistema]; 7) o enterroda classe como categoria, erguendo em seu lugar outrasidentidades; 8) o descrédito sobre as lutas de classes,preferindo a cooperação governamental e internacional [pararesponder às necessidades na busca do bem comum]; 9) adesconsideração de imperialismo como fenômenosignificativo; 10) a necessidade de que as organizaçõespopulares não apenas respondam às demandas sociais, masque se voltem cada vez mais para a captação de recursosexternos.

33 Afirmam Watzklawick e colaboradores (1987, p. 76) que como recurso da “desqualificação” um sujeito “pode secomunicar de maneira tal que sua própria comunicação ou ado outro fiquem invalidadas. As desqualificações abarcamuma ampla gama de fenômenos comunicacionais, tais comoauto-contradições, incongruências, mudanças de tema,tangencializações, orações incompletas, mal-entendidos,estilo obscuro ou maneirismos idiomáticos, interpretaçõesliterais da metáfora e interpretação metafórica das expressõesliterais, etc”.

Carlos Montañ[email protected] Federal do Rio de JaneiroEscola de Serviço SocialAv. Pasteur, 250 – Campus Praia VermelhaRio de Janeiro – RJCEP: 22290-140

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