texto.08.küng.ethos.mundial

Upload: leo-santana

Post on 02-Mar-2018

212 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

  • 7/26/2019 Texto.08.Kng.ethos.mundial

    1/19

    H AN S K N G

    Para q u e um

    t o s

    mund i a l

    Religio e tica

    em tempos de globalizao

    CONVERSANDO COM J RGE N HOE RE N

    TRADUO

    Alfred J . Keller

    ~

    ies oyo a

  • 7/26/2019 Texto.08.Kng.ethos.mundial

    2/19

    Pre fc io

    De cl ar ao d ia nte d o p le nrio das Naes Unidas

    Confrontadas com as confuses atuais, muitas pessoas se

    perguntam: o sculo XXI ser realmente melhor do que foi o

    sculo XX, cheio de violncia e guerras? No sculo XX deixamos

    de aproveitar trs chances de criar uma nova ordem mundial:

    Em 1918, depois da Primeira Guerra Mundial, por causa

    da

    realpolitik

    europia;

    Em 1945, depois da Segunda Guerra Mundial, por causa

    do stalinismo;

    Em 1989, depois da reunificao alem e da Guerra do

    Golfo, por causa da falta de viso.

    Passaremos a apresentar a viso de um novo paradigma de

    relaes internacionais que toma em considerao, tambm, os

    novos agentes da conjuntura global.

    Em nossos dias, as religies se apresentam novamente como

    agentes da poltica mundial.

    verdade que as religies, no decorrer

    da histria, mostraram por demais o seu lado destrutivo. Provo-

    caram e legitimaram dio, inimizade, violncia e at guerras. Mas,

    em muitas ocasies, inspiraram e legitimaram tambm o entendi-

    mento, a reconciliao, a c ooperao e a paz. Nas ltimas dcadas

    aumentou mundialmente o nmero de iniciativas visando o di-

    logo e a colaborao entre as religies.

    7

  • 7/26/2019 Texto.08.Kng.ethos.mundial

    3/19

    Para que um ethos mundial?

    Durante esse dilogo, as religies do mundo redescobriram

    uc os eus prprios princpios ticos apiam e aprofundam os va-

    I res ticos seculares que seencontram na Declarao Geral dos

    Direitos Humanos. No Parlamento das Religies Mundiais, reali-

    zado em Chicago em 1993, mais de 200 representantes de todas

    as religies mundiais definiram, pela primeira vez na histria, o

    eu consenso acerca de determinados valores, padres e posiciona-

    mentos ticos comuns como base de um ethos mundial que, de-

    pois, foram includos no relatrio de nosso grupo de especialistas

    destinado ao secretrio geral e ao plenrio das Naes Unidas.

    Qual , afinal, a base de um ethos mundial que possa ser comparti-

    lhado por pessoas de todas asgrandes religies e tradies ticas?

    Em primeiro lugar, o princpio da humanidade: Todo ser

    humano - seja homem ou mulher, branco ou negro, jovem ou

    velho - deve receber tratamento humano . Mais claro ainda

    fica esse princpio na expresso da regra de ouro da reciproci-

    dade: O que voc no quer que faam com voc, tambm no

    deve fa z lo aos outros. Os princpios se desdobram em quatro

    mbitos conclamando todos os homens, todas as instituies e

    todas as naes a assumirem a sua responsabilidade:

    Por uma cultura da no-violncia e do respeito a toda

    a vida;

    Por uma cultura da solidariedade e uma ordem econ-

    mica justa:

    por uma cultura da tolerncia e uma vida de veracidade:

    por uma cultura de igualdade de direitos e de compa-

    nheirismo entre homem e mulher.

    Justamente na era da globalizao se faz absolutamente

    necessrio um ethos global dessa natureza. Pois a globalizao

    da economia, da tecnologia e das comunicaes leva tambm

    no mundo todo a uma globalizao dos problemas que amea-

    am esmagar-nos: so os problemas ambientais, a tecnologia

    nuclear e a engenharia gentica, mas tambm o crime e o terro-

    rismo globalizados. Numa poca como a nossa indispensvel

    8

    Prefcio

    que a globalizao da economia, da tecnologia e das comunica-

    es favorea uma globalizao do ethos. Em outras palavras:

    a globalizao precisa de um ethos global no como mais um

    fardo, e sim como fundamento e auxlio para os homens, para

    a sociedade civil.

    H cientistas polticos que prevem para o sculo XX I um

    choque de civilizaes . A eles opomos a nossa viso do futuro,

    que no se resume simplesmente num ideal otimista, mas numa

    viso de esperana realista: as religies e as culturas do mundo

    podem, em colaborao com todos os homens de boa vontade,

    ajudar a evitar a coliso anunciada, desde que transformem em

    prtica as seguintes ponderaes:

    No haver paz entre as naes sem paz entre as religies.

    No haver paz entre asreligies sem dilogo entre as religies.

    No haver dilogo entre as religies sem padres ticos

    globais.

    No haver sobrevivncia na Terra com paz e justia sem

    que surja um novo paradigma nas relaes internacionais,

    baseado em padres ticos.

    Nova York, 9 de novembro de 200l.

    Hans Kng

    9

  • 7/26/2019 Texto.08.Kng.ethos.mundial

    4/19

    I

    ~NG ~

    ~~S

    I

    ? G \ yQ

    ~0_~_. v _ Y _ . ~ _ + _ h _ o _ s _ r n _ v Y _ t 1 _ ,~ a . I

    J < e

    l

    t0

    w ~

    ~ 1 0

    k

    - - S -

    S~ . ; l u l a .

    Ethos

    m undia l

    um a nova relig io m undia l?

    Poderamos dizer que o e th o s mundial gostaria de ser uma espcie

    d e car ta d as r eli gi es mu nd ia is o u os dez mandamentos bsicos

    das religies mundiais?

    Talvez melhor, um sistema de coordenadas. Quando voc

    tem apenas uma bssola e um mapa, precisa ainda de coor-

    denadas para achar o caminho. Nesse sentido poderamos falar

    em coordenadas morais para a bssola da conscincia. Na-

    turalmente, necessrio

    explicit-las,

    De fato, poucos; textos

    me custaram tanto trabalho e poucos assuntos me exigiram

    tanta discusso e troca de opinies quanto o projeto da decla-

    rao do Parlamento das Religies Mundiais de 1993, em

    Chicago. Nessa declarao fez-se a tentativa, hoje amplamente

    aceita, de definir o ethos da humanidade, que vem se desen-

    volvendo desde tempos imemoriais, em forma de seis grandes

    regras, de dois princpios bsicos e quatro diretrizes. Seu obje-

    tivo no consiste em substituir os dez mandamentos, antes

    pretende expressar aquilo que, no fundo, j est implcito nos

    dez mandamentos; s que esse contedo no encontrado

    apenas no monte Sinai, no Sermo da Montanha ou no Coro,

    ele j est presente tambm em Patanjali, o fundador da ioga,

    no cnone budista ou em Confcio e em outros grandes textos

    da histria das religies da humanidade.

  • 7/26/2019 Texto.08.Kng.ethos.mundial

    5/19

    P ar a q ue um ethos mundial?

    Seria da maior importncia que a humanidade, em nossos

    tempos, se desse conta de que, em primeiro lugar, no pode

    prevalecer essa discricionariedade ps-modernista, esse

    anything

    goes, em relao moral.

    necessrio saber que existem certas

    regras que obrigam a todos, no apenas o cidado comum, mas

    tambm os estadistas, os industriais, os professores nas universi-

    dades e nos laboratrios. Em segundo lugar necessrio dar-se

    conta de que essas regras bsicas so comuns a todos, no se

    restringindo, portanto,

    rea de influncia das trs religies

    profticas - judasmo, cristianismo e isl, pois elas podem ser

    encontradas tambm nas religies de origem hindu ou chinesa.

    Mas

    o

    senhor no estquerendo criar uma nova religio mundial?

    O e th os mundial ho uma nova religio mundial?

    Seria realmente ridculo. Durante a minha vida inteira resisti

    a todas as tentaes de me transformar em tribuno do povo

    colocando-me frente de um grande grupo. Muito menos ainda

    tenho vocao de fundador de Igreja. Mas, para responder seria-

    mente: no precisamos temer essa religio mundial nica, porque

    a diversidade das religies que existem grande demais. E nem

    devemos esperar por uma religio mundial nica, pois, na situa-

    o atual, no h nenhum indcio de que ela possa vir a existir

    um dia. O que devemos fazer reforar a convico de que

    essas regras bsicas devem aplicar-se a toda a humanidade. A

    importncia disso vimos confirmada rio Parlamento das Religies

    ~undiais em Chicago, em 1993, e no parlamento seguinte, na

    CIdade do Cabo, em 1999. No de modo abstrato, como pode

    soar a minha formulao aqui, mas concretamente explicado

    nossa poca: o que significa no matar, e sim praticar o respeito

    diante de toda vida? O que significa no mentir, e sim dizer a

    verdade? O que significa no furtar, e sim empenhar-se por

    uma ordem econmica justa? O que significa no abusar da

    sexualidade, e sim defender o respeito pela mulher e a camara-

    3

    WI

    .

    Ethos mundial uma nova religio mundial?

    dagem entre homem e mulher? So normas que unem todas as

    religies e que podem ter tambm a adeso dos no-crentes.

    Para isso no necessitamos de uma religio comum, e sim de

    uma moral bsica comum.

    O

    que quer dizer isso?

    O

    senhor menciona a rea da sexualidade

    os

    abusos em relao mulher. Qual

    a exigncia do ethos mundial?

    Isso significa que as coisas negativas devem ser ditas com

    toda a clareza, o que quer dizer, concretamente, que existem,

    no mundo todo, formas condenveis de patriarcalismo, de predo-

    mnio de um sexo sobre o outro. Isso se aplica sobretudo

    explorao da mulher, ao abuso sexual de crianas e prosti tui-

    o forada. Deve ser dito tambm com toda a clareza que,

    nesta nossa terra, as diferenas sociais levam muitas vezes a

    situaes em que sobretudo mulheres, e at crianas de pases

    menos desenvolvidos, se vem obrigadas a recorrer prostitui-

    o como meio de sobrevivncia. Positivamente podemos dizer

    que a diretriz genrica das grandes tradies ticas e religiosas

    da humanidade prescreve: No pratique impudiccias. Assim

    se dizia antigamente. Hoje dizemos: importa no abusar da

    sexualidade . Ou, em nossa formulao positiva: Respeitem e

    amem uns aos outros. Isso significa claramente que nenhum

    ser humano tem o direito de rebaixar um outro a mero objeto

    de sua sexualidade, de lev-lo dependncia sexual e de mant-

    1 0

    nesse estado. Naturalmente, possvel avanar mais nesse

    campo, tendo sempre em vista o que se repete em todas as

    normas da declarao do ethos mundial: os jovens j deveriam

    exercitar-se nessas prticas na famlia e na escola. Eles deveriam

    aprender que a sexualidade no ,basicamente, uma fora nega-

    tiva, destruidora ou exploradora e, sim, uma fora criadora e

    formadora, cabendo-lhe, portanto, a funo de constituir comu-

    nidade numa ati tude positiva diante da vida, e que a sexualidade

    s consegue desenvolver-se quando vivida na responsabilida-

    31

  • 7/26/2019 Texto.08.Kng.ethos.mundial

    6/19

    Para que um

    et hos

    mundial?

    de pela felicidade tambm do parceiro. Todos esses aspetos esto

    ligados questo da sexualidade.

    Porm, devo fazer uma restrio. Nem nas declaraes de

    Chicago e da Cidade do Cabo, nem na declarao pol tica do

    InterAction Council de ex-chefes de Estado ou de Governo se

    encontrar alguma referncia s atuais questes controvertidas

    em relao sexualidade ou biotica, sobretudo quanto s ques-

    tes de contracepo, aborto, homossexualidade e da eutansia.

    Por que os documentos no seposicionam a respeito dessas ques-

    tes? Porque se trata de questes polmicas entre as religies e

    at dentro de uma religio, dentro de todas as religies, at dentro

    da prpria Igreja. Tambm na Igreja catlica no existe, obviamen-

    te, um consenso sobre essas quatro questes. Por isso impossvel

    chegar a uma deciso sobre uma questo dessas dentro de uma

    declarao geral. Felizmente dispunha de influncia suficiente

    sobre o andamento das coisas, de modo que pude recusar os

    requerimentos que exigiam um posicionamento sobre certas

    questes. Deste modo conseguimos livrar os textos de manifesta-

    es que, de fat?, poderiam ter torpedeado toda a declarao,

    uma vez que teriam provocado controvrsias imprevisveis, por

    exemplo, a favor ou contra o aborto,

    Na A~emanha se discute atualmente se a prostituio deve ser

    legalizada. As Igrejas que se opem a essa idia levam epeche

    do ridculo.

    ~enso que seja necessrio distinguir o aspecto da ajuda s

    prostitutas, que muitas vezes so vt imas das condies sociais,

    c?nforme consta da declarao do

    ethos

    mundial que citei ante-

    normente. Sob certas circunstncias pode acorttecer tambm

    em nossa sociedade que mulheres acabem nessa situao difci l

    - quem poderia julgar isso? Um lado , portanto, ajud-Ias

    'dando-lhes a oportunidade de emancipar-se. Por outro lado existe

    uma certa tendrtcia de minimizar o problema da prosti tuio

    3

    Et hos mundial uma nova religio mundial?

    vendo nela uma profisso como outra qualquer, quando na reali-

    dade uma forma de abuso da sexualidade. Tambm nessa rea

    existem determinados limites, e certamente funo da Igreja

    insistir nesses limites. A desgraa que a Igreja catlica romana,

    cuja hierarquia estabelece parmetros extre~ament~ rigorosos

    at em relao

    plula e em todas as demais ~ues ~es morais,

    no ouvida quando realmente deveria ser OUVIda.E Justamen e

    a gerao mais jovem que retruca: Desses a j sabemos que sao

    mesmo contra tudo.

    En t o p ode mo s di ze r q ue a I gr ej a pe rd eu a comp et ncia n a re a

    da sexualidade?

    Em grande parte, infel izmente, sim: em questes .d~~oral

    sexual, o prprio magistrio da Igreja minou a su~ ~~edIbIhda~e.

    Segundo o resultado de todas as pesquisas de opmiao a res~eI:o

    desse assunto, apenas uma pequena porcentagem da proP:-la

    populao catlica que est disposta a seguir o.papa ~as q~esto~s

    de tica sexual.

    O

    culpado disso ele propno. pois a sltuaao

    poderia ser bem diversa. Espero que um dia ten~amos u~ papa

    que escreva uma encclica sensata so~re a s~xuahdade: tnl?ando

    um caminho intermedirio entre o hberahsmo e o ngonsmo.

    33

  • 7/26/2019 Texto.08.Kng.ethos.mundial

    7/19

    1

    .:1

    I

    f

    r

    I~

    I

    r

    . r

    i

    i

    I I

    f

    I

    I

    Globa l i zao

    l

    l

    I

    I

    I

    I

    A idia do

    ethos

    m un dia l e st lig ad a a o c on ce it o d a g lo ba liz a o

    t an to a ss im q ue o s en ho r d is cu te t am b m c om e mp re s rio s q ue a ge m

    em n v e l g lo b al . E x is te n es se s m e io s a lg um a d em a nd a p or d ir et riz es

    d e a lc an ce m un dia l? O u a ca ba p re va le ce nd o a qu ilo q ue d m ais lu cro ?

    Em 1990, eu j falava em ethos global quando praticamente

    ningum falava ainda em globalizao. Naturalmente, nessa poca

    de globalizao o ethos global tomou-se especialmente urgente.

    Durante muito tempo se afirmou que a finalidade das empresas

    era a maximizao do lucro. Essa viso foi abandonada, pelo

    menos na Europa, h muito tempo. verdade que, atualmente,

    esto aparecendo de novo tendncias dessa natureza vindas da

    Amrica. Ns nos opomos a essas tendncias. Em maro de 2001,

    a Fundao Ethos Mundial realizou em Baden-Baden um colquio

    sobre o tema Empresas globais e ethos global. Nesse simpsio,

    nenhum executivo de destaque defendeu o ponto de vista de que

    as empresas s se preocupam com o shareholder value, o lucro

    que a empresa paga aos acionistas. Em lugar disso, todos falaram

    em stakeholders, de todos aqueles portanto que participam da

    empresa. Estes so, em primeiro lugar, as funcionrias e osfuncio-

    nrios da produo e da administrao. Mas, includos esto tam-

    bm as empresas fornecedoras, os clientes e, naturalmente, os

    financiadores: trata-se, portanto, de um conjunto bastante com-

    113

  • 7/26/2019 Texto.08.Kng.ethos.mundial

    8/19

    A =r= : do

    ethos

    mundial ajuda

    a

    essas empresas? Ajuda a

    conciliar diferenas? Afinal uma empresaglobal atua em sociedades

    diversas que tm estruturas bem diferentes.

    P ar a q u e u m

    ethos

    mundial?

    plexo. Nas grandes empresas, chega s centenas de milhares o

    n~mero dos envolvidos, ao lado dos funcionrios propriamente

    ditos. A empresa precisa ter em considerao esse fato. Nem

    poderia ser.de outra maneira. Houve diversas tentativas de seguir

    um curso diferente, mas, em geral, pagou-se um preo muito alto.

    Mesmo os grandes conglomerados, como a Shell, tiveram de reco-

    n~ecer que n~o podem agir sem levar em considerao a popula-

    ao e o ambiente , As indstr ias qumicas da regio da Basi l ia

    tambm aprenderam com os desastres havidos; agora cuidam da

    segurana, controlam a pureza da gua do rio Reno, resolvem

    problemas am?ientais etc. Hoje em dia, uma empresa s poder

    ser bem-sucedida se mostrar interesse nos aspectos social e eco-

    lgi~o. At~ mesmo grandes fabricantes americanos de artigos es-

    portvos tiveram problemas porque no respeitavam certas nor-

    mas t icas em relao produo e s condies de trabalho no

    Terceiro Mundo.

    I

    1I

    I

    il

    \1

    I

    o ethos costuma revelar-se til e proveitoso. Infelizmente

    era adm nistrado pela Igreja em forma de moral ina que, na

    percepao das pessoas, repr imia o ser humano. Mas, no fundo

    o

    ethos

    to t il quanto o

    guardrail

    numa estrada cheia de curvas;

    a sua final idade no restringir e , sim, fazer com que se suba ou

    des?~ a se~a com alguma segurana. Para as empresas, as regras

    da enca sao tambm uma espcie de

    guardrail.

    O

    funcionrio,

    por exemplo, que no quer part ic ipar de corrupo ou mentiras

    p~de valer-~e delas. Acredito, alis, que, a longo prazo, corrup-

    ao e mentiras no fazem bem a empresa alguma .

    .Como princpio geral, podemos estabelecer o seguinte: se

    reahzarmos a.pen~s uma globalizao da economia, da tecnologia

    e das

    comurucaoes

    sem efetuar tambm uma globalizao do

    114

    Globalizao

    ethos

    no teremos certeza nenhuma de que tudo isso no reverter

    em p;ejuzo para a humanidade. Porque hoje e~i~teum consenso

    crescente at entre aqueles que, inicialmente, rejeItavam qualquer

    forma de ~lobalizao: todos ns tiramos muito p~oveito ?~ globa-

    lizao, todos usam com satisfao o fax e o e-ma~l,.s~utilizam de

    um transporte areo eficiente e sevalem da possIbIlIdade de rea-

    lizar transaes financeiras internacionais. Estas so a~e~~s algu-

    mas das vantagens. Por outro lado, mesmo aqueles que Illicmlmen-

    te s t inham elogios para a global izao se convenceram de que

    o existem tambm perdedores nesse processo. H empresas que fa-

    o liram. H desempregados que perderam o seu po~to de t~ab~lho

    por causa da terceirizao. H naes inteiras, ~ontmentes mteIros,

    que entraram numa espcie de vcuo. A frica se transfo~?u

    num continente problemtico que ficou

    margem dos

    benefci os

    da globalizao. Assim se aprofunda cada vez mais o a?ism~ ~ue

    separa aqueles que dispem de computador, ~axe dema:s

    faclida

    des tcnicas modernas dos outros que no tem nada dISSO.Co~

    o tempo, esse estado de coisas setomar fatdico. A antiga tensao

    norte-sul recrudesce. O fosso entre os have and have-nots, como

    se diz em ingls , potencializado pelo acesso desigual ~s~o~as

    tecnologias. Por isso necessrio tomar as devidas provIdenc~as

    para que a globalizao se realize, primeiramente, de modo SOCIal,

    e, em segundo lugar, de maneira ecolgica, e, sobretudo, que

    ningum fique simplesmente de fora. . .,

    um processo que exige uma n~va atitude de ~a?a md1Vlduo

    e de cada nao. Isso se aplica

    Africa, onde VIsItantes afro-

    americanos, entre outros, ficaram estarrecidos com a falta de

    discipl ina e de disposio ao trabalho, co~

    0_

    taman?o d~ cor-

    rupo que grassa entre as eli tes, com osmIlh~es da aju~a mter-

    nacional que simplesmente desaparecem. Mas ISSOse aphca tam-

    bm

    Europa. Precisamos mudar tambm na Alemanha, da~do-

    nos conta de que estamos

    in competition

    que podemos ficar

    para trs, at em relao aos nossos vizinhos, uma vez que a

    produtividade na Frana, na Holanda, na Escandin~a serev.ela,

    em certos setores, mais alta do que em nosso pais. Por ISSO

    115

  • 7/26/2019 Texto.08.Kng.ethos.mundial

    9/19

    precisamos perguntar-nos se os problemas podero ser resolvidos

    apenas com a distribuio de mais benefcios e conquistas sociais.

    Precisamos refletir se o mercado de trabalho extremamente

    regulamentado no deveria passar por uma liberalizao, como

    acontece em outros pases, mesmo que isso seja desconfortvel

    para algumas pessoas confortavelmente instaladas. Nesses tem-

    pos de economia em rpido desenvolvimento necessrio adap-

    tar-se continuamente. Uma empresa que no consegue ser flex-

    vel est em perigo. Se uma nao inteira no se esforar estar

    igualmente correndo risco.

    P ar a q ue u m

    ethos

    mundial?

    I

    I

    preciso conhecer os valores e as re lig ies para se ter uma .

    orientao. claro que os meios de comunicao formam um

    poder de primeira grandeza, felizmente no apenas para divulgar

    o mal, mas igualmente o bem. No adianta queixar-se de uma

    certa queda qualitativa, at mesmo nas redes pblicas, por causa

    da presso das emissoras comerciais. Eu mesmo fiz, com a TV

    Sudoeste (S'YR) uma srie de sete programas sobre as re lig ies

    domundo, sob o ttulo Seguindo rastros . Foi um desafio enorme

    para mim e para a equipe. Em sete vezes 50 minutos pretendia

    captar a essncia das sete grandes rel igies e a sua troca de para-

    digtnas, realando ao mesmo tempo o ethos dessas religies. So

    bvias as dificuldades de seapresentar quatro mil anos de histria

    rel igiosa da China e de um espao de tempo mais ou menos igual

    das religies indianas , mostrando tambm os problemas que as

    acompanham. Mas vimos que possvel faz-Ia, e agora estou

    muito grato por podermos divulgar essas idias em forma de

    multimdia. Todos os filmes podem ser vistos em vdeo, dispomos

    de um CD-ROM de cunho didtico com grande quantidade de

    informaes complementares, temos um livro ilustrado que explica

    mais detalhadamente muitos dos assuntos abordados. Partindo

    de todo o mater ial disponvel, pudemos montar uma exposio

    Os m eio s d e c om un ic a o s o a lia do s d ess a id ia de u m ethos mundial?

    116

    Globalizao

    itinerante sobre o tema Religies Mundiais - Paz Mundial -

    Ethos Mundial. Essa exposio existe em trs verses em alemo

    que percorrem as cidades da Alemanha, =~stria e d~ ~ua.

    Recentemente inaugurei na Inglaterra a pnmeira exposiao em

    lngua inglesa. E em dezembro/janeiro de 2001/2 oi apr~sentada

    uma segunda verso em ingls na sede das Naoes Umdas, em

    Nova York. Temos orgulho dessa realizao. So novas chances

    inopinadas de divulgar a idia do ethos mundial. E justamente

    s escolas que cabe um papel importantssimo dessa misso. Estou

    . muito contente de ver que no estado de Baden-Wrttemberg,

    .mas tambm em outros estados alemes, existe um grande interes-

    sepelo projeto do ethos mundial. Encontramos uma boa repercus-

    so. Continuamente , os nossos colaboradores esto dando con-

    ferncias em cursos de aperfeioamento de professores. Na Ale-

    manha e na Sua real izamos concursos para professores sobre

    as melhores oportunidades de falar das religies e, sobretudo, de

    disseminar a idia do ethos mundial. Muito provavelmente, as

    escolas no podero incluir em seus currculos uma matria espe-

    cfica com esse nome. Mas isso nem necessrio. J um grande

    progresso verificar que a perspect iva do ethos mundial pass~ a

    fazer parte, com sua perspectiva prpria, dos currculos do ensmo

    rel igioso e tico. Alm disso importante que os professores de

    geografia abordem essas questes, por exemplo, quando trata~

    da ndia ou da China. Normalmente, os alunos se mostram mais

    interessados em conhecer a maneira de viver de um povo, as nor-

    mas vigentes, o modo de encarar certos problemas, do que em

    aprender os nomes dos rios de um determinado pas.

    117

  • 7/26/2019 Texto.08.Kng.ethos.mundial

    10/19

    ne xo

    Declarao sob re o ethos mundial

    Parlamento das Religies Mundiais

    4 de setembro de 1993 Chicago/EUA

    Os princpios do ethos mundial

    o

    nosso mundo est passando por uma crise fundamental:

    crise da economia mundial, da ecologia mundial, da poltica

    mundial. Em toda a parte lamenta-se a ausncia de uma grande

    viso, o acmulo espantoso de problemas no resolvidos, a imobi-

    lidade poltica, uma liderana poltica medocre sem muito discer-

    nimento e previso e, em geral, pouca sensibilidade para o bem

    comum. Muitas respostas velhas para desafios novos.

    Centenas de milhes de pessoas em nosso planeta sofrem

    desemprego, pobreza, fome e destruio das famlias. Ae sperana

    de paz duradoura entre os povos diminui novamente. As tenses

    entre os sexos e as geraes chegaram a um nvel assustador.

    Crianas morrem, matam e so mortas. Aumenta o nmero de pa-

    ses abalados por escndalos de corrupo na poltica e na econo-

    mia. A convivncia pacfica em nossas cidades fica cada vez mais

    difcil por causa de conflitos sociais, raciais e tnicos, do abuso de

    drogas, do crime organizado e at de anarquia. Muitas vezes, at

    os vizinhos se olham com medo. O nosso planeta continua sendo

    espoliado descaradamente. O colapso dos ecossistemas iminente.

    Em vrios lugares do mundo observamos a atuao de lde-

    res e seguidores religiosos que incitam

    agresso, ao fanatismo,

    ao dio e xenofobia, estimulando, e inclusive legitimando,

    conflitos violentos e sangrentos. Com freqncia abusa-se da

    173

  • 7/26/2019 Texto.08.Kng.ethos.mundial

    11/19

    P ar a q u e u m

    ethos

    mundial?

    re ligio a f im de conquis tar o poder pol t ico fazendo uso at da

    guerra. Isso tudo nos causa repulsa.

    Condenamos todos esses processos declarando que no

    precisa ser ass im. Jexiste um

    ethos

    capaz de agir contra esses

    processos globais desastrosos. No que esse

    ethos

    possa ofere-

    cer solues imediatas para todos os problemas imensos do nosso

    ~u~( o, mas ele pode servir de base moral para uma ordem

    ndvdual e global melhor, uma

    viso

    capaz de afastar homens

    e mulheres do desespero e da disposio ao uso da violncia

    distanciando a sociedade do caos. '

    Somos hOll}ense mulheres que se declaram adeptos dos man-

    ~am~ntos e das prticas das religies do mundo. Confirmamos que

    jaexiste um consenso entre as religies que poder servir de base

    para um ethos mundial, um consenso bsico mnimo em relao

    a

    valores, parmetros

    inalterveis e

    atitudes

    morais bsicas.

    I. No pode haver nova ordem mundial sem

    ethos

    mundial

    Ns, homens e mulheres de diversas rel ig ies e regies do

    mundo, dirigimo-nos, por tanto, a todas as pessoas do mundo

    sejam elas religiosas ou no. Queremos manifestar a nossa con-

    vico comum: .

    Ns todos somos responsveis por uma melhor ordem

    mundial.

    imperativo o nosso empenho pelos direitos humanos

    pela liberdade, pela just ia, pela paz e pela preservao

    da terra.

    A diversidade das nossas tradies religiosas e culturais no

    deve ser empeci lho para agirmos juntos contra todas as

    formas de desumanidade e a favor de mais humanidade.

    Os princpios que constam da presente declarao po-

    dem ser sustentados por todas as pessoas que tenham

    convices ticas, sejam estas de origem religiosa ou no.

    ~~, porm, que somos

    pessoas de orientao religiosa e es-

    piritual,

    que fundamos a nossa vida numa realidade ltima

    174

    ~

    Anexo

    da qual haurimos fora espiritual e esperana numa atitude

    de confiana, em orao e meditao, em palavras e em

    silncio, temos a obrigao especial de atuar pelo bem de

    toda a humanidade e pela proteo do planeta Terra. No

    nos consideramos melhores do que os outros, mas, confiando

    na sabedoria antiqssima de nossas religies, cremos que

    ela nos poder indicar tambm os caminhos do futuro.

    Depois de duas guerras mundiais e do

    fim

    da guerra fria, da der-

    rocada do fascismo e do nazismo e do abalo do comunismo e do

    colonialismo, a humanidade entrou numa nova fase de sua histria.

    Hoje em dia a humanidade disporia de recursos econmicos,

    culturais e espirituais suficientes para iniciar uma ordem mundial

    melhor . Mas, a construo pacfica de um mundo melhor conti -

    nua ameaada por antigas e novas

    tenses tnicas, nacionais,

    sociais, econmicas e religiosas.

    verdade que a nossa poca ex-

    perimenta os maiores progressos cientficos e tcnicos da his t-

    ria. Mas mesmo assim vemo-nos confrontados com o fato de a

    pobreza, a fome, a mortalidade infantil, o desemprego, o empo-

    brecimento e a destruio da natureza aumentarem em vez de

    diminurem. Muitos povos sevem ameaados pela runa econ-

    mica, pela desmontagem do sistema social, pela marginalizao

    poltica, por catstrofes ecolgicas, pela falncia nacional.

    Nessa situao dramtica, a humanidade no precisa apenas

    de programas e aes pol t icas. Ela precisa de uma

    viso de

    convivncia pacfica

    dos povos, das comunidades e religies

    tnicas e ticas, de uma responsabilidade comum pelo nosso

    planeta Terra. Uma viso se baseia em esperanas , obje tivos ,

    ideais, paradigmas. Estes, no entanto, se perderam para muitas

    pessoas no mundo todo. Mesmo assim estamos convencidos de

    que, apesar de seus abusos e freqentes fracassos histricos, cabe

    justamente s religies a responsabilidade da conservao, fun-

    damentao e vivncia dessas esperanas, desses objetivos, ideais

    e paradigmas. Essa constatao se dirige sobretudo aos estados

    modernos: as garant ias de liberdade de conscincia e de reli-

    175

  • 7/26/2019 Texto.08.Kng.ethos.mundial

    12/19

    Para que um ethos mundial?

    gio so necessrias, mas elas no substi tuem o elo dos valores

    ?as convices e das normas vlidas para todas as pessoas:

    mdependentemente de sua origem, sexo, cor, lngua ou religio.

    Estamos convencidos da unidade fundamental da famlia hu-

    mana em nosso planeta Terra. Por isso queremos lembrar a De-

    clarao Geral dos Direitos Humanos das Naes Unidas, de

    1948. O que foi proclamado solenemente em nvel de direito que-

    remos ver confirmado e aprofundado da parte do ethos. a reali-

    zao plena da indisponibilidade da pessoa humana, da liberdade

    inalienvel, do princpio da igualdade de todos os seres humanos

    e da necessria solidariedade e interdependncia de todos.

    As experincias da vida pessoal e da histria calamitosa de

    nosso planeta nos ensinaram,

    que uma ordem melhor do mundo no pode ser criada ou

    at imposta apenas por meio de leis, normas e convenes;

    que a implementao de paz, justia e conservao da

    terra depende do entendimento dos homens e de sua dis-

    posio de fazer valer a justia;

    que o empenho pelo direito e pela liberdade pressupe a

    conscincia da responsabilidade e dos deveres e que essa,

    por sua vez, exige um apelo mente e ao corao dos

    homens; ;

    que o direito no sobrevive por muito tempo sem a moral,

    de modo que no poder haver uma nova ordem mundial

    sem um ethos mundial.

    Por ethos mundial no entendemos nem uma nova ideologia

    global nem uma religio mundial uniforme que esteja alm de

    todas as religies existentes, nem muito menos o predomnio de

    uma religio sobre as demais. Entendemos por ethos Mundial um

    consenso fundamental em relao aos valores existentes que nos

    unem, a paradigmas indiscutveis e a atitudes pessoais.

    Sem um

    co~senso quanto ao ethos, qualquer sociedade estar ameaada,

    mars .cedo ou ~ais tarde, pelo caos ou por uma ditadura, e pes-

    soas Isoladas ficaro desesperadas.

    176

    Anexo

    1 1 . E x i g n ci a b si ca :

    t odo s er hu man o d ev e s er t rat ad o h um ana men te

    Somos todos homens falveis e imperfeitos, com limites e

    falhas. Sabemos que o mal uma realidade. Justamente p~r isso

    sentimo-nos obrigados a declarar, para o bem da humanidade,

    quais deveriam ser os elementos fund~m~n~ais de um e hos co-

    mum da humanidade, aplicvel tanto ao indivduo quanto ascomu-

    nidades e organizaes, tanto aos Estados quanto s pr?~rias r~-

    ligies. A nossa confiana nasce do fato de nossas tradies reli-

    giosas e ticas, muitas vezes seculares, conterem elementos su-

    ficientes para um ethos que possa convencer e ser vivido ~or todos

    os homens de boa vontade, sejam eles religiosos ou nao.

    Temos no entanto, plena conscincia de que asnossas dife-

    rentes tradies religiosas e ticas explicam de maneiras muitas

    vezes diversas o que bom e o que ruim para o ser humano,

    o que certo ou errado, o que bom ou mau. No preten.demos

    encobrir ou ignorar as diferenas profundas entre as diversas

    religies. Mas estas no devero impedir-nos de proclamar

    publicamente o que temos em comum j n~sse.n:omento fazendo

    com que nos sintamos obrigados a observa-Io ja agora, tendo em

    vista as nossas prprias bases religiosas ou ticas.

    Sabemos que as religies no so capazes de resolver os

    problemas ecolgicos, econmicos, polticos e sociais ~es~a terra.

    Mas elas podem alcanar aquilo que os planos econormcos, os

    programas polticos ou as normas jurdicas, p~r si s, ~~o con e,:

    guem:

    mudar

    a atitude interna, toda ~ ~entahd~de,

    o coraao

    do homem, levando-o a uma conversao do caminho errad~ para

    uma nova atitude diante da vida. No h dvida, a humanidade

    precisa de reformas sociais e ecolgicas, mas ~laprecisa i~almen:e

    de uma

    renovao espiritual.

    Ns, que seguimos uma one.ntaao

    religiosa ou espiri tual, queremos assumir esse co~promIsso de

    modo especial, porque temos a convico de que Justamente as

    foras espirituais das religies podem transmitir aos ~~mens uma

    confiana bsica, um horizonte plausvel, normas ltimas e um

    177

  • 7/26/2019 Texto.08.Kng.ethos.mundial

    13/19

    P ar a q u e u m ethos mundial?

    lar espiritual para a sua vida. Naturalmente, as religies s podero

    atuar nesse sentido, com credibilidade, se elas prprias acabarem

    com os conflitos cuja raiz est nelas prprias, sereduzirem mutua-

    mente toda a arrogncia, desconfiana, preconceitos e at inimiza-

    des hereditrias, vendo com respeito as tradies, os santurios,

    as festas e os ritos uns dos outros.

    Todos ns sabemos que em toda par te

    seres humanos

    conti-

    nuam sendo tratados de

    modo desumano.

    Roubam-lhes as opor-

    tunidades de vida e a sua l iberdade, jogam aos ps os seus direi-

    tos humanos, menosprezam a sua dignidade humana. O poder ,

    no entanto, no equivale ao direi to. Diante de todas essas desu-

    manidades, as nossas convices religiosas e ticas exigem:

    Todo

    ser humano deve ser tratado humanamente

    Isso significa: Todo ser humano, sem distino de idade, sexo,

    raa, cor, capacidade fsica, QI mental, lngua, religio, convico

    poltica, origem social ou nacional, possui uma

    dignidade intocvel

    e inalienvel. Por isso, todos, tanto o indivduo quanto o estado,

    tm a obrigao de respeitar essa dignidade e de garantir-lhe uma

    proteo eficaz. Tambm na economia, na poltica e nos meios de

    comunicao, em instituies de pesquisa e empresas industriais,

    o ser humano deve ser sempre o sujei to de direi tos e o objet ivo,

    no devendo nunca ser visto apenas como meio, como objeto da

    comercializao e industrializao. Ningum est alm do bem

    e do mal : nenhuma pessoa e nenhuma classe social, nenhum

    grupo de interesses influente e nenhum cartel de poder, nenhuma

    polcia, nenhum exrcito e nenhum estado. Pelo contrrio: como

    ser dotado de racionalidade e conscincia, todo ser humano tem

    a obrigao de comportar-se de maneira verdadeiramente humana

    e no desumanamente, de

    fazer

    o

    bem e de deixar defazer

    o

    mal.

    O significado concreto dessas aspiraes explicitado em nossa

    declarao. Tendo em vista uma nova ordem global, pretendemos

    recordar certas normas ticas impreterveis e incondicionais. Estas

    no devero ser tratadas como algemas e correntes a oprimir o ser

    humano e, s im, como amparo e aux lio para encontrar e real izar

    de novo orientao, valores, atitudes e sentido de vida.

    178

    Anexo

    Existe um princpio, uma regra urea, que h sculos faz

    parte da tradio de muitas tradies religiosas e ticas da huma-

    nidade e cujo valor ficou comprovado: O

    que voc no quer que

    faam a voc, no

    o

    faa tambm aos outros.

    Ou, dito demodo

    positivo: O

    que voc quer que faam a

    r

    tamb~m. aos

    outros.

    Esta dever ia ser a norma impretenvel e incondicional

    vlida para todas as reas da vida, para a famlia e as comuni-

    dades, para as raas, naes e religies. . _

    Os egosmos de qualquer natureza - qualquer asprraao

    individual ou cole tiva, manifes tada em forma de classismo, de

    racismo, nacionalismo ou sexismo - so reprovveis. Ns os

    condenamos porque impedem o homem de ser verdadeiramente

    humano. A autodeterminao e a auto-realizao so aspiraes

    perfeitamente legtimas, desde que no sejam desvinculadas da

    auto-responsabilidade e da responsabilidade pelo mundo, da res-

    ponsabilidade pelos semelhantes e pelo planeta Terra.

    Esse princpio encerra paradigmas bem concretos que de-

    vem nortear o nosso agir. Dele derivam quatro normas abrangen-

    tes antiqssimas

    que podem ser encontradas na maior parte

    das religies do mundo.

    1 1 1 Quatro instrues impreterveis

    1. Comprometimento com uma cultura de no-violncia e de

    respeito pela vida

    Em todas as regies e religies, inmeras pessoas procuram

    viver uma vida que no seja dominada pelo egosmo, e sim pelo

    empenho em favor de seus semelhantes e do mundo que os

    cerca . Mesmo assim, o mundo de hoje est cheio de dio, inveja,

    cime e violncia, no s entre indivduos, como tambm entre

    grupos sociais e tnicos, entre classes e raas, n~es e religies.

    O uso da violncia, o trfico de drogas e o cnme orgamzado,

    muitas vezes munidos dos recursos tcnicos mais recentes, alcan-

    179

  • 7/26/2019 Texto.08.Kng.ethos.mundial

    14/19

    Para q ue u m

    ethos

    mundia l?

    aram propores globais. Em muitos pases ainda se governa

    d~ cima para baixo .; h ditadores que violentam os seus pr-

    pnos povos, e em muitos lugares reina a violncia institucionali-

    zad? Mesmo ~m ~1~tIns'pases em que existem leis para proteger

    as ltberdad.es individuais, h presos sendo torturados, homens

    sendo muttlados e refns sendo assassinados.

    A. Vem-nos das grandes antigas tradies religiosas e ticas

    da humanidade a ordem:

    No matars

    Ou de forma

    positiva:

    Respeite a vida

    Lembremo-nos, portanto das

    conseqncias dessa norma antiqssima: todo ser huma-

    no tem direito vida, integridade fsica e ao desenvolvi-

    men.to ivre de sua personalidade, desde que no infrinja

    os direitos de outros. Ningum tem o direito de torturar

    fsica ou psiquicamente um outro ser humano, de machu-

    c lo ou de

    ma t lo

    at. E nenhum povo, nenhum Esta-

    do, nenhuma raa, nenhuma religio pode discriminar

    limpar, exilar ou at exterminar uma minoria diversa

    ou de outra f.

    B. Naturalmente, onde h gente haver confl itos. Os confli-

    tos, porm, deveriam

    se r

    resolvidos, por princpio, sem o

    u~o da violncia e dentro do quadro de uma ordem

    jur-

    dica, Isso vale tanto para os indivduos quanto para os

    Es~ados. Justamente dos detentores do poder pol t ico

    exige-se que se atenham ordem jurdica defendendo na

    medida ~OApo~svel,solues pacficas que dispense~ o

    ~so da v~olencta. Eles deveriam engajar-se por uma ordem

    internacional de paz que, por sua vez, precisa ser protegi-

    da e defendida contra aqueles que recorrem violncia.

    O .armamento progressivo uma aberrao, a hora atual

    exige desarmamento. Que ningum se engane: no h

    sobr~vivncia para a humanidade sem paz mundial

    C. Por ISSO,os jovens deveriam aprender em sua famlia e

    na escola que a violncia no pode ser um meio de dis-

    puta com os outros. S assim ser possvel criar

    uma

    cultura da no-violncia.

    180

    An ex o

    D. A pessoa humana infinitamente preciosa e precisa ser

    protegida sob qualquer hiptese. Mas tambm a

    vida dos

    animais e das plantas

    que habitam conosco esse planeta

    merecem proteo, cuidados e ateno.

    um crime explo-

    rar desenfreadamente os recursos naturais da vida, destruir

    a biosfera sem a menor considerao e militarizar o uni-

    verso. Como seres humanos temos uma responsabilidade

    especial em relao ao planeta Terra e ao universo, ao ar,

    gua e ao solo, sobretudo tendo em vista as geraes

    futuras. Estamos

    todos interligados

    nesse universo, depen-

    dendo uns dos outros. Cada um depende do bem-estar

    do todo. Por isso vale a regra: no se deve pretender o do-

    mnio do homem sobre a natureza e o universo e, sim, cul-

    tivar a comunho com a natureza e o universo.

    E. No esprito de nossas grandes tradies religiosas e ticas,

    ser verdadeiramente humano significa ser diligente e pres-

    tativo, tanto na vida privada quanto na vida pblica. No

    deveramos nunca ser irreverentes e brutais. Todo povo,

    toda raa, toda religio deve aproximar-se da outra com

    tolerncia, respeito e, at, com apreo. As minorias, sejam

    elas de natureza racial, tnica ou religiosa, n~cessitam de

    nossa proteo e de nosso incentivo.

    2. Com prom etim ento com um a cultura de solidariedade

    e

    com

    um a ordem econ mica justa

    Em todas as religies, inmeras pessoas se dedicam solida-

    riedade numa vida de trabalho e de cumprimento fiel dos deveres

    profissionais. Mesmo assim, existe muita fome, muita pobreza

    e muita necessidade no mundo de hoje. A culpa dessa situao

    no s dos indivduos. Muitas vezes, a culpa tambm das

    estruturas sociais injustas: milhes de pessoas no tm trabalho,

    milhes so explorados pelo trabalho mal remunerado, so mar-

    ginalizados e privados de oportunidades. Em muitos pases h

    181

  • 7/26/2019 Texto.08.Kng.ethos.mundial

    15/19

    Pa ra que um

    ethos

    m undi al?

    desigualdades imensas entre ricos e pobres, entre poderosos e

    impotentes. Num mundo em que tanto o capitalismo sem peias

    quanto o socialismo totalitrio solaparam e destruram tantos

    valores ticos e espirituais, alastraram-se a sofreguido do lu-

    cro sem limites e a avidez desenfreada. Mas cresceu tambm a

    mentalidade materialista dos que exigem cada vez mais do Es-

    tado, sem a disposio a uma contribuio correspondente. No

    s nos pases emergentes, a corrupo se transformou num

    verdadeiro cncer da sociedade.

    A. Das antigas grandes tradies religiosas e ticas da huma-

    nidade, porm, ouvimos a ordem: No furtars Ou, em

    termos positivos: Seja justo e honesto Voltemos a pensar,

    portanto, nas conseqncias dessa norma antiqssima:

    ningum tem o direito de furtar ou de apossar-se da pro-

    priedade de um outro ou da coletividade, seja de que

    forma for. Mas, por outro lado, vale tambm o princpio

    de que ningum tem o direito de valer-se de seus bens

    sem tomar em considerao as necessidades da socieda-

    de e da terra.

    B. Onde reina pobreza extrema alastra-se uma sensao de

    desamparo e de desespero; nessa situao o furto pra-

    ticado muitas vezes por uma questo de sobrevivncia.

    Quando o poder e a riqueza se acumulam descarada-

    mente, inevitvel que nos desfavorecidos e marginali-

    zados surjam sentimentos de inveja, de mgoa e at de

    dio e de revolta. O resultado um crculo vicioso de

    violncia e contra-violncia. Que ningum se engane:

    no haver paz mundial sem justia mundial.

    C. Por isso, os jovens j deveriam aprender, em sua famlia

    e na escola, que a propriedade, por menor que seja, traz

    obrigaes. Seu uso precisa estar tambm a servio do

    bem comum. S assim ser possvel construir uma

    ordem

    econmica justa.

    D. Mas, se quisermos mudar decisivamente a situao do

    bilho de pessoas mais pobres do planeta, especialmente

    182

    An ex o

    das mulheres e crianas, ser necessrio dar um feitio

    mais justo s estruturas da economia mundial . Beneficn-

    cia individual e projetos isolados de ajuda so indispen-

    sveis, porm insuficientes. Todos os pases e as autorida-

    des das organizaes internacionais precisam colaborar

    para que se chegue a uma partilha justa. .

    A crise da dvida e a pobreza do segundo e do terceiro

    mundo necessitam de uma soluo aceitvel para todos.

    Certamente, conflitos sero inevitveis tambm no fu-

    turo. Nos pases desenvolvidos ser necessrio distin-

    guir, em todo caso, entre consumo indispensvel e .con-

    sumo desenfreado, entre o uso socialmente conveniente

    e inconveniente da propriedade, entre a utilizao justi-

    ficada e injustificada dos recursos naturais, entre uma

    economia de mercado puramente capitalista e uma eco-

    nomia orientada segundo princpios sociais e ecolgi-

    cos. Os pases em desenvolvimento tambm precisam

    fazer um exame de conscincia nacional. Para todos vale

    a regra: onde os governantes oprimem os governados,

    onde as instituies oprimem as pessoas, onde o poder

    oprime o direito, a resistncia legtima - na medida

    do possvel, sem o uso de violncia.

    E. Ser verdadeiramente humano significa, segundo o esp-

    rito de nossas grandes tradies religiosas e ticas:

    - Em vez de abusar do poder econmico e poltico numa

    luta despudorada pela supremacia, este deve ser colocado

    a servio do ser humano. Precisamos desenvolver um

    esprito de compaixo com os que sofrem e ter uma preo-

    cupao especial pelos pobres, deficientes, idosos, refu-

    giados, solitrios.

    - Em vez de um pensamento fixo exclusivamente no poder

    e de uma poltica baseada no poder sem peias, devem

    prevalecer na concorrncia inevitvel o respeito mtuo,

    a harmonia sensata dos interesses, a disposio ao enten-

    dimento e a estima .

    183

  • 7/26/2019 Texto.08.Kng.ethos.mundial

    16/19

    P ar a q ue u m

    ethos

    mundial?

    Anexo

    - Em vez de urna sofreguido insacivel por dinheiro, pres-

    t gio e consumo, faz-se necessrio reencontrar o senso

    da medida e o senso da modstia.

    Pois o homem vido

    perde a sua alma , sua liberdade, sua tranqilidade,

    sua paz interior e, com isso, deixa de ser humano.

    gum, nenhuma insti tuio, nenhum Estado e tampou-

    co nenhuma Igreja ou grupo religioso tm o direito de

    dizer inverdades aos homens.

    B. Essa regra aplica-se sobretudo:

    - aos meios de comunicao de massa aos quais se outorga,

    com toda a razo, a garantia da liberdade de informao

    para que possam encontrar a verdade, cabendo-lhes, por

    isso mesmo, urna funo de sentinela dentro de cada so-

    ciedade. Eles no esto acima da moral, antes devem, com

    objetividade e imparcial idade, comprometer-se com a

    dignidade humana, com os direi tos humanos e os demais

    valores fundamentais. Eles no tm o direi to de invadir a

    privacidade das pessoas, de distorcer a realidade ou de

    manipular a opinio pblica.

    - arte, l iteratura e cincia, s quais se outorga, com

    toda a razo, a l iberdade artst ica e acadmica. Mas nem

    por isso elas podem eximir-se dos paradigmas ticos ge-

    rais; antes devem servir

    verdade.

    - aos

    polticos e aos partidos polticos:

    Quando mentem

    descaradamente para o povo, quando se tornam culpados

    de manipulao da verdade, de corrupo ou de uma

    poltica que visa apenas o poder interno e externo, per-

    dem o direi to credibilidade, merecendo a destituio

    de seus cargos e a rejeio de seus eleitores. Por outro

    lado, a opinio pblica deveria apoiar aqueles polt icos

    que tm a coragem de dizer sempre a verdade ao povo.

    - aos representantes das religies, enfim, que merecem a

    condenao dos homens e a perda de seus seguidores

    quando incentivam ati tudes inspiradas em preconcei-

    tos, dio e inimizade contra os adeptos de outras cren-

    as, quando pregam o fanatismo ou desencadeiam e

    legitimam at guerras religiosas.

    3 . Comp ro me ti me nto com u ma cul tu ra d e t ol er n cia

    e

    uma

    vida pautada na veracidade

    Inmeras pessoas de todas as regies e religies se esfor-

    am para levar, em nossa poca, uma vida pautada na honesti-

    dade e na veracidade. Mesmo assim h, no mundo de hoje,

    tanta mentira e falsidade, tanta fraude, tanta hipocrisia, tanta

    ideologia e demagogia:

    h polticos e homens de negcios que se valem da men-

    tira como recurso e meio para obter sucesso na poltica;

    h meios de comunicao de massa que divulgam propa-

    ganda ideolgica em lugar de um noticirio verdico, que

    fornecem desinformao em lugar da informao, que

    visam cinicamente o interesse comercial em lugar do

    compromisso com a verdade;

    h cientistas e pesquisadores que se pem a servio de

    programas ideolgicos ou polt icos moralmente suspei-

    tos ou de grupos voltados a um mero interesse econmi-

    co, procurando justificar pesquisas que ferem princpios

    morais bsicos;

    h representantes de religies que desqualificam os adep-

    tos de outras rel igies como inferiores, pregando o fana-

    tismo e a intolerncia em lugar do respeito, do entendi-

    mento e da tolerncia.

    A. Das grandes antigas tradies religiosas e ticas, no en-

    tanto, nos vem a ordem: No mentirs Ou, em termos

    positivos: Fale e aja de acordo com a verdade Convm

    relembrar as implicaes dessa regra antiqssima: nin-

    Que ningum se engane: no pode haver justia mundial

    sem veracidade e humanidade.

    184

    185

  • 7/26/2019 Texto.08.Kng.ethos.mundial

    17/19

    Pa ra q ue u m ethos mundial?

    C. Por isso os jovens j deveriam aprender, em suas famlias

    e na escola, a praticar a veracidade no pensar, no falar e no

    fazer. Todo ser humano tem direito

    verdade e

    veracida-

    de. Ele tem o direito

    informao e

    formao necess-

    rias pa~a que possa tomar as decises fundamentais para

    a sua VIda.Se lhe faltar , porm, uma orientao tica b-

    sica, dif icilmente saber distinguir o que importante

    daquilo que no tem importncia. Diante da enxurrada

    diria de informaes, os paradigmas ticos podem ajudar

    a desvendar a distoro dos fatos, os interesses escusos, a

    opo por tendncias e a absolutizao de opinies.

    D. Ser verdadeiramente humano significa, segundo o esprito

    de nossas grandes tradies religiosas e ticas, o seguinte:

    - em.vez de confundir liberdade com arbitrariedade e plu-

    rahsmo com discricionariedade, prestigiar a verdade;

    - em vez de viver uma vida de desonestidade, dissimulao

    e conformismo oportunista, cultivar o esprito de veraci-

    dade, inclusive nas relaes cotidianas entre as pessoas;

    - em vez de divulgar meias-verdades ideolgicas e faccio-

    sas,

    procurar sempre de novo a verdade

    com veracidade

    incorruptvel;

    - em vez de devotar-se ao oportunismo, servir

    verdade

    reconhecida com confiabilidade e constncia.

    4 . Comp ro me ti me nto com u ma cul tu ra de i gu al da de

    e

    com-

    panheirismo entre homem e mulher

    Em todas as regies e religies, inmeras pessoas se esfor-

    am para levar uma vida de companheirismo entre homem e

    mulher, e de responsabilidade em relao ao amor, sexualidade

    e ~famlia. No entanto, existem no mundo muitas formas conde-

    nveis de patriarcalismo, de predominncia de um sexo sobre o

    outro, de explorao das mulheres, de abuso sexual de crianas

    e de prostituio forada. As desigualdades sociais levam muitas

    vezes a situaes em que sobretudo as mulheres, mas tambm

    186

    Anexo

    crianas, de pases menos desenvolvidos se vem obrigadas a

    recorrer prostituio corno meio de sobrevivncia.

    A. Das antigas grandes tradies religiosas e ticas da hu-

    manidade, no entanto, nos vem a ordem: No cometers

    atos despudorados Ou, em termos positivos: Respeitem-

    se e amem-se

    Recordemos, portanto, as implicaes dessa

    regra antiqssima: ningum tem o direito de rebaixar o

    outro a mero objeto de sua sexualidade, de torn I o sexu-

    almente dependente ou de mant-lo nessa dependncia.

    B. Condenamos a explorao e a discriminao sexual como

    uma das formas mais degradantes do ser humano. Sem-

    pre que se pregar a predominncia de um sexo sobre o

    outro, at mesmo em nome de uma convico religiosa,

    ou que se tolerar a explorao sexual, sempre que a

    prostituio for incentivada ou que houver abuso de

    crianas, ser necessrio resistir. Que ningum se enga-

    ne: no pode haver verdadeira humanidade sem convi-

    vncia em esprito de companheirismo.

    C. Por isso os jovens j deveriam aprender, em suas fam-

    lias e na escola, que a sexualidade em si no uma fora

    negativa de destruio ou explorao e, sim, uma fora

    de formao criadora. Ela tem a funo de formar uma

    comunidade que encare a vida de maneira positiva, mas,

    para poder desenvolver-se, precisa incluir tambm a

    responsabilidade pela felicidade do parceiro.

    D. A relao entre homem emulher no deveria ser marca da

    pela sujeio ou explorao da mulher pelo homem e,

    sim, pelo amor, pelo companheirismo e pela confiabilida-

    de. A realizao humana no se confunde com o prazer

    sexual. A sexualidade deve ser expresso e confirmao

    de uma relao amorosa vivida em parceria.

    H tradies religiosas que conhecem tambm o ideal

    da renncia voluntria ao desenvolvimento de sua sexua-

    lidade. A renncia voluntria tambm pode ser expresso

    de identidade e realizao.

    187

  • 7/26/2019 Texto.08.Kng.ethos.mundial

    18/19

    Para

    que um

    ethos

    mundial?

    E. Apesar de todas as diferenas culturais e religiosas, a ins-

    tituio social do casamento marcada pelo amor, pela

    fidelidade e pela durabilidade. Seu objetivo garantir a

    homens, mulheres e filhos segurana e apoio mtuo, alm

    de assegurar-Ihes certos direitos. Em todos os pases e cul-

    turas deve haver um esforo no sentido de criar as condi-

    es sociais que possibilitem ao casamento e famlia uma

    existncia digna que deve incluir tambm os idosos. Os

    filhos tm direito educao. Nem os pais devem explorar

    os filhos, nem os filhos os pais; a sua relao deve basear-

    se, isto sim, no respeito, no reconhecimento e na assistn-

    cia mtuos.

    F. No espri to de nossas grandes tradies religiosas e ticas,

    ser verdadeiramente homem significa:

    - em vez de domnio ou degradao patriarcal, que expri-

    mem violncia e produzem freqentemente reaes violen-

    tas, deve haver respeito mtuo, compreenso, pa rce ir ismo.

    - em lugar de qualquer forma de cupidez sexual possessiva

    ou de abuso sexual deve haver considerao mtua,

    tolerncia, esprito de reconciliao, amor .

    Ao nvel das naes e das religies s poder ser praticado

    aquilo que antes j est sendo vivido ao nvel das relaes pes-

    soais e familiares.

    IV.Transformao da conscincia

    Todas as experincias sociais comprovam: a nossa terra no

    ser mudada sem a transformao da conscincia de cada um e

    da esfera pblica. Em questes como guerra e paz, economia e

    ecologia, j ficou demonstrado nas ltimas dcadas que possvel

    realizar essas mudanas fundamentais. Precisamos avanar nessa

    direo tambm em relao ao ethos. Cada indivduo no apenas

    titular de uma dignidade inviolvel e de direitos inalienveis, as-

    siste-lhe tambm uma responsabilidade irrecusvel por tudo que

    188

    /

    Anexo

    faz ou no faz. Todas as nossas decises e aes tm conseqn-

    cias inclusive as nossas falhas e fracassos. .

    uma das funes especf icas das religies manter VIva

    essa responsabilidade, aprofund-la e pass-~a adiante pa a as

    geraes futuras. Adotando uma atitude reahs~a em relaao ao

    consenso ora alcanado, insistimos na necessidade de atentar

    para o que segue: .

    1. difcil chegar a um consenso universal quanto a muitas

    qu estes ticas controver tid as (a come~r 'pela bio~yc~ e

    a tica sexual, passando pela tica da mdia e da cle~c.la,

    at chegar

    tica da economia e do Estado). No espmto

    dos princpios comuns desenvolvidos agora devena ser

    possvel, no entanto, encontrar solue~ adeq~adas ~ara

    muitas das questes que, no momento, amda sao conside-

    radas polmicas.

    2. Em muitas reas j se nota o despertar de uma nova cons-

    cincia em relao responsabilidade tica. Por isso incen-

    tivamos a elaborao de

    cdigos de tica

    atualizados que

    ofeream diretrizes concretas em questes melin~ros~s

    para o maior nmero possvel de ca teg ori as

    profissionais

    como por exemplo os mdicos, os cientistas, os homens

    de negcios, os jornalistas, os polticos.

    3. Gostaramos de insistir sobretudo com os di ve rs os gru pos

    religiosos no sentido de formularem o seu e~ ho s e specfico:

    O que cada uma das tradies de f tem a dizer, por ~xe~-

    plo, sobre o sentido da vida e da morte, sobre o SIgnIfI-

    cado do sofrimento e o perdo de culpas, sobre a entrega

    altrusta e a necessidade da renncia, sobre compaixo e

    alegria. Tudo isso contribuir para o aprofundam~nto, a

    especificao e a concretizao de um

    ethos

    mundial que

    comea a delinear-se.

    Finalizando, dirigimos um apelo a todos os habitantes desse

    planeta: A nossa terra no poder mudar para melhor sem a trans-

    formao da conscincia de cada um. Insist imos numa mudana

    189

  • 7/26/2019 Texto.08.Kng.ethos.mundial

    19/19

    P ar a q ue um ethos mundial?

    da conscincia individual e cole tiva , num despertar das foras

    espirituais pela reflexo, pela meditao, pela orao e pelo pen-

    samento positivo, numa

    converso dos coraes.

    Juntos pode-.

    mos transportar montanhas. A situao no mudar substancial-

    mente se no estivermos dispostos a correr riscos e aceitar sacri-

    f cios. Por isso nos comprometemos todos com um

    ethos

    mun-

    dia l comum: com um melhor entendimento mtuo e com modos

    de vida socialmente mais compatveis, mais favorveis

    paz e

    mais benficos natureza.

    Convidamos todos

    os

    homens,

    sejam eles re ligiosos ou no, a fazer o mesmo

    1993 por Council for a Parl iament of the World Rel ig ions, Chicago,

    preparado por Hans Kng e publicado com comentrios por Piper Verlag

    (Munique), Continuum Publishing (Nova York), SCM Press (Londres),

    Arator Oy (Helsinque), Editorial Trotta (Madri), Les dit ions du Cerf

    (Paris), Gn Yayincilik (Ancara), Bon-Books (Tquio), Rizzoli Libri (Mi-

    lo), The Amity Foundation (Nanjing - Hong Kong).

    190