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UM HISTÓRICO COMENTADO DA FOTOGRAMETRIA, DA FOTOGRAFIA E DAS ORIGENS DA BIOFOTOGRAMETRIA© Este e-book é um elemento gratuito e parte integrante da Formação BFG© Experiences A experiência de conhecer o histórico das tecnologias que utilizamos nos permite ganhar autonomia sobre seu uso criativo. Este e-book é um passeio pela história de tudo o que compõem os pressupostos fundamentais da Biofotogrametria.

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Page 1: UM HISTÓRICO COMENTADO DA FOTOGRAMETRIA, DA FOTOGRAFIA … · DA FOTOGRAFIA E DAS ORIGENS DA BIOFOTOGRAMETRIA© medidas, até a moderna fotografia digital e sua utilização em documentação

UM HISTÓRICO COMENTADO DA

FOTOGRAMETRIA, DA

FOTOGRAFIA E DAS ORIGENS DA

BIOFOTOGRAMETRIA©

Este e-book é um elemento gratuito e parte

integrante da Formação BFG© Experiences

A experiência de conhecer o histórico das tecnologias que utilizamos nos

permite ganhar autonomia sobre seu uso criativo. Este e-book é um

passeio pela história de tudo o que compõem os pressupostos

fundamentais da Biofotogrametria.

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Denise da Vinha Ricieri, 2016

BFG MODELLING E-book UM HISTÓRICO COMENTADO DA FOTOGRAMETRIA, DA FOTOGRAFIA E DAS ORIGENS DA BIOFOTOGRAMETRIA©

1

Apresentação ao leitor Este e-book é um elemento gratuito

e parte integrante da Formação

BFG© Experiences

Bem-vindo ao paradigma da simplificação

das medidas de movimentos por imagens.

Nossa intenção nunca foi substituir ou

competir com outros sistemas, mas antes,

apresentar uma forma simplificada,

intuitiva, criativa e viável de ter sempre à

mão um Motion Capture System confiável

para uso na análise quantitativa de

movimentos funcionais e alterados, em

qualquer cenário da atuação dos

profissionais da saúde.

O texto deste e-book é uma transcrição

revisada e atualizada dos estudos e

publicações do Stricto Sensu da autora

(Dissertação de Mestrado e Tese de

Doutorado).

Neste volume o leitor encontrará o início

de uma viagem ao mundo do registro de

imagens, desde a ciência da fotogrametria,

na agrimensura, passando pelo conceito de

O Modelling-BFG©

Experience é um

curso livre de

aperfeiçoamento

profissional, de

natureza online, na

área de cinemática

2D, composto de

24h de atividades

online e de 16h de

atividades

presenciais

(optativas),

compondo uma

carga horária total

de até 40 (quarenta)

horas. A certificação

do módulo é

conferida aos

regularmente

inscritos que

cumprirem todas as

atividades

propostas.

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medidas, até a moderna fotografia digital e sua utilização em

documentação médica e de saúde.

Trata-se da revisão histórica e das bases teóricas dos processos

cinemáticos sobre os quais foi desenvolvido o processo de

Biofotogrametria©.

O material foi dimensionado para ser uma leitura leve, dinâmica,

interativa em imagens, e que visa oferecer suporte acadêmico

consistente para profissionais e estudantes que desejam utilizar a

análise de movimento como eixo diferencial de sua atuação nos

cuidados com a saúde do movimento humano.

PROF. DRA. DENISE DA VINHA RICIERI

Fisioterapeuta

Desenvolvedora da BIOFOTOGRAMETRIA

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Sumário

1- CONTEXTOS INICIAIS ............................................................................................... 4

2- A AVALIAÇÃO DO MOVIMENTO .............................................................................. 7

3- FOTOGRAMETRIA E BIOFOTOGRAMETRIA ............................................................ 9

3.1. Fotogrametria ........................................................................................................ 9

3.2. Conceitos interpretativos fotogramétricos ........................................................... 12

3.2.1. Restituição ..................................................................................................... 12

3.2.2. Fotointerpretação .......................................................................................... 13

3.3. Fotogrametria Computadorizada ......................................................................... 15

3.4. Biofotogrametria©: a história de uma sistematização lógica, ágil e aplicada ........ 16

3.4.1. Restituição em Biofotogrametria© ................................................................. 17

3.4.2. Fotointerpretação em Biofotogrametria©...................................................... 18

3.5. Biofotogrametria©: os novos tempos ................................................................... 18

4- MULTIDISCIPLINARIDADE NA ANÁLISE DOS MOVIMENTOS ............................... 20

5- UM PASSEIO PELA INVENÇÃO DA FOTOGRAFIA.................................................. 23

5.1. O paradoxo da arte bidimensional ........................................................................ 27

5.2. Profundidade de campo em imagens 2D .............................................................. 30

5.3. Da fotografia analógica à fotografia digital .......................................................... 33

5.4. A fotografia digital e a documentação médica por imagem ................................ 34

5.5. Vantagens da fotografia digital ........................................................................... 38

5.6. A fotografia digital na análise biomecânica do movimento ................................. 44

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1- CONTEXTOS INICIAIS

Ao considerar qualquer movimento como um fenômeno

integrado, é possível conceber que o ato de se movimentar amplia

os limites individuais pela ativação de processos de decisão e

controle, se o gesto for voluntário. Inúmeras possibilidades de

exploração em estudos emergem desta relação entre o controle e o

gesto, especialmente aquelas que integrem processo, origem,

objetivo, aprendizagem, desenvolvimento, normalidade e

anormalidade dos movimentos. Incluem-se, em tais possibilidades, a

exploração dos movimentos respiratórios e as implicações

determinadas por eles, resultando em variações vicariantes, como

ocorre na asma (RICIERI; ROSÁRIO FILHO; COSTA, 2008b). Neste

contexto, estudos acerca da relação entre a geometria postural

toracoabdominal, ou da parede torácica (PT), e as limitações físicas

(SILVA et al., 2005) e funcionais (LAMAR FILHO et al., 2001; PIANOSI;

DAVIS, 2004) decorrentes das disfunções respiratórias crônicas em

crianças, assumem relevância acadêmica e social.

A Biofotogrametria1 emergiu no contexto da

instrumentação para análise biomecânica como uma variação da

fotogrametria bidimensional (2D), dando prioridade às dificuldades

da análise do movimento nos ambientes típicos da prática

profissional de atenção à saúde. Esta prioridade gerou pressupostos

1 DENISE DA VINHA RICIERI. Biofotogrametria. Patente requerida de marca junto ao

Instituto Nacional de Propriedade Industrial, processo no. 900953829 de 05/06/2008, publicada em 26/08/2008 na Revista de Registro de Marcas no 1964.

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que orientaram uma sistematização própria no trato com a medida

na imagem (RICIERI, 2005).

A Biofotogrametria foi aplicada para medir diferentes tipos

de movimentos (WHITERS, 2002; LODOVICO et al., 2003; PANTANALI,

2004; RICIERI, 2004a) em variadas situações clínicas (POMBO, 2005;

WANSAUCHEKI, 2005; GANANÇA, 2006; RICIERI; COSTA; ROSÁRIO

FILHO, 2008). Pode-se afirmar que a Biofotogrametria apresentou

custos operacionais compatíveis com sua utilização desde o

diagnóstico e acompanhamento do tratamento em disfunções

motoras, até sua aplicação no escopo da andragogia, onde pode

figurar como recurso tecnológico de apoio no processo de ensino-

aprendizagem para formação de profissionais da saúde.

No campo do conhecimento formal, a Biofotogrametria

situa-se como um ramo da Biomecânica denominado cinemática2.

A biomecânica deriva das ciências físicas (Figura 1) aplicadas às

funções corporais e é considerada uma ciência relativamente

recente (MARCHIN, 1969; KUMMER, 1970). A despeito disso, sua

história está ricamente pontuada pela determinação dos

pesquisadores em busca de instrumentos para medidas

quantificáveis, que desempenhem papel útil na fundamentação de

conceitos e elaboração de teorias sobre o movimento corporal

humano (AMADIO et al., 1999).

2 Trata da geometria do movimento, relacionando posição, velocidade, aceleração e

tempo, sem referência às causas que o originaram. In: BARROS Jr, J.J. (org). Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa - Versão 1.0. ed. São Paulo/SP: Instituto Antônio Houaiss - Editora Objetiva, 2001. 1 CD-ROM.

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FIGURA 1 – ESQUEMA ILUSTRATIVO DAS DIVISÕES DAS CIÊNCIAS FÍSICAS EM

SEUS RAMOS CIENTÍFICOS, ENTRE ELES A BIOMECÂNICA OU

MECÂNICA DOS CORPOS RÍGIDOS. FONTE: ADAPTADO DE AMADIO ET

AL.(1999)

Para a biomecânica, o corpo humano é dividido em

segmentos considerados perfeitamente rígidos para simplificação

das análises quantitativas (AMADIO et al., 1999), daí o fato de ser

considerada uma vertente da mecânica dos corpos rígidos. A

premissa de um corpo formado por segmentos rígidos, articulados

entre si, oferece uma interface viável para intercâmbio entre áreas

de conhecimento e suas tecnologias, voltadas para medir os

movimentos entre esses segmentos (JEMT; BACK; PETERSSON, 1999).

Como resultado, é possível estimar quantitativamente características

normais e anormais dos movimentos, sejam eles voluntários ou não.

Por isso a biomecânica assumiu o papel de ciência de

interface, e tem se ocupado com análises físicas dos sistemas

biológicos e dos fenômenos do corpo humano, incluindo movimentos

corporais (AMADIO et al., 1999).

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2- A AVALIAÇÃO DO MOVIMENTO

MEDIDA3 é um dos conceitos fundamentais da cultura

clássica grega, herdado pela ciência moderna. O mais famoso

princípio sobre medidas e padronizações foi exarado pelo sofista

Pitágoras (487-420a.C.), quando afirmava que “o homem é a medida

de todas as coisas” (ABBAGNANO, 1998).

A medida, como princípio de reprodutibilidade dos

resultados, apresenta-se como o veio central da exploração

científica e vem sendo explorada e perseguida em todos os

laboratórios, ao longo de séculos de pesquisa. O físico e astrônomo

Johannes Kepler (1571-1630) considerou a medida como a razão de

sua existência e de seu trabalho como cientista. Em seu epitáfio, de

sua própria pena, escreveu:

(GLEISER, 1998)

O ser humano está capacitado a funcionar dentro de

limites estreitos. A primeira limitação crítica é a própria citoarquitetura

do sistema respiratório e o modelo funcional do aparelho locomotor.

3 Do grego “μετρον”.

“Eu medi os céus, agora, as sombras eu

meço. Para o firmamento viaja a mente, na

terra descansa o corpo”

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A segunda limitação é imposta pelos mecanismos de manutenção

da homeostase do meio interno, sensíveis aos estímulos mais sutis. A

terceira limitação é o obstáculo da reserva corporal dos nutrientes

essenciais ao metabolismo (FISHMANN, 1992).

Ao confrontar, de um lado as limitações funcionais

inerentes ao ser humano, e do outro, a necessidade de medidas

sobre essas mesmas funções, chegar-se-á à difícil tarefa de perseguir

métodos de avaliação cada vez mais precisos, todavia indeléveis aos

sensíveis servomecanismos de manutenção da homeostase corporal.

(BARAÚNA, 1997)

Validade de uma medida é a propriedade de um

instrumento em refletir até que ponto ele realmente

mede o que pretende, e a precisão, como a

tendência em fornecer resultados consistentes e

estáveis, relativamente livres de erros.

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3- FOTOGRAMETRIA E BIOFOTOGRAMETRIA

3.1. Fotogrametria

O termo fotogrametria, de origem grega4, expressa a

aplicação da fotografia à métrica, onde se deduz a dimensão dos

objetos contidos numa imagem de natureza fotográfica ou

cinematográfica.

A fotogrametria corresponde à...

(A.S.P., 19665 apud TEMBA, 2000)

4 Expressão de origem grega, derivada dos radicais “πηοτο” = luz; “γραμμα” = traçado; “γραπηειν” = descrever. Medição das distâncias e das dimensões reais dos objetos por meio da fotografia. In: BARROS Jr, J.J. (org). Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa - Versão 1.0. ed. São Paulo/SP: Instituto Antônio Houaiss - Editora Objetiva, 2001. 1 CD-ROM. 5 American Society of Photogrammetry/ASP. Manual of Photogrammetry. 1220p, 1966.

“...arte, ciência e tecnologia de obter

informações de confiança sobre objetos e do

meio ambiente com o uso de processos de

registro, medições e interpretações das

imagens fotográficas e dos padrões de energia

eletromagnética registrados”

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Na agrimensura, utiliza-se o termo para denominar a

técnica que permite efetuar as medidas de um objeto quanto às suas

formas e situação espacial, através de perspectivas registradas

fotograficamente.

A FOTOGRAMETRIA CARTOGRÁFICA como é chamada na

agrimensura, divide-se em aerofotogrametria, quando o material de

imagem é obtido de uma plataforma espacial, e fotogrametria

terrestre, também chamada de fotogrametria de curta distância,

quando as estações fotográficas são fixas ao solo. A técnica trata,

básica e principalmente, da produção de mapas planimétricos,

topográficos e outros procedimentos de medida (CORRÊA, Internet).

A fotogrametria cartográfica divide-se em

AEROFOTOGRAMETRIA, quando o material de imagem é obtido de

uma plataforma espacial ou de câmeras em aviões que sobrevoam

áreas a serem mapeadas (Figura 2), e FOTOGRAMETRIA TERRESTRE,

também chamada de fotogrametria de curta distância (Figura 3),

quando as estações fotográficas estão fixas no solo (TEMBA, 2000).

Tanto para a AEROFOTOGRAMETRIA quanto para a

FOTOGRAMETRIA TERRESTRE, são aplicadas duas abordagens de

processamento para as imagens: a interpretativa e a métrica (TEMBA,

2000).

Ao longo dos tempos, a fotogrametria cartográfica

desenvolveu-se, e evoluiu ao ponto de permitir que suas bases lógicas

e procedimentais pudessem ser também empregadas em outras

ciências, sendo denominada nesses casos de fotogrametria não-

cartográfica (RICIERI, 2000).

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FIGURA 2 - ILUSTRAÇÕES REPRESENTATIVAS DA TÉCNICA DE FOTOGRAMETRIA

AÉREA OU AEROFOTOGRAMETRIA: ESTIMATIVAS TOPOGRÁFICAS A

PARTIR DE IMAGENS ADQUIRIDAS POR CÂMERAS INSTALADAS EM

DIFERENTES TIPOS DE AERONAVES. FONTES: [FIGURA À ESQUERDA]

CABEZÓN D. XATAKAFOTO WEBSITE (ACESSO EM 29/10/2008).

[FIGURA À DIREITA] ALTAVISÃO IMAGENS AÉREAS (ACESSO EM

29/10/2008).

FIGURA 3 – ILUSTRAÇÕES REPRESENTATIVAS DA FOTOGRAMETRIA TERRESTRE

OU FOTOGRAMETRIA DE CURTA DISTÂNCIA: AS ESTIMATIVAS DE

MEDIDAS TOPOGRÁFICAS SÃO REALIZADAS A PARTIR DO

POSICIONAMENTO DAS CÂMERAS E OUTROS EQUIPAMENTOS

AUXILIARES NO SOLO. FONTES: [FIGURA À ESQUERDA] VIACARTA

CARTOGRAFIA E AGRIMENSURA WEBSITE (ACESSO EM 29/10/2008).

[FIGURA À DIREITA] UNIREFERÊNCIA TOPOGRAFIA WEBSITE (ACESSO

EM 29/10/2008).

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3.2. Conceitos interpretativos fotogramétricos

Alguns dos conceitos interpretativos e metodológicos

fundamentais da fotogrametria cartográfica foram transportados,

adaptando-se as técnicas ao estudo dos movimentos humanos. As

adaptações mais importantes relacionam-se aos conceitos de

restituição e fotointerpretação (CORRÊA, Internet).

3.2.1. Restituição

Na fotogrametria cartográfica a RESTITUIÇÃO consiste no

conjunto de procedimentos para obter feições planimétricas e/ou

altimétricas de uma determinada localidade, expressas na projeção

ortogonal por meio de fotografias aéreas ou terrestres, após

estabelecer uma equivalência geométrica entre o objeto e a

imagem (TEMBA, 2000).

A restituição consiste no amplo domínio de conhecimentos

de como planejar e construir um mapa planimétrico perfeitamente

Em outras palavras, é preciso estabelecer uma linha

de identidade entre as equivalências objeto-imagem

para transpor as medidas na imagem em unidades

métricas reais, e esta linha de identidade é obtida por

uma restituição bem planejada

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condizente com a realidade que pretende refletir. O domínio da

restituição é muito amplo, envolvendo conhecimentos fotográficos,

fotogramétricos, princípios instrumental e operacional,

fotointerpretação, topografia, cartografia e desenho.

Além disso, envolve certas condições físicas, como boa

visão estereoscópica, coordenação motora, zelo e responsabilidade,

tanto pela qualidade da informação como pela conservação dos

materiais e equipamentos (CORRÊA, Internet).

3.2.2. Fotointerpretação

A interpretação fotográfica é a ação de examinar as

imagens com a finalidade de identificar objetos e julgar seu

significado. Num contexto mais abrangente, qualquer pessoa é

fotointérprete, à medida que é capaz de julgar e emitir um parecer

sobre os elementos constituintes de uma fotografia e suas

características (CORRÊA, Internet).

Um dos princípios mais importantes da fotointerpretação é

a observação. Da observação constante deve nascer a perspicácia

da diferenciação dos vários componentes da imagem fotográfica.

Uma vez dominada a técnica de se observar, parte-se então à parte

mais difícil do trabalho, quando, utilizando-se da lógica interpretativa

e da métrica, chega-se a conclusões acerca dos objetos observados

(CORRÊA, Internet).

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A FOTOGRAMETRIA INTERPRETATIVA é composta por três

técnicas sequenciais. A FOTOLEITURA é a técnica mais simples:

dispensa equipamentos ou aparatos especiais e consiste no

reconhecimento visual direto do conteúdo da imagem. Na

FOTOANÁLISE é necessária a separação e a distribuição do objeto

em seus componentes básicos constantes na imagem. Por fim, a

FOTODEDUÇÃO é a técnica que inclui todas as características da

fotoleitura, aliadas a uma avaliação geomorfológica da área

retratada, num exame detalhado de todos os elementos restantes da

imagem que possam conduzir a deduções relativas às informações

ocultas (TEMBA, 2000).

Esse princípio não deve ser confundido com o conceito da

fotointerpretação profissional. Cada campo do conhecimento que

se utiliza da fotogrametria, cartográfica ou não, possui uma base

própria de conhecimento para avaliar as imagens contidas numa

fotografia, de acordo com o fim a que se destina tal interpretação.

Por outro lado, a FOTOGRAMETRIA MÉTRICA consiste das

medições realizadas nas imagens, somadas a outras fontes de

informação, para determinar posições relativas entre pontos de

referência, como distâncias, ângulos, áreas, volumes, tamanhos e

formas de objetos (TEMBA, 2000).

FOTOGRAMETRIA

INTERPRETATIVA FOTOGRAMETRIA

MÉTRICA

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3.3. Fotogrametria Computadorizada

Uma das muitas aplicações do aproveitamento da

fotogrametria fora da cartografia refere-se à sua aplicação em

imagens de segmentos corporais para avaliação da geometria

corporal (HOCHMAN; CASTILHO; FERREIRA, 2002) ou do movimento

(BARAÚNA et al., 2004a; LIMA et al., 2004; BARAÚNA et al., 2004b;

BARAÚNA et al., 2006; CARREGARO; SILVA; GIL COURY, 2007).

Os primórdios da técnica referem-se ao trabalho de

FERREIRA e CORREIA DA SILVA (1994, apud BARAÚNA, 1997) na

Universidade Técnica de Lisboa, quando desenvolveram um

programa experimental para computadores pessoais que

selecionava imagens obtidas através fitas de vídeo em VHS,

permitindo a delimitação de pontos e o cálculo dos ângulos

formados entre esses pontos (BARAÚNA, 1997).

O programa foi utilizado com sucesso em um estudo que

analisou a marcha de amputados de membro inferior que utilizavam

prótese (BARAÚNA, 1997) e chegou ao Brasil, onde foram iniciados

estudos para o aperfeiçoamento técnico do referido programa. Em

parceria com o Prof. Dr. Alcimar B. Soares6, o Prof. Dr. Mário Antonio

Baraúna7 aperfeiçoou o sistema em um novo aplicativo, baseado no

mesmo princípio de cálculo angular anterior. Esse novo sistema foi

registrado como ALCimage - Manipulando imagens, versão 1.0, 1999.

6 Universidade Federal de Uberlândia (MG) - Curso de Pós-Graduação/Engenharia da

Computação. Lattes: 7 Centro Universitário do Triângulo/UNIT, Uberlândia/MG. Lattes:

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A fotogrametria poderia ter sido mais um entre tantos

recursos de avaliação não-invasiva, se não trouxesse em seu bojo

duas grandes vantagens na efetividade de sua aplicação clínica: o

baixo custo do sistema de imagens e fotointerpretação e a precisão

e reprodutibilidade dos resultados.

O programa ALCimage®, mais funcional e cosmético que

seu precursor, ofereceu resultados otimistas para a substituição de

métodos qualitativos de avaliação. Os primeiros trabalhos publicados

com medidas feitas pelo sistema incluíram “Teste de Romberg”, para

equilíbrio e a simetrografia para postura, e a análise de referências

ósseas, articulares e angulares torácicas, na avaliação estática do

aparelho respiratório de crianças saudáveis e asmáticas (DELOROSO,

1999).

3.4. Biofotogrametria©: a história de uma sistematização lógica, ágil e aplicada

Para estudar movimentos mais complexos, o poder de

análise da Fotogrametria Computadorizada era restrito. Movimentos

como marcha, respiração, e controle compensatórios musculares

requeriam muitas horas de trabalho com poucos recursos gráficos.

Ao início do novo século, era preciso de interfaces mais

ágeis que aceitassem registros em vídeo para proceder às análises, e

os programas Suíte CorelDraw® e AutoCAD® mostravam-se

amplamente superiores na tarefa de medir imagens com maior

precisão e resultados finais mais cosméticos.

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O desenvolvimento da BIOFOTOGRAMETRIA© foi motivado

por essas necessidades e caracterizou-se por ser um processo

sistematizado de análise 2D, cujas etapas e condutas são operadas

de modo manual e representativo dos aspectos quantitativos de um

movimento. Seu principal objetivo é oferecer expressão numérica

para significação no processo de tomada de decisão na prática

profissional em saúde (RICIERI; POMBO, 2005).

A Biofotogrametria© incorporou e adaptou para seu

próprio uso os conceitos de restituição e fotointerpretação da

fotogrametria cartográfica. Esses conceitos tornaram-se premissas

fundamentais no desenvolvimento e validação da técnica de

avaliação sistemática dos movimentos corporais em seres humanos

3.4.1. Restituição em Biofotogrametria©

Na Biofotogrametria©, a restituição abrange os estudos

preliminares acerca das condições em que se deve realizar o registro

da imagem do movimento desejado para uma fotointerpretação

precisa.

A restituição, nesse sentido, deve envolver conhecimentos

anatômicos gerais e de superfície, conhecimentos cinematográficos,

fotogramétricos, princípios instrumentais e operacionais dos

equipamentos de registro. Não obstante, envolve também

condições físicas, como boa visão, coordenação motora, zelo e

responsabilidade pela qualidade da informação e pelas

repercussões clínicas que dela advêm.

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3.4.2. Fotointerpretação em Biofotogrametria©

Da observação constante de um grande número de

imagens desenvolve-se a perspicácia da diferenciação de seus

vários componentes. Da cuidadosa observação desses

componentes, decorre a fotointerpretação e o laudo clínico

pertinente.

Referências ósseas e articulares, planos, eixos, regiões

corporais, tudo pode ser avaliado pela Biofotogrametria©, desde que

a imagem adquirida seja previamente demarcada “in loco” no

observado antes da aquisição. Caso contrário, pode-se demarcar

diretamente a imagem, após sua aquisição. Na demarcação “in

loco”, fundamentos de contraste e operacionalização devem ser

levados em consideração na escolha do elemento marcador.

O importante é que, tanto a demarcação como os

resultados finais da fotointerpretação, gerem conforto para o

observado, liberdade para realização e registro dos movimentos;

nitidez na visualização da imagem e adequada interpretação

fotogramétrica.

3.5. Biofotogrametria©: os novos tempos

Depois de mais de uma década e meia de estudos e

pesquisas de aperfeiçoamento de cada etapa que compõe o

processo biofotogramétrico, a nomenclatura foi atualizada, detalhes

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foram acrescidos, margens de segurança foram calculadas,

tornando a Biofotogrametria© o que é atualmente: um processo

confiável, reprodutível, de alta qualidade, baixo custo, e aplicável à

ciência, à educação e à prática profissional.

O movimento – normal ou patológico – expressa e/ou

reage clinicamente às variadas intervenções dos diferentes

profissionais de saúde, em suas muitas especialidades de atuação.

Esta é uma das razões que faz da Biofotogrametria© um instrumental

potencialmente atrativo e multidisciplinar, voltado para análise

clínica quantitativa de movimentos.

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4- MULTIDISCIPLINARIDADE NA ANÁLISE DOS MOVIMENTOS

A palavra movimento é uma herança dos homens da

ciência e dos pensadores da Grécia antiga, que a utilizavam para

expressar a manifestação daquilo que existe em potencial no ser

humano. Por esta definição, não apenas o movimento corporal

estava compreendido pela expressão grega original, e reconhecido

como realização de potencialidades físicas humanas, mas também

a aprendizagem, a cura, o crescimento e mesmo, o envelhecimento,

representavam movimentos, na acepção da palavra (RICIERI, 2000).

Uma manifestação motora, ou gesto, não é um fenômeno

isolado, mas uma reação controlada, um fenômeno intrínseco e

integrado ao corpo que o gera, e ao meio que o cerca.

A multidisciplinaridade tornou-se cada vez mais

necessária, ou ainda, um requisito quase

imprescindível nas análises complexas dos

fenômenos biológicos, âmbito no qual estão

incluídas as análises quantitativas de movimentos

corporais. As interfaces do saber são cada vez mais

abrangentes, e a necessidade de convergência

entre diferentes tipos de conhecimentos reflete

uma contribuição importante de cada interface no

desvendar dos mistérios da manifestação motora.

(MELO; SANTOS, 2000)

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A avaliação biomecânica de um movimento permite a

quantificação dos graus de habilidade, ou destreza, na execução de

determinada tarefa, fenômeno denominado desempenho8

(AMADIO et al., 1999).

Pela lógica aristotélica, todo movimento demanda estudos

detalhados para a compreensão da parte movente e do motor que

o gera, e dessa lógica derivou, historicamente, o interesse pelo

movimento biológico (CAPOZZO; CAVANAGH, 1994). Desse modo,

quantificar características físicas dos movimentos e fenômenos

biológicos é um desafio que vem percorrendo a história, desde a

Antiguidade até os tempos atuais.

As observações levaram o filósofo à conclusão que o

deslocamento do corpo na deambulação era uma consequência

da ação dos membros inferiores, ou patas, contra o solo. Tais

conclusões motivaram as primeiras, das muitas discussões que se

8 Da expressão original em inglês “performance”.

Foram de Aristóteles (384-322 a.C.) os primeiros

relatos observacionais sobre o ato de caminhar de

humanos e de animais: ”o animal que se move faz

sua mudança de posição pressionando contra o

que está embaixo dele”.

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sucederiam ao longo dos tempos, na tentativa de comprovar ou

refutar sua veracidade.

Por sua vez, essas muitas discussões geraram novas

observações e explicações para o ato de caminhar (MELO; SANTOS,

2000), o que só foi completamente esclarecido e ratificado quase

dois mil anos depois, pela aplicação da Terceira Lei de Newton ou

princípio da ação e reação. O mesmo aconteceu para muitos outros

fenômenos motores, como o movimento respiratório, que seguiram

pelo mesmo caminho, em busca de justificativas cartesianas

satisfatórias às exigências da ciência.

Porém, a história e a ciência muito ainda haveriam de

evoluir antes de poder transformar impressões subjetivas visuais, que

fundamentaram as teorias do movimento durante séculos, em

registros objetivos que permitissem medidas, fato possível somente a

partir da invenção da fotografia.

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5- UM PASSEIO PELA INVENÇÃO DA FOTOGRAFIA

“Escrever com a luz” é um fenômeno que despertou a

curiosidade de filósofos e estudiosos pelos fenômenos da natureza

desde a idade antiga. De fato, a “photographia”9 não possuiu um

inventor único, ao contrário, ela representa uma síntese de várias

observações e inventos, desenvolvidos e divulgados em diferentes

momentos da história (PORTAL SÃO FRANCISCO, 1998).

Historiadores dividiram o mérito pelo desenvolvimento dos

conhecimentos ópticos que deram origem às primeiras tentativas de

“escrever com a luz”, ou ainda, “visão tecnicamente mediada”

(MACHADO, 2002) entre o chinês Mo Tzu (Século V a.C.) e o filósofo

grego Aristóteles (OKA; ROPERTO, 2002).

Aristóteles era um observador nato dos fenômenos naturais,

físicos e biológicos, e dele nasceu o relato de que, durante um eclipse

parcial, a imagem do sol projetava-se no solo em forma de meia lua

quando seus raios passavam por pequenos orifícios entre as folhas de

uma árvore, sob a qual estava sentado. Ele percebeu também que

quanto menor o orifício entre as folhas, mais nítida era a imagem

(KODAK Website, acesso em 2007).

9 Expressão de origem grega a partir dos radicais “photon” = luz + “graphos” = escrever.

Arte ou processo de reproduzir imagens sobre uma superfície fotossensível (como um filme), pela ação de energia radiante, especificamente a luz. In: BARROS Jr, J.J. (org). Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa - Versão 1.0. ed. São Paulo/SP: Instituto Antônio Houaiss - Editora Objetiva, 2001. 1 CD-ROM.

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Séculos de ignorância e de superstições sobre a “mágica”

da imagem na câmara escura ocuparam a Europa, e fizeram com

que os princípios do conhecimento grego sobre projeções de luz

fossem mantidos restritos ao oriente (OKA; ROPERTO, 2002). Apenas

no alvorecer do século XI, Ibn Al-Haitam10, importante físico,

matemático e astrônomo árabe que realizou importantes estudos de

óptica, descreveu e nominou como câmara obscura11 o que todos

acreditavam tratar-se de magia (KODAK Website, acesso em 2007).

Embora esta primeira descrição da câmara escura tenha

sido feita no século XI, somente no século XVI um cientista napolitano,

Giovanni Baptista Della Porta (1451-1615), publicou uma descrição

detalhada sobre a câmera e seus usos no livro “Magia Naturalis sive

de Miraculis Rerum Naturalium” (OKA; ROPERTO, 2002). Sua descrição

referia-se a um quarto refratário à luz, com um orifício de um lado e a

parede oposta pintada de branco (Figura 4). Quando um objeto era

colocado diante do orifício, pelo lado de fora do quarto, sua imagem

era projetada invertida sobre a parede branca (KODAK Website,

acesso em 2007).

FIGURA 4 – ILUSTRAÇÃO

DESCRITIVA DO MODELO DE

CÂMARA ESCURA, SEGUNDO

GIOVANNI BAPTISTA DELLA

PORTA (1558). FONTE:

KODAK WEBSITE (ACESSO

EM 2007).

10 Cuja alcunha era “O Al-Hazen” (965-1039 d.C.) 11 Do original em latim “obscurum cubiculum“.

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Na tentativa de melhorar a estrutura e a nitidez obtidas pelo

uso da câmara escura, alguns cientistas tentaram diminuir o diâmetro

do orifício. Este recurso tornava a imagem mais nítida, porém a

escurecia proporcionalmente, o que praticamente impossibilitava

sua identificação. Este problema foi resolvido em 1550 pelo físico

milanês Girolamo Cardano (1501-1576), que propôs a integração de

uma lente biconvexa junto do orifício (Figura 5), o que permitia

aumentar a imagem sem perder a nitidez, e ainda, mantê-la clara

(KODAK Website, acesso em 2007).

FIGURA 5 - ILUSTRAÇÃO DESCRITIVA DA INTERPOSIÇÃO DA LENTE BICONVEXA,

SUGERIDA POR GIROLAMO CARDANO (1550), AO COMPLEXO DA

CÂMARA ESCURA DE GIOVANNI DELLA PORTA. FONTE: KODAK

WEBSITE (ACESSO EM 2007).

O sucesso da proposta de Cardano deu-se graças à

capacidade de refração do vidro em convergir os raios luminosos

refletidos pelo objeto, fazendo com que cada ponto luminoso

correspondesse a um pequeno ponto na imagem. Até hoje, as

imagens formadas nas câmeras seguem este princípio, por isso são

chamadas puntiformes, ou seja, formam-se ponto a ponto a partir da

luz refletida pelo objeto retratado (OLIVEIRA, 2006).

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A câmara escura passou ainda por muitas melhorias, e a

ela foram atribuídas variadas utilidades, como por exemplo, a de

instrumentação auxiliar no desenvolvimento de desenhos e pinturas

(KODAK Website, acesso em 2007).

Esse conhecimento difundiu-se entre intelectuais e artistas

do século XVI, que logo perceberam a impossibilidade de obter

imagens nítidas se os objetos captados pelo visor estivessem a

diferentes distâncias da lente: ou se focava o objeto mais próximo,

pela variação da distância da lente, e deixava-se o restante do

cenário mais distante desfocado, ou vice-versa.

Para contornar esse problema, Danielo Brabaro (1568)

mostrou em seu livro, "A prática da perspectiva", que ao variar o

diâmetro do orifício era possível melhorar a nitidez da imagem. Com

isso, a câmara escura foi novamente aprimorada pela instalação de

um sistema junto à lente, que permitia aumentar e diminuir o orifício:

estava inventado o primeiro diafragma12 (OLIVEIRA, 2006).

Outras idéias, muitos aprimoramentos, e grandes

modificações sucederam-se pela história até o surgimento da

câmara escura móvel, ou câmera fotográfica. Sabe-se, por exemplo,

que Leonardo da Vinci (1452-1519) fez uso deste instrumento e dele

deixou uma descrição minuciosa em seu livro de notas sobre

espelhos, publicado apenas em 1797, muito tempo após sua morte

(OLIVEIRA, 2006).

A agregação de idéias, para aprimorar conceitos e

incorporar novas tecnologias, deu origem às câmeras digitais, mais

12 Da expressão original “diaphragma”: palavra de origem grega: “di(a)” = movimento ou

passagem através de; “phragma” = cerca, paliçada, defesa).

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precisas e potentes. Muitas utilidades e finalidades foram atribuídas

às câmeras digitais: do lazer à arte, e desta à ciência. Mas o fato

intransponível, a despeito de toda evolução, desde a câmara

obscura à tecnologia da imagem digital, foi que o produto final, qual

seja a imagem, era e será sempre uma redução 2D de um mundo

tridimensional (3D).

5.1. O paradoxo da arte bidimensional

O ser humano possui visão estereoscópica, ou seja, vê em

três dimensões e pode diferenciar nas imagens que vê entre altura,

largura e profundidade. Na Figura 6 a percepção é de que os prédios

estariam ao fundo enquanto o rio estaria mais próximo da lente da

câmera, ainda, que as torres à esquerda seriam mais altas que o

prédio à direita (MARMION, 2007a). Mas como afirmar que os prédios

estão realmente ao fundo, se esta fotografia, ou fotograma, é uma

imagem 2D?

FIGURA 6 – IMAGEM EXEMPLO. FONTE: MARMION, J. O PARADOXO DA ARTE

BIDIMENSIONAL (2007a).

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Este é o paradoxo da arte 2D, que também ocorre na

pintura e na gravura, ou seja, representar um mundo tridimensional

(3D) reduzindo-o a apenas duas dimensões, sem profundidade. Na

antiguidade, por exemplo, os egípcios trataram o problema sem

muita complexidade (Figura 7): elaboravam representações de

pessoas e do cotidiano em traçado puramente 2D, sem qualquer

preocupação com a profundidade (MARMION, 2007a).

FIGURA 7 – REPRESENTAÇÃO GRÁFICA DE DESENHOS EGÍPCIOS

BIDIMENSIONAIS FONTE: MARMION, J. O PARADOXO DA ARTE

BIDIMENSIONAL (2007a).

Fato: não há fundo uma vez que rio e prédios

estão exatamente no mesmo plano. No entanto,

é correto afirmar que os prédios estão na parte

superior da imagem e o rio na parte inferior, mas

não que os prédios estão ao fundo.

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Muito mais tarde, por volta do século XVII, os artistas

descobriram o segredo para incluir uma impressão de

tridimensionalidade em suas obras: enganar o cérebro empregando

artifícios visuais. Esta não foi uma tarefa difícil, posto que era

conhecido o fato de que o cérebro tende a se basear em

experiências anteriores e induzir o observador a perceber a existência

de profundidade na imagem plana como uma interpretação

subjetiva (MARMION, 2007a).

A estratégia de inclusão de tridimensionalidade foi

exemplificada na obra “Diana e suas companheiras”13, pintada em

1650 por Jacob Van Loo (1614-1670). Ao analisar a pintura (Figura 8),

percebe-se que a tridimensionalidade foi introduzida por meio de

linhas invisíveis, que levam o cérebro a concluir que o cachorro à

esquerda estaria ao fundo do cenário, por possuir dimensões

menores que os personagens mais próximos do observador.

FIGURA 8 – PINTURA “DIANA E SUAS COMPANHEIRAS”, POR JACOB VAN LOO

(1650): TRATAMENTO ÓPTICO PARA INSERÇÃO DA IMPRESSÃO DE

TRIDIMENSIONALIDADE. FONTE: MARMION, J. O PARADOXO DA ARTE

BIDIMENSIONAL (2007a)

13 Também conhecido como “Diana e suas ninfas”.

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A observação do quadro induz à clara sensação que

quanto mais à direita da pintura, mais próximos estariam os

personagens no cenário retratado. Mas isso não passa de uma ilusão

criada pelo artista: todos se encontram no mesmo plano e é

impossível existir perto e longe, ou frente e fundo, por se tratar de um

plano 2D. É disso que trata a estratégia: iludir o cérebro do observador

(MARMION, 2007a).

5.2. Profundidade de campo em imagens 2D

O desafio da fotografia, incluindo as imagens para

documentação médica, era a redução do mundo 3D para ocupar

uma imagem 2D. Como já apresentado, na transformação perde-se

a dimensão profundidade, que pode ser reconstruída trabalhando-

se apropriadamente na câmera por meio de estratégias que iludam

o cérebro a perceber uma imagem como 3D, como faz a

propriedade profundidade de campo.

PROFUNDIDADE DE CAMPO corresponde à região da área

fotografada que se deseja permaneça nítida, desde que

corretamente focalizada. Um exemplo desta propriedade é

apresentado na Figura 9, onde há uma linha de três bonecos, sendo

que a primeira e a última estão fora de foco, ao passo que os

bonecos da segunda linha apresentam imagens nítidas de tal modo

que é possível observar-se-lhes os detalhes (MARMION, 2007b).

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FIGURA 9 – IMAGEM REPRESENTATIVA DA PROPRIEDADE DE PROFUNDIDADE

DE CAMPO, ONDE A ÁREA DE NITIDEZ ENCONTRA-SE NA ZONA

CENTRAL DA IMAGEM. FONTE: MARMION, J. O PARADOXO DA ARTE

BIDIMENSIONAL (2007a)

Todos os elementos fora da área de nitidez, entre a lente da

câmera e o fundo do ambiente ficarão, em maior ou menor grau,

fora do foco (Figura 10). Esta profundidade de campo pode ser

regulada pelos recursos da câmera (Figura 11), de alguns centímetros

a alguns metros (MARMION, 2007b).

Esta propriedade fotográfica é importante por ser um dos

elementos essenciais para conferir à imagem uma impressão de

tridimensionalidade. Ao desfocar propositalmente certas regiões da

imagem, é possível induzir à percepção de que um objeto esteja mais

distante, recriando uma experiência multidimensional (MARMION,

2007b).

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FIGURA 10 – ILUSTRAÇÃO DA PROPRIEDADE DE PROFUNDIDADE DE CAMPO EM

UMA CÂMERA FOTOGRÁFICA, EM SITUAÇÃO ANÁLOGA À FOTO

ANTERIOR. FONTE: MARMION, J. O PARADOXO DA ARTE

BIDIMENSIONAL (2007a)

FIGURA 11 – ILUSTRAÇÃO REPRESENTATIVA DA PROPRIEDADE DE

PROFUNDIDADE DE CAMPO PELA VARIAÇÃO DA REGULAGEM, EM

UMA CÂMERA FOTOGRÁFICA. FONTE: MARMION, J. O PARADOXO DA

ARTE BIDIMENSIONAL (2007a)

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O aperfeiçoamento dos recursos, técnicas, estratégias e

tratamentos na revelação dos filmes, ao longo dos anos, contribuiu

para uma qualidade progressivamente superior da fotografia

analógica. Mas a revolução tecnológica da computação, ocorrida

na década de 80, agregou novos paradigmas ao processo de

aquisição e registro de imagens, fazendo emergir no mercado a

fotografia digital (MARMION, 2007b).

5.3. Da fotografia analógica à fotografia digital

Considerados os séculos entre as primeiras tentativas de

reproduzir imagens em câmaras escuras e o advento das câmeras

fotográficas analógicas, o processo como um todo pouco evoluiu,

permanecendo sustentado sobre os pilares dos princípios ópticos e

dos formatos originais (OLIVEIRA, 2006).

No século XX, a fotografia passou ao grau de centro das

atenções na imprensa mundial, cujas amplas reportagens exigiram

dos profissionais do fotojornalismo uma demanda específica por

equipamentos e recursos mais leves e ágeis. Esta demanda relevante

de mercado despertou interesse nos fabricantes para investimentos

no setor, provocando uma renovação com o surgimento da

fotografia digital, ao final dos anos 80 (OLIVEIRA, 2006).

A evolução dos equipamentos resultou na migração para

a tecnologia digital, e a fotografia analógica entrou em declínio ao

final dos anos 90, acabando com o fascínio exercido durante

décadas pelos laboratórios fotográficos de revelação e ampliação e

transformando a prática tão comum da fotografia analógica em

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algo primitivo. Uma vez que a fotografia digital era um processo

recente, sua manipulação mereceu regulamentação específica em

todas as áreas de aplicação, de modo a evitar transtornos

propositais, imprudentes ou involuntários (Figura 12).

FIGURA 12 – ILUSTRAÇÃO SATÍRICA DE UMA MANIPULAÇÃO INADEQUADA DE

IMAGENS MÉDICAS. FONTE: ADAPTADO DE NERDIANO BLOGSPOT

WEBSITE (2007)

5.4. A fotografia digital e a documentação médica por imagem

No mercado de câmeras domésticas, a tecnologia digital

foi disseminada em largas proporções (TOMMASELLI; HASEGAWA;

GALO, 2000), e sua utilização em atividades métricas tem crescido

devido à agilidade na coleta de dados e, principalmente, por

dispensar o domínio completo e aprofundado sobre o processo de

aquisição (GALO; TOMMASELLI; HASEGAWA, 1999).

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As câmeras digitais tornaram-se populares e acessíveis a

partir da disseminação da tecnologia CCD14 na década de 80, quer

pela redução dos custos, quer pelo aumento da confiabilidade em

relação às antigas câmeras analógicas (GALO; TOMMASELLI;

HASEGAWA, 1999). Os dispositivos de acoplamento de carga CCD

(Figura 13) são, na verdade, circuitos integrados de silício usados

como transdutores de imagem, ou seja, capazes de transformar uma

forma de energia em outra, nesse caso, energia eletromagnética em

energia elétrica. Estes circuitos são fabricados sob o formato de um

conjunto matricial linear de células fotossensíveis (TOMMASELLI;

HASEGAWA; GALO, 2000).

FIGURA 13 – EXEMPLO DE UM

SENSOR CCD DE UMA CÂMERA

KODAK. FONTE: KODAK WEBSITE

(ACESSO EM: 05/05/2008)

A câmera é um sistema básico para coleta e

armazenamento de imagens digitais. De modo geral, uma câmera

digital contém um sistema de lentes, processadores, um aparato

fotossensível – o chip CCD – e uma memória, para o armazenamento

final da imagem (Figura 14).

14 Charge Coupled Device.

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FIGURA 14 – ESQUEMA DE UMA CÂMERA DIGITAL E SEUS COMPONENTES, NO

PROCESSO DE CAPTURA DA IMAGEM. FONTE: TOMMASELLI;

HASEGAWA; GALO (2000)

No CCD matricial, os pixels15 que formam uma imagem são

criados por milhares de fotocélulas microscópicas. Como cada

câmera apresenta apenas um CCD, a captura de imagens coloridas

é feita utilizando uma matriz de filtros RGB posicionada à frente do

CCD. Após a exposição do objeto, as cores são interpoladas por

processos computacionais internos (TOMMASELLI; HASEGAWA; GALO,

2000), formando a imagem final.

A finalidade da FOTOGRAFIA MÉDICA não está relacionada

ao resultado artístico da imagem, mas ao seu papel como

documentação ou exame. Deve ser a mais real e nítida possível e

considerar, na maioria dos casos, relações entre a métrica da

imagem e a métrica real.

15 Na informática, refere-se a um ponto luminoso do monitor que, juntamente com outros

do mesmo tipo, forma as imagens na tela. In: BARROS Jr, J.J. (org). Dicionário Eletrônico

Houaiss da Língua Portuguesa - Versão 1.0. ed. São Paulo/SP: Instituto Antônio Houaiss -

Editora Objetiva, 2001. 1 CD-ROM.

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Quando realizada de modo padronizado, a fotografia

satisfaz plenamente sua finalidade como documentação científica,

particularmente em relação à propriedade de reprodutibilidade

(HOCHMAN; NAHAS; FERREIRA, 2005).

Na atividade científico-acadêmica, independente da

especialidade médica, a documentação fotográfica viabiliza a

transmissão de conhecimento e experiências entre um profissional e

sua comunidade científica, e vice-versa (OLIVEIRA, 1980, HOCHMAN;

NAHAS; FERREIRA, 2005). O acervo fotográfico possibilita, ainda,

estudos estatísticos específicos e análises da evolução científica de

uma equipe profissional pelos resultados obtidos em seu serviço, por

exemplo.

O emprego da fotogrametria em medidas de movimentos

tem sido questionado sem muito sucesso (FARKAS et al., 1980;

NECHALA; MAHONEY; FARKAS, 1999), e possui ao seu favor o fato de

reduzir a margem de erro encontrada na antropometria ou na

goniometria. Em outras palavras, ao medir alguma estrutura no

paciente, de maneira direta, instrumentos rígidos como paquímetros,

compassos, réguas, goniômetros ou transferidores, podem deformá-

la por compressão. Isso incorpora uma margem de erro

representativa ao resultado final (HOCHMAN; NAHAS; FERREIRA, 2005;

SACCO et al., 2007), tanto quanto nas medidas por imagens.

Além de impor menor desconforto e constrangimento para

o avaliado, a fotogrametria possibilita o resgate da imagem ao longo

do tempo, de modo sequencial ou não, e permite o acréscimo de

medidas não consideradas em análises anteriores, ou mesmo, não

pertinentes ao quadro clínico em evolução à época (HOCHMAN,

NAHAS e FERREIRA, 2005).

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Finalmente, para se atingir qualidade necessária na

documentação fotográfica científica, deve-se cultivar organização

e disciplina, além de manter atualizados os conhecimentos básicos

em fotografia, as informações elementares sobre composição e

tratamento de imagens, e as noções de computação gráfica

(HOCHMAN, NAHAS e FERREIRA, 2005).

5.5. Vantagens da fotografia digital

Por essa razão, médicos e profissionais da saúde podem

adotar a documentação fotográfica padronizada e de

boa qualidade técnica como um acervo seguro e

preservado ao longo do tempo, que permite revisões

extemporâneas em busca de novas evidências, face à

evolução das ciências médicas.

A fotografia digital, recente evolução da fotografia analógica, é

um dos legados da pesquisa espacial, cujo desenvolvimento foi

fomentado pela necessidade de um sistema que enviasse à Terra,

via rádio, imagens adquiridas por sensores remotos em diversos

lugares do espaço. Esta evolução da fotografia trouxe em seu

bojo muitas possibilidades de aplicações e uma maiúscula

mudança de hábitos para a sociedade moderna.

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Na fotografia digital, as imagens não são capturadas por

processos químicos, mas por fotocélulas, e interpretadas

computacionalmente em termos de matrizes binárias (x,y). As

imagens são transferidas para uma memória virtual, que as exibe

imediatamente em um monitor para posterior edição e/ou

impressão, ou ainda, para transferência direta entre câmera e

impressora capaz de reconhecer os arquivos de imagens digitais

(NEGRAES, 2007). A impressão final é cada vez mais impecável, e

torna difícil a diferenciação entre uma fotografia tirada por uma

máquina 35mm utilizando filme fotográfico, daquela produzida por

uma câmera digital.

A diferença substancial ainda é o custo dos equipamentos

digitais mais sofisticados. Na verdade, as câmeras digitais estão

incorporando controles cada vez mais sofisticados que permitem

recursos antes de alcance impossível para um fotógrafo, como a

visualização prévia da imagem e a possibilidade de apagá-la/refazê-

la quantas vezes forem necessárias, até sua aprovação definitiva

(NEGRAES, 2007).

Outra vantagem da fotografia digital foi a popularização

de modelos de câmeras com recursos e controles mais limitados, um

problema para fotógrafos experientes ou profissionais, porém com

um marketing apelativo determinante: o preço final acessível ao

consumidor popular. Por isso, se a ideia consiste em produzir imagens

apenas para serem vistas na tela da câmera, em apresentações, ou

para serem enviadas rapidamente pela Internet, as câmeras de

baixo custo são indicadas (NEGRAES, 2007).

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Nas câmeras digitais sofisticadas, o panorama é outro,

podendo mesmo rivalizar ou exceder, em alguns casos, imagens

adquiridas por câmeras profissionais potentes, uma vez que lentes

intercambiáveis e variadas opções de controle sobre o modo de

aquisição já fazem parte dos recursos de fábrica (NEGRAES, 2007).

O importante neste contexto é que, com os preços em

declínio desde o início do século XXI, o item mais caro desta

tecnologia, qual seja o CCD, atingiu níveis tecnológicos satisfatórios,

mesmo em câmeras comerciais, com recursos mínimos e destinados

a fotógrafos amadores (NEGRAES, 2007). O reflexo desta evolução

tecnológica é que qualquer fotógrafo amador passou a usufruir da

qualidade de uma câmera digital para finalidades múltiplas, inclusive

iniciá-lo no registro e análise de documentação médica (Figura 15).

(A) (B)

FIGURA 15 – EXEMPLO DE FOTOGRAFIA PARA DOCUMENTAÇÃO MÉDICA:

REGISTRO DO EXAME DE ANUSCOPIA PARA INFECÇÃO ANAL PELO

HPV NA FORMA SUBCLÍNICA: (A) COM TESTE DE AZUL DE

TOLUIDINA POSITIVO; (B) COM TESTE DO ÁCIDO ACÉTICO

POSITIVO. FONTE: MAGI ET AL. (2006)

Câmeras digitais oferecem controles criativos,

dependendo do leque de recursos que possuam: permitem o

controle da luz, o movimento nas imagens, e a seleção entre o que

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deve ou não ser registrado com nitidez. De qualquer modo,

independente de controles sofisticados oferecidos, os mesmos

princípios básicos estão sempre presentes, sendo possível manipulá-

los e deles tirar vantagens. Por exemplo, todas as câmeras digitais

possuem um modo automático que determina o foco, a exposição e

o balanço de cor: resta ao fotógrafo apenas apontar a câmera e

apertar o botão de disparo (NEGRAES, 2007).

Para IMAGENS EM MOVIMENTO, o dispositivo principal é o

obturador, que mantém a luz longe do sensor, exceto durante uma

exposição para aquisição de imagem. Quando ele se abre para

permitir a entrada da luz que atinge o sensor de imagem; o período

de tempo em que permanece aberto afeta tanto a exposição da

imagem quanto a forma final da aquisição, referente ao movimento.

Velocidades baixas da exposição do obturador permitem que a luz

atinja o sensor por mais tempo: a foto fica mais brilhante, porém pode

ficar mais tremida; velocidades mais baixas permitem menos tempo

de exposição à luz, resultando numa foto mais escura, mas com

menos chances de tremulação (NEGRAES, 2007).

Os obturadores das câmeras fotográficas, por exemplo,

possuem um controle mecânico de velocidade, enquanto o

obturador utilizado na maioria das câmeras de vídeo com CCD

apresenta um controle para velocidades variadas. As variações da

velocidade representam o tempo permitido para que a carga

gerada pela indução da luz se acumule eletronicamente no CCD.

A maioria das câmeras CCD profissionais tem velocidades

que variam de 1:6016, que significa a qualidade mínima, até 1:2.000

16 Relação referente ao número de imagens registradas por segundo, ou seja, uma

velocidade de shutter de 1:60 refere-se à aquisição de 60 imagens em um segundo.

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por segundo, embora existam algumas que cheguem mesmo a

1:12.000 por segundo, possibilitando, inclusive, a criação de efeitos

especiais (WHITTAKER; BARREIROS, 2002).

É a velocidade do obturador que determina se a imagem

final de um objeto em movimento aparecerá na fotografia digital de

maneira nítida, com um efeito de arrasto (Figura 16) ou com múltiplas

imagens sobrepostas (Figura 17).

FIGURA 16 – IMAGENS ADQUIRIDAS POR CÂMERAS COM DIFERENTES

VELOCIDADES DE ABERTURA DO OBTURADOR. NA VELOCIDADE 1/30

POR SEGUNDO, O EFEITO ESTROBOSCÓPICO É INTENSO, E

APARENTA UM ARRASTO NA IMAGEM, IMPEDINDO A PERCEPÇÃO DA

CENA. ESTA É REVELADA PELO USO DE UMA CÂMERA CUJA

VELOCIDADE DE ABERTURA DO OBTURADOR É DE 1/500 POR

SEGUNDO. FONTE: WHITTAKER; BARREIROS (ACESSO EM:

16/08/2008)

FIGURA 17 – EXEMPLO DO EFEITO

ESTROBOSCÓPICO SEM ARRASTO. FONTE:

WHITTAKER; BARREIROS (ACESSO EM:

16/08/2008)

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A presença deste tipo de artefato na imagem final

denomina-se efeito estroboscópico. Portanto, entender a velocidade

do obturador é fundamental para controlar o resultado final da

captura da imagem de um objeto em movimento, minimizando o

efeito estroboscópico.

O efeito estroboscópico na documentação médica

impossibilita interpretações precisas pela ausência da nítida

visualização das imagens em movimento. Para evitá-lo é necessária

a vigência de pelo menos uma, de duas condições: (1) que as

câmeras possuam velocidades do obturador iguais ou superiores a

1:60, pelo menos; (2) ou que o movimento que se deseja registrar seja

lentamente executado, como é o caso dos movimentos funcionais

humanos durante exames, particularmente nas condições de

recuperação de doenças, traumas e cirurgias (Figura 18).

FIGURA 18 – AVALIAÇÕES FÍSICO-FUNCIONAIS DE MOVIMENTOS CORPORAIS

CUJAS IMAGENS FORAM ADQUIRIDAS POR CÂMERAS COMERCIAIS,

SEM RECURSOS ESPECIAIS PARA VELOCIDADE DO OBTURADOR.

FONTE: O AUTOR (2004)

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5.6. A fotografia digital na análise biomecânica do movimento

Desde a invenção da câmera fotográfica analógica, as

pesquisas sobre aspectos do movimento corporal por meio de

imagens representaram uma nova possibilidade metodológica, e

deram origem a um novo ramo da biomecânica, conhecido como

CINEMETRIA17 (CAPOZZO; CAVANAGH, 1994).

De modo geral, numa primeira etapa, os processos

envolvem o controle de aquisição e de condições de registro das

imagens ou fotogramas18, e o domínio das fontes possíveis de erro nas

imagens adquiridas. A distribuição de marcadores de superfície,

procedimento denominado modelagem, orienta sobre referências

anatômicas que se deseja controlar durante o processo de medidas.

17 Metodologia biomecânica que se destina à obtenção de variáveis cinemáticas para a

descrição de posições ou movimentos no espaço (Barros, 2001). 18 Cada impressão fotográfica ou quadro unitário de um filme cinematográfico In: BARROS

Jr, J.J. (org). Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa - Versão 1.0. ed. São Paulo/SP: Instituto Antônio Houaiss - Editora Objetiva, 2001. 1 CD-ROM

A cinemetria propiciou o congelamento e registro das

imagens dos movimentos e, por decorrência, a possibilidade

de medir geometricamente aspectos de interesse por meio

dos instantâneos ou fotogramas. Isso tornou viável o uso de

descrições quantitativas para movimentos estáticos ou

dinâmicos através de processos sistematizados.

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As medidas podem relacionar-se a variações planares, ou

medidas 2D, ou a variações espaciais, ou 3D, dos segmentos

corporais medidos. Para realização das medidas nas imagens

frequentemente são aplicados princípios de geometria plana ou

analítica, esta última especificamente para análise de variações

espaciais ou 3D. Ao final do processo podem ser gerados tabelas ou

gráficos, reunidos em laudos de significação clínica ou biomecânica

(Figura 19).

FIGURA 19 – ETAPAS DE

PROCESSAMENTO NA

CINEMETRIA. FONTE:

ADAPTADO DE AMADIO

ET AL. (1999)

Na cinemetria, a aquisição da imagem por filmadoras ou

câmeras fotográficas digitais é determinada pelo tipo de movimento

a ser analisado. Gestos estáveis como POSTURA CORPORAL

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(GUIMARÃES; SACCO; JOÃO, 2007) e AMPLITUDE ARTICULAR

(BARAÚNA et al., 2004), ou ainda, GEOMETRIA DE SEGMENTOS e seus

componentes anatômicos, como face (HOCHMAN; CASTILHO;

FERREIRA, 2002) ou tórax (RICIERI; ROSÁRIO FILHO; COSTA, 2008a),

podem ser analisados por meio de imagens fotográficas, sem que

ocorra a perda de informações.

Por outro lado, para análise de movimentos contínuos, que

ocorrem em fases, como MARCHA (PATIÑO et al., 2007), EQUILÍBRIO

ESTÁTICO (BARAÚNA et al., 2006) e RESPIRAÇÃO (SARRO, 2003), é

recomendada a aquisição por câmeras de vídeo. Nas duas

situações, os parâmetros entre câmera e objeto, como distância,

alinhamento e forma de execução do movimento para aquisição da

imagem devem ser controlados e reprodutíveis (AMADIO et al., 1999).

Uma vez adquiridas em formato digital, as imagens são

submetidas a técnicas de reconhecimento das coordenadas de

referência anatômica, que podem variar, segundo a natureza do

sistema de análise utilizado, desde a automatização computacional,

até a semiautomatização e o processamento totalmente manual

(BARROS et al., 1999).

Ainda a depender do sistema de análise utilizado, os

resultados serão apresentados na forma de variação planar da

trajetória das coordenadas, para os sistemas 2D, ou da variação das

posições espaciais ao longo do tempo, para os sistemas 3D (AMADIO

et al., 1999).

A quantificação dos dados referentes ao movimento é

interpretada, de modo geral, em bases geométricas, pela medição

das distâncias angulares, relativas ou absolutas, lineares, de superfície

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ou volumétricas (AMADIO et al., 1999). É a partir de dados como estes

que a significação, feita por meio de laudos, tabelas e gráficos, será

determinada, e deverá ter por base teórica a descrição de uma

função motora normal ou anormal, relacionada a uma patologia ou

seqüela (BARROS et al., 1999)

A primeira análise tridimensional do movimento humano

aconteceu no final do século XIX, e foi realizada pelo engenheiro

prussiano Otto Fischer e o professor Wilhelm Braune (CAPOZZO;

CAVANAGH, 1994). Historicamente, ela foi considerada uma

revolução metodológica no estudo do movimento e o marco inicial

da cinemática19.

Dividida em VIDEOGRAMETRIA e FOTOGRAMETRIA, de

acordo com o tipo de câmera utilizada no momento da aquisição

da imagem do movimento, a cinemática evoluiu como

instrumentação de precisão, da imagem analógica à imagem digital

e à computação gráfica (Figura 20).

A despeito das tentativas anteriores de se registrar e

pesquisar o movimento humano, um impulso substancial da

produção científica nesta área ocorreu somente nas décadas de 60

e 70, pela ampliação do conhecimento sobre a cinemática da

locomoção humana, com referência especial aos seus aspectos

dinâmicos (SAAD; BATTISTELLA; MASIERO, 1996).

19 Trata da geometria do movimento, relacionando posição, velocidade, aceleração e tempo,

sem referência às causas que o originaram (AMADIO et al., 1999).

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FIGURA 20 - DIVISÃO DA BIOMECÂNICA SEGUNDO O PERFIL DE ANÁLISE. FONTE:

ADAPTADO DE AMADIO ET AL. (1999)

Além da marcha humana, a descrição quantitativa de

diferentes movimentos tem despertado interesse, sob diferentes

aspectos do conhecimento (MORO, 2000; DUARTE, 2001; LI; HONG;

CHAN, 2001; BETTINELLI et al., 2002; KESHNER, 2003; CLIQUET Jr et al.,

2004; GANANÇA, 2006; PATIÑO et al., 2007).

Cada vez mais, deseja-se estudar o movimento humano em

seus menores detalhes, de modo quantificável e sistemático, voltado

para um objetivo principal de investigação científica, como exercer

um papel auxiliar no exame físico em doentes respiratórios adultos

(RODRIGUES et al., 1993; HODGES; HEIJNEN; GANDEVIA, 2001) e

pediátricos (BANOVCIN; SEIDENBERG; VON DER HARDT, 1995).

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A VERSÃO GRATUITA DESSE EBOOK NÃO CONTÉM O

CAPÍTULO DE REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS, EXCLUSIVO

PARA A VERSÃO INTEGRANTE DO CURSO DE FORMAÇÃO

BFG-EXPERIENCES.

É sob este prisma que se situa a contribuição da

Biofotogrametria junto ao exame físico motor de modo

geral, e em especial à semiologia respiratória, inicialmente

em situações relacionadas à geometria da PT, postura

corporal e controle muscular respiratório.

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CÓDIGO DESTE EBOOK: 2016.5392.L1.C1M

No link https://www.researchgate.net/profile/Denise_Ricieri você acessa

na íntegra meus principais textos publicados, incluindo a

Dissertação de Mestrado e a Tese de Doutorado

que serviram de base para esse e-book.