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O Sinal do “Formigamento”- nas Lesões dos Nervos Periféricos Por J. TINEL (1915) La Presse Médicale, jeundi, 7 Octobre 1915. Tradução Livre de Nelson Mattioli Leite (2005) Dissemos que muitas vezes é muito difícil fazer um diagnóstico preciso em lesões dos nervos periféricos. Há uma secção do nervo, compressão, laceração ou irritação? o nervo está ou não em vias de regeneração? O neuroma percebido à palpação é permeável ou não aos axônios ? A sutura de um nervo foi ou não bem sucedida? Tantos problemas que se colocam ao clínico a cada dia, cuja importância é capital do ponto de vista do prognóstico e do tratamento. Nós pensamos que o estudo sistemático do formigamento provocado pela pressão do nervo, pode aportar uma ajuda preciosa na solução destes problemas. *** La pressão de um tronco nervoso lesado produz em seguida a impressão de formigamento, referido pelo indivíduo na periferia do nervo e localizado por ele em um território cutâneo bem preciso. O que importa é diferenciar este formigamento da dor , que às vezes, igualmente é provocada pela pressão sobre um nervo traumatizado. A dor é um sinal de irritação neu rítica; o formigamento é um sinal de regeneração; ou mais exatamente o formigamento traduz a presença de axônios jovens, em via de crescerem. A dor de irritação neurítica é quase sempre uma dor local, percebida no ponto em que se exerce a pressão sobre o nervo. Nos casos onde ela irradia sobre todo o trajeto do nervo, ela existe ao mesmo tempo que, e mais viva, no ponto comprimido. Ela irradia por todo o trajeto do nervo, ela existe quando mesmo é mais viva no ponto comprimido. Ela coexiste sempre um pouco perto com uma dor à pressão das massas musculares e muitas vezes os músculos são mais dolorosos do que o nervo. O formigamento de regeneração não é doloroso; é uma sensação vagamente desagradável que os doentes comparam habitualmente a aquela de eltricidade. Ele é percebido no ponto comprimido e um pouco mais sentido no território cutâneo correspondente. Os músculos vizinhos do nervo que “formiga” não são dolorosos.

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O Sinal do “Formigamento”- nas Lesões dos Nervos PeriféricosPor J. TINEL (1915)La Presse Médicale, jeundi, 7 Octobre 1915.

Tradução Livre de Nelson Mattioli Leite (2005)

Dissemos que muitas vezes é muito difícil fazer umdiagnóstico preciso em lesões dos nervos periféricos. Há umasecção do nervo, compressão, laceração ou irritação? o nervoestá ou não em vias de regeneração? O neuroma percebido àpalpação é permeável ou não aos axônios ? A sutura de um nervofoi ou não bem sucedida? Tantos problemas que se colocam aoclínico a cada dia, cuja importância é capital do ponto de vista doprognóstico e do tratamento.

Nós pensamos que o estudo sistemático do formigamentoprovocado pela pressão do nervo, pode aportar uma ajudapreciosa na solução destes problemas.

***La pressão de um tronco nervoso lesado produz em seguida

a impressão de formigamento, referido pelo indivíduo na periferiado nervo e localizado por ele em um território cutâneo bempreciso.

O que importa é diferenciar este formigamento da dor , queàs vezes, igualmente é provocada pela pressão sobre um nervotraumatizado. A dor é um sinal de irritação neu rítica; oformigamento é um sinal de regeneração; ou mais exatamente oformigamento traduz a presença de axônios jovens, em via decrescerem.

A dor de irritação neurítica é quase sempre uma dor local,percebida no ponto em que se exerce a pressão sobre o nervo.Nos casos onde ela irradia sobre todo o trajeto do nervo, elaexiste ao mesmo tempo que, e mais viva, no ponto comprimido.Ela irradia por todo o trajeto do nervo, ela existe quando mesmo émais viva no ponto comprimido. Ela coexiste sempre um poucoperto com uma dor à pressão das massas musculares e muitasvezes os músculos são mais dolorosos do que o nervo.

O formigamento de regeneração não é doloroso; é umasensação vagamente desagradável que os doentes comparamhabitualmente a aquela de eltricidade. Ele é percebido no pontocomprimido e um pouco mais sentido no território cutâneocorrespondente. Os músculos vizinhos do nervo que “formiga” nãosão dolorosos.

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Esses dois tipos de fenômenos provocados pela pressão donervo, a dor e o formigamento, são fáceis de diferenciar empraticamente todos os casos. Eles coexistem raramente sobre omesmo nervo, ou mais exatamente, eles coexistem maisraramente sobre um mesmo ponto do nervo em questão; porquenós veremos que eles poderão se suceder sobre um mesmotronco nervoso.

Esses dois Sinai diferentes provocados pela pressão donervo são superponíveis aos sintomas sensitivos que revela aexploração da pele. A irritação neurítica se acompanha muitasvezes, com efeito, de uma hiperestesia dolorosa cutânea; aregeneração do nervo se traduz pelas parestesias, de tipo maisconstante, é a sensação suficientemente fatigante deformigamento, associada à de hipoestesia e provocada pelotoque, à picada e sobretudo pelo roçar leve da pele.

Em todos os casos, os sintomas provocados pela pressãodo nervo, a dor que traduz a irritação de axônios ou formigamentoque demonstra sua regeneração, são muito mais fáceis dedistinguir um do outro, do que os sinais de sensibilidade cutânea.Eles são também muito mais constantes, muito mais precoces;eles fornecem as informações muito mais precisas, mais fixas emais importantes. ***

O estudo sistemático do formigamento provocado pelapressão do nervo permite muitas vezes:

dar-se conta se a interrupção do nervo é completa ouincompleta;

determinar o local exato e ampliado da lesão;descobrir de maneira precoce a regeneração dos axônios,

de seguir a sua evolução e importância.Vejamos exemplos de diferentes casos:1o - nas secções nervosas completas constatamos no trajeto

do tronco nervosos uma zona muito clara onde a pressãodetermina formigamento no território cutâneo do nervo. Esta zonade formigamento é pouco estendida: ela não passa de 2 a 3centímetros; ela é permanente, absolutamente fixa; ela persisteidêntica por semanas ou meses. Ela ocorre somente sobre otrajeto nervoso e a gente não a observa, nem acima nem abaixoda lesão, nem noutro ponto onde a pressão possa provocarformigamento. Esta zona indica que neste ponto preciso, osaxônios, bruscamente interrompidos, desenvolvem regeneraçãolocal, e que estão impedidos de transpor o obstáculo ou

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recuperara o segmento periférico. Eles se embolam em umneuroma mais ou menos volumoso.

2o – nas interrupções completas do nervo, par umacompressão muito intensa, as mesmas características de fixação,de permanência e de limitação precisa, são reencontradas; mas azona de formigamento é mais estendida; ela pode encontrar-se 6,8, 10 cm ou mais no trajeto do nervo. Por exemplo, nascompressões freqüentes do nervo radial por fratura do úmero,podemos na pesquisa do formigamento provocado, seguir todo otrajeto do nervo preso no calo ósseo; poderemos saber se o nervoestá preso em todo o comprimento do calo ósseo, ou se o nervoencontra-se interrompido na parte superior ou inferior da fratura.

Observa-se que num calo ósseo a simples pressão donervo dificilmente determinada o formigamento; o obtemos pelapercussão leve do calo. Em todo caso, se a zona de formigamentopermanece fixa e não transpõe os limites inferiores doaprisionamento ósseo e assim permanece por semanas, sem quepossamos encontrar abaixo da lesão o sinal de formigamentoprovocado do nervo, é que a compressão lhe causou constricçãomuito intensa e os axônios estão interrompidos e não conseguemtranspassá-la.

3o – podemos, em certos casos encontrar em um mesmonervo dois locais diferentes de formigamento provocado,correspondente a duas lesões superpostas.

Por exemplo, vimos dois pacientes com paralisia radial,causadas por ferimento por arma de fogo na parte superior dobraço. Existia uma primeira zona de formigamento sobre o nervoradial, ao nível da saída da bala, na face posterior do braço, emais uma segunda zona, mais estendida, sobre a face lateral domembro, ao nível de um calo ósseo exuberante; estas duas zonasencontravam-se fixas e limitadas, sem qualquer sinal deformigamento provocado abaixo do calo ósseo. Na intervençãocirúrgica observou-se que o nervo encontrava-se parcialmentedestruído pela passagem da bala e que aquela fibras nervosasque escaparam desta destruição foram comprimidas mais abaixopelo calo fraturário.

Pudemos observar o formigamento parcial do nervo. Apressão do ciático, por exemplo , pode mostrar uma lesão limitadade sua parte externa ou interna, muitas vezes a sensação deformigamento se localiza no território cutâneo do ciático poplíteoexterno ( fibular comum) ou ciático poplíteo interno (nervo tibial).

Outro exemplo: um homem teve paralisia do ciático porferimento de arma de fogo na parte média da coxa e apresentava

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formigamento duplo: a pressão do nervo ao nível do ferimentodeterminou um formigamento na planta do pé, melhor dizendo, noterritório do ciático popliteo interno, mas em outra parte a pressãodo nervo abaixo da lesão mostrou, em uma superfície bastanteestendida, que progressivamente chegou ao cavo poplíteo,seguindo-se em uma zona de formigamento localizada sobre osdedos do pé, no território do nervo ciático poplíteo externo (nervofibular). Existia neste caso, em uma parte, uma interrupçãocompleta da parte interna do ciático , com formigamento fixo; enoutra parte , uma interrupção incompleta da parte externa donervo, com progressão dos axônios regenerados, quecaminhavam na direção da fossa poplítea a partir da zonaprovocativa inicial de formigamento.

4o –com efeito, as interrupções incompletas do nervo, oumais exatamente, as lesões que permitem a passagem dosaxônios regenerados, se caracterizam pela extensão progressivada zona de formigamento provocado.

Vemos, por conseqüência, o formigamento aparecer abaixoda lesão e progressivamente dirigir-se à periferia, no trajetonervoso. Um nervo que formiga abaixo da lesão é um nervo queregenera, parcial ou totalmente. Podemos semanalmente seguirdesta forma a progressão dos axônios, podemos observar arapidez da restauração do nervo; podemos sobretudo julgar suaimportância, pela intensidade do formigamento provocado eestendido no território cutâneo ou onde ele se manifesta.

É o mesmo para as suturas nervosas, onde podemos pelaconstante progressão da zona de formigamento, julgarrapidamente o sucesso, maior ou menor, da intervenção cirúrgica.

A medida que a zona de formigamento se estende e seacentua em direção à periferia, ela diminui e terminadesaparecendo completamente da região traumatizada. Ela sedesloca excentricamente sempre conservando uma extensãoconsiderável.

É sempre necessário explorar o nervo em todo seu trajeto.Examinamos um homem portador de uma paralisia completa dociático; o ferimento, na parte superior da coxa ocorrera há cincomeses; a paralisia era total, se bem que o tônus muscular não foitotalmente abolido e a zona de anestesia era um pouco reduzida.Nós encontramos sobre o ciático, inutilmente, ao nível e abaixo dalesão , uma zona de formigamento provocado, e nós nosperguntamos se aquela ausência não era um mau prognóstico.Mas ao contrário, o formigamento se recuperava muito abaixo,nos ramos do nervo, ao nível do cavo poplíteo e na parte média

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da perna; conseqüentemente tratava-se de um nervo em vias derestauração bastante avançada; constatamos rapidamente umarestauração da contratilidade farádica naqueles facículosmusculares dos gêmeos, peroneiros e tibial anterior.

5o – A mesma extensão progressiva da zona deformigamento se encontra nas interrupções incompletas comirritação neurítica. Parece que às vezes, muito raramente, osfenômenos de irritação e de regeneração podem se associar nomesmo nervo.; a interpretação é bastante difícil. Entretanto, emgeral o sujeito acusa, nos neuríticos, a irradiação de umentorpecimento doloroso ou mesmo de comichão, muito penosos,ou mesmo a sensação de um verdadeiro formigamento.

Mas, na maior parte dos casos, o formigamento substitui ador neurítica provocada por pressão do nervo; ele a expulsa desua frente. A medida que desce a zona de formigamento, o tronconervosos e os músculos da vizinhança deixam de ser dolorosos;trazemos como exemplo um ciático que tornou-se indolor, formigaà pressão da coxa, e então os nervos e massas musculares daperna são agora dolorosos.

***É fácil de dar-se conta, por estes exemplos, dos serviços

que podem tornar o sinal do formigamento provocado. Diremosque que a pesquisa sistemática deste sintoma não pode , dequalquer maneira, dispensar o exame minucioso dos achadosmotores, elétricos, sensitivos e tróficos. Eles vêm simplesmenteassociar-se, e não fazem na maior parte dos casos, nada maisque confirmar e precisar os achados clínicos já fornecidos por esteexame.

Será lamentável atribuir ao sinal do formigamento umaimportância exagerada, que pode faltar alguma vez, e visto emcertas condições:

1o – o formigamento provocado pela pressão do nervo nãoparece curado abntes da quarta ou mesmo sexta semana, a partirdo traumatismo. Dizemos que toda lesão nervosa, secção oucompressão, se traduz por uma primeira fase de degeneração:degeneração descendente walleriana, se prolonga até aterminação nervosa; degeneração ascendente ou retrógrada quese não passa , em geral, algum segmento do nervo, mas que,mesmo muito limitada, se acompanha de perturbações muitoprofundas das células de origem do nervo. É somente depoisdesta primeira fase degenerativa, que se produz a fibrilação dosaxônios do segmento central, seu brotamento e seu crescimento.Parece que no homem esta fase de regeneração não aparece

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antes de três a quatro semanas; ela é, de resto, mais ou menosprecoce ou tardia conforme a idade, a vitalidade, estado de saúdee das faculdades regenerativas de cada indivíduo.

É este período de neoformação dos axônios que parececorresponder à aparição do formigamento provocado.

2o – o formigamento desaparece desde que o nervo tenhase reposto à condição normal e que os axônios neoformadosencontram-se em estado adulto. É em geral por um período deoito a dez meses que parece cessar o formigamento; grandesvariações se observam naturalmente entre os indivíduos, aslesões e o comprimento do nervo a regenerar. Nós já observamosque o formigamento desaparece de modo excêntrico e se espalhaprogressivamente em direção à periferia do nervo.

3o – finalmente, o formigamento pode faltar naquelesraros casos, for a dos limites de início ou fim que nós acabamosde expor. É nos casos que a lesão é muito leve e que ela nãocausou nenhuma destruição profunda das fibras nervosas; ou aocontrario porque ele não teve qualquer regeneração, como vemosàs vezes em indivíduos idosos, doentes ou infectados comnutrição profundamente perturbada.

O formigamento provocado não se constitui de um sinalabsolutamente constante , fixo e de interpretação sempre fácil. Elenão pode dispensar de nenhum modo o exame minucioso erepetido do paciente. Ele não pode ter valor a não ser associadoa todos outros sintomas clínicos.

Mas com todas estas reservas, o formigamento nos parececomo suscetível a esclarecer algumas vezes certos problemas dediagnóstico neurológico e de fornecer as indicações precisas parao prognóstico e o tratamento das lesões nervosas periféricas.