um edifício master a cada esquina

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Um Edifício Master a cada esquina Aqui na coluna Cinema em D ebate (LINK) eu escolho filmes para pontuar discussões sobre fatos corriqueiros dos nossos dias. Acho interessante como a ficço re!ela !erdades" #s !e$es escondidas" a  partir de persona%ens que s& e'istem no fa$ de conta. * oda!ia" dessa !e$ decidi escolher +ustamente um document,rio" tal!e$ o meu fa!orito" para o te'to. -stou falando de -difcio /aster" do rec0m1falecido -duardo Coutinho. 2osto de afirmar que filmes ser!em para pontuar discussões sobre fatos corriqueiros ou centrais aos nossos dias. Acho interessante como a ficço re!ela !erdades" #s !e$es escondidas" a partir de  persona%ens que s& e'istem no fa$ de conta. *o da!ia" document,rios sobre pessoas normais tamb0m  podem muito bem fa$er essa funço" como o e'cepcional -difcio /aster" do +, falecido -duardo Coutinho.  Nesse pequeno mimo" o documentarista e sua equipe entre!istam 34 famlias que !i!em no  pr0dio supracitado" locali$ado na famosa Copacabana. Com suas c5meras bem postas e a sa%acidade e o carisma que lhe eram peculiar" Coutinho arranca re!elações" sonhos" frustrações" dese+os e ambições de  pessoas comuns. A o re!er o filme esses dias" pensei o quo delicado 0 e sse retrato do cotidiano e de como encontramos um -difcio /aster a cada esquina e no nos damos conta. 6ico particul arment e tocad o quand o entro em conta to com a sabe doria popular . 6i$ %radua ço em 7sicolo%ia e" por isso" conheci a lon%a !erborra%ia da ,rea" que por !e$es tende a enfeitar demais as situações em elucubrações al0m da conta. Ao ou!ir a fala de uma pessoa absolutamente normal sobre assuntos cor riq ueiros" e no um %ra nde autor renomado e rep rod u$i do a e'a ust o" pod emo s nos surpreender com a densidade das pala!ras e da emoço que as acompanha. *udo isso porque estamos acostumados a alimentar a cultura da %rife" que implica em super!alori$ar o conhecido e i%norar o ordin,rio. Co ut inho " co mo e' ce pciona l docume nt arista que er a" no li %a !a para esses ! cios da modernidade. -scondido atr,s das suas lentes" s& incenti!a!a o entre!istado a falar. A m,%ica do cinema acontece na monta%em" todos n&s sabemos" mas s& o dar espaço para a e'posiço de um comum +, 0 al%o lou!,!el. - 0 esse material que sur%e que mostra o quanto" apesar dos pesares" somos parecidos uns com os outros em nossas !idas. - mais" a di!ersidade de tipos interro%ados fa$ com que o pr0dio se+a um microcosmo da cidade e" por consequ8ncia" da nossa sociedade. - tamb0m de n&s mesmos... Ao lon%o de todas as entre!istas conse%uimos perceber a quantidade de dramas humanos que esto presentes no cotidiano. 9ma senhora que !i!e so$inha di$ que a solido machuca muito" a ponto de !i!er uma !ida dupla. 7ara os ami%os ela se mant0m para cima" mas botar a cha!e na porta de casa a fa$ entrar em contato com a terr!el sensaço de estar s&. -ssa tr,%ica e crua descriço certamente nos 0 familiar. 7or !e$es queremos trancar os problemas e mer%ulharmos em nossos se%uros abri%os" mas sucumbimos diante dos seus efeitos danosos em n&s e re!elamos nossa fra%ilidade.

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Resenha sobre Edifício Master, documentário de Eduardo Coutinho.

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7/17/2019 Um Edifício Master a Cada Esquina

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Um Edifício Master a cada esquina

Aqui na coluna Cinema em Debate (LINK) eu escolho filmes para pontuar discussões sobre fatos

corriqueiros dos nossos dias. Acho interessante como a ficço re!ela !erdades" #s !e$es escondidas" a partir de persona%ens que s& e'istem no fa$ de conta. *oda!ia" dessa !e$ decidi escolher +ustamente um

document,rio" tal!e$ o meu fa!orito" para o te'to. -stou falando de -difcio /aster" do rec0m1falecido

-duardo Coutinho.

2osto de afirmar que filmes ser!em para pontuar discussões sobre fatos corriqueiros ou centrais

aos nossos dias. Acho interessante como a ficço re!ela !erdades" #s !e$es escondidas" a partir de

 persona%ens que s& e'istem no fa$ de conta. *oda!ia" document,rios sobre pessoas normais tamb0m

 podem muito bem fa$er essa funço" como o e'cepcional -difcio /aster" do +, falecido -duardo

Coutinho.

 Nesse pequeno mimo" o documentarista e sua equipe entre!istam 34 famlias que !i!em no

 pr0dio supracitado" locali$ado na famosa Copacabana. Com suas c5meras bem postas e a sa%acidade e o

carisma que lhe eram peculiar" Coutinho arranca re!elações" sonhos" frustrações" dese+os e ambições de

 pessoas comuns. Ao re!er o filme esses dias" pensei o quo delicado 0 esse retrato do cotidiano e de como

encontramos um -difcio /aster a cada esquina e no nos damos conta.

6ico particularmente tocado quando entro em contato com a sabedoria popular. 6i$ %raduaço

em 7sicolo%ia e" por isso" conheci a lon%a !erborra%ia da ,rea" que por !e$es tende a enfeitar demais as

situações em elucubrações al0m da conta. Ao ou!ir a fala de uma pessoa absolutamente normal sobre

assuntos corriqueiros" e no um %rande autor renomado e reprodu$ido a e'austo" podemos nos

surpreender com a densidade das pala!ras e da emoço que as acompanha. *udo isso porque estamos

acostumados a alimentar a cultura da %rife" que implica em super!alori$ar o conhecido e i%norar o

ordin,rio.

Coutinho" como e'cepcional documentarista que era" no li%a!a para esses !cios da

modernidade. -scondido atr,s das suas lentes" s& incenti!a!a o entre!istado a falar. A m,%ica do cinema

acontece na monta%em" todos n&s sabemos" mas s& o dar espaço para a e'posiço de um comum +, 0 al%olou!,!el. - 0 esse material que sur%e que mostra o quanto" apesar dos pesares" somos parecidos uns com

os outros em nossas !idas. - mais" a di!ersidade de tipos interro%ados fa$ com que o pr0dio se+a um

microcosmo da cidade e" por consequ8ncia" da nossa sociedade. - tamb0m de n&s mesmos...

Ao lon%o de todas as entre!istas conse%uimos perceber a quantidade de dramas humanos que

esto presentes no cotidiano. 9ma senhora que !i!e so$inha di$ que a solido machuca muito" a ponto de

!i!er uma !ida dupla. 7ara os ami%os ela se mant0m para cima" mas botar a cha!e na porta de casa a

fa$ entrar em contato com a terr!el sensaço de estar s&. -ssa tr,%ica e crua descriço certamente nos 0

familiar. 7or !e$es queremos trancar os problemas e mer%ulharmos em nossos se%uros abri%os" massucumbimos diante dos seus efeitos danosos em n&s e re!elamos nossa fra%ilidade.

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7/17/2019 Um Edifício Master a Cada Esquina

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:utra moradora" uma +o!em" se mudou da casa dos pais para o /aster na 0poca do cursinho pr01

!estibular. -nfrentou os desafios de morar so$inha e a saudade do lar e de seus confortos. -m sua fala

apresenta questionamentos parecidos com o da !elha canço -u *amb0m ;ou <eclamar" de <aul =ei'as>

?uem eu sou@Da onde !enho@- aonde !ou" d,@. A responsabilidade de decidir o seu futuro 0 uma

 presso que ainda no sabe como administrar" +, que no se ima%ina em nada. -st, ce%a diante das possibilidades que nessa etapa da !ida aparecem em profuso" mas receosa do que pode !ir a ser. A

imaterialidade do futuro 0 assustadora no s& para aquela moça" mas para todos n&s. 6ico ima%inando

qual caminho ela decidiu percorrer enquanto sorrio com o plano que sucede sua declaraço> uma +anela

aberta.

/as no 0 s& de momentos de apreenso que !i!e esse document,rio. 7or muitas !e$es achamos

%raça de conflitos de pequeno bur%u8s que so mostrados. *estemunhamos casais confabulando sobre

os amores do passado e os contrapondo com o presente" ponto que a relaço apresenta tpicos des%astes

que se refletem na di!iso irre%ular de tarefas dom0sticas" 5nsias de que no so mais to amados e

demais desentendimentos.

:utro conflito dessa linha est, em uma famlia que passou a ser discriminada pelo fato de terem

se mudado da $ona norte para a Copacabana. :s anti%os !i$inhos" muito mais amistosos e pr&'imos que

os no!os do /aster se%undo o relato deles" os olham a%ora com desconfiança. Isso se d, por apostarem

em uma ascenso social dos entre!istados" +, que passaram a residir em uma ,rea nobre da cidade.

I%nora!am completamente a metra%em redu$ida do im&!el e desconheciam que o patriarca esta!a

desempre%ado" mas o simples morar no badalado bairro dei'a!a uma marca desconfort,!el. -ra como se

no pertencessem mais #quele anti%o lu%ar. Curioso 0 que a famlia em questo no esta!a plenamente

confort,!el na no!a casa nem ha!iam resol!ido o embate entre o saudosismo do passado com a !ida no

 presente.

6alando em passado" tal!e$ o trecho mais emocionante do document,rio se+a a fala do !iB!o

enrique. -le conta sobre como foi !i!er nos -9A e narra uma e'peri8ncia que lhe marcou a !ida> a !e$

que cantou com 6ran =inatra. E tocante !er como esse momento de %rande$a 0 reprodu$ido com tanta

ener%ia pelo morador" que construiu o h,bito de ocasionalmente cantar /F GaF" a mBsica com que

di!idiu os palcos com o astro" para os !i$inhos aos s,bados. 7odemos !islumbrar um pouco disso quando

ele se apresenta diante das c5meras e fa$ malabarismos para controlar o choro.

- 0 cada um em seu +eito e cada hist&ria a sua maneira que passeamos pelas fi%uras de -difcio

/aster enquanto as dei'amos passarem por n&s. -m quase duas horas de pro+eço contemplamos o

ordin,rio e encontramos bele$a no banal" como nas cenas de um %rupo le!ando um bolo de ani!ers,rio

 para uma ami%a" de uma criança preocupada com o %atinho da !i$inha no corredor ou da menina que

canta no chu!eiro quando est, feli$. -m tempos que o corriqueiro 0 to cin$a e apressado" filmes como

esse nos ensinam que ainda h, o que se admirar no cotidiano.