turma recursal da bahia condena telemar

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COJE – COORDENAÇÃO DOS JUIZADOS ESPECIAIS TURMAS RECURSAIS CÍVEIS E CRIMINAIS Pça. D. Pedro II, s/n, Fórum Rui Barbosa, Nazaré, Salvador/Ba –Tel/3320-6904 TERCEIRA TURMA - CÍVEL E CRIMINAL PROCESSO Nº 032.2009.000.353-7 PROJUDI - Cível RECORRENTE: MARIA ARAÚJO SANTOS RECORRIDA: TELEMAR NORTE LESTE S/A RELATOR (A): JUIZ(A) BALTAZAR MIRANDA SARAIVA EMENTA: RECURSO INOMINADO. CONTRATO DE TELEFONIA FIXA. COBRANÇAS DE TARIFA MENSAL DE ASSINATURA DE USO RESIDENCIAL. AUSÊNCIA DE INTERESSE JURÍDICO DA ANATEL NA DISCUSSÃO A JUSTIFICAR SUA INTERVENÇÃO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL PARA CONHECER E JULGAR A CAUSA, COM ATRIBUIÇÃO PERMITIDA AOS JUIZADOS ESPECIAIS. NÃO CONFIGURAÇÃO DE CAUSA COMPLEXA. PRELIMINARES REJEITADAS. RECONHECIMENTO DA LEGALIDADE DA COBRANÇA DA ASSINATURA MENSAL. RECURSO PROVIDO PARA SE REFORMAR EM PARTE A SENTENÇA HOSTILIZADA, DECLARANDO A ABUSIVIDADE E ILEGALIDADE DAS COBRANÇAS DIRIGIDAS À PARTE RECORRENTE A TÍTULO DE “ASSINATURA BÁSICA” POR MALFERIR A CF E NORMAS DO CDC, CONDENANDO A RECORRIDA A RESTITUIR À PARTE RECORRENTE, DE FORMA SIMPLES, OS VALORES RESPECTIVOS PAGOS NAS FATURAS, NÃO ALCANÇADAS PELA PRESCRIÇÃO QÜINQÜENAL, CONFORME REQUERIDO NA INICIAL, FICANDO CIENTE A RECORRIDA QUE O NÃO PAGAMENTO DA QUANTIA NA QUAL FOI CONDENADA, APÓS 15 DIAS DO TRÂNSITO EM JULGADO, HAVERÁ INCIDÊNCIA DE 10% SOBRE O VALOR DA CONDENAÇÃO. TRATANDO-SE DE RECURSO VENCEDOR, SEM CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS, A TEOR DO QUE DISPÕE O ART. 55, CAPUT, DA LEI 9.099/95. ACÓRDÃO Realizado Julgamento do Recurso do processo acima epigrafado. A TERCEIRA TURMA, composta dos Juízes de Direito, BALTAZAR MIRANDA SARAIVA, JOSEFA CRISTINA TOMAZ MARTINS KUNRATH, LICIA MARIA MELLO DE MESQUITA, decidiu, à unanimidade de votos, REJEITAR AS PRELIMINARES ADUZIDAS e, no mérito, DAR PROVIMENTO EM PARTE AO RECURSO interposto, para se reformar a sentença hostilizada, declarando a abusividade e ilegalidade das cobranças dirigidas à parte Recorrente a título de “assinatura básica”, condenando a Recorrida a restituir à parte Recorrente de forma simples, os valores respectivos pagos nas faturas e por saber-se certo a cobrança mês a mês, independente de consumo ou não, a devolução deverá incidir de todas as contas pagas pela parte autora, mesmo aquelas não juntadas aos autos, obedecida a prescrição qüinqüenal, conforme requerido na inicial, ficando ciente a Recorrida que o não pagamento da quantia na qual foi condenada, após 15 dias do trânsito em julgado, haverá incidência de 10% sobre o valor da condenação. Tratando-se de recurso vencedor, sem condenação em honorários advocatícios, a teor do que dispõe o art. 55, caput, da Lei 9.099/95. Salvador, Sala das Sessões, em 03 de fevereiro de 2010 JUIZ(A) BALTAZAR MIRANDA SARAIVA Presidente/Relator(a)

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Juiz Baltazar Miranda condena telemar

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COJE – COORDENAÇÃO DOS JUIZADOS ESPECIAISTURMAS RECURSAIS CÍVEIS E CRIMINAIS

Pça. D. Pedro II, s/n, Fórum Rui Barbosa, Nazaré, Salvador/Ba –Tel/3320-6904

TERCEIRA TURMA - CÍVEL E CRIMINALPROCESSO Nº 032.2009.000.353-7 PROJUDI - Cível

RECORRENTE: MARIA ARAÚJO SANTOSRECORRIDA: TELEMAR NORTE LESTE S/ARELATOR (A): JUIZ(A) BALTAZAR MIRANDA SARAIVAEMENTA: RECURSO INOMINADO. CONTRATO DE TELEFONIA FIXA.

COBRANÇAS DE TARIFA MENSAL DE ASSINATURA DE USO RESIDENCIAL. AUSÊNCIA DE INTERESSE JURÍDICO DA ANATEL NA DISCUSSÃO A JUSTIFICAR SUA INTERVENÇÃO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL PARA CONHECER E JULGAR A CAUSA, COM ATRIBUIÇÃO PERMITIDA AOS JUIZADOS ESPECIAIS. NÃO CONFIGURAÇÃO DE CAUSA COMPLEXA. PRELIMINARES REJEITADAS. RECONHECIMENTO DA LEGALIDADE DA COBRANÇA DA ASSINATURA MENSAL. RECURSO PROVIDO PARA SE REFORMAR EM PARTE A SENTENÇA HOSTILIZADA, DECLARANDO A ABUSIVIDADE E ILEGALIDADE DAS COBRANÇAS DIRIGIDAS À PARTE RECORRENTE A TÍTULO DE “ASSINATURA BÁSICA” POR MALFERIR A CF E NORMAS DO CDC, CONDENANDO A RECORRIDA A RESTITUIR À PARTE RECORRENTE, DE FORMA SIMPLES, OS VALORES RESPECTIVOS PAGOS NAS FATURAS, NÃO ALCANÇADAS PELA PRESCRIÇÃO QÜINQÜENAL, CONFORME REQUERIDO NA INICIAL, FICANDO CIENTE A RECORRIDA QUE O NÃO PAGAMENTO DA QUANTIA NA QUAL FOI CONDENADA, APÓS 15 DIAS DO TRÂNSITO EM JULGADO, HAVERÁ INCIDÊNCIA DE 10% SOBRE O VALOR DA CONDENAÇÃO. TRATANDO-SE DE RECURSO VENCEDOR, SEM CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS, A TEOR DO QUE DISPÕE O ART. 55, CAPUT, DA LEI 9.099/95.

ACÓRDÃORealizado Julgamento do Recurso do processo acima epigrafado. A

TERCEIRA TURMA, composta dos Juízes de Direito, BALTAZAR MIRANDA SARAIVA, JOSEFA CRISTINA TOMAZ MARTINS KUNRATH, LICIA MARIA MELLO DE MESQUITA, decidiu, à unanimidade de votos, REJEITAR AS PRELIMINARES ADUZIDAS e, no mérito, DAR PROVIMENTO EM PARTE AO RECURSO interposto, para se reformar a sentença hostilizada, declarando a abusividade e ilegalidade das cobranças dirigidas à parte Recorrente a título de “assinatura básica”, condenando a Recorrida a restituir à parte Recorrente de forma simples, os valores respectivos pagos nas faturas e por saber-se certo a cobrança mês a mês, independente de consumo ou não, a devolução deverá incidir de todas as contas pagas pela parte autora, mesmo aquelas não juntadas aos autos, obedecida a prescrição qüinqüenal, conforme requerido na inicial, ficando ciente a Recorrida que o não pagamento da quantia na qual foi condenada, após 15 dias do trânsito em julgado, haverá incidência de 10% sobre o valor da condenação. Tratando-se de recurso vencedor, sem condenação em honorários advocatícios, a teor do que dispõe o art. 55, caput, da Lei 9.099/95.

Salvador, Sala das Sessões, em 03 de fevereiro de 2010

JUIZ(A) BALTAZAR MIRANDA SARAIVAPresidente/Relator(a)

TERCEIRA TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS E CRIMINAIS.CLASSE: RECURSO INOMINADO nº 032.2009.000.353-7 – PROJUDI.RECORRENTE: MARIA ARAÚJO SANTOS.RECORRIDA: TELEMAR NORTE LESTE S/A.RELATOR: JUIZ BALTAZAR MIRANDA SARAIVA

EMENTA: RECURSO INOMINADO. CONTRATO DE TELEFONIA FIXA. COBRANÇAS DE TARIFA MENSAL DE ASSINATURA DE USO RESIDENCIAL. AUSÊNCIA DE INTERESSE JURÍDICO DA ANATEL NA DISCUSSÃO A JUSTIFICAR SUA INTERVENÇÃO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL PARA CONHECER E JULGAR A CAUSA, COM ATRIBUIÇÃO PERMITIDA AOS JUIZADOS ESPECIAIS. NÃO CONFIGURAÇÃO DE CAUSA COMPLEXA. PRELIMINARES REJEITADAS. RECONHECIMENTO DA LEGALIDADE DA COBRANÇA DA ASSINATURA MENSAL. RECURSO PROVIDO PARA SE REFORMAR EM PARTE A SENTENÇA HOSTILIZADA, DECLARANDO A ABUSIVIDADE E ILEGALIDADE DAS COBRANÇAS DIRIGIDAS À PARTE RECORRENTE A TÍTULO DE “ASSINATURA BÁSICA” POR MALFERIR A CF E NORMAS DO CDC, CONDENANDO A RECORRIDA A RESTITUIR À PARTE RECORRENTE, DE FORMA SIMPLES, OS VALORES RESPECTIVOS PAGOS NAS FATURAS, NÃO ALCANÇADAS PELA PRESCRIÇÃO QÜINQÜENAL, CONFORME REQUERIDO NA INICIAL, FICANDO CIENTE A RECORRIDA QUE O NÃO PAGAMENTO DA QUANTIA NA QUAL FOI CONDENADA, APÓS 15 DIAS DO TRÂNSITO EM JULGADO, HAVERÁ INCIDÊNCIA DE 10% SOBRE O VALOR DA CONDENAÇÃO. TRATANDO-SE DE RECURSO VENCEDOR, SEM CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS, A TEOR DO QUE DISPÕE O ART. 55, CAPUT, DA LEI 9.099/95.

Dispensado o relatório nos termos do artigo 46 da Lei n.º 9.099/951, homenageado pelo enunciado 92 do FONAJE2.

1 Art. 46. O julgamento em segunda instância constará apenas da ata, com a indicação suficiente do processo, fundamentação sucinta e parte dispositiva. Se a sentença for confirmada pelos próprios fundamentos, a súmula do julgamento servirá de acórdão.

2 Enunciado nº 92: Nos termos do art. 46 da Lei nº 9099/95, é dispensável o relatório nos julgamentos proferidos pelas Turmas Recursais.

Circunscrevendo a lide e a discussão recursal para efeito de registro, saliento que a Recorrente MARIA ARAÚJO SANTOS, requerendo os benefícios da assistência judiciária gratuita, pretende a reforma da sentença de fl., que reconheceu a legalidade das cobranças empreendidas sob a rubrica de “assinatura residencial”, relacionadas à linha telefônica pertencente à mesma.

Os autos virtuais foram distribuídos para esta 3a Turma Recursal, cabendo-me por sorteio a função de relator. Após examiná-los, submeto aos demais membros desta E. Corte o meu

V O T O

Conheço do recurso, pois apresentado tempestivamente.

Inicialmente, saliento a necessidade de o julgamento em segunda instância no sistema de juizados especiais atentar para os princípios da simplicidade e objetividade recomendados pelo dispositivo legal acima invocado. Por isso mesmo, reza o enunciado 46 do FONAJE que “a fundamentação da sentença ou do acórdão poderá ser feita oralmente, com gravação por qualquer meio, eletrônico ou digital, consignando-se apenas o dispositivo na ata”.

Analisando os fatos debatidos no feito em julgamento, não tenho dúvida de que o recurso merece provimento em parte.

Incorporo os argumentos apresentados pelo MM. Juízo a quo na sentença recorrida para efeito de afastar as preliminares suscitadas novamente pela Recorrida em suas contra-razões do recurso que poderiam conduzir à extinção do processo sem julgamento do cerne.

Analisando-se as argüidas preliminares constata-se que merecem ser rejeitadas.

Verifica-se que todas elas vêm sendo objeto de argüição nos inúmeros processos que tramitaram e tramitam nos Juizados Cíveis e perante as Turmas Recursais, sendo os argumentos e fundamentos do inacolhimento os mesmos – falta de amparo legal.

Segundo pacífico entendimento da jurisprudência, em feitos da espécie não há interesse jurídico reclamando a intervenção da ANATEL, na medida em que as repercussões do julgado não atingirão sua órbita jurídica, mas tão-somente às partes envolvidas.

Sem a necessidade do chamamento da ANATEL, que deslocaria a discussão para a Justiça Federal, subsiste a competência da Justiça Estadual para conhecer e julgar a ação, respeitando-se, em conseqüência, a atribuição do Juizado Especial Cível.

De igual modo, não vislumbro na causa complexidade factual e probatória de grandes proporções de modo a impedir sua apreciação pelo sistema dos juizados especiais.

Portanto, diante dos inúmeros acórdãos, todos pela rejeição, e acolhendo as razões expendidas pelo douto julgador de instância primeira, ratifico o entendimento já pacificado neste colegiado, rejeitando-os mais uma vez.

No mérito, conforme já ressaltado, a sentença guerreada merece ser reformada em parte.

A meu ver, agiu bem o nobre Juízo a quo ao recusar a incidência da decadência no caso em julgamento. De fato, não se tratando de vício que torne o serviço impróprio ou inadequado ao consumo, já que não se discute a eficácia do sistema que permite realizar as ligações telefônicas, inaplicável se torna o disposto no art. 26, II, do CDC.

Quanto à cobrança da chamada “assinatura básica”, reconheço que o assunto é polêmico, sendo ainda objeto de exaustivo debate, especialmente no seio do Judiciário. Longe de uma pacificação, alinham-se importantes argumentos contrários e a favor da exigência imposta aos usuários do serviço de telefonia fixa, alguns trazidos à baila nos autos em julgamento, sendo despiciendo reproduzi-los integralmente, até porque, conforme já ressaltado, a sentença guerreada deve ter seus termos confirmados na inteireza por seus próprios e jurídicos fundamentos que, assim, aqui são integrados.

Para que se tenha uma idéia da polêmica instaurada em torno do assunto, até mesmo a respeitada organização Pro Teste – Associação Brasileira de Defesa do Consumidor, incansável defensora dos direitos dos consumidores, não se opõe ao pagamento da tarifa discutida, embora por questões eminentemente econômicas (http://www.proteste.org.br).

Após intensa reflexão a respeito do tema, conhecendo, inclusive, os argumentos da cadeia favorável à cobrança, com destaque para os julgados oriundos da 1ª Turma do STJ, relatados pelo Ministro José Delgado, e de insignes colegas componentes do Sistema de Juizados Especiais Cíveis da Bahia, filiei-me a corrente que entende ilegal a cobrança perpetrada pelas empresas de telefonia, resignando-me com a incapacidade de acrescentar novidade à discussão.

A remuneração pela prestação de serviços públicos tem origem remota no art. 175 da Constituição Federal, o qual expressa que a sua cobrança depende da edição de lei3. Essa remuneração, envolvendo a delegação da prestação do serviço, trata-se de tarifa, que, decorrente de contrato, é regida por normas e princípios do Direito Privado, pelo que somente poderá ser cobrada se e quando ocorrer a efetiva utilização do serviço que justifica o pagamento, não cabendo, como ocorre nas hipóteses de remuneração por meio de taxa, a cobrança pela sua simples disponibilidade.

A Constituição Federal também estabelece, em seu art. 22, IV4, que compete privativamente à União legislar sobre telecomunicações, não cogitando compartilhamento ou delegação dessa competência. Por outro lado, do texto constitucional também emerge a certeza de que o direito do consumidor é objeto de tutela constitucional fundamental especial (CF, arts. 170, V5 e 5º, XXXII6), que irmanado ao princípio da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III7), veicula verdadeiras diretrizes do ordenamento jurídico, estabelecendo limites à atuação do próprio Estado, afastando a possibilidade de se atribuir o mesmo peso a outros dispositivos normativos, inclusive constitucionais, que não possuam a mesma importância eleita pelo legislador constituinte em núcleo rígido. Por isso, até mesmo as normas da competência da União deverão seguir as vinculações estabelecidas na Carta Magna no sentido de promover à defesa dos direitos fundamentais, sob pena de inconstitucionalidade.

Assim, na interpretação sistemática dos dispositivos legais

3 Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos.Parágrafo único. A lei disporá sobre:...III - política tarifária;...

4 Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:...IV - águas, energia, informática, telecomunicações e radiodifusão;...

5 Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:...V - defesa do consumidor;...

6 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: ...XXXII - o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor;...

7 Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:... III - a dignidade da pessoa humana;...

lembrados nos autos à luz dos fatos debatidos, não tenho dúvida de que a cobrança da também chamada “assinatura básica” fere regras, princípios e normas legais, sobretudo aqueles dispostos no Código de Defesa do Consumidor.

A “tarifa de assinatura residencial” representa na prática a venda de um pacote mínimo de serviços, onde o consumidor é obrigado a adquiri-lo sob a alegação de ser concedida uma franquia de pulsos. Só que a cobrança é empreendida mesmo que o serviço não seja efetivado, ou seja, mesmo que o consumidor não utilize a franquia, violando o art. 39, I, do CDC8.

Travestida de taxa, uma vez que, independentemente do uso, o consumidor vê-se compelido a pagar compulsoriamente o respectivo valor de forma contínua, sua cobrança é perpetrada em contrato de adesão, subscrito pelo consumidor sem possibilidade de discussão de suas cláusulas e condições, que as aceita pela necessidade premente de obter o serviço já havido como essencial. Sem poder economizar nos gastos com o telefone fixo, posto que se vê obrigado a pagar por um consumo mínimo pré-determinado, ainda que não tenha utilizado o serviço, se não fizer o pagamento mensal terá o serviço suspenso e seu nome acabará inscrito em órgão de restrições creditórias. Assim, por todos os ângulos, essa tarifa encerra desproporcionalidade nas obrigações contratuais (desequilíbrio econômico-financeiro), gerando onerosidade excessiva ao consumidor, fulminando ainda a função social que todo pacto deve ter, devendo a cobrança, assim, encontrar o reconhecimento da nulidade por força do art. 51, IV9, e parágrafo primeiro10, do CDC.

Consoante as normas do CDC, o consumidor deve pagar somente pelos serviços de telefonia que utiliza e não pela implementação e manutenção do sistema, pois são obrigações da concessionária que já é muito bem remunerada pela cobrança de diversos serviços agregados.

Além de todos esses vícios, sua criação encontra origem na ANATEL, órgão com poderes apenas de fiscalizar e regulamentar o setor, que, assim, não dispõe de competência para legislar, muito menos sobre a matéria.

8 Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:I - condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos;...

9 Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade;

10 § 1º. Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que:I - ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence;II - restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou o equilíbrio contratual;III - se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso.

A própria Lei nº 8.987/95, que regulamentou o art. 175 da CF, embora autorize a cobrança de uma remuneração tarifária pela prestação do serviço, permitindo já na apresentação das propostas pelos concorrentes ao procedimento licitatório a indicação dos valores e os tipos das tarifas que irão cobrar dos usuários pelos serviços prestados, não expressa permissão de pagamento sem a contraprestação do serviço.

De igual modo, a Lei nº 9.472, de 16.07.1997, conhecida como a Lei das Telecomunicações, não prevê a cobrança de assinatura mensal como condição para a continuidade da prestação do serviço, nem diz que a tarifa pode ser cobrada mesmo sem o seu uso. O inciso VII, de seu art. 93, apenas menciona que o contrato de concessão deve de logo indicar “as tarifas a serem cobradas dos usuários e os critérios para seu reajuste e revisão”, pressupondo, assim, a efetiva prestação do serviço. Aliás, o parágrafo único do artigo 83 da Lei nº 9.472/97, assevera que as concessionárias de serviço de telecomunicação serão remuneradas “pela cobrança de tarifas dos usuários ou por outras receitas alternativas”, como os pulsos cobrados pelos serviços efetivamente usados.

Se no contrato de concessão firmado entre as empresas de telefonia e o poder concedente constou cláusula autorizando a cobrança de “tarifa de assinatura”, conforme assegura a Recorrida, não é um problema da parte Recorrente, mas sim dela e, sobretudo do governo, que, sem base constitucional e há muito distanciado dos anseios do povo, outorgou o que não podia.

Em que pese nos autos, não constar todas as cópias das contas de consumo, não há por parte da acionada TELEMAR NORTE LESTE S/A qualquer informação quanto a falta de pagamento das mesmas, ou qualquer impugnação quanto a titularidade.

No que se refere a assinatura e por saber-se certo a cobrança mês a mês, independente de consumo ou não, a devolução deverá incidir de todas as contas pagas pela parte autora, mesmo aquelas não juntadas aos autos, obedecida a prescrição qüinqüenal, conforme requerido na inicial.

Por outro lado, entendo que a devolução dos valores pagos deve ser de forma simples e não em dobro, considerando que o disposto no parágrafo único do art. 4211 do CDC, claramente põe a salvo a incidência da aludida cominação às hipóteses de “engano justificável”, o que é o caso dos autos.

Pelo exposto e tudo mais que dos autos consta, VOTO no 11 O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro

ao que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.

sentido de REJEITAR AS PRELIMINARES ADUZIDAS e, no mérito, DAR PROVIMENTO EM PARTE AO RECURSO interposto, para se reformar a sentença hostilizada, declarando a abusividade e ilegalidade das cobranças dirigidas à parte Recorrente a título de “assinatura básica”, condenando a Recorrida a restituir à parte Recorrente de forma simples, os valores respectivos pagos nas faturas e por saber-se certo a cobrança mês a mês, independente de consumo ou não, a devolução deverá incidir de todas as contas pagas pela parte autora, mesmo aquelas não juntadas aos autos, obedecida a prescrição qüinqüenal, conforme requerido na inicial, ficando ciente a Recorrida que o não pagamento da quantia na qual foi condenada, após 15 dias do trânsito em julgado, haverá incidência de 10% sobre o valor da condenação. Tratando-se de recurso vencedor, sem condenação em honorários advocatícios, a teor do que dispõe o art. 55, caput, da Lei 9.099/95.

É como voto.Salvador, Sala das Sessões, 03 de fevereiro de 2010.

DR. BALTAZAR MIRANDA SARAIVAJUIZ RELATOR

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