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COMENTÁRIO DA PROVA DE PORTUGUÊS Prova fundamentada na compreensão de textos, valendo-se para isso de cinco belos excertos a orientar as questões. Em tempos de jornalismo partidário travestido de “imparcialidade democrática”, sempre é interessante lembrar – até mesmo numa situação de prova – como a linguagem e a veiculação de informações se prestam a manipulações, embora boa parte dos leitores não veja assim. Além desses dois textos abordando tal aspecto de nossa realidade (o trecho do romance de Umberto Eco e o artigo de Venício Lima), mais dois artigos sobre comportamento (Hélio Schwartsman e Rosely Sayão) enriquecem a discussão ao olhar do aluno atento ao noticiário do dia a dia – a lembrança à questão do conceito de família é exemplo disso, sem dúvida. Aliás, esse debate somado à redução da maioridade penal aponta para uma segunda fase que aprofunde o olhar sobre a guinada conservadora verificada no Congresso Nacional neste ano de 2015. Importante também que em uma prova de língua haja um toque metalinguístico, como no texto do professor Sírio Possenti. O que se lamenta é que tenha sido APENAS UM toque em 12 questões. O questionamento gramatical ainda parece “diluído” na prova de português da Federal. Em suma, uma prova equilibrada, com textos à feição do aluno informado e sintonizado com questões fundamentais do debate público em que nos vemos atualmente. Tomara, apenas, que a pertinência das ideias levantadas por esse exame não melindre os patrulhadores da “doutrinação” nas escolas e provas. A estes, o recado da Federal parece muito claro: o jovem sabe pensar e merece discutir o mundo à sua volta. 1 PORTUGUÊS

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COMENTÁRIO DA PROVA DE PORTUGUÊS

Prova fundamentada na compreensão de textos, valendo-se para isso de cinco belos excertos a orientar asquestões.

Em tempos de jornalismo partidário travestido de “imparcialidade democrática”, sempre é interessante lembrar – atémesmo numa situação de prova – como a linguagem e a veiculação de informações se prestam a manipulações, emboraboa parte dos leitores não veja assim.

Além desses dois textos abordando tal aspecto de nossa realidade (o trecho do romance de Umberto Eco e o artigode Venício Lima), mais dois artigos sobre comportamento (Hélio Schwartsman e Rosely Sayão) enriquecem a discussãoao olhar do aluno atento ao noticiário do dia a dia – a lembrança à questão do conceito de família é exemplo disso, semdúvida. Aliás, esse debate somado à redução da maioridade penal aponta para uma segunda fase que aprofunde o olharsobre a guinada conservadora verificada no Congresso Nacional neste ano de 2015.

Importante também que em uma prova de língua haja um toque metalinguístico, como no texto do professor SírioPossenti. O que se lamenta é que tenha sido APENAS UM toque em 12 questões. O questionamento gramatical aindaparece “diluído” na prova de português da Federal.

Em suma, uma prova equilibrada, com textos à feição do aluno informado e sintonizado com questões fundamentaisdo debate público em que nos vemos atualmente. Tomara, apenas, que a pertinência das ideias levantadas por esseexame não melindre os patrulhadores da “doutrinação” nas escolas e provas. A estes, o recado da Federal parece muitoclaro: o jovem sabe pensar e merece discutir o mundo à sua volta.

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Resolução:

Na resposta de Colonna, a estratégia jornalística é explicada de modo muito claro: primeiramente, toma-se a opinião de umhomem comum sobre algo, colocando-se tal ideia entre aspas, para que ela se torne um fato à vista de quem lê. Depois, emum segundo momento, adiciona-se uma opinião que pareça mais racional, abalizada – e, portanto, com maior crédito.Assim, a posição do jornal é veiculada sutilmente por meio dessa “opinião” de um cidadão qualquer, opondo-se à primeira,que é meramente ilustrativa.

Essa estratégia justifica explicitamente os itens 1 e 3. Por extensão, entende-se que o expediente é usado para salientar oponto de vista que interessa ao jornal.

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Resolução:

O procedimento mencionado na resposta da questão 1 mostra como as opiniões das pessoas – tomadas como fatos – sãoutilizadas como recurso para manipular as informações em um jornal.

a) Errada: Simei não afirma que os jornais sigam estritamente o princípio da separação, mesmo porque ele é negado naresposta de Colonna.

c)Errada: Simei não está pregando a separação entre fatos e opiniões, muito menos propondo que isso seja explicitado nosartigos como uma obrigatoriedade do jornalismo.

d) Errada: Na verdade, Colonna mostra como o jornalismo induz a uma leitura e, portanto, age de forma parcial.

e) Errada: A citação ao uso de aspas não tem nada a ver com a fidelidade nas informações, mas em fazer com que uma opi-nião pareça um fato.

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Resolução:

A pergunta que encerra o parágrafo inicial já responde à questão. Resposta a.

As alternativas incorretas são excluídas pelos seguintes trechos:

b) “... que a vontade de punir impere sem restrições”

c) “... nem o grau de parentesco...”

d) “... que vai contra o instinto”

e) É o que o texto chama de “justiça retributiva” que faz o sucesso dos filmes de Hollywood.

Resolução:

A resposta está na frase anterior a esta, no segundo parágrafo:

“Se você pretende produzir seres sociais, precisa encontrar um modo de fazer com que eles colaborem uns com osoutros e, ao mesmo tempo, se protejam dos indivíduos dispostos a explorá-los”.

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Resolução:

No texto, o verbo “soçobrar” é intransitivo. Esse aspecto da regência nos levaria a duas opções B ou C . O significado,“acabar”, está descrito na alternativa D .

Resolução:

Em 1 , o verbo se refere ao tamanho do sapato, não o lugar.

Em 4 , o erbo se refere a tempo.

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Resolução:

O verbo “ir” funciona como verbo auxiliar de futuro composto na frase da alternativa C .

Resolução:

A frase final do terceiro parágrafo claramente informa que as manchetes negativas são as mais atraentes ao leitor. O com-plemento a essa ideia se vê no quinto parágrafo, em que se detalham procedimentos de telejornal e de seus âncoras salien-tando catástrofes, acidentes e toda sorte de aspectos negativos de uma notícia.

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Resolução:

Diz-se no quinto parágrafo que se reforçam na notícia justamente seus aspectos e consequências funestos (= “fatais”, “queproduzem desgraça”). Em seguida, na conclusão, explica-se que esse procedimento poderá, em algum momento, cansarum leitor/telespectador empurrado diariamente para um cenário (“vale de lágrimas”) sombrio (“medievalesco”).

Resolução:

“Sujeito posposto” vem após o verbo, em ordem indireta. Na alternativa a), colocando-se o trecho na ordem direta, tería-mos: “69.907 manchetes veiculadas em quatro sites noticiosos internacionais (...) foram identificadas, (...)”

b) O sujeito é o pronome relativo “que”, anteposto ao verbo “atrair”.

c) “Os principais telejornais exibidos na televisão brasileira” é o sujeito anteposto à forma verbal “estão”.

d) “Os âncoras dos telejornais” (...) se encarregam – ordem direta.

e) “Os resultados do trabalho dos pesquisadores do DCC-UFMG” nos ajudam” – ordem direta.

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Resolução:

Baseada em um texto de Rosely Sayão, a questão traz interessante e oportuna discussão sobre a concepção legal de famí-lia.

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A respeito das proposições pode-se dizer:

1. A leitura atenta do terceiro parágrafo e a percepção da importância dos marcadores de tempo “Desde o início da segundametade do século passado” e “Até então” indicam a assertiva como correta.

2. A leitura do quinto parágrafo demonstra como correta a afirmativa.

3. A afirmação não é demonstrada pelo texto. Nesse sentido, o texto apenas afirma que pode haver pessoas sob o mesmoteto ou que têm relações de parentesco, mas que não guardam entre si vínculo afetivo. Não se fala em desestabilizaçãosocial e a afirmativa é, portanto, incorreta.

4. A frase entre travessões no segundo parágrafo do texto traz claramente a ideia de exclusão (absurda e lastimável) dasdefinições de família que não se encaixem no conceito da Câmara.

Assim, a afirmação é correta.

Resolução:A primeira afirmação é verdadeira e não requer discussão ou comentários.

A segunda afirmação é claramente falsa, pois a estrutura da frase deixa claro que a Câmara dos Deputados é que consi-dera certa a definição e não há a adesão da autora do texto, cuja argumentação conduz à opinião contrária.

A terceira afirmação é verdadeira e, inclusiva, esclarece parte da resolução da questão anterior.

A quarta afirmação é falsa. É obvio que se trata de dois períodos distintos: o período após 1950 e o período anterior a isso.

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COMENTÁRIO DA PROVA DE LITERATURA

Das 10 obras indicadas como leitura obrigatória, 6 foram cobradas nas questões. Duas delas dispensavam a leitura,uma vez que exigiram mais interpretação de poema transcrito do que conhecimentos específicos sobre a leitura, autor,estilo de época, contexto histórico, etc.).

As questões poderiam, assim, ser divididas em duas mais complicadas, duas de nível médio e duas de resoluçãoquase direta.

Uma distribuição razoável quanto ao nível de dificuldade, o que determina maior valorização dos candidatos maisbem preparados.

Gostaríamos de constatar nas questões a presença mesmo discreta de elementos estilísticos dos estilos de época ede uma ou outra questão estabelecendo paralelos entre elementos de duas ou mais obras exigidas.

Resolução:Interpretação e análise de um poema barroco de Gregório de Matos. O poeta contrapõe a instabilidade das marés, provo-cada pela instabilidade da Lua, à persistência contínua sem trégua, de seus sofrimentos.

a) INCORRETA. A temática do poema é pessoal. O poeta compara o sobe e desce das marés ao vaivém das angústias doeu poético. Além do que, no poema, o mundo está em harmonia: o ciclo das marés, as fases da lua, a natureza como umtodo.

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b) CORRETA. O “eu poético” afirma que, ao contrário das marés que sobem e descem os seus “azares” ou sofrimentos,nunca tem maré baixa.

c) INCORRETA. Porque é a mutabilidade da lua que provoca os altos e baixos das marés, diferentes dos males do eu poé-tico que nunca têm trégua.

d) INCORRETA. A poesia barroca se caracterizou pela complexidade e pelos conflitos. O ideal de simplicidade e bucolismo,cujo lema era a aurea mediocritas, caracterizava a poesia do Arcadismo e não do Barroco.

e) INCORRETA. Há um descompasso entre a natureza, que sempre segue os seus ciclos, e o eu lírico, imerso em seusconstantes tormentos. Tal tensão configura-se como tipicamente barroca.

Resolução:Análise sobre características do Naturalismo. A leitura integral da obra revelava a perspectiva do narrador e os recursos nar-rativos empregados por ele.

Questão muito boa, que mostrou o quanto uma obra tão fortemente enquadrada numa estética pode possuir certos elemen-tos mais recorrentes em outra, o que contribui para a riqueza literária de um texto.

a) INCORRETA. Item perigoso, pelo seguinte: a narrativa naturalista é pautada pela “objetividade” – sobretudo quando secomparada com as subjetivas narrativas românticas – e pela “riqueza de detalhes”. Porém, o trecho destacado, presenteno capítulo 3, demonstra traços mais subjetivos e muito próximos do Romantismo. Trata-se de um contraponto às descri-ções mais patológicas, presentes no mesmo capítulo e no todo da obra, nas quais há uma adjetivação mais econômica ecenas desprovidas de maior beleza.

b) INCORRETA. O texto citado é exemplo de ação e não de reflexão. Além do que o refinamento de valores culturais não fazparte do ideário naturalista.

c) INCORRETA. As referências à cultura grega são do narrador que tenta vislumbrar em Amaro o despertar de um senti-mento estático e não da personagem que vê apenas o aspecto sensual das formas de Aleixo.

d) INCORRETA. Novamente, as referências à obra de Shakespeare são do narrador, pois Amaro era analfabeto e total-mente ignorante a respeito de obras literárias. As intenções de vingança por parte de Bom-Crioulo são explícitas em suasruminações obsessivas.

e) CORRETA. É o narrador que interpreta os sentimentos, conflitos e angústias de Amaro, traduzindo para o leitor o infernodesesperador que se instalou na mente da personagem.

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Resolução:A leitura dos contos de Machado de Assis era essencial para a resolução desta questão que não apresentou grandes dificul-dades.

1. Correta. O editor da obras de Pestana, além de atribuir às composições do artista títulos relacionados a fatos da política,expressava claramente a intenção de utilizar as músicas como instrumentos de bajulação aos poderosos.

2. Incorreta. Não houve nenhuma relação adúltera entre Garcia e Maria Luísa. Houve apenas a cena em que Fortunato,espiando da porta, deliciou-se sadicamente com o sofrimento desesperado de Garcia beijando o cadáver dela.

3. Correta. Pilar, o menino narrador, depois de ser castigado e humilhado na frente dos colegas, reconheceu ter aprendidoduas lições sobre a corrupção (a moedinha de prato) e a delação (a denúncia do colega).

4. Incorreta. O narrador parte de uma perspectiva masculina. D. Paula e Venancinha, inclusive com surpreendente coinci-dência de personagens, tentaram escolher o seu destino, mas tiveram que voltar atrás, justamente por causa das regrassociais.

5. Correta. O substantivo e o adjetivo chamados de Sílvio e Sílvia buscam-se ansiosamente nos diversos patamares erecantos do cérebro do escritor, como os amantes bíblicos do “Cântico do cânticos”.

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Resolução:Esta questão exigia capacidade de interpretação e análise criteriosa, a partir da leitura integral de obra.

a) CORRETA. Esta atitude de imobilidade de Ana diante dos apelos amorosos de André será determinante para sua saídade casa. Na festa de seu retorno, a dança de Ana enfeitada com os fetiches e adereços das prostitutas, que Andrécolecionava, revelará seus sentimentos e desejos com relação ao irmão.

b) INCORRETA. Quando fala da agricultura, André é explícito e objetivo. Sua fala se torna metafórica e enigmática quandotenta revelar seus conceitos morais e sua atração pela irmã.

c) INCORRETA. Na verdade, em nenhum momento aparecem falas da personagem Ana, que se expressa através de atitu-des e movimentos corporais como na dança.

d) INCORRETA. O livro não faz referência explícitas ao texto bíblico. Pela leitura é que percebemos os princípios da Bíblia edo Alcorão inspirando as falas dos personagens, principalmente do pai.

e) INCORRETA. A linguagem do pai é quase sempre explícita. As falas de André, principalmente no diálogo com o pai apóso retorno, são alegóricas, metafóricas, tanto que chegam a confundir e a irritar o pai.

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Resolução:Um dos mais belos poemas de amor escritos por Carlos Drummond de Andrade. A complexidade deste sentimento, a intrín-seca necessidade que o ser humano tem dele e as infinitas formas, possibilidades e contradições implícitas na sua prática.

a) INCORRETA. Ao contrário, os versos afirmam a obrigatoriedade e a inevitabilidade do amor.Trata-se de perguntas retóricas que apontam exatamente o oposto: é nosso destino amar, apesar de tudo.

b) INCORRETA. O eu poético afirma: Este o nosso destino: amor sem conta. O amor deve ser intenso tanto com relação aobelo como com relação ao grotesco. “e amar o inóspito, o áspero...”vale dizer, há um “amar” de tudo, mesmo daquilo não tão belo: amar o áspero, o pérfido, o nulo, o inóspito, etc.

c) INCORRETA. Segundo o poema, não há justificativa para o amor: “Amar a nossa falta mesma de amor...” Além do que opoema fala de elementos não tão delicados assim por natureza.

d) CORRETA. “Que pode, pergunto, o ser amoroso (o sujeito), sozinho em rotação universal, (a condição universal) senãorodar também e amar? (a ação praticada) Amar o que o mar traz à praia” (os objetos a que essa ação se dirige).Amar as nossas faltas, amar o que está ao nosso redor, por ser esta a nossa essência: talvez seja a fusão a que se refereesta alternativa.

e) INCORRETA. Primeiramente, não se trata de um soneto. Além disso, o final do poema reitera a eficiência do amor,mesmo diante de situações aparentemente caóticas e impeditivas para a realização do amor.

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Resolução:Questão excelente. Nossos alunos certamente se sentiram recompensados pelos esforços do ano inteiro.

1. INCORRETA. O romance não cita documentos históricos; as informações biográficas sobre Augusto do Anos e OlavoBilac não são precisas e, nem o rigor científico, nem o estilo descritivo os caracterizam.

2. CORRETA. É recorrente no transcorrer da narrativa a presença de versos, expressões e vocábulos utilizados nos poe-mas de Augusto dos Anjos, destacando o teor negativista de suas composições.

3. INCORRETA. A perspectiva do narrador, como “personagem”, é de participação na história, o que proporciona um efeitode veracidade à narrativa.

4. CORRETA. O narrador apresenta a biografia das personagens com riqueza de detalhes e particularidade intimistas reve-lando aspectos conflituosos de sua personalidade.

5. CORRETA. Ana Miranda, ancorada em registros históricos e na imprensa da época, revela magistralmente as transfor-mações físicas, sociais e comportamentais do Rio de Janeiro, não só no final do século XIX mas também no início doséculo XX.

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