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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO TRIBUNAL DO JÚRI E O PRINCÍPIO DA VERDADE REAL ITIBERÊ CORNELIUS EWERLING Biguaçu (SC), maio de 2008.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

TRIBUNAL DO JÚRI E O PRINCÍPIO DA VERDADE REAL

ITIBERÊ CORNELIUS EWERLING

Biguaçu (SC), maio de 2008.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO - BIGUAÇU

TRIBUNAL DO JÚRI E O PRINCÍPIO DA VERDADE REAL

ITIBERÊ CORNELIUS EWERLING

Monografia apresentada como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito pela Universidade do Vale de Itajaí – UNIVALI.

Orientadora: Profa. MSc. Eunice Anisete de Souza Trajano

Biguaçu (SC), maio de 2008.

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AGRADECIMENTO

Primeiramente às pessoas da minha família:

Minha mãe Catian que sempre meu amou

incondicionalmente, e continua sendo a pessoa mais

importante em minha vida;

Minha avó Rosa, que, sempre inspiradora, serviu de

exemplo para que eu desenvolvesse toda a minha

formação intelectual;

Meus tios Carlos e Rodrigo, que estiveram à frente

de nossa família e souberam sempre conduzi-la com

maestria;

Meu pai Luiz, que sempre será um exemplo de

perseverança, aquele que, através de longas

conversas, foi sempre o meu maior confidente;

Minha irmã Flora, por quem eu tenho o maior

carinho e respeito.

Em segundo, mas de maneira alguma menos

importantes, foram meus professores, os quais,

profissionais do mais alto gabarito, admirei ao longo

de minha estada na academia; em especial na pessoa

do Dr. MSc Luiz César Silva Ferreira, advogado

militante a nível nacional, o qual depositou grande

confiança neste acadêmico ao propor que estagiasse

em seu Escritório; ensinamentos que levarei para a

vida toda obtive ao seu lado, e por isso, será meu

eterno “professor”.

Minha orientadora, Profa. MSc. Eunice Anisete de

Souza Trajano, profissional respeitadíssima, seja

pelo invejável magistério, seja por sua ilibada

carreira de advogada; a pessoa que me instigou a

desenvolver esta pesquisa, quando em suas aulas

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aprendi a amar e respeitar o Tribunal do Júri e o

Direito Processual Penal.

Minha querida amiga, chefe e colega de Escritório,

Dr. Luciana de Bona Ferreira, advogada talentosa,

por proporcionar, juntamente com o Dr. Luiz, que eu

tivesse minha formação extra-acadêmica; e, onde

estamos diuturnamente postulando nas mais variadas

causas; o Escritório “Luiz César Ferreira Advogados

Associados” já é insubstituível em minha vida.

Por fim, e, já pedindo venia pelo exagero, aos meus

colegas de turma, sem os quais jamais estaria onde

me encontro, fiéis e merecedores do meu respeito,

jamais deixarão a minha memória; em especial nas

pessoas do Thiago Vinicius Amaral, Luiz Carlos de

Mello Neto e Ian Andrezzo Dutra.

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DEDICATÓRIA Dedico a presente monografia à memória do meu

querido avô Gustavo Sebastião Cornelius (1939-

2000).

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Três âncoras deixou Deus ao homem: o amor à

pátria, o amor à liberdade, o amor à verdade. Cara

nos é a pátria, a liberdade é mais cara; mas a verdade

é mais cara que tudo – Patria cara, carior libertas,

veritas carissima – Damos a vida pela pátria.

Deixamos a pátria pela liberdade. Mas a pátria e a

liberdade renunciamos pela verdade. Porque este é o

mais santo dos amores. Os outros são da terra e do

tempo. Este vem do Céu, e vai à eternidade.

Rui Barbosa

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro para todos os fins de Direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte

ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí, a

Coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer

responsabilidade acerca do mesmo.

Biguaçu, maio de 2008.

Itiberê Cornelius Ewerling

Graduando

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PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão de Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí –

UNIVALI, elaborada pelo graduando Itiberê Cornelius Ewerling, sob o título de Tribunal

do Júri e o Princípio da Verdade Real, foi submetida em 20 de junho de 2008 à banca

examinadora composta pelos seguintes professores: Eunice Anisete de Souza Trajano

(Orientadora e Presidente); Marilene do Espírito Santo (Membro); Celso Wiggers (Membro),

e aprovada com a nota 9,82 (nove, oitenta e dois).

Área de Concentração: Direito Público

Biguaçu/SC, 20 de junho de 2008

Eunice Anisete de Souza Trajano Orientadora e Presidente da Banca

Helena Nastassya Paschoal Pitsíca Responsável pelo Núcleo de Prática Jurídica

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SUMÁRIO

RESUMO

ABSTRACT

INTRODUÇÃO ................................................................................................................................................... 1

1 ORIGENS DO TRIBUNAL DO JÚRI E SUA EVOLUÇÃO HISTÓRICA ...............................................

6

1.1 ASPECTOS RELEVANTES DAS ORIGENS DO TRIBUNAL DO JÚRI E SUA

EVOLUÇÃO HISTÓRICA ............................................................................................................

6

1.1.1 DA ORIGEM MOSAICA ................................................................................................................. 9

1.1.2 DA ORIGEM GREGA ...................................................................................................................... 11

1.1.3 DA ORIGEM ROMANA .................................................................................................................. 12

1.1.4 DA ORIGEM BÁRBARA E FEUDAL ............................................................................................ 14

1.1.5 DA ORIGEM INGLESA .................................................................................................................. 17

1.1.6 DA EVOLUÇÃO DO TRIBUNAL DO JÚRI NA AMERICANA DO NORTE ............................. 18

1.1.7 DO TRIBUNAL DO JÚRI NA FRANCA APÓS A REVOLUÇÃO DE 1789 ................................ 20

1.2 ASPECTOS RELEVANTES SOBRE O TRIBUNAL DO JÚRI NO BRASIL ......................... 21

1.2.1 CRIAÇÃO E REGULAMENTAÇÃO NA CONSTITUIÇÃO DO PERÍODO IMPERIAL ........... 22

1.2.2 O TRIBUNAL DO JÚRI NO CÓDIGO DE PROCESSO CRIMINAL DO IMPÉRIO ................... 23

1.2.3 O TRIBUNAL DO JÚRI NO BRASIL REPUBLICANO ................................................................ 26

1.2.4 DO TRIBUNAL DO JÚRI NA CONSTITUIÇÃO REPUBLICANA DE 1891 .............................. 26

1.2.5 DO TRIBUNAL DO JÚRI NA CONSTITUIÇÃO DE 1934 ........................................................... 28

1.2.6 DO TRIBUNAL DO JÚRI NA CONSTITUIÇÃO DE 1937 E O DECRETO Nº 167, DE 5 DE

JANEIRO DE 1938 ...........................................................................................................................

29

1.2.7 DO TRIBUNAL DO JÚRI NA CONSTITUIÇÃO DE 18 DE SETEMBRO DE 1946 ................... 31

1.2.8 DAS ALTERAÇÕES NO TRIBUNAL DO JÚRI PELA LEI Nº 263, DE 23 DE FEVEREIRO

DE 1948 .............................................................................................................................................

32

1.2.9 DO TRIBUNAL DO JÚRI NA CONSTITUIÇÃO DE 24 DE JANEIRO DE 1967 E NA

EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 1, DE 17 DE OUTUBRO DE 1969 .......................................

34

1.2.10 O TRIBUNAL DO JÚRI NA CONSTITUIÇÃO DE 1988 .............................................................. 35

2 OS PRINCÍPIOS DA VERDADE REAL E DA VERDADE FORMAL .....................................................

38

2.1 OS PRINCÍPIOS DA VERDADE REAL E DA VERDADE FORMAL ................................... 38

2.1.1 CONCEITUALIZAÇÕES DESTACADAS ..................................................................................... 38

2.1.1.1 Conceitualização de “Princípio” .................................................................................................... 38

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2.1.1.2 Conceitualização da Palavra “Verdade” ....................................................................................... 40

2.1.1.3 Conceitualização de “Prova” .......................................................................................................... 41

2.2 O PRINCÍPIO DA VERDADE REAL – DEFINIÇÕES DOUTRINÁRIAS ............................. 42

2.2.1 O JUIZ PENAL NA BUSCA PELA VERDADE ............................................................................. 46

2.2.2 VERDADE FORMAL FRENTE À VERDADE REAL ................................................................... 50

2.3 VERDADE PROCESSUAL ........................................................................................................... 55

2.4 ASPECTOS DESTACADOS DE SITUAÇÕES EM QUE A DESCOBERTA VERDADE

REAL É PREJUDICADA POR LIMITAÇÕES LEGAIS (FORMAIS) ...................................

58

3 A BUSCA PELA VERDADE NO PLENÁRIO DO TRIBUNAL DO JÚRI ...............................................

62

3.1 FASE PROCEDIMENTAL PRÉ-PLENÁRIO – JUDICIUM ACUSATIONIS ......................... 63

3.1.1 ORDEM DOS ATOS PROCEDIMENTAIS .................................................................................... 63

3.1.2 POSSÍVEIS DECISÕES NO ENCERRAMENTO DO JUDICIUM ACUSATIONIS ...................... 64

3.2 O PLENÁRIO DO TRIBUNAL DO JÚRI – JUDICIUM CAUSAE .......................................... 66

3.2.1 SUJEITOS PROCESSUAIS NO PLENÁRIO DO TRIBUNAL DO JÚRI – PARTES

RELEVANTES AO ESTUDO ..........................................................................................................

68

3.2.1.1 O Juiz-Presidente do Tribunal do Júri ......................................................................................... 68

3.2.1.2 O Promotor de Justiça no Plenário do Tribunal do Júri ............................................................. 70

3.2.1.3 O Assistente de Acusação no Plenário do Tribunal do Júri ........................................................ 72

3.2.1.4 O Advogado de Defesa no Plenário do Tribunal do Júri ............................................................. 74

3.2.1.5 O Acusado sob Julgamento pelo Tribunal do Júri ....................................................................... 76

3.2.1.6 Os Jurados ....................................................................................................................................... 77

3.2.1.6.1 As Perguntas feitas pelos Jurados ..................................................................................................... 80

3.2.2 INTERROGATÓRIO DO ACUSADO ............................................................................................ 81

3.2.3 REALIZAÇÃO DE PROVAS EM PLENÁRIO .............................................................................. 82

3.2.3.1 Oitivas das Testemunhas ................................................................................................................ 82

3.2.3.2 Declarações de Peritos no Plenário do Tribunal do Júri ............................................................. 83

3.2.3.3 Acareações no plenário do Tribunal do Júri ................................................................................ 84

3.3 DEBATES ORAIS ........................................................................................................................... 85

3.3.1 ACUSAÇÃO ..................................................................................................................................... 89

3.3.2 ASISTENTE DE ACUSAÇÃO ........................................................................................................ 91

3.3.3 DEFESA ............................................................................................................................................ 92

3.3.4 RÉPLICA E TRÉPLICA ................................................................................................................... 94

3.4 ESCLARECIMENTOS FINAIS AOS JURADOS ....................................................................... 97

3.5 EXPLICAÇÃO DOS QUESITOS AOS JURADOS .................................................................... 98

CONCLUSÃO ...................................................................................................................................................... 99

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................................................................. 106

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RESUMO

A presente pesquisa tem como objeto a verificação de como o Princípio da Verdade Real se

relaciona com o Plenário do Tribunal do Júri e se é dado ênfase ao mesmo durante esta fase

procedimental. Para que isso se elucidasse, a monografia serviu-se do método dedutivo de

pesquisa, utilizando a doutrina técnica, bem como artigos científicos publicados na área do

Direito Processual Penal, no âmbito do Código de Processo Penal. A pesquisa bibliográfica

foi dividida em três capítulos. O primeiro Capítulo cuidou de expor as origens e evolução

histórica do Tribunal do Júri, trazendo à baila suas origens desde os tempos da antigüidade,

passando pela idade média, onde se desenvolveu as primeiras linhas de como hoje o é, bem

como sua primeira aparição e evolução no Brasil, desde o período colonial, nas constituições

republicanas, até a Constituição de 1988. No segundo Capítulo, tratou-se de explorar o

Princípio da Verdade Real, sua conceituação doutrinária, e as diferenças entre a Verdade

Material e a Verdade Formal, bem como a Verdade Processual, além da importância da

descoberta da verdade para uma decisão justa. No terceiro e último Capítulo, foi tratado da

Busca da Verdade Real no Tribunal do Júri, ponto culminante da pesquisa, vislumbrando-se

quando o Princípio orientador do Processo Penal tem lugar em plenário, para que ao final se

possa decidir acerca dos fatos como realmente ocorreram, e o que fazem o juiz, as partes e os

jurados para seguir na busca da verdade, durante a realização das provas e nos debates orais.

Palavras chave: Tribunal do Júri, Princípio da Verdade Real, Processo Penal, Prova, Verdade.

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ABSTRACT

This research aims at checking on how the Principle of Real Truth is related to the Plenary of

the Court of Jury and if the Jury is given the same emphasis during this phase procedural. For

that to elucidate, the monograph served up the deductive method of search, using the technical

doctrine and scientific articles published in the area of the Criminal Procedural Law, under the

Code of Criminal Procedure. The literature search was divided into three chapters. The first

Chapter cared to explain the origins and historical development of the Court of Jury, bringing

the emphasis its origins since the days of age through middle age, where he developed the

first lines of today as it is, as well as his first appearance and developments in Brazil since the

colonial period, the republican constitutions, to the Constitution of 1988. In the second

chapter, it was exploring the Principle of Real Truth, his doctrinaire concept, and the

differences between the Real Truth and material Formal Truth and the Truth Procedure, in

addition to the importance of the discovery of truth for a fair decision. In the third and final

chapter, was treated in Search of Real Truth in the Court of Jury, culmination of search,

seeing itself as the guiding principle of Criminal Procedure takes place in the Plenary, so that

the end can decide on the facts as really occurred, and what are the judge, the parties and the

jury to follow in the search for truth, during the conduct of the evidence and in oral

discussions.

Key words: Court of the Jury, Principle of Real Truth, Criminal Procedure, Evidence, Truth.

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INTRODUÇÃO

A presente pesquisa tem como objeto o Tribunal do Júri e o Princípio

da Verdade Real, haja vista que aquele é uma instituição secular que está presente no

ordenamento jurídico pátrio desde o período imperial, foi modificado e aprimorado até a

contemporaneidade; já referido Princípio é orientador do Processo Penal brasileiro, uma vez

que a busca pela verdade é considerada por muitos como a causa final do processo.

Apesar das alterações propostas ao Código de Processo Penal em

relação ao Tribunal do Júri, pelo Projeto de Lei 4.203 de 2001, que já obteve inclusive, após

regular tramitação, a aprovação do Congresso Nacional, e que, em 21 de maio de 2008 foi

encaminhado a Sessão Presidencial, na presente monografia enfatizar-se-á apenas o texto

vigente atualmente no referido dispositivo processual penal brasileiro.

O objetivo desta pesquisa é a reunião de informações, baseadas nas

referências bibliográficas utilizadas, de maneira a proporcionar ao leitor uma maior

compreensão acerca da temática tratada, com isso, objetiva-se angariar um conteúdo que

possa ser utilizado pelo leitor como meio para um aprofundamento acerca dos temas

pesquisados, contribuindo assim, para o acúmulo de informação científico-cultural da pessoa

interessada.

Para tanto, no desenvolver desta monografia utilizar-se-á o método

dedutivo de pesquisa, de modo a partir-se sempre de uma conceituação da matéria,

desenvolver o conteúdo de forma a proporcionar uma sistemática de estudo em que o leitor

chegará às conclusões bem informado para tecer uma análise crítica sobre o conteúdo

apreciado.

Será efetuada a pesquisa nas mais diversas obras doutrinárias do

Direito Processual Penal, de modo a tecer um conteúdo bem embasado, dispondo de inúmeras

opiniões dos mais renomados juristas que cuidaram de expor em suas obras os temas aqui

tratados.

Desta forma, ao final desta monografia, será reunida matéria que

poderá servir para a futuras pesquisas, pois, acolherá materiais destacados de grande

discussão no mundo acadêmico, profissional e social, com isso, resultará em um texto hábil a

proporcionar aos acadêmicos de Direito, aos profissionais da área jurídica, bem como

qualquer outra pessoa interessada, um estudo fértil acerca da temática, que contribuirá para o

leitor na medida de seu interesse.

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Sendo assim, a pesquisa foi dividida em três capítulos, consistindo o

primeiro capítulo, intitulado de “ORIGENS DO TRIBUNAL DO JÚRI E SUA EVOLUÇÃO

HISTÓRICA”, na análise bibliográfica acerca das origens da Instituição ao longo do tempo,

tendo início nos tempos antigos da civilização, onde cada povo havia de decidir seus

conflitos, e, escolheu a reunião de pessoas da mesma sociedade para decidir em conjunto

acerca do litígio.

Além do mais, partindo-se do Princípio de que em qualquer reunião

de pessoas que se motivam a resolver um conflito em sua sociedade, julgando um de seus

membros, já se pode notar certa semelhança com o Tribunal do Júri.

Pois, sabe-se que já nos tempos de Moisés havia métodos de

julgamento que se assemelhavam com o Tribunal do Júri como hoje se conhece, trata-se do

Conselho dos Anciãos e de outros tribunais semelhantes; na Grécia antiga já havia o tribunal

dos Heliastas, que muito tem a ver com o Tribunal do Júri de hoje, com juízes tirados do

povo, que eram incumbidos de julgar uma pessoa de sua própria sociedade; em Roma,

formaram-se as Quaestiones Perpetuae, que da mesma forma, reunia cidadãos para julgar

cidadãos.

Mais adiante no tempo, a história conta que os povos germânicos

possuíam os tribunais wehmicos, que revelavam a tendência destes povos na popularização

dos juízos; em seguida se nota que na Inglaterra o Tribunal do Júri foi organizado mais

semelhantemente como é conhecido hoje em dia, quando da abolição das ordálias e dos juízos

de Deus pelo Consílio de Latrão.

Porém na América do Norte, nos primeiros dias da colonização

inglesa, já se cuidou de implantar o Tribunal do Júri, e de aprimorá-lo; bem como para a

França revolucionária, que no Júri viu um jeito de despertar dos abusos cometidos até então.

Será isto tudo tratado no primeiro capítulo, e, além disso, se verificará

como se deu o surgimento do Tribunal do Júri no Brasil, desde a sua implantação no ano de

1822, passando pela sua previsão na Constituição Imperial, a qual o previu no capítulo do

Poder Judiciário, passando por seu regulamento pelo Código de Processo Criminal do

Império.

Tratar-se-á adiante, também, do Tribunal do Júri no período

republicano, começando com a previsão constitucional na Carta de 1891, a qual fez vigente o

Tribunal do Júri no capítulo referente às garantias constitucionais, bem como na Constituição

de 1934, onde voltou a pertencer aos órgãos do Poder Judiciário; posteriormente cuidar-se-á

da Instituição na Constituição de 1937, omitindo-se acerca do Tribunal do Júri, fazendo com

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que a matéria fosse regulada pela Lei nº 167, que além de firmar sua existência, retirou a sua

soberania; sendo a soberania dos veredictos restaurada na Constituição de 1946, esta

colaciona o Tribunal do Júri no Capítulo dos direitos e garantias fundamentais, onde está até

hoje previsto.

Logo, adveio a Lei nº 263, fazendo inumaras alterações no Tribunal

do Júri, dentre elas o controle de suas decisões pelas instâncias superiores, mas sem violar sua

soberania; com a constituição de 1967, poucas foram as alterações, isso se deu da mesma

forma com o advento da Emenda Constitucional nº 1, de 1969; depois disso, a Constituição de

1988, estabeleceu seus princípios básicos vigentes hoje, quais sejam: a plenitude de defesa, o

sigilo nas votações, a soberania dos veredictos e a competência mínima para julgamentos dos

crimes dolosos contra a vida; discutidos no primeiro capítulo.

No segundo capítulo, intitulado de “OS PRINCÍPIOS DA VERDADE

REAL E DA VERDADE FORMAL”, desenvolver-se-á o trabalho referente ao Princípio da

Verdade Real vigente no Processo Penal, bem como, a título de análise, será contraposto com

o Princípio da Verdade Formal, vigente no Processo Civil.

Sabe-se que o Princípio da Verdade Real trata-se basicamente de que,

para o poder-dever punitivo do Estado – jus puniendi – se fazer valer sobre determinada

pessoa o Processo Penal necessita de uma reconstrução dos fatos de forma a embasar a

decisão do juiz, o qual a partir desta reconstrução empírica, formará a sua certeza, a fim de

que seja atribuído ao acusado, ao fim do Processo, exatamente o que lhe cabe de acordo com

os atos praticados, podendo ser absolvido ou condenado, mas isso em conformidade com sua

conduta, tudo em prol da tão necessária e salutar justiça.

Quando for feita a contraposição entre os dois referidos Princípios

será visto que o que mais os diferencia é a limitação que possui o da Verdade Formal, na

aquisição de provas por iniciativa do próprio juiz, o que não ocorre no Processo Penal, haja

vista que, como será igualmente tratado, os juizes não devem permanecer inertes, ademais,

devem determinar ex-officio a produção de provas que possam dirimir dúvidas e proporcionar

o descobrimento da verdade.

Continuando, no segundo capítulo analisar-se-á os poderes que possui

o Juiz penal para a participação na produção das provas, diga-se já que isso é possível, e, além

disso, é dever do magistrado penal colher os fatos que compõe a verdade fática, para que sua

decisão seja a mais justa possível, uma vez que, diferentemente da esfera civil, os bens, de

caráter quase sempre patrimoniais, são disponíveis, o Processo Penal cuida dos bens

indisponíveis, como o direito à liberdade.

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Analisar-se-á, também, os casos em que a Verdade Real é prejudicada

no Processo Penal pelas verdades formais, como o caso do in dubio pro réu, em que faltando

a certeza para a condenação, é preferível a absolvição.

Será tratada da verdade tida como processual, trazida à baila por

alguns autores como crítica à Verdade Real, afirmando que para que a verdade seja relevante

para o Processo Penal ela deve estar dentro dos autos, porque, como diz o brocardo jurídico, o

que não está nos autos não está no mundo.

No terceiro e último capítulo, intitulado de “A BUSCA PELA

VERDADE NO PLENÁRIO DO TRIBUNAL DO JÚRI”, será pesquisado, como é que o

Princípio da Verdade Real se relaciona com o plenário da sessão de julgamento, analisando

qual o papel das partes na busca pela verdade e o que o juiz e os jurados podem fazer para

manter a perquirição da verdade no seu caminho.

Tratar-se-á, primeiramente, acerca dos sujeitos processuais, bem como

as figuras dos jurados, os verdadeiros juizes da causa, a quem deverá a prova e a verdade

recair, pois, ao final, caberá a eles manifestar-se acerca dos fatos apresentados, a busca pela

verdade é tão importante neste momento do procedimento do Tribunal do Júri que o juiz pode

até mesmo dissolver o Conselho de Sentença no caso da necessidade de alguma diligência

essencial ser requisitada por alguma das partes, pelos jurados ou até mesmo ex-officio, como

será visto.

Tratar-se-á da realização da prova em plenário, no momento do

interrogatório do acusado, bem como na oitiva das testemunhas, esclarecimentos pelos

peritos, e as acareações no caso de contradições, tudo em nome do Princípio da Verdade Real.

Nos debates orais, diga-se que a oralidade impera no Tribunal do Júri,

é onde cada uma das partes procurará convencer os jurados acerca da procedência de suas

razões, será analisado até que ponto podem as partes visar somente à vitória, dando especial

relevância a fatos pouco pertinentes, fugindo da Verdade Real em prol de sua causa, e como o

Juiz presidente deve se portar nessas horas, utilizando-se de suas atribuições legais, para a

condução dos debates.

Ainda no terceiro capítulo será na parte dos debates orais, verificada a

possibilidade do Promotor de Justiça pedir pela absolvição do acusado, e como a doutrina

trata da celeuma, bem como a possibilidade do defensor não pedir a absolvição em todos os

casos, quando poderá apenas pleitear causas de diminuição de pena ou a exclusão de uma

qualificadora, por exemplo.

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Por fim, tratar-se-á da necessária explicação que deve ser dada aos

jurados acerca do questionário que deverá ser respondido pelos julgadores na forma de

quesitos, bem como todos os esclarecimentos obrigatórios antes da votação, e é claro, da

possibilidade de nesta fase, haver a reinquirição das testemunhas que não foram dispensadas

pelas partes ou pelos jurados.

Ao final espera-se chegar a uma conclusão acerca da temática

preestabelecida.

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1 ORIGENS DO TRIBUNAL DO JÚRI E SUA EVOLUÇÃO HISTÓRICA

1.1 ASPECTOS RELEVANTES DAS ORIGENS DO TRIBUNAL DO JÚRI E SUA

EVOLUÇÃO HISTÓRICA

O que se objetiva através deste apanhado histórico acerca da

Instituição do Tribunal do Júri, é investigar os aspectos relevantes de sua origem ao longo da

história; as organizações, métodos e procedimentos semelhantes à sua organização hodierna,

para que, com isso, seja possível uma melhor compreensão desta Instituição na celeuma

contemporânea.

Bem se sabe que a principal característica da Instituição do Tribunal

do Júri, em analise neste primeiro capítulo, é o método como o fato é julgado, ou seja, por

mais de uma pessoa; e com a participação popular1.

Firmino Whitaker, em sua obra acerca desta instituição, já nos

longínquos anos de 1930, traça as principais características do Tribunal do Júri: “São traços

característicos do Jury: constituir-se de juizes tirados do povo, por prévio alistamento, sorteio

e escolha; guiarem-se estes juizes, pela convicção íntima; decidirem apenas questões de

fato2”.

Evidentemente aqui se referindo apenas ao Tribunal do Júri pátrio,

pois como bem assevera José Frederico Marques, há outros países em que os jurados não

decidem “com inteira liberdade”, alertando para a processualística de países como o a

Inglaterra, no qual os jurados estão presos ao sistema da prova legal ou evidency3.

Goffredo Júnior, em sua tese, compõe ótima definição do Tribunal do

Júri; por suas palavras: “O Jury é um tribunal, em que juízes de consciência procuram

descobrir e declarar a verdade dos fatos sujeitos a julgamento, para que um juiz de direito

aplique a lei adequada ao caso4”.

Quando se trata de suas origens mais remotas, afirma Firmino

Whitaker, ser o Tribunal do Júri uma instituição que,

1 Cf. CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 13.ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p.638; MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. São Paulo: Saraiva, 1963. pp.3-9; WHITAKER, Firmino. Jury. 6.ed. São Paulo: Saraiva, 1930. p.3; TUCCI, Rogério Lauria. Origem do Tribunal do Júri. Apud ______. (coord.). Tribunal do júri: estudo sobre a mais democrática instituição jurídica brasileira. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p.16; TELLES JÚNIOR, Goffredo da Silva. Justiça e jury no estado moderno. São Paulo: Empreza Graphica da Revista dos Tribunais, 1938. p.253. 2 [Sic.] WHITAKER, Firmino. Jury. p.4. 3 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.11. 4 [Sic.] TELLES JÚNIOR, Goffredo da Silva. Justiça e jury no estado moderno. p.253.

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em sua simplicidade primitiva, remonta às primeiras épocas da humanidade. Qual que fosse a duvida levantada nas tribos errantes, sem leis positivas e autoridades permanentes, a decisão era proferida pelos pares dos contendores5.

O constitucionalista Carlos Maximiliano, em seus “Comentários à

Constituição Brasileira”, aos anos de 1948, afirma que as origens do Tribunal do Júri “se

perdem nas noites dos tempos; ditas, aliás, vagas e indefinidas6”.

Com isso, se tratará de desvendar através da história onde se pode

observar as referidas características do Tribunal do Júri, e destacar suas semelhanças com a

instituição como se conhece no ordenamento jurídico pátrio contemporâneo, todavia, a pedra

fundamental do estudo neste primeiro capítulo seja, por certo, a busca pelas origens da

referida instituição, bem como a sua evolução até os dias contemporâneos.

Romualdo Sanches Calvo Filho e Paulo Fernando Soubihe Sawaya,

alertam em sua obra, para a grandiosa tarefa de se adentrar em um assunto de tamanha

controvérsia, nota-se certa divergência doutrinária quanto às verdadeiras origens da instituição

hoje denominada de Tribunal do Júri, tanto que na opinião dos autores, constitui uma tarefa

hercúlea a tentativa de determinar com exatidão as origens do Tribunal do Júri, seja no tempo

ou no espaço, posto que isso se tornou um desafio para os grandes estudiosos do tema7.

Assim, dado a falta de um consenso acerca das origens do Tribunal do

Júri, os doutos autores procuram orientar-se pelas longínquas origens do direito, quando uma

simples aglomeração de pessoas poderia caracterizar a origem de tal instituição8.

Certamente nota-se primitiva semelhança com o Tribunal do Júri

hodierno sempre que se encontrar uma reunião de pessoas organizadamente propostas à

resolução de um conflito. Todavia, nem mesmo os doutrinadores mais respeitados e ferrenhos

estudiosos do Tribunal do Júri comungam acerca das origens de tal instituição9. Aliás,

conforme magistério de Edílson Mougenot Bonfim, “a participação de cidadãos no

5 [Sic.] WHITAKER, Firmino. Jury. p.8. 6 MAXIMILIANO, Carlos. Comentários à constituição brasileira. Apud TUCCI, Rogério Lauria. Origem do Tribunal do Júri. In: _____. (coord.). Tribunal do júri: estudo sobre a mais democrática instituição jurídica brasileira. p.12. 7 Cf. CALVO FILHO, Romualdo Sanches; Sawaya, Paulo Fernando Soubihe. Tribunal do júri da teoria à prática. São Paulo: Suprema Cultura Editora, 2003. p.19. 8 Cf. LOBO RESENDE, Reinaldo Oscar de Freitas Mundim. Da evolução da instituição do júri: no tempo, sua atual estrutura e novas propostas de mudanças. Projeto de Lei nº 4.203/2001. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br>. Acesso em: 19 jul. 2007. Com acesso em: 19 jul. 2007. 9 Cf. LOBO RESENDE, Reinaldo Oscar de Freitas Mundim. Da evolução da instituição do júri: no tempo, sua atual estrutura e novas propostas de mudanças. Projeto de Lei nº 4.203/2001.

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julgamento dos crimes mais graves é um Princípio recorrente nos diversos modelos de

sociedade ao longo da história10”.

Rui Barbosa, por exemplo, admite origens do Tribunal do Júri nos

judices romanos, nos dikastas gregos e nos centeni comites dos germanos primitivos, porém

ao tratar de sua forma definitiva, tem a seguinte convicção: que foi em solo britânico que o

Tribunal do Júri se consolidou, depois da conquista normanda por Henrique II11.

Todavia, com a devida venia a Rui Barbosa, de ver-se notar, como

ressalta Arthur Pinto da Rocha, que para se achar as remotas origens do Tribunal do Júri,

é muito além do Capitólio e do Parthenon e não nos Heliastas e Dikastas gregos como pretende a corrente hellenista que nós procuraremos a origem da instituição. As leis de Moysés, ainda que subordinando o magistrado ao sacerdote, foram, na antiguidade, as primeiras que interessaram os cidadãos nos julgamentos dos tribunaes12.

Dessa feita, impossibilita-se o prosseguimento sem a devida atenção

às palavras de Rogério Lauria Tucci, o qual demonstra

a insegurança dos autores, no tocante à determinação da origem do Júri; tanto que outros, igualmente renomados, como Sampaio Dória e Pontes de Miranda, sequer chegaram a abordá-la. E isso, por certo, dada a escassez de informações acerca das instituições mais antigas, dentre as quais, também induvidosamente, se inclui13.

Ipso facto, passa-se agora a uma análise sintética das possíveis origens

do tribunal do Júri, sendo que se fará uma sinopse baseando-se em vários trabalhos acerca das

origens e evoluções do Tribunal do Júri, e, por conseguinte, ter-se-á uma melhor compreensão

de como o Tribunal do Júri evoluiu através da história até os tempos hodiernos.

Com relação às origens, tratar-se-á, primeiramente dos tempos da

antiguidade, onde as civilizações organizadas resolviam seus conflitos por métodos

procedimentais, conforme se relata, semelhantes aos do Tribunal do Júri hodierno ou onde

tiveram suas primeiras linhas, para mais tarde, tratar da criação e evolução no Brasil.

10 BONFIM, Edílson Mougenot. Curso de processo penal. 2.ed. rev., aum. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. p.455. 11 BARBOSA, Rui. Obras completas de Rui Barbosa: posse de direitos pessoais, o Júri e a independência da magistratura. Rio de Janeiro: Ministério da Educação e Cultura – Departamento de Imprensa Nacional, 1976. v.XXXIII, t.III. p.147. 12 [Sic.] PINTO DA ROCHA, Arthur. O jury e a sua evolução. Rio de Janeiro: Editora Leite Ribeiro & Maurillo, 1919. pp.8-9. 13 TUCCI, Rogério Lauria. Origem do tribunal do júri. Apud _____. (coord.). Tribunal do júri: estudo sobre a mais democrática instituição jurídica brasileira. p.13.

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1.1.1 DA ORIGEM MOSAICA

Ensina José Aleixo Irmão em seu opúsculo, que já nos mais remotos

tempos, com os hebreus, “através da tradição oral e escrita” tem-se a processualística

semelhante à que hoje norteia o processo do Tribunal do Júri14.

Segundo o referido autor, o qual cita para embasar sua tese João

Mendes de Almeida Júnior, no período mosaico havia três tipos de tribunais, figurando como

três graus de jurisdição: O tribunal dos Três; o Tribunal dos Vinte e Três; e o Sinédrio15.

Na referida obra, nota-se que,

esses tribunais, também chamados de Ordinários, Conselho dos Anciãos; e Grande Conselho vêm descritos no Êxodo16, Números17, Deuteronômio18, sendo que, no Conselho dos Anciãos, encontramos o fundamento da instituição do júri moderno19.

Mister se faz, neste momento, lembrar de orientação do autor De

Palácio e Silva, o qual assevera “Júri” ser na verdade o Tribunal do Júri, pois por certo se tería

o conjunto de jurados como o “conselho de sentença”20.

Continuando com o Conselho dos Anciãos, este era composto por 23

membros, julgava e impunha a pena capital ao réu, sendo que as próprias testemunhas seriam

as primeiras a golpearem o condenado. No Deuteronômio Capítulo 17.7, lê-se que: “As

testemunhas serão as primeiras que lhe atirem, e depois atirar-lhe-á todo o resto do povo: para

que tires o mal do meio de ti21”.

Sobre o Conselho dos Anciãos, assevera José Aleixo Irmão, não

havendo nesta época um “acusador público” eram então os próprios anciãos encarregados de

14 Cf. ALEIXO IRMÃO, José. Grandezas e misérias do júri. Editora Cupulo Ltda., 1968. p.11. 15 Cf. ALEIXO IRMÃO, José. Grandezas e misérias do júri. p.12. 16 “Segundo livro da Bíblia. Relata a fuga dos israelitas do Egito, sua chegada ao Sinai e o estabelecimento das primeiras leis”. Enciclopédia barsa: índice enciclopédico. São Paulo: Encyclopaedia Britannica do Brasil Publicações Ltda., 1995. v.1. p.208. 17 “Quarto livro da Bíblia, assim chamado por conter dados estatísticos sobre as tribos”. Vários Autores. [Sic] Enciclopédia barsa: índice enciclopédico. p.400. 18 Quinto livro do Pentateuco, sendo que contém os últimos discursos de Moisés, pronunciados nas planícies de Moab, além de um apêndice histórico. O Pentateuco é a denominação dada aos primeiros cinco livros da Bíblia, ou Torá. São: Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio. Enciclopédia barsa: índice enciclopédico. pp.169, 429. 19

ALEIXO IRMÃO, José. Grandezas e misérias do júri. p.13. 20 Cf. SILVA, De Palácio e. apud ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário jurídico brasileiro acquaviva. São Paulo: Editora Ícone, 1998. p.746. 21 ALEIXO IRMÃO, José. Grandezas e misérias do júri. p.13.

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prolatar parecer sobre a inocência ou a culpabilidade do sujeito sob julgamento; o acusado

deveria proceder em própria defesa, ou poderia designar uma pessoa para essa finalidade22.

Já se pode notar nesta longínqua época a preocupação com certas

garantias ao acusado, sendo que a processualística do Conselho dos Anciãos respeitava

algumas características básicas; são elas:

a) escolha dos juízes pela sorte; b) julgamento do acusado pelos pares; c) investigação rigorosa sobre os fatos; d) publicidade dos debates; e) liberdade de defesa; f) recusa motivada dos juízes, e g) a garantia contra falsos testemunhos, devendo a morte civil ou natural se basear em dois testemunhos contestes23.

Tal recusa motivada dos juízes, relatada por José Aleixo Irmão

poderia ser por impedimento ou suspeição24.

A respeito desta última garantia, o autor fundamenta no citado

Deuteronômio, Capítulo 17.6: “Sobre o depoimento de duas ou de três testemunhas morrerá

aquele que houver de ser castigado. E nenhum será morto sobre o testemunho de uma só

pessoa25”.

As regras processuais do direito mosaico, as quais perduraram até os

tempos da dominação romana foram as seguintes, em síntese:

1 - nulidade do falso testemunho; 2 - nulidade do julgamento noturno; 3 - nulidade da prisão fora do flagrante; 4 - nulidade de testemunho único; 5 - nulidade do interrogatório às ocultas; 6 - nulidade da instrução em segredo; 7 - nulidade de decisão de público26.

Segundo os ditames processuais do Conselho dos Anciãos, caso o

acusado se sentisse sucumbente com a decisão proferida, e com fulcro nas referidas nulidades;

teria o direito sagrado de lançar mão de recursos, nas formas admitidas27.

Para embasar a presente pesquisa, ainda cita-se Arthur Pinto da

Rocha, elaborador de um excelente ensaio sobre a instituição do Tribunal do Júri no ano de

1919, afirma o autor, que é na velha legislação de Moisés que se fundamentaria e a origem da

instituição do “jury”, “o seu princípio básico28".

22 Cf. ALEIXO IRMÃO, José. Grandezas e misérias do júri. p.13. 23 ALEIXO IRMÃO, José. Grandezas e misérias do júri. p.13, 14. 24 Cf. ALEIXO IRMÃO, José. Grandezas e misérias do júri. p.14. 25 ALEIXO IRMÃO, José. Grandezas e misérias do júri.. p.14. 26 ALEIXO IRMÃO, José. Grandezas e misérias do júri. p.15. 27 Cf. ALEIXO IRMÃO, José. Grandezas e misérias do júri. p.15. 28 Cf. PINTO DA ROCHA, Arthur. O jury e a sua evolução. p.9.

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1.1.2 DA ORIGEM GREGA

Ressalta José Aleixo Irmão, há quem sustente que foi com o Tribunal

dos Heliastas, na Grécia, que se deu a origem do Tribunal do Júri29.

Autores como Romualdo Filho e Paulo Sawaya comungam no sentido

de ser na Atenas clássica que se teria “as linhas mais próximas dos contornos atuais do

Tribunal do Júri30”.

Segundo João Mendes de Almeida Júnior, em Atenas havia quatro

jurisdições criminais, sendo elas: a Assembléia do Povo; o Areópago; os Efetas; e, os

Heliastas31. A respeito das três primeiras transcorrer-se-á brevemente, dando maior ênfase ao

Tribunal dos Heliastas.

Conforme José Aleixo Irmão,

à Assembléia competia julgar os crimes políticos mais graves; quase sempre determinava, por meio de decreto, que os heliastas tomassem conhecimento do fato criminoso que a ela fora denunciado. Ao Areópago, composto de cinqüenta e um juízes, competia julgar os homicídios premeditados, os envenenamentos, os incêndios e outros crimes especificados e punidos com a pena de morte. Os Efetas, também composto do mesmo número de juízes que o Areópago, porém de senadores tirados à sorte, julgavam os homicídios não premeditados32.

Os Heliastas eram atenienses, juízes do povo, que ao ar livre se

reuniam, sob o sol nascido, e julgavam coletivamente ou por meio dos discatérios (que

consistiam nas dez seções em que se dividiam o tribunal ateniense dos heliastas). Esses

chamados juízes do povo eram escolhidos aleatoriamente; deveriam ter idade igual ou

superior a trinta e cinco anos; e estarem quites com o tesouro33.

Segundo Romualdo Filho e Paulo Sawaya, era um dos tribunais

atenienses que estava incumbido de zelar pela paz social da localidade, proferindo suas

decisões após a ouvida da defesa do réu, por sua livre convicção34.

Competia-lhes a jurisdição criminal. O Tribunal dos Heliastas dividia-

se em dez seções podendo essas mesmas funcionar de forma conjunta ou separadamente para 29 Cf. ALEIXO IRMÃO, José. Grandezas e misérias do júri. p.11. 30 CALVO FILHO, Romualdo Sanches; SAWAYA, Paulo Fernando Soubihe. Tribunal do júri da teoria à prática. p.19. 31 ALMEIDA JÚNIOR, João Mendes de. O processo criminal brasileiro. Apud ALEIXO IRMÃO, José. Grandezas e misérias do júri. p.17. 32 [Sic.] ALEIXO IRMÃO, José. Grandezas e misérias do júri. p.16. 33 Cf. ALEIXO IRMÃO, José. Grandezas e misérias do júri.. p.11. 34 Cf. CALVO FILHO, Romualdo Sanches; Sawaya, Paulo Fernando Soubihe. Tribunal do júri da teoria à prática. p.19.

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proferir uma decisão sob o caso, tal decisão por filosofia do instituto era como se fosse

emanada do próprio povo ateniense35.

Após o acusador exercer a acusação, passava-se então à ouvida de

suas testemunhas; logo após, o acusado falaria em própria defesa, ou era defendido por meio

de patronos nomeados, em seguida passava-se à ouvida das testemunhas de defesa. Isto posto,

o presidente convidava os juízes às deliberações, estas feitas ali mesmo, antes do sol se por36.

Os julgamentos proferidos eram totalmente públicos, votando-se com

total publicidade, primeiramente a matéria que versava sobre a culpabilidade do acusado, se

positivo, passava-se à uma segunda votação tratando esta da atribuição da pena adequada ao

culpado pelo fato criminoso37.

João Mendes de Almeida Júnior, em sua obra, demonstra alguns dos

traços característicos do processo do Tribunal dos Heliastas; ipsis literis:

o direito popular de acusação e de julgamento; a publicidade de todos os atos do processo, inclusive do julgamento; a prisão preventiva; a liberdade provisória sob caução, salvo nos crimes de conspiração contra a pátria e a ordem pública; o procedimento oficial nos crimes políticos e a restrição do direito popular de acusação em certos crimes que mais lesavam o interesse do indivíduo do que o dá sociedade38.

José Aleixo Irmão faz uma ressalva em relação aos votos secretos,

asseverando que,

se os hebreus não conheciam o voto secreto, o mesmo diremos dos gregos. O julgamento se fazia na praça pública, à luz do sol. Somente o Areópago fazia exceção à regra citada, naqueles casos em que pudessem os juízes se conturbarem à vista do acusado[...]. Então, nesses casos especiais, o julgamento se fazia a noite, porém, em praça ao ar livre.39

1.1.3 DA ORIGEM ROMANA

Também se nota uma corrente romanista quanto às origens do

Tribunal do Júri; autores como Rogério Lauria Tucci e Marcus Cláudio Acquaviva relatam

estar no direito romano o embrião da instituição hoje conhecida como Tribunal do Júri40.

35 Cf. ALEIXO IRMÃO, José. Grandezas e misérias do júri. p.16. 36 Cf. ALEIXO IRMÃO, José. Grandezas e misérias do júri. p.16. 37 Cf. ALEIXO IRMÃO, José. Grandezas e misérias do júri. p.16. 38 ALMEIDA JÚNIOR, João Mendes. Apud ALEIXO IRMÃO, José. Grandezas e misérias do júri. pp.16-17. 39 [Sic.] ALEIXO IRMÃO, José. Grandezas e misérias do júri. p.19. 40 Cf. TUCCI, Rogério Lauria. Origem do tribunal do júri. In: ______. (coord.). Tribunal do júri: estudo sobre a mais democrática instituição jurídica brasileira. p. 15; ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Tribunal do júri. São Paulo: Editora Ícone, 1991. p.17.

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Nesse sentido de ver-se observar o magistério de José Aleixo Irmão, o

qual afirma que as quaestiones perpetuae durante o período republicano de Roma foram as

primeiras manifestações do “Júri”, ressalta-se ainda, com total importância, seu caráter

público e representativo da manifestação soberana do povo romano41.

Nesta mesma simetria se posiciona Rogério Láuria Tucci, o qual

vislumbra nas quaestiones perpetuae romanas a origem do “tribunal popular” hodierno; por

suas palavras há de se compreender que:

o verdadeiro, por assim dizer autêntico, embrião do tribunal popular, que recebeu a denominação hoje corrente de (tribunal do júri), se encontra em Roma, no segundo período evolutivo do processo penal, qual seja o do sistema acusatório

42.

As quaestiones perpetuae surgiram quando uma pretérita instituição

chamada de Comitatus Maximus perdeu o direito a voto e passou a delegar poderes a

magistrados com jurisdição próprias, os quais passaram a julgar crimes predeterminados,

como ensina José Aleixo Irmão43.

Conforme o autor,

surgiram, desta forma os quaestores, que cuidavam dos homicídios; os dummviros que atendiam aos os crimes de lesa pátria e de lesa majestade; os quaestores que superintendiam ao erário e outros. Determinando esse fenômeno de delegação de poderes jurisdicionais, o crescido números de causas, e a dificuldade que representava o seu julgamento perante o comitatus maximus

44.

Isto posto, “formaram-se comissões ou juízes em comissão, com

jurisdição temporária, à medida que os delitos eram perpetrados45”.

Afirma ainda que

com o correr dos tempos, essas comissões, denominadas quaestiones,

passaram de temporária a permanentes e distribuíam entre si os processos crimes a serem submetidas a julgamento perante elas. Estavam instituídas as quaestiones perpetuae, em substituição ao comitatus maximus

46.

41 Cf. ALEIXO IRMÃO, José. Grandezas e misérias do Júri. p.24. 42 TUCCI, Rogério Lauria. Origem do tribunal do júri. In: ______. (coord.). Tribunal do júri: estudo sobre a mais democrática instituição jurídica brasileira. p.15. 43 Cf. ALEIXO IRMÃO, José. Grandezas e misérias do júri. p.23. 44 ALEIXO IRMÃO, José. Grandezas e misérias do júri. p.23. 45 ALEIXO IRMÃO, José. Grandezas e misérias do júri. p.23. 46 [Sic] ALEIXO IRMÃO, José. Grandezas e misérias do júri. p.23.

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As quaestiones perpetuae eram presididas por um pretor, denominado

de praetor urbanus, este tinha a competência para compor a quaestio, fazer o sorteio dos

jurados, gerir os respectivos debates, além de fazer a polícia das sessões e sentenciar.

Competia a outro pretor, o praetor peregrinus, o julgamento entre os estrangeiros e dos

estrangeiros e cidadãos47. Nesta época a pretura foi a mais alta dignidade, superados apenas

pelos cônsules romanos48.

Quanto aos jurados, pelas palavras do referido autor, estes eram

“simples cidadãos, a princípio tirados entre os senadores; depois da ordem dos cavaleiros e,

finalmente, recrutados entre as ordens mencionadas e mais dos tribunos do tesouro49”.

Todavia, um cidadão para estar qualificados à investidura do cargo de

jurado nas quaestiones perpetuae deveria se enquadrar em determinadas condições, quais

sejam: “ter 30 anos no mínimo ou 60 no máximo; nascido livre; não ter sido degredado da

ordem dos senadores; não sofrer nota infamante ou pena; residir em Roma e conhecer as leis e

os costumes dos habitantes50”.

Segundo João Mendes de Almeida Júnior, “no processo romano desta

época destacam-se os seguintes princípios”:

1- o direito popular de acusação; 2- o direito de prosseguir no feito até final sentença; 3 - o encargo das diligência da instrução comissionado ao próprio acusador popular; 4 - restrição de prisão preventiva; 5 - aplicação de liberdade provisória sob caução fidejussória; 6 - a completa publicidade de todos os atos do processo; 7 - o direito popular de julgamento51.

1.1.4 DA ORIGEM BÁRBARA E FEUDAL

Conforme doutrina Arthur Pinto da Rocha, ipsis literis, “os tribunais

wehmicos, cuja origem é das mais antigas e que existiram em Westphalia até o século XVI,

revelam a tendência acentuada que tinham os povos da raça germânica para os juízos

populares52”.

Referido autor, em seguida, descreve esses tribunais; por suas

palavras:

47 Cf. ALEIXO IRMÃO, José. Grandezas e misérias do júri. p.24. 48 Cf. ALEIXO IRMÃO, José. Grandezas e misérias do júri. p.24. 49 ALEIXO IRMÃO, José. Grandezas e misérias do júri. p.24. 50 ALEIXO IRMÃO, José. Grandezas e misérias do júri. p.24. 51 ALMEIDA JÚNIOR, João Mendes. O processo criminal brasileiro. 4.ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1959. v.I, p.150. 52 [Sic.] PINTO DA ROCHA, Arthur. O jury e a sua evolução. p.49.

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eram secretos, os seu juizes desconhecidos tinham uma extraordinária influência sobre todas as classes sociais com poderes ilimitados. Os próprios juizes eram os executores de suas sentenças que se verificavam pelo punhal ou pela força53.

Rogério Lauria Tucci, explica as palavras de Pinto da Rocha

esclarecendo que “embora tais tribunais retratassem a rebeldia do direito germânico às

instituições romanas e cristãs, revelavam, claramente, a tendência dos povos germânicos para

a popularização dos juízos54”.

De ver-se que “segundo refere Tacito55, a assembléia pública do

Estado designava para cada cantão – um príncipe que administrava a justiça com o concurso

de cem homens livres56”.

Arthur Pinto da Rocha lecionando ainda que,

primitivamente, o povo julgava as causas capitais no champs de Mars

(campo de março57) ou no Champs de Mai (campo de maio58); pouco a pouco, porém, os placita extraordinária fixaram-se no domínio político e transformaram-se nos Reichstag59. Os plaids ou assembléias públicas em que se julgavam os processos, os plaids provinciais, landtags, conservavam a posse da jurisdição criminal60.

Quanto aos francos, ensina Pinto da Rocha, haviam constituído um

tribunal popular denominado Mall ou placitum61.

Referido tribunal, conforme o precitado autor, compunha-se dos

homens livres ou notáveis, os rachimburgos ou boni homines in mallbergo sedentes; “eram

fortemente multados aqueles que não compareciam62”.

Também havia a possibilidade de se suscitar o impedimento, ditos

legítimos, sendo fundamentados “na doença, no serviço do Senhor, ou na morte de parentes”;

53 PINTO DA ROCHA, Arthur. O jury e a sua evolução. p. 49. 54 TUCCI, Rogério Lauria. Origem do tribunal do júri. In: ______. (coord.). Tribunal do júri: estudo sobre a mais democrática instituição jurídica brasileira. p.25. 55 (c. 55 d.C.-c. 120) Historiador romano, autor de Anais e Histórias. Enciclopédia barsa: índice enciclopédico. p.529. 56 [Sic.] PINTO DA ROCHA, Arthur. O jury e a sua evolução. p.49. 57 Cf. TUCCI, Rogério Lauria. Origem do tribunal do júri. In: ______. (coord.). Tribunal do júri: estudo sobre a mais democrática instituição jurídica brasileira. p.25. 58 Cf. TUCCI, Rogério Lauria. Origem do tribunal do júri. In: ______. (coord.). Tribunal do júri: estudo sobre a mais democrática instituição jurídica brasileira. p.25. 59 Câmara baixa da Alemanha, eleita por voto universal. Enciclopédia barsa: índice enciclopédico. p.469. 60 Cf. PINTO DA ROCHA, Arthur. O jury e a sua evolução. p.49. 61 Cf. PINTO DA ROCHA, Arthur. O jury e a sua evolução. p.50. 62 Cf. PINTO DA ROCHA, Arthur. O jury e a sua evolução. p.50.

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posteriormente os Wisigodos incluíram nessas justificativas a inundação, a neve e a força

maior63.

Quanto à composição dos Malls, nota-se que

em nenhuma disposição da lei antiga aparece uma referência, sequer, ao número de rachimburgos ou scabinos necessários para a constituição dos tribunais. Em todo o caso, como a lei salica prescrevia a pena de multa para sete daqueles que se recusassem a funcionar como juízes, é licito concluir que, pelo menos, era necessário esse número para se constituir o tribunal64.

Dito isto, observa ainda o autor, que depois da invasão bárbara sofrida

pelo império romano, “foram modificadas as primitivas instituições daqueles, ao contato da

civilização latina e surgiram os plegos dos burgos, os centurionatos e as decanias65”.

Ao Conde, competia a presidência desses tribunais, sendo o mesmo

responsável por resumir o fato, estabelecer os dados da questão, recolher os votos e proferir o

julgamento. Podia ainda convocar plaids extraordinários.

Pinto da Rocha, aponta as palavras de François Guizot, grande

estadista e historiador francês, o qual considera a intervenção do povo na administração da

justiça,

como um dos elementos orgânicos mais notáveis da sociedade feudal: o julgamento das contestações suscitadas pelos proprietários de feudos entre si: ‘todos os fatos no estado social se resolvem por julgamentos; a intervenção dos cidadãos na da justiça é, pois, a garantia verdadeira, definitiva da liberdade. Ora, esta garantia existia na sociedade feudal: o julgamento pelos pares era o princípio fundamental da jurisdição, se bem que de aplicação muito irregular’66.

Não há como prosseguir sem os devidos esclarecimentos a respeito do

referido “julgamento pelos pares”. É Mister, nesse ponto, fazer a devida ressalva, nas palavras

de Pinto da Rocha, o qual assevera que

o julgamento pelos pares não equivale de modo nenhum ao julgamento pelos jurados. O tribunal dos pares, que caracterizou o sistema judiciário das sociedades feudais, não tem a mesma significação do júri. Aquele estabelece o julgamento por meio de categorias, pressupõe a desigualdade política como fundamento da organização social; este repele a idéia de classe e funda-se na máxima igualdade política. O julgamento, portanto, dos pares é

63 Cf. PINTO DA ROCHA, Arthur. O jury e a sua evolução. p.50. 64 PINTO DA ROCHA, Arthur. O jury e a sua evolução. p.50. 65 Cf. PINTO DA ROCHA, Arthur. O jury e a sua evolução. p.50. 66 PINTO DA ROCHA, Arthur. O jury e a sua evolução. p.53.

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inteiramente contrário ao julgamento do Júri, se bem que se aproximem pela semelhança da forma67.

1.1.5 DA ORIGEM INGLESA

Quanto à origem do Tribunal do Júri em solo inglês, vários autores

comungam no sentido de que nesta terra o tribunal popular surgiu; como ensina José

Frederico Marques, o Júri nasceu na Inglaterra, “depois que o Concílio de Latrão aboliu as

ordálias e os juízos de Deus68”.

Conforme Rui Barbosa, o Júri “recebeu os primeiros traços de sua

forma definitiva no solo britânico, depois da conquista normanda, sob Henrique II69”, de ver-

se notar também, o que assevera Pinto da Rocha; segundo o autor:

foram os normandos os conquistadores da Inglaterra. Os elementos que realizaram a invasão do arquipélago levaram consigo os germens das próprias instituições que, em virtude de longa permanência, resultante de conquista, se adaptaram e radicaram entre os povos dominados. Os normandos conheciam e praticavam a instituição do Júri, se bem que rudimentar, e que lhes ficara da dominação romana70.

Conforme explica referido autor, no século X, a Normandia fora

hierarquizada, e, entre as instituições judiciais que foram criadas, adaptou-se um júri de vinte

e quatro membros, “escolhidos entre as pessoas vizinhas do lugar onde o crime fora praticado,

consagrando também o princípio das recusações71”.

Dito isso, Pinto da Rocha, ressalta que,

com tais elementos, não admira que o Júri inglês em sua primitiva forma apresentasse um caractere misto, condenando, sim, mas atestando primeiramente que o acusado cometera o crime em determinadas circunstâncias de fato e de lugar72.

Continua o autor, afirmando que,

primitivamente, o Júri era apenas um conjunto de testemunhas, por cujo intermédio a comuna depunha a favor ou contra o acusado; o seu veredicto,

67 PINTO DA ROCHA, Arthur. O jury e a sua evolução. p.55. 68 MARQUES, José Frederico. O júri no direito brasileiro. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 1955. p.45; Acquaviva. Marcus Cláudio. Tribunal do júri. p.18. 69 BARBOSA, Rui. Obras completas de Rui Barbosa: posse de direitos pessoais, o Júri e a independência da magistratura. p.148. 70 PINTO DA ROCHA, Arthur. O jury e a sua evolução. p.61. 71 [Sic.] PINTO DA ROCHA, Arthur. O jury e a sua evolução. p.61. 72 PINTO DA ROCHA, Arthur. O jury e a sua evolução. p.61.

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pois, fundava-se sobre o conhecimento próprio do fato e, além disso do caractere, antecedentes e qualidades do indigitado criminoso73.

Porém, assim que a Inglaterra teve de substituir as ordálias, que

acabaram de ser condenadas pelo Concílio de Latrão, os ingleses imaginaram um meio

infinitamente mais sábio de dirimir as pendências ocorridas, substituindo o julgamento de

Deus e a prova pelo combate; assim, reuniam-se doze vizinhos do acusado, que decidiam a

inocência ou a culpabilidade deste74.

Acquaviva ensina ainda, que havia a seguinte convicção quanto ao

número de doze jurados, sendo que

em lembranças aos doze apóstolos que havia recebido a visita do espírito santo, quando doze homens de consciência pura se reuniam sob a invocação divina, a verdade infalivelmente se encontrava entre eles. Desta crença teria nascido o Júri75.

No mesmo sentido Arthur Pinto da Rocha relata que o número místico

de doze, se dá em recordação aos doze apóstolos; e, este número de jurados dava a esta

instituição popular, ou seja, o Tribunal do Júri que surgia, a sanção religiosa reclamada pela

opinião pública da época76.

1.1.6 DA EVOLUÇÃO DO TRIBUNAL DO JÚRI NA AMERICANA DO NORTE

Aqui, trata-se de uma evolução do Tribunal do Júri, com isso, já esta a

instituição consolidada em seus moldes mais modernos, como abordado anteriormente,

todavia, a seguir será tratado acerca da evolução à um Júri que segundo Arthur Pinto da

Rocha, é um modelo para todos os outros; por suas palavras: “um jury verdadeiramente

nacional é o Jury dos Estados Unidos da América do Norte e sua organização é digna de

servir de modelo a todos os povos77”.

De ver-se notar, conforme orientação de Rui Barbosa, que entre os

colonizadores ingleses na América do Norte, o julgamento pelo júri foi uma de suas garantias

básicas, havendo uma forte relação entre o júri e a liberdade78. “Prezavam-no os colonos

73 PINTO DA ROCHA, Arthur. O jury e a sua evolução. p.61. 74 PINTO DA ROCHA, Arthur. O jury e a sua evolução. p.63. 75 ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Tribunal do júri. p.18. 76 PINTO DA ROCHA, Arthur. O jury e a sua evolução. p.64. 77 [Sic] PINTO DA ROCHA, Arthur. O jury e a sua evolução. p.83. 78 Cf. BARBOSA, Rui. Obras completas de Rui Barbosa: posse de direitos pessoais, o Júri e a independência da magistratura. p.149.

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ingleses como uma das suas instituições mais caras”, sendo que “era um direito ingênito aos

americanos, a sua primogenitura, o seu patrimônio hereditário, their birthright79

,80”;

“encaravam-no como a mais preciosa parte da sua herança81”.

Assevera ainda, o autor, que “antes de passar das Ilhas Britânicas para

o continente”, no caso o continente europeu, “a velha inspiração do gênio legista dos anglo-

saxônios estabelecera a sua segunda pátria no solo americano82".

Segundo consta na obra de Rui Barbosa:

O júri foi uma das instituições mais antigas das colônias inglesas na América do Norte. Já o consagrava formalmente a carta-régia, outorgada ao primeiro grupo de emigrantes que da Inglaterra veio civilizar aquelas paragens. A patente dada, em 1629, aos colonos de Plymouth, os pais da América atual, assegurava-lhes entre ‘as livres liberdades do livre povo inglês’, santificadas quase na mesma linguagem da Magna Carta quatro séculos antes, o julgamento pelo júri. Já então se reputava entre os americanos, uma das leis fundamentais83.

Dito isso, nota-se que as províncias coloniais comungavam entre si

quanto aos valores inerentes ao Tribunal do Júri, com isso “o sistema de governo

representativo, com o processo do júri, adquiriu foro de direito reconhecido” no novo

hemisfério, “de modo que muito antes de constituírem nação independente, ‘o julgamento

geral de todas as causas pelo júri se achava tão universalmente estabelecido nas colônias

como na metrópole84”.

Ainda ensina Rui Barbosa que,

quando se separaram da mãe pátria, um dos agravos ‘atrovejados pelo Congresso Continental aos ouvidos do mundo, como afronta suficiente para justificar a revolta’ foi o de que o governo de Jorge III ‘os privara, em muitos casos, do benefício do júri’. São palavras da Declaração de Independência85.

79 Their Birthrights: seus direitos inerentes ao nascimento; direito que vem de berço; direito adquirido pelo fato de ser natural de determinado local (tradução livre). 80 BARBOSA, Rui. Obras completas de Rui Barbosa: posse de direitos pessoais, o Júri e a independência da magistratura. p.150. 81 BARBOSA, RUI. Obras completas de Rui Barbosa: posse de direitos pessoais, o Júri e a independência da magistratura. p.150. 82 BARBOSA, Rui. Obras completas de Rui Barbosa: posse de direitos pessoais, o Júri e a independência da magistratura. p.148. 83 BARBOSA, Rui. Obras completas de Rui Barbosa: posse de direitos pessoais, o Júri e a independência da magistratura. pp.148-149. 84 Cf. BARBOSA, Rui. Obras completas de Rui Barbosa: posse de direitos pessoais, o Júri e a independência da magistratura. p.149. 85 [Sic.] BARBOSA, Rui. Obras completas de Rui Barbosa: posse de direitos pessoais, o Júri e a independência da magistratura. p.150.

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1.1.7 DO TRIBUNAL DO JÚRI NA FRANCA APÓS A REVOLUÇÃO DE 1789

As profundas modificações perpetradas pela Revolução Francesa de

1789 em sua sociedade não poderiam deixar de afetar também a organização judiciária do

país, modificando-a em favor de formas mais compatíveis com as idéias revolucionárias, ou

seja, a dignidade da pessoa humana, de acordo com os direitos proclamados86.

Com o decreto de 30 de abril de 1790, a Assembléia Constituinte

consagrou a admissão do Júri criminal como instituição judiciária, como ensina Arthur Pinto

da Rocha; o mesmo ainda evidencia que,

os abusos, as violências, as barbaridades da tortura, a dominação absoluta da vontade dos déspotas haviam preparado o advento dessa instituição, como um porto de bonança e de salvamento. Os espíritos estavam absolvidos pela palavra dos mais notáveis homens públicos: a magistratura e a filosofia tinha feito a propaganda87.

Os franceses revolucionários já haviam notado o Júri inglês, sendo

que os magistrados, os filósofos e os publicistas franceses já o tinham como alvo de seus

olhares, e, então como já havia sido feito pelas colônias americanas anteriormente, a nação

revolucionária adotou o modelo inglês, bem como adotou destas colônias os direitos do

homem, pilares de sua revolução. Dito isso, ressalta-se a adoção do Júri inglês como

pretensão de completar a sua grande obra de reforma88.

Dentre as modificações aplicadas pelos franceses ao Júri inglês, cita-

se a determinação legal que para ser jurado; era necessário ser eleitor, sendo que o eleitor que

não se inscrevesse na lista dos jurados perderia seus direitos políticos durante dois anos89.

Segundo Pinto da Rocha, “esta foi, sem dúvida, a mais notável

modificação que a reforma de 1789 introduziu na velha instituição do Júri90”.

De notar-se ainda, é que a Assembléia Constituinte francesa

proclamou por lei o princípio da publicidade dos debates, dizendo ainda que o Júri funcionaria

nas causas criminais e cíveis; como se observa,

o processo criminal, porém, compõe-se de três fases distintas: I. A instrução preparatória; II. O Júri de Acusação; III. Debates no tribunal criminal e Júri de julgamento definitivo. Como se vê, o que nos importa conhecer é que na

86 Cf. PINTO DA ROCHA, Arthur. O jury e a sua evolução. p.75. 87 PINTO DA ROCHA, Arthur. O jury e a sua evolução. p.75. 88 Cf. PINTO DA ROCHA, Arthur. O jury e a sua evolução. pp.76-77. 89 Cf. PINTO DA ROCHA, Arthur. O jury e a sua evolução.. p.77. 90 PINTO DA ROCHA, Arthur. O jury e a sua evolução. p.77.

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segunda parte do processo criminal aparece como simples tribunal de acusação91.

Dessa feita, Pinto da Rocha instrui que o referido Júri de acusação era

composto de oito membros, sorteados de uma lista de trinta cidadãos, sendo que esta lista era

elaborada pelo procurador local; importante salientar que no Júri de acusação não havia a

possibilidade de recusas por nenhuma das partes92.

Já no Júri de julgamento, havia o direito de recusas pelas partes, vinte

no total para as peremptórias e ilimitadas para as motivadas; ainda, como assevera Pinto da

Rocha quanto ao Júri de julgamento, este

se compõe de doze membros e a sua formação definitiva depende de muitas formalidades. Todos os anos, em dezembro, o procurador-síndico de cada distrito organiza uma lista, sob pena de serem privados dos seus direitos políticos por dois anos93.

Arthur Pinto da Rocha traçando suas considerações, afirma ainda que

a França republicana e revolucionária modificou notavelmente a instituição do Júri a fim de poder adaptá-la às circunstâncias em que se encontrava entre a tradição histórica, secular, que tinha raízes profundas na sociedade e a aspiração liberal que fazia da velha e arcaica processualística mosaica, ateniense, romana, bárbara, feudal e inglesa um ideal inteiramente novo, inseparável da liberdade [...]94.

1.2 ASPECTOS RELEVANTES SOBRE O TRIBUNAL DO JÚRI NO BRASIL

Aqui se tratará de dar amparo ao Tribunal do Júri no ordenamento

jurídico brasileiro, desde a sua criação no ano de 182295 até a contemporaneidade, observando

sua evolução, pois, notadamente se observa grandes mudanças procedimentais ao longo de

sua história, bem como alterações em sua competência, e eventualmente outras que serão

oportunamente abordadas.

91 PINTO DA ROCHA, Arthur. O jury e a sua evolução. p.78. 92 PINTO DA ROCHA, Arthur. O jury e a sua evolução. pp.78-81. 93 PINTO DA ROCHA, Arthur. O jury e a sua evolução. p.79. 94 PINTO DA ROCHA, Arthur. O jury e a sua evolução. p.83. 95 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.15.

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1.2.1 CRIAÇÃO E REGULAMENTAÇÃO NA CONSTITUIÇÃO DO PERÍODO

IMPERIAL

No ordenamento jurídico pátrio o Tribunal do Júri vem sendo

regulado desde o período imperial, criado pela Lei de 18 de junho de 182296, ou seja, meses

antes da independência desta nação, que ocorreria dia 7 de setembro. O Tribunal do Júri

pátrio, no momento de sua criação possuía competência apenas para o julgamento dos crimes

de liberdade imprensa97.

É o que ensina José Frederico Marques; por suas eruditas palavras,

coube ao Senado da Câmara do Rio de Janeiro, em vereação extraordinária

de 4 de fevereiro de 1822, dirigir-se a Sua Alteza, o Príncipe Regente D. Pedro, solicitando a criação do Juízo dos Jurados, para execução da Lei de Liberdade de Imprensa no Rio de Janeiro, ‘aonde a criação do Juízo dos Jurados parece exeqüível sem conveniente, atenta a muita população de que se compõe, e as muitas luzes que já possui’98.

Dito isso, conforme assevera João Mendes de Almeida Júnior,

declarava o Príncipe Regente que,

‘procurando ligar a bondade, a justiça e a salvação pública, sem ofender a liberdade bem entendida da imprensa, que desejo sustentar e conservar, e que tantos bens tem feito à causa sagrada da liberdade brasílica’ criava um tribunal de juízes de fato composto de vinte e quatro cidadãos. ‘Homens bons, honrados, inteligentes e patriotas’ nomeados pelo Corregedor do Crime da Corte e Casa [...]99.

Todavia, de ver-se aqui fazer a devida ressalva quanto ao número de

vinte e quatro jurados referidos, trata-se da totalidade, pois, uma vez que as recusas, em

número de dezesseis, fosses efetuadas se passaria ter apenas oito jurados, que segundo as

palavras do Príncipe, esses “oito restantes seriam o suficiente para compor o conselho de

julgamento100”.

Segundo consta, o único recurso cabível da decisão seria ao próprio

Príncipe, de acordo com suas palavras: “os réus só poderiam apelar para a minha real

clemência101”.

96 WHITAKER, Firmino. Jury. p.8. 97 ALMEIDA JÚNIOR, João Mendes. O processo criminal brasileiro. p.150. 98

MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.15. 99 ALMEIDA JÚNIOR, João Mendes. O processo criminal brasileiro. p.150. 100 Cf. ALMEIDA JÚNIOR, João Mendes. O processo criminal brasileiro. pp.150-151. 101 Cf. ALMEIDA JÚNIOR, João Mendes. O processo criminal brasileiro. p.151.

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Segundo destaca-se da obra de José Frederico Marques,

a Constituição Política do Império, promulgada em 25 de março de 1824, ao estatuir sobre o Poder Judiciário, assim dispôs: ‘Art. 151 – O Poder Judicial é independente e será composto de juízes e jurados, os quais terão lugar no cível e no crime, nos casos e pelo modo que os Códigos determinarem’. ‘Art. 152 – Os jurados pronunciam sobre o fato e os juízes aplicam a lei’. Posteriormente, a lei de 20 de setembro de 1830 deu ao Júri organização mais específica [...]. Neste diploma legal, vinha previsto o Júri de Acusação e o Júri de Julgação102.

Nota-se aqui, que o Júri foi elevado a órgão do Poder Judiciário, além

do que a Carta Constitucional do Império fez previsão do julgamento pelos jurados em

matéria civil, todavia, como ensina Firmino Whitaker,

não exerceu, porém, o Júri poder algum nos processos civis. Os legisladores que procuraram desenvolver e regulamentar os preceitos de liberalíssima Carta, entenderam que os juízes do povo poderiam somente, com os requisitos da integridade e critério, decidir bem as questões criminais; mas não as civis, que, em sua maioria complexas e difíceis, exigiam, além desses requisitos, o conhecimento das leis e a prática de julgar103.

1.2.2 O TRIBUNAL DO JÚRI NO CÓDIGO DE PROCESSO CRIMINAL DO IMPÉRIO

Antes de mais nada, mister se faz neste momento observar, como

doutrina Vicente Greco Filho, que no Brasil, durante o período colonial, devido ao fato deste

país e Portugal formarem um Estado único, aplicavam-se as leis da metrópole à colônia104.

Vigorando, por conseguinte, em matéria processual penal as

Ordenações do Reino, no caso as Ordenações Filipinas, as quais mesmo depois da

independência regeram o processo penal até os anos de 1832, quando surgiu o Código de

Processo Criminal do Império, contudo, “nas vésperas da independência, por reflexo do

movimento liberal europeu, a legislação portuguesa aplicável ao Brasil passa a estabelecer

garantias para o acusado, abolindo-se a tortura e certas penas infamantes105”.

Contudo, ainda assevera Vicente Greco Filho que,

tais reformas, porém, não eram satisfatórias para o novo país de após 1822, que queria reagir firmemente contra as leis propiciadoras do arbítrio. Inspirado na Constituição de 25 de março de 1824, que definiu os direitos

102 [Sic.] MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.16. 103 WHITAKER, Firmino. Jury. p.9. 104 Cf. GRECO FILHO, Vicente. Manual de processo penal. 3.ed. Atual. São Paulo: Saraiva, 1995. p.73. 105 GRECO FILHO, Vicente. Manual de processo penal. p. 73.

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políticos e civis dos cidadãos brasileiros, surgiu o Código de Processo Criminal de 1832, em que dominava em espírito antiinquisitorial e liberal106.

Quanto ao Tribunal do Júri, segundo afirma José Frederico Marques,

o qual cita Cândido de Oliveira Filho, o Código de Processo Criminal do Império, imitando as

leis inglesas, norte-americanas e francesas,

deu ao Júri atribuições amplíssimas, superiores ao grau de desenvolvimento da nação que se constituía, esquecendo-se, assim, o legislador de que as instituições judiciárias, segundo observa MITTERMAIER, para que tenham bom êxito, também exigem cultura, terreno e clima apropriados107.

Consta no Código Processual de 1832, que em cada distrito havia um

juiz de paz, um escrivão, oficiais de justiça, além de inspetores de quarteirão; já nos termos,

um Conselho de Jurados, o juiz municipal, o promotor público, um escrivão das execuções e

oficiais de justiça; nas comarcas, um juiz de direito, ou mais deles, conforme a população do

local108.

Conforme norteia, José Frederico Marques, “em cada termo havia um

Conselho de Jurados, podendo reunir-se dois ou mais termos para formá-lo, cuja, a ‘cabeça’

seria ‘a cidade, vila ou povoação, onde com maior comodidade de seus habitantes’ pudesse

‘reunir-se o conselho’109”.

Referidos juízes de paz tinham competência para o julgamento de

determinados crimes, e outras atribuições, senão de ver-se observar, por exemplo, o

julgamento das contravenções às posturas municipais, prisão, degredo, desterro até seis

meses. Os demais crimes eram de competência do conselho de jurados110.

Como bem assevera José Frederico Marques, havia dois conselhos de

jurados:

sendo o primeiro conselho, ou Júri de acusação, composto de vinte e três jurados e o segundo, ou Júri de sentença, de doze. Aos juízes de paz competia, outrossim, proceder a auto de corpo de delito e formar a culpa aos delinqüentes, remetendo os autos ao juiz de paz da cabeça do termo onde se deveria reunir o conselho, sob a presidência de um juiz de direito111.

106 [Sic.] MARQUES, José Frederico. Tratado de direito processual penal. São Paulo: Saraiva, 1981. v.1, p. 112. 107 OLIVEIRA FILHO, Cândido. A reforma do júri. p.9-10. Apud MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.16. 108 Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.16. 109 Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.16. 110 Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.16. 111 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.16.

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Para ser jurado bastava ter reconhecido bom senso, probidade e poder

ser eleitor, com ressalva aos senadores, deputados, conselheiros e ministros de estado, bispos,

magistrados, oficiais de justiça, juízes eclesiásticos, vigários, presidentes, secretários dos

governos das províncias, comandantes das armas e dos copos de primeira linha; referidas

pessoas estavam excluídas da lista de jurados112.

Com as reformas ocorridas em 1841, pela Lei nº 261, de 3 de

dezembro, e em 1842, pelo Regulamento nº 120, de 31 de janeiro, como bem leciona José

Frederico Marques,

extinguiu-se o Júri de acusação, e a formação da culpa e a sentença de pronúncia foram atribuídas às autoridades policiais [...] e aos juízes municipais, dependendo a pronúncia dos delegados e subdelegados de confirmação dos juízes municipais113.

Ainda sobre a reforma sofrida pela Lei nº 261, relevante é considerar a

exigência da unanimidade de votos para a aplicação da pena de morte, feita pelo Código de

Processo Criminal; tal requisição foi modificada pelo artigo 66 da referida lei, determinando

que a decisão do Júri fosse vencida por dois terços dos votos. Demais decisões sobre outras

questões propostas sendo vencidas por maioria absoluta dos votos; e no caso de empate,

sendo adotada a opção mais favorável ao acusado114.

“Ao juiz de direito cabia a aplicação da pena, à vista das decisões

proferidas sobre o fato pelos jurados, em seu grau máximo, médio ou mínimo115”.

Segundo Firmino Whitaker, “trinta anos depois, a Lei nº 2.033, de

vinte de setembro de 1871, regulamentada pelo decreto nº 4.824, de 22 de novembro do

mesmo ano, veio dar ao Júri a organização definitiva que a república encontrou116”, dentre

tais modificações, José Frederico Marque cita as principais, sendo elas: “as pronúncias

passaram a ser da competência dos juízes de direito nas comarcas especiais [...] e dos juízes

municipais nas comarcas gerais”, foi também restituída a exigência da unanimidade para a

aplicação da pena de morte117.

112 Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.17. 113 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.18. 114 Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.19. 115 Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.19. 116 WHITAKER, Firmino. Jury. 1930. p.9. 117 Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.20.

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1.2.3 O TRIBUNAL DO JÚRI NO BRASIL REPUBLICANO

Com a proclamação da República, foi mantido o Tribunal do Júri, e

logo já surgiram mudanças significativas, em 11 de outubro de 1890, pelo Decreto de nº 848

deu a organização da Justiça Federal, prevendo o Júri Federal118, o qual era competente para o

julgamento dos crimes de competência da Justiça Federal da época, enumerados no Código de

Processo Civil e Criminal da Justiça Federal119.

Como ensina José Frederico Marques:

sobre o Júri Federal e as posteriores leis da Justiça Federal, assim se exprime o Prof. J. C. Mendes de Almeida: ‘O Júri de sentença federal, segundo o Decreto federal nº 848, de 11 de outubro de 1890, era também composto de doze juízes de fato, sorteados dentre trinta e seis cidadãos dos corpo de jurados estadual (arts. 71 e 94) da comarca. Formavam a culpa os juízes seccionais e, mais tarde, pelo Decreto federal nº 1.420, de 21 de fevereiro de 1891, os juízes substitutos. Estavam afastados da competência do Júri os processos e julgamentos de crimes políticos120.

Mais tarde, por Leis federais e Decretos o Júri Federal sofreu várias

alterações significantes, no tocante a sua competência, foram excluídos os crimes de moeda

falsa, contrabando, peculato, falsificação de estampilhas, selos adesivos, veles postais, dentre

outros, passando, por conseguinte à competência do juiz de secção121.

1.2.4 DO TRIBUNAL DO JÚRI NA CONSTITUIÇÃO REPUBLICANA DE 1891

Aos dias de 25 de fevereiro de 1891, com a promulgação da primeira

Constituição republicana brasileira, tinha-se no seu artigo 72, § 31: “É mantida a instituição

do Júri”, depois de longos debates no plenário constituinte, quando por maioria foi aprovada a

118 Júri Federal: necessário observar os crimes de competência da justiça federal, neste caso, tratando-se de crimes dolosos contra a vida, resultará fixada a competência para Tribunal do Júri Federal. Como exemplo, hodiernamente, em atenção às normas previstas na Constituição Federal na celeuma da competência da Justiça Federal, sendo o crime de competência do Tribunal do Júri, e, tratando-se de ofendido funcionário público federal, lesado no exercício ou com motivação na sua função pública, resulta fixada a competência para o julgamento perante o Júri Federal. Cf. MARQUES PORTO, Hermínio Alberto. Júri: procedimentos e aspectos do julgamento questionários. 8.ed. rev. e ampl. São Paulo: Malheiros, 1996. p.302. 119 Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.20. 120 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.20. 121 Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. pp.20-21.

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emenda que versava sobre o Júri122, sendo o mesmo previsto no capítulo dos Direitos e

Garantias Fundamentais, como leciona Hermínio Alberto Marques Porto123.

Pelas palavras de Firmino Whitaker, “o preceito da Constituição

Republicana é lacônico”, por conseguinte, isso gerou uma controvérsia que mobilizou grandes

jurisconsultos da época, todos com o objetivo de resolver a questão: “é mantida a instituição

do Júri124”.

Neste sentido relata José Frederico Marques que:

sobre a significação do lacônico texto constitucional, surgiu ampla discussão, em 1896, quando do processo sofrido pelo juiz da comarca de Rio Grande, Dr. ALCIDES DE MENDONÇA LIMA, que, presidindo ao Tribunal popular, excluiu os jurados recusados pelas partes, apesar de declarar a Lei gaúcha nº 10, de 1895, no art. 66, que os ‘jurados não podem ser recusados’125.

O referido magistrado contratou ninguém menos que Rui Barbosa

para a sua defesa, sendo que em parecer emitido se manifesta no seguinte sentido:

quando a constituição diz: ‘é mantida a instituição do Júri’ (art. 72, § 31), sua intenção manifesta é determinar que ele, nos seus elementos substanciais, continue a existir tal e qual era sob o regímen de que saímos. A frase ‘é mantida’ exprime evidentemente um laço de continuidade, e tem por fim obstar à solução dela. Não quis o legislador constituinte simplesmente que a republica fosse dotada com a instituição do Júri, a que sob esse nome, se pudessem infligir modificações de caráter: manteve a instituição, isto é, prolongou a duração de uma entidade precriada, consolidou-a, perpetrou-a, fixou-a126. Para João Mendes de Almeida Júnior, “resultaria daí que a

constituição quis manter a Instituição do Júri, tanto para a jurisdição federal, como para as

jurisdições estaduais, tal como estava no tempo do Império127”.

Como assevera Carlos Maximiliano,

não ‘se compreende a palavra manter como impondo o status quo, o processo vigorante em 1889, a imobilidade incompatível com o processo’. O que quis a constituinte, foi ‘apenas salvar o Júri, em sua essência’,

122 Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.21. 123 Cf. MARQUES PORTO, Hermínio Alberto. Júri: procedimentos e aspectos do julgamento questionários. p.41. 124 Cf. WHITAKER, Firmino. Jury. p.10. 125 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.21. 126 [Sic.] BARBOSA, Rui. Obras completas de Rui Barbosa: posse de direitos pessoais, o Júri e a independência da magistratura. p.141. 127 ALMEIDA JÚNIOR, João Mendes. O processo criminal brasileiro. V.II. p.379.

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combatido que estava pelos criminalistas da escola positivista de FERRI e GAROFALO

128.

Discutiu-se muito sobre a essência da instituição do Tribunal do Júri.

“Rui Barbosa, além das recusas peremptórias e da votação secreta, nela incluía a existência de

doze jurados129”.

Quanto ao assunto controvertido, em data de 7 de outubro de 1899,

por acórdão o Supremo Tribunal decidiu:

‘são características do Tribunal do Júri: I – quanto a composição dos jurados, a) composta de cidadãos qualificados periodicamente por autoridades designadas pela lei, tirados de todas as classes sociais, tendo as qualidades legais previamente estabelecidas para as funções de juiz de fato, com recurso de admissão e inadmissão na respectiva lista, e b) o conselho de julgamento, composto de certo numero de juizes, escolhidos a sorte, de entre o corpo dos jurados, em numero tríplice ou quádruplo, com antecedência sorteados para servirem em certa sessão, previamente marcada por quem a tiver de presidir, e depurados pela aceitação ou recusação das partes, limitadas as recusações a um numero tal que por elas não seja esgotada a urna dos jurados convocados para a sessão; II – quanto ao funcionamento, a) incomunicabilidade dos jurados com pessoas estranhas ao Conselho, para evitar sugestões alheias, b) alegações e provas da acusação e defesa produzidas publicamente perante ele, c) atribuição de julgarem estes jurados segundo sua consciência, e d) irresponsabilidade do voto emitido contra ou a favor do réu130’.

Dito isso, José Frederico Marques ressalta que Firmino Whitaker,

na mais perfeita e completa monografia que entre nós se escreveu sobre o Júri, aplaudiu aquela decisão, entendendo que o Júri não pode ficar acorrentado às formas primitivas, nem estacionário, sem receber os influxos da ciência e os aperfeiçoamentos que a experiência dos tempos costuma trazer, por isso, embora condenasse e lamentasse as restrições à competência do Júri , cada vez mais numerosas, não julgava ‘inconstitucionais essas leis restritivas’131.

1.2.5 DO TRIBUNAL DO JÚRI NA CONSTITUIÇÃO DE 1934

Conforme orientação de João Alfredo Medeiros Vieira, “a

Constituição de 16 de julho de 1934, quando do governo de Vargas, colocou o Júri no

128 MAXIMILIANO, Carlos. Comentários à constituição brasileira. p.812, nota 2, e 814. Apud MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.22. 129 Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.22. 130 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.22. 131 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.23.

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Capítulo referente ao Poder Judiciário, tal qual como fizera a Constituição Política do

Império132”.

No seu artigo 72, sob a rubrica do Poder Judiciário, como já

asseverado, vinha proclamar o seguinte: “É mantida a instituição do Júri, com a organização e

as atribuições que lhe der a lei133”.

Conforme voto proferido pelo eminente ministro Manoel da Costa

Manso, no Supremo Tribunal Federal, período ditatorial de Getúlio Vargas,

‘a Constituição de 1934, nem declarou que o Júri era mantido como existia na época da sua promulgação, nem determinou que fossem guardados tais e tais elementos característicos. Foi mais longe: confiou ao critério do legislador ordinário suas atribuições. Quis a Assembléia Constituinte, sem dúvida, atender à necessidade de a uma reforma radical da vetusta instituição, de acordo com os ensinamentos da ciência penal moderna e os imperativos da defesa social contra o delito’134.

1.2.6 DO TRIBUNAL DO JÚRI NA CONSTITUIÇÃO DE 1937 E O DECRETO Nº 167, DE

5 DE JANEIRO DE 1938

Segundo constata-se, a Constituição de 10 de novembro de 1937 nada

mencionava sobre o Tribunal do Júri, tanto que se chegou até mesmo ao ponto suscitar-se sua

extinção em face da nova carta constitucional vigente135.

Todavia, para solucionar a omissão dos membros constituintes, em 5

de janeiro de 1938 era promulgado o Decreto nº 167, A Lei do Júri, o qual alterou

profundamente o Tribunal do Júri, porém, contudo, fixou sua existência, pois como

fundamentação na “exposição dos motivos” que o acompanhava o conspícuo ministro

Francisco Campos asseverou a subsistência do Júri136.

Afirmava o ilustre Ministro, que subsistia o Tribunal do Júri

‘por estar compreendido no preceito genérico do art. 183, da carta de 10 de novembro, que declarava em vigor, enquanto não revogadas, as leis que, explicita ou implicitamente, não contrariassem as disposições da constituição137’.

132 MEDEIROS VIEIRA, João Alfredo. O júri. 2.ed. São Paulo: Ledix. 2005. p.21. 133 Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. 1963. p.23. 134 COSTA MANSO, Manoel da. Revista dos tribunais: 97/261. Apud MARQUES, José Frederico. A Instituição do júri. p.23. 135 Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.24. 136 Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.24. 137 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.24.

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Conforme ensina José Frederico Marques, o Decreto nº 167

proclamou inúmeras alterações ao Tribunal do Júri, alterações estas de profunda relevância,

com relação à princípio balizador da referida instituição. Referido decreto, em seu artigo 92,

letra “b”, subtrai a chamada soberania dos veredictos, passando-se, dessa feita, a se permitir a

apelação pelo mérito; desde que houvesse, pela letra de tal dispositivo, ipsis literis, “injustiça

da decisão, por sua completa divergência, com as provas existentes nos autos ou produzidas

em plenário”138.

Neste caso, por conseguinte, ex vi do artigo 96 do Decreto nº 167,

‘se, apreciando livremente as provas produzidas, quer no sumário de culpa, quer no plenário de julgamento, o Tribunal de Apelação se convencer de que a decisão do Júri nenhum apoio encontra nos autos, dará provimento à apelação, para aplicar a pena justa, ou absolver o réu, conforme o caso139’.

Dito isso, sabe-se que no meio forense hodierno ao Decreto n º 167

houve muita discussão acerca da subtração da soberania dos veredictos. Para Pedro Aleixo, o

Decreto em tela ao regular a instituição do Júri praticamente o que fez, foi abolir a mesma; J.

C. Mendes de Almeida, verbi gratia, embora não condenasse a reforma atribuída pelo

Decreto, via nela “a morte virtual do instituto Tribunal dos Jurados”. Ary Franco encara o

assunto como um meio extremamente eficaz de coibir os abusos atribuídos ao Tribunal do

Júri140.

No Brasil republicano, o Decreto nº 167 foi a primeira lei nacional de

processo penal, esse diploma não só instruiu o Tribunal do Júri, após a omissão da

Constituição de 1937, como também disciplinou seu procedimento141.

Com a entrada em vigor do Código de Processo Penal, Decreto-Lei nº

3689 de 3 de outubro de 1941, os procedimentos referentes ao Tribunal do Júri foram

regulados de forma ampla, bem como a sua composição e organização, permanecendo o

Decreto nº 167 como sendo a base legal da instituição142.

138 Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.24. 139 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.24. 140 Cf. FRANCO, Ary Azevedo. Código de processo penal. v.2. p.95. 141 Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. pp.28-29. 142 Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.29.

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1.2.7 DO TRIBUNAL DO JÚRI NA CONSTITUIÇÃO DE 18 DE SETEMBRO DE 1946

Com a promulgação da Constituição de 1946, como ensina José

Frederico Marques, o Tribunal do Júri voltou a ter assento constitucional, sofrendo inúmeras

reformas em seus elementos estruturais, sendo restaurada a soberania dos veredictos,

suprimida pelo Decreto nº 167, sendo também lhe atribuída competência obrigatória para o

julgamento dos crimes dolosos contra a vida143, bem como sendo previsto

constitucionalmente no capítulo referente aos direitos e garantias fundamentais, conforme

magistério de Hermínio Alberto Marques Porto144.

Em seu artigo 141, §28, a Constituição de 1946 proclama, seja

mantida a instituição do Júri, com a organização que lhe der a lei, contanto que seja sempre ímpar o número de seus membros e garantido o sigilo das votações, a plenitude de defesa do réu e a soberania dos veredictos. Será obrigatoriamente de sua competência o julgamento dos crimes dolosos contra a vida145.

Assevera José Frederico Marques que em face da Constituição de

1946, o Júri só existirá “se obedecer a todas as imposições do art. 141, §28. Um outro tribunal

a que falte um só daqueles caracteres obrigatórios, não será órgão do judiciário, pois não se

encontra constitucionalmente previsto146”.

Ao comentar referido artigo da Constituição, José Frederico Marques

afirma que de acordo com este dispositivo,

mantida a instituição do Júri, deferido ficou o legislador ordinário estruturá-la juridicamente. A este, porém, opuseram-se limitações que se referem à organização e forma de funcionamento do tribunal, e à sua competência. Quanto à organização, vedado está à lei instituir o conselho julgador com número par de membros; quanto à forma de funcionamento, não podem as normas regulamentarem o Júri, cercear o direito de defesa, nem estabelecer julgamentos descobertos. Em relação à competência: a) os crimes dolosos contra a vida, são, ratione materiae, da atribuição privativa, quanto ao julgamento, do Tribunal do Júri; b) não cabe aos tribunais superiores ou a qualquer outro órgão judiciário, em relação á competência funcional, conhecer dos veredictos soberanos do Júri, para, como judicium rescisorium, reforma-los em grau recurso147.

143 Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.29. 144 Cf. MARQUES PORTO, Hermínio Alberto. Júri: procedimentos e aspectos do julgamento questionários. p.41. 145 MARQUES PORTO, Hermínio Alberto. Júri: procedimentos e aspectos do julgamento questionários. nota 54, “b”. p.42. 146 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.28. 147 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.26.

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Uma vez observadas essas limitações constitucionais, então, o

legislador ordinário pode regulamentar a instituição do Tribunal do Júri como lhe parecer

mais acertado, respeitando aquilo que a constituição declara como essencial à instituição,

pois, como ensina José Frederico Marques, “o que a Constituição manteve foi a instituição do

Júri, e não outras formas de tribunal popular, como o dos escabinos148 ou o

assessorado149,150”.

1.2.8 DAS ALTERAÇÕES NO TRIBUNAL DO JÚRI PELA LEI Nº 263, DE 23 DE

FEVEREIRO DE 1948

Ainda sob a vigência da Constituição de 1946, foi promulgada aos

dias 23 de fevereiro de 1948, a Lei nº 263; tal Lei, nas palavras de José Frederico Marques,

“procurou dar ao texto constitucional uma complementação sábia e equilibrada151”,

modificando o Código de Processo Penal, sendo que sua ementa versa no seguinte sentido:

“Modifica a competência do Tribunal do Júri e dá outras providências152”.

Dentre as principais alterações, destaca-se a questão da apelação,

visando eliminar parte dos abusos derivados do Tribunal do Júri, uma vez que submetia os

veredictos a um controle das jurisdições superiores, mesmo assim não violando a soberania

dos veredictos153. Carlos Maximiliano opina a respeito no seguinte sentido: “A constituição

vigente restaura o passado: o Tribunal excelso, em vez de fulminar o culpado, manda-o a um

novo julgamento pelos seus concidadãos154”.

Assevera José Frederico Marques, que “as regras sobre a competência

por conexão e continência de causa, sofreram as adaptações impostas pelas modificações

constitucionais sobre a competência do Júri155”. Esclarece Júlio Fabbrini Mirabete que por

148 Escabino: Tribunal misto, composto por juízes leigos (jurados) e profissionais. No Escabinado a responsabilidade do réu é examinada, em conjunto, pelos juízes leigos e profissionais. Ambos concorrem na fixação da pena, sendo que, com algumas variações, é o sistema adotado na França, Suíça, Alemanha, Itália, Portugal e Grécia. Cf. MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. 2.ed. rev. e atual. por Eduardo Reale Ferrari. Campinas: Milennium, 2000. v.II. p.251; Bonfim, Edílson Mougenot. Curso de processo penal. p.457. 149 Assessorado: Tribunal misto, formado por juízes leigos (jurados) e profissionais. No Assessorado os juízes profissionais e os juízes leigos decidem sobre a penalidade; a existência do crime e sua autoria é decidida apenas pelos juízes leigos. Cf. MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. v.2. p.252. 150 Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. pp.26-27. 151 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.30. 152 Brasil. Lei n٥ 263/1948. Disponível em: <http://www81.dataprev.gov.br>. Acesso em: 23 set. 2007. 153 Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.30. 154 MAXIMILIANO, Carlos. Comentários à constituição de 16 de setembro. v.II. p.412. Apud MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.30. 155 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.30.

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disposições constitucionais, os crimes dolosos contra a vida devem ser julgados pelo Tribunal

do Júri, por conseguinte, a competência do Tribunal do Júri, quando conflitante com outras,

deve prevalecer sobre os demais juízos156. Lembrando que a constituição de 1946, em seu

artigo 141, § 28, quanto à competência mínima do Tribunal do Júri, determina que “Será

obrigatoriamente de sua competência o julgamento dos crimes dolosos contra a vida157”.

Por disposição do artigo 2º da Lei em análise, passou a vigorar o

artigo 74 do Código de Processo Penal, a respeito da competência, com o seguinte texto

vigente atualmente:

Art. 74. A competência pela natureza da infração será regulada pelas leis de organização judiciária, salvo a competência privativa do Tribunal do Júri. § 1º Compete ao Tribunal do Júri o julgamento dos crimes previstos nos arts. 121, §§ 1o e 2o, 122, parágrafo único, 123, 124, 125, 126 e 127 do Código Penal, consumados ou tentados158.

O artigo 3º da precitada Lei alterou da seguinte maneira as regras a

respeito da conexão e continência: “Art. 78. Na determinação da competência por conexão ou

continência, serão observadas as seguintes regras: I - no concurso entre a competência do júri

e a de outro órgão da jurisdição comum, prevalecerá a competência do Júri159”.

Ainda por disposição da Lei nº 263, foi alterado o tempo dos debates,

alterando-se o artigo 474 do Código de Processo Penal, passando agora à duração máxima de

três horas para cada uma das partes, sendo de uma hora o tempo máximo para a réplica e

tréplica160. Mais tarde por disposição da Lei nº 5.941, de 22 de novembro de 1973, o tempo de

duração dos debates seria novamente alterado: duas horas no máximo a cada uma das partes,

tendo como duração máxima de meia hora a réplica e a tréplica161, vigorando hodiernamente

tais disposições.

156 Cf. MIRABETE, Júlio Fabbrini. Código de processo penal interpretado. 11.ed. atual. até jul. 2003. São Paulo: Atlas, 2006. p.311. 157 MARQUES PORTO, Hermínio Alberto. Júri: procedimentos e aspectos do julgamento questionários. nota 54, “b”. p.42. 158 JESUS, Damásio Evangelista de. Código de processo penal anotado. 22.ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2005. p.98. 159 BRASIL. Lei n٥ 263/1948. Disponível em: <http://www81.dataprev.gov.br>. Acesso em: 23 set. 2007. 160 BRASIL. Lei n٥ 263/1948. Disponível em: <http://www81.dataprev.gov.br>. Acesso em: 23 set. 2007. 161 Cf. MIRABETE, Júlio Fabbrini. Código de processo penal interpretado. p.1212.

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1.2.9 DO TRIBUNAL DO JÚRI NA CONSTITUIÇÃO DE 24 DE JANEIRO DE 1967 E NA

EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 1, DE 17 DE OUTUBRO DE 1969

Conforme orientação de Paulo Lúcio Nogueira, a Constituição de 24

de janeiro de 1967 manteve o Tribunal do Júri no capítulo sobre os direitos e as garantias

individuais dos brasileiros e estrangeiros residentes do país, o artigo 150, § 18 dispunha: “São

mantidas a instituição e a soberania do Júri, que terá competência no julgamento dos crimes

dolosos contra a vida162”.

A Emenda Constitucional nº 1, de 17 de outubro de 1969 da mesma

maneira que a Constituição de 1967 manteve o Tribunal do Júri no capítulo dos direitos e das

garantias individuais163. Seu artigo 153, § 18 dispunha: “É mantida a instituição do Júri, que

terá competência nos crimes dolosos contra a vida164”.

Nota-se, entretanto, a omissão da soberania dos veredictos,

o que levou alguns a entenderem que estava suprimida a soberania dos julgamentos, mas vários julgados entenderam que não se compreende a instituição sem ser soberana e que o disposto na Emenda Constitucional não é auto-aplicável, carecendo de regulamentação (RT 427/461, 415/93. 412/379)165.

Ainda sob a validade da Emenda Constitucional nº 1 de 1969, foi

posta em vigência a Lei nº 5.941, de 22 de novembro de 1973, alterando o Código de

Processo Penal; dentre as modificações, destaca-se a possibilidade do réu primário e de bons

antecedentes continuar em liberdade ou, se preso estiver, ser decretada a sua liberdade, por

disposição da nova redação do artigo 408, § 2º, o qual vigora atualmente no processo penal

brasileiro166.

Outra modificação auferida pela Lei 5.941, foi no sentido de alterar a

duração dos debates orais para duas horas no máximo para cada uma das partes, sendo que a

réplica e a tréplica teriam duração não superior à meia hora167. Tal disposição é vigente nos

162 Cf. NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Questões processuais penais controvertidas. 3.ed. rev., aum. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 1988. p.282. 163 Cf. NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Questões processuais penais controvertidas. p.282. 164 MARQUES PORTO, Hermínio Alberto. Júri: procedimentos e aspectos do julgamento questionários. nota 54, “d”. p.42 165 NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Questões processuais penais controvertidas. p.282. 166 Cf. NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Questões processuais penais controvertidas. p.282; Cf. Mirabete, Júlio Fabbrini. Código de processo penal interpretado. pp.1081-1082. 167 Cf. NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Questões processuais penais controvertidas. p.282.

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tempos de hoje; é o que prescreve o corpo textual do artigo 474 do Código de Processo

Penal168.

1.2.10 O TRIBUNAL DO JÚRI NA CONSTITUIÇÃO DE 1988

Por fim, depois desta análise de como se deu a evolução do Tribunal

do Júri e suas possíveis origens na história do Direito, desde os tempos mais remotos, e,

passando pela evolução histórica desta instituição no Brasil, chega-se à Constituição da

República Federativa do Brasil de 1988, onde sua previsão encontra-se no Capítulo Dos

Direitos e Garantias Individuais, constituindo cláusula pétrea, ou seja, núcleo constitucional

intangível169.

Sua previsão constitucional encontra-se fulcrada no Artigo 5º, Inciso

XXXVIII: “é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei”, da

Constituição Federal, onde estão também previstos seus princípios básicos, quais sejam: a

plenitude de defesa; o sigilo nas votações, a soberania dos veredictos e a competência mínima

para julgamentos dos crimes dolosos contra a vida170.

Passa-se então a um breve estudo dos princípios constitucionais do

Tribunal do Júri:

Sobre a Plenitude de Defesa assim leciona Bonfim:

Garante a Constituição Federal ao réu submetido ao julgamento do Júri a plenitude da defesa, e não somente a ampla defesa, reconhecida aos acusados em geral. [...] A garantia de uma defesa plena seria, [...], mais abrangente do que a garantia de uma defesa ampla. Abrangeria entre outras, a possibilidade de o acusado participar da escolha dos jurados que comporão o Conselho de Sentença, bem como a própria necessidade de os juízes populares pertencerem às diversas classes sociais. Outra manifestação da plenitude de defesa estaria no poder conferido ao juiz presidente de, considerando o réu indefeso, dissolver o Conselho de Sentença, nomeando outro defensor e marcando outro julgamento171.

Acerca do Sigilo das Votações leciona Capez no sentido de ser um

Princípio informador do Tribunal do Júri, com isso não se aplicando o Princípio da

Publicidade das decisões do poder judiciário, previsto expressamente no Artigo 93, Inciso IX,

168 Cf. JESUS, Damásio Evangelista de. Código de processo penal anotado. p.378. 169 Cf. CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. p.637. 170 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em <www.planalto.gov.br> Acesso em 28 fev. 2008. 171 BONFIM, Edílson Mougenot. Curso de processo penal. p.458.

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da Constituição Federal172, 173; ressalta-se com isso, conforme doutrina de Edílson Bonfim,

que é a verdadeira aplicação do Inciso LX do Artigo 5º da Constituição Federal174,175.

A Soberania dos Veredictos, conforme capez:

implica na impossibilidade de o tribunal técnico modificar a decisão dos jurados pelo mérito. Trata-se de Princípio relativo, pois no caso das apelações do Júri pelo mérito [...], o Tribunal pode anular o julgamento e determinar a realização de um novo, se entender que a decisão dos jurados afrontou manifestamente a prova dos autos176.

Bonfim ainda assevera que nada “obsta a possibilidade de revisão

criminal e a substituição do julgamento proferido por outro [Júri], por meio de protesto por

novo Júri177”.

Por fim, imperioso é ressaltar ensinamento de Fernando Capez, o qual

observa que “a soberania do Júri é um Princípio relativo porque não pode obstar o Princípio

informador do Processo Penal, qual seja, a busca da Verdade Real178”.

A Constituição Federal ao prescrever que o Tribunal do Júri tem

competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida, tratou simplesmente de sua

competência mínima, haja vista, tratar-se de cláusula pétrea, não pode com isso o legislador

infraconstitucional suprimir sua competência para o julgamento destes crimes, porém, com

isso se entende que nada obsta que o legislador ordinário amplie a competência e inclua outras

figuras típicas179.

Os crimes dolosos contra a vida são: a) homicídio simples,

privilegiado ou qualificado; b) induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio; c) infanticídio;

e, d) aborto, em todas as suas modalidades; com isso a competência para o julgamento desses

172 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988: Artigo 93 caput e Inciso IX: “Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios: [...] IX: todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação; [...]”. 173 Cf. CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. p.637. 174 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988: Artigo 5º, caput e Inciso LX: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...]; LX: lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem; [...].” 175 BONFIM, Edílson Mougenot. Curso de processo penal. p.458. 176 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. p.638. 177 BONFIM, Edílson Mougenot. Curso de processo penal. p.458. 178 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. p.638. 179 Cf. CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. p.638; BONFIM, Edílson Mougenot. Curso de processo penal. pp.458-459.

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crimes é do Tribunal do Júri; ademais, que dita competência abrange tanto os delitos

consumados quanto os tentados180.

Vale lembrar que a própria Constituição Federal prevê exceções à competência do tribunal popular, quando o acusado goze de foro privilegiado. A competência penal do Júri possui extração constitucional. Assim, conforme o caráter absoluto que apresenta e por efeito da vis

attractiva181 que exerce, estende-se aos crimes penais conexos ao crime

doloso contra a vida182.

180 Cf. BONFIM, Edílson Mougenot. Curso de processo penal. p.459. 181 Vis attractiva: Força atrativa. Questão ligada à competência. FILARDI LUIZ, Antônio. Dicionário de expressões latinas. 2.ed. São Paulo: Atlas, 2002. p.326. 182 BONFIM, Edílson Mougenot. Curso de processo penal. p.459.

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2 OS PRINCÍPIOS DA VERDADE REAL E DA VERDADE FORMAL –

ASPECTOS DESTACADOS

2. 1 OS PRINCÍPIOS DA VERDADE REAL E DA VERDADE FORMAL.

Após a exposição de um breve roteiro histórico acerca da instituição

do Tribunal do Júri, desde os mais remotos tempos da história do Direito até os dias de hoje,

passa-se agora neste segundo capítulo a tratar do Princípio da Verdade Real, bem como do

Princípio da Verdade Formal, sendo que, ressalta-se, o objetivo da presente monografia é a

verificação de como o Princípio processual da Verdade Real se relaciona com o Tribunal do

Júri, na fase do plenário, o que será tratado em capítulo próprio.

2.1.1 CONCEITUALIZAÇÕES DESTACADAS

Antes de mais nada, forçoso é a conceitualização de certas expressões

de que serão tratadas a partir de agora; com isso, passa-se aos conceitos de “Princípio”,

“Verdade” e “prova”, pois, como se observará ao longo deste segundo capítulo, o Princípio da

Verdade Real é exercido através da busca pela dita Verdade, a fim de fornecer elementos de

Prova, haja vista que esta, posteriormente, será apreciada pelo órgão julgador de modo a

contribuir para a formação da certeza necessária a uma sentença justa, em consonância com os

acontecimentos históricos pretéritos, levados a juízo183.

2.1.1.1 Conceitualização de “Princípio”

Destarte, forçoso se faz uma conceitualização de o que vem a ser um

Princípio, e, o que deverá ser entendido como este daqui à diante na presente pesquisa, para

tanto, é de se observar que “muitas vezes faz-se necessária a definição etimológica da uma

determinada palavra para a sua correta compreensão. Assim, para que se possa compreender

os princípios que regem o processo penal”184 aqui é imperioso a definição da palavra e da

expressão: “Princípio”.

183 Cf. MITTERMAIER, C.J.A. Tratado da prova em matéria criminal. 3.ed. Tradutor: Herbert Wüntzel Heinrich. Campinas: Editora Bookseller, 1997. p.55; Almeida Júnior, João Mendes. Direito judiciário brasileiro. 5.ed. adap. São Paulo: Livraria Freitas Bastos, 1960. p.171. 184 RANGEL, Paulo. Direito processual penal. 10.ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Editora Lumes Júris, 2005. p.1.

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Consta no Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, Princípio como sendo:

1. Momento ou local ou trecho em que algo tem origem. 2. Causa primária; origem. 3. Preceito, regra. - A Princípio. 1. No começo, no(s) primeiro(s) momento(s). 2. Antes de reflexão ou observação mais cuidadosas. Em Princípio. Antes de qualquer consideração, antes de mais nada185.

Segundo Tucci, imprescindível também, é ressaltar as origens latinas

da palavra:

O vocábulo princípio, etimologicamente deriva do latino – principium, principii – de princeps, principis (o primeiro), forma sincopada de primiceps, de primus [...] e de capere (captar, tomar, segurar, prender, conceber), cujo significado vulgar se mostra na origem, começo, início de qualquer coisa.186

Paulo Bonavides, assim como outros juristas, leciona no sentido de a

expressão “Princípio” derivar da geometria, onde designam as primeiras verdades, por

estarem ao princípio uma vez que são as premissas da totalidade de um sistema que se

desenvolve; afirmando a seguir que os Princípios são verdades objetivas não pertencendo em

sua plenitude ao universo do ser, mas sim do dever-ser, quando da qualidade de norma

jurídica, dotados de validez, vigência e, é claro, obrigatoriedade187.

Quanto aos Princípios relacionados à norma jurídica, assevera Luís-

Diez Picazo: “princípio de direito é o pensamento diretivo que domina e sirva de base à

formação das disposições singulares de Direito de uma instituição jurídica, de um Código ou

de todo um Direito Positivo188”.

Conforme citação de Paulo Bonavides, após tecer as primeiras linhas

do que é um Princípio na norma jurídica, mister faz-se assinalar:

que se devem considerar como princípios do ordenamento jurídico aquelas orientações e aquelas diretivas de caráter geral e fundamental que se possam deduzir da conexão sistemática, da coordenação e da íntima racionalidade das normas, que concorrem para formar, num dado momento histórico, o tecido do ordenamento jurídico189

185 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Miniaurélio: o dicionário da língua portuguesa. Aurélio Buarque de Holanda Ferreira; coord. de edição Margarida dos Anjos, Maria Baird Ferreira. 6. ed. rev. e atual. Curitiba: Editora Positivo, 2005. p.654. 186 TUCCI, Rogério Lauria. Princípios e regras orientadoras do novo processo penal brasileiro. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1986. p.4. 187 Cf. BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 21.ed. atual. São Paulo: Editora Malheiros, 2007. pp.255-256. 188 PICAZO, Luiz0Diez. Apud BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. p.256. 189 Conceito de Princípio, retirado de uma das primeiras sentenças da Corte Constitucional Italiana, em 1956. Apud BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. p.256.

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Segundo Clóvis Beviláqua, “com os princípios gerais do Direito o

Jurista penetra em um campo mais dilatado, procura apanhar as correntes diretoras do

pensamento jurídico e canaliza-las para onde a necessidade social mostra a insuficiência do

Direito Positivo190”.

Após a análise etimológica da palavra “Princípio”, bem como de sua

origem latina e sua aplicação às normas jurídicas, adentra-se agora mais especificamente no

Direito Processual Penal, pois, como afirma Jorge Figueiredo Dias, os tais Princípios são

aqueles que “dão sentido à multidão das normas, orientação ao legislador e permitem à

dogmática não apenas explicar, mas verdadeiramente compreender os problemas do direito

processual e caminhar com segurança ao encontro de sua solução191”.

O Processo Penal se encontra em consonância com inúmeros

Princípios e regras que representam os postulados fundamentais da política processual penal

de um Estado. A liberdade individual, assegurada pelo Processo fica cada vez mais protegida

em um Estado Democrático de Direito onde são observados esses Princípios192, e “dessa

forma, os princípios que regem o direito processual (penal) constituem o marco inicial de

construção de toda a dogmática jurídico-processual (penal), sem desmerecer e reconhecer os

princípios gerais do direito que lhe antecedem193”.

2.1.1.2 Conceitualização da Palavra “Verdade”

Antes ainda, de adentrar-se no tema foco deste capítulo,

imprescindível é a compreensão do que vem a ser entendido como “Verdade”, pois, esta

servirá de mecanismo de convicção à certeza do Magistrado no ato de sentenciar; conforme

leciona Malatesta, “a verdade, em geral, é a conformidade da noção ideológica com a

realidade; a crença na percepção desta conformidade é a certeza194”, pois há a necessidade de

“convencer o juiz, o qual para decidir há mister de adquirir plena certeza195”.

190 BEVILÁQUA, Clóvis. Apud BARROS, Francisco Dirceu. Direito processual penal: teoria, jurisprudência e questões de concursos com gabarito comentado. 2.ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Editora Elsevier, 2006. v.1. p.5. 191 DIAS, Jorge Figueiredo. Apud BARROS, Francisco Dirceu. Direito processual penal: teoria, jurisprudência e questões de concursos com gabarito comentado. p.5. 192 Cf. TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. 25.ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2003. v.1. p.36. 193 RANGEL, Paulo. Direito processual penal. p.1. 194 MALATESTA, Nicola Framarino. A lógica da prova em matéria criminal. Tradutor: Paulo Capitanio. Campinas: Editora Bookseller, 1996. p.21. 195 MITTERMAIER, C.J.A. Tratado da prova em matéria criminal. p.59.

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Guilherme de Souza Nucci observa que a Verdade é sempre

relativa196, opinião esta, compartilhada por Paulo Rangel197, sendo que, como leciona

Malatesta, a Verdade é, portanto,

um estado subjetivo da alma, podendo não corresponder à verdade objetiva. Certeza e verdade nem sempre coincidem: por vezes, tem-se certeza do que objetivamente é falso; por vezes, duvida-se do que é objetivamente verdadeiro. E a mesma verdade que aparece certa a uns, a outros parece duvidosa, e, por vezes, até mesmo falsa a outros198.

Mittermaier afirma que “a verdade é a concordância entre um fato real

e a idéia que dele forma o espírito”, é “a realidade absoluta das coisas199”, que muitas vezes

não pode ser alcançada, mesmo porque, como leciona Tucci “a verdade, de modo absoluto,

objetivamente considerada, não pertence ao homem, mas, tão-só, a Deus200”.

Contudo, para a investigação criminal, a Verdade perquirida é a

Verdade Histórica, e é está que se deverá perseguir sempre que haver por objetivo a

certificação de determinados acontecimentos, e de certos atos passados no tempo e no espaço.

Percorrendo o tempo e o espaço, colhemos pelo caminho uma multidão de circunstâncias isoladas, que ligamos entre si; estas nos guiam a seu turno, e quando, com o seu auxílio, chegamos ao fim de nossas indagações, com confiança julgamos se os acontecimentos passados, de que tratamos, são com efeitos reais, e qual sua natureza; acreditamos possuir a verdade, desde o momento em que nossas idéias sobre o objeto da indagação nos parecem em perfeita concordância com o mesmo201.

2.1.1.3 Conceitualização de “Prova”

Quanto à Prova, os ensinamentos de Mittermaier assim revelam:

Todas as vezes que um indivíduo aparece como autor de um fato, que é, por força de lei, de conseqüências aflitivas, e que se trata de lhe fazer a aplicação devida, a condenação repousa sobre a certeza dos fatos, sobre a convicção que gera na consciência do juiz. A soma dos motivos geradores dessa certeza é a prova202.

196 Cf. NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 3.ed. rev., atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p.96. 197 RANGEL, Paulo. Direito processual penal. p.5. 198 MALATESTA, Nicola Framarino. A lógica da prova em matéria criminal. p.21. 199 MITTERMAIER, C.J.A. Tratado da prova em matéria criminal. p.59. 200 TUCCI, Rogério Lauria. Princípios e regras orientadoras do novo processo penal brasileiro. p.142. 201 MITTERMAIER, C.J.A. Tratado da prova em matéria criminal. p.60. 202 MITTERMAIER, C.J.A. Tratado da prova em matéria criminal. p.55.

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Nicola Framarino Dei Malatesta, leciona no seguinte sentido acerca da

Prova:

Como as faculdades perceptivas são a fonte subjetiva da certeza, as provas são um modo de apreciação da fonte objetiva, que é a verdade. A prova é, portanto, deste ângulo, o meio objetivo com que a verdade atinge o espírito; e o espírito pode, relativamente a um objeto, chegar por meio das provas tanto à simples credibilidade, como à probabilidade e certeza; existirão, assim, provas de credibilidade, de probabilidade e de certeza. A prova, portanto, em geral, é a relação concreta entre a verdade e o espírito humano nas suas especiais determinações de credibilidade, probabilidade e certeza203.

João Mendes de Almeida Júnior trata em sua obra de que a prova é a

alma do processo, sustentando que o processo nada mais é do que a arte de administrar a

prova204.

Conforme leciona:

A parte pode ter o direito; mas sem a prova dos fatos a que seria o direito aplicado, como reconhecer esse direito? MASCADAMUS, no proêmio do seu tratado De Probationibus, diz o seguinte [...]: ‘nas provas está firmada toda a força do juízo. Quem não pode provar é como quem não tem; aquilo que não é provado é como se não existisse; não poder ser provado, ou não ser é a mesma coisa’205.

Assim sendo, é de se notar que “provar é querer, em substância,

demonstrar a verdade e convencer o juiz, o qual para decidir há mister de adquirir plena

certeza206”.

Por fim, consoante ao magistério de José Frederico Marques, mister é

notar que “no processo penal brasileiro, vigora o Princípio da Verdade Real, no que tange à

produção de provas207”.

Portanto, traçadas as primárias diretrizes, passa-se agora a tratar do

Princípio da Verdade Real, balizador e guia do processo penal.

2.2 O PRINCÍPIO DA VERDADE REAL – DEFINIÇÕES DOUTRINÁRIAS

Para que o poder-dever punitivo do Estado – jus puniendi 208 – se faça

valer sobre determinada pessoa o Processo Penal necessita de uma reconstrução dos fatos de 203 MALATESTA, Nicola Framarino. A lógica da prova em matéria criminal. p.81. 204 Cf. ALMEIDA JÚNIOR, João Mendes. Direito judiciário brasileiro. p.172. 205 ALMEIDA JÚNIOR, João Mendes. Direito judiciário brasileiro. p.172. 206 MITTERMAIER, C.J.A. Tratado da prova em matéria criminal. p.59. 207 MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. v.II. p.338.

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forma a embasar a decisão do juiz, o qual a partir desta reconstrução empírica, formará a sua

certeza, a fim de que seja atribuído ao acusado, ao fim do Processo, exatamente o que lhe

cabe de acordo com os atos praticados, podendo ser absolvido ou condenado, mas isso em

conformidade com sua conduta, tudo em prol da tão necessária e salutar justiça209.

Até mesmo porque, como ressalta Ferrajoli, o juízo penal, ademais,

como todo o sistema judicial, é um “saber-poder”, ou seja, uma combinação de

conhecimentos reunidos, a Verdade Real; e de decisão, sentença, sistematicamente um

dependendo do outro, em um balanço harmonioso210, e, por isso “assume especial importância

a perquirição da verdade material, induvidosamente o dado mais relevante do fundamento do

processo penal211”.

Para Fernando Capez, trata-se de Princípio “característico do processo

penal, dado ao caráter público do direito material sub judice, excludente da autonomia das

partes212”, “mas o poder do juiz está contido na lei, não se confundindo com o arbítrio: o juiz

age na direção do processo, solutus partibus, mas não solutus lege213”, ou seja, livre de

vínculos com as partes, mas não, livre de vínculos com a lei214.

Conforme orientação de Luigi Ferrajoli,

a verdade a que aspira o modelo substancialista do direito penal é a chamada verdade substancial ou material215, quer dizer, uma verdade absoluta e onicompreensiva sem relação às pessoas investigadas, carente de limites e de confins legais, alcançável por qualquer meio, para além das rígidas regras procedimentais216.

Em seguida, alertando para o perigo do império da arbitrariedade no

caso dessa verdade ser buscada fora dos parâmetros legais, o professor italiano esclarece que

208 Jus puniendi ou direito de punir, é o que legitima o Estado a aplicar a sanção ao infrator penal, pois os bens protegidos pela norma jurídica são de interesse público, uma vez que podem comprometer toda a ordem pública, com isso além da vítima, a sociedade é a maior vítima, exigindo que o Estado pugne pela paz social. Cf. Tourinho Filho, Fernando da Costa. Processo penal. v.1. pp.9-10. 209 Cf. TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. v.1. p.36; Mirabete, Júlio Fabbrini. Processo penal. p.44. 210 Cf. FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. 2.ed. rev. e ampl. Tradutor: Juares Tavares et al. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p.49. 211 TUCCI, Rogério Lauria. Princípios e regras orientadoras do novo processo penal brasileiro. p.142. 212 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. p.22. 213 CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. 20.ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Malheiros, 2004. p.66. 214 Cf. FILARDI LUIZ, Antônio. Dicionário de expressões latinas. p.292. 215 Verdade Substancial ou Material são termos utilizados por vários autores, consistindo sinônimo de Verdade Real. 216 FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. p.48.

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é evidente que esta pretendida ‘verdade substancial’, ao ser perseguida fora das regras e controles e, sobretudo, de uma exata predeterminação empírica das hipóteses de indagação, degenera em juízo de valor, amplamente arbitrário de fato, assim como o cognitivismo ético sobre o qual se baseia o substancialismo penal resulta inevitavelmente solidário com uma concepção autoritária e irracionalista do processo penal217. Pelas palavras de Mirabete:

Com o princípio da verdade real se procura estabelecer que o jus puniendi somente seja exercido contra aquele que praticou a infração penal e nos exatos limites de sua culpa numa investigação que não encontra limites na forma ou na iniciativa das partes. Com ele se excluem os limites artificiais da verdade formal, eventualmente criados por atos ou omissões das partes, presunções, ficções, transações etc., tão comuns no processo civil218.

Tourinho Filho no mesmo sentido afirma que a “natureza pública do

interesse repressivo exclui limites artificiais que se baseiam em atos ou omissões das partes”,

sendo que a “força incontrastável deste interesse consagra a necessidade de um sistema que

assegure o império da verdade, mesmo contra a vontade das partes219”.

Referido autor, afirma ainda, que a função punitiva do Estado só pode

se fazer valer em detrimento do indivíduo que realmente perpetrou conduta infracionária,

devendo o Processo, com isso, tender à averiguar e descobrir a Verdade sobre os fatos para

que a sentença do juiz tenha fundamentos220, uma vez que tenha com isso, o magistrado, a

crença segura na Verdade, transparecida através do arcabouço probatório colhido, este de

forma convicta condena ou absolve221.

Conforme leciona Edílson Mougenot Bonfim, toda a atividade

processual deve se ater ao descobrimento de como os fatos se passaram na realidade, sendo

que o conjunto de dados da instrução deve, por fim, refletir com maior grau de fidelidade

possível, os acontecimentos atinentes ao fato objeto da investigação222.

Na mesma ceara, Paulo Rangel instrui que:

A descoberta da verdade processual223 do fato praticado, através da instrução probatória, passa a ser, assim, uma espécie de reconstituição simulada do fato, permitindo ao juiz, no momento da sentença, aplicar a lei penal ao caso

217 FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. p.48. 218 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Processo penal. p.44. 219 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. v.1. p.37. 220 Cf. TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. v.1. p.36. 221 Cf. NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.96. 222 Cf. BONFIM, Edílson Mougenot. Curso de processo penal. pp.48-49. 223 Verdade Processual: expressão utilizada por alguns doutrinadores, v.g. Paulo Rangel e Luigi Ferrajoli, como crítica alternativa à Verdade Real, basicamente seria a verdade contida nos autos do processo, cf. referidos autores. Sobre esta temática: vide item 2.3 infra.

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concreto, extraindo a regra jurídica que lhe é própria. É como se o fato fosse praticado naquele momento perante o juiz aplicador da norma224.

Francisco de Assis do Rego Monteiro Rocha, ao tratar do Princípio da

Verdade Real, assim leciona:

Não pode haver punição, sem que o órgão de acusação demonstre a existência do fato criminoso e respectiva autoria. E tudo isso é objeto, é fim do processo penal. Mesmo contra a vontade das partes, é dever do juiz buscar a verdade real, aquela que brota das informações todas encontradas no bojo dos autos. A natureza pública do processo penal exclui qualquer possibilidade de sentenciar o juiz sem que investigue os fatos trazidos à sua consideração225.

Interessante observar importante lição trazida por Heráclito Antônio

Mossin, quando afirma que o Princípio em tela se relaciona diretamente com a produção do

conteúdo probatório no Processo Penal, vigorando em todas as legislações que acolhe o

Sistema Acusatório226, encontrando guarida em todos os países sob o Estado Democrático de

Direito227.

Mossin ainda ensina que “descobrir a verdade real ou material é

catalisar elementos probatícios aptos a demonstrar com segurança imutável quem realmente

praticou o crime e o modo e meio como ele foi na realidade executado228”.

Dando continuidade, afirma referido doutrinador, ipsis literis:

Induvidosamente, se a finalidade do processo é a justa solução do interesse estatal em punir o autor da infração típica ou do interesse desse autor quanto ao seu jus libertatis, a causa finalis da instrução probatória é a descoberta da verdade real, pois somente assim pode-se dar solução justa e exata ao pedido229.

Neste sentido, José Frederico Marques preleciona, o seguinte:

A verdade real – eis a causa finalis da instrução probatória e, portanto, do próprio processo. Tendo em vista os graves interesses que estão em conflito,

224 RANGEL, Paulo. Direito processual penal. p.5. 225 ROCHA, Francisco de Assis do Rego Monteiro. Curso de direito processual penal. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1999. pp.26-27. 226 Sistema Acusatório: adotado em nosso ordenamento jurídico pela Constituição Federal de 1988 – “possui nítida separação entre o órgão acusador e o julgador; há liberdade de acusação, reconhecido o direito ao ofendido e a qualquer cidadão; predomina a liberdade de defesa e a isonomia entre as partes no processo; vigora a publicidade do procedimento; o contraditório está presente; existe a possibilidade de recusa do julgador; há livre sistema de produção de provas; pre4domina a maior participação popular na justiça penal e a liberdade do réu é a regra”. NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.103. 227 Cf. MOSSIN, Heráclito Antônio. Curso de processo penal. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 1998, v.1. p.64. 228 MOSSIN, Heráclito Antônio. Curso de processo penal. v.1. p.65. 229 MOSSIN, Heráclito Antônio. Curso de processo penal. v.1. p.64.

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na instância penal, é absolutamente imprescindível que fique elucidado o thema probandum a fim de que se dê solução justa e exata ao pedido que se contém na acusação. E isto se consegue quando emergem da instrução, de maneira fiel e real os acontecimentos que motivaram a acusação. Para tanto, necessário é também, que o juiz aprecie os dados e informações obtidas com a prova, para reconstruir a situação concreta que deve ser objeto de seu pronunciamento jurisdicional230.

Com isso, é de se observar que somente após a descoberta da Verdade

Real é que uma justa decisão poderá ser proferida pelo magistrado no Processo Penal,

magistrado este que está apto à busca da Verdade, pois, dotado de poder investigatório,

conforme se passa a verificar.

Por fim, mister se faz esclarecer, como ressalta Guilherme de Souza

Nucci, “que a busca pela verdade material não quer dizer a ilimitada possibilidade de

produção de provas, pois há vedações legais que necessitam ser respeitadas, como por

exemplo, a proibição da escuta telefônica, sem autorização judicial231”.

2.2.1 O JUIZ PENAL NA BUSCA PELA VERDADE

Para que uma decisão justa possa ser proferida pelo juiz da causa

necessário é a reunião de elementos que venham a reconstituir o fato ocorrido no tempo e no

espaço, a fim de fornecer ao magistrado um conjunto de certezas para que este forme sua

convicção fundamentando esta, naquele arcabouço probatório colhido.

Tal desiderato só é alcançado através da investigação, que no Processo

Penal, pela natureza pública dos bens jurídicos protegidos pelo Direito Penal, se estende à

figura do juiz, estando este dotado de poder investigatório com o objetivo de elucidar a causa

de maneira mais justa quanto possível, e, isso, no Processo Penal, conforme leciona Vicente

Greco Filho, é consagrado como “fazendo parte de suas linhas mestras e justifica-se,

inegavelmente, em virtude do interesse público nele envolvido: de um lado a necessidade

social de repressão penal e, de outro, o direito de liberdade232”.

No mesmo sentido, Ada Pellegrini Grinover, em conjunto com Cintra

e Dinamarco, afirmam que isso é tido

diante da colocação publicista do processo, não é mais possível manter o juiz como mero espectador da batalha judicial. Afirmada a autonomia do direito

230 MARQUES, José Frederico. Apud Mossin, Heráclito Antônio. Curso de processo penal. v.1. pp.64-65. 231 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.99. 232 GRECO FILHO, Vicente. Manual de processo penal. p.216.

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processual e enquadrado como ramo do direito público, e verificada a sua finalidade preponderantemente sócio-política, a função jurisdicional evidencia-se com o poder-dever do Estado, em torno do qual se reúnem os interesses dos particulares e os do próprio Estado233.

Com isso, importante colocação é trazida por Edílson Mougenot

Bonfim, afirmando que “o dever de produção de provas não é só das partes. Havendo

interesses maiores em discussão, as provas são produzidas em favor da sociedade234”, com

isso, se demonstra a necessidade de o magistrado concorrer com as partes na busca pelos

elementos necessários à reconstituição dos acontecimentos levados a juízo.

Capez afirma que “é um dever do magistrado superar a desidiosa

iniciativa das partes na colheita do material probatório, esgotando todas as possibilidade para

alcançar a verdade real dos fatos, como fundamento da sentença235”.

Ademais, conforme instrui Guilherme de Souza Nucci, o juiz é uma

figura essencial na busca da Verdade, não devendo o mesmo se contentar com as alegações e

provas produzidas pela acusação e defesa, devendo concorrer na perseguição da Verdade, ou

seja, como ocorreram os fatos no universo fático extra-jurídico, de ofício, pois estão em jogo

direitos fundamentais da pessoa humana, no caso o jus libertatis, além de outros como a

segurança da coletividade236.

Ao comentar o artigo 156237 do Código de Processo Penal238,

verdadeiro exemplo do dever do magistrado de atuação na perquirição pela verdade, uma vez

que referido dispositivo da lei processual “coloca o juiz no papel de investigador, descendo do

seu lugar supra partes (distante dos interesses das partes), para procurar aquilo que acha que é

verdade239”; quanto ao assunto, assim leciona Guilherme de Souza Nucci:

Não se deve contentar o juiz com as provas trazidas pelas partes, mormente se detectar outras fontes possíveis para buscá-las. Imagine-se que o réu narre em seu interrogatório, ter viajado no dia do crime para o exterior. Ainda que

233 CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. p.64. 234 BONFIM, Edílson Mougenot. Curso de processo penal. p.49. 235 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. pp.22-23. 236 Cf. NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. 6.ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p.350. 237 Código de Processo Penal, Artigo 156: “A prova da alegação incumbirá a quem a fizer; mas o juiz poderá, no curso da instrução ou antes de proferir sentença, determinar, de ofício, diligências para dirimir dúvida sobre ponto relevante”. 238 Isto porque a segunda parte do artigo 156 do Código de Processo Penal é consagração clara do princípio da verdade real, e é visando exatamente à descoberta ou a reconstrução do fato cometido é que o magistrado deve agir de ofício, de modo a dirimir dúvida sobre ponto relevante à causa. Cf. Rangel, Paulo. Direito processual penal. p.8. 239 RANGEL, Paulo. Direito processual penal. p.9.

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a defesa, por esquecimento ou falha, não produza prova nesse sentido, é preciso que o magistrado, em busca da verdade real, determine a expedição de ofício para a companhia aérea a fim de verificar a veracidade do afirmado pelo acusado. A solução deste ponto poderá beneficiar tanto a defesa, quanto a acusação, confirmando ou demonstrando o álibi oferecido. A adoção do princípio da verdade real no processo penal tem por fim fomentar no juiz um sentimento de busca, contrário à passividade, pois estão em jogo os direitos fundamentais da pessoa humana, de um lado, e a segurança da sociedade, de outro240.

O Ministro da Justiça Francisco Campos, na Exposição dos Motivos

do Código de Processo Penal é claro ao afirmar que

o juiz deixará de ser um mero espectador inerte da produção de provas. Sua intervenção na atividade processual é permitida, não somente para dirigir a marcha da ação penal e julgar a final, mas também para ordenar, de ofício, as provas que lhe parecerem úteis ao esclarecimento da verdade241.

Com isso, é de se observar que o magistrado deve sempre que julgar

prudente, agir de ofício, como corolário do princípio da Verdade Real; em sendo assim, no

mesmo sentido assevera Nucci:

Em homenagem à verdade real, que necessita prevalecer no processo penal, deve o magistrado determinar a produção das provas que entender pertinentes e razoáveis para apurar o fato criminoso. Não deve ter a preocupação de beneficiar, com isso, a acusação ou a defesa, mas única e tão somente atingir a verdade242.

Dito isto, prudente citar alguns exemplos relevantes de quando

magistrado está legitimado a proceder à busca pela Verdade Real, uma vez que, conforme

Nucci, “o Princípio da Verdade Real significa, pois, que o magistrado deve buscar provas,

tanto quanto as partes, não se conformando com o que lhe é apresentado, simplesmente243”.

O Código de Processo Penal legitima o magistrado a perseguir a

Verdade nos artigos 196244; 234245; 502246; 502, § único247; 616248.

240 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. p.350. 241 Exposição dos Motivos do Código de Processo Penal, Item VII, da lavra do Ministro Francisco Campos. Apud MIRABETE, Júlio Fabbrini. Código de processo penal interpretado. pp.58-59. 242 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. p.351. 243 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.97. 244 Código de Processo Penal, Artigo 196: ”A todo tempo o juiz poderá proceder a novo interrogatório de ofício ou a pedido fundamentado de qualquer das partes”. 245 Código de Processo Penal, Artigo 234: “Se o juiz tiver notícia da existência de documento relativo a ponto relevante da acusação ou da defesa, providenciará, independentemente de requerimento de qualquer das partes, para sua juntada aos autos, se possível”.

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Conforme orientação de Paulo Rangel “nestes dispositivos legais o

juiz, para formar sua livre convicção e extrair do acusado as informações necessárias, visando

aplicar corretamente a lei penal, pode proceder a novo interrogatório ou oitiva de

testemunhas249”.

Através do novo interrogatório, ou reinquirição de testemunhas, o juiz

investiga o perfil e as declarações do acusado, preocupando-se com a reconstrução dos fatos e

circunstâncias da causa, como se observa no artigo 502 caput e Parágrafo Único, bem como é

o que ocorre no caso do artigo 616, ambos do Código de Processo Penal, porém neste caso

existe a possibilidade da reinquirição de testemunhas, assim como a possibilidade de haver a

determinação de outras diligências, visando o alcance da Verdade250.

Sobre o artigo 234 do Código de Processo Penal, assevera Paulo

Rangel no seguinte sentido:

Do disposto no art. 234 [...], emerge a autoritária verdade real visada pelo juiz em ação ex officio, pois, independente de requerimento das partes, o juiz determina as diligências que entender cabíveis para a juntada aos autos do documento, inclusive, se for o caso, através de medida coercitiva real de busca e apreensão251.

Com isso, e, sendo um dever do magistrado a investigação, nada mais

precioso do que quando tomar conhecimento de documento hábil a elucidar ponto relevante

deve o juiz determinar de ofício a sua juntada no processo, uma vez que vários documentos de

suma importância para o processo só poderão ser conseguidos por intermédio de requisição

judicial252.

Conforme destaca referido autor, “Em outra passagem do Código [de

Processo Penal], verifica-se nitidamente o princípio da verdade processual [Real] autorizando

o juiz a ouvir outras testemunhas além das indicadas pelas partes (cf. art. 209 do CPP253)254”.

246 Código de Processo Penal, Artigo 502, caput: “Findos aqueles prazos, serão os autos imediatamente conclusos, para sentença, ao juiz, que, dentro em cinco dias, poderá ordenar diligências para sanar qualquer nulidade ou suprir falta que prejudique o esclarecimento da verdade”. 247 Código de Processo Penal, artigo 502, § único: “O juiz poderá determinar que se proceda, novamente, a interrogatório do réu ou a inquirição de testemunhas e do ofendido, se não houver presidido a esses atos na instrução criminal”. 248 Código de Processo Penal, Artigo 616: “No julgamento das apelações poderá o tribunal, câmara ou turma proceder a novo interrogatório do acusado, reinquirir testemunhas ou determinar outras diligências”. 249 RANGEL, Paulo. Direito processual penal. p.9. 250 Cf. RANGEL, Paulo. Direito processual penal. p.9. 251 RANGEL, Paulo. Direito processual penal. p.9. 252 Cf. NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. p.485. 253 Código de Processo Penal. Artigo 209: “O juiz, quando julgar necessário, poderá ouvir outras testemunhas, além das indicadas pelas partes”. 254 RANGEL, Paulo. Direito processual penal. p.11.

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Guilherme de Souza Nucci afirma se tratar inegavelmente do

Princípio da Verdade Real, devendo o magistrado através da produção da prova testemunhal

de ofício, perseguir a Verdade necessária a formação de sua certeza255.

Dito isso, conforme ensinamentos de Rogério Lauria Tucci,

não se compreende como possa o julgador, sujeito processual a quem é atribuída a solução do conflito de interesses entre o Estado e indigitado autor da prática criminosa ou contravencional, permanecer estático, aguardando que os demais sujeitos integrantes do processo, ainda que em contraditório real, lhe forneçam as diretrizes e fundamentos para decidir a causa submetida à sua apreciação. Muito pelo contrário, obrigado, por dever funcional, no processo penal moderno, a perquirir a verdade material, deve o juiz conduzir o procedimento em que ele se corporifica à consecução de seu escopo. E isso, certamente, com a predominância, sempre, da ação judiciária sobre a ação da partes256.

Importante colocação neste momento se faz necessária; no sentido de

que a liberdade na produção da prova por parte do juiz penal “não exclui a atividade

processual das partes, mas, tão-só, suprir-lhes a falta; nem objetiva conferir um monopólio ao

juiz, mas apenas tolher o monopólio das partes257”, e, relembrando seus limites, leia-se a

orientação de Paulo Rangel, sendo que “a satisfação da pretensão, objeto do processo, deve

ser alcançada através da verdade judiciária com os limites impostos pela ordem jurídica258”.

Sendo assim, nada mais coerente e justo do que o próprio juiz, como

destinatário final da prova, colhê-la em co-participação com as partes, produzindo-a em favor

da sociedade, diante da desídia das partes ou quando julgar necessário, coroando o Princípio

da Verdade Real.

2.2.2 VERDADE FORMAL FRENTE À VERDADE REAL

Acerca do Princípio da Verdade Real e do Princípio da Verdade

Formal existe uma diferença primordial, tratada por vários doutrinadores, que será abordada

neste momento.

Conforme ensinamentos de Mossin, a diferença fundamental entre o

Princípio da Verdade Real, como regra na processualística penal, e o da Verdade Formal,

255 Cf. NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. p.451. 256 TUCCI, Rogério Lauria. Princípios e regras orientadoras do novo processo penal brasileiro. p.149. 257 TUCCI, Rogério Lauria. Princípios e regras orientadoras do novo processo penal brasileiro. p.150. 258 RANGEL, Paulo. Direito processual penal. p.6.

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prevalente no Processo Civil, reside basicamente na limitação ou ilimitação da prova,

podendo ou não o magistrado agir de ofício para a elucidação da lide259.

Afirma Mossin, que

enquanto na verdade formal ou legal a prova é menos extensa, mais limitada, porquanto o juiz funda sua livre convicção através das provas produzidas pelas partes; na verdade real, a prova é mais extensa, ilimitada, porquanto como diz o art. 156 do Código de Processo Penal, ‘o juiz poderá, no curso da instrução ou antes de proferir a sentença determinar, de ofício diligência para dirimir dúvidas sobre ponto relevante’260.

Referido autor, assevera que dentro do “Princípio da Verdade Real

pode o magistrado para formar sua persuasão racional determinar diligências, com isso

estabelecendo provas não produzidas pelos sujeitos da relação jurídico-processual”, isto se

torna imprescindível para se dar exata solução ao pedido judicialmente formulado pelas

partes261.

Necessário é observar que o Princípio da Verdade Formal é acolhido

no Processo Civil, satisfazendo-se, o juiz civil, apenas com o que as partes trazem ao

processo, sendo que para a formação de sua certeza ao decidir a lide civil, o magistrado deve

ater-se ao que consta nos autos do Processo, não estando obrigado à colheita de provas262.

Conforme leciona Guilherme de Souza Nucci,

contrariamente à verdade formal, inspiradora do processo civil, onde o juiz não está obrigado a buscar provas, mormente em ações de conteúdo exclusivamente patrimonial, que constitui interesse disponível, contentando-se com a trazida pelas partes e extraindo sua conclusão com o que se descortina nos autos, a verdade real vai além: quer que o magistrado seja co-autor na produção de provas263.

Continua o autor, afirmando que, “enquanto na esfera civil o

magistrado é mais um espectador da produção da prova, no contexto criminal, deve atuar

como autêntico co-partícipe na busca dos elementos probatórios264”.

Ademais, é do ensinamento de Tourinho Filho o seguinte:

De fato, enquanto o juiz não penal deve satisfazer-se com a verdade formal ou convencional que surja das manifestações formuladas pelas partes, e a

259 Cf. MOSSIN, Heráclito Antônio. Curso de processo penal. v.1. p.66. 260 MOSSIN, Heráclito Antônio. Curso de processo penal. v.1. p.66. 261 Cf. MOSSIN, Heráclito Antônio. Curso de processo penal. v.1. p.66. 262 Cf. CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. p.65. 263 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.97. 264 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.98.

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sua indagação deve circunscrever-se aos fatos por elas debatidos, no processo penal o juiz tem o dever de investigar a verdade real, procurar saber como os fatos se passaram na realidade, quem realmente praticou a infração e em que condições a perpetrou, para dar base certa à justiça265.

Dito isto, importante colocar neste momento, que é a natureza dos

direitos da pessoa, que estão sub judice no Processo, Penal ou Civil, que servem de base para

ser ou não permitida a extensão dos meios de prova ao magistrado, no Processo Civil,

pertinente ao ramo do Direito Privado, onde vigora o Princípio da Verdade Formal,

basicamente as causas versam sobre direitos disponíveis, patrimoniais266.

Por outro lado, no Processo Penal, pertencente ao ramo do Direito

Público, onde primordialmente as causas são baseadas em bens indisponíveis, como o jus

libertatis, não se permitindo que o magistrado forme a sua convicção apenas com as ações

oriundas das partes, uma vez que há interesse público na pretensão punitiva, ademais,

conforme assevera Tourinho Filho, “a força incontrastável deste interesse consagra a

necessidade de um sistema que assegure o império da verdade, mesmo contra a vontade das

partes267”.

Edílson Mougenot Bonfim, ao tratar de distinção entre a Verdade Real

e Formal, afirma que é neste ponto que

a distinção se justifica. No âmbito cível, a maioria das causas versa sobre interesses patrimoniais disponíveis, que em tese têm menor grau de relevância para a sociedade. Já no âmbito penal, tendo em vista a possibilidade concreta de aplicação de penas que restrinjam o direito fundamental da liberdade, bem como pelo elevado grau de interesse social com relação às condutas tuteladas no direito penal material, é muito mais relevante que a elucidação dos fatos que fundamentam as decisões seja feita da forma mais acurada possível268.

De ver-se notar também, o que leciona Paulo Rangel, considerando

que

o direito é disponível [no ramo cível] para as partes e que as mesmas podem transigir, torna-se desnecessária a investigação da verdade no processo civil. Entretanto, no processo penal, com exceção das infrações de menor

265 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. v.1. p.37. 266 Cf. CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. p.65. 267 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. v.1. p.37. 268 BONFIM, Edílson Mougenot. Curso de processo penal. p.49.

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potencial ofensivo269, o Estado deve investigar a verdade dos fatos, quem realmente os praticou e em quais circunstâncias foram perpetrados270.

Dito isso, de ver-se notar, como ressaltam Cintra, Dinamarco e

Grinover, que

no campo do processo civil, embora o juiz hoje não mais se limite a assistir inerte à produção de provas, pois em princípio pode e deve assumir a iniciativa destas (Código de Processo Civil; art. 130271, 342272 etc.), na maioria dos casos (direitos disponíveis) pode satisfazer-se com a verdade formal, limitando-se a acolher o que as partes levam ao processo e eventualmente rejeitando a demanda ou a defesa por falta de elementos probatórios273.

Diante desta colocação, acerca de que no ramo do direito cível, por

conta do artigo 130 do Código de Processo Civil, o juiz está sim, apto a perquirir a verdade

real, Paulo Rangel, assevera que,

portanto, não podemos (e não devemos) afirmar que no processo civil vigora o princípio da verdade ficta e, no penal, o da verdade real. Não. Se assim fosse, a letra do artigo acima citado não imporia ao magistrado a incumbência de determinar as provas necessárias à instrução do processo. Ambos os ramos da ciência jurídica processual (civil e penal) movem-se pelo princípio da verdade real, devendo-se atentar para a res in judicio deducta274, se disponível ou indisponível275.

Com isso, segundo o autor, quando no Processo Civil a res in judicio

deducta for indisponível, não mais se poderá admitir que sejam aceitas presunções ou ficções

jurídicas, devendo o magistrado necessariamente seguir na busca pela Verdade Real276.

Dito isso, continuam Cintra, Dinamarco e Grinover, em consonância

com Tourinho Filho277, lecionando que no Processo Penal o fenômeno é o inverso do cível,

sendo que só excepcionalmente o juiz penal se satisfaz com a Verdade Formal, isto somente é

possível quando não existem meios para se assegurar o descobrimento da Verdade Real, cita-

269 As infrações de menor potencial ofensivo são definidas e tratadas no item 2.4 infra. 270 RANGEL, Paulo. Direito processual penal. p.7. 271 Código de Processo Civil, Artigo 130: “Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias à instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias”. 272 Código de Processo Civil, Artigo 342: “O juiz pode de ofício, em qualquer estado do processo, determinar o comparecimento pessoal das partes, a fim de interrogá-las sobre os fatos da causa”. 273 CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. p.65. 274 Res in judicio deducta: questão deduzida em juízo. Isto é, a controvérsia levada a juízo para ser solucionada. FILARDI LUIZ, Antônio. Dicionário de expressões latinas. p.268. 275 RANGEL, Paulo. Direito processual penal. p.8. 276 Cf. RANGEL, Paulo. Direito processual penal. p.8. 277 Cf. TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. v.1. p.37.

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se no caso, como exemplo o que é prescrito no artigo 386, inciso VI278, do Código de

Processo Penal; absolvido o réu, não será possível instaurar-se novo Processo Criminal pelo

mesmo fato, após a coisa julgada, ainda que supervenientemente surjam novas provas

concludentes contra o mesmo279,280.

Reafirmando, Nucci, que a Verdade Formal é aquela que “emerge do

processo, conforme os argumentos e as provas trazidas pelas partes281”, afirma ainda que o

maior exemplo disso é o que ocorre no Processo Civil, quando o réu não promove a

contestação à ação que lhe é movida, após regularmente citado para, querendo, proceder com

sua defesa282.

Pode com isso, o magistrado civil, julgar antecipadamente a lide,

dando ganho de causa ao autor da ação, reputando como verdadeiros os fatos narrados na

petitória exordial, porque não controversos, nos termos dos artigos 319283 e 330, inciso II284,

ambos do Código de Processo Civil285.

Contudo, afirma Nucci em seguida, que “tal situação jamais ocorre no

processo penal, onde prevalece a verdade real, que é a situada o mais próximo possível da

realidade. Não se deve contentar o juiz com as provas trazidas pelas partes, mormente se

detectar outras fontes possíveis para buscá-las286”.

Mas, enquanto no processo civil o princípio dispositivo foi aos poucos se mitigando, a ponto de permitir ao juiz uma ampla gama de atividades instrutórias de ofício [...], o processo penal caminhou em sentido oposto, não apenas substituindo o sistema puramente inquisitivo pelo acusatório (no qual se faz uma separação nítida entre acusação e jurisdição: CPP, art. 28287), mas ainda fazendo concessões ao princípio dispositivo (cf. art. 386, inc. VI)288.

278 Código de Processo Penal, Artigo 386: “O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça: [...] VI – Não existir prova suficiente para a condenação”. 279 Acerca da absolvição por falta de provas, vide item 2.4 infra. 280 Cf. CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. p.65. 281 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.99. 282 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.99. 283 Código de Processo Civil, Artigo 319: “Se o réu não contestar a ação, reputar-se-ão como verdadeiros os fatos afirmados pelo autor”. 284 Código de Processo Civil, Artigo 330: “O juiz conhecerá diretamente do pedido, proferindo sentença: [...] II – quando ocorrer a revelia (art. 319)". 285 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.99. 286 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.99. 287 Código de Processo Penal, Artigo 28: “Se o órgão do Ministério Público, ao invés de apresentar a denúncia, requerer o arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer peças de informação, o juiz, no caso de considerar improcedentes as razões invocadas, fará remessa do inquérito ou peças de informação ao Procurador-Geral, e este oferecerá a denúncia, designará outro órgão do Ministério Público para oferecê-la, ou insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só então estará o juiz obrigado a atender”. 288 CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. p.65.

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Por fim, Cintra, Dinamarco e Grinover, manifestam-se no seguinte

sentido:

Conclui-se, pois, que o processo civil, hoje, não é mais eminentemente dispositivo, como era outrora; e o processo penal, por sua vez, transformando-se de inquisitivo em acusatório, não deixou completamente à margem uma parcela de dispositividade das provas. Impera, portanto, tanto no campo processual penal como no campo processual civil, o princípio da livre investigação das provas, embora com doses maiores de dispositividade no processo civil289.

Podendo-se afirmar, com isso, que mesmo o Princípio da Verdade

Real não estar vigorando em sua plenitude no âmbito do Processo Penal, por simples

percepção, conforme ressalta Tourinho Filho, aqui tal Princípio é mais intenso do que no

âmbito civil, não havendo dúvidas de que a procura da Verdade Real, para se chegar à solução

justa do litígio, é tarefa ínsita da atividade jurisdicional, seja no Processo Civil ou no Processo

Penal290.

Mister é, outrossim, reafirmar aqui, aquilo anteriormente tratado, no

sentido de que o poder discricionário do juiz ao perseguir a Verdade Real, é pautado na lei, e

não em simples discricionariedade oriunda de anseios pessoais, estando desvinculado dos

desejos das partes, mas não o estando da vontade da lei291, ademais, a diretriz máxima da

atividade da magistratura é a imparcialidade, esta, diga-se de passagem, jamais poderá ser

ameaçada diante da busca pela Verdade.

2.3 VERDADE PROCESSUAL

Paulo Rangel, reafirmando rigidamente o brocardo latino: quod non

est in actis, non est in mundo292, assevera que a Verdade Real, tão necessária ao Processo

Penal, é na realidade uma ilusão ou mito, pois esta Verdade que servirá de base à sentença é

aquela que está dentro dos autos processuais293; para o autor,

289 CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. p.66. 290 Cf. TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. v.1. p. 38. 291 Cf. CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. p.66. 292 O que não está nos autos (no processo), não está no mundo. Provérbio de larga aplicação no direito atual. Quer dizer que o juiz deve decidir de acordo com os elementos levados para o processo, não podendo levar em consideração aquilo que não foi objeto de prova. FILARDI LUIZ, Antônio. Dicionário de Expressões Latinas. 2.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2002. p. 256. 293 Cf. RANGEL, Paulo. Direito processual penal. p.5.

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a verdade é dentro dos autos e pode, muito bem, não corresponder à verdade do mundo dos homens. Até porque o conceito de verdade é relativo, porém, nos autos do processo, o juiz tem que ter o mínimo de dados necessários (meios de prova) para julgar admissível ou não a pretensão acusatória. Afirmar que a verdade, no processo penal, não existe, é reconhecer que o juiz penal decide com base em uma mentira, em uma inverdade. Ao mesmo tempo, dizer que ele decide com base na verdade real, como se ela fosse única, é uma grande mentira294.

A matéria ora tratada, na visão de Aury Lopes Jr, o qual até mesmo a

afirma que a Verdade Real “nasce na inquisição e, a partir daí, é usada para justificar os atos

abusivos dos Estado, na mesma lógica de que ‘os fins justificam os meios295", sobre a

Verdade Processual assevera:

Trata-se de uma verdade perseguida pelo modelo formalista como fundamento de uma condenação e que só pode ser alcançada mediante o respeito das regras precisas e relativas aos fatos e circunstâncias considerados como penalmente relevantes296.

Ademais, existe no Processo, intrínseco em seus autos, um consenso

oriundo do arcabouço probatório produzido, pelas partes e pelo magistrado, que o compõe297.

Com isso, a Verdade é processual, uma vez que “são os elementos de

prova que se encontram dentro dos autos que são levados em consideração pelo juiz em sua

sentença”, uma vez que a valoração e a motivação baseiam-se sobre todo o conteúdo

probatório contido nos autos do processo298, se atingindo com isso, o necessário “nexo

exigido pelo princípio da estrita legalidade entre a ‘validez’ da decisão e a ‘verdade’ da

motivação299”.

Aury Lopes Jr. e Luigi Ferrajoli concordam que:

a verdade processual não pretende ser verdade. Não é obtida mediante indagações inquisitivas alheias ao objeto processual, mas sim condicionada em si mesma pelo respeito aos procedimentos e garantias de defesa. A verdade formal é mais controlada quanto ao método de aquisição e mais reduzida quanto ao conteúdo informativo que qualquer hipotética verdade substancial300.

294 RANGEL, Paulo. Direito processual penal. p.5. 295 LOPES JR., Aury. Introdução crítica ao processo penal. 4.ed. rev., atual. e ampl. rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2006. p. 273. 296 LOPES JR., Aury. Introdução crítica ao processo penal. p.273. 297 Cf. RANGEL, Paulo. Direito processual penal. p.5. 298 Cf. RANGEL, Paulo. Direito processual penal. p.5. 299 FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. p.50. 300 FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. p.57; Lopes Jr., Aury. Introdução crítica ao processo penal. p.274.

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Conforme leciona Luigi Ferrajoli, “se uma justiça penal integralmente

‘com verdade’ constitui uma utopia, uma justiça penal completamente ‘sem verdade’ equivale

a um sistema de arbitrariedade301”, para o autor italiano, a “impossibilidade de formular um

critério seguro de verdade das teses judiciais depende do fato de que a verdade ‘certa’,

‘objetiva’ ou ‘absoluta’ representa sempre a ‘expressão de um ideal’ inalcançável302”.

Dito isso, necessário observar, conforme orientação de Paulo Rangel,

ipsis literis, que

o caráter instrumental do processo demonstra que ele (o processo) é meio para efetivar os direitos e garantias individuais assegurados pela Constituição e nos tratados e convenções internacionais de que o Brasil seja parte, não sendo, como pensam alguns autores303, instrumento para se aplicar o direito penal, única e exclusivamente. Entretanto, assegurados todos os direitos constitucionais, a incidência da norma penal sobre o indivíduo autor do fato-crime (pelo menos em tese) somente poderá se dar desde que, nos autos do processo, as provas não dêem margem a outra solução ao magistrado. A punição, dentro do Estado Democrático de Direito, é exceção e não regra. A regra é a liberdade304.

Em seguida, referido autor ressalta que,

não obstante acharmos a verdade real, nem sempre ela condiz com a realidade fática ocorrida, portanto, entendemos, que se trata de uma verdade no processo. O sistema do livre convencimento impõe-nos uma conduta: vale o que está nos autos do processo. Já se disse alhures que o direito não pode ser realizado a qualquer preço. Há que se descobrir a possível verdade dentro de um processo legal305.

O juiz não pode divergir das provas contidas nos autos do Processo,

mesmo que com isso se distancie da Verdade primária ou histórica, que pelo notório fato de

não constar nos autos, é de total desconhecimento do magistrado, uma vez que a pretensão

punitiva deve se fundar na Verdade judiciária, dentro dos limites fixados pelas normas legais

do ordenamento jurídico306.

301 FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. p.48. 302 FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. p.52. 303 Tourinho filho, v.g., quanto ás finalidades do processo penal, afirma que “existe uma finalidade mediata, que se confunde com a própria finalidade do Direito Penal - a paz social -, e uma finalidade imediata, que outra não é senão a de conseguir a ‘realizabilidade da pretensão punitiva derivada de um delito, através da utilização da garantia jurisdicional’. Sua finalidade, em suma, é tornar realidade o Direito Penal. Enquanto este estabelece sanções aos possíveis transgressores das suas normas, é pelo Processo Penal que se aplica a sanctio júris [sanção penal], porquanto toda pena é imposta processualmente”. TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. v.1. p.29. 304 RANGEL, Paulo. Direito processual penal. p.6. 305 RANGEL, Paulo. Direito processual penal. p.6. 306 Cf. RANGEL, Paulo. Direito processual penal. p.6.

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Até mesmo porque, como observa Tourinho Filho,

é certo, por outro lado, que, mesmo na justiça penal, a procura e o encontro da verdade real se fazem com as naturais reservas oriundas da limitação e falibilidade humanas, e, por isso, melhor seria falar em ‘verdade processual’ ou ‘verdade forense’, até porque, por mais que o juiz procure fazer uma reconstrução histórica do fato objeto do processo, muitas e muitas vezes o material de que ele se vale poderá conduzi-lo a uma ‘falsa verdade real’307.

Então, por mais que se procure a Verdade, conforme observa

Fernando Capez, apesar de aceitar a hipótese de no Processo Penal, o juiz ter o “dever de

investigar como os fatos se passaram na realidade, não se conformando com a verdade formal

constante nos autos308”, reafirma que, “por óbvio, é inegável que mesmo nos sistemas em que

vigora a livre investigação das provas, a verdade alcançada será sempre formal [processual],

porquanto ‘o que não está nos autos, não está no mundo’309”.

2.4 ASPECTOS DESTACADOS DE SITUAÇÕES EM QUE A DESCOBERTA

VERDADE REAL É PREJUDICADA POR LIMITAÇÕES LEGAIS (FORMAIS)

No sistema jurídico vigente, vários são os casos em que, em prol de

outros direitos e garantias fundamentais, a busca pela Verdade é valorada como secundária,

cuida-se neste momento de se analisar algumas destas situações, prescritas em lei, no âmbito

penal, que prejudicam a perquirição da verdade.

Trata-se de regra notória, como já amplamente mencionado, o fato do

Processo Penal estar norteado pela incansável perseguição da Verdade, isso, é dado ao caráter

público do direito material sub judice310.

Dito isso, surge o primeiro caso em que resulta prejudicado o

Princípio da Verdade Real ou a simples perquirição pela Verdade que deveria embasar a

sentença; trata-se da absolvição do acusado por falta de provas, nos termos do artigo 386,

inciso VI, do Código de Processo Penal, uma vez que não se dispõe de meios para o

descobrimento efetivo da Verdade Real311.

Cita-se assim, importante explicação apresentada por Cintra,

Dinamarco e Grinover, na seara de que no Processo Penal,

307 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. v.1. p.39. 308 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. p.28. 309 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. p.23. 310 Cf. CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. p.22. 311 Cf. CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. p.22.

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só excepcionalmente o juiz se satisfaz com verdade formal, quando não disponha de meios para assegurar a verdade real (Código de Processo Penal, art. 386, VI). Assim, p. ex.: absolvido o réu, não poderá ser instaurado novo processo criminal pelo mesmo fato, após a coisa julgada, ainda que venham a ser descobertas provas concludentes contra ele. É uma concessão à verdade formal, dita por motivos políticos312.

Com relação à absolvição por falta de prova, Tourinho Filho afirma

que, em rigor, resta prejudicado o Princípio da Verdade Real, acrescentando em seguida, que

só será permitido a busca pela Verdade, no caso, se surgirem novas provas concludentes após

a sentença condenatória, em favor do condenado, seria possível com isso, a revisão

criminal313.

O que se concede ao acusado neste momento em que não existem

provas necessárias à sua condenação é o Princípio do in dubio pro réu ou Princípio da

Prevalência do Interesse do Réu, consistindo no fato de optar-se pela absolvição do acusado

quando o juiz não possuir provas sólidas para a formação do seu convencimento, nem poder

fundamentar a sua sentença de maneira concludente314.

Isso se dá pela necessidade da certeza no ato de sentenciar o acusado

no Processo Penal, pois, o jus libertatis, garantia constitucional prevista no caput do artigo 5º

da Constituição Federal315, e se tal certeza é exigida e não há provas sólidas para a

condenação, melhor é prevenir que um inocente ingresse ao cárcere, ademais, como coloca

Mittermaier,

quem quer obter a certeza não fecha as portas para a dúvida; pelo contrário, aproveita todos os indícios que o possam conduzir a ela; e só quando completamente a tem feito desaparecer que sua decisão se torna irrevogável, e que assenta na base indestrutível da convicção afirmativa316.

Com isso, faltando a certeza; imperando a dúvida, deve o acusado ser

absolvido.

Neste momento, conforme ressalta Paulo Rangel, mister é acrescentar,

312 CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. p.65. 313 Cf. TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. v.1. p.38. 314 Cf. NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. p.656. 315 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, Artigo 5º, caput: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:”. 316 MITTERMAIER, C.J.A. Tratado da prova em matéria criminal. p.65.

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que um dos limites impostos à busca da verdade é o respeito à dignidade da pessoa humana (cf. art. 1º, III, da CRFB317), sendo proibidas em nosso sistema constitucional as provas obtidas por meios ilícitos (cf. art. 5º, LVI da CRFB318). Neste caso, o juiz vê-se impedido, diante do binômio defesa social x direito de liberdade, de prosseguir na busca pela verdade sem ofender um dos direitos e garantias fundamentais319.

Outros casos que vêm a prejudicar o Princípio da Verdade Real,

conforme apontamento de Tourinho Filho, são as transações320 admitidas no Processo Penal,

em caráter excepcional, para as infrações penais de menor potencial ofensivo321, previstos

pela na Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, que trata dos Juizados Especiais

Criminais322.

Cintra, Dinamarco e Grinover, afirmam que o Processo Penal vem

cada vez mais fazendo concessões ao Princípio Dispositivo ou Princípio da Verdade Formal,

sendo que uma dessas concessões é exatamente esta possibilidade de transação prevista no

procedimento processual dos Juizados Especiais Criminais323.

Com isso, de ver-se notar importante colocação traçada por Paulo

Rangel:

Assim, podemos afirmar que, com o advento da Constituição Federal, este princípio [...] está mitigado, já que, neste caso, o Estado contenta-se com o que está sendo acordado entre o Ministério Público e o autor do fato, sem perquirir ao fundo as circunstâncias em que o fato fora praticado, bem como se aquele apontado [...] é realmente o autor do fato. Trata-se de um consenso324.

Afirma em seguida, referido autor, que “em outras palavras, a

Constituição Federal, ao estatuir que os juizados especiais são competentes para a transação

317 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – CRFB - Artigo 1º, caput e inciso III: “a Republica Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: [...] III – a dignidade da pessoa humana;”. 318 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, Artigo 5º, inciso LVI: “são inadmissíveis no processo, provas obtidas por meios ilícitos;”. Vide caput, supra, item 1.2.10. 319 RANGEL, Paulo. Direito processual penal. p.6. 320 Consiste ela em um acordo celebrado entre o Ministério Público e o autor do fato, pelo qual o primeiro propõe ao segundo uma pena alternativa (não privativa de liberdade), dispensando-se a instauração do processo. CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: legislação penal especial. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2007. v.4. p.551. 321 Infrações Penais de Menor Potencial Ofensivo: Lei nº 9.099/95, artigo 61: “Consideram-se infrações penais de menor potencial ofensivo, para os efeitos desta Lei, as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a 2 (dois) anos, cumulada ou não com multa”. 322 Cf. TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. v.1. p.38. 323 Cf. CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. p.65. 324 RANGEL, Paulo. Direito processual penal. p.6.

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nas hipóteses previstas em lei, demonstra claramente a intenção de se mitigar o Princípio da

Verdade Real325”.

Ademais, Tourinho Filho, chama a atenção para a possibilidade de

“em determinados casos o Juiz penal nem sequer chegar à verdade histórica, como acontece

com a proibição de se argüir a exceção da verdade (art. 138, § 3º, do CP326)327”.

Contrapondo-se o ramo cível com o penal, de forma a ressaltar que

embora exista a possibilidade de haver transigência entre o juízo penal e Verdade Real, nota-

se que no âmbito penal essas transigências são menos vistas, conforme leciona Tourinho

Filho, é de se observar que nesses exemplos:

percebe-se que o juízo penal transige com a verdade real. Maior transigência, contudo, existe no campo extrapenal. Assim sendo, não se pode negar que no juízo penal a transigência com a verdade material seja menor que no cível. Por isso, pode-se afirmar que, embora o princípio da verdade real não vigore em toda a sua pureza no Processo Penal, aqui ela é mais intensa que no cível328.

325 RANGEL, Paulo. Direito processual penal. p.7. 326 BRASIL. Código Penal: Decreto-Lei 2.848/1940. Artigo 138, caput e § 3º: “Caluniar alguém, imputando-lhe fato definido como crime: Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa. [...] § 3º Admite-se a prova da verdade, salvo: I – se, constituindo o fato imputado crime de ação privada, o ofendido não for condenado por sentença irrecorrível; II – se o fato é imputado a qualquer das pessoas indicadas no nº I do art. 141 [Presidente da República ou chefe de governo estrangeiro]; III – se o crime imputado, embora de ação pública, o ofendido foi absolvido por sentença irrecorrível”. 327 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. v.1. p.38. 328 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. v.1. p.38.

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3 A BUSCA PELA VERDADE NO PLENÁRIO DO TRIBUNAL DO

JÚRI – ASPECTOS DESTACADOS

Por fim, após exposição das origens históricas do Tribunal do Júri e da

sua evolução em solo brasileiro até os dias de hoje, no primeiro Capítulo, e, abordagem acerca

do Princípio da Verdade Real, com definições e assuntos destacados objetivando-se uma

maior compreensão da matéria, no segundo Capítulo; neste momento chega-se ao limiar desta

monografia, após uma abordagem dedutiva acerca do Tribunal do Júri e do Princípio da

Verdade Real, de forma a granjear conteúdo para o desenvolvimento do presente capítulo, no

qual tratar-se-á de relacionar o Princípio em epígrafe com a fase do Plenário do Tribunal do

Júri; onde efetivamente o acusado será julgado pelo Conselho de Sentença acerca dos fatos

ocorridos, com a observância (ou não) do Princípio da Verdade Real.

Ocorre que, como alerta David Borensztajn, a instituição do Tribunal

do Júri, tem sofrido ao longo dos anos, críticas que poderiam ser resumidas dizendo-se que,

sendo composto de leigos, consequentemente, decide mal, além disso, cada parte busca a

prevalência de sua própria verdade329.

Conforme Heleno Cláudio Fragoso ao criticar o Tribunal do Júri

afirmou, “o debate feito pelas partes é necessariamente tendencioso, visando cada uma à

vitória de sua causa330”, porém, referido autor após algum tempo, alterou seu discurso,

afirmando que,

no quadro da Justiça Criminal em geral, o Júri não sai perdendo para o julgamento feito pelo juiz togado. A Justiça Criminal funciona com critérios relativos. O corpo judiciário, incluindo juízes e promotores, funciona de um modo geral com uma mentalidade extremamente conservadora e repressiva, reacionária, mesmo fazendo o papel que o sistema lhe atribui. Com isso sobra para o Júri Popular uma possibilidade de justiça mais humana331.

Dito isso, deixar-se-á as críticas de lado em prol do presente objetivo

de observar quando o Princípio da Verdade Real vigora (ou não) no procedimento do plenário

a seguir.

329 Cf. BORENSZTAJN, David. Notas e comentários (criminal). A busca da verdade no Tribunal do Júri. Revista dos tribunais. São Paulo: Revista dos Tribunais, abr., 1987. n.618. p.420. 330 FRAGOSO, Heleno Cláudio. A questão do Júri. (versão integral e original do artigo publicado na Revista Forense, n. 193, jan./mar. 1961, pp.20-29). Disponível em: <www.fragoso.com.br>. Com acesso em: 23 abr. 2008. p.12. 331 FRAGOSO, Heleno Cláudio. Entrevista nas páginas amarelas da edição de 17 de dezembro de 1980, da revista Veja. O Júri deve ser popular. Disponível em: <www.fragoso.com.br>. Com acesso em: 23 abr. 2008.

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3.1 FASE PROCEDIMENTAL PRÉ-PLENÁRIO – JUDICIUM ACUSATIONIS

Primeiramente, antes de ser tratado do Plenário do Tribunal do Júri,

mister é asseverar que o procedimento dos crimes de competência do Tribunal do Júri se dá

por rito próprio, como ensina José Frederico Marques:

A forma progressiva da acusação, no processo penal do Júri, traz, como corolário, o procedimento penal escalonado. Há, de início, uma fase procedimental preparatória, para o julgamento da denúncia, e uma segunda fase definitiva, para o julgamento do libelo332,333.

Cuida-se neste primeiro momento, de uma breve introdução acerca da

primeira fase do rito procedimental do Tribunal do Júri, denominada judicium acusationis334,

com o objetivo de uma maior compreensão de como se deve proceder até que se chegue ao

julgamento em Plenário, segunda fase do procedimento em tela, o denominado judicium

causae335.

3.1.1 ORDEM DOS ATOS PROCEDIMENTAIS

Conforme magistério de Cintra, Grinover e Dinamarco, o

procedimento é o “meio extrínseco pelo qual se instaura, desenvolve-se e termina o processo,

[...] não passando da coordenação de atos que se sucedem336”, ademais, Borges da Rosa

leciona que o “Direito Processual Penal é a série de atos destinados à descoberta da verdade

relativa à prática de fato previsto na lei penal337”; sendo assim, para o entendimento de como

se desenvolve o procedimento até a fase plenária do Tribunal do Júri, é imperioso neste

momento um breve roteiro procedimental.

A primeira fase procedimental, como já mencionado, é denominada

judicium acusationis, e obedece a seguinte ordem procedimental: a) denúncia ou queixa; b)

recebimento da denúncia ou queixa; c) citação do acusado; d) interrogatório; e) fixação do

332 Libelo: trata-se da peça acusatória cuja o conteúdo é fixado pela sentença de pronúncia, ou seja, pela sentença da primeira fase da instrução criminal do rito do Júri, expondo, na forma de artigos, a matéria que será submetida a julgamento pelo Plenário do Tribunal do Júri. Cf. NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. p.417. 333 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.57. 334 Judicium Acusationis: Juízo de acusação. FILARDI LUIZ, Antônio. Dicionário de expressões latinas. p.156. 335 Judicium Causae: juízo da causa. FILARDI LUIZ, Antônio. Dicionário de expressões latinas. p.156. 336 CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. p.277. 337 ROSA, Inocêncio Borges da. Comentários ao código de processo penal. 3ª ed., rev. e atual. por Angelito A. Aiquel. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1982. v.III. p.347.

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tríduo para a defesa prévia; f) audiência para a oitiva das testemunhas arroladas pela acusação

(no máximo oito); g) audiência para a oitiva das testemunhas arroladas pela defesa (no

máximo oito); h) alegações no prazo de cinco dias para cada parte, havendo assistente de

acusação, terá este igual prazo, após a fala do promotor de justiça338.

Ademais, conforme ressalva Edílson Mougenot Bonfim, “o judicium

acusationis [...] se apresenta muito semelhante aos procedimentos sujeitos aos julgamentos do

juízo monocrático339”, “até porque, a um e a outro, presidem as sumariações dos feitos

magistrados de carreira que, obrigatoriamente, primam por um regramento técnico-jurídico

para a instrução probatória340”.

Conforme ressalta José Lisboa da Gama Malcher,

A única diferença existente entre o procedimento de que tratamos e o ordinário de primeiro grau é a inexistência do prazo para requerimento de diligências, imediatamente após o encerramento da prova de defesa e antes das alegações finais; aqui ele não existe neste momento processual: a acusação deve requerer diligências apenas quando oferece a inicial, e a defesa nas alegações preliminares341.

As diligências poderão ser ordenadas de ofício pelo juiz, tantas

quantas necessárias ao descobrimento da Verdade Real342.

Fernando Capez leciona ainda que:

em nome do Princípio da Verdade Real, após as alegações, os autos vão conclusos ao juiz, que ordenará diligências imprescindíveis para sanar qualquer nulidade ou suprir falha que prejudique o esclarecimento da verdade, podendo inclusive inquirir testemunhas. Em seguida, os autos vão conclusos para a sentença [de pronúncia]343.

3.1.2 POSSÍVEIS DECISÕES NO ENCERRAMENTO DO JUDICIUM ACUSATIONIS

Passadas as referidas fases procedimentais, o juiz pode tomar as

seguintes decisões, como encerramento da fase do judicium acusationis: pronúncia,

desclassificação, impronúncia ou absolvição sumária344.

338 Cf. CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. pp.640-641. 339 BONFIM, Edílson Mougenot. Curso de processo penal. p.459. 340 bonfim, Edílson Mougenot. Júri: do inquérito ao plenário. 2.ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 1996. p.85. 341 MALCHER, José Lisboa da Gama. Manual de processo penal brasileiro. Rio de Janeiro: Livraria Freitas Bastos, 1890. v.I. p.441. 342 Cf. MALCHER, José Lisboa da Gama. Manual de processo penal brasileiro. v.I. p.441. 343 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. p.641. 344 Cf. CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. p.641.

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A Sentença de Pronúncia, conforme ensina Guilherme de Souza

Nucci,

é decisão interlocutória mista, que julga admissível a acusação, remetendo o caso à apreciação do Tribunal do Júri. Trata-se de decisão de natureza mista, pois encerra a fase de formação da culpa, inaugurando a fase de preparação do plenário, que levará ao julgamento de mérito. Chama-se sentença de pronúncia, porque possui formalmente a estrutura de uma sentença, isto é, relatório, fundamentação e dispositivo345.

Os requisitos para Sentença de Pronúncia são: a prova da

materialidade do crime e indícios suficientes de que o acusado seja o autor, e, na falta de

qualquer destes requisitos essenciais o juiz deve proceder de forma a impronunciar o

acusado346.

Dito isso, complementa Paulo Rangel, afirmando que “a impronúncia

é a decisão oposta à pronúncia, ou seja, ocorre quando o juiz julga inadmissível a acusação,

entendendo não haver prova da existência do crime e/ou indícios suficientes de autoria347”,

“neste caso, o juiz profere uma decisão de cunho nitidamente processual, declarando

inadmissível a imputação feita na denúncia348”.

Desclassificação, segundo Júlio Fabbrini Mirabete, ocorre quando é

atribuído ao crime classificação legal diversa daquela imputada na denúncia ou na queixa,

sendo assim, caso o juiz no ato da Sentença de Pronúncia, observar que não se trata de crime

doloso contra a vida, excluindo, com isso, a competência do Tribunal do Júri, deve, portanto

remeter os autos ao juiz competente para apreciar o crime, seguindo-se o procedimento

previsto para aquele tipo de crime349.

Paulo Rangel arremata no seguinte sentido: “desclassificação é

mudança, alteração, deslocar ou tirar de uma classe ou categoria. Desclassificar uma infração

é retirá-la da classificação inicial e coloca-la em outra350”.

Quanto à Absolvição Sumária, assim é do ensinamento de Paulo

Rangel:

A absolvição sumária é decisão de mérito, onde o juiz julga improcedente o pedido do Ministério Público, formulado na denúncia, com conseqüente

345 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. p.685. 346 Cf. GRECO FILHO, Vicente. Manual de processo penal. p.415. 347 RANGEL, Paulo. Direito processual penal. p.540. 348 RANGEL, Paulo. Direito processual penal. p.545. 349 Cf. MIRABETE, Júlio Fabbrini. Código de processo penal interpretado. p.265. 350 RANGEL, Paulo. Direito processual penal. p.550.

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absolvição do acusado, face à presença de uma excludente, seja de ilicitude ou de culpabilidade351.

Continua em seguida o autor, afirmando que,

a decisão de absolvição sumária somente poderá ser prolatada quando houver exclusão da ilicitude [...] ou exclusão da culpabilidade [...]. Na primeira hipótese, não há crime, não sendo possível levar o réu a julgamento por um fato que não encontra proibição na ordem jurídica, ou seja, é lícito o fato típico. Na segunda hipótese, o réu é isento de pena, podendo ser absolvido ou sofrer medida de segurança352, pois o fato típico e ilícito não é punível353.

Colacionadas as primeiras diretrizes, adentra-se a seguir na Fase do

Plenário do Tribunal do Júri.

3.2 O PLENÁRIO DO TRIBUNAL DO JÚRI – JUDICIUM CAUSAE

Conforme elucida James Tubenchlak,

ponto culminante do procedimento dos delitos dolosos contra a vida e da fase do judicium causae é, sem dúvida, o julgamento pelo Tribunal do Júri. As solenidades de que se reveste, dentre elas o vestuário do Juiz-Presidente e das partes – a toga e a beca – dão às vezes a impressão de que se está no interior de um tempo antigo e sagrado354.

José Frederico Marques afirma que “na sessão de julgamento pelo

Tribunal do Júri, é que se realiza a instrução definitiva da causa355”.

Compõe-se o Tribunal do Júri de um juiz de direito e de vinte e um

jurados, que são sorteados dos que constituem o respectivo corpo de jurados e que estão

incumbidos de servir na reunião periódica; é deles que, na sessão plenária se procederá ao

sorteio dos sete componentes do Conselho de Sentença356.

Por outro lado, conforme ensinamentos de Guilherme de Souza Nucci,

351 RANGEL, Paulo. Direito processual penal. p.553. 352 Medida de Segurança: “sanção penal imposta pelo Estado, na execução de uma sentença, cuja finalidade é exclusivamente preventiva, no sentido de evitar que o autor de uma infração penal que tenha demonstrado periculosidade volte a delinqüir”. Capez, Fernando. Curso de direito penal: parte geral. p.400. 353 RANGEL, Paulo. Direito processual penal. p.554. 354 TUBENCHLAK, James. Tribunal do júri: contradições e soluções. 4.ed. rev. e ampl. São Paulo: Saraiva: 1994. p.97. 355 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.283. 356 Cf. NORONHA, Edgard Magalhães. Curso de direito processual penal. 24.ed. atual. por Adalberto José Q. T. de Camargo Aranha. São Paulo: Saraiva, 1995. p.264.

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para validamente começar seus trabalhos, devem reunir-se, pelo menos, 16 pessoas (um juiz togado e 15 jurados). Portanto, pode-se dizer que há o Tribunal do Júri pleno (22 pessoas), o Tribunal do Júri mínimo (16 pessoas) e o Tribunal do Júri constituído para o julgamento (8 pessoas)357.

Além disso, importante é ressaltar que as faltas de quaisquer das

partes são matéria de suma relevância, com isso é de se observar conforme leciona Fernando

Capez: ocorrendo a falta do membro do Ministério Público, de maneira justificada, o

julgamento será adiado para a próxima sessão, no caso de falta injustificada o julgamento será

igualmente adiado, porém acarretará em ofício ao procurador-geral a fim de que designe outro

promotor; faltando o assistente do Ministério Público, justificada ou injustificadamente, não

há falar em adiamento do julgamento; no caso de falta justificada do defensor, adia-se o Júri,

diante de falta injustificada, o Júri será igualmente adiado para a próxima sessão; sendo o réu

o faltante, de forma justificada, será o seu julgamento adiado, em se tratando de ausência

injustificada, se a infração for afiançável, o julgamento deve ser realizado, se inafiançável o

julgamento não pode ser realizado, sendo conveniente a decretação da prisão preventiva do

acusado; sendo as testemunhas faltosas, tanto as faltas justificadas como as injustificadas

somente acarretam o adiamento do julgamento se foram arroladas em caráter de

imprescindibilidade358.

Mister ainda, arrematar que, na falta das testemunhas somente será

adiado o julgamento no caso de alguma delas ter sido arrolada no libelo em caráter de

imprescindibilidade359.

Importante é, neste momento, o entendimento de como se prossegue

na marcha processual do Plenário do Tribunal do Júri, com isso, mister se faz a exposição do

roteiro da sessão de julgamento, como segue:

1) Início do Trabalhos (toque de campainha); 2) Chamada dos Jurados (pelo Escrivão); 3) Verificação do “Quorum”. Adiamento se não alcançado; 4) Decisão das escusas de faltas dos jurados e imposição de multa aos faltosos; 5) Verificação e colocação das cédulas dos jurados presentes na Urna de Sorteio de Jurados (urna menor); 6) Anúncio do(s) processo(s) a julgar; 7) Pregão das Partes (pelo Oficial de Justiça); 8) Entrada do réu, qualificação deste e indicação de defensores; 9) Pregão do M.P. [Ministério Público], querelante, assistente e testemunhas. Adiamento se couber. Recolhimento das testemunhas à Sala especial; 10) Advertência aos jurados das causas legais de impedimento e suspeição; 11) Sorteio do Conselho de Jurados. Recusa peremptória e apresentação de exceções pelas partes aos jurados; 12) Compromisso dos Jurados; 13) Assinatura do Termo de Compromisso pelos

357 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. p.728. 358 Cf. CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. p. 653. 359

Cf. CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. p. 653.

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Jurados, Juiz e Partes; 14) Chamada do réu a interrogatório; 15) Interrogatório do réu; 16) Relatório. Leitura das peças pelo Escrivão; 17) Debate: Sustentação do Libelo e Defesa (2 horas por parte). Réplica e Tréplica (meia hora por parte); 18) Questionário: Redação e explicação aos jurados pelo Juiz; 19) Oportunidade para reclamações e requerimentos das partes; 20) Indagação aos jurados sobre esclarecimentos adicionais e se estão aptos a julgar; 21) Recolhimento à Sala Secreta; 22) Votação. Consignação da Votação em termo; 23) Sentença (pelo Juiz-Presidente, no Termo de Votação); 24) Reabertura da Sessão Pública. Publicação da Sentença; 25) Encerramento da Sessão. Convocação dos Jurados para a Sessão seguinte; 26) Ata de Julgamento e Certidão de incomunicabilidade dos Jurados (posteriormente à Sessão)360.

3.2.1 SUJEITOS PROCESSUAIS NO PLENÁRIO DO TRIBUNAL DO JÚRI – PARTES

RELEVANTES AO ESTUDO

Os sujeitos processuais, segundo José Frederico Marques, “são as

pessoas entre as quais se desenvolve a relação processual361”, e é isso o que se cuidará de

expor neste momento; passando pela figura do Juiz-Presidente, pelo Promotor de Justiça, o

Assistente de acusação, o Advogado de Defesa, o Acusado sob julgamento, e, por fim, os

Jurados, haja vista que todos serão reunidos em plenário e cada um terá sua importância e

finalidade na fase propriamente dita do juízo da causa.

3.2.1.1 O Juiz-Presidente do Tribunal do Júri

É do ensinamento de José Frederico Marques, que “a presidência do

Tribunal do Júri cabe a um juiz, de acordo com a distribuição de atribuições da organização

judiciária local362”, para integrar o plenário do Tribunal do Júri, assim como regular os seus

trabalhos, no Brasil sempre vigorou o Princípio do juízo monocrático363; “inteligente,

ilustrado e honesto – eis as qualidades primordiais da autoridade incumbida de dirigir o

Tribunal do Júri364”.

Edgard Magalhães Noronha, afirma que “deve o Presidente ser juiz

vitalício, em face do relevo de suas funções, dentre as quais se sobressaem a de graduar a

pena e aplicar medida de segurança365”, contudo como observa Adriano Marrey, Alberto Silva

360 MALCHER, José Lisboa da Gama. Manual de processo penal brasileiro. p.450. 361 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.61. 362 MARQUES, José Frederico. O júri no direito brasileiro. p.82. 363 Cf. MARQUES, José Frederico. O júri no direito brasileiro. p.82. 364 WHITAKER, Firmino. Jury. pp.22-23. 365 NORONHA, Edgard Magalhães. Curso de direito processual penal. p.264.

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Franco e Rui Stoco, a Lei Orgânica da Magistratura Nacional veio a “facultar aos juízes que

ainda não hajam adquirido vitaliciedade pratiquem ‘todos os atos reservados por lei aos juizes

vitalícios’366”.

Para que tenha a possibilidade de exercer suas funções, ao Juiz-

Presidente do Tribunal do Júri é conferida uma lista de atribuições, elencadas no artigo 497 do

Código de Processo Penal367, das quais poderá se utilizar no controle do plenário do Tribunal

do Júri.

Tais atribuições são essências ao exercício da função da presidência

do Tribunal do Júri, contudo, em especial uma se destaca pela importância para a presente

monografia; trata-se do inciso XI, do artigo 497, onde o Juiz-Presidente, ex ofício, pode

determinar diligências e “seguir em busca da Verdade Real, como Princípio fundamental

adotado no processo penal brasileiro368”, e, se esta não puder ser realizada no momento, deve

ser dissolvido o conselho de sentença para a sua realização e marcada nova sessão de

julgamento para outra data369.

Ainda é de se notar a perquirição da Verdade Real no caso das

diligências requeridas pelas partes, tratadas no Inciso VII do referido dispositivo legal, haja

vista que o Juiz-Presidente precisa considerá-la necessária e deferir o requerimento, porém,

como em muitos casos a suspensão dos trabalhos é inviável, pois a prova a ser produzida não

é imediata, hoje em dia é uma medida pouco utilizada370.

Ademais, como presidente que é do Tribunal do Júri, o magistrado é a

única autoridade com poder de mando no plenário, o juiz presidente, além de suas atribuições

decisórias, exercerá os poderes de polícia, o poder disciplinar, os poderes voltados para a

instrução da causa e os poderes destinados a zelar pela regularidade do processo371.

366 MARREY, Adriano; FRANCO, Alberto Silva; STOCO, Rui. Teoria e prática do júri. 6.ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. p.265. 367 Código de Processo Penal, Artigo 497, "Caput" e Incisos: I - regular a polícia das sessões e mandar prender os desobedientes; II - requisitar o auxílio da força pública, que ficará sob sua exclusiva autoridade; III - regular os debates; IV - resolver as questões incidentes, que não dependam da decisão do júri; V - nomear defensor ao réu, quando o considerar indefeso, podendo, neste caso, dissolver o conselho, marcado novo dia para o julgamento e nomeado outro defensor; VI - mandar retirar da sala o réu que, com injúrias ou ameaças, dificultar o livre curso do julgamento, prosseguindo-se independentemente de sua presença; VII - suspender a sessão pelo tempo indispensável à execução de diligências requeridas ou julgadas necessárias, mantida a incomunicabilidade dos jurados; VIII - interromper a sessão por tempo razoável, para repouso ou refeição dos jurados; IX - decidir de ofício, ouvidos o Ministério Público e a defesa, ou a requerimento de qualquer das partes, a preliminar da extinção da punibilidade; X - resolver as questões de direito que se apresentarem no decurso do julgamento; XI - ordenar de oficio, ou a requerimento das partes ou de qualquer jurado, as diligências destinadas a sanar qualquer nulidade, ou a suprir falta que prejudique o esclarecimento da verdade. 368 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. p.803. 369 Cf. NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. p.803. 370 Cf. NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. p.803. 371 Cf. BONFIM, Edílson Mougenot. Curso de processo penal. p.488.

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Quanto à sessão de julgamento no Plenário do Tribunal do Júri, o

Princípio da Identidade Física do Juiz é imprescindível, ou seja, o juiz que der início aos

trabalhos de uma sessão deverá como corolário do referido Princípio, presidi-lo até o seu

fim372, “podendo ser ele mesmo, ou outro, o encarregado da instrução e das providências

referentes à organização do corpo de jurados e à convocação do Júri373”.

Dito isso, é de se observar o que Edgard Magalhães Noronha ressalta,

no sentido de que “preside o Júri, o juiz, guiando-se exclusivamente pela lei, embora não deva

abrir mão da colaboração do Conselho de Sentença e mesmo das partes, podendo ouvi-las

quando achar necessário374”.

3.2.1.2 O Promotor de Justiça no Plenário do Tribunal do Júri

Conforme magistério de José Frederico Marques, “os processos da

competência do Júri têm todos, por objeto, crimes de ação pública375, a qual, [...] é promovida

pelo Ministério Público376”, por força do artigo 100, § 1º, do Código Penal377, com isso, de

regra a ação penal dos crimes afetos ao Tribunal do Júri é do Ministério Público, que a exerce

pelo seu Promotor de justiça378.

Somente quando houver crimes conexos de ação penal privada ou

subsidiária da pública é que surge no Processo Penal do Júri a figura do querelante379,380.

No Plenário do Tribunal do Júri o Ministério Público, pelas palavras

de José Frederico Marques,

372 BONFIM, Edílson Mougenot. Curso de processo penal. p.488. 373 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Código de processo penal interpretado. p.1078. 374 NORONHA, Edgard Magalhães. Curso de direito processual penal. p.265. 375 Ação Penal: é o direito de pedir ao Estado-Juiz, o titular do direito de punir, a aplicação do direito penal objetivo a um caso concreto. Diz-se ação penal pública quando assim lhe atribuir a lei, só podendo ser esta exercida pelo Ministério Público, diz-se privada a ação penal que por disposição legal pode ser exercida pela vítima do crime ou seu representante legal, sendo que o titular do direito de punir lhe transfere o direito de ação, diz-se ainda ação penal subsidiária da pública, quando, por disposição legal, o poder de mover a ação penal passa para a vítima do crime ou seu representante legal, depois que o Ministério Público, passado o prazo legal para o ajuizamento, deixa de promovê-la, assim como na ação penal privada o Estado, titular do direito de punir, transfere a legitimidade de ação. Cf. CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. pp.111, 120 e 133. 376 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.181. 377 Código Penal, Artigo 100, caput e § 1º: “100 - A ação penal é pública, salvo quando a lei expressamente a declara privativa do ofendido. § 1º - A ação pública é promovida pelo Ministério Público, dependendo, quando a lei o exige, de representação do ofendido ou de requisição do Ministro da Justiça”. 378 Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.181. 379 Querelante: na ação penal privada, é a vítima do crime ou seu representante legal. Cf. BONFIM, Edílson Mougenot. Curso de processo penal. p.169. 380 Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.181.

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trata-se de órgão estatal a que foi dada a titularidade da ação penal, uma vez que é ele, também, o órgão do Estado a que está afeta a pretensão punitiva. Como a aplicação do direito de punir depende de julgamento prévio, – existe este órgão para deduzir a pretensão punitiva em juízo, através da acusação, e também para orientar a persecução penal. [...]. Titular da pretensão punitiva e do direito de acusar, é evidente que o Ministério Público tem a função e papel de parte, na relação processual que se instaura com a ação penal381.

Continua em seguida o autor, afirmando que, “titular da ação penal e

do direito de acusar, incumbe ao ministério Público apresentar a denúncia e, posteriormente,

quando já pronunciado o réu, o libelo-crime acusatório382”. Ademais, depois que o juiz

pronuncia o réu, a apresentação do libelo se torna indeclinável383.

Além dos atos ligados à propositura da ação penal, e daqueles que pratica, de modo normal, como parte, no curso da instância, cabe ao Ministério Público, no processo do Júri, algumas atribuições peculiares, decorrentes da própria estrutura procedimental dos julgamentos do tribunal popular, ou das operações destinadas à composição e instalação do Tribunal do Júri384.

Dentre estas, cita-se a título de exemplo, pois não é o objeto de estudo,

o dever estar presente no dia e hora marcados para a realização da sessão de julgamento,

presenciando, inclusive os atos iniciais da sessão periódica385.

Se o Promotor de Justiça não comparecer à sessão, fica

impossibilitada a realização do julgamento, como já mencionado acima, “entretanto, é preciso

que o motivo da ausência seja caracterizado como de força maior e não simplesmente porque

o promotor deseja adiar a sessão por interesses pessoais386”, esclarecendo ainda, que caso

ocorra a falta não justificada por motivo de força maior, “o fato deve ser comunicado ao

Procurador-Geral387”, acarretando no adiamento do julgamento para a próxima sessão388.

Ainda participa, assim como a defesa, da formação do conselho de

sentença, com o exercício do direito de recusa em relação aos jurados sorteados, no limites

legais, bem como pode argüir a suspeição de cada um dos jurados sorteados389.

Durante a fase plenária do procedimento do Júri, o órgão do

Ministério Público, na pessoa do Promotor de Justiça, funciona como parte acusadora, 381 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.181. 382 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.182. 383 Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.182. 384 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.183. 385 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.183. 386 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. p.741. 387 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. p.741. 388 Cf. CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. p.653. 389 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.184.

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cabendo-lhe com isso: a) inquirir através do juiz, as testemunhas de acusação e de defesa390;

b) ler o libelo-crime acusatório e, a seguir, promover a acusação; c) falar na réplica; d)

requerer ou formular reclamações após a leitura dos quesitos; e) assistir ao julgamento em

sala secreta do Tribunal do Júri, sem é claro, perturbar a livre manifestação do Conselho de

Sentença; tudo isso, por atribuição legal do Código de Processo Penal391.

Ademais, o Promotor de Justiça assinará, com o juiz, a ata da sessão

de julgamento, ata essa que deve assinalar a abertura da sessão e a presença do Ministério

Público392.

Quando da fase dos debates orais, assim leciona Ary Azevedo Franco:

Fala em primeiro lugar, o promotor, que lerá o libelo e os dispositivos da lei penal em que se achar o réu incurso, e produzirá a acusação. Se o processo for promovido pela parte ofendida, ao acusador particular caberá falar em primeiro lugar, ler o libelo e os dispositivos de lei em que o réu se achar incurso e promover a acusação, falando o promotor depois dele. Quando houver assistente (que nada mais é que o auxiliar da acusação pública, representada pelo promotor), falará ele sempre depois do promotor393.

Já com relação ao tempo que cada um poderá utilizar na acusação,

este é de duas horas, na réplica e tréplica a duração é de meia hora, com acréscimo de um hora

neste tempo no caso de haver a pluralidade de réus394; quanto à sua divisão, leciona Júlio

Fabbrini Mirabete afirmando que no caso de haver mais de um acusador “podem ajustar a

divisão dos tempos entre eles e, não concordando, caberá ao juiz dividi-lo, antes de iniciada a

exposição das partes395”.

3.2.1.3 O Assistente de Acusação no Plenário do Tribunal do Júri

Conforme Firmino Whitaker, o assistente de acusação “é aquele que,

não tendo oferecido queixa, intervém como assistente no processo, para esclarecer o

390 Porém, é do ensinamento de Edilson Mougenot Bonfim e sustentado majoritariamente pela doutrina e jurisprudência, que não se aplica ao julgamento pelo Tribunal do Júri o sistema presidencialista, onde as perguntas são feitas por intermédio do juiz presidente, mas sim, o sistema inglês, onde as perguntas são feitas diretamente pelas partes às testemunhas. Cf. BONFIM, Edilson Mougenot. Curso de processo penal. p.480; Guilherme de Souza Nucci, arremata a questão: “O art. 467 é claro ao dispor que as partes e os jurados inquirirão as testemunhas, dispensando-se, pois, a participação do presidente. Este, por sua vez, fiscalizará as perguntas realizadas, indeferindo as que forem impertinentes, irrelevantes e abusivas”. NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.734. 391 Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.184. 392 Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.184. 393 FRANCO, Ary Azevedo. Código de processo penal. Rio de Janeiro: Livraria Jacinto, 1943, v.2. p.115. 394 Cf. MALCHER, José Lisboa da Gama. Manual de processo penal brasileiro. p.455. 395 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Código de processo penal interpretado. p.1022.

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promotor396”, adiante, referido autor leciona ponto importante para a presente monografia,

afirmando que “o auxiliar só pode apresentar à promotoria, indicações de provas e diligências,

[...] tendentes à descoberta da verdade397”.

Para Vicente Greco Filho, “o assistente é o ofendido, seu

representante legal, ou seu sucessor, auxiliar da acusação pública. [...] o assistente atua,

também, em colaboração com a acusação pública no sentido da aplicação da lei penal398”.

“O assistente poderá ingressar a partir do recebimento da denúncia e

até o trânsito em julgado da sentença, recebendo a causa no estado em que se encontrar. Não

se admite assistente perante o inquérito policial ou na fase de execução da pena399”, conforme

leciona Vicente Greco Filho.

Para a intervenção em Plenário o assistente que não tenha participado

da instrução criminal deverá ser requerida ao juiz-presidente com antecedência mínima de três

dias, nos ditames da Lei processual400, ou seja, há um prazo mínimo para que ingresse nos

autos, apresentando-se para o julgamento, a fim de se preparar corretamente à sessão.

Ademais, conforme Firmino Whitaker,

A defesa seria prejudicada, porque, o auxiliar comparecendo inesperadamente no plenário [...] surpreenderia o réu justamente no ato do julgamento, isto é, quando lhe faltaria tempo de se preparar para combater o novo adversário; e toda interpretação que sacrifica o direito de defesa, em favor da acusação, é anormal e desumana401.

Conforme leciona Guilherme de Souza Nucci, deve ser dada

oportunidade ao assistente de acusação para se manifestar no Plenário do Tribunal do Júri,

sendo que:

Deve ser garantida pelo juiz presidente, caso não haja acordo com o Ministério Público. Não se trata de mera concessão do promotor, mas de direito da vítima que, através de seu procurador, possa falar. Assim, o ideal é entrarem em acordo – promotor e assistente – comunicando ao juiz como dividirão o tempo. Não sendo assim, o juiz presidente, conforme seu prudente critério, promove a divisão do tempo destinado a cada um, normalmente em iguais partes402.

396 WHITAKER, Firmino. Jury. p.41. 397 WHITAKER, Firmino. Jury. p.42. 398 GRECO FILHO, Vicente. Manual de processo penal. p.252. 399 GRECO FILHO, Vicente. Manual de processo penal. p.253. 400 Cf. NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. p.740. 401 WHITAKER, Firmino. Jury. p.43. 402 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. p.761.

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Sua participação em plenário é permitida, porém, “a tendência é

suprimir e não ampliar a ação individual do ofendido, para que a sociedade exclusivamente

exerça o direito de pedir penas, que hoje já não se baseiam na vingança, mas nos interesses

sociais403”.

3.2.1.4 O Advogado de Defesa no Plenário do Tribunal do Júri

No ato de punir os delitos praticados em determinada localidade a

sociedade não está exercendo a vingança, o intuito da sociedade punindo o delinqüente é

restabelecer a ordem social alterada pelo delito, e, ao mesmo tempo, fornecendo aos demais

possíveis delinqüentes, exemplo que configure o perigo de imitação da conduta, bem como é

claro, corrigir o delinqüente, habituando-o a respeitar a lei, a sociedade e encaminhando-o à

regeneração dos costumes404.

Nem toda a infração, porém, merece ser castigada. Há delitos que são a obra lamentável de um inconsciente ou constrangido; outros que resultam de acidente ou mesmo do exercício de um direito. Estes nenhum abalo causam. Puni-los, seria, talvez, praticar justiça absoluta; nunca, porém, agir conforme a utilidade social, que daquela é reguladora. Por outro lado, há circunstâncias que minoram as penas aplicáveis ao delinqüente. A defesa, pois, não é só de interesse individual, mas, também, de interesse geral [...]405.

Tamanha é a importância social da defesa que importa na

irrenunciabilidade por parte do acusado, e em caso de não poder arcar com sua defesa o

Estado fica obrigado a lhe fornecer defensor, pois o “direito de defesa é indisponível, pelo

que, se o réu não o exerce, descumprindo ônus processuais que lhe são impostos em função da

tutela do jus libertatis406, cabe ao defensor faze-lo, nos limites que a lei demarca407”.

Conforme José Frederico Marques, “nenhum processado, ainda que

ausente ou foragido, será processado ou julgado sem defensor408”, ademais, quanto a

indisponibilidade do direito de defesa, leciona Guilherme de Souza Nucci que,

trata-se de uma decorrência da indisponibilidade do direito de liberdade, razão pela qual o réu, ainda que não queira, terá nomeado um defensor, habilitado para a função, para o patrocínio de sua defesa. E tal medida não é

403 WHITAKER, Firmino. Jury. p.43. 404 Cf. WHITAKER, Firmino. Jury. pp.44-45. 405 WHITAKER, Firmino. Jury. p.45. 406 Jus Libertatis: direito de liberdade. FILARDI LUIZ, Antônio. Dicionário de expressões latinas. p.164. 407 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.188. 408 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.188.

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o bastante. Torna-se fundamental que o magistrado zele pela qualidade da defesa, declarando, se for preciso, indefeso o acusado e nomeando outro advogado para desempenhar a função409.

Importante lembrar neste momento, que sempre, antes de lhe ser

nomeado defensor, lhe será concedido prazo razoável para que indique advogado de sua

confiança410.

O juiz-presidente do Tribunal do Júri, depois da pronúncia, no

momento do recebimento do libelo, o referido magistrado deverá verificar se o acusado possui

defensor constituído nos autos, pois conforme a Lei processual, cabe-lhe prover a falta de

defesa técnica e profissional para os casos do procedimento preparatório do Plenário do

Tribunal do Júri, o mesmo será feito no início da sessão de julgamento411, pois, como observa

José Frederico Marques, “em ambos os casos, necessita o juiz examinar se o réu ainda não

possui defensor, porque este pode ter deixado a causa e não mais encontrar-se prestando

assistência técnico-profissional ao acusado412”.

Sendo assim,

incumbe ao defensor do réu, praticar todos os atos processuais da instância, para exercício dos deveres, direitos e ônus do acusado, salvo aqueles, como o interrogatório, em que a lei exige a participação pessoal deste último. Está a cargo, assim, do advogado do réu, promover a defesa deste, requerendo o que for de seu interesse e participando dos debates do plenário413.

No plenário do Tribunal do Júri, o Advogado defensor deverá

promover a defesa oralmente durante os debates orais, falando após o promotor de justiça,

pelo tempo idêntico de duas horas, caso apenas um acusado sob julgamento; e, de três horas

no caso de se decidir a situação de mais de um acusado414.

Ademais, ressalta Eduardo Espínola Filho,

que a defesa é um ato indispensável à sessão de julgamento sob pena de nulidade, [...] é indiscutível, mas, tal como a acusação, trata-se da defesa encarada do ponto de vista formal, como necessidade de manifestar-se, perante os jurados, o defensor do réu, argumentando com lógica e boa ordem, numa exposição leal, aproveitando, em benefício do defendido, todos

409 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. p.531. 410 Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.188. 411 Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.189. 412 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.189. 413 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.189. 414 Cf. ESPÍNOLA FILHO, Eduardo. Código de processo penal brasileiro anotado. 1.ed. atual. por José Geraldo da Silva; Wilson Lavorenti. Campinas: Bookseller, 2000. v.IV. p.533.

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os elementos constantes do bojo dos autos, ou que se tenham conhecido na própria sessão de julgamento415.

Acerca da verdade perquirida no Tribunal do Júri, não há dúvida de

que o advogado defensor tem íntima relação com esta busca, ademais, conforme Piero

Calamandrei,

o advogado, tal como o artista, pode ter o dom de descobrir e revelar os mais inesperados e os mais secretos aspectos da verdade. Pode por isso dar aos profanos – que não têm idêntica faculdade – a impressão de que os fatos que revela com amorosa fidelidade são de sua invenção, mas o advogado não altera a verdade se consegue tirar dela aqueles elementos mais característicos, que escapam ao vulgo416.

3.2.1.5 O Acusado sob Julgamento pelo Tribunal do Júri

Pelo magistério de Vicente Greco Filho, o “acusado é a pessoa

natural, maior de 18 anos, a que se imputa a prática de uma infração penal417”, o acusado é

sempre pessoa certa, haja vista que a certeza física é indispensável, para José Frederico

Marques a expressão “acusado” somente surgirá a partir da pronúncia, mas o “réu”, ou a

pessoa contra quem se pede alguma coisa, é assim, “o sujeito parcial da instância contra quem

é formulada a pretensão punitiva; para o autor até a pronúncia o réu deve ser chamado de

“imputado”418.

O acusado está cercado de inúmeras garantias, como por exemplo, o

direito de ver respeitada a sua integridade física e moral; de ser processado e julgado pela

autoridade competente; de não ser privado de sua liberdade ou de seus bens sem o devido

processo legal; ao contraditório e a ampla defesa; além de outros, como a plenitude de defesa,

em se tratando do procedimento ora estudado, aliás, uma de suas mais importantes garantias é

justamente o julgamento pelo Tribunal do Júri, ou seja, o julgamento pelos jurados, seus

pares419.

Ademais, isso se dá, porque,

o processo penal é aparelhado de numerosas garantias que têm por finalidade assegurar ao réu o mais amplo direito de defesa, garantias essas que têm por principal fundamento o caráter especialmente relevante da liberdade, bem

415 ESPÍNOLA FILHO, Eduardo. Código de processo penal brasileiro anotado. p.534. 416 CALAMANDREI, Piero. Eles os juízes vistos por nós advogados. Campinas: Editora Minelli, 2003. p.59. 417 GRECO FILHO, Vicente. Manual de processo penal. p.249. 418 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.187. 419 Cf. BONFIM, Edílson Mougenot. Curso de processo penal. pp.356-358.

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jurídico tolhido com a aplicação da pena a que visa com a instauração do processo penal420.

Todavia, conforme magistério de Vicente Greco Filho,

tem o acusado em decorrência do processo, ônus processuais: ônus de comparecer, de ser identificado, [...] o de contrariar a acusação, o de permanecer no distrito da culpa, salvo autorização do juiz [...]. O acusado poderá ser conduzido coercitivamente para atos processuais em que sua presença seja necessária, como por exemplo, o reconhecimento ou acareação421. Preserva-se, porém, o direito constitucional de permanecer calado422.

Conforme leciona José Frederico Marques, o réu não pode ser levado

a julgamento pelo Tribunal do Júri sem que antes transite em julgado a sentença de pronúncia,

como anteriormente tratado, declarando admissível a acusação, sendo com isso, passa ele de

imputado a acusado e deve ser submetido a julgamento em plenário423.

Ainda, segundo referido autor:

Como a acusação só se completa através do oferecimento do libelo, dá-se ao réu uma cópia dessa peça acusatória tão-logo o juiz a receba. E a seguir direito lhe cabe de contrariá-la, bem como o de ‘apresentar o rol de testemunhas que devam depor em plenário, até o máximo de cinco, juntar documentos e requerer diligências’424.

Por fim, José Frederico Marques, leciona que “em plenário, o réu é

interrogado, assiste aos atos de instrução e debates. Por seu defensor, exerce o direito de

recusar jurados, argüir suspeição contra estes, e ainda o de defender-se oralmente e

treplicar425”.

3.2.1.6 Os Jurados

Conforme Firmino Whitaker, o Jurado “é o cidadão incumbido pela

sociedade de declarar se os acusados submetidos a julgamento do Júri são culpados ou

inocentes426”, conforme consta na obra de Edgard Magalhães Noronha, a palavra “Jurado”,

provém do juramento que faziam outrora e ainda hoje, sob a forma de compromisso cívico, 420 BONFIM, Edílson Mougenot. Curso de processo penal. p.356. 421 Acareação: Vide infra, item 3.2.3.1 422 GRECO FILHO, Vicente. Manual de processo penal. p.249. 423 Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.188. 424 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.188. 425 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.188. 426 WHITAKER, Firmino. Jury. p.15.

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são obrigado a fazer os cidadãos ao serem investidos da função julgadora, aqui são referidos

os sorteados para o Conselho de Sentença427.

Acerca da conceituação de “Jurado” prelecionada por Firmino

Whitaker, discorda José Frederico Marques, arrematando que,

nem o jurado se encontra adstrito à função exclusiva de dizer se o acusado é culpado ou inocente nem possui ele mandado da sociedade para exercer as atribuições que lhe são conferidas em lei. O jurado não se limita a responder sobre a inocência ou não do réu, pois também decide sobre os limites e pressupostos da pena a ser imposta a este, nos casos em que o declara culpado. Por outra parte, não há que falar em incumbência da sociedade para o exercício de tais funções, porquanto o Júri não exerce qualquer representação ou mandado do povo428.

Concorda, porém, o autor, com a definição apresentada por Faustin

Hélie, no seguinte sentido: “Os jurados são cidadãos que, não estando revestidos de qualquer

caráter público, são chamados a pronunciar sobre os fatos que motivam a acusação, uma

declaração com base na qual os juízes fazem a aplicação da pena429”.

O jurado é, apenas, órgão leigo, não permanente, do Poder Judiciário, investido por lei, de atribuições jurisdicionais, para integrar juízo colegiado heterogêneo a que se dá o nome de Júri. Essas atribuições estão praticamente limitadas ao pronunciamento do veredicto, – ato decisório com que se compõe o judicium causae e no qual o jurado profere decisão sobre a existência do crime e a autoria imputada ao réu. O jurado, em suma, através do veredicto, decide sobre a existência da imputação, para dizer se houve fato punível, e se o acusado é o seu autor430.

Podem ser Jurados, os cidadãos maiores de vinte e um anos431 e estão

isentos, embora sendo facultada a sua participação, os maiores de sessenta anos; a função de

Jurado é considerada serviço público relevante, além disso, ressaltasse, é essencial à formação

do devido processo legal dos acusado de praticar crimes dolosos contra a vida; natural que

seja uma participação obrigatória, tamanha é a relevância social desta função, e, além disso,

427 NORONHA, Edgard Magalhães. Curso de direito processual penal. p.246. 428 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.87. 429 HÉLIE, Faustin. Traité de l’instruction criminalle. 1867. v.VII. p.83. apud MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.87. 430 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.87. 431 A redução da maioridade civil de 21 para 18 anos não alterou essa exigência de idade mínima, pois cuida-se de exercício de relevante função de interesse do Estado, aliás, a título de exemplo, impõe-se o mesmo para outras atividades judicantes, como é o caso da regra constitucional de que para o cargo de Ministro do Supremo Tribunal Federal é preciso ser maior de 35 anos. Lembra-se ainda o caso dos menores de 21 anos no âmbito do Direito Penal, o qual goza de benefícios, como atenuante e prescrição reduzida pela metade, demonstrando ainda tratar-se de pessoa em formação de personalidade, motivo pelo qual evita-se que assuma compromissos fundamentais, como o de julgar o semelhante. Cf. NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p. 718.

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ainda, constitui presunção de idoneidade moral e assegurará prisão especial, em caso de crime

comum, até a sentença condenatória irrecorrível, bem como preferência em concorrência

pública, em situação de igualdade432.

Além do fator da idade, para servir como Jurado, o cidadão deve ser

pessoa de notória idoneidade, alfabetizado, possuidor de saúde mental e física compatível

com a função, além, é claro, de ser exigido que esteja em pleno gozo de seus direitos políticos

e ser brasileiro433.

E isso, se justifica, conforme Índio Brasileiro Rocha, pela ideologia

que cada jurado deve possuir, ou seja, a sua visão própria da sociedade, e, “é exatamente

porque a justiça no Júri se faz de modo diferente, prevalecendo a decisão de quem não precisa

ter formação jurídica, mas, apenas, bom senso, é que não se pode admitir que quem nele

trabalhe se prive de um mínimo de ideal434”.

Ademais disso, Roberto Lyra, em sua obra selecionou as seguintes

decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal acerca dos jurados:

‘O Júri-juiz de consciência, que está no meio do povo, conhece melhor que ninguém as circusntâncias do fato e as condições dos protagonistas’. ‘O Júri decide por sua livre e natural convicção. Não é o jurado obrigado, como o juiz, a decidir pelas provas do processo, contra os impulsos da consciência. A multiplicidade infinita dos fatos e a necessidade social de uma decisão verdadeira e justa impeliram o legislador a conceder ao jurado a esfera de ação mais ampla’435.

Em seguida, o autor afirma que “o Júri não está adstrito ao alegado e

provado nos autos, nem à estreiteza dos textos, e não seria o Júri se deixa-se de sentir o

conjunto das realidades individuais e sociais436”.

No entanto, na opinião de Cláudio Heleno Fragoso “ninguém pode

esperar que o leigo possa decidir assuntos que lhe são estranhos, especialmente quando

homens hábeis e experimentados usam toda a sua argúcia e experiência para iludi-los437”,

432 Cf. NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. pp.718-721. 433 Cf. NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.719. 434 ROCHA, Índio Brasileiro. Júri: a maneira democrática de se fazer justiça; das emoções, que engrandecem, ao temor que a violência infringe aos jurados. Disponível em <www.amerj.org.br>. Com acesso em: 29 jul. 2007. 435 Supremo Tribunal Federal. Apud LYRA, Roberto. O júri sob todos os aspectos: textos de Ruy Barbosa sobre a teoria e a prática de instituição. Rio de Janeiro: Editora Nacional de Direito, 1950. pp.13-14. 436 LYRA, Roberto. O júri sob todos os aspectos: textos de Ruy Barbosa sobre a teoria e a prática de instituição. p.14. 437 FRAGOSO, Heleno Cláudio. A questão do júri. (versão integral e original do artigo publicado na Revista Forense, n. 193, jan./mar. 1961, pp.20-29). p.13.

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quando afirma que os advogados usam toda sua habilidade retórica para ludibriar os

jurados438.

No contexto da Verdade Real, os jurados são os destinatários da

verdade, formando sua certeza através das provas apresentadas, são eles que irão apreciá-la ao

final e decidir acerca dos fatos, assim como o juiz togado no procedimento comum, aos

jurados as provas no plenário do Júri deverão ser apresentadas, como no caso do

interrogatório, além de ser momento de defesa, os jurados serão o destinatário desta prova,

que positiva ou negativamente os auxiliará na formação da certeza439.

Nesta celeuma, por fim, necessário introduzir afirmação de Cláudio

Heleno Fragoso, o qual assevera que:

É claro, porém, que não serão apenas as questões de direito que deixarão os jurados em dificuldades, mas também as questões técnicas, o que lhes torna praticamente impossível analisar a prova pericial. Questões de criminalística e médicolegais são questões científicas e nelas o jurado leigo jamais poderia orientar-se com segurança440.

3.2.1.6.1 As Perguntas feitas pelos Jurados

Durante o interrogatório do acusado, é permitido aos Jurados fazer

perguntas; esclarecendo suas dúvidas poderão julgar com maior convicção, quanto maior

conhecimento da Verdade Real, maior será a certeza quando da formação de sua convicção,

ademais, leciona ainda Guilherme de Souza Nucci que “são ele os juízes, tanto quanto o

magistrado togado, motivo pelo qual têm direito de fazer perguntas ao réu. Aliás, é melhor

esclarecer alguma dúvida do jurado do que do juiz presidente, uma vez que não é este e sim

aquele a apreciar o mérito da causa441”.

Afirma ainda Júlio Fabbrini Mirabete, que “aos jurados se possibilita

que, por intermédio do presidente, formulem perguntas442”, acordando com este, encontra-se

Francisco do Rêgo Monteiro Rocha443, contudo, não é opinião majoritária, haja vista que

Guilherme de Souza Nucci entende que “a pergunta deve ser feita diretamente pelo jurado ao

438 Cf. FRAGOSO, Heleno Cláudio. A questão do júri. (versão integral e original do artigo publicado na Revista Forense, n. 193, jan./mar. 1961, pp.20-29). p.14. 439 Cf. ROCHA, Francisco de Assis do Rego Monteiro. Curso de direito processual penal. p.695; NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. p.464. 440 FRAGOSO, Heleno Cláudio. A questão do júri. (versão integral e original do artigo publicado na Revista Forense, n. 193, jan./mar. 1961, pp.20-29). p.14. 441 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. p.756. 442 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Código de processo penal interpretado. p.1012. 443 Cf. ROCHA, Francisco de Assis do Rêgo Monteiro. Curso de direito processual penal. p.695.

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réu, alertado aquele, pelo juiz presidente, de que não deve manifestar o seu convencimento,

nem contrariar ou comentar a resposta dada pelo acusado444”.

Da mesma maneira que os jurados possuem a faculdade de inquirir o

acusado durante o seu interrogatório, no ato procedimental da oitiva das testemunhas é

perfeitamente possível que os membros do conselho de sentença perguntem à testemunha445.

Neste caso, porém, leciona Guilherme de Souza Nucci, que “a norma

é clara ao dispor que as partes e os jurados inquirirão as testemunhas, dispensando-se, pois, a

participação do juiz presidente446”, opinião esta em harmonia com o magistério de Fernando

Capez447, Edílson Mougenot Bonfim448 e Júlio Fabbrini Mirabete449.

Contudo importante lembrar que “impõe-se, com alusão às perguntas

a serem feitas pelos jurados, a advertência preliminar aos mesmos, de que não deverão deixar

transparecer a intenção de voto porventura já formada em suas consciências450”, “pois, têm o

dever da imparcialidade451”.

3.2.2 INTERROGATÓRIO DO ACUSADO

Conforme José Frederico Marques, “é esse o primeiro ato instrutório

que se pratica em plenário, pois que se realiza após o compromisso do conselho de

sentença452”, sendo que “é uma das peças mais importantes de um procedimento criminal453”

e ainda, segundo Firmino Whitaker, “no Júri é formalidade essencial454”, constituindo

momento fundamental para a autodefesa do acusado, sendo ato personalíssimo deste, quando

poderá esclarecer para o conselho de sentença as ocorrências, alegar a sua versão acerca dos

fatos colocando à baila sua variante da verdade acerca dos acontecimentos455.

José Frederico Marques, em obra diversa, afirma que nesse ato

processual,

444 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. p.756; MIRABETE, Júlio Fabbrini. Código de processo penal interpretado. pp.1013-1014. 445 Cf. NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. p.758. 446 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. p.756 447 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. p. 655. 448 BONFIM, Edílson Mougenot. Curso de processo penal. p.480. 449 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Código de processo penal interpretado. p.1014. 450 TUBENCHLAK, James. Tribunal do júri: contradições e soluções. p.104. 451 MALCHER, José Lisboa da Gama. Manual de processo penal brasileiro. p.454. 452 MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. v.III. p.256. 453 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.287. 454 WHITAKER, Firmino. Jury. p.84. 455 Cf. WHITAKER, Firmino. Jury. p.84.

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a defesa encontra um de seus mais eficazes instrumentos de manifestação, ao mesmo passo que a pesquisa da verdade pode ali haurir elementos seguros de convicção para o julgador. No plenário de julgamento do Júri, de redobrada importância é o interrogatório do réu, visto que se realiza coram

iudicem, isto é, perante os sete cidadãos em cujo veredicto irá consubstanciar-se a decisão quanto à acusação que pesa sobre o interrogado456.

Conforme Francisco de Assis do Rêgo Monteiro Rocha, “o

interrogatório é ato exclusivo do juiz, dele não participando a defesa, nem a acusação, salvo

para observar ao juiz, o descumprimento das normas legais, ou apontar algum excesso ou

abuso de poder457”.

Referido autor leciona ainda que “deve o juiz procurar desvendar a

verdade, não desconhecendo, por certo, que isso não interessa, quase sempre, ao réu458”.

3.2.3 REALIZAÇÃO DE PROVAS EM PLENÁRIO

Conforme Guilherme de Souza Nucci, as provas realizadas no

Plenário do Tribunal do Júri são provas testemunhais459. Ademais, leciona José Frederico

Marques que a instrução em plenário não pode ficar adstrita à análise de elementos

probatórios já constantes nos autos, sendo que, com isso, é permitida às partes a oitiva de

testemunhas, desde que arroladas pela acusação no libelo e pela defesa na contrariedade deste,

no máximo cinco para cada parte, além é claro, das testemunhas arroladas ex officio, pelo juiz

presidente460.

3.2.3.1 Oitivas das Testemunhas

Primeiramente, pertinente é observar o fundamento da prova

testemunhal, colocado à baila por Fernando da Costa Tourinho Filho:

A prova testemunhal, sobretudo no Processo Penal, é de valor extraordinário, pois, dificilmente, e só em hipóteses excepcionais, provam-se as infrações com outros elementos de prova. Em geral, as infrações penais só podem ser provadas, em juízo, por pessoas que assistiram ao fato ou dele tiveram

456 MARQUES, José Frederico. O júri no direito brasileiro. p.251. 457 ROCHA, Francisco de Assis do Rêgo Monteiro. Curso de direito processual penal. p.693. 458 ROCHA, Francisco de Assis do Rêgo Monteiro. Curso de direito processual penal. p.693. 459 Cf. NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal p.734. 460 Cf. MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. v.III. p.258; RANGEL, Paulo. Direito processual penal. p.573; MARQUES, José Frederico. A instituição do Júri. p.284.

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conhecimento. Assim, a prova testemunhal é uma necessidade, e neste, reside seu fundamento461.

Porém referido autor, ressalta a seguir, que “sem embargo de, com

freqüência, a prova testemunhal ser uma necessidade, não se segue seja absoluto seu valor

probatório. Como toda e qualquer prova, a testemunhal é relativa462”.

Quanto à ordem da oitiva em plenário, segundo José Frederico

Marques, “a testemunha ou testemunhas arroladas de ofício pelo Presidente do Tribunal do

Júri serão ouvidas antes das de acusação463”, em seguida são ouvidas as testemunhas arroladas

no libelo pela acusação, e, posteriormente aquelas arroladas na contrariedade do libelo pela

defesa464, e, além disso, “deve ser garantida às partes e aos jurados a oportunidade de

realizarem as reperguntas desejadas diretamente à testemunha465”, devendo nesta hora, o juiz

presidente fiscalizar as perguntas realizadas, indeferindo aquelas que julgar impertinentes,

irrelevantes ou abusivas466.

Ainda, observação Guilherme de Souza Nucci:

É importante lembrar que, antes da sessão ter início, pode a parte que arrolou a testemunha desistir livremente da sua inquirição. Depois de iniciados os trabalhos, a testemunha passa a ser do Tribunal do Júri, necessitando, pois, da concordância de todos para que seja dispensada, inclusive do juiz presidente – que pode ouvi-las como testemunha de juízo. Assim, caso o promotor queira desistir da inquirição de alguém, pouco antes de iniciar a fase de colheita dos depoimentos, deve o juiz consultar a defesa e os jurados. Somente após obter o aval de todos, acolherá a desistência, dispensando a testemunha467.

3.2.3.2 Declarações de Peritos no Plenário do Tribunal do Júri

Os peritos, pela complexidade técnica que envolve o seu trabalho, em

nome do Princípio da Verdade Real, devem sempre que requisitados comparecer em Plenário

para prestar esclarecimentos.

Conforme ressalta José Frederico Marques,

461 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. v.3. p.297. 462 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. v.3. p.297. 463 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.294. 464 Cf. CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. p.655. 465 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.734. 466 Cf. NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.734. 467 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.734.

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Não fala o Código de Processo Penal em esclarecimentos de peritos perante o Tribunal do Júri. Parece-nos evidente, no entanto, em face dos princípios que regem a instrução e as provas em nosso processo penal, que tanto a acusação quanto a defesa podem pedir a presença dos peritos no plenário e ali ouvi-los sobre o laudo468.

Nessa passagem, notoriamente o autor se refere ao Princípio da

Verdade Real, segundo o qual, “descobrir a verdade é meio e modo de comprovação da exata

situação concreta em que deve incidir a norma penal a ser jurisdicionalmente aplicada469”,

além do Princípio da Oralidade470, inerente no contexto das provas em plenário do Tribunal

do Júri471.

Ademais, “as partes podem requerer a produção de prova pericial, mas

no libelo ou na contrariedade. Os peritos que nela funcionaram podem, também, prestar

esclarecimentos em plenário472”.

3.2.3.3 Acareações no plenário do Tribunal do Júri

Afirma Ary Azevedo Franco, que “determina a lei a providência da

acareação das testemunhas, quando divergirem sobre pontos essenciais da causa, acareação

que poderá ser ordenada pelo Juiz Presidente, ex-officio473, ou a requerimento das partes, ou

de qualquer dos jurados474”.

Leciona Guilherme de Souza Nucci, que Acareação,

é o ato processual, presidido pelo juiz, que coloca frente a frente depoentes, confrontando e comparando declarações contraditórias ou divergentes, no processo, visando a busca da verdade real. [...] Valor da acareação: teoricamente é um meio de prova dos mais promissores, uma vez que serviria para contornar as mais intrincadas contradições entre testemunhas, entre estas e vítima, enfim, possibilita o reequilíbrio das provas colhidas em autêntica desarmonia, permitindo o correto deslinde da causa475.

O autor ainda sustenta que “em homenagem à busca da verdade real,

possa haver acareação entre quaisquer pessoas envolvidas no julgamento, tal como disposto

468 MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. v.III. p.259. 469 MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. v.I. p.63. 470 Princípio da Oralidade: “deve haver a predominância da palavra falada (depoimentos, debates, alegações)”. CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. p.312. 471 Cf. CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. p.312. 472 MARQUES, José Frederico. A Instituição do júri. p. 284. 473 Ex Officio: “Por obrigação; por dever do cargo; sem a provocação das partes [...]”. Filardi Luiz, Antônio. Dicionário de expressões latinas. p.110. 474 FRANCO, Ary Azevedo. Código de processo penal. v.2. p.114. 475 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. p.478.

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no art. 229, caput [do Código de Processo Penal]476,477”, contudo sustenta Joaquim Cabral

Netto que as acareações devem ser realizadas apenas entre as testemunhas no Tribunal do

Júri, em atenção à literalidade da norma contida no artigo 470 do Código de Processo

Penal478,479.

3.3 DEBATES ORAIS

Após o final da inquirição das testemunhas, são iniciados os debates,

falando primeiro a acusação, por seu promotor de justiça, que deverá ler o libelo, desde a sua

parte introdutória até a parte final onde constam os dispositivos penais em que o acusado se

achar incurso; em seguida o advogado promoverá a defesa, sempre em favor do acusado480;

“todavia, se a ação foi promovida pelo ofendido, é este quem primeiro acusará, seguindo-se,

depois, pelo Ministério público481”, “quando houver assistente (que nada mais é do que o

auxiliar da acusação pública, representada pelo promotor), falará ele sempre depois do

promotor482”.

Conforme Antônio Bento de Faria, “o debate é a discussão entre a

acusação e a defesa sobre a responsabilidade do réu, com fundamento no exame e valor das

provas apreciadas. É a instrução oral, que completa e valoriza o resultado da instrução

anterior483”.

Observa José Frederico Marques, que o julgamento pelo Tribunal do

Júri deve obedecer primordialmente ao Princípio da Oralidade484, pois, como leciona Edgard

Magalhães Noronha, “não há dúvida de que o Júri é para os que se sabem exprimir por meio

da palavra485”, sendo que “a oralidade no procedimento é o sistema segundo o qual as

declarações frente aos juízes e tribunais só possuem eficácia através da palavra oral486”,

porém com afirma Cláudio Heleno Fragoso, “a oralidade, entre nós, é apenas do debate feito

476 Código de Processo Penal, Artigo 229, caput: “A acareação será admitida entre acusados, entre acusado e testemunha, entre testemunhas, entre acusado ou testemunha e a pessoa ofendida, e entre as pessoas ofendidas, sempre que divergirem, em suas declarações, sobre fatos ou circunstâncias relevantes”. 477 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. p.759. 478 Código de Processo Penal, Artigo 470: “Quando duas ou mais testemunhas divergirem sobre pontos essenciais da causa [...]”. 479 CABRAL NETTO, Joaquim. Instituições de processo penal. Belo Horizonte: Editora Del Rey, 1997. p.154. 480 Cf. NORONHA, Edgard Magalhães. Curso de direito processual penal. p.274. 481 NORONHA, Edgard Magalhães. Curso de direito processual penal. pp.274-275. 482 FRANCO, Ary Azevedo. Código de processo penal. v.2. p.115. 483 FARIA, Antônio Bento de. Apud FRANCO, Ary Azevedo. Código de processo penal. v.2. p.116. 484 Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.43. 485 NORONHA, Edgard Magalhães. Curso de direito processual penal. p.275. 486 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.43.

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pelas partes, o qual é necessariamente tendencioso, visando cada um à vitória de sua

causa487”, haja vista que “saber argumentar de fato e de direito é o primeiro requisito para o

orador do Júri488”.

Ademais, dentre os inúmeros princípios que estão intimamente

relacionados com a oralidade no Tribunal do Júri, necessário destacar os seguintes:

Concentração, Imediação e Identidade Física do Juiz, conforme destaca José Frederico

Marques489.

A concentração consiste em apertar o feito em um período breve, reproduzindo-o a uma só audiência ou a poucas audiências a curtos intervalos, pois quanto mais próximos da decisão do juiz são os movimentos processuais, tanto menor é o perigo do desaparecimento das impressões pessoais e dos fatos que a memória registra. A concentração existente no plenário do Júri supera a dos demais procedimentos. [...] A imediatidade consiste em obrigar o juiz a ficar em contato direto com as partes e as provas, recebendo assim, também de maneira direta o material e elementos de convicção em que se baseia o julgamento. Ela não se confunde com a oralidade, visto que pode coexistir com o procedimento escrito. Intimamente ligado ao Princípio, como corolário deste, é a regra da identidade física do juiz, pois de outra forma a imediatidade estaria praticamente frustrada490.

Da mesma maneira que a oralidade se atine ao Tribunal do Júri, o

Princípio da Publicidade a ele também é atribuído, consistindo que “público é o ato

processual, ou audiência e sessão em que a série de atos são praticados, de maneira que todos

possam assistir491”.

O Tribunal do Júri, no Processo Penal, conforme José Frederico

Marques, “deveria obedecer a mais ampla oralidade. Infelizmente, o que se possui desta é tão

só o torneio dialético da acusação e defesa492”.

Isso se dá, na visão de David Borensztajn, porque “o que se busca é a

vitória, como se o plenário fosse um campo esportivo ou um teatro, onde advogados e

acusadores estivessem desempenhando um papel, à custa do réu e da vítima493”, porém

ressalta a seguir que “se a causa da justiça é a verdade, tal procedimento, que é a base de todas

487 FRAGOSO, Heleno Cláudio. A questão do júri. (versão integral e original do artigo publicado na Revista Forense, n. 193, jan./mar. 1961, pp.20-29). p.12. 488 NORONHA, Edgard Magalhães. Curso de direito processual penal. p.275. 489 Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.44. 490 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.44. 491 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.44. 492 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.45. 493 BORENSZTAJN, David. Notas e comentários (criminal). A busca da verdade no Tribunal do Júri. Revista dos tribunais. p.421.

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as críticas ao tribunal popular, não pode prosperar494”, isso porque Heleno Cláudio Fragoso,

por exemplo, já havia dito que “o debate das partes é necessariamente tendencioso, visando

cada uma a vistoria de sua causa495”, segundo este último o Tribunal do Júri, sendo composto

por leigos, e por conseqüência disso, decidiria mal496.

Segundo David Borensztajn,

a tendenciosidade, denunciada por muitos e sentida por quase todos, no plenário, não tem necessariamente de existir bastando – para coibir tal prática e, portanto, buscar-se a verdade real – aplicar-se o artigo 497, com seus ns. III, IV, X e XI do CPP497. [...] se a lei processual penal pátria diz que dentre as atribuições do presidente do Tribunal do Júri estão a de regular os debates, resolver questões incidentes que não dependam da decisão do Júri, resolver as questões de direito que se apresentem no decurso do julgamento e ordenar, de ofício ou a requerimento das partes ou de qualquer jurado, as diligências destinadas a sanar qualquer nulidade, ou a suprir falta que prejudique o esclarecimento da verdade, então vemos que o juiz togado pode e deve interferir nos debates – imparcialmente é evidente – para impedir que haja uma flagrante deturpação do que dos autos conste, bem como do que diz a lei498.

David Borensztajm, ao analisar os comentários acerca da matéria, por

Edgard Magalhães Noronha e Ary Azevedo Franco, já citados nesta monografia, afirma que,

Os comentaristas, [...] sempre foram mais preocupados com o que chamam de torneios de eloqüência, e [...] com ataques pessoais, sejam estes às partes ou ao réu, esquecendo o que, a nosso ver, é o mais grave: a mentira fria, proposital, calculada e deliberada, com o fim de criar no espírito dos jurados se não um outro quadro dos fatos, ao menos a dúvida razoável, que evidentemente, levaria o resultado do julgamento a um desfecho diverso499.

Cláudio Heleno Fragoso, neste sentido, se expressa asseverando o

seguinte:

Os advogados, no Júri, tudo fazem para induzir os jurados a superestimar detalhes de somenos e emprestando máxima relevância a fatos secundários, que beneficiam o réu. Conforme seu maior ou menor talento nesse torneio, muitas vezes atingem o fim colimado. É impressionante comparar a defesa

494 BORENSZTAJN, David. Notas e comentários (criminal). A busca da verdade no Tribunal do Júri. Revista dos tribunais. p.421. 495 FRAGOSO, Heleno Cláudio. A questão do júri. (versão integral e original do artigo publicado na Revista Forense, n. 193, jan./mar. 1961, pp.20-29). p.12. 496 Cf. FRAGOSO, Heleno Cláudio. A questão do júri. (versão integral e original do artigo publicado na Revista Forense, n. 193, jan./mar. 1961, pp.20-29). p.13. 497 A respeito deste dispositivo legal vide item 3.2.1.1 supra. 498 BORENSZTAJN, David. Notas e comentários (criminal). A busca da verdade no Tribunal do Júri. Revista dos tribunais. p.421. 499 BORENSZTAJN, David. Notas e comentários (criminal). A busca da verdade no Tribunal do Júri. Revista dos tribunais. p.422.

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que é feita perante o Júri, com a que se faz ante o juiz togado. No Júri todos os recursos são lícitos, desde que sirvam para convencer os jurados. [...] O próprio juiz togado, após a atuação de hábeis advogados, tem, muitas vezes, dificuldades no exame da prova, e na busca da verdade500.

Diante de situação que possa causar dúvida, conforme David

Borensztajn,

o jurado tem, pela lei, direito ao esclarecimento, ou seja, perguntar ao juiz-presidente sobre fatos citados pelas partes, buscando melhor compreensão sobre pontos obscuros. Ora, a prática nos demonstra que o jurado, geralmente leigo e pouco afeito a falar em público, tem uma natural tendência a não se manifestar, com justo receio de estar interrompendo, indevidamente, o discurso da parte501.

Ademais, para finalizar, mister é citar o magistério de Edgard

Magalhães Noronha, o qual afirma que, no Tribunal do Júri,

o que deve predominar na oração de qualquer das partes é a honestidade, a fidelidade aos autos, pois nenhuma delas pode esquecer que a outra está ali fiscalizando-a com os apartes502, a réplica e a tréplica; não deve olvidar que o próprio jurado poderá pedir que ela indique a página dos autos onde se encontra a peça lida ou citada, enfim, deve estar cônscia de que é objeto de fiscalização no plenário e que seu comportamento oratório pode comprometer-lhe decisivamente a pretensão503.

E isso se dá porque “perante o conselho de sentença esclarecido, não

terão grande efeito as palavras bonitas, porém ocas, vazias de conteúdo e distantes dos

autos504”, como leciona Edgard Magalhães Noronha; além disso, referido autor afirma que o

orador é completo no momento em que se juntam a elegância e precisão no falar, o poder de

análise probatória e a cultura jurídica, mas além da erudição mister é que jamais distancie a

500 FRAGOSO, Heleno Cláudio. A questão do júri. (versão integral e original do artigo publicado na Revista Forense, n. 193, jan./mar. 1961, pp.20-29). p.15. 501 BORENSZTAJN, David. Notas e comentários (criminal). A busca da verdade no Tribunal do Júri. Revista dos tribunais. p.422. 502 Aparte: trata-se da intervenção da acusação durante a manifestação da defesa, ou a interferência desta na fala do promotor; pela singela leitura da lei, a impressão primeira que se tem é de não haver possibilidade de concessão de apartes. Primeiramente, fala a acusação e, somente depois, manifesta-se a defesa. Não há norma que se refira aos apartes, embora, por força da tradição, esteja esse direito incorporado ao Júri. Deve a parte conceder apartes, quando solicitada pela contrária, sob pena de poder haver a intervenção do juiz presidente, concedendo momento de interferência, para que se faça algum comentário importante, referente ao tema desenvolvido por aquele que está falando. O aparte é esclarecedor e ilustra o jurado, quando bem feito e sem abuso. Cf. NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.738. 503 NORONHA, Edgard Magalhães. Curso de direito processual penal. p.275. 504 NORONHA, Edgard Magalhães. Curso de direito processual penal. p.275.

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argumentação dos autos do processo, pois o Júri medianamente esclarecido de imediato se

dará conta deste desvio505.

Segundo Eduardo Espínola Filho,

o ardor, o fogo da discussão, não deve levar o orador nunca até à indelicadeza, ao ataque pessoal e, muito menos à agressão e à ofensa, contra o adversário, é um ponto de ética profissional, na observância do qual o escrúpulo tem de ir mesmo ao exagero, sendo penoso e degradante ver um promotor e um advogado chegarem a ponto de cortar relações, em conseqüência da forma desairosa e deselegante, por que, nos debates, investiram um contra o outro506.

Referido autor ainda ressalta que “igualmente, não se justificam, nem

se podem perdoar as injúrias dirigidas quer ao réu, quer ao ofendido507”; e continua em sua

explicação afirmando que “por muito haja o que reprovar no passado de um ou de outro, são

dignos de respeito, em razão da grande desgraça em que se viram colocados, por motivo do

crime em exame508”.

3.3.1 ACUSAÇÃO

Primeiramente nesta fase dos debates orais irá falar o acusador, e

tratando-se de ação penal pública, será o órgão do Ministério Público, por seu Promotor de

Justiça, que procederá na acusação; deverá ler o libelo, na sua totalidade, indicando os

dispositivos legais em que o acusado se achar incurso, em seguida, fará a sustentação oral509.

De acordo com José Frederico Marques, “acusar, no plenário, é expor

oralmente a pretensão deduzida no libelo e aduzir argumentos que lhe demonstrem

procedência510”.

Em atenção ao magistério de Eduardo Espínola Filho, nos debates a

acusação é a primeira etapa, consistindo na “exposição oral, em que se procura demonstrar ao

Júri a existência material do crime, desenvolvendo o esclarecimento dos elementos de prova e

articulando-os para demonstrar a procedência do libelo acusatório511”.

Conforme Firmino Whitaker, a acusação do promotor,

505 Cf. NORONHA, Edgard Magalhães. Curso de direito processual penal. p.274. 506 ESPÍNOLA FILHO, Eduardo. Código de processo penal brasileiro anotado. v.IV. p.518. 507 ESPÍNOLA FILHO, Eduardo. Código de processo penal brasileiro anotado. v.IV. p.518. 508 ESPÍNOLA FILHO, Eduardo. Código de processo penal brasileiro anotado. v.IV. p.518. 509 Cf. MALCHER, José Lisboa da Gama. Manual de processo penal brasileiro. p.455. 510 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.302. 511 ESPÍNOLA FILHO, Eduardo. Código de processo penal brasileiro anotado. v.IV. p.528.

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deve revestir-se da mais alta imparcialidade. A sociedade pede a condenação em nome da ordem pública sobressaltada com o proceder criminoso de um de seus membros, mas não é motivada por sentimentos de ódio, paixão e vingança. Quando seu representante, abandonando a verdade e a lógica, socorre-se, para vencer, dos artifícios da palavra e vícios de argumentação, amesquinha o mandato, [...] porque, se, nos debates, o réu demonstrar à evidência sua inocência ou seu direito, o promotor, pela dignidade do cargo, deve considerar-se vencido, confessando lealmente a impotência da acusação512.

Guilherme de Souza Nucci trás à baila assunto do qual não se pode

ausentar-se, afirmando que, “respeitada a fiel exposição das provas, para preservar a soberania

dos jurados, pode o representante do ministério público pedir a absolvição do réu513”, até

porque, como leciona Firmino Whitaker, “a causa da justiça, porém, é a verdade; a

condenação do inocente consiste maior desgraça para a sociedade do que para o

condenado514”, até mesmo porque, o Ministério Público é “um órgão do Estado, destinado a

obter, não a condenação do acusado, sempre e em qualquer caso, mas uma sentença, que

traduza a reafirmação do Princípio de justiça violado pelo fato anti-social do indivíduo515”.

Contudo, em sentido contrário, Inocêncio Borges da Rosa, afirma que

o promotor público, no plenário do Tribunal do Júri, não pode desistir da palavra, ou seja, da

acusação, tampouco pedir a absolvição516; no mesmo sentido, José Frederico Marques: “se o

promotor é obrigado a apresentar o libelo-crime acusatório depois da pronúncia do réu,

ficando sujeito a pena disciplinar se faltar à obrigação de apresentá-lo, como admitir-se que

possa ele deixar de acusar em plenário?517”, em seguida afirma que “a acusação, no

julgamento do Júri, é ato indeclinável518”, tal impossibilidade se dá, conforme o argumento do

autor, pela literalidade do Artigo 564, Inciso III, Alínea “l”519, do Código de Processo Penal,

pois, a falta da acusação acarretaria a nulidade520 do julgamento pelo Tribunal do Júri.

Dito isso, em favor da possibilidade do promotor de justiça pedir pela

absolvição do acusado em plenário, esclarece Espínola filho, ao salientar que,

512 WHITAKER, Firmino. Jury. p.93. 513 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.736. 514 WHITAKER, Firmino. Jury. p.93. 515 ESPÍNOLA FILHO, Eduardo. Código de processo penal brasileiro anotado. v.IV. p.521. 516 Cf. ROSA, Inocêncio Borges da. Comentários ao código de processo penal. v.III. p.114. 517 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.186. 518 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.186. 519 Código de Processo Penal, Artigo 564 caput, Inciso III, Alínea “l”: “A nulidade ocorrerá nos seguintes casos: [...] III - por falta das fórmulas ou dos termos seguintes: l) acusação e a defesa, na sessão de julgamento”. 520 Nulidade: “é o vício, que impregna determinado ato processual, praticado sem a observância da forma prevista em lei, podendo levar à sua inutilidade e conseqüente renovação”. NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. p.859.; ou, é “uma sanção que, no processo, é de ser o ato considerado como não realizado”. MIRABETE, Júlio Fabbrini. Código de processo penal interpretado. p.1165.

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assume o Ministério Público, que se movimenta por intermédio de um dos seus órgãos, o papel acusador, e, como tal, se torna o sujeito ativo da ação penal; mas, constituindo-se parte na ação penal, só o é, entretanto, em aspecto formal, não perdendo o seu caráter de órgão do Poder Público, cujo interesse é unicamente a apuração rigorosa da verdade e a punição apenas do culpado521.

Afirma ainda que o órgão acusador por excelência, pode com total

liberdade, deixar de pedir pela condenação do acusado522, e “até mesmo opinar pela sua

absolvição, quando verifique não lhe ter sido devidamente imputada a autoria, ou haver

motivos excluindo-lhe a responsabilidade523, a criminalidade524 ou a punibilidade525,526”.

Júlio Fabbrini Mirabete, esclarece que “quanto a acusação, o que

acarreta a nulidade é a falta de manifestação do Ministério Público [...], já que aquele pode

manifestar-se inclusive pela absolvição , como se deduz do artigo 385527 [do Código de

Processo Penal]528”.

3.3.2 ASISTENTE DE ACUSAÇÃO

Firmino Whitaker afirma que “a presença de um acusador particular é

sempre desagradável, por demonstrar represália incompatível com o fim da pena529”, continua

a seguir afirmando que, “como, porém, é permitida, deve ser regulada de modo que a

discussão se limite aos fatos, sem a ofensa ao réu, que deve merecer o respeito de sua própria

desgraça530”.

Assim como o promotor de justiça, “se não quiser comprometer sua

acusação, não deverá nunca ofender o acusado. A regra há de ser evitar os qualificativos e

521 ESPÍNOLA FILHO, Eduardo. Código de processo penal brasileiro anotado. v.IV. pp.521-522. 522 Cf. ESPÍNOLA FILHO, Eduardo. Código de processo penal brasileiro anotado. v.IV. p.522. 523 Excludente de Responsabilidade, ou Culpabilidade: é a falta de aptidão do agente para ser punido por seus atos, por exemplo: desenvolvimento mental incompleto, doença mental. Cf. Capez, Fernando. Curso de direito penal: parte geral. p.290. 524 Excludentes de Criminalidade, ou de Ilicitude: Situações em que se deixa de considerar a conduta praticada pelo agente como crime; por exemplo: a legítima defesa e o estado de necessidade. Cf. CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral. pp.251-253. 525 Excludente de Punibilidade: “são aquelas que extinguem o direito de punir do estado”, por exemplo: com a morte do agente, ou com a retratação, nos casos permitidos por lei. Cf. CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral. p.510. 526 ESPÍNOLA FILHO, Eduardo. Código de processo penal brasileiro anotado. v.IV. p.522. 527 Código de Processo Penal: Artigo 385: “Nos crimes de ação pública, o juiz poderá proferir sentença condenatória, ainda que o Ministério Público tenha opinado pela absolvição, bem como reconhecer agravantes, embora nenhuma tenha sido alegada”. 528 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Código de processo penal interpretado. p.1174. 529 WHITAKER, Firmino. Jury. p.94. 530 WHITAKER, Firmino. Jury. p.94.

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apontar os fatos; estes sim em toda a sua pujança e com toda a eloqüência531”. Competindo

também ao promotor nesta hora,

quando houver auxiliar da acusação, recomendar-lhe que não se exceda nas objurgatórias ao réu, porque a verdade é que são quase sempre advogados os mais agressivos na acusação, já por lhes faltar o hábito dessa tribuna, havendo-se acostumado com a amplitude da defesa, já porque estando a par do que se passa no lar da vítima, deixam-se freqüentemente levar pela indignação, que, entretanto, pode ser contraproducente532.

Ainda, conforme Guilherme de Souza Nucci,

A manifestação do assistente de acusação, se houver, deve ser garantida pelo juiz presidente, caso não haja acordo com o Ministério Público. Não se trata de mera concessão do promotor, mas de direito da vítima de, através de seu procurador, falar. Assim, o ideal é entrarem em acordo – promotor e assistente –, comunicando ao juiz como dividirão o tempo. Não sendo assim, o juiz presidente, conforme seu prudente critério, promove a divisão do tempo destinado a cada um, normalmente em iguais partes533.

3.3.3 DEFESA

Firmino Whitaker afirma consistir “a defesa em patentear, com os

fatos e a lei, a irresponsabilidade do réu, o direito que ele exerceu ou a existência de

circunstâncias que o favorecem534”, segundo o autor, “é direito natural, não havendo

necessidade de lei escrita, para ser exercida535”, e, conforme leciona José Frederico Marques,

“a defesa, no Júri, consiste em contrariar o réu, por seu advogado, oralmente, a pretensão

punitiva do acusador536”.

É do entendimento de Firmino Whitaker que:

Não é direito exclusivo do acusado. A sociedade só quer justiça; e esta seria substituída pela opressão, se a defesa não fosse exercida ampla e livremente. Todos os meios que visam prevenir erros judiciários (a defesa é um deles), tanto interessam ao acusado, como à sociedade. Daí estas conseqüências que já notamos: o direito de defesa não pode ser renunciado537.

531 NORONHA, Edgard Magalhães. Curso de direito processual penal. p.275. 532 NORONHA, Edgard Magalhães. Curso de direito processual penal. p.275. 533 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.738. 534 WHITAKER, Firmino. Jury. p.96. 535 WHITAKER, Firmino. Jury. p.96. 536 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.302. 537 WHITAKER, Firmino. Jury. p.96.

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Firmino Whitaker ainda leciona que,

a defesa deve ser calma, imparcial, moderada e séria. No Júri não devem entrar os sentimentos de ódio e vingança. As alegações devem ser expostas com clareza, lealdade e lógica, baseando-se em provas convincentes. A verdade não precisa dos artifícios da palavra, nem da astúcia que a rabulice538 geralmente emprega539.

Dito isso, Guilherme de Souza Nucci admite a possibilidade, em

determinadas situações, de o defensor solicitar a condenação540, devendo-se destacar que “há

pedidos de absolvição tão frágeis e dissociados da prova colhida, que terminam por levar os

jurados a desacreditar, completamente, a argumentação defensiva541“.

Esclarece o autor que:

Conforme o caso, pedir pura e simplesmente a absolvição pode favorecer a acusação, pois o Conselho de Sentença não mais dá crédito à palavra do defensor. Imagine-se o réu confesso em todas as fases, inclusive no plenário, diante dos jurados. De que adiantaria ao defensor negar a autoria? Faria um papel distanciado da realidade, salvo se tiver bons motivos para acreditar que se trata de uma confissão falsa. Não sendo assim, o melhor é partir para outras teses, visando à absolvição pelo reconhecimento de alguma excludente de ilicitude ou culpabilidade, ou mesmo tendo por finalidade o reconhecimento de algum privilégio ou, ainda, o afastamento de qualificadora542.

Lembra ainda referido autor, que “não deixa de ser ampla a defesa que

busca o melhor para o réu, dentro do possível e do razoável543”.

Contudo, Inocêncio Borges da Rosa, que também é contrário à

possibilidade do pedido de absolvição pelo Ministério Público, como já mencionado, entende

neste caso, que o defensor do acusado jamais poderá pedir a condenação de seu constituinte,

nem mesmo a aplicação da pena mínima para o caso544.

Referido autor assim se manifesta:

A defesa, pedindo a condenação, nivela-se à acusação pedindo a absolvição. Quer num, quer noutro caso, o órgão destoa, aberra da sua função. O Direito Judiciário Penal criou a acusação para sustentar a culpabilidade dos réus, e,

538 Rábula: “advogado de poucos conhecimentos, que usa de recursos pouco convencionais em juízo”. LUZ, Valdemar P. da. Manual do advogado. 19.ed. rev. e atual. Florianópolis: OAB/SC Editora, 2006. p.642. 539 WHITAKER, Firmino. Jury. pp.96-97. 540 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.736. 541 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. pp.736-737. 542 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.737. 543 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.737. 544 Cf. ROSA, Inocêncio Borges da. Comentários ao código de processo penal. v.III. p.121.

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em conseqüência, pedir a sua condenação; [...] estabeleceu a defesa para sustentar a inocência dos réus e, em conseqüência, pedir a sua absolvição545.

José Frederico Marques, uma vez que nega a possibilidade do

Ministério Público pedir pela absolvição do acusado, não destoaria da opinião de Inocêncio

Borges da Rosa, afirmando que como a falta de acusação é causa de nulidade na sessão de

julgamento, nos termos legais, como a defesa faz parte da mesma previsão legal, natural que

ocorra nulidade a sua falta546.

Contudo, Júlio Fabbrini Mirabete esclarece que o que gera a nulidade

é a falta de defesa satisfatória ao acusado547, afirmando que o que se pressupõe como

indeclinável é a “manifestação em favor do acusado, ainda que para pleitear, conforme as

circunstâncias, apenas o reconhecimento de causas de diminuição de pena ou de atenuantes. A

ausência de defesa, formal ou de fundo, é que causa a nulidade548”.

3.3.4 RÉPLICA E TRÉPLICA

Depois de terminados os debates orais pelas partes, a acusação poderá

replicar os argumentos da defesa, posteriormente, a defesa terá então a palavra para treplicar

os argumentos sustentados pela acusação na réplica549, “a réplica é um complemento da

acusação, assim como a tréplica é um complemento da defesa, é uma decorrência da regra de

que o acusado sempre fala em último lugar550”, ainda, conforme Antônio Pimenta Bueno, “a

réplica é a contestação da contrariedade do réu, e a sustentação do libelo; a tréplica tem por

objeto contestar a réplica e o libelo, e sustentar a contrariedade551”, lembra ainda, Firmino

Whitaker que a tréplica é a “resposta que a defesa dá a réplica, é a consagração do princípio

de que a palavra do acusado deve ser a última, em toda discussão552”.

Importante salientar que a tréplica somente será exercida no caso do

uso efetivo da réplica por parte da acusação, no caso negativo, cessam os debates553.

Neste momento do procedimento do plenário do Tribunal do Júri

existe a possibilidade de serem reinquiridas testemunhas já ouvidas anteriormente na fase

545 ROSA, Inocêncio Borges da. Comentários ao código de processo penal. v.III. p.121. 546 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.191. 547 Cf. MIRABETE, Júlio Fabbrini. Código de processo penal interpretado. p.1174. 548 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Código de processo penal interpretado. p.1174. 549 Cf. FRANCO, Ary Azevedo. Código de processo penal. v.2. p.115. 550 MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.302. 551 BUENO, Antônio Pimenta. Apud MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. p.302. 552 WHITAKER, Firmino. Jury. p.98. 553 Cf. NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.738.

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pertinente554, para isso, no entanto, “é fundamental que elas estejam aguardando e não tenham

sido dispensadas. Aliás, é esse o motivo pelo qual, quando cada testemunha termina seu

depoimento, o juiz consulta as partes e os jurados se dispensam a pessoa, para que possa ir

embora555”; ressalta ainda Ary Azevedo Franco, que “essa reinquirição poderá ser feita a

requerimento de qualquer das partes, de qualquer dos jurados e por determinação, ex-offico,

do juiz presidente556”.

Guilherme de Souza Nucci, afirma ainda que,

essa nova inquirição deve ser feita dentro do tempo da parte que assim deseje. Do contrário, o interessado poderia abusar, aumentando consideravelmente o seu tempo de manifestação. Além dos 30 minutos para a tréplica, poderia o promotor, por exemplo, ouvir de novo a principal testemunha de acusação, o que iria relembrar aos jurados fatos relevantes. O mesmo faria a defesa, no tocante a testemunha sua, e o julgamento seria estendido indevidamente. Assim, se a parte desejar reinquirir alguém, deve fazê-lo dentro do seu tempo para a réplica ou tréplica557.

Conforme Eduardo Espínola filho,

À vista da circunstância de, na réplica, falar a acusação pela última vez, seguindo-se a confutação do adversário, a que não poderá dar resposta (senão por curtos apartes), mesmo para esclarecer algum ponto obscuro, não é demais obtemperar a conveniência de, sendo vários acusadores, replicar o mais hábil, o mais respeitado pela sua eficiência; e ainda assim, na réplica, é necessário o cuidado de não avançar teses temerárias, nem afirmações equívocas, que poderão proporcionar à defesa um combate fulminante, arrasador, repercutindo, tanta vez, com a desmoralização do ponto focalizado, no total desprestígio da acusação558.

Já na tréplica, segundo Edílson Mougenot Bonfim, “há divergência

quanto à possibilidade de a defesa apresentar tese defensiva nova [...]. entendem alguns que

esse expediente violaria o princípio do contraditório559, pois não poderia a acusação se

manifestar acerca da nova tese560”; é o entendimento de Fernando Capez, quando afirma que

554 Cf. TUBENCHLAK, James. Tribunal do júri: contradições e soluções. p.106. 555 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.738. 556 FRANCO, Ary Azevedo. Código de processo penal. v.2. p.115. 557 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.739. 558 ESPÍNOLA FILHO, Eduardo. Código de processo penal brasileiro anotado. v.IV. p.539. 559 Princípio do Contraditório: “quer dizer que a toda alegação fática ou apresentação de prova, feita no processo por uma das partes, tem o adversário o direito de se manifestar, havendo um perfeito equilíbrio na relação estabelecida entre a pretensão punitiva do Estado e o direito à liberdade e a manutenção do estado de inocência do acusado”. NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.80. 560 BONFIM, Edílson Mougenot. Curso de processo penal. p.481.

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“não pode haver inovação de tese pela defesa, sob pena de ofensa ao princípio do

contraditório561”, Hermínio Alberto Marques Porto assevera que,

se a defesa técnica, aproveitando a tréplica, apresenta tese defensiva nova, por acréscimo substancial ou alteração fundamental do que tenha pleiteado ao responder à acusação, estará subtraindo da parte autora o direito de contrariar, e que a lei processual assegura restritamente nos limites da réplica; tal inovação defensiva [...] violenta o contraditório562.

Já Guilherme de Souza Nucci, James Tubenchlak e Júlio Fabbrini

Mirabete, dentre outros, discordam, afirmando a possibilidade de a defesa inovar na tréplica,

conforme este, “realmente , não há qualquer impedimento expresso na lei processual que vede

a alegação de teses novas na tréplica, e, como a defesa deve sempre falar por último, pode

acrescentar ou reformular suas teses em sua derradeira manifestação563”, James Tubenchlak

observa que “é lícito ao réu substituir, no plenário do Júri, a tese defensiva exposta na

contrariedade do libelo564”, sob o seguinte argumento:

Não se justifica censurar-se a simples palavra da defesa – e o único motivo seria a surpresa do órgão acusador, que não disporia de tempo para tentar rebater os novos argumentos – até porque, em qualquer caso, a defesa é sempre a última a se pronunciar, sendo certo, também, que a missão precípua da acusação não é, de modo algum, a de destruir os argumentos defensivos, senão a de provar os fatos que articulou565.

Já Guilherme de Souza Nucci, trás à baila o argumento de que “no

tocante a teses jurídicas, isto é, na parte concernente à interpretação das provas e quanto ao

direito a ser aplicado não há necessidade de se ouvir, sempre, a parte contrária566”,

argumentando a seguir que, no Tribunal do Júri, “elegeu o constituinte, como princípio

regente, a plenitude de defesa, razão pela qual se algum interesse há de prevalecer sobre o

outro é o do réu que merece sobrepor-se ao da acusação567”.

Por fim, James Tubenchlak assim se manifesta acerca deste assunto:

Em suma, o princípio do contraditório consta do texto constitucional, genericamente em relação aos litigantes, e especificamente em relação aos

561 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. p.655. 562 MARQUES PORTO, Hermínio Alberto. Júri: procedimentos e aspectos do julgamento questionários. p.126. 563 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Código de processo penal interpretado. p.1021. 564 TUBENCHLAK, James. Tribunal do júri: contradições e soluções. p.113. 565 TUBENCHLAK, James. Tribunal do júri: contradições e soluções. p.114. 566 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.739. 567 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.740.

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acusados, lado a lado com a ampla defesa (art. 5º, LV568), não sendo vulnerado, assim, pelo surgimento, ao apagar das luzes, de tese defensiva inesperada pela acusação569.

3.4 ESCLARECIMENTOS FINAIS AOS JURADOS

Os esclarecimentos são imprescindíveis, privilegiando a descoberta da

Verdade Real, haja vista que os jurados devem decidir pela íntima convicção, com isso,

quanto maior a gama de informações para que sua consciência esteja preparada para o

julgamento, mais correta e justa será o veredicto.

Conforme Guilherme de Souza Nucci,

Encerrados os debates, o juiz presidente consulta os jurados se estão habilitados a julgar ou desejam mais algum esclarecimento. Se algum jurado desejar obter informações sobre questão de fato, o juiz poderá dá-las diretamente ou determinar que o escrivão as dê, à vista dos autos [...]. Dúvidas quanto às questões de direito poderão ocorrer, cabendo igualmente ao magistrado togado solucioná-las570.

Podem ainda as próprias partes intervir nos esclarecimentos aos

jurados, desde que o juiz presidente mantenha a ordem dos trabalhos e não permita que

recomecem os debates pelas partes, sendo que, nesta situação o juiz presidente deverá

determinar que a parte esclareça, diretamente, o que pretendeu dizer ou sustentar, tratando-se

de um informe breve, que normalmente é feito com a concordância da parte contrária, isso

enriquece os dados coletados pelo Conselho de Sentença para formar o seu convencimento571.

Caso não se consiga dirimir todas as dúvidas dos jurados, como por

exemplo quando um jurado desejar ouvir alguma testemunha referida em juízo por alguma

outra, o juiz presidente deverá dissolver o Conselho de Sentença e marcar outra data para a

realização de nova sessão onde será realizada a prova almejada572.

568 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988: Artigo 5º, Inciso LV: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”. Caput, vide nota nº 173 supra. 569 TUBENCHLAK, James. Tribunal do júri: contradições e soluções. p.114. 570 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.741. 571 Cf. NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.741. 572 Cf. NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.741.

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3.5 EXPLICAÇÃO DOS QUESITOS AOS JURADOS

Afirma James Tubenchlak, que além da leitura que o juiz presidente

deverá fazer dos quesitos573 a serem votados pelos jurados, é também necessária a explicação

prévia destes, esclarecendo ao Conselho de Sentença o significado de cada um; em seguida

deverá indagar se alguma das partes tem alguma reclamação ou algum requerimento a fazer,

atendendo às, se houver, e, em seguida, fazendo constar na ata do julgamento as respectivas

reclamações ou requerimentos feitos pelas partes574.

Segundo Guilherme de Souza Nucci, “a leitura e explicação dos

quesitos, [...] deve ser feita em plenário, na presença do público575”, porém afirma não gerar

qualquer nulidade, por falta de prejuízo, caso o juiz presidente resolver ler e explicar os

quesitos em local reservado do público, mas sim, mera irregularidade576.

Defende, no entanto, o autor, que,

o magistrado deve fazer a leitura dos quesitos em plenário, à vista do público, que ficará esclarecido sobre o julgamento, bem como porque alguma das partes pode ter reclamações a fazer, resolvidas, então, de plano, de modo que tudo seria acompanhado pelos presentes, prestigiando o princípio da publicidade577.

Passada esta fase de esclarecimentos, leitura e explicação dos

quesitos, terá início a votação dos quesitos na sala secreta, posteriormente, terminada a

votação e assinado o respectivo termo578, “o juiz lavrará sentença, que deverá ser

fundamentada, salvo quanto às circunstâncias que resultarem das respostas dos quesitos. A

sentença será lida pelo juiz em público antes do encerramento da sessão de julgamento579”.

Depois disso encerra-se a sessão de julgamento580.

573 Questionário: é uma série de perguntas – que são os quesitos – dirigidas aos jurados que integram o Conselho de Sentença, destinados à coleta da decisão sobre os fatos classificados pela decisão de pronúncia e articulados pelo libelo, e sobre as teses postuladas pela defesa técnica. Cf. Marques Porto, Hermínio Alberto. Júri: procedimentos e aspectos do julgamento questionários. p.148; Deverá também conter fato ou circunstância alegada pelo réu, em sua defesa, durante o interrogatório, sob pena de nulidade, ainda que não tenha sido apresentada pelo defensor por ocasião dos debates. Cf. BONFIM, Edílson Mougenot. Curso de processo penal. p.482. 574 Cf. TUBENCHLAK, James. Tribunal do júri: contradições e soluções. p.107. 575 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.741. 576 Cf. NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.741. 577 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. p.741. 578 Cf. BONFIM, Edílson Mougenot. Curso de processo penal. p.482. 579 BONFIM, Edílson Mougenot. Curso de processo penal. p.486. 580 Cf. MALCHER, José Lisboa da Gama. Manual de processo penal brasileiro. p.450.

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CONCLUSÃO

Nesta parte terminal da presente monografia, na qual se tratou de

verificar a relação do Princípio da Verdade Real com o Plenário do Tribunal do Júri, se

fornece um conteúdo que teve como objetivo proporcionar um aprofundamento no tema

objeto do estudo, seja para o acadêmico de Direito, o profissional da área jurídica ou qualquer

pessoa interessada no assunto.

Utilizou-se para tanto, do método dedutivo de pesquisa, a qual se

desenvolveu a partir das obras doutrinária do Direito Processual Penal, artigos científicos e de

outros relacionados à temática estudada.

Primeiramente, faz-se necessário contextualizar o tema através das

origens históricas do Tribunal do Júri, nos mais diversos lugares e épocas distantes, fato que

alguns doutrinadores encaram como um épico desafio, afirmando que o julgamento por

pessoas, onde se reuniam para julgar aquele que, em sua sociedade cometeu um deslize,

remontam às primeiras épocas da humanidade, tamanha é a controvérsia acerca das origens da

Instituição do Tribunal do Júri.

Desta forma, se estudou as origens que remontam ao tempo de

Moisés, sendo que os hebreus, com a sua tradição oral e escrita, já possuíam uma

processualista semelhante à moderna organização do Tribunal do Júri, com seus tribunais, os

Ordinários, o Conselho dos Anciãos e o Sinédrio, julgavam pessoas que praticavam condutas

tidas por eles como crimes, dentro das características do julgamento contemporâneo, ou seja,

havia o julgamento de uma pessoa considerada incurso em um crime, por várias outras,

retiradas da própria sociedade local.

Noutros povos também se vislumbrou tal semelhança, como na

Grécia, quando do Tribunal dos Heliastas, sendo este tido por vários autores como o que mais

se assemelharia com as linhas modernas do Tribunal do Júri, sendo que, era incumbido de

zelar pela paz social local, escolhia os seus juizes aleatoriamente dentre as pessoas do povo, e

que após a ouvidas testemunhas da acusação e da defesa, julgavam pela íntima convicção.

Alguns autores afirmam que o Tribunal do Júri surgiu em Roma, com

as quaestiones perpetuae, por seu caráter representativo, digno do período republicano de

Roma, representava a soberania do povo romano, sendo que havia jurados escolhidos do

povo, eram senadores a princípio, existiam os debates orais, além do respeito de inúmeros

princípios como o da total publicidade, e de restrição da prisão preventiva.

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Na continuidade relatou-se que, na idade média, foram primeiramente

os germânicos que desenvolveram a tradição dos julgamentos populares, porém os seus

primeiros tribunais eram secretos, e os próprios jurados possuíam grande influência na

sociedade, além de serem os mesmos os executores da pena, não se nega a grande influência

do povo na administração da justiça nesta época, por meio dos tribunais dos plaids e

posteriormente os plegos, além de outros.

Como é o entendimento da doutrina, na Inglaterra, o Tribunal do Júri

recebeu os traços de sua forma definitiva, após a conquista normanda, por Henrique II, sendo

que quando da invasão, seus conquistadores trouxeram os germens da instituição com a sua

cultura, e com o passar do tempo, foi adquirindo a forma pela qual hoje se conhece.

Com a abolição da ordálias pelo Concílio de Latrão, eram reunidos

doze vizinhos do acusado e eles decidiam acerca de sua culpa, doze era o número por

referência aos dozes apóstolos que haviam recebido a visita do Espírito Santo, e assim,

quando doze homens de consciência pura se reuniam sob a invocação divina, a verdade

infalivelmente se encontravam entre eles. Desta crença teria nascido o Júri.

Já na América do Norte relatou-se apenas acerca da evolução daquilo

que os ingleses já haviam organizado, mas que, segundo alguns autores, é um Júri

verdadeiramente nacional e deve servir de exemplo para as outras nações, trazido pelos

colonizadores ingleses, consistia em uma garantia básica dos cidadãos.

Quando da Revolução Francesa, naturalmente esta houve por

modificar a organização judiciária do país, foi instituído o Tribunal do Júri como uma garantia

contra os atos bárbaros das torturas praticadas pelos déspotas de antes, sendo esta nova

instituição considerada como um porto de bonança e salvamento.

Com isso, após várias argumentações pelos mais variados e

respeitados jurisconsultos, dentre os quais Rui Barbosa, João Mendes de Almeida Júnior e

Arthur Pinto da Rocha, não se pode ignorar que a instituição do Tribunal do Júri, mesmo que

apenas com poucas semelhanças, mas sempre presente a idéia principal de julgamento pelos

pares, que já nos mais remotos tempos é possível notar suas origens, das quais foi evoluindo

com o passar do tempo, até onde se têm a organização mais parecida com a de hoje, ou seja,

na Inglaterra, quando foi realmente tratado como um órgão da organização judiciária e passou

a ser solução aos juízos de Deus, então abolidos pelo Concílio de Latrão.

No Brasil, o Tribunal do Júri foi criado pela Lei de 18 de junho de

1822, possuindo a competência apenas para os crimes de imprensa, e suas apelações somente

poderiam ser dirigidas ao próprio Príncipe, sendo elevado na Constituição de 1824, e até

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mesmo adquirindo competência para matéria civil, mas nunca chegou a haver sequer um Júri

civil, encontrando-se nesta, previsto no capítulo referente ao Poder Judiciário.

Até então vigoravam as Ordenações do Reino, mas com o Código de

Processo Penal do Império, em 1832, passou o Brasil a ter a sua própria legislação processual

penal, que veio para combater as leis arbitrária da colônia, dominando o Código o espírito

antiinquisitorial e liberal.

Com o Decreto-Lei 848, foi mantido o Júri no Período Republicano, o

Júri Federal foi criado, para os julgamento dos crimes de competência da Justiça federal da

época, como, por exemplo, o crime de moeda falsa, contudo essa competência era

constantemente alterada por Leis e Decretos.

Quanto a Constituição Republicana de 1891, verificou-se que

continha apenas que era mantida a instituição do Júri, pura e simplesmente, vindo previsto no

capítulo dos direitos e garantias fundamentais, tal expressão lacônica fez surgir uma discussão

no país, mobilizando os juristas, tanto que Rui Barbosa afirmou que o que queria a

constituição era manter vigente a instituição, nos seus moldes básicos, como eram no antigo

regime, opinião contestada, mas depois aceita por todos.

Na constituição de 1934, o Júri foi colocado no capítulo do Poder

Judiciário. Já a constituição de 1937, nem sequer cuidou de manifestar-se acerca do Tribunal

do Júri, o que mais tarde foi corrigido pelo Decreto-Lei nº 167, em 1938, conhecido como a

Lei do Júri, cuidou esse de firmar a existência da Instituição, porém privando-o da soberania

dos veredictos, Princípio balizados da Instituição, permitido que sua decisão fosse reformada

no mérito pelos órgãos superiores.

Somente com a constituição de 1946 é que foi devolvido ao Tribunal

do Júri a sua soberania dos veredictos, quando voltou a ter acento constitucional, sendo

previsto no capítulo dos direitos e garantias fundamentais, e, ainda sobre a vigência da Carta

de 1946, passou a ter vigência a Lei 263, submeteu suas decisões ao controle da instância

superior, porém sem violar a soberania dos veredictos.

Na constituição de 1969, bem como na Emenda Constitucional nº. 1,

de 1969, o Tribunal do Júri foi mantido no capítulo dos direitos e garantias fundamentais,

sendo que na Emenda referida, foi omitida a soberania dos veredictos, o que mais tarde foi

jurisprudencialmente resolvido.

Na Constituição de 1988, que hoje é a vigente, o Tribunal do Júri

encontra-se previsto no capítulo dos direitos e garantias fundamentais, constituindo cláusula

pétrea constitucional, com os seguintes princípios básicos: a plenitude de defesa; o sigilo nas

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votações, a soberania dos veredictos e a competência mínima para julgamentos dos crimes

dolosos contra a vida.

Com isso, nota-se que o Tribunal do Júri evoluiu de maneira

controvertida até os dias contemporâneos, de forma a passar por inúmeras modificações que o

levaram quase a se extinguir, mas com a regularização dos seus princípios com a constituição

de 1946, voltou aos poucos a ser soberano, como hoje o é.

Sendo assim, a evolução por qual passou o Tribunal do Júri, tratada

nesta monografia, em seu primeiro capítulo, ajudará o leitor a entender melhor a Instituição

do Tribunal do Júri.

Depois disso, no segundo capítulo, cuidou-se da exposição do

Princípio da Verdade Real e da Verdade Formal, e, a partir dos aspectos destacados, nota-se a

importância da busca pela verdade para que um decisão seja proferida com total embasamento

fático, com a necessária certeza, se possível, de que apenas os culpados estão sendo

condenados, ou que os inocentes são absolvidos, sendo que, ainda, assegurando que cada

pessoa receba o que merece como sentença, na medida de sua participação no fato histórico

ocorrido e analisado em juízo.

O que se verificou, foi que Princípio da Verdade Real, consiste em

nada mais do que a necessidade de que sejam reunidos no processo o maior número de

informações referentes ao fato ocorrido, consistindo na base para que posteriormente os

julgadores decidam, sempre devendo se ter em mente que o jus puniendi deve recair sobre o

acusado somente na medida dos seus atos, daí a importância de se chegar o mais próximo

possível da verdade.

Verificou-se que a Verdade Formal conflita-se com a Verdade Real,

sendo aquela, uma verdade referente à trazida pelas partes ao processo, não sendo permitido

em muitos casos, como quase sempre no Direito Processual Civil, onde a verdade formal é

vigente, que o próprio julgador aja de ofício para a produção da prova, como é possível muito

mais no Direito Processual Penal, onde é vigente a regra da Verdade Real, dado ao caráter

público dos direitos em pauta, onde no cível trata-se de direitos disponíveis, como os

patrimoniais, no penal trata-se de bens indisponíveis, como a liberdade.

Se notou, também, que apesar de alguns poderes de ação, ex-officio,

que no ramo civil, o magistrado é mais um espectador da produção de provas, já no processo

penal o magistrado possui amplos poderes para busca da verdade, quando, por exemplo, pode

determinar de ofício alguma diligência que possa sanar dúvida e chegar à verdade.

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E apesar de alguns doutrinadores afirmarem que a verdade que

realmente interessa é aquela que se encontra nos autos, ou seja, a Verdade Processual, não se

pode deixar de notar que esta verdade somente se possibilitou com o poder investigatório

conferido ao juiz de buscar a verdade por seus próprios desígnios, de ofício, pois hoje em dia

não se pode mais permitir que um magistrado fique inerte, esperando as provas serem trazidas

pelas partes, deve agir em busca da verdade, pois esta sim será o motivo de seu sono

tranqüilo, expurgando a injustiça das decisões por ele proferidas com total embasamento, seja

no ramo cível ou na esfera penal.

Porém, sabe-se que no Direito Processual Penal também existem

limitações à descoberta da verdade, o que ao final se nota a necessidade de que, as vezes,

como exceção, a possibilidade de que Verdade Real se curve à Verdade Formal, mas sempre

em prol de um bem maior, no caso os direitos e garantias constitucionais, vigorando sobre um

Princípio eminentemente processual, mas que garante sejam aquelas asseguradas de maneira

notória; é o caso, como exemplo, na absolvição do acusado por falta de provas, ora, se se

acredita que a busca pela Verdade Real é necessária para que a condenação judicial seja

baseada na certeza, como é que na falta desta, pode-se condenar, pergunta-se; não se pode,

por disposição constitucional do Princípio do in dubio pro réu.

No Plenário do Tribunal do Júri, não pode ser diferente, vigorando o

Princípio da Verdade Real, cada parte, o juiz presidente, os jurados, devem concorrer em

igualdade para a produção das provas no mais íntimo corolário do Princípio em estudo.

Porém, ocorre que, deixando-se a parte procedimental de lado, pois já

vista, cada parte se preocupa em buscar a sua própria verdade durante a realização da prova

em plenário, dando maior ênfase ao que lhe interessa, como se observou, deixando de lado o

bem maior que é a justiça, cada parte procura a vitória a qualquer preço, pois se faz uso de

deslealdades, mentiras preparadas, e, através de batalhas retóricas e eloqüentes, desviam dos

jurados os fatos reais que servem de base para o veredicto.

Contudo notou-se que existem mecanismos para se inibir e fazer

cessar tais abusos, uma vez que o juiz presidente utilizando-se do seu poder de policia em

plenário, deve intervir para que nada influencie os jurados, de modo a incorrerem em erro,

para que decidam em conformidade com a Verdade Real, mas, contudo, sempre de forma

imparcial é evidente.

Já quanto aos jurados, nota-se que possuem faculdades que podem,

com isso auxiliá-los no momento de se proclamar a justiça, no caso, podem requerer a oitiva

de testemunhas e diligências, podem pedir esclarecimentos sobre os fatos, e tudo isso em prol

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da Verdade Real, necessária, como já se deixou claro, para a correta manifestação na hora do

veredicto.

Com isso, se nota que o Tribunal do Júri, chamado por muitos de

tribunal popular, mostra-se apto a buscar a verdade e fazer a justiça nos moldes de uma

sociedade que se faz presente nas decisões dos crimes mais graves, sentando-se no banco

reservado ao Conselho de Sentença lhes é depositada a responsabilidade de julgar um cidadão

como eles, mas que está agora ali como acusado, sob julgamento pela sociedade, e conforme a

maneira de pensar acerca dos fatos por ele cometidos, é dado seu veredicto.

À medida que a sociedade, representada pelos jurados, tiver

conhecimento de todos os fatos como aconteceram no mundo natural, mais justa será a

apreciação da conduta do acusado, e, esta sociedade, decidindo pela sua íntima convicção,

poderá considerar a conduta daquele reprovável ou não, de acordo com o que cada um dos

jurados entender ser o certo ou o errado; mas, isso só pode ocorrer se os fatos forem

apresentados na sua plenitude e veracidade, e, está será a medida da justiça que eles estarão

apto a proferir, na exata medida em que os fatos lhes foram apresentados.

Então, se nota a evidente importância que a verdade tem nas decisões

judiciais, os métodos de investigação devem se estender até a figura do juiz, que deve

concorrer com as partes na produção das provas, buscando-se o bem maior que é justiça.

No Plenário do Tribunal do Júri, a verdade é mais importante ainda,

pois os jurados não são peritos apreciadores da prova, sendo o procedimento oral

importantíssimo nos seus melhores moldes da lealdade entre as partes, para que os fatos

cheguem límpidos até eles, necessitando de um interrogatório completo do acusado, de

perguntas pertinente às testemunhas, de peritos que venham ao plenário esclarecer os laudos

se preciso, e, atenção redobrada aos debates, com análise crítica do que é colocado como fato

verdadeiros aos jurados

Com isso, ou seja, com a Verdade Real exposta em plenário, pois se

nota com o explanado nesta monografia tal possibilidade, os jurados apreciarão os fatos e

reprovarão ou não a conduta do acusado, de acordo com aquilo que é aceito na sociedade

onde vivem, de acordo com o que cada jurado pensa sobre os fato, pela sua íntima convicção.

Só assim a justiça é feita, baseada na certeza, não importando a

condenação ou a absolvição, mas a certeza de que a decisão para o caso concreto foi dada, a

melhor subsunção no ato da sentença é aquela onde se tem os dispositivos legais corretos, e

mais ainda os fatos corretos para que se decida.

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Por fim, conclui-se que este estudo não encontra-se acabada pois,

com as modificações trazidas com o Projeto de Lei 4.203 de 2001, que inclusive já obteve

aprovação no Congresso Nacional, e encontra-se atualmente no gabinete do Presidente da

República para sancionamento, novas inspirações surgirão, para os acadêmicos e operadores

jurídicos.

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