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ANA CLÁUDIA MORAES JULIANO FIGURAS DE LINGUAGEM NO DISCURSO PUBLICITÁRIO: ANÁLISE DE ANÚNCIOS EM REVISTAS MARÍLIA 2006

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  • ANA CLUDIA MORAES JULIANO

    FIGURAS DE LINGUAGEM NO DISCURSO PUBLICITRIO: ANLISE DEANNCIOS EM REVISTAS

    MARLIA2006

  • ANA CLUDIA MORAES JULIANO

    FIGURAS DE LINGUAGEM NO DISCURSO PUBLICITRIO: ANLISE DEANNCIOS EM REVISTAS

    Dissertao apresentada ao Programa deMestrado em Comunicao, Linha dePesquisa: Produo e Recepo de Mdia, daFaculdade de Comunicao Universidadede Marlia, como exigncia parcial paraobteno do grau de Mestre emComunicao

    Orientadora: Prof. Dr. Elusis Mirian Camocardi

    MARLIA2006

    2

  • UNIVERSIDADE DE MARLIAFACULDADE DE COMUNICAO, EDUCAO E TURISMO

    REITOR

    MRCIO MESQUITA SERVA

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM COMUNICAO

    COORDENADORA PROF DRA SUELY FADUL VILLIBOR FLORY

    REA DE CONCENTRAO

    MDIA E CULTURA

    LINHA DE PESQUISA

    PRODUO E RECEPO DE MDIA

    ORIENTADORAPROF DR ELUSIS MIRIAN CAMOCARDI

    3

  • FOLHA DE APROVAO

    FIGURAS DE LINGUAGEM NO DISCURSO PUBLICITRIO: ANLISE DEANNCIOS EM REVISTAS

    UNIVERSIDADE DE MARLIAMESTRADO EM COMUNICAO

    Mestranda:

    ______________________________________Ana Cludia Moraes Juliano

    Banca Examinadora

    _______________________________________Prof. Dr. Lucilene dos Santos Gonzales

    _______________________________________Prof. Dr. Altamir Battoso

    _______________________________________Orientadora: Prof. Dr. Elusis Mirian Camocardi

    Data da aprovao: _____/______/______

    4

  • AGRADECIMENTOS

    Agradeo a Deus por ter me dado sade para seguir

    essa caminhada.

    orientadora Dra. Elusis Mirian Camocardi que,

    com pacincia, incentivo, dedicao e competncia

    tornou possvel a realizao deste trabalho.

    Aos meus pais Weide e Ivany por acompanharem a

    realizao deste trabalho, sempre incentivando e

    colaborando para eu alcanar mais um objetivo.

    5

  • JULIANO, Ana Cludia Moraes. Figuras de Linguagem no DiscursoPublicitrio: Anlise de Anncios em Revistas. 2005. 132f. Dissertao(Mestrado em Comunicao) Faculdade de Comunicao, Educao eTurismo, Universidade de Marlia, Marlia/SP.

    RESUMO

    Este trabalho tem por objetivo analisar a linguagem usada no discurso publicitrio

    escrito, atravs de anncios publicados em revistas. O texto publicitrio uma forma de

    comunicao de massa, e pretende transmitir informaes e incitar as pessoas a certos

    comportamentos. Com base nesta premissa, analisam-se as funes da linguagem

    publicitria, que possui recursos prprios e so utilizadas para chamar e prender a

    ateno do leitor e faz-lo memorizar a mensagem. Destacam-se tambm a importncia

    do discurso verbal e no verbal, pois a combinao de texto verbal e ilustrao torna-se

    cada vez mais importante para fazer com que o anncio fique mais criativo, estruturado

    e racional para provocar no leitor mudanas de opinio e de comportamento. Abordar-

    se- a ideologia e a persuaso no discurso publicitrio, porque at certo ponto a

    linguagem publicitria reflexo da ideologia dominante dos valores em que a sociedade

    acredita. A dissertao tratar ainda da retrica, que nasceu entre os gregos e foi se

    transformando em mero sinnimo de recursos embelezadores do discurso, e nos dias

    atuais, tem a preocupao de estudar as figuras de linguagem e as tcnicas de

    argumentao. Sero estudados os processos de articulao dos raciocnios textuais,

    como a possibilidade criada pelo uso das figuras de linguagem e sua classificao

    segundo a Retrica Geral de Jean Dubois e outros. E finalizando, analisar alguns

    anncios publicitrios escritos, mostrando uma combinao do discurso verbal e no

    verbal, com o objetivo de tornar a mensagem publicitria criativa.

    Palavras-chave: Discurso verbal e no verbal; retrica; figuras de linguagem.

    6

  • JULIANO, Ana Cludia Moraes. Figures of language in the advertisingexecutive discourse: analysis of announcements in magazines. 2005.132f. Dissertation. (Master in Communication) Faculdade de Comunicao,Educao e Turismo, Universidade de Marlia/SP.

    ABSTRACT

    This work aims at analysing the language used in the writing publicity discourse, through

    the advertisements announced in magazines. The publicity text is a way of

    communication of mass and intend to transmit information and to incite people to have

    certain behaviours. Based on this proposition, we analyse the functions of the publicity

    language, which has its own resources and it is utilized to get and call attention of the

    reader and makes him to memorize the message. We emphasize the importance of the

    verbal and no-verbal speech, because the combination of verbal text and illustration

    becomes more and more important to make the advertisement to convert itself in

    something more creative, organized and with reasoning to provoke changes in the

    readers opinions and behaviours. We will board the ideology and the persuasion in the

    publicity discourse, because we can consider the publicity language as a reflection of the

    dominant ideology of the values in which the society believes. The dissertation will treat

    of Rhetoric which was born among the Greeks and was transforming itself in a simple

    synonym of embellish resources of the discourse and nowadays, it has the

    preoccupation of studying the figures of language and its argumentation techniques. We

    will study the process of articulation of textual reasonings with the possibility created by

    the use of the figures of language and their classification according to the book General

    Rhetoric by Jean Dubois and other authors. And finally, we will analyse some writing

    publicity advertisements, showing a combination of verbal and no-verbal discourse with

    the objective of becoming more creative the publicity message.

    Keywords: Verbal and no-verbal discourse; Rhetoric, figures of language.

    7

  • SUMRIO

    Resumo Abstract

    INTRODUO........................................................................... 09

    1 A LINGUAGEM PUBLICITRIA................................................ 131.1 Caractersticas.......................................................................... 141.2 Funes da linguagem............................................................. 191.3 Mensagens verbal e visual...................................................... 30

    2 IDEOLOGIA E PERSUASO NO DISCURSO

    PUBLICITRIO.......................................................................... 342.1 Discurso publicitrio e ideologia............................................ 342.2 Signo e ideologia...................................................................... 372.3 Persuaso no texto publicitrio.............................................. 41

    3 ARTE DA RETRICA................................................................ 443.1 Elementos histricos: da retrica clssica retrica

    moderna.................................................................................... 443.2 Retrica e publicidade............................................................. 51

    4 TROPOS E FIGURAS DE LINGUAGEM................................... 554.1 Conceito e histria................................................................... 554.2 Classificao............................................................................ 594.3 Anlise de anncios publicitrios.......................................... 77

    CONCLUSO............................................................................ 127REFERNCIAS.......................................................................... 130

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  • INTRODUO

    O discurso publicitrio pode ser considerado o brao direito da

    tecnologia moderna, por apresentar mensagens criativas, inovadoras,

    inusitadas, com a utilizao crescente de novos recursos tecnolgicos.

    Os recursos estilsticos adotados pelas mensagens publicitrias

    correspondem em geral retrica, e se propem a examinar, descrever,

    perceber e avaliar atitudes que venham a influenciar percepes de

    sentimentos e aes empregadas atravs de palavras com diferentes

    9

  • conotaes.

    Estes recursos permitem que a publicidade cumpra sua finalidade

    de persuaso e exera a funo psicolgica. A viso sociolgica presume que

    no se dirige a ningum em especial; a publicidade d a cada um a iluso de

    que se dirige a ele individualmente e, ao mesmo tempo, o faz ter conscincia

    de ser membro de uma cidade.

    A palavra tem poder de criar, destruir, de prometer e negar e a

    publicidade usa desses recursos como principais instrumentos para

    convencer o receptor da mensagem a adquirir o produto veiculado.

    Antigamente, a retrica tinha a preocupao de estruturar o

    discurso, faz-lo de forma convincente, elegante, com arte, com recursos

    embelezadores; hoje busca-se ensinar tcnicas de persuaso. Este novo

    papel est ligado ao estudo das figuras de linguagem e ao das tcnicas de

    argumentao, ou seja, estudar a organizao discursiva para apreender os

    procedimentos que permitem a adeso de um ponto de vista quelas idias

    que lhes so apresentadas. Os processos de articulao dos raciocnios

    textuais surgem como possibilidade criada pelo uso das figuras de linguagem.

    Este trabalho tem por objetivo analisar a linguagem utilizada no

    discurso publicitrio escrito, atravs de anncios publicados em revistas, com

    suas caractersticas, e tambm verificar a importncia do discurso verbal e

    no verbal, uma vez que a combinao de texto verbal e ilustrao torna-se

    cada vez mais importante para expressar os sentidos e provocar mudanas

    de opinio. Discutir-se- a Ideologia, a persuaso e a retrica como recursos

    10

  • para expressar o pensamento dominante e os valores em que a sociedade

    acredita, bem como a maneira como se enxerga o mundo.

    O primeiro captulo abordar o estudo da linguagem publicitria,

    destinada a apresentar caractersticas reais do produto e tambm

    caractersticas subjetivas do produto, com a finalidade de argumentar para

    persuadir os indivduos a mudarem de atitudes diante do que lhes oferecido.

    A linguagem dos anncios deve ser rpida, leve, coloquial para

    atrair o leitor e facilitar o conhecimento da mensagem que transmitida, fato

    este que ser estudado nas funes da linguagem, cada uma com um

    anncio exemplificativo para demonstrar alguns recursos lingsticos usados,

    j que so estes que importam na realizao da mensagem publicitria. A

    organizao das funes pode torn-la mais criativa, estruturada e apelativa,

    com a finalidade de provocar no leitor mudanas de opinio.

    No captulo 2, observar-se-o a ideologia e a persuaso no discurso

    publicitrio, porque at certo ponto a linguagem publicitria reflexo da

    ideologia dominante dos valores em que a sociedade acredita.

    Reconhecemos que a ideologia um componente necessrio da vida

    humana, pois, se no nos apegssemos a certas atitudes e formas de pensar,

    nossa conscincia estaria num fluxo constante, que nos paralisaria por

    completo. Como recurso persuasivo, ou de convencimento, a publicidade

    recorre a apelos verbais e visuais, com o objetivo de fazer o leitor acreditar

    naquilo que se prope atravs de idia bsica ou tema. Esses apelos podem

    vir concretizados em imagens, formas, cores, volumes, gestos, olhares,

    11

  • expresso corporal em rostos belos, em dolos, artistas, heris, esportistas e

    em ambientes sugestivos, elegantes capazes de traduzir sensualidade,

    charme, erotismo, beleza, esportividade e prestgio.

    O captulo 3 tratar da retrica, visto que na antiguidade o estudo da

    persuaso, que nasceu entre os gregos, pressupe conhecimentos do

    domnio da expresso verbal com a necessidade de exposio pblica das

    idias para justificar uma certa democracia. A ela competia o manejo hbil das

    formas de argumentao. A retrica foi se transformando em mero sinnimo

    de recursos embelezadores do discurso, ganhando at um certo tom

    pejorativo. Um pouco dessa posio preconceituosa se deve a certas vises

    tericas, como as desenvolvidas no sculo XVIII e XIX, quando os estudiosos

    no a tratavam apenas como questo de mtodo compositivo, e de

    estruturao gramatical, mas buscavam com as figuras de retrica o melhor

    enfeite, a palavra mais bela.

    Com o passar dos anos, a retrica foi tendo suas funes alteradas:

    da preocupao com as tcnicas de organizao do discurso e com a

    persuaso, o que se ir presenciar no final do sculo XIX uma vinculao da

    retrica com a idia de embelezamento do texto.

    O novo papel da retrica est ligado a duas questes importantes: a

    do estudo das figuras de linguagem e o das tcnicas de argumentao, ou

    seja, estudar a organizao discursiva a fim de apreender os procedimentos

    que permitem ligar a adeso de um ponto de vista quelas idias que lhes so

    apresentadas. Refere-se a processos de articulao dos raciocnios textuais,

    12

  • como a possibilidade criada pelo uso das figuras de linguagem, tema que ser

    abordado no captulo 4, sua classificao segundo a obra Retrica geral de

    Jean Dubois e outros.

    O captulo 4 ainda analisar alguns anncios publicitrios escritos

    extrados de revistas, mostrando uma combinao do discurso verbal e no

    verbal, com o objetivo de tornar a mensagem publicitria criativa.

    Este trabalho seguir um raciocnio didtico, voltado para alunos de

    graduao, com o objetivo de incentiv-los ao estudo das figuras de

    linguagem, tendo como classificao outras teorias existentes e portanto com

    nomenclatura diversa da costumeira, mas que podem ser encontradas

    tambm no discurso publicitrio escrito com freqncia, como em revistas

    veiculadas em todo os meios de divulgao.

    1 A LINGUAGEM PUBLICITRIA

    Para se definir com exatido e clareza a linguagem publicitria,

    torna-se necessrio tecer algumas consideraes sobre a noo de texto.

    Segundo Plato & Fiorin (2000, p.11-12) o texto no um

    aglomerado de frases. Isso quer dizer que todas as frases de um texto tm

    significado prprio e esto relacionadas entre si: o significado das partes

    depende das correlaes que elas mantm entre si. Alm disso, um pequeno

    13

  • texto no parte isolada de um texto maior, a que se pode denominar

    contexto.

    Entende-se por contexto uma unidade lingstica maior onde seencaixa uma unidade lingstica menor. Assim, a frase encaixa-se nocontexto do pargrafo, o pargrafo encaixa-se no contexto docaptulo, o captulo encaixa-se no contexto da obra toda. (2000, p.12)

    Concluindo com os professores e crticos acima citados, h que se

    observar que uma leitura bem feita deve basear-se nas correlaes que as

    frases mantm num texto e que o significado desse texto s pode ser

    apreendido dentro de um contexto. Por isso, uma boa leitura nunca pode

    deixar de apreender o pronunciamento contido por trs do texto, j que

    sempre se produz um texto para marcar posio frente a uma questo

    qualquer. (2000, p.13)

    Mas essa correlao de significados no ocorre apenas com o texto

    verbal. O texto no verbal tambm possui estruturao interna, encadeamento

    de idias, est inserido em contextos mais amplos. Na linguagem publicitria,

    o texto verbal assume relacionamentos com outros cdigos, como a cor, a

    imagem, o movimento, o som.

    Um texto publicitrio compe-se de linguagem verbal e linguagem

    no verbal, intimamente relacionadas quanto ao significado.

    1.1 Caractersticas

    14

  • Segundo Vestergaard & Schroder (1988, p.14 apud GONZLES,

    2003, p.14) o texto publicitrio uma forma de comunicao de massa, cujos

    objetivos so transmitir informao e incitar as pessoas a certos

    comportamentos.

    O texto publicitrio apresenta as seguintes caractersticas:

    uma unidade de sentido estruturada por signos lingsticosverbais e signos no-verbais, como cones, imagens, smbolos;

    uma forma de comunicao de massa que se dirige a umpblico annimo, desconhecido dos anunciantes;

    uma forma de comunicao de carter informativo e, ao mesmotempo, persuasivo, com finalidades ideolgicas divulgar as

    idias (propaganda) e comerciais vender produtos e servios

    (publicidade).

    Os termos propaganda e publicidade so utilizados indistintamente

    por muitos autores e profissionais da rea publicitria, bem como no dia-a-dia

    do mercado embora usados como sinnimos, no significam rigorosamente a

    mesma coisa.

    A palavra propaganda deriva do latim propagare, que significa

    reproduzir por meio de mergulhia, ou seja, enterrar o rebento de uma planta

    no solo. Em outras palavras, propagare quer dizer enterrar, mergulhar,

    plantar (CHAISE, 2001, p.10). Pode-se entender como propagao de

    princpios, teorias, doutrinas.

    15

  • Foi em Roma no ano de 1597, que o termo propaganda foi

    introduzido pelo Papa Clemente VII, quando fundou a Congregao da

    Propaganda, com o intuito de propagar a f catlica pelo mundo.

    Posteriormente, em 1740, o vocbulo foi introduzido no Dicionrio da

    Academia Francesa, com o significado eclesistico. Atualmente, a

    propaganda definida como um conjunto de tcnicas com a inteno de

    persuadir e influenciar as opinies, e modificar as atitudes do pblico receptor.

    A palavra publicidade de origem latina publicus, e quer dizer ato

    de divulgar, de tornar pblico. a forma de divulgar produtos ou servios, por

    meio de anncios com o objetivo de interesse comercial.

    A propaganda abrange a divulgao de idias como tambm a

    venda de produtos e servios; a publicidade o ato de divulgar, de tornar

    pblico. A diferena essencial entre publicidade e propaganda so os

    objetivos, que, na primeira, so comerciais, e, na segunda, no comerciais e

    sim ideolgicos.

    Em contrapartida, a propaganda se assemelha publicidade ao

    criar, transformar ou confirmar certas opinies, empregando meios e tcnicas

    que lhes so comuns. Assim, possvel afirmar que a publicidade uma

    decorrncia da propaganda, tendo em vista que ambas exercem uma ao

    psicolgica no pblico pela divulgao de mensagens.

    A linguagem publicitria possui como modalidade tcnica um certo

    grau de formalidade e de adequao mensagem a ser expressa. Essa

    adequao segue a norma lingstica falada, para que o destinatrio a

    16

  • compreenda melhor, e tambm obedece s caractersticas do produto

    oferecido e funo persuasiva prpria da publicidade.

    Desde o incio do sculo XX, o discurso publicitrio firmou-se pelacriatividade e pela linguagem mais apurada e persuasiva, imitando omodelo americano das primeiras agncias que chegavam ao Brasilque muito contriburam para o aperfeioamento do sistema depropaganda no pas. Predominam nos textos publicitrios atuais,alm da criatividade, a inovao, a originalidade, a busca derecursos retricos, tanto no texto quanto na ilustrao aperfeioadapela moderna tecnologia. (CAMOCARDI; FLORY, 2003,p.22)

    A linguagem usada pelas agncias de publicidade nos anncios e

    textos comerciais sofreu grandes modificaes desde os primrdios da

    atividade propagandstica at nossos dias. Historicamente, essas

    modificaes aparecem nos anncios desde a dcada de 20 com os textos de

    hoje, e essa evoluo quanto linguagem publicitria, a partir dos textos

    escritos por Monteiro Lobato, para divulgar o Biotnico Fontoura como

    remdio eficaz. Por volta de 1900, os Estados Unidos surgiram no cenrio do

    mundo industrial e comercial, contribuindo para mudar a mentalidade negativa

    da publicidade de que anunciar fraudar, existente ainda hoje em nosso

    meio, sobretudo da parte dos comerciantes sem clientela tradicional e fixa

    (MARTINS, 1997, p.33).

    No comeo do sculo, alm do cinema, aperfeioam-se tambm as

    grandes revistas norte-americanas, francesas e inglesas e mais um veculo

    publicitrio apresenta um elemento novo de atrao psicolgica: a cor.

    Logo aps a Segunda Guerra desenvolve-se um veculo

    17

  • revolucionrio: a televiso que coloca nos lares uma pessoa que quer vender

    um produto. O objetivo atingir uma tcnica em que o vendedor ao lado do

    cliente demonstre o momento adequado, o valor do produto anunciado, para

    que, no dia seguinte, realize a compra. A dcada de 50 trouxe o surgimento

    das escolas de comunicao e a multiplicao das agncias de propaganda

    em todos os Estados.

    Com esses marcos, a linguagem publicitria transforma-se bastante,

    torna-se mais dinmica e mais sinttica e foge ao cdigo formal da lngua sem

    o abandonar totalmente, assimila o registro coloquial corrente nos grandes

    centros, com o objetivo de obter maior identificao com o grande pblico.

    Esses cdigos lingsticos, formal - usado no incio, e o coloquial -

    mais aceito agora, mostraro daqui por diante as caractersticas dos produtos,

    uma vez que para uns necessria a linguagem sria e correta para valorizar

    a nobreza, ou a espcie dos objetos, como jias, sade, bancos,

    empreendimentos. Para outros, indispensvel o uso de linguagem leve,

    rpida, coloquial, e at mesmo humorstica, desde que atinja os

    consumidores, ou o seu nvel social, como o caso de sabes, cigarros,

    roupas, palha de ao, cerveja. A linguagem do anncio publicitrio precisa

    atrair o leitor e facilitar o conhecimento da mensagem que transmitida.

    A publicidade busca novas formas nos anncios, entre as quais se

    destacam: uma nova linguagem que seja adequada s rpidas mudanas

    quanto moda, costumes, avano nos meios de comunicao e nos produtos

    de consumo; como exemplo: eletrnicos, eletrodomsticos. A originalidade

    18

  • nas mensagens adaptadas ao ritmo acelerado da vida urbana e o gosto por

    tudo o que novo, diferente e simples, tais como as formas de linguagem da

    TV, rdios. Mudanas na abordagem das relaes com o consumidor,

    seguindo conceitos de viver, com discursos que consideram que o prazer

    individual e imediato o nico bem possvel, princpio e fim da vida moral,

    assim como estes exemplos: pensamos em voc... seu prazer de todos os

    dias. Outro estilo de discurso publicitrio, que substitui cdigos antigos, as

    mensagens do teatro por formas mais agradveis, mais polida e mais

    simpticas, como se observa nos seguintes exemplos: um perfume para

    sonhar..., o gosto de toda a gente ser tambm o seu. A promoo de um

    novo consumo dirigido para o que o pblico quer e no o que o fabricante

    deseja, e sim direcionado s necessidades psicolgicas do indivduo, s suas

    aspiraes e aos desejos do consumidor.

    Para atingir os objetivos de divulgao e assimilao de idias e de

    venda de produtos e servios, a linguagem publicitria utiliza-se de funes,

    como poderemos verificar na seqncia do nosso trabalho.

    1.2 Funes da Linguagem

    O estudo das funes da linguagem ganha destaque no discurso

    publicitrio, pois as funes so utilizadas para chamar e prender a ateno

    do leitor e faz-lo memorizar a mensagem. E isso se consegue, entre outros

    recursos, com destaque ao cdigo lingstico, com as tcnicas que pem em

    19

  • evidncia a mensagem, cujo objetivo a venda do produto/servio ou a

    disseminao das idias.

    Segundo Jakobson (1995, p.123-162), seis so as funes da

    linguagem, mas no se quer dizer que uma funo exclua outra ou outras. O

    que h , a rigor, o predomnio de uma ou outra. Assim, o interesse do ato

    comunicativo pode estar centrado mais no remetente, no codificador, na 1

    pessoa. O emissor fala de si mesmo, d vazo a seus sentimentos, usa o

    pronome da 1 pessoa, produz frases exclamativas, usa interjeies. A essa

    funo d-se o nome de funo emotiva ou expressiva. H predominncia

    dessa linguagem em textos que revelam os emissores voltados para si

    mesmos, para os prprios sentimentos, expressando o seu emocional. Nota-

    se, por isso, a presena reiterada de verbos e pronomes em primeira pessoa

    e de pontos de exclamao, enfatizando os aspectos emocionais da

    linguagem dos emissores.

    Esse tipo de funo tem forte presena na poesia lrica e, como de

    se esperar, no to comum na linguagem publicitria.

    Observe-se, como exemplo, o anncio publicitrio da Jovem Pan,

    destinado a estudantes que possuem carteirinha que garantam benefcios

    culturais conquistados pela UNE e UBES e outros benefcios para economizar

    dinheiro: Eu tenho, Eu vou! NA FAIXA! Com a carteira do Estudante Jovem

    Pan UNE/UBES voc vai s melhores BALADAS e SHOWS EXCLUSIVOS

    (REVISTA CLUDIA).

    20

  • 21

  • Na imagem, observamos a alegria e a satisfao de um jovem ao

    conseguir vantagem com descontos, utilizando carteiras de estudante JOVEM

    PAN UNE/UBES. No discurso verbal, atravs do uso pronominal de 1 pessoa

    22

  • do singular, eu e dos verbos ter e ir, EU TENHO, EU VOU, o rapaz afirma

    possuir os objetos do anncio publicitrio e o seu desejo de usufruir das

    vantagens oferecidas: na compra de livros (Submarino), de doces (Mr.

    Pretzels), de roupas (Sibria, Cavalera), de lanches (Baked Potato, The

    Fifties) viagens (Central de Intercmbio) divertimentos (Hopi Hari), cursos de

    idiomas (Yzigi), e at mesmo aluguel de filmes (Blokbuster), mensalidades

    de academias (Bio Ritmo Academia) e visitas a motel (Studio A Motel). O

    emissor transmite informaes sobre o que tem e o que pretende realizar.

    Atravs do slogan EU TENHO, EU VOU! NA FAIXA!, podemos detectar a

    funo emotiva da linguagem. Da a imagem refletir as emoes do olhar e do

    sorriso do anncio. Linguagem verbal e visual complementam-se.

    O mesmo anncio publicitrio apresenta tambm a funo apelativa

    ou conativa da linguagem, porque a funo apelativa tem por objetivo mover o

    decodificador, o destinatrio do cdigo ao consumo de mercadorias ou ao uso

    de servios. Quando o ato comunicativo externa forte apelo ao receptor, ao

    destinatrio, ao interlocutor ou decodificador da mensagem, dizemos que

    predomina a funo apelativa ou conativa, quando, na linguagem, h por

    parte do emissor o desejo de atuar sobre o receptor, levando-o a uma

    mudana de comportamento. E isso pode acontecer por meios de uma ordem,

    um apelo, uma sugesto, uma splica. Trata-se, portanto, de uma funo

    usada para se atrair a ateno do receptor e influenci-lo a receber a

    mensagem. Na funo apelativa, os verbos aparecem no modo imperativo e

    os vocbulos so cuidadosamente escolhidos a fim de envolver o receptor:

    23

  • Confira algumas vantagens e so nomeadas dezessete empresas que

    oferecem descontos ao receptor. Nesse elenco de empresas observa-se a

    predominncia da funo referencial ou informativa.

    No difcil imaginar que na linguagem publicitria a funo

    apelativa esteja muito presente, pois o objetivo vender um bem de consumo,

    um produto, um servio, ou uma idia; persuadir algum, levar algum a

    um comportamento: Beba Coca-Cola. Vender um produto, atingindo, por

    exemplo a vaidade do leitor: No basta um bom shampoo para fazer a

    cabea de uma mulher inteligente; Durma no colcho Castor. (Revista

    Cludia, dezembro 1998)

    A funo referencial se destaca na linguagem tcnica ou cientfica,

    em que os fatos esto em evidncia e devem convencer o destinatrio da

    mensagem e eventualmente lev-lo a agir. Emissor e receptor ficam em

    segundo plano, nem h a preocupao em dar especiais efeitos estilsticos

    mensagem. O verbo est preferencialmente na terceira pessoa e com muita

    freqncia na voz passiva, tipo de predicado que tem como sujeito o elemento

    que na voz ativa o objeto direto, sendo tambm freqente o uso do pronome

    oblquo se.

    A funo referencial ou informativa, tambm chamada denotativa, certamente a mais comum, porque a mais usada no cotidiano. Elaprivilegia o contexto e evidencia o assunto, o objeto, os fatos, osjuzos. a linguagem da comunicao, das descries objetivas, dasnarraes convencionais, das dissertaes, dos ensaios cientficos,do discurso jornalstico, da correspondncia oficial e comercial etc...(CAMOCARDI; FLORY, 2003, p.21)

    24

  • Observemos a propaganda seguinte:

    25

  • A referida propaganda um exemplo da funo referencial. Trata-se

    da publicidade do Programa do Governo em parceria com o Banco do Brasil

    para financiamentos: Mrcia sempre sonhou em ter oportunidade de estudar.

    O pai de Mrcia foi ao Banco do Brasil e com os recursos do PRONAF,

    Programa Social do Governo Federal, fez um financiamento, aumentou a

    produo da sua propriedade e, assim, teve condies de realizar o sonho da

    sua filha: entrar para a Faculdade, hoje, alm de estudar, Mrcia pode contar

    as vantagens da conta Universitria do Banco do Brasil para ajudar na sua

    formao. assim que o Banco do Brasil est ajudando a construir um Brasil

    melhor. O discurso no verbal apresenta Mrcia sonhando que est

    freqentando Faculdade e prestando ateno s aulas e em destaque mostra

    como o Carto do Banco do Brasil que ela obter para receber seu

    financiamento, caso venha a inscrever-se nesse programa. Esta funo se

    destaca pelo grande teor de informao; os verbos esto na voz ativa: O pai

    de Mrcia foi ao Banco do Brasil... fez um financiamento... aumentou a

    produo... teve condies de realizar o sonho... Mrcia pode contar...

    Na funo potica, a mensagem posta em destaque. O emissor

    tem um cuidado especial na escolha das palavras, realando sons que

    proporcionam significados diversos e empregando imagens sugestivas, a fim

    de expressar ou enfatizar a sua mensagem.

    Tome-se como exemplo o anncio publicitrio de Guttalax, cujo

    slogan A independncia uma prola, que apresenta como recurso

    estilstico a metfora in praesentia (em presena), na comparao

    26

  • estabelecida entre independncia e prola.

    A preocupao com a elaborao da mensagem no

    caracterstica exclusiva dos textos literrios. Para auxiliar a memorizao, por

    exemplo, os anncios publicitrios exploram a repetio sonora, como

    acontece neste texto: Nunca tanta gente se juntou para ajudar no seu

    trabalho (SERRANA ao lado de quem produz). A repetio dos fonemas

    linguodenatis /t/ (tanta gente juntou trabalho); e constritivos /g/ (gente,

    juntou), que constituem figuras de aliterao e as vogais nasais //// que

    emprestam musicalidade ao texto verbal. Encontramos a mesma explorao

    da linguagem com a presena marcante da funo potica em propagandas

    polticas.

    importante ressaltar que, em um mesmo texto, podem coexistir

    mais de uma funo de linguagem. Todo texto informa alguma coisa; logo, a

    funo referencial est sempre presente. Igualmente a funo potica se faz

    presente em textos artsticos ou literrios. Assim, dependendo da inteno do

    emissor ao elaborar sua mensagem, pode predominar uma ou outra funo

    da linguagem num texto ou numa fala em que estejam sendo empregadas

    vrias delas.

    Quando os enunciados procuram averiguar se o contato com o

    interlocutor est vivo, se o canal de comunicao est operando, fala-se em

    funo ftica.

    A funo ftica predominante quando, num texto, emprega-se a

    linguagem para iniciar, prolongar, verificar, testar ou interromper a prpria

    27

  • comunicao. Esta funo pe o canal de comunicao em destaque,

    verificando se o contato entre o emissor e o receptor continua sendo mantido.

    Na funo ftica, muitas vezes, ocorrem frases vazias, sem significado, que

    servem apenas para manter a conversao. Exemplo: Afinidade o que liga

    Roberto Cludia. Inovao o que liga os dois CTBC. Solues em

    telefonia fixa, celular, internet banda larga e data center que deixam a

    comunicao simples. Para cada um falar do seu jeito. CTBC A GENTE

    FALA DO SEU JEITO.

    28

  • No texto, nota-se o objetivo de pr em destaque o canal de

    comunicao, em face da forte insistncia em manter evidente o contato entre

    emissor e o receptor. Por isso, dizemos que h predomnio, portanto, da

    funo ftica da linguagem.

    No discurso publicitrio encontramos muitos exemplos dessa

    funo.

    A funo metalingstica ocorre quando se discorre sobre o prprio

    cdigo. , na verdade, a prpria linguagem que est em jogo. O emissor

    utiliza-se dela para transmitir ao receptor suas reflexes sobre ela mesma.

    Assim, o prprio cdigo lingstico discutido e posto em destaque. Tome-se

    como exemplo a definio ou conceito de um vocbulo.

    O texto do lingista brasileiro Francisco da Silva Borba (apud

    Mesquita, 2000, p.30) comprova nossas afirmaes:

    (...) Se a linguagem atividade mental e capaz de expressarestados mentais, logo verificamos que linguagem e pensamento serelacionam muito estreitamente. Um depende do outro paradesenvolver-se em larga escala. O pensamento s exteriorizadopela linguagem.

    O lingista, ao discutir a linguagem, utilizou-se dela prpria para

    levar o receptor s suas reflexes. Nota-se, por exemplo, o emprego da

    funo metalingstica em um texto em prosa ou no, que discuta a criao

    artstica em si; um programa de televiso que debata sua funo educativa;

    um filme que questione a prpria arte cinematogrfica; livros de lingstica ou

    29

  • gramtica que procurem estabelecer princpios para os diversos usos de

    linguagem. Tambm os dicionrios so exemplos do uso da funo

    metalingstica.

    Destaca-se a importncia da funo esttica na linguagem

    publicitria porque essa funo chama a ateno para o texto, para o cdigo.

    As pessoas recebem muitos estmulos atravs de mensagens publicitrias,

    pois elas despertam e prendem a ateno do leitor, fazendo-o memorizar a

    mensagem. E isso se consegue com recursos que do destaque ao cdigo

    lingstico, e com recursos que pem em evidncia a mensagem, cujo

    objetivo chocar ou causar estranhamento.

    Causar estranhamento no leitor no s funo da metfora ou da

    metonmia ou ainda da linguagem figurada em geral. Muitos outros recursos

    tm esse objetivo. Averiguar quais so esses recursos, descrev-los e,

    analisar anncios publicitrios nas linguagens verbal e visual so os objetivos

    desta pesquisa.

    Recursos de que se serve a linguagem publicitria para sua funo

    esttica ou potica so, entre outros, as figuras de harmonia, como a

    paronomsia, a aliterao, a sinestesia, a assonncia; as figuras de

    construo, como: anadiplose, trocadilho, dicope, epizeuxe, pleonasmo,

    hiprbato, silepse; as figuras de pensamento: ironia, anttese, aluso,

    comparao, hiprbole; os tropos: imagem, metfora, metonmia, smbolo,

    etc.; aspectos sintticos, aspectos semnticos, linguagem figurada, letras ou

    combinaes de letras que vamos chamar de exticas, o jogo com a palavra e

    30

  • com a frase feita (TAVARES, 1978, p.328-329).

    Alguns recursos lingsticos tambm podem ser usados no discurso

    publicitrio como a paronomsia, com o jogo de verbos: A mame disse para

    que nos amssemos e no para que nos amassemos (Revista Cludia,

    dezembro 1998, p.34) Comparar antes de comprar; outros recursos

    freqentes em textos de propaganda e que visam dar nfase forma de

    comunicao so a rima, o ritmo e as aliteraes, recursos todos que visam

    prender a ateno do receptor, faz-lo ocupar-se com a mensagem, ajud-lo

    a memoriz-la e, por fim, persuadi-lo a agir.

    1.3 Mensagens Verbal e Visual

    Na nossa cultura, a combinao de texto verbal e ilustrao torna-se

    cada vez mais importante. De um lado temos um texto com recursos

    lingsticos para o desenvolvimento do anncio publicitrio com o objetivo de

    provocar mudanas de opinio nos leitores e por outro, linguagens no

    verbais que expressam sentido e utilizam tambm signos lingsticos, com a

    diferena de que, na linguagem verbal, os signos so sons da lngua

    (palavras), e no discurso no verbal os signos so explorados de forma

    imagtica, sonora, pela cor, pelo movimento.

    Quando o texto e imagem coincidem nos veculos impressos, a

    relao mais freqente entre um e outra o que Barthes (apud

    31

  • VESTERGAARD & SCHODER, 2000, p.31) chama de ancoragem, que

    significa um elo entre a imagem e a situao espacial e temporal que os

    meios puramente visuais de expresso no permitem estabelecer. Abrange

    tudo o que, no texto, apia a imagem na realidade, ajudando-nos a interpret-

    la. O texto tambm seleciona uma entre vrias interpretaes possveis da

    imagem, razo pela qual se pode dizer que, enquanto uma imagem em si

    mesma sempre neutra, se tiver ttulo ou legenda nunca o ser.

    Nesta funo de ancoragem, o papel da linguagem substituir a

    imagem ou completar seu sentido, elucidar em nvel denotativo e conotativo1

    e agir como orientadora da significao. Na imagem, esto subentendidos

    seus significantes, uma rede flutuante de significados2 dos quais o leitor

    escolhe uns e rejeita outros, orientado pelo texto lingstico que a acompanha.

    Segundo Barthes (1971), a linguagem tem o papel de sustentar a

    mensagem visando identificar os elementos da percepo denotativa icnica3

    e evitar erros de identificao trazidos pelas vrias leituras possveis.

    O que importa na realizao da mensagem publicitria a

    organizao de processos para torn-la criativa, estruturada e com raciocnio

    1 Denotao: a relao existente entre o plano da expresso e o plano do contedo. Desse modo, significadode denotativo aquele conceito que um certo significante evoca no receptor. Em outras palavras, o conceito aoqual nos remete um certo significante. (PLATO & FIORIN, 2000, p.113) Conotao: Um termo ou uma palavra, alm do seu significado denotativo, pode vir acrescido de outrossignificados paralelos, pode vir carregado de impresses, valores afetivos, negativos e positivos. Assim, sobreum signo lingstico, dotado de um plano de expresso e um plano de contedo, pode-se construir outro planode contedo constitudo de valores sociais, de impresses e reaes psquicas que um signo desperta. Essesvalores sobrepostos ao signo constituem aquilo que denominamos de sentido conotativo e esse acrscimo deum novo contedo constitui a conotao. (PLATO & FIORIN, 2000, p.114)2 Significado o efeito direto realmente produzido no intrprete pelo signo; aquilo que concretamenteexperimentado em cada ato de interpretao, dependendo portanto do intrprete e da condio do ato e sendodiferente de outra interpretao. Significante, parte fnica, ou imagem acstica de um fonema ou seqncia defonemas provido de significao. (COELHO NETTO, 2001, p.72)3 cone um signo cuja conexo com o objeto repousa num certo tipo de similaridade. (VESTERGAARD &SCHRODER, 2000, p.35)

    32

  • para provocar no leitor mudanas de opinio e de sentimentos, a fim de

    convenc-lo a assumir determinados comportamentos sobre um produto ou

    servio.

    Erros so corrigidos, palavras so substitudas e termos

    desnecessrios so retirados no processo de elaborao do texto com o

    objetivo de realiz-lo com caractersticas prprias da publicidade, pelo fato de

    ser destinado a controlar o comportamento, direcionar e sugerir decises. Na

    organizao da mensagem publicitria importa sobretudo o que oferecido e

    como oferecido, o contedo e a expresso da mensagem (MARTINS,

    1997, p.39).

    O plano do contedo o relato de fatos que demonstram a idiacentral ou tema. A disposio do enunciado depende da criatividadedo redator e deve constituir a estrutura interna do texto formada porsegmentos que convergem em seqncias lgicas para o tema ouncleo. O plano da expresso a forma, ou texto significante. Aexpresso o texto perceptvel revelador de uma realidade queutiliza os signos lingsticos como instrumental, nos trs nveis, o dossons ou fonemas; o das apalavras; o das frases ou construes.(MARTINS, 1997, p.39)

    O contedo formado por elementos que se referem s

    caractersticas objetivas e reais do produto-objeto do anncio, a seus valores

    racionais e concretos, como os valores dirigidos s faculdades psquicas dos

    receptores. E tambm os processos argumentativos e os juzos que acionam,

    como instrumentos, os campos da significao e da expresso das idias.

    Essas partes do contedo apresentam-se em conjunto para explicar,

    comprovar e complementar o tema, compondo o plano de significao. Esta

    33

  • significao reforada por conotaes e recursos utilizados pelo redator,

    alcanando as figuras de linguagem e transformaes devidas, para transmitir

    idias.

    Quanto ao plano da expresso, utilizam-se elementos que

    constituem a forma expressiva, e que residem nos campos da morfologia e da

    sintaxe. A forma criativa aproveita os recursos lingsticos para aprimorar a

    expresso do pensamento tais como: rimas, paronomsia, ritmo e outros

    recursos estilsticos e estticos.

    Depois dessas consideraes sobre as mensagens verbal e visual,

    ressaltamos que outra inteno deste trabalho verificar qual o lugar das

    determinaes ideolgicas neste complexo fenmeno que a linguagem,

    analisar como a linguagem veicula a ideologia, mostrar o que o ideologizado

    na linguagem; estes so os objetivos do prximo captulo.

    34

  • 2 IDEOLOGIA E PERSUASO NO DISCURSO PUBLICITRIO

    2.1 Discurso Publicitrio e Ideologia

    Os aspectos que podem interessar ao estudo do discurso

    publicitrio so o jurdico, o tico e o sociolgico. Como aspecto sociolgico,

    destaca-se a ideologia ou os valores que ganham nfase no discurso

    publicitrio, por seu reflexo sobre a linguagem. Aspectos ticos so, por

    exemplo, os que levaram suspenso, pelo CONAR (Conselho Nacional de

    Auto-Regulamentao Publicitria), de anncios publicitrios das indstrias de

    bebidas, cigarros, roupas, entre outros. Como exemplo, temos uma campanha

    publicitria da conhecida marca de roupas BENETON, exibida em vrios

    pases, que foi objeto de ao cautelar movida pelo Ministrio Pblico de So

    Paulo, objetivando a sustao de sua veiculao. A pea publicitria mostrava

    a fotografia de um paciente de AIDS no exato momento de sua morte.

    A linguagem publicitria , at certo ponto, reflexo e expresso da

    ideologia dominante dos valores em que se acredita; ela manifesta a maneira

    de ver o mundo de uma sociedade em certo espao da histria. Segundo o

    Dicionrio da Lngua Portuguesa, de Aurlio Buarque de Holanda Ferreira,

    ideologia

    [...] pensamento terico que pretende desenvolver-se sobre seusprprios princpios abstratos, mas que, na realidade, a expressode fatos, principalmente sociais e econmicos, que so levados emconta ou no so expressamente reconhecidos como determinantes

    35

  • daqueles pensamento. (1986, p.913)

    No Dicionrio Houaiss de Lngua Portuguesa (2001, p.1565),

    ideologia pode ser definida como

    [...] sistema de idias (crenas, tradies, princpios e mitos)interdependentes, sustentadas por um grupo social de qualquernatureza ou dimenso, as quais refletem, racionalizam e defendemos prprios interesses e compromissos institucionais, sejam estesmorais, religiosos, polticos ou econmicos // p.ext. conjunto deconvices filosficas, sociais, polticas, etc., de um indivduo ougrupo de indivduos.

    Como no existe conhecimento neutro, uma vez que todo

    conhecimento encontra-se comprometido com interesses sociais, podemos

    deduzir que ideologia, por ser um sistema de idias de um indivduo ou grupo

    social, viso de mundo. , pois, o ponto de vista de um indivduo, de uma

    classe social, de uma empresa ou de uma instituio a respeito da realidade.

    a maneira como uma classe ordena, justifica e explica a ordem social.

    Podemos deduzir, portanto, que h tantas vises de mundo quantas foram as

    classes sociais.

    Esses valores aceitos pela sociedade, demonstrados atravs de um

    conjunto de idias que servem para justificar e explicar a ordem social, as

    condies de vida do homem e as relaes que ele mantm com os outros

    homens, o que se chama ideologia.

    A ideologia pertence ao domnio do senso comum e, por sua vez, o

    conceito do senso comum nos permite alcanar a essncia da ideologia como

    aquilo que , ao mesmo tempo, visvel para todos e invisvel por seu carter

    36

  • bvio, como no exemplo de anncios publicitrios que possuem a figura da

    me, em que a reao reflete na crena inata de que os laos entre me e

    filho so to fortes que nada pode romp-los e que a diferena entre amor

    materno e amor paterno no de grau, mas de gnero. Em nossa sociedade,

    a ideologia do amor materno pode ser considerada como o esteio da estrutura

    da famlia tradicional e do acesso ao amor-prprio da mulher economicamente

    dependente. Em nossos dias, alguns homens encararo os sagrados laos

    maternos como uma prerrogativa feminina que gostariam de compartilhar.

    Em resumo, reconhecemos que a ideologia um componente

    necessrio da vida humana, pois se no nos apegssemos a certas atitudes

    fundamentais e formas de pensar, nossa conscincia estaria num fluxo

    constante, que nos paralisaria por completo. Devemos lembrar que at

    mesmo os nossos valores fundamentais so produto do conhecimento

    humano e dos processos culturais e, como tal, esto sujeitos a mudanas.

    Podemos afirmar que o conhecimento est ligado ao interesse social e

    portanto viso que cada um tem do mundo, o seu ponto de vista.

    Uma formao ideolgica dever ser entendida como a viso demundo de uma determinada classe social, isto , um conjunto derepresentaes, de idias que revelam a compreenso que umadada classe tem do mundo. A cada formao ideolgica correspondeuma formao discursiva, pois no existem idias fora dos quadrosda linguagem. (CAMOCARDI; FLORY, 2003,p.64)

    O estudo da ideologia est ligado com os do signo, portanto, esta

    questo ser tratada no item seguinte, uma vez que entre eles h uma

    37

  • relao de dependncia que ser descrita.

    2.2 Signo e Ideologia

    No possvel afastar o estudo da ideologia e o estudo dos signos,

    pois a questo do signo se prolonga na questo das ideologias, h entre

    ambos uma relao de dependncia tal que nos levaria a crer que s

    possvel o estudo dos valores e idias contidas nos discursos atentando para

    a natureza dos signos que os constroem. Assim sendo, os recursos retricos

    que entram na organizao de um texto no seriam meros recursos formais,

    jogos visando deixar a frase com mais palavras bonitas; ao contrrio, o modo

    de dispor o signo, a escolha de um ou outro recurso lingstico, revelaria

    mltiplos comprometimentos de cunho ideolgico.

    A relao entre signo e ideologia ocorre nos dizeres de Bakhtin

    (apud CITELLI, 2002, p.27):

    Um produto ideolgico faz parte de uma realidade (natural ou social)como todo corpo fsico, instrumento de produo ou produto deconsumo; mas, ao contrrio destes, ele tambm reflete e refrata umaoutra realidade, que lhe exterior. Tudo que ideolgico possui umsignificado e remete a algo situado fora de si mesmo. Em outrostermos, tudo que ideolgico um signo. Sem signos no existeideologia.

    Observemos o seguinte exemplo: uma pomba uma ave, e outro

    significado no extramos seno de uma ave, contudo, a mesma ave posta

    em outro contexto, em outra situao pode produzir idias ou valores que

    esto situados fora de si mesmos, refletindo e refratando outra realidade, ser

    38

  • convertida em signo. A pomba como smbolo da paz, ganha dimenso

    ideolgica. A ideologia transitou atravs dos signos. Tal fato pode ser

    observado no exemplo do anncio publicitrio da LG com o seguinte discurso

    verbal: SUA ME J SEGUROU MUITAS BARRAS. MAS NENHUMA IGUAL

    A ESTA. No discurso no verbal aparece a me com uma barra de ouro na

    mo e o filho com os cabelos espetados, tatuagem, demonstrando ser uma

    pessoa fora dos padres tidos como normais. Ento o sentido de BARRAS

    seria o de ajudar em momentos difceis ocasionados por aes desaprovveis

    ou ruins praticados pelo filho, mas observando a imagem notamos que

    simplesmente o sentido literal da palavra barras de ouro.

    39

  • Conforme j havamos destacado em relao ao signo pomba, no

    anncio da LG, tambm a ideologia transitou atravs dos signos. H alguns

    exemplos de instrumentos, ou at mesmo produtos de consumo, que

    perderam seu sentido inicial para se transformarem em signos, ou seja,

    passaram a funcionar como veculos de transmisso de ideologias, como o

    po e o vinho para os cristos; a balana para a justia, a ma para o

    pecado.

    O signo nasce e se desenvolve em contato com as organizaes

    40

  • sociais, por isso s pode ser pensado socialmente, contextualmente. Dessa

    forma, cria-se uma relao estreita entre a formao da conscincia individual

    e o universo dos signos; s podemos pensar a formao da conscincia

    dentro de um prisma concreto, derivado, no embate entre os signos.

    As palavras nascem neutras, mais ou menos como esto em estado

    de dicionrio, porm ao se contextualizarem, passam a expandir valores,

    conceitos, pr-conceitos. Vivemos em contato com outros homens, mediados

    pelas palavras, que iro nos informar e formar; as palavras sero por ns

    absorvidas, transformadas e reproduzidas, criando um circuito de formao e

    reformulao de nossas conscincias. As palavras, no contexto, perdem sua

    neutralidade e passam a indicar aquilo a que chamamos propriamente de

    ideologias; numa sntese: o signo forma a conscincia que por seu turno se

    expressa ideologicamente.

    Para se verificar a construo do discurso persuasivo, necessrio

    reconhecer a organizao e a natureza dos signos lingsticos, pois a inter-

    relao dos signos que produz a frase, o perodo, o texto. Pode-se afirmar,

    segundo Ferdinande Saussure, que:

    O significante o aspecto concreto do signo, a sua realidadematerial, ou imagem acstica. O que constitui o significante oconjunto sonoro, fnico que torna o signo audvel ou legvel. Osignificado o aspecto imaterial, conceitual do signo e que remete adeterminada representao mental evocada pelo significante.(SAUSSURE, 1973, p.26)

    Tomemos como exemplo, a palavra cabea tem por significante um

    41

  • aspecto concreto; conjunto sonoro, C A B E A; como significado, o aspecto

    conceitual, imagem mental; aspecto abstrato. O significante engloba aspectos

    constitutivos de uma mesma unidade. Ao anunciarmos a palavra cabea, o

    fazemos relacionando conjunto sonoro e imagem mental. Dizemos,

    conseqentemente, que a palavra cabea possui uma significao. Na frase:

    A cabea um rgo do corpo humano, a cabea j produz uma

    significao, um sentido; ou se quisermos, representa mentalmente aquilo que

    a forma lingstica est evocando. A significao , portanto, uma espcie de

    produto final da relao existente entre o significado e o significante.

    Segundo Ullman (apud CITELLI, 2002) os objetos s se relacionam

    com os nomes atravs do sentido e, visto que as palavras esto sempre em

    lugar das coisas e no nas coisas, pode-se assegurar que a palavra

    apresenta, como um de seus aspectos bsicos, um carter simblico.

    Alm da ideologia, tambm a persuaso um fator importante que

    ser tratado no tpico seguinte, pois leva o consumidor a se convencer com o

    objetivo de adquirir o produto ou o servio.

    2.3 Persuaso no Texto Publicitrio

    Na opinio de Vestergaard & Schroder (2000), a publicidade

    constitui uma maneira pblica de comunicao verbal e no verbal e no

    desempenho dessa funo ela tem de operar como discurso informativo e

    discurso persuasivo, tendo como principais funes a referencial e a

    42

  • apelativa. Como discurso informativo, a publicidade cumpre sua principal

    finalidade de transmitir significao; para tanto, lana mo de variados

    recursos, tanto visuais, quanto verbais e sonoros. Com recursos visuais, ela

    apresenta o produto ou sua imagem, destaca ou enfatiza o produto com jogo

    de cores, formas, volumes. Com os recursos lingsticos, a significao

    advm de textos slogans e inscries que demonstram os resultados e

    benefcios do produto, descrevem suas caractersticas e atributos.

    Como discurso persuasivo, ou de convencimento, a publicidade

    recorre a apelos verbais ou visuais que objetivam fazer acreditar naquilo a

    que se prope atravs da idia bsica ou tema. Estes apelos podem vir

    concretizados em imagens, formas, cores, volumes, gestos, olhares,

    expresso corporal em rostos belos, ou partes do corpo, em dolos, artistas,

    heris, esportistas e em ambientes sugestivos, elegantes, capazes de traduzir

    sensualidade, charme, erotismo, beleza, poder, esportividade e prestgio. A

    publicidade recorre tambm a recursos apelativos de natureza lingstica e

    lgica, como depoimentos testemunhais, ou citaes, argumentos racionais

    baseados em dados concretos, demonstraes de causa/efeito irrefutveis e

    elementos expressivos e emotivos, como as figuras estilsticas.

    A persuaso publicitria pode acontecer tambm pela predisposio

    do consumidor em aceitar a mensagem. Para tanto, poder criar clima

    fantasioso em que apresentado o produto como sedutor, como

    proporcionador de estilo de vida, ambiente dos sonhos, capaz de envolver e

    excitar o consumidor, provocar satisfao de prazer pela posse e uso do

    43

  • produto, ou por elogios. Tambm atravs de linguagem positiva, que promove

    o prazer, a alegria, a sade, a beleza. Portanto, as finalidades da mensagem

    publicitria so: informar sobre algum produto ou servio, persuadir para

    mover as pessoas a tomarem decises e fazer agir, adquirir o produto ou

    servio. Por outro lado tambm, pode-se produzir um anncio rompedor de

    certas normas preestabelecidas, causando um forte impacto no receptor

    atravs de mecanismos de estranhamento, situaes incmodas, que levam,

    muitas vezes, indagao ou pura indignao. Particularmente em um

    momento em que se opera uma certa redemocratizao da sociedade

    brasileira possvel publicidade mexer com temas tabus, como o do

    homossexualismo, do complexo de dipo, temas esses que provocam

    incmodo em boa parte dos receptores e talvez por isso mesmo consigam se

    afirmar persuasivamente.

    O texto publicitrio nasce de raciocnios, ideologia e argumentao

    e da alquimia verbal e no verbal advinda do conjunto de efeitos retricos da

    linguagem. Observe-se o anncio seguinte divulgado em televiso e revistas:

    Nove entre dez estrelas do cinema usam LUX.

    O slogan apresenta um raciocnio lgico, em forma de silogismo,

    com premissa menor e concluso implcita, mas que podem ser facilmente

    deduzidas da premissa maior e como figuras de retrica apresenta a

    comparao implcita e a hiprbole. No exemplo em apreo, o anncio do

    sabonete LUX procura persuadir a leitora a comprar o produto para se tornar

    tambm uma estrela.

    44

  • Encerradas nossas observaes sobre a persuaso no texto

    publicitrio, passaremos, no prximo captulo, a traar um panorama da

    retrica e trataremos da sua importncia para a publicidade.

    3 ARTE DA RETRICA

    3.1 Elementos Histricos: da Retrica Clssica Retrica Moderna

    Conforme Citelli (2002), o estudo da persuaso pressupe

    45

  • conhecimento sobre o discurso praticado na Antigidade Clssica, pois o

    domnio da expresso verbal nasceu entre os gregos, brotando da

    necessidade de exposio pblica das idias para justificar uma certa

    democracia. Ao orador grego competia o manejo das formas de

    argumentao, originando-se da toda a tradio dos tribunos e dos sofistas

    que, em praas pblicas, tribunais ou foros, intentavam inflamar multides,

    buscando alterar pontos de vista e mudar conceitos pr-formados.

    Demstenes, Quintiliano, Grgias foram alguns dos nomes que se

    celebrizaram pela habilidade com que encaminhavam suas lgicas

    interpretativas.

    Uma vez que na Grcia clssica havia a preocupao com a

    estruturao do discurso, as escolas criaram disciplinas que melhor

    ensinassem as artes de domnio das palavras como a eloqncia, a

    gramtica, a retrica, atestando algumas das evidncias do conjunto de

    preocupaes que marcaram a relao dos gregos com o discurso. A questo

    no era s de falar corretamente, mas tambm de faz-lo de forma

    convincente, elegante, unindo arte e esprito, bem ao gosto da cultura

    clssica. A disciplina que cuidava de buscar tal harmonia era a retrica.

    A retrica foi se transformando em mero sinnimo de recursos

    embelezadores do discurso, ganhando at um certo tom pejorativo. Um pouco

    dessa posio preconceituosa se deve a certas vises tericas, como as

    desenvolvidas no sculo XVIII e XIX, quando os estudiosos no a tratavam

    apenas como questo de mtodo compositivo e de estruturao gramatical,

    46

  • mas buscavam com as figuras de retrica o melhor enfeite, a palavra mais

    bela, a expresso inusitada, que so as marcas do iderio esttico dos

    parnasianos.

    At alguns anos atrs, quem afirmasse que a Retrica iria tornar-se

    de novo uma disciplina, teria causado riso, pois estava morta, como reflexo e

    como prtica. Aparece hoje, no s como cincia de futuro, mas tambm

    como uma cincia da moda, nos limites do estruturalismo, da nova crtica e da

    semiologia.

    Na Frana, a retrica como reflexo, e mesmo como prtica, se

    sustentou por muito tempo, de maneira especial por aqueles que tinham maior

    interesse em defend-la, como os escritores, gramticos e filsofos. Em 1836,

    o jornal de LInstruction Publique notava que, sem a proteo dos

    regulamentos universitrios, a retrica na Frana estaria hoje morta (DUBOIS

    et.al., 1974, p.15). Graas a esse apoio oficial, o ltimo ano dos colgios

    conservou uma disciplina cuja razo de ser era cada vez mais obscuramente

    compreendida (CITELLI, 2002, p.74).

    Com esse renascimento da Retrica na Frana, encontra-se a

    influncia do lingstica Roman Jakobson, e mais particularmente a

    publicao feita por Nicolas Ruwet, em 1963, de uma traduo de Essais de

    Linguistique gnrale de onde se salienta o estudo fundamental sobre a

    metfora e a metonmia; que alcanou xito.

    Segundo Dubois et.al. (1974) havia nos retricos clssicos uma fria

    na atribuio de nomes s modificaes das palavras e construes, modo de

    47

  • se engrandecerem e justificarem, multiplicando os objetos do saber, fato esse

    que contribuiu para o manifesto declnio da retrica. importante lembrar que

    a prpria retrica esteve longe de constituir uma disciplina coerente,

    sobretudo no perodo clssico francs (sculos XVII e XVIII), no qual de um

    tratado a outro, verificam-se, quanto ao prprio objeto, mais divergncias do

    que muitos admitem. Em todo caso, seria falsa a imagem histrica da arte da

    eloqncia se seu objeto fosse reduzido teoria da elocuo, e mais falsa

    ainda, se reduzido simples definio dos tropos e figuras.

    A cincia dos tropos no abrange todo o campo da retrica, entre os

    antigos, assim como entre os modernos. A finalidade declarada da retrica a

    de ensinar tcnicas de persuaso. A idia de argumento e a de auditrio so

    nesse caso essenciais. A ligao com a dialtica, no sentido do termo antes

    de Hegel, de tal ordem, que Aristteles comea por verificar sua real

    confuso.

    Pela prpria natureza do estado grego, era imperativo para certas

    camadas sociais dominar as regras da boa argumentao e o exerccio do

    poder; era ao mesmo tempo uma cincia e uma arte, louvados como instncia

    de extrema sabedoria. Da surgem as primeiras sistematizaes e reflexes

    acerca da linguagem. Os pensadores gregos, Scrates e Plato, escreveram

    sobre o assunto, porm com Aristteles que o discurso ser dissecado em

    sua estrutura e funcionamento.

    De acordo com Citelli (2002), na Macednia (384-322 a.C.) surgiu

    uma obra que permanece at hoje como um dos manuais clssicos para

    48

  • quem deseja estudar certas questes vinculadas aos processos compositivos

    dos textos: Arte Retrica, de Aristteles. Esta obra pode ser considerada uma

    espcie de sntese das vises que se acumulavam em torno dos estudos

    retricos, assim como um guia dos modos de se construir um texto

    persuasivo. A Retrica composta dos livros I, II, III, onde se podem ler,

    trazidos para a linguagem de hoje, elementos de gramtica, lgica, filosofia da

    linguagem e estilstica, para ficarmos em alguns dos temas que nos dizem

    respeito. Para nos aproximarmos da estrutura de Arte Retrica, convm

    observar o roteiro fornecido por Jean Voilquin e Jean Capelle:

    O livro I contm quinze captulos. Aps ter mostrado, nos captulos Ie III, as relaes entre retrica e dialtica definido a retrica,Aristteles, que censura seus precessores por haverem estudadoprincipalmente as provas alheias arte, consagra os captulos III aXIV, inclusive, ao estudo das provas tcnicas; s provasextratcnicas: leis, depoimentos das testemunhas, contratos,declaraes obtidas sob tortura, juramentos, atribuir apenas ocaptulo XV do livro I a XVII, estuda Aristteles as provas morais esubjetivas, para retomar, nos captulos XVII a XXVI, o exame dasprovas lgicas. O livro III dedicado ao estudo da forma.(VOILQUIN; CAPELLE apud CITELLI, 2002, p.9)

    Resumindo ainda mais esse roteiro, chegamos concluso de que

    estamos diante de um corpo de normas e regras que visa saber o que ,

    como se faz e qual o significado dos procedimentos persuasivos. Aristteles

    no desejava confundir, como muitos de seus contemporneos, retrica e

    persuaso. A retrica para Aristteles tem algo de cincia, ou seja, um

    corpus com determinado objeto e um mtodo verificativo dos passos

    seguidos. Por isso, a retrica, no sendo persuaso, pode ser capaz de gerar

    49

  • a persuaso, levando o estudioso a descobrir, pela anlise, o que

    importante, prprio e necessrio para convencer ou persuadir. uma espcie

    de cdigo dos cdigos, estando acima do compromisso estritamente

    persuasivo, pois abarca todas as formas discursivas. (CAMOCARDI; FLORY,

    2003,p.53)

    Ou como afirma Aristteles:

    Assentamos que a retrica a faculdade de ver teoricamente o que,em cada caso, pode ser capaz de gerar a persuaso. Nenhuma outraarte possui esta funo, porque as demais artes tm, sobre o objetoque lhes prprio, a possibilidade de instruir e de persuadir; porexemplo, a medicina, sobre o que interessa sade e doena; ageometria, sobre as variaes das grandezas; a aritmtica, sobre onmero, e o mesmo acontece com as outras artes e cincias. Mas aRetrica parece ser capaz de, por assim dizer, no concernente auma dada questo, descobrir o que prprio para persuadir. Porisso, dizemos que ela no aplica suas regras a um gnero prprio edeterminado. (VOILQUIN; CAPELE apud CITELLI, 2002, p.10)

    A retrica no considerada tica, por no entrar no mrito daquilo

    que est sendo dito, mas sim, no como aquilo est sendo dito, o que implica o

    domnio do processo, de formas, instncias, modos de argumentar.

    A obra Arte Retrica e Arte Potica apresenta regras que so

    aplicadas nos discursos persuasivos, e um dos mecanismos o que fixa a

    estrutura do texto em quatro instncias seqenciais e integradas: o exrdio

    o comeo do discurso, podendo ser um conselho, um elogio, conforme o

    gnero do discurso em pauta. tambm denominado de introduo. A

    narrao o assunto, onde os fatos so mencionados, propriamente a

    argumentao. As provas so os elementos sustentadores e comprobatrios

    50

  • da argumentao. A quarta instncia a perorao, isto , a concluso, que

    a ltima oportunidade para prender a ateno do receptor.

    Quando se colocam relaes entre retrica e persuaso, no h

    necessidade de se verificar at onde o ato de convencer constitui verdade;

    persuadir sinnimo de submeter, por isso possui um lado autoritrio, pois

    quem persuade leva outra pessoa a aceitar uma idia. possvel que o

    persuasor no esteja usando de uma verdade, mas de algo que se aproxime

    do que parea ser verdade ou com uma certa verossimilhana. Como no

    exemplo de um outdoor que apresenta um panetone de natal, todo apetitoso,

    com formas redondas e cheio de frutas, pedindo para ser devorado. Ningum

    considera que o panetone a ser degustado em casa tenha a mesma forma

    daquele que est no cartaz, mas no conclui ser uma mentira; o que ocorre,

    ao olharmos para o outdoor, que ficamos convencidos pela imagem.

    Portanto o que estamos vendo no verdadeiro, verossmil e nos convence

    enquanto lgica interna do prprio cartaz. Portanto, verossmil o que se

    constitui em verdade a partir de sua prpria lgica, com isso a necessidade de

    construir a existncia de argumentos, provas, peroraes, exrdios, conforme

    certas proposies j formuladas por Aristteles. Persuadir no s sinnimo

    de convencer, mas de organizar o discurso que resulta como verdadeiro para

    o receptor.

    Com o passar dos anos, a retrica foi tendo suas funes alteradas.

    Da preocupao com as tcnicas de organizao do discurso e com a

    persuaso, o que se ir presenciar no final do sculo XIX a vinculao da

    51

  • retrica com a idia de embelezamento do texto. Cabia retrica fornecer

    recursos visando produzir mecanismos de expresso que tornassem o texto

    mais bonito. O uso de figuras de linguagem encobriam, muitas vezes, as

    idias ineficientes. Esse fato levou idia, que ainda persiste, de retrica ser

    sinnimo de enfeite do estilo e vazio das idias. Comprova-se esse fato com

    os discursos dos advogados, em suas peties, ou aqueles discursos de

    campanhas polticas, de discursos de formaturas.

    Mas os estudos da Retrica receberam tratamento inovador quando

    relacionados potica, em obras desenvolvidas por Jean Dubois e o grupo de

    Lige (Universidade de Lige Frana).

    Busca-se com a retrica afastar a preocupao de a tudo dar nomes

    e encontrar questes como as provenientes da teoria das figuras. Os

    conceitos formulados por Aristteles reencontram espao para uma reflexo

    mais arejada e menos contaminada por tendncias que marcaram a histria

    da retrica.

    Este novo papel est ligado a duas questes importantes: o do

    estudo das figuras de linguagem e o das tcnicas de argumentao, ou seja,

    estudar a organizao discursiva a fim de apreender os procedimentos que

    permitem ligar a adeso de um ponto de vista quelas idias que lhes so

    apresentadas. Refere-se a processos de articulao dos raciocnios textuais,

    como a possibilidade criada pelo uso das figuras de linguagem, tema este que

    deve ser abordado no prximo captulo.

    52

  • 3.2 Retrica e Publicidade

    Os princpios da retrica tm hoje seu principal campo de aplicao

    e revestimento nos textos de publicidade, pois ao se entender a retrica como

    a arte de persuadir, de convencer e de levar ao por meio da palavra,

    fcil ver que esse tambm o papel da linguagem no anncio publicitrio.

    A linguagem publicitria se distingue, por outro lado, como a

    literria, pela criatividade, pela busca de recursos expressivos que chamem a

    ateno do leitor, que o faam parar e ler ou escutar a mensagem que lhe

    dirigida, nem que para isso se infrinjam as normas da linguagem padro ou se

    passe por cima das convenes da gramtica normativa tradicional e, em

    certo sentido, da competncia lingstica abstrata geralmente aceita.

    O destinatrio da mensagem publicitria, o comunicatrio,

    principalmente o urbano, vive num universo saturado de estmulos, que o

    mesmo, nem que se disponha a isso, no consegue dar ateno e assimilar

    todas as mensagens que lhe chegam via rdio, televiso, jornal, revistas,

    outdoors. A linguagem publicitria enfrenta o maior dos desafios, o de

    prender, como primeira tarefa, a ateno desse destinatrio.

    Tendo conseguido que o comunicatrio se ocupe com determinado

    texto, convenc-lo ou lev-lo, em conseqncia, ao, possivelmente

    tarefa ou desafio menor, uma vez que prender a ateno do leitor ou ouvinte

    parece ser o debate maior. Se o leitor no parar para ler a mensagem, esse

    fato inviabiliza a seduo e a ao. A criatividade do publicitrio est em

    53

  • buscar incessantes meios estilsticos que faam com que o leitor ou ouvinte

    preste ateno ao seu texto, chocando-o at se for necessrio.

    A publicidade usa alguns esquemas bsicos a fim de obter o

    convencimento dos receptores tais como: o uso de esteretipos; substituio

    de nomes (eufemismo); criao de inimigos; apelo autoridade e afirmao e

    repetio. Veja-se, como exemplo, o anncio publicitrio da NIVEA, com a

    imagem de Gisele Bndchen, modelo bem sucedida, que sempre est

    viajando e na mala tem todos os produtos da nvea como: NIVEA body;

    NIVEA soft; NIVEA visage; NIVEA hand; NIVEA creme; NIVEA sun e

    NIVEA desodorant. E no carto de identificao da mala vem a promoo:

    Compre NIVEA e concorra a 60 viagens para torcer pelo Brasil na

    Alemanha.

    54

  • No anncio dos produtos NIVEA destaca-se o emprego da funo

    conativa ou apelativa, enfatizado pela utilizao de verbos no imperativo:

    compre, concorra, cadastre-se, envie, guarde, consulte.

    55

  • Alm disso, as compradoras dos produtos NIVEA podem ganhar

    prmios e ter a beleza de Gisele Bndchen. O anncio procura seduzir as

    mulheres, seu alvo principal, e convenc-las a adquirir os produtos da Marca

    NIVEA pelo emprego da funo conativa ou apelativa.

    As figuras de linguagem tm papel importante para preencher o

    objeto bsico da publicidade: o de provocar, atravs da elaborao da

    mensagem, o estranhamento do leitor, atravs de discursos informativo e

    persuasivo, e a partir da, fazer com que ele se interesse pelo texto e,

    conseqentemente, pelo que propagado.

    As figuras, ou translaes, cumprem a funo de redefinir um

    determinado campo de informao, criando efeitos novos e que sejam

    capazes de atrair a ateno do receptor. So expresses figurativas que

    conseguem quebrar a significao prpria e esperada daquele campo de

    palavras.

    As figuras mais usadas so a metfora e a metonmia, consideradas

    por Jakobson como espcie de matrizes presentes, ora com dominncia de

    uma, ora com a da outra, na imensa maioria dos textos.

    As palavras organizadas de forma diferenciada, constituem os

    tropos ou figuras, que vm sendo estudados desde a Antigidade clssica at

    os tempos atuais. O renascer dos estudos retricos trouxe novos enfoques e

    esquemas classificatrios, como o de Dubois que ser estudado no prximo

    captulo, juntamente com a anlise de alguns exemplos de discursos

    publicitrios.

    56

  • 4 TROPOS E FIGURAS DE LINGUAGEM

    4.1 Conceito e Histria

    Figuras so as palavras tomadas no seu sentido prprio e de

    maneira expressiva quanto ao som, estrutura, funo e ordem, e ao sentido.

    Tropos so as palavras tomadas em outro sentido, o figurado. Nos tempos

    atuais, o renascer dos estudos retricos trouxe novos enfoques e esquemas

    classificatrios, destacando-se os do grupo de Dubois e Lige.

    As figuras e os tropos at praticamente o sculo XIX faziam parte da

    retrica, disciplina cujo mbito era muito complexo e extenso. Aristteles na

    Potica, Ccero no De Oratore, Quintiliano em Institutio Oratria, dentre

    outros, cuidaram do assunto com especial interesse, e Quintiliano chegou a

    estabelecer o sistema tradicional e fixo.

    A reao esperada no sculo XIX coincide com o eclodir da esttica

    romntica, que se consubstanciava na liberdade de forma e inspirao,

    favorecendo os processos de ampla pesquisa e renovao. As figuras

    consideradas como adornos voluntrios mereceram de artistas e estudiosos

    franca repulsa como se fossem meros artifcios que tornavam falsas as

    pretensas obras de arte.

    No passado, principalmente no cultismo barroco e na poesia

    parnasiana, o brilho ou valor literrio assentava-se to somente no uso dos

    57

  • chamados adornos, e as anlises e crticas concentravam-se em apontar a

    presena de tais elementos.

    Atualmente no se permitem excessos, pois a moderna estilstica

    veio substituir a retrica, no para aboli-la de vez, como quiseram alguns

    radicais, mas para coloc-la em seu devido lugar, aproveitando aquilo que de

    til legou sistemtica da teoria literria, atualizando-lhe e arejando-lhe os

    mtodos.

    Se a retrica a estilstica dos antigos, como afirmam Vossler,

    Kayser, Leo Spitzer e outros, seu campo delimitou-se elocuo e ao

    emprego expressivo da palavra articulada, tendo assumido para muitos

    espritos mal informados uma significao depreciativa.

    Para Hnio ltimo da Cunha Tavares (1978, p.324), o emprego das

    figuras e dos tropos no admitem regras, pelo fato de serem inerentes ao

    prprio pensamento. Admiti-las seria no s um absurdo, como tambm a

    tentativa v de se erguer uma barreira ao ato de pensar ou sentir. Na

    linguagem erudita e na linguagem espontnea e coloquial observamos a

    atuao constante das figuras e dos tropos. Hoje nem percebemos que o uso

    de um nmero de expresses e construes diariamente presentes em

    nossas conversas constituem figuras ou tropos. O emprego reiterado

    estereotipou-as, apagando a conscincia do fenmeno, como exemplo em

    associaes por analogia, quando chamamos algum de homem bala, a idia

    da pressa ou velocidade que nos suscitou o termo bala, sem nos

    preocuparmos em saber se estamos perpetrando um tropo, a metfora.

    58

  • Segundo o terico supracitado os retricos nada inventaram, nada

    criaram que no o tivesse criado o povo em sua linguagem; o que fizeram foi

    apenas sistematizar e ordenar os diversos aspectos que configuram o modo

    de expressar a nossa emoo e o nosso pensamento.

    As figuras e os tropos contribuem para a constituio de uma obra

    potica em cada caso isolado e em sua medida.

    Com a interpretao de ornato em geral pouco se diz, e, maisfreqentemente ainda, uma tal interpretao errada. Mas se asfiguras assim so colocadas em outras relaes, isto , se j no soexplicadas ao orador e ao poeta no sentido de como deviam serusadas conscientemente, para melhoramento do seu discurso, masse, interpretadas como fenmenos basilares lingsticos, interessamao lingista e investigador do estilo; ento surge tambm aqui umsentimento de gratido para com os antigos que to magnficasbases souberam criar. (TAVARES, 1978, p.326)

    Em toda cincia a necessidade terminolgica uma imposio, pois

    indispensvel o conhecimento das figuras e dos tropos para comunicarmos

    o contedo de toda uma tradio cultural. As figuras e os tropos devem ser

    investigados nas anlises literrias, sob o ponto de vista hermenutico, pois

    representam no estilo do autor no um adorno ou artifcio rebuscado para

    exemplificao de tais fenmenos, mas sim fruto da intuio criadora do

    artista, que possui originalidade e vigor, a sua individualidade expressional.

    Quanto mensagem publicitria, os recursos estilsticos

    correspondem em geral retrica, tipo de discurso voltado para examinar,

    descrever, perceber e avaliar atos e eventos que venham influenciar

    percepes, sentimentos, atitudes e aes, com palavras empregadas de

    59

  • forma diferente do uso comum, do uso literal. Usar recursos retricos usar a

    comunicao para definir a realidade do modo como se deseja que ela seja

    vista.

    A definio da realidade sob certos ngulos favorece tanto o

    interesse do emissor como do destinatrio ou receptor, na medida em que

    contribui para a convergncia de interesses do influenciador (enunciador) com

    os do influenciado (receptor). O anunciante de um produto de consumo est

    interessado em obter lucros, vendendo seu estoque e suas novidades. O

    comprador em potencial, por sua vez, sempre estar interessado em alguma

    aquisio sob a forma de conforto, alvio, segurana ou prazer. Por isso

    receber a mensagem de forma adequada, ser permevel ao consumo.

    As figuras do discurso, como formas persuasivas ou apologticas,

    desempenham um importante papel na elaborao da mensagem publicitria.

    So usados os tropos convencionais, ou figuras de linguagem, e tropos no

    convencionais ou que se tornaram convencionais por estarem presentes na

    comunicao.

    O emprego de linguagem figurada no admite regras porque as

    figuras de linguagem so inerentes ao prprio pensamento. No se podem

    erguer barreiras ao ato de pensar e de sentir. Tanto na linguagem culta e

    formal, como na linguagem coloquial e prosaica observamos a atuao

    constante das figuras e dos tropos, nomenclatura usada por Hnio Tavares.

    Hoje nem percebemos que o uso de inmeras expresses e

    construes diariamente presentes em nossas conversas, em manchetes de

    60

  • jornais, em anncios publicitrios, so desvios lingsticos. O emprego

    reiterado da linguagem figurada estereotipou-a, apagando a conscincia do

    fenmeno. Por exemplo, quando atribumos a algum o epteto de cordeiro, j

    temos agregado ao nosso esprito a idia de mansido. E nem nos

    apercebemos de que estamos criando um tropo: metfora. O mesmo

    acontece quando consideramos uma pessoa esperta, inteligente, culta como

    cabea Voc cabea! (metfora) ou Voc o mximo! (hiprbole).

    Os retricos clssicos e modernos bem como a estilstica

    contempornea no inventaram nem criaram nada que j no tivesse sido

    falado ou criado pelo povo na sua linguagem, como bem observa Hnio

    Tavares.

    4.2 Classificao

    Em toda cincia h necessidade de se estabelecerem terminologias

    para caracterizar fenmenos ou processos. Por isso, nos estudos lingsticos

    indispensvel o conhecimento da linguagem figurada, no como adorno ou

    artifcio de estilo, mas como objeto de investigao e anlise da intuio

    criadora de um artista enquanto marcas de uma individualidade expressional.

    Baseando-se na imagem visual (fanopia), na carga musical

    (melopia) e no efeito lgico (logopia), Hnio Tavares apresenta uma

    classificao geral diferenciando os desvios ou rupturas do cdigo lingstico

    em figuras e tropos.

    61

  • Os tericos do Grupo de Lige (J. Dubois, F. Edeline, J.M.

    Klimkenberg, P. Minguet, F. Pire e H. Trinon), na obra Retrica Geral (1974),

    partindo da terminologia proposta por B. Pottier e J. Greimas, consideram a

    palavra ou lexema4 como uma coleo de semas (traos significativos

    mnimos), dos quais uns so nucleares e outros contextuais, isto , uns

    representam desvios em palavras e outros so modificaes de sentido em

    contexto. O todo um semema5 (frases, oraes, perodos, pargrafos que

    organizam um contexto). justamente a manipulao dos semas que produz

    as figuras de retrica ou metboles6.

    Nas metboles gramaticais (metaplasmos, metataxes) e nas

    metboles lgicas (metassememas e metalogismos) so possveis dois tipos

    de operao: a supresso ou o acrscimo de semas ou partes. O desvio da

    norma percebido pelo leitor atravs da marca, isto , da alterao na taxa

    de redundncia da mensagem. Mas esse desvio7 pode ser diminudo graas

    presena de um invariante, que a parte no modificada ou base da figura

    que no sofreu efeitos retricos e que, por isso, conserva seu grau zero, e

    uma relao sistemtica que a liga conveno lingstica (SAMPAIO, 1978,

    p.2-3).

    Dentro dessa concepo de figura, temos tambm a obra de Jean

    Cohen Estrutuctura del Lenguaje Potico para quem a figura um conflito

    entre sintagma e paradigma (1970, p.112). Segundo esse terico, a

    4 Lexema: unidade lexical, cujo conjunto vai formar o lxico da lngua.5 Semema: reunio de semas de um lexema.6 Metboles: designao das figuras de retrica, segundo o Grupo de Lige.7 Desvio: alterao no grau zero da mensagem.

    62

  • linguagem possui duas funes: intelectual ou cognitiva (denotao) e afetiva

    ou emotiva (conotao). Tanto a denotao quanto a conotao tm o mesmo

    referente e a oposio delas se opera no plano psicolgico, pois a denotao

    suscita no destinatrio da mensagem uma resposta cognitiva, enquanto a

    conotao provoca uma resposta emotiva. A diferena no est no sentido da

    mensagem, mas no efeito que ela causa no receptor.

    Para o Grupo de Lige, as metboles gramaticais (as que sofrem

    alterao no cdigo, no plano da expresso) sobre a morfologia levam o nome

    de metaplasmos, quando as mudanas se do sobre a sintaxe denominam-se

    metataxes. As metboles lgicas (as que sofrem desvios no referente, no

    plano do contedo) sobre a semntica chamam-se metassememas e sobre a

    lgica, metalogismos. Observe-se o quadro a seguir:

    63

  • METBOLESGRAMATICAIS (CDIGO) LGICAS (REFERENTE)

    EXPRESSO CONTEDOA. METAPLASMOS B. METATAXES C. METASSEMEMAS D. METALOGISMOS

    OPERAES SOBRE A MORFOLOGIA SOBRE A SINTAXE SOBRE A SEMNTICA SOBRE A LGICA

    S

    U

    B

    I. Supresso1.1 Parcial

    1.2 Completa

    Afrese, apcope, sncope,sinrese

    Deleo, embranquecimeno

    Crase

    Elipse, zeugma, assndeto,parataxe

    Sindoque e antonomsiageneralizantes, comparaometfora in praesentia.Assemia

    Litotes I

    Reticncias,suspenso, silncio

    S

    T

    A

    N

    C

    II. Adjuno2.1 Simples

    2.2 Repetitiva

    Prtese, direse, afixao,epntese, palavra-valise

    Duplicao, insistncia, rimas,aliterao, assonncia,paronomsia

    Parntese, concatenao,expletivao, enumerao

    Repetio, polissndeto,mtrica, simetria

    Sindoque e antonomsiaparticularizantes, arquilexia

    ---------------------

    Hiprbole, silnciohiperblico

    Repetio, pleonasmo,anttese

    I

    A

    I

    S

    III. Supresso-Adjuno3.1 Parcial

    3.2 Completa

    3.3 Negativa

    Linguagem infantil, substituio deafixos trocadilho

    Sinonmia, arcasmo, neologismo,emprstimo

    Silepse, anacoluto

    Mudana de classequiasma

    -----------------

    Metfora in absentia

    Metonmia

    Oxmoro

    Eufemismo

    Alegoria, parbola,fbula

    Ironia, paradoxo,antfrase, litotes 2

    RELACIONAIS

    IV. Permutao4.1 Qualquer

    4.2 Por Inverso

    Contrepet, anagrama, mettese

    Palndromo, verlen

    Tmese, hiprbato

    Inverso ---------------------

    Inverso lgica,inverso cronolgica

    64

  • Fonte: Dubois et al. Retrica geral.62

    65

  • Ao estudarmos a Retrica Geral e o quadro geral das metboles ou

    figuras de retrica (1974, p.71) encontramos muita dificuldade em distribuir e

    analisar os anncios publicitrios selecionados nas revistas sob essa

    perspectiva.

    Procuramos, pois, uma classificao mais genrica e simplificada,

    ao mesmo tempo que apropriada com os objetivos propostos neste trabalho,

    que so o de analisar as figuras de retrica em anncios publicitrios, nos

    planos da expresso verbal e no verbal e nos planos de contedo, de forma

    didtica para aplicao prtica em sala de aula.

    Por isso, optamos pelo quadro geral das figuras de retrica do

    Grupo de Lige, associado s conceituaes de Hnio Tavares.

    Conforme explicita Dante Tringalli, em Introduo Retrica (1988),

    as figuras so modificaes da linguagem, ou metboles (grego: repetio da

    mesma idia, conceito, sentido, significado, por meio de palavras, expresses

    ou frases diferentes), seja no vocbulo (metaplasmos, metassemema), seja

    na frase (metataxe, metalogismo), e tanto no nvel da expresso, como do

    contedo, ou acrescentando alguma coisa (adjuno: levantar alevantar),

    ou subtraindo (supresso: ainda inda), ou repetindo (repetio: Deus

    Deus) ou permutando (permutao: da vida pela estrada), tendo como

    objetivo conseguir efeito artstico; em outros termos, para obter efeito potico

    ou retrico ou estilstico da linguagem. (1984, p.99)

    Em tpicos anteriores afirmamos que as figuras so consideradas

    63

  • desvios da norma lingstica corrente, de um modo normal e comum de dizer,

    ou seja, um modo diferente de dizer, segundo Dante Tringalli