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1 UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E LETRAS E ARTES PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS UM OLHAR LÉXICO-SEMÂNTICO SOBRE O VOCABULÁRIO REGIONAL EM AGRURAS DA LATA D’ÁGUA DE JESSIER QUIRINO Maria de Fátima Oliveira JOÃO PESSOA-PB Maio, 2006

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E LETRAS E ARTES

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS

UM OLHAR LÉXICO-SEMÂNTICO SOBRE O VOCABULÁRIO REGIONAL EM AGRURAS DA LATA

D’ÁGUA DE JESSIER QUIRINO

Maria de Fátima Oliveira

JOÃO PESSOA-PB

Maio, 2006

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Maria de Fátima Oliveira

Dissertação apresentada ao Programa

de Pós-Graduação em Letras, do

Centro de Ciências Humanas, Letras e

Artes da Universidade Federal da

Paraíba, na Linha de Pesquisa:

Fenômenos lingüísticos: variação e mudança, sob a orientação da

Professora Doutora Maria das Neves Alcântara de Pontes, como requisito

parcial para obtenção do grau de

Mestre em Letras.

JOÃO PESSOA

Maio, 2006

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“Os pesquisadores do linguajar

espontâneo, não praticam

certezas, não humilham ninguém,

nem exercem coações e

violências, porque têm sempre

sob a mão a fonte genuína: o povo

que cria e faz viver a língua, o

laboratório natural da linguagem”. A. César Veiga

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UM OLHAR LÉXICO-SEMÂNTICO SOBRE O VOCABULÁRIO

REGIONAL EM AGRURAS DA LATA D’ÁGUA DE JESSIER QUIRINO

Por

Maria de Fátima Oliveira

Dissertação apresentada ao Programa

de Pós-Graduação em Letras, do

Centro de ciências Humanas, Letras e

Artes da Universidade Federal da

Paraíba, na Linha de Pesquisa:

Fenômenos lingüísticos: variação e mudança, sob a orientação da

Professora Doutora Maria das Neves Alcântara de Pontes, como requisito

parcial para obtenção do grau de

Mestre em Letras.

Profa. Dra. Maria das Neves Alcântara de Pontes/UFPB – Orientadora

Profa. Dra. Nelly Carvalho/UFPE – Examinadora

Profa. Dra. Ana Cristina de Souza Aldrigue/UFPB – Examinadora

Prof. Dr. Dermeval da Hora/UFPB - Suplente

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho à minha família, pela compreensão e apoio no cotidiano

das nossas vidas.

A Daniel, meu filho-sobrinho, pela colaboração e incentivo, no transcorrer da

minha caminhada para o mestrado.

Aos caros professores, colegas da FAFOPAI, pelos gestos de solidariedade e

companheirismos demonstrados.

Aos queridos alunos e alunas da FAFOPAI, razão pela qual enveredei pelos

caminhos do Léxico e dos saberes lingüísticos.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, a quem sempre recorri, nas horas difíceis de desânimo, buscando Nele,

força e coragem para prosseguir.

Ao poeta Jessier Quirino, pela disponibilidade, sempre muito atencioso,

colaborando de bom grado, nesse trajeto pelas trilhas do Regionalismo.

À minha orientadora, a Professora Nevinha, luz que iluminou os trechos

obscuros dos caminhos Geo-etnosociolingüísticos para os quais meu trabalho foi

direcionado..

Ao Professor Doutor Dermeval da Hora, pela honestidade, fazendo-me

entender que o meu caminho de pesquisa, não era o seu.

Ao Programa de Pós-graduação em Letras da Universidade Federal da

Paraíba, na pessoa da Coordenadora Profa. Dra. Elisalva de Fátima Madruga

Dantas e professores, pela competência e desempenho.

À Maria José Acioly, amiga e parceira nesse caminhar, que trilhamos juntas,

ajudando-nos mutuamente, apesar dos percalços da vida.

À Autarquia Educacional de Afogados da Ingazeira – AEDAI, por me

oportunizar condições para a realização desse sonho, proporcionando o

afastamento das atividades acadêmicas.

Ao Padre Marcílio, pela acolhida sempre alegre e generosa em sua residência

em João Pessoa.

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Aos Padres João Acioly e Josenildo do Pajeú, amigos e incentivadores, pelos

gestos de solidariedade e apoio, nessa trajetória significativa da minha vida

acadêmica.

Enfim, a todos que contribuíram, direta ou indiretamente, minha sincera

gratidão. A viagem foi longa, mas eu estou aqui.

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RESUMO Com este trabalho de investigação, é nossa intenção, contribuir paras os estudos Geo-

etnosociolingüísticos, valorizando os falares regionais, manifestados na linguagem poética de

Jessier Quirino, em sua obra, Agruras da lata d’água, com ênfase no léxico, buscando adequar

estudos lingüísticos à realidade regional, cultural e social do sertão nordestino. O nosso

trabalho pauta-se em abordagens sociolingüísticas à luz da Lexicologia, da Semântica e da

Dialetologia, sem perder de vista a tríade: língua, cultura e sociedade.

Palavras-chave: léxico, cultura, neologismo, regionalismo.

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ABSTRACT With this work of inquiry, they’re our intentions to contribute for the geo-

etnosociolinguistic studies, valuing regional speeches revealed in the poetic language of

Jessier Quirino, in its workmanship: Agruras da lata d’água”, with emphasis in the lexicon,

searching to adjust linguistic studies to reality, regional, cultural and social of the hinterland

northeastern. Our work guideline in boarding sociolinguistics, the light of the Lexicology, the

Semantics, the Dialectology, without losing of sight the triad: language, culture, society.

Words- Key: lexicon, culture, neologism, regionalism.

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AGRURAS DA LATA D’ÁGUA

... e eu que fui enjeitada

Só porque era furada.

Me botaram um pau na boca,

Sabão grudaram no furo,

Me obrigaram a levar água

Muitas vezes pendurada,

Muitas vezes num jumento.

Era aquele sofrimento,

As juntas enferrujadas.

Fiquei com o fundo comido.

Quando pensei que tivesse

Minha batalha cumprido,

Um remendo me fizeram:

Tome madeira no fundo

E tome água e leva água,

E tome água e leva água.

Daí nasceu minha mágua:

O pau da boca caía,

Os beiços não resistiram.

Me fizeram um troca-troca:

Lá vem o fundo pra boca,

Lá vai o pau para o fundo.

Que trocado mais sem graça

Na frente de todo mundo!

E tome água e leva água

E tome água e leva água.

Já quase toda enfadada,

Provei lavagem de porco,

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Aí mexeram de novo:

Botaram o pau na beirada.

E assim, descochavada,

Medi areia e cimento,

carreguei muito concreto

Molhado, duro e friento,

Sofri de peitos aberto,

Levei baque, dei peitada.

Me amassaram as beiradas,

Cortaram minhas entranhas.

Lá fui eu assar castanha,

Fui por fim escancarada.

Servi de cocho de porco

Servi também de latada.

Se a coisa não complica,

Talvez eu seja uma bica

Pela próxima invernada.

E inverno é chuva, é água,

E eu encherei outras latas

Cumprindo minha jornada.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 14

CAPÍTULO 1 - PRESSUPOSTOS TEÓRICOS 19

1.1 O Signo: diferentes linguagens, diferentes códigos 19

1.2 Tecendo considerações sobre o Léxico 24

1.3 Nas trilhas do léxico 29

CAPÍTULO 2

2.1 Léxico e Cultura X Cultura popular 35

2.2 2.2 Regionalismos 42

2.3 Neologismos 45

CAPÍTULO 3 -

3.1 E por falar em Jessier Quirino 49

3.2 Acervo fotográfico 53

CAPÍTULO 4

4.1 Um olhar sobre o falar regional em Agruras da Lata D’água 61

4.2 O Corpus 63

4.2.1 Descrição do Corpus 63

4.2.2 Análise do Corpus 74

CONCLUSÃO 99

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 101

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INTRODUÇÃO

A partir do século XIX foi que o estudo das variações lingüísticas veio a formalizar-se,

sendo um momento histórico de relevante importância para as investigações no campo da

Lingüística.

O homem, sujeito ativo, responsável pela transformação do meio em que vive,

interage expressando as suas idéias, depreendendo seu estilo pessoal, utilizando a língua de

acordo com a variedade que lhe foi transmitida, inferindo marcas novas, a partir de situações

que enfrenta no seu cotidiano.

Muito pouco se tem explorado no que diz respeito ao campo de pesquisa das variantes

lingüísticas do Sertão, entretanto, constata-se através de bases científicas que, a linguagem é

rica em seu léxico, em sua fraseologia, sabendo que muitas expressões e construções são

heranças dos colonizadores, dos africanos e, sobretudo dos indígenas que permanecem em uso

no linguajar utilizado pelo homem sertanejo, com toda a sua cultura e forma de vida.

O Dicionarista Aurélio Buarque de Holanda, em seu Dicionário da Língua Portuguesa

define Cultura como:

“O conjunto dos padrões de comportamento, das crenças, das instituições e de

outros valores espirituais e materiais, transmitidos coletivamente e característicos

de uma sociedade”, podemos afirmar que é através da cultura de um povo que a

língua se projeta.”

Observemos o que diz o lingüista Mattoso Câmara (1994:20) a esse respeito:

“A Língua é uma parte da cultura, mas uma parte que se destaca do todo e com ele

se conjuga dicotomicamente (...) é o resultado dessa cultura, ou em súmula, é o

meio para ela operar, é a condição para ela subsistir”.

Nessa perspectiva, é no uso da sua variedade, do seu idioleto que associamos o sujeito

usuário de uma língua a um determinado grupo social. Vários fatores como a pronúncia de

determinados vocábulos, a opção pela seleção vocabular, os mecanismos morfológicos,

identificam a região em que ele vive, o grupo social do qual faz parte e a situação em que se

encontra.

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O sertão rico de expressões culturais e artísticas nos oferece uma oportunidade para

através da poesia popular, expressar com muita riqueza literária, a realidade lingüística da

região, possibilitando a operacionalização de um trabalho de investigação científica pautado

em abordagens que decerto ampliarão um conhecimento mais apurado do sertão e da

problemática social tão bem divulgada em prosa e verso pelos autores sertanejos e

nordestinos, à luz de teorias lingüísticas, voltadas para a Semântica, a Lexicologia e a

Dialetologia, considerando-se a relação língua, cultura e sociedade.

Com este trabalho, queremos contribuir para um nível de conscientização e

valorização do estudo do linguajar Geo-etnosociolingüístico manifestado na poesia popular,

do poeta paraibano Jessier Quirino, em sua obra Agruras da Lata D’água, para adequação

do ensino da língua à realidade regional, no que tange ao universo lexical.

A língua enquanto saber transmissível é saber cultural. Nesse sentido, o aspecto

cultural da língua apresenta a própria cultura como saber lingüístico, que será concretizado

segundo os usos de uma comunidade. Sobre a base deste saber o usuário cria a sua expressão

que, enquanto coincide com a de outros, integra a língua comprovada no falar.

Numa breve abordagem sobre a língua falada, podemos afirmar que ela se apresenta

com maior espontaneidade nas ocorrências com a presença de elementos enfáticos,

situacionais, vocabulário informal, não se restringindo às normas gramaticais, apresentando

grande quantidade de variedades, com bastantes ocorrências de realizações perifrásticas,

metafóricas e outras figuras.

O corpus no qual nos debruçamos apresenta nuances da língua falada e, portanto

características que lhes são peculiares, como uso de diminutivos, polissemia, vocabulário

informal e muitos regionalismos, além dos neologismos.

Nesse sentido, levando em consideração as diferenças, há possibilidade de

estabelecerem-se relações isomórficas entre as duas modalidades, língua falada e língua

escrita, pois muitos elementos são comuns, apesar de cada uma possuir suas especificidades

de acordo com as circunstâncias situacionais.

Assim, realizaremos uma abordagem acerca da realidade lingüística do sertão,

partindo de diversos pressupostos ideológicos e buscando referenciais na Sociologia da

Linguagem, na Dialetologia, na Etnolingüística na Lexicologia e na Semântica.

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Para realização da pesquisa forma determinadas algumas hipóteses, que nos possibilita

obter resultados satisfatórios da presente investigação:

• Através de um corpus da modalidade escrita, é possível realizar uma análise das

peculiaridades do léxico regional, estruturando um quadro sociocultural, tendo como

recorte a obra AGRURAS DA LATA D’ÁGUA de Jessier Quirino.

• A história de um povo, seus costumes, suas crenças, sua cultura, é passível de uma

análise com vistas à identificação de expressões lingüísticas presentes na obra em

estudo.

• A referida obra retrata um linguajar regional, rico de diversidades que oportunizam

uma análise da linguagem típica sertaneja.

• Os aspectos socioculturais da região sertaneja influenciaram o linguajar regional, bem

como os neologismos encontrados no corpus objeto de análise.

Com base nessas hipóteses, o nosso trabalho de investigação tem como objetivo geral

contribuir para a preservação de costumes e valores culturais do homem sertanejo, expresso

no seu linguajar, retratado em versos, adequando estudos de pesquisa nas áreas da

Lexicologia, Semântica, Sociolingüística, Etnolingüística e Lingüística à realidade

regional/popular, partindo de um corpus de modalidade escrita, numa abordagem léxico-

semântica, oportunizando aos estudiosos desse campo de estudo, a aquisição de pressupostos

que venham a subsidiar a sua prática.

Foram determinados os objetivos específicos:

• Identificar na obra, termos e expressões peculiares do sertão, com seus respectivos

significados, viabilizando uma melhor compreensão dos vários níveis lingüísticos.

• Correlacionar dados obtidos da realidade sociocultural expressa no objeto de estudo,

identificando aspectos da cultura, bem como da temática sertaneja, através dos

aspectos contextuais situados na obra.

• Analisar aspectos da variedade lingüística sertaneja, presentes na poesia regional-

popular, nos diversos níveis de realização fonológico, semântico e lexical.

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• Realizar uma análise léxico-semântica, enfatizando a constituição lexical,

considerando as inter-relações dos aspectos sociais, culturais com o lingüístico.

Além do conhecimento do homem, de sua cultura, de sua visão, leitura de mundo, de

sua criação poética retratados em versos, objeto de investigação, esse campo de pesquisa, será

documento importante para a memória histórica do estudo das variações dialetais presentes na

obra, aliado a um embasamento lingüístico para professores de Língua Portuguesa,

fornecendo subsídios à formação de atitudes positivas adequadas quanto aos fatos da língua.

Assim, uma maior valorização do léxico regional irá de forma objetiva e sistemática

minimizar atitudes preconceituosas sobre o uso do linguajar regional e popular.

Parcos estudos de forma generalizados, a respeito da linguagem nordestina e regional,

apenas apontam sem nenhuma comprovação sistemática, características sobre o falar sertanejo

regional, o que pouco contribuiu para o conhecimento da realidade lingüística a respeito da

extensão e das circunstâncias em que ainda se observam aspectos das línguas indígenas e

africanas, graças aos poetas nordestinos que, com a beleza e a riqueza artístico-cultural das

suas produções têm divulgado amplamente as variedades lingüísticas.

Partindo de um corpus da modalidade escrita, esse trabalho tem a intenção de analisar

fenômenos lingüísticos, expressos no léxico regional, presentes na poesia popular do poeta

paraibano Jessier Quirino a qual retrata os falares sertanejos como dos mais ricos em

expressividade e regionalismos, que teimam em conservar sua identidade, apesar da

constatação de profundas mudanças nos padrões de vida desse povo e acentuada

descaracterização dos seus hábitos e peculiaridades lingüísticas em virtude das influências dos

meios de comunicação de massa.

Sabendo que estudos dessa natureza encontrarão grandes dificuldades ligadas às

causas de várias ordens, esse trabalho de investigação será executado com rigor científico,

seguindo uma metodologia postulada pela Lexicologia, Semântica, Sociolingüística,

Etnolingüística e pela Lingüística Moderna, representando, assim, o esforço de ampliar o

conhecimento, divulgando a realidade e a variedade lingüística do Sertão Nordestino.

Com esse trabalho de pesquisa, pretende-se contribuir para uma análise histórica,

sociológica e antropológica e sua relação com os fenômenos lingüísticos, notadamente no

universo léxico-semântico, tendo em vista que, o mesmo é passível de mudanças culturais,

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manifestadas nas diversas estruturas sociais, responsáveis pelas várias possibilidades de

realização da língua, comprovando assim a sua dinamicidade.

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CAPÍTULO I - PRESSUPOSTOS TEÓRICOS

O SIGNO, DIFERENTES LINGUAGENS, DIFERENTES CÓDIGOS

Dada a importância da relação sígnica entre língua e realidade, apresentamos alguns

pressupostos sobre a natureza do signo lingüístico, visto que convergem para o nosso estudo

em questão.

As línguas naturais são caracterizadas pelo que se chama de dupla articulação,

processo que norteia a linguagem verbal, tornando-a eficaz quanto à capacidade de

comunicação que o homem possui para interagir através de uma variedade ilimitada de

mensagens, obedecendo uma seqüência de unidades providas de uma forma vocal e um

sentido, que constitui o significado, o que confere à linguagem verbal, composta de um

conjunto de signos, o que Martinet chama de monema, unidade de duas faces: o significante, a

manifestação fônica e o significado, o seu sentido.

O signo ou “representâmen” aponta para um objeto perceptível ou até mesmo

inimaginável, é aquilo que representa alguma coisa para alguém.

O signo na sua essência é segundo Epstein (1990:21):

“Algo que está por outra coisa”.

Ele ainda afirma (1990: 21):

“A transmissão de significados constitui o fluxo intersubjetivo pelo qual circula a

cultura”.

O homem, ao longo do tempo, foi desenvolvendo a aptidão para a comunicação

verbal, que depende do seu desempenho, tornando-o capaz de transmitir um número ilimitado

de variedades, levado pela necessidade de comunicação com os outros, assim desenvolvendo

em princípio a comunicação consigo mesmo, a consciência de si.

Pressupondo que a comunicação se dá através da transmissão das variedades, estas são

veiculadas por meio dos signos, como algo que está para outra coisa, uma definição

característica de todas as línguas e dialetos humanos.

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Faz-se necessário ressaltar a importância dos signos, os processos pelos quais

transmitem os significados e a forma como os signos se organizam em diferentes linguagens e

códigos, constituindo-se assim, conteúdo relevante para a teoria da comunicação.

São muitos os autores que tratam do tema em questão, tornando arbitrárias as redes

conceituais em relação à definição do signo e dos seus atributos. No processo semiótico faz-se

necessário pelo menos dois seres para realizar o processo da mediação desencadeado pelo

signo.

A semiótica tem como objeto de estudo os signos e as redes conceituais que norteiam

o assunto, necessárias à teoria da Comunicação, através da qual veicula os significados ou os

sentidos, estruturados em códigos.

Charles Pierce (2003:43), um dos fundadores da Semiótica diz que a característica

básica do signo é o poder de representar as coisas ou objetos. Na sua concepção, para que o

signo possa ser um signo, deve representar alguma outra coisa:

“...um signo ou representâmen é algo que, sob certo aspecto, representa alguma coisa para alguém. Dirige-se a alguém, isto é, cria na mente dessa pessoa um signo equivalente ou melhor desenvolvido. Ao signo assim criado denomino interpretante do primeiro signo. Representa alguma coisa, seu objeto”.

A definição de signo vem ao longo da história, nas mais diferentes culturas,

constituindo-se como uma grande preocupação para os estudiosos, nas mais diversas

correntes, no que diz respeito à sua definição e classificação. Vários termos vêm surgindo,

para definir o signo: índice, ícone, sinal, alegoria. Essa pluralidade de termos tem contribuído

para cristalizar a ambigüidade do termo signo.

Ferdinand de Saussure (1995;80), um dos primeiros a inferir a concepção de signo,

afirma

O signo lingüístico une não uma coisa a um nome, mas um conceito a uma imagem acústica.

Sendo assim, não são as coisas, mas os signos que circulam entre os falantes, isto é, as

relações entre um significado e um significante.

Saussure, tomando como base os fundadores da lógica clássica, sobretudo na tradição

aristotélica do convencionalismo dos signos, considera a língua como sistema de signos,

entidade bifacial – conceito e imagem acústica – ligando assim a função sígnica: significante

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– que se realiza no plano da expressão e significado – que se realiza no plano do conteúdo.

Desse modo, o signo se configura na interação do sentido com a imagem acústica.

O próprio Saussure (1995:80) afirma:

“Esses dois elementos estão intimamente unidos e um reclama o outro”

Saussure (1995: 80 ), em suas teorias semióticas, aponta para as duas faces da função

sígnica: o significante no plano de expressão e o significado no plano de conteúdo, ao passo

que Peirce (2003:46 ) atribui a tríade: o representâmen que se situa no plano da expressão, o

interpretante, no plano dos significados ou do conteúdo e os referentes no plano dos objetos.

No entanto, há uma divergência que coteja as teorias dos referidos autores, quando se

trata da intencionalidade: enquanto Peirce afirma que os signos não são produzidos apenas no

âmbito artificial, levando em consideração também os fenômenos naturais, mesmo inferidos

culturalmente, inserindo-se assim, no processo semiótico, Saussure defende a concepção de

que os signos são entidades usadas conscientemente e cuja intencionalidade é voltada para a

finalidade da comunicação.

Assim, a intencionalidade é uma característica que define os signos naturais,

independentemente da intenção de usá-los como signos, nos remetem à significação de

alguma coisa, enquanto que os signos artificiais, a intenção é determinada conscientemente

pelo homem.

A Professora Maria das Neves Pontes1 (2001:30) em sua obra, cita Blikstein que

ratifica o pensamento de Saussure ao considerar que:

“O signo representaria a realidade extralingüística e, em princípio é por meio dele que podemos conhecê-la” .

O signo está ligado a algo que substitui ou representa as coisas, a realidade. Isso se

constitui, na verdade, o ponto de partida tanto para a Semiologia, como para a Lingüística,

que buscam compreender de forma mais abrangente o processo da significação.

Se o signo é de natureza psíquica, essa associação ocorre no espírito: não são as coisas, mas a

representação, isto é, as imagens mentais das coisas e as idéias que delas se fazem que estão

associadas no espírito.

1 LINGUAGEM REGIONAL/POPULAR uma visão léxico-semântica de Menino de engenho de José Lins do Rego.

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Pontes2 (2001: 31) ainda cita o semanticista Adam Schaff que afirma a respeito do

signo:

“O problema da essência e do papel do signo e, portanto, o problema da tipologia de suas diversas formas e variedades, só pode ser visto no seu todo, quando considerado como parte da questão – como os homens se comunicam uns com os outros”.

Ele entende que o processo social de comunicação humana constitui o ponto de partida

para a análise do signo lingüístico e da significação, isto porque ambos são elementos do

processo de comunicação.

Segundo Pontes3 (2001: 31) Schaff entende que, para uma análise satisfatória do

signo lingüístico e da significação, é preciso tomar como referência o processo social da

comunicação, pois a realização dos signos situa-se nesse processo, enfatizando que o homem

busca interagir com o meio através de uma diversidade de signos que constituem o sistema

lingüístico.

Retomando a obra de Pontes4 ( 2001: 30 ) vejamos como Pierre Guiraud (1983:16) em

seus estudos sobre significação, conceitua o signo:

“...um estímulo associado a um outro estímulo do qual ele evoca a imagem mental”...

No seu entender, o signo é um processo de associação entre um objeto ou um ser. É,

portanto, um instrumento de comunicação – é um estímulo cuja ação sobre o organismo

provoca a imagem mental de um outro estímulo.

Ainda acrescenta o referido autor (1983:15):

“O que chamamos experiência ou conhecimento é apenas uma “significação” da realidade [...] nós vivemos entre os signos”

Ele ainda tece considerações (1968:160).

“Exatamente porque os homens sempre se comunicam uns com os outros por meio de signos, toda a vida social está permeada de signos, é impossível viver sem eles”.

2LINGUAGEM REGIONAL/POPULAR. Uma visão léxico-semântica de Menino de Engenho de José Lins do Rego. 3 LINGUAGEM REGIONAL/POPULAR uma visão léxico-semântica de Menino de engenho de José Lins do Rego. 4 LINGUAGEM REGIONAL/POPULAR uma visão léxico-semântica de Menino de engenho de José Lins do Rego.

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Sendo assim, o signo atua no contexto do processo de comunicação e para o propósito

da comunicação. Ele ainda ressalta a teoria da tipologia dos signos e estabelece a distinção

entre signos materiais e os signos propriamente ditos, os artificiais. Estes por sua vez, são por

ele divididos em signos verbais e todos os outros signos. Os signos verbais são aqueles que

reproduzidos pelo homem com o objetivo de comunicar, tanto para informar como para

induzir de alguma forma o comportamento humano são sempre signos para alguma coisa.

Apesar de muitos estudiosos já terem se dedicado à problemática do significado, há

muito por esclarecer, visto que o tema exige significações adversas. Por isso o significado

constitui a face do signo que suscita as questões mais relevantes no que se refere à definição e

interpretação da natureza lingüística, que tem enfrentado algumas dificuldades no que diz

respeito à prática da investigação científica.

Em seus estudos, Pontes5 (2001:37) com base em Sapir considera que a linguagem

insere-se nas situações que estão intrinsecamente ligadas aos aspectos históricos, sociais e

culturais, pois, nao se concebe a história de uma língua desvinculada da cultura, visto que, a

mesma manifesta-se através do seu vocabulário, sendo a língua o instrumento através do qual

fazemos a leitura da realidade.

Segundo Sapir, estudar o significado é estudar a própria língua, visto ser a mesma o

sistema que dar voz às idéias e serve de instrumento da representação e interpretação da

realidade. Por esse motivo ao nos determos no estudo do significado, faz-se necessário

determinarmos os traços socioculturais que interferem na língua.

Diante dessas considerações a respeito do tema em questão ressaltamos a relevância da

relação simbiótica entre língua, realidade e cultura, uma vez que ela norteia o cerne dos

estudos do léxico.

As nossas relações com o mundo são mediadas pelos signos que estabelecem as

relações com tudo o que nos cerca, pois é através deles, que compreendemos o mundo e nos

fazemos entender, para isso, faz-se necessário que no processo da comunicação, tanto emissor

como receptor tenha o domínio de pelos menos uma boa parte dos signos que a comunidade

5 LINGUAGEM REGIONAL/POPULAR uma visão léxico-semântica de Menino de engenho de José Lins do Rego.

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adota e assim, ambos são intérpretes dos mesmos signos, sendo de significativa importância

que os signos veiculados tenham o mesmo sentido.

É no ato da comunicação que o signo assume a sua dimensão pragmática, e o faz

tornar-se uma unidade cultural.

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TECENDO CONSIDERAÇÕES SOBRE O LÉXICO

O homem utiliza o léxico de uma língua natural para dar nome aos seres e objetos,

constituindo-se assim, uma maneira de registrar o conhecimento de uma língua. Como

primeiro momento científico da natureza humana na trajetória de conhecimento do universo

está a ação de nomear a realidade.

O homem foi estruturando o mundo que o rodeia reunindo objetos em grupos,

identificando semelhanças e, ao mesmo tempo distinguindo traços diversos que

individualizam esses seres e objetos em identidades diferentes, sendo esse o processo de

nomeação que deu origem ao léxico das línguas naturais.

Maria Tereza Biderman (2001: 10) afirma:

“A criação do léxico tem se processado por meio de atos consecutivos de aquisição

da realidade e da categorização das experiências que se cristalizam em signos

lingüísticos, as palavras”.

Ao lermos um livro, um conto, um artigo de maneira geral, não nos damos conta de

que algumas palavras do texto não fazem parte do nosso vocabulário anterior à leitura.

As palavras constituem-se como elementos de que dispomos constantemente para

formarmos enunciados e quase sempre fazemos uso, sem pararmos para pensar muito nelas e

que muitas vezes esses elementos não faziam parte do nosso acervo e foram formulados por

nós diante da necessidade comunicativa.

Temos dois bons motivos para formamos palavras: a utilização da idéia de uma

palavra em uma outra classe gramatical e a necessidade de um acréscimo semântico numa

significação lexical básica. Surgem assim, alguns questionamentos: por que não temos uma

palavra para cada acréscimo semântico necessário? Poderíamos ter uma palavra inteiramente

diferente, mas isto implicaria multiplicar muitas vezes o número de palavras que teríamos

como vocabulário básico.

Assim, a razão fundamental para formamos palavras é a de que se tornaria

complicado para nossa memória armazenar formas diferentes para cada necessidade que nós

temos de usar palavras em contextos e situações diversos.

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O mecanismo da língua sempre procura atingir o máximo de eficiência, o que se

traduz num máximo de flexibilidade em termos de expressão simultaneamente a um mínimo

de elementos estocados na memória. Graças a essa flexibilidade que nos permite contar com

um grande número de elementos básicos de comunicação sem precisarmos sobrecarregar a

memória com esses mesmos elementos.

Citando ainda, Biderman (2001:11):

“Não é possível definir a palavra de maneira universal, isto é, de uma forma aplicável a toda e qualquer língua... [...] essa unidade psicolingüística se materializa no discurso com uma inegável individualidade”.

Assim, tomando como referência a língua falada, a palavra torna-se bastante difícil de

definir, mas, ao mesmo tempo de fácil reconhecimento, visto que, na oralidade não fazemos

pausas sistemáticas entre cada palavra pronunciada.

Na língua escrita, não temos dificuldades de definição neste aspecto, pois podemos

defini-la como qualquer seqüência que ocorra entre espaços e/ou sinais de pontuação, isto é,

as seqüências possíveis da língua.

O léxico, saber partilhado que se situa na consciência dos falantes de uma comunidade

lingüística, constitui-se como o acervo do saber partilhado de um grupo sócio-linguistico-

cultural. O léxico configura-se como o caminho inicial para se ter acesso a um texto, uma vez

que esse nível da língua reflete os valores, as crenças, os hábitos e costumes da uma

comunidade, e também os avanços tecnológicos, as transformações sócio-econômicas e

políticas que acontecem numa sociedade.

Mário Vilela (1994: 6) em suas posições afirma:

“O léxico é a parte da língua que primeiramente configura a realidade extra lingüística e arquiva o saber lingüístico de uma comunidade. Avanços e recuos civilizacionais, descobertos e inventos, encontros entre povos e culturas, mitos e crenças, afinal, quase tudo, antes de passar para a língua e para a cultura dos povos, tem um nome e esse nome faz parte do léxico. O léxico que é o repositório do saber lingüístico e é ainda a janela através da qual um povo vê o mundo. Um saber partilhado que apenas existe na consciência dos falantes de uma comunidade”.

Com base nisso, o léxico de uma língua mantém uma estreita relação com a história

cultural da comunidade. Portanto, o acervo lexical de uma comunidade lingüística, reflete o

seu modo de vida, como encara a realidade e a maneira como seus membros organizam o

mundo no qual vivem, bem como sistematizam os diferentes aspectos do conhecimento.

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Assim, ao mesmo tempo em que o léxico recorta realidades do mundo, insere-se na

cultura. Desse modo as línguas constituem-se como um tesouro cultural abstrato, ou seja, um

conjunto de signos lexicais que herdamos de uma série de modelos categoriais que geram

novas palavras.

Podemos afirmar que o homem desenvolveu algumas estratégias para associar

palavras a conceitos, simbolizando os referentes, os signos lingüísticos que remetem ao

universo referencial. Nesse processo de desenvolvimento as comunidades adquiriram o

conhecimento da realidade e tomaram posse do mundo que as cercam, criando assim as

técnicas e as ciências, daí surgindo a necessidade de ampliar o acervo de signos lexicais para

denominar a realidade ao mesmo tempo em que precisavam nomear as invenções

desenvolvidas pelas ciências e técnicas. Dessa forma, o léxico de uma língua vive num

processo de expansão permanente.

A esse respeito, Biderman (2001: 179) afirma:

“Qualquer sistema léxico é a somatória de toda a experiência acumulada de uma sociedade e do acervo da sua cultura”.

Citamos como exemplo, o crescimento geométrico do léxico português e das línguas

modernas em vista da rapidez com que se desenvolvem o progresso técnico e científico, das

mudanças sociais provocadas pela freqüência e intensidade dos meios de comunicação e da

progressiva interação das culturas e dos povos, como também a eficiente atuação da mídia e

das telecomunicações. É o léxico o único domínio da língua que se constitui como um sistema

aberto.

O léxico de uma língua caracteriza-se pelo constante movimento. Palavras vão

surgindo, depois desaparecem, ganham ou perdem significados, proporcionando ao usuário de

uma língua a interação com a realidade social, sendo o signo o mediador entre o homem e o

mundo.

O léxico constitui-se como o conhecimento partilhado de um grupo sociolingüístico,

inserido numa cultura, que, situa-se na mente dos falantes, sendo responsável pelas mudanças

e transformações da língua que norteiam a realidade e a cultura na história da humanidade.

O sujeito usuário de uma língua, na necessidade de constante de comunicação, busca

sempre o léxico para externar o seu pensamento, os seus sentimentos e emoções, para isso,

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criando, inovando, incorporando novos vocábulos, o que se comprova que o falante

acompahando as transformações no tempo e no espaço, é motivado a ampliar o seu acervo

lexical, para assim, conviver no mundo, sem se colocar à margem dos acontecimentos.

A grande preocupação de dicionaristas e lexicólogos é dar conta do incontrolável

desenvolvimento cultural que permeia a sociedade.

Maria Emília Barcellos da Silva (2000: 142) cita Coseriu (1980: 125):

“A língua não é apenas aquilo que está feito por meio da sua técnica, mas também é aquilo que, mediante essa mesma técnica se pode fazer; não é só passado e presente, mas possui uma dimensão de futuro”.

Mas, sabemos que o léxico não se renova apenas de neologismos, formado de palavras

inéditas, mas também na mudança de significado, através da metaforização e metonimização,

em que palavras assumem outros contextos situacionais.

Tudo isso consiste na concepção de que são os usuários de uma língua, os

responsáveis por essas transformações, inferindo novos sentidos, pois são eles que criam a

Semântica da língua, principalmente aqueles que a utilizam de forma criativa e com incrível

competência lingüística como os escritores, poetas e literatos, que atribuem uma nova

conotação ao léxico utilizado nos seus poemas inferindo marcas regionais.

Maria Tereza Biderman (2001: 180) em suas conjecturas, afirma:

“No processo de aquisição da linguagem, o léxico é o domínio cuja aprendizagem jamais cessa durante toda a vida do indivíduo”.

Nesse sentido, o léxico vai sendo incorporado, inserindo-se na memória dos falantes

sucessivamente, por meio dos signos lingüísticos, cuja assimilação acontece através da leitura

da realidade e das experiências acumuladas.

Diante da dinamicidade da língua, o léxico pode sofrer transformações, vocábulos

desaparecem, caem no desuso, ao mesmo tempo em que vão surgindo novos vocábulos ou

diferentes significações para vocábulos que já existem, ou ainda são resgatadas unidades

lexicais com outras significações.

Tudo isso consiste na concepção de que são os usuários de uma língua responsáveis

por essas transformações, inferindo novos sentidos, pois são eles que criam a Semântica da

língua, principalmente aqueles que a utilizam de forma criativa e com incrível competência

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lingüística como os escritores, poetas e literatos, atribuindo uma nova conotação ao léxico

utilizado nos seus poemas, inferindo marcas regionais características da sua obra.

Assim, a criatividade humana, sobretudo, do artista da palavra permite inferir novas

significações, possibilitando a mobilidade da extensão lexical da língua.

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NAS TRILHAS DA CIÊNCIA DO LÉXICO

Entre as disciplinas que enfocam o estudo do léxico, destacamos a Lexicologia como

sendo a ciência que tem como finalidade principal o estudo científico do léxico, a descrição

desse mesmo léxico, bem como os princípios que norteiam a sua estruturação.

A Lexicologia, ciência antiga que tem como objeto de estudo e análise a palavra, a

categorização lexical e a estruturação do léxico, tem despertado pouca atenção dos lingüistas.

A esse respeito Maria Vilela (1994:10) faz as suas considerações:

“A lexicologia não tem como função inventariar todo o material armazenado ou incluído no léxico, mas sim fornecer os pressupostos teóricos e traçar as grandes linhas que coordenam o léxico de uma língua. A sua função é apresentar as informações acerca das unidades lexicais necessárias à produção do discurso e caracterizar a estrutura interna do léxico, tanto no aspecto conteúdo, como no aspecto forma”.

A definição e identificação da unidade lexical têm causado uma problemática bastante

complexa com conseqüências em outros domínios, principalmente no campo da Lexicografia.

No que diz respeito à estruturação do léxico, disciplina um tanto complexa e desconhecida,

pouco tem sido objeto de estudos científicos, está apenas aflorando.

Enveredando pelos caminhos do estudo do léxico em português, pretendemos dar um

enfoque sincrônico ao acervo lexical da nossa língua, sem perder de vista a Semântica Lexical

numa ótica discursiva, como também, a Pragmática que trata dos usos da língua em meio aos

aspectos sociais.

Indo mais adiante, vamos entender a Lexicologia como parte da Lingüística que estuda

a língua em todos os seus aspectos, retomando pressupostos teóricos científicos do léxico e

tendo como objeto as unidades do universo lexical.

Muitos estudiosos têm se debruçado sobre os limites da Lexicologia, buscando

respostas concretas para sua legitimidade, como ciência e sua área de abrangência, tendo em

vista que o léxico de uma língua constitui-se como um sistema ilimitado que tende a alargar

seus horizontes.

É papel de a Lexicologia analisar a palavra em todos os seus aspectos, incluindo-se a

etimologia, a formação e importação de palavras, a Morfologia, a Fonologia e a Sintaxe, tudo

isso numa relação muito estreita com a Semântica.

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Com o reconhecimento da Lexicologia, do seu status científico, passou-se a utilizar

métodos e técnicas, de analisar descrição, conforme alguns pressupostos teóricos de variadas

correntes lingüísticas contemporâneos.

Podemos afirmar segundo Saussure, que o léxico constitui-se como o dicionário ideal

duma língua ou de outro ponto de vista como o conjunto de palavras de uma língua que os

falantes de uma comunidade tem como conhecimento interiorizado a respeito das várias

propriedades lexicais da palavra.

Porém não é papel da Lexicologia realizar um levantamento desse conjunto de

palavras, mas sim, de oferecer fundamentos teóricos para se traçar os nuances que permeiam

o universo lexical de uma língua.

A palavra é tida como a unidade básica da Lexicologia, que é definida por Pottier

como a “lexie”, suscetível de ser analisada sob os dois eixos, o das substituições, o

paradigmático e o das combinações, o sintagmático.

Os fundamentos teórico-práticos a respeito do léxico vão buscar suas referências nas

grandes correntes da Lingüística Moderna, especialmente no estruturalismo, no Gerativismo,

levando em consideração as suas convergências.

Maria Tereza Camargo Biderman, uma estudiosa da Lexicologia, traça as suas

considerações a respeito do léxico e já sinaliza que na Lingüística Românica há uma produção

de trabalhos de grande relevância para a Lexicologia.

Segundo Biderman (1978:139):

“O léxico de uma língua constitui um vasto universo de limites imprecisos e

indefinidos”.

Mas como podemos delimitar a palavra? Vejamos algumas concepções de alguns

pesquisadores a respeito da Lexicologia. Os gregos viam a palavra como a unidade

significativa do discurso, mas essa teoria tem sido bastante questionada por investigadores e

lingüistas contemporâneos.

Em se tratando do nível do microcosmo lexical, cada palavra da língua faz parte de

uma extensa estrutura que deve ser considerada a partir de dois eixos básicos: o eixo

paradigmático, o das substituições em que se observam as comutações possíveis em um

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mesmo segmento do enunciado, e o eixo sintagmático – o eixo das combinações – onde se

analisa as probabilidades combinatórias da palavra na cadeia falada, com as variantes de

significação e os diferentes efeitos de sentido que daí resulta. A partir desses dois eixos

resulta uma grande complexidade de redes semântico-lexicais nas quais o léxico se estrutura.

Embora seja atribuído à Semântica o estudo das significações lingüísticas, a

Lexicologia mantém uma estreita relação com a mesma, visto que se ocupa do léxico e da

palavra, levando em consideração a sua essência significativa.

Os estudos da Lexicologia têm convergido para a formação de palavras em

consonância com a Morfologia. Os lexicólogos também têm se debruçado sobre o estudo da

criação lexical, ou seja, dos neologismos, cujos estudos têm avançado e muitas pesquisas

realizadas, com o intuito de aprofundar questões no que diz respeito às investigações

realizadas a respeito do vocabulário.

Segundo Ana Maria Pinto (2001:16), muitas pesquisas ainda têm sido realizadas no

domínio da Semântica Evolutiva e também se estabelecendo relações com ciências como a

Dialetologia e a Etnolingüística; e sua ligação entre língua e cultura. Dados comprovam que

Psicolingüística e a Neurolingüística têm realizado pesquisas a respeito do armazenamento do

vocabulário e o problema do acesso ao repertório lexical retido na memória de cada um de

nós.

No que diz respeito aos estudos da Lexicologia percebe-se significativos avanços nas

décadas de cinqüenta e sessenta com o surgimento da Teoria da Informação, dando assim, um

destaque teórico para a produção de um vasto leque de pesquisas realizadas a respeito do

léxico.

Surge, assim, uma grande preocupação da parte dos pesquisadores da Lexicologia,

com relação à distinção entre as unidades significativas, incentivando para delimitação da

unidade lexicológica. Surgindo assim algumas divergências sobre o assunto.

A professora Biderman (1978: 73) considera que:

“A noção de palavra varia conforme o nível de consciência do falante”.

Ela afirma ainda que por ser uma unidade psicolingüística, que se concretiza no

discurso, pode ser conceituada e identificada no íntimo de cada língua; daí ser inviável

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atribuir uma definição da palavra em âmbito universal. Ela se reporta a hipótese de Sapir

Worf que afirma não poder dar um valor absoluto ao conceito de palavra.

Acrescenta ainda a professora Biderman (1979:85):

“Os seus contornos formais situam-na entre uma unidade mínima gramatical significativa - morfema- e uma unidade sintagmática maior – o sintagma –”.

Também o professor Mario Vilela demonstra um interesse em definir e delimitar a

palavra como unidade básica e significativa do léxico, que segundo ele, se infere no sistema

basilar de uma língua, apesar das várias acepções que a norteiam, tais como, palavra léxica,

sintagma, item lexical, lexema, lexia.

O professor Vilela (1979:115), afirma:

“A palavra léxica apresenta a relação imediata língua-realidade extralingüística, contudo, tem-se normalmente como certo que o conceito de palavra com que a Lingüística trabalha é uma noção refletida e empírica”.

E ainda esclarece:

“Se a palavra é difícil de definir, a intuição dos falantes apercebe-se dela e assegura que ela existe.”

A escritora Leonor Scliar Cabral é citada por Pontes6(2001:49),que tece a suas

considerações a respeito do tema em questão:

“Definir uma palavra sempre foi uma das questões polêmicas em Lingüística, apesar de o falante nativo ter uma intuição bastante nítida quanto à delimitação dessa unidade”.

Segundo Pottier, as palavras em sua estrutura interna são formadas de um monema

como branco ou um lexema e um morfema, comprar ou vários lexemas, pé- de moleque.

Faz-se necessário estabelecer a distinção entre Lexicologia e Lexicografia, pois aquela

trata da palavra como unidade significativa, constituída de elementos foneticamente

articulados e inseparáveis, com probabilidades de substituições em níveis hierárquicos e essa

trata do estudo da descrição da língua feita pelos dicionários.

A Semântica lexical, objeto da Lexicologia pode situar-se no nível da langue em que

se encontra a sistematicidade das unidades lexicais, o que não é essencialmente funcional ou

tem caráter distintivo, sendo aquilo que é fixado socialmente por uma comunidade lingüística,

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faz parte da norma e o que diz respeito ao discurso concreto, as relações com o

extralingüístico pertence ao nível da parole.

A língua formada de unidades léxicas compõe-se de resultado heterogêneo, que advém

de todo um processo histórico. Nessa trajetória, vamos percorrer alguns pressupostos

históricos par analisarmos de forma sucinta a origem do léxico português que é a soma do que

se originam do latim e de vários outros elementos, empréstimos múltiplos e variados

condicionamentos sócios culturais.

Segundo Dino Preti (1982: 62), a língua no seu conjunto é um diassistema que

compreende as variações ocorridas: as variedades diastráticas que determinam os fatores

sócios culturais, as diatópicas que denominam as variações de natureza espacial, como os

falares regionais ou locais e as variantes diafásicas determinadas pela situação, pelo ambiente

em que se encontra o falante, são as variações observadas entre a oralidade e a escrita.

A constituição do léxico do português deu-se através de variadas origens, destacando-

se o latim vulgar que assume a função de estrato, no qual outros idiomas anteriores à

romanização - os substratos – deixam marcas as mais variadas possíveis, distinguindo-se aí o

léxico como herança e o tomado como empréstimo de outros idiomas.

Vemos assim, que o Português resulta de uma longa história permeada de

empréstimos, heranças e câmbios semânticos, resultando assim, no léxico como um

subsistema que se caracteriza por sua dinamicidade, pois nele, refletem-se as inovações, as

mudanças políticas, econômicas, sociais, culturais e cientificas, constatando as maiores forças

que se manifestam no léxico como sendo a necessidade urgente em manter a sistematicidade

da língua e da comunicação entre os falantes, bem como a exigência em configurar o que de

novo surge na comunidade.

O que diferencia, portanto, o português das outras línguas românicas, é a sua

localização periférica, a origem meridional dos seus colonizadores e o forte substrato céltico.

Podemos perceber assim, a sistematicidade do léxico, identificada pelas estruturas

lexicais de determinadas relações que, para dar conta dessa organicidade, atém-se ao plano

sincrônico da langue no qual as oposições funcionam, o que não acontece no plano do formal

ou da parole.

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Faz-se necessário estabelecer uma distinção entre o lingüístico e o extralingüístico,

isto é, o nosso conhecimento de mundo ou o saber enciclopédico, pois a essência dessa

sistematicidade está nas relações paradigmáticas e sintagmáticas.

O estudo do léxico insere-se principalmente na Semântica lexical, com base nas

relações entre as palavras, apesar de sabermos que algumas análises interessantes no que diz

respeito à estrutura interna, hierárquica e não linear dos lexemas apresentem as suas falhas.

Nos últimos anos, a Semântica deixou de lado as teorias formais e assumiu as

proposições pragmáticas, comunicativas e cognitivas, retomando o estudo do léxico a ser

abordado em todas as correntes e concepções lingüísticas.

Nessas concepções, destacamos a Semântica Cognitiva que confere ao léxico um lugar

ao qual chamamos de Semântica dos protótipos, dos estereótipos, das semelhanças entre as

famílias ou o princípio de aproximação do protótipo. Essa perspectiva considera que o

conhecimento lexical é conhecimento de língua e conhecimento cultural, destacando-se o

perfil psicológico da abordagem lingüística.

De acordo com essa concepção, o processo de aquisição do léxico, além de ser uma

apropriação das regras de referência, passa, também, por um processo de aculturação. A

aquisição de uma palavra nova é sempre a aprendizagem da relação entre esta palavra que se

situa como um objeto dentro e na cultura.

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CAPÍTULO II

LÉXICO E CULTURA X CULTURA POPULAR

A função cultural evidencia as relações metafóricas e metonímicas como marco

significativo na construção do léxico.

Não podemos empreender um estudo do léxico sem uma abordagem das relações entre

cultura e língua. O termo cultura é bastante amplo e em torno das suas concepções surgem

muitas controvérsias, pois é fruto de uma trajetória histórica, de um diálogo social que se

prende a partir dos diversos níveis do discurso. Com isso pretendemos abordar alguns

conceitos que surgem a partir da natureza de mecanismos lingüísticos e as suas inter relações

com a vida social.

É nos séculos XVIII e XIX, período do florescimento da revolução industrial que

emerge o termo cultura antes confundido com idéia de civilização, tornando-se a partir daí

como metáfora para o processo de crescimento espiritual do homem e entendido como arte,

literatura, esfera superior que se tornou um tipo de defesa compensatória das noções de

criatividade, imaginação e espontaneidade, também peculiar na constituição do léxico.

Tendo em vista uma definição polêmica, como já dissemos, é imprescindível

determinar o seu significado, uma vez que o termo envolve não só valores espirituais, mas

também materiais, incluindo-se as qualidades peculiares do homem e aquelas adquiridas ao

longo da sua existência, do seu desenvolvimento, nas suas relações com os outros, inclusive

na aquisição da linguagem.

Surge no Iluminismo o conceito antropológico de cultura como a competência da

capacidade genérica e ideológica do ser humano que se corporifica na sua competência

lingüística que não se restringe apenas à formação de uma simbologia.

O Dicionário Houaiss (2003), define cultura como:

“Conjunto de crenças, costumes,, atividades etc. de um grupo social; civilização, conhecimento; instrução”.

Para Aurélio Buarque de Holanda (1986)

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“Cultura é o complexo dos padrões de comportamento, das crenças, das instituições e doutros valores espirituais e materiais transmitidos coletivamente e característicos de uma sociedade”.

A professora Maria das Neves Pontes, em sua obra, LINGUAGEM

REGIONAL/POPULAR: uma visão léxico-semantica de MENINO DE ENGENHO, de José

Lins do Rego, cita Vivian Shelling (1990: 31-32) que afirma:

“A linguagem humana abrange especificamente a combinação de símbolos capazes de expressar relações entre coisas, indivíduos e acontecimentos”.

A referida autora acrescenta ainda,

“A cultura, segundo a definição antropológica, é um fenômeno supra individual. Ela é aprendida, partilhada e adquirida, tornando-se permanente através do tempo e independente de seus portadores”.

A cultura reflete, portanto, o modo de vida de uma sociedade, enquanto um conjunto

organizado de indivíduos que interagem através das diversas relações sociais, sobretudo do

léxico que reflete os valores sociais, políticos, religiosos e culturais dos usuários de uma

língua.

Quanto à cultura como fenômeno lingüístico, o pesquisador Renato Ortiz, (2003: 142)

define:

“A cultura enquanto fenômeno de linguagem é sempre passível de interpretação, mas em última instância, são os interesses que definem os grupos sociais que decidem sobre o sentido da reelaboração simbólica desta ou daquela manifestação”.

Diante da complexidade e da relevância do termo cultura, direcionamos nossa atenção

para o seu aspecto antropológico, abordando especificamente a cultura popular, voltada para

uma análise Geo-etnosociolingüístico das várias expressões que envolvem as manifestações

que valorizam tradições populares regionais, às quais estão refletidas no linguajar do povo.

Ainda remetendo a obra de Pontes (1990:35)”, ela retoma a concepção de Gramsci no

que diz respeito à cultura:

“Intimamente ligada à vida social: os movimentos sociais e os conflitos entre

classes que faziam avançar o desenvolvimento histórico; as instituições da

sociedade civil, particularmente a escola e a Igreja, onde em larga medida se

formava a consciência, a linguagem e a visão do mundo dos indivíduos”.

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Essa concepção é retratada em todos os aspectos da vida social, com especial atenção à

escola e à igreja, pois são elas responsáveis pela aquisição do conhecimento, das informações

e pela formação da consciência crítica.

Em se tratando ainda das relações da língua com a cultura, nos reportamos para a

hipótese de Sapir-Worf citada em Pontes7 (2001:63) e suas concepções a respeito das teorias

sobre o tema em questão que norteia fundamentalmente os mecanismos lingüísticos no que se

refere ao Léxico e a semântica.

A referida hipótese bastante difundida entre lingüistas e estudiosos na área vem

reforçar a concepção de que a cultura se reflete na língua, quanto aos seus aspectos

gramaticais e semânticos, pois é aí que são manifestados os dados da realidade que

caracterizam uma língua, bem como a cultura na qual ela está inserida.

Segundo eles, língua e cultura constituem duas realidades diferentes que embora

ligadas ajam constantemente uma sobre a outra.

Vejamos o que diz Sapir (1980:165):

“[...] a língua não existe isolada de uma cultura, isto é de um conjunto socialmente

herdado de práticas e crenças que determinam a trama de nossas vidas”.

.Segundo Sapir, é apenas o léxico de uma língua o responsável pela organização da

experiência do povo que a fala, com isso ele parece admitir não haver outro nível na língua

que dependa da cultura que não seja o léxico, considerando que a língua é formada no mundo

e é ela que organiza todas as nossas reflexões e assim no nosso itinerário, retomamos a visão

de cultura com ênfase na cultura popular ou cultura de massa, cujo termo tem sido bastante

questionado por cientistas sociais e por críticos literários, mas que é uma marca da moderna

civilização urbana e industrial, em que as pessoas consomem ou desfrutam de uma cultura

essencialmente diversa das camadas chamadas elites, que constituem a estrutura social, sendo

observado tanto no que se refere aos conteúdos, como a qualidade.

São os meios de comunicação de massa, os responsáveis pela difusão e transmissão

desse perfil de cultura bem presente na sociedade contemporânea, passando a ser o tipo de

cultura mais universalmente compartilhado, abrangendo assim diversos aspectos que

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constituem a vida social e individual, considerando a sociedade um agregado de relações

sociais, sendo a cultura o conteúdo dessas relações.

O próprio nome cultura popular aponta para a concepção de povo, o que os

estudiosos do folclore relacionam à concepção de folclore que está intrinsecamente ligada à

idéia de tradição. O que se pretendemos é apresentar um estudo de ordem etnolingüística,

permeado por este tema tão discutido.

Renato Ortiz (2003: 70) remete a Florestan Fernandes que vê a Cultura popular

como:

“O saber tradicional das classes subalternas das nações civilizadas”.

De acordo com essa concepção, compreende-se que existe uma elite promovedora do

desenvolvimento e outra considerada subalterna que resiste às inovações, conservando o

tradicionalismo, o que implicaria numa conservação da sabedoria popular, sendo bastante

discutida por outros estudiosos.

O poeta Ferreira Gullar contestando a teoria de Florestan Fernandes, é citado também

por Renato Ortiz (2003: 71):

“a tomada de consciência da realidade brasileira” e não uma “concepção do

mundo das classes subalternas”.

E acrescenta ainda:

“A cultura designa um fenômeno novo na vida brasileira”. (1994:72)

Nesse sentido, há uma desvinculação do seu caráter conservador, separando-se as

concepções de folclore e cultura popular, enquanto aquele é interpretado como as

manifestações de caráter tradicional, esta é definida como passível de transformações. Enfim,

Ferreira Gullar compreende a cultura popular como: tomada de consciência da realidade

brasileira, que aborda os produtos artísticos elaborados pelas camadas populares, no seu

projeto político que se apropria da cultura como elemento de sua realização.

Renato Ortiz (2003: 71) remete a Carlos Estevam, que considera a cultura popular

como uma ação de caráter fundamentalmente reformista. Para ele a cultura representa uma

forma extremamente particular de consciência: a consciência que vai despejar na ação

política.

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40

Ele afirma:

“fora da arte política não há arte popular”.

E assim, de acordo com essa concepção, se rompe a relação entre folclore e cultura

popular, definindo-se como todas as manifestações culturais de caráter tradicional, pois ainda

assumindo uma nova roupagem, significando, portanto uma função política dirigida ao povo,

que envolve outras manifestações culturais, tais como, o teatro, a valorização dos temas

brasileiros, cantados em prosa e verso, de modo geral as tradições populares regionais.

Também chamada de cultura de massa, a cultura popular, é assim chamada pelas

suas características especialmente da moderna civilização urbana e industrial.

Quando se trata de Cultura popular, há certa dificuldade em atribuir-lhe uma

definição, visto que, ela aponta para um universo abrangente de conceitos e concepções que a

própria Antropologia Social, ciência que se preocupa com estudos que dizem respeito à

cultura, dados os múltiplos sentidos e concepções que permeiam a expressão. Para alguns

estudiosos ela nos remete ao conhecimento, inferindo-lhe a tarefa de resistir contra a

dominação de classe, por outro lado é vista como formas diversas de expressão, nas quais os

valores são muitos em meio a uma sociedade complexa e bastante heterogênea.

Aurélio Buarque de Hollanda, em seu Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa,

define cultura como:

“Saber, estudo, elegância, esmero, ela evoca os domínios da Filosofia, das ciências

e das artes”...

Muito já se escreveu e se debateu sobre o tema, surgindo assim várias controvérsias

sobre o tema: Uns confundem a Cultura popular com folclore, um conjunto de práticas

religiosas e artísticas, consideradas tradicionais. Outros depreendem como resquícios da

cultura intelectual apurada no decorrer do tempo.

Essa ideologia nos leva a concluir que a cultura é imune ao tempo e não passível de

mudanças.

Segundo Antonio Augusto Arantes (2004:22):

“Cultura é um processo dinâmico; transformações ocorrem, mesmo quando intencionalmente se visa congelar o tradicional para impedir a sua “deterioração”.

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É possível preservar os objetos, os gestos, as palavras, os movimentos, as características plásticas exteriores”...

A cultura popular criada e inventada pelo povo convive lado a lado com a cultura

erudita, mostrando uma visão de mundo que contradiz aspectos formais, partindo de formas

de expressão criadora, estabelecendo uma harmonia em cada hábito, crença, emoção,

inferindo novos significados, pois ela vive em constante reelaboração, pois o homem como

criador e renovador, ao longo da história vai entrelaçando o moderno com o arcaico, numa

expressão única de arte e de revelação do belo.

A cultura popular segue no ritmo da vida cotidiana, através da qual o artista busca

nos objetos e fatos, formas ricas e variadas de externar a vida do povo, como o faz Jessier

Quirino que através da poesia popular regionalista entrelaça arte, poesia e humor, numa ação

especificamente estética e lúdica, que embora direcionada para um público menos letrado,

acompanha o desenvolvimento científico tecnológico sem perder de vista a retratação da vida

do homem sertanejo, nordestino.

A divulgação do Nordeste como repositório da cultura popular deve-se a vários

intelectuais e artistas quem em suas obras têm uma visão do Nordeste, enquanto região prenhe

de cultura e regionalismo. Destacamos Gilberto Freyre, José Lins do Rego, Manuel Bandeira

e Ascenso Ferreira. Trazendo mais para a contemporaneidade, Zé Dantas, Humberto Teixeira,

que perpassa pela música de Luiz Gonzaga, como também João Cabral de Melo Neto, Rachel

de Queiroz, Ariano Suassuna, que em meio às divergências, são autênticos construtores de

uma visão do Nordeste desmistificado de preconceitos.

A obra sociológica de Gilberto Freyre, como de outros romancistas de trinta, resgata a

manifestação cultural como verdadeira expressão do regionalismo, pois é nesse período que

os movimentos regionalistas se voltam para os movimentos populares, como ponto de

reencontro do homem com seus valores sociais, históricos e culturais.

Ressaltamos também a figura de um grande divulgador e colaborador da cultura

popular, Ariano Suassuna, que vem reafirmar com sua obra o reino encantado do Nordeste,

como expressão do fazer popular, que estabelece um elo entre o real e o imaginário. Todos

esses autores citados tem em comum a cultura popular, atrelada ao regionalismo, que busca

no passado a memória, estabelecendo assim uma relação com o presente.

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No celeiro da cultura popular, destacamos ainda, outras figuras, que, com suas obras

tecem, retratam e divulgam a realidade cultural nordestina, como o pesquisador Norte Rio

grandense, Câmara Cascudo, que muito tem contribuído para a valorização da cultura popular

e, sobretudo dos regionalismos.

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REGIONALISMOS

Inserindo-se nesse contexto de cultura popular, é imprescindível fazermos um recorte

do que seja Regionalismo, seus conceitos e tendências, um tema bastante interligado à

concepção de cultura de massa.

No período do romantismo, verifica-se a crescente importância do Brasil regional, um

fato bastante significativo nesse período, com as influencias geográficas, culturais,

econômicas, folclóricas e tradicionais que inseriram suas características distintivas na vida,

nos costumes, no temperamento, nas expressões artísticas, na maneira de ser, de sentir, de

agir, de trabalhar e de falar.

Há várias maneiras de se ver o Regionalismo, desde o simples localismo ao amplo

regionalismo literário, enfim, as referências aos aspectos regionais, devem-se à maneira como

as regiões são apresentadas e tratadas ao longo da história.

O professor Afrânio Coutinho em suas considerações sobre Regionalismo, tomando

como referência George Steward, afirma que num sentido mais amplo, toda obra de arte, é

regional, quando tem por pano de fundo uma região particular ou parece germinar

intimamente desse fundo.

Sintetizando, uma obra de arte, para ser regional, não somente tem de ser localizada

numa região, senão também deve retirar sua substância real desse local, que decorre em

primeiro lugar do suporte material, incluindo-se aí o ambiente natural representado por clima,

topografia, fauna, flora, hidrografia, tidos como elementos que afetam a vida humana na

região e também dos modos de vida peculiares de uma sociedade radicada naquela região e

que a fizeram distinta de todas as demais.

Segundo o referido autor, essa é uma concepção autêntica do que é Regionalismo, que

apresenta o espírito humano nos seus diferentes aspectos na inter-relação com o seu meio

imediato, refletindo o homem com sua linguagem, a paisagem e as riquezas culturais de uma

região em particular, consideradas em relação às atitudes do indivíduo herdeiro de certas

peculiaridades de raça e tradição.

Ainda são palavras do Professor Afrânio Coutinho (1972:237) a respeito do

Regionalismo:

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“É a variedade que se entremostra na unidade, na identidade de espírito, de

sentimentos, de língua, de costumes, de religião. As regiões não dão lugar a obras

literárias isoladas, mas contribuem com suas diferenciações para a homogeneidade

da paisagem literária do país”.

Para o pernambucano Gilberto Freyre (1996:140), o que faz o Brasil regionalista é o

respeito às diversidades entre as regiões. Ele vê como:

“Um esforço no sentido de facilitar e dignificar certa atividade criadora local”.

Em se tratando de estudos relacionados ao léxico e sua inter-relação com a cultura,

não poderíamos deixar de fazer esse recorte sobre Regionalismo, partindo do pressuposto de

que a língua reflete a realidade, o mundo social no qual o homem, agente transformador infere

suas marcas de acordo com a região em que vive.

É na década de 20 que flui um novo regionalismo, que se reflete nas várias esferas do

país, ocorrendo mudanças significativas, tanto no campo econômico, como no social e em

outros setores, buscando novos espaços em meio a essas mudanças. O discurso regionalista

deixa de ser apenas ideológico, o que caracterizaria a essência do Nordeste, instituindo uma

imagem a partir do universo histórico e intelectual.

Tomando como referência Os Sertões de Euclides da Cunha, que se tornou um marco

no que diz respeito à efervescência da produção literária nacional, com ele resgatamos as

origens, os costumes, as tradições e, sobretudo uma reflexão sobre a identidade do Sertão

vista de uma forma discriminatória, como um espaço repositório de uma cultura folclórica e

tradicional.

Durval Muniz de Albuquerque (2001:74) em sua obra A invenção do Nordeste, cita a

frase atribuída a Agamenon Magalhães, a qual expressa a autêntica identidade do Nordeste:

“O Nordeste o que tem feito hoje é se coser com suas próprias linhas”.

O Regionalismo é visto como um elemento da nacionalidade brasileira, desde o início

quando as regras são identificadas pelas mais diversas histórias, grupos típicos, religiosidade,

heróis, costumes e tradições.

Gilberto Freyre foi o grande impulsionador do movimento regionalista, que

influenciou o Congresso regionalista do Recife em 1926, assumindo assim, uma característica

cultural e artística que tinha como princípio resgatar, preservar e valorizar as tradições

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nordestinas. Com Freyre, o regionalismo assume não apenas um caráter artístico e cultural,

mas também, social, fluindo, a partir de uma visão sociológica bem defendida em sua obra.

Esse regionalismo que surgia, é defendido por José Lins do Rego, como afirma Durval

Muniz de Albuquerque (2001: 87):

“José Lins, tratando de afirmar a novidade do movimento e do regionalismo freyreano, afirma não ser este a simples extravagância de linguagem ou traje, nem caipirismo de Monteiro Lobato, nem saudosismo de superfície. Ele seria, no plano político, contrário ao estadualismo, no plano artístico, seria uma “sondagem da alma do povo, nas fontes do folclore”. Seria um regionalismo orgânico, revelador e vitalizador do “caráter brasileiro”, que fortalecia a unidade brasileira, formando um povo que não seria uma massa uniforme e sem cor”.

O tema regionalismo, nos remete para o Nordeste, cenário do corpus que iremos

trabalhar, tendo como cerne o sertão nordestino retratado na literatura popular, que possui

uma estrutura narrativa com preceitos paradigmáticos que de forma criativa são retratados

pelo autor que, o qual nos debruçamos.

A exemplo dos cantadores, repentistas e contadores de histórias, apresenta uma

narrativa sem argumentos centralizadores e poucos diálogos, com depoimentos pessoais, em

que diferentes vozes apresentam uma visão de mundo, estabelecendo um estilo regional,

próximo ao falar do cotidiano, sem artificialidade, numa tentativa de fazer a linguagem ser

uma expressão do real, estabelecendo a relação entre homem e coisas, os seus significados,

resgatando assim uma linguagem regional peculiar do sertão, que nesse trabalho, é refletida na

linguagem poética de Jessier Quirino.

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NEOLOGISMOS

A sociedade constantemente está evoluindo. Essa evolução é refletida, sobretudo na

língua, enquanto objeto da cultura, vai sofrendo essas inovações com a introdução de novos

termos, que vão se incorporando e, portanto, sendo aceitos.

A língua como fato social, vai sendo moldada de acordo com as necessidades da

comunidade que a utiliza e, assim, essas transformações vão sendo refletidas na sociedade.

O léxico nordestino recebeu várias contribuições: o português arcaico da língua trazida

no século XVI pelos portugueses com várias palavras e expressões, cujo uso hoje é

considerado arcaico. A derivação e a composição dialetais herdadas do Português, como

forma de enriquecimento pela tematologia, a contribuição estrangeira dada pelo tupi e as

línguas africanas são um grande manancial de termos referentes à fauna, flora, aos usos e aos

costumes.

São observáveis as modificações das variantes lingüísticas no campo da sintaxe,

estrutura viva da língua, em cuja articulação reside a alma e o caráter do idioma, observando

assim, que algumas formas sintáticas dialetais cristalizaram-se de certa forma na linguagem

das várias camadas sociais que entraram para a literatura o que, à luz da gramática são

considerados erros, são considerados corretos dentro da realidade lingüística dos usos.

Hoje, antes de realizarmos qualquer estudo lingüístico, faz-se necessário dirigirmos

um olhar para o sujeito que fala, o meio no qual está inserido, o grupo social ao qual pertence,

pois tudo isso será refletido no seu falar.

Mário Marroquim (1975:21) em sua A língua do Nordeste diz que: “A pronúncia do nordestino é a que caracteriza em geral o falar brasileiro”.

Remetendo a questão do neologismo também para fonética, ele também afirma: Em geral a entonação do falar nordestino,no interior, principalmente, segue uma

orientação descendente. As vogais são marcadas e abertas. Daí a fama de falarmos

cantando”.

O nosso Brasil, dada a enorme extensão territorial, possui falares, cujo léxico varia de

uma região para outra, em que cada uma apresenta suas peculiaridades, levando em

consideração a cultura de cada região, surgindo de forma espontânea nas massas populares,

impulsionadas pelas tendências atuais e naturais, cabendo aos lingüistas e filólogos, estudá-los

e analisa-los, sem, no entanto repudiar ou negar.

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Alguns estudiosos como Amadeu Amaral em “Dialeto Caipira” e Antenor Nascentes

com “Linguajar Carioca” já têm se dedicado aos estudos do português falado, daí surgindo

outras publicações bem como glossários regionais.

No linguajar cotidiano, observa-se um falar brasileiro bem característico, com

construções de expressões e sintaxe espontânea que divergem da língua portuguesa. É a

autêntica e verdadeira língua brasileira, que vai inferindo ao dialeto novas formas lexicais

como uma maneira de resistir à força conservadora da língua. No entanto esse falar muitas

vezes é bloqueado pelo caráter disciplinador da escola, pelo preconceito em relação a outras

regiões brasileiras.

Jessier Quirino em sua obra, além de um repertório especial de palavras regionais,

traduz com muita autenticidade a pronúncia do nordestino que caracteriza o falar brasileiro,

de pronúncia arrastada em contraste com a prosódia lusitana, inferindo também um recorte de

ordem fonética

Com vistas à desvalorização e limitadas pesquisas no que concerne a pesquisa sobre a

língua falada nos textos escritos, vimos, dessa forma, desenvolver um trabalho científico

pautado em investigações sobre o linguajar nordestino, o regionalismo e, sobretudo, os

neologismos.

No nosso estudo sobre o léxico, teceremos algumas considerações a respeito de

neologismo, compreendido como uma criação nova que é incorporada ao léxico de uma

língua.

Maria Tereza Birdeman (2001: 203) distingue dois tipos de neologismos:

- Neologismo conceptual – uma nova acepção que se incorpora ao campo

semasiológico de um significante qualquer.

- Neologismo formal – constitui uma palavra nova introduzida no idioma. Pode ser um

termo vernáculo ou um empréstimo estrangeiro.

A pesquisadora pernambucana a Professora Nelly Carvalho (1987:10) em seus estudos

sobre a formação neológica considera que:

Sempre criar uma palavra é impor um conceito por intermédio de sua

representação escrita ou falada. Mais que um ato lingüístico,portanto, a criação é

um ato social, uma tentativa de impor uma visão de mundo a uma comunidade”.

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Ela também afirma (2002:32):

“Uma língua, através do vocabulário que a liga ao mundo exterior, reflete a cultura da sociedade à qual serve de meio de expressão”.

A professora Nelly acrescenta que toda língua viva tem seus mecanismos de

ampliação do léxico, que resulta de dois processos:

- o processo de criação dentro da própria língua;

- o processo de adoção e adaptação de um termo de língua estrangeira.

A esse respeito, (2002: 34) ainda acrescenta:

“A ampliação do léxico, pelo empréstimo, é resultado não propriamente de uma inovação, mas de uma adoção que é a adequação da língua como saber lingüístico à sua própria superação e tem como determinantes fins culturais, estéticos e funcionais”.

Ao ser inserido no léxico de uma língua, o neologismo é incorporado numa cadeia

semântica e vai, aos poucos, sofrendo influência quanto à sua significação, muitas vezes até

ampliando a sua carga semântica, participando da evolução da língua.

Há neologismos que passam a ser dicionarizados, permitindo a sua cristalização e

conseqüentemente a sua durabilidade no vocabulário, o que significa que foi incorporado ao

inventário aberto de uma comunidade usuária de uma língua.

Há uma necessidade constante de criar novas expressões, alargando assim os campos

lexicais, tanto das linguagens especiais como da língua como um todo. Além das criações

materiais e mentais dos cientistas, como também as transformações sociais, têm suscitado

neologismos, que dão origem a novas situações responsáveis pela categorização do léxico.

São muitos os fatores que influenciam a criação de neologismos: os poetas e escritores

estão constantemente criando termos e palavras novas, ou inferindo novos significados as

palavras já existentes. A ciência e a tecnologia são grandes responsáveis pela criação

neológica, pois dado o seu acelerado desenvolvimento, estão criando profundas mudanças.

O neologismo, como resultado da criatividade lingüística é fruto do desenvolvimento

dessa criatividade nos diversos setores: artísticos, científicos e tecnológicos, contribuindo

assim para a formação de novas concepções e conseqüentemente para a evolução do ser

humano, enquanto sujeito responsável pela transformação do meio em que vive.

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A professora Nelly Carvalho (1987: 8) afirma a esse respeito:

“[...] Daí o neologismo ser tão ligado à sociedade atual, algo tão ao gosto do homem de hoje, sequioso de mudanças e novidades”.

Destacamos um tipo particular de criatividade no uso da faculdade da linguagem, o

que se manifesta na arte literária, em que o ser humano extravasa seus sentimentos, idéias e

emoções através do código lingüístico que vai além do simples ato de comunicar: a criação

artística na qual o poeta utiliza a língua enquanto sistema que depende da norma,

transcendendo as potencialidades simbólicas da língua para criar uma linguagem permeada de

beleza, criando um código lingüístico pessoal com estrutura própria.

É a linguagem poética, uma relação entre o concreto e o abstrato, entre o real e o

imaginário, que se sobrepõe à língua não apenas como objeto de comunicação, mas como

uma forma de expressão que retrata beleza de formas, sentimentos, sons que vão se criando

através dela.

Há escritores que são contrários às inovações na língua, outros são mais ousados e

expressam os seus sentimentos, as suas emoções de maneira peculiar e inusitada na suas

obras, incorporando termos novos, fruto do seu espírito criador e do seu poder de

comunicação.

Sabemos que sempre há resistência quanto às mudanças, por parte daqueles que

apresentam atitudes preconceituosas, em relação aos neologismos, considerando a língua

como um objeto imutável, pronto e acabado.

Nesse sentido, Nelly Carvalho cita Monteiro Lobato, em sua obra O que é Neologismo

(1987:32), considerando o poeta da literatura infantil:

“Se numa língua nunca houver neologismo, essa língua não aumenta. Assim como há sempre crianças novas no mundo, é preciso que haja, na língua, uma contínua entrada de neologismos”.

Assim, em Agruras da lata d’água encontramos uma linguagem informal e cotidiana,

bem popular, impregnada de neologismos, que vão de forma espontânea, inserindo-se através

dos regionalismos, onde a afetividade, o emocional é poeticamente transbordado de termos e

expressões que enriquecem o estilo popular e regional de Jessier Quirino.

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CAPÍTULO III

E POR FALAR EM JESSIER QUIRINO

O quarto filho homem do Seu Quirino e Dona Pompéia, nascido em 1956, menino

tímido e acanhado, que obedecia às ordens dos seus irmãos mais velhos, além de também,

herdar também as calças que não serviam mais, os livros do ano passado, sapatos arranhados,

cinturão de beira quebrada e camisa volta ao mundo que não cabia mais nos irmãos mais

velhos.

Estudou no Colégio Pio XI, em Campina Grande, sua terra natal, onde levado pela

timidez refugiou-se na poesia, compondo versos cômicos, declamados com graça, inflexão e

traquejo, que imponham respeito entre os colegas que o apelidavam de cabeção e assim, por

trás dos versos rimados, escondia a timidez, para aflorar a poesia impregnada de

regionalismos.

Luís Berto8, escritor,(2004) afirma:

“Enfim um jeito novo de poetar, foi o pensamento que me veio à cabeça após o impacto da leitura de AGRURAS DA LATA D’ÁGUA. O ineditismo na maneira de meter o chicote e domar as palavras foi o ponto saliente da obra desse jovem vate paraibano que me ficou retinindo o juízo”.

Desde cedo despertou seu interesse pelas coisas nordestinas, quando ouvia na Rádio

Borborema os bemóis das cantorias de viola, antes da Ave-Maria, hora em que os meninos

chegavam da escola da professora Dona Bazinha.

Foi criança como os outros da sua época que gostava de ir tomar banho no açude de

Seu Euclides, pescar no canal de Chico Quirino, jogar bolas de meia, caçar calango,

adivinhão, pintassilgos e lavadeiras. Tempo da meninice, em que o papel pautado, tinha um

cheiro de sabonete Lifebuoy e Eucaloi e Cashmere Bouquet, que era comprado na venda de

Seu Nilo com tamboretes de aroeira, tempo da narrativa do jogo entre Treze e Campinense,

feita por Zé Américo, que também acirrava o fanatismo político, tempo das brincadeiras com

Ciço Galinha, um matuto nato, que com suas tiradas engraçadas muito influenciou o lado

poético e sua admiração pela poesia matuta, Paulo Mocó, Lulu Aurelinho e outros moleques,

tempo dos filmes de Maciste e Ivanhoé, tempo que dava gosto ver a boiada levada para Monte

Santo, santo era o dia da padroeira, Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, na igrejinha de 8 A força da poesia p.5

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Bodocongó, onde observava muito contrito as mulheres rezando, chamando a sua atenção o

brilho reluzente do terço de sua mãe. 9

Havia em Campina Grande uma efervescência cultural intensa, com a divulgação da

música e do teatro e, sobretudo os festivais de repentistas onde se declamava e se improvisava

com muita graça. E foi assim, surgindo o gosto pela poesia matuta, começando pelos outros

poetas, encontrando assim, a licença poética para penetrar nesse mundo da improvisação.

Era um tempo em que ficava encantado com a fonte luminosa da Praça Clementino

Procópio, quando pilotava um jipe de madeira do carrossel, ao lado doCine Capitólio.

Grande admirador do sertão nordestino, sempre esteve muito atento à sabedoria

popular, à simplicidade do matuto sertanejo que, no seu linguajar traduzem as emoções os

sentimentos do povo nordestino. Recebeu influências da poesia matuta dos mestres Zé da Luz,

Patativa do Assaré e Zé Laurentino e o cantar de muitos repentistas.

Hoje, já adotando um estilo mais rebuscado, vai beber na fonte de tantos outros

autores: no lirismo matuto de Renato Caldas, nas abordagens sociais de Catulo, no

surrealismo de Zé limeira, na imagem de Ascenso Ferreira, nos neologismos de Guimarães

Rosa, na desconstrução, na brasilidade e originalidade de João de Barros, no universo

sertanejo dos cantadores e folcloristas entre outros tantos poetas nordestinos, sempre esteve

muito atento à realidade nordestina, retratando com tanta legitimidade os costumes

nordestinos, do forró, da rapadura, do coco, do arrasta-pé além de se debruçar no vocabulário

popular rico em regionalismos e neologismos, nos falares típicos recheados de um léxico

característico do Nordeste Paraibano.10

Profundo observador do sertanejo, homem simples, resgata expressões típicas do seu

linguajar, lapidando a palavra, tornando o errado, certo na ótica do homem nordestino.

Luís Berto, escritor(2004),11 afirma:

“Enfim um jeito novo de poetar, foi o pensamento que me veio à cabeça após o impacto da leitura de AGRURAS DA LATA D’ÁGUA. O ineditismo na maneira de meter o chicote e domar as palavras foi o ponto saliente da obra desse jovem vate paraibano que me ficou retinindo o juízo”.

9 A força da poesia. p. 3 10 A força da poesia p. 3 11 A força da poesia p. 5

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Antes de fazer poesia, surgiu a arte de declamar poesias e contar casos de outros

poetas e escritores, recitando os textos com a força e expressão. Como autêntico observador

do universo popular explorando esse universo, com certa dose de teatralidade e uma inflexão

na voz que lhe é peculiar, ele traz na memória os versos que declama com extrema segurança,

aquilo que flui naturalmente da boca do povo e que, com certa agilidade verbal, retrata o

dialeto popular, muito explorado por outros autores, que também utilizam as variantes

dialetais, os regionalismos para exprimir e expressar com muita graça o que o povo diz no

cotidiano, o que ele retrata em métrica e rima.12

Segundo Alberto da Cunha Lima(2004):

“A poesia quiriniana, requer a oralidade de um discurso cadenciado, mais violeiro e, por isso mais agressivo e ousado, pois ele usa e abusa, inclusive, de neologismos e regionalismos, como neste fragmento de “Sóbrio”:

Morando atualmente em Itabaiana, cidade próxima de João Pessoa, onde reside a

dezessete anos junto com sua esposa e quatro filhos, ele se diz arquiteto por profissão, poeta

por vocação, matuto por convicção, começou a escrever em 1996, publicando seu primeiro

livro, Paisagem do Interior, pelas Edições Bagaço, seguindo outros: Agruras da Lata

D’água, O Chapéu Mau e o Lobinho Vermelho,(infantis), Prosa Morena, Política de Pé

de Muro, A Folha de boldo, Notícias de Cachaceiros, obras que tem lhe rendido muita

respeitabilidade, no meio literário e assim, vai semeando nordestinidades, pelo Brasil afora,

lançando os seus livros, sua poesia permeada de declamações em tons suaves e engraçados,

dono de um estilo próprio, onde sempre procura retratar a esperteza do matuto sertanejo,

jogando com as palavras, acervo lingüístico do léxico nordestino, sem contudo, fugir do

lirismo poético.13

William Costa 14(2004)do jornal O NORTE fala sobre Jessier:

“(...)É impressionante o domínio que tem Jessier da linguagem coloquial do povo pobre que habita as cidades pés-de-serra desse imenso país chamado Sertão. O vocabulário do poeta é tão extenso quanto o Rio São Francisco. É uma cascata de palavras, rimadas em metros tradicionais, que, descrevendo paisagem e personagem, tudo bem embaladinho numa bem humorada crítica social, encanta e seduz a platéia”.

Fiel ao seu estilo, desde a sua primeira obra, vem fazendo uma espécie de etnografia

poética dos valores, costumes, objetos e, sobretudo, a linguagem do agreste e sertão

12 A força da poesia p. 3 13 A força da poesia p.3 14 A força da poesia p.5

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nordestinos. Muitos críticos e ensaístas atribuem-lhe definições filosóficas, afirmando que,

sua obra, além do valor estético, será, com certeza, um referencial, para as futuras gerações,

um legado que nem o avanço tecnológico que avança numa velocidade assustadora,

conseguirá destruir, de modo especial para aqueles que apreciam as coisas do Nordeste.

Bráulio Tavares15, (2004: 6)por ocasião do lançamento de Agruras da Lata D’água:

“Mestre Jessier: Ainda com a lata d’água na cabeça, tomo a pena para rascunhar uns rabiscos a respeito. A riqueza provavelmente inesgotável do seu vocabulário faz de você um poeta de imensa importância social, pela recuperação e vivificação de incontáveis palavras (arcaísmos, regionalismos etc) que bruxuleavam moribundas, prestes a extinguir-se por que ninguém as usava mais”.

Diz Jessier Quirino (2004):

“Desde o meu primeiro livro Paisagem do Interior, venho fazendo recitais em todo o Brasil para os mais diversos tipos de público. Vou a festivais de repentistas, a Universidades, hospitais, escolas públicas e privadas, a clubes, praça pública, teatros, grandes convenções, saletas e salões importantes. Já fui tema de vestibular. Tenho livros infantis adotados na rede de ensino de Pernambuco. A minha poesia foi tese de graduação em Ouro preto, já dividi projetos musicais com Luiz melodia e Chico César, tenho músicas gravadas por Xangai e Maciel Melo. Há uma espécie de unanimidade no gostar. Da criança que congela na minha frente ao adulto que ri e se emociona. Alguns mais intelectualizados fazem conceituações filosóficas, outros vêem um misto de erudição e regionalismo, outros fazem reflexões, outros sentem com profundidade a essência da poesia, outros exploram o lado didático da palavra, outros vêem graça e sarcasmo... Tenho recebido almofadas de sobrecu de pavão ”. leitor, palavras gasosas de críticos e estudiosos e o reconhecimento e carinho daqueles que são o elemento básico da minha poesia: o povo simples. Li certa vez uma citação de um pensador ou poeta “O grande poeta existe para mostrar ao homem pequeno como este é grande”. De posse desse pensamento e com uma veia artística voltada para o popular, tratei de versejar por esse caminho. De fato o homem pequeno, o desimportante, muitas vezes é de uma altura de dar neve na cabeça. Na minha prosa, na música, na poesia sempre retrato o vaqueiro, o retirante, o homem do campo,as prostitutas, o cangaceiro, o feirante, o trabalhador da roça... sempre procurando tirar doçura e graça onde só se ver amargor e tristeza.

E assim, é a poesia de Jessier Quirino, permeada de regionalismos, sem, contudo, cair

na vulgaridade. Apesar de ser uma pessoa culta, sabe valorizar a cultura popular, o linguajar

sertanejo, nordestino, dando a sua obra uma forma de recriar os fatos, usando de muita

expressividade.

15 A força da poesia p.6

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54

ACERVO FOTOGRÁFICO

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55

Foto registrada na revista A força da poesia

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56

Jessier Quirino e Flávio José

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57

Jessier e Dominguinhos

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58

Jessier com Vital Farias

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59

Jessier Quirino com Alceu Valença

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60

Jessier com Antonio Carlos Nóbrega

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61

Jessier apresentando recital com seu filho Victor

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CAPÍTULO IV

UM OLHAR SOBRE O FALAR REGIONAL EM AGRURAS DA LATA

D’ÁGUA

No propósito de realizar uma análise léxico-semântica com profundo rigor científico,

da obra de Jessier Quirino, realizamos inicialmente uma leitura aprofundada do corpus,

Agruras da lata d’água, ao mesmo tempo em que mantivemos contato com o referido autor,

com o objetivo de conhecer melhor a sua obra e produção e conseqüentemente proceder a

uma análise mais aprofundada de como fatores sociolingüísticos e culturais, entrelaçam-se

com o lingüístico, numa abordagem voltada para a linguagem regional/popular, bem presente

na obra, tomando como referência a realidade sociocultural do Nordeste, mais

especificamente do Sertão Paraibano, tomando como referência o estudo realizado pela

Professora Maria das Neves Alcântara de Pontes, em análise léxico-semântica de Menino de

Engenho, de José Lins do Rego.

Sendo o centro de nossa pesquisa, também levando em consideração a realidade

econômica, política, social e cultural do matuto nordestino, é nossa pretensão, tomando como

referencial o corpus, Agruras da lata d’água, mostrar como essa realidade é refletida no

linguajar cotidiano do sertanejo.

Estudos foram realizados no âmbito da Semântica, da Lexicologia e da Antropologia

Cultural, para que pudessem subsidiar a nossa pesquisa, tendo em vista a complexidade em

realizar um trabalho de investigação dessa natureza, colocando como cerne a realidade

lingüística do sertão nordestino.

Com a colaboração do já citado autor, fizemos um inventário de expressões regionais e

os neologismos presentes na obra, levando em consideração o contexto sociolingüístico de

cada poema analisado e assim, inferindo a devida significação regional.

A coleta de dados já mencionada será organizada em amostragem de termos

expressões populares e analisada à luz dos estudos dos modelos e autores presentes na obra da

professora, orientadora desse trabalho, Doutora Maria da Neves Alcântara de Pontes,

pesquisadora na linha geo- etnosociolingüística, para a qual nossa pesquisa será direcionada.

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63

Ressaltando, a tessitura semântica no que diz respeito aos regionalismos, a nossa

análise levará em consideração o matuto sertanejo com suas crenças, ideologias, hábitos,

atitudes e padrões de comportamento, que com certeza refletirão no seu linguajar,

percebendo-se assim, o elo entre o meio em que vive e o homem, sujeito e construtor de sua

história.

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64

DESCRIÇÃO DO CORPUS INVENTÁRIO BÁSICO TOMADO PARA ANÁLISE EM AGRURAS DA LATA

D’ÁGUA

VOCÁBULOS/EXPRESSÕES SIGNIFICAÇÃO CLASSIFICAÇÃO

ENTRE O PENTE E O REPENTE

(p.17)

não sou esses balai todo!

sou meio desleriado

minhas dúvidas são campestres

...na baixa das tristezais

os meus olhos são piscosos

alegria é manga-espada, é

sempre verde e amarela

É rima caçando rima feito fuxico

de galos.

Descontramantelo da vida

E nordestando o Nordeste

Não valho muita coisa

Desorientado,desligado,

desenxabido, sem graça.

Externa os sentimentos de

incertezas, que reflete uma

sensação de liberdade, causada

comparada ao ar bucólico.

Busca a poesia, mesmo em meio

as tristezas.

Olhos brilhantes de alegria, de

emoção.

O sentimento de alegria,

comparado ao doce sabor da

manga-espada, tipo de fruta

tropical, típica do Nordeste.

Ato de rimar comparado a briga de

galo.

Descontrole da vida,

desorganização, desmantelo.

Procurando conhecer melhor o

Nordeste, valorizar os seus

costumes, a sua cultura.

Regionalismo

Rgionalismo

Metáfora

Neologismo

Regionalismo

Metáfora

Comparação

Regionalismo

Neologismo

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65

Lembro o cangote caiado pelo

talco da saudade.

Nós colgate&palmolive por essa

vida marvada.

Termo popular do pescoço. Na

expressão, caiado quer dizer

branco, de talco, usado pelos

barbeiros

Vida cruel, cheia de dureza,

maldade.

Regionalismo/metáfora

Regionalismo

AGRURAS DA LATA D’ÁGUA

(p.45)

Eu que fui enjeitada

As juntas enferrujadas

Os beiços não resistiram...

Já quase toda enfadada

Rejeitada, abandonada, desprezada

Ossos doloridos, com reumatismo,

refere-se a lata enferrujada,

desgastada.

Forma popular de lábios.

Refere-se a lata, que já está

cansada.

Termo popular

Expressão popular

Termo popular

Termo popular

E assim, desconchavada

Me amassava as beiradas

Expressão tica da fala,, com

sentido de desajeitada,

descombinada.

Margens, lados da lata, beiras.

Termo popular

Expressão popular

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66

QUATRO AVE-MARIA BEM

CHEIA DE GRAÇA (p.47)

De sofrer uma cambrainha

Ferroada de lacrau

Dum sujeito bexigoso

Duma tosse igrejeira

Dum trupicão de ladeira

Duma laigada de mão

Da saúde canigada

Dum vira-lata ispritado

Picada de mangagá

De briga de má-querença

Dum jogo marradiado

Que Zé meu abaixe o facho

Disgaviando o assunto

Diminutivo de câimbra, contração

dolorosa dos músculos.

Picada de uma espécie de

escorpião

Pessoa cheia de manchas, pintas

Tosse que fica intensa quando se

está na Igreja..

Trupicão significa queda, perder o

equilíbrio,tropeção, topada na

ladeira

Tapa que se dá no rosto de

alguém.

Pouca saúde, saúde ameaçada.

Tipo de cachorro raivoso,

zangado.

Ferroada de inseto, que produz

calafrios e febre, tipo de abelhas

sociais do gênero bombus.

Confusão entre pessoas, bate-boca

Jogo cheio de confusão

Significa aquietar-se, deixar de

fazer alguma coisa, acalmar-se

Mudar, fugir de assunto.

Diminutivo

Expressão popular

Expressão popular

Expressão popular

Expressão popular

Expressão popular

Regionalismo

Expressão popular

Expressão regional

Regionalismo

Regionalismo

Expressão popular

Neologismo

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67

QUALQUER COISA A VER

COM ROÇADO (p.50)

Matuto caririzeiro

Peixeira cortando vento

Um quixó pegando tejo

Um punaré amoitado

Caju novo maturi

Um frango gogó-sola

Cancela na rangedeira

Fumo cortado a quicé

Menino tamãe de nada

Calça matando marreca

Resina de catingueira

Desinteirando o inteiro

Matuto típico do cariri, região

paraibana

Espécie de faca, lançada no ar.

Espécie de armadilha, colocada

num buraco para prender animais,

como o tejo, animal roedor, que

vive em buracos.

Espécie de rato, de cor

avermelhada, que vive no mato,

debaixo das pedras, das moitas e

buracos. Amoitado significa

escondido nas moitas.

Broto do caju.

Raça de frango com o pescoço

sem penas, pelado

Espécie de porteira, que ao ser

aberta, emite um rangido.

Quicé significa ponta de faca

velha, gasta, utilizada para cortar

fumo, em cima da mesa.

De tamanho pequeno.

Calça mais curta do que o normal.

Líquido extraído da catingueira,

planta típica da caatinga.

Partindo o que está inteiro,

cortando em pedaços.

Expressão popular

Metáfora

Termos populares

Expressão popular

Regionalismo

Regionalismo

Regionalismo

Regionalismo

Regionalismo

Expressão popular

Neologismo

Regionalismo

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68

Vaqueiro astuto, tinhoso

Cheio de nó pelas costas

Fala pelos cotovelos

Maniva de macaxeira

Um lerão bem aguado

Catemba velha de coco

Brocoió destrangolado

Um caboco atoleiamdo

Nas esquinas garranchentas

Vaqueiro, figura típica do

Nordeste, astuto e tinhoso significa

esperto, sutil, ardiloso, teimoso e

pertinaz.

Cheio de artimanhas.

Fala muito, não pára de falar.

Caule da mandioca ou da

macaxeira.

Significa amontoado de terra, entre

dois sulcos, por onde a água

escorre, para aguar a plantação.

Espécie de casca que se desprende

do coqueiro, sendo de muita

utilidade para o homem, inclusive

utilizada para o artesanato

regional.

Matuto desajeitado, desengonçado

Homem típico do sertão, roceiro

matuto, resultante do branco com

índio. Atoleimado é corruptela de

retardado.

Expressão popular

Expressão popular Regionalismo Regionalismo Regionalismo Regionalismo Regionalismo

BUQUÊ DO MATO (p.57)

Tem fulô de manacá

Talo de marmeleiro

Flor de manacá, planta medicinal,

cujas flores são grandes e

ornamentais, de cor esbranquiçada,

gerando um belo efeito quando

numerosas.

Caule do marmeleiro, planta típica

do sertão nordestino.

Expressão popular

Regionalismo

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69

Uns dois dedinhos de prosa

Lindosos brincos que brinca

Sagradice de desejo

Dexovê de qual o tipo

Um pó de arroz a voar

Goodbye de mentirinha

Que loirejam qualquer mar

O gráfico de um olhar

Uma conversa breve, curta.

Bonitos, formosos

Desejo de ser sagrado.

Forma popular de deixe eu ver.

Cosmético usado no rosto, para

maquiagem.

Diminutivo de mentira

Que douram qualquer mar.

Regionalismo

Neologismo

Neologismo

Expressão popular

Expressão popular

Diminutivo

Neologismo

DELITO CHUMBREGADOR

É um coice nos incômodo

É um ligar de motor

É um avôo de condor

É injeção de fogueira

É gá-gá-gá de gagueira

É lua no meio-dia

É verso, é poesia

É alegria, é frescor

É colapso intupidor

É dismai, é faniquito

É mei camim andado

Delito chumbregador

Ocorrências de

anáforas e metáforas

QUATRO PERNAS

PENDURADA NA PRECE DA

SEDUÇÃO (p.59)

Finalmente a pidança

Botemo pra render

E tome sussurração

Sussurro velorioso

Falei dençanças de amor

Minha manteiguinha turvo

Meu vidro de lambedor

Ato de pedir

Apurar os fatos

Sussurro, suspiros, murmúrio

Murmúrio típico de velórios

Dengo, jeito manso de falar, dizer

palavras amorosas.

Mel fabricado com raízes e cascas

Termo popular

Expressão popular

Regionalismo

Neologismo

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de ervas e açúcar.

QUATRO PERNA

PENDURADA NA PRECE DA

SEDUÇÃO (p.59)

Luarando a imensidão

Duas vidas emparedada

Lua iluminando o universo

Viver juntos.

Neologismo

Neologismo

BONITO É VER O BONITO

(p.60)

E o milhará penduando

E o azul fino dos olhos

É tudo parede-meia

A vaia come no centro

No tempo da inverneira

Pra tomar um negocim

Uma conversa de brebote

No roçado da Paixão

Cheirar no toitiço dela

Cochichar uma gracinha

Fazer sala na cozinha

De algodãozinho na crista

Plantação de milho soltando

pendão

Azul intenso, claro

Paredes típicas das casa do sertão

nordestino, que não chegam até o

teto.

Acontecem muitas vaias.

Tempo das chuvas no sertão.tomar

um gole de bebida, uma dose.

Conversa à toa, que não leva a

nada.

No auge da paixão

No pescoço dela.

Dizer em voz baixa um gracejo.

Receber acolher uma visita na

cozinha.

Diminutivo de algodão

Regionalismo

Metáfora

Regionalismo

Regionalismo

Termo popular

Diminutivo

Regionalismo

Metáfora

Regionalismo

Diminutivo

Perífrase

Diminutivo

O NÃO DO AMOR (p.62)

esqueletou meu juízo

uma fofinha malvada

do corpo da caboquinha

Contrariou, pertubou.

Diminutivo de fofa, referindo a

alguém

Termo que se refere à moça do

sertão.

Regionalismo

Diminutivo

Diminutivo

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Com varinha de condão

Dimunitivo de vara Diminutivo

HEM HEM QUE COISA MAIS

LINDA (p.64)

Sandalinha lepo-lepo

Vestidinho bem folote

Dou-lhe um chegue na cintura

Taco um cheiro no cangote

Morenoso e jambeado

De amor cheim de mote

Ela vai se legalsando

Dá a impressão que o mundo tá na

hora do recreio

Que o pingue – pongue da vida

Esqueceu o desenfreio

Eu nela me esparadrapo

Ganho um beijo assaborado

Calmoso e alegrador

Sandálias de couro que ao andar

faz um barulho característico.

Vestido pequeno, cheio de graça,

florido.

Dou-lhe um aperto na cintura, um

abraço apertado.

Dou um cheiro no pescoço.

Cor morena, da cor de jambo.

Amor cantando em mote. Forma

característica dos repentistas

fazerem versos.

Vai ficando boa, legal.

Mundo feliz, alegre, de

brincadeiras.

Jogo da vida, afazeres da vida.

Eu nela me apego, me grudo.

Beijo saboroso.

Calmo, tranqüilo, que causa

alegria.

Expressão popular

Regionalismo

Expressão popular

Expressão popular

Expressão popular

Diminutivo

Neologismo

Metáfora

Metáfora

Neologismo

Neologismo

Neologismo

UM VARAL EMPESTADO DE

CALCINHA AVIVENTA O

RESPIRO DA PAIXÃO (p.66)

Quando ela me faz uma cosquinha

E navego um beijo apaixonado

Silhueta da minha malandrinha

Aumenta o respiro e o doidejo

Mandacaru eclipsando o luar

Diminutivo popular de cócegas.

Dou um beijo

Mandacaru fazendo sombra para a

Diminutivo

Metáfora

Diminutivo

Neologismo

Neologismo

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Estradando nas molas do molejo

lua.

Caminhando

Neologismo

PEDAÇODE MAU CAMINHO

(p.67)

Menina propagandeira

Tu tens o corpo aluado

Tu sabes calanguear

Te ensinava a cartilhinha

Pra tu ser a primerinha

Menina faladeira

Corpo bem feito

Tu sabes requebrar, andar

balançando o corpo.

Cartilha pequena

Diminutivo de primeira

Regionalismo

Regionalismo

Regionalismo

Diminutivo

Diminutivo

UMA PAIXÃO DE GURI (p.68)

Tive febre de amor

Quarenta grau de saudade

Era como se tu fosse

Um prato de arroz doce

Sofreu por amor

Muita saudade

Termo comparativo, em que a

roupa branca, pura,da primeira

comunhão

Metáfora

Metáfora

Comparação

NORDESTE DESAJUDADO

(p.71)

Que eu jangadeio com meu

versejar

Musando uma musa que já deu

nos calo

Nos antigamente daquele costado

Com a sonolença dum bucho

armoçado

Que a lágrima era doce

Se embrenha no mato sofrido de

amor

Caminho, navego com meu jeito

de fazer versos.

Foi embora

Nos tempos antigos.

Com o sono que sente após o

almoço

Lágrima de um choro consolado

Meter-se enconder-se, no

sofrimento do amor.

Neologismo

Regionalismo

Neologismo

Termos regionais

Metáfora

Metáfora

SOU DOS BARES O MENOR

(p.78)

Sou buteco, sou latada

Desencheiando as garrafas

Me segredam o coração

Bar pequeno, onde se vende pinga.

Esvaziando as garrafas

Me fazem confidências

Regionalismo

Neologismo

Neologismo

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A talagada ei arbitro

Birinaite e biridia

Olha a cana de pertinho

Analisa o colarinho

Mode ver se ta no grau

Porção, golada.

Dose de cachaça ou outra bebida.

Passa a língua nas beiradas do

copo de cachaça para sentir mo

seu sabor.

Regionalismo

Termo popular

Expressão popular

NO DIA QUE EU ME ARRETAR

MATO ELA DE CIÚME (p.85)

Caboco distiorado

Ficador do que é alheio

Cabra do cambite fino

Lundunzento, catingueiro

Bajulador, enredeiro

Sovacudo e indecente

Tapiador de inocente

Caboclo desmantelado,

desorientado.

Ladrão, furtador, gatuno.

Homem das pernas finas

Enjoado, birrento, fedorento.

Adulador, fofoqueiro

Refere-se aos sovacos, axilas, sem

decência.

Enganador, que usa de má fé para

com as pessoas ingênuas.

Expressão popular

Neologismo

Regionalismo

Termos populares

Termos populares

Regionalismo

Neologismo

NEM TODO DEDO SE D (p. 90)

Nem toda ponta é suvela

Nem todo povo é povinho

Nem todo dedo é mindinho

Nem todo pé é rapado

Nem toda eira é sem beira

Nem toda erva é cidreira

Nem toda trave é poleiro

Nem todo fogo é de palha

Objeto pontiagudo que o sapateiro

utiliza para furar o couro.

Expressão popular que se refere a

quem não tem nada.

Ocorrência de anáforas

Expressão popular

O DIA EM QUE LAMPIÃO

CHOROU (p.92)

Lampião pequenininho

Brincando com Corisquinho

Diminutivo de pequeno

Diminutivo de Corisco, cabra de

Lampião.

Diminutivo

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74

AUDIÊNCIA DE APARTAÇÃO

(p.105)

Pra evitar remunheta

Um zambê ou latumia

Lá vem ela com chacoca

Com quiprocó da mulesta

Pois mulher é feito índio

Se pinta quando quer briga

Birrento do istopor

O gato quando se roça

Macio feito um novelo

Pra evitar latumia pra toda

famiação

Para evitar confusão

Gritaria, barulho, reclamação.

Mangação,.

Briga, confusão

Expressão comparativo da mulher

quando dominada pela raiva,

maquia-se, assemelhando-se ao

índio que pinta o rosto, segundo os

seus costumes, quando vai fazer

guerra.

Teimoso, amuado.

Compara feita entre o gato por

possuir um pelo macio, ao novelo

de lã que também se caracteriza

por sua maciez.

Pessoas da família

Termo regional

Regionalismo

Regionalismo

Expressão popular

Expressão popular

Comparação

Regionalismo

Comparação

Expressão popular

* Há pouca ocorrência de polissemia e perífrases, sendo portanto, a sua e descrição realizada

na própria análise.

* Quanto aos ditos populares, foram identificados em apenas um poema, sendo descritos na

análise do referido poema.

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ANÁLISE DO CORPUS

METÁFORAS

O estudo das metáforas tem sido motivo de atenção de muitos estudiosos da

linguagem desde a Antigüidade clássica. Aristóteles em sua Poética apresentava propostas

importantes que merecem nossa atenção.

Lakoff e Johnson argumentam sobre a noção de metáfora, não somente na linguagem,

mas também no pensamento humano.

Várias correntes teóricas vêm se dedicando ultimamente ao estudo das metáforas em

uso, como Cameron16 (2004)que em 1999 traça um perfil de metáforas no mundo

contemporâneo.

Metáfora é uma expressão lingüística nova, onde uma ou mais palavras são usadas

fora de seu significado normal, convencional para expressar um conceito semelhante.

Vários analistas com base nas teorias de Cameron17(2004), partem de uma abordagem

sócio-construtivista que leva em consideração o uso da língua, partindo da identificação das

metáforas empregadas em situação reais da fala/escrita.

Há uma necessidade, porém de pesquisarmos a língua em uso, mostrando a interação

entre o cognitivo e o social, o que nos permite abordar a linguagem sob uma ótica que nos

retrata toda a sua riqueza de formulações sócio-históricas.

Aristóteles também contribuiu para uma definição de agudeza como condição máxima

de materialização poética, somente conseguida pelo efeito das metáforas.

Por meio do modelo de agudeza a construção poética passa a ser exemplo de uma

metáfora bem construída: é um recurso de ornamentação poética, cuja tarefa é descobrir os

significados, pois o papel é valorizar a significação para o leitor.

16 Lendo metáforas poéticas. 17 Lendo metáforas poéticas.

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Na linguagem poética não há preocupação em explicitar o significado preciso da

metáfora, pois a beleza da metáfora na poética prende-se a originalidade, ultrapassando os

limites do código lingüístico.

A metáfora é definida por Aristóteles como:

“Aquilo que consiste em transportar para uma coisa, o nome de outra”.

Ela vai além de uma simples comparação. Mattoso Câmara afirma(1985:)

É a transferência de um termo para um âmbito de significação que não é o seu.. Não se fundamenta numa relação objetiva, mas sim numa relação toda subjetiva”.

Sendo assim, a metáfora caracteriza-se pelo o uso de uma palavra com um sentido

transferido de outra, em razão da analogia estabelecida pela criatividade e subjetividade.

É um recurso estilístico bastante utilizado pelos poetas, inferindo assim, um

significado semântico às palavras de maneira artística e criativa.

No corpus em estudo, observamos a presença constante de metáforas nos poemas, as

quais analisaremos, identificando a sua carga semântica.

“Alegria é manga-espada, é sempre verde e amarela”. (p.17)

O autor utilizando a metáfora conceitual expressa o sentimento de alegria comparado

ao sabor de uma manga, fruta tropical, saborosa, colorida, típica do Nordeste. As cores verde

e amarela são símbolos do estado de espírito em que se encontra o autor. Ele remete para o

seu estado de espírito, o doce sabor da manga. É assim denominada, por ter um formato

comprido com a aparência de uma espada.

“Minhas dúvidas são campestres”...(p.17)

O autor no exemplo citado, externa, os seus sentimentos, em relação às dívidas e

incertezas, revestindo de um ar bucólico o seu anseio de liberdade e sonho.

“Sou o capim de cheiro que vem do buquê do mato”. (p.18)

O capim de cheiro tem um odor bastante agradável, de frescor, de mato, sendo esse

perfume remetido para a sensação da alegria, de estar de bem com a vida, retratando assim, o

frescor saudável do campo.

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“Peixeira cortando vento”.(p.18)

Faca peixeira, lançada no ar, num gesto como se estivesse cortando o ar.

“Pensamento sertanejo orquestrando o amém da hora santa”...(p.52)

Os sapos as rãs e as jias, ao anoitecer emitem sons, que o autor compara a uma

orquestra, executando a ave-maria ao entardecer, no crepúsculo nordestino sertanejo.

“Dá a impressão que o mundo tá na hora do recreio”.(p.64)

Hora do recreio, é hora de brincadeira, de descanso das tarefas. O autor infere aí uma

visão de um mundo, sorridente, alegre, de brincadeiras, sem preocupações.

“Que o pingue-pongue da vida esqueceu desenfreio”(p.64)

O pingue-pongue é um jogo em que a bolinha vai e volta entre os jogadores. Assim, é

o vai-vem da vida, os afazeres, as lutas do cotidiano, fazendo esquecer as amarguras, as

tristezas.

É de fundamental importância, observar e discutir como se processa a leitura de

metáforas nos textos poéticos, pois a poesia é um tipo de discurso apropriado para a

observação dos mecanismos da leitura metafórica, sendo o texto em verso, onde encontramos

com mais freqüência a linguagem metafórica.

A interpretação de poesias é um ato discursivo que pressupõe trabalho elaborativo,

fundado em relações inferenciais e cognitivas a partir da linguagem poética.

Enfocada como um fenômeno cognitivo, a metáfora requer elaboração conceptual e/ou

imagética como uma das condições para a construção da expressão de significados nem

sempre acessíveis imediatamente aos seus usuários. Saber operar metáforas poéticas

possibilita estratégias cognitivas.

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COMPARAÇÕES

A comparação é o processo pelo qual se enfatiza o que existe de comum entre dois

elementos, não se limita apenas à fala, mas também à escrita ocasionando um efeito coloquial.

Na obra Agruras da lata d’água de Jessier Quirino, constatamos algumas

ocorrências quanto à comparação, que foram analisadas segundo os parâmetros léxico-

semânticos, identificando assim, a preferência do autor em representar a oralidade.

O lingüista Mattoso Câmara Jr. (1985: 75) vê a comparação como:

“Termo que em gramática descritiva define uma construção sintática de dois membros em que um é posto em cotejo com o outro, definindo-se em função do que se sabe desse outro. Estabeleceu-se um sintagma comparativo em que ao determinado corresponde o comparado e ao determinante, o comparante”.

É nossa intenção, identificarmos as comparações presentes nos poemas, analisando-os

a partir da ótica léxico-semântica, enfatizando os traços de oralidade aí presentes, sem,

contudo, nos preocuparmos em estabelecer as diferenças entre a comparação e a metáfora,

muitas vezes confundidas.

As comparações encontradas em Agruras da lata d’água, refletem a visão de mundo

do autor, suas experiências, suas relações com o mundo exterior, cotejadas no ato de fazer

versos, buscando as significações do mundo real, concreto, trazendo para o universo abstrato

da poesia.

“É rima caçando rima feito fuxico de galos”...(p. 17)

Muito presente em seus versos, o autor lança mão desse recurso, remetendo para os

versos escritos, uma prática da oralidade. A comparação estabelecida nesses versos faz um

confronto com o ato de rimar, construir rimas, para o imaginário, relacionando com um fato

do cotidiano que é o fuxico dos galos.

Nesse exemplo o autor parte do abstrato, ato de caçar rimas, elemento comparado, a

uma ação concreta, o fuxico dos galos, elemento comparante.

“Roquete é feito feijãozim, quando esquenta dá o bicho”..(p. 38)

Temos nessa comparação um exemplo de reprodução da oralidade, refletindo aí a

reprodução do linguajar do homem do sertão, construções bem presentes na língua falada, do

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meio rural, que procura no seu cotidiano comunicar-se utilizando os recursos de oralidade de

que ele dispõe, a partir das suas experiências e vivências de mundo, o autor utiliza esse

recurso para enfatizar, enriquecer e retratar esse tipo de linguagem. Na palavra feijãozim,

observamos o apagamento do sufixo diminutivo inho, característica do falar regional.

Nessa comparação, o termo comparado, indivíduo apelidado de Roquete, estabelece

uma relação de associação com o elemento comparante, o feijão.

“Mais parecendo uma miragem”...(p.58)

No exemplo citado, o elemento comparativo, a mulher, situa-se no universo do

concreto, ser humano, fêmea, ao passo que o comparante, uma miragem pertencente ao plano

do espiritual, aparição, coisa do outro mundo, efeito óptico.

Nesse contexto, a mulher, fêmea, é retratada como um ser dotado de muitas qualidades

físicas, exaltadas pelo autor num linguajar típico, regional.

Nesse caso, em que a mulher é comparada a uma miragem, ocorre uma comparação,

na qual o elemento comparante eleva o termo comparado.

“Era como se tu fosse um prato de arroz doce”...(p.68)

O exemplo citado, um caso típico de comparação de um elemento de bastante

expressividade, peculiar da narrativa oral.

O autor utiliza-se de elementos da variedade regional, em que o termo comparado, a

lembrança de um amor de infância, é comparado a arroz doce, comida típica regional do

sertão nordestino, feita com arroz, coco, leite e açúcar.

A comparação dá-se pela lembrança da menina, paixão da infância, no dia da primeira

comunhão, com seu vestido branco, suave, comparado à brancura, suavidade e ao sabor

adocicado do arroz doce.

Para externar o arrebatamento da paixão, o autor faz uso do concreto remetendo para o

plano emocional dos sentimentos.

“Mulher é como índio se pinta quando quer briga”... (p. 105)

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O autor evidencia nessa comparação um fato que foge do cotidiano sertanejo, mas vai

buscar nos costumes de outros povos, os índios, qualidades que lhe são inerentes,

configurando elementos históricos para exprimir, nesse universo semântico, o estado

emocional da mulher, retratada como um ser humano, que quando dominada pela raiva, tem

uma maneira peculiar de externar esse sentimento pintando o rosto, daí a relação comparativa

com o índio que, ao preparar-se para as guerras, pinta todo o corpo, num ritual bastante

expressivo das suas crenças, costumes, bem arraigados ainda, nas tribos indígenas, que, ainda

hoje resistem à extinção. No citado exemplo, há o emprego do conectivo como, que reflete as

comparações ao nível da fala, destacando assim, o que de comum existe entre os dois

elementos.

“O gato quando se roça macio feito um novelo”...(p.106)

No exemplo destacado, a comparação é feita entre elementos de natureza concreta,

real. O gato, animal felino, esperto, de uma mansidão, mas que tem o pelo macio, termo

comparado a um novelo de lã, termo comparante, que possui características semelhantes de

suavidade, maciez, que gosta de roçar seus pelos, nas pessoas e objetos.

Há nesse processo de comparação uma expressividade que se sobrepõe ao plano

lingüístico, influenciado por elementos culturais, sociais e regionais, que se manifestam

através da imaginação criadora do autor.

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DIMINUTIVOS

Os diminutivos comumente usados na língua falada, muitas vezes, também são

utilizados como um recurso estilístico pelos poetas nos textos em versos.

Jessier Quirino em Agruras da lata d’água emprega nos seus versos alguns

diminutivos, inferindo assim uma conotação de expressividade e afetividade ou até de

depreciação.

Na língua as palavras sofrem modificações que são os mecanismos de flexão para

exprimir atenuação ou modificação no seu significado. Essas modificações no grau acontecem

através do processo de derivação sufixal que no caso, dos diminutivos, apresentam uma

dimensão de diminuição em relação ao estado normal.

Na Língua portuguesa, para realização dos diminutivos, temos dois sufixos

formadores:

Inho (o,a) vem do latim, usado amplamente na língua.

It (o,a) também origina-se do latim e o seu uso é bastante limitado.

Os diminutivos por vezes, nos remetem a uma idéia afetiva, ou criativa das coisas, dos

objetos, dos sentimentos.

Analisaremos alguns diminutivos identificados no corpus em estudo, comprovando

assim, o uso freqüente da linguagem regional nos poemas.

... de sofrer uma cambrainha... (p.47)

Diminutivo de câimbra que significa uma contração dolorosa dos músculos.

Esse exemplo reflete o pedido a São Jerônimo de que nada lhe aconteça e dentre

muitas outras coisas ruins, uma seja a de sofrer uma cabrainha, que aparece com o sentido de

pequenez, o que nem sempre dá idéia de anormalidade.

[...] um feijãozim mulatinho (p.50)

Feijão mulatinho é um tipo característico do feijão cultivado no sertão e que dentre as

muitas coisas boas, desfrutadas pelos os que moram no roçado, uma delas é ter na mesa esse

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tipo de comida típica do Nordeste. O feijão mulatinho dentre outros tipos, é cultivado em

terrenos arenosos, apropriados para o cultivo desse alimento, considerado iguaria, quando

preparado de diversas formas, como o tutu, o arrumadinho, tornando-se o prato principal do

sertanejo nordestino.

O diminutivo aí apresentado revela certa carga semântica de afetividade.

“Do doidim que traz água na ancoreta”... (p.50)

“E o ceguinho fazendo o ponteado”... (p. 50)

Em pensamento sertanejo, poema que reflete o profundo conhecimento do autor em

relação das coisas do sertão, ele vai descrevendo lugares, objetos, fatos e pessoas que fazem

parte desse cenário. No meio de todos esses elementos, ele apresenta o doidim que de início

pode ser interpretado como um significado pejorativo, no entanto o termo está posto nos

versos com um sentido bem característico do linguajar sertanejo.

“Do espelhinho, missal, de terço e santo”... (p.52)

“Da banquinho ao lado da maleta”...(p. 52)

“Depois dum almocim bem palitado”...(p.

Esses exemplos vêm reforçar o tom de afetividade, que reflete a emoção, a

sensibilidade do autor ao descrever em versos o que lhe vem na memória das coisas do sertão.

Em almocim, identificamos mais um caso de questão fonética, o apagamento do sufixo

diminutivo inho.

“E basta o vento assoprar uns dois dedinhos de vento”...(p.

Na metáfora presente no texto, permeada de subjetividade, percebe-se aí uma intensa

carga semântica afetiva, conferida pela fértil imaginação do autor.

“good bye de mentirinha”...(p.57)

“pra tomar um negocim”...(p. 60)

Nesses casos de diminutivos, além da idéia de pequenez, também estão imbuídos de

outras significações. No primeiro exemplo o termo mentirinha é suavizado, assumindo um

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tom carinhoso. No termo negocim, escrito tal como é utilizado na linguagem falada, o autor

confere um sentido de pequena quantidade, um gole de bebida, assumindo um caráter

pejorativo, além de uma fonética própria do falar regional, que realiza os fonemas omitindo o

sufixo inho, típico desse linguajar.

Através da análise realizada, observamos que os exemplos citados de diminutivos,

permeiam os poemas de intensa expressividade, característica própria do texto literário,

enfatizando o uso de expressões populares, nas quais estão inseridos os diminutivos, recurso

estilístico bastante utilizado em textos dessa natureza, utilizados para inferir uma carga

semântica do aspecto popular regional.

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POLISSEMIA

Uma mesma palavra pode ter vários significados, a esse fenômeno chamamos de

polissemia.

Polissemia é uma propriedade fundamental das línguas humanas, que sem a sua

existência, jamais funcionariam com eficácia.

É impossível, numa língua, nomear diferentemente cada coisa, inclusive aquelas que

não conhecemos. Ao nos depararmos com um objeto desconhecido, teríamos grandes

dificuldades para denominá-lo.

Dessa forma, entendemos que isso dificultaria a nossa compreensão de mundo, pois,

ao nos deparamos com um objeto novo, ou um animal desconhecido, é de praxe procurar

reconhece-lo e enquadrá-lo no acervo lexical que retivemos na memória.

A polissemia oportuniza às línguas a possibilidade de flexibilização para que elas

possam externarem todos os inumeráveis aspectos da realidade.

São raros os termos não polissêmicos, no léxico, entre eles podemos citar as criações

artificiais e os termos técnicos. Consequentemente, no léxico a maioria das palavras são

polissêmicas.

Em Agruras da lata d’água encontramos casos de polissemia, em relação a palavra

pé,os quais analisaremos a seguir:

“num pé de parede”...

“é um pé desmentido”...

“no pé de goiaba”...

“é um pé de pimenta”...

A palavra pé no poema É MANGA CAÍDA É BAGAÇO CHUPADO (p.115), assume

uma condição polissêmica, isto de acordo com a circunstância em que aparecem significados

diferentes.

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No primeiro caso, pé de parede é atribuído a um recanto da parede, já pé desmentido

nos remete para o pé, membro que se localiza nas extremidades dos membros inferiores, do

corpo humano, sendo que pé desmentido é o pé que sofre uma contusão, uma torção. No pé

de goiaba, nos remete para a árvore que dá o fruto da goiaba, grude no pé, significa sujeira,

pé que não foi lavado e pé de pimenta, árvore da qual brota a pimenta.

“Tristezou num pé de pau”...(p.)

Sendo assim, afirmamos ser a polissemia um processo adotado pelos lingüistas,

sabendo-se que, numa língua dinâmica como a nossa, sobretudo a língua falada, ou na

linguagem literária, torna-se difícil saber onde termina um item léxico e onde começa outro,

sendo a polissemia um recurso importante para o estudo das línguas.

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TERMOS E EXPRESSÕES POPULARES

Nosso propósito é realizar uma análise semântica das expressões populares utilizadas

por Jessier Quirino em Agruras da lata d’água, levando em consideração a linguagem

utilizada permeada de oralidade, sem perder de vista a questão sociolingüística, aliada a um

estudo do léxico inserido num contexto social e cultural.

O léxico é responsável pela evolução da língua na comunidade, pois é ele que melhor

reflete a realidade sociocultural, daí porque encontramos dificuldades para realizarmos um

estudo dessa natureza, sendo necessário levar em consideração as questões sociais, culturais,

políticas e regionais.

Jessier apresenta um estilo bem peculiar nos seus versos, carregados de um

vocabulário bem expressivo, típico do sertão, que foi sendo compilado nas suas pesquisas, a

través das suas andanças pelo o interior, nas feiras livres e nas conversas com as pessoas,

observando os tipos humanos, os fatos, os objetos e, sobretudo o jeito de falar, dispensando

grande atenção sobretudo, nos regionalismos aí encontrados.

Eis aí um perfil léxico-semântico do linguajar regional da obra, que se inserindo no

processo comunicativo, vem conferir uma visão antropocultural dos falares regionais, termos

e expressões populares.

A nossa análise será realizada a partir de uma amostragem das expressões

identificadas nos diversos poemas que compõem a obra em estudo.

“Sou meio desleriado”... (p.17)

Termo peculiar da língua falada, constituindo-se como uma expressão não encontrada

em dicionários, significa nesse contexto que ele é meio desligado, sem graça, desenxabido.

“Descontramantelo da vida”...(p.17)

Expressão não dicionarizada, que significa descontrole, desorganização, vida

desmantelada.

“Juntas enferrujadas”...(p. 45)

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Refere-se à lata d’água que se queixa das funções que é levada a assumir. Termo

dicionarizado, que no sentido literal quer dizer ossos doloridos, com reumatismo. No

contexto, assume o significado de lata enferrujada, desgastada.

“e assim desconchavada”... (p. 45)

O significado que o termo assume, no poema é típico da língua falada, bem presente

em Agruras da lata d’água, no sentido de descombinada, desajeitada.

“Um trupicão de ladeira”...(p. 47)

Termo dicionarizado como tropeção, que significa ato de tropeçar, perder o equilíbrio,

topada.

No contexto nos remete para um pedido ao santo para livrar de uma topada na ladeira.

“Duma laigada de mão”...(p.47)

Expressão bem popular, que se encontra no texto com o sentido de um tapa, que se dá

com a mão em outra pessoa. O termo reflete a fala, na qual o matuto nordestino, subsitui o

fonema r, por um ditongo.

“Dum vira-lata ispritado”...(p.48)

O termo tido como coloquial, refere-se a um tipo de cahorro nervoso, aperriado, bravo,

zangado.

“picada de mangagá”... (p. 48)

O termo encontrado no Dicionário Lingüístico-literário de termos regionais populares

de Maria das Neves Alcântara de Pontes, significa picada de vespa, inseto cuja mordedura

produz calafrios e febre. Designação das abelhas sociais do gênero bombus.

“Que Zé meu abaixe o facho”...(p.48)

Expressão típica do sertão, bastante utilizada pelo matuto sertanejo, significando

aclamar-se, deixar de fazer determinada coisa, aquietar-se. Expressão típica utilizada pelas

mães, ao dirigir-se às filhas, para conter o seu assanhamento.

“Um quixó pegando tejo” (p. 50)

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Quixó, palavra dicionarizada, que significa armadilha, aratca, colocada em um buraco

para pegar pequenos animais como o preá, pequeno animal roedor cavídeo, que vive em

buracos.

“Um punaré amoitado”...(p.50)

Palavra dicionarizada, significando espécie de rato, de cor avermelhada, que vive no

mato, debaixo das pedras, moitas de cactáceos e buracos nos barrancos, daí a expressão

amoitado, no sentido de ficar escondido nas moitas.

“Fumo cortado a quicé”...(pág.50)

Quicé, um termo popular que designa faca de ponta, velha, muito gasta, por ter sido

amolada muitas vezes. Muita usada pelo matuto, para cortar fumo de rolo em cima de uma

mesa e enrolar o cigarro.

“Cancela na rangedeira”... (p. 50)

O termo constitui um regionalismo, cuja significação é uma porteira que ao ser aberta,

emite um ruído rangedor. O ranger da cancela, tem sido inspiração para muitos poetas e

repentistas da região.

“Calça matando marreca”...(p.50)

Constitui um regionalismo do linguajar popular, não dicionarizado. Nesse contexto,

tem o sentido de calça, vestimenta mais curta do que o normal, num tamanho menor do que

quem a usa.

“Resina de catingueira”...(p.50)

A expressão corresponde ao líquido viscoso, extraído das plantas, no exemplo citado,

da catingueira, arbusto da família das leguminosas, planta típica da caatinga do Nordeste que,

num determinado período do ano, floresce e suas flores deixam além de um colorido, um

gostoso aroma do campo.

“Vaqueiro astuto, tinhoso”... (p.51)

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O vaqueiro é uma figura tradicional do Nordeste brasileiro, que conduz o gado pela

caatinga. No exemplo citado, lhe são atribuídos alguns adjetivos: astuto e tinhoso, que

significam respectivamente, esperto, sutil, ardiloso, teimoso e pertinaz.

“Um lerão bem aguado”... (p.51)

Termo dicionarizado, corruptela de leirão, que significa amontoado de terra, entre dois

sulcos, deixando entre cada um, rego, por onde a água vai escorrer, para plantação de batata,

macaxeira, inhame. Lerão bem aguado, quer dizer a água com a qual os sucos são molhados,

escorrendo e drenando a terra.

Catemba velha de coco”...(p.51)

A expressão citada, é comumente usada na fraseologia popular, não encontrada nos

dicionários, corresponde a uma espécie de casca que se desprende do coqueiro, sendo de

muita utilidade para o homem do Nordeste, principalmente, para o artesanato regional.

“Brocoió destrangolado”...(51)

Expressão tipicamente nordestina, só utilizada na fala, tem o sentido de matuto

desajeitado. Pessoa que se deixa enganar, desengonçado.

“Caboco atoleimado”... (p.51)

Variante de caboclo, o termo caboco faz referência ao homem do sertão de cor

morena, roceiro matuto, resultante da mistura do branco com o índio, interiorano analfabeto,

sendo que atoleimado é corruptela de retardado.

“Fulô de Manacá”...(p.57)

Fulô, como é assim pronunciada pelo matuto, corresponde à flor do manacá, uma

planta medicinal do Brasil, cujas flores são grandes e ornamentais, de cor esbranquiçada e

azul, gerando um belo efeito quando numerosas.

“Talo de marmeleiro”...(p.57)

Termo dicionarizado, que tem o sentido de galho marmeleiro, arbusto nativo do sertão

nordestino.

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Percorrendo a obra, encontramos um número considerável de regionalismos e

expressões típicas que cotejam os poemas com uma linguagem característica e cotidiana do

sertão nordestino.

O autor utiliza-se da linguagem oral, empregando amplamente expressões populares,

simples, corriqueiras, próprias dos falares simples e rudes, que o mesmo vai observando os

costumes e tipos característicos e vai traduzindo nos seus poemas, uma autêntica

representatividade da cultura popular, inserindo-a no contexto literário contemporâneo.

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NEOLOGISMOS

Se vaga-lumas na noite,

Eu me vaga-lumarei.

Se beberes rum-com-coca,

Eu também rum-cocarei.

E se tu café-com-leitas,

Eu café-comleitarei,

Academiando as letras

Das letras que soletrei.

Se cachaça-com-limonas,

Eu me descachaçarei

Pra não saírem palavras

De mim embrialengadas,

Malditas, mal retizadas,

Sem vergagem e sem ver lei,

Bostificando o sentido,

Fodendo o desconfundido

Dizendo que as inventei

Os neologismos constituem uma forma de atualização da linguagem, que consiste na

capacidade do ser humano de criar palavras novas.

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José Brasileiro Vilanova (2005:65), cita Mattoso Câmara, que tece suas considerações

sobre neologismos:

“São inovações lingüísticas, que se firmam numa língua dada...”

Entre os escritores sempre há uma tendência em criar termos, inferindo assim, um

estilo inovador nas suas criações literárias e poéticas.

No corpus, o qual nos debruçamos, analisaremos alguns neologismos que permeiam a

obra, os quais produzem um efeito estilístico e bastante expressivo na criação poética.

“Os meus olhos piscosos”... (p.17)

Situando no contexto, a expressão piscosos faz referência ao brilho intenso dos olhos

que piscam de emoção.

“Nordestando o Nordeste”...(p.18)

Expressão criada pelo autor que confere ao termo a ação de valorizar as coisas do

Nordeste, andar pelo sertão, procurando conhecer melhor, os costumes, as tradições a cultura

e tudo o que diz respeito à região.

“Da tercerez desse mundo”...(p.47)

“Da saúde canigada”...(p. 48)

No poema, o autor pede a proteção de São Gerome, forma popular atribuída ao Santo

São Jerônimo, para evitar o castigo de adoecer, ter a saúde ameaçada.

“Disgaviando o assunto”...(p.48)

O termo não dicionarizado, tem o sentido de mudar de assunto, fugir do assunto,

devanear.

“Sagradice de desejo”...(p.57)

A expressão constitui-se como a qualidade do desejo ser sagrado.

“Falei denganças de amor”...(p.59)

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A expressão externa o sentido de fazer dengo, demonstrando o amor, jeito manso de

falar de quem está apaixonado, dizer palavras amorosas.

“Luarando a imensidão”...(p.59)

Termo criado que remete para a luz da lua a iluminar o universo, externando assim, o

sentimento, a sensibilidade do poeta, ao utilizar com bastante expressividade e poesia, a lua,

criando uma expressão neológica, para externar a carga poética que permeia a lua.

O poema SÓBRIO (p.84) é um exemplo bem claro da ocorrência de neologismos na

obra em estudo:

Esse poema revestido de neologismos, referenda a obra do autor, que vê o mundo,

acompanha as transformações, os problemas que norteiam a vida do nordestino e vai

inserindo poeticamente termos peculiares do seu convívio, que expressam um modo de ver e

sentir diferente, por vezes, até engraçado.

Segundo a professora Nelly Carvalho (1997: 9):

“Além de testemunhar a criatividade e a imaginação fértil de seus falantes, os neologismos têm profunda ligação com as modificações do mundo exterior,e as mais diversas áreas do conhecimento”.

Um exemplo também de neologismos, na obra de Jessier Quirino, são os verbos

criados a partir de substantivos:

Que loirejam qualquer mar...(pág.57)

Finalmentando a pidança...(pág. 59)

Luarando a imensidão... (pág.59)

Esqueletou meu juízo...(pág.62)

Eu nela me esparadrapo...(pág. 64)

Que eu jangadeio com meu versejar... (pág.71)

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Desencheando as garrafas... (pág. 78)

Me segredam o coração...(pág. 78)

Ainda remetendo a Nelly (1997:12), ela afirma:

É sempre o espírito humano na constante busca do processo de criação que ,partindo do mundo extralingüístico, atinge o lingüístico e o modifica”.

Como se percebe, os neologismos são responsáveis pela revitalização da língua. São

resultados do espírito criador do escritor, do poeta, que se utiliza desse recurso para atender à

exigência da língua, sempre em processo de atualização. Isso acontece através das diversas

manifestações de criatividade, que o homem tem e sente essa necessidade de expressar, de

renovar a língua, acompanhando as transformações do mundo que o cerca.

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DITOS POPULARES

Jessier Quirino com seu estilo regionalista, vai beber no popular, sem cair na

vulgaridade, utilizando alguns artifícios lingüísticos, como os ditos populares tão utilizados

pelo matuto nordestino na sua sabedoria popular o qual autor mostra ser grande apreciador.

O poema UMAS E OUTRAS (p. 70), construído com ditos populares, faz uma alusão

às mulheres, utilizando-se desse recurso que busca na subjetividade subjacente aos ditos,

expressar os diversos protótipos de mulher, que apesar de serem populares, os ditos, possuem

certa dose de lição de moral.

UMAS E OUTRAS

“Tem umas com a faca o queijo na mão”

Tem tudo nas mãos, tem todas vantagens.

“Tem outras com a mão na frente e outra atrás”

Sem nada na vida, sem nenhum recurso.

“Tem umas com a pulga atrás da orelha”

Desconfiadas, ariscas.

“Que a ferro e a fogo rejeitam a paz”

Obrigadas, à força.

“Tem umas que ficam de queixo caído”

Ficam admiradas, abismadas, pasmas.

“De peito lavado, de pernas pro ar”

Satisfeita com o que acontece de ruim com outra pessoa, sem ter nada para fazer.

“Tem umas com cara de poucos amigos”

De cara feia, zangada.

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“No olho da rua no seu arruar”

Expulso, jogado fora, sem ter pra onde ir.

“Em hora apagada por baixo dos panos”

Encoberto, escondido, descampado.

“Distando a distância com o rabo do olho

Na réstia da lua vivendo de enganos”

Olhar pelo canto do olho, olhar atravessado.

“Tem umas que saem de arma e bagagem”

Saem preparadas, em todos os sentidos.

“Falando com duas, três pedras na mão

Daí a nadinha, a passa-piolho

De rostos colados terminam em paixão

Mas tem as que fazem um par de minutos

Um nada, nadinha durar um horror

Um vôo demoroso, um trote rasgado

Disputa de golpes maneiros de amor”

Saem zangadas, bravas, ásperas.

“E parede-meia com aqueles que amam

De corpo mandado se põem a pensar”

Separados por uma meia parede, característica das casas nordestinas, em que os

cômodos são separados por paredes, que não vão até o teto, daí serem chamadas de meia

parede.

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“No dito e feito dos seus pensamentos

Aconteceu como se previa, como se esperava.

Um lindo galope na beira do mar”.

Os ditos populares, os provérbios, permeiam a fala do matuto nordestino, que os

utiliza para externar a sua experiência e sabedoria, assumindo assim, um caráter regional, que

Jessier Quirino soube tão bem utilizar nos seus versos.

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PERÍFRASES

Um recurso bastante utilizado na linguagem oral, a perífrase constitui - se dentro do

universo léxico-semântico da língua, como um prolongamento da significação da ação verbal.

Formada por um verbo auxiliar e um substantivo que, no conjunto, dão um sentido de

continuação, seqüência da ação verbal.

As perífrases são comumente empregadas em expressões populares e regionais.

Tomando para análise, alguns exemplos, serão abordados alguns aspectos, presentes

na obra, enfatizando os recursos semânticos das perífrases aí encontradas.

“Fazer sala na cozinha”... (pág.60)

Corresponde à ação de dar assistência a alguém, receber um convidado. Termo

perifrástico que enfatiza a duração da ação verbal. Fazer sala na cozinha, remete-nos para o

sentido de dar atenção, receber uma visita na cozinha, costume bem nordestino.

“Que já deu nos calo”... (pág.71)

A construção perifrástica aponta para a ação de ir embora, viajar, traduzindo o aspecto

temporal da expressão.

“Prefiro viver solteiro”...

“Do que pedir uma mão”...(p.109)

A locução verbal de muita expressividade enfatiza a opção por não querer casar, que

se estende para outra perífrase, apontando a causa do não querer casar-se. Pedir uma mão,

expressão popular que indica um pedido de casamento. Ao conjunto de todos esses elementos,

percebe-se o valor do aspecto verbal, enfatizado pelas perífrases aí presentes no contexto.

“É um pega no sono”...(p.115)

A expressão pegar no sono, indica o começo da ação de dormir, que se depreende pela

carga semântica do verbo pegar. Essa perífrase reflete a expressiva atuação do conjunto,

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ressaltando o caráter inceptivo, no qual o fator tempo torna preciso, pois indica o início da

ação.

“Por só querer ser as pregas”... (pág. 134)

A noção de duração que a perífrase encerra é enfatizada pela ação da locução querer

ser, que traduz a expressão popular de ser convencido, orgulhoso, achar-se importante.

No exemplo, observamos que um conglomerado fraseológico, substituindo o verbo,

assume um mesmo significado, variando o estilo e atenuando a rudeza da expressão.

A perífrase compreende uma das formas de expressão do aspecto verbal, o que requer

um estudo mais minucioso e aprofundado dos pesquisadores na área.

Para ampliar os conteúdos semânticos de alguns verbos, escritores e poetas regionais

utilizam o recurso da perífrase, como uma forma caracterizada da língua falada, em que a

natureza semântica do verbo e a questão aspectual exprimem a durabilidade da ação.

A questão do aspecto verbal, é uma questão de ordem gramatical, que exige análise e

estudo mais aprofundado, mas, também faz abordagens no que diz respeito, aos nuances da

língua falada, utilizando o aspecto verbal, para expressar o lado afetivo da língua.

Assim, as perífrases, contribuem para o enriquecimento do léxico, como um recurso

estilístico.

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CONCLUSÃO

Com vistas a desvalorização e limitadas pesquisas no que concerne à presença da

língua falada nos textos escritos, vimos dessa forma desenvolver um trabalho científico

pautado em investigações sobre o linguajar sertanejo, tomando como corpus a obra literária

Agruras da lata d’água em sua 1ª edição do poeta Jessier Quirino, autor contemporâneo

que permeia a sua obra de um caráter nordestino e através de sua poética retrata com muita

autenticidade os falares típicos do sertão paraibano.

A opção por uma obra dessa natureza, foi feita mediante a importância do estudo em

questão para literatura regional, dada a ênfase que o autor dá, no que diz respeito ao

regionalismo e a funcionalidade da língua falada.

Quanto aos termos e expressões populares, procuramos ser fidedignos ao texto, tal

como são apresentados, localizando o poema e a página, para assim oportunizar uma melhor

compreensão aqueles que dele se utilizarem para futuras pesquisas.

A obra de Jessier com uma quantidade expressiva de regionalismos e neologismos,

reflete a linguagem cotidiana do Nordeste, com termos e expressões populares, observados na

linguagem coloquial típica do sertão nordestino, como também, os valores culturais e socais.

A nossa pesquisa concretizou-se a partir da análise léxico-semantica de algumas

ocorrências identificadas no obra, tendo como cerne o léxico utilizado pelo autor, que nos

seus poemas reflete características da língua falada.

Daí a riqueza de um vocabulário típico do Nordeste, permeado de regionalismos, que

confere a obra uma visão antropocultural.

No transcorrer da análise, ficou evidenciado que nos versos de Agruras da lata

d’água estão refletidos aspectos socioculturais da língua falada permeada de palavras,

expressões e termos populares, desprovidos da preocupação com a norma culta e sim, em

retratar a fala de maneira autêntica com suas peculiaridades sócio-culturais da região.

Na nossa pesquisa, identificamos vários recursos léxico-semanticos, os quais foram

objeto de nossa análise como as metáforas, que na linguagem poética é um recurso estilístico

que ultrapassa o nosso imaginário.

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Constatamos o emprego de comparações, como um processo que determina a

identidade ou similaridade entre os seres, coisas e objetos.

Quanto ao emprego dos diminutivos, identificamos na obra, pelo seu caráter afetivo,

de pequenez ou até pejorativo.

As expressões ou termos populares peculiares da língua falada, vem comprovar a

preocupação do autor em retratar através do léxico regional popular os costumes e a cultura.

Identificamos também casos de plurissignificação de alguns termos como aspecto de

enriquecimento do léxico.

A polissemia dá a língua oportunidade de flexibilização e dinamicidade, sendo assim,

um recurso significativo para o nosso estudo.

Os neologismos estão bem presentes na poética de Jessier Quirino, fruto da sua

criatividade, contribuindo assim, para a revitalização da língua.

Na obra, também identificamos os nuances da língua falada na qual analisamos a

presença das perífrases verbais, um recurso do aspecto verbal, que amplia e enfatiza o seu

significado.

O nosso trabalho tem o propósito de contribuir para pesquisas léxico-

semânticas dos regionalismos do sertão nordestino, ainda pouco explorados no que diz

respeito à realidade lingüística, levando em consideração a tríade: língua-cultura-sociedade..

Muito ainda há o que percorrer quanto às pesquisas lexicológicas e sociolingüísticas

dos falares regionais e as suas variantes. Pretendemos, numa perspectiva de futuro, aprofundar

nosso estudos nesta direção. Esperamos assim, estar contribuindo para novas pesquisas neste

ramos da Lingüística.

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