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CAMPANHA NACIONAL DE ESCOLAS DA COMUNIDADE FACULDADE CENECISTA DE CAPIVARI – FACECAP
PEDAGOGIA
UM OLHAR REFLEXIVO SOBRE OS MÉTODOS DE
ALFABETIZAÇÃO
ARLETE PINTO DOS SANTOS
Capivari, SP
2014
CAMPANHA NACIONAL DAS ESCOLAS DA COMUNIDADE FACULDADE CENECISTA DE CAPIVARI – FACECAP
PEDAGOGIA
UM OLHAR REFLEXIVO SOBRE OS MÉTODOS DE
ALFABETIZAÇÃO
Monografia apresentada ao Curso de
Pedagogia da FACECAP/CNEC Capivari, para
obtenção do título de Pedagogo, sob a
orientação da Prof.ª Dr.ª Cláudia B. de C.
Nascimento Ometto.
ARLETE PINTO DOS SANTOS
Capivari, SP
2014
FICHA CATALOGRÁFICA
S233o
SANTOS, Arlete Pinto dos
Um olhar reflexivo sobre os métodos de alfabetização/ Arlete Pinto dos
Santos. Capivari - SP: CNEC, 2014. 71 p.
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Cláudia B. de C. Nascimento Ometto.
Monografia apresentada ao curso de Pedagogia.
1. Concepção de alfabetização. 2. Métodos de alfabetização. 3. Práticas
de letramento. I. Título. II. Faculdade Cenecista de Capivari.
CDD. 371.332
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho a minha mãe (in memoriam),
à minha família, que me apóia em todos os momentos,
às minhas sobrinhas, e a Deus por tudo que tem feito em minha vida,
por estar sempre presente, me levantando e me acolhendo.
Obrigada Senhor.
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus por ter me dado forças para alcançar mais uma vitória,
por sua presença em minha vida, me ajudando a cada momento. Dando-me sabedoria, me
levantando e me consolando, enfim, me fazendo superar e alcançar alguns objetivos.
Agradeço a minha família, meus irmãos e irmãs pelo apoio e incentivo em todas as horas, por
estarmos sempre juntos e unidos.
As minhas sobrinhas queridas Lívia, Evilyn e Ana, as preciosidades da minha vida.
Agradeço a minha mãe, que embora não esteja presente conosco no corpo, está presente no exemplo
de vida, de força, de dedicação, de luta e perseverança, e creio está olhado por nós.
Agradeço aos amigos todos que me cercam e me encorajam.
Aos amigos da faculdade, em especial a Kátia pela atenção e ajuda em todos os momentos.
A todos os professores do curso de pedagogia que nos ensinaram com carinho e dedicação. Em
especial agradeço minha orientadora Prof.ª Dr.ª Cláudia B. de C. Nascimento Ometto pela paciência e
grande ajuda na conclusão desse trabalho, pois sem sua ajuda isso não se tornaria realidade.
Enfim agradeço a todos que direta ou indiretamente ajudaram neste trabalho.
Muito obrigado.
Foi aí que nasci: Nasci na sala do 3º ano, sendo professora D. Emerenciana Barbosa, que Deus tenha.
Até então, era analfabeto e despretensioso.
Lembro-me: nesse dia de julho, o sol que descia da serra era bravo e parado.
A aula era de Geografia, e a professora traçava no quadro-negro nomes de países distantes.
As cidades vinham surgindo na ponte dos nomes, e Paris era uma torre ao lado de uma ponte e de um rio, a
Inglaterra não se enxergava bem no nevoeiro, um esquimó, um condor surgiam
misteriosamente, trazendo países inteiros.
Então, nasci. De repente nasci, isto é, senti vontade de escrever.
Nunca pensara no que podia sair do papel e do lápis, a não ser bonecos sem pescoço, com cinco riscos
representando as mãos. Nesse momento, porém, minha mão avançou para a carteira à procura de um
objeto, achou-o, apertou-o irresistivelmente, escreveu alguma coisa parecida com a narração de uma
viagem de Turmalinas ao Pólo Norte.
Carlos Drummond de Andrade
SANTOS, Arlete Pinto dos. Um olhar reflexivo sobre os métodos de alfabetização.
Trabalho de Curso. Pedagogia, Faculdade Cenecista de Capivari - CNEC, 71 páginas, 2014.
RESUMO
Este trabalho de pesquisa discute o tema da alfabetização na escola por compreender que em
uma relação de ensino mediada de modo sistemático um importante procedimento pedagógico
é o método utilizado pelo professor. O estudo justifica-se por entender que ler e escrever não
só é importante para a significação do mundo, mas porque ler e escrever modifica as funções
mentais superiores dos sujeitos. Isto posto, o objetivo desta pesquisa é compreender,
historicamente, os métodos de alfabetização que estiveram e ainda estão presentes nas escolas
públicas brasileiras. Teoricamente optou-se por uma pesquisa bibliográfica pautada em
autores do campo da psicologia do desenvolvimento e do campo da linguística, tais como,
Vigotski (1998), Ferreiro (2001), Mortatti (2000, 2006), Cagliari (1999) e Soares (1998,
2003), entre outros. Procedimentalmente, a fim de produzir dados empíricos acerca da
temática, após o estudo bibliográfico realizou-se uma pesquisa de campo através de um
questionário junto a um grupo de cinco professoras alfabetizadoras. Os dados permitem
afirmar que os professores pouco conhecem acerca dos métodos de alfabetização. O que
remete ao fato de que o professor precisa conhecer profundamente seu conteúdo de ensino -
no caso a alfabetização - bem como os procedimentos metodológicos que o colocam em
prática - os diferentes métodos para alfabetizar.
Palavras chave: 1. Concepções de alfabetização. 2. Métodos de alfabetização. 3. Práticas de
letramento.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1- Página da Cartilha da Infância .................................................................................. 27
Figura 2- Capa da Cartilha Maternal ........................................................................................ 30
Figura 3- Capa da Cartilha Sodré ............................................................................................. 32
Figura 4 - Página da Cartilha Sodré.......................................................................................... 32
Figura 5 - Capa da cartilha Caminho Suave ............................................................................. 33
Figura 6 - Página da cartilha Caminho Suave .......................................................................... 34
Figura 7 - Método de alfabetização palavra geradora .............................................................. 37
SUMÁRIO
E ASSIM COMEÇOU ........................................................................................................... 10
CAPÍTULO I – A TRAJETÓRIA HISTÓRICA DA ALFABETIZAÇÃO ..................... 13
1.1. Os princípios da escrita alfabética ........................................................................... 13
1.2. A história da alfabetização no Brasil ....................................................................... 18
CAPÍTULO II – OS MÉTODOS DE ALFABETIZAÇÃO ................................................ 24
CAPÍTULO III – CONCEPÇÕES SOBRE ALFABETIZAÇÃO ..................................... 38
3.1. Perspectiva cognitivista estruturalista da alfabetização .......................................... 38
3.2. Perspectiva discursiva da alfabetização ................................................................... 42
CAPÍTULO IV – O QUE NOS DIZEM OS PROFESSORES SOBRE OS MÉTODOS
DE ALFABETIZAÇÃO? ....................................................................................................... 47
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................. 62
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 65
ANEXOS ................................................................................................................................. 69
10
E ASSIM COMEÇOU...
Ao decidir pesquisar o tema alfabetização, vieram algumas recordações do passado
que me levaram a pensar nas dificuldades encontradas em algumas fases da minha vida.
Lembro-me da minha infância alegre, em que eu brincava nas ruas da minha cidade natal,
Barra – Bahia, sem preocupação nenhuma com o futuro ou com o que acontecia ao meu redor.
Foi uma fase feliz e despreocupada.
Recordo-me do início da minha escolarização, aos três anos de idade comecei a
frequentar uma escola. As marcas que reconheço daquele tempo ajudam-me a compreender o
que ficou gravado na memória: uma experiência culinária vivenciada, a professora fez na sala
de aula uma salada de frutas.
Já meu início no mundo das letras tem poucas lembranças. Recordo que a professora
ensinava o bê a bá „B com A= BA, B com E= BE‟ e assim por diante... com uma cartilha!!!
Não me recordo qual cartilha era aquela, nem a idade exata em que aprendi a ler minhas
primeiras palavras e entender o que significavam. Minha experiência escolar foi boa de modo
geral, embora muitas vezes em algumas fases não me lembre bem, o que me faz refletir sobre
a forma de aprendizagem que vivenciei.
Repensando sobre minha época escolar, entendo hoje que muitas coisas que eu fazia
não tinham sentido, „o fazer por fazer‟. Ir à escola era uma obrigação que se tinha que
cumprir. Na época eu não entendia a importância e o porquê ir à escola.
Brinquei muitas vezes sobre o que queria ser quando crescesse e sempre pensava que
queria ser uma advogada, pois ouvia meu pai dizer que essa era uma carreira interessante,
embora não soubesse exatamente o que essa carreira significava.
Recordo-me que desde a infância eu gostava muito de ler. Lembro-me que certa vez
peguei um pedaço de revista em quadrinhos que achei na rua e fiquei lendo no banheiro. O
que me faz refletir o quanto a leitura não fora explorada na escola e mesmo em casa, ou que
eu não soubera, na época aproveitar as oportunidades que se apresentavam naquele momento.
Ao fazer essa pesquisa surgiram alguns flashes de minha vida na memória. Lembro-
me de uma fase difícil da minha infância, quando ocorreu a separação dos meus pais, foram
muitas as necessidades que nós passamos. Fez-me pensar muito na luta da minha mãe para
sustentar os sete filhos, sozinha, e apesar de todas as dificuldades nos ensinou valores que nos
acompanham até hoje.
Recordo-me da guerreira que era e sempre foi e que buscou mesmo no pouco que
tínhamos ensinar o melhor para os filhos. Fez com que frequentássemos a escola e
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aprendêssemos. Dizia que os estudos nos fariam falta mais tarde. Vejo hoje o quanto seus
esforços valeram a pena, hoje, (re)significo o passado. Muito embora a aprendizagem fosse de
maneira mecanizada e sem sentido na época, hoje percebo a importância do estudo em minha
vida e o quanto foi importante passar por cada fase, mesmo sentindo a defasagem de cada
uma delas.
Viemos para São Paulo em busca de uma vida melhor e aqui também me deparei com
as dificuldades na aprendizagem. Alguns professores também ensinavam de forma
mecanizada e por meio do ensino decorado, mas o ensino era mais exigente e pude ampliar
alguns conhecimentos que eu não tinha.
Deparei-me também aqui com as dúvidas de como ensinar os alunos a lerem e
escreverem, o que me fez sentir despreparada para assumir o compromisso de ensinar logo
quando me formei no magistério. Comecei então a trabalhar no comércio local.
Com o passar do tempo, o sonho e a vontade de aprender mais persistiram, e refletindo
sobre a área em que eu queria atuar, veio à vontade de aprender a ensinar. Isso me objetivou a
uma mudança, eu precisava estudar mais, foi a partir daí que me interessei pelo curso de
Pedagogia. Como que numa sequência de mudanças na minha vida, surgiu o concurso para
trabalhar como professora em creche e me agarrei a essa oportunidade, junto veio o início no
curso superior.
Foi a partir do curso de Pedagogia que alguns conteúdos que eu tinha estudado nas
fases escolares anteriores, começaram a serem (re)significados. Pude então, retirar de cada
fase um significado positivo, o que me fez prosseguir em meio às dificuldades. Aprendi que
não se pode desistir na primeira dificuldade encontrada e deve-se buscar sempre mais, é
preciso conhecer, praticar e estudar para ampliar seu conhecimento, fazer com que a
aprendizagem tenha realmente sentido e significação.
Comecei a me envolver com o tema alfabetização no segundo ano do curso de
Pedagogia, os professores, Teresa Bedendi da disciplina de Didática e Carlos Eduardo Klebis,
da disciplina de Fundamentos e Metodologia do Ensino de Língua Portuguesa conversavam a
respeito da não aceitação de muitos professores em assumir salas de alfabetização, pois
consideravam que alfabetizar era trabalhoso e exigia muito deles. Em suas aulas enfatizaram
bastante a importância da alfabetização e como é prazeroso ensinar aos alunos a dar os
primeiros passos na leitura e na escrita.
Foi a partir daí que surgiu um interesse e certa curiosidade em compreender melhor o
tema e o porquê de alguns professores terem receio em assumir turmas de alfabetização. O
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que me fez refletir sobre os motivos que levam alguns professores a se afastarem dessa fase
de escolarização.
Ao adentrar neste tema, procuro me inteirar e me envolver com um conteúdo que é ao
mesmo tempo tão importante e tão discutido, tanto no passado quanto no presente. A
alfabetização é vinculada ao acesso ao mundo da decodificação das letras. No atual mundo
grafocêntrico que vivemos hoje, as pessoas precisam ser alfabetizadas para significarem cada
vez mais o mundo a sua volta.
Muitos professores assim como eu quando terminei o magistério, não se sentem
preparados para envolver os alunos no trabalho com as letras e as palavras. O que me fez
buscar conhecer e aprimorar meus conhecimentos sobre os métodos de alfabetização que são
utilizados. Neste contexto surgiram alguns questionamentos: por que a dificuldade em fazer
com que os alunos aprendam a ler e escrever? Quais as defasagens dos professores em
conhecimentos teóricos e práticos no que diz respeito à prática de alfabetização? Eles não
dominam e não conhecem os métodos de alfabetização? Qual o melhor método para se
alfabetizar? Como fazer para que os alunos encontrem sentido e significação naquilo que
estão lendo e escrevendo?
Essas questões sintetizaram-se na seguinte questão de investigação: quais são os
métodos de alfabetização utilizados no Brasil e como os professores os tem colocado em
prática?
Para tanto, delimitei o tema de minha pesquisa no que diz respeito aos métodos de
alfabetização utilizados no Brasil e para compreendê-los busquei a história e a importância
dos mesmos, visando compreender e ampliar meus conhecimentos sobre essa temática.
Para tal, o primeiro capítulo trata da história da alfabetização no Brasil para
compreender os diferentes modos de concebê-la no percurso histórico de nossa população,
uma vez que a alfabetização ancora-se sempre, e necessariamente, em uma concepção ou
outra de linguagem. No segundo capítulo é tratado, especificamente dos métodos de
alfabetização. A cada concepção, corresponde uma perspectiva de alfabetização, a saber, em
uma perspectiva cognitivista estruturalista ou em uma perspectiva discursiva, este o foco do
terceiro capítulo. Para finalizar realizei uma pesquisa de campo e sua respectiva análise, no
quarto capítulo.
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CAPÍTULO I - A TRAJETÓRIA HISTÓRICA DA ALFABETIZAÇÃO
A partir de estudos e pesquisas, em um primeiro momento com embasamento em
artigos, teses e trabalhos de curso, em especial da base teórica de alguns autores que
pesquisam a temática, este capítulo trata da história da alfabetização no Brasil para
compreender os diferentes modos de concebê-la no percurso histórico de nossa população.
1.1. Os princípios da escrita alfabética
Na antiguidade a história da alfabetização surge, em conjunto com a escrita,
auxiliando o desenvolvimento social. A partir da escrita e da alfabetização os cidadãos se
comunicavam e realizavam seus negócios.
Consta que com o surgimento da escrita, tornou-se necessário a alfabetização,
permitindo ao leitor decifrar o que está escrito. “Quem inventou a escrita inventou ao mesmo
tempo as regras da alfabetização, ou seja, as regras que permitem ao leitor decifrar o que está
escrito, entender como o sistema de escrita funciona e saber usá-lo apropriadamente”.
(CAGLIARI, 1999, p. 12). A escrita possibilitou a ampliação do registro de informações que
a memória oral não permitia.
Partindo de registros históricos, desde a época primitiva os homens desenhavam
imagens representativas nas paredes das cavernas em uma linguagem pictórica1. Cagliari
(1999, p. 14) diz que “de acordo com os fatos comprovados historicamente, a escrita surgiu
do sistema de contagem feito com marcas em cajados ou ossos, e usados provavelmente para
contar o gado, numa época em que o homem já possuía rebanhos e domesticava animais”.
No início eram os pictogramas, a escrita era feita com desenhos para representar
objetos, a escrita ideográfica não era tão fácil de ser entendida. Passado um tempo viu-se que
os símbolos eram muito numerosos, tornando difícil relacionar aos objetos representados, e
que se tornavam cada vez mais complexos. Os pictogramas então deram lugar para os
silabários que eram sinais representando os sons das sílabas.
Mudou-se o foco da escrita, o significado do som das palavras passou de ideográfica
para fonográfica. A partir disso houve uma redução nos números de caracteres necessários à
composição das palavras. Também ocorreu a modificação nos nomes dos caracteres que
1 Pictórica-Forma de escrita pelo qual ideias e objetivos são transmitidos através de desenhos.
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perderam a relação de conotação com os objetos representados, e adquiriram significados
próprios. Segundo Cagliari,
Nessa época de escrita primitiva, ser alfabetizado significava saber ler o que aqueles
símbolos significavam e ser capaz de escrevê-los, respeitando um modelo mais ou
menos padronizado, mesmo porque o que se escrevia era apenas um tipo de
documento ou texto. Com a expansão do sistema de escrita, a quantidade de
informações necessárias para que alguém soubesse ler e escrever aumentou
consideravelmente, o que obrigou as pessoas a abandonar o sistema de símbolos
para representar coisas e a usar cada vez mais símbolos que representassem sons da
fala, como, por exemplo, as silabas. (CAGLIARI, 1999, p. 14).
Pode-se perceber também segundo Massini-Cagliari (1999) que o desenho (figuras,
fotografias) representa o mundo de maneira direta. E a escrita representa o mundo de maneira
indireta, porque a escrita representa a fala, a linguagem e é a linguagem que representa o
mundo.
Deparamo-nos muitas vezes com desenhos usados como figuras que representam os
objetos ou ideias do mundo, seja como escrita que representa a linguagem. O desenho pode
ser também uma forma de escrita. E os desenhos podem dar margens a várias interpretações.
“Embora não tenha uma interpretação única, eles se comportam como todas as outras formas
de escrita, como uso que fazemos do nosso alfabeto, são usadas em combinação com outras
formas de escrita para formar textos e os textos nunca têm uma única interpretação”.
(MASSINI- CAGLIARI, 1999, p.14).
Massini-Cagliari (1999) cita diversos exemplos que mostram a multiplicidade de
interpretação, que é devido ao caráter ideográfico desse tipo de escrita pictográfica. O sistema
ideográfico escreve a partir das ideias que a linguagem transmite, e não a partir de seus sons.
“No sistema ideográfico a decifração (a leitura) parte das ideias expressas pela escrita para
depois recuperar os sons envolvidos. É exatamente o contrário do que acontece quando se
escreve com letras”. (MASSINI-CAGLIARI, 1999, p. 15).
Se escrevermos com letras, partimos da observação dos sons da linguagem para
registrar as ideias. “Portanto, na leitura (ou na decifração), fazemos o caminho inverso;
partimos dos sons para depois chegar às ideias registradas na escrita. É por isso que a escrita
com letras tem uma ideia mais literal do que a escrita com figuras ou desenhos”. (MASSINI-
CAGLIARI, 1999, p.17).
As letras são desenhos, elas possuem um aspecto gráfico importante que vai distinguir
uma das outras, e elas não são desenhos iguais. Elas são desenhos que têm uma função
específica de representar a linguagem, mas pelos sons. E por consequente chegar à ideia
15
registrada pela escrita, ou seja, as palavras, e que é preciso antes decifrar esses sons
representados pelas letras.
Desde cedo à humanidade sentiu necessidade de registrar, guardar a sua linguagem.
Foi dessa necessidade que surgiu a escrita. Segundo a autora foi-se percebendo dois caminhos
a seguir2:
1- Representar o significado (a ideia) veiculado pela palavra e a partir do
reconhecimento deste significado, chegar aos sons que formam esta palavra
na leitura.
2- Representar os sons de uma palavra e, a partir do reconhecimento desses
sons, na leitura, chegar ao significado desta palavra, às ideias a ela
associadas.
Massini-Cagliari (1999) fala um pouco sobre essas duas formas de escrita e diz: “a
primeira maneira de registrar linguagem, escrevendo a partir dos significados, das ideias,
damos o nome de escrita ideográfica; a segunda, que escreve a partir dos sons das palavras, é
chamada escrita fonográfica”. (MASSINI-CAGLIARI, 1999, p.22).
A autora diz que a escrita ideográfica não é mais primitiva do que a fonográfica,
porque foi a primeira a surgir historicamente. Existem línguas, como o chinês, por exemplo,
que até hoje se utiliza desse sistema como escrita. Convivemos bastante com o sistema
ideográfico de escrita, juntamente com a escrita com letras, se observarmos as placas de
trânsito, e como escrevemos os números entre outros exemplos.
A diferença entre a escrita ideográfica e a escrita com letras na nossa cultura está na
forma de uso, e sua função. Dependendo do uso a escrita ideográfica é muito importante, pois,
passa a ideia a ser transmitida de uma maneira mais rápida.
Fica claro que discussões sobre o surgimento da escrita são amplos, no entanto
constata-se que a escrita nasce num contexto humano, caracterizado pela necessidade de
comunicação, utilizando-se de signos escritos. Sabe-se também que a Suméria é considerada o
2 MASSINI-CAGLIARI, G. Quando o desenho é escrita? In: MASSINI-CAGLIARI, G; CAGLIARI, L. C.
Diante das letras: a escrita na alfabetização. 1999, p. 22.
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berço da escrita, pois os primeiros registros se deram em uma pequena lápide, encontrada em
um templo, nela o construtor escreveu o nome do seu rei. (BARBOSA, 1992).
A evolução da escrita acompanha lentamente a evolução da humanidade, o homem
sente necessidade de registrar de forma clara suas ideias e suas expressões significativas.
Cagliari mostra um pouco dessa evolução:
A escrita, pelo que se sabe hoje, começou de maneira autônoma e independente, na
Suméria, por volta de 3300 a.C. É muito provável que no Egito, por volta de 3000
a.C., e na China, por volta de 1500 a.C., esse processo autônomo tenha se repetido.
Os Maias na America Central também inventaram um sistema de escrita
independentemente de um conhecimento prévio de outro sistema de escrita, num
tempo indeterminado ainda pela ciência, que talvez se situe por volta do inicio da era
cristã. (CAGLIARI, 1999, p.15).
Segundo Cagliari (1999), outro povo que contribuiu para a história da escrita foram os
semitas. Ao formarem seu sistema de escrita eles escolheram um conjunto de palavras em que
o primeiro som se diferenciava.
Outra novidade foi o princípio acrofônico, em que o som inicial do nome das letras é
o som que a letra representa. Pogorzelski e Lima (2010) em seu artigo explicitam que os
romanos também se utilizaram do princípio acrofônico, mas não davam nomes especiais para
as letras. No entanto, foram os gregos que desenvolveram o alfabeto incluindo as vogais,
mantendo o mesmo princípio acrofônico. Desenvolveram, porém, alguns ajustes, incluindo as
vogais.
Os romanos assimilaram o que puderam da cultura grega, incluindo o alfabeto. Os
romanos utilizaram 21 letras que sofreram modificações na forma gráfica e no valor fonético
de algumas. Com o objetivo de seguir o princípio acrofônico, os romanos modificaram os
nomes das letras. Para eles era mais prático designar as letras por monossílabos iniciados com
o som mais representativo de cada uma das letras. E assim as letras passaram a se chamar „a,
bê, cê, dê, etc‟ e o alfabeto passou a ter outro nome em português: „abecê‟. Segundo o autor:
[...] o povo romano percebeu que não precisavam ter nomes especiais para as letras;
era mais simples ter como nome da letra apenas o próprio som dela. Dessa forma,
mantinha-se o principio acrofônico e ficava ainda mais fácil usar o alfabeto e se
alfabetizar. Foi assim que alfa, beta, gama, delta, épsilon, etc. transformaram-se em
a, bê, cê, dê, e, etc. (CAGLIARI, 1999, p. 17).
Cagliari (1999 p.17) diz que “a alfabetização acontecia de maneira semelhante às dos
semitas, com a única diferença de que os gregos tinham de detectar na fala não apenas as
consoantes, mas também as vogais, para escreverem alfabeticamente”.
17
O sistema alfabético, com suas técnicas e instrumentos, configuram outra redefinição
no processo da comunicação da escrita, que consiste primeiro na invenção de uma série de
signos gráficos, na decomposição da palavra em sons simples, em que cada qual é
representado por um só signo. Não mais a pictografia, ou a ideografia, desenhos
representando ideias, mas sinais que, evoluindo dos desenhos representavam diretamente os
sons da fala.
Cagliari (mímeo; s/d, p.1) explicita que o melhor tipo de caractere para representar os
sons era o silábico, que trazia muitas redundâncias. “Se existiam „letras‟ como PA, BA, TA,
AS, LA, RA, ou PE, BE, TE, SE, LE, RE, podia-se simplificar mais ainda e formar uma nova
classe de caractere, como A, E, P, B, T, S, L, R etc”. Na teoria, esse foi o desenvolvimento do
alfabeto. Segundo o autor, no entanto, a prática não aconteceu do modo esperado, a escrita
não apareceu ao mesmo tempo para todos os povos, o que torna a história interessante.
Diz ainda que os antigos costumavam escrever palavras sem separação, emendando
umas nas outras. Para evitar o duplo sentido, ou simplesmente descartar palavras, usavam um
ponto para separa-lás. Os semitas escreviam da direita para a esquerda. Os gregos começaram
a escrever compondo uma linha da esquerda para a direita e a seguinte da direita para a
esquerda.
Massini-Cagliari (1999) diz que existem muitos tipos de escrita fonográfica, como a
escrita silábica que é usada por muitos povos, entre eles os japoneses, e a escrita consonantal
que consiste em representar as palavras através da escrita de seus sons consonantais. Já a
escrita fonética ou alfabética consiste em representar os sons da fala, exatamente conforme
eles foram pronunciados. Para representar foneticamente as palavras de uma língua é preciso
registrar todas as nuances de pronúncia, uma vez que elas se modificam conforme a classe
social e a região do país.
A escrita passou por dificuldades com diversos dialetos, diante das várias diversidades
de línguas o alfabeto parecia que ia desaparecer, mas com o surgimento da ortografia, acabou
sendo salva. “[...] a ortografia mostrou uma vantagem a mais: além de servir para neutralizar a
variação linguística na escrita, do ponto de vista fonético, passou a ser o guia interpretativo do
valor da variação gráfica das próprias letras”. (CAGLIARI, 1999, p.19).
A escrita alfabética ortográfica veio auxiliar o sistema de escrita fonográfica fonética,
uma vez que com a invenção do alfabeto e da escrita fonética, tiveram problemas com a
variação linguística. Pois ficaria difícil se todos se utilizassem de uma escrita diferente,
complicando sua interpretação, por isso, surgiu a ortografia, para que se escrevesse de uma
18
única forma ortográfica as palavras de uma língua, independente de suas diferentes
pronúncias.
Segundo Cagliari o alfabeto hoje é uma parte do sistema de escrita que usamos, mas as
letras são a parte mais importante deste sistema. E completa:
(...) O alfabeto grego formou-se a partir do sistema fenício, uma ramificação da
escrita semítica, que funcionou como modelo gráfico. Alguns caracteres fenícios,
entretanto, passaram a representar vogais no alfabeto grego, perdendo seu valor
consonantal de origem (as línguas semíticas grafavam apenas as consoantes das
palavras). Pode-se dizer que os gregos, ao introduzirem vogais no sistema de escrita,
desenvolveram o primeiro alfabeto moderno. O abecedário romano, empregado até
hoje, derivou do alfabeto grego. Inicialmente existiam apenas as letras capitais
(maiúsculas). As minúsculas correspondentes surgiram na Idade Média. Seu uso
cursivo, com ligaduras entre as letras, modificou bastante sua forma gráfica.
(CAGLIARI, 2009, p. 164).
A escrita constituiu-se num sistema de intercomunicação humana através dos signos,
desde as pinturas nas cavernas até a formação do princípio alfabético. E que evoluiu,
buscando agilidade na representação, visando transformações sociais e econômicas.
1.2. A história da alfabetização no Brasil
Os estudos na disciplina de História da Educação e História da Educação no Brasil,
representados por autores como (ARANHA, 1998/2006), (HILSDORF, 2006), (RIBEIRO,
2000), mostra que a história da educação no Brasil se iniciou com a chegada dos jesuítas.
Inácio de Loiola fundou, em 1534, a Companhia de Jesus, como uma reação da igreja católica
contra a reforma protestante. O objetivo principal era deter o avanço protestante, e para isso,
utilizou-se do método de educar as novas gerações e também a ação missionária, procurando
converter os povos dos lugares colonizados à fé católica.
Quando o primeiro governador-geral Tomé de Souza chegou ao Brasil em 1549, veio
acompanhado por jesuítas, entre eles Manuel da Nóbrega. Os jesuítas criaram a escola „de ler
e escrever‟ em Salvador, e isso foi o início do processo de criação de escolas elementares,
secundária, seminário e missão espalhada pelo Brasil.
Num período de 210 anos, eles promoveram ações de catequizar os índios, e educar os
filhos dos colonos, de formarem novos sacerdotes e também a elite intelectual. Os padres
aprenderam as línguas indígenas nativas para poder elaborar recursos para atrair e estimular as
crianças. Pois eles não conseguiram influenciar os índios adultos, então passaram a tarefa de
conquistar os filhos dos índios e ensinaram eles a ler e a escrever, juntamente com os filhos
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dos colonos. Utilizando-se como instrumento o uso do teatro, a música, poesia, entre outros.
Pode-se perceber na história, a importância da alfabetização, tanto para os índios como para
os brancos, sem a qual não seria possível a catequização ou o avanço nos estudos.
Essa é uma amostra das contribuições dos jesuítas na história do processo de
alfabetização no Brasil. Araújo (1999, p.32) diz que “foram os padres da companhia que nos
trouxeram o alfabeto, o latim, a gramática e a literatura de fundo místico e ascético”. Como
mostra o estudo feito a partir do artigo de Ayala de Sousa Araújo3, sobe o tema „ História da
Alfabetização: Reflexões sobre as contribuições da Companhia de Jesus‟.
O trabalho dos jesuítas foi facilitado pela realeza, com o intuito de que, à medida que
convertia os índios aos costumes europeus e à religião católica, favorecia o trabalho
colonizador da coroa portuguesa. Com seu trabalho educativo os jesuítas ensinavam as
primeiras letras e a gramática latina, ensinavam a doutrina cristã e os costumes europeus.
Em entrevista aos „Cursos Livres Univesp TV - História do Brasil - História da
Alfabetização‟ a professora Maria Luiza Marcílio4 diz que o governo de Portugal abriu mão
de abrir escolas aqui no Brasil e permitiu que os jesuítas assumissem a educação, e
praticamente deu o monopólio da educação para os jesuítas.
Na fala da professora, os jesuítas eram os melhores construtores de colégios na
Europa, e um pouco depois da criação da Companhia de Jesus, eles vieram ao Brasil com a
finalidade missionária (catequização) em 1º lugar e em 2º formar sacerdotes brancos para
ensinar os índios e para aqui ficar.
Vieram vários sacerdotes e padres, José Anchieta, Manuel da Nóbrega, entre outros e
partiram para a criação dos colégios, 1º em Salvador, Rio de Janeiro e em 1554 em São Paulo
(fundou a cidade através do colégio), uma escola para índios e formação de sacerdotes
eventualmente.
Na Europa a Companhia de Jesus decidiu-se pelo trabalho em instituições escolares.
No Brasil, eles passaram a dedicar-se aos colégios para os filhos dos colonos. Já com os
índios a ação educacional resumiu-se na cristianização e na pacificação, objetivando deixá-los
dóceis. Já com os filhos dos colonos a educação foi além da escola elementar de ler e
escrever, ou seja, foi além de somente alfabetizá-los.
3 Graduada em Pedagogia (UESC); Especialização em Psicopedagogia (FACINTER); Especialização em
Educação para as Relações Étnicos Raciais (UESC); Mestranda em Educação NPGED/UFS. 4 Maria Luiza é professora de história da USP e presidente da Comissão de Direitos Humanos da Universidade
de São Paulo. Também é a criadora e diretora da Biblioteca Virtual de Direitos Humanos da USP.
20
Eles utilizavam na organização dos colégios o plano de estudo definido por um
documento chamado Ratio Studiorum5. O documento trazia regras práticas sobre a ação
pedagógica e sobre a organização administrativa.
Em 1759, com o crescimento de conflitos de interesses entre os jesuítas e portugueses,
sobretudo em relação às missões, o marquês de Pombal (Sebastião José de Carvalho e Melo
primeiro-ministro de Portugal) expulsou os jesuítas do Brasil. Para muitos historiadores, este
fato significou uma desestabilização no sistema escolar brasileiro, porque os jesuítas
possuíam muitas escolas, além de terem formados professores e disciplinar os alunos.
Após todo o desmoronamento da estrutura educacional montada pela Companhia de
Jesus, a educação ficou prejudicada de imediato, pois não foi substituída por outra
organização educacional. Os índios ficaram entregues a própria sorte e abandonaram as
missões. Foi apenas em 1772, que foi implantado o ensino público oficial.
Maria Luiza Marcílio reforça que com a expulsão dos jesuítas o governo português
resolveu assumir o ensino e criou o ensino público. Eles instituíram a escola régia, pública e
eram constituídas da escola de ler e escrever principalmente.
Ou seja, a coroa estabeleceu planos de estudos, nomeou professores e modificou o
curso de humanidades, para o sistema de aulas régias6. Incluindo aulas avulsas em salas
alugadas, em prédios das antigas escolas jesuíticas ou mesmo nas casas dos professores.
Essa foi à primeira forma de ensino público oficial no Brasil. Os lugares eram
improvisados. Além da educação doméstica, em que os que tinham condições pagavam
preceptores para seus filhos. Também se reuniam as crianças em igrejas, em salas das
prefeituras e de lojas, e na casa dos professores, que podiam ser nomeados pelo governo ou
contratados por particulares. Outras ordens religiosas também continuaram atentas à
educação, como as carmelitas, beneditinos e franciscanos.
A professora Maria Luiza Marcílio diz ainda que o professor contratado (por volta de
1770-1772) deveria passar por um exame aonde ele tinha que mostrar que sabia ler, escrever,
contar e ter um mínimo de doutrina cristã, e estas eram as matérias de toda iniciação.
Segundo a professora Maria Luiza o perfil social desses professores era um perfil de
pessoas muito pobres e velhas, e que não tinham o que fazer, não tinha emprego e nem
5 Ratio Studiorum - buscava instruir o jesuíta docente sobre a natureza, a extensão e as obrigações do seu cargo.
Trazia uma sistematização da pedagogia jesuítica, contendo 467 regras que cobriam todas as atividades
diretamente ligadas ao ensino. 6 Aulas Régias – estudos avulsos ministrados por um professor régio, isto é, autorizado e nomeado pelo rei.
21
ocupação. E não tinham outra forma de sobreviver. „Diziam-se muito no começo do século
XIX, que quando um sujeito não tinha forma nenhuma de trabalho, não encontrava nem
mesmo para fazer café nas repartições, ele ia ser professor primário‟. O que mostra que a
história da desvalorização do professor também é muito antiga.
Pesquisando sobre a alfabetização encontro-me com os dizeres de Mortatti (2006) que
fez pesquisas sobre o assunto, segundo ela no Brasil desde o final do século XIX, em especial
com a proclamação da República, a educação ganhou destaque como um vislumbre da
modernidade. A escola se consolidou como um lugar, uma instituição necessária para o
preparo das gerações futuras, com o objetivo de atender os ideais republicanos que buscavam
instaurar uma nova ordem política e social. Com isso a universalização da escola teve um
papel importante como instrumento da modernização e do progresso, ela diz „foi como
principal propulsora do esclarecimento das massas iletradas‟. E completa:
No âmbito desses ideais republicanos, saber ler e escrever se tornou instrumento
privilegiado de aquisição de saber/esclarecimento e imperativo da modernização e
desenvolvimento social. A leitura e a escrita - que até então eram práticas culturais
cuja aprendizagem se encontrava restrita a poucos e ocorria por meio de transmissão
assistemática de seus rudimentos no âmbito privado do lar, ou de maneira menos
informal, mas ainda precária, nas poucas “escolas” do Império („aulas régias”) -
tornaram-se fundamentos da escola obrigatória, leiga e gratuita e objeto de ensino e
aprendizagem escolarizados. Caracterizando-se como tecnicamente ensináveis, as
práticas de leitura e escrita passaram, assim, a ser submetidas a ensino organizado,
sistemático e intencional, demandando, para isso, a preparação de profissionais
especializados. (MORTATTI, 2006, p.2).
Os processos de ensinar e aprender a leitura e a escrita se apresentaram como um
momento de passagem para um mundo novo, que instaurou modos diferentes de pensar, sentir
e agir, e fez com que mudassem as relações dos sujeitos entre si, com a natureza, com a
história e com o próprio Estado.
Mais de cem anos após a implantação no Brasil do modelo republicano de escola, o
problema do fracasso escolar na alfabetização foi sendo debatido e buscaram-se soluções,
mobilizando a atenção de todos envolvidos no âmbito educacional.
Mortatti (2006) diz que desde essa época, observavam-se esforços de mudanças, para a
superação do que em cada momento da história consideravam como tradicional no ensino e
fator responsável pelo fracasso na alfabetização. Por quase um século, os esforços se fixavam
sistemática e oficialmente na questão dos métodos de ensino da leitura e da escrita.
22
Diz ainda que houve muitas disputas entre os que se consideravam portadores de um
novo e revolucionário método de alfabetização e os que continuavam defendendo métodos
considerados antigos e tradicionais.
Segundo Mortatti (2006) até o final do Império brasileiro, o ensino carecia de
organização, e as poucas escolas que existiam eram salas adaptadas, que abrigavam alunos de
todas as séries, e funcionavam em prédios pouco apropriados. Por causa da situação precária
de funcionamento, o ensino dependia do empenho do professor e do aluno para subsistir. O
material que se dispunham, também era precário, embora na segunda metade do século XIX,
houvesse alguns materiais impressos (livros) para o ensino da leitura, editados e produzidos
na Europa.
Em 1890 implantou-se a reforma da instrução pública no Estado de São Paulo,
servindo de modelo para os demais estados do Brasil. Essa reforma se iniciou com a
reorganização da escola Normal de São Paulo e a criação da escola Modelo; em 1896, foi
criado o jardim de infância nesta escola. Do ponto de vista didático, a base dessa reforma
estava nos métodos de ensino.
Mortatti (2006) diz ainda que em decorrência da „autonomia didática‟ proposta pela
reforma Sampaio Dória7 e de novas urgências políticas e sociais, a partir de meados da década
de 1920 aumentou a resistência dos professores quanto à utilização do método analítico8 e
começaram a buscar novas propostas, visando solucionar os problemas de ensino e
aprendizagem iniciais da leitura e da escrita.
Já no início da década de 1980, passou-se a questionar a forma de alfabetização, a fim
de enfrentar particularmente o fracasso da escola na alfabetização de crianças. Surge então no
Brasil o pensamento construtivista sobre alfabetização, resultantes de pesquisas sobre a
psicogênese da língua escrita desenvolvida pela pesquisadora argentina Emília Ferreiro e
colaboradores, mudando se o foco de discussão sobre os métodos de ensino para o processo
de aprendizagem da criança (sujeito cognoscente9).
7 Sampaio Dória – bacharel em Direito (1908), professor de Psicologia da Escola Normal da Praça, participante
ativo da Liga Nacionalista, apresentou a base de um plano de extinção do analfabetismo, centrado na urgência
nacional de „alfabetizar o povo‟. Discutiu os métodos de ensino da leitura, em especial com a ideia de autonomia
didática, propondo que o professor não seja um mero executor obediente, mas que tenha liberdade de escolher
com responsabilidade, o livro didático e o método de ensino desde que em conformidade com as necessidades da
criança em formação e com as bases oficiais estabelecidas a fim de assegurar a unidade. Fonte In: MORTATTI,
2000a, p. 131-134. 8Os métodos analíticos, também são conhecidos como globais, têm como pontos de partida unidades maiores da
língua, como o conto, a oração ou a frase. 9 Sujeito cognoscente – que tem autonomia no processo de construção do conhecimento
23
Ao longo do período histórico, Mortatti (2006) ressalta a marcante tensão entre os
„modernos e antigos‟, na disputa para determinar o melhor método de alfabetização.
24
CAPÍTULO II - OS MÉTODOS DE ALFABETIZAÇÃO
Os métodos de alfabetização sempre acompanharam o ensino da alfabetização no
Brasil desde a época em que os jesuítas aqui chegaram.
Segundo Mortatti (2006) em nosso país a história da alfabetização tem sua face mais
visível nas questões dos métodos de alfabetização, especialmente no final do século XIX, no
qual se destacavam as disputas relacionadas com antigas e novas explicações para o problema
da dificuldade das crianças em aprenderem a ler e a escrever, em especial na escola pública.
Questões relacionadas aos métodos de alfabetização continuam presentes no âmbito
escolar, quando se discuti a utilização ou não de cartilhas ou quando se traz a questão da
desmetodização do processo de alfabetização na década de 1980. A discussão em torno dos
métodos é que esses métodos mecanizariam a questão da escrita.
De acordo com Mortatti (2000a) acompanhando o movimento das tematizações,
normatizações e concretizações sobre as questões dos métodos, as primeiras cartilhas
brasileiras, produzidas no final do século XIX, sobretudo por professores fluminenses e
paulistas a partir de experiências didáticas, foram baseadas nos métodos de marcha sintética
(soletração, fônico e silabação).
Iniciava-se o ensino da leitura apresentando as letras, seus nomes, depois reunindo as
letras em sílabas, passando a conhecer as famílias silábicas, ensinando a ler as palavras
formadas com sílabas e letras, e na sequência ensinando a formação de frases, e assim por
diante. A escrita estava restringida à caligrafia e seu ensino, à cópia, ditados e formação de
frases, enfatizando a ortografia e o desenho da letra de forma correta.
Assim sendo, o primeiro método que chegou ao Brasil foi o método sintético ou a
marcha sintética.
O método sintético ou marcha sintética é o método que parte da silabação, ou parte das
unidades menores da língua, ou seja, das letras, para depois compor a escrita das palavras, se
caracterizando da correspondência entre o som e grafia, do oral e escrito. A aprendizagem se
faz por meio de letra por letra, sílaba por sílaba e palavra por palavra. Os métodos sintéticos
se dividem em três tipos: o alfabético, o fônico e o silábico.
O método alfabético, conhecido também por soletração, inicia-se o aprendizado a
partir das letras e, em seguida, forma as sílabas, unindo as consoantes com as vogais. Depois
se formam as palavras que constituem o texto.
25
No método fônico, a aprendizagem parte do som das letras: se junta os sons das
consoantes com os sons das vogais, articulando as sílabas formadas.
Segundo Capovilla; Capovilla (2004), muitas pesquisas falam sobre como se devem
alfabetizar as crianças, se pelo método global ou pelo método fônico. Os autores apontam que
a diferença entre eles é simples. O método global propõe que a alfabetização deve ser feita a
partir de textos complexos e introduzido logo no início da alfabetização, antes que a criança
tenha aprendido a decodificar e a codificar, não havendo um ensino explícito e sistemático das
correspondências grafema-fonema, pois se espera que a criança aprenda sozinha tais relações.
No entanto, no método fônico o texto é introduzido de maneira gradual, com complexidade
crescente, à medida que a criança adquira boa habilidade de fazer a decodificação
grafofonêmica, logo após ela ter recebido instruções explícitas e sistemáticas da consciência
fonológica e corresponder grafemas e fonemas.
Capovilla; Capovilla (2004) diz que o método fônico explicitado em seu livro tem
como objetivo desenvolver as habilidades metafonológicas, e ensinar as correspondências
grafofonêmicas de modo a levar a criança a adquirir as competências na leitura e na escrita, na
escrita fazer a decodificação fonológica suficiente para poder registrar o seu pensamento, e na
leitura fazer a decodificação grafofonêmica suficiente para ter acesso semântico natural
conforme processa o texto.
De acordo com Capovilla; Capovilla (2004) o método baseia-se na constatação de que
as crianças com dificuldades de leitura e disléxicas tem dificuldades na discriminação,
segmentação e manipulação dos sons da fala de forma consciente. Aponta que esta
dificuldade pode ser diminuída de modo significativo a partir de atividades explícitas e
sistemáticas de consciência fonológica, durante o processo de alfabetização, ou momentos
antes.
O método fônico se mostra adequado ao ensino não somente de crianças com
dificuldades de aprendizagem na leitura e na escrita, mas também com crianças sem
distúrbios de leitura e escrita.
Os autores apontam que a consciência fonológica é a habilidade de discriminar e
manipular os segmentos da fala, sendo um quesito fundamental para a aquisição de leitura e
escrita. Outro quesito é o ensino explícito e sistemático das correspondências entre as letras e
os sons. O professor deve expor para a criança não somente os nomes das letras, mas também
dos seus sons. Para que a criança compreenda que cada letra escrita corresponde às vezes, mas
26
nem sempre preciso, a um som da fala. Conhecendo como isso ocorre, os fundamentos da
leitura e da escrita serão apreendidos mais facilmente pelas crianças.
O método fônico é um importante meio para a alfabetização, porque requer o
desenvolvimento de diversas habilidades, como as semânticas, as sintáticas, as fonológicas e
as metafonológicas. Segundo Capovilla; Capovilla:
Não é possível alcançar a competência em leitura e escrita sem o domínio dessas
habilidades. A partir de extensos levantamentos de pesquisas conduzidas nos mais
diversos países, este livro oferece aos professores atividades comprovadamente
eficazes para desenvolver tais habilidades e levar a criança a um domínio seguro da
leitura e da escrita competentes. (CAPOVILLA; CAPOVILLA, 2004, p.88).
Cabe ao professor, criar situações metodológicas, nas quais o uso da escrita tenha
realmente uso, função e sentido para as crianças.
No método silábico, também conhecido como silabação, se aprende as sílabas, que
constituem as unidades sonoras, para depois formar as palavras. Primeiro trabalham-se as
sílabas simples, para depois trabalhar as sílabas complexas. Neste método, o aprendizado
ocorre de forma mecânica, visto que é fundamentado na repetição. São utilizadas as cartilhas
para guiar tanto os alunos quanto os professores. E enfatizam a questão da soletração. Mortatti
(2006) completa:
Para o ensino da leitura, utilizavam-se, nessa época, métodos de marcha sintética (da
"parte" para o "todo"): da soletração (alfabético), partindo do nome das letras; fônico
(partindo dos sons correspondentes às letras); e da silabação (emissão de sons),
partindo das sílabas. Dever-se-ia, assim, iniciar o ensino da leitura com a
apresentação das letras e seus nomes (método da soletração/alfabético), ou de seus
sons (método fônico), ou das famílias silábicas (método da silabação), sempre de
acordo com certa ordem crescente de dificuldade. Posteriormente, reunidas as letras
ou os sons em sílabas, ou conhecidas as famílias silábicas, ensinava-se a ler palavras
formadas com essas letras e/ou sons e/ou sílabas e, por fim, ensinavam-se frases
isoladas ou agrupadas. Quanto à escrita, esta se restringia à caligrafia e ortografia, e
seu ensino, à cópia, ditados e formação de frases, enfatizando-se o desenho correto
das letras. (MORTATTI, 2006, p. 5).
De acordo com Mortatti (2000a) Thomaz Paulo do Bom Sucesso Galhardo escreve a
Cartilha da Infância, na década de 1880, defendendo o método da silabação por considerar o
mais adequado ao ensino no Brasil. Também uma tendência que utilizou aspectos psicológicos
na alfabetização foi o trabalho pautado no livro „Testes ABC‟ de Lourenço Filho, que objetivou a
verificação da maturidade necessária para a aprendizagem da leitura e da escrita.
27
Um exemplo da Cartilha da Infância de Thomaz Galhardo10:
Figura 1- Página da Cartilha da Infância.
Mendonça (2003) diz que o método silábico, ensinava o nome das vogais primeiro, e
depois o de uma consoante, em seguida eram apresentadas as famílias compostas por elas. Ao
contrário do fônico, a silabação, a sílaba é apresentada pronta, não se explicando a articulação
entre as consoantes e as vogais, ensinando na sequência palavras compostas por estas sílabas e
outras que já tenham sido estudadas.
Mendonça (2003) completa dizendo que:
Os métodos da soletração, o fônico e o silábico são de origem sintética, pois partem
da unidade menor rumo à maior, isto é, apresentam a letra, depois unindo letras se
obtém a sílaba, unindo as sílabas compõem-se palavras, unindo palavras formam-se
sentenças e juntando sentenças formam-se textos. Há um percurso que caminha da
menor unidade (letra) para a maior (texto). (MENDONÇA, 2003, p. 37).
De acordo com Mortatti (2006) em 1876 iniciou-se um marco crucial nesta história,
que foi a publicação em Portugal da Cartilha Maternal ou Arte da Leitura, escrita pelo poeta
português João de Deus. No início da década de 1880, o método João de Deus, contido nesta
cartilha passou a ser divulgado sistemática e programaticamente, em especial na província de
São Paulo e do Espírito Santo, por Antônio da Silva Jardim.
10
Figura 1- Página da cartilha da Infância, de Thomaz Galhardo (141. ed., 1939). Fonte: BCPP – AHSM. In:
MORTATTI, 2000a, p. 228.
28
O método João de Deus ou método da palavração baseava-se nos princípios da
linguística da época e consistia em iniciar o ensino da leitura pela palavra, e depois analisá-la
a partir dos valores fonéticos das letras.
Esse foi um dos primeiros momentos intitulado por Mortatti (2000a) e que se estendeu
até o início da década de 1890, em que deu início a disputa entre os que defendiam o método
João de Deus e os que defendiam os métodos sintéticos (soletração, fônico e silabação).
Havendo então, mudanças neste contexto, institucionalizando o método analítico no país.
No método analítico, o aprendizado na alfabetização se dá, a partir das unidades
maiores, para depois se chegar às unidades menores.
Mortatti (2006) prossegue dizendo que diferente dos métodos sintéticos até então
utilizados, o método analítico teve forte influência da pedagogia norte americana, baseado nos
princípios didáticos vindos de uma nova concepção (de caráter biopsicofisiológico) da
criança, em que a forma de apreensão do mundo era entendida como sincrética. Ela continua:
De acordo com esse método analítico, o ensino da leitura deveria ser iniciado pelo
“todo”, para depois proceder à análise de suas partes constitutivas. No entanto,
diferentes se foram tornando os modos de processuação do método, dependendo do
que os defensores consideravam o “todo”: a palavra, ou a sentença, ou a “historieta”.
O processo baseado na “historieta” foi institucionalizado em São Paulo, mediante a
publicação do documento Instruções práticas para o ensino da leitura pelo methodo
analytico- modelos de lições. (MORTATTI, 2006, p.7).
Assim sendo, o método analítico é um processo de análise das palavras, as crianças
analisam as palavras, frases ou histórias, depois decompõem até chegar às letras. Esse método
também é conhecido como o método da palavração, ou método João de Deus. Palavração,
pois parte das palavras até chegar à sua decomposição.
Pertencem à categoria dos métodos analíticos, os métodos de contos, historietas,
sentenciação e palavração.
Segundo Frade (2007) o método da palavração parecia ser uma resposta à
modernização que pretendia nos discursos sobre o método analítico, diz ainda que “uma
concretização deste método encontra-se no livro Primeira Leitura, de Artur Joviano,
produzido em Minas Gerais, em 1907, como resposta às críticas empreendidas aos silabários”.
(FRADE, 2007, p.26).
Ela prossegue dizendo que “no método de sentenciação, a unidade é a sentença que,
depois de reconhecida globalmente e compreendida, será decomposta em palavras e,
finalmente, em sílabas”. (FRADE, 2007, p.27).
29
Mendonça (2003) traz como exemplo “a palavra (BOLO) em que se analisam as
sílabas (BO-LO), desenvolve-se a família silábica da primeira sílaba que a compõe (BA-BE-
BI-BO-BU) e chega-se às letras”. (MENDONÇA, 2003, p. 37).
Frade (2007) relata que no Brasil, ainda que haja menção aos métodos analíticos,
desde o final do século XIX, surge mais tarde, na década de 1930, a denominação „método
global de contos ou de historietas‟. Tendo como ponto de partida o texto. Frade continua:
No método global de contos e historietas a marcha seguida, com algumas variações,
parte do reconhecimento global de um texto que é memorizado e “lido” durante um
período, para o reconhecimento de sentenças, seguida do reconhecimento de
expressões (porções de sentido), de palavras e, finalmente, das sílabas. Aqui, não
estamos falando de um processo seqüencial e quase simultâneo entre as fases já
descritas. Tomando como foco o sentido, o professor encaminhava o processo
utilizando-se, por um período, de textos completos das várias lições seguidas.
Somente após esse convívio maior com o texto é que viria uma forma de
decomposição, mas com o cuidado de fragmentar o texto em parcelas maiores como
primeiro a sentença e depois a palavra. (FRADE, 2007, p. 27-28).
Juntando-se aos dizeres de Frade (2007), Mendonça (2003) acrescenta dizendo que o
surgimento do método global veio com a finalidade de partir de um contexto e de algo mais
próximo da realidade da criança. “Sabe-se que a letra ou a sílaba, isoladas de um contexto
dificultam a percepção, pois são elementos abstratos para a criança”. (MENDONÇA, 2003,
p.36).
Mortatti (2006) acrescenta que as cartilhas produzidas, neste momento da história da
alfabetização, em especial no início do século XX, basearam-se então no método analítico,
buscando adequar-se as instruções oficiais, no caso paulista.
Segue um exemplo da cartilha Maternal de João de Deus11
:
11
Figura 2 - Capa da Cartilha Maternal, de João de Deus (edição de 1990). Fonte: CRPHE. In: MORTATTI,
2000a, p. 226.
30
Figura 2- Capa da Cartilha Maternal
.
O método misto ou eclético é a junção do método sintético com o método analítico, ou
seja, ora partia das unidades menores para compor as palavras, ora partia das palavras para
decompor em unidades menores, trabalhava-se com os dois métodos, mesclando e misturando
para que as crianças tivessem um maior entendimento.
De acordo com Mortatti (2006) os defensores do método analítico continuaram
utilizando-o propagando sua eficácia, no entanto buscando conciliar os dois tipos básicos de
métodos de ensino, (sintético e analítico), passaram a utilizar os métodos mistos ou ecléticos
(analítico-sintético ou vice versa) considerados mais rápidos e eficientes. Mortatti (2006)
completa:
A disputa entre os defensores dos métodos sintéticos e os defensores dos métodos
analíticos não cessaram; mas o tom de combate e defesa acirrada que se viu nos
momentos anteriores foi-se diluindo gradativamente, à medida que se acentuava a
tendência de relativização da importância do método e, mais restritamente, a
preferência, nesse âmbito, pelo método global (de contos), defendido mais
enfaticamente em outros estados brasileiros. (MORTATTI, 2006, p. 9).
Segundo Mortatti (2000) a partir de 1930, aproximadamente, as cartilhas passaram a
ser baseado nos métodos mistos ou ecléticos, em especial pela decorrência da disseminação e
31
repercussão dos „testes ABC‟, de Lourenço Filho, que tinha como finalidade medir o nível de
maturidade necessário para o aprendizado da leitura e da escrita, visando maior rapidez e
eficiência na alfabetização. No que Mortatti (2000b, p.45) completa: “verifica-se, então, um
processo de secundarização da importância do método, uma vez que o como ensinar encontra-
se subordinado à maturidade da criança e as questões de ordem didática, às de ordem
psicológica”.
Mortatti (2006, p.10) acrescenta que a escrita prosseguiu sendo entendida como uma
habilidade de caligrafia e ortografia, que tinha que ser ensinada, ao mesmo tempo à habilidade
de leitura, e que o aprendizado de ambas, demandava um período preparatório, com
„exercícios de discriminação e coordenação viso-motora e auditivo-motora, posição de corpo
e membros, dentre outros‟.
Em relação ao uso das cartilhas, Mendonça (2003) diz que a partir de 1930, cresceu
consideravelmente o seu número de publicações, pois isso passou a ser um grande negócio.
De acordo com ela, por volta de 1944, surge o manual do professor, com a função de orientar
o professor para o uso correto desse material. Mendonça (2003, p.38) diz que “em pesquisas
realizadas nos anos de 1960 e 1980, as principais cartilhas adotadas no Estado de São Paulo
eram Caminho Suave, Quem Sou? E Cartilha Sodré (anos 1960); e Caminho Suave, No Reino
da Alegria, Mundo Mágico e Cartilha Pipoca (anos 1980)”.
Mendonça (2003, p.39) continua dizendo que: “no intuito de facilitar a leitura para o
aluno, a cartilha propõe textos que são pretextos, elaborados com palavras compostas e sílabas
já dominadas. Porém, o conteúdo, a coesão e a coerência, na maioria dos casos, ficam
prejudicados”.
E ainda, fala que a cartilha ignora a realidade linguística do aluno, quando trabalha
textos que não consideram a sua experiência de vida, desenvolvendo um trabalho fora do
contexto do aluno.
Trago aqui alguns exemplos das cartilhas utilizadas entre os anos de 1960 e 198012
:
12
Figura 3 - Capa da cartilha Sodré, de Benedicta Stahl Sodré (254. ed. 1979). Fonte: CRPHE. In:
MORTATTI, 2000a, p. 240.
32
Figura 3- Capa da Cartilha Sodré.
Figura 4 – Página da Cartilha Sodré
13.
13
Figura 4 – Página da cartilha Sodré, de Benedicta Stahl Sodré (1. ed., década de 1940).
33
Figura 5 - Capa da cartilha Caminho Suave
14.
14
Capa da cartilha Caminho Suave, de Branca Alves de Lima (8. ed., 1954). Fonte: CRPHE. In: MORTATTI,
2000a, p. 242.
34
Figura 6 - Página da cartilha Caminho Suave15
.
15
Capa da cartilha Caminho Suave, de Branca Alves de Lima (8. ed., 1954). Fonte: CRPHE. In: MORTATTI,
2000a, p. 242.
35
Continuando a falar sobre os métodos de alfabetização, falarei um pouco sobre „o
método Paulo Freire‟. A história dos métodos de alfabetização no Brasil e na América Latina
foi transformada e marcada pela presença de Paulo Freire, que inovou a concepção de
alfabetização. Contribuiu para a formação de uma sociedade democrática, com um projeto de
educação democrático e libertador.
Em sua proposta Paulo Freire trouxe um processo educativo centrado na mediação
entre professor e aluno, partindo do conhecimento do aluno. Através de discussões que
problematizam a realidade que o aluno vivenciava e a partir daí, ampliar a aprendizagem,
partindo de um tema gerador.
Mendonça (2003) apresenta alguns passos com as definições e sequência do esquema
do método. Mas antes de apresentar esses passos, ela fala um pouco sobre a expressão palavra
geradora ou tema gerador – trata-se de uma designação sinônima do método Paulo Freire ou
método da palavra geradora: “a palavra sob estudo é extraída do universo vocabular da
comunidade conforme critérios de produtividade temática, fonética e teor de conscientização,
e decomposta em sílabas. Pela combinação dessas sílabas, geram-se outras palavras”.
(MENDONÇA, 2003, p.46).
Segue-se então, para os passos de estudo da palavra geradora no método Paulo Freire,
segundo Mendonça (2003) que são16
:
1º Codificação: Representação de um aspecto da realidade expressa pela palavra
geradora através da oralidade, desenho, dramatização, mímica, música e de outros códigos
que o analfabeto domina.
2º Descodificação17
: Releitura da realidade expressa na palavra geradora para superar
as formas ingênuas de compreender o mundo, através de discussão crítica e do subsídio do
conhecimento universal acumulado (ciência, arte e cultura).
3º Análise e Síntese: Análise e síntese da palavra geradora, com o objetivo de levar o
aprendiz a descobrir de que a palavra escrita representa a palavra falada, através da divisão
das sílabas da palavra e apresentação de suas famílias silábicas na ficha de descoberta, e em
seguida juntar as sílabas para formar novas palavras, levando-o a aprender seus significados,
através da escrita e da leitura.
16
MENDONÇA, O. S. Métodos de Alfabetização: percurso histórico e questões atuais In: Pedagogia Cidadã -
Caderno de Formação - Alfabetização. UNESP. 2003, p.46. 17
Mendonça (2003) utiliza-se do termo descodificar, que significa o mesmo que decodificar, ou seja, traduzir
em linguagem clara uma informação codificada. Descodificar – sinônimo decodificar, antônimo codificar;
decodificar sinônimo descodificar, antônimo codificar. Visto em in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa.
<http://www.priberam.pt/dlpo/descodificar >; <http://www.priberam.pt/dlpo/decodificar>.
36
4º Fixação da Leitura e Escrita: Aqui se passa para a revisão da análise das sílabas da
palavra e apresentação das famílias silábicas, para que através das fichas de descobertas,
formarem novas palavras com significado, em seguida compor frases e textos, com leitura e
escrita significativas.
Mendonça (2003) prossegue:
Os passos da alfabetização caminham da palavra escrita apresentada abaixo do
desenho gerador para suas partes constituintes, as sílabas, num processo analítico-
sintético, por ex: ESCOLA, ES-CO-LA, precisam ser precedidos da codificação
(representação de um aspecto da realidade) e da descodificação (releitura da
realidade para superar as formas ingênuas de compreender o mundo), como propõe
Paulo Freire (1989, p. 11): „A leitura do mundo procede à leitura da palavra...”.
(MENDONÇA, 2003, p. 46).
De acordo com Mendonça (2003) a codificação e descodificação são necessárias para
a exploração das potencialidades mentais dos alunos, através da linguagem que resulta a
técnica de ler e escrever, no qual as crianças usam como instrumentos para o desempenho
social, com poder de reivindicar, com habilidades de questionar, tomar a palavra, expor ideias
e superar formas de compreender o mundo.
A autora ainda completa dizendo que, qualquer que seja a metodologia proposta no
processo de alfabetização, excluir os passos da codificação e da descodificação, iniciando
somente pela letra, pela sílaba, pela palavra ou ainda pelo texto, se torna mecânico, pois não
estão inseridos no processo discursivo da alfabetização. E acrescenta que “deste modo, Freire
contextualiza e acrescenta a interação verbal como colaboradora e enriquecedora do processo
de alfabetização de tal forma que sua prática socializadora de conhecimento dinamiza e
motiva o processo de ensino/aprendizagem”. (MENDONÇA, 2003, p. 47).
Segundo Mendonça (2003, p. 49) considerando-se os passos da codificação e da
descodificação da palavra geradora:
Vê-se que se trata de uma metodologia global, e também analítico-silábica, quando a
análise e a síntese levam o aprendiz à descoberta de que a palavra escrita representa
a palavra falada, ou seja, a fonetização da escrita é percebida pelo alfabetizando. O
processo de análise e síntese da palavra é indispensável e a chave para o
entendimento do processo de leitura e escrita. (MENDONÇA, 2003, p. 49).
Por isso a palavra geradora, faz parte da realidade linguística da criança, de sua nuance
fonética e produtividade silábica, e ao se decompor em sílabas proporciona a combinação das
mesmas para formar novas palavras que tenha significado, propiciando um melhor
aprendizado.
37
Um exemplo de acordo com Mendonça (2003) 18
do desenvolvimento dos passos de
codificação e descodificação da palavra geradora escrita, „ESCOLA‟, exemplo que será
generalizado para as demais palavras detectadas do vocabulário da comunidade a ser
alfabetizada, segue-se o esquema em sua ficha de descoberta:
Figura 7 – Método de alfabetização palavra geradora.
Segundo Mendonça (2003) um dos objetivos desse passo que a criança percorre até se
alfabetizar, é que aprenda a concentrar-se nas semelhanças e diferenças de formas das
palavras, levando a conhecer e distinguir sílabas da palavra falada e escrita. E acrescenta “a
leitura é muito mais do que um ato mecânico porque o leitor deve ser capaz de compreender
as ideias, as mensagens contidas no texto”. (MENDONÇA, 2003, p.51). Finaliza ao dizer que
o conhecimento e o respeito pelo saber do aluno são fundamentais no método Paulo Freire.
Após discorrer sobre os métodos de alfabetização, o próximo capítulo analisa as
concepções de alfabetização levando em consideração os estudos de Ferreiro e Luria.
18
MENDONÇA, O. S. Métodos de Alfabetização: percurso histórico e questões atuais In: Pedagogia Cidadã-
Caderno de Formação - Alfabetização. UNESP. 2003, p.50.
38
CAPÍTULO III - CONCEPÇÕES SOBRE ALFABETIZAÇÃO
A alfabetização ancora-se sempre, e necessariamente, em uma concepção ou outra de
linguagem. A cada concepção, corresponde uma perspectiva de alfabetização. Neste capítulo,
é discutida a perspectiva cognitivista estruturalista e a perspectiva discursiva no que diz
respeito às concepções de alfabetização.
3.1. Perspectiva cognitivista estruturalista da alfabetização
Um dos aspectos envolvidos nas discussões sobre alfabetização diz respeito à questão da
democratização do ensino e do compromisso dos professores com o ensino. Se antes as teorias e
as práticas tradicionais como as cartilhas eram à base da educação, a partir da necessidade de
mudanças sociais e políticas se abriu em 1980 a possibilidade de algo novo, que trazia uma nova
„revolução conceitual‟, o construtivismo, resultante de pesquisas sobre a psicogênese da língua
escrita desenvolvida pela pesquisadora argentina Emília Ferreiro e colaboradores.
Segundo Mortatti (2000a) a proposta de Emília Ferreiro, o construtivismo, buscou
respostas para a necessidade de formulação para superar os problemas sócio-político-
educacionais da época, utilizando-se de um discurso de revolução conceitual. Representado
pela construção do conhecimento linguístico pela criança, e valorizando o processo de
aprendizagem do sujeito cognoscente e ativo, o construtivismo discute as hipóteses por que
passam a criança em seu processo de elaboração da escrita.
A partir de pesquisas desenvolvidas por Emília Ferreiro orientadas por Jean Piaget e
com a colaboração de Ana Teberosky, buscou-se explicar a perspectiva psicolinguística,
resultado segundo Mortatti (2000a) do,
entrecruzamento de dois marcos conceituais da teoria da linguagem de N. Chomsky
e a teoria da inteligência de J. Piaget, a aquisição da língua escrita pela criança como
processo psicogenético, que se inicia antes da escolarização e que segue uma linha
de evolução. (FERREIRO apud MORTATTI, 2000a. p. 264).
Mortatti ainda completa dizendo:
As conclusões resultantes das investigações sobre o conhecimento da evolução
psicogenética da aquisição da língua escrita se apresentam, portanto, como uma
„revolução conceitual‟ em relação às concepções tradicionais sobre alfabetização,
passando a demandar, por um lado, conceber-se: a língua escrita como um sistema
de representação e objeto cultural, resultado do esforço coletivo da humanidade e
não como código de transcrição de unidades sonoras nem objeto escolar; sua
39
aprendizagem como conceitual e não como aquisição de uma técnica, ou seja, como
um processo interno e individual de compreensão do modo de construção desse
sistema, sem separação entre leitura e escrita e mediante a interação do sujeito com o
objeto de conhecimento; e a criança que aprende como um sujeito cognoscente,
ativo e com competência linguística, que constrói seu conhecimento na interação
com o objeto de conhecimento de acordo com uma sequência psicogeneticamente
ordenada. (MORTATTI, 2000a, p. 267).
Numa linha de pensamento que tira a visão de que é o método que alfabetiza e que o
professor é o único detentor do saber, os adeptos da teoria cognitivista, embasados na teoria
piagetiana, consideravam a criança como um ser ativo e dinâmico, a qual interage com o
ambiente, com as pessoas e com os objetos que estão presentes ao seu redor.
Savian (2013) em sua dissertação de mestrado diz que nesse processo de interação
com o meio, a criança elabora e constrói suas estruturas mentais, tornando o ambiente físico
um dos fatores mais importantes. Assim os pressupostos que a fundamentam, apresentam que
o sujeito está em constante conflito com os fatores internos (maturação) e com os fatores
externos (ações do meio), e em busca do equilíbrio entre esses fatores que estão internamente
ligados entre si. Para isso, a criança utiliza de esquemas, que se incubem de garanti-lo.
Para Ferreiro (2001) a criança tem uma maneira particular de construir a sua escrita.
Ela vai construindo sua escrita de modo evolutivo, ou seja, de uma fase menos elaborada para
uma fase mais elaborada. A criança vai dando saltos qualitativos em relação à construção
dessa escrita. Lembrando que é a partir da superação dos conflitos pela criança, que ela passa
a reformular suas hipóteses, até estabelecer um vínculo entre a escrita e a fala, e assim
perceber que a escrita representa a fala. No entanto, é importante ressaltar que essa evolução
não acontece da mesma forma para todas as crianças, pois cada uma tem um ritmo próprio.
Por isso, para Emília Ferreiro (2001), a criança tem que passar pelas fases de
desenvolvimento, no qual ela dividiu em hipótese pré-silábica; hipótese silábica; hipótese
silábica- alfabética e hipótese alfabética. Ferreiro completa dizendo:
Ambas as hipóteses, a da quantidade e a da variedade, são construções da criança,
no sentido de elaborações internas que não dependem do ensino do adulto e nem da
presença de amostra de escritas onde podem aparecer anotações de uma ou duas
letras, com reduzida variedade interna. São construções próprias da criança que
tampouco podem ser explicadas por confusões perceptivas. (FERREIRO, 2001,
p.46).
Segundo ela o ensino se constrói a partir do estágio de desenvolvimento cognitivo em
que a criança se encontra. A escrita é um objeto de conhecimento e os professores devem
considerar as tentativas individuais de cada criança, como passos importantes na elaboração
40
da escrita. Diz ainda que a alfabetização não é uma questão de método, é uma questão de
construção, de reflexão que a criança precisa fazer sobre sua própria escrita.
Tendo por base a escrita como um sistema de representação e enquanto aquisição
conceitual, destaca-se o que Ferreiro (2001) diz sobre as etapas e os processos com relação à
construção da escrita pela criança:
1. Distinção entre o modo de representação icônico e o não-icônico; 2. A construção
de formas de diferenciação (controle progressivo das variações sobre os eixos
qualitativos e quantitativos); 3. A fonetização da escrita (que se inicia com um
período silábico e culmina no período alfabético). (FERREIRO, 2001, p. 19).
Desta forma, o desenvolvimento inicial da escrita descrito por Ferreiro e Teberosky
(1985) evolui do conceito do desenho à abstração arbitrária do símbolo, ou seja, compreende
a partir desse momento que se lê à escrita e não o desenho, pois, ambas são produções
gráficas distintas.
No estágio da hipótese pré-silábica, a escrita se caracteriza por traços observados no
seu dia a dia, a criança utiliza-se de seu nome, e de materiais visualizados por ela, no qual ela
pode representar seu pensamento. A criança vai percebendo que além dos desenhos, que
existem outras formas de representar a língua e utiliza rabiscos, números e letras, e nesta fase
também ela ainda não faz relação entre a escrita e a fonetização.
Segundo Ferreiro (2001) as crianças exploram critérios de escritas que lhes permitem
às vezes variações sobre o eixo quantitativo (variar a quantidade de letras de uma escrita para
outra), e às vezes sobre o eixo qualitativo (variar o repertório de letras que utiliza de uma
escrita para outra). “A criança começa por descobrir que as partes da escrita (suas letras)
podem corresponder a outras tantas partes da palavra escrita (suas sílabas)”. (FERREIRO,
2001, p.24).
No segundo estágio de hipótese silábica, a criança inicia o processo de fonetização, ou
seja, as tentativas de relacionar a fala com a escrita fazendo corresponder uma sílaba, uma
emissão sonora, com sinal gráfico. Nesta fase as crianças podem se utilizar de letras e de
outros tipos de grafia. Segundo a autora, a criança evolui até chegar a uma exigência maior,
ou seja, uma sílaba por letra sem omitir sílabas e sem repetir letras.
Na hipótese silábico alfabético, a criança busca solucionar conflitos internos, entre a
hipótese que se coloca e a escrita convencional. Este estágio, diz Ferreiro (2001, p.27) “marca
a transição entre os esquemas prévios em via de serem abandonados e os esquemas futuros em
vias de serem construídos”. E completa:
41
A criança descobre que a sílaba não pode ser considerada como unidade, mas que
ela é por sua vez reanalisável em elementos menores, ingressa no último passo da
compreensão do sistema socialmente estabelecido. E, a partir daí, descobre novos
problemas: pelo lado quantitativo, que se por um lado não basta uma letra por sílaba,
também não se pode estabelecer nenhuma regularidade duplicando a quantidade de
letras por sílaba (já que há sílabas que se escrevem com uma, duas, três ou mais
letras); pelo lado qualitativo, enfrentará os problemas ortográficos (a identidade de
som não garante identidade de letras, nem a identidade de letras a de sons).
(FERREIRO, 2001, p. 27).
Na hipótese alfabética, a criança passa a representar cada fonema com um signo
gráfico que o corresponde, e busca seguir um padrão silábico consoante-vogal. Completando,
assim a hipótese anterior, a criança passa, então a compreender e descobrir que existem
algumas regras para a escrita e estas convenções da escrita vai sendo construídas durante o
processo de aprendizagem.
Percebe-se que a partir dos estudos de Ferreiro e Teberosky (1985), começou-se a dar
importância a fatores internos que podem auxiliar no aprendizado da leitura e da escrita. E
esses fatores podem ser caracterizados por várias habilidades que devem ser desenvolvidas
para assegurar a aquisição e o aperfeiçoamento da leitura e da escrita no sujeito.
Um dos problemas do construtivismo, no entanto, ao adentrar nas salas de aula, foi à
interpretação de maneira equivocada por parte de alguns professores, que passaram a confundi-lo
como um método de ensino. E ao considerar que a construção da escrita é um processo interno e
individual, deixaram as crianças a própria sorte, a seu bel prazer.
Para Soares (2003, p.18), “o construtivismo constituiu uma teoria mais complexa e nos
trouxe conhecimento sobre os processos de desenvolvimento da criança”, mas não definiu o papel
do professor no processo de interação com o aluno.
Ela diz ainda que nas concepções anteriores, os professores tinham um método, fosse qual
fosse. Mas não tinham uma teoria, porque o método utilizado era tudo.
Hoje acontece o contrário: todos têm uma bela teoria construtivista da alfabetização,
mas não têm método. Se antigamente havia método sem teoria, hoje temos uma
teoria sem método. E é preciso ter as duas coisas: um método fundamentado numa
teoria e uma teoria fundamentada no método. (SOARES, 2003, p.17).
Soares (2012) continua dizendo que a proposta de Ferreiro também “teve uma
contribuição muito significativa, porque, com base na teoria psicogenética de Piaget, Emília
Ferreiro clareou o processo pelo qual a criança compreende a língua escrita como um sistema
de representação e se apropria do princípio alfabético”. (SOARES, 2012 p.6).
42
No entanto, há, por sua vez, uma concepção de linguagem e uma concepção de sujeito
envolvido nesta teoria. Considerar a alfabetização em uma perspectiva discursiva leva a um
deslocamento de concepção. Se na perspectiva piagetiana a linguagem é subordinada ao
pensamento e o sujeito é o senhor de seus dizeres e de suas ações, o que Koch (2006),
esclarece dizendo que:
[...] a concepção de língua como representação do pensamento corresponde à de
sujeito psicológico, individual, dono de sua vontade e de suas ações. Trata-se de um
sujeito visto como um ego que constrói uma representação mental e deseja que esta
seja “captada” pelo interlocutor da maneira como foi mentalizada. (KOCH, 2006, p.
9).
Diz ainda que nesta concepção espera-se que o sujeito seja entendido ao expor sua
mensagem e que no ato de ler um texto, por exemplo, ele capte algum conhecimento, pois
essa é a única intenção do texto, que o sujeito entenda o que o texto quer dizer. Ou seja, o
sujeito, como o autor, controla e constrói o texto apenas com base nas ideias por ele
mentalizadas. Já em uma linha de perspectiva discursiva a compreensão é de que a linguagem é
constitutiva do pensamento dos sujeitos, sujeitos que, por sua vez, são constituídos socialmente,
nas relações das quais participam. Não há um sujeito soberano. Sendo esta perspectiva tema
seguinte desta pesquisa.
3.2. Perspectiva discursiva da alfabetização
Nesta perspectiva a compreensão de linguagem é constitutivamente social, histórica e
singular, em que as experiências discursivas se formam e desenvolvem através de uma
interação constante e contínua.
Tanto Geraldi (2004) quanto Koch (2006) explanam sobre essa concepção de
linguagem como sendo uma forma de interação entre o autor-texto-leitor. Segundo os autores
o texto é o lugar em que a interação entre os sujeitos acontece verdadeiramente. Geraldi
(2004) completa dizendo, “[...] o sujeito que fala pratica ações que não conseguiria levar a
cabo, a não ser falando; com ela o falante age sobre o ouvinte, constituindo compromissos e
vínculos que não preexistiam à fala”. (GERALDI, 2004, p. 41).
Neste contexto, alfabetização se torna um conjunto de práticas sociais em que a escrita
é um sistema simbólico. Smolka (2008) enfatiza o papel do interlocutor, visto que sem ele o
processo de compreensão do uso da escrita, pelas crianças, fica comprometido. A autora diz
que:
43
A alfabetização não implica, obviamente, apenas a aprendizagem da escrita de
letras, palavras e orações. Nem tampouco envolve apenas uma relação da criança
com a escrita. A alfabetização implica, desde sua gênese, a constituição do sentido.
Desse modo, implica, mais profundamente, uma forma de interação com o outro
pelo trabalho de escritura. (SMOLKA, 2008, p. 69).
Tal como Smolka, Koch (2006) sinaliza para importância dessa compreensão e ratifica
acerca da importância da leitura como fator de decisão para a produção de sentidos. Para essa
autora:
a leitura é uma atividade interativa altamente complexa de produção de sentidos, que
se realiza evidentemente com base nos elementos linguísticos presentes na superfície
textual na sua forma de organização, mas requer mobilização de um vasto conjunto
de saberes no interior do evento comunicativo. (KOCH, 2006, p. 11).
É através de práticas significativas, que a leitura e a escrita se constrói, o domínio da
linguagem escrita não se aprende com atividades de cópias, memorização. A criança aprende
imersa em práticas discursivas; escrevendo com e para o outro se apropriar dos usos sociais da
escrita.
Bakhtin (1999, p. 112) diz que “a enunciação é o produto da interação de dois
indivíduos socialmente organizados e, mesmo que não haja um interlocutor real, este pode ser
substituído pelo representante médio do grupo social ao qual pertence o locutor”.
Para o autor toda palavra comporta duas fases, e é determinada tanto pelo fato de
proceder de alguém, como de se dirigir a alguém. Constituindo assim, o produto da interação
do locutor e do ouvinte. Segundo ele a palavra serve de ponte de ligação entre o locutor e
interlocutor.
Em pesquisa, encontrei-me como o livro „Alfabetização linguística: da teoria à prática‟
das autoras Soares, Aroeira e Porto (2010), o qual diz que por muito tempo o conceito de
alfabetização ficou ligado à ideia de que para aprender a ler era necessária apenas a
capacidade de decodificar os sinais gráficos, transformando-os em sons, e que para aprender a
escrever precisava-se apenas desenvolver a capacidade de codificar os sons da fala,
transformando-os em sinais gráficos.
Elas dizem que a partir da década de 1980, várias teorias mostraram que a
aprendizagem da escrita não se reduzia ao domínio de correspondência entre grafema e
fonemas (a decodificação e a codificação), mas caracterizava-se como um processo ativo, em
que aos primeiros contatos da criança com a escrita, ela construiria e desconstruiria
44
suposições sobre a natureza e o funcionamento da língua escrita como um sistema de
representação.
Assim o conceito de letramento passa a circular ampliando a visão de alfabetização,
pois enfatiza o uso das práticas de ler e escrever, para além do domínio da leitura e da escrita,
ampliando-os para o uso dessas habilidades em práticas sociais, nas quais o ler e escrever são
necessários. Num processo que tem início quando a criança começa a conviver com diferentes
escritas na sociedade, ela convive com rótulos, propagandas, placas, revistas, entre outros. E
que se prolonga ao longo da vida, com a participação nas práticas sociais que envolvem a
língua escrita.
Alfabetização e letramento são processos distintos, cada um com sua especificidade,
mas ambos são indispensáveis quando se leva em conta a aprendizagem da leitura e da escrita.
Segundo Soares (2004, p. 14) a entrada da criança no mundo da escrita, ocorre
simultaneamente por esses dois processos e completa:
a alfabetização desenvolve-se no contexto de e por meio de práticas sociais de
leitura e de escrita, isto é, através de atividades de letramento, e este, por sua vez, só
se pode desenvolver no contexto da e por meio da aprendizagem das relações
fonema-grafema, isto é em dependência da alfabetização. (SOARES, 2004, p.14).
O que mostra a necessidade de combinar a alfabetização e o letramento, assegurando
assim que os alunos se apropriem do sistema de escrita e do domínio das práticas sociais da
leitura e da escrita. Possibilitar um ambiente em que a criança conviva com variados tipos de
textos e construa sua base alfabética. Nesse processo, o professor é o mediador nesta prática
de alfabetização.
As autoras Soares, Aroeira e Porto (2010) explicitam o quanto essa construção do
conhecimento não é fácil, e nem tão pouco simples, mas complexa, individual e subjetiva -
ainda que sempre envolva a relação com o outro, posto que não é solitária, pois exige uma
troca de informações. “A interação do leitor com o texto acontece dentro e fora da escola”.
(SOARES; AROEIRA; PORTO, 2010, p.54). A criança começa aprender a ler antes da escola
e continua aprendendo fora dela.
Desde o primeiro contato com a escrita, a criança precisa vivenciar a experiência de
ser o autor, os Parâmetros Curriculares Nacionais explicitam que,
é necessário, portanto, ensinar os alunos a lidar com a escrita da linguagem – os
aspectos notacionais relacionados ao sistema alfabético e às restrições ortográficas –
como com a linguagem escrita – os aspectos discursivos relacionados à linguagem
que se usa para escrever. Para tanto é preciso que, tão logo o aluno chegue à escola,
45
seja solicitado a produzir seus próprios textos, mesmo que não saiba grafá-los, a
escrever como lhe foi possível, mesmo que não o faça convencionalmente. (PCN –
LP, 1997, p. 68).
A construção da linguagem implica esse entrecruzamento de informações entre os
participantes do diálogo. A criança aprende tanto participando da fala, quanto sendo a ouvinte
que observa a fala dos adultos que a cercam.
Ou seja, vivemos em um mundo letrado, onde encontramos informações em quase
todos os lugares, e a partir daí nos comunicamos e nos relacionamos uns com os outros.
Kleiman (2005, p.5), diz que “letramento é um conceito criado para referir-se aos usos da
língua escrita não somente na escola, mas em todo lugar [...]”.
Unindo-se aos dizeres de Kleiman (2005), Soares (1999, p.5) completa que o
“letramento é o estado ou condição de quem não só sabe ler e escrever, mas exerce as práticas
sociais da leitura e da escrita que circulam na sociedade em que vive, conjugando-as com as
práticas sociais de intervenção oral”. Segundo ela:
Letramento é usar a escrita para se orientar no mundo (o atlas), nas ruas (os sinais de
trânsito), para receber instruções (para encontrar um tesouro... para montar um
aparelho... para tomar um remédio), enfim, é usar a escrita para não ficar perdido.
Letramento é descobrir a si mesmo pela leitura e pela escrita, é entender-se, lendo ou
escrevendo (delinear o mapa de quem você é), e é descobrir alternativas e
possibilidades, descobrir o que você pode ser. (SOARES, 1998, p. 43).
O que mostra, o quanto é importante estimular as crianças a conhecer diferentes
gêneros textuais, pois permite o domínio e a apropriação da leitura e escrita de forma efetiva.
Soares ainda relata a diferença existente entre saber ler e escrever, ser alfabetizado, e ser
alguém que se envolve com as práticas sociais da leitura e da escrita.
Há assim uma diferença entre saber ler e escrever, ser alfabetizado, e viver na
condição ou estado de quem sabe ler e escrever, ser letrado (atribuindo a essa
palavra o sentido que tem literate em inglês). Ou seja: a pessoa que aprende a ler e a
escrever – que se torna alfabetizada – e que passa a fazer uso da leitura e da escrita,
a envolver-se nas práticas sociais de leitura e de escrita – que se torna letrada – é
diferente de uma pessoa que não sabe ler e escrever – é analfabeta – ou, sabendo ler
e escrever, não faz uso da leitura e da escrita – é alfabetizada, mas não é letrada, não
vive no estado ou condição de quem sabe ler e escrever e pratica a leitura e a escrita.
(SOARES, 1998, p. 36).
Socialmente e culturalmente a pessoa letrada tem outra condição social e cultural, o
qual a autora trata de esclarecer que não se refere a nível ou classe social, cultural, mas de
mudar seu modo de viver na sociedade, sua relação com os outros, com o contexto, ou seja,
46
sua relação com bens culturais se torna diferente. Ao apropriar-se e dominar o sistema de
leitura e escrita e seu uso social, seu conhecimento vai além, transcende.
Soares (1998, p.39) diz ainda que apropriar-se da escrita é diferente de ter aprendido a
ler e a escrever, pois “aprender a ler e escrever significa adquirir uma tecnologia, a de
codificar em língua escrita e de decodificar a língua escrita; apropriar-se da escrita é tornar a
escrita „própria‟, ou seja, é assumi-la como sua „propriedade‟”.
Ainda que eu corra o risco de trazer para o texto uma citação bastante extensa, faz-se
necessário por considerá-la extremamente pertinente ao tema. Trago o que a autora diz sobre a
diferença entre ser „alfabetizado‟ e „letrado‟.
Um adulto pode ser analfabeto e letrado, não sabe ler nem escrever, mas usa a
escrita: pede alguém que escreva por ele, dita uma carta, por exemplo, (e é
interessante que, quando dita, usa as convenções e estruturas lingüísticas próprias da
língua escrita, evidenciando que conhece as peculiaridades da língua escrita) – não
sabe escrever, mas conhece as funções da escrita, e usa-as, lançando mão de um
“instrumento” que é o alfabetizado (que funciona como máquina de escrever...);
pede a alguém que leia para ele a carta que recebeu, ou uma notícia de jornal, ou
uma placa na rua, ou indicação do roteiro do ônibus – não sabe ler, mas conhece as
funções da escrita, e usa-a, lançando mão do alfabetizado. É analfabeto, mas é, de
certa forma letrado, ou tem certo nível de letramento. [...] Uma criança pode ainda
não ser alfabetizada, mas ser letrada: uma criança que vive num contexto de
letramento, que convive com livros, que ouve histórias lidas por adultos, que vê o
adulto lendo e escrevendo, cultiva e exerce práticas de leitura e de escrita: toma um
livro e finge que está lendo (e aqui de novo é interessante observar que quando finge
ler, usa as convenções e estruturas lingüísticas próprias da narrativa escrita), toma
papel e lápis e “escreve” uma carta, uma história. Ainda não aprendeu a ler e
escrever, mas é, de certa forma, letrada, tem já certo nível de letramento. [...] Uma
pessoa pode ser alfabetizada e não ser letrada: sabe ler e escrever, mas não cultiva
nem exerce práticas de leitura e de escrita, não lê livros, jornais, revistas, ou não é
capaz de interpretar um texto lido: tem dificuldades para escrever uma carta, até um
telegrama – é alfabetizada, mas não é letrada. (SOARES, 1998, p.47).
A autora especifica ainda que existem diferentes tipos e níveis de letramento, o que
depende do uso e das necessidades da escrita encontradas pelos sujeitos no meio em que estão
inseridos, a depender do contexto social e cultural. Essas afirmações mostram que os
conceitos de letramento e de alfabetização são distintos, porém devem caminhar juntos nos
processos de aprendizado e de uso da escrita na sociedade.
47
CAPÍTULO IV - O QUE NOS DIZEM OS PROFESSORES SOBRE OS MÉTODOS
DE ALFABETIZAÇÃO?
A fim de analisar como se procede a aprendizagem da leitura e da escrita dos alunos,
fez-se necessário pesquisar o mediador dessa aprendizagem, ou seja, o professor. Diante
disso, foi desenvolvida uma pesquisa exploratória com uma abordagem qualitativa.
Para a concretização da pesquisa foi realizado um questionário com nove perguntas
(roteiro em anexo), com algumas professoras alfabetizadoras de diferentes ciclos de
alfabetização, na qual foi questionado os métodos utilizados na alfabetização de seus alunos.
Foram convidadas para participar da pesquisa quatorze professoras alfabetizadoras, no
entanto, somente cinco deram devolutiva positiva, ao retornarem com o questionário
respondido. A elas foi esclarecido o objetivo da pesquisa e entregue os termos de
consentimento livre e esclarecimento. E a fim de preservar a identidade dos sujeitos, as
professoras são identificadas com nomes fictícios.
Para conhecer a atuação das professoras pesquisadas nas classes de alfabetização,
foram estabelecidas algumas questões que nortearam a produção dos dados, a fim de que
contribuíssem para uma análise sobre a temática pesquisada.
Perguntando para as docentes sobre há quanto tempo atuam como professoras
alfabetizadoras, responderam:
Entre as docentes que responderam o questionário se conclui que a média dos anos
trabalhados alcança-se 6 anos.
48
Ao realizar essa pesquisa pude coletar diversas respostas, das mais variadas possíveis.
Ao questionar as professoras sobre o que consideram importante para alfabetizar
encontra-se contradições de posições quanto aos métodos.
Sobre isso, Eloisa e Ellen dizem o seguinte:
Eloisa: - Primeiramente é necessário que o professor conheça seus alunos e o meio
em que vivem desta forma poderá nortear seu trabalho utilizando diferentes
estratégias durante todo o processo de alfabetização.
Ellen: - É necessário que o professor inicie o trabalho com a sala de aula após ter
realizado uma sondagem com os alunos, assim ele saberá a necessidade de cada
criança. Durante todo o processo ensino-aprendizagem a mediação do professor é
fundamental no desenvolvimento dos seus alunos.
Eloisa cita diferentes estratégias, mas não fala sobre os métodos, já Ellen diz que é
importante conhecer os alunos, entra em um detalhe importante na alfabetização ao falar da
mediação, pois o professor é o mediador da aprendizagem.
Esse aspecto é importante, pois corroboro com Libâneo,
A atividade essencial de uma escola é assegurar a relação cognitiva do aluno com a
matéria, ou seja, a aprendizagem dos alunos, com a ajuda pedagógica do professor.
O professor é o mediador desse encontro do aluno com os objetos de conhecimento.
O professor introduz os alunos no mundo da ciência, da linguagem, para ajudar o
aluno a desenvolver seu pensamento, suas habilidades, suas atitudes. (LIBANEO,
2001, p. 22).
A seguir, o que dizem Rosana e Gabriela sobre o que consideram importante para
alfabetizar:
Rosana: - O comprometimento do professor com a tarefa de ensinar, que a sala de
aula seja um ambiente alfabetizador e que deixe o aluno em contato constante com a
escrita, através de cartazes, alfabeto, alfabeto móvel, jogos, livros de histórias,
revistas, etc.
Gabriela: - Considero fundamental no processo de alfabetização um trabalho
voltado para as necessidades do aluno e sua relação com a leitura e escrita, para
tanto o trabalho do professor deve ser voltado para ações diferenciadas
proporcionando assim, um ambiente alfabetizador. Trazendo para a turma diferentes
gêneros, estimulando o manuseio dos alunos com material escrito. A leitura e a
escrita devem ser de fácil acesso para todos, a leitura deve ser realizada e valorizada
“deve ter significado para o aluno”. O educador deverá trabalhar com o educando de
forma a mostrar a importância da leitura/ escrita em seu cotidiano, levando para a
sala de aula, exemplos reais. Também considero de suma importância a afetividade
em todo o processo, pois a afinidade e confiança entre professor e aluno colaboram
muito para um trabalho eficiente. Para o professor é fundamental amar o que faz e
confiar no potencial do seu aluno, acreditar que a alfabetização é possível.
Rosana foi a primeira a falar sobre a necessidade de se ter um ambiente alfabetizador e
se aproxima das questões metodológicas, Gabriela também fala das questões, mas não cita
49
quais são elas, aponta sobre os diferentes gêneros textuais sem comentar os métodos e entra
na alfabetização com as relações sociais entrelaçando com o letramento. Pode-se concluir que
todas as docentes não entraram em aspectos fundamentais para uma prática específica.
No que diz respeito à rotina diária, o que dizem as professoras:
Eloisa: – A rotina nessa fase é essencial. Devemos ler histórias, anotar a rotina na
lousa e no caderno. Leitura por parte dos alunos do alfabeto, palavras, frases ou
textos. Cantar músicas e até mesmo a conversa, narrando fatos vivenciados por eles,
deixando as vezes que registrem o que narraram.
Ellen: – Na rotina diária de alfabetização é importante a leitura diária de livros de
história, leitura do alfabeto, palavras, frases, letras de músicas infantis feitas pelos
alunos, jogos de formação de palavras.
Rosana: – Eu acho que o que deve fazer parte da rotina diária dos alunos: leitura do
alfabeto e dos numerais, uso do alfabeto móvel, leitura de histórias, atividades de
alfabetização, jogos, brincadeiras, recortes de jornais, músicas, etc.
Gabriela: – Considero importantíssimo na rotina a leitura prazerosa em um espaço
especial e estimulante como um “cantinho da leitura”, montado com atrativos que
chamem atenção. Jogos pedagógicos também não podem faltar, pois os alunos
superam suas dificuldades através da interação que o lúdico proporciona projetos e
pesquisa sobre temas estimulantes também ajudam muito, pois além de explorarem e
pesquisarem sobre assuntos diversos em ambientes diferenciados (bibliotecas,
laboratórios) privilegiam a escrita e leitura até mesmo nos produtos finais. O
trabalho com diferentes gêneros conhecidos pelos alunos: rimas, parlendas, cantigas
são objetos a serem explorados todos os dias. Também o estudo do nome próprio,
manuseio do alfabeto móvel são recursos eficazes.
Sílvia: – É importante que a rotina da criança ofereça oportunidades de ler e ouvir
histórias, atividades que desafiem a escrita de palavras ou a produção de um texto,
momentos de troca de experiências com outras crianças.
Ao perguntar sobre a rotina diária do aluno Eloisa, Ellen e Rosana destacam a
importância da rotina e incluem para sucesso desta a leitura de história diariamente, além do
alfabeto e de trabalhar com jogos e músicas. Gabriela comenta sobre os diferentes gêneros
textuais, a rima, parlendas, cantigas, como objetos a serem explorados diariamente, fazendo
uma relação entre grafemas e fonemas. Segundo Carvalho (2007, p. 14) é importante "desde a
alfabetização, apresentar uma ampla variedade de textos [e] favorecer um mergulho no mundo
da escrita, com a exploração de mil e uma possibilidades”. E completa:
A intimidade com diferentes tipos de texto, no entanto, nasce da possibilidade
concreta de utilizá-los, em diferentes momentos da vida escolar e social. Não basta
saber classificar os textos – isso é uma narrativa, isso é um poema, aquilo é uma
receita -, mas sim entendê-los, compreender como e porque são produzidos, e mais
tarde ser capaz de escrevê-los. (CARVALHO, 2007, p 16).
Silvia fala de maneira superficial, o que pode concluir que as outras professoras
aprofundaram-se um pouco mais no que diz respeito ao conhecimento acerca da prática de
alfabetização e maneiras de como trabalhar a rotina diária.
50
Questionadas sobre as principais dificuldades encontradas ao trabalhar com
alfabetização a maioria das professoras disse ser a falta de estímulo da família como um dos
obstáculos para a aprendizagem dos alunos, além da dificuldade de aprendizagem individual
de alguns alunos. E dizem:
Eloisa: – A maior dificuldade atualmente é a falta de interesse por parte da família,
de incentivar seus filhos com relação ao estudo, pois assim o próprio aluno se mostra
desinteressado nas atividades escolares. Outro fator ocorre quando a criança tem
alguma dificuldade não especificamente de aprendizagem, que está além do meu
campo de estudo, havendo a necessidade de encaminhar ao profissional
especializado e os responsáveis pela criança não entendem ou não encontram o
atendimento adequado.
Ellen: – As principais dificuldades que encontrei como professora alfabetizadora foi
a falta de jogos pedagógicos, a falta de interesse da família no incentivo para com os
filhos com relação à importância dos estudos e a falta de uma professora auxiliar na
sala de aula quando havia alunos com necessidade especial.
Rosana: – Uma das principais dificuldades que encontro, é com aquele aluno que
não tem estímulo e nem ajuda família.
Gabriela – O fracasso relacionado a reprovações anteriores, a desmotivação do
aluno em relação a sua capacidade, ansiedade da criança/família em relação a sua
aprendizagem.
Sílvia: – A maior dificuldade que vejo é que cada criança é única, cada uma na
maioria das vezes se encontra em momentos diferentes na alfabetização. Por isso,
nem sempre a mesma estratégia funciona para todos os alunos, às vezes é preciso
fazer atividades diferenciadas para que o aluno possa se desenvolver.
As professoras apontaram como obstáculos, a falta de materiais pedagógicos, entre
outros. Gabriela fala também do excesso de expectativa dos pais em relação à aprendizagem
dos filhos e a sensação de fracasso dos alunos que não se sentem capazes de aprender. Sílvia
acrescenta que salas de aula cheias dificultam a aprendizagem, o que realmente acontece, pois
isso dificulta a circulação do conhecimento e do reconhecimento, pelo professor, das
especificidades de cada aluno. É importante ressaltar que o fracasso na aprendizagem não
pode ser atribuído a um único culpado. De acordo com Kramer (2008 p. 51-52), “o fato de
algumas crianças não terem se alfabetizado [...] provém de um conjunto complexo de fatores,
que se combinam diferente em cada contexto específico, que assumem pesos variados nas
várias situações”. O professor precisa então trabalhar diversas estratégias, a fim de atingir as
diferenças e as especificidades de cada aluno.
Como foi citado pelas professoras ao responderem a questão sobre o que consideram
importante para alfabetizar vem de acordo com esta questão, da necessidade de conhecer o
aluno e o professor ser o mediador da aprendizagem.
Segundo Kramer (2008), ensinar não é somente fazer o aluno ter domínio da leitura e
da escrita, mas atribuir a esse aprendizado seu significado social. O professor atua como o
51
mediador entre os alunos e o conhecimento, cabe ao professor o papel de interagir com seus
alunos das mais variadas formas articulando o saber adquirido por eles com o saber escolar.
Perguntei para as professoras que métodos de alfabetização elas conhecem,
estabelecendo uma relação com a temática estudada. Eis as respostas:
Eloisa: – Na verdade normalmente falamos sobre métodos de ensino, como por
exemplo, tradicional, construtivista ou montessoriano. Entretanto quando falamos
de métodos de alfabetização os mais conhecidos para mim são: alfabético, fônico,
analítico e sintético.
Ellen: – Eu sempre procurei pesquisar sobre alfabetização, me interesso bastante
pelo assunto. O construtivismo é uma linha pedagógica. Quanto aos métodos
conheço o sintético, analítico, alfabético e fônico.
Rosana: – Método construtivista, fônico, analítico e sintético.
Gabriela: – Sintético - relação entre som e grafia, parte da aprendizagem das letras
posteriormente sílabas e mais adiante palavras. Analítico – trabalho com unidades
textuais mais complexas, para extrair palavras relevantes e dividi-las em unidades
menores (sílabas). Alfabético – decorar as letras do alfabeto e posteriormente suas
combinações (sílabas). Fônico – Método que prioriza o aprendizado através da
associação entre fonemas e grafemas (sons e letras).
Sílvia: - Método tradicional, construtivista, fônico, sintético, letramento.
Eloisa, Ellen e Rosana, falam que conhecem os métodos de alfabetização citando o
sintético, o analítico, o alfabético e o fônico, mas não falam especificamente sobre como são
esses métodos, ou seja, acerca da especificidade de cada um deles. Gabriela, no entanto, fala
sobre cada um dos métodos demonstrando conhecer suas especificidades.
Eloisa destaca, ainda, o método montessoriano para alfabetização. Segundo Angotti
(2003), Montessori19
desenvolveu vários materiais destinados ao desenvolvimento dos alunos,
dentre os materiais para leitura e escrita destaca-se o alfabeto em letras cursivas, a letra de lixa
ou alfabeto de lixa, o alfabeto móvel, e ainda o uso de jogos e uso de bilhetes. É importante
destacar também que no método montessoriano a aula é extremamente organizada e tem a
ideia de que a criança deve descobrir por si mesma. É uma educação centrada no aluno.
19
Maria Montessori nasceu em 1870 em Chiaravalle, no norte da Itália, filha única de um casal de classe média.
Desde pequena se interessou pelas ciências e enfrentando a resistência do pai e de todos à sua volta estudou
medicina na Universidade de Roma. Direcionou a carreira para a psiquiatria e depois se interessou por crianças
com retardo mental - nos termos utilizados naquela época -, mudando sua vida e a história da educação. Após
pesquisas, observações e experiências, percebeu que as crianças respondiam com entusiasmo aos estímulos para
realizar trabalhos domésticos, exercitando habilidades motoras e desenvolvendo autonomia, a partir dessas
observações, passou a fazer experiências com as crianças que se caracterizavam como normais. Montessori
graduou-se em pedagogia, antropologia e psicologia e pôs suas ideias em prática na primeira Casa dei Bambini
(Casa das crianças), aberta numa região pobre no centro de Roma. (REVISTA NOVA ESCOLA Disponível em
<http://revistaescola.abril.com.br> visitado em 03 de outubro de 2014)
52
Nessa mesma linha de uma educação centrada no aluno Eloisa e Rosana citam o
construtivismo como sendo um método. Suas falas permitem destacar o quanto o
construtivismo ainda está presente entre os professores alfabetizadores, e mais, erroneamente
entendidos como método. Destaco, tal como anteriormente, que o construtivismo e a
psicogênese da língua escrita não são um método de alfabetização e ensino, mas sim uma
teoria cognitivista de construção da escrita pela criança.
Sílvia parece recitar uma série de nomes conhecidos por ela, sem nenhum
aprofundamento.
Questionando sobre os métodos utilizados por elas na alfabetização, trago suas
respostas:
Eloisa: – Em meus poucos anos de alfabetizadora, analisando com cuidado, diria
que utilizo o método fônico, que consiste na associação entre fonemas e grafemas,
sempre levando em consideração os conhecimentos prévios dos alunos e sempre
seguindo, como foi enfatizado no Pacto Nacional pela alfabetização na Idade Certa,
o „lema‟, Alfabetizar letrando, pois o conhecimento de mundo é importantíssimo,
fazer relação das atividades com o que o aluno encontra no mundo. Desta forma o
aprendizado se torna mais efetivo.
Ellen – Quando alfabetizava o método fônico, que é baseado no ensino do código
alfabético de forma dinâmica. As relações entre sons e letras devem ser feitas
através do planejamento de atividades lúdicas para levar a criança a aprender a
codificar a fala em escrita e a decodificar a escrita no fluxo da fala e do pensamento.
Acho importante destacar que todas as atividades realizadas pelos meus alunos eram
corrigidas, onde eu apontava o erro na escrita. Essa atividade era devolvida ao aluno
para fazer a correção (com o meu auxílio, se necessário). Em seguida, eu olhava se
realmente havia corrigido e pedia para ler o que escreveu (principalmente os alunos
que apresentavam maiores dificuldades). Quando o aluno reflete sobre o que
escreveu vai adquirindo autonomia na escrita e leitura.
Rosana: – Quando alfabetizei meus alunos, utilizei um pouco de cada método, mas
principalmente o método construtivista.
Gabriela: – No princípio utilizava os métodos mais comuns nas escolas (sintético e
alfabético). Com o tempo e as próprias experiências vamo-nos aperfeiçoando e
experimentando, assim, hoje posso dizer que minhas ideias acerca da alfabetização
mudaram bastante e os métodos que trouxeram maiores resultados são os métodos
fônicos e analíticos, mas poderia dizer que já utilizei todos os métodos citados
acima.
Sílvia: – Dependendo do aluno acabo usando diferentes métodos a fim de promover
a aprendizagem.
Eloisa diz utilizar o método fônico, trabalhando a associação entre fonemas e
grafemas, fala também que procura levar em consideração o conhecimento prévio dos alunos.
Percebe-se que na fala dessa professora, quando ela se refere ao conhecimento do mundo ser
importante, expõe o fato das atividades terem significado para o contexto do aluno.
„Alfabetizar‟ e „letrar‟, é ampliar o uso das habilidades do domínio da leitura e da escrita nas
práticas sociais em que ler e escrever são necessárias.
53
Ellen diz que utiliza o método fônico, pois a criança aprende de uma forma dinâmica,
apresentando atividades de forma lúdica e estimulando a participação e o interesse do aluno,
levando-o a compreender a leitura e a escrita. Destaco, no entanto, que suas justificativas pela
utilização do método fônico não dizem respeito ao que é próprio e específico do método, uma
vez que sua principal característica é a análise das relações entre sons e letras a fim de
desenvolver a consciência fonológica na criança. Aprender de forma dinâmica, com
atividades lúdicas para que o interesse do aluno seja despertado não são procedimentos que o
levem a compreender, e eu diria apropriar-se, da leitura e da escrita, tal como disse Ellen.
Tal como Eloisa, Rosana traz para interlocução o conceito de construtivismo, o que se
repete em outras questões posteriores, pode-se dizer que ela utiliza os métodos mistos, pois
varia, ora sintético, ora analítico. Vale ressaltar que ela fala sobre a utilização do método
construtivista, é importante deixar claro que construtivismo não é método, é uma teoria, de
construção espontânea, e de reflexão que a criança precisa fazer sobre sua própria escrita.
Gabriela fala sobre os métodos mais utilizados na história da alfabetização, que se
constituíram em sintético (soletração, fônico e silabação), analíticos (contos, historietas,
sentenciação e palavração) e os mistos ou ecléticos. Essas questões relacionadas aos métodos
de alfabetização continuam presentes no âmbito escolar, sendo ainda os mais conhecidos até
hoje. Sílvia novamente responde vagamente que utiliza vários métodos, não os especificando.
Ao perguntá-las sobre se atualmente usam algum método para alfabetizar é
possível reencontrar os métodos já explanados anteriormente neste trabalho.
Eloisa: - Atualmente utilizo o método apostilado do sistema Anglo, além disso, faço
atividades lúdicas e sistematizadas complementando as atividades da apostila.
Rosana: – Sim, em especial o método construtivista.
Eloisa diz que utiliza o método apostilado. Pode-se dizer que esse „método‟ não está
necessariamente preocupado com um método de alfabetização. Segundo Mendonça (2003)
nenhum material didático é completo, pronto e acabado. Todos eles podem ser adaptados e
melhorados pelo professor em função das necessidades na sala de aula. O professor que
respeita a produção do aluno tem uma boa fundamentação teórica aliada à prática e supera as
imperfeições dos métodos, oferecendo condições para que o aluno tenha uma alfabetização
consciente, que aprenda pensando e não somente memorizando os sinais gráficos.
(MENDONÇA, 2003, p. 44). E acrescenta: “a produção de texto deve ser estimulada na
alfabetização: tudo o que a criança produzir merece ser elogiado para que ela sinta vontade de
escrever”.
54
Rosana mais uma vez diz utilizar o método construtivista. Destaco de sua resposta que
o construtivismo não é um método, mas sim uma teoria que discute as hipóteses no qual
passam a criança em seu processo de elaboração da escrita. A criança constrói relações,
elabora hipóteses, e passa por etapas em que tem avanços e retrocessos, até a apropriação do
código linguístico e passa a dominá-lo. Segundo a teoria construtivista a criança passa por
fases de desenvolvimento, divididas em: hipótese pré-silábica; hipótese silábica; hipótese
silábica- alfabética e hipótese alfabética.
O pensamento construtivista traz uma desarticulação das discussões sobre métodos de
ensino, privilegiando o processo de aprendizagem da criança. É importante ressaltar que um
dos problemas do construtivismo ao adentrar nas salas de aula foi o deslocamento do
professor no que diz respeito aos métodos de ensino. Ao considerar que a construção da
escrita é um processo interno, individual da criança as práticas metódicas foram deixadas de
lado e as crianças a própria sorte.
Diferentemente das professoras Eloisa e Rosana, Gabriela mostra conhecer as
características dos métodos de alfabetização.
Gabriela: – Poderia dizer que utilizo dois métodos o analítico e o fônico, gosto de
trabalhar com diferentes gêneros textuais antes mesmo dos meus alunos conhecerem
os fragmentos textuais, gosto de pensar na alfabetização através do letramento.
Também utilizo o método Fônico (o método das boquinhas) quando o aluno
relaciona o som à grafia ele consegue compreender o processo com maior
propriedade.
Gabriela fala da utilização do método analítico e do método fônico e enfatiza o uso do
método das boquinhas como facilitador da aprendizagem. Segundo Cunha (2012), o método
das boquinhas inicialmente foi criado para reabilitar crianças com dificuldades de
aprendizagem. Aprovado pelo MEC em Dez/2009 como tecnologia educacional, o método
das boquinhas inovou o cenário educacional com uma proposta multissensorial, que oferece
ao aluno uma nova oportunidade de aprendizagem. No processo de alfabetização o método
das boquinhas associa o som das letras à boca que os pronuncia (fonema ao articulema).
Ainda de acordo com Cunha (2012) para a aquisição da leitura e da escrita é preciso
que os fonemas sejam decodificados e codificados em letras (grafemas), como ocorre no
processo fônico, desenvolvendo a consciência fonológica, e acrescenta a articulação da boca
ao pronunciar as letras. Entende-se que a partir do uso dessa perspectiva o processo de
aprendizagem de leitura e escrita atingiria a todos, e que através de mecanismos concretos e
sinestésicos (em bases sensoriais), as crianças aprenderiam de maneira mais simples por
intermédio da boca como única ferramenta. Segundo Cunha “a alfabetização com as
55
boquinhas é um trabalho agradável para crianças, já que elas passam a reconhecer em sua
boca uma ferramenta pessoal de auxílio no processo de aquisição da leitura e escrita, o que o
torna algo mais lúdico no universo infantil”. (JARDINI & GOMES, 2008 apud CUNHA,
2012, p.26).
O método fônico, segundo Capovilla; Capovilla (2004) desenvolve as habilidades
metafonológicas, e ensina as correspondências grafofonêmicas de modo a levar a criança a
adquirir as competências na leitura e na escrita. Na escrita, ao fazer a decodificação
fonológica suficiente para poder registrar o seu pensamento. E na leitura fazer a decodificação
grafofonêmica suficiente para ter acesso semântico natural conforme processa o texto.
Analisando as respostas das professoras se o método utilizado tem apresentado
resultados, primeiramente na fala de Eloisa, pode-se dizer que em termos de pesquisa não é
possível afirmar que está dando certo, pois ela utiliza a apostila e não menciona o método que
usa especificamente. A professora também fala sobre os problemas de aprendizagem que
dificultam os resultados positivos. Vale ressaltar que muitos professores se prendem a questão
da não aprendizagem do aluno como algo patológico.
Retomo os enunciados de Eloisa acerca da eficácia do método utilizado:
Eloisa: – Sim, por enquanto o método utilizado está apresentando resultados
positivos. Todavia sempre encontramos educandos que apresentam mais
dificuldades, por isso, procuro sempre modificar minha prática. Neste ano, por
exemplo, alguns alunos estavam apresentando certas dificuldades, então pedi auxílio
à fonoaudióloga escolar a mesma me apresentou um método que ela utiliza chamado
“alfabetizando pelas boquinhas”, o qual trabalha simultaneamente a articulação da
boca, o fonema e o grafema. Método esse que vem apresentando resultados
significativos.
Lemle (2007) vem dizer que é de fundamental importância que o professor
alfabetizador compreenda e saiba que o conhecimento da criança sobre o sistema de escrita
passa por três etapas. Na primeira a criança acredita na hipótese da monogamia, ela supõe que
uma letra corresponde a um som que é representado por uma só letra. Na segunda, ela começa
a substituir a hipótese da monogamia pela hipótese da poligamia, ou seja, uma mesma letra
representa às vezes um tipo de som da fala, às vezes outra. Na terceira, a criança percebe que
um som, na mesma posição, pode ser representado ortograficamente por diferentes letras.
Há uma gradação entre esses três tipos de relação. A motivação fonética da relação
simbólica é perfeita no primeiro caso e decai gradativamente. No segundo caso, a
motivação fonética vem combinada com a consideração da posição e, no terceiro, a
motivação fonética da opção entre as letras está perdida. Essa gradação determina
uma gradação de facilidade na aprendizagem das letras. (LEMLE, 2007, p.25).
56
Pode-se dizer que o professor alfabetizador que tem conhecimentos linguísticos,
possui melhores condições de encontrar as dificuldades de seus alunos e refletir sobre suas
práticas a fim de obter maiores resultados. Mais abrangente parece ser a resposta de Gabriela.
Gabriela: – Sim, consigo resultados bem mais eficazes com os métodos analíticos e
fônicos do que quando utilizava o sintético, acredito que os métodos que utilizo hoje
possibilitam maior participação do aluno em relação a sua aprendizagem.
Gabriela fala sobre o método fônico e analítico como bastante eficazes, esses são dois
métodos diferentes, mas que podem dar resultados. No método analítico, são apresentadas
palavras, textos e em seguida a instrução sistemática associando letras das palavras
especificamente com seus respectivos sons. Capovilla; Capovilla (2004) explica que não deve
ser introduzido logo no início da alfabetização, antes que a criança tenha aprendido a
decodificar e a codificar, portanto a criança analisa as relações entre sons e letras de palavras
já aprendidas, de modo a evitar pronunciar sons fora da palavra. No método fônico o texto é
introduzido gradualmente, conforme a criança adquira habilidade de fazer a decodificação
grafofonêmica, de forma explícita e sistemática da consciência fonológica e corresponder
grafema e fonemas.
No método sintético o ensino da leitura se apresenta de maneira a apresentar às letras,
seus nomes, as famílias silábicas, na sequência o ensino de frases. A escrita se restringe a
caligrafia e seu ensino, a cópia, ditados, enfatizando a escrita correta.
O método fônico tem se mostrado mais eficaz, pois introduz os fonemas de forma
explícita e sistemática, numa sequência planejada, fornece informações sobre os fonemas na
medida em que eles vão aparecendo nos textos, possibilitando às crianças uma aprendizagem
significativa.
Ainda sobre a eficácia dos métodos, Rosana e Sílvia diz:
Rosana: – Sim, pois no método construtivista professor e alunos estão juntos na
construção do conhecimento.
Sílvia: – Na maioria das vezes tem apresentado resultado significativo.
De suas respostas destaco a imprecisão. No caso de Rosana suas falas sempre remetem
a questões muitas vezes errôneas referentes à teoria construtivista, já Sílvia se mostra sempre
imprecisa ao responder.
57
Questionadas se existe um método mais eficaz para alfabetizar, Eloisa e Ellen
dizem que cabe ao professor analisar quais métodos e estratégias utilizar para que o aluno
tenha uma aprendizagem significativa.
Eloisa: – Não acredito que exista um método eficaz que apresente 100% de
resultados positivos, afinal trabalhamos com seres humanos, especialmente com
crianças que estão em constante processo de formação, além disso, elas têm acesso a
uma tecnologia que também muda constantemente. Eu acredito que o professor tem
o compromisso de sempre se atualizar, procurar por diversos métodos, estratégias,
recursos que auxiliem seus alunos a aprenderem, afinal ser professor é magnífico e
ser alfabetizador é um verdadeiro presente de Deus, pois a cada aluno que você
ajuda a aprender a ler e escrever o mundo se torna um lugar cheio de esperança e
seus dias ainda mais iluminados.
Ellen: – Não existe um método eficaz para alfabetizar. O professor deve estar atento
às dificuldades dos seus alunos e ir mudando as estratégias, utilizando diferentes
recursos para levá-los a aprendizagem, a descoberta de um novo mundo por meio da
leitura e da escrita.
É importante destacar sobre a responsabilidade do professor no processo de
alfabetização, sua atenção deve ser voltada para aspectos específicos da linguagem realizando
um trabalho com a linguagem e sobre a linguagem uma vez que é no movimento discursivo
que o sujeito apropria-se do código linguístico. Ainda que as professoras destaquem que cabe
ao professor a decisão sobre qual método utilizar, como fazê-lo se a grande maioria tem
demonstrado desconhecer as características específicas de cada um deles?
Aqui o que dizem Rosana e Gabriela sobre a eficácia de um ou outro método.
Rosana: – Sim, o método construtivista, porém, os alunos apresentam características
individuais bem distintas para aprender, cada aluno tem um ritmo de aprendizagem,
então é necessário que o professor trabalhe de forma abrangente, a fim de conseguir
atingir o maior número de alunos.
Gabriela: – Não poderia dizer que existe um método mágico, capaz de ser aplicável
e trazer o resultado positivo para todos igualmente, o processo de alfabetização é
como o próprio nome diz „um processo‟. Em meio a este processo, existem seres
humanos (alunos, professor, equipe escolar) envolvidos, que precisam se
compreender. A partir da visão do professor suas estratégias, abordagem
pedagógica, interação com a classe, expectativa sobre a capacidade de seus alunos,
cabe a ele decidir qual o método que ele possui maior afinidade, qual atenderá
melhor a demanda, valorizando as necessidades de seus alunos.
Rosana se confunde inúmeras vezes e fala sobre o construtivismo como método, que já
foi apontado estar equivocado, Gabriela diz que não existe um método mágico, capaz de ser
aplicável e trazer o resultado positivo para todos igualmente, ressalta que o processo de
alfabetização é como o próprio nome diz „um processo‟, e através das palavras de Vigotski
(1998) o processo é prioritário em relação ao resultado. Vigotski diz:
58
Acreditamos que o desenvolvimento da criança é um processo dialético complexo
caracterizado pela periodicidade, desigualdade no desenvolvimento de diferentes
funções, metamorfose ou transformação qualitativa de uma forma em outra,
embricamento de fatores internos e externos, e processos adaptativos que superam
os impedimentos que a criança encontra. (VIGOTSKI, 1998, p.51).
E acrescenta ainda:
Uma vez que essa abordagem se baseia na premissa de que o aprendizado segue a
trilha do desenvolvimento e que o desenvolvimento sempre se adianta ao
aprendizado, ela exclui a noção de que o aprendizado pode ter um papel no curso do
desenvolvimento ou maturação daquelas funções ativadas durante o próprio
processo de aprendizado. O desenvolvimento ou a maturação são vistos como uma
pré-condição do aprendizado, mas nunca como resultado dele. Para resumir essa
posição: o aprendizado forma uma superestrutura sobre o desenvolvimento,
deixando este último essencialmente inalterado. (VIGOTSKI, 1998, p.54).
Segundo Vigotski (1998) o aprendizado é muito mais que aquisição de capacidade de
pensar, é adquirir muitas capacidades especializadas para pensar várias coisas. Desenvolve
várias capacidades de focalizar a atenção sobre diferentes coisas, e ainda de acordo com esse
ponto de vista, um treino especial afeta o desenvolvimento global só quando os elementos,
seus materiais e seus processos são parecidos aos vários campos específicos, o hábito nos
governa. Vigotski continua: “consequentemente, ao dar um passo no aprendizado, a criança
dá dois no desenvolvimento, ou seja, o aprendizado e o desenvolvimento não coincidem”.
(VIGOTSKI, 1998, p. 56).
Destacada a importância do processo chamo a atenção para a resposta de Sílvia.
Sílvia: – Acredito que cada criança aprende melhor de um determinado jeito, não
são todos iguais, seja do modo tradicional ou não, o importante é o progresso
alcançado com a criança.
E Sílvia acaba por transformar esta questão em algo sem valor, como se alfabetizar não
fosse um processo, pois se pode entender que alfabetização é,
O que poderíamos chamar de acesso ao mundo da escrita – num sentido amplo – é o
processo de um entrar nesse mundo, e isso se faz basicamente por duas vias: uma
através do aprendizado de uma „técnica‟. Chamo a escrita de técnica, pois aprender a
ler e a escrever envolve relacionar sons com letras, fonemas com grafemas, para
codificar ou para decodificar. Envolve, também, aprender a segurar um lápis,
aprender que se escreve de cima para baixo e da esquerda para a direita; enfim,
envolve uma série de aspectos que chamo de técnicos. Essa é, então, uma porta de
entrada indispensável. (SOARES, 2003, p.17).
59
Observou-se através da pesquisa realizada, que muitos professores não conhecem com
profundidade os métodos de alfabetização. Em suas respostas, as professoras falam de
maneira não específica.
Embora seja a professora que esteja a menos tempo atuando como professora
alfabetizadora, Gabriela mostra ter um conhecimento maior que as outras quatro professoras.
Ela tem um conhecimento teórico mais amplo, o que a fundamenta no seu trabalho como
alfabetizadora. Sua fala indicia que esse conhecimento ancora sua atuação no trabalho com
leitura e escrita junto aos seus alunos.
No caso de Eloisa e Ellen, suas respostas revelam um conhecimento razoável sobre os
métodos de alfabetização. Elas são as professoras que têm maior tempo de experiência nessa
prática, mas isso não é garantia de que efetivamente conheçam os métodos a fim de que esse
conhecimento ancore suas escolhas.
Contraditoriamente, Eloisa diz que primeiramente é necessário que o professor
conheça seus alunos e o meio em que vivem desta forma poderá nortear seu trabalho
utilizando diferentes estratégias durante todo o processo de alfabetização e, na sequência,
afirma que quando a criança tem alguma dificuldade não especificamente de aprendizagem,
que está além do meu campo de estudo, havendo a necessidade de encaminhar ao
profissional especializado e os responsáveis pela criança não entendem ou não encontram o
atendimento adequado ou ainda, que neste ano, por exemplo, alguns alunos estavam
apresentando certas dificuldades, então pedi auxílio à fonoaudióloga escolar a mesma me
apresentou um método que ela utiliza chamado ‘alfabetizando pelas boquinhas’, o qual
trabalha simultaneamente a articulação da boca, o fonema e o grafema. Método esse que vem
apresentando resultados significativos.
Eloisa chama para as interlocuções profissionais da área da saúde como
corresponsáveis pela aprendizagem dos alunos. Fico a perguntar-me: será que os
conhecimentos sobre métodos de alfabetização evidenciados por ela durante a pesquisa „dão
conta‟ de ancorar suas escolhas a fim de que o ensino promova a aprendizagem dos alunos ou
é mais fácil encontrar o problema no âmbito da aprendizagem, recaindo a „culpa‟ no
biológico daquele que não aprende?
Minha suspeita ancora-se no fato de que o processo de aprendizagem da escrita, por
um ou outro método, deve possibilitar que os alunos estabeleçam a relação grafema-fonema,
esse é o princípio básico da alfabetização, como foi visto anteriormente. Quando Eloisa traz
60
para a interlocução a figura da fonoaudióloga20
, o que está dizendo? A resposta, não tão clara,
indicia: as crianças não estão sendo capazes de estabelecer essa relação fundamental ao
aprendizado da leitura e da escrita, portanto, o fonoaudiólogo passa a ser corresponsável pelo
trabalho com o aluno. Resta ainda uma questão: será mesmo que o aluno não foi capaz de
estabelecer essa relação por apresentar algum problema de ordem biológica ou o método de
ensino não foi capaz de produzir esse aprendizado?
No caso de Rosana suas falas evidenciam um conhecimento equivocado sobre o
construtivismo ao mesmo tempo em que demonstra não ter conhecimento acerca das
especificidades dos métodos de alfabetização. Nesse caso pode-se afirmar que seu
conhecimento e aprofundamento científico não lhe permitem realizar escolhas que dêem
suporte ao seu trabalho. Suas dúvidas não encontrarão respostas para os problemas
enfrentados no cotidiano do trabalho com a alfabetização, colocando seus alunos em risco de
finalizarem os anos iniciais sem ainda terem completado esse processo fundamental e vital ao
desenvolvimento das funções psicológicas superiores.
Sílvia fala como se conhecesse todos os métodos, pois responde elencando seus
„nomes‟. Se considerar seu tempo de atuação na prática de alfabetização, possui a mesma
média das outras professoras e atua há mais tempo que Gabriela, no entanto, é aquela que
demonstra ter menor conhecimento sobre a temática proposta, uma vez que suas respostas
indiciam que não fala muito para não se comprometer com o que diz, talvez para não ser
indagada sobre as especificidades de cada um deles.
Percebe-se de modo geral, que as professoras têm algum tempo de experiência com a
prática de alfabetização, mas isso não parece ser garantia de conhecimento acerca do assunto.
Rosana e Sílvia não se aprofundam em nenhuma das questões, muitas vezes se distanciam do
que lhes foi perguntado: sobre os diferentes métodos de alfabetização.
20
O fonoaudiólogo é um profissional de Saúde e Educação, com graduação plena em Fonoaudiologia, que atua
de forma autônoma e independente nos setores público e privado. É responsável pela promoção da saúde,
prevenção, avaliação e diagnóstico, orientação, terapia (habilitação e reabilitação) e aperfeiçoamento dos
aspectos fonoaudiológicos da função auditiva periférica e central, da função vestibular, da linguagem oral e
escrita, da voz, da fluência, da articulação da fala e dos sistemas miofuncional, orofacial, cervical e de
deglutição. Exerce também atividades de ensino, pesquisa e administrativas. Uma das especialidades do
fonoaudiólogo é a Linguagem, a especialidade que trabalha com os aspectos que envolvem a comunicação oral e
escrita de pessoas com problemas de comunicação (expressão e compreensão). Conselho Regional de
Fonoaudiologia - 2ª. Região - São Paulo. Disponível em <http://www.fonosp.org.br/crfa-2a-
regiao/fonoaudiologia/o-que-e-a-fonoaudiologia/>. Visto em 06 de outubro de 2014.
61
Diante da pesquisa de campo é possível afirmar que os professores pouco conhecem
acerca dos métodos de alfabetização. Das cinco que responderam ao questionário, apenas
Gabriela demonstra ter maior domínio sobre o assunto, o que me remete ao fato de que o
professor precisa conhecer profundamente seu conteúdo de ensino - no caso a alfabetização -
bem como os procedimentos metodológicos que o colocam em prática - os diferentes métodos
para alfabetizar. Isso parece corroborar com dados de pesquisas que afirmam que muitos de
nossos alunos estão chegando do final do ensino fundamental ainda sem saber ler e escrever.
Estamos, portanto, diante de um problema de aprendizagem ou de ensinagem?
62
CONSIDERAÇÕES FINAIS
“Então, nasci. De repente nasci, isto é, senti vontade de escrever. Nunca pensara no
que podia sair do papel e do lápis,” faço minhas as falas de Carlos Drummond de Andrade no
livro Contos de aprendiz (1975) como início dessas considerações. Foi assim que comecei,
parti de um emaranhado de traçados e letras, como um iniciante no mundo letrado. Fui
descobrindo e redescobrindo a escrita em mim, tão complexa e fascinante como as crianças se
descobrindo no mundo da leitura e da escrita.
Na história do Brasil o início da alfabetização teve como ponto de partida a chegada
dos jesuítas. Eles promoveram ações de catequização dos índios, educação dos filhos dos
colonos, formação de novos sacerdotes e trabalho com a elite intelectual. Através do trabalho
educativo, os jesuítas ensinavam as primeiras letras e a gramática aos gentios, além da
doutrina cristã e dos costumes da Europa. Num primeiro momento eles tiveram o apoio da
realeza, no entanto, conforme o trabalho ganhava força e poder, foram expulsos do Brasil, o
que causou desestabilidade no ensino. A coroa então estabeleceu planos de estudos, nomeou
professores, e modificou o sistema de ensino implantando as aulas régias, se tornando assim a
primeira forma de ensino público no Brasil.
Passou-se um tempo considerável, antes de ocorrerem disputas para implantação de
métodos que fizessem com que as crianças aprendessem a ler e a escrever. Disputas acirradas
entre os métodos antigos e os novos. Defensores dos métodos sintéticos e dos métodos
analíticos.
Questões relacionadas aos métodos de alfabetização continuam presentes no campo
escolar, quando se discuti a utilização de cartilhas ou não, e mesmo na questão da
desmetodização do processo de alfabetização, indo contra a metodização mecanizada da
escrita.
O primeiro método a ser implementado é o sintético, que partia das unidades menores
da língua para as palavras. Os métodos sintéticos se dividem em três tipos: o alfabético, o
fônico e o silábico. Veio então o método João de Deus ou método da palavração, que se
baseava nos princípios da linguística e consistia em iniciar o ensino da leitura pela palavra
passando depois para a análise dos valores fonéticos das letras. Mudando-se o foco para o
método analítico no qual se aprendia a partir das unidades maiores para depois chegar às
unidades menores. No qual se dividiam em métodos de contos, historietas, sentenciação e
palavração.
63
Continuaram as disputas uns defendiam como sendo melhor método, os métodos
sintéticos e outros defendiam os métodos analíticos, havendo então a junção dos dois
métodos, ora utilizavam um, ora utilizavam o outro se caracterizando os métodos mistos.
Um dos métodos também utilizados no Brasil foi o método Paulo Freire, que trouxe
um processo educativo centrado na mediação entre professor e aluno, e partia do
conhecimento do aluno através da problematização de discussões da realidade vivenciada por
eles, partindo de uma palavra geradora.
Muito discutida também foi à proposta construtivista de Emília Ferreiro, numa linha
de pensamento que tira a visão do método que alfabetiza e do professor como sendo o único
que tem os saberes, considerando a criança como um ser ativo e dinâmico. Segundo a teoria
construtivista a criança evolui por meio de fases, vai de uma menos elaborada até chegar a
uma mais elaborada, dando saltos qualitativos, ressaltando que se deve respeitar o ritmo de
cada criança, e a construção espontânea.
Há também uma concepção de linguagem constitutiva socialmente, histórica e
singular, nessa perspectiva parte-se de experiências discursivas, desenvolvidas a partir da
interação constante e contínua. Através de práticas significativas de leitura e escrita é que a
aprendizagem vai sendo construída, a criança aprende imersa nas práticas discursivas, no qual
escreve com e para o outro e se apropria dos usos sociais da escrita.
Vivemos em um mundo letrado e nele encontramos informações em quase todos os
lugares, o que remete a importância da aprendizagem da língua escrita a fim de ampliar os
processos comunicativos entre sujeitos. É nesse contexto que surge o conceito de letramento.
Há que se ressaltar, no entanto, que a alfabetização e o letramento são processos distintos,
cada um com sua especificidade, mas ambos indispensáveis quando se leva em conta a
aprendizagem da leitura e da escrita.
Todos esses conhecimentos adquiridos durante o meu percurso acadêmico acabaram
por me envolver com o tema da alfabetização. O meu conhecimento foi sendo transformando
e, a partir dos estudos sobre a temática, foram agregadas contribuições efetivas à minha
aprendizagem.
Pude perceber a complexidade que envolve a alfabetização e a necessidade do docente
ter uma formação que leve em conta às especificidades dos métodos, da fundamentação
teórica assim como as práticas vivenciadas em sala de aula. Ou seja, o conhecimento e
compreensão do professor acerca do caráter complexo e multifacetado da alfabetização e do
64
letramento o levam a ações significativas na implicação do domínio da leitura e escrita pela
criança.
Muitas são as discussões sobre os métodos de alfabetização, mas é preciso considerar
que não é possível alfabetizar sem método. O que leva a refletir que conhecer a história dos
métodos de alfabetização pode nortear o professor a desenvolver estratégias que efetivamente
proporcionem a seus alunos uma maior aprendizagem, pois cada aluno tem sua singularidade
e especificidade.
Diante da pesquisa de campo constata-se, que muitos professores que atuam na área de
alfabetização desconhecem as especificidades dos métodos a serem escolhidos para
exercerem seu trabalho. Esse conhecimento é fundamental para o profissional que lida com
uma das questões mais relevantes aos sujeitos. Muitos professores não conhecem com
profundidade os métodos de alfabetização, foi percebido que embora as professoras tenham
algum tempo de experiência nessa prática, isso não significa garantia de maior conhecimento
sobre a temática.
É possível verificar através da pesquisa que das cincos professoras que responderam
ao questionário, apenas uma demonstra ter maior domínio sobre o assunto, o interessante que
é a professora mais nova na atuação com alfabetização.
O que se leva a pensar através da pesquisa que a inserção dos alunos para um mundo
letrado, parte primeiramente da alfabetização, que a professora alfabetizadora é uma das
grandes responsáveis pelo ensino sistematizado dessa prática e para isso ela deve estar
preparada e ancorada teoricamente.
Assim sendo, pode-se dizer de acordo com Mendonça (2003) que não há um método
de alfabetização perfeito, o professor precisa ter formação adequada para reconhecer as falhas
e limitações, adaptar e transformar os conhecimentos que possui quanto aos métodos e
estratégias, para que o aluno seja auxiliado na superação das dificuldades encontradas durante
o processo de aquisição da leitura e escrita. Essa afirmação reforça o papel fundamental do
conhecimento teórico que o professor precisa ter para realizar escolhas metodológicas que
ancorem a aprendizagem de seus alunos.
65
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ANEXOS
70
1. TERMO DE CONSENTIMENTO PARA REALIZAÇÃO DA PESQUISA DE CAMPO
CNEC CAPIVARIEducação Infantil - Ensino Fundamental - Ensino Médio - Educação Profissional - Ensino Superior
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE ESCLARECIDO
Eu ______________________________________________________________________________ portador do CPF ___________________________ e RG ___________________________________ Residente e domiciliado (a) na cidade de _________________________ - SP, na Rua ___________ _________________________________________________________________________________ nº _____ Bairro ____________________________________________________________________ aceito participar das atividades de pesquisa de campo (questionário), para cumprimento das tarefas relacionadas ao Trabalho de Curso, sob a responsabilidade da Profª. Drª Claúdia Beatriz de Castro Nascimento Ometto e da coordenadora do curso Profª Me. Rita de Cássia Cristofoleti da Faculdade Cenecista de Capivari, curso de Pedagogia. 1- O objetivo da pesquisa que está sendo realizada refere-se ao conhecimento sobre a temática: “Um olhar reflexivo sobre os métodos de alfabetização”. O trabalho de Curso que está sendo desenvolvido também tem como objetivo oferecer conhecimento teórico e prático, que visem ampliar as competências pedagógicas dos educadores, para que possam realizar mediações que colaborem de forma mais efetiva no processo educativo dos alunos. 2- As atividades de pesquisa de campo ocorrerão no mês de Setembro. 3- Estou livre para interromper a qualquer momento a minha participação nestas atividades, sem necessidade de qualquer justificativa, como também não acarretará nenhum prejuízo. 3- Os dados pessoais das pessoas pesquisadas serão mantidos em sigilo. Os resultados da pesquisa serão utilizados para fins didáticos e pedagógicos do curso, e serão divulgados no Trabalho de Curso da aluna Arlete Pinto dos Santos. 4- Obtive todas as informações necessárias para poder decidir conscientemente sobre a minha participação na efetiva pesquisa. 5- Poderei entrar em contato com o (a) professor (a) Orientador (a) e com a coordenadora do curso Rita de Cássia Cristofoleti, a qualquer momento que julgar necessário.
Este termo de livre consentimento é feito em duas vias de igual teor, ficando uma para o responsável e outra para a Faculdade.
Capivari, __________ de _____________________ de 2014. Declaro que entendi os objetivos e benefícios de minha participação na pesquisa e concordo com a participação:
................................................................ Assinatura do (a) professor (a) e/ou mãe de aluno (a)
71
2. QUESTINÁRIO PARA PESQUISA DE CAMPO
1. Há quanto tempo você trabalha com alfabetização?
2. O que você considera importante para alfabetizar os alunos?
3. O que você acha que deve fazer parte da rotina diária de um aluno no ciclo de
alfabetização?
4. Quais são as principais dificuldades que você encontra para alfabetizar seus alunos?
5. Quais métodos de alfabetização você conhece?
6. Quais métodos você já utilizou para alfabetizar seus alunos?
7. Atualmente você utiliza algum método em especial? Qual?
8. O método utilizado tem apresentado resultados?
9. Você diria que existe um método mais eficaz para alfabetizar, qual?