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UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS FACULDADE DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO UM OLHAR SOBRE O PROCESSO ENSINO- APRENDIZAGEM DA MATEMÁTICA NAS SÉRIES INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL MANAUS 2007

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS FACULDADE DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

UM OLHAR SOBRE O PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM DA MATEMÁTICA NAS SÉRIES

INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL

MANAUS

2007

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS

FACULDADE DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

IVANA VALÉRIA DENÓFRIO ARANÃO

UM OLHAR SOBRE O PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM DA MATEMÁTICA NAS SÉRIES INICIAIS DO

ENSINO FUNDAMENTAL

Orientadora: Profª Drª Lucíola Inês Pessoa Cavalcante

MANAUS

2007

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Amazonas, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Educação.

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IVANA VALÉRIA DENÓFRIO ARANÃO

UM OLHAR SOBRE O PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM DA

MATEMÁTICA NAS SÉRIES INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL

Aprovada em 25 de abril de 2007.

BANCA EXAMINADORA

_______________________________________

Profª. Drª. Lucíola Inês Pessoa Cavalcante

Orientadora – UFAM

______________________________________

Profª. Drª. Antonia Silva de Lima

Membro – UFAM

______________________________________

Prof. Dr. Nilomar Vieira de Oliveira

Membro - UFAM

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Amazonas, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Educação.

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DEDICATÓRIA

A Deus, pelas bençãos em minha vida;

À Profª Lucíola, por suas preciosas orientações e a todos

aqueles que auxiliaram, direta ou indiretamente, na construção

deste trabalho;

À minha família, em especial minha Mãe e ao meu pai (in

memorian), que sempre incentivaram-me ao crescimento

acadêmico e profissional;

À minha tia Dalila e minha irmã Rosemeire pela amizade e

carinho a mim dedicados;

Às minhas lindas filhas, Valéria e Valeska, pelo amor e pela

compreensão dos momentos em que fiquei ausente para a

conclusão deste trabalho.

14

AGRADECIMENTOS

Agradeço o apoio valioso da Irmã Diretora, da Professora e

dos alunos que contribuíram para a realização e conclusão

deste trabalho.

15

“O principal objetivo da educação é criar

homens que sejam capazes de fazer coisas novas, e não

simplesmente repetir o que outras gerações já fizeram.”

Jean Piaget

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RESUMO

A pesquisa refere-se ao processo ensino-aprendizagem da Matemática nas séries iniciais do Ensino Fundamental relacionando-o com a prática educativa, a formação do educador, a metodologia de ensino e o contexto sócio-cultural dos atores desta prática, bem como a visão destes sobre a Matemática em si. Tem como objetivos: identificar os principais fatores que interferem no processo de aprendizagem da Matemática dos alunos das primeiras séries do Ensino Fundamental tornando-a uma disciplina de difícil assimilação; identificar os principais fatores que levam o aluno a não gostar e ter dificuldades na aprendizagem da Matemática; ressaltar a importância da atuação do professor neste processo e propor sugestões de práticas pedagógicas para o ensino da Matemática. Para alicerçar a pesquisa, contamos com a colaboração de autores da tendência sócio-interacionista como Piaget e Vygotsky e, do processo progressista de aprendizagem da Matemática, Kátia Smole, Luis Roberto Dante, Dione Carvalho, entre outros. A pesquisa de campo foi realizada numa escola particular de Ensino Fundamental no centro de Manaus, cujo ensino da Matemática é realizado por tempos de 50 minutos desde a 1ª série. A pesquisa de campo contou com um período de observações na turma de 4ª série durante todo o 2º trimestre de 2006 e, no final do ano letivo, foram realizadas intervenções com aulas interativas ministradas pela pesquisadora. Os resultados obtidos após o término da pesquisa apontaram para duas reflexões distintas: a primeira sobre a necessidade da contextualização da Matemática em situações práticas para uma aprendizagem significativa; a segunda, para a necessidade de repensar os cursos de formação de professores que irão atuar com a Matemática diretamente em salas de aula das séries iniciais do Ensino Fundamental.

Palavras-chave: Formação e Atuação do Professor. Processo Ensino-Aprendizagem da Matemática. Dificuldades de Aprendizagem.

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ABSTRACT

This research focus the mathematic teach-learning process to the beginners of the primary school, correlated with the educational practice, educator graduation, methodology of teaching, cultural and social context of this acts, as well as a whole view of mathematic itself. The research has as the main goals: identify the principal factors that intervene with the process of the pupils in primary school, becoming it a difficult subject, which makes mathematic learning too hard of being understood; identify the principal factors that makes the pupils dislike and even do not understand, showing this way, so many difficulties of learning it; focus how important the teacher is and show that he is involved in all whole this process, as well as present pedagogical practice results to the mathematic teaching. With the objective of basing the research, we have been counting on the authors’ collaboration as Piaget and Vygotsky and, mathematic learning progressive process, Katia Smole, Luis Roberto Dante, Dione Carvalho, among others. This study was realized at a primary private school, as well as at a Manaus’s government school, which the mathematic learning is taught in 50 (fifty) minutes since the first level. The period of observation of this research, lasted about three months of 2006 (second quarter), in the fourth level of teaching, and at the end of this year, some interventions had been done with interactive classes presented by the researcher. The results obtained after the research ending showed different reflections: first, is about the mathematic needing context at practical situations to a meaning learning; second, revaluate the teacher’s graduation curses that work with mathematic, directly at beginning primary school.

KEY WORD: Teacher’s graduation and working. Mathematic learning teaching process.

Learning difficulties.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ......................................................................................................................10

1. O INÍCIO ............................................................................................................................13

2. REFLEXÕES SOBRE O ENSINO DA MATEMÁTICA...............................................17

2.1 A MATEMÁTICA, A LÍNGUA MATERNA E AS DIFICULDADES

DE APRENDIZAGEM DA MATEMÁTICA (DAM) ...................................................27

2.2 FATORES QUE PODEM INTERFERIR NA APRENDIZAGEM

DA MATEMÁTICA .........................................................................................................33

3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ...................................................................63

3.1INDICAÇÃO E JUSTIFICAÇÃO DO PARADIGMA QUE ORIENTA O

ESTUDO .............................................................................................................................63

3.2 ETAPAS DO DESENVOLVIMENTO DA PESQUISA ..........................................64

3.3 CONTEXTO E PARTICIPANTES ...........................................................................66

3.4 PROCEDIMENTOS E INSTRUMENTOS DE COLETA DE DADOS ........... 67

3.5 ANÁLISE DE DADOS E CRITÉRIOS PARA MAXIMIZAR A

CONFIABILIDADE .........................................................................................................67

4. ANÁLISE DE DADOS ......................................................................................................73

4.1 FASE DE INVESTIGAÇÃO FOCALIZADA E AS CATEGORIAS

DE ANÁLISE .....................................................................................................................77

CONCLUSÃO .....................................................................................................................113

REFERÊNCIAS ...................................................................................................................120

SUGESTÃO DE SITES .......................................................................................................125

ANEXOS ...............................................................................................................................126

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INTRODUÇÃO

Escrever sobre ensino não é tarefa simples, muito menos quando se trata do “ensino

da matemática”. São muitos os elementos que compõem o ato de ensinar: a seleção dos

conteúdos adequados à faixa etária, o estabelecimento dos objetivos a serem alcançados, os

procedimentos metodológicos para viabilizá-los, os recursos que o apoiam, o tipo de

avaliação adotada e, sobretudo, a postura do professor que intermedia todo o processo ensino-

aprendizagem.

Este último é o protagonista, junto com o aluno, que irá proporcionar a boa ou a má

tessitura da rede de conhecimentos no que se refere à aprendizagem da Matemática, na

medida em que viabiliza elementos do processo educativo (conteúdos, didática, avaliação)

para que este ocorra de modo eficaz. Defrontamo-nos com inúmeras variáveis que podem

interferir no processo, dentre elas a formação do professor, sua postura frente ao ato de

ensinar, as dificuldades encontradas por ele, sua visão, vivências e sentimentos em relação à

Matemática, os instrumentos que utiliza para ensinar, sua concepção de ensino. Por sua vez,

está o aluno que aprende, suas vivências, o contexto sócio-cultural-familiar, a relação que

estabelece com a Matemática, suas necessidades, desejos e visão sobre a mesma.

Sabe-se que a Matemática está presente em todos os aspectos de nossa vida, seja na

forma de números, geometria das figuras, espaço ou tempo. A partir do momento que

nascemos, o tempo começa a ser contado e as experiências com a Matemática vão somando-

se a cada dia que passa. Durante a vida, aprendemos a calcular e estabelecer relações. Ao

comprarmos um produto, comparamos preços; ao escolhermos um calçado, estabelecemos a

relação número e tamanho do pé; ao fazermos uma receita culinária, relacionamos a

quantidade de ingredientes ao tamanho da fôrma a ser usada; o médico, ao receitar um

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remédio, estabelece a relação entre peso do paciente e a dosagem de remédio, e assim

acontece em todos os setores da vida humana.

Sendo de tal forma, por que a Matemática é concebida, no processo ensino-

aprendizagem, como o “bicho-papão” na vida de muitas pessoas? Se ela faz parte de nossa

vida, em todos os momentos, qual é a razão das dificuldades dos alunos em solucionar

problemas? Que influência tem a postura do educador no ensino da Matemática?

Sendo a Matemática uma linguagem universal, utilizada no dia-a-dia, uma linguagem

que requer vários saberes relacionados ao cotidiano do ser humano, seria óbvio deduzirmos

que a aprendizagem da mesma pelos alunos do Ensino Fundamental seria simples e de fácil

assimilação, mas está comprovado na prática que esta dedução não é verdadeira. É constante a

afirmação de alunos que detestam a Matemática e de pais preocupados com os filhos que não

aprendem a disciplina.

Daí vem o porquê de tais afirmações e de tantas dificuldades na aprendizagem. É

justamente neste ponto que pretendo mergulhar para melhor compreender a razão deste “não

aprender Matemática” e deste “detestar a Matemática”, uma vez que ela está intrínseca nas

ações cotidianas. Para tanto, a pesquisa tem os seguintes objetivos:

� Objetivo Geral: Analisar os principais fatores que interferem no processo de

aprendizagem da Matemática pelos alunos das séries iniciais do Ensino Fundamental,

tornando-a uma disciplina de difícil assimilação.

� Objetivos Específicos:

• Identificar os principais fatores que levam o aluno a não gostar e/ou ter

dificuldades na aprendizagem da Matemática devido à metodologia de ensino;

• Verificar aspectos da atuação do professor que facilitam ou dificultam o

processo ensino-aprendizagem da Matemática nas séries iniciais do Ensino Fundamental;

• Propor sugestões de práticas pedagógicas para o ensino da Matemática.

Frente aos objetivos propostos, busquei responder às seguintes questões

norteadoras: Sendo a Matemática uma linguagem universal que propicia o raciocínio lógico-

matemático, auxiliando na articulação de saberes, por que vem a ser uma ciência de difícil

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assimilação pelos alunos das séries iniciais do Ensino Fundamental? Quais são os principais

fatores que levam o aluno a não gostar e a ter dificuldades na aprendizagem da Matemática?

Como a atuação do professor pode influenciar nestes fatores?

Para tanto, o estudo foi estruturado em quatro capítulos. O primeiro contempla a

história de vida da autora em relação à sua experiência com a Matemática, uma vez que sua

formação é em pedagogia. O segundo capítulo estabelece reflexões sobre o ensino da

Matemática, fazendo referência deste com a Língua Materna, as dificuldades de aprendizagem

e os fatores que podem interferir nesta aprendizagem. O terceiro capítulo trata dos

procedimentos metodológicos utilizados para viabilizar a pesquisa e, o último capítulo, a

análise dos dados obtidos durante a pesquisa de campo. Vale ressaltar que a presente pesquisa

tem, como foco principal, uma reflexão sobre a importância da atuação do professor nas séries

iniciais do Ensino Fundamental, como mediador no processo ensino-aprendizagem da

Matemática.

Para subsidiar esta pesquisa, contamos com os seguintes autores: Jean Piaget com sua

teoria da construção do conhecimento e o conhecimento lógico-matemático; Lev Vygotsky

com suas contribuições sobre a base sócio-cultural do desenvolvimento humano, e autores que

abordam a teoria e os conceitos elaborados por Piaget (1975) e Vygotsky (1998). Contamos

também com as contribuições de autores ligados à área da Educação Matemática, trazendo

uma proposta de trabalho interdisciplinar, contextualizada e significativa para o ensino desta

disciplina. Dentre eles estão: Moysés (1997), Smole (2001), Rabelo (2002), Machado (2003)

e Carvalho (2005).

Ressalto a fundamental importância e urgente necessidade de se refletir sobre o

processo ensino-aprendizagem da Matemática nas séries iniciais do Ensino Fundamental,

dada à sua complexidade, na medida em que inúmeros fatores interferem neste processo,

impedindo, de certa forma, a sua eficácia e a garantia de bons resultados em sua

aplicabilidade. Sabemos que, atualmente, o maior índice de retenção escolar é atribuído às

dificuldades na aprendizagem da Matemática. Desse modo, esta pesquisa tem o intuito de

colaborar com um olhar crítico sobre o processo, refletindo e buscando meios para a melhoria

do ensino e da aprendizagem da Matemática no meio escolar.

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1. INÍCIO

Lembro-me perfeitamente das dificuldades que tinha em aprender determinados

conteúdos matemáticos durante a 3ª e 4ª séries do ensino fundamental. Minha mãe pagava

aulas com professor de matemática e isso me incomodava, pois achava que o certo era eu

aprender sem dificuldades e sem necessitar de auxílio extra-classe. A matemática sempre me

encantou com seu aspecto desafiante e, de certa forma, lúdico para mim. No entanto, ela era

ensinada de forma nada lúdica e prazerosa. Durante o primeiro ano do ensino médio, o

professor de matemática confiou-me o título de “monitora de matemática” a fim de que o

auxiliasse nas correções dos exercícios repassados para meus colegas de classe.

Em 1978, ao finalizar o primeiro ano básico do ensino médio, tive que optar por uma

das três áreas profissionalizantes oferecidas pela escola: exatas, humanas ou biológicas. De

início optei por exatas, pois pretendia prestar vestibular para engenharia civil. No dia

seguinte, decidi não mais seguir nesta área, efetuando a matrícula no magistério. Esta minha

decisão de mudança foi devido ao fato de que pensava ser melhor optar pelo magistério para

obter um certificado, dando-me o direito de logo lecionar e ganhar meu próprio dinheiro.

Depois, fazendo um cursinho, poderia tentar engenharia.

Em 1981, finalista do curso de magistério, eu e um grupo de professoras que já

lecionavam na própria escola onde cursávamos o magistério, fomos “intimadas” a passar dois

meses de nossas férias (julho e janeiro) em São Paulo para aprendermos a lidar com o Sistema

Montessoriano de ensino a fim de lecionarmos sob esta orientação. Caso não aceitássemos,

não seria possível, para a Direção, que continuássemos lecionando na escola. Durante o curso,

meu encanto pela Matemática finalmente se concretizou. Os materiais montessorianos

dirigidos ao ensino da Matemática me fascinaram por sua simplicidade e pela maneira como a

aprendizagem poderia fluir naturalmente, sem cobranças e sem traumas. Foram 10 anos

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trabalhando neste sistema, vivenciando ricas experiências e me apaixonando cada vez mais

pelo magistério e pela Matemática.

Em 1985, com o surgimento da “febre do construtivismo”, ou talvez “modismo

educacional” para as escolas na época, a direção da escola onde trabalhava contratou um

“especialista na teoria de Jean Piaget” para nos ensinar tudo sobre esta teoria. Outros cursos

sobre Piaget e o construtivismo surgiam por todos os cantos da cidade de Campinas, onde a

prefeitura municipal investia muito na formação continuada de seus professores. Na época,

lecionava também em uma E.M.E.I (Escola Municipal de Educação Infantil). Fui devoradora

assídua de textos e livros que versavam sobre a teoria de Piaget.

Tudo o que aprendia na teoria, aplicava na minha prática como professora. Reflexão

e ação caminhavam, pois, juntas, o que me recorda uma citação de Pimenta (2002, p. 19-20)

sobre professor reflexivo:

[...] Schön propõe uma formação profissional baseada numa epistemologia da

prática, ou seja, na valorização da prática profissional como momento de construção de conhecimento, através da reflexão, análise e problematização desta [...] No entanto, esse conhecimento não é suficiente. Frente a situações novas que extrapolam a rotina, os profissionais criam, constroem novas soluções, novos caminhos, que se dá por um processo de reflexão na ação.

Esta citação ilustra bem esse momento, no sentido de que é na prática profissional

que o professor constrói seu conhecimento e reflete sobre sua ação tanto pedagógica como

pessoal. Durante minha história como professora, fui buscando, cada vez mais, saciar minha

fome de conhecer sobre assuntos relacionados à prática educativa. Minhas aulas eram

diversificadas, baseadas em conhecimentos montessorianos e piagetianos que me auxiliavam

na busca por uma prática educativa significativa.

Em 1990, mudei-me para São Luís do Maranhão. Muitas foram as festinhas de

despedida antes de minha partida: presentes, abraços e muito, muito choro. No ano seguinte

da minha mudança, passei no vestibular da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) para

Pedagogia e tive a grande oportunidade de coordenar quatro creches mantidas por uma ONG

que recebia recursos da França para trabalhos com crianças oriundas de famílias de baixa

renda em São Luís. A estrutura das creches era montada com recursos da ONG porém, todo o

trabalho pedagógico deveria ser exercido pelas mães da comunidade sob as minhas

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orientações. Estas mães atuavam como professoras das crianças. As estantes das salas eram

montadas com caixas de papelão revestidas com folhas de revista; os brinquedos eram doados

por pessoas da sociedade maranhense e também construídos por nós e pelas crianças com

materiais recicláveis; os cadernos eram feitos de papel de formulário contínuo (inutilizados

pelas agências bancárias) costurados, e as atividades eram realizadas com materiais que

tínhamos em mãos. Deste trabalho, nasceu meu livro “A Matemática Através de Brincadeiras

e Jogos”, editado pela Editora Papirus, cujo lançamento foi em Manaus, em 1996. Em

dezembro de 1994, apresentei meu Trabalho de Conclusão de Curso, o qual resultou no livro

anteriormente citado. Em fevereiro de 1995, já estava trabalhando em Manaus, ocupando o

cargo de Coordenadora Pedagógica de uma escola particular onde atuo até hoje. Tanto em São

Luís como em Manaus, ministrei oficinas sobre a teoria de Piaget e sobre o manuseio de

materiais didáticos montessorianos e não montessorianos aplicados ao ensino da Matemática.

Em 2004, terminei minha pós-graduação na UnB em convênio com o SESI e a

UNESCO, cuja monografia recebeu o seguinte título: O Processo Ensino-Aprendizagem da

Matemática na Educação de Jovens e Adultos. Finalmente, no mestrado, meu objeto de

pesquisa (a Matemática) foi focado nas séries iniciais do Ensino Fundamental.

Nesta trajetória de 25 anos de prática educacional, construí conhecimentos através

das oportunidades de formação continuada, vivenciei significativas experiências tanto

enquanto professora como pedagoga, refleti sobre minhas práticas, questionei meus saberes e

reconstrui conceitos. Marquei vidas e também fui marcada por elas. Como escreve Saul (apud

BICUDO e SILVA JR., 1996, p. 115) “[...] gosto e insisto na abordagem da formação como

um processo de desenvolvimento que ocorre durante toda a vida do ser humano”.

Vale lembrar que, mesmo não tendo licenciatura plena em Matemática, hoje, devido

às minhas experiências de vida com a Matemática, a edição do livro sobre o assunto e sendo

ela meu objeto de pesquisa atual, ministro aulas de Fundamentos e Metodologia da

Matemática num curso de Pedagogia, em Manaus. A prática e o conhecimento sobre o

assunto possibilitaram-me esta experiência como professora universitária.

Assim, refletindo sobre minha própria formação e a prática como professora,

acompanho Cavalcante e Costa (1996, p. 45) em suas indagações:

25

De onde partem nossas referências teóricas? De nossa história de vida e dos estudos/reflexões que constantemente fazemos. Como pensamos e como atuamos hoje tem a ver com as experiências por nós vividas como alunos(as), professores(as), filhos(as), companheiros(as), dentre outras referências. É importante localizá-las, pensar sobre elas e sobre a influência que têm na forma como pensamos e atuamos hoje, fazer a auto-crítica, a análise de nós mesmos(as) e de nossa atuação, a fim de visualizar o que precisa ser mudado e providenciar os recursos adequados para as mudanças que se revelam em nossa prática.

E assim, a história continua a ser escrita pelos caminhos que a vida nos leva e que nós nos

deixamos levar...

26

2. REFLEXÕES SOBRE O ENSINO DA MATEMÁTICA

Ao pesquisar sobre o surgimento da Matemática, constatamos que sua origem deve-

se à necessidade dos homens em resolver seus problemas decorrentes das situações da vida

diária: demarcação de terras, contagem do rebanho, registro dos períodos de tempo

(festividades religiosas, época de plantio e colheita).

Caracterizada pela idéia da abstração, precisão, rigor lógico no extenso campo de sua

aplicação, tem-se a idéia de que a Matemática é a ciência da quantidade e do espaço, devido

ter surgido pela necessidade de quantificá-lo e organizá-lo.

Este caráter de precisão e perfeição, e de uma certa visão elitista, permanece até

nossos dias, como o filtro seletivo básico de todos os sistemas educacionais. É comum

utilizar-se a Matemática como indicador para classificar alunos inteligentes pelo fato de

apresentarem um bom desempenho em tal ciência. Essa supremacia da Matemática como área

do conhecimento certamente distancia crianças e adolescentes que não se sentem motivados a

assumir desafios, desenvolvendo, assim, sentimentos negativos em relação à mesma.

Pesquisas realizadas nas últimas décadas confirmam a hipótese de que são muitos os

estudantes que demonstram grandes dificuldades em atingir os objetivos propostos para os

conteúdos matemáticos estabelecidos nos currículos educacionais (CURI, 2003).

Esta realidade não é só confirmada na fala e no desempenho dos alunos, mas também

é expressa pelos próprios professores que se vêem envolvidos na situação ensino-

aprendizagem. Estes, mesmo quando acham a Matemática fascinante e fácil, não conseguem

convencer a seus alunos, que a caracterizam como enfadonha e difícil.

As obras de Piaget e de seus colaboradores têm oferecido não somente material de

estudo, como também possibilitado mudanças de paradigmas nos programas escolares,

abrindo perspectivas de novos horizontes para a teoria da aprendizagem da Matemática. No

27

dizer de Kamii (1995, p.22) “o ensino da Aritmética não está funcionando atualmente porque

a teoria da aprendizagem da Aritmética dos educadores matemáticos tradicionais é errônea.”

Os resultados de suas pesquisas confirmam que a criança constrói o conceito de número,

utilizando-se de uma lógica própria, bem diferente da lógica utilizada nas metodologias de

ensino de tais conceitos. Critica e demonstra que a Matemática Moderna é baseada em

pressupostos empiristas duvidosos.

O Movimento da Matemática Moderna, nas décadas de 60/70, influenciou

fortemente o ensino da Matemática em vários países, fazendo parte de uma política de

modernização econômica como ferramenta que possibilitava uma moderna via de acesso para

o pensamento científico e tecnológico, ao lado da área das Ciências Naturais.

Ao aproximar a Matemática escolar da Matemática pura, centrando o ensino nas estruturas e fazendo uso de uma linguagem unificadora, a reforma deixou de considerar um ponto básico que viria se tornar seu maior problema: o que se propunha estava fora do alcance dos alunos, em especial daqueles das séries iniciais do ensino fundamental” (PCN-Matemática, 2000, p.21).

Nesta época, os países ocidentais preocupavam-se com o avanço tecnológico dos

países orientais. Sendo assim, acharam por bem reformular o currículo relacionado à

Matemática, consultando matemáticos famosos, os quais,

[...] compuseram o grupo Bourbaki com a função única de elaborar os conteúdos e, Jean Piaget que se encarregaria da elaboração das estratégias de ensino. Surge então, a Matemática Moderna atingindo seu auge em 1960. No Brasil, chegou com o ensino da teoria dos conjuntos (tipos de conjuntos, símbolos, interseção, união de conjuntos, elementos de um conjunto) por volta de 1965” (CURI, 2003), veiculada pelos livros didáticos.

Os pressupostos do Movimento da Matemática Moderna baseavam-se no

compromisso da Matemática com o progresso técnico, cuja meta principal seria ensinar o

aluno a abstrair conteúdos sem importar-se com a sua aplicabilidade prática. Portanto, a

Matemática estaria desvinculada da aplicação em situações do cotidiano.

No sistema educacional brasileiro, a Matemática Moderna teve bastante influência

através dos livros didáticos que introduziram a teoria dos conjuntos como unidade inicial de

cada série, envolvendo a aprendizagem de terminologia e símbolos específicos,

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comprometendo significativamente o ensino do cálculo, da geometria e das medidas. Esta

preocupação excessiva com abstrações, internas à própria Matemática, provocou uma

formalização precoce de conceitos e pouca vinculação da Matemática às suas aplicações

práticas. (PCN, 2000. V.3, p.21).

Porém, com a reforma posterior do ensino (1980), o Movimento da Matemática

Moderna enfrentou severas críticas relacionadas ao uso inadequado da teoria dos conjuntos, o

“abandono” da geometria em função da aritmética e álgebra e de temas como medidas e

grandezas.

O Movimento da Matemática Moderna foi substituído por um outro modo de

conceber o ensino da Matemática: a aula não poderia ser mera transmissão de conhecimentos

e sim um “fazer-Matemática”; novos papéis seriam conferidos ao professor; introdução de

recursos didáticos e resolução de problemas; estabelecimento de conexões entre temas

matemáticos e as conexões entre a Matemática e a realidade (foi o principal contraponto em

relação à Matemática Moderna); o recurso às tecnologias (partir do que o aluno precisa saber

e ultrapassar a realidade momentânea); utilização da calculadora e computadores.

Como conseqüência de inúmeras discussões, as décadas de 80/90 marcaram um

período de redefinição dos princípios norteadores do ensino da Matemática, a partir do

documento “Agenda para Ação”, apresentado pelo National Council of Teacher of

Mathematics1 nos Estados Unidos, em 1980, que destaca a importância da compreensão dos

aspectos sociais, antropológicos e lingüísticos para as novas diretrizes curriculares. Estas

idéias influenciaram as reformas ocorridas mundialmente sobretudo através do Programa

Etnomatemática2 que, no Brasil, vem sendo incorporado às ações pedagógicas das propostas

curriculares das Secretarias de Estado e Secretarias Municipais de Educação (CURI, 2003).

O Sistema Nacional de Avaliação Escolar da Educação Básica (SAEB) tem

constatado, através da análise dos resultados dos testes de rendimento escolar na área da

Matemática, que esta tem uma significativa influência na seleção de alunos que concluem ou

não o ensino fundamental. Os índices que indicam o baixo desempenho dos alunos nesta área

apontam a “Matemática como a disciplina que contribui para elevação das taxas de retenção.”

(PCN. 2000, v.3, p.24).

1 Órgão responsável por estabelecer reflexões a respeito do ensino da Matemática. 2 Etnomatemática é um programa de pesquisa em cultura, cognição, epistemologia, história e política (D’AMBRÓSIO, 1997, p. 119)

29

Atualmente, contamos com o apoio dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs),

elaborados a partir da promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, Lei nº 9394/96,

a fim de nortear o processo ensino-aprendizagem das disciplinas escolares, dentre elas a

Matemática. A elaboração do PCN-Matemática para o Ensino Fundamental partiu de alguns

princípios, tais como:

• A Matemática é fator importante na construção da cidadania;

• No ensino da matemática é necessário relacionar observações da vida com

representações (tabelas, esquemas e figuras) e, relacionar essas representações com conceitos

matemáticos. O aluno deve “falar e escrever” matematicamente;

• A Matemática deve ser compreendida de modo a estabelecer relação com as

demais disciplinas e o cotidiano do aluno;

• A seleção e organização dos conteúdos devem contribuir para o

desenvolvimento intelectual do aluno e estar em permanente construção;

• “O conhecimento matemático deve ser apresentado aos alunos como

historicamente construído e em permanente evolução” (p. 20);

• Os recursos matemáticos, como jogos, livros e outros, devem estar interligados

a situações que levem ao exercício de análise e reflexão.

No volume 3 dos PCNs (2000, p.15), dedicado à Matemática, a Secretaria de

Educação Fundamental começa a apresentação do livro com a seguinte ponderação:

O ensino de Matemática costuma provocar duas sensações contraditórias por parte de quem ensina, como por parte de quem aprende: de um lado, a constatação de que se trata de uma área de conhecimento importante; de outro, a insatisfação diante dos resultados negativos obtidos com muita freqüência em relação à sua aprendizagem .

Esta afirmação nos leva a uma primeira reflexão mencionada anteriormente, ou seja,

se a Matemática faz parte da vida, do dia-a-dia, desde o nascimento até a morte, por que tanta

dificuldade em assimilar seus conceitos?

30

Mais uma vez citando os PCNs (2000, p.15), no decorrer da apresentação do trabalho

lê-se a seguinte afirmativa:

A insatisfação revela que há problemas a serem enfrentados, tais como a necessidade de reverter um ensino centrado em procedimentos mecânicos, desprovidos de significados para o aluno. Há urgência em reformular objetivos, rever conteúdos e buscar metodologias compatíveis com a formação que hoje a sociedade reclama.

É necessário, portanto, procurar entender como ocorre o processo ensino-

aprendizagem da Matemática, com o intuito de identificar e analisar os fatores que interferem

neste processo, contribuindo ou não para o surgimento de dificuldades apresentadas pelos

alunos durante sua aprendizagem, a fim de poder sugerir alternativas de erradicação ou

minimização das mesmas.

Neste sentido, Piaget (1975, p.57) argumenta:

É aqui [no ensino da Matemática] que os professores encontram maior dificuldade e onde, apesar de todas as qualidades de seu ensino, os métodos não-ativos que estão habitualmente compelidos a usar resultam em dificuldades que são de um modo geral bem conhecidas. [...] Às vezes, a compreensão da matemática elementar chega a ser considerada como um sinal de aptidão especial. A presença ou ausência desse “dom” matemático é então usada para explicar o sucesso e o fracasso, embora se possa perguntar se não são talvez atribuíveis ao método clássico do próprio ensino.

Tomando-se por base este pensamento de Piaget sobre a importância da metodologia

de ensino, podemos também citar as preocupações de Paulo Freire (1987, p.102) quanto à

prática pedagógica:

Enquanto na prática “bancária” da educação, antidialógica por essência, por isto, não comunicativa, o educador deposita no educando o conteúdo programático da educação, que ele mesmo elabora ou elaboram por ele, na prática problematizadora, dialógica por excelência, este conteúdo, que jamais é “depositado”, se organiza e se constitui na visão do mundo dos educandos, em que se encontram seus temas geradores.

Nesta perspectiva de prática problematizadora e dialógica é que foi encaminhada

esta pesquisa, sobretudo porque compreendemos a Matemática como forma de pensamento e

31

conhecimento construído a partir da própria evolução da humanidade, quando da necessidade

de resolução de problemas advindos do meio ambiente e na relação social entre os homens.

Atualmente, as tendências no ensino da Matemática apontam para um ensino

contextualizado, interligado com a vivência do aluno e realizado de forma interdisciplinar.

Há, neste ensino, certas características comuns, como sua universalidade e a própria

concepção do seu estudo, fazendo com que os alunos, dos mais diferentes países, se

comportem de maneira muito semelhante. Um exemplo é a clássica pergunta: Esse problema

é “de mais” ou “de menos”? Este tipo de pergunta foi constatada por diversos pesquisadores,

dentre eles Mellin-Olsen (1986), da Noruega e, Stodolsky (1985) e Forman (1989), autores

norte-americanos. Estes confirmam as mesmas dificuldades e propõem novas formas de

ensinar a Matemática, dentre elas, as atividades em grupo (atividades compartilhadas), que

favorecem a interação na construção do conhecimento matemático (MOYSÉS, 1997, p. 61).

No Brasil, compartilham da mesma posição, autores como: Kátia Stocco Smole e

Maria Ignez Diniz (2001), Terezinha Nunes (2005), Analúcia Schliemann (2001), Nilson

Machado (1998), Silvia Machado (2003), Edmar Rabelo (2002), Lúcia Moysés (1997), entre

outros. Os autores citados contribuem com reflexões sobre Educação Matemática cujo ensino

caminha numa perspectiva interdisciplinar, envolvendo situações do cotidiano do aluno, de

modo significativo e prazeroso.

Hoje, o termo “Ensino da Matemática” é progressivamente substituído por

“Educação Matemática”, considerada como uma área autônoma de pesquisa em educação,

com expansão em níveis internacionais, tendo, como um dos seus pontos básicos, a tendência

para o enfoque sociocultural. Este enfoque surgiu por ocasião do Terceiro Congresso

Internacional de Educação Matemática, na Alemanha, em 1976 (MOYSÉS, 1997, p.62).

Igualmente, a matemática e a educação matemática não podem ser insensíveis aos problemas maiores afetando o mundo moderno, principalmente a exclusão de indivíduos, comunidades e até nações, dos benefícios da modernidade. A matemática é o maior fator de exclusão nos sistemas escolares. O número de reprovações e evasões é intolerável. Faz-se necessário ampliar as oportunidades de escolaridade e de pesquisa com a utilização plena dos recursos de ensino à distância. E naturalmente repensar, profundamente, os modelos correntes de avaliação (D’AMBRÓSIO, 2001, p.16).

32

Em relação à Educação Matemática, D’Ambrósio (2001, p.15) afirma que “o grande

desafio que nós, educadores matemáticos, encontramos é tornar a matemática interessante,

isto é, atrativa; relevante, isto é, útil; e atual, isto é, integrada no mundo de hoje”.

Neste sentido, o meio mais apropriado para o estabelecimento da Educação

Matemática se dá através da resolução de situações-problema.

Na aprendizagem da Matemática, não é mais suficiente saber simplesmente efetuar

as operações, mas sim, saber utilizá-las de forma efetiva na resolução de situações-problema.

Deste modo, é interessante que o professor proponha situações-problema que motivem a

busca de soluções, incentivando os alunos a expressarem seu raciocínio, fazendo uso da

linguagem matemática convencional e estabelecendo relações com outros problemas

resolvidos anteriormente.

Quanto à resolução de problemas, Rabelo (2002, p.76) enfatiza que:

[...] o ensino da matemática deve buscar também a formação de bons formuladores e resolvedores de problemas. Neste sentido, a resolução de problemas deve proporcionar a construção de conceitos e descoberta de relações e formular e resolver problemas deve ser assumido não só como atividades, mas também como conteúdos de aprendizagem.

Nesse processo didático, entram em jogo as percepções individuais do aluno, as

trocas de experiências com os companheiros e as interferências do professor numa interação

constante. Por isso, o enfoque sóciocultural.

O que se percebe, no entanto, é que a dificuldade de se resolver problemas não está

tão presente nas operações matemáticas, mas sim na forma como aparece o enunciado, nos

dados numéricos, no tipo de pergunta e nas necessidades de recorrer a informações não

explícitas. Neste sentido, o diálogo entre companheiros e professor é necessário para elucidar

os elementos inter-relacionados na resolução de um problema, a fim de entender o enunciado,

a retirar dele os dados mais importantes e desprezar os dados desnecessários à solução. Deste

modo, teremos uma Matemática viva, dinâmica e significativa.

Nesta caminhada, deve-se dar maior importância à construção dos conceitos e à

compreensão dos processos de cálculos. É necessário, porém, que, após a compreensão dos

mesmos, haja a memorização dos processos compreendidos a fim de servir de instrumentos a

33

novas aquisições. Caso contrário, a resolução de operações com números maiores se tornaria

muito demorada. É o caso da tabuada: a memorização é extremamente necessária, porém a

compreensão de seu funcionamento deve preceder a memorização. Uma vez compreendidas

as etapas que levam aos automatismos, é possível ao aluno detectar erros e corrigi-los,

evitando a ilusão de que as aplicações das operações são “truques de mágica”.

A tendência atualmente para o ensino da Matemática, como já citado, está focada na

aplicação de jogos e resolução de situações-problema, pois ambos motivam o aluno, de forma

dinâmica e significativa, a desenvolver o raciocínio lógico, estimulam a troca de idéias, o

respeito às argumentações de seus pares e a construção progressiva do conhecimento

cognitivo. São muitos os autores que caminham nesta tendência, dentre eles citarei as

contribuições de alguns deles que alicerçaram meu trabalho como pesquisadora e professora

universitária.

Carvalho (2005) propõe, de forma criativa, diferentes tipos de estratégias para

resolução de problemas matemáticos em sala de aula. Reflete, ainda, sobre o processo de

aprendizagem do aluno, comparando-o com a evolução histórica da matemática, ou seja, do

mesmo modo como os pastores relacionavam uma pedrinha para cada ovelha (relação

biunívoca) ou fazendo tracinhos em seu cajado para contar seu rebanho, o aluno também faz

tracinhos, bolinhas e outras marcas para resolver um problema proposto. A autora acrescenta

que “a não-aplicação da operação matemática na resolução de um problema cria ansiedade no

professor, mas também esquecemos que a humanidade levou séculos para abstrair o atual

sistema de numeração decimal” (p.12).

Segundo a autora, devemos considerar a complexidade do nosso sistema de

numeração hindu-arábica uma vez que contempla quatro regularidades. Tomemos como

exemplo o numeral 521. A primeira regularidade refere-se à leitura decomposta do numeral,

ou seja, lemos “quinhentos e vinte e um”. Porém, ao efetuarmos as operações de adição,

subtração e multiplicação, começamos na ordem inversa (das unidades para a centena). A

segunda regularidade implica no valor posicional de cada numeral: no caso o 5 está ocupando

a casa das centenas, o 2 das dezenas e o 1 das unidades. Temos, portanto, o valor absoluto e

relativo dos numerais. A terceira regularidade indica que os numerais são também

multiplicativos. Vejamos: 5 (x100) 2 (x10) 1 (x1) ou 50 (x10) 20 (x1) 1(x1). E a última

regularidade é que os numerais também são aditivos: 500 + 20 + 1.

34

A humanidade levou milhares de anos para chegar a estas regularidades e queremos

que nossos alunos aprendam tudo isto, e mais um pouco, em alguns meses de aula.

Por conta da falta de entendimento do sistema de numeração decimal e, conseqüentemente, de todas essas regularidades, o trabalho com a construção dos conceitos das operações matemáticas (adição, subtração, multiplicação e divisão), a tabuada, o cálculo mental ficam comprometidos, priorizando-se a memorização, mas não como uma habilidade facilitadora e fundamental para aprender, e sim como ferramenta para fazer o exercício, o problema proposto (p. 12-13).

Na boa intenção de simplificar ou facilitar a aprendizagem da Matemática pelo

aluno, o professor (e principalmente os livros didáticos) acaba por segmentá-la em pedaços,

para ser melhor “ingerida”.

Outro fator essencial que o professor compreenda é o princípio fundamental da

contagem, possibilitando ao aluno perceber que o símbolo numérico 3 é composto de uma

unidade inclusa em duas unidades, ou uma unidade, mais uma unidade, mais uma unidade,

formam três unidades. A este princípio, Piaget (KAMII, 1989, p. 20) denomina inclusão

hierárquica. Este princípio auxiliará no estabelecimento da conservação contínua de

quantidade (identificar de forma abstrata a quantidade estabelecida não importando sua

distribuição).

É válido também ressaltar, a importância do professor conhecer a história da

Matemática, dos números e das medidas a fim de estabelecer uma ponte de ligação com a

história da evolução humana uma vez que, tanto a Matemática (delimitação espacial, sistema

monetário etc), quanto os números (contagem e símbolos numéricos) e as medidas

(estabelecimento de padrões de medidas aceitos socialmente) foram criados na medida em

que o homem sentia necessidade de buscar soluções para resolver os problemas provenientes

em seu cotidiano.

Tal como a evolução histórica da Matemática foi construída a partir da resolução de

problemas que afetavam a humanidade, a Matemática escolar também deveria ser trabalhada

utilizando-se deste mesmo princípio. Afinal, nossa vida é repleta de pequenos e grandes

problemas a serem solucionados diariamente.

Além disso, o processo ensino-aprendizagem da Matemática deve contar não só com

o conhecimento que o educador tem sobre seus conteúdos, mas também conhecer técnicas e

35

materiais pedagógicos que auxiliem no desenvolvimento do raciocínio e assimilação dos

mesmos. Séguin (1986) e Montessori (1977) juntos elaboraram, a princípio para crianças com

retardo mental, uma gama de materiais com objetivos específicos a fim de auxiliarem no

processo ensino-aprendizagem. As tábuas de Séguin, as barras de Cuisinaire e o material

dourado podem ser utilizados com eficiência no ensino do sistema decimal e nas quatro

operações. Dienes (1986), por sua vez, criou os blocos lógicos que colaboram no

desenvolvimento de noções e conteúdos matemáticos, tais como: geometria, par/ímpar,

conjuntos, seriação, classificação, pertence/não pertence, números primos, matrizes etc.

Dante (2003) também traz grandes contribuições à didática da resolução de

problemas ao apontar objetivos, distinguir os vários tipos de problemas e encaminhar

propostas de resolução dos mesmos.

Verificamos, portanto, que a reflexão e o estudo sobre o processo ensino-

aprendizagem da Matemática requer uma análise crítica e pedagógica a fim de colaborar com

propostas de trabalho para melhor viabilizar tal processo, atentando para a seleção de

conteúdos significativos e contextualizados, práticas pedagógicas adequadas e formas de

avaliação que colaboram para a aprendizagem do aluno.

Dentre as inúmeras questões que permeiam o ensino da Matemática, e que muitos

educadores têm procurado respondê-las, estão as seguintes:

� Qual é a maior dificuldade apresentada pelos alunos das séries iniciais do

Ensino Fundamental, no que se refere à aprendizagem da Matemática?

� Que interferência ocasiona, na aprendizagem do aluno, a metodologia aplicada

pelo professor no ensino da Matemática?

� Até que ponto os sentimentos (entusiasmo, apatia, desânimo, insegurança) que

o professor tem em relação a Matemática interferem na aprendizagem do aluno?

� É necessário muito exercício para que o aluno assimile o conteúdo ou o uso

adequado de materiais didáticos pode auxiliar melhor a aprendizagem?

� Quais são os conteúdos em que os alunos apresentam maior dificuldade ou

facilidade de aprendizagem?

36

São muitos os questionamentos, porém esta pesquisa terá como principal foco de

análise a metodologia de ensino do professor das séries iniciais do ensino fundamental.

Cabe ainda ressaltar que a Matemática não deve ser vista isoladamente de outras

disciplinas. Ela está intrinsecamente ligada com a Língua Materna uma vez que exige a

interpretação de enunciados de problemas matemáticos e, na proposta da Educação

Matemática, incentiva o contato com textos matemáticos (histórico da Matemática, histórias

de Malba Tahan, livros paradidáticos referentes a conteúdos matemáticos etc.) e a produção

de textos a partir de unidades ensinadas pelos professores.

2.1 A MATEMÁTICA, A LÍNGUA MATERNA E AS DIFICULDADES DE

APRENDIZAGEM MATEMÁTICA (DAM):

É interessante notar que a Matemática faz parte dos currículos escolares desde os

primeiros anos de escolaridade, bem como a Língua Materna em todos os países do mundo,

independente do seu sistema político, credos e nível sócio-econômico.

No entanto, segundo Machado (1998, p.17), “[...] não há proposta de currículo para a

Matemática na escola básica que exclua o desenvolvimento do raciocínio lógico da lista de

suas metas precípuas”, ou seja, a justificativa, na maioria das vezes, da inclusão da

Matemática no currículo é devido à sua associação com o raciocínio, passando a ter um

caráter de fonte primária para o desenvolvimento da lógica ou mesmo para o tirocínio do

raciocínio.

A questão fundamental, no entanto, está na articulação consistente entre a Língua

Materna, tendo em vista o desenvolvimento do raciocínio e da interpretação dos textos por ela

apresentados em forma de “problemas”.

O estigma de disciplina árida e de difícil compreensão, não se adequa à Língua

Materna, mas sim, à Matemática; isso porque freqüentemente são utilizadas abordagens

inadequadas nos seus conteúdos.

É interessante verificar que este estereótipo, ou seja, estas posições, amplamente

difundidas entre leigos e especialistas, acabam por ficar “[...] solidamente fundadas no senso

comum e têm aparência tão natural que, às vezes, contestá-las soa como puro contra-senso”

37

(MACHADO, 1998, p.20). Alguns exemplos são as afirmações que costumeiramente

ouvimos em nosso dia-a-dia: “A Matemática é uma ciência exata e abstrata.”, “A Matemática

desenvolve o raciocínio.”, “A capacidade de aprender Matemática é inata” ...

Essas e outras proposições instalam-se como verdadeiros dogmas até mesmo entre

estudiosos no assunto. Esse fato contribui para a distorção da visão da Matemática, não a

entendendo como algo inerente em nossa vida e que necessita de raciocínio, como as outras

disciplinas escolares também necessitam. A diferença é que um único sinal pode modificar

todo um raciocínio ou uma resposta, mas isso também pode ocorrer com a leitura e

interpretação de textos se os sinais de pontuação não forem colocados devidamente.

Não basta um acordo no nível do discurso para que as dificuldades relacionadas ao

ensino da Matemática sejam superadas; há que se combatê-las na ação concreta. Uma das

medidas seria munir o professor de instrumentos para a modificação de sua prática

pedagógica para que a aprendizagem da Matemática possa ser encarada de modo tão natural

quanto a aprendizagem da Língua Materna.

Smole e Diniz (2001) trazem como proposta para a Educação Matemática a leitura e

escrita de textos nas aulas de Matemática para a busca de informações e para aprender

diferentes áreas do conhecimento, estabelecendo inferências e trocando idéias sobre o que foi

lido com seus pares.

É necessário que, no processo de leitura e interpretação de textos, o professor

proponha estratégias assegurando ao aluno a compreensão do texto e programe “um projeto

de intervenções didáticas destinadas exclusivamente a levar os alunos a lerem problemas de

matemática com autonomia e compreensão” (SMOLE e DINIZ, 2001, p. 72).

Devemos atentar para uma questão básica, porém mal interpretada por alguns

educadores: atribuir a culpa do aluno com dificuldades em resolver problemas de Matemática

ao professor de Língua Portuguesa, por este não ter trabalhado o suficiente a interpretação de

textos. Esta argumentação não possui fundamentação, pois a linguagem matemática apresenta

especificidades (termos, sinais, letras) diferentes de um texto literário. É muito diferente um

texto de uma situação-problema onde geralmente aparecem dados numéricos e uma situação a

ser resolvida, de um conto de fadas ou uma fábula, por exemplo.

38

Vale salientar que se pode considerar um texto matemático não somente uma

situação-problema como também uma receita culinária, uma receita médica, uma bula, uma

história de Malbatham (escritor matemático), um poema (métrica, versos, estrofes) etc.

Baseado nas propostas das autoras anteriormente citadas, podemos salientar alguns

cuidados necessários ao fazer a leitura e interpretação de um texto matemático. São eles:

� Propor dinâmicas de leitura (oral coletiva, oral individual, silenciosa e

alternada) e interpretação (Do que se trata o problema? Há alguma palavra desconhecida? O

que o texto pergunta? Como faremos para chegar à resolução?);

� Não mecanizar a resolução dos problemas indicando palavras-chaves. Por

exemplo: o professor que ensina que toda vez que aparecer a palavra “mais”, o problema será

de adição. Isto não ocorre quando o problema se trata da diferença entre idades (quantos anos

têm a mais?).

� É conveniente que o problema seja resolvido pelo aluno (individualmente ou

em grupo) e não pelo professor, podendo considerar os vários tipos de raciocínio que

aparecem, não padronizando a resolução em um sistema único de: sentença – cálculo –

resposta;

� Propor a leitura, interpretação e resolução de problemas tanto de forma

individual, como em duplas ou trios;

� O importante é que a criança saiba a idéia central de cada operação e não

palavras-chaves que mecanizam o raciocínio ou conduzem ao erro.

� É interessante que o aluno compreenda que, mesmo numa operação específica,

pode-se utilizar as demais operações. Vejamos a resolução da seguinte divisão:

428 12 - 36 35 68 - 60 8

Para a prova real, multiplica-se o quociente pelo divisor e soma-se o resto

39

Neste caso, ao operarmos com a divisão, estamos também utilizando as demais

operações. Muitas são as estratégias para se ter uma Educação Matemática de qualidade,

motivadora e facilitadora da aprendizagem. Basta o professor interessar-se por esta proposta e

pô-la em prática.

Para a Educação Matemática, numa prática interdisciplinar com a Língua Materna,

Smole e Diniz (2001) propõem ainda algumas sugestões:

� Criação de um dicionário matemático pelo aluno;

� Proposição de problemas montados em tiras aleatórias para ser organizado como

um quebra-cabeça;

� Proposição de problemas faltando dados numéricos para os alunos completarem

adequadamente;

� Elaboração de uma ou mais perguntas relacionadas aos dados de um problema,

ou escolher a pergunta adequada dentre várias apresentadas pelo professor;

� Leitura e interpretação de diferentes tipos de textos relacionados a: notícias de

jornais, gráficos, tabelas, livros paradidáticos, poemas etc.

Podemos, portanto, inferir que as autoras aqui citadas, e outros também defensores

de uma Educação Matemática significativa e contextualizada, são favoráveis a uma prática

interdisciplinar, no momento em que apoiam a idéia de um trabalho envolvendo outras áreas

do conhecimento (Ciências, Geografia etc.) e estimulam a produção de texto nas aulas de

Matemática. Estas produções podem partir da solicitação do professor para que o aluno

elabore, em seu caderno, um texto sobre o que entendeu do assunto dado durante a aula, ou

que elabore situações-problemas a fim de montar uma “Problemacoteca”, ou mesmo que

escreva regras para um determinado jogo.

Portanto, a teoria cognitiva da aprendizagem é conhecida pelos pesquisadores e

educadores como uma teoria abrangente, capaz de explicar diferentes tipos de aprendizagem,

desde a mais simples a mais complexa. Os psicólogos cognitivistas direcionam seu trabalho

teórico e experimental para o estudo do pensamento lógico, da aprendizagem de conceitos e

princípios, da solução de problemas. Esta abordagem situa na Matemática um vasto e

40

complexo campo de ação pelas peculiaridades que oferece para estudo, tendo em vista estas

características catalogadas por Riviere (apud FARIAS,1999, p.141):

Trata com materiais formais que se prestam mais que outros a destacar a organização dos processos mentais; facilita a resolução de problemas como soluções definidas e, geralmente exatas; possui uma estrutura hierárquica mais clara que a de outras áreas do conhecimento; os erros na Matemática são mais transparentes e fáceis de detectar - isto é importante porque os erros são como “janelas” para se conhecer o funcionamento mental; para alguns psicólogos do desenvolvimento como Piaget (1977) a Matemática define uma espécie de “axiomática do pensamento”, e é o produto de uma “abstração reflexionante” (Piaget, 1977) realizada a partir das próprias operações intelectuais (e não dos fatos) e, por este motivo, as atividades matemáticas seriam especialmente adequadas para o estudo das estruturas de operações que definem a inteligência.

Considerando como prioridade o conhecimento dos processos mentais utilizados nas

atividades lógico-matemáticas, bem como as estruturas intelectuais que o educando deve

possuir para realizá-las, o enfoque cognitivo estabelece pressupostos sobre a natureza da

mente assim constituída por:

a) Atenção seletiva e focalizada.

b) Conhecimentos prévios.

c) Distribuição de recursos cognitivos.

Os psicólogos cognitivistas evitam rotular a criança com dificuldade em aprender

Matemática, como portadora de um problema cerebral, mas tratam de compreender e explicar

os mecanismos e estratégias que utiliza nas situações em que efetua operações, resolve

problemas e assimila conceitos matemáticos. Realizam uma análise minuciosa dos vários

mecanismos que interferem na resolução das tarefas matemáticas, conferindo grande

importância aos fatores emocionais que freqüentemente são detectados como elementos que

interferem na motivação para a aprendizagem da Matemática, sobretudo em relação ao medo

de errar. Considera-se que os educandos com DAM (Dificuldades de Aprendizagem

Matemática), ao participarem destas experiências pedagógicas, superam com mais facilidade

os seus medos, a vergonha de dar respostas e o desencorajamento de fazerem tentativas.

Diante destes pressupostos convém lembrar que as aprendizagens matemáticas formais

ou informais ocorrem, na maioria das vezes, em situações de relação interativa que propõe

41

soluções, inventa seus próprios caminhos para a resolução de problemas, ao interagir com o

objeto do conhecimento, comunica e expressa seus pensamentos e suas formas de aprender,

num espaço de relação com o (a) professor(a) e colegas. Para que estes processos mentais se

evidenciem há que se cuidar das relações entre aprendizes e professores (as), evitando que

o(a) educando(a) seja visto como um sistema processador de informações, mas como um ser

que potencializa em sua identidade as instâncias sócio-afetivas e psicomotoras.

O modelo cognitivo proposto por Riviere (Op. Cit., p.141), que estuda as D.A.M.,

aponta vantagens por estender sua atuação a todos os alunos superando assim a visão focalista

do conceito de discalculia3; estabelecendo a relação entre os erros e os processos naturais de

aprendizagem; concebendo os alunos como sistemas ativos e analisando as sutilezas da

lógica-matemática utilizadas. Pesquisadores cognitivistas têm levantado questões relativas à

Matemática na intenção de conhecer a explicação das atitudes negativas e baixos

rendimentos:

A Matemática é realmente difícil ou será que não é bem ensinada? Que origem e significado têm as enormes diferenças na competência matemática dos alunos? Há alunos que sofrem de algum tipo de alteração ou distúrbio real que os impede ou dificulta a aprendizagem das operações matemáticas mais elementares? Por que a Matemática é tão difícil para tantos alunos que não chegam a esse grau de alteração? O que fazer nesta situação? Como o professor pode enfrentá-la? (Op.Cit., p. 143).

As DAM são dificuldades significativas no desenvolvimento das habilidades

relacionadas com a matemática que, por sua vez, não são ocasionadas por escolarização

escassa ou inadequada, deficiência mental, nem por déficits visuais ou auditivos. Segundo

Garcia (1998, p. 211), elas estão relacionadas às habilidades:

� Línguísticas: a compreensão e o emprego da nomenclatura matemática, a

compreensão ou denominação de operações matemáticas e a codificação de problemas

representados com símbolos matemáticos;

� Perceptivas: o reconhecimento ou a leitura de símbolos numéricos ou sinais

aritméticos, e o agrupamento de objetos em conjuntos;

3 Refere-se à quantidade de erros variados na compreensão dos números, habilidades de contagem, habilidades computacionais e solução de problemas verbais (GARCIA, 1998, p.213)

42

� De Atenção: como copiar figuras corretamente nas operações matemáticas

básicas, recordar o número que “transportamos” e devemos acrescentar a cada passo, e

observar os sinais das operações;

� Matemáticas: como o seguimento das seqüências de cada passo nas operações

matemáticas, contar objetos e aprender as tabuadas de multiplicar.

Estudos dos processos cognitivos nesta área têm sido de grande porte nestas últimas

décadas, mas as investigações sobre as DAM não têm avançado paralelamente; os estudos são

escassos, não apresentando resultados que superem os conceitos tradicionais de discalculia já

bastante criticados por se fundamentar em conceitos que necessitam ser revistos, tanto na sua

fundamentação científica como na sua utilidade prática.

Vale frisar que esta pesquisa não tem a pretensão de identificar qual é o tipo específico

de dificuldade que afeta a aprendizagem do aluno, mas analisar os fatores que podem

contribuir para o surgimento desta, enfatizando a importância da atuação do professor como

mediador do processo entre ensino e aprendizagem da Matemática e, conseqüentemente,

colaborador ou não para o aparecimento das dificuldades.

2.2 FATORES QUE PODEM INTERFERIR NA APRENDIZAGEM DA

MATEMÁTICA

No convívio diário com as pessoas, alunos e pais de alunos, é comum encontrarmos

alguém que não goste de Matemática, tenha dificuldade em assimilar seus conteúdos ou

simplesmente tema a não compreensão desta ciência.

Vimos anteriormente exemplos que tentam justificar os temores e as dificuldades em

aprender Matemática. Porém, não podemos de forma alguma atribuir a estas dificuldades um

único fator. São vários os motivos pelos quais o aluno pode adquirir aversão ou bloqueios na

relação com o ensino da Matemática.

Podemos analisar alguns desses motivos:

43

Devido à Concepção de Ensino

Ao refletirmos sobre o ensino da Matemática nas séries iniciais do Ensino

Fundamental, não podemos deixar de contextualizá-lo numa visão macro no que se refere ao

momento histórico-cultural-social em que vivemos e o sistema de ensino (Secretarias de

Ensino, proposta curricular, tempos de aula, filosofia da escola etc.) no qual este ensino está

inserido, nem tampouco numa visão micro no que tange à sala de aula com seus atores

(professores e alunos). Além disso, nesta reflexão deve-se levar em consideração a formação

dos professores na atual conjuntura político-social.

Para tanto, é necessário fazermos uma breve retrospectiva a respeito do modelo

escolar implantado há anos atrás e que continua enraizado em nossa prática educativa.

A escola da primeira metade do século XIX tinha como objetivo formar cidadãos a

fim de prepará-los para a inserção na divisão social do trabalho através da manutenção de

valores intrínsecos e estáveis determinados pela instituição de ensino (BARROSO apud

BARBOSA, 2004). A partir da Segunda Guerra Mundial, no século XX, a escola deixou de

ser elitista para ser uma escola de massas com a promessa de desenvolvimento, mobilidade

social e igualdade. Tais promessas justificam a passagem da euforia ao desencanto e

incerteza:

A sociologia da educação dos anos 70 veio pôr em evidência o efeito reprodutor das desigualdades sociais, desempenhado pelo sistema escolar. Paradoxalmente, a democratização da escola comprometeu-se com a produção de desigualdades sociais e ela deixou de poder ser vista como uma instituição justa num mundo injusto (Dubet, 1999), aumentando os níveis de frustração e desencanto que marca a sua entrada numa era de incertezas. (CANÁRIO apud BARBOSA, 2004, p. 50).

Este desencanto vem refletir na própria profissão do professor quanto à missão

educativa da escola, quanto à possibilidade de realmente educar as crianças e jovens e quanto

ao seu papel de educador na área afetiva e relacional. Hoje vemos uma confusão funcional e

organizacional a respeito da função do professor, ou seja, ao mesmo tempo que são

educadores, atuam por vezes como assistentes sociais, psicólogos, técnicos sociais e de saúde.

No contexto escolar do século XIX, cabia ao professor a simples função de repassar

os conhecimentos por ele adquiridos aos seus alunos. Era uma época em que a atuação da

mulher dificilmente se dava fora do âmbito familiar. Cabia à família a responsabilidade de

44

educar, incutir princípios e valores; à escola cabia a instrução. Hoje com a mulher inserida no

mercado de trabalho, a influência da tecnologia (televisão, vídeo game, Internet, Lan Houses)

e a falta de tempo para cultivar os laços familiares, houve uma sutil transferência de

responsabilidades (que antes cabia somente ao pai e à mãe) de todo este encargo para a escola.

Há, portanto, uma sobrecarga de tarefas para o professor assumir.

É necessário fazermos uma reflexão sobre a relação entre as mudanças a serem

introduzidas na formação de professores e as mudanças que ocorrem no espaço educativo a

fim de alterar o caráter tido como “imutável” do modelo escolar, em prol de uma dimensão

comunitária da escola pública (BARROSO, apud TEODORO, 2001).

Desde a criação da escola pública (século XIX), o estabelecimento de uma

organização pedagógica específica e uniforme, voltada para a prática de uma pedagogia

coletiva, onde a estrutura principal é o “ensino em classes” com o intuito de atender as

necessidades da época (instrução e obediência), se encontra de certo modo fixada através de

um conjunto de “invariantes” as quais são denominadas por Tyac e Tobin (apud BARBOSA,

2004, p. 53) por “gramática da escola”, ou seja, esta gramática constitui

Um conjunto persistente (e quase imutável) de características organizacionais e estruturais que são parte integrante da nossa imagem do ensino: alunos agrupados em classes graduadas, com uma composição homogênea e um número de efetivos pouco variável; professores atuando sempre a título individual, com perfil de generalistas (ensino primário) ou de especialistas (ensino secundário); espaços estruturados de ação escolar, induzindo uma pedagogia centrada essencialmente em sala de aula; horários escolares rigidamente estabelecidos que põem em prática um controle social do tempo escolar; saberes organizados em disciplinas escolares, que são referências estruturantes do ensino e do trabalho pedagógico.

Tais elementos passaram então a definir o “modelo escolar de educação” que está na

base da criação e desenvolvimento da escola pública e da escola particular.

Estabeleceu-se, portanto, o princípio da homogeneidade das “normas, dos espaços,

dos tempos, dos alunos, dos professores, dos saberes e dos processos de inculcação” (idem, p.

54).

Esta forma de conceber o saber é responsável, em grande parte, pelo processo de

exclusão e indisciplina dos alunos e, também, pela descaracterização do trabalho do professor.

45

Segundo Barroso (idem, p.54), a escola pública desenvolveu-se tomando como

referência dois modelos de organização: a burocrática e a corporação docente. A burocracia

tem como objetivo garantir resultados de forma rotineira e previsível “como forma de garantir

a eqüidade do serviço público e a neutralidade dos atos da administração, em função de

fatores pessoais e sociais”. A corporação docente afirma-se por meio de um reforço do seu

profissionalismo.

Estes dois modelos determinaram, de certo modo, uma regulação burocrático-

profissional sobre os modos de organização e funcionamento da escola, com a não-

participação de alunos, suas famílias e da comunidade local. Este afastamento acontece

principalmente dos alunos e das famílias oriundas de classes populares que não correspondem

aos valores sociais dominantes (BARBOSA, 2004).

Somente através da revitalização do sentido comunitário na escola pública pode-se

criar condições de legitimação da ação coletiva, principalmente para aqueles alunos que não

reconhecem a utilidade e a necessidade de freqüentarem a escola.

Podemos afirmar que um dos problemas básicos da educação atual é o modelo de

conhecimento, ensino e aprendizagem. Basicamente, temos dois modelos de educação que se

ramificam em outros: o modelo tradicional e o modelo escolanovista.

No modelo tradicional de educação o conhecimento é tratado como conteúdo,

informações, coisas e fatos a serem ensinados aos alunos, ou seja, o ensino é a transmissão de

informações. Cabe ao aluno receber, memorizar e reproduzir tais informações em uma

avaliação escrita.

Pode-se constatar, atualmente, que a maioria das escolas ainda adota este modelo:

“(1) o papel dominante do professor que dirige a aprendizagem do aluno; (2) a ênfase em

respostas certas – apenas uma resposta certa para cada problema; (3) a noção de que o

conhecimento consiste do acúmulo de fatos e informações isoladas; (4) a utilização de

problemas que não incentivam o aluno a pensar, a raciocinar” (CARRAHER, 1993).

Alguns livros didáticos cumprem o seu papel de propor informações a serem

transmitidas e exercícios de fixação. Tanto os textos quanto os exercícios tradicionais

sobrecarregam a memória do aluno.

46

Encontramos nos livros didáticos uma série de problemas tradicionais (convencionais

pela sua estrutura e tratamento) que, na verdade, são simples exercícios de aplicação ou

fixação de técnicas ou regras, sem contexto significativo para o aluno e desvinculado com o

seu cotidiano. Tais problemas aparecem geralmente após a apresentação de um conteúdo, ou

seja, no final de uma unidade de um livro didático. Numa linguagem mais clara podemos

exemplificar com a apresentação de conteúdos como “adição” que, após a sua

conceitualização, exemplificação e “continhas”, segue-se uma série de “probleminhas também

de adição” onde a criança não é estimulada a desenvolver seu raciocínio, pois a mesma é

levada ao automatismo de apenas aplicar a famosa estrutura para resolução de problemas

ensinada pelo(a) professora(a): “sentença, cálculo e resposta” utilizando a operação proposta

naquela unidade. O mesmo ocorre com as demais operações de subtração, multiplicação e

divisão.

Com relação ao ensino da Matemática, Carraher (1993, p.14) salienta:

Muitos problemas dados aos alunos não são verdadeiros problemas que exijam reflexão, mas sim exercícios tipo papagaio (“agora você resolve este problema para ver se você aprendeu como foi que eu resolvi antes.”). Um exemplo típico são os problemas de matemática, em que o aluno tem que utilizar precisamente as fórmulas que acabou de estudar. Os problemas são tratados mecanicamente, sem que, muitas vezes, o aluno compreenda o que está fazendo.

Neste modelo de ensino, a responsabilidade do educador seria “falar sobre” e, a

responsabilidade do aluno seria memorizar o que lhe é ensinado.

O trabalho centrado exclusivamente na proposição e na resolução de problemas convencionais gera nos alunos atitudes inadequadas frente ao que significa aprender e pensar em matemática. É muito comum observarmos que, se os problemas estão sempre associados a uma operação aritmética, os alunos perguntam insistentemente “qual é a conta?” ou, então, buscam no texto uma palavra que indique a operação a ser efetuada. Se no texto aparecem palavras como “ao todo”, “o total” ou “juntos”, os alunos tendem a adicionar os números que aparecem no texto, assim como “restou”, “sobrou” ou “perdi” estão associadas à subtração. Desse modo, temos observado que, em um texto no qual tais palavras aparecem, o fracasso é certo. Esse fracasso gera o medo, a insegurança e, com o passar do tempo, a crença de que o aluno é incapaz de aprender matemática. (SMOLE e DINIZ, 2001, p. 100)

Outra faceta deste modelo leva à idéia de que a responsabilidade do fracasso escolar

recai sobre o aluno, com o amparo de mil-e-uma desculpas que justifiquem este fracasso: é

47

filho de pais separados, é filho adotivo, tem problemas domésticos, é danado, é lento, tem

dificuldades de atenção etc. Alguns dos fatores mencionados (e outros não mencionados)

exercem influência no processo de aprendizagem do aluno, porém, se o professor souber

buscar maneiras de lidar com este “aluno-problema” de forma eficaz, dominar os conteúdos a

serem trabalhados em suas aulas e proporcionar uma metodologia de ensino atraente, com

certeza saberá desfrutar de momentos significativos de aprendizagem junto a este aluno.

Infelizmente, presenciamos, tanto em escolas públicas como particulares, o modelo

tradicional imperando nas aulas de Matemática, com professores ensinando as regras, alunos

estáticos “engolindo” tais regras e tentando aplicá-las em modelos pré-determinados de

exercícios e problemas sem vínculos com a sua vivência e, o que é pior, a Matemática sendo

utilizada como meio utilizado pelo professor para amedrontar o aluno com ameaças de que irá

“arrebentar” na avaliação. Não é de se estranhar que a maioria dos alunos não goste de

Matemática. Neste modelo escolar de ensino muitos são os fatores que levam o aluno a temê-

la. Além desses fatores um outro fator tão importante quanto os apresentados até aqui é a

postura do professor: sua didática, seu tom de voz, sua relação afetiva com o aluno, as

sugestões de atividades e como as sugere, sua conduta em sala, seu modo de avaliar, sua

maneira de lidar com os erros dos alunos, e o modo como se preocupa com a aprendizagem

do aluno.

O professor que teve más experiências com a Matemática durante sua vida

acadêmica ou simplesmente não aprecia tal ciência, dificilmente terá êxito no processo de

aprendizagem de seus alunos, ou poderá exercer influência no modo como estes irão conceber

a Matemática, contribuindo até para que a repudiem. Assim, forma-se uma espécie de círculo

vicioso no processo de ensinar e aprender a Matemática. Então pergunta-se: “Como o

professor de cursos de formação docente poderá contribuir para quebrar este “círculo

vicioso”?, “Como poderá auxiliar seu professor em formação em adquirir o gosto pela

Matemática, sanar suas dificuldades, dizimar seus traumas de infância, para que não reflita em

seus alunos posteriormente?

Acredito que o caminho seria propor vivências agradáveis com a Matemática através

de um ensino dinâmico, significativo e consistente. Com certeza esta proposta não provém do

Modelo Tradicional de Ensino.

48

Portanto, de acordo com as tendências atuais para o ensino da Matemática, creio que

se destaca melhor a proposta de se trabalhar segundo o Modelo Sócio-Interacionista de Ensino

que nasce da Tendência Cognitiva a partir do Movimento da Escola Nova, com teóricos como

Piaget e Vygotsky. Embora a teoria de cada um deles tenha um enfoque diferenciado, ambos

convergem para o ponto de que o indivíduo é um ser cognitivo, social, histórico e cultural,

que constrói seu conhecimento através da interação com o meio ambiente e o meio social.

A Escola Nova representa o mais vigoroso movimento de renovação da educação depois da criação da escola pública burguesa. A idéia de fundamentar o ato pedagógico na ação, na atividade da criança, já vinha se formando desde a “Escola Alegre” de Vitorino de Feltre (1378-1446), seguindo pela pedagogia romântica e naturalista de Rousseau. Mas foi no início do século XX que tomou forma concreta e teve conseqüências importantes sobre os sistemas educadionais e a mentalidade dos professores. [...] A teoria da Escola Nova propunha que a educação fosse instigadora da mudança social e, ao mesmo tempo, se transformasse porque a sociedade estava em mudanças (GADOTTI, 2004, p.142).

Para situar o trabalho de Piaget e as várias propostas pedagógicas que surgiram a

partir de suas contribuições, cabem mencionar alguns pressupostos básicos de sua teoria, em

especial o interacionismo, a idéia de construtivismo seqüencial e os fatores que, segundo ele,

interferem no desenvolvimento cognitivo.

Para Piaget, o desenvolvimento resulta de combinações entre aquilo que o organismo

traz e as circunstâncias oferecidas pelo meio: o eixo central, portanto, é a interação

(interacionismo) organismo/meio. Esse interacionismo pretende, assim, superar, de um lado,

as concepções inatistas e, de outro, as teorias comportamentalistas. Essa interação se dá

através de dois processos simultâneos: a assimilação e a acomodação, possibilitando a

adaptação ao meio, funções exercidas pelo organismo ao longo de toda a vida que configuram

os estágios de desenvolvimento.

A inteligência é assimilação na medida em que incorpora nos seus quadros todo e qualquer dado da experiência.[...]A inteligência é uma adaptação. Para aprendermos as suas relações com a vida, em geral, é preciso, pois, definir que relações existem entre o organismo e o meio ambiente.[...] O organismo adapta-se construindo materialmente novas formas para inseri-las nas do universo, ao passo que a inteligência prolonga tal criação construindo, mentalmente, as estruturas suscetíveis de aplicarem-se às do meio (PIAGET, 1975, p.15-16).

49

Os estágios evoluem, segundo a teoria piagetiana, como uma espiral, de maneira que

cada estágio engloba o anterior e o amplia. Piaget não define idades rígidas para os estágios,

mas considera que se apresentam em uma seqüência constante (construtivismo seqüencial).

Considera, ainda, que tal processo de desenvolvimento é influenciado pelos seguintes fatores:

maturação (crescimento biológico); exercitação (formação de hábitos); aprendizagem social

(aquisição de valores, linguagem, costumes e padrões culturais e sociais) e equilibração

(processo de auto-regulação interna do organismo, que se constitui na busca sucessiva de

reequilíbrio após cada desequilíbrio sofrido).

Com base em tais pressupostos, a educação precisa possibilitar ao sujeito o

desenvolvimento amplo e dinâmico. A escola deve, assim, levar em consideração os

esquemas de assimilação da criança (partir deles), favorecendo a realização de atividades

desafiadoras que provoquem desequilíbrio (conflitos cognitivos) e reequilibrações sucessivas,

promovendo a descoberta e a construção do conhecimento. Nessa construção, as concepções

infantis (ou hipóteses) combinam-se às informações provenientes do meio, na medida em que

o conhecimento não é concebido apenas como espontaneamente descoberto pela criança, nem

como transmitido mecanicamente pelo meio exterior ou pelo adulto, mas como resultado

dessa interação onde o sujeito é sempre ativo.

Assim, os principais objetivos da educação consistem na formação de homens

“criativos, inventivos e descobridores”, na formação de pessoas críticas e ativas e,

fundamentalmente, na construção da autonomia (FREIRE, 1996). A interdisciplinaridade é

considerada central, ao contrário da fragmentação dos conteúdos existentes nos currículos da

pedagogia tradicional.

Em se tratando da Educação (processo ensino-aprendizagem) Matemática, é de vital

importância que levemos em conta todos esses pressupostos. Primeiro porque a criança que

freqüenta o Ensino Fundamental, na faixa etária de 7 a 11 anos, está no período de

desenvolvimento cognitivo, denominado por Piaget, de “Operacional Concreto”. Este período,

posterior ao “Pré-Operacional”, tem como características principais (PIAGET, 1975):

� A fase da reversibilidade – quando consegue solucionar os problemas de

conservação de quantidade, ou seja, embora aparentemente uma determinada quantidade

ocupe um espaço maior em relação a outra, ambas equivalem a mesma quantia. Ex: uma única

moeda de R$1,00 equivale a 10 moedas de R$0,10;

50

� As operações lógicas desenvolvidas e aplicadas a problemas concretos

(situações conhecidas em sua vivência);

� A falta de capacidade em solucionar problemas verbais complexos, problemas

hipotéticos e problemas que lidam com o futuro.

Levando-se em consideração estas três características, podemos entender que a

criança, neste período, embora tenha conseguido atingir o pensamento reversível e saiba

utilizar-se de operações lógicas, necessita ainda de experiências concretas para resolver

situações hipotéticas.

Portanto, o pensamento ainda está estreitamente ligado ao concreto e vinculado à percepção (porém não está mais dominado pela percepção). Por exemplo, enquanto a criança na fase operacional concreta consegue dar respostas logicamente “corretas” aos problemas de conservação, a qualidade de seu raciocínio está vinculada aos aspectos concretos da situação específica. Não há indícios de que a criança pense de acordo com regras formais mais abstratas independentes dos objetos concretos (WADSWORTH, 1984, p. 22).

Neste sentido, podemos inferir que a utilização de recursos didáticos, brinquedos,

jogos e materiais concretos (embalagens descartáveis, elementos naturais etc.), é muito

oportuna para auxiliar a criança na compreensão e resolução de situações-problema.

Ainda sobre a fase de desenvolvimento em que a maioria dos alunos das séries

iniciais de Ensino Fundamental se situa, Lima (2001, p. 13) argumenta:

[...] na (fase) operacional concreta (7 a 11 anos), os conhecimentos a respeito da realidade externa adquiridos na fase anterior (pré-operacional) são gradualmente transformados em verdadeiros esquemas conceituais, isto é, na idade escolar a criança já forma esquemas conceituais e já trabalha com eles de acordo com os princípios da lógica, mas ainda depende da existência dos objetos do mundo. Forma, portanto, esquemas mentais daqueles objetos que têm existência concreta [...]

Em relação à aprendizagem, o processo de assimilação e acomodação, expresso na

teoria piagetiana, alicerça a idéia de que a criança, quando chega à escola, já traz consigo uma

bagagem de conhecimentos matemáticos assimilados durante sua interação com o ambiente

(natureza, pessoas, livros, situações vividas). Estes conhecimentos, por sua vez, interagem

com o ensino sistematizado (institucionalizado). No momento em que ela associa seu

conhecimento anterior ao conhecimento adquirido, acontece a acomodação destes

51

conhecimentos aos esquemas mentais, proporcionando à criança a possibilidade de aplicá-los

(utilizá-los) em situações diversas (adaptação). Neste sentido, os recursos concretos poderão

auxiliá-la nesta adaptação para se chegar às imagens mentais a fim de contribuir para

solucionar situações que ocorrem em seu cotidiano, bem como na vida escolar. Como ressalta

Piaget (apud WADSWORTH, 1984, p. 32), “para que ocorra o desenvolvimento a criança

precisa agir sobre o ambiente. Essas ações são as matérias-primas para a assimilação e

acomodação e geram o desenvolvimento de estruturas mentais ou esquemas.”

Neste processo de construção do conhecimento, o professor tem fundamental

importância a partir do momento em que age como mediador da aprendizagem, interferindo

adequadamente, no momento oportuno, com questionamentos e inferências, no intuito de

provocar o desequilíbrio de seu pensamento. Na teoria piagetiana, o processo de

desenvolvimento é estabelecido pela relação de equilíbrio e desequilíbrio (PIAGET, 1993) na

elaboração do pensamento, ou seja, o desequilíbrio ocorre quando as crianças precisam chegar

à consciência de que, de certo modo, as suas concepções não são mais adequadas, tentando

restabelecer o equilíbrio positivo e saindo da contradição lógica em que está

momentaneamente.

Segundo Lima (2001, p. 12), Piaget

Conceituou desenvolvimento como sendo um “processo de equilibração progressiva que tende para uma forma final, na qual seja a conquista das operações formais”. O equilíbrio refere-se à forma pela qual o indivíduo lida com a realidade na tentativa de compreendê-la, como organiza seus conhecimentos em sistemas integrados de ações ou crenças, com a finalidade de adaptação.

O professor (ou qualquer outra pessoa), porém, não tem como assegurar a

ocorrência do desequilíbrio na criança em relação a uma determinada aprendizagem.[...]

Simplificando, o professor não pode controlar diretamente o curso do desenvolvimento

cognitivo (WADSWORTH, 1984, p. 101), pois o mecanismo de controle reside na própria

criança.

Muito se teria para escrever sobre a teoria de Piaget. Visamos, todavia, abordar

aspectos relevantes de sua teoria que possam embasar o tema desta pesquisa. Dentre eles,

destacamos o conhecimento lógico-matemático.

52

A teoria piagetiana ressalta a existência de três tipos de conhecimento que se

entrelaçam entre si, embora cada um deles possua características próprias.

O conhecimento físico é a descoberta das características (qualidades) dos objetos

através da ação da criança sobre os mesmos e da intervenção de pessoas que interagem com

ela. Uma criança ao tocar em uma almofada saberá que a mesma é macia, é azul e serve para

apoiar as costas. As características desta almofada são ditas por alguém próximo no momento

do toque. Este é um tipo de conhecimento social-arbitrário, ou seja, a linguagem, os valores,

as regras, a moralidade e os sistemas de símbolos são exemplos deste conhecimento. Através

dele ela aprenderá o nome e a qualidade de todos os objetos a sua volta, em sua língua

materna ou na língua do país em que vive. No momento que esta criança age sobre os objetos,

estabelecendo relações entre eles, estará construindo o conhecimento lógico-matemático, ou

seja, se ela estabelecer a relação entre uma almofada macia e uma pedra, poderá comparar os

dois objetos deduzindo que um é mais leve que o outro, um é macio e o outro é duro. Se

comparar o número de almofadas existentes em um sofá de três lugares com um de dois

lugares, poderá perceber que há mais almofadas no sofá maior e menos no menor (PIAGET,

1975).

Piaget (1978) afirma que o conhecimento lógico-matemático é sempre o resultado de

uma coordenação das ações, ou seja, várias ações simultâneas ao invés de uma única ação.

Este conhecimento é, portanto, resultado das ações da criança sobre os objetos, colocando-os

em relação entre si.

Segundo Piaget (1978), o conhecimento lógico-matemático é um conhecimento

abstrato, inventado a partir das ações sobre os objetos. Os materiais didáticos e os objetos

auxiliam na construção do pensamento matemático e na evolução da fase pré-operacional para

a fase operacional concreta e, por fim, desta para as operações formais.

Portanto, podemos inferir que até o período das operações concretas, o material

didático funciona como um auxílio (uma ponte) para se alcançar as operações formais cujo

pensamento torna-se reflexivo e abstrato.

No processo de construção do conhecimento matemático, a ação do professor é,

pois, extremamente importante a fim de selecionar o material mais apropriado, as questões

mais significativas e na proposição de problemas numa seqüência que leve a uma abstração

gradativa.

53

É necessário salientar que os materiais necessariamente não precisam de nenhuma

sofisticação. Cabe ao professor a ação criativa de se obter de “materiais simples” a construção

de “idéias sofisticadas”. Nenhum material por si só é capaz de ensinar matemática.

Mas será que a escola propicia este momento de manipulação de objetos? Se

propiciar, será que este momento é mediado pelo professor? De que forma?

O que verificamos freqüentemente, nas escolas de Ensino Fundamental, são crianças

sentadas em suas carteiras, uma atrás da outra, o professor passando contas e problemas no

quadro para serem copiados e resolvidos pelos alunos enquanto ele, o professor, fica

corrigindo trabalhos ou preparando planos de aula. Às vezes, podemos verificar a boa vontade

de um ou outro professor oferecendo materiais didáticos para as crianças manusearem

livremente, porém sem nenhuma orientação adequada para seu aprendizado.

Wadsworth (1984, p.194-195) assim comenta:

É aqui (no ensino da matemática) que os professores encontram maior dificuldade e onde, apesar de todas as qualidades de seu ensino, os métodos não-ativos que estão habitualmente compelidos a usar resultam em dificuldades que são de um modo geral bem conhecidas. [...] Às vezes, a compreensão de matemática elementar chega a ser considerada como um sinal de aptidão especial. A presença ou ausência desse “dom” matemático é então usada para explicar o sucesso e o fracasso , embora se possa perguntar se não são talvez atribuíveis ao método clássico do próprio.

O modelo tradicional de ensino impõe a estrutura formal (segmentada, abstrata) da

matemática às crianças, ao invés de permitir que elas construam o significado da matemática a

partir da atividade. O ensino na Educação Infantil e nas primeiras séries do Ensino

Fundamental raramente permite a construção ativa dos conceitos matemáticos (conhecimento

lógico-matemático) a partir de ações sobre os objetos. A instrução focaliza a manipulação dos

números abstratos e, freqüentemente, é vazia de significado para a criança.

Somos cientes que são inúmeras as razões pelas quais as crianças sentem

dificuldades na aprendizagem da Matemática; dentre elas podemos destacar seu contexto

social, familiar, distúrbios orgânicos (síndromes, déficit de atenção, distúrbios neurais), a falta

de alimentação adequada, entre outros. Mas nesta pesquisa, vale enfatizar, o enfoque é dado

para o sistema de ensino em si, ou seja, a metodologia utilizada pelo professor, sua relação

54

com o aluno, sua postura em sala, sua maneira de encarar a Matemática e sua maneira de

avaliar a aprendizagem do aluno.

Além das contribuições de Piaget para a relevância do ensino da Matemática, temos

também as preciosas contribuições de Lev Vygotsky e seus colaboradores, Luria e Leontiev.

Na mesma linha da Tendência Cognitiva, enquanto Piaget busca compreender as

estruturas do pensamento através do mecanismo interno que a produz, Vygotsky procura

compreender de que maneira se dá a interferência do mundo externo no mundo interno, ou

como a natureza sócio-cultural se torna natureza psicológica. Vygotsky chama a atenção para

o fato de que todas as funções no desenvolvimento da criança aparecem, primeiro, em nível

social e depois em nível individual. Essa passagem de um nível interpsicológico para um nível

intrapsicológico acontece através da internalização, que implica uma reconstrução interna pela

criança de uma atividade externa, como resultado de processos interativos ao longo do

desenvolvimento. Nesse sentido, o conhecimento é construído a partir da internalização de

signos produzidos culturalmente (a linguagem, a escrita, o sistema de números), através da

interação com o outro.

É fundamental reconhecermos a contribuição de Vygotsky para a educação, uma vez

que este possuía uma formação intelectual deveras ampla, sobre as mais variadas áreas do

saber: advocacia, medicina, literatura, filosofia e psicologia. Teve forte e decisiva influência

das idéias filosóficas de Marx e Engels, incluindo as categorias da dialética. Sustentava a

necessidade de se procurar analisar o comportamento do homem como um todo e estudar,

influenciado pelo materialismo dialético, as formas mais complexas de consciência social,

cultural e historicamente determinadas. Muitos são os conceitos teóricos que desenvolveu,

porém destacaremos alguns relacionando-os com o processo ensino-aprendizagem da

Matemática. São eles: mediação, internalização, ZDP (Zona de Desenvolvimento Proximal),

formação de conceitos, significado e sentido (VYGOTSKY, 1993).

Podemos afirmar que um dos conceitos mais conhecido da teoria de Vygotsky é o de

Zona de Desenvolvimento Proximal. Vygotsky afirma que em cada pessoa existem dois níveis

de desenvolvimento: um nível de desenvolvimento efetivo, indicado por aquilo que o sujeito

pode realizar sozinho, e um nível de desenvolvimento potencial, indicado por aquilo que ele

pode realizar com a ajuda de outras pessoas mais experientes.

55

A Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP) é a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma determinar através da solução independente de problemas, e o nível potencial, determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes (VYGOTSKY, 1998, p. 112).

Considerando, então, que a ZDP não é uma propriedade estável e estática, a função

do professor é auxiliar o aluno criando diferentes e freqüentes ZDP, permitindo que o

pensamento do aluno vá progressivamente se modificando, em direção a tarefas

progressivamente mais complexas.

A Zona de Desenvolvimento Proximal define aquelas funções que ainda não amadureceram, mas que estão em processo de maturação, funções que amadurecerão, mas estão presentemente em estado embrionário. Essas funções poderiam ser chamadas de “brotos” ou “flores” do desenvolvimento, ao invés de “frutos” do desenvolvimento. [...] aquilo que é a zona de desenvolvimento proximal hoje, será o nível de desenvolvimento real amanhã, ou seja, aquilo que uma criança pode fazer com assistência hoje, ela será capaz de fazer sozinha amanhã (VYGOTSKY, 1998, p. 113)

Portanto, a Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP) “mede” a distância entre estes

dois níveis, significando que o educador pode interferir no sentido de diminuir a distância

entre eles, oferecendo ajudas contigentes ao processo de crescimento e construção do aluno

para incentivar os progressos que experimenta e superar os obstáculos que encontra, não

esquecendo que o ensino não substitui os processos singulares e individuais de cada um deles

em relação à sua aprendizagem. Criando zonas de desenvolvimento proximal, o professor

estaria possibilitando o aparecimento de funções ainda não completamente desenvolvidas

(MOYSÉS, 1997, p. 34). Deste modo, no que tange à aprendizagem de conteúdos

matemáticos, o professor tem um papel fundamental na mediação dos níveis de

desenvolvimento, cabendo a ele a escolha de recursos apropriados para tal, a proposição de

exercícios que contribuam efetivamente para esta mediação e a didática apropriada para que o

aluno consiga realizar tais exercícios em prol da construção de seu conhecimento matemático.

Moysés (1997, p.37) pondera:

Vale salientar que em termos cognitivos o questionamento e a correção, por parte de quem ensina, desempenham um relevante papel na aprendizagem. Conhecendo a zona de desenvolvimento proximal do aluno, o professor bem preparado saberá fazer as perguntas que irão provocar o desequilíbrio na sua estrutura cognitiva fazendo-a avançar no sentido de uma nova e mais elaborada reestruturação.

56

O processo de mediação refere-se à noção de que o signo (linguagem, sistemas de

contagem, símbolos algébricos, mapas, desenhos), inventado pelo homem para mediatizar não

só o pensamento como o próprio processo social humano, quando utilizados pelo homem,

acaba por modificar as suas próprias funções psíquicas superiores (VYGOTSKY, 1981,

p.137). Após vários experimentos relacionados a estímulos externos,

Vygotsky conclui que o próprio sujeito, ao longo da história e do seu próprio desenvolvimento, introduziu sistematicamente novos sinais, novos elementos (estímulos, na linguagem psicológica) e novos símbolos na mediação das suas ações. Por exemplo, o hábito de fazer marcas nos troncos de árvores ou nas pedras para registrar uma contagem foi encontrado em diferentes culturas primitivas (MOYSÉS, 1997, p.25).

A mediação, inicialmente, aconteceria entre a relação de um estímulo externo com

signos que atribuíssem algum significado, sendo que “com o passar do tempo, a criança deixa

de necessitar desse elemento auxiliar externo, e passa a utilizar signos internos. Esses nada

mais são do que representações mentais que substituem os objetos do mundo real”

(MOYSÉS, 1997, p.26).

Quanto ao processo de internalização, Vygotsky aprofunda e sistematiza concepções

já existentes sobre o termo, através de inúmeros experimentos que realiza em colaboração

com outros pesquisadores. Em todos, a mesma idéia central: a de que é na interação social e

por intermédio do uso de signos que se dá o desenvolvimento das funções psíquicas

superiores (MOYSÉS, 1997, p.27). Cada função psíquica internalizada implica uma nova

reestruturação mental, alargamento e enriquecimento psico-intelectual.

A razão é muito simples: ao começar a ser internalizada, a nova função irá interagir com outras já existentes na mente da criança. Não se trata, pois, de camadas superpostas ou algo parecido, e sim de uma coordenação entre a nova função e outras já existentes (MOYSÉS, 1997, p. 27).

Um dos aspectos decorrentes desse processo de internalização, investigado por

Vygotsky e seus colaboradores (1998), é o componente afetivo que o permeia, ou seja, o

aparecimento das relações cognitivas necessárias à realização do processo de internalização é

57

impulsionado pelos estados emocionais e pelas necessidades afetivas do sujeito. Portanto, no

processo de internalização, os aspectos cognitivos e afetivos estão diretamente ligados.

A criança que adentra o espaço escolar traz consigo não só o intelecto aberto para

aprender, mas todos os sentimentos que vivenciou fora da escola durante momentos antes de

sua aula iniciar. O aluno deve ser visto em sua totalidade, o que nem sempre acontece. É

comum a existência de professores que vêem seus alunos como meros ouvintes de seus

ensinamentos.

A formação de conceitos é outro marco na teoria de Vygotsky, como uma extensão

das suas próprias pesquisas sobre o processo de internalização. Nelas considerou o confronto

entre os conceitos espontâneos e científicos. Os conceitos espontâneos são aqueles adquiridos

no cotidiano da criança em contato com determinados objetos, fatos, fenômenos, dos quais ela

não tem consciência. Por outro lado, os conceitos científicos são aqueles sistematizados e

transmitidos no âmbito de uma instituição escolar. Portanto, a principal função do professor,

ao levar em consideração estes dois tipos de conceitos, é criar situações de articulação entre

ambos. Seria valorizar os conceitos que o aluno tem construído ao longo de sua história de

vida, fora da escola, propondo conceitos científicos institucionalizados que permitam a

sistematização de seus conhecimentos, tornando-os mais amplos. Como os demais marcos

teóricos, penso que a formação de conceitos é um ponto de reflexão para nós educadores, no

momento em que supervalorizamos os conceitos científicos e não levamos em conta os

conceitos espontâneos vivenciados pelos nossos alunos em relação à Matemática. Para ilustrar

esta nossa reflexão, cito uma situação descrita por Parolin (2005, p. 126):

Uma professora, alfabetizadora de adultos, propôs para a turma um trabalho de Matemática e notou que uma de suas alunas ficou pálida. A professora percebeu no seu estado emocional o que ela estava sentindo. “Tenho horror à Matemática! Não sei nada de Matemática. Sei que vou conseguir aprender a ler, mas Matemática...nunca!” A professora, muito habilidosa, perguntou: “Quem paga suas contas de luz?” “Eu”, respondeu a aluna. “E quem faz o supermercado da sua casa?”, continuou a professora. “ Eu”, respondeu a aluna. [...]”Vive do seu salário?”, continuou a professora. “Não! Vivo com o pouquinho que eu ganho e não devo pra ninguém.” “Então, a senhora é ótima em Matemática”, afirmou a professora, provocando espanto em sua aluna.

Esta situação exemplifica claramente a questão da formação de conceitos, ou seja, a

falta de consciência do aluno (e muitas vezes também do professor) sobre as situações que

envolvem a Matemática em seu cotidiano (conceitos espontâneos) e a sistematização

58

(conceitos científicos) destes conhecimentos adquiridos espontaneamente, no seio da

instituição escolar. A formação de conceitos implica a reconstrução do saber mediante

estratégias adequadas, propostas pelo professor, mediador entre o aluno e o objeto de

conhecimento.

Esse processo de relacionar o conceito espontâneo que o aluno traz com o conceito científico que se quer que ele aprenda exige de quem ensina uma compreensão dos diferentes significados que os conceitos – tanto os espontâneos quanto os científicos – têm para o aluno. Exige, também, que o docente perceba quais são o seus contextos, quais são os sentidos nos quais eles estão empregados (MOYSÉS, 1997, p.38)

Finalmente, destacamos o significado e o sentido como conceitos introduzidos por

Vygotsky (1993) para tratar da ligação entre linguagem e pensamento.

Quando o homem assimila o significado de uma palavra, está dominando a

experiência social e cultural que, por sua vez, depende da individualidade de cada um.

Processo semelhante ocorre com a aprendizagem da Matemática, ao atribuirmos significado e

sentido para os termos matemáticos que nos são apresentados. É extremamente necessário, ao

processo de aprendizagem, o aluno buscar o significado de determinado conteúdo e atribuir

sentido quanto à sua real utilização prática no cotidiano. Porém, com freqüência o professor

não atenta para este fato e “ensina” os conteúdos matemáticos com ausência de significado e

sentido para a vida do aluno. Este é um dos fatores principais que acaba por dificultar a

aprendizagem do aluno ou, pelo menos, torná-la desconexa de sua prática cotidiana.

São inúmeras as experiências que vemos em nosso cotidiano e que evidenciam a

relação entre a afetividade e a qualidade da aprendizagem. Quando perguntamos a alguém

sobre qual a disciplina escolar que menos gosta, a resposta geralmente vem acompanhada da

justificativa da postura do professor em relação a ela: “não gosto de matemática porque meu

professor é muito bravo, briga comigo, grita”. Se buscarmos em nossa memória, as

lembranças deixadas pelos nossos professores de Matemática, que impressões nos trariam?

De apego afetivo, de repulsa, de medo, de incentivo? As emoções estão intimamente

relacionadas ao cognitivo, isto é, se a emoção é negativa, o cognitivo (a inteligência, a mente)

a registra e associa ao que está sendo vivenciado, no caso, a aprendizagem de determinado

conteúdo.

59

Antunes (2002, p.32), educador sensível à importância da afetividade nas relações

estabelecidas entre os principais atores do ato educativo (professor e aluno), estabelece a

seguinte reflexão:

Não existe jardineiro, padeiro, barbeiro, professor e aluno feliz sem a auto-estima de querer-se bem. [...] O professor é, muitas vezes, bem mais que o pai ou a mãe, quem melhor pode desenvolvê-la. Descubra o lado bom do aluno e elogie com moderação. Coloque uma lente de aumento em seus acertos e descubra o que ninguém vê. [...] Todo professor é e sempre será um artesão de amanhãs e para isso tem que descobrir qualidades, investigar talentos, surpreender-se com revelações. Pense nos professores que teve e provavelmente lembrará que a imagem mais linda não estava necessariamente no mais culto, mas nos que te olharam com olhos gulosos de carinho.

Parolin (2005) menciona uma pesquisa, realizada por ela, de fluxo de rua, feita em

Curitiba, com 200 pessoas, com a seguinte pergunta: Qual é a disciplina que você mais odeia

na escola e por quê?

Dentre várias disciplinas citadas, a vencedora foi a Matemática, com 37%. As

respostas, em sua maioria, apontavam para as dificuldades com cálculos e sua desvinculação

com o cotidiano, e indiretamente, para a didática do professor em não facilitar a

aprendizagem. O entrevistado número 190, por exemplo, coloca o seguinte: “Por causa do

professor, a maneira de explicar, porque ele só explica no quadro. Quando eu vou perguntar

para ele, ele não explica de novo.”

Quanto ao ensino, Moysés (1997, p. 60) colabora com um exemplo prático:

Creio que ilustra bem o fato um episódio relatado por um pesquisador e professor de matemática que vem trabalhando por um ensino mais rico e pleno de sentido para seus alunos: Allan Schoenfeld. Refere-se a uma avaliação, em nível nacional, dos conhecimentos matemáticos de alunos secundaristas, feita nos Estados Unidos. Dentre os problemas propostos havia um que consistia no seguinte: “Em um ônibus do exército cabem 36 soldados. Se 1128 soldados precisam ser transportados para um local de treinamento, quantos ônibus serão necessários?” Aproximadamente 70% dos alunos realizaram a operação aritmética correta, dividindo 1128 por 36, encontrando um quociente de 31 e 12 de resto. Apenas 23% responderam que seriam necessários 32 ônibus. Os demais escreveram que o número de ônibus necessário era 31 e sobram 12 (Schoenfeld, 1989, p.81). Essa é a forma como a escola ensina a pensar o conhecimento matemático! Pensamento matematicamente correto, mas destituído de sentido.

60

Refletindo sobre a função da escola neste processo, parece que não há continuidade

entre o que se aprende na escola e o conhecimento que existe fora dela, dificilmente

mostrando, para o aluno, a relação direta e óbvia que há entre a escola e a vida.

Por outro lado, é notório percebermos que o conhecimento adquirido fora da escola,

nem sempre é usado para servir de base à aprendizagem escolar, nem como recurso

motivacional. O saber da escola, ao que parece, anda na contramão do saber da vida.

Se professor e alunos defrontam-se com sentenças, regras e símbolos matemáticos sem que nenhum deles consiga dar sentido e significado a tal simbologia, então a escola continua a negar ao aluno – especialmente àquele que freqüenta a escola pública – uma das formas essenciais de ler, interpretar e explicar o mundo (MOYSÉS, 1997, p.67).

Neste sentido, nenhuma prática é neutra, ou seja, toda prática está envolvida numa

dimensão política. Do mesmo modo, a didática que o(a) professor(a) utiliza em suas aulas, irá

favorecer ou não a aprendizagem do conhecimento sistematizado. A didática, portanto, é

outro fator que pode contribuir para desenvolver ou dificultar a aprendizagem do aluno.

Dificuldades Devido à Didática do Professor

Muitos são os questionamentos acerca da Didática utilizada pelo professor de

qualquer nível de ensino, da Educação Infantil à Educação de Jovens e Adultos.

É comum ouvirmos de alunos que o professor fulano-de-tal não tem didática, não

sabe ensinar. Para alguns, o professor bom é aquele que passa muitos exercícios, para outros,

é aquele que utiliza recursos didáticos adequados.

A didática utilizada pelo professor é fundamental para a eficácia do processo ensino-

aprendizagem, porém não significa que somente este elemento poderá determinar o sucesso

ou fracasso do aluno nesta relação.

Nesta questão, não podemos deixar de mencionar a posição pedagógica que o

professor assume no ministério de suas aulas. Há, basicamente, três caminhos.

Há professores que adotam uma postura tradicional, frente ao ensino, valorizando a

memorização através da repetição de exercícios e atribuindo menção do rendimento escolar

através de avaliações escritas; há os que seguem uma linha cognitivista (construtivista), ou

seja, crêem na construção do conhecimento pelo próprio aluno na interação deste com o meio

61

e com situações que desafiem seu raciocínio. Valorizam a manipulação de materiais concretos

(pedagógicos, sucata etc.) como apoio nesta construção e agem, enquanto professores, como

mediadores do processo de construção do conhecimento através de interferências nas

argumentações dadas pelos alunos, nas propostas de resolução de situações-problema, no

diálogo, nos conteúdos interdisciplinares e na interação dos alunos em grupos. As aulas são

dinâmicas e com apoio de materiais diferenciados.

No construtivismo4, os alunos, durante o processo de aquisição do conhecimento

matemático, são instigados, pelo professor, com perguntas, em momentos oportunos, a fim de

provocar a desequilibração temporária de suas respostas que estimularão o raciocínio e a

argumentação de seu pensamento.

Na teoria piagetiana, antes das crianças conseguirem lidar significativamente com

números e operações, elas precisam compreender o que os números e as operações significam,

e isso não acontece simplesmente com exercícios impressos de ligar uma figura a outra, pintar

o objeto maior, riscar o menor etc.

Nesta postura deve-se ter muito cuidado em não atribuir uma ênfase maior à

utilização dos materiais concretos. Schliemann e Carraher (2001), em sua pesquisa, ao propor

situações-problema de compra e venda e, verificando a resolução das mesmas pelas crianças

trabalhadoras, advertem:

O fato de as crianças terem tido diante de si objetos concretos não pode explicar o melhor desempenho na situação de venda simulada. A presença de objetos com vários preços não simplifica a aritmética nesses casos, pois as contas referiam-se aos preços e não aos objetos. Os preços não estavam escritos nos objetos. Além disso, nenhuma criança manipulou os objetos ao resolver problemas de multiplicação ou divisão (p. 52).

Como na vida, na Educação deve-se encontrar um equilíbrio, ou seja, não se pode

levar o aluno à exaustão na execução de inúmeros exercícios a fim de que ele memorize

determinado conteúdo, mas também não se pode deixar que simplesmente manipule objetos

ou brinque com jogos sem depois sistematizar os conhecimentos construídos na utilização dos

mesmos.

4 Termo que teve sua origem com a teoria de Piaget referente ao processo de construção do conhecimento através da relação do indivíduo com o meio que o cerca.

62

Para a eficácia do processo ensino-aprendizagem deve haver um equilíbrio entre aula

expositiva e aula-passeio, entre manipulação de objetos concretos e o exercício escrito, entre a

proposta de resolução de situações-problema e o registro dos mesmos e sua praticidade. Não

há progresso sem conquista diária.

Além das duas posturas acima citadas (tradicional e construtivista) tem-se, ainda, a

postura crítico-social (sócio-interacionista) onde o professor, ao planejar suas aulas, deve

atentar para o tipo de conteúdo e atividades que irá propor aos alunos, ou seja, a abordagem

dos conteúdos é realizada de forma crítica e contextualizada, onde elementos sociais são

expostos e questionados.

Ao optar por uma ou por outra postura, o professor deve atentar para vários e

diferentes fatores que irão conduzir suas aulas, tornando-as prazerosas ou enfadonhas,

facilitando ou dificultando o processo de aprendizagem do aluno. Portanto, seria viável

primeiro conhecer a capacidade de seus alunos e suas dificuldades através de uma avaliação

diagnóstica (não necessariamente escrita) a fim de planejar suas aulas visando o objetivo que

deseja atingir, ou melhor, planejar as aulas focando não o ensino, mas a aprendizagem do

aluno: como ele aprende, o que é realmente necessário aprender, como facilitar a

aprendizagem do aluno, quais os recursos que facilitarão sua aprendizagem e as formas

apropriadas de avaliação desta aprendizagem. O problema é que o foco do professor

geralmente é o ensino; o que ensinar e como ensinar. Após a determinação de seus objetivos,

é necessário pensar nos conteúdos relevantes para apropriação pelos alunos. Em seguida, o

professor deve refletir sobre a metodologia a ser empregada para melhor facilitar a

aprendizagem de seus alunos, bem como os recursos necessários para viabilizá-la, tendo

sempre em vista o grau de desenvolvimento de sua turma. A didática refletirá no tipo de aula

que o professor adota, predominantemente, em sala de aula: tradicional, cognitivista ou

crítica.

Não se pode atribuir à didática do professor o total fracasso ou sucesso do aluno, mas

pode-se dizer que, com certeza, as técnicas e os recursos adotados pelo professor irão

favorecer ou não a aprendizagem. O importante é preparar a aula com amor e consciência da

missão que um educador tem diante do presente e futuro de seus alunos. As aulas devem ser

empolgantes, significativas e, acima de tudo, um momento em que o aluno possa construir e

fixar os conhecimentos. Para uma receita de bolo dar certo, é necessário que todos os

ingredientes tenham o seu peso, a sua contribuição química num equilíbrio harmônico. Se

63

algo não estiver dando certo, é necessário avaliar o processo e buscar outras formas que

viabilizem o sucesso. Deste modo, outro fator é fundamental durante o processo ensino-

aprendizagem: a Avaliação.

Dificuldades Mediante o Tipo de Avaliação Adotada pelo Professor

Sabemos que há várias formas de se avaliar um aluno; podemos optar pela avaliação

contínua, diagnóstica, somativa, auto-avaliativa e inúmeras formas de registrar o que foi

avaliado: testes, questionários, relatórios, portfólios, tabelas, gráficos

Segundo Zabala (1998, p.196),

[...] toda intervenção educativa na aula se articula em torno de alguns processos de ensino/aprendizagem que podem ser analisados desde diferentes pontos de vista. Examinemos, em primeiro lugar, o processo que cada aluno segue. Neste caso pode se distinguir entre a maneira como o menino ou menina está aprendendo e o que faz o professor (a) para que aprenda, quer dizer, o processo de ensino.

Quanto aos processos avaliáveis, Zabala (idem) continua:

Apesar de que o ensino e aprendizagem se encontram estreitamente ligados e fazem parte de uma mesma unidade dentro da aula, podemos distinguir claramente dois processos avaliáveis: como o aluno aprende e como o professor ou professora ensina.

A avaliação está presente em todos os momentos de nossa vida: ao escolher um

tecido para produzir uma roupa, avalia-se a sua textura, seu preço, sua cor a fim de optar pelo

tecido apropriado para o modelo escolhido. Nas situações do cotidiano estamos sempre

avaliando: a fisionomia e a postura das pessoas, as escolhas a fazer etc.

Portanto, a avaliação é aspecto fundamental em nossas vidas e na sociedade; aspecto

que determina a manutenção ou não de determinadas atitudes, pois toda atitude ou todo o

produto de uma ação é avaliado, mesmo sem a intenção consciente de sê-lo. Isso ocorre em

todos os momentos porque ciclicamente estamos formando e emitindo juízos de valor

(LUCKESI, 2003).

64

Depois de décadas sob o paradigma de que a quantificação dos aspectos escolares

traduzir-se-ia em notas, graus e/ou conceitos, obtivemos a possibilidade de pensarmos sobre a

avaliação escolar de forma mais ampla e abrangente.

Numa concepção de ensino centrado na seleção dos alunos mais preparados para continuar a escolarização até os estudos universitários, é lógico que o sujeito de avaliação seja o aluno e que considerem objeto da avaliação as aprendizagens alcançadas em relação às necessidades futuras que foram estabelecidas – as universitárias. [...] Quando a formação integral é a finalidade principal do ensino e, portanto, seu objetivo é o desenvolvimento de todas as capacidades da pessoa e não apenas as cognitivas, muitos dos pressupostos da avaliação mudam (ZABALA, 1998, p.197).

A avaliação deve ser um instrumento ou um momento que permite ao aluno avaliar-

se quanto as suas dificuldades; seria uma reflexão sobre o porquê não aprendeu e porque

precisaria aprender este conteúdo. Caso contrário, a função da avaliação torna-se

descaracterizada, perdendo o sentido real de reflexão e aprendizagem sobre os erros

cometidos.

A avaliação, durante o processo educacional, pode colaborar para o sucesso ou

fracasso do aluno, pois ela é o coroamento de todo o processo ensino-aprendizagem:

planejamento, determinação dos objetivos e dos conteúdos, escolha dos recursos e atividades

escolares.

Dentre as mais variadas formas de avaliar o rendimento escolar de um aluno, a que

mais persiste no Ensino Fundamental é a avaliação escrita, somativa e classificatória.

A avaliação é tradicionalmente associada, na escola, à criação de hierarquias de

excelência. Os alunos são comparados e depois classificados em virtude de uma norma de excelência, definida no absoluto ou encarnada pelo professor e pelos melhores alunos. [...] No decorrer do ano letivo, os trabalhos, as provas de rotina, as provas orais, a notação de trabalhos pessoais e de dossiês criam “pequenas” hierarquias de excelência, sendo que nenhuma delas é decisiva, mas cuja adição e acúmulo prefiguram a hierarquia geral (PERRENOUD, 1999, p. 11).

Neste tipo de avaliação tradicional o professor ensina os conteúdos e o aluno os

reproduz na avaliação escrita, recebendo uma nota pelo grau de integridade do conteúdo

reproduzido.

65

Este tipo de procedimento complica-se ainda mais quando se trata da Matemática.

Em várias experiências, tanto com crianças como com adultos, ao aplicarmos um teste escrito

sobre os conteúdos estudados, a maioria dos alunos apresentava algum tipo de reação ou

atitude no momento de responder ao teste: uns sabiam a resposta, mas não sabiam como

registrar a operação para chegar ao resultado, outros executavam com perfeita coerência todo

um raciocínio para a resolução de um problema, porém erravam um único número e a

resposta era invalidada. Além destas questões, existem aqueles que não compreendem ou não

atentam para o enunciado da questão, levando ao erro na execução. Outro fator determinante

neste sistema é que o professor “treina” seu aluno com uma bateria de exercícios e na

avaliação adota um elemento novo diante do qual o aluno fica inseguro (pois não foi treinado)

e acaba não sabendo resolver a questão.

Por outro lado, há aqueles alunos que respondem corretamente as perguntas, mas não

conseguem fazer uso do que aprenderam no cotidiano de sua vida.

O pior é quando o professor utiliza a Matemática como ameaça para os alunos a fim

de obter sua atenção durante as aulas ou a disciplina em sala.

Conforme mostrou Chevallard (1986) no que tange aos professores de matemática, as notas fazem parte de uma negociação entre o professor e seus alunos ou, pelo menos, de um arranjo. Elas lhe permitem fazê-los trabalhar, conseguir sua aplicação, seu silêncio, sua concentração, sua docilidade em vista do objetivo supremo: passar de ano. A nota é uma mensagem que não diz de início ao aluno o que ele sabe, mas o que pode lhe acontecer “se continuar assim até o final do ano” (PERRENOUD, 1999, p. 12).

Nosso intuito não é, neste trabalho, analisar cada forma de avaliação ou registro e

sim possibilitar um momento de reflexão sobre a importância do instrumento que o professor

utiliza para avaliar seu aluno, o motivo pelo qual optou por determinado tipo de avaliação

descartando outras formas de avaliar, o objetivo que pretende atingir mediante a opção feita e

o que pretende fazer com os resultados obtidos.

O certo é que a avaliação não deve ser um instrumento de tortura para o aluno nem

tampouco uma arma que o professor utiliza para tentar garantir o interesse de seus alunos

durante suas aulas ou mesmo utilizar a avaliação como punição. Além disso, o resultado da

avaliação deve ser refletido e discutido junto aos alunos a fim de juntos, professor e alunos,

buscarem soluções mediante as dificuldades apresentadas. De nada adianta, nada se constrói,

66

quando o professor entrega a avaliação escrita para seu aluno, com os “certos e errados” em

tinta vermelha, atribuindo-lhe uma nota, apenas como um documento a ser guardado para a

posteridade. A função da avaliação, ao contrário, está ligada ao conceito de melhoria de si, de

suas ações e das aprendizagens dos alunos. Produtivo é encontrar meios para recuperar os

conteúdos não assimilados pelos alunos.

Segundo Carrilo (apud CURI, 2003), a avaliação “É uma atividade valorativa e

interrogativa, facilitadora da mudança educativa e do desenvolvimento profissional do

professor”.

No entanto, o que ocorre no processo educacional geralmente são os seguintes

pontos:

� Só se avalia conteúdos conceituais e procedimentais;

� O “culpado” do fracasso escolar é o estudante;

� O único objeto de avaliação é o aluno;

� A avaliação se faz apenas sobre os resultados;

� A recuperação é a repetição das provas;

� A avaliação fundamenta-se nos aspectos negativos;

� A avaliação tem cunho classificatório;

� Utiliza-se como instrumento uma prova escrita;

� A avaliação é seletiva e conclui um processo;

� Não se pratica a auto-avaliação;

� O agente da avaliação é um instrumento de repressão;

� Não se pratica avaliação contínua;

� Não se esclarece as condições de avaliação.(PRIETO apud CURI, 2003)

67

Carrilo (apud CURI, 2003) apresenta sugestões para avaliar a resolução de

problemas ao levar-se em conta os seguintes tópicos:

� Características pessoais do “resolvedor” de problema: o aluno gosta de resolver

problemas? Ele espera alguém resolver por ele? Ele simplesmente copia o resultado?

Podemos dizer que se trata de uma avaliação atitudinal onde o objetivo é verificar

como os alunos se posicionam diante da resolução de problemas.

� Características táticas do processo: como o aluno busca soluções? Como as

registra? Qual a metodologia empregada?

� Características reguladoras do processo: o processo foi direto ou não?

Segundo Polya (1995), durante a resolução de problemas o professor deve considerar

as seguintes etapas:

1º) Compreensão do problema: verificar se o aluno entendeu o que foi pedido no

problema, solicitar que explique o que entendeu e identifique os dados e a pergunta do

problema.

2º) Concepção do plano de resolução: avaliar se o aluno sabe estabelecer um plano

para resolver o problema. A escola e o professor não devem tolher o aluno na resolução do

problema à sua maneira e sim incentivá-lo a buscar caminhos diferentes que levem à uma

resposta satisfatória.

3º) Execução do plano: é o momento do registro das operações matemáticas. Neste

momento, o aluno deve ser instruído para não apagar as contas mesmo pensando tê-las errado,

mas sim riscá-las, a fim de que o professor possa acompanhar o seu raciocínio e intervir

corretamente.

4º) Validação da resposta: retomar o texto para dar a resposta correta.

Outra sugestão de como avaliar consta no PCN-Matemática (2000, p. 58-59)

Alguns professores têm procurado elaborar instrumentos para registrar observações sobre os alunos. Um exemplo são as fichas para o mapeamento do desenvolvimento de atitudes, que incluem questões como: Procura resolver problemas por seus próprios meios? Faz perguntas? Usa estratégias criativas ou apenas as

68

convencionais? Justifica as respostas obtidas? Comunica suas respostas com clareza? Participa dos trabalhos em grupo? Ajuda os outros na resolução de problemas? Contesta pontos que não compreende ou com os quais não concorda? Os resultados expressos pelos instrumentos de avaliação, sejam eles provas, trabalhos, postura em sala, constituem indícios de competências e como tal devem ser considerados.

Podemos verificar, portanto, que há diversas formas de realizar uma avaliação;

todavia, necessário é atentar para a sua finalidade e os mecanismos adotados para o alcance da

eficácia no processo de aprendizagem.

A seguir, trataremos de questões referentes a outros fatores que interferem na

aprendizagem da Matemática.

Dificuldades Devido a Fatores Psicológicos, Emocionais e Sociais

É inegável a influência de fatores psicológicos, emocionais e sociais no processo de

aprendizagem do aluno. Ainda mais hoje em dia em que os contra-valores viabilizados pelos

meios de comunicação sobrepõem-se aos valores creditados pelas famílias. A preocupação

com tais fatores transpõe as paredes do ambiente familiar e atinge o ambiente escolar.

Parolin (2005, p. 74) faz a seguinte reflexão:

A escola tem um papel importante e singular na constituição do sujeito, papel, aliás, que tem aumentado significativamente ao longo dos tempos, já que cada vez mais as crianças ficam mais tempo na escola e aos cuidados dos professores. A escola é parceira da família na construção do cidadão, pois é ela a instituição que tem a peculariedade de ser fortemente socializadora tanto do conhecimento quanto das experiências e entre pessoas. Nessa perspectiva, entender e administrar conflitos que são gerados por emoções tornam-se um instrumento indispensável para o professor na sala de aula.

Com relação à aprendizagem do aluno, Parolin (2005, p. 73) continua:

É tarefa do professor reconhecer cada aluno seu como alguém singular, contemplá-lo em sua individualidade, estabelecer um campo emocional que favoreça a manifestação desse ser e viabilizar uma ação pedagógica que contemple o aprendiz em sua totalidade e plenitude. A aprendizagem acontece em um contexto social-afetivo e educativo, num clima emocional entre pessoas comprometidas entre si e com o conhecimento, uma perspectiva de busca dos instrumentos necessários para o viver e conviver.

69

Sem dúvida alguma, os fatores psicológicos que acompanham a trajetória de vida do

aluno são os mais difíceis de lidar no decorrer do processo educativo.

Do ponto de vista emocional e psicológico, o que normalmente ocorre quando um

indivíduo não tem afinidade em lidar com determinado assunto ou pessoa, a atitude mais

provável é de rejeição ou insegurança. Este sentimento, imperceptivelmente, é repassado a

terceiros que podem ou não absorvê-lo e internalizá-lo para si, trazendo assim conseqüências

em determinadas áreas de sua vida.

O estímulo e a motivação (intrínseca e extrínseca)5 são fatores que podem contribuir

muito para a aprendizagem da Matemática.

Motivação é algo que leva os alunos a agirem por vontade própria: ela inflama a imaginação, excita e põe em evidência as fontes de energia intelectual, inspira o aluno a ter vontade de agir, de progredir. Em suma, motivar é despertar o interesse e o esforço do aluno. É fazer o estudante “desejar” aprender aquilo que ele precisa aprender (ZÓBOLI, 1997, p. 16).

Realmente não é uma tarefa simples o ato de educar e, especificamente, o ato de

ensinar conteúdos de uma ciência que por si só gera tanta polêmica no meio educacional.

Há fatores que não competem ao professor tentar resolvê-los (problemas familiares,

financeiros, emocionais...) pois acabaria frustrado e com uma carga muito pesada sobre seus

ombros. Segundo Delors (2003, p.155):

O professor deve estabelecer uma nova relação com quem está aprendendo, passar do papel de “solista” ao de “acompanhante”, tornando-se não mais alguém que transmite conhecimentos, mas aquele que ajuda os seus alunos a encontrar, organizar e gerir o saber, guiando mas não modelando os espíritos, e demonstrando grande firmeza quanto aos valores fundamentais que devem orientar toda a vida.

Muitas são as colocações de Delors (2003, p. 157) sobre a importância do professor

no ato educativo:

O trabalho do professor não consiste simplesmente em transmitir informações ou conhecimentos, mas em apresentá-los sob a forma de problemas a resolver,

5 Motivação intrínseca reside no próprio sujeito enquanto motivação extrínseca reside no ambiente, nos fatores externos (ZÒBOLI, 1997, p. 17).

70

situando-os num contexto e colocando-os em perspectiva de modo que o aluno possa estabelecer a ligação entre a sua solução e outras interrogações mais abrangentes. [...]A grande força dos professores reside no exemplo que dão, manifestando sua curiosidade e sua abertura de espírito, e mostrando–se prontos a sujeitar as suas hipóteses à prova dos fatos e até a reconhecer os próprios erros. Deve, sobretudo, transmitir o gosto pelo estudo.

Antigamente, o ato de ensinar resumia-se simplesmente em transmitir o

conhecimento para que o aluno reproduzisse na avaliação; atualmente, este conceito cai por

terra e o professor deve adquirir uma postura mais crítica, criativa e atraente para que o aluno

realmente se interesse e aprenda os conteúdos de forma interativa e dinâmica. Além disso, o

professor deve preocupar-se com questões sociais que são trazidas para dentro de sua sala de

aula, além de administrar seu processo de aprimoramento não só pedagógico como

tecnológico.

A postura do professor em sala de aula, ou seja, seu dinamismo, seu

comprometimento com a educação, sua preocupação em buscar caminhos para que sua aula

seja envolvente, a segurança pela qual transmite conceitos e seu jeito amável de ser, são

fatores imprescindíveis que colaboram muito para que o aluno tenha sucesso na aprendizagem

não só da Matemática como de outras matérias de um modo geral. Porém, devemos lembrar

que o ensino da Matemática acontece em determinado contexto, com professores que vivem

em determinadas condições, que tiveram uma certa formação e que também sofrem

influências do contexto social (histórico e cultural), construindo valores, percepções

singulares da realidade e produzindo emoções que irão interferir diretamente no processo

educativo.

Atualmente, estes professores sofrem pressões do sistema de ensino com regras a

cumprir, horários inflexíveis e responsabilidades burocráticas. Vêm-se obrigados a trabalhar

em jornada dupla (muitas vezes tripla) devido à má remuneração e, desta forma, ficam sem

tempo para sua qualificação profissional, sua formação continuada, ou até mesmo, para a

preparação de aulas com qualidade: planejamento de conteúdos significativos, preparação de

recursos didáticos adequados e elaboração de avaliações criativas. Vemos professores

cansados, doentes por excesso de trabalho e desmotivados. Neste mesmo cenário que

situamos os professores, estão os alunos. Alunos do mesmo modo desmotivados com o

ensino, mas excessivamente motivados para a Internet, para as Lan Houses, para a televisão e

pelas várias opções de lazer que a sociedade lhes apresenta. A escola parece não acompanhar

(ou não querer acompanhar) a evolução tecnológica. A família, outro personagem nesta

71

complexa trama educacional, do mesmo modo que o professor, pressionado pelo sistema

capitalista, investe seu tempo no trabalho para poder ganhar dinheiro a fim de suprir suas

necessidades básicas. Sai de cena a mãe que acompanha os filhos em suas tarefas escolares

enquanto o pai sai para trabalhar. Paga-se (quando pode) um professor de reforço para atuar

neste papel. E neste drama em que vive a sociedade hoje, está a Matemática, cuja concepção

de ciência abstrata, difícil de assimilar, torna-a ainda mais complexa diante deste quadro que

acabamos de pintar.

Portanto, reiteramos, embora haja uma diversidade de fatores que podem interferir,

prejudicando a aprendizagem da Matemática, a presente pesquisa tem como objetivo focar o

olhar para a metodologia de ensino do professor, uma vez que ele é o mediador de todo o

processo ensino-aprendizagem deste conhecimento no âmbito escolar.

Para tanto, é imprescindível irmos a campo, para melhor apreender e compreender,

em nossa realidade, a dinâmica do processo de ensino-aprendizagem da Matemática.

72

3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

É evidente que este momento, sem desmerecer os demais, é de extrema importância

para a efetivação de uma pesquisa científica. O rigor da busca e da análise são fundamentais

para a construção de um projeto alicerçado num referencial teórico consistente e significativo.

Deste modo, optei por seguir um roteiro proposto por Alves-Mazotti (1998) para o

detalhamento dos procedimentos metodológicos: “indicação e justificação do paradigma que

orienta o estudo, as etapas do desenvolvimento da pesquisa, a descrição do contexto, o

processo de seleção dos participantes, os procedimentos e o instrumental de coleta e análise

de dados, os recursos utilizados para maximizar a confiabilidade dos resultados e o

cronograma” (p.159).

3.1 INDICAÇÃO E JUSTIFICAÇÃO DO PARADIGMA QUE ORIENTA O ESTUDO

Baseada no Paradigma Qualitativo (PATTON apud ALVES-MAZOTTI, 1998), esta

pesquisa tem como principal característica a compreensão e a interpretação dos fatos uma vez

que “as pessoas agem em função de suas crenças, percepções, sentimentos e valores que não

se dá a conhecer de modo imediato, precisando ser desvelado” (p.131).

Foi adotada a Abordagem Qualitativa Crítica por acreditar que todo processo deve

ser compreendido dentro de um contexto social e não de forma isolada. Vale lembrar que “[...]

tentando compreender como as redes de poder são produzidas, mediadas e transformadas

[...]esses processos estão sempre profundamente vinculados às desigualdades culturais,

econômicas e políticas que dominam nossa sociedade.” (ALVES-MAZOTTI, 1998, p. 139).

Em se tratando de uma pesquisa realizada no seio de uma escola particular cuja clientela é

composta tanto de crianças e adolescentes provenientes da camada popular como de famílias

73

abastadas e da classe média, estes pontos são fundamentais no delineamento de uma postura

crítica face à realidade em que a instituição se encontra inserida.

3.2 ETAPAS DO DESENVOLVIMENTO DA PESQUISA

Conforme recomendação de Alves-Mazotti (1998), a investigação foi precedida por

um período exploratório que, por sua vez, é posterior à fase de negociação para o acesso ao

campo.

Acesso ao campo: A escola selecionada para a realização da pesquisa é a mesma em

que a pesquisadora exerce, há onze anos, a função de supervisora escolar. Portanto, o acesso

foi assim facilitado uma vez que as relações de amizade e profissionalismo entre alunos,

professores e diretora, estão consolidadas há anos. Ciente da necessidade da realização da

pesquisa, a diretora não impôs resistência para sua efetivação na instituição a qual dirige, até

mesmo por reconhecer que é função da supervisão escolar acompanhar o desenvolvimento

das aulas dos professores ali atuantes. Desse modo, não causou estranheza ou intimidação, por

parte da professora e dos alunos, o fato da pesquisadora ter estado presente nas aulas.

Foi esclarecido, para os participantes da pesquisa (diretora, professora e alunos), os

objetivos da mesma e as possíveis conseqüências que poderiam decorrer de uma observação

mais sistemática, incisiva e crítica. A direção e a professora concordaram com a ocorrência de

tais possibilidades, acreditando que a pesquisa poderia contribuir para a melhoria do padrão

educacional ali estabelecido. Não atribuíram, portanto, obstáculos para qualquer tipo de

intervenção (aplicação de questionário, entrevistas e observações). Os alunos aceitaram de

bom grado a proposta e mostraram interesse em saber mais sobre a pesquisa em si e sobre a

vida acadêmica da pesquisadora (que antes era vista somente como supervisora da escola).

Período exploratório: Durante a atuação como supervisora escolar, nesta instituição

de ensino, foi possível observar os pontos frágeis no ensino da Matemática e dialogar com

pais de alunos licenciados em Matemática sobre esta questão. Os professores desta disciplina

vêm participando de cursos e palestras dentro e fora da instituição em que trabalham. Com

freqüência, nas reuniões pedagógicas e nas conversas descontraídas durante a hora da

merenda, refletiu-se sobre a aprendizagem dos alunos em relação à Matemática e o modo

como se poderia auxiliá-los. Uma das idéias concretizadas foi a contratação de uma aluna

74

finalista do curso de Matemática da Universidade Federal do Amazonas, na intenção de que a

mesma pudesse dar suporte para o trabalho diário da professora titular e ajudasse os alunos

que apresentassem dificuldade de aprendizagem. Durante esse período de atenção mais

sistemática sobre o ensino da Matemática, pôde-se constatar que, apesar da proposta da

direção da escola em contratar professores licenciados nas áreas em que atuam, havia, ainda,

uma média, de 4 a 6 alunos de cada série da 1ª etapa do ensino fundamental com dificuldades

de aprendizagem em Matemática. Porém, verificou-se que somente nas 4ªs séries (atual 5º.

ano) estas dificuldades persistiam ao ponto de levar os alunos a realizarem “avaliações

paralelas” oportunizando a obtenção da média (7,0). A preparação dos alunos para estas

avaliações era feita durante duas ou três aulas de revisão de conteúdos, com toda a turma, sem

a preocupação direta com as dificuldades de aprendizagem dos alunos que ficaram em

“paralelas”. Melhor dizendo, não havia um tempo específico, para estes alunos, a fim de

ajudá-los na superação de suas dificuldades, preparando-os para executarem as avaliações

paralelas, devido ao fato de não haver uma estrutura apropriada para tal: espaço físico e

contratação de professores para este fim.

A singularidade do sistema desta escola em contratar professores licenciados ou

cursando licenciatura em disciplinas específicas, para lecionar desde a 1ª série do Ensino

Fundamental, aguçou a minha curiosidade para a realização desta pesquisa a fim de investigar

sobre os benefícios deste fato no processo de ensino e aprendizagem da Matemática.

Fase de investigação focalizada: Esta fase compreendeu três etapas, sendo a primeira,

o período de observação que teve início no dia 08 de maio de 2006 e término no dia 20 de

agosto de 2006 (correspondendo ao 2º trimestre letivo), sendo que do total de 65 aulas

previstas, 50 aulas foram assistidas, não integralizando o total previsto devido aos feriados,

recessos ocasionados por ocasião da Copa, ensaios para a festa junina e recesso escolar. Este

período foi assim determinado devido aos seguintes fatores: 1) O 2º trimestre compreende a

fase intermediária do ano letivo, sendo considerado um período propício para a realização da

investigação, pois o 1º trimestre é quando os alunos ainda estão se adaptando à nova série e

passando pela revisão dos conteúdos da série anterior, e o 3º trimestre é considerado um

período conturbado pela ânsia dos alunos em recuperar a média baixa decorrida dos trimestres

anteriores e pela angústia de pais e professores com relação às notas baixas dos alunos; 2) O

2º trimestre é o período em que o aluno já está familiarizado ao sistema, aos colegas e ao

professor; 3) O aluno traz conhecimentos adquiridos do trimestre anterior como pré-requisitos

para os conteúdos que irá aprender durante o 2º trimestre; 4) É um trimestre entrecortado com

75

feriados, datas comemorativas relevantes (dia das mães, festa junina, Festival Folclórico de

Parintins, dia do estudante, dia dos pais, Copa do Mundo de Futebol (no ano de 2006) e

recesso escolar; 5) É quando se define a situação acadêmica do estudante (possibilidade de

aprovação definitiva ou reprovação). A segunda etapa do período de investigação focalizada,

foi denominada como período de intervenção (1º momento), ou seja, foi o período em que a

pesquisadora assumiu a sala de aula durante os últimos dez dias do ano letivo, fazendo as

intervenções necessárias para a coleta de dados. E finalmente a última etapa, denominada de

intervenção (2º momento), consistiu na aplicação de um rol de exercícios para alunos que

ficaram em Exame Especial a fim de captar pequenas dúvidas que acabavam prejudicando a

aprendizagem do aluno e a obtenção de média para aprovação.

3.3 CONTEXTO E PARTICIPANTES

A realização da pesquisa de campo aconteceu numa escola particular situada no

centro da cidade de Manaus, com alunos oriundos das diversas camadas sociais sendo, em sua

maioria, advindos de famílias cujos pais são funcionários públicos, autônomos ou políticos.

No ano em que foi realizada a pesquisa de campo(2006), esta escola atendia 936 alunos

distribuídos nos turnos matutino e vespertino; na Educação Infantil e Ensino Fundamental. É

uma escola católica, de cunho filantrópico, dirigida por uma religiosa com formação em

Pedagogia e Ciências Sociais. Por ser filantrópica, possuía várias atividades de assistência

social, sendo uma delas, bolsas de estudo, parcial e integral, para 234 alunos.

A referida escola foi escolhida por dois motivos: 1º) A pesquisadora atuava como

supervisora escolar há mais de uma década, portanto conhecedora da realidade educacional

desta instituição; 2º) A instituição possuía um sistema de ensino singular, ou seja, desde a 1ª

série do Ensino Fundamental as aulas são distribuídas por tempos de 50 minutos com

professores licenciados na disciplina que ministram.

Segundo a diretora, adotou-se este sistema por acreditar que o professor que possui

licenciatura plena na área em que atua ou em áreas afins teria maior probabilidade de ensinar

de forma eficaz, uma vez que se presume possuir empatia pela disciplina, domínio dos

conteúdos a serem ministrados, capacidade de seleção dos recursos didáticos apropriados para

cada conteúdo e elaboração de avaliações condizentes com o nível de aprendizagem dos

alunos.

76

No ano em que foi realizada a pesquisa de campo, havia um professor finalista em

Física que lecionava para as 1ªs e 2ª s séries e uma professora licenciada em Matemática que

lecionava para as 3ªs e 4ªs séries do Ensino Fundamental. Ambos possuíam, em média, 4 anos

de vínculo trabalhista nesta escola, em período integral, fato este que deve ser ressaltado

como elemento positivo no processo educacional desta escola por haver mais professores

nesta situação.

A investigação foi realizada na 4ª série B do turno vespertino, com a participação de

23 alunos, sendo 14 meninas e 09 meninos na faixa etária entre 10 e 11 anos. Havia uma

aluna repetente, um aluno novato e os demais estudavam, em média, há 8 anos nesta escola. O

turno vespertino foi escolhido em função da disponibilidade de tempo da pesquisadora e, a

turma selecionada obedeceu aos seguintes critérios: 1º) A professora era licenciada em

Matemática e possuía 05 anos de atuação na instituição; 2º) Indicação da própria professora,

uma vez que foi apontada como a turma cujos alunos apresentavam maior dificuldade de

aprendizagem.

3.4 PROCEDIMENTOS E INSTRUMENTOS DE COLETA DE DADOS

Foram utilizados como instrumentos para a coleta de dados: observação participante

assistemática, documentos, entrevistas, dinâmicas e exercícios xerocopiados.

A observação participante assistemática foi realizada diariamente, durante o 2º

trimestre letivo (08 de maio a 20 de agosto de 2006). O objetivo da realização da observação

participante era o contato direto da pesquisadora com a realidade dos atores sociais em seu

próprio meio, estabelecendo uma relação direta com os observados, podendo modificar e ser

modificado pelo contexto. Deste modo, foi possível captar uma variedade de situações que

não seriam obtidas por intermédio da aplicação de outros instrumentos de coleta de dados.

Os dados foram registrados no diário de campo, servindo como instrumento posterior

de análise. Nele foram registradas as percepções, questionamentos e informações que

ocorreram durante os 50 minutos de cada aula. As observações foram assistemáticas (não-

estruturadas), “[nas quais] os comportamentos [...] observados não são predeterminados, eles

são observados e relatados da forma como ocorrem, visando descrever e compreender o que

está ocorrendo numa dada situação” (ALVES-MAZOTTI, 1998). Segundo a autora, este tipo

de observação é a mais comum em pesquisas qualitativas. Embora não haja um roteiro

77

específico para a realização das observações ou até mesmo um formulário contendo tópicos

pré-determinados, foram levadas em conta as seguintes dimensões de análise: relação

professor-aluno; metodologia de ensino; a inter-relação disciplinar; recursos utilizados;

sistema de avaliação; ambiente físico; sistema de ensino da instituição, comportamento dos

alunos em sala e nível de aprendizagem.

Como já foi ressaltado anteriormente, o grau de intervenção da pesquisadora, durante

o período de observação, foi o mínimo possível, restringindo-se a tirar dúvidas dos alunos,

quando solicitada, durante a realização de exercícios. Uma única vez foi proposto pela

pesquisadora, a utilização de materiais concretos (garrafas pets e fichas coloridas) para uma

aula sobre frações.

As entrevistas fizeram parte da observação participante, apresentando caráter

informal, com o intuito de compreender o significado atribuído pelos sujeitos (professora e

alunos) em relação às dimensões anteriormente apontadas.

Neste período também foram consultados os seguintes instrumentos: regimento

escolar, projeto político pedagógico, plano de ensino, planos de aula, avaliações (testes e

exercícios) e livros didáticos.

Um segundo momento da pesquisa aconteceu durante os dez últimos dias do ano

letivo (20 a 30 de novembro/06), com a intervenção direta da pesquisadora em sala de aula.

A professora titular da turma atuou como espectadora das aulas durante este período de

intervenção. Este momento foi avaliado como necessário para melhor apreensão da

problemática estudada, uma vez que as observações realizadas não foram suficientes para

detectar os principais fatores que interferiram no processo ensino-aprendizagem da

Matemática. Deste modo, após diálogo com a professora, ficou acordado que as intervenções,

pela pesquisadora com os alunos, seriam realizadas nas duas últimas semanas de aula, por se

tratar de um período onde todos os conteúdos já haviam sido ministrados, não prejudicando o

seu planejamento escolar.

As aulas de intervenção foram planejadas de acordo com alguns conteúdos

ministrados durante o ano, visando a relação interdisciplinar entre a Matemática e a Língua

Portuguesa, e levando em consideração a vivência dos alunos. Foram utilizadas dinâmicas

criadas pela pesquisadora e situações-problema apresentados por alguns autores que fizeram

parte do referencial teórico desta pesquisa.

78

Outro fator determinante foi constatar a possibilidade ou não de realizar tais

atividades num tempo de aula de 50 minutos (o que parecia muito curto para atividades

práticas).

Com este procedimento, a teoria pôde ser vivenciada na prática, no contato direto

com os alunos, preenchendo algumas das lacunas deixadas pelas observações. Houve, porém,

a necessidade de detectar pormenores, detalhes, que ficaram nas entrelinhas quanto às

dificuldades apresentadas pelos alunos no momento da execução de um exercício ou prova

escrita. Neste momento, o olhar da pesquisadora voltou-se principalmente para um grupo

composto de seis alunos que, durante todo o ano, não conseguiu bom rendimento em

Matemática, apresentando notas abaixo da média. Este grupo permaneceu na Recuperação

Especial (que será descrita mais adiante) após o término do ano letivo e, mesmo após a

finalização deste período, não conseguiu aprovação, ficando para o Exame Especial. Este

exame consta de uma prova escrita com os conteúdos da Recuperação Especial, realizado no

final do mês de janeiro. Caso não conseguisse média, seriam reprovados, tendo que cursar a

mesma série novamente, no ano seguinte. A dependência beneficia somente os alunos de 5ª

série em diante. Deste grupo, três alunos participaram da 2ª etapa da intervenção, realizada

após o término da Recuperação Especial. A 2ª etapa, consistiu na execução de um rol de

exercícios parecidos com os que haviam cometido erros nas provas de recuperação. O

procedimento adotado para a execução deste exercício foi a solicitação de que fizessem os

exercícios verbalizando cada procedimento de execução e as dúvidas que surgissem. Deste

modo, conseguiria visualizar melhor as dificuldades para fazer a intervenção direta sobre as

dúvidas. Os outros três alunos não participaram desta etapa pois, dois deles passaram por

arredondamento de média (obtiveram 6,9 com arredondamento automático do sistema para

7,0) e com uma aluna não foi possível estabelecer contato telefônico com os pais. É

interessante verificar que os três alunos participantes apresentaram dificuldade de

relacionamento com a professora durante o ano e possuíam idade incompatível com a série

que cursaram, ou seja, pela idade, deveriam ter cursado a 3ª (9 –10 anos) e não a 4ª série (10-

11 anos).

3.5 ANÁLISE DE DADOS E CRITÉRIOS PARA MAXIMIZAR A CONFIABILIDADE

Com base em Minayo (1992), a análise de dados teve como finalidade compreender

os dados coletados e responder aos objetivos formulados na pesquisa, ampliando o

79

conhecimento sobre o assunto pesquisado, em articulação com o contexto cultural do qual a

intervenção faz parte.

Partindo dos dados coletados, foram estabelecidas as categorias de análise,

contribuindo para o estabelecimento de um caráter mais específico e concreto da pesquisa.

Ressalta-se que o processo de análise foi realizado durante toda a investigação,

através de teorizações progressivas, em um processo interativo com a coleta de dados.

Os critérios utilizados para maximizar a credibilidade da pesquisa (ALVES-

MAZOTTI, 1998, p.172), foram os seguintes:

A Permanência prolongada no campo foi favorecida pelo fato da pesquisadora

desenvolver sua atividade profissional na instituição, o que lhe permitiu um conhecimento

aprofundado sobre as questões inerentes ao sistema daquela instituição. Entretanto, com o

objetivo específico para a investigação focalizada, sua permanência, como foi dito

anteriormente, na sala da 4ª série B, foi durante o 2º trimestre. Ao término deste trimestre

foram contados os dias efetivos em que foram realizadas as observações, uma vez que este

período foi entrecortado por feriados, festas e recesso escolar.

“Checagem” por participantes: Durante a realização da pesquisa, ocorreram

verificações parciais junto à professora da sala para checar as informações obtidas pela

pesquisadora. Ao final do período das observações, foram apresentados os resultados, para

avaliação quanto à precisão e relevância dos dados obtidos. Deste modo, concluiu-se que

haveria a necessidade de uma intervenção direta da pesquisadora junto aos alunos, com

atividades específicas direcionadas para a coleta de dados uma vez que não foram suficientes

as observações.

Questionamento por leitor(a) crítico(a): O trabalho foi lido e analisado pela

professora-orientadora da pesquisa a fim de colaborar na avaliação dos dados, apontando

falhas, identificando dimensões não exploradas e sugerindo alternativas para seu

aprimoramento.

Triangulação: Foi feita a triangulação dos dados, partindo da organização dos

mesmos, com a interligação entre as observações descritas no diário de campo, as entrevistas

realizadas, os documentos consultados e as aulas de intervenção no final do ano letivo,

80

levando-se em consideração o sistema de ensino da instituição e a concepção de ensino da

professora da turma investigada.

Para conduzir a análise de dados, foram eleitas as seguintes categorias:

a) Os conteúdos de Matemática e a inter-relação disciplinar: o ensino realizado na

escola foi analisado à luz da proposta dos autores que dialogam nesta pesquisa, como Smole e

Diniz (2001), Carvalho (2005), Moysés (1997) entre outros que valorizam o aspecto

significativo, contextualizado e interdisciplinar da Matemática, principalmente no que se

refere à Língua Materna.

b) Relação professor-aluno: esta categoria de análise refere-se diretamente à

maneira como a professora conduziu suas aulas, que tipo de relação estabeleceu com seus

alunos. O olhar esteve voltado para as nuances de comportamento entre os atores (professora

e aluno) no que diz respeito ao ensino e aprendizagem: Como se deu a relação (professora e

alunos) diante das dificuldades apresentadas pelos alunos? Como os alunos expuseram suas

dúvidas e dificuldades? A relação entre professora e alunos apresentava-se como de

confiança, segurança e amizade? Estas e outras perguntas conduziram a análise desta relação.

Sabe-se que a aprendizagem não é regida somente pelo cognitivo, mas também pela carga

emocional oriunda da relação entre aquele que aprende e aquele que ensina.

c) Nível de aprendizagem: Nesta categoria o foco é o próprio aluno, ou seja, sua

relação com os conteúdos apresentados (nível de significação, dificuldades e sucessos), com

as atividades propostas e com os recursos utilizados. Considerou-se também seu sentimento

em relação à Matemática e a quem a ministra. Outro ponto fundamental a ser destacado é o

apoio dos pais ou pessoas contratadas (aulas de reforço) para acompanhar os alunos em seu

processo de aprendizagem. As notas das avaliações foram consideradas, porém com certa

ressalva, pois acredita-se que a aprendizagem não se resume ao momento único da avaliação

escrita. Ressaltamos que, durante o período de observações e intervenção, toda a turma foi

envolvida. Entretanto, buscamos identificar o grupo de alunos que obteve baixo rendimento

durante o ano, ficando em Recuperação Especial durante a primeira quinzena do mês de

dezembro por não ter alcançado a média. Este grupo era composto de 4 meninos e 2 meninas

(uma delas, repetente). A Recuperação Especial é um período em que são ministradas aulas

diariamente com duração de 90 minutos. Os conteúdos da Recuperação foram selecionados

pela professora antes do início da mesma, seguindo como critério a importância da

81

aprendizagem dos pré-requsitos para a série seguinte, e repassados, em forma de listagem,

para os alunos e pais dos alunos no primeiro dia de aula. Durante a recuperação, os conteúdos

foram ministrados em forma de aulas expositivas e proposição de vários exercícios, no

caderno, visando a aprendizagem dos mesmos. Ao término de cada semana (duas semanas de

aula) foi realizada uma avaliação que, após a soma, obteve-se uma média que foi adicionada à

média anual e dividida por dois. No decorrer da análise se fará menção a este grupo de alunos

e as dificuldades apresentadas na execução dos exercícios propostos nas avaliações.

Destacamos, portanto, que cada categoria será analisada à luz dos teóricos

apresentados no referencial.

82

4. ANÁLISE DOS DADOS

Este momento visa coroar a pesquisa, buscando-se, na análise dos dados, contemplar

a relação existente entre os objetivos propostos, as questões norteadoras e a análise dos dados

coletados, através das observações, entrevistas e intervenções, à luz dos teóricos abordados no

referencial, levando-se em conta as categorias de análise propostas: os conteúdos

programáticos e a inter-relação da Matemática com outra disciplina escolar; relação

professor/aluno e nível de aprendizagem dos alunos.

A princípio, é necessário enfatizar que estas categorias de análise foram propostas com

base na abordagem sócio-interacionista que percebe o homem como um ser social que

constrói sua própria história e do meio que o rodeia na medida em que interage e transforma

este meio. Nesta perspectiva, o objeto de análise, no caso a Matemática, não pode ser

analisado como um elemento isolado de um contexto maior. A Matemática é um elemento

que pertence à estrutura curricular de uma instituição de ensino (particular ou pública) que

possui um regimento e um projeto político pedagógico elaborado pela comunidade educativa

desta escola. Neste espaço atuam alunos que aprendem, professores que ministram conteúdos,

pais de alunos que anseiam por bons resultados de aprendizagem e técnicos (diretor,

pedagogos, psicólogos etc) que orientam todo este processo. Além disso, estas pessoas

possuem sua própria história de vida, formação profissional, anseios, desilusões e vitórias em

relação ao nosso objeto de estudo: a Matemática. O modo como ela é ensinada ou aprendida,

depende de cada um dos elementos até aqui mencionados. Ela faz parte de uma rede de

relações e situações. Não está solta no tempo e no espaço.

Portanto, antes da análise das categorias se faz necessário mencionar o contexto

escolar no qual a Matemática está inserida.

O sistema de ensino desta instituição adota uma postura tradicional, propondo horários

fixos para cada aula (5 tempos de aula a partir da 1ª série do Ensino Fundamental), conteúdos

83

programáticos elaborados pelos professores e aprovados pelo Conselho Estadual de Educação,

e apoio de livros didáticos e exercícios xerocopiados para o ensino destes conteúdos, com

tarefas escolares (nos livros e cadernos) em sala e em casa para fixação dos mesmos. As

aulas, em sua grande maioria, eram expositivas, com pouca utilização de recursos didáticos

(jogos, materiais pedagógicos, materiais alternativos e dinâmicas) e participação ativa dos

alunos. As aulas praticamente se restringiam à correção de exercícios de casa feitos no dia

anterior, e a fazer outros exercícios em sala. Quando havia conteúdo novo, a professora

expunha o assunto, com muita segurança, utilizando a lousa. Após a explicação, perguntava

sobre as dúvidas a fim de esclarecê-las.

Uma das principais características desta instituição era a distribuição em tempos de

aula de 50 minutos para cada disciplina escolar, a partir da 1ª série do Ensino Fundamental

(crianças de 7 anos), com professores licenciados na área em que atuam e com formação em

magistério. Por um lado, esta opção de ensino apresenta pontos propícios à aprendizagem,

pressupondo-se que o professor, licenciado em sua área de atuação, está preparado para

ministrar aulas com segurança e competência, aí incluindo a escolha da metodologia e

recursos apropriados a um ensino de qualidade. Por outro lado, a fragmentação dos conteúdos

em tempos de aula, inviabiliza procedimentos que demandam mais tempo para sua execução,

tais como: dinâmicas com jogos de regras, atividades de recorte e colagem etc. Na verdade, o

tempo real de aula reduz-se a 30 minutos aproximadamente, se contar com o tempo que o

professor leva para deslocar-se de uma sala para outra, organizar a turma para sua aula e

corrigir as tarefas passadas em sala no dia anterior. Este fato acaba por conduzir o professor a

uma postura mais “prática e rápida” para gerenciar seu tempo e cumprir com o plano de

ensino, optando por aulas expositivas e exercícios. Porém, seria necessário um

acompanhamento pedagógico efetivo tanto durante as reuniões realizadas uma vez ao mês,

quanto durante as aulas para auxiliar e orientar o professor neste processo. Este

acompanhamento, por sua vez, era impossibilitado pela sobrecarga de tarefas que a

supervisora escolar tinha em sua jornada de trabalho, pois a equipe pedagógica era composta

somente por duas pessoas.

Verificou-se que a maioria dos alunos possui professor de reforço, não com o intuito

de ensinar o que não conseguiu assimilar em sala, mas para auxiliá-los nas tarefas de casa,

uma vez que os pais trabalhavam o dia todo.

84

Quanto à utilização de livros didáticos e exercícios xerocopiados, constatou-se que a

base do ensino estava na utilização dos mesmos, além da complementação de exercícios

escritos no caderno. Para o ensino da Matemática foram utilizados dois livros: “Porta-

Aberta”, da Editora FTD e, “Caderno do Futuro”, da Editora IBEP. O primeiro estava

estruturado numa perspectiva contextualizada, interdisciplinar e desafiante dos conteúdos, na

medida em que estimulava o raciocínio-lógico dos alunos. O segundo apresentava uma

perspectiva tradicional, propondo uma série de exercícios mecânicos sobre cada item

abordado. Era um livro sem explicações sobre conteúdos, simplesmente com muitos

exercícios para serem efetuados. A preocupação da professora e da escola em adotar ambos os

livros era de proporcionar os dois momentos para os alunos: raciocinar de forma

contextualizada e exercitar o mecanismo dos conteúdos através de exercícios de fixação.

Além da proposta dos livros didáticos, o caderno pautado também era muito utilizado, pela

professora, como recurso didático, ao colocar na lousa mais exercícios de fixação sobre cada

conteúdo trabalhado. Em alguns momentos, como foi o caso de simplificação de frações,

foram passadas 40 frações para serem simplificadas e corrigidas no dia seguinte. Pelas

observações e entrevistas realizadas com os alunos, pôde-se constatar que eles não

apreciavam este número exagerado de exercícios, alegando que era cansativo e que tinham

tarefas de outras disciplinas para fazer. Portanto, as aulas praticamente se resumiam à

exposição do assunto, realização de exercícios de fixação (caderno pautado e livros) e

correção dos mesmos. Foram poucos os momentos, durante este período, em que um outro

recurso didático foi utilizado. Não foi presenciado aulas envolvendo jogos e brincadeiras. Esta

rotina acabava por tornar as aulas monótonas, embora a professora tivesse um excelente

domínio sobre os conteúdos programáticos. As explicações que fazia utilizando o quadro

eram bem detalhadas, possibilitando, naquele momento, o entendimento dos conteúdos pelos

alunos. Porém, ressaltamos a necessidade de dinamização das aulas para a real apropriação do

saber matemático direcionando-o não somente para a execução correta de exercícios, mas

para a aplicação prática dos conteúdos em situações do cotidiano.

De acordo com o Regimento Escolar, era estipulado o mínimo de quatro avaliações

por trimestre, podendo ser avaliações escritas com conteúdos cumulativos, avaliações orais,

exercícios avaliativos, trabalhos realizados em sala e em casa, participação, pesquisas,

seminários etc. No caso específico da Matemática, normalmente eram aplicadas duas

avaliações escritas com conteúdos cumulativos (datas previamente marcadas), um exercício

avaliativo que, normalmente, se restringia a um rol de problemas matemáticos, e um trabalho

85

proposto no livro didático, realizado em sala de aula. Este último podia ser substituído por

avaliações quanto à participação dos alunos e/ou sobre a verificação das tarefas realizadas em

sala e em casa (critérios e ficha de controle elaborados pela professora). Durante as

observações, pudemos contemplar a ênfase em exercícios mecânicos, ou seja, não

contextualizados. Porém, no momento da avaliação escrita, os exercícios apareciam em forma

de situações-problema. Estas eram praticadas, vez ou outra, com a utilização do livro Porta

Aberta, mas não era uma prática constante a fim de contribuir para a aprendizagem

significativa. Como o aluno foi “treinado” para responder de determinada forma, ele ficava

inseguro sobre como aplicar o que aprendeu na situação-problema apresentada. Deste modo,

não alcançava a média (7,0) ocasionando tristeza, indignação, repulsa pela disciplina e,

conseqüentemente, desinteresse por entender que dificilmente conseguirá aprender de forma a

realizar uma boa avaliação. Se, após as quatro avaliações, o aluno não alcançava a média, ele

era submetido à Avaliação de Recuperação Paralela no final de cada trimestre. Não

alcançando a média anual (21 pontos), ele deveria participar da Recuperação Especial durante

a primeira quinzena de dezembro. Caso não conseguisse obter a média nesta recuperação, o

aluno poderia participar do Exame Especial que aconteceria no mês de janeiro, contendo os

assuntos trabalhados durante a Recuperação Especial. Não alcançando a média 7,0 no Exame

Especial, ele seria automaticamente reprovado.

Quanto ao apoio pedagógico, acreditamos que seria interessante a oferta de um do tipo

“tira-dúvidas”, em horário oposto ao de aula. Porém, a escola não possuía espaço físico para

oferecer este serviço. Em contrapartida, contratou uma finalista do curso de Matemática para

auxiliar os alunos durante a aula, retirando da sala, quando possível, os alunos que possuíssem

dificuldades na aprendizagem, a fim de corrigir os exercícios junto com eles e identificar suas

dúvidas. Este auxílio paralelo era adequado, mas não foi realizado de forma sistemática, pois

a professora auxiliar também substituiu professores que faltaram ao trabalho. Como foi

mencionado, o apoio pedagógico era realizado de forma particular, pelos pais de alunos, que

colocavam seus filhos em “aulas de reforço”. No entanto, essas aulas de reforço funcionavam

mais como um auxílio às tarefas de casa e trabalhos de pesquisa do que como um reforço no

que se refere à eliminação das dúvidas.

Constava no Regimento Escolar que a instituição dispunha do Serviço Técnico-

Pedagógico e Psicológico, tendo por finalidade acompanhar as ações pedagógicas e

psicológicas da mesma. Este serviço deveria ser composto por profissionais habilitados em

Pedagogia (Orientação Educacional e Supervisão Escolar) e Psicologia (Psicólogos). Porém,

86

na realidade, este setor conhecido como Coordenação Pedagógica era composto por duas

pedagogas: uma supervisora que trabalhava em turnos alternados, acumulando as funções da

Orientação e da Supervisão; e uma assessora pedagógica, também em turnos alternados, que

auxiliava a direção nas decisões, coordenava a elaboração das avaliações pelos professores e

averiguava a atribuição de notas. Segundo o Regimento, as atribuições do Orientador

Educacional compreendiam 18 itens, dentre eles: planejar, organizar, coordenar, dirigir,

controlar e avaliar o serviço de Orientação Educacional; coordenar o processo de sondagem

de interesses, aptidões e habilidades do educando, dentre outros. As atribuições do Supervisor

Escolar eram descritas em 16 itens, dentre os quais podemos citar: coordenar as atividades

didático-pedagógicas, orientando o seu desenvolvimento e corrigindo possíveis desvios;

acompanhar, controlar e avaliar o desenvolvimento ou execução do currículo; acompanhar,

controlar e avaliar os resultados do processo ensino-aprendizagem, dentre outros. Sendo a

Coordenação Pedagógica exercida somente por duas Pedagogas para 936 alunos, Educação

Infantil e Ensino Fundamental, havia uma sobrecarga de atividades: verificação das listas de

presença e planejamentos; atendimento a pais sobre o desenvolvimento de seus filhos;

atendimento a outras pessoas que procuravam o setor (representantes de livros, pais de alunos

de outras escolas que solicitavam informações sobre a escola em estudo etc); atendimento aos

alunos que apresentavam comportamentos inadequados em sala de aula; acompanhamento das

aulas; orientação aos professores e pais; realização de reuniões pedagógicas; estímulo à

formação continuada dos professores; elaboração de bilhetes, circulares etc. Com o acúmulo

de atribuições e devido ao sistema de troca de professor a cada 50 minutos, o

acompanhamento diário e sistemático dos conteúdos ministrados, bem como o

acompanhamento do professor e do aluno em sala de aula, ficava bastante prejudicado.

4.1 FASE DE INVESTIGAÇÃO FOCALIZADA E CATEGORIAS DE ANÁLISE

Este momento foi organizado de forma que a análise das categorias (conteúdos

programáticos e sua inter-relação com outras disciplinas; relação afetiva entre professor e

alunos; nível de aprendizagem) acontecesse simultaneamente, seguindo as etapas do

desenvolvimento da pesquisa de campo no que se refere à coleta de dados, uma vez que tais

categorias estão interconectadas.

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1ª ETAPA: PERÍODO DE OBSERVAÇÃO

Esta etapa aconteceu durante o segundo trimestre letivo de 2006 (08 de maio a 20 de

agosto), utilizando-se como instrumentos de coleta de dados a observação participante

assistemática, entrevistas informais com alunos e consulta de documentos.

A turma era formada por 23 alunos sendo 14 meninas e 09 meninos, dentre eles, uma

aluna repetente e um aluno novato; a maioria estudava nesta escola desde o maternal, portanto

se conhecia há pelo menos 8 anos. Por um lado, isto era bom pela amizade instaurada entre os

alunos, por outro, havia formação de “panelinhas” difíceis de serem desarticuladas. Uma delas

era formada por um grupo de 06 meninos que apresentavam dispersão nas aulas, com

conversas ou brincadeiras; dentre eles somente um conseguiu aprovação direta, os demais

ficaram em Recuperação Especial. Entre as meninas, duas delas (uma é repetente)

demonstraram muita dificuldade na aprendizagem dos conteúdos de Matemática, também

ficando em Recuperação Especial. É importante frisar que embora soubesse das condições

particulares da vida familiar de alguns desses alunos, condições estas que podiam, de algum

modo, prejudicá-los no processo de aprendizagem, não se tem como objetivo da pesquisa a

análise destas condições.

A professora que lecionava para a turma era uma pessoa com mais de 40 anos,

experiente e com licenciatura em Matemática. Demonstrava segurança ao repassar os

conteúdos, porém não tinha o hábito de utilizar estratégias diferenciadas ou recursos didáticos

variados em suas aulas, argumentando que o tempo era muito escasso para tal. Conseguia

manter a disciplina dos alunos, mas tinha momentos que demonstrava certa rispidez em sua

fala ao chamar a atenção dos mesmos.

Quanto à sala de aula, apesar de ser espaçosa, era localizada entre o pátio externo

(parque infantil e espaço para festas de aniversários) e interno (para realização de datas

comemorativas e outras atividades), o que dificultava ainda mais a concentração destes

alunos.

Caracterizado os atores e o espaço da sala de aula, se faz necessária a apresentação dos

conteúdos programáticos a fim de adentrarmos na análise das categorias.

Os conteúdos programáticos para a 4ª série (5ª.série) do Ensino Fundamental,

aprovados pelo Conselho Estadual de Educação, estavam distribuídos em 20 unidades:

88

conjuntos, sistema de numeração decimal, números romanos, números ordinais, geometria,

expressões numéricas, operações do números naturais, sentença matemática, seqüências e

divisores, números primos, múltiplos e divisores de um número natural, representação

fracionária de números inteiros e operações, representação fracionária dos números decimais

e operações, sistema monetário, porcentagem, medidas (massa, comprimento, volume,

capacidade, tempo), gráficos e medidas aritméticas. Os conteúdos da 5ª série (6ª. série)

estavam distribuídos em 13 unidades: conjuntos e operações com conjuntos, correspondência,

números naturais, operações em N, sistema de numeração, seqüências e divisores, MMC,

MDC, potenciação, números fracionários, números decimais, sistema métrico decimal e

construções geométricas (planas, tridimensionais, áreas e perímetros). Verifica-se, portanto,

que há uma sobrecarga de conteúdos na 4ª série em relação a 5ª série, o que não deveria

acontecer, considerando a maturidade e o desenvolvimento cognitivo apontados por Piaget em

sua teoria das fases do desenvolvimento, ou seja, a criança de 4ª série do Ensino Fundamental

regular encontra-se na faixa etária entre 9/10 e 11 anos (fase das operações concretas)

enquanto que a criança de 5ª série, do mesmo segmento de ensino, estaria entrando na fase do

desenvolvimento das operações formais quando o nível de abstração é maior. No entanto,

durante a pesquisa de campo, realizada no decorrer do 2º trimestre/06, constatou-se que os

alunos da 4ª série, já haviam aprendido MMC, MDC, potenciação e radiciação logo no 1º

trimestre. A explicação dada pela professora foi que estes conteúdos são seqüenciais aos

conteúdos de múltiplos e divisores de um número natural, trabalhados em março/06. Os

alunos conseguiram, baseados em modelos de mecanismos de execução dos exercícios

matemáticos, aplicá-los em outros exercícios semelhantes. Porém, ao propor situações-

problema que envolvessem tais conteúdos, a dificuldade de resolução era notória. Com este

fato, se poderia inferir que uma das possíveis causas da dificuldade em aprender matemática

estaria atrelada aos conteúdos programáticos que estavam além do nível de assimilação dos

alunos uma vez que, segundo a teoria do desenvolvimento cognitivo de Piaget (1975), a

maioria deles estaria no período operacional concreto e não das operações formais, ou seja, no

período operacional concreto a criança ainda necessita muito do apoio do material concreto e

situações concretas relacionadas ao seu cotidiano para processar as informações (assimilação

e acomodação dos conhecimentos adquiridos para utilizá-los em novas situações –

adaptação). Como argumenta Wadsworth (1984, p. 71), baseado na teoria piagetiana, [...] o

pensamento [operacional concreto] ainda está estreitamente ligado ao concreto e vinculado

à percepção [...].

89

No caso dos conteúdos ensinados no 1º trimestre (MMC, MDC, potenciação,

radiciação, múltiplos e divisores de um número e números primos) não se fez menção alguma

sobre sua aplicabilidade ou significação para a vida dos alunos. Para Vygotsky (1993),

significado e sentido estão relacionados à linguagem e pensamento. Em outras palavras, é

necessário atribuir significado e sentido aos termos matemáticos que são ensinados a fim de

que haja uma aprendizagem significativa. Geralmente a razão dada para o ensino de

determinado conteúdo, é o fato de que “cairá na prova” ou que será importante como “pré-

requisito” para outros conteúdos. Deste modo, o ensino acaba sendo uma prática

descontextualizada, sem ligação com a vida do aluno. Além disso, segundo Piaget (1978), o

conhecimento lógico-matemático é um conhecimento abstrato, inventado a partir das ações

sobre os objetos, no caso em estudo, a ação se restringe à ação do professor no ato das

explicações. Não há a interação concreta do aluno com o objeto da Matemática ou situações

concretas onde o aluno poderia vislumbrar sua aplicabilidade. Vejamos a seguinte situação-

problema retirada do livro didático “Projeto Pitanguá”, 4ª série, da Editora Moderna:

Depois desta situação-problema, o livro sugere alguns exercícios sobre múltiplos e

outra situação-problema. O professor, partindo do exemplo das embarcações, poderia sugerir

que seus alunos formulassem (individualmente ou em duplas) outras situações semelhantes a

fim de verificar a aplicabilidade do conteúdo ministrado. Veja que esta situação-problema

envolve uma realidade de nossa cidade vivenciada por muitas pessoas. Esta mesma situação

poderia ser transferida para os ônibus da rodoviária da cidade de Manaus. Inclusive seria

interessante trabalhar a inter-relação disciplinar com conteúdos sobre os meios de transporte,

comércio, turismo, trabalho etc. Outra sugestão seria que visitassem o porto de Manaus e a

rodoviária a fim de, não só conhecerem a realidade do local e seu entorno, como também

listar os horários de saídas de embarcações e ônibus para desenvolver atividades matemáticas

Do porto da cidade de Manaus partem várias embarcações de transportes de cargas ou pessoas, inclusive turísticas. Imagine que do porto de Manaus partam embarcações de transporte de pessoas a cada 20 minutos e embarcações turísticas a cada 45 minutos. Duas embarcações, uma de cada tipo, partiram juntas. Quanto tempo depois as duas embarcações partirão juntas novamente?

TEMPO DE PARTIDA (min.) Embarcação de pessoas 20– 40 – 60 – 80- 100-120-140-160-180-200 Embarcações turísticas 45 – 90 – 135 - 180

M(20): 20,40,60,80,100,120,140,160,180,200. M(45): 45, 90, 135, 180. O menor múltiplo comum (MMC) entre 20 e 45 é 180. As embarcações voltarão a partir simultaneamente depois de 180 minutos.

90

(tabelas, MMC, porcentagem) e interdisciplinares (relatório de visita, histórico do porto,

poluição do Rio Negro, trabalho dos pescadores, relação de compra e venda do pescado etc).

Para tanto, é necessário que o planejamento seja bem estruturado, numa relação

interdisciplinar, envolvendo outros professores da instituição e com um apoio pedagógico

presente. Porém, o corpo docente precisa também estar disposto a desenvolver um trabalho

integrado, pois sabemos que não é tão simples preparar um planejamento nestes moldes. Além

disso, deve-se levar em conta a concepção de ensino que o professor tem referente à

Matemática.

Com relação a este ponto, pudemos verificar, através das observações e nas entrevistas

(informais) realizadas com a professora da turma que, embora seu discurso seja favorável a

uma metodologia de ensino baseada em princípios construtivistas, sua prática diária

demonstra uma postura conservadora e resistente a inovações. Argumentava que o tempo de

aula de 50 minutos era muito curto para fazer dinâmicas e utilizar recursos. Deste modo, os

alunos tornam-se meros reprodutores dos conteúdos ensinados, sendo treinados com muitos

exercícios de fixação. O espaço para atuarem ativamente como construtores do saber

matemático era praticamente inexistente. Portanto, a concepção de ensino da professora, de

acordo com o seu discurso, era uma concepção baseada nos pressupostos construtivistas,

porém a prática era puramente conservadora (tradicional) devido, segundo a mesma, à

limitação do tempo de aula e da cobrança (do sistema) em passar exercícios de sala e de casa.

Acredito que até possa haver a preocupação com os níveis de desenvolvimento cognitivo dos

alunos propostos por Jean Piaget, e com a formação de conceitos expostos por Vygotsky, mas

as circunstâncias que envolviam o ensino da Matemática eram desfavoráveis. Deste modo, a

Zona de Desenvolvimento Proximal era mediada basicamente pelo professor através de aulas

expositivas e exercícios. Porém, nas respostas dadas pelos alunos, durante entrevistas

informais, em relação ao modo como a aula acontece, não apareciam objeções. Os alunos

argumentavam que a professora explicava bem, o modo como lecionava era rígido, mas

reclamavam da quantidade excessiva de exercícios a fazer. Quando questionados sobre a

utilização de recursos utilizados, não souberam responder, ou seja, não souberam argumentar

contra ou a favor sobre a utilização de recursos didáticos (jogos e materiais pedagógicos)

durante as aulas, uma vez que a experiência com este tipo de material foi praticamente nula.

Realmente, o que percebemos nas aulas de matemática é que a professora dominava os

conteúdos, demonstrando segurança em ensiná-los e preocupando-se com as dúvidas

apresentadas pelos alunos. Foi presenciado, por diversas vezes, sua preocupação em fazer

91

com que o aluno compreendesse, raciocinasse com lógica sobre os exercícios e não

exclusivamente de modo mecânico. Porém, sentimos que os conteúdos eram ensinados de

forma fragmentada. Para melhor esclarecimento sobre esta afirmação, devemos recorrer ao

período das observações realizadas em sala de aula. Durante este período, o único conteúdo

programático ensinado foi o sistema fracionário (tipos de frações, representação e operações),

até mesmo por sua extensa diversidade de conteúdos. Com foco na metodologia do ensino da

Matemática, neste período, faço algumas observações, aparentemente simples, mas

fundamentais para a compreensão do aluno e do processo de aprendizagem.

A primeira delas é que houve uma quebra brusca na passagem do conjunto dos

numerais naturais para o conjunto dos numerais racionais. É necessário que o aluno visualize

esta passagem (numa reta numérica, por exemplo) e o motivo pelo qual ela acontece,

envolvendo, inclusive, o histórico da origem da criação destes conjuntos: Por quem foram

criados? Por que foram criados? Em que momento da história da humanidade? Isto é situar o

aluno num momento histórico da civilização humana, refletindo sobre as necessidades que

surgiam motivando a criação de representações numéricas e operações matemáticas. É

essencial que o aluno entenda que a Matemática, assim como ele, possui uma história que

evolui até hoje. As frações, o sistema de medidas, os números, a contagem, o sistema

monetário, enfim, todos os conteúdos relacionados à Matemática, possuem um processo

histórico que evolui junto com a humanidade. A Matemática é, portanto, um produto social.

Há, na história da Matemática, dados interessantes que podem despertar a curiosidade

dos alunos. Temos, como exemplo, a criação do traço horizontal utilizado para separar o

numerador do denominador. Ele foi inventado pelos árabes no século XIII, baseado no

modelo de representação numérica indiana. O traço diagonal foi inventado pelos tipógrafos

mexicanos, em 1784 (OLIVEIRA, 2006).

Se o aluno não aprende a ver a Matemática como um produto da evolução da

sociedade, presente em seu cotidiano, como poderá concebê-la de forma prazerosa e

significativa para sua vida escolar e social?

Outro cuidado simples, mas fundamental, é o ensino do conceito de fração.

Geralmente o aluno aprende que fração é um pedaço do inteiro (o que não ocorreu nesta

instituição), porém este não é um conceito verdadeiro: a fração é parte de um inteiro, pois há

fração maior que um inteiro (frações impróprias). A fim de visualizar este conceito, é

92

interessante que o professor utilize a reta Q+. Vejamos um exemplo prático: Em que parte da

reta numérica fica a fração 5/2?

Geralmente a criança na fase operacional concreta, e, portanto, ainda perceptiva, vê o

numerador maior que dois e imediatamente responde que esta fração fica após o número 5, o

que não é verdade, pois transformando-a em fração mista, obtemos dois inteiros e um meio.

Portanto, a fração 5/2, na reta numérica, ficaria exatamente entre o número 2 e 3.

a b

Reta Q+ 0 1 2 5/2 3

É também fundamental que o aluno entenda que o conjunto dos números racionais é

representado pela letra Q que significa “quociente”, ou seja, o quociente é o resultado de uma

divisão. Além disso, deve-se informar ao aluno que este conjunto é uma ampliação do

conjunto dos números naturais. Por se tratar de um conjunto muito extenso, na 4ª série irão

lidar somente com os números positivos (Q+) diferentes de zero, ou seja, sendo a/b, sendo b

diferente de zero, pois a divisão por zero não é definida (zero não divide nenhum número).

Quanto à nomenclatura de algumas frações, pode gerar, na mente do aluno, a confusão

no sentido lingüístico: um terço (terço para rezar?), um sexto (cesto de roupa?).

Um outro fator, a meu ver extremamente importante, que contribui para uma visão

fragmentada e descontextualizada, é a maneira como os livros didáticos distribuem os

conteúdos de frações, números decimais e porcentagem separadamente. Como se um não

fosse parte integrante do outro. Ao aprender o sistema de frações, o aluno precisa visualizar

sua:

1. Representação gráfica. Exemplo: Há meia dúzia de laranjas sobre a mesa. Maria pegou

¼ delas para fazer laranjada. Nota-se que neste exemplo, Maria tomou ¼ de um todo.

Vejamos agora: Maria tomou ¼ de uma laranja. Aqui, Maria tomou ¼ de uma unidade que

pode ser representado graficamente da seguinte forma:

93

2. Representação fracionária: 3. Representação decimal: = 4 . Representação percentual: se 100% corresponde ao todo, então 100%:4 = 25%.

Porém, durante as observações o que mais presenciamos foram exercícios sobre

representações, tipos e operações com frações, tanto no livro didático como no caderno.

Devemos dizer que os alunos não sentiram muita dificuldade em efetuar os exercícios

ensinados, porém questiona-se se eles compreenderam o real sentido de se aprender fração,

sua ligação com os demais conteúdos (decimais e porcentagem) e sua aplicabilidade no

cotidiano. O fato é que na escola o aluno não apreende (se apropria do) o saber matemático,

mas esforça-se para aprender os conteúdos ensinados para obtenção de média e aprovação no

final do ano letivo.

Neste sentido reside a importância da atuação do professor no processo de

aprendizagem do aluno. Para Polya (1995, p. 01), o professor deve colocar-se no lugar do

aluno, perceber o ponto de vista deste, procurar compreender o que se passa em sua cabeça e

fazer uma pergunta ou indicar um passo que poderia ter ocorrido ao próprio estudante.

Cremos que a aprendizagem seria mais efetiva se os exercícios de fixação fossem

colocados em prática através de situações-problema e que os alunos pudessem ser estimulados

a também elaborá-las.

Polya (1995, p.25-27) é enfático em sua proposta de aprender matemática através da

resolução de problemas, sugerindo, como procedimento, o diálogo entre alunos e professor.

Esta proposta engloba várias perguntas efetuadas pelo professor aos seus alunos,

considerando as seguintes etapas: familiarização; aperfeiçoamento da compreensão, procura

da idéia proveitosa; execução do plano e retrospecto.

No entanto, as propostas de resolução de problemas foram mínimas e resumiam-se ao

livro didático e caderno pautado. Aliás, em toda aula sempre havia pelo menos um que

esquecia de levar o livro didático, ficando à margem da aula.

U D C

0, 2 5

1 4 ou 1/4

25 100

94

No decorrer das observações, um fato que intrigante foi a falta de atenção de alguns

alunos durante as aulas, ou seja, os mesmos que ficaram em Recuperação no final do ano,

composto de duas meninas (uma era repetente) e quatro meninos. Este grupo foi denominado

pela pesquisadora de “grupo G6”. Dificilmente estes alunos eram “incomodados” pelo

professor. Dizemos “incomodados”, pois ficavam acomodados, quietos, alheios ao que era

ensinado, distraídos em seu próprio mundo, sem serem chamados para participar das aulas.

Poucas foram as vezes em que a professora circulava entre os alunos para auxiliá-los em suas

dificuldades ou simplesmente para verificar se estavam ou não fazendo a tarefa de sala.

Acreditamos que a escola poderia ajudá-los “incomodando-os” para sair desta inércia;

propondo situações que pudessem participar mais das aulas através de dinâmicas interativas a

fim de buscarem significado e prazer naquilo que estavam fazendo.

Deste grupo de alunos, a aluna repetente era a que mais se esforçava em entender o

conteúdo. Durante a entrevista, ao ser questionada sobre sua empatia com a Matemática, ela

respondeu, com um sorriso nos lábios, que gostava muito de Matemática, mas tinha

dificuldade em entendê-la. Os demais alunos do grupo G6 responderam que gostavam “mais

ou menos”, pois não conseguiam entender direito. Somente um aluno disse que aprender

Matemática era “chato”. Este mesmo aluno, na entrevista, colocou, como ponto positivo das

aulas, a correção dos exercícios pelos alunos no quadro e, como ponto negativo, quando a

professora não o chamava para ir ao quadro. Esta resposta vem ratificar a reflexão sobre a

maior participação deles durante a aula. Outra observação interessante, feita por este mesmo

aluno, foi que “toda vez que passasse tarefa para casa, fosse corrigida imediatamente no dia

seguinte e que passasse mais tarefa no livro do que no caderno”.

Notamos que a maioria dos alunos não gostava de copiar exercícios do quadro para

efetuá-los no caderno pautado; preferiam o livro “Porta Aberta” do que o livro “Caderno do

Futuro” (composto de inúmeros exercícios repetitivos). Ressaltamos que a adoção deste

último foi proposto pela direção da escola e não pela professora. Após expor esta situação à

professora, ela diminuiu o número de exercícios no caderno pautado e concordou com a

opinião dos alunos a respeito do “Caderno do Futuro”, tanto que não o incluirá na lista de

materiais para o próximo ano.

A aluna repetente, ao ser questionada sobre o que mudaria nas aulas de Matemática,

respondeu que “em vez de ter tanta coisa para escrever, faria (a professora) mais atividades

práticas.”

95

Uma das alunas, não pertencente ao “grupo G6”, quanto à mesma pergunta, disse que

mudaria “o jeito de fazer os cálculos, pois o pai ensina de um jeito mais fácil e ela (a

professora) quer do jeito dela.” Nesta observação reside a importância de se pensar a

Matemática de forma não padronizada, isto é, o aluno deve ser estimulado a encontrar

caminhos diferentes para se obter uma solução correta. Sabemos que cada um possui um

modo próprio de solucionar problemas e contas. O professor, como mediador deste processo,

tem o dever de mostrar ao aluno esta realidade.

Uma simples conta de divisão pode ser resolvida de diversas maneiras. Porém, é

comum presenciarmos professores ensinando de uma única maneira. Este é um dos fatores

que ocasiona dificuldade do aluno em aprender, pois ele pode não se adaptar àquela maneira

de pensar e resolver exercícios ou situações-problema. É preciso que cada um busque sua

própria maneira a partir das mediações que o professor faz em suas aulas. Daí reside a

importância da teoria de Vygotsky sobre a Zona de Desenvolvimento Proximal.

A maioria dos alunos, sobre o que mudaria nas aulas de Matemática, respondeu que

queria menos quantidade de exercícios no livro (de costume são passadas 6 páginas) e no

caderno pautado. Com relação à professora, elogiaram seu modo de ensinar (explica bem),

mas criticaram sua maneira de abordá-los no momento de chamar sua atenção ou resolver

dúvidas dizendo que “briga muito” com os alunos.

Ao questionar a professora sobre suas aulas e suas expectativas em relação à

instituição, no que podia melhorar, foi evidente a demonstração de ansiedade frente à falta de

um acompanhamento pedagógico efetivo para os alunos (serviço de Orientação Educacional e

Psicológico) e para o professor, desgaste do professor frente a tantos compromissos (trabalho

em 03 turnos, elaboração e correção de provas e exercícios), falta de tempo para elaboração

das aulas e para sua formação continuada. Seu desejo era fazer uma pós-graduação em

Metodologia de Ensino, pois atribuía grande importância a esta área para facilitar a

aprendizagem do aluno.

Sua preocupação com o entendimento dos conteúdos era notório. Talvez por isso

passasse grande quantidade de exercícios. Reconheceu seu temperamento forte e algumas

vezes explosivo, mas disse que já havia melhorado muito quanto a isto.

Sabemos que esta relação é um ponto determinante no processo de aprendizagem. É

comum ouvirmos relatos de pessoas que não gostam de Matemática, ou apresentam

96

dificuldades em assimilá-la, devido às más lembranças que possuem de seu tempo de

estudante, quando eram castigados por não saberem de cor a tabuada, pela rispidez dos

professores de Matemática, pela humilhação que sofriam diante da turma, pelo medo de

perguntar sobre suas dúvidas e ser motivo de chacota ou qualquer outra lembrança negativa

deixada por seus professores. Este, portanto, consideramos como outro fator que pode levar o

aluno a ter dificuldades em aprender Matemática. No caso em estudo, havia dois meninos, do

grupo G6, que apresentavam dificuldade de relacionamento com a professora, pois ocorreram

momentos de indisposição entre eles.

Outro aspecto importante a analisar é a questão da inter-relação entre a disciplina de

Matemática e as demais disciplinas escolares.

Autores que escrevem sobre a metodologia de ensino da Matemática tais como Smole

e Diniz (2001), Carvalho (2005), Dante (2003), Rabelo (2002), dentre outros, valorizam o

aspecto significativo, contextualizado e interdisciplinar da Matemática, principalmente em

relação à Língua Portuguesa. A Matemática torna-se significativa para o indivíduo a partir do

momento em que se estabelece uma relação entre o conteúdo ensinado e a realidade existente.

Este outro fato constatado foi a não relação direta da Matemática com outras disciplinas.

(Uma boa opção de livro didático de Matemática é da Coleção Vitória Régia, da Editora

Lago, que apresenta os conteúdos matemáticos aplicados em outras áreas do conhecimento,

além de propor jogos e projetos interdisciplinares.)

A proposta dos autores citados anteriormente é de que a Matemática esteja

intimamente relacionada com a língua materna, com técnicas de leitura e interpretação dos

enunciados dos problemas, produção de textos sobre o entendimento de determinada unidade

ou dinâmica, criação de situações-problema, trabalhos com jornais (leitura e interpretação de

gráficos e tabelas) ou revistas, produção de histórias matemáticas (Ex: O homem que

calculava de Malba Taham), leitura de livros paradidáticos cujo tema trata de assuntos

matemáticos (criação da roda de leitura), criação da problemoteca (SMOLE e DINIZ, 2001,

p.119), a própria história da Matemática para ser dramatizada refletindo sobre sua evolução

associada com a evolução da humanidade etc. Há inúmeros títulos de livros paradidáticos

relacionados à Matemática. Podemos citar:

97

Coleção “A Descoberta da Matemática”

Editora Ática � Frações Sem Mistério � O que fazer primeiro? � As mil e uma equações � Encontros de Primeiro Grau � Aventura Decimal

Coleção “Vivendo a Matemática”

Editora Scipione � Na Terra dos Noves-Fora � Geometria das Dobraduras � Problemas curiosos � A numeração indu-arábica � Os Poliedros de Platão e os dedos da mão � Polígonos, centopéias e outros bichos � Lógica? É Lógico! � Desenhos da África

Coleção “Investigação Matemática”

Editora Scipione � Atividades e Jogos com Áreas e Volumes � Atividades e Jogos com Círculos � Atividades e Jogos com Formas

Coleção “Turma da Matemática”

Editora Ática ... E eles queriam contar

Coleção “Vira Mundo” Editora Moderna Triângulos, pirâmides e cones Série “O Contador de Histórias da Matemática”

Editora FTD Os Exploradores: números inteiros

Com tanta riqueza de livros paradidáticos, materiais pedagógicos (material dourado,

QVL, ábaco, dominós de frações e operações etc), CD-rooms interativos, jogos diversos, ou

até mesmo, materiais alternativos (encartes de supermercados, propagandas em revistas,

classificados de jornais), seria interessante que, no planejamento que a professora faz de suas

aulas, abrisse espaço, vez ou outra, para esses recursos. Isso não pode ser encarado como

secundário; trata-se de um ponto crucial na aprendizagem do aluno. Acreditamos que seja o

principal no estabelecimento de uma aprendizagem efetiva, agradável e significativa.

Talvez por falta de tempo para selecionar recursos, planejar aulas e atualizar-se

profissionalmente, o professor acaba por optar em ministrar suas aulas do mesmo modo que o

professor de sua época de primário o fazia, ou seja, com aulas expositivas, passando tarefas de

sala e de casa e aplicando avaliações sobre os exercícios treinados, como se todos

aprendessem do mesmo modo e ao mesmo tempo, sem levar em conta seus saberes, sua

individualidade, seu ritmo e seus anseios. Sei que não é fácil administrar todas estas situações

em prol de um ensino de qualidade, mas acreditamos que com um acompanhamento

pedagógico mais presente seria possível organizar melhores aulas, tornando-as um pouco

mais interativas. Este foi um dos fatores que levou a pesquisadora/supervisora, como parte do

processo pedagógico, a optar pelas aulas de intervenção, no final do ano, a fim de vivenciar as

98

dificuldades de se ministrar aulas interativas em tão pouco tempo e sentir a reação dos alunos

frente a este tipo de aula. Realmente foi uma experiência riquíssima que será compartilhada

no próximo sub-título.

Não poderia excluir desta análise, até mesmo por lecionar (a pesquisadora)

Metodologia do Ensino de Matemática no Curso Normal Superior em uma faculdade

particular de Manaus, a própria formação acadêmica do professor. Os cursos Normal Superior

e Pedagogia, com raras exceções, em sua proposta curricular, dispõem de pouco tempo para o

ensino da disciplina de Fundamentos e Metodologias de Ensino da Matemática para as séries

iniciais do Ensino Fundamental. Além disso, os vestibulandos que normalmente optam por

estes cursos, o fazem na intenção de “fugir” das disciplinas da área de exatas. É comum

encontrarmos professores em formação que não simpatizam com a Matemática ou que

apresentaram dificuldades em sua aprendizagem no tempo em que fizeram o antigo primário

ou ginásio. Por outro lado, as faculdades de licenciatura em Matemática preparam os futuros

professores com ênfase no Ensino Médio. É quase nula a preocupação com o ensino de uma

didática voltada para as crianças de 06 a 11 anos. É comum encontrarmos nestas faculdades o

ensino dos fundamentos e metodologias da Matemática totalmente desvinculados da relação

com outras disciplinas (Língua Portuguesa, Ciências, História etc). É como se fosse uma

disciplina escolar estanque, isolada, pura, diferente das outras. Este fato é inconcebível na

medida em que é óbvia sua relação com todos os setores da vida humana: medidas de tempo,

massa, comprimento, geometria das formas no ambiente, enunciados de problemas etc. A

própria evolução histórica do ser humano está intrinsecamente ligada à evolução histórica da

Matemática, cuja origem se dá pela necessidade dos homens primitivos em solucionar seus

problemas de ordem espacial (tempo e espaço) e organizacional.

Considerando a formação de professores, Piaget (1984, p. 63) faz a seguinte reflexão:

[...] a preparação dos professores constitui a questão primordial de todas as reformas pedagógicas em perspectiva, pois, enquanto não for a mesma resolvida de forma satisfatória, será totalmente inútil organizar belos programas ou construir belas teorias a respeito do que deveria ser realizado. Ora, esse assunto apresenta dois aspectos. Em primeiro lugar, existe o problema social da valorização ou da revalorização do corpo docente primário e secundário, a cujos serviços não é atribuído o devido valor pela opinião pública, donde o desinteresse e a penúria que se apoderam dessas profissões e que constituem um dos maiores perigos para o progresso, e mesmo para a sobrevivência de nossas civilizações doentes. A seguir, existe formação intelectual e moral do corpo docente, problema muito difícil, pois quanto melhores são os métodos preconizados para o ensino mais penoso se torna o ofício de professor, que pressupõe não só o nível de uma elite do ponto de vista dos conhecimentos do aluno e das matérias como também uma verdadeira vocação para

99

o exercício da profissão. Para esses dois problemas existe uma única e idêntica solução racional: uma formação universitária completa para os mestres de todos os níveis (pois, quanto mais jovens são os alunos, maiores dificuldades assume o ensino, se levado a sério).

Finalmente, a última categoria de análise vem tratar sobre o nível de aprendizagem dos

alunos. Embora sendo a 4ª série B apontada pela professora como a turma que apresentava

maiores dificuldades em aprender Matemática, durante as observações e analisando a planilha

de notas dos alunos no 1º e 2º trimestre, pudemos verificar que o índice de dificuldade não era

tão alto como se pensava. No 1º trimestre, após as notas das quatro avaliações escritas (sendo

uma delas um trabalho em sala), do total de 23 alunos: 26,08% não atingiram a média 7,0;

43,47% alcançaram a média entre 7,0 e 8,9; e 30,43% atingiram a média acima de 9,0.

Podemos dizer que menos de um terço da turma apresentou dificuldades em aprender

Matemática. Ressalta-se que, neste período, os conteúdos trabalhados foram: potenciação,

radiciação, MMC, MDC, expressões numéricas e operações matemáticas. Analisando as

condições de aprendizagem dos alunos que não atingiram a média no 1º trimestre, verificamos

que uma das alunas (a repetente), não possuía atenção suficiente dos pais em casa; outra tem

dificuldade em decorar a tabuada dificultando a efetuação de contas e resolução de problemas

de um modo hábil e rápido. Ambas necessitariam de uma avaliação diagnóstica mais

aprofundada a fim de verificar se possuíam ou não algum distúrbio de aprendizagem da

Matemática (discalculia, por exemplo). Os demais alunos que não atingiram média também

faziam parte do “grupo G6”; eram alunos que apresentam dificuldade de concentração em sala

de aula, não demonstrando dificuldades reais em Matemática. Outro detalhe é que a

freqüência dos alunos nas aulas era excelente, ou seja, as faltas eram esporádicas, por motivo

de doença ou viagens.

No 2º trimestre, cujo conteúdo programático foi praticamente o sistema de numeração

fracionário (representação de frações, tipos de frações, operações e problemas com frações), a

média dos alunos, ao término das quatro avaliações estabelecidas pela instituição, foi a

seguinte: 30,43% não atingiram a média 7,0; 39,13% atingiram a média entre 7,0 e 8,9;

26,08% atingiram a média acima de 9,0. Para fim de análise, somando-se as médias obtidas,

no 1º e 2º trimestre, temos: 28,61% dos alunos obtiveram média inferior a 6,9; 41,3%

obtiveram média entre 7,0 e 8,9; 28,25% atingiram a média acima de 9,0.

Verifica-se, portanto, que o nível de aprendizagem em Matemática dos alunos era

razoável, ou seja, quase 70% dos alunos conseguiram aprender os conteúdos programáticos

100

obtendo bons resultados nas avaliações. Mas surge daí uma reflexão: Houve realmente uma

aprendizagem significativa, onde o aluno saiba transferir os conteúdos aprendidos em sala de

aula, utilizando-os na solução dos problemas que emergem em seu cotidiano fora da escola?

Nesta ótica, pudemos verificar que, na instituição onde foi realizada a pesquisa, o

índice de reprovação em Matemática de 1ª a 4ª série do Ensino Fundamental não era

significativo para se realizar um trabalho profundo de intervenção para a minimização do

problema. No ano passado tivemos somente quatro reprovados, sendo uma criança na 2ª série,

uma na 3ª série e duas na 4ª série. Deste modo, acreditamos que a questão norteadora para

uma próxima pesquisa não seria com relação às dificuldades de aprendizagem que resultam

em reprovação, mas sim quanto à real aplicabilidade dos conhecimentos adquiridos em sala,

nas soluções e inovações das situações que aparecem constantemente na vida diária destes

alunos.

Atualmente, é evidente, dentro do sistema capitalista que rege a vida de todo

brasileiro, a necessidade de formar profissionais competentes não só a nível cognitivo como

também para saber utilizar, de modo eficaz, os conhecimentos adquiridos na busca de meios e

soluções para as situações-problema que aparecem no dia-a-dia da instituição em que

trabalham. Não adianta obter conhecimento e não saber utilizá-lo, colocá-lo em prática.

[Temos exemplos no meio educacional quando ouvimos de alunos depoimentos do tipo

“Aquele professor tem muito conhecimento, mas não sabe ensinar, não tem didática”.]

Neste momento, assumem relevância as palavras de Delors (2003) quando, de 1993 a

1996, organizou e redigiu, contando com a contribuição de especialistas em todo o mundo, o

Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre a Educação para o Século XXI,

sob o título “Educação – um tesouro a descobrir”:

[...] o próximo século submeterá a educação a uma dura obrigação que pode parecer, à primeira vista, quase contraditória. A educação deve transmitir, de fato, de forma maciça e eficaz, cada vez mais saberes e saber-fazer evolutivos, adaptados à civilização cognitiva, pois são as bases das competências do futuro. [...] À educação cabe fornecer, de algum modo, os mapas de um mundo complexo e constantemente agitado e, ao mesmo tempo, a bússola que permita navegar através dele (p.89).

Um pouco mais adiante, Delors (2003) continua:

101

Nesta visão prospectiva, uma resposta puramente quantitativa à necessidade insaciável de educação – uma bagagem escolar cada vez mais pesada – já não é possível nem mesmo adequada. Não basta, de fato, que cada um acumule no começo da vida uma determinada quantidade de conhecimentos de que possa abastecer-se indefinidamente. É, antes, necessário estar à altura de aproveitar e explorar, do começo ao fim da vida, todas as ocasiões de atualizar, aprofundar e enriquecer estes primeiros conhecimentos, e de se adaptar a um mundo em mudança (p.89).

Em seu relatório, propõe a organização da educação em “quatro aprendizagens

fundamentais que, ao longo de toda a vida, serão de algum modo para cada indivíduo, os

pilares do conhecimento: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver juntos e

aprender a ser” (DELORS, 2003, p. 90).

O que se presencia, no entanto, é uma grande ênfase no primeiro pilar do

conhecimento, deixando à margem da vida do aluno os demais pilares.

Sendo assim, embora a maioria dos alunos não tenha demonstrado grande dificuldade

na aprendizagem da Matemática, mesmo sendo submetido a um ensino tradicional,

segmentado, estanque e pobre de manuseio de recursos didáticos e dinâmicas lúdicas de

ensino, defendemos um ensino inteiramente prazeroso, significativo, dinâmico,

contextualizado e interdisciplinar para que a Matemática não venha a ser encarada como uma

obrigação em armazenar conteúdos a fim de reproduzi-los nas provas com o intuito de ser

aprovado no final do ano. O aluno precisa aprender Matemática para utilizá-la em sua vida, na

resolução de seus problemas diários, do mesmo modo como foi concebida durante a evolução

da humanidade, ou seja, criada e aplicada a fim de solucionar problemas e suprir

necessidades.

Ansiamos por um ensino da Matemática que contribua para o enriquecimento, não só

cognitivo do ser humano, mas como poderosa ferramenta de transformação e evolução

humana. Portanto, não deve ser reduzida a um simples “componente curricular”,

empobrecendo-a ou, o que é pior, contribuindo para fomentar na mente humana o repúdio e o

desinteresse por aprendê-la e colocá-la em prática.

Acreditamos, portanto, que este seria o principal ponto a ser estudado e discutido entre

pesquisadores e educadores da área, a fim de verificar as reais condições e possibilidades de

se construir uma ponte de ligação entre o “saber conhecer” e os demais saberes anteriormente

citados, diante das reais circunstâncias em que tanto a escola privada como a pública, o ensino

e os atores que vivem o cotidiano escolar estão mergulhados.

102

2ª ETAPA: PERÍODO DE INTERVENÇÃO (1º MOMENTO)

Esta etapa ocorreu durante as duas últimas semanas de aula quando já se havia

cumprido todo o conteúdo programático e realizado todas as avaliações do trimestre. A

descrição deste período será toda relatada na 1ª. pessoa do singular a fim de dar maior ênfase

ao trabalho que foi realizado exclusivamente pela pesquisadora como interventora.

A proposta deste período, em concordância com a professora, foi de assumir a turma

com aulas de Matemática para aplicação de dinâmicas envolvendo conteúdos ensinados

durante o ano. Deste modo, seria possível averiguar a possibilidade de se trabalhar com aulas

interativas num tempo de aula (50 minutos), observar a aceitação dos alunos quanto a este

tipo de aula e avaliar a aplicação dos conteúdos em situações práticas a fim de verificar o

nível de aprendizagem dos mesmos.

No primeiro dia apresentei a proposta aos alunos dizendo que ministraria aulas de

Matemática com dinâmicas ainda não vivenciadas por eles. A reação foi muito positiva, tanto

que a aluna repetente manifestou sua alegria soltando um grito de “oba!”.

A primeira atividade foi relacionada às notações numéricas, operações com números

decimais envolvendo o sistema monetário e resolução de problemas. Propus que todos se

dirigissem para a cantina da escola com lápis e papel nas mãos. O entusiasmo e a expectativa

eram grandes entre os alunos. No caminho da cantina adotaram uma postura madura, sem

correria ou indisciplina. Chegando à cantina, expliquei à merendeira que os alunos estavam ali

para anotar o valor de alguns produtos que estavam na tabela de preços e solicitei que fossem

esclarecidas as perguntas que surgissem. As crianças ficaram atentas copiando o nome dos

produtos e seus preços. Alguns alunos questionaram a merendeira sobre o valor da unidade de

alguns produtos que não constavam na tabela.

Ao regressarem para a sala de aula, a proposta foi de que elaborassem um problema a

partir da tabela produzida por eles, sem resolvê-lo. Conseguimos realizar esta atividade em

um tempo de aula. Levei a produção dos alunos para casa a fim de analisar a elaboração do

enunciado, a ortografia, o nível de dificuldade do problema e as notações numéricas.

103

Quanto ao enunciado, com exceção de uma aluna, todos o elaboraram com lógica.

Houve poucos erros ortográficos e todos os problemas possuíam uma pergunta que conduzia a

uma resolução. Dos 21 problemas elaborados: 07 continham somente a operação de adição

dos preços de produtos (total ou parcial); 11 continham duas operações (adição e subtração)

envolvendo situação de troco; 02 envolviam exclusivamente a operação de divisão sendo um

sobre “metade”; e 01 envolvia a operação de divisão e subtração. Abaixo, relaciono alguns

problemas, na íntegra, elaborados pelos alunos que não fazem parte do grupo focal:

A1 – (problema sem resolução total) = “Se eu comprace tudo da cantina da tia laura

quanto eu gastaria e quanto sobraria de troco?” Este problema possui resolução parcial, pois

não menciona uma quantia para que se devolva o troco.

A2 – “Meus colegas estão com muita fome e só tenho R$10,00 para 5 pessoas. Como

só posso gastar 7,00, quanto vai dar para cada um?” Quanto à notação numérica, vemos que

ora ela utiliza “R$” e ora não. Veja que ela envolve seus colegas numa situação de

distribuição do dinheiro sendo que, do valor total, R$3,00 deve ser destinado ao seu lanche, e

o que sobra, poderá ser gasto com os colegas. Trata-se de uma aluna participativa em sala e

sem dificuldades em Matemática.

A3 – “Na cantina da escola tem muitas coisas para comprar. Outro dia eu fui comprar

um refrigerante de lata, um refrigerante de copo e duas pizzas para mim e para meu irmão

mas quando fui pagar dei R$50,00. Quanto deu no total? E quanto me deram de troco?” Esta

criança é uma aluna tímida, não participativa e que apresenta notas regulares (7,0 a 8,0). A

lógica de seu raciocínio correspondeu à distribuição coerente do lanche entre ela e seu irmão e

o valor em dinheiro. O enunciado de seu problema apresentou duas situações: uma de adição

e outra de subtração envolvendo troco. Também atentou para a notação numérica correta do

sistema monetário.

A4 – “Mateus tem R$5,00 reais para seu lanche. Vai querer uma esfirra e um

refrigerante de copo. O troco vai querer bombons e pirulitos. Quantos ele vai poder comprar?

Vai sobrar troco? Quanto?”. Esta criança é considerada, entre colegas e professores, um bom

aluno. Seu enunciado foi muito bem elaborado na medida em que, baseado na tabela anotada,

propõe uma quantia básica a ser gasta com um salgado e um refrigerante, sendo que, com o

troco, ainda poderá comprar pirulitos e sobrar alguma moedinha. Somente errou parcialmente

104

na notação numérica, pois não era necessário escrever “reais” uma vez que havia anotado

corretamente a forma monetária.

Quanto aos alunos pertencentes ao “grupo G6”, somente um faltou no dia desta

atividade; os demais participaram com muito empenho e sem dificuldades. A aluna repetente

elaborou o seguinte problema a partir da tabela com todos os produtos da cantina: “Se eu

levasse R$50,00 reais e comprasse isso tudo, quanto sobraria de troco?” Com certeza, o aluno

que pegar este problema para resolver terá que fazer uma adição com 18 parcelas, e depois

realizar uma subtração do total com a quantia inicial. O que chamou minha atenção é que ela

foi a única criança que caprichou no colorido da tabela.

Outro aluno deste grupo, um dos que fica sentado na frente por apresentar indisciplina,

elaborou o único problema de divisão envolvendo a situação de metade: “Irmã (freira da

cantina) comprol um pacote de geladinho sabendo que uma caixa havia 50 unidades, irmã em

um dia vendeu a metade. Quantos a irmã vendeu em um dia e quantos restaram?” É um

problema simples de resolver e apresenta alguns erros gramaticais, porém possui lógica.

Os outros três alunos do grupo focal apresentaram erros ortográficos mínimos e

elaboraram com logicidade situações-problema envolvendo situação de troco (adição e

subtração).

Houve a necessidade de destacar algumas características de cada aluno a fim de

ressaltar que, nesta proposta de atividade interativa, não houve alunos que sobressaíram em

relação aos outros, isto é, o nível de dificuldades e entendimento entre eles na execução da

tarefa foi praticamente igual.

É interessante observar que a atividade proposta envolvia integralmente a participação

do aluno como “criador” de problemas e, posteriormente, como “resolvedor” do problema

elaborado por seu colega. A função da professora (pesquisadora) nesta situação foi

intermediar esta construção. Eles tiveram a liberdade de utilizar qualquer operação

matemática envolvendo o sistema monetário que, por sua vez, envolve números decimais.

Além disso, nesta proposta, estabelece-se a inter-relação com a disciplina de Língua

Portuguesa, uma vez que há a preocupação com a construção de uma produção textual com

estrutura e linguagem matemática e gramatical (pontuação, ortografia, concordância verbal e

nominal).

105

É interessante frisar que, em 50 minutos, deu tempo para fazer a pesquisa na cantina,

elaborar o problema a partir da tabela de preços e ainda elaborar uma situação-problema a

partir do tema: “Minha Festa de Aniversário”.

Esta proposta envolveu uma situação real vivenciada pelos alunos, na medida em que

auxiliam seus pais na organização da festa de seu próprio aniversário, uma produção textual e

os elementos matemáticos (notação numérica, pergunta e operações).

Os problemas geralmente envolviam comida, decoração, DJ e até garçons. A maioria

elaborou situações com o custo da festa. Uma minoria elaborou problemas envolvendo a

quantia de alimentos e não os gastos. Os enunciados demonstraram a realidade da vida social

de cada um, pois nesta turma há crianças provenientes de famílias abastadas e outras de

famílias menos favorecidas financeiramente.

Todos os alunos do “grupo G6” elaboraram corretamente o enunciado, com exceção

de um aluno que simplesmente relatou uma situação não muito feliz vivida por ele: “Ano

passado fiz uma festa de aniversário. Minha mãe teve que comprar: salgadinhos, brigadeiro,

bolo de chocolate e etc. Quando aconteceu minha festa de aniversário dia 31/12/2005, todo

mundo que foi na minha festa ficou feliz inclusive eu, mas minha mãe ficou mais ou menos.

Porque minha mãe ficou assim? R: Porque ela gastou muito dinheiro no meu aniversário.

A aluna repetente elaborou o seguinte enunciado: “Eu fiz uma festa muito doida com

muitas coisas: R$2000 de balões, R$4000 de salgados, R$4000 de docinhos, R$4000 de

refrigerantes e R$4000 de lembrancinhas e 5000 convidados. Se eu fizesse o dobro quanto ia

dar tudo isso?”

A aluna cuja mãe era a merendeira da escola, escreveu o seguinte: “Meu aniversário

terá muitas coisas, minha mãe ecomedara: R$20,00 reais de salgados, R$10,00 reais de

docinhos, o bolo que custa R$30,00 reais, mais os enfeites que custa R$40,00 reais, o DJ que

custa R$60,00 mais o lugar que vai ser a festa custa R$200,00. Ser minha mãe pagar a prazo

quanto ela vai gastar?”. Neste enunciado podemos verificar a preocupação em não se poder

pagar todos os gastos a vista. Houve poucos erros ortográficos e de pontuação, porém alguns

valores corresponderam ao real como no caso do local, dos salgados, dos enfeites e do bolo.

No dia seguinte, levei os problemas da festa de aniversário, digitados e cortados em

tiras de papel, para distribuir entre os alunos com a finalidade que resolvessem aquele que

106

pegassem aleatoriamente. Do total de 19 alunos participantes, 13 deles resolveram

corretamente o problema elaborado por seu colega; 04 erraram toda a resolução e 02

acertaram parcialmente. Dos alunos pertencentes ao grupo focal:

� Um aluno estava ausente (o mesmo do dia anterior);

� As duas alunas acertaram totalmente (um de adição simples com 05 parcelas de

números decimais e outro com divisão pela metade);

� Dois alunos erraram toda a resolução. Um deles, o enunciado era o seguinte:

“Na minha festa de aniversário convidei adultos e crianças. No total deu 45 pessoas. Somando

com os 3 garçons e os 2 DJs, no total dá 50 pessoas. No dia da festa, faltaram 15% das

pessoas que eu convidei. Quantas pessoas faltaram na minha festa?”. O outro problema, o

aluno soube qual era a operação mas a executou de modo incorreto: “Em minha festa irão 40

pessoas. Se uma pessoa levar um convidado, vai dar 40 convidados. Só que 15 disseram que

iam levar um convidado. Quantas pessoas vão? Quantas mesas terei que alugar se em cada

uma dá para colocar 04 cadeiras? Vai sobrar cadeiras?”

� Um aluno acertou parcialmente, por falta de atenção, pois fez a adição, mas

esqueceu-se de multiplicar pelo dobro ao ler o problema elaborado pela aluna, citada

anteriormente, referindo-se a uma “festa muito doida”.

Dentre os problemas elaborados havia: 07 de adição; 03 de subtração; 02 de adição e

subtração; 01 de divisão (metade); 01 de adição e divisão (prazo); 01 de multiplicação de R$

por unidade simples e adição; 02 com subtração acompanhados de divisão e 02 envolvendo

porcentagem.

Este tipo de atividade interdisciplinar e contextualizada, oportunizando a elaboração

de problemas pelo próprio aluno, faz parte da Educação Matemática atual, envolvendo

propostas e teorias de autores citados no referencial teórico, tais como: Carvalho (1994),

Dante (2003), Machado (1998), Rabelo (2002) e Smole (2001).

Nota-se que este tipo de atividade poderia ser trabalhada durante ou após o ensino de

um conteúdo programático a fim de verificar a real compreensão do assunto e sua

aplicabilidade numa situação-problema elaborada pelos próprios alunos (saber-fazer). Esta

atividade pode ser individual ou em duplas. Outra sugestão seria organizar todos os problemas

elaborados pelos alunos para a implantação e funcionamento de uma problemoteca sugerida

107

por Stancanelli (apud SMOLE e DINIZ, 2001, p. 119). Ao final do ano, poderia ser elaborado

um dossiê com todos os trabalhos desenvolvidos pelos alunos.

No mesmo dia em que resolveram o problema da festa de aniversário elaborado pelo

colega, propus que resolvessem dois desafios (problemas de lógica) como se fossem detetives.

Friso que somente uma vez durante o ano, eles resolveram 04 problemas de lógica retirados

do livro de Smole e Diniz (2001), proposto por mim no momento em que houve necessidade

de substituição de uma professora que havia faltado ao trabalho.

Os dois problemas de lógica retirados do livro de Carvalho (1994, p. 50-51) foram os

seguintes:

Solicitação: Leia e decifre o mistério de cada um dos desafios abaixo. Depois faça

uma ilustração:

a) Mabel, Ruth e Laura moram na mesma rua, uma ao lado da outra. Leia as dicas

com atenção e diga onde cada uma delas mora: na casa da direita não há boneca; a menina

que tem bicicleta não é vizinha da menina que tem patins; na casa de Mabel não tem bicicleta

nem patins; a bicicleta da Laura é diferente.

b) Lucas, Rubens e Fábio ganharam os presentes que queriam em diferentes datas.

Leia as dicas com atenção e diga quem ganhou determinado presente e em que data: Lucas

não ganhou presente na Páscoa; Fábio não ganhou patins nem autorama; no Natal, Rubens

adorou o presente; o menino que ganhou o par de patins de aniversário já saiu patinando pela

casa.

Foi solicitado que resolvessem os desafios em duplas a fim de possibilitar a

socialização do raciocínio entre os participantes e a troca de argumentações (saber-conviver).

Todos resolveram os desafios e poucos erraram. Não demonstraram dificuldade em

sua resolução. Acredito que isto se deva ao fato dos alunos estarem no período das operações

concretas, onde o desenvolvimento cognitivo “ocorre a partir do pensamento pré-lógico para

as soluções lógicas de problemas concretos” (WADSWORTH, 1984). Além disso, a

resolução foi facilitada pela verbalização em duplas e construção pictórica (desenhos).

Quanto à socialização do pensamento, Vygotsky (2003, p.117) faz a seguinte citação:

108

Piaget e outros demonstraram que antes que o raciocínio ocorra como uma atividade interna, ele é elaborado, num grupo de crianças, como uma discussão que tem por objetivo provar o ponto de vista de cada um. Essa discussão em grupo tem como aspecto característico o fato de cada criança começar a perceber e checar as bases de seus pensamentos. Tais observações fizeram com que Piaget concluísse que a comunicação gera a necessidade de checar e confirmar pensamentos, um processo que é característico do pensamento adulto.

Mais adiante Vygotsky (2003, p. 117-118) continua:

Propomos que um aspecto essencial do aprendizado é o fato de ele criar a zona de desenvolvimento proximal; ou seja, o aprendizado desperta vários processos internos de desenvolvimento, que são capazes de operar somente quando a criança interage com pessoas em seu ambiente e quando em cooperação com seus companheiros. Uma vez internalizados, esses processos tornam-se parte das aquisições do desenvolvimento independente da criança.

Porém, no dia seguinte lancei outros desafios que não foram resolvidos por nenhum

aluno. Inclusive, estes mesmos desafios apliquei com minha turma (58 alunos) do Normal

Superior e também nenhum aluno conseguiu resolvê-los, ou melhor, apenas dois alunos

conseguiram resolver, parcialmente, o último desafio.

Estes desafios foram retirados do livro “Problemas Curiosos”, de Imenes (2003):

a) Existe quatro pessoas para receber quatro maçãs que estão numa cesta. Reparta as

maçãs de forma que cada pessoa receba uma fruta inteira e ainda fique uma na cesta.

b) Um alfaiate tem uma peça de tecido com 20 metros de comprimento. Cada dia

ele tira um pedaço de 2 metros. Se o primeiro corte foi feito no dia 11/04/06, em que dia ele

fará o último corte?

c) Reparem neste número de quatro algarismos: 1224. Os dois algarismos do meio,

são iguais. Além disso, o número formado pelos dois últimos algarismos (24), é o dobro do

número formado pelos dois primeiros algarismos (12). Descobri que há mais quatro números

de quatro algarismos desse tipo. Procure descobrir quais são esses números.

Creio que a dificuldade encontrada tanto pelos alunos da 4ª série (período operacional

concreto) quanto pelos alunos do Normal Superior (período das operações formais), se deva

ao fato de terem vivenciado um aprendizado arraigado em moldes tradicionais de ensino,

109

onde a criatividade tenha sido tolhida, ou seja, o pensamento matemático foi direcionado para

operar numericamente e não logicamente.

Para explicar este fato recorro a uma citação de Moysés (1997, p.59-60):

A última década viu se acirrarem as críticas contra a forma como a escola vem trabalhando os conteúdos escolares. A matemática não é exceção. Ao contrário, talvez seja um dos campos onde melhor se observa o fenômeno do “encasulamento” ou “encapsulamento” da escola (RESNICK, 1987, p. 15). Trata-se do extremo isolamento que cresce a cada dia na escola em relação ao mundo que a rodeia.[...]

Moysés (1997) continua citando uma situação a qual também apliquei com os alunos.

Creio que ilustra bem o fato um episódio relatado por um pesquisador e professor de matemática que vem trabalhando por um ensino mais rico e pleno de sentido para seus alunos: Allan Schoenfeld. Refere-se a uma avaliação, em nível nacional, dos conhecimentos matemáticos de alunos secundaristas, feita nos Estados Unidos. Dentre os problemas propostos havia um que consistia no seguinte: “Em um ônibus do exército cabem 36 soldados. Se 1128 soldados precisam ser transportados para um local de treinamento, quantos ônibus serão necessários?” Aproximadamente 70% dos alunos realizaram a operação aritmética correta, dividindo 1128 por 36, encontrando um quociente de 31 e 12 resto. Apenas 23% responderam que seriam necessários era “31 e sobram 12” (SCHOENFELD, 1989, p. 81). Essa é a forma como a escola ensina a pensar o conhecimento matemático! Pensamento matematicamente correto, mas destituído de sentido.

Este mesmo problema, o adaptei para uma situação concreta que iriam vivenciar

brevemente: “Estamos organizando um passeio ao Jardim Botânico para todos os alunos da 4ª

série (matutino e vespertino). Sabendo-se que a 4ª série matutina possui 35 alunos, a 4ª série

A e B vespertina possuem 23 alunos cada uma, quantos ônibus precisaremos alugar para todos

os alunos irem ao mesmo tempo? Lembre-se que em cada ônibus há 36 lugares e é preciso um

professor acompanhando a turma”.

O resultado foi o seguinte: dos 19 alunos em sala, 8 não conseguiram fazer. Os 11

alunos que fizeram, deram as seguintes respostas:

� Precisará 02 ônibus e faltará 12 lugares. = resposta dada por dois alunos.

� Serão precisos 3 ônibus e sobrará lugar = resposta dada por nove alunos.

110

Verificamos que do total de alunos, 47% conseguiram chegar ao resultado correto.

Todas as dinâmicas descritas até o momento aconteceram em um tempo de aula e

houve a participação de todos sem causar nenhuma indisciplina. Porém, as dinâmicas do

encarte e do gráfico foram realizadas em dois dias cada uma.

A dinâmica do encarte de supermercado consistia na solicitação de que recortassem e

colassem produtos oferecidos no encarte, com seus respectivos valores, a fim de elaborar

quatro problemas envolvendo as quatro operações matemáticas. Poderia ser utilizado o valor

monetário do produto ou a sua quantidade (unidades, litros, gramas, metros). Puderam, desse

modo, operar com valores de medidas (massa, comprimento e capacidade), prazos

(prestações), valor a vista, desconto, juros, números decimais e operações envolvendo estes

conteúdos.

Esta atividade gerou certa movimentação dos alunos, mas não comprometeu o

desenvolvimento da aula. Finalizado o trabalho, a proposta era de escolher um colega com

quem iria compartilhar os seus problemas, ou melhor, o aluno deveria escolher um dos

problemas elaborados pelo seu colega para resolvê-lo e vice-versa.

Todos participaram com satisfação e os erros foram corrigidos pelo colega com quem

elaborou o problema.

Os problemas elaborados seguiram o padrão convencional, sendo que alguns tinham

toques personalizados e uma pitada de criatividade. Vejamos alguns exemplos:

A1 = A aluna repetente colou três eletrodomésticos, um embaixo do outro, distribuídos

na folha de papel e ao lado de cada um escreveu somente o nome do produto, seu preço a

vista e a pergunta: Se eu comprasse em ...... vezes sem juros, quanto daria? Para cada produto

ela estipulou um número de parcelas.

A2 = Este aluno, considerado um bom aluno, elaborou o seguinte problema, a partir de

uma figura de um protetor solar de 120ml, vendido por R$29,99: “Vou viajar por 30 dias. A

cada 15 dias uso 01 protetor. Quantos devo comprar? Quantos mls vou ter? Se usar 5 ml em

um dia, quanto sobrará?”

111

Este mesmo aluno elaborou também o seguinte problema: “Preciso comprar 4 cadeiras

(a vista R$319,00) iguais a essa. Vou parcelar em 8 x sem juros. Quanto vai custar as 8

cadeiras? Quanto vou pagar por mês?”

A3 = Esta aluna colou a figura de um repelente (R$8,29) e um talco (R$3,59) e fez o

seguinte enunciado: “Caroline foi ao supermercado e levou R$10,00 para comprar talco e

repelente, só que não deu para comprar. Quanto Caroline precisará para completar o

dinheiro?”

A4 = Este aluno relacionou sua mesada com a compra que desejaria fazer, a partir de

uma figura de Game no valor de R$100,00 ou 4 x R$25,00: “Ganho de mesada R$50,00 por

mês; quero comprar o jogo pra computador “Fifa 07”. Quanto vai sobrar de minha mesada se

em cada mês eu pagar R$25,00?”

Antes de propor a elaboração dos problemas, explorei o encarte perguntando sobre os

produtos relacionados às medidas, o menor e o maior valor de um produto, a diferença de

preço entre eles etc. Solicitei que olhassem para o Suco Pronto Kapo (havia 4 deles) de 200ml

cada sendo vendidos a R$3,56. Perguntei quanto falta para chegar a um litro? Qual é o valor

de cada Kapo?

Após a elaboração dos problemas, pedi que os resolvessem no caderno. Não

identifiquei dificuldades nem na elaboração, nem da resolução dos problemas.

Em relação a este tipo de proposta, Stancanelli (apud SMOLE & DINIZ, 2001)

argumenta:

Ao trabalhar com os problemas não-convencionais, os alunos têm contanto com diferentes tipos de textos e desenvolvem sua capacidade de leitura e análise crítica, pois, para resolver a situação proposta, é necessário voltar muitas vezes ao texto a fim de lidar com os dados e analisá-los, selecionando os que são relevantes e descartando aqueles supérfluos (p. 107).

Além disso, em concordância com a teoria de Piaget e Vygotsky, o aluno torna-se o

construtor do seu saber, na medida em que é estimulado a produzir e resolver situações,

mediado pelo professor.

112

A fim de avaliar a aplicação dos conhecimentos adquiridos sobre frações e

porcentagem, entreguei a cada aluno uma folha com malha quadriculada 10 x 10 cm com as

seguintes perguntas:

1ª - “Quantos quadradinhos há nesta malha quadriculada?”

Com esta pergunta poderia verificar aqueles que aplicariam a multiplicação para

resolver a questão. Todos, com exceção de duas alunas, utilizaram este método. Uma delas

contou quadradinho por quadradinho e, a outra, utilizou a contagem de 10 em 10

quadradinhos. Ressalto que ambas não compõe o “grupo G6”.

2ª - “Vamos supor que esta malha é o local onde você colocará luzes coloridas para a

iluminação de sua festa de aniversário. Pinte ½ dos quadradinhos de vermelho, representando

as luzes vermelhas. Pinte ¼ de azul, 2/10 de amarelo e o restante de verde.”

Dentre os 21 alunos que participaram desta atividade, 10 erraram a contagem para a

pintura dos quadradinhos azuis e verdes, correspondendo a 47,62% dos alunos da turma.

Com este fato, podemos deduzir que a dificuldade tornou-se maior no momento em

que o todo não era mais os 100 quadradinhos, mas ¼ deles no qual deveria ser pintado 2/10 e

ainda deveria sobrar “alguma coisa”, pois o enunciado dizia “o restante de verde”. Portanto,

aqueles que não se apropriaram do conhecimento sobre determinar a fração de uma parte do

todo, não conseguiram descobrir a quantia correta para pintar os quadradinhos. Veja que para

os vermelhos não foi preciso realizar nenhuma operação, pois a abstração de “metade” estava

bem consolidada em suas mentes. O mesmo pode-se dizer com relação a ¼ de cores azuis, na

medida em que os alunos já haviam abstraído que ¼ corresponde à metade da metade.

Alguns, ao serem questionados sobre como haviam descoberto que ¼ correspondia a 25

quadradinhos, responderam-me que compararam com uma nota de R$100,00 reais, sendo a

metade R$50,00 e a metade da metade, R$25,00. Mais uma vez a vemos a importância da

aprendizagem concreta, significativa, para a construção do conhecimento abstrato. Ao se

depararem com a solicitação de “2/10 de quadradinhos amarelos”, tiveram dificuldade em

imaginar o quanto seria, uma vez que não havia uma base sólida de aprendizagem a respeito

de como utilizar-se dos conteúdos de frações numa situação prática. Neste momento, intervi

como mediadora relembrando-os sobre o modo como operacionalizar e resolver tal situação.

Deste modo, conseguiram “consertar” o que haviam errado.

113

3º - “Qual é a porcentagem de luzes vermelhas? E a porcentagem de luzes azuis? E de

luzes amarelas? Qual é a porcentagem de luzes verdes?”

Do total de alunos participantes, 13 alunos (62%) responderam esta pergunta sem

realizar operações matemáticas, utilizando-se da contagem e percepção visual das cores na

malha quadriculada. Duas alunas utilizaram cálculo para determinar os 2/10 (9,5%) e uma

aluna (2,1%) utilizou cálculo para determinar cada porcentagem. Esta última assim o fez pois

foi a única aluna que pintou os quadradinhos de modo “salpicado” dando um visual de

mosaico, portanto, dificultando a percepção visual para uma contagem rápida dos quadrados.

Os demais, ou seja, cinco alunos (23,8%), dentre eles três do “grupo G6”, não conseguiram

determinar a porcentagem de luzes amarelas e verdes.

A última atividade, elaborada por mim, consistiu na construção de uma tabela a partir

de uma entrevista que deveriam fazer com os próprios colegas de sala, para a elaboração de

um gráfico e determinação da porcentagem dos dados obtidos.

A princípio pedi que pensassem em uma única pergunta para a coleta dos dados. Dei

como exemplo as seguintes perguntas: “Qual é o sabor de sorvete que você mais gosta?”;

“Qual é sua cor favorita?”; “Em que mês você nasceu?”

Após a elaboração da pergunta, os alunos movimentaram-se pela sala, questionando e

anotando as respostas dadas pelos colegas. O passo seguinte era construir uma tabela com os

dados obtidos para, posteriormente, determinarem a porcentagem e construírem um gráfico.

Esta atividade durou duas aulas. A maioria não teve dificuldades na construção da tabela e do

gráfico, mas sim, em determinar a porcentagem. Tive que explicar, utilizando a lousa, como

poderiam fazer isso. O resultado foi muito interessante, pois o total de pessoas entrevistadas

variou de aluno para aluno: uns perguntaram para todos os colegas incluindo eu e a

professora; outros perguntaram para alguns colegas e para a professora. Deste modo, a

porcentagem variou conforme o número de entrevistados.

Do “grupo G6”, dois faltaram neste dia, e dos quatro restantes somente um não fez a

porcentagem por falta de atenção (havia acabado o tempo de aula). Solicitei que terminasse

em casa e me trouxessem no dia seguinte para verificar as dúvidas.

114

Algumas das perguntas foram: “Qual seu esporte favorito?”; “Que tipo de filme você

prefere: ação, comédia, suspense, terror ou romance?”; “Qual seu artista favorito?”; “O que

você prefere: um Celta, um Palio ou um Gol?”

No último dia de aula avaliamos as atividades realizadas e o resultado foi muito

positivo. Os alunos disseram que gostaram de participar das aulas, solicitando que houvesse

mais aulas desse tipo. A professora, ao ser solicitada que fizesse uma avaliação das aulas,

respondeu que foram muito produtivas uma vez que os alunos mostraram grande interesse em

participar, pois houve diversificação com proposta de exercícios de raciocínio. “Quando

diversifica, parece que há um aprendizado maior.”, disse ela dando o exemplo de quando

ensinou a música dos números primos que facilitou a memorização pelos alunos. Ao ser

questionada sobre “que metodologias participativas contribuem para o aprendizado do aluno,

respondeu-me que o professor não deve utilizar-se somente do pincel e quadro, mas de outros

recursos que possam tornar as aulas mais dinâmicas e prazerosas. Em relação a políticas

públicas, argumentou que a mudança deve começar “de cima para baixo”, ou seja, na própria

formação do professor; falta esta conscientização, com proposição de aulas puramente

tradicionais. Fez algumas críticas em relação ao ambiente de sala de aula que não colaborou

para a concentração do aluno por posicionar-se entre a área externa (parque) e interna (pátio

para lanche); a falta do serviço de orientação pedagógica para acompanhamento dos alunos e

do serviço de supervisão no acompanhamento do professor.

Deste modo, avaliando este período, posso afirmar que foi um tempo em que pude

conhecer melhor o nível de aprendizagem dos alunos uma vez que os conhecimentos

matemáticos aprendidos durante o ano foram aplicados na resolução de situações-problema.

Além disso, verifiquei que o tempo estipulado de 50 minutos é pouco para fazer um trabalho

com recorte e colagem, mas se colocarmos esse fator como empecilho, nunca as crianças

terão o prazer de vivenciar uma aula dinâmica e interativa. Neste caso, é necessário planejar

bem as atividades, alternando dinâmicas com exercícios em livros e cadernos. A cada semana

poderia se reservar dois tempos de aula para as dinâmicas.

Fazendo uma análise desta etapa, posso garantir que foram momentos muito

significativos para mim tanto como pesquisadora, como supervisora desta instituição, pois,

aprendi o quanto é importante, vez ou outra, o(a) pedagogo(a) assumir uma sala de aula a fim

de “sentir” a turma e poder, de fato, construir um trabalho junto com o professor. Do mesmo

115

modo, o(a) professor(a) pode também aprender junto com o(a) pedagogo(a) no momento em

que traz novas experiências para dentro de sala.

No caso desta nossa experiência, ratifiquei a real possibilidade de se realizar

dinâmicas interativas em apenas 50 minutos, a participação prazerosa dos alunos durante as

aulas e a aplicação dos conteúdos ensinados durante o ano. Porém, como em toda aula

(tradicional ou interativa) devemos atentar para aqueles que terminam logo a atividade e para

aqueles que não conseguem terminar no prazo de 50 minutos. Para os primeiros, sugiro a

problemoteca (STANCANELLI, 2001), gibis, palavras-cruzadas, ou outras atividades

interessantes expostas em um canto da sala, onde poderão ficar produzindo, aguardando o

término da aula. Para aqueles que não terminam no prazo, sugiro que terminem após o

horário, em casa ou em outro momento combinado com o professor.

3ª etapa = INTERVENÇÃO DIRETA (2º MOMENTO).

Esta etapa consistiu na aplicação direta de uma lista de exercícios baseados nos erros

apresentados por três alunos do “grupo G6”, nas provas de Recuperação Especial. Estes três

alunos foram selecionados por apresentar três pontos em comum: a idade não é condizente

com a série que cursam; tiveram problemas de relacionamento com a professora e os pais

permitiram que participassem desta intervenção. A aluna que apresentou baixíssimo

rendimento durante o ano, também o fez durante a Recuperação Especial. Acredito que esta

aluna apresente algum distúrbio de aprendizagem em Matemática, pois não conseguia realizar

cálculos básicos e sua compreensão dos mecanismos de resolução era muito lenta, apesar de

concentrar-se nas aulas e esforçar-se na efetivação dos exercícios. Esta aluna não participou

desta etapa, pois não consegui estabelecer contato com os pais após o término da Recuperação

quando decidi fazer esta intervenção.

Entre os seis alunos pertencentes a este grupo, somente a aluna repetente e outro aluno

foram aprovados por arredondamento de nota; os demais foram reprovados na Recuperação

Especial e ficaram de Exame Especial. Estes alunos fizeram duas avaliações durante este

período, cuja média foi somada com a média anual, divididas por dois, originando a média da

Recuperação Especial. Como a média anual foi muito baixa, deveriam ter obtido notas altas

na Recuperação, para conseguirem aprovação.

116

Durante a quinzena de Recuperação Especial foram ministradas aulas expositivas e

com exercícios sobre os seguintes conteúdos, selecionados pela professora e repassados aos

pais e alunos no primeiro dia de aula:

1. Expressões numéricas de números decimais;

2. Divisores de um número natural;

3. Critérios de divisibilidade;

4. Cálculo do Maior Divisor Comum (MDC);

5. Números primos;

6. Decomposição de um número natural em fatores primos;

7. Múltiplos de um número natural;

8. Calculando o Menor Múltiplo Comum (MMC) entre dois ou mais algarismos;

9. Os números racionais e a sua representação fracionária: leitura de uma fração;

tipos de fração; números mistos; frações equivalentes; simplificação de frações;

redução de duas ou mais frações ao mesmo denominador; comparação de frações;

adição e subtração de frações; multiplicação e divisão de frações; calculando a

metade, a terça parte; resolução de problemas com dados fracionários.

10. Números decimais e porcentagem;

11. Polígonos;

12. Medidas de comprimento de superfície.

A seleção dos conteúdos matemáticos teve como critério os pré-requisitos necessários

para a aprendizagem do aluno para cursar a série seguinte, sendo considerados conteúdos

básicos e imprescindíveis que deveriam ter sido assimilados na 4ª série do ensino

fundamental. Durante as aulas de Recuperação a professora, com poucos alunos, pode dar

maior atenção às suas dúvidas e dificuldades. No final de cada semana (no total foram duas),

houve uma avaliação dos conteúdos ministrados naquele período.

117

A primeira avaliação da Recuperação Especial foi composta por quatro expressões

numéricas com colchetes e chave; um problema de multiplicação e divisão; dois exercícios

com divisores de um número; um exercício com números primos e compostos; um exercício

com quatro itens para determinar o MDC e três itens com MMC; um exercício para identificar

os múltiplos e uma situação problema envolvendo MMC.

Entre os quatro alunos que ficaram em Recuperação, dois conseguiram obter notas

acima da média nesta avaliação. Todos acertaram as expressões numéricas e o primeiro

problema. Porém, nenhum deles acertou o problema envolvendo MMC e houve pequenos

erros nos demais exercícios.

O problema foi o seguinte: “Na rua de Carlinhos a coleta de lixo é feita de dois em

dois dias, e a entrega de leite, de três em três dias. No primeiro dia de setembro houve

coincidência na coleta de lixo e na entrega de leite. a) Em que dias de setembro essa

coincidência voltará a ocorrer?; b) De quantos em quantos dias há coincidências?; c) Ache o

mínimo múltiplo comum de 2 e 3.” (havia a figura de um calendário do mês de setembro)

Quanto à segunda avaliação, que envolvia praticamente frações, as notas foram as

seguintes: 4,2; 4,4; 2,2 e 5,6. Havia um problema com representação de fração; um exercício

com quatro itens para identificar o tipo de fração; um exercício com quatro itens para

encontrar a fração irredutível; dois exercícios para determinar o valor de n (frações

equivalentes); um exercício com quatro itens para comparar frações (=, > e <); três expressões

com adição e subtração de frações; um exercício para determinar a fração mista e imprópria a

partir de um desenho; um exercício com quatro itens para calcular a divisão de frações e três

com multiplicação; um exercício com quatro itens para escrever na forma fracionária os

número decimais; um exercício para determinar a porcentagem e dois exercícios para

determinar a área das figuras utilizando a transformação de metros para centímetros e vice-

versa.

Podemos verificar que a segunda avaliação foi mais carregada de exercícios, exigindo

maior grau de concentração e abstração.

Após a elaboração de exercícios conforme as dificuldades apresentadas, foi marcada

uma data para os três alunos participarem da intervenção.

118

Coloquei os três alunos ao meu redor e pedi para que fizessem cada exercícios

verbalizando suas dificuldades. Após a conclusão de cada exercício, pedia que escrevessem o

que entenderam sobre aquele conteúdo. Um aluno, por exemplo, escreveu que “múltiplos são

os resultados das tabuadas começando pelo zero”: M2 = {0, 2, 4, 6 ...} e, “divisores são os

números onde a divisão dá exata e começa sempre por 1”: D9 = {1, 3, 9}. Porém, tiveram

dificuldade em determinar os divisores. Neste momento, apresentei três possibilidades de

encontrar os divisores e pedi para que escolhessem uma que mais se identificavam. São elas:

1ª possibilidade: Distribuição utilizando-se de desenhos.

Vamos supor que eu queira distribuir 12 bombons em caixinhas. Quais seriam as várias

maneiras de distribuí-los sem sobrar bombons?

D(12) = {1, 2, 3 , 4, 6, 12}

2ª possibilidade: Tabela de divisores.

Para descobrir os divisores há várias maneiras uma delas é a tabelinha. Complete a tabela

abaixo com os divisores dos números:

: 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 1 1 2 2 1 3 3 -- 1 4 5 6 7 8 9

10

3ª possibilidade: Regras da divisibilidade.

Compreender, exercitar e decorar as regras.

4ª possibilidade: Pelo resultado da tabuada.

12 6 4 6 4 4 3 3 3 3 2 2 2 2 2 2

1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1

119

Foi unânime a escolha desta última possibilidade.

Os alunos não apresentaram dificuldades em determinar o MMC e o MDC, porém

tiveram dificuldade em aplicar o MMC na resolução de um problema (como havia ocorrido na

avaliação).

Um deles, durante todo o tempo em que permaneceu comigo, apresentava dispersão e

falta de atenção. Errava o resultado de tabuada simples e achava graça. Este aluno teve

problemas graves em sua família, não possui idade para estar na 4ª série e teve problemas de

relacionamento com a professora. A mãe acredita que esta dispersão é de família, pois o pai e

a avó paterna são do mesmo modo. Os outros dois alunos realmente tinham dúvidas básicas

sobre determinados conteúdos. Um deles não soube fazer o exercício para encontrar o valor

do “n”, questionando: Por que “n”? O que significa este “n”? Um deles disse: “A professora

não ensinou isso!”.

Expliquei que ela poderia ter colocado qualquer letra no lugar do “n”. Isto não tinha

importância para a resolução, mas sim descobrir, tal qual um detetive, a pista principal para

descobrir o valor daquela letra. Eles então compreenderam que a pista principal era

determinar o valor que relacionava os números entre si para depois aplicar este mesmo valor

para encontrar “n”. O exercício foi o seguinte:

Outra dúvida que possuíam era entender o real significado da fração mista e imprópria.

Eles sabiam identificar qual era uma e qual era a outra, mas só foram entender de fato quando

Podemos encontrar os divisores de um número procurando todas as multiplicações de dois fatores que resultem nesse número como produto. Começamos pelo 1 e vamos efetuando os produtos, até que um dos fatores se repita. Por exemplo: Para encontrarmos os divisores de 30 fazemos o seguinte:

30 = 1 x 30 30 = 2 x 15 30 = 3 x 10 30 = 5 x 6

Então, agora é só arrumar em ordem crescente: D(30) = {1, 2, 3, 5, 6, 10, 15, 30}

a) 4 n b) 12 e 6 7 42 18 n

=

120

solicitei que representassem graficamente cada uma delas e comparassem. O sorriso

estampado no rosto ao descortinarem esta incógnita foi lindo!

Através da representação gráfica (representação concreta, pictórica) entenderam

também a fração aparente, as frações equivalentes, a comparação entre frações e as operações

com frações (utilizando-se a malha quadriculada).

Nos exercícios referentes à área das figuras, eles erraram por falta de atenção na

interpretação do enunciado, pois o exercício apresentava as medidas em “cm” e solicitava a

área em metros e vice-versa.

O que pude verificar na aplicação destes exercícios é que, para efetuar corretamente

um determinado exercício, é necessário que o aluno:

� Leia com atenção o enunciado a fim de verificar o que realmente é necessário

executar;

� Compreenda o conceito, o verdadeiro significado do conteúdo e como aplicá-lo

em situações-problema;

� Utilize representações gráficas (desenhos) para solucionar exercícios e

problemas;

� Verbalize suas dúvidas para poder executar o exercício com eficiência;

Por sua vez, o professor precisa estar atento a esses detalhes e orientar o aluno no

momento da avaliação quanto ao não entendimento do processo de execução do exercício;

incentivar um clima de diálogo e confiança entre aluno e professor evitando erros

desnecessários nos exercícios, e entender que o aluno está em um processo de aprendizagem e

de passagem de nível cognitivo (operacional concreto para o formal), portanto, precisa da

intervenção do professor. Coloco isto, pois já ouvi professores argumentarem que na hora da

prova não se manifestam, pois quando os alunos estiverem numa situação de teste (vestibular

ou teste para concurso) não poderão pedir ajuda.

Além disso, é necessário o professor atentar para o fato de que há pequenos detalhes

que possibilitam o erro ou não execução do exercício, não configurando uma dificuldade em

Matemática propriamente dito. Este foi o caso do exercício com a letra “n”.

121

A dificuldade maior reside no fato de não entenderem o real sentido e sua aplicação

em situações-problema. Isto aconteceu nos problemas que envolviam a aplicação do MMC,

por exemplo.

Por fim, o aluno precisa saber que há maneiras diferentes de se chegar a um resultado

correto e optar por uma que lhe seja mais fácil e agradável.

Desta maneira, vimos a importância da mediação eficaz do professor na aprendizagem

significativa do aluno, utilizando-se de diferentes metodologias de ensino e valorizando uma

relação sadia entre ele e seus alunos.

Nota-se que, além disso, há outros fatores que impedem uma boa evolução na

aprendizagem e que também devem ser considerados: problemas sociais, familiares e

desenvolvimento cognitivo compatível com a série que estuda. Estes, porém, não

compuseram o foco da pesquisa, embora sejam relevantes ao tema.

122

CONCLUSÃO

Com a finalização da pesquisa realizada e após o término da análise dos dados obtidos,

foi possível destacar alguns pontos de reflexão sobre o processo ensino-aprendizagem da

Matemática nas séries iniciais do ensino fundamental, na intenção de responder às perguntas e

aos objetivos que nortearam este trabalho. O primeiro deles seria o fato de que a

aprendizagem da Matemática, bem como a simpatia dos alunos por ela, sofrem influências de

uma série de fatores que interferem de modo quase imperceptível na rotina diária do processo

ensino-aprendizagem dentro do meio escolar e acabam prejudicando o processo de

aprendizagem do aluno. São fatores que vão desde o modo como a instituição concebe o

ensino, a formação do professor, o apoio dos pais, o apoio pedagógico, até o modo como o

aluno aprende e suas experiências em relação à Matemática fora da escola. Não se pode

buscar ou apontar um “culpado” para as dificuldades apresentadas pelos alunos. Deve-se, sim,

avaliar toda a estrutura que envolve o contexto escolar e, nele, o ensino da Matemática a fim

de se determinar o principal fator e encontrar soluções em conjunto com a comunidade

educativa.

O primeiro objetivo, relacionado também às questões norteadoras começa, pois,

buscando compreender os principais fatores que interferem no processo de aprendizagem da

Matemática pelos alunos das séries iniciais do Ensino Fundamental, tornando-a uma

disciplina de difícil assimilação.

Durante o período das observações e das intervenções, pudemos constatar que, de

modo geral, os alunos da 4ª série gostavam de Matemática e não apresentavam dificuldades

significativas em sua aprendizagem. Dentre os 23 alunos desta turma, 04 foram reprovados

nesta disciplina. Estes, porém, faziam parte do grupo que denominei de “grupo G6”. Os

outros dois alunos pertencentes a este grupo passaram por arredondamento da nota realizada

123

pelo próprio sistema de informatização, ou seja, obtiveram a nota 6,8 e o sistema arredondou

automaticamente para 7,0 (média para aprovação).

Em relação a este grupo, as dificuldades apresentadas pelos alunos eram tanto na

aplicação dos conteúdos para problemas concretos como também na execução de exercícios

mediante um modelo. Verificamos que esses alunos apresentavam características comuns:

todos são filhos únicos (com exceção da aluna repetente), possuem dificuldade de atenção e

concentração e, a idade cronológica não condiz com a série escolar, ou seja, deveriam ter

cursado a 3ª série e não a 4ª série. Acreditamos que, por estes motivos, as dificuldades de

aprendizagem não eram somente em Matemática, mas também nos demais componentes

curriculares que exigiam um certo nível de abstração. Em relação a serem filhos únicos, o que

não deixa de ser um dado curioso e ponto de partida para outras pesquisas, cremos que a falta

de atenção em sala se devia ao fato de priorizarem a convivência entre os amigos uma vez

que, em casa, a convivência era restrita aos adultos que deles cuidavam.

Os demais alunos da turma conseguiram apresentar uma boa aprendizagem, porém,

tinham grande dificuldade de estabelecer relação entre o que aprendiam e como aplicar

concretamente os conhecimentos matemáticos assimilados em situações-problema.

Tomando-se por base a teoria piagetiana sobre a aprendizagem, podemos inferir que

houve assimilação dos conteúdos ministrados, houve acomodação deste conteúdo aos

conhecimentos já construídos anteriormente, mas não houve adaptação destes conteúdos de

modo a colocá-los em prática para resolver situações de vida. Ocorreu uma quebra neste

processo e, assim sendo, a aprendizagem segmentada obtinha sucesso apenas na resolução de

exercícios parecidos com os que realizavam no livro ou caderno.

Deste modo, quando os conteúdos apareciam de forma contextualizada em exercícios

avaliativos ou avaliações escritas, em geral, o rendimento era menor. Se houvesse regras a

serem memorizadas para sua aplicação em exercícios, como no caso dos múltiplos e

submúltiplos do metro, onde a vírgula é transferida para a direita ou para a esquerda conforme

a medida, a dificuldade não era tão notória. Em outras palavras, o que foi constatado é que

não havia tanta dificuldade em responder um exercício se este tivesse sido trabalhado

mediante um modelo a seguir, mas a grande dificuldade apresentada era saber utilizar

praticamente o conteúdo matemático em um contexto, ou seja, em situações-problema. É o

“saber-aprender” prevalecendo sobre o “saber-fazer”.

124

A posição que defendemos, tomando como referência as sugestões dos autores

apontados nesta pesquisa, é que os conteúdos sejam problematizados tanto pelo professor

quanto pelo aluno (formulação e execução de problemas).

De modo geral, as dificuldades de aprendizagem apresentadas pelos alunos eram

heterogêneas, ou seja, enquanto uns apresentaram dificuldades em determinar o MDC, outros

em realizar operações com decimais e assim por diante. Porém, o que se revelou comum

foram as dificuldades na aprendizagem de frações (simplificação, operações e comparações).

Acreditamos que isto se deva ao nível de complexidade e abstração de tal conteúdo devido ao

fato de envolver vários conhecimentos para a resolução de um exercício. Exemplificando,

tomemos a operação de adição entre duas frações cujos denominadores são diferentes. Para a

efetuação desta operação, não basta simplesmente somar ambas as frações, é necessário antes

determinar o MMC, realizar todo o processo de divisão pelos denominadores e multiplicação

do quociente obtido pelos numeradores, para depois somá-las. Além disso, pode passar,

inconscientemente, pela mente do aluno as seguintes perguntas: Para que somar frações?

Onde é que vou utilizar isto no meu dia-a-dia?

Neste sentido, destacamos a importância da atuação do professor no ministério destes

conteúdos, relacionando-os com situações práticas de seu cotidiano uma vez que a criança que

da 4ª série do ensino regular, em sua maioria com 10 anos de idade, ainda está, segundo a

teoria piagetiana, na fase das operações concretas, a qual necessita da compreensão concreta

para alcançar a abstração reflexiva. É necessário, portanto, o olhar do professor sobre o aluno

que aprende, identificando suas reais dificuldades. Outro ponto de fundamental importância é

tentar buscar a associação da Matemática com o cotidiano do aluno, interligando-a com outras

disciplinas escolares.

Vemos que, na proposta tradicional de ensino, o aluno é mero espectador e o

professor repassa os conhecimentos a serem aprendidos. Para que isto ocorra, deve

permanecer em silêncio, concentrado enquanto o professor “dá” sua aula. Comportamentos

inadequados de conversa e falta de atenção são intoleráveis. Na proposta construtivista, o

diálogo é permanente, o professor media a aprendizagem de forma questionadora, observando

o nível de aprendizagem do aluno para poder interferir e auxiliá-lo (criando a zona de

desenvolvimento proximal) na passagem para uma zona de desenvolvimento superior. A

relação entre aluno e professor é regida pelo diálogo, pela compreensão e respeito às

limitações do aluno.

125

É recomendável que o professor tire o aluno da inércia de sua carteira escolar,

incomodando-o através de questionamentos sobre o assunto ministrado, solicitando que

escreva sobre o que entendeu do conteúdo ou que verbalize suas dúvidas, convidando-o para

ir ao quadro responder os exercícios e estimulando o seu raciocínio com atividades que

despertem seu interesse e, consequentemente, sua participação.

A inter-relação da Matemática com uma outra disciplina escolar, é mais um ponto

que interfere na aprendizagem do aluno no momento em que, ao perceber a relação da

Matemática com outras áreas do conhecimento humano, aumenta o nível de significação e

aplicabilidade da mesma. Como já foi dito anteriormente, trata-se da articulação entre o

significado e o sentido (Vygotsky, 1998) de aprender. Não é aconselhável que o aluno veja a

Matemática como uma disciplina isolada das demais, à margem de sua vida. É neste aspecto

que reside a falta de compreensão da mesma e o sentido de obrigação em aprendê-la apenas

para ser aprovado no final do ano. Ela deve ser exposta para o aluno como algo inerente à sua

vida, ao seu cotidiano, à sua história de vida e à própria história da evolução humana neste

planeta. Isto só é possível se associá-la com as demais ciências que compõem a estrutura

curricular. Sugestões para que isso aconteça estão nos livros citados nesta pesquisa e também,

um pouco de criatividade do professor ajudaria muito.

O apoio pedagógico existente durante as aulas, na instituição pesquisada, poderia ter

sido realizado após o término do período em que a criança estuda, ou em horário oposto, ou

mesmo aos sábados, para aqueles que apresentavam dificuldades na aprendizagem. Este apoio

seria de muito valor na medida em que possibilitaria o estreitamento do contato entre

professor e aluno e o reconhecimento das particularidades nas dificuldades apresentadas por

cada um.

As famílias devem também ser acionadas para comprometer-se com o rendimento

escolar de seu filho ou serem orientadas para procurar auxílio especializado na hipótese da

criança apresentar algum distúrbio de aprendizagem. E, finalmente, repensar as avaliações.

Cremos que este é o maior obstáculo enfrentado pelo aluno, pois muitas vezes ele é “treinado”

com inúmeros exercícios de fixação e, nas avaliações escritas, os exercícios aparecem em

forma de situações-problema. Se o aluno não aprendeu como e quando aplicar os exercícios

que tanto treinou, torna-se difícil um bom rendimento neste tipo de avaliação.

126

Concluímos, portanto, que além dos fatores bio-psico-sociais que precisam ser

levados em conta, mas tomando-se como foco o cenário da sala aula, as dificuldades não

estavam necessariamente associadas com a antipatia pela Matemática. Obtivemos, de algumas

crianças, respostas positivas de empatia com esta ciência, mesmo reconhecendo certa

dificuldade de aprendizagem. As dificuldades, por sua vez, não podem ser generalizadas a tal

ponto de rotular esta ou aquela pessoa de ser “ruim” em Matemática. Cada indivíduo

apresenta facilidade ou dificuldade de aprender um determinado conteúdo matemático. Há

crianças que não possuem dificuldade de entender a representação fracionária, mas podem

não saber operacionalizá-las. Uns podem encontrar facilidade em determinar o MDC de um

número, mas outros não. Cada conteúdo toca o aluno a seu modo, dependendo das

circunstâncias do momento, e de “n” outros motivos. Porém, ficou constatado que os fatores

que interferem diretamente na aprendizagem da Matemática são os seguintes: maturidade

cognitiva (capacidade de abstração), ambiente físico da sala de aula, capacidade de atenção e

concentração, e capacidade de transferência da aprendizagem para situações concretas.

Quanto à da atuação do professor contribuindo para as dificuldades de aprendizagem,

os pontos determinantes ficaram por conta da metodologia de ensino de forma não

contextualizada e não interdisciplinar, resultando num ensino praticamente reprodutor e

conservador. Esta conclusão é proveniente do tempo de intervenção em que a pesquisadora

passou com a turma aplicando os conteúdos em situações práticas. Nestas atividades o nível

de resposta dos alunos, em geral, foi praticamente igual, ou seja, não era visível o destaque de

quem sabia mais ou sabia menos. Todos apresentavam uniformidade no desenvolvimento das

atividades. Portanto, não resta dúvida que a atuação do professor no que se refere à

metodologia de ensino, à escolha dos critérios de avaliação, à seleção de recursos didáticos

apropriados e à relação de simpatia estabelecida com os alunos, é de fundamental importância

para o processo de aprendizagem da Matemática. No entanto, vale ressaltar a importância do

pedagogo na assessoria ao professor, fazendo-se, em algumas ocasiões, presente em sala de

aula a fim de vivenciar, junto com o professor, situações do cotidiano do processo ensino-

aprendizagem para ter subsídios concretos na intenção de bem auxiliá-los neste processo.

Ressaltamos como pontos altamente positivos da instituição pesquisada, a

permanência da professora em horário integral, facilitando, assim, a elaboração de seu

planejamento mensal, preparação de atividades e outras atribuições. Outro ponto fundamental

é a pequena rotatividade de professores proporcionando a visão de processo, de continuidade

do trabalho pedagógico realizado pelo professor, evitando a troca de professores em seu

127

quadro docente. E, finalmente, a formação específica do professor que leciona por tempos de

aula desde a primeira série do ensino fundamental. Este fator muito contribui no momento em

que há uma identificação positiva do professor licenciado com a disciplina que ministra e,

consequentemente, qualificado para o seu ministério. Do mesmo modo, os tempos de aula de

50 minutos que, a princípio, parecem ser um fator que limita a dinamicidade das aulas,

poderão ser melhor planejados a fim de que se possa associar os exercícios em livros e

cadernos, com aulas interativas. O período em que a pesquisadora participou ministrando

aulas com dinâmicas, pôde constatar ser isso viável. Para tanto, é de fundamental importância

repensarmos os cursos de formação de professores que irão atuar nas séries iniciais do ensino

fundamental a fim de que realmente sejam preparados para lidarem de forma positiva com

esta clientela e ministrarem aulas de modo significativo, cujos conteúdos, metodologias,

recursos e avaliação sejam condizentes com a faixa etária. É comum, no entanto, vermos

professores com dificuldades em lidar com conteúdos matemáticos, frutos de uma formação

acadêmica deficitária, incidindo diretamente no modo como irá ministrar suas aulas.

Finalmente, deixamos registrado aqui a valiosa contribuição deste trabalho na

reflexão da prática educativa tanto como pesquisadora desta área específica do conhecimento

humano, como professora universitária em curso de formação de professores, e também,

como pedagoga.

No movimento dialético da ação-reflexão-ação, pode-se refletir e avaliar a prática

pedagógica da pesquisadora na instituição pesquisada de forma a considerar ações urgentes e

fundamentais a fim de colaborar para a qualidade de ensino da mesma. Deste modo,

concluímos que os conhecimentos adquiridos com este trabalho poderão contribuir muito com

um acompanhamento pedagógico mais sistemático e efetivo aos professores e alunos, e

propondo reuniões visando a formação continuada do professor através de palestras, oficinas e

mini-cursos.

Fica, porém, uma última reflexão sobre todo este processo: a grande responsabilidade

das políticas públicas em relação ao ensino da Matemática em nosso município. É comum nos

depararmos com professores mal-remunerados, obrigados a trabalhar três turnos para obter

condições de sobrevivência; são professores cansados, desmotivados, sobrecarregados, sem

tempo para aprimorar-se profissionalmente. Estes mesmos professores, muitas vezes se

deparam com salas numerosas, com prédios sem infra-estrutura adequada para a realização de

um bom trabalho. Apesar de todas as intempéries que assolam a educação brasileira,

128

acreditamos no compromisso, na consciência, na competência e na boa vontade do professor

que tem, em suas mãos, a “matéria-prima” para construir uma sociedade melhor: o aluno.

129

REFERÊNCIAS

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SUGESTÃO DE SITES

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ANEXO A – Parecer do Comitê de Ética e Pesquisa

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