um outro natal

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Título: Um Outro NatalTexto: Lucília Barata

lustração: Rita Caldeira CabralDesenhos geométricos: Lucília Barata

Design gráfico: Luciana Bignardi1ª edição: Março 1996

Edição revista: Março 2016

Page 6: Um Outro Natal

Os que sabem, nada sabem se não possuem a força do amor ,

porque o verdadeiro sábio não é o que vê, mas o que, vendo mais longe, ama com mais profundidade.

Ver sem amar é olhar nas trevas.

(Maurice Maeterlinck)

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Page 7: Um Outro Natal

A ti, que procuras a Sabedoria

Com este pequeno conto quero chamar a tua atenção para a importância de três conceitos fundamentais: FORMA, NÚMERO e COR.

Com eles na tua bagagem podes iniciar a viagem ao «misterioso» reino dos símbolos, onde uma nova visão do Universo te espera. Verás que muito podes apren-der com eles e que essa aprendizagem muito enriquecerá o teu espírito. Compreende-rás então que esta linguagem simbólica contém a essência do Conhecimento e que, por isso mesmo, foi a escolhida pelo Espírito Universal para transmitir ao longo da história da humanidade a Sua grande mensagem.

Quando a descobrires verás que ela é muito superior à das palavras e muito mais simples também.

Gostaria ainda que soubesses que há uma nova forma de aprender e uma nova forma de ensinar.

Para ires ao seu encontro deixa que a Mãe Tradição deste conto te pegue na mão e conduza à fonte sagrada onde ela foi beber a sua Sabedoria...

Lucília

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Page 8: Um Outro Natal

Naquele dia, ao entardecer, o João e a Sara regressavam da escola. À medida que caminhavam iam olhando à sua volta.

O Natal tinha-se feito anunciar em cascatas de luz e cor e, no ar, pairava um não sei quê de mistério e magia. A tarde começava já a dar lugar à noite e o som de belos cânticos de Natal passeava-se pelas ruas.

Nas lojas, por onde iam passando, havia um montão de coisas lindas para pôr no sapatinho e, de dentro de uma delas, viram surgir a certa altura um divertido Pai Natal que os fez rir alegremente.

Nessa noite até a árvore de Natal da sua rua se acendeu e ficou coberta de es- trelas cintilantes, como que a avisá-los de que mais um Natal estava a chegar!

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A ESTRELA DE BELÉM

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No dia seguinte, quando o João chegou à escola, sozinho e um pouco atra- sado, trazia uma expressão triste no rosto.

– Como foi possível a Sara ter adoecido assim tão de repente? – interrogava-se, tendo ainda

bem presentes todos os bons e divertidos momentos que, horas antes, tinha partilhado com ela.

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Na sala de aula todos ficaram desolados quando souberam que a sua prima esta-va no hospital. Quiseram saber pormenores. Mas ele pouco podia adiantar. Apenas sabia que, quando tinha saído de casa, ela ainda não tinha chegado.

Tentando consolá-lo a professora sorriu-lhe e acariciou-o com ternura. Há muito que sabia como eram fortes os laços afetivos que os uniam. O facto de serem filhos únicos e terem a mesma idade tinha feito da amizade entre ambos uma amizade muito especial. Mais pare-ciam dois irmãos.

Nesse dia o João mostrou-se ausente e foi pouco participativo na aula. Intimamente só desejava que o tempo passasse depressa para poder voltar a casa.

Como temera, a Sara tinha ficado internada. Pior ainda: o interna-mento estender-se-ia pela quadra de Natal.

Assim que o soube ficou triste. Restava-lhe o consolo de saber que ela não corria perigo de vida. Era apenas uma questão de tempo e voltaria a ficar boa.

De regresso à escola, o João contou a novidade. A notícia foi recebida com algum pesar e comentada por todos: – Que pena ela ter ficado doente logo agora, numa das épocas mais bonitas do ano!

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Em anos anteriores, mais ou menos por esta altura, na escola, entre outras coisas, costumavam fazer os seus presentes para oferecerem aos pais. Como seria o deste ano?

Parecendo responder a esta interrogação a professora propôs que fizessem um bonito cartão de Natal.

À primeira vista poderia parecer uma sugestão um tanto ou quanto banal. Mas, com a certeza de que havia sempre uma boa razão para tudo o que se fazia na aula, a proposta foi acolhida com alegria. E o João decidiu logo que, em vez de um, faria dois cartões: um para oferecer aos pais, outro para oferecer à prima.

– Ótima ideia! – concordaram todos, combinando logo escrever-lhe também uma mensagem.

Só depois souberam que o desenho dos seus cartões seria o de uma árvore de Natal. Não o desenho de uma árvore feito ao jeito de cada um, mas o de uma árvore que seria igual para todos. – Vão ver como ela vos vai ajudar a compreender melhor o significado do Natal – disse-lhes a professora. – Mas, para isso, terão que começar por recordar algumas das coisas que já aprenderam sobre os conceitos de Forma, Número e Cor.

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À medida que a professora ia falando, o João foi recuando no tempo…Começou por recordar o cubo que o ensinara a distinguir as três unidades diferentes

com que pode ser medido o Espaço – de comprimento, superfície e volume – e a maneira como essas unidades se podem agrupar para formar conjuntos.

Lembrou também a surpresa que tivera ao confirmar que não era necessário mais do que um conjunto de dez unidades – tantos como os dedos das mãos! – para se poder descobrir o segredo de

todas as operações numéricas e aprender a identificar a uni-dade e qualquer conjunto até dez com uma das seis cores simbólicas contidas na luz do sol.

E como tinha sido bonito ver surgir pela primeira vez as cores do arco-íris depois dos raios de sol terem atravessado um prisma de vidro transparente!

As mesmas cores que, naquele momento, salpi-cavam as paredes da sala de aula e dança-

vam ao ritmo dos movimentos lentos do pequeno cristal facetado

pendurado junto a uma das janelas,

por onde entrava o sol…

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Um outro conceito importante que aprendera tinha o nome de Simetria. Um conceito curioso que tanto se escondia na forma do corpo humano como em qualquer quadrado ou cubo.

Foi aplicando este conceito que descobrira que muitas formas diferentes podiam ser desenhadas e coloridas em papel quadriculado ou no computador, de acordo com as cores atribuídas à unidade e conjuntos de unidades até dez – representação, no plano, de formas idêntica feitas a partir da unidade de volume representada por um cubo, cuja face definia a quadrícula sobre a qual trabalhavam.

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O desafio desse dia era desenhar uma árvore de Natal cuja superfície fosse igual à de um conjunto de vinte e cinco quadrados, precisamente o número que, no mês de Dezembro, assinala o dia de Natal.

Para lhes facilitar a tarefa, a professora sugeriu que um desses quadrados

representasse o tronco da árvore.

– Dividam os outros vinte e quatro em três conjuntos iguais, de modo que

cada conjunto possa corresponder à forma de uma camada da árvore – acrescentou.

– E não se esqueçam do princípio de simetria que permite dividir cada quadrado em

dois triângulos iguais.Sabendo que a área de cada uma dessas formas teria que ser igual a oito uni-

dades de superfície, as crianças partiram à descoberta de formas com essa área.

Começaram por desenhar um retângulo.

Logo a seguir um trapézio…

E não foi preciso ir mais longe…

Pouco depois um triângulo...

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– Descobri! Descobri! – exclamou o João a certa altura, entusiasmado. – Se rejeitarmos o retângulo e, ao quadrado escolhido para o tronco, juntarmos dois tra-pézios iguais a este, e no topo pusermos o triângulo, temos a forma de uma árvore de Natal. Posso mostrar como? Sem esperar qualquer resposta pegou numa tesoura, come-çou a recortar as formas geométricas que achava necessárias, e foi colocando uma a uma sobre uma folha de papel liso, con-tornando-as com um lápis. E o resultado foi a forma de um tradicional pinheirinho de Natal com três camadas dis-tintas!

– Bom, agora que já têm a forma da árvore, só precisam encontrar as cores adequadas para colorir cada uma das suas partes – disse-lhes a professora.

Queria ela dizer com isto que essas cores não podiam ser esco-

lhidas ao acaso. Teriam que ser as mesmas que costumavam atribuir à unidade e aos conjuntos de

unidades até dez. E não era que essa correspondência permitia que o tron-co fosse colorido de vermelho e o resto da árvore de

verde?!... No vermelho do tronco descobriram a cor do sangue

– a seiva que nele circulava e ia alimentar os seus ramos. No verde dos ramos descobriram a cor das folhas das árvores perenes, que nunca ficam nuas com

o rodar das estações. Por outro lado, sendo o Natal a festa da Família, as suas três camadas foram comparadas às três gerações necessárias para definir todas as relações de parentesco.

A camada superior representaria a geração mais nova – a dos Filhos – , a camada seguinte a geração dos Pais e, por fim, mesmo juntinho ao tronco, a geração dos Avós.

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Foi depois altura de enfeitar a árvore com bolas e fios, tal como se enfeita qualquer árvore de Natal. As bolas, como frutos pendurados numa árvore, simboliza-riam as pessoas pertencentes a cada uma das três gerações nela representadas. O que é cada pessoa, afinal, se não o “fruto” do amor dos seus pais? Quanto aos fios, eles representariam as ligações de parentesco e também afetivas que uniam essas pessoas. João começou por colocar doze bolas verme-lhas na sua árvore, as quais foram assim distri-buídas: duas na camada de cima, represen-tando-o a ele e à prima, quatro na camada a seguir, representando os pais de ambos, e seis na camada inferior, representando os seus avós.

– Que giro! – disse para consigo ao contá-las mentalmen-te, de cima para baixo.

Até parecia que tinha começado outra vez a

aprender a “tabuada” – uma vez duas... duas vezes duas...

três vezes duas... – e voltado

ao princípio da adição – duas mais duas é igual a quatro… quatro mais duas é igual a seis… duas mais quatro, mais seis, é igual a doze. Doze ! O número necessário para definir as principais relações de parentesco, igual ao número de elementos comuns pertencentes à sua família e de Sara. Uma coincidência que o deixou feliz e levou depois, cheio de entusiasmo, a ligar entre si as bolas da sua árvore.

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Nos desenhos que fizeram, porém, nem todas as árvores ficaram com doze bolas. Umas ficaram com menos, o que aconteceu com as árvores daqueles que eram filhos únicos e não tinham tios. Outras ficaram com mais, como aconteceu com as daqueles que, além de irmãos, tinham também tios e primos. E, neste último caso, houve até alguém que se viu em apuros para resolver o problema. Como poderia a Ana representar na sua árvore os seus três irmãos, vinte e tal tios e tias, e mais de quarenta primos e primas? Não seria melhor nela representar apenas os seus irmãos, pais e avós?

Foi isso o que ela fez. Contudo, o exemplo desta família numerosa serviu de ponto de partida para

todos descobrirem como pode ser grande o conceito de Família. Como puderam dedu-zir, não só a Ana, mas também os pais, os irmãos e todos os seus familiares mais pró-ximos, não faziam apenas parte da sua árvore. Todos tinham, também, lugar em outras árvores, nas quais havia pessoas que, por sua vez, pertenciam a outras árvores e assim por diante…

Viram assim que as pessoas iam saltando de árvore em árvore, como os pássa-ros saltitam de galho em galho sempre à volta da mesma árvore. Uma árvore que, neste caso, não era senão um dos ramos mais novos de uma única árvore geneaógica nascida no Jardim do Éden.

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Aproximando-se do João, a professora pediu-lhe que lesse alto uma peque-nina história que ela mesma tinha escrito para eles:

Era uma vez uma árvore enorme, na qual teve origem a grande família humana. Com o passar do tempo os seus ramos mais antigos foram-se inclinando para o solo, nele deixando cair os seus frutos.

Uma vez no chão, esses frutos penetraram a terra e tudo fizeram para desco-brir os segredos que dentro dela se escondiam. Mas a terra apenas parecia murmu-rar baixinho:

– O segredo está em ti... o segredo está em ti...

Sem desistir, puseram-se a caminhar. Até que encontraram as raízes da árvo-re que lhes dera vida. Por elas começaram a trepar… a trepar…, ao mesmo tempo que iam absorvendo muitos dos seus ensinamentos.

Com essa sabedoria continuaram a subir e começaram a alimentar os frutos que iam encontrando pelo caminho. Mas, por mais que se esforçassem, era cada vez mais difícil alcançar aqueles que estavam nas camadas mais altas daquela árvore enorme.

Neste processo lento e penoso esta grande Árvore da Família foi perdendo muito da sua força. E agora, já velhinha, cada vez mais vergada pelo peso de tantos frutos que dera, receava que os seus ramos se quebrassem ou secassem, não poden-do dar mais frutos.

Enquanto isso, os frutos das suas camadas mais altas olhavam o céu azul numa atitude de súplica, esperando que o céu lhes revelasse os seus segredos. Mas o céu, tal como a terra, apenas parecia repetir baixinho:

– O segredo está em ti... o segredo está em ti...20

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Mas, teria sido apenas esta árvore da Família a furar a crosta do planeta Terra para poder ver a luz do sol? Não. Outras árvores o tinham feito e eram tão frondosas como ela. E o mais curioso é que, sendo tantas, jamais tinham pensado em trocar entre si os seus frutos. Cada um de sua espécie faziam lembrar filhotes de todos os casais enamorados que entraram na grande Arca de Noé.

Algumas dessas árvores, porém, em vez de crescerem para fora da terra tinham crescido na água, estendendo os seus ramos por oceanos e rios, lagos e pequenas fontes. Outras ainda tinham crescido dentro da própria terra, procurandoo calor que esta alberga no seu ventre.

Árvores e mais árvores de família perfurando com as suas raízes o corpo fecundo do planeta Terra, para aí se entrelaçarem e unirem num grande abraço. Apenas uma viagem mágica no Espaço e no Tempo e aquela singela árvore de Natal, que o João tinha à sua frente, acabara de transformar-se na única e verdadeira Árvore da Família !

Um pouco mais de imaginação e quem sabe se ela não poderia transformar-se na própria Árvore da Vida?

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Depois de enfeitadas com bolas e fios multicores, até parecia que a árvore que tinham feito já estava pronta e completo, também, o seu significado simbólico. Mas... estaria? Não se teriam eles esquecido de colocar nela o elemento mais importante sem o qual qualquer árvore de Natal fica mergulhada em total escuridão, mesmo que a luz do sol ou de qualquer gambiarra elétrica a ilumine por fora?

– Claro! A estrela! – pensou logo o João, batendo com a mão na testa, admi-rado por se ter esquecido de tão importante detalhe. Pois se até era costume, ele e a prima, fazerem um sorteio para verem quem teria o privilégio de colocar a estrela no topo da árvore de Natal que ambos costumavam fazer em casa dos avós de ambos, onde sempre se juntavam para celebrar o Natal!... Naquela árvore simbólica, qual seria a forma dessa estrela? E qual seria o seu nome? A resposta a estas perguntas estava ali bem perto deles, escondida no presé-pio que tinham feito e se encontrava num dos cantos da sala de aulas. Contrastando com o tamanho e complexidade da Árvore da Família Humana que tinham acabado de descobrir, as três principais figuras do presépio indicavam, em toda a sua singeleza, a essência do próprio conceito de Família. Não o de uma família vulgar, unida pelos laços vermelhos do sangue, mas o de uma família dife-rente, unida pelos laços invisíveis do espírito.

A anunciar o nascimento daquele menino deitado nas palhinhas do presépio, tinha aparecido no céu, lá para os lados do Oriente, uma enorme estrela brilhante. Fora ela que ensinara o caminho aos Reis Magos até Belém, o local onde tinha aca-bado de nascer um outro rei da linhagem de David – um dos mais importantes reis de Israel. Por isso aquela estrela só podia ter uma forma: a mesma da estrela que o povo de Israel tinha adotado como símbolo da sua nação, e que todos conheciam por Estrela de David.

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Para descobrirem a forma dessa estrela foi necessário, no entanto, encontrar, em primeiro lugar, um outro símbolo: o Olho do Conhecimento ou Olho da Sabedoria...

A sua forma era idêntica à dos olhos que temos no rosto, através dos quais podemos ver as formas que a luz tem o condão de revelar. Mas, para revelar as formas que este olho permite des-cobrir, era preciso uma luz que também ilumina por dentro: a luz

da Estrela de David ou Estrela de Belém.

Formada por dois triângulos equilá-teros entrelaçados, esta estrela de seis pontas foi dividida em seis partes iguais, sendo cada uma delas colorida com uma das seis cores do arco-íris.

E não tardou a ser colocada no topo da árvore de Natal que tinham feito, derra-

mando sobre ela todo o esplendor da sua luz!26

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E o menino do presépio? Que veio ele fazer ao mundo? – interrogou-se João, a certa altura.

Assim como os médicos estavam a tentar curar a sua prima, também ele tinha vindo para curar a Humanidade. A sua missão tinha sido a de sarar um belo “plane-ta azul”, que no espaço viaja juntamente com outras células suas irmãs, mas estava ainda mais doente do que algumas células do corpo de Sara. Era, por isso, necessá-rio sará-lo, e sará-lo bem depressa!...

– Sara... sarar... – disse baixinho para consigo, como se apenas então se aper-cebesse do lindo significado oculto no nome da sua prima. Que pena tinha de não poder partilhar com ela tudo aquilo que tinha aprendido nos últimos dias sobre o verdadeiro significado do Natal! Principalmente agora que começava a ver com outros olhos o arquétipo da Árvore de Natal que iria oferecer-lhe.

Sem saber explicar, tinha a sensação de que o Olho do Conhecimento que havia dentro dele tinha começado a abrir-se lentamente, permitindo-lhe uma visão que, em vez de lhe trazer paz, começava a perturbá-lo um pouco.

Era-lhe agora difícil olhar os ramos da árvore que fizera sem evocar os muitos ramos da grande Árvore da Família Humana e ver neles caminhar, lado a lado, a saúde e a doença, a alegria e a dor, a inocência e a maldade, a paz e a guerra, a vida e a morte...

Não ficou surpreendido ao vê-los. Só que, por mais que tentasse, não conseguia entender porque é que caminhavam aos pares e pareciam seguir de mãos dadas. Olhou fixamente a árvore que tinha à sua frente, esperando que ela lhe desse uma resposta. Mas a árvore, em vez de lhe responder, cobriu-se com o manto do Amor tecido pela luz da estrela que a coroava...

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Que achas, João? – perguntou-lhe a professora, fazendo-o “descer à terra”. – Não te parece que vai ser necessário identificares cada uma das bolas no desenho que vais fazer para oferecer a Sara?

A professora tinha razão. Como é que a prima poderia descobrir o significado simbólico da Árvore de Natal que iria desenhar para oferecer-lhe, se ela não tinha estado com eles nos últimos dias? Não seria melhor colocar dentro de cada bola a imagem da pessoa que ela representava?

Todos os seus colegas já tinham feito a sua opção. Uns tinham-se decidido pela fotografia. Outros tinham preferido o desenho. Só ele parecia continuar indeciso.

Depois de pensar um pouco, acabou por decidir-se pela fotografia. Era impor-tante que Sara descobrisse o significado de cada uma das bolas colocadas na árvore do cartão que iria receber. Mas isso só seria possível se ela identificasse logo a pes-soa representada em cada uma delas. Assim, mesmo sabendo que muitas coisas fica-riam por explicar sobre o verdadeiro significado do Natal, João teve a certeza de que, através do amor que unia todas as pessoas representadas na sua árvore de família, deixaria bem clara a mensagem transmitida pela luz da estrela que a iluminava:

Só os laços invisíveis do Amor dão sentido ao Natal.

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Logo que o cartão ficou pronto João apressou-se a ir entregá-lo à prima. Sara ficou emocionada quando olhou o cartão e viu o rosto das pessoas que mais amava, fitando-a a sorrir. No olhar de cada uma pareceu-lhe ver refletida a cor da esperança, a mesma que dava vida aos ramos daquela linda árvore de Natal que o primo tinha feito para ela. O Natal ainda não tinha chegado, mas era como se já o estivesse a celebrar com a família.

Seus olhos deixaram transparecer um arco-íris de sentimentos logo que abriu o cartão e viu, no seu interior, as mensagens do primo, da professora e de todos os colegas.

Começou a lê-las. E, à medida que o foi fazendo, a emoção que sentia foi cres-cendo dentro dela. A leve tristeza que ainda tinha antes de iniciar a leitura começou a dissipar-se, dando lugar a uma alegria intensa e profunda que só o amor faz acon-tecer. Seria a primeira vez que não partilharia toda a quadra do Natal com a família. Mas, que importava isso agora, se as pessoas que lhe eram mais queridas a tinham vindo visitar para lhe dar o ânimo que precisava e para encher o seu coração de ale-gria? Além disso – pensou –, não seria ela a única criança a passar o Natal no hos-pital. Outras crianças estavam também ali para combater a doença, o que gerara entre todas um forte sentimento de solidariedade. Mais pareciam já uma pequena família.

Limpou uma lagrimita teimosa que lhe começara a rolar pelo rosto, fruto da emoção que sentia e, olhando ternamente o primo, inclinou-se para o abraçar.

E assim ficaram, por momentos, unidos num abraço que parecia ter o tamanho do mundo...

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Após as férias de Natal, João voltou à escola de novo acompanhado pela prima.Um novo período escolar começava e, como sempre acontecia, havia imensas

coisas novas para contar. Mas a maior de todas foi a que logo se espalhou pela escola como um sussurro que se multiplicou e parecia dizer:

A Sara sarou ... A Sara sarou... A Sara sarou...

Na sala de aula o reencontro chegou a ser comovente.Olhando à sua volta, Sara ia observando tudo com atenção, tentando descobrir

se alguma coisa tinha mudado durante a sua ausência. Mas, aparentemente, nada tinha mudado. Apenas ela tinha mudado. A sua doença, assim como a morte de uma amiguinha que fizera no hospital, tinha abalado muito o seu pequeno-grande coração. Não. Nunca mais nada seria como antes. Aquele Natal era já um marco importante na sua vida. Para trás tinham ficado os Natais mágicos da sua infância. Era como se o olho de que o primo lhe falara se tivesse também aberto dentro dela, permitindo-lhe ver, pela primeira vez, o verdadeiro rosto do sofrimento e da morte. Não. Nunca mais nada seria como antes. Che-gou mesmo a pensar, nos momentos mais difíceis, que nunca mais voltaria a rir e a brincar despreo-cupadamente como o tinha feito até ali. Interro-gou-se, até, com alguma sabedoria, se alguma vez poderia vir a esquecer ou a ignorar tudo o que tinha visto e vivido em tão curto espaço de tempo.

A vida, porém, muito mais sábia do que ela, encarregou-se de lhe ir dando as respostas que precisava.

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Terminada a quadra natalícia, a primeira festividade a surgir no calendário do Tempo foi o Carnaval. O reino do Faz-de-conta não tardou a fazer-se anunciar com enorme animação. Na escola começaram a fazer-se os preparativos para o comemo-rar, e durante alguns dias todas as crianças puderam dar asas à sua imaginação.

Neste reino da fantasia houve lugar para máscaras, confetis e serpentinas e, até, para algumas «partidinhas» inocentes que fizeram umas às outras.

Por todo o lado havia uma alegria ruidosa que chegava a ser conta-giante. E, como seria de esperar, João e Sara foram contagiados por ela.

Só a professora sabia que esta onda passageira não tardaria a desfazer-se em espuma na grande praia da Vida. Mas ela sabia, também, como era importante que cada criança sobre ela pudesse rodopiar e deslizar, como fazem os surfistas com algumas ondas do mar...

Terminada a quadra natalícia, a primeira festividade a surgir no calendário do Tempo foi o Carnaval. O reino do faz-de-conta não tardou a fazer-se anunciar com enorme animação. Na escola começaram a fazer-se os preparativos para o comemo-rar, e durante alguns dias todas as crianças puderam dar asas à sua imaginação.

Neste reino da fantasia houve lugar para máscaras, confetis e algumas «parti-dinhas» inocentes que fizeram umas às outras. Por todo o lado havia uma alegria ruidosa que chegava a ser contagiante. E, como seria de esperar, o João e a Sara foram contagiados por ela.

Só a professora sabia que esta onda passageira não tardaria a desfazer-se em espuma na grande praia da Vida. Mas ela sabia, também, como era importante que cada criança sobre ela pudesse rodopiar e deslizar, como fazem os surfistas com algumas ondas do mar...

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Depois de umas curtas férias, as crianças voltaram a reunir-se na escola. A euforia da quadra carnavalesca tinha desaparecido e tudo voltara à normalidade. O tempo que agora se vivia era outro. O Carnaval tinha dado lugar à Quaresma – os quarenta dias que antecedem a Páscoa. Ao contrário da alegria esfuziante dos dias de Carnaval, a Quaresma dava iní-cio a um período de interiorização e reflexão absolutamente necessário para se poder compreender o significado da grande festa que se aproximava. Depressa as montras das pastelarias e prateleiras dos supermercados se en-cheram de amêndoas e ovos de chocolate embrulhados em coloridos papéis de prata. Os primeiros sinais de que a Páscoa não tardaria a chegar, embora poucos soubessem por que é que a amêndoa e o ovo se tinham tornado símbolos pascais. É a tradição – dizia-se. E a Tradição lá seguia, no seu passo lento e cansado, afastando-se cada vez mais da fonte que lhe dera origem. Não seria, então, tempo dela fazer o caminho inverso e ir beber novamente a essa fonte sagrada? Quem sabe se, assim, não voltaria revigorada e cheia de vida? E ela foi. Andou... andou... andou… até chegar à nascente onde sabia ter brotado a grande Árvore da Vida. Exausta da caminhada, foi bebendo até saciar a sua sede. Só depois, completa-mente revigorada, iniciou o seu caminho de volta.

Pelo caminho foi saudando todos os que encontrava, sempre pronta a respon-der às perguntas que lhe faziam. E, com enorme satisfação, pode notar que voltava a ser respeitada.

A notícia do seu regresso depressa se espalhou pela escola, ainda com maior rapidez do que aquela que anunciara o regresso de Sara. Desta vez parecia repetir em voz alta:

– Vamos ter nova professora!... Vamos ter nova professora!... 38

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a sala de aula todos começaram a aguardar a sua chegada com uma certa ansiedade. E ela não se fez esperar.

Já sentada no meio das crianças, começou por lhes pedir que desenhassem o olho que lhes permitira descobrir a luz da estrela colocada no topo da árvore de Natal que tinham feito. – Vamos ver se conseguem descobrir nele a forma de uma amêndoa - disse em tom de alegre desafio. As crianças desenharam o olho. Depois, lembrando-se da expressão «olhos amendoados», ficaram paradas, pensando que o próprio olho fosse a amêndoa a que ela referia. Mas não. Não era o olho, mas sim a forma das duas amêndoas que o formavam. Bastou-lhes então mudar a posição da folha de papel… e eis que elas se revelaram!

- Muito bem! – elogiou a Tradição.

– Mas, sendo elas iguais, basta que avivem os contornos de uma e façam o mesmo aos segmentos de reta que definem a sua largura e altura.

N

Fizeram-no. E imediatamente se tornaram

visíveis as formas de uma cruz e de uma amêndoa - dois símbolos pascais associados à morte e ressurreição de Cristo…

Fizeram-no. E imediatamente se tornaram visíveis as formas de uma cruz e de uma amên-

doa – dois símbolos pascais associados à morte e ressurreição de Cristo…

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a sala de aula todos começaram a aguardar a sua chegada com uma certa ansiedade. E ela não se fez esperar.

Já sentada no meio das crianças, começou por lhes pedir que desenhassem o olho que lhes permitira descobrir a luz da estrela colocada no topo da árvore de Natal que tinham feito. – Vamos ver se conseguem descobrir nele a forma de uma amêndoa - disse em tom de alegre desafio. As crianças desenharam o olho. Depois, lembrando-se da expressão «olhos amendoados», ficaram paradas, pensando que o próprio olho fosse a amêndoa a que ela referia. Mas não. Não era o olho, mas sim a forma das duas amêndoas que o formavam. Bastou-lhes então mudar a posição da folha de papel… e eis que elas se revelaram!

- Muito bem! – elogiou a Tradição.

– Mas, sendo elas iguais, basta que avivem os contornos de uma e façam o mesmo aos segmentos de reta que definem a sua largura e altura.

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Fizeram-no. E imediatamente se tornaram

visíveis as formas de uma cruz e de uma amêndoa - dois símbolos pascais associados à morte e ressurreição de Cristo…

Na sala de aula todas as crianças começaram a aguardar a sua chegada com uma certa ansiedade. E ela não se fez esperar. Já sentada no meio delas, começou por lhes pedir que desenhassem o olho que lhes permitira descobrir a luz da estrela colocada no topo da árvore de Natal.

– Vamos ver se conseguem descobrir nele a forma de uma amêndoa – disse em tom de alegre desafio. As crianças desenharam o olho. Depois, lembrando-se da expressão «olhos amendoados», ficaram paradas, pensando que o próprio olho fosse a amêndoa a que ela se referia. Mas não. Não era o olho, mas sim a forma das duas amêndoas que o formavam.

Bastou-lhes então mudar a posição da folha de papel… e eis que elas se revelaram!

– Muito bem! – elogiou a Tradição. Mas, sendo elas iguais, basta avivarem os contornos de uma delas. Realcem também os segmentos de reta que definem a sua largura e altura.

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O conceito de perpendicularidade, implícito na cruz que definia as dimen-sões desta amêndoa, era bem conhecido de todas as crianças que se encontravam na aula. Sabiam que dele dependia a orientação no espaço, e que neste conceito estava implícito o ângulo reto. Um ângulo muito especial que, desde cedo, descobriram através do próprio corpo em algumas das suas posi-ções: de pé, deitado, sentado ou ajoelhado.

Qualquer uma delas sabia, também, que era na posição dos dois segmentos que definiam este ângulo que se escondiam dois princípios muito importantes: um de repouso, outro de movimento. Um relacionado com a morte, outro relacionado com a vida. Tinham--nos descoberto de uma maneira simples e, tam-bém, muito natural. Precisamente através das duas posições, perpendiculares entre si, em que fica o nosso corpo quando dormimos ou cami-nhamos: a primeira – horizontal –, a segunda – vertical –.

Fora assim que começaram a entender que o sono não é senão uma morte aparente, e a vida um movimento contínuo. Como sabiam que, de certo modo, todas as noites morriam para a vida, e todas as manhãs renasciam para ela.

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Para entenderem melhor o ciclo da Vida tinham seguido a

gotinha azul do mar,

chuva abençoada, “menina-gotinha-de-água”

que conheciam, e com ela foram nuvem no ar,

fonte a cantar,ribeiro a saltar,

rio a correr,

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rio a correr,e, uma vez mais,

gotinha azul do mar,quando o rio

foi desaguar no mar... 45

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e, uma vez mais , pequena semente,

quando o fruto caiu na terra…

Tinham seguido também a “semente”, e com ela foram

pequena semente,

delicada planta,

árvore frondosa,

colorida flor,

fruto maduro,

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Na grande Árvore da Vida tudo lhes falava de morte e ressurreição. Seria isso o que a Tradição tinha para lhes dizer? Mas... isso já elas sabiam! O que seria então? Que mensagem importante era aquela que a tinha levado a fazer uma tão longa caminhada, depois de ter matado a sua sede nas águas cristalinas daquela fonte sagrada? Por enquanto apenas sabiam que ela chamara a atenção de todos para a cruz e para a amêndoa que tinham desenhado. Mas, o que haveria de tão especial nestas duas formas?

Não levou muito tempo para ficarem a saber que a dimensão dos três segmen-tos mais pequenos da cruz, que definia a amêndoa, era igual à aresta do cubo com que tinham aprendido a definir as três principais unidades de medida – de comprimen-to, superfície e volume – e que o segmento maior era igual à sua diagonal.

Sim… Não deixava de ser uma coincidência interessante. Mas os números e as formas já as tinham presenteado com tantas coincidên-cias, que esta era apenas mais uma.

Confrontada com a aparente indiferença das crianças, a Tradição resolveu fazer-lhes uma “partida”. Com uma das mãos segurou a peça vermelha de madeira que, juntamente com outras, formavam o cubo – a mesma peça que os ajudara a descobrir as dimensões da cruz – e, com a outra mão, pegou num cubo branco igual ao vermelho formado por essas peças.

Fitou depois, atentamente, cada um dos rostos que a olhava com um ar intrigado e voltou a desafiá-las:

– Sempre quero ver se são capa-zes de construir a forma de uma casa com estas duas peças de madeira.

Realmente, aquele era um grande desafio. 48

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Surpreendida, Sara foi a primeira a pergun-tar em tom duvidoso:

– Uma casa?!... – Sim, uma casa

– confirmou ela.As crianças deram tra-

tos à imaginação. Tentaram e vol-taram a tentar encontrar uma solução, mas acabaram por concluir que tal proeza era impossível.

– Impossível? – disse a Tradição franzindo a testa. – Então vou provar-vos o contrário!

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Dizendo isto, foi buscar um objeto de madeira que estava num armário e colo-cou-o em cima da mesa de trabalho, tendo o cuidado de o manter apenas virado para si enquanto nele não colocou as duas peças que lhes dera momentos antes, e tinham sido já viradas e reviradas pelas mãos de todas as crianças que tinha à sua frente. Depois, como num truque de magia, pegou nele com as mãos, virou-o rapidamente para a turma e exclamou:

– Aqui têm a forma de uma casa feita com as duas peças que vos dei!

– Oh! – exclamaram surpreendidas.50

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Não havia dúvida que essas peças, encostadas às três placas unidas e perpendi-culares entre si, ao refletirem-se nos espelhos que revestiam o interior das duas placas verticais, davam a ideia de uma casa branca coberta por um telhado vermelho.

Embora fascinado com a solução do problema, João não pode deixar de argu-mentar:

– Mas... não é uma casa de verdade... – Não me lembro de ter referido a natureza da casa. Se era real ou virtual, ou

uma mistura de ambas… – respondeu a Tradição. Que partidinha marota acabava de lhes pregar! E, pelos vistos, resultou em

cheio, pois este pequeno “truque de magia” aumentou imenso a curiosidade de todos. O que era um bom sinal, pois aquela peça de madeira, fosse forrada interiormente com um, dois ou três espelhos, ainda teria muito para lhes ensinar sobre os segredos do Espaço.

Este tinha sido também o pretexto que a Tradição encontrou para poder com-parar a figura de Jesus à «pedra angular» de um edifício espiritual – o mais belo de todos os tempos e de todos os lugares – erguido em louvor a Deus!

É certo que nem sempre era fácil para as crianças estabelecerem uma ligação imediata entre os símbolos que iam descobrindo e tudo o que se escondia por trás deles. Podiam sentir, no entanto, que neles havia lógica e que, por seu intermédio, começavam a entender melhor alguns “mistérios” da Vida, que iam desvendando aos poucos. Não era, pois, de admirar que, por vezes, se sentissem confusas. Afinal, estava ainda no início a sua viagem pelo misterioso reino dos símbolos...

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Quando a Tradição chegou à escola onde o João e a Sara andavam, pensou que a sua visita ali seria rápida e de lá partiria para visitar outras escolas. Mas, depois do truque com os espelhos, quando se preparava para partir, as crianças

pediram-lhe que não se fosse embora. Queriam que ela ficasse, pelo menos, até às férias da Páscoa. A verdade é que gosta-

riam de saber mais coisas sobre aquele menino que ainda há tão pouco tempo tinham visto no presépio e já pare-cia encaminhar-se para a colina onde ia ser crucifica-do. Por isso era importante que ela as ajudasse a entender o verdadeiro significado da Páscoa. Perante tanta insistência, e vendo que estavam a ser sinceras, a Tradição aceitou ficar por mais algum tempo. Queriam saber mais? Pois bem! Então que voltas-sem a fazer o mesmo desenho do olho que lhes revela-ra a forma da amêndoa e da cruz.

– Outra vez?! – estranharam elas. – Sim, outra vez... Porque não? Se os olhos que têm

no rosto vos permite ver muitas formas, porque não há-de este olho permitir-vos descobrir muitos símbolos?!

Realmente, esta analogia foi logo comprovada quando, sem grande esforço, descobriram a forma de um peixe.

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uando a Tradição chegou à escola, onde João e Sara andavam, pensou que a sua visita ali seria rápida e de lá partiria para visitar outras escolas.

Mas, depois do truque com os espelhos, quando se preparava para partir, as crianças pediram-lhe que não se fosse embora. Queriam que ela ficasse, pelo menos, até às férias da Páscoa. A verdade é que gostariam de saber mais coisas sobre aquele menino que ainda há tão pouco tempo tinham visto no presépio e já parecia encaminhar-se para a colina onde ia ser crucificado. Por isso era importante que ela as ajudasse a entender o verdadeiro significado da Páscoa. Perante tanta insistência, e vendo que estavam a ser sinceras, a Tradição aceitou ficar por mais algum tempo. Queriam saber mais? Pois bem! Então que voltassem a fazer o mesmo desenho do olho que lhes revelara a forma da amêndoa e da cruz. - Outra vez?! - estranharam elas. - Sim, outra vez... Porque não? Se os olhos que têm no rosto os permite ver muitas formas, porque não há-de este olho permitir-vos descobrir muitos símbolos?!

Realmente, esta analogia, foi logo comprovada quando, sem grande esforço, descobriram a forma de um peixe.

Explicou-lhes, então, a Tradição, que este era mais um símbolo de Jesus, que escolhera alguns pescadores para o seguirem, de modo a tornaram-se mais tarde «pescadores» de homens. Disse-lhes, ainda, que as letras da palavra Peixe, em grego, coincidiam com as iniciais das palavras «Jesus Cristo Deus Filho Salvador». O que é que elas tinham a dizer sobre isto? O que é que sabiam de Deus?

- Mas que pergunta! - pensaram. – Como se alguém soubesse ou conseguisse explicar…

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Explicou-lhes a Tradição, que este era mais um símbolo de Jesus, que escolhe-ra alguns pescadores para o seguirem, de modo a tornaram-se mais tarde «pescado-res» de homens. Disse-lhes, ainda, que as letras da palavra Peixe, em grego, coinci-diam com as iniciais das palavras «Jesus Cristo Deus Filho Salvador». O que é que elas tinham a dizer sobre isto? O que é que sabiam de Deus?

– Mas que pergunta! – pensaram. – Como se alguém conseguisse explicar...53

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Enquanto olhavam uns para os outros com ar interrogativo, o João e a Sara trocaram entre si um olhar cúmplice. Isto porque, naquele momento, ambos se lem-braram do deslumbrante espetáculo de fogo-de-artifício a que tinham assistido numa linda noite de verão, durante as últimas férias.

Perante tanta beleza, e com tudo aquilo que já tinham aprendido sobre o Uni-verso, acharam que, se ele pudesse ser visto de fora como estavam a ver o fogo-de--artifício, devia ser parecido com algumas daquelas formas – qual delas a mais bonita! – só que infinitamente maior.

Desde então, sempre que se falava ou explicava qualquer coisa sobre o Univer-so, eles imaginavam-no logo como tendo origem numa enorme explosão, idêntica àquela provocada pela cabeça de um foguete ao desintegrar-se na escuridão do Espaço, nele lançando biliões e biliões de partículas incandescentes que depois se iam expandindo em formas de rara beleza.

Ambos sabiam que algumas destas partículas, em contacto com o frio do Espaço, iam arrefecendo e perdendo o seu brilho, exatamente como tinha acontecido com o planeta onde viviam.

Isto lhes bastava para compreenderem a beleza e imensidão do Universo, que eles achavam ser o “corpo” de Deus, do qual sabiam fazer parte. E se eles, como cor-pos tão pequeninos que eram, tinham pensamento próprio, porque não haviam de admitir que esse corpo universal tinha também o seu próprio pensamento? Não seria esse o Espírito Universal ou Pensamento de Deus?

É claro que eles não iam dizer nada disto à Tradição. Sabia-se lá o que é que ela lhes poderia dizer sobre Deus! Se calhar começaria com explicações muito com-plicadas que não entenderiam, e no final, além de ficarem confusos, ficariam tam-bém na dúvida se o Deus único em que acreditavam tinha algo a ver com os muitos deuses concebidos pelo Homem ao longo da sua história.

Por isso nada disseram.54

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entindo o silêncio prolongar-se, a Tradição achou melhor não insistir e desistiu da pergunta. Em vez disso ensinou-lhes o sítio certo onde deveriam

colocar o ponto que representaria o olho do peixe que tinham desenhado.

A princípio este pedido pareceu-lhes um pouquinho exagerada. Mas, depois de terem feito em arame um peixe igual ao do desenho, e de aprenderem a rodá-lo da maneira que a Tradição lhes ensinou, logo entenderam porquê. Como poderiam imaginar que a posição desse olho lhes permitiria descobrir os princípios subjacentes a um importante tipo de simetria, conhecido por simetria bilateral?

Ficaram assim a saber que, ao rodar este peixe no espaço, em torno de cada um dos eixos que definiam o seu comprimento e largura, o seu olho ia ocupar um dos vértices da estrela que tinham colocado no topo da sua árvore de Natal.

Desenharam-na e coloriram-na.

S

↓ → ↑

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entindo o silêncio prolongar-se, a Tradição achou melhor não insistir e desistiu da pergunta. Em vez disso ensinou-lhes o sítio certo onde deveriam

colocar o ponto que representaria o olho do peixe que tinham desenhado.

A princípio este pedido pareceu-lhes um pouquinho exagerada. Mas, depois de terem feito em arame um peixe igual ao do desenho, e de aprenderem a rodá-lo da maneira que a Tradição lhes ensinou, logo entenderam porquê. Como poderiam imaginar que a posição desse olho lhes permitiria descobrir os princípios subjacentes a um importante tipo de simetria, conhecido por simetria bilateral?

Ficaram assim a saber que, ao rodar este peixe no espaço, em torno de cada um dos eixos que definiam o seu comprimento e largura, o seu olho ia ocupar um dos vértices da estrela que tinham colocado no topo da sua árvore de Natal.

Desenharam-na e coloriram-na.

S

↓ → ↑

Sentindo o silêncio prolongar-se, a Tradição achou melhor não insistir e desistiu da pergunta. Em vez disso ensinou-lhes o sítio certo onde deveriam colocar o ponto que representaria o olho do peixe que tinham desenhado.

Escolher uma posição exata para o olho do peixe pareceu--lhes um pouquinho exagerado. Mas, depois de fazerem em arame um peixe igual ao do desenho, e de aprenderem a rodá-lo da maneira que a Tradição lhes ensinou, logo entenderam porquê.

Como poderiam imaginar que a posição desse olho lhes permitiria descobrir os princípios subjacentes a um importante tipo de simetria, conhecido por simetria bilateral?

Ficaram assim a saber que, ao rodar este peixe no espaço, em torno de cada um dos eixos que definiam o seu comprimento e largura, o seu olho ia ocupar um dos vértices da estrela que tinham colocado no topo da sua árvore de Natal.

Desenharam-na e coloriram-na. 56

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E logo o peixe se iluminou com o brilho da estrela que tinha dentro de si! E, o mais curioso é que, fosse qual fosse a posição em que considerassem o peixe no plano depois de feita a rotação, a estrela continuava sempre a iluminá-lo por dentro!

E logo o peixe se iluminou com o brilho da estrela que tinha dentro de si! E o mais curioso é que, fosse qual fosse a posição em que considerassem o peixe no plano, depois de feita a rotação, a estrela continuava sempre a iluminá-lo por dentro!

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– Sabem uma coisa? – disse-lhes, a certa altura, a Tradição. – Gostava que as minhas filhas estivessem aqui connosco e vissem este peixe a brilhar com a luz da estrela que colocaram no topo da vossa árvore de Natal.

Ah! Afinal, a Tradição era mãe! Que surpresa! Pensavam que era sozinha. Quantas filhas teria?

– Muitas, muitas... – respondeu ela, abanando tristemente a cabeça. – E isso põe-te triste? – perguntaram as crianças, admiradas. Foi então que ela lhes contou que todas as suas filhas tinham saído de casa

há muito tempo, dispostas a viajar pelo mundo. Mas, como eram muito novas nessa altura e cada uma delas tinha escolhido um local diferente para morar, depressa se desataram os laços que as uniam. Ela bem tinha tido a preocupação de ver se, antes de saírem de casa, para correrem mundo, levavam nas suas mochilas o embrulhinho que fizera igual para todas onde, sob a forma de símbolos, estava tudo aquilo que lhes tinha ensinado quando eram ainda crianças. Mas, ou porque tinham perdido alguns desses símbolos pelo caminho, ou porque se tinham afeiçoado mais a uns do que a outros, tinham acabado por perder o sentido de unidade que havia entre todos. E agora era vê-las teimar que os símbolos com que cada uma tinha ficado eram os mais importantes! Por isso ela gostava de ter ali, naquele momento, as filhas que se tinham apegado unicamente a um dos símbolos que ela lhes tinha ensinado a dese-nhar, entre eles o olho, a amêndoa, a cruz, a estrela e o peixe. Quem sabe se, ao vê--los novamente assim juntinhos e ligados entre si, não perdiam o seu orgulho tonto e faziam as pazes? Ah! Se elas soubessem como gostaria de voltar a tê-las reunidas à sua volta para as poder levar até àquela fonte sagrada onde a Sabedoria tem um só rosto! Quem sabe se, assim, não voltaria a ser tudo como antes, como quando eram crianças e se aninhavam no seu regaço?

Assim foi o desabafo da Mãe Tradição, que logo mudou de assunto para não ficar ainda mais triste.

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Para disfarçar a sua tristeza pediu-lhes que voltassem a desenhar os triângulos que as tinham ajudado a descobrir a estrela colocada no topo da árvore de Natal, mas agora numa posição perpendicular à anterior.

Essa estrela, juntamente com a anterior, formava uma estrela de doze pontas, que desenharam dentro da circunferência representando a íris do Olho do Conhecimento, o qual se encontrava agora em duas posições perpendiculares entre si.

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Para disfarçar a sua tristeza pediu-lhes que voltassem a desenhar os triângulos que as tinham ajudado a descobrir a estrela colocada no topo da árvore de Natal, mas agora numa posição perpendicular à anterior.

Essa estrela, juntamente com a anterior, formava uma estrela de doze pontas, que desenharam dentro da circunferência representando a íris do Olho do Conhecimento, o qual se encontrava agora em duas posições perpendiculares entre si.

Para disfarçar a sua tristeza pediu-lhes que voltassem a desenhar os triângulos que as tinham ajudado a des-cobrir a estrela colocada no topo da árvore de Natal, mas agora numa posição perpendicular à anterior.

Essa estrela, juntamente com a anterior, formava uma estrela de doze

pontas, que desenharam dentro da circun-ferência representando a íris do Olho do

Conhecimento, o qual se encontrava agora em duas posições perpendiculares entre si.

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Puderam, assim, concluir que os

vértices desta estrela de doze pontas, além de coincidirem com os vértices de quatro triângulos equiláteros, coincidiam, também, com os vértices de dois hexágonos, os quais, em conjunto, coincidiam, por sua vez, com os vértices de um dodecágono, e que todos esses vértices eram pontos da circunferência que formava a íris do Olho do Conhecimento nas duas posições perpendiculares entre si.

E – surpresa das surpresas! -

coincidia ainda com os vértices de três quadrados, ocupando os vértices de dois deles a posição do olho do peixe em cada um dos quadrantes definidos pelos eixos que determinavam as suas dimensões, quando este rodava em torno do ponto de intersecção desses dois eixos.

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Puderam, assim, concluir que os

vértices desta estrela de doze pontas, além de coincidirem com os vértices de quatro triângulos equiláteros, coincidiam, também, com os vértices de dois hexágonos, os quais, em conjunto, coincidiam, por sua vez, com os vértices de um dodecágono, e que todos esses vértices eram pontos da circunferência que formava a íris do Olho do Conhecimento nas duas posições perpendiculares entre si.

E surpresa das surpresas! -

coincidia ainda com os vértices de três quadrados, ocupando os vértices de dois deles a posição do olho do peixe em cada um dos quadrantes definidos pelos eixos que determinavam as suas dimensões, quando este rodava em torno do ponto de intersecção desses dois eixos.

Puderam assim concluir, sob o ponto de vista matemático, que os vértices desta estrela, eram vértices de dois hexá-gonos e também de um dodecágono. Todos eles pertencentes à circunferência que for-mava a íris do Olho do Conhecimento, nas duas posições perperdiculares entre si.

E – surpresa das surpresas! – coincidia ainda com os vértices de três

quadrados. Sendo que, os vértices de dois des-ses quadrados, coincidiam com a posição do olho

do peixe ao rodar no plano.60

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Uma grande descoberta, sem dúvida, pois, se até ali, tinham ficado a conhe-cer o princípio subjacente à chamada simetria bilateral, acabavam agora de desco-brir a chamada simetria rotacional. Dois tipos de simetria fáceis de identificar atra-vés das posições que o olho do peixe podia tomar no plano!

As surpresas, porém, não acabaram aqui…Uma outra logo surgiu, apresentando-se sob a forma de uma quadra:

Um ponto que está no Círculo,No Quadrado e no Triângulo.Conheces esse ponto? Tudo vai bem.Não o conheces? Tudo será em vão.

Mais do que um enigma, esta quadra representava, sobretudo, um desafio. Um desafio que a Mãe Tradição lhes lançou quando lhes pediu que a interpretassem em toda a sua simplicidade através de um único desenho.

Como facilmente puderam deduzir, esse desenho teria a ver com aqueles que anteriormente tinham feito e com tudo aquilo que já tinham aprendido. Por isso não devia ser assim tão difícil decifrar o mistério. E, de facto, não foi. Bastou que conside-rassem uma rotação completa do peixe num só sentido sobre a folha de papel em torno do ponto de intersecção dos dois eixos que definiam as suas dimensões, para que o seu olho descrevesse uma circunferência e coincidisse, em cada quadrante, com os vértices de um dos quadrados. Quanto ao triângulo, a solução também era fácil, uma vez que qualquer dos vértices do quadrado considerado era simultanea-mente vértice de um dos triângulos que formava a estrela de doze pontas inscrita no círculo que representava a íris do Olho do Conhecimento!

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Decidiram, então, apresentar a

interpretação do enigma num único desenho, como a Mãe Tradição lhes pedira. E, para isso, apenas foi preciso manter o desenho base, nele realçando a forma do peixe na posição que ocupara no início e final da rotação completa a que tinha sido submetido. O suficiente para pôr em evidência que o seu olho era, simultaneamente, ponto de um círculo, de um quadrado e de um triângulo….

- Bravo! - aplaudiu a Mãe Tradição. - Acabam de resolver um enigma que há

séculos corre o mundo, mas só aqueles que têm a chave que dá acesso ao misterioso reino dos símbolos conseguem decifrar.

Como seria de esperar, as crianças sentiram-se orgulhosas. E com razão. Não

afirmava a quadra que tudo seria em vão para aqueles que não conhecessem o misterioso ponto que referia?…

Decidiram, então, apresentar a interpretação do enigma num único desenho, como a Mãe Tradição lhes pedira. E, para isso, apenas foi preciso manter o desenho base, nele realçando a forma do peixe na posição que ocu-para no início e final das rotações a que tinha sido submetido. O suficiente para pôr em evi-dência que o seu olho era, simultaneamente, ponto de um círculo, de um quadrado e de um triângulo….

– Bravo! – aplaudiu a Mãe Tradição. – Acabam de resolver um enigma que há séculos corre o mundo, mas só aqueles que têm a chave que dá acesso ao misterioso reino dos símbolos conseguem decifrar.

As crianças sentiram-se orgulhosas. E com razão. Não afirmava a quadra que tudo seria em vão para aqueles que não conhecessem o misterioso ponto que referia?…

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Agora que o círculo representando a íris do Olho do Conhecimento havia sido destacado, foi oportuno considerarem a sua divisão em doze partes iguais a par-tir dos pontos que coincidiam com os vértices da estrela de doze pontas nele inscrito. E que essas partes fossem também coloridas com as cores terciárias obtidas a partir

da mistura de cada uma das três cores primárias com duas cores secundárias.

O círculo foi, então, colorido de acordo com doze diferentes gradações das cores do arco-

-íris, sendo também com esta sua divisão que puderam ver justificado o número de horas do dia e da noite, dos meses do ano e dos signos do Zodíaco.

Nesta altura, porém, a Mãe Tradi-ção deu-se conta de que aquilo que agora

lhes estava a ensinar já não era propria-mente da sua competência, mas sim da pro-

fessora que viera ajudar. E, como tinha ficado muito abalada depois do desabafo que tivera sobre

as suas filhas, perguntou-lhes se não se importavam que se fosse embora.

As crianças hesitaram. Embora compreendessem o seu pedido, acharam que só podiam aceitá-lo se ela lhes garantisse que voltaria para as ajudar a desenhar o Ovo da Páscoa e a descobrir o seu simbolismo.

– Sim, voltarei antes da Páscoa – prometeu ela, pensando já numa maneira de voltar a surpreende-las antes de se despedir.

                                                                       

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– Já repararam que todos os símbolos que descobriram até agora, assim como os princípios que lhe estão subjacentes, estão intrinsecamente ligados à forma amen-doada que nasce da interseção das duas primeiras circunferências que desenharam? – perguntou. – Pois bem! A essa forma dei o nome de Mandorla, que significa amêndoa em italiano, ou Vesica Piscis, que significa bexiga de peixe em latim.

A dúvida instalou-se na cabeça do João. A relação desta forma com a do peixe era, para ele, mais ou menos clara. Mas

não a da amêndoa.– Porquê amêndoa – perguntou –, se a forma da amêndoa que relacionámos

com as dimensões de um cubo é diferente desta? – A forma desta amêndoa também está relacionada com um cubo – disse a

Mãe Tradição. – Neste caso, com um cubo de aresta igual a duas vezes a aresta daquele que referes. Além disso, não se lembram de terem falado na conhecida expressão “olhos amendoados”? E que foi, precisamente, a partir desta forma que descobriram o olho simbólico que representa o Conheci-mento e a Sabedoria? Por que não o desenham, então, novamente, mas agora de modo a que o círculo que representa a sua íris seja colorido com as doze cores que acabaram de repre-sentar no desenho anterior?

As crianças concordaram. E, no final, pareceu-lhes que a relação deste olho com a luz tinha-se tornado ainda mais evidente. Elas sabiam, no entanto, que esta luz não tinha propriamente a ver com a luz exterior captada pelos orgãos da visão, mas sim com uma “luz interior” que ilu-mina a inteligência e o espírito…

                                                                                                   

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uando chegou o momento da despedida, a tristeza que sentiram ao ver a Mãe Tradição partir apenas foi atenuada pela alegria de retomarem as

aulas com a sua professora, de quem também gostavam muito. Não perdendo tempo, ela voltou ao assunto das «cores frias» e «cores quentes»,

de modo a poder associá-las ao clima. Mas, para as crianças poderem compreender as variações de temperatura ao longo do dia e do ano, teriam que compreender, primeiro, os movimentos de rotação da Terra em torno do seu eixo, e o seu movimento de translação em volta do sol. Só assim poderiam entender a contínua sucessão dos dias e das noites, e a contínua sucessão dos doze meses do ano. Ora, uma vez que a Terra, no seu movimento de translação, descreve uma trajetória semelhante a uma elipse, ocupando o sol a posição de um dos seus focos, tornava-se necessário explicar o que era uma elipse e como podia ser desenhada. E, porventura, isso era complicado? Claro que não! Principalmente se elas voltassem ao desenho base que lhes permitira desenhar a estrela de doze pontas.

Seguindo, à risca, o conhecido

«método do jardineiro», a primeira elipse que desenharam foi feita com o auxílio de um fio de comprimento igual ao perímetro de qualquer dos quadrados cujos vértices coincidiam com quatro vértices dessa estrela.

Puderam assim descobrir a importância da posição de dois pontos chamados focos, e aprenderam que a distância de ambos a cada ponto da elipse é sempre igual.

Q – Bom, agora que a relação deste olho simbólico com a luz se tornou clara – continuou a Mãe Tradição –, considerem-no numa posição perpendicular à anterior. Quem sabe se, assim, não poderão descobrir uma outra interpretação símbólica?

As crianças rodaram a folha de papel que tinham à sua frente, mas ficaram mudas, sem saber interpretar o que viam.

– Comecem pela forma ovalada que nasce da inter-ceção das duas circunferências – sugeriu a Mãe Tra-dição. – Não vos sugere nada, essa forma?

As crianças, entreolharam-se, numa ati-tude de dúvida..

– Tudo bem… E se eu vos disser que ela tem uma configuração idêntica a um orgão do corpo da mulher? Isso ajuda?

A resposta talvez não fosse possí-vel se elas não conhecessem já a anato-mia do corpo humano. Ainda assim, um certo pudor que ainda existia quando eram abordados temas de natureza sexual, impediu-as de responder.

– Vá lá! Eu sei que sabem! Olharam umas para as outras com um sorriso

envergonhado, embora com um olhar cúmplice. A ana-logia, obviamente, era simbólica, mas agora não tinham dúvida que aquela forma, juntamente com o círculo colorido no seu centro, ao serem associados ao corpo da mulher, só podia evocar «nascimento». Não era bem conhecida a expressão «dar à luz»., sempre que um bebé nasce?

O silêncio, porém, continuou. E assim o mantiveram por algum tempo, por terem a certeza que a sábia Tradição sabia que elas sabiam…

                                                                                                   

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uando chegou o momento da despedida, a tristeza que sentiram ao ver a Mãe Tradição partir apenas foi atenuada pela alegria de retomarem as

aulas com a sua professora, de quem também gostavam muito. Não perdendo tempo, ela voltou ao assunto das «cores frias» e «cores quentes»,

de modo a poder associá-las ao clima. Mas, para as crianças poderem compreender as variações de temperatura ao longo do dia e do ano, teriam que compreender, primeiro, os movimentos de rotação da Terra em torno do seu eixo, e o seu movimento de translação em volta do sol. Só assim poderiam entender a contínua sucessão dos dias e das noites, e a contínua sucessão dos doze meses do ano. Ora, uma vez que a Terra, no seu movimento de translação, descreve uma trajetória semelhante a uma elipse, ocupando o sol a posição de um dos seus focos, tornava-se necessário explicar o que era uma elipse e como podia ser desenhada. E, porventura, isso era complicado? Claro que não! Principalmente se elas voltassem ao desenho base que lhes permitira desenhar a estrela de doze pontas.

Seguindo, à risca, o conhecido

«método do jardineiro», a primeira elipse que desenharam foi feita com o auxílio de um fio de comprimento igual ao perímetro de qualquer dos quadrados cujos vértices coincidiam com quatro vértices dessa estrela.

Puderam assim descobrir a importância da posição de dois pontos chamados focos, e aprenderam que a distância de ambos a cada ponto da elipse é sempre igual.

Q Quando chegou o momento da despedida, a tristeza que sentiram ao ver a

Mãe Tradição partir apenas foi atenuada pela alegria de retomarem as aulas com a sua professora, de quem também gostavam muito.

Não perdendo tempo, ela voltou ao assunto das «cores frias» e «cores quentes», de modo a poder associá-las ao clima. Mas, para as crianças poderem compreender as variações de temperatura ao longo do dia e do ano, teriam que compreender, pri-meiro, os movimentos de rotação da Terra em torno do seu eixo, e o seu movimento de translação em volta do sol. Só assim poderiam entender a contínua sucessão dos dias e das noites, e a contínua sucessão dos doze meses do ano. Ora, uma vez que a Terra, no seu movimento de translação, descreve uma trajetória semelhante a uma elipse, ocupando o sol a posição de um dos seus focos, tornava-se necessário explicar

o que era uma elipse e como podia ser desenhada. E, por-ventura, isso era complicado? Claro que não! Princi-

palmente se elas voltassem ao desenho base que lhes permitira desenhar a estrela de doze pontas.

Seguindo à risca o conhecido «método do jardineiro», a primeira elipse que dese-nharam foi feita com o auxílio de um fio de comprimento igual ao perímetro de qualquer dos quadrados cujos vértices coincidiam com quatro vértices dessa

estrela.Puderam assim descobrir a importân-

cia da posição de dois pontos chamados focos, e aprenderam que a distância de ambos a cada

ponto da elipse é sempre igual. 67

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Mal acabaram de desenhar a elipse no papel, a professora fez-lhes uma proposta irrecusável: desenhar uma elipse idêntica, no chão. Não no chão da sala de aulas, mas lá fora, na área do recreio. A sugestão foi recebida com alegria. O dia esta-va lindo. O sol brilhava intensamente e o céu apresentava-se imensamente azul. Tudo convidava ao ar livre… Recolheram, por isso, o material necessário, e não tardou que no chão surgisse desenhada uma elipse. E como foi divertido depois dela já estar desenhada e, também, assinalada a posição dos seus focos, quando a professora explicou como seria a trajetória da Terra em torno do seu eixo e, ao mesmo tempo, em volta do sol!

Sara foi o primeiro sol a brilhar no firmamento. Por fim, foi a própria professo-ra que ocupou o lugar do sol, de modo a permitir que todas as crianças pudessem fazer de «planeta azul», rodopiando em torno de si próprias e, também, ao seu redor, em alegre e estonteante coreografia.

Depois disto, a hora do recreio não podia ter sido mais divertida...

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Mas, não foi apenas por esse motivo que aprenderam a construir uma elipse. A verdade é que, sem uma elipse, não poderiam desenhar a forma do Ovo da

Páscoa. Logo, era necessário começarem a procurar as dimensões dessa elipse. Para as ajudar, a professora apenas lhes disse quais deveriam ser as dimen-

sões dos seus eixos: o eixo maior teria que ser igual ao dobro do eixo menor, sendo este igual ao eixo maior da elipse que já tinham desenhado no papel. E, pronto! Era tudo o que lhes podia dizer. O resto teriam que ser elas a descobrir.

– Como? – perguntaram, sem saber por onde começar. – Com paciência e esforço. Vão tentando... Vão tentando... Já têm os elementos

que precisam. E elas tentaram... tentaram... voltaram a tentar... e nada! Não conseguiam

saber que comprimento dar ao fio, nem tão pouco encontrar a posição onde deve-riam colocar o sol e o seu irmão gémeo invisível. Isto porque, tão apressadas esta-vam em descobrir a forma do ovo, não se preocuparam em descobrir primeiro uma outra propriedade fundamental da elipse.

Após uma série de tentativas, começaram a ficar um pouquinho impacientes. Um pouco irritadas até. Afinal, aquilo que lhes parecera tão fácil tinha-se tornado, para elas, um verdadeiro “quebra-cabeças”.

E a professora ali quieta, sem parecer disposta a ajudá-las... Mal sabiam que o esforço que ela lhes pedia era absolutamente necessário.

Como na vida, quantas vezes não são necessárias várias tentativas até se encontrar a solução para um determinado problema! Solução que às vezes está mesmo à frente dos nossos olhos e não conseguimos enxergar. Era bom que elas se apercebessem disso. Se queriam encontrar o Ovo da Páscoa teriam que saber merecê-lo. Que tentas-sem... Que tentassem ainda mais...

– Por onde andará a Tradição? Ela disse que nos vinha ajudar a desenhar o Ovo da Páscoa, e afinal não veio – disseram, a meia voz, umas para as outras.

– Quem disse que eu não vim? – ouviram dizer.70

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Levantaram a cabeça e viram, surpreendidas, que a Mãe Tradição tinha entrado sorrateiramente na sala sem que alguém se apercebesse. – Que bom! – pensaram, suspirando de alívio e, ao mesmo tempo, extremamente satisfeitas por voltarem a vê-la. Ela acercou-se e quis saber que dificuldade era aquela que estavam a enfrentar. – Por que andam às voltas em tentativas sem nexo? – perguntou. – Não será mais lógico voltarem atrás e descobrirem, primeiro, todas as propriedades de uma elipse, a partir daquela que já fizeram? – Claro! Que tontas! – pensaram, logo que descobriram a propriedade que lhes faltava e viram como teria sido fácil desenhar uma elipse a partir dos elementos que a professora lhes tinha dado.

Depois dela estar desenhada foi só rodar o papel, e considerarem a circun-ferência que limitava a íris do Olho do Conhecimento e aquela cujo diâmetro era igual ao seu eixo menor.

E não foi preciso mais nada… A forma de um ovo acabava de se revelar em duas posições inertidas e todas as crianças a conseguiam ver!

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Levantaram a cabeça e viram, surpreendidas, que a Mãe Tradição tinha entrado sorrateiramente na sala sem que alguém se apercebesse. – Que bom! – pensaram, suspirando de alívio e, ao mesmo tempo, extremamente satisfeitas por voltarem a vê-la. Ela acercou-se e quis saber que dificuldade era aquela que estavam a enfrentar. – Por que andam às voltas em tentativas sem nexo? – perguntou. – Não será mais lógico voltarem atrás e descobrirem, primeiro, todas as propriedades de uma elipse, a partir daquela que já fizeram? – Claro! Que tontas! – pensaram, logo que descobriram a propriedade que lhes faltava e viram como teria sido fácil desenhar uma elipse a partir dos elementos que a professora lhes tinha dado.

Depois dela estar desenhada foi só rodar o papel, e considerarem a circun-ferência que limitava a íris do Olho do Conhecimento e aquela cujo diâmetro era igual ao seu eixo menor.

E não foi preciso mais nada… A forma de um ovo acabava de se revelar em duas posições inertidas e todas as crianças a conseguiam ver!

Levantaram a cabeça e viram, surpreendidas, que a Mãe Tradição tinha entra-do sorrateiramente na sala sem que alguém se apercebesse.

– Que bom! – pensaram, suspirando de alívio e, ao mesmo tempo, extrema-mente satisfeitas por voltarem a vê-la.

Ela acercou-se e quis saber que dificuldade era aquela que estavam a enfrentar. – Por que andam às voltas em tentativas sem nexo?

– perguntou. – Não será mais lógico voltarem atrás e descobrirem, primeiro, todas as propriedades de uma elipse, a partir daquela que já fizeram?

– Claro! Que tontas! – pensaram, logo que descobriram a propriedade que lhes fal-tava e viram como teria sido fácil desenhar uma elipse a partir dos elementos que a pro-fessora lhes tinha dado.

Depois dela estar desenhada foi só rodar o papel, e considerarem a circun- ferência que limitava a íris do Olho do Conhecimento e aquela cujo diâmetro era

igual ao eixo menor da elipse. E não foi preciso mais nada… A forma de

um ovo acabava de se revelar em duas posições invertidas e todas as crianças a conseguiam ver!

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Quiseram logo desenhar os contornos do ovo numa das suas posições, de modo a destacá-lo do resto do desenho. Mas a Mãe Tradição não concordou. Queria que elas, primeiro, olhassem para dentro da elipse que as ajudara a encontrar a forma do ovo e destacassem os símbolos que já conheciam.

Começaram pelo Olho do Conhecimento, – um símbolo manifestamente feminino.

Seguiu-se a estrela de David, a cruz e a amêndoa.

Quiseram logo desenhar os contornos do ovo numa das suas posições, de modo a destacá-lo do resto do desenho. Mas a Mãe Tradição não concordou. Queria que elas, primeiro, olhassem para dentro da elipse que as ajudara a encontrar a forma do ovo e destacassem os símbolos que já conheciam.

Começaram pelo Olho do Conhecimento – um símbolo manifestamente feminino.

 

 

                                           

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Quiseram logo desenhar os contornos do ovo numa das suas posições, de modo a destacá-lo do resto do desenho. Mas a Mãe Tradição não concordou. Queria que elas, primeiro, olhassem para dentro da elipse que as ajudara a encontrar a forma do ovo e destacassem os símbolos que já conheciam.

Começaram pelo Olho do Conhecimento, – um símbolo manifestamente feminino.

Seguiu-se a estrela de David, a cruz e a amêndoa.

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Quiseram logo desenhar os contornos do ovo numa das suas posições, de modo a destacá-lo do resto do desenho. Mas a Mãe Tradição não concordou. Queria que elas, primeiro, olhassem para dentro da elipse que as ajudara a encontrar a forma do ovo e destacassem os símbolos que já conheciam.

Começaram pelo Olho do Conhecimento, – um símbolo manifestamente feminino.

Seguiu-se a estrela de David, a cruz e a amêndoa.

Seguiu-se a estrela de David, a cruz e a amêndoa.

 

 

                                           

 

 

                                           

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– E também o Cubo! – exclamou o João, quando menos se esperava. A Mãe Tradição sorriu, acenou com a cabeça, e confirmou: – Claro! E também o Cubo... E se ele é importante!.... Ainda bem que o João tinha mencionado o cubo. Assim era

oportuno falar-lhes da relação da elipse, dentro da qual tinham desenhado todos os símbolos acabados de referir, com um peixe igual ao do desenho, mas tridimensional. De altura precisamente igual à aresta do cubo relacionado com as dimensões da cruz que definia a forma da amêndoa escondida na forma do próprio olho...

Realmente, as crianças já tinham notado que as extremidades da cauda do peixe do desenho coincidiam com dois pontos da elipse que definia o ovo. O que não podiam suspeitar era que a distância do centro do desenho a uma das extremidades superiores da cauda do peixe tridimensional fosse aquela que determinava um dos seus focos!…

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Por fim, o peixe, cujo olho estava associado ao misterioso Ponto da Bauhütte, o qual, pertencendo a uma circunferência, era também vértice de um quadrado e de um triângulo.

– E também o Cubo! – exclamou o João, quando menos se esperava. – Mas, esse, não o podemos desenhar. A Mãe Tradição sorriu, acenou com a cabeça, e confirmou:

– Claro! E também o Cubo... E se ele é importante!.... Ainda bem que o João tinha mencionado o cubo. Assim era oportuno falar-lhes da relação da elipse, dentro da qual tinham desenhado todos os símbolos acabados de referir, com um peixe igual ao do desenho, mas tridimensional. De altura precisamente igual à aresta do cubo relacionado com as dimensões da cruz que definia a forma da amêndoa escondida na forma do próprio olho...

Realmente, as crianças já tinham notado que as extremidades da cauda do peixe do desenho coincidiam com dois pontos da elipse que definia o ovo. O que não podiam suspeitar era que a distância do centro do desenho a uma das extremidades superiores da cauda do peixe tridimensional fosse aquela que determinava um dos seus focos!…

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Por fim, o peixe, cujo olho estava associado ao misterioso Ponto da Bauhütte, o qual, pertencendo a uma circunferência, era também vértice de um quadrado e de um triângulo.

– E também o Cubo! – exclamou o João, quando menos se esperava. – Mas, esse, não o podemos desenhar. A Mãe Tradição sorriu, acenou com a cabeça, e confirmou:

– Claro! E também o Cubo... E se ele é importante!.... Ainda bem que o João tinha mencionado o cubo. Assim era oportuno falar-lhes da relação da elipse, dentro da qual tinham desenhado todos os símbolos acabados de referir, com um peixe igual ao do desenho, mas tridimensional. De altura precisamente igual à aresta do cubo relacionado com as dimensões da cruz que definia a forma da amêndoa escondida na forma do próprio olho...

Realmente, as crianças já tinham notado que as extremidades da cauda do peixe do desenho coincidiam com dois pontos da elipse que definia o ovo. O que não podiam suspeitar era que a distância do centro do desenho a uma das extremidades superiores da cauda do peixe tridimensional fosse aquela que determinava um dos seus focos!…

Por fim, o peixe, cujo olho estava associado ao misterioso Ponto da Bauhütte, o qual, pertencendo a uma circunferência, era também vértice de um quadrado e de um triângulo.

 

 

                                           

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Mas, se isso foi motivo de admiração, o que dizer quando a Mãe Tradição lhes lançou um último desafio?

– Será que conseguem descobrir no desenho a forma de um outro símbolo? Um símbolo que contém, dentro de si, todos os que já mostraram?

As crianças olharam com muita atenção o último desenho que tinham feito. Contudo, apesar do esforço, não foram bem sucedidas.

– Bom… o que vos posso dizer é que a sua construção depende também da elipse que vos ajudou a descobrir a forma do ovo – esclareceu a Mãe Tradição. – Tentem. Seria bom que o encontrassem antes de falarmos sobre o simbolismo do ovo.

Na opinião do João essa descoberta só seria possível se a Mãe Tradição aju-dasse, dando-lhes algumas pistas.

– Se é de pistas que precisam, então começo por fazer uma pergunta: sabem qual era o símbolo de reconhecimento entre os primitivos cristãos?

– O peixe – respondeu Sara, sem hesitar. – Sim – confirmou a Mãe Tradição. – O peixe era, nessa altura, e ainda hoje

é, um símbolo de Jesus. E há quem diga que, quando foi crucificado, o seu sangue foi recolhido por um dos seus discípulos no cálice que usou na última Ceia. Ora, sobre o simbolismo deste cálice, conhecido por Cálice do Graal, há imensas lendas. Mas esse é um assunto que fica para mais tarde. Para já, o que vos peço é que tentem encon-trar a forma de um cálice no desenho que têm à vossa frente.

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Mas, se isso foi motivo de admiração, o que dizer quando a Mãe Tradição lhes lançou um último desafio? – Será que conseguem descobrir no desenho a forma de um outro símbolo? Um símbolo que contém, dentro de si, todos os que já mostraram? As crianças olharam com muita atenção o último desenho que tinham feito. Contudo, apesar do esforço, não foram bem sucedidas. – Bom… o que vos posso dizer é que a sua construção depende também da elipse que vos ajudou a descobrir a forma do ovo – esclareceu a Mãe Tradição. –Tentem Seria bom que o encontrassem antes de falarmos sobre o simbolismo do ovo. Na opinião do João essa descoberta só seria possível se a Mãe Tradição ajudasse, dando-lhes algumas pistas. . – Se é de pistas que precisam, então começo por fazer uma pergunta: sabem qual era o símbolo de reconhecimento entre os primitivos cristãos? – O peixe – respondeu Sara, sem hesitar.

– Sim – confirmou a Mãe Tradição. – O peixe era, nessa altura, e ainda hoje é, um símbolo de Jesus. E há quem diga que, quando foi crucificado, o seu sangue foi recolhido por um dos seus discípulos no cálice que ele usou na última Ceia. Ora, sobre o simbolismo deste cálice, conhecido por Cálice do Graal, há imensas lendas. Mas esse é um assunto que fica para mais tarde. Para já, o que vos peço é que tentem encontrar a forma de um cálice no desenho que têm à vossa frente.

Elas tentaram, e, desta vez, com sucesso. A forma de um cálice não tardou a revelar-se para

grande admiração de todos. E a sua base era formada precisamente pela cauda do peixe que tinham aprendido a desenhar ! Enfim, um nunca mais acabar de surpresas que as deixavam maravilhadas...

Elas tentaram e, desta vez, com sucesso. A forma de um cálice não tardou a revelar-se para grande admiração de todos. E a sua base era formada precisamente pela cauda do peixe que tinham aprendido a desenhar !

Enfim, um nunca mais acabar de surpresas que as deixavam maravilhadas...

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A maior surpresa, porém, estava ainda para vir, e foi também a Mãe Tra-dição que a trouxe.

Começou por lhes contar que, depois de ter abandonado a escola onde anda-vam, voltara a sua casa para matar um pouco as saudades dos momentos felizes que ali vivera com toda a sua família. Há muito tempo que já não via as suas filhas. Por isso, logo a seguir à conversa que tinham tido na sala de aulas, a saudade começou a doer-lhe por demais dentro do peito. Sentiu, então, que precisava voltar a encontrá--las. Tinha tanto para lhes dizer! Ela sabia que o seu regresso a casa poderia aumen-tar ainda mais essa saudade, logo que nela entrasse e a sentisse abandonada e vazia. Mas, qual não foi o seu espanto quando, ao chegar a casa, viu que todas as suas filhas já lá estavam à sua espera, em jeito de quem tinha vindo fazer uma sur-presa. Apesar de estarem nos mais diversos cantos do mundo, mesmo longe, tinham captado o seu pensamento e respondido ao seu apelo. Tão emocionada ficou ao vê--las que não conseguiu dizer nada. E ainda bem, pois nesse preciso momento entrou em casa o seu companheiro, a quem não via há muito. Sim! Era ele! Era o Pai Conhe-cimento que acabava de entrar, para alegria de todos. A princípio ainda pensou que fosse um sonho. Mas não. Não era um sonho. Antes, sim, a concretização do seu sonho. Caíram todos nos braços uns dos outros e choraram de alegria. E, ali mesmo, juraram nunca mais voltar a desatar os laços que os uniam.

Foi isso que ela tinha vindo dizer-lhes. Que era altura de começarem a acredi-tar em milagres. E que o maior milagre que podiam esperar encontrava-se escondido precisamente dentro do ovo que iriam desenhar.

Agora, sim, podiam avivar os seus contornos e colorir a sua gema com as cores do arco-íris…

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Finalmente, o Ovo! O Ovo da Páscoa, contendo, na sua gema, a luz da Vida eterna! Ovo-Embrião que apenas aguardava que chegasse o seu Natal para começar a abrir-se e a espalhar pelo mundo toda a luz que continha no seu interior. Esperando, ansioso, que chegasse o seu Natal. Um outro Natal! Um Natal diferente daquele que as crianças tinham vivenciado meses antes, embora o seu protagonista fosse ainda o menino do presépio. Esse menino que cresceu, se fez Homem, e deu a vida para salvar a Humanidade.

Como acontecera com a Árvore de Natal, que crescera e se ramificara dando origem à Grande Árvore da Vida, também este Ovo tinha crescido de modo invisível no seio da Mãe Natureza, tendo-se tornando cada vez maior, até tocar os confins do Universo. Apenas aguardava o momento que a sua casca se rompesse, e do seu interior se soltasse uma luz que tudo viria a cobrir e transfor-mar. Uma luz especial, com um poder libertador e redentor. O poder de fazer do futu-ro um eterno presente, um «aqui e agora» sempre feliz, do qual seriam banidos, para sempre, o sofrimento e a morte...

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Tudo isso lhes disse a Mãe Tradição, embora por outras palavras. Muito atentas, todas as crianças escutaram emocionadas a sua explicação. E,

ainda que o significado simbólico deste Ovo ultrapassasse tudo aquilo que podiam imaginar, logo nos seus corações se acendeu a chama da Esperança, que parecia disposta a manter-se sempre acesa até esse outro Natal chegar.

A Mãe Tradição olhou-as com ternura, e disse-lhes que eram horas de ir andando. Cumprida a sua promessa, a sua missão terminava ali. Outras mis-sões a esperavam em outros cantos do mundo. A ela, ao marido e ao seu ran-chinho de filhas. Principalmente agora que se tinham reconciliado e jurado nunca mais se separarem.

Ao partir levou, gravados no seu coração, o rosto de todas as crianças com quem, um dia, tinha partilhado a sua dor e com ela partilhavam, agora, a sua alegria. Por seu lado, também estas se sentiam enriquecidas com tudo aquilo que tinham aprendido com ela. Além disso, sabiam que esta não seria

uma despedida. Tinham a certeza de que ela haveria de voltar outras vezes para lhes ensinar muitas coisas.

Ao regressarem a casa sentiam o coração a transbordar de alegria por tudo o que tinham aprendido sobre a Páscoa. E também o desejo de que um ovo

semelhante àquele que tinham aprendido a desenhar se viesse a abrir um dia, de modo a transformar tudo em luz e cor.

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Foi então, nessa noite, que Sara – símbolo vivo de uma Humanidade completa-mente sarada – teve um sonho. Um sonho no qual viu um enorme Ovo da Páscoa cingi-do com um grande laço verde, da cor da esperança que morava no seu peito. De repente, como que desatado por mãos invisíveis, o laço foi-se desfazendo até se desatar por com-pleto. Em seguida, a casca do ovo começou a estalar. E, a pouco e pouco, uma luz multi-cor de brilho muito suave começou a sair por entre as fendas.

À medida que estas se iam abrindo maior era a luz que delas saía. Até que a casca do ovo se rompeu por completo, e todo ele se transformou em múltiplas ondas luminosas que se espalhavam em todas as direções, tudo transformando à sua passagem.

Ao vê-las aproximarem-se, Sara fechou os olhos e dispôs-se a deixar-se levar por elas. Como por magia, sentiu que lentamente o seu corpo ia perdendo peso, e que cada vez mais leve, começava a flutuar no espaço. Era como se, de repente, tivesse ganho um par de asas invisíveis e estivesse a voar. Abriu, depois, os olhos e mal acreditou no que viu. Tudo o que a rodeava estava para além de todo o deslumbramento que jamais pode-ria imaginar. Para qualquer lado que olhasse via tudo envolto numa luz ténue, embora

resplandecente, como se cada objeto ou pessoa brilhasse com luz própria. Era como se a luz que tudo rodeava, ao entrar em contacto com objetos

materiais, os transformasse em objetos etéreos, diáfanos e luminosos.

Ah, como tudo aqui-lo era belo! E como

era boa a sensação que tinha!...

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Aquele momento, porém, não durou muito. Sem que soubesse porquê,

algo a levou a acordar. De forma inesperada, e também indesejável…

Abriu os olhos de novo, e olhou à sua volta. Mas, desta

vez, a única luz que viu foi a do sol, que naquele momento espreitava pela janela do seu quarto como que a desejar--lhe um bom dia. Sara compreendeu, então, que tudo não passara de um sonho. O sonho mais lindo que alguma vez poderia sonhar. Só o seu puro cora-ção de criança lhe dava a certeza de ter acabado

de viver a magia de um outro Natal....

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