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As CORRENTES FILOSÓFICAS NA FORMAÇÃO DO DIREITO PENAL MODERNO WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR Juiz Federal e Professor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, da Escola da Magistralllra do Rio Grande do Norte - ESMARN e do Centro de Estudos e Ape1leiçoamento Funcional - CEAF do Ministério Público Estadual do Rio Grande do Norte. I. INTRODUÇÃO Investigar as raízes da vida é tema do qual a humanidade tem se ocupado desde os primeiros instantes de convívio em sociedade. A história da vida pode ser buscada com a atenção voltada apenas para os acontecimentos importantes registrados ao longo do tempo. Todavia, para compreender o presente e as perspectivas vislumbradas no futuro é preciso estudar e investigar o passado, campo do qual se ocupa a história da filosofia. Não se vive o presente sem o lastro fornecido pelo passado. GIORGIO DEL VECCHIO lembra que o passado revive no presente e que "Os problemas filosóficos que hoje discutimos são fundamentalmente os mesmos que aos filósofos antigos se mostraram, ainda que de modo germinaI ou embrionário"}, pelo que o estudo dos sistemas filosóficos proporciona ao investigador uma série de experiências lógicas, contribuindo para que se I Lições de Filosofia do Direito. 5' ed. Trad. Antônio José Brandão, Armênio Amado - Editor, sucessor, Coimbra, 1979, pág. 31.

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INSTITUIÇÃO TOLEDO DE E1\SINO

:la ed. Rio de Janeiro: Paz e

1 da Liberdade. 22a ed. Rio

ia Modernidade no Brasil.

tradução ao Pensamento l\cadêmica, 1995.

r;'undamentos de uma Nova ): Alfa Omega, 1997.

As CORRENTES FILOSÓFICAS NA

FORMAÇÃO DO DIREITO PENAL MODERNO

WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR

Juiz Federal e Professor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, da Escola da Magistralllra do Rio Grande do Norte - ESMARN e do Centro de Estudos e

Ape1leiçoamento Funcional - CEAF do Ministério Público Estadual do Rio Grande do Norte.

I. INTRODUÇÃO

Investigar as raízes da vida é tema do qual a humanidade tem se ocupado desde os primeiros instantes de convívio em sociedade. A história da vida pode ser buscada com a atenção voltada apenas para os acontecimentos importantes registrados ao longo do tempo. Todavia, para compreender o presente e as perspectivas vislumbradas no futuro é preciso estudar e investigar o passado, campo do qual se ocupa a história da filosofia.

Não se vive o presente sem o lastro fornecido pelo passado. GIORGIO DEL VECCHIO lembra que o passado revive no presente e que "Os problemas filosóficos que hoje discutimos são fundamentalmente os mesmos que aos filósofos antigos se mostraram, ainda que de modo germinaI ou embrionário"}, pelo que o estudo dos sistemas filosóficos proporciona ao investigador uma série de experiências lógicas, contribuindo para que se

I Lições de Filosofia do Direito. 5' ed. Trad. Antônio José Brandão, Armênio Amado - Editor, sucessor, Coimbra, 1979, pág. 31.

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caminhe em direção a um sistema mais perfeito, escoimando os erros anteriormente cometidos e aproveitando os progressos alcançados.

Não há de se negar que o pensamento filosófico de hoje guarda identidade, em muitos aspectos, com o que foi sustentado nos primórdios pela escola filosófica mais antiga da filosofia grega, desenvolvida no VI Século A. c., denominada Escola Jônica.

Certamente que a filosofia mais proeminente deste Século, o existencialismo, que teve em SARTRE o seu grande pensador, representa uma renovação de muitas das idéias socráticas. O neotomismo defendido principalmente na França por ÉT/ENE GILSON e JACQUES MARITAIN, propugnando a reconciliação entre a filosofia e o cristianismo, segundo a ótica da ortodoxia religiosa, é o retorno, com roupagem nova, do tomismo, filosofia sustentada por SÃO TOMÁS DE AQUINO no Século XVI. Do mesmo modo, a filosofia analítica ou empirismo lógico volta ao pensamento de HUME, ao empirismo britânico e a lógica de ARISTÓTELES. Outra corrente filosófica importante do Século XX é a ecofilosofia2

, que é um pensamento neodarwinista.

Nos últimos anos, tem-se intensificado a noção de que o pensamento científico está em processo de mudança de paradigma, modificando radicalmente, nas mais diversas áreas, os valores cultivados. Com esse processo de mudança de paradigma, têm surgido movimentos alternativos, conferindo particular importância para um pensamento holístico, na defesa de um novo estilo de vida.

Em verdade, os pensadores políticos hodiernos3 observam que estamos chegando ao término não apenas de um século, mas propriamente de uma era, ao mesmo tempo em que vivemos o processo de criação de outra. A era que se finda é aquela experimentada com a Revolução Industrial, esgotada para os países desenvolvidos, utilizada pelos que estão em

2 Essa corrente filosófica questiona a noção de evolução, sustentando que a sociedade caminhou errado no instante em que relegou a segundo plano questões de ordem ambiental, a exemplo da poluição, no falso pressuposto de que o homem está no topo da natureza.

1 Alvin e Heidi Toftler, dois dos maiores pensadores sociais contemporâneos, demonstram essa realidade em seus estudos (Criando uma Nova Civilização. Livros do Brasil S. A., Lisboa).

WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR

desenvolvimento, e subdesenvolvidos. A qUt em que qualidade e ten profunda mutação nos instrumento de formaçã< operada como meio de civilização, no que tange

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INSTITUIÇÃO TOLEDO DE ENSINO

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desenvolvimento, e sonhada, ainda, pelos países subdesenvolvidos. A que está a principiar é a do conhecimento, em que qualidade e tempo são os dogmas, conduzindo isso a profunda mutação nos valores sociais. A informática é o instrumento de formação dessa nova concepção de vida, sendo operada como meio de alcançar o know how político da nova civilização, no que tange às iniciativas do poder público e privado,

Em processo globalizado desse novo pensamento reformista dos paradigmas, o mundo inteiro sente e participa do movimento, embora as dimensões continentais e as distorções sociais façam com que existam localidades em que a primeira grande modificação da civilização, encetada pelo movimento agrícola, ainda seja a realidade, sem que os indivíduos tenham tido oportunidade de gozar dos avanços que foram implementados com a Revolução Industrial.

Esse movimento contagiante filosófico se faz sentir, também, como não poderia deixar de ser, no sistema jurídico. A sociedade emergente, exigente em termos de qualidade e rapidez dos serviços, clama por justiça eficaz e célere, que atenda as suas necessidades crescentes e que o Direito sirva, efetivamente, de instrumento de vida.

A nova sociedade, que está em processo de formação há mais de duas décadas sob a batuta do pensamento filosófico de mudança dos paradigmas, tem maior percepção de sua cidadania, conhece os seus direitos, sabe de suas carências e possui a consciência de que necessita se organizar, em classes, para possuir força nas reivindicações. Esta é a sociedade dos interesses coletivos e globalizada, que aproxima os cidadãos mais distantes pela identidade de suas pretensões, voltadas à implantação de seus ideais, ou melhor, ao modelo de vida almejado.

É a formação da sociedade coletivizada, ou, como previsto por Bobbio, a concepção do cidadão do mundo4

4 ..... Direitos do homem, democracia e paz são três momelllos necessários do mesmo movimento histórico: sem direitos do homem reconhecidos e protegidos, não há democracia; sem democracia, não existem as condiç(jes míninws para a solução pacífica dos conflito.1. Em outras palavras, a democracia é a sociedade dos cidadãos, e os súditos se tomam cidadãos quando lhes são reconhecidos alguns direitos ./i.mdamentais; haverá paz estável, uma paz que

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Nesse contexto, o fenômeno cnmmoso de agora não é uma reação individual tal como concebido na filosofia de BECCARIAs, mas um fenômeno coletivizado, em que até mesmo os pequenos crimes estão relacionados e controlados pela macrocriminalidade, com repercussões transnacionais.

2. INDIVIDUALISMO, PUBLICISMO E COLETIVISMO

Antes de analisar a influência das correntes filosóficas na formação das escolas penais, é relevante apreciar que o sistema jurídico, acompanhando o fenômeno social, nitidamente, passou por uma época individualista, em que homenageava sobremaneira o direito de liberdade. Posteriormente, ingressou na era da publicização e, nos dias de hoje, experimenta uma verdadeira coletivização.

A preocupação filosófica dos pré-socráticos concentrou-se na investigação das origens do mundo, procurando explicações quanto à sua criação e as razões de sua existência. Os filósofos daquela época ficaram conhecidos como os filósofos da natureza. Isso decorreu de movimento cultural que rechaçava as idéias mitológicas, exsurgindo, com essa contestação, o embrião do pensamento filosófico até hoje praticado em maior escala.

Posteriormente, os três maiores filósofos da história - Sócrates, Platão e Aristóteles, passaram a concentrar parte considerável de suas indagações filosóficas na relação do homem com o Estado e com o seu semelhante, instigando, principalmente, o exame das questões de ordem política, ética e lógica. Em verdade, os pensadores, em determinado instante, sem deixarem de encarar a importância das verdades sobre a criação da vida, perceberam que, independentemente desse conhecimento, seria necessário estabelecer as premissas básicas das relações sociais,

não tenha a guerra como alternativa, somente quando existirem cidadiios não rruJis apenas deste ou daquele Estado, mas do mundo. .. (A era dos direitos, trad. de Carlos Nelson Coutinho, Rio de Janeiro: Campus, 1992, pág. I).

5 No livro Dos Delitos e das Penas, Cesare Beccaria. o precursor da primeira Escola Penal, a Escola Clássica, desenvolveu a sua filosofia, em razão da realidade social reinante na segunda metade do Século XVIII, tendo como suporte o fenômeno criminoso como uma realização individual.

despontando, nessa orderr político do ser humano.

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6 Aristóteles advertia que a democracia eI prática de injustiças, indagando: "Os dos ricos? Não é isso uma injustiça Edipro, 1995, pág. 104).

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despontando, nessa ordem de idéias, o comportamento ético e político do ser humano.

A partir daí, naturalmente começaram a ser engendrados modelos políticos de formação dos Estados, cabendo a Aristóteles prever três boas formas de Estado: a monarquia, a aristocracia e a democracia, agregando, posteriormente, Kant, que a democracia6

era o mecanismo de busca da "paz perpétua".

A Democracia, para os filósofos, apresentou-se como o processo de vivificação das relações sociais, devendo o homem, enquanto ser condicionado, desenvolver as suas três atividades fundamentais - labor, trabalho e ação -, no sentido empregado por Hanna Arendt7, a fim de alcançar a sua plena realização nos limites da terra, e efetivamente desempenhar a sua função política, participando decisivamente para o avanço da humanidade,

A secularização do Estado e a derrocada dos regimes absolutos deram lugar, com suporte no movimento iluminista, à sedimentação do dogma da liberdade, fomentando a concepção política do modelo de Estado ideal. O Poder não mais era de origem divina, e o direito, ainda que natural, era produto do homem. O Estado, sob essa idéia, só teria legitimidade para intervir em assuntos essenciais para o desenvolvimento da sociedade, deixando tudo mais à liberdade dos cidadãos para se auto-determinarem. Esse fenômeno, naturalmente, repercutiu no Direito, dando ensejo à concepção de ordenamento jurídico prestigiando, sobremaneira, os interesses individuais. É o instante do Direito individual.

Paulatinamente, o Estado, sob a falsa legitimidade popular e pretensão de diminuir as desigualdades fomentadas pelo liberalismo, iniciou a ingerência, cada vez mais acentuada, nas relações sociais, ingressando na era intervencionista,

6 Aristóteles advertia que a democracia embasada na maioria poderia ser desvirtuada, conduzindo à prática de injustiças, indagando: "Os pobres, porque sejam em maioria, podem USUllJar os bens dos ricos! Niio é isso uma injustiça?" (A Política, trad. Nestor Silveira Chaves. Bauru - SP. Edipro. 1995, pág. 104).

7 Segundo Arendl, as três atividades humanas fundamentais são o labor. que corresponde ao processo biológico do corpo humano, ou seja, é a própria vida, o trabalho, que ela entende como a atividade correspondente ao artificialismo da existência humana, e a ação, que é a ati vidade de relação diretamente entre os homens. sem a mediação das coisas ou da matéria.

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apresentando-se como a soluções para todas as questões exorbitantes da esfera individual de cada um dos indivíduos, como único modo eficiente de amparar os desassistidos. Acompanhando esse movimento, o direito entrou na fase da publicização de seus institutos. É o momento da publicização do Direito.

Agora, sente-se que a sociedade caminha em outra direção, não mais exigindo a onipresença do Estado, porém reclamando a reconquista dos espaços cedidos pelos cidadãos, só que não mais sob a ótica individual, mas sim coletiva. Estamos, por fim, e não por último, na era do Direito coletivo.

Qual a relação desse movimento reformista com o crime? Tudo! E essa resposta não pode ser contestada. Impõe-se realçar, de logo, que o crime é fenômeno mal compreendido. Certamente que a ciência penal, dentre todas, talvez seja a que tenha raízes mais profundas com a filosofia, pois parte de indagações como o direito de punir do Estado, a pena de morte, a prisão, a liberdade e institutos outros, assuntos com os quais a maioria dos filósofos se ocupou. Basta ter em mente que o nascimento da ciência penal, efetivamente, ocorreu com a publicação da obra "Dos delitos e das penas", de Beccaria, que, em verdade, é mais filosófica do que jurídica.

Ainda assim, em que pese a vasta literatura a respeito das mazelas do fenômeno delinqüente, não se tem uma clara posição de sua manifestação no imo da sociedade. Quanto se fazem elucubrações a respeito do criminoso, nada obstante as diversas mutações de ordem social, ainda se buscam explicações nas teorias de Lombroso e Ferri. Encara-se o crime como uma ação individual do agente que o pratica, para, daí, investigar as causas da delinqüência, sem se dar conta de que, hoje, a criminal idade, assim como a sociedade em seu todo, não é mais fenômeno individual, mas sim coletivo concentrando-se, a maioria dos ilícitos, ainda que praticado por uma só pessoa, como o simples furto de um veículo, na seara do crime organizado.

Em rigor, tem-se sentido, desde os fins dos anos 70, o surgimento de crimes novos, como conseqüência normal do progresso técnico. Porém, impressiona como o crime organizado,

WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR

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INSTITUiÇÃO TOLEDO DE ENSINO WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR

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a partir dos grupos mafiosos italianos, tem se expandido, fazendo brotar novos grupos criminosos como os cartéis colombianos, os grupos guerrilheiros espalhados pela América do Sul, Ásia, Médio Oriente (Líbano), África e também na Europa (ex-Iuguslávia), criando o liame de seus propósitos com tráfico de armas e o de drogas. Em verdade, as novas formas de criminalidade modificaram o perfil da delinqüência tradicional, de nítido caráter individual, agora com concepção organizacional, coletivizada.

3. ESCOLAS PENAIS

É preciso saber que a primeira concepção da justiça penal deve-se à criação religiosa, tendo como suporte a expiação do criminoso culpado por haver atentado contra a Divindade. O crime suscitava a cólera dos deuses, que só seria escoimada com o castigo correspondente. Essa tendência é bem visível no Código de Hamurabi. Pune-se, com rigor, o agente, a fim de satisfazer o Deus atingido, obtendo o seu perdão. Tal concepção de justiça penal coincide com o estádio de organização alcançado pela sociedade, superando o pensamento da repressão à criminalidade com a pura vingança privada. A sanção penal não está a serviço do homem que sofreu com o crime, mas sim de Deus, tendo o Direito Penal índole teocrática e sacerdotal, havendo uma mesclagem do crime (pecado) e a ofensa com pressupostos religiosos.

Essa época, da justiça divina, teve inspiração, inicialmente, com a visão mitológica do mundo, que não é considerada uma concepção filosófica, pois por filosofia entende-se uma forma completamente diferente de pensar, surgida na Grécia aproximadamente 600 a. c., em que os primeiros filósofos da natureza contestaram as explicações religiosas passadas de geração para geração por meio dos contos míticos.

A doutrina cristã, surgida na Palestina, em poucos séculos se difundiu no mundo civilizado, modificando as concepções sobre o Direito e o Estado, muito embora inicialmente não tivesse ela

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significado jurídico ou político, porém apenas moral, tendo como princípio a caridade, o amor e a fraternidade.

Partia da concepção de que o mundo é governado por um Deus pessoal, de modo que o Estado, em verdade, era uma instituição divina, e o direito criado seria emanado da vontade divina. Na antigüidade clássica, o indivíduo tinha o dever de comportar-se de conformidade com as regras impostas, reconhecendo a supremacia do Estado, sob pena de penalizado por afronta aos Deuses.

Os grandes filósofos gregos da Antigüidade. SÓCRATES, PlATÃO (Leis e Protágoras), ARISTÓTELES (Ética Nicomáquea e na Política), em seus estudos, debateram a autoridade do Estado em punir, a razão e a finalidade da pena, sem, contudo, representar marco do pensamento humano contra as barbáries praticadas em nome da justiça penal.

O próprio SÓCRATES, em diversos diálogos narrados por PlATÃO, sustenta a obediência irrestrita às leis, admitindo até mesmo a pena de morte. Aliás, SÓCRATES aceitou, resignadamente, para dar bom exemplo quanto ao cumprimento das leis, a sua sentença de morte, muito embora lhe tenha sido oferecida a oportunidade de fugir. PlATÃO, no Livro IX, do diálogo As Leis, embora exponha que a pena deva ter a finalidade de tornar o agente que pratica o ilícito melhor, assevera que "se se demonstrar que o delinqüente é incurável, a morte será para ele o menor dos males ,,8.

Importa considerar que a concepção aristotélica da formação orgânica do Estado, embasada na premissa de que o todo está acima das partes, que vigorou como dogma incontestável na Antigüidade e na Idade Média, serviu de suporte à sustentação dos argumentos em prol da aplicação de penas severas aos errantes, até mesmo a pena de morte, nas suas mais diversas modalidades. A lógica era de que o homem é um animal político, não podendo viver fora do corpo social, e que o homem individual se constituía

, Essa passagem do pensamento de Platão é realçada por Bobbio em A Era dos Direitos. Acrescenta Bobbio que Platão. no diálogo As Leis. menciona a pena de morte para diversos delitos. desde os delitos contra as divindades e os cultos. até aqueles contra os genitores, e, em regra. contra os homicídios, ressaltando que para Platão a pena de morte era a "pena natural" para esses crimes.

WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR

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Na Idade Média, em I

religiosos, SANTO AGO como efeito do Cristia Estado, assim como se sobrepondo-se esta àqUf apenas temporárias, com diante da crescente expal crimes nele previstos a p desde que se tratasse de penas excessivas e cruéi privativas de liberdade como forma de buscar, cc da culpa. A pena, no C< castigo divino e purificaç:

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9 Ob. cit., pág. 181.

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30bbio em A Era dos Direitos. Acrescenta lena de morte para diversos delitos. desde :s contra os genitores. e. em regra, contra Je morte era a "pena natural" para esses

apenas em uma parte da vida do corpo social, daí porque a vida de um deve ser sacrificada em benefício da vida do todo, a fim de expungir o risco de contaminação que o ser infectado apresenta.

Não se pode deixar de registrar, contudo, que PLATÃO, no diálogo As Leis, difunde idéias, a respeito da punição do agente em virtude da prática de ilícito, que serviram de fundamento para o desenvolvimento da Escola da Nova Defesa Socíal.

Na Idade Média, em que despontam os dois maiores filósofos religiosos, SANTO AGOSTINHO e SÃO TOMÁS DE AQUINO, como efeito do Cristianismo, formula-se nova concepção de Estado, assim como se define a sua relação com a Igreja, sobrepondo-se esta àquele pois trata das coisas eternas e não apenas temporárias, como é a vida terrena. O Direito Canônico, diante da crescente expansão da autoridade da Igreja, estende os crimes nele previstos a pessoas não sujeitas à disciplina religiosa, desde que se tratasse de fatos de natureza espiritual, prevendo penas excessivas e cruéis para os hereges, infligindo as penas privativas de liberdade em detrimento das penas patrimoniais, como forma de buscar, com a segregação do indivíduo, a expiação da culpa. A pena, no Código Canônico, tinha duas finalidades: castigo divino e purificação da alma do agente.

BOBBIO lembra que SÃO TOMÁS, arraigado à idéia aristotélica da formação orgânica do Estado, defendeu, em seus escritos, que "Cada parte está ordenada ao todo como o imperfeito ao perfeito (00')' Por causa disso, vemos que, se a extirpação de um membro é benéfica à saúde do corpo humano em seu todo (00') é louvável e até salutar suprimi-lo", concluindo que seria louvável e salutar "matá-lo para salvar o bem comum,,9.

O segundo pensamento da justiça penal, que acompanha o movimento da separação dos fins do Estado dos da Religião, deixa o campo religioso propriamente dito, para adentrar mais especificamente a órbita política. Surge com o Renascimento, iniciado no Século XIV, movimento de libertação da filosofia e da ciência da teologia cristã, apartando-se do pensamento

90b. cit., pág. 181.

1

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desenvolvido na Idade Média, em que a vida era enxergada pelo prisma divino. O homem, com o Renascimento, volta a ser o centro de tudo, libertando-se o espírito crítico, sufocado com a ideologia cristã.

DEL VECCHIO chama a atenção de que o Renascimento, com a sua nova concepção de natureza, trouxe modificações profundas nas condições políticas, firmando a separação do Estado da Igreja, surgindo "os grandes Estados, as grandes monarquias, com territórios determinados mas independentes da hegemonia do Papado ou do Império, e verdadeiramente soberanos "lO,

fornecendo, no campo teórico, novas bases para o sistema jurídico e político.

A justiça penal, com supedâneo nas idéias implantadas com o Renascimento, não teria mais como fim aplacar a ira dos deuses, mas sim o de proteger a ordem e a paz pública perquirida pelo Soberano. A repressão ao comportamento antagônico à ordem e à paz estabelecida passa a representar a forma de se impor a autoridade do Estadoll

.

Para manter a sua autoridade, o Soberano insere, no ordenamento jurídico, os mecanismos mais bárbaros, não apenas no propósito de punir, mas também, o que é pior, no escopo de descobrir a verdade12

. O corpo do homem, que era o objeto da pena, além de se manifestar como o responsável pelos atos criminosos, transforma-se, de igual forma, no objeto do processo, devendo merecer provações para esclarecer o crime.

Estamos na época dos suplícios. O corpo do agente do crime, diante da necessidade de afirmar-se, pela força, a autoridade do

10 Ob, cit. 11 Jostein Gaarder informa que "durante o Renascimento floresceu também aquilo que charrUJmos

de 'anti-huflUJnismo', Refiro-me com isto a uma 19reja e a um poder estatal autoritários. Durante o Renascimento houveram também processos contra bruxos e bruxas. execuç()es em jiJgueiras. rrUJgia. superstição. sangrentas guerras religiosas e ainda brutal conquista da América. .. (O Mundo de Sofia - Romance da História da Filosofia. trad. João Azenha Jr.. São Paulo, Cia. Das Letras, 1995, pág. 220).

12 Constata-se, no exame da evolução da justiça penal, que o período da vingança pública. em termos de barbárie. representa o período mais sombrio do Direito Penal. sendo comum a morte pela forca. pelo fogo (o condenado era amarrado a um poste. em praça pública, para ser consumido pelas labaredas de fogo, ou imerso em chumbo fundido). por afogamento, a roda (o condenado era amarrado em uma imensa roda, a fim de que os seus membros fossem esmagados. pelo esquarteiamento, decapitação, estrangulamento, enterro em vida. etc.).

WALTER NUNES DA SILVA JúNIOR

soberano, passa a ser p durante o processo, em qu técnica empregada para de com a aplicação da pena, realizado diante da socie, como medida de prevençã, apenas como a forma de pena corporal correspondel

Nada obstante os suplü execução, quando então se do grupo social o suplíci tendo participação o a conhecimento do acusad judiciário privilégio único ( sabia qual era a imputaçi tomados, as provas apurac sendo inocente, de defesa 1

fosse culpado, a ela não te alguns dogmas da concepçii

A forma secreta e eSI estabelecimento da verdadi direito absoluto e poder e; juristas da Renascença d natureza e à eficácia das prc

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11 Na época da concepção política da jl supliciado se insere em primeiro lu verdade do crime." (Vigiar e Punir, 35). MICHEL FOUCAULT realça ( França, apresentando como exceção a

INSTITUIÇÃO TOLEDO DE ENSINO WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR

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bases para o sistema jurídico

as idéias implantadas com o im aplacar a ira dos deuses, paz pública perquirida pelo ento antagônico à ordem e à Lr a forma de se impor a

, o Soberano insere, no ~ mais bárbaros, não apenas o que é pior, no escopo de ornem, que era o objeto da I o responsável pelos atos Irma, no objeto do processo, Irecer o crime.

) corpo do agente do crime, pela força, a autoridade do

I floresceu também aquilo que chamamos greja e a um poder estatal autoritários. :os contra bruxos e bruxas. execuçiies em religiosas e ainda brutal conquista da

ia da Filosofia, trad. João Azenha Jr., São

que o período da vingança pública, em la do Direito Penal, sendo comum a morte a um poste, em praça pública, para ser umbo fundido), por afogamento, a roda (o I fim de que os seus membros fossem 19u1amento, enterro em vida, etc.).

soberano, passa a ser penalizado duas vezes: primeiramente, durante o processo, em que o suplício do corpo com a tortura é a técnica empregada para descortinar a verdade do crime J3

,' depois, com a aplicação da pena, que deve ser corporal, em cerimonial realizado diante da sociedade, para servir de exemplo e atuar como medida de prevenção geral. A prisão era prevista, de regra, apenas como a forma de deter-se o homem para a aplicação da pena corporal correspondente.

Nada obstante os suplícios ao corpo, todo o processo, até sua execução, quando então se fazia importante levar a conhecimento do grupo social o suplício final, permanecia secreto, dele não tendo participação o acusado. O processo não era do conhecimento do acusado, tornando-se o saber do drama judiciário privilégio único e exclusivo da acusação. O acusado não sabia qual era a imputação que lhe era feita, os depoimentos tomados, as provas apuradas. Imperava o entendimento de que, sendo inocente, de defesa o acusado não precisava, enquanto se fosse culpado, a ela não teria direito. Era a influência, ainda, de alguns dogmas da concepção religiosa.

A forma secreta e escrita do processo era de mister ao estabelecimento da verdade, tendo o Soberano e os seus juízes direito absoluto e poder exclusivo para encontrá-la, tratando os juristas da Renascença de desenvolver a doutrina quanto à natureza e à eficácia das provas.

No entanto, alguns pensadores da Renascença, como ERASMO DE ROTERDÃ e MAQUIA VEL, diante das guerras religiosas, da descoberta de novos continentes e dos inevitáveis efeitos econômicos daí decorrentes e dos avanços cientificos da física e da astronomia, percebendo o abalo da mentalidade medieval e a insegurança crítica do Século XVII, passaram a desenvolver idéias interrogando os dogmas, doutrinas e opiniões então aceitas, além de apresentar em respostas mais adequadas a essas inquietações.

I) Na época da concepção política da justiça penal, segundo MICHEL FOUCAULT, "O corpo supliciado se insere em primeiro lugar no cerimonial judiciário que deve trazer à lume a verdade do crime." (Vigiar e Punir, tradução de Lígia M. Pondé Vassalo, Vozes, 1977, pág. 35). MICHEL FOUCAULT realça que, na maior parte dos países europeus, incluindo aí a França, apresentando como exceção a Inglaterra, o processo. até a sentença, era secreto.

115

INSTITUIÇÃO TOLEDO DE ENSINO WALTER NUNES DA SILVA júNIOR116

o Iluminismo, tencionando instaurar o livre-pensamento, hostiliza, sem ser anti-religioso, a fé nos milagres, pondo em dúvidas o historicismo bíblico, não só por suas raízes positivas germinadas dafé nas leis invioláveis da natureza, mas também em razão da desconfiança contra as pessoas que asseveraram a autenticidade da narrativa propugnada pela Igreja.

Desapartando-se do pensamento da Igreja e de Aristóteles, os iluministas se escoram em nova filosofia, difundida por LOCKE e NEWTON. A filosofia dos iluministas parte das leis da natureza, competindo a VOLTAIRE difundir a idéia de que há uma lei - a lei da gravidade de NEWTON - que rege a natureza e o universo inteiro l4

, sendo inviolável, regular e racional, daí porque renega qualquer intervenção sobrenatural no desenvolvimento do mundo. A razão, na filosofia iluminista, é o valor maior dessa idéia, atribuindo-se a HUGO GROTIUS a missão de negar a origem divina do direito natural, percebendo-o como fruto do homem e desenvolvido sob a influência da racionalidade.

Seguindo as idéias desse movimento, CESARE RECCARIA, no final do Século XVIII, com a obra "DOS DELITOS E DAS PENAS", criticando as atrocidades dos sistemas penais existentes, principalmente em virtude da presença da tortura e da pena de morte, inicia a etapa da justiça penal jurídica, fundando o que se denominou Escola Clássica.

Procurou, RECCARIA, difundir a idéia da concepção de um sistema penal embasado na legalidade pura quanto aos crimes e punições, expungindo, assim, o arbítrio do juil5

. Sob a influência de MONTESQUIEU, desenvolve a idéia de que o direito de punir do Estado deve ser limitado pela lei, só podendo ser exercicido dentro dos parâmetros concebidos pela sociedade, que são conhecidos com a feitura da lei 16. Liberdade e legalidade, eis a base da doutrina. A doutrina da legitimidade das leis e o seu papel

" Coube a VOLTAIRE expor as conclusões filosóficas de NEWTON formuladas com base na lei da gravidade.

15 LOCKE queria que o juiz não passasse da boca que pronuncia as palavras da lei (Novos Rumos do sistema Penal Miguel Reale Ir., Forense, pág. 5).

16 VOLTAIRE dizia que o Estado ideal seria aquele em que não obedece senão às leis (Miguel Reate Ir., obra citada).

de preservação da liberdc "ESPIRÍTO DAS LEIS", ROUSSEAU no "CONTR para o desenvolvimento da

Parte do princípio de ql sociedade, com o pacto s com as leis que vão repre portanto, ao Estado, o po castigo merecido, quando, a fim de se restabelecer a aos demais. O direito de lit como espécie de depósito, quando isso for necessári, social. A pena, a despeit Clássica, ainda é encarada c é o mal infligido ao age sociedade.

A obra "DOS DELITOS jurídica, apresentando-se m de direito penal, embasado I pelos iluministas, competinc da Escola Clássica.

Interessa ressaltar que Bl considerado, um grande fil( história, em verdade, sempn despeito dos três maiores maiores filósofos do Século ardorosamente a pena de retributiva da sanção penal, dever do Estado para com a do grupo social, manifestand, "Se ele matou, deve morrer", fosse justa.

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INSTITUIÇÃO TOLEDO DE ENSINO

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WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR 117

de preservação da liberdade, sustentada por MONTESQUIEU no "ESPIRÍTO DAS LEIS", e a do pacto social, defendida por ROUSSEAU no "CONTRATO SOCIAL", servem de supedâneo para o desenvolvimento da tese de BECCARIA.

Parte do princípio de que o indivíduo se compromete, perante a sociedade, com o pacto social, devendo viver de conformidade com as leis que vão representar a vontade de todos, conferindo, portanto, ao Estado, o poder-dever de puni-lo, infligindo-lhe o castigo merecido, quando vier a transgredir as normas de conduta, a fim de se restabelecer a ordem jurídica e servir de prevenção aos demais. O direito de liberdade, com o pacto social, é entregue, como espécie de depósito, ao Estado, que haverá de restringi-la quando isso for necessário para o restabelecimento da ordem social. A pena, a despeito do caráter humanitário da Escola Clássica, ainda é encarada como a retribuição pelo mal praticado: é o mal infligido ao agente em razão do mal provocado à sociedade.

A obra "DOS DELITOS E DAS PENAS" não era propriamente jurídica, apresentando-se mais como espécie de ensaio filosófico de direito penal, embasado no pensamento humanístico defendido pelos iluministas, competindo a CARRARA iniciar a fase jurídica da Escola Clássica.

Interessa ressaltar que BECCARIA não era, nem chegou a ser considerado, um grande filósofo. Aliás, os grandes filósofos da história, em verdade, sempre foram favoráveis à pena capital. A despeito dos três maiores filósofos da Antigüidade, os dois maiores filósofos do Século XVIII, KANT e HEGEL, defenderam ardorosamente a pena de morte. KANT, defendendo a teoria retributiva da sanção penal, assegura que a pena de morte é um dever do Estado para com a segurança dos demais componentes do grupo social, manifestando-se como um imperativo categórico: "Se ele matou, deve morrer", inexistindo qualquer outra pena que fosse justa.

118 INSTITUIÇÃO TOLEDO DE ENSINO WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR

Em que pese a resistência dos grandes filósofos 17,

principalmente quanto à abolição da pena de morte, as idéias da Escola Clássica foram difundidas, ingressando em formalismo contra o qual correntes de pensamento se insurgiram. Reclamava­se que o acusado, mesmo no processo da Escola Clássica, estava ausente do debate judiciário, preocupando-se os juristas com a ocorrência unicamente do fato, para, daí, sem perquirir das questões orgânicas e do meio social do homem delinqüente, aplicar a pena.

Era a nova corrente filosófica, o positivismo, que passava a influenciar também o direito, a partir da primeira metade do Século XIX, tendo como precursor AUGUSTO COMTE, que representou a ascensão da burguesia emergente após a Revolução de 1789, embasada na ciência, na técnica e na industrialização. Representava o otimismo experimentado com a Revolução Industrial e o desenvolvimento das ciências experimentais, contrapostas à metafísica, no pressuposto de que só o conhecimento dos fatos é fecundo, não passando, o dogma da racionalidade, de mera especulação. Com o pensamento positivista, ciências fundamentais adquiriram posição, como a biologia e a sociologia.

Inserido no movimento filosófico positivista, CÉSAR LOMBROSO desenvolveu a tese da antropologia criminal, editando o livro "O HOMEM DELINQÜENTE", defendendo a tese de que o homem não comete o crime pelo fato de fazer essa opção, mas sim porque ele é levado ao crime por um fenômeno biológico. Há homens que já nascem potencialmente delinqüentes, predispostos ao crime, enquanto outros, por um processo de degeneração orgânica, seriam levados à criminalidade. Posteriormente, admitiu que fatores exógenos poderiam impulsionar o homem ao crime, cuidando ENRICO FERRI de expor esse pensamento na sociologia crIminal, defendendo a existência de cinco categorias de delinqüentes: o nato, o louco, o habitual, o ocasional e o passional.

17 Não se pode deixar de registrar que Voltaire foi um grande entusiasta das idéias de Beccaria. Bobbio afirma que grande parte do sucesso do livro de Beccaria se deve ao apoio que foi conferido por Voitaire.

Vinha a pêlo o de biologismo de LOMBRO recaindo em GAROFALO Positiva.

Com esse moviment formalismo jurídico da E com o fato criminoso, d< aplicação da pena, não b subsunção do fato à nom do agente, a fim de identij a pena mais adequada delinqüente, agora, não di processo, mas o objeto d ciências afins, no sentido (

Pune-se o delinqüente porque é preciso defen observada diante do estlli caráter meramente retrib social, podendo ser aplic, como forma de prevenção.

A ocorrência da primei. como as mudanças polítü que essas Escolas recebes1 de conferir tratamento ma abrandar esse tratamento. outras correntes ecléticas, Itália por CARNEVALE, chamada de Positivismo C

18 A aplicação da lei pelo juiz, ainda qUi uma mera operação mecanicista. T( colocação do princípio da legalidad condenações sem lastro normativo, Dos Delitos e Das Penas. Em ou Recaséns Siches quando, com acui esteja jungido ao princípio da inter lei de forma mais suave ou severa I

Porrúa, México, 1973, págs. 231123

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INSTITUIÇÃO TOLEDO DE ENSINO WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR

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Vinha a pêlo o determinismo positivista, embasado no biologismo de LOMBROSO e no fatalismo social de FERRI, recaindo em GAROFALO a fase propriamente jurídica da Escola Positiva.

Com esse movimento, teve-se em mente abandonar o formalismo jurídico da Escola Clássica, preocupando-se menos com o fato criminoso, do que com o homem que o pratica. À aplicação da pena, não basta mais, ao juiz, verificar, apenas, a subsunção do fato à norma, todavia perquirir do comportamento do agente, a fim de identificar a sua periculosidade, aplicando-lhe a pena mais adequada para reprimir a conduta. O homem delinqüente, agora, não deve mais ser encarado como objeto do processo, mas o objeto de estudo cientifico, com o auxílio das ciências afins, no sentido de se perscrutar a sua personalidade/R.

Pune-se o delinqüente não em razão de vindita pública, mas porque é preciso defender a sociedade da periculosidade observada diante do estudo nele feito. A pena deixa de ter o caráter meramente retributivo, para servir de esteio à defesa social, podendo ser aplicada mesmo antes da prática delituosa, como forma de prevenção real.

A ocorrência da primeira e segunda Guerras Mundiais, assim como as mudanças políticas nesse intervalo de tempo, fez com que essas Escolas recebessem algumas mudanças, ora no sentido de conferir tratamento mais severo ao agente do ilícito, ora para abrandar esse tratamento. Nessa confluência de idéias, surgiram outras correntes ecléticas, merecendo destaque a difundida na Itália por CARNEVALE, denominada Terceira Escola, também chamada de Positivismo Crítico, em que se pretende conciliar o

18 A aplicação da lei pelo juiz, ainda que na seara criminal. não pode ser. como defendia Beccaria, uma mera operação mecanicista. Tem-se de entender que Beccaria pensava em leis claras e a colocação do princípio da legalidade como dogma penal, com o firme propósito de põr fim a condenações sem lastro normativo, como era bem próprio na época em que escreveu o livro Dos Delitos e Das Penas. Em outra perspectiva, não se pode deixar de conferir razão a Recaséns Siches quando, com acuidade, expõe que, em matéria penal, nada obstante o juiz esteja jungido ao princípio da interpretação estrita, pode e deve, consoante os fatos, aplicar a lei de forma mais suave ou severa (Nueva Filosofia de La Interpretación Del Derecho, Editor POITÚa, México, 1973, págs. 2311232).

119

I

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positivismo e o classicismo, para daí extrair um direito penal mais consentâneo ao combate à criminalidade.

Na Alemanha, a doutrina liderada por VON LISZT, em crítica profunda ao positivismo jurídico, dá origem à Escola Moderna, tendo em mira separar o direito penal da criminologia, reservando àquele a pesquisa dogmática das normas jurídicas penais, por meio da lógica, concebendo o crime como um fato jurídico, mas não se descurando de que quem o pratica é o homem, possuindo, portanto, aspectos de ordem humana e social.

. Outras Escolas ainda se formaram. Algumas representando o neoclassicismo, outras o neopositivismo. Dentre elas, destacou-se a Escola do Tecnicismo Jurídico-Penal, que teve como expoentes VICENTE MANZINI e ARTURO ROCCO, exercendo forte influência sobre o Direito Penal brasileiro, defendendo que os juristas deveriam se afastar dos assuntos metajurídicos, debruçando-se no estudo do direito positivo em si, com a finalidade de interpretar e aplicar as normas penais, partindo de princípios e do conceito de bem jurídico por elas formulado.

Contudo, durante todo esse tempo, estava em formação uma nova corrente de pensamento, que, mais tarde, veio a sedimentar­se sob a roupagem da Escola da Nova Defesa Social. Com efeito, já no ano de 1910, em obra intitulada "A DEFESA SOCIAL E AS TRANSFORMAÇÕES DO DIREITO PENAL", ADOLPHE PRINS defendia que a função do direito penal não seria retribuir o mal produzido pelo fato ilícito, e sim objetivar a defesa da sociedade, o que só seria possível, no seu pensamento, substituindo-se a noção de responsabilidade moral pelo critério da periculosidade do delinqüente.

A idéia do Direito Penal como forma de defesa social, em que a preocupação deveria ser com o homem que pratica o ilícito, no sentido de aplacar a sua delinqüência, que estava presente na Escola Positiva, de há muito era sentida pelos filósofos, havendo menção ao pensamento de PLATÃO, segundo o qual a sanção não deveria se preocupar com o passado, pois ele não poderia mais ser recuperado, mas sim com o futuro.

Posteriormente, após a intenso movimento refon colocando-se o positivism pecha de ser o grande resI nazismo e do fascismo. A redirecionamento dos direi chegando-se a propagar a i lei que se apresentasse inJ

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INSTITUIÇÃO TOLEDO DE ENSINO

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W ALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR 121

Posteriormente, após a Segunda Guerra Mundial 19, operou-se

intenso movimento reformista, ressurgindo o direito natural, colocando-se o positivismo jurídico no banco dos réus, sob a pecha de ser o grande responsável pelas atrocidades jurídicas do nazismo e do fascismo. A crise surgida no pós-guerra suscitou o redirecionamento dos direitos naturais impostergáveis, absolutos, chegando-se a propagar a idéia de que nenhuma jurisprudência ou lei que se apresentasse injusta, ou, ela própria, delitiva, poderia servir de fundamento para que o juiz decidisse uma causa.

A valoração formal da lei não poderia, em tempo algum, ser obstáculo à consecução da justiça20, que deveria pairar acima da proposição normativa, devendo, o direito, se conformar com esta e não com aquela. A lei, por conseguinte, deixaria de ter um valor em si mesma, carecendo de confronto com a justiça que dela deve promanar, sob pena de não se confortar com os ditames do direito.

4. ESCOLA DA NOVA DEFESA SOCIAL

Esse movimento filosófico reformista da valoração do direito deu origem à difusão dos direitos humanos, ao pensamento alternativo, e a uma nova Escola de Direito Penal, a Escola da Defesa Social, com suporte na nova corrente filosófica que se instaurava: o existencialismo.

A filosofia existencialista, inspirada em KIERKEGAARD, ganha fôlego após a Segunda Guerra Mundial, tendo como líder o Francês PAUL SARTRE, sustentando que não há valores ou regras eternas e absolutas e que o homem é livre para fazer a escolha quanto ao seu agir, e essa liberdade o torna responsável pelo que faz, não podendo eximi-la pelo argumento da submissão. As normas de condutas são, e devem ser, flexíveis, de modo que o

19 Eric Hobsbawn mostra que o Século XX foi excessivamente marcado pelas duas maiores guerras já registradas na Terra, em que não apenas as grandes potências se envolveram, mas praticamente todos os países, influenciando decisivamente nos sistemas políticos (Era dos Extremos, O breve Século XX-1914-1991, São Paulo, Cia. Das Letras, 1995).

20 O Francês Jean Cruet, já em 1908, alertava que o juiz não é a boca que pronuncia a vontade da lei, pois ele tem função criadora, não tendo a norma o condão de encerrar o direito (A vida do Direito e a Inutilidade das Leis, Tipografia José Bastos, Lisboa).

INSTITUIÇÃO TOLEDO DE ENSINO 122

homem possa direcionar o seu comportamento pelo senso de responsabilidade.

Os excessos desumanos praticados antes e durante a Segunda Guerra Mundial, declarados, no processo de Nuremberg, sob a noção de "crime contra a humanidade ", que tanta indignação para este Século legou, suscitaram nos homens da ciência penal, com fulcro no existencialismo, a necessidade de repensar o problema penal, procurando enxergá-lo, agora, não sob o aspecto apenas referente ao homem delinqüente e ao campo do direito penal, mas encará-lo como fenômeno social. O problema não seria propriamente criminal, e sim social, inserindo-se, aí, o direito criminal como um, e não como o único, instrumento de defesa social.

FILIPO GRAMATICA tratou de levar a conhecimento essas novas idéias, criando, em Gênova, no ano de 1945, um Centro de Estudos de Defesa Social, vindo a sedimentar, com seus escritos, a teoria da Defesa Social, que, da crítica construtiva dos seus adeptos, originou a Escola da Nova Defesa Social, representada nessa fase, pelo Francês MARC ANCEL , sob forte influência do existencialismo, mediante a obra fundamental "A NOVA DEFESA SOCIAL".

A Escola da Nova Defesa Social, que se situa como doutrina sedimentada no Século XX, tendo como suporte as correntes filosóficas de agora, sente que o penalista não pode mais, para apresentar solução à problemática inerente ao fenômeno criminoso, ser simplesmente jurista, tratando abstratamente dos fundamentos legais aplicáveis à responsabilidade ou aos elementos jurídicos do delito. Deve, contudo, ter em mente que não pode, ele, o penalista, ser substituído, nessa tarefa, pelo médico, pelo sociólogo e pelo psicólogo, pois a criminologia moderna necessita examinar a ação criminosa com o concurs(} de todas as ciências humanas.

O sistema penal há de ser concebido de modo que leve em consideração a realidade humana e social, não ficando dissociado dessas circunstâncias, sob pena de não apresentar solução eficaz à criminalidade. Os dogmas jurídicos devem ser postos de lado,

W ALTER NUNES DA SILV A JÚNIOR

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INSTITUiÇÃO TOLEDO DE ENSINO

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WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR 123

percebendo-se que o direito criminal, como ciência do direito, e principalmente por seu campo de ação, atua na área em que não há absolutismos, mas sim verdades relativas.

Os únicos dogmas que devem nortear o caminhar da justiça criminal, se é que se pode admiti-los como tais, são apenas a prevenção do crime e a busca da reinserção social do agente que comete o ilícito, tendo presente, na aplicação dos instrumentos necessários a esses fins, o respeito à dignidade da pessoa humana.

A Nova Defesa Social, assim, é uma carta de intenções de política legislativa, judiciária e executiva, em relação ao crime, diante da concepção de que a ciência penal moderna não pode prescindir da criminologia, que se preocupa com o estudo do fenômeno criminal; do Direito Penal, que se ocupa em sistematizar as normas jurídicas com as quais a sociedade se prontifica a combater o fenômeno delituoso, e, por fim, da política criminal, que deve ser, a um tempo, ciência e arte, instrumento que deve servir de bússola ao legislador na elaboração das leis criminais, ao juiz no seu processo de aplicação e à administração penitenciária na execução da determinação judicial.

Pode-se definir a Escola da Nova Defesa Social como o conjunto de idéias, de ordem política, orientadoras dos Poderes Constituídos do Estado no tratamento a ser dispensado no combate à criminalidade. É a política criminal a ser desenvolvida no que pertine ao fenômeno criminal, inserido no contexto social.

Aqui, abandona-se a idéia do caráter retributivo da pena, vendo-se a sanção apenas como o meio de se preservar a ordem social, devendo ser aplicada na proporção em que for necessária. Não é a hediondez do crime, efetivamente, que vai determinar a espécie ou quantidade da pena, mas sim a personalidade delinqüente que foi examinada durante o processo.

Propõe que, de uma vez por todas, o acusado seja chamado para o processo, não como o classicismo, timidamente fez, no sentido de conhecer a acusação e se defender, muitos menos dentro da aspiração positivista, que foi para tê-lo como objeto de estudo, porém para que se conheça a sua personalidade.

j

124

I

INSTITUIÇÃO TOLEDO DE ENSINO

Pois, para a Nova Defesa Social, o crime é um fato humano, ou melhor, a expressão da personalidade do seu autor, que deve ser reprimido em virtude da necessidade de segurança social, mas, em nome dela mesma e para prevenir outros ilícitos, a sanção deve ter o caráter de tratamento, aplicando-se, por isso mesmo, indistintamente, tanto ao imputável quanto ao inimputável.

Os delinqüentes devem ser classificados, mas não nos moldes preconizados pela Escola Positivista, e sim dentro da perspectiva de que o agente do ilícito, nafase da aplicação da pena, há de ser conhecido pelo juiz, a fim de que a pena que lhe seja aplicada se apresente consentânea com as necessidades da imposição da sanção, de conformidade com as peculiaridades que o levaram ao cometimento do ilícit021

.

A pena é dotada de medidas curativas e educativas, devendo-se aplicar, aos adultos, a mesma ordem de idéias que levaram a se cuidar do menor com medidas sócio-educativas, sendo mais espécie de tratamento do que de punição. Nesse passo, penso, está o ponto alto da Escola em foco, quando MARC ANCEL, após dizer que "Num sistema renovado de política crimina, ao contrário, o juiz deve poder fazer uso da sanção repressiva, mesmo quando, como ocorre com relação aos menores, situamo­nos no âmbito normal da sanção educativa,,22, acrescenta que, assim como não deve mais haver diferença entre pena e medida de segurança, as medidas sócio-educativas do menor, que primeiramente foram ejetadas do direito penal dos adultos, criando-se o direito do menor delinqüente, manifestam-se como "a prefiguração do direito penal de amanhã,,23, de forma que esse "mesmo método, realista e humano, que tão magmficamente renovou a organização da reação contra a delinqüência juvenil, seja amanhã aplicado, mutatis mutandis, em relação ao

21 o problema Criminológico. a ser pesquisado no processo antes de se proferir a sentença, não consiste na forma simplista de enquadrar o agente do delito em uma das diversas categorias de delinqüentes preestabelecidas, mas sim a pesquisa efetiva das peculiaridades do caso, no desiderato de saber porque o homem que está sendo julgado, diante das circunstãncias presentes, aliadas aos seus antecedentes e específica constituição biológica, se compol1ou de forma cri minosa.

22 Ob. cit., pág. 301. 23 Ob. cit., pág. 357.

W ALTER NUNES DA SILV A JÚNIOR

delinqüente adulto, e part ,,24Ie es.

Essa Escola da Nova D consentânea com as novas de paradigma às orientaçõ, de Direito Penal. Não se d movimento da Lei e da 01 que tem como lema o tr como única forma de encontrado campo fértil criminoso e vem ganhando

5. CONCLUSÃO

GIUSEPPE BETTIOL c uma filosofia, e que, a racionalidade dessa afirma Penal nasceu como filos( RADBRUCH, até o final romanisticamente, como conseguinte, até então, o ql uma filosofia sobre as que ser objeto desse ramo do D

Realmente, os problema natureza da pena, dos fins c morte, sempre foram objet filósofos da história.

Evidentemente que essa preciso reconhecer que e porquanto são examinados em critérios da razão, com I

Ainda hoje assanha a illi explicativas à legitimação penais e, primacialmente, q

24 Ob. cito

INSTITUiÇÃO TOLEDO DE ENSINO WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR

:rime é um fato humano, ou do seu autor, que deve ser e segurança social, mas, em )S ilícitos, a sanção deve ter ia-se, por isso mesmo, mto ao inimputável.

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7S e educativas, devendo-se te idéias que levaram a se io-educativas, sendo mais io. Nesse passo, penso, está lndo MARC ANCEL, após de política crimina, ao

rso da sanção repressiva, ção aos menores, situamo­

· ,,22lca tlva ,acrescenta que, -ença entre pena e medida 'ucativas do menor, que ireito penal dos adultos, ente, manifestam-se como

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tra a delinqüência juvenil, itandis, em relação ao

:so antes de se proferir a sentença. não Ielito em uma das diversas categorias de :fetiva das peculiaridades do caso, no Ido julgado, diante das circunstâncias :onstituição biológica, se comportou de

delinqüente adulto, e particularmente a certas categorias dentre eles. ,,24

Essa Escola da Nova Defesa Social é a que se apresenta mais consentânea com as novas idéias de ordem penal, até porque serve de paradigma às orientações da AIDP - Associação Internacional de Direito Penal. Não se deve deixar de reconhecer, porém, que o movimento da Lei e da Ordem, preconizado nos Estados Unidos, que tem como lema o tratamento mais severo aos criminosos como única forma de arrefecer o ímpeto delinqüente, tem encontrado campo fértil no tratamento passional do fenômeno criminoso e vem ganhando fôlego.

S. CONCLUSÃO

GIUSEPPE BETTIOL diz, sem rodeios, que o Direito Penal é uma filosofia, e que, ainda que não se queira admitir a racionalidade dessa afirmação, não se pode negar que o Direito Penal nasceu como filosofia, pois, consoante também adverte RADBRUCH, até o final do Século XVII, foi considerado, romanisticamente, como uma parte do Direito Civil. Por conseguinte, até então, o que se tinha não era a ciência penal, mas uma filosofia sobre as questões que, posteriormente, passaram a ser objeto desse ramo do Direito.

Realmente, os problemas do fundamento do direito de punir, da natureza da pena, dos fins da sanção, da licitude ou não da pena de morte, sempre foram objeto de meditação por parte dos grandes filósofos da história.

Evidentemente que essas questões têm caráter jurídico, mas é preciso reconhecer que esses assuntos têm raízes filosóficas, porquanto são examinados e procuradas as soluções com suporte em critérios da razão, com caráter e valor universais.

Ainda hoje assanha a mente dos filósofos perquirir concepções explicativas à legitimação do Estado na aplicação de sanções penais e, primacialmente, quanto à definição dos limites do direito

24 Ob. cit.

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de punir. Hodiernamente, os direitos fundamentais assegurados ao homem, positivados com base nas idéias do direito natural, demonstram a preocupação em preservar o homem contra os poderes punitivos de que se arvora o Estado.

Embora os filósofos de agora, em sua maioria, diferentemente do passado, condenem a pena de morte, diversos países recalcitram em humanizar os seus sistemas penais, a exemplo dos Estados Unidos. A pena de morte é tema do qual se ocuparam os principais filósofos da história, desde a Antigüidade, até mesmo os filósofos contemporâneos, como DEL VECCHIO, RADBRUCH, BOBBIO e tantos outros de igual expressão cultural.

Os fundamentos da sanção penal em si continuam a despertar a atenção de boa parte dos pensadores contemporâneos, sendo auspicioso constatar que tem merecido acolhimento a tese de que o agir a ser regulado pelo sistema penal deve ser tão-somente aquele cujo disciplinamento na seara dos demais ramos do direito não se mostre eficiente para ordenar o comportamento. Tem-se verificado consistente movimento no sentido de descriminalizar e despenalizar, diante da concepção de que a pena de prisão, a grande substituta da pena de morte, defendida por BECCARIA no final do Século XVIII, não cura, corrompe.

O grande desafio a ser enfrentado pelos filósofos é pensar em forma de punição que, a um tempo, sirva de aparelho de contenção de criminalidade e seja eficiente no tratamento curativo daquele que se desviou das normas de conduta vigentes na sociedade na qual ele está inserido.

Quanto a esse problema fundamental, a filosofia ainda não apresentou ao Direito Penal a solução, menos por ineficiência do que pela complexidade da questão, que não é estática, pelo contrário complexamente variável, muito embora as proposições feitas por MICHEL FOUCAULT, no livro Vigiar e Punir, devam ser levadas em consideração em qualquer programa que tenha em mente a previsão de sanções penais na implementação da política criminal firmada nos estudos da Escola da Nova Defesa Social.

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lamentais assegurados ao léias do direito natural, var o homem contra os do.

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WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR 127

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Importante não esquecei o homem não quer apenas o homem vi ve, e alimenta ( sempre buscado como re exatamente, como o fim homem, está o bem, que Metaphysica Generalis, o ( perfeito e portanto desl concretizado.

Dentro de tal posiciona quanto se dá realce, na dis força ordenadora da Ética, parece ser o seu bem, en homem se revela aos outr9S

Em artigo publicado j: quando se propõe a dizer I seu art. 30, exatamente, qua precisos termos há de volt; justa e solitária, onde se gé um trabalho eficaz pai marginalização, e conseqü~

e regionais, destinada, pois