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territorium 16 191 OS RISCOS EM PROTECÇÃO CIVIL. IMPORTÂNCIA DA ANÁLISE E GESTÃO DE RISCOS PARA A PREVENÇÃO, O SOCORRO E… A REABILITAÇÃO * J. A. Leal Martins Ex-Presidente do Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil [email protected] Luciano Lourenço Departamento de Geografia. Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra [email protected] RESUMO Numa época em que os desastres ou catástrofes estão a acontecer cada vez mais, o debate e a acção nunca se apresentaram como tão necessários na esfera da Protecção Civil. Assim, neste artigo expõem-se algumas ideias básicas da Análise de Risco e referem-se algumas questões nucleares, ainda em aberto. Assinala- -se o facto de tão pouco se recorrer à Análise no Planeamento de Emergência e mostram-se as vantagens que o seu uso generalizado poderia trazer ao Sistema de Protecção Civil. Palavras-chave: Gestão de risco; planeamento de emergência; plano de acção; resposta. RÉSUMÉ À une époque où les désastres ou catastrophes se produisent de plus en plus, les débats et l’action n’ont jamais été autant nécessaire dans le domaine de la Protection Civile. Par conséquent, cet article “Des Risques en Protection Civile: Importance de l´Analyse et Gestion des Risques pour la Prévention, Intervention... et Réhabilitation” énonce quelques idées de base sur l´Analyse des Risques et réfère à certaines questions fondamentales restant en discussion. On constate que l’analyse est très peu utilisé dans la planification d’urgence et qu’il faut montrer les avantages que leur utilisation à grande échelle pourrait apporter au Système de la Protection Civile. Mots-clé: Gestion des risques; planification d’urgence; plan d’action; réponse. ABSTRACT At a time when the disasters or catastrophes are happening more and more, the debate and action never had as much and so necessary in the sphere of Civil Protection. Therefore, this article “Risks in Civil Protection: The Importance of Risk Analysis and Risk Management for the Prevention, Response... and Rehabilitation” sets out some basic ideas of Risk Analysis and mention, in addition, nuclear issues still in open discussion. It is noted that so little is used to analyse the Emergency Planning and show the advantages that their widespread use could bring to the Civil Protection System. Key words: Risk management; emergency planning; action plan; response. * Este artigo corresponde à conferência “Protecção Civil: Importância da Análise de Risco na Prevenção, Socorro… e Reabilitação” proferida pelo primeiro autor durante o I Congresso Internacional de Riscos , em Coimbra, no dia 29 de Maio de 2009, com as posteriores alterações que, a pedido do primeiro, o segundo autor lhe introduziu.

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OS RISCOS EM PROTECÇÃO CIVIL.IMPORTÂNCIA DA ANÁLISE E GESTÃO DE RISCOS PARA A PREVENÇÃO, O SOCORRO E…

A REABILITAÇÃO*

J. A. Leal MartinsEx-Presidente do Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil

[email protected]

Luciano LourençoDepartamento de Geografia. Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra

[email protected]

RESUMO

Numa época em que os desastres ou catástrofes estão a acontecer cada vez mais, o debate e a acçãonunca se apresentaram como tão necessários na esfera da Protecção Civil. Assim, neste artigo expõem-sealgumas ideias básicas da Análise de Risco e referem-se algumas questões nucleares, ainda em aberto. Assinala--se o facto de tão pouco se recorrer à Análise no Planeamento de Emergência e mostram-se as vantagens que oseu uso generalizado poderia trazer ao Sistema de Protecção Civil.

Palavras-chave: Gestão de risco; planeamento de emergência; plano de acção; resposta.

RÉSUMÉ

À une époque où les désastres ou catastrophes se produisent de plus en plus, les débats et l’action n’ontjamais été autant nécessaire dans le domaine de la Protection Civile. Par conséquent, cet article “Des Risques enProtection Civile: Importance de l Analyse et Gestion des Risques pour la Prévention, Intervention... et Réhabilitation”énonce quelques idées de base sur l Analyse des Risques et réfère à certaines questions fondamentales restanten discussion. On constate que l’analyse est très peu utilisé dans la planification d’urgence et qu’il faut montrerles avantages que leur utilisation à grande échelle pourrait apporter au Système de la Protection Civile.

Mots-clé: Gestion des risques; planification d’urgence; plan d’action; réponse.

ABSTRACT

At a time when the disasters or catastrophes are happening more and more, the debate and action never hadas much and so necessary in the sphere of Civil Protection. Therefore, this article “Risks in Civil Protection: TheImportance of Risk Analysis and Risk Management for the Prevention, Response... and Rehabilitation” sets outsome basic ideas of Risk Analysis and mention, in addition, nuclear issues still in open discussion. It is noted thatso little is used to analyse the Emergency Planning and show the advantages that their widespread use couldbring to the Civil Protection System.

Key words: Risk management; emergency planning; action plan; response.

* Este artigo corresponde à conferência “Protecção Civil: Importância da Análise de Risco na Prevenção, Socorro… e Reabilitação” proferida pelo primeiro autordurante o I Congresso Internacional de Riscos, em Coimbra, no dia 29 de Maio de 2009, com as posteriores alterações que, a pedido do primeiro, o segundo autorlhe introduziu.

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“Um programa de acção tem riscos e custos -mas eles são, a longo prazo,

menores do que os riscos e custos daconfortável inacção.”

John F. KENNEDY (1917 - 1963), 35.º Presidentedos Estados Unidos.

“Eu deixei ordens para ser acordado, emqualquer altura, em caso de emergência nacional,

mesmo que esteja numa reunião do gabinete.”

Ronald REAGAN (1911 - 2004), 40.º Presidentedos Estados Unidos.

Introdução

O Artigo 1.º da Lei de Bases da Protecção Civil de1991 (Lei 113/91) dava, para o seu tempo, umadefinição quase perfeita de protecção civil: “A ProtecçãoCivil é a actividade desenvolvida pelo Estado e peloscidadãos com a finalidade de prevenir riscos colectivosinerentes a situações de acidente grave, catástrofe oucalamidade, de origem natural ou tecnológica, e deatenuar os seus efeitos e socorrer as pessoas em perigo,quando aquelas situações ocorram”.

Foi a Lei, que no nosso país fez a transição doconceito de “defesa civil” para o conceito de“protecção civil”. O legislador percebeu bem o quedeveria ser a Protecção Civil, compreendeu os seusenvolvimentos e pôde, assim, produzir a lei doutrináriae inovadora que continha as ideias mestras daconstrução do edifício da protecção colectiva. Apenasdois reparos, porque, por um lado, tinha emconsideração os riscos tecnológicos, por oposiçãoaos naturais, quando deveria contemplar sim os riscosantrópicos, porque, além daqueles, estes tambémenglobam os sociais e os biofísicos, que, com acrescente globalização, desenvolvida sobretudo nosanos que se seguiram ao da publicação daquelediploma, têm ganho cada vez mais acuidade. Poroutro lado, considerava apenas a Prevenção e oSocorro. Se, eventualmente, a Reabilitação tambémlá estivesse considerada, teria sido uma lei realmenteinovadora, avançada no tempo mais de 10 anos.

Entretanto, várias vicissitudes ocorridas no país,nos anos que se seguiram à entrada em vigor da Lei,puseram injustamente em causa as suas virtudes. Aotempo, não se compreendeu que os problemassurgidos apenas tinham a ver com o facto de a Leinão estar a ser correctamente aplicada e não seprestou atenção às grandes potencialidades da suamatriz teórica. O desaproveitamento desta Lei ficou

bem explícito no 12.º ano da sua vigência, quandofoi publicado o nado-morto Decreto-Lei n.º 49/2003,a então chamada Lei Orgânica do Serviço Nacionalde Bombeiros e Protecção Civil. O pouco respeitopelo espírito e pela letra da Lei de Bases lançou aconfusão no Sistema de Protecção Civil, criando-lheentropias totalmente desnecessárias e afastando-oirremediavelmente de uma base teórica coerente. AProtecção Civil tinha sido reduzida às merasoperações de socorro.

E assim se enterrou uma excelente Lei, mesmo antesde estar morta. Demorando a lei substituta, semsoluções preparatórias ou de transição dignas denota, o edifício delineado em 1991 ameaçavadesagregar-se. Mantinha-se apenas a esperança, empano de fundo, de que os alertas vindos de fora doSistema, dos académicos, do sector privado, dasassociações profissionais e dos cidadãosintervenientes pudessem travar novos erros e anularas forças interesseiras que pressionavam para que asleis fossem “à medida”.

Entretanto, em resultado dos grandes incêndiosflorestais e da vaga de calor de 2003, os portuguesespassaram a manifestar maiores preocupações comas catástrofes naturais, com a degradação doambiente, com as mudanças climáticas e, mesmo,com os acidentes terroristas. As pessoas,individualmente ou em grupo - não o país! -, estavama interrogar-se sobre se o risco e a resposta àsemergências estariam a ser tratados da melhormaneira pelos políticos, como assuntos de prioridadeimediata, tendo passado a notar também o ladonegro dos grandes incêndios florestais.

A trilogia de medos do passado - fome, peste eguerra - estava, de facto, a ser substituída pelo medodas perdas humanas e económicas decorrentes dosgrandes desastres súbitos. Sem dúvida, a protecçãoe a segurança eram a grande preocupação daspessoas na entrada do século XXI e estavam a levar aque o Estado se sentisse mais responsabilizado pelagestão das emergências e olhasse mais, não só parao Socorro, mas também para a Prevenção e, pelaprimeira vez, para a Reabilitação, esta entendidacomo a missão humanitária de recuperar os locaisdos desastres e acompanhar os sobreviventes naretoma da vida normal.

Também no Reino Unido, em 2004, foi feita arevisão das disposições do planeamento deemergência tendo a respectiva proposta de lei, depoisde aprovada no parlamento, recebido o Royal Assent.O pioneirismo dos ingleses – que publicaram asprimeiras leis do mundo sobre protecção civil - o nívelde conhecimentos teóricos das suas universidades, oseu sentido prático e o, ainda maior, sentidoeconómico das soluções que preconizam, estavam a

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pôr à disposição dos outros países da UE, uma óptimafonte de inspiração para a Protecção Civil. O CivilContingencies Act 2004 e os regulamentos e medidasnão-legislativas que o acompanham “Fornecem umaestrutura única para a protecção civil no Reino Unido,capaz de responder aos desafios do século XXI”, comose pode ler no preâmbulo do Act. Com efeito, a suapedra de toque é a gestão integrada das emergências,comprendendo seis funções (e não, apenas, as trêstradicionais): antecipação, avaliação de risco,prevenção, prontidão, resposta e reabilitação.

Um facto interessante, é que na lei britânica o“sistema” que estrutura a protecção civil passou achamar-se UK Resilience. A palavra resiliência erausada em português, em física, com o significado deelasticidade, de recuperação de molas e,recentemente, passou também a ser utilizada emprotecção civil, como sendo a capacidade de umapaisagem, natural ou humanizada, manter ou retomaro seu normal funcionamento e desenvolvimento apósuma perturbação grave.

Com efeito, o Concise Oxford English Dictionarydá o significado de resilience como able to withstandor recover quickly from difficult conditions, ou seja, acapacidade para resistir ou recuperar rapidamente,a partir de condições difíceis. Contudo, como essacapacidade nem é intrínseca, nem decorre de umdespacho automático, depois da plena manifestaçãode um determinado risco (tremor de terra, maremoto,inundação, incêndio, explosão, atentado…) énecessário proceder à recuperação da área afectadae é nesse sentido que, quanto a nós, a palavraReabilitação deve traduzir, em português, a acçãoda Protecção Civil.

Posto isto, foi, finalmente, publicada a nova Lei deBases da Protecção Civil, em 3 de Julho 2006, Lei n.º27/2006. Deve, desde logo, salientar-se que mantevea base teórica da Lei de 1991, que melhorou e ampliouem muitos aspectos de ordem prática e que,tecnicamente, também é uma boa lei. No entanto, decerto modo, é uma lei mais conservadora do queaquela, como se pode ver nos seguintes exemplos:

· Para além da entrada das autarquias, noacompanhamento do Estado, e daconsideração das entidades públicas eprivadas, para o enquadramento da actividadedos cidadãos, não apresenta outras evoluçõesdo conceito Protecção Civil dignas de nota;

· Na Lei, nada consta explicitamente sobreReabilitação, embora esteja implícita na alínead) do Artigo 4.º ao “Apoiar a reposição danormalidade da vida das pessoas em áreasafectadas por acidente grave ou catástrofe”, oque não impede que a reabilitação possa não vira ser, mais uma vez, um filho pródigo do sistema;

· Artigo 44.º: “A Autoridade Nacional deProtecção Civil é instituída em diploma próprio,que define as suas atribuições e respectivaorgânica”. A escolha palavra “autoridade” nãofoi feliz, face ao que se passa na maioria dospaíses e face à evolução das ideias, que vãono sentido de que a autoridade se exerce e nãose impõe por diploma legal;

· Em todo o articulado da Lei, não aparecequalquer referência explícita nem à Análise deRisco nem à Gestão de Riscos e, muito menos,à Metodologia a usar, embora devamosesperar que o legislador tenha pensado nelaspara as aplicações do n.º 2 do Artigo 4.º“Levantamento, previsão, avaliação eprevenção dos riscos colectivos” e “Análisepermanente das vulnerabilidades perantesituações de risco”.

Nos finais do século passado, muitos analistasfizeram previsões sobre os grandes problemas que aHumanidade iria enfrentar no, então, próximo séculoXXI. As diversas análises forneceram listas deproblemas, sendo que uma das mais conhecidascontinha apenas três: água, conservação do ambientee segurança.

Se, agora, olharmos para o miolo comum dostrês problemas, eles podem ser reduzidos, de facto, aapenas dois: análise e gestão de riscos, ou,porventura, até, a apenas um: riscos, os quaiscomportam, obviamente, a sua análise e gestão.

É evidente que a preparação de respostas bemdimensionadas para, no futuro, se enfrentarem osriscos, minorar as perdas e garantir a protecção e asegurança dos cidadãos, implica a necessidade demeios e, certamente, também a de planeamento. Alémdisso, seria necessário recorrer à análise de risco, aum nível nunca antes atingido, para se produzirem osbons planos de emergência que são necessários.

Ao Sistema de Protecção Civil já deixou de sersuficiente usar, simplesmente, a análise de risco. Énecessário ir, agora, bem mais longe, procedendo-se àsua “institucionalização” como metodologia detrabalho, para que a avaliação sistemática dos riscos edos seus efeitos sirva, com vantagens no plano dos custos-benefícios, à Prevenção, ao Socorro e à Reabilitação.

Com esse objectivo, permitimo-nos sistematizaralguns – poucos - dos métodos mais usuais econhecidos para proceder a análises de risco, osquais se encontram dispersos por váriaspublicações, que procurámos aqui reunir eapresentaremos mais adiante.

A redacção deste artigo decorre pois,essencialmente, da experiência vivida pelo primeiroautor, enquanto foi Presidente do ex-Serviço Nacionalde Bombeiros e Protecção Civil e, também, do vasto

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conhecimento que, entretanto, foi adquirindo emmatéria de protecção civil, sobretudo depois determinadas essas funções, aprofundado ao longo dasua posterior vida profissional que continuou ligadaa este sector.

Além do aproveitamento desse seu saberintrínseco, apoiou-se também na muita da bibliografiaexistente sobre o assunto, trabalho de que resultou otexto correspondente à conferência apresentada aoCongresso de Riscos.

Posteriormente, esse texto foi revisto pelo segundoautor, não tanto em termos do seu conteúdo, mas,principalmente, no que diz respeito à forma e, também,à sequência de apresentação temática, com vista àsua adaptação a artigo científico e em termos da suaadequação às normas da Territorium, dando origema uma nova versão, que, depois, foi sendo discutida eafinada em conjunto, correspondendo ao texto queagora se divulga.

Os riscos públicos e a Protecção Civil

A Humanidade, desde sempre, sofreu catástrofesnaturais que, atrás de si, deixaram pânico edevastação. Depois, nos começos do séc. XX,entraram em cena os desastres tecnológicos. O medodas pessoas agravou-se ainda mais quando, a partirda 2.ª Guerra Mundial, se iniciou a produção dearmas nucleares, biológicas e químicas. Maisrecentemente, com o início das grandes preocupaçõescom o Planeta Azul, a partir dos anos oitenta do séculopassado, adquiriu-se a consciência de outros riscos,agora com origem no ser humano, ou por eletransmitidos, e na sociedade (riscos antrópicos),riscos que são geradores de novos medos, porventuramais subtis, mas não menos avassaladores.

Neste contexto, as catástrofes naturais ocorremquando acontecimentos físicos, com origem na mãenatureza, tais como inundações, terramotos, maremotos,vulcões, deslizamentos de terras e acidentesmeteorológicos (tempestades, ondas de calor, vagasde frio, poeiras em suspensão), produzem importantesdanos, extensivos às pessoas e aos seus bens, e,eventualmente, provocam um elevado número de vítimas.

Os desastres antrópicos referem-se não só aacidentes graves causados, directa ou indirectamente,pela acção do Homem, por exemplo, através dautilização inadequada da tecnologia e dos recursosnaturais, mas também a situações de emergênciamotivadas pela incapacidade do ser humano conviverem harmonia com os seus semelhantes e que semanifestam através da guerra, fome, terrorismo eoutras formas de violência.

O termo antrópico (do Grego, anthropikos,próprio do homem) diz respeito “à distribuição e

actividade do homem” e identifica-se, pelo menos,com três situações distintas mas complementares: emtermos históricos e literários, como “pertencente aogénero humano ou aos humanos, ou ao período daexistência da Humanidade”; as ciências da terra eda natureza, referem-se-lhe por “estar associado comos humanos, influenciado pelos humanos ou tendolugar durante a existência humana”; por último, emfísica e cosmologia, o princípio antrópico estabeleceque “os seres humanos devem ter em consideraçãoos constrangimentos que a existência humana impõeaos universos teóricos que possam vir a suportar avida humana” (UNITED NATIONS, 2002).

Neste contexto abrangente, incêndios florestais,terrorismo, actos de vandalismo e os riscos decorrentesda interrupção dos serviços públicos básicos, porexemplo, são classificados como riscos antrópicos. Eque quer isto dizer realmente? Será por ocorrerem notempo da existência da Humanidade ou, então, porestarem associados aos seres humanos?

Naturalmente que será por esta circunstância,uma vez que a anterior lhe é concomitante. Comefeito, a literatura especializada, apresenta diversasclassificações de riscos, mas, quando está em causaa sua origem, o universo das hipóteses fica cheio deconstrangimentos. Ou se apresenta uma origem(causa) natural, quando o fenómeno que produz osdanos provém da natureza, ou, quando tal nãosucede, a origem advém de acções humanas, peloque, indubitavelmente, a sua causa é antrópica, poroposição à natural. Alguns riscos, como os incêndiosflorestais, podem apresentar ambas origens peloque, nesse caso, podem ser designados por mistos(L. LOURENÇO, 2007).

Por sua vez, os riscos antrópicos podem, emfunção da sua génese, ser agrupados em três tipos.Em primeiro lugar, surgem os riscos tecnológicos, queincluem um amplo leque de acidentes, cujas vias daexposição humana são: a água que bebemos, osalimentos que tomamos e o ar que respiramos. Asverdadeiras origens podem estar em fenómenospotencialmente perigosos, quer sejam químicos,mecânicos, térmicos, em radiações ionizantes(nucleares), no transporte de substâncias perigosas(explosivos, gases, líquidos, sólidos, auto-inflamáveis,tóxicas, infecciosas, corrosivas), em contaminaçõesatmosféricas, de águas, continentais e marítimas, edos solos, por deposição de resíduos.

O segundo tipo de riscos antrópicos, os riscossociais, diz respeito à incapacidade do homem viverem paz consigo próprio e com os seus semelhantes,no respeito pelos princípios da são convivência entreo “eu” e o “outro”, que são os da liberdade, igualdadee fraternidade e que se manifestam através de diversasformas de violência social.

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Por último, o terceiro tipo, corresponde aos riscosbiofísicos, que resultam de desequilíbrios entre o serhumano e os outros seres vivos. Embora, de início,sejam transmitidos ao ser humano por outros seresvivos, depois, passa a ser ele o agente difusor, peloque também devem ser incluídos nos riscos antrópicos.

Deste modo, alguns riscos, com origem antrópica,têm-se manifestado através de diversos tipos decatástrofes, como por exemplo: incêndios (urbanos,industriais, florestais), acidentes graves no transportede pessoas e bens, ou relacionados com a interrupçãode serviços públicos (água, gás, electricidade,comunicações), terrorismo, actos de vandalismo,grandes eventos desportivos, grandes concentraçõeshumanas (festas, eventos, aglomerações) e saúdepública (epidemias, contaminações, envenenamentos).

Face à probabilidade de manifestação de muitosdestes riscos, os países tiveram, naturalmente, de seorganizar para poderem enfrentar os desastres, nãosó os naturais, mas também os antrópicos.Começaram, então, por criar serviços nacionais dedefesa civil que, posteriormente, passaram adenominar-se de protecção civil.

Ao mesmo tempo, iniciaram a preparação deplanos de emergência, bem como a organização daprontidão e a disponibilização dos necessáriosrecursos, humanos e técnicos, para o socorro.

Mais tarde, reconheceu-se a importância dasmedidas de prevenção e passou a trabalhar-se, demodo sistemático, também nessa área.

Só depois, bastantes anos mais tarde, secomeçaram a equacionar e programar as intervençõesde reabilitação nos cenários de catástrofe, actividadeque, no nosso país, ainda se encontra numa faseembrionária.

Deste modo, pouco a pouco, através decontribuições sucessivas, chegou-se ao actual modelode Protecção Civil que, em termos gerais, nos paísesda UE, está organizado de modo mais ou menossimilar (fig. 1).

De início, em tempo de paz, não existiam sistemasnacionais de protecção, pelo que o combate aosdesastres estava a cargo das autoridades locais daaldeia, vila ou cidade, com os cidadãos voluntáriosa intervirem de modo espontâneo.

A Inglaterra foi o primeiro país a organizar a suaprotecção civil, tendo desenvolvido, em 1935,medidas de protecção relativas a raides aéreos.Poucos anos depois, em 1940, já possuía um serviçode protecção civil para tempo de paz.

Actualmente, tanto nos países onde o conceito éo de protecção civil (Europa) como nos países onde,ainda, persiste o conceito de defesa civil (América),as funções da protecção civil são, fundamentalmente,as mesmas e aparecem estruturadas geralmente emcinco ramos: Análise e Gestão de Risco, Planeamentode Emergência, Sistemas de Aviso e Comunicação,Programas e Documentação e, por último, Gestãoda Emergência.

Vamos, agora, centrar-nos, no primeiro dessesramos, ou seja, na análise e gestão de risco, para,depois, nas suas diferentes aplicações que, emconsequência da análise efectuada, serão objectode estudo mais adiante quando passarmos aotratamento dos outros quatro ramos atrásmencionados.

Análise e Gestão de Risco

Começando pelo conceito de risco, desde logo,encontramos muitas definições, que variam em funçãoda sua aplicação específica e do contexto em quesão tratadas. Os dicionários têm uma definiçãosimples, mas perfeitamente satisfatória: “uma situaçãoque envolve a exposição ao perigo ou a possibilidadede algo desagradável acontecer”.

Em todo o caso, os economistas, estatísticos,teóricos da decisão, estudiosos dos seguros e gestoresde riscos continuam a discutir os conceitos de risco ede incerteza na tentativa chegar a uma definiçãosatisfatória para todos os campos de aplicação.

Talvez não passe de uma tentativa destinada aofracasso: quando se folheiam os livros sobre análisede risco nota-se, com alguma surpresa que, ou fogempura e simplesmente à definição de risco ou, cadaum deles, avança com a sua própria definição(SCHIEROW, 2005).

Ao longo dos anos, os termos risco e incertezatêm-se tornado intermutáveis, podendo encontrar-semuitas vezes um deles na definição do outro. O Risconão é mais do que uma exposição às consequênciasda incerteza, contendo em si apenas dois elementosmuito simples de interpretar: a probabilidade doacontecimento e a resultante da intensidade dasconsequências (impacte), se o acontecimento

Fig. 1 – Modelo de organização e dos recursos daProtecção Civil na União Europeia.

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realmente se verificar.Uma grande dificuldade no tratamento do risco

advém do facto dos acontecimentos futuros não ocor-rerem exactamente da forma como os estamos a pen-sar no presente, devido aos muitos factores de nature-za incerta que intervêm no processo (HOLTON, 2004).

A dificuldade torna-se ainda maior quanto se temem conta o factor tempo, pois é notório que aprobabilidade se altera com o tempo de exposição eos impactes têm valores diferentes consoante se tratade um futuro imediato ou de um mais longínquo (esta éa razão teórica que determina que os planos deemergência não devam ser “estáticos”, havendo queproceder às suas revisões periódicas).

Uma fórmula matemática muito simples permiteexpressar o valor do risco, que é dado pelo produtoda probabilidade da ocorrência pela severidade ouintensidade das consequências, ou, então, expressode outro modo (CASTRO, 2000), corresponde aoproduto da frequência pela magnitude das

manifestações de determinado risco:Como a probabilidade/frequência é adimensional,

o risco terá a dimensão da severidade/magnitude, porexemplo, número de vítimas, desalojados, … mastambém poderá ser expressa em euros, pelo que orisco também será traduzido em euros, uma excelenteunidade de medida para efeitos de comparação eanálises de custo-benefício.

O mérito da análise e gestão de risco dependeessencialmente dos dados disponíveis e do rigor dosmétodos utilizados. Para os desastres naturais,antrópicos e mistos, os dados disponíveis são, ainda,muito limitados e os métodos são todavia duvidosos,daí decorrendo que as estimativas do risco sãoimprecisas e incertas e não fornecem a boa informaçãode que o planeamento precisa. É esta a principal razãoporque se discute se, porventura, a análise e gestãodos riscos públicos não exagera as estimativas do riscopara, assim, influenciar as políticas (o exageroproporciona que o interesse público se transforme,muitas vezes, em interesse de votos!).

Contudo, a análise e gestão de risco dispõe demetodologia própria, com modelos e ferramentas debase matemática e de natureza claramente científica,multidisciplinar, de abordagem sistémica e marcada porforte pendor prático. O problema fundamental que se

propõe resolver, pode exemplificar-se do seguinte modo:Apresenta-se uma primeira situação, A, em que o

risco, sendo de 0,75 x 60 = 45 milhões de euros, éinaceitável. Numa segunda situação, B, a gestão derisco, com medidas de mitigação apropriadas, podereduzir a probabilidade para 0,50 e a severidade para50 M€, sendo agora o risco 25 milhões de euros.Contudo, investindo mais em mitigação, na terceirasituação, C, o valor da apólice de seguro já pode terum valor aceitável (fig. 2). Assim, se tratar de umnegócio, este será mais saudável, pois passa a poder

cobrir os seus próprios riscos.Com efeito, de um ponto de vista formal, considera-

se que a análise e gestão de risco abrange quatroelementos inter-relacionados. Por um lado, dois delesestão directamente ligados à análise, e são a avaliaçãode risco — processo em que se determina o quê, comoe porquê os riscos se podem manifestar e como sematerializam em perigos e, ainda, qual poderá vir aser a sua severidade, — e, depois, a subsequentetomada de consciência do risco e a percepção doperigo, as quais permitem avaliar se um risco é ou nãotolerável e identificam onde devem ser postas asprioridades relativas às respostas.

Em resultado da análise efectuada, e para que estatenha consequências, é necessário passar à faseseguinte, a da gestão de risco, que envolve os outrosdois dos elementos antes mencionados, a gestão derisco propriamente dita, que se refere à cultura,processos, estruturas e meios dirigidos tanto para aprevenção como para o combate efectivo dos efeitosadversos da manifestação do risco, bem como a naturalcomunicação de risco que ela implica, a qual envolvea informação, avisos e alertas que é necessário fazerchegar às pessoas, individual e colectivamente, comoabordaremos a seguir.

Avaliação de Risco

A avaliação de risco engloba os estudos para de-terminar a probabilidade de ocorrência, de um ou mais

R = P . S R = F . M

R – Risco R – Risco

P – Probabilidade F – Frequência

S – Severidade M – Magnitude

Fig. 2 – Problema fundamental da gestão do risco.

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eventos, e os seus impactes potenciais. Começa-se pelaidentificação e caracterização do risco em causa, atra-vés da modelação e quantificação das incertezas.

Recorrendo à teoria das probabilidades, épossível avaliar as incertezas e descrever ocomportamento das variáveis aleatórias que,relacionadas entre si, permitem chegar à probabilidadefinal. É muito importante que a avaliação de risco nãoproduza análises contraditórias, sendo este o melhormodo de evitar que o público leigo fique ainda maisperplexo e confuso.

A avaliação inicia-se com a formulação doproblema, a delimitação do seu âmbito e a especificaçãodo nível de detalhe pretendido; continua com aidentificação dos perigos que determinado risco podeprovocar e com a análise dos respectivos cenários, porequipas multidisciplinares, as quais devem ter bonsconhecimentos sobre os desastres e sobre as técnicasde análise; prossegue com a identificação dassequências de eventos que os riscos assinalados podemoriginar e termina com a avaliação propriamente dita,onde se comparam os riscos calculados com os riscosaceitáveis, e se decide quanto à tolerabilidade do risco,concretamente, se é (ou não) indicado promover medidasde mitigação, para reduzir a probabilidade deocorrência e/ou diminuir os impactes.

Um modo de conhecer o que verdadeiramente sepassa em relação a um determinado risco consiste emconstruir uma curva de excedente de probabilidade,através da qual se mostra a probabilidade de um dadonível de impactes poder ser excedido (KUNREUTHER,2007). Os impactes podem ser avaliados em termosde valores monetários, número de vítimas mortais,número de feridos, ou qualquer outra unidadeapropriada para a análise, como mostra uma simplesde curva EP (probabilidade de eventos), onde L é ovalor dos impactes e P(L) é a probabilidade de osimpactes poderem exceder L (fig. 3):

Pela avaliação probabilista de risco, combina--se o conjunto de eventos que podem produzir umdado impacte e, seguidamente, calculam-se asprobabilidades de exceder esse impacte emdiferentes magnitudes. Com base nas estimativas,pode representar-se a EP média que incorpora asincertezas associadas com as probabilidades deocorrência e o valor dos impactes. Deste modo, ascurvas EP consideraram o grau de incertezarelativamente à probabilidade e aos impactes.

Consciência do Risco e Percepção do Perigo

No passado, na avaliação de risco, só secalculavam as probabilidades e se quantificavamos impactes. Percebeu-se, entretanto, que, apenasisso, não era suficiente. Existiam outras questõesque estavam a ser ignoradas e que eram aconsciência do risco e a percepção do perigo,relacionadas com factores psicológicos eemocionais que influenciam o comportamento daspessoas (FISCHOFF, 2006).

A nova abordagem só teve início nos passadosanos setenta, quando Paul SLOVIC e Baruch FISCHHOFF

(2004) pesquisaram o comportamento depopulações em situações de exposição a diferentestipos de risco. Os estudos mostraram que os riscossobre os quais havia pouco conhecimento e maistemor, eram entendidos como sendo os de maiorperigo. Esse era o caso, por exemplo, do nuclear edo armazenamento dos desperdícios radioactivos,em que havia uma grande disparidade de pontosde vista entre o simples cidadão e os analistas derisco. O facto do cidadão comum ver o mundo deum modo diferente do visto pelos peritos acabou,como se compreende, por levantar questõesrelativamente aos processos de tomada de decisãosobre estes riscos.

Na verdade, o público deixou de acreditar nasanálises dos especialistas, porque elas não erambem comunicadas, porque as suposições em quese baseavam não eram claras e porque não seentendia que os especialistas tivessem opiniões tãodiferentes, entre si.

Foi, pois, necessário alterar esta situação, oque aconteceu quando se passaram a incluirfactores psicológicos e emocionais no processoda avaliação dos riscos e se compreendeu que opúblico evita agir de determinada maneira, frentea determinadas situações, apenas porque “sabe”que elas podem ser perigosas.

Aparentemente, há um estigma de medo associadoàs tecnologias, lugares e acontecimentos naturais sóporque o público os “conhece” como envolvendo riscos(SLOVIC, 2000).

Fig. 3 – Exemplo de curva de probabilidade de eventos(curva EP).

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Gestão de Risco

A gestão de risco é o processo através do qual sedecide o que fazer em relação ao(s) risco(s) em causa,às populações expostas e a todas as consequênciasque, de algum modo, sejam adversas. Para o efeito,implementa as decisões contidas nos planos de acção,avalia os resultados e, a nível de programa, decideos riscos que devem ser controlados e a ordem emque tal deve ser feito.

O risco público é gerido por organismosresponsáveis, que em nome da sociedade tomamdecisões sobre a utilização dos dinheiros atribuídos,em princípio, com o objectivo de reduzir os riscos aque as populações estão expostas.

Nas actuais sociedades desenvolvidas, 10 a 20%da riqueza produzida é encaminhada para asegurança, redução de risco e melhoria da saúdepública (SOARES, 2005). Nos países evoluídos são osserviços da protecção civil que gerem uma boa partedesses dinheiros, assumindo que se trata de“despesas”. Presentemente, discute-se a necessidadeduma mudança de paradigma, ou seja, a de passara gerir aqueles dinheiros disponíveis comoinvestimentos e não como despesas.

A gestão de riscos engloba as medidas tomadaspara manter os níveis de risco dentro de limitesaceitáveis. A avaliação mostra o nível de risco ecompara-o com critérios de aceitabilidade do risco.Assim, se o risco se apresentar como não tolerável,então é necessário proceder ao seu controlo atravésde planos de acção e medidas apropriadas. Por suavez, se o risco for considerado inaceitável, entãodevem implementar-se medidas de mitigação. Adificuldade é que, na maior parte das situações, orisco não se apresenta claramente inaceitável ouinsignificante, pelo que há necessidade de recorreràs análises de custo-benefício para comparar aaceitabilidade com os custos da mitigação.

No caso dos riscos públicos, a tomada de decisãotem sempre uma forte carga política e, como tal,depende da percepção que a sociedade tem do riscoe da forma como a ele reage (essas reacções sãoamostragens das futuras intenções de voto). Assim, aforma mais responsável e transparente de gerir os riscospúblicos só pode consistir na sua quantificaçãorigorosa e comparação com critérios suficientementeestudados, para estabelecer os níveis de aceitabilidadee preparar respostas bem dimensionadas (a respostadesproporcionada, típica das decisões “ad-hoc”, nuncaé a melhor solução).

No desenvolvimento de estratégias de gestão deriscos públicos há sempre, como se sabe, anecessidade de ter também em conta o sector privado.Contudo, é ao sector público que compete assumir o

papel principal no desencadeamento de medidas deprotecção, pois o sector privado geralmente nãodispõe dos incentivos para dar os primeiros passospor si próprio (HEAL, 2002).

Na Protecção Civil Nacional nota-se a necessidadede se vir a instituir algum tipo de norma que leve àconcordância geral, quanto à terminologia dos riscose quanto aos processos de análise e de comunicação,e que leve também a perceber que a gestão de risconão é apenas uma preocupação das empresas e dosserviços públicos, mas também o é dos cidadãos,tomados individual e colectivamente, quandodirectamente afectados pelos desastres ou não.

Um exemplo deste reconhecimento levou a que,em 2002, no Reino Unido, as três maioresorganizações de gestão de riscos, Institute of RiskManagement (IRM), Association of Insurance and RiskManagers (AIRMIC) e National Forum for RiskManagement in the Public Sector (ALARM), sejuntassem, formando uma equipa de trabalhoconjunta, para produzir uma regra sobrenormalização (IRM, 2002).

Comunicação do Risco

Quando se desenvolvem estratégias para a gestãodos riscos públicos, é indispensável considerar, nãosó os dados de análise, mas também os factores queinfluenciam a percepção do risco.

No entanto, como as pessoas comuns têm semprealguma dificuldade em compreender dados relativosa acontecimentos incertos, coloca-se sempre odesafio de uma comunicação efectiva com o público.As políticas e as medidas da gestão de riscos nãoterão grande futuro se não reconhecerem asdificuldades que os cidadãos têm em compreenderos riscos que os afectam, ou os podem vir a afectar.

A comunicação de risco só, em 1969, foireconhecida como algo de cariz marcadamentecientífico (SINISI, 2004), mas só a partir dos anosoitenta é que se desenvolveu uma nova aproximação,a qual tornou a comunicação do risco, para o público,em algo mais do que a simples transmissão deinsípidos números da gíria especializada. Naactualidade, felizmente, já adquiriu o estatuto de ummétodo profissional de compreensão científica etecnológica do risco, associado às decisões políticasem cenários de desastre ou catástrofe, transmitindo ainformação relevante às estruturas sociais e políticase, também, aos cidadãos.

Os objectivos da comunicação de risco, emsituações de emergência, são vários, designadamente:criar confiança nas pessoas, quanto à credibilidade doSistema da Protecção Civil e à sua capacidade paratrabalhar em coordenação com as outras autoridades

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que intervêm; transmitir informação exacta, rápida, ecompleta, para acalmar receios e manter a tranquilidadepública; minimizar o pânico, relativamente aos desastres;disponibilizar informação fiável, consistente, edetalhada, para todos os que dela necessitem; combaterboatos, rumores, inexactidões e questões malcompreendidas; coordenar a comunicação, com todosos outros parceiros no terreno, públicos e privados, sejaa nível local, regional ou nacional (os planos decomunicação explicitam sempre a informação que nãodeve ser descurada durante a emergência).

Não há receitas fáceis para a comunicação derisco bem sucedida. Contudo, os estudiosos doassunto geralmente concordam com as sete regrasde ouro da comunicação do risco (COVELLO, 2005):

~Aceitar e envolver o público como parceiro;~Planear cuidadosamente a comunicação;~ Avaliar os resultados;~ Atender às preocupações das pessoas;~ Comunicar com clareza, honestidade,

franqueza e abertura;~ Coordenar e colaborar com as fontes de

informação;~ Ir de encontro às necessidades da comunicação

social.Aliás, a Associação Portuguesa de Riscos,

Protecção e Segurança, consciente desta dificuldadee sensível à importância que este assunto deve merecer,dedicou o seu III Encontro Nacional de Riscos, quedecorreu em Mafra, no dia 24 de Novembro de 2006,precisamente ao desenvolvimento desta temática, ouseja, à informação e comunicação do Risco emProtecção Civil.

Análise e Gestão de Riscos em Protecção Civil - Síntese

Como vimos, diz respeito à identificação e àanálise dos riscos, nas suas quatro fases – avaliação,percepção, gestão e comunicação– para suporte doplaneamento e desenvolvimento dos procedimentose requisitos da resposta.

Uma rápida pesquisa de livros sobre análise derisco feita na Amazon, em 14 de Maio de 2009,mostrou, indirectamente, a grande importância daanálise de risco. Procurando em Professional &Technical Books, obtiveram-se para a entrada Risk,620 538 livros; para a entrada Risk Management,45 388 livros; e, para a entrada Risk Analysis, 24 170livros. Estreitando mais a pesquisa, passando à sub--categoria de Engineering Books, para entrada Riskobtiveram-se 35 868 livros; para a entrada RiskManagement, 8 463 livros; e. para a entrada RiskAnalysis, 6 625 livros. Muitos destes livros, semsombra de dúvida, referem-se a riscos públicos e aplanos de emergência.

A importância da análise de risco, em protecçãocivil, também ficou bem expressa quando, emSetembro de 2007, se realizou na Universidade deShangai, China, a 1.ª Conferência Internacional sobreAnálise de Risco e Respostas de Emergência, a agorafamosa RACR-07. O tema abordado foi sobre “Teoriase Aplicações da Análise de Risco e Respostas deEmergência” e a organização da conferência, a cargodas associações e autoridades chinesas, foi apoiada,entre outros, pela Society for Risk Analysis para“fortalecer as trocas académicas nas áreas da análisede risco e da resposta a emergências, promovê-las aum nível mais elevado e proporcionar um fóruminternacional para reflectir sobre os progressos dasua investigação” (RACR, 2007). Estiveram presentesmais de mil cientistas e altos responsáveisinternacionais de uma variada gama de disciplinasque comunicaram e trocaram ideias de grandeinteresse para a análise dos riscos públicos.

No nosso país, as vicissitudes ocorridas nas áreasda Protecção e do Socorro, nos últimos anos devigência da 1.ª Lei de Bases da Protecção Civil, e que,injustamente, puseram em causa a adequabilidadedesta Lei e levaram à sua substituição, teriam tido umaoutra interpretação, ou encontrado uma soluçãodiferente, se a análise de risco já fosse verdadeiramenteuma componente do sistema. Teria sido possível mostrarque vários dos problemas, então surgidos, teriam maisa ver com o modo como a lei estava a ser aplicada,desvirtuada da sua matriz teórica, do que com a letrae o espírito da própria Lei.

Por exemplo, a questão dos incêndios florestaisteria sido conduzida de outra forma, não sepermitindo que uma questão essencialmenteeconómica, do sector privado, tivesse sidotransformada num problema exclusivamente deprotecção civil. A apregoada falta de meios, deixariade camuflar a falta de planeamento para a suautilização e localização. O Voluntariado, passaria aincluir os simples cidadãos individuais, agrupadossob novas bandeiras, para cooperarem activamentecom o sistema.

A Protecção Civil, seria encarada como um“chapéu” de protecção integrada dos cidadãos e,assim, teria de haver unidade de comando, boacoordenação, controlo efectivo e economia de meios.Passaria a conceder-se maior protagonismo aosagentes do nível local, nomeadamente aos municípiose juntas de freguesia. Os planos de emergênciamunicipais seriam elaborados tendo em mais e emmelhor conta os recursos dos concelhos vizinhos enão se aceitaria que existissem concelhos sem planosde emergência (em 2003 ainda havia 3 municípiossem plano de emergência municipal e aceitavam-seplanos do tipo “recorte e cole” [copy and paste], em

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que, por vezes, até se esqueceram de que era preciso,pelo menos, alterar os nomes das freguesias).

Torna-se, pois, indispensável que a Protecção Civil nãocaia em erros do passado, quanto à gestão dos riscos,evitando desperdiçar consideráveis somas na vã tentativade gerir algo que não se conhece, pois já não é possívelgerir os riscos públicos à revelia da análise de risco.

Com efeito, o professor Sam SAVAGE (2003), daUniversidade de Stanford, escreveu: “Mesmo quandoexistem bons dados históricos, as pessoas acabam portomar más decisões. Nós temos dificuldade emcompreender bem e gerimos erradamente algunsproblemas importantes. Não é porque sejamos estúpidosou porque os processos tenham erros desconhecidos. Asimples utilização de algumas simulações de Monte-Carlo, rápidas e baratas, poderia reduzir o número dedecisões gravosas de alguns gestores de risco que semantêm agarrados às médias simplistas”.

Assim, se há riscos que são perfeitamenteadmissíveis, outros há que são completamenteinaceitáveis, pelo que se torna necessário estabelecercritérios que permitam distinguir uns de outros.

Critérios de Aceitabilidade do Risco

A qualidade de vida em sociedade tem sidorelacionada com o nível de produção de riqueza ecom a esperança de vida das pessoas, havendoindicadores que descrevem aquela qualidade de vida.No entanto, nenhum desses indicadores inclui,explicitamente, um factor que traduza a exposiçãoaos riscos públicos, embora isso também tenha muitoa ver com a qualidade de vida.

De entre os vários critérios que ajudam a identificara aceitabilidade do risco indicamos os seguintes:

LQI – Life Quality Index

O Índice de Qualidade de Vida (LQI – Life QualityIndex), cujo conceito foi iniciado no Institute for RiskResearch da Universidade de Waterloo, Canada, porN. C. LIND et al. (1992), combina dois indicadoressociais primários, a esperança de vida saudável ànascença, E, e o produto interno bruto por pessoa, G,corrigido de modo apropriado para o poder decompra, k (RACKWITZ, 2005; PANDEY et al., 2006){http://en.wikipedia.org/wiki/Life_Quality_Index}

L = Ek.GL – Índice de Qualidade de VidaE – Esperança de vida saudável à nascençaG – Produto interno bruto por pessoak – constante baseada no orçamento disponível

para muitos países, sendo aproximadamenteigual a 5,0 para os países desenvolvidos.

Se bem que este indicador já considere o riscopúblico, fá-lo, ainda, de um modo muito indirecto.Com efeito, a análise de risco quantitativa só,recentemente, emergiu estruturada como metodologiaprecisa para a avaliação dos riscos públicos e oplaneamento das medidas preventivas.

Terá de basear-se, naturalmente, num certo númerode critérios de comparação e indicadores que dêemsuporte aos planos de emergência. É sobre este temados “critérios” que, presentemente, se debruçam osmelhores teóricos da protecção civil, procurandoinspiração no modo como as empresas tratam o riscoe avaliam os seus investimentos em segurança.

SLE – Single Loss Exposure

O Indicador de Exposição de Perda Única (SLE –Single Loss Exposure) estabelece uma medida precisado modo como um único evento de risco pode afectarum determinado activo e, assim, representar umpotencial valor de perda para a empresa. É dadopela fórmula:

I = V . EI – Indicador de Exposição de Perda ÚnicaV – Valor do ActivoE – Factor de Exposição

onde o valor do activo (V) é uma medida sintéticados valores de custo de aquisição, de manutenção,de apoio, de substituição e de propriedade do activo;e em que o factor de exposição (E) representa umamedida da magnitude do impacte no valor do activoconsiderado, expresso numa percentagem do seuvalor {http://wiki.case.edu/Information_Security_Risk_Management}.

É um facto que os indicadores demasiadoeconomicistas não servem para a protecção civil,sendo até contrários ao seu espírito “humanista”. Noentanto, pelo menos, podem chamar a atenção paraa falta de bons critérios de aceitabilidade dos riscos,sem os quais, mesmo com óptimas análises de risco,não se poderão alcançar nem boas políticas, nemmedidas de protecção adequadas ou planos deacção eficazes.

Um dos modelos mais simples de gestão dos riscospúblicos (fig. 4) tem a particularidade de considerarum “posto de acompanhamento” central onde é feitaa comparação com os indicadores – o modelo é“controlável” e, portanto, tem alta probabilidade deser eficaz.

Uma grande dificuldade, que precisa de serresolvida, é a necessidade dos indicadoresconsiderarem, implicitamente, o valor do risco avariar com o tempo. Como os impactes, numa dada

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altura, são diferentes dos impactes noutra alturaposterior, é indispensável que os factores deexposição possam ser actualizados, tal como odevem ser os planos de emergência.

EFCT - Exposure Factor during Critical Time

Um indicador desenvolvido recentemente, o (EFCT- Exposure Factor during Critical Time), que tem mais aver com acidentes terroristas, expressa a percentagempotencial de danos, com criticismo relativamente aotempo, numa dada infra-estrutura vital (BELLA, 2007),onde F é o factor de exposição e C é o factor queexpressa a percentagem de criticismo no intervalo detempo {http://www.sciencedirect.com}.

F = (E + C) – (E . C)F – Factor de Exposição em Tempo CríticoE – Factor de ExposiçãoC – Factor de Criticismo

Continua a ser preciso mostrar, com estudo decasos, como os indicadores podem constituir umóptimo apoio aos planos de emergência e permitemavaliar a eficácia das regulamentações e de todas asmedidas tendentes a reduzir os riscos.

Passemos, então, à síntese de alguns dos métodosmais usados na análise de risco.

Metodologia de análise de riscos

Existe uma grande variedade de métodos parafazer a avaliação, caracterização e quantificaçãodos riscos. A escolha depende da natureza do riscoe da quantidade de dados históricos disponíveis paraa análise, em especial no caso de se tratar demétodos quantitativos.

Naturalmente, quando se atenta na solidez, rigore potencialidades de aplicação dos vários métodoslevantam-se muitas questões, desde a adequabilidadeà ligação de métodos qualitativos a métodos

quantitativos, passando pela sua precisão echegando, até, ao nível de controlo que eles permitamter sobre os factores de risco.

É ilusão acreditar-se que o risco apresentado porum qualquer cenário concreto, é uma espécie depropriedade inerente a essa situação. Não é assim.Com efeito, cada cenário – por exemplo uma ponteque pode ruir - é um sistema dinâmico, que “reage” àscondições de mudança durante o seu tempo de vida.Logo, o risco só pode ser definido e calculado comum curto período de avanço (alguns anos) e, apenas,enquanto as condições naturais, técnicas e, até,políticas não se alterarem muito.

A protecção, a segurança e o risco só podem serentendidos no seu sentido mais restrito, o que implicasempre a necessidade de reavaliações periódicas,tudo voltando a ser novamente considerado comopossível de acontecer. Deste modo, a reavaliaçãodos riscos traz, desde logo, a grande vantagem deproporcionar melhor formação aos analistas, alémde permitir a recapitulação das teorias e métodosenvolvidos e, ao mesmo tempo, conduzir à melhorpercepção dos aspectos positivos e negativos de todaa problemática que se apresenta (LOMBARDI, 2003).

Com efeito, cada uma das áreas de aplicação daanálise de riscos desenvolveu a sua escola de análise,com métodos próprios, para resolver os seusproblemas específicos. Partindo dos métodosqualitativos primitivos, progressivamente, passou arecorrer-se mais ao cálculo das probabilidades e àestatística e, deste modo, chegou-se aos métodosexclusivamente quantitativos. Os problemas asolucionar têm-se tornado cada vez mais complexose, por isso, os antigos métodos qualitativos deixaramde responder com suficiência às necessidades.

Quando estão envolvidos factores de ordemnatural, os métodos analíticos têm de ser, ainda, maisrefinados. Para além da base matemática, não podemdispensar a base científica, teórica e aplicada. Nopassado, as aplicações da análise de riscodesenvolveram-se de forma separada, com os seusespecialistas a conhecerem bem apenas uma ou duasáreas de aplicação. Contudo, quando se trata desistemas naturais, ambiente ou alta tecnologia, ouseja, de riscos complexos, em que estão em causainfra-estruturas vitais e, sobretudo, pessoas, o risco jánão pode ser modelado desse modo simples.Passaram a ser necessários métodos integrados eequipas de análise multi-disciplinares.

Apesar de haver importantes diferençasrelacionadas com a dimensão, natureza econsequências dos riscos, e com as próprias áreasde interesse onde eles ocorrem, continua a procurar--se uma metodologia geral de análise que identifiquee trate de modo idêntico tanto os riscos públicos, da

Fig. 4 – Modelo de gestão de riscos.

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área da protecção civil, como os privados, sobretudoligados às empresas e pessoas, enquanto indivíduos,e não como sociedade.

Assim, nos planos de emergência, as questões daanálise unificada e da abordagem integrada estão amerecer grande atenção, sendo agora reconhecidaa necessidade do envolvimento conjunto dos sectorespúblico e privado nesse estudo, com vista aodesenvolvimento e aplicação de soluções queinteressem a todas as partes.

Como se observa, presentemente, a análise derisco pode utilizar várias dezenas de métodosespecíficos nos vários campos de aplicação. A títulomeramente exemplificativo, indicamos alguns dessesmétodos de entre os que nos parecem mais adaptadospara utilização no planeamento da Protecção Civil.

Métodos gerais

Existem já métodos de análise, com aplicaçãoem vários campos, incluindo a protecção civil, queforam suficientemente melhorados para serem aceitescomo “gerais”, por exemplo:

~ Análise de Custo-Benefício;~ Parecer de Peritos;~ Análise de Árvore de Falhas;~ Métodos Baseados em Dados;

Análise de Custo-Benefício (CBA - Cost-BenefitAnalysis)

A análise de custo-benefício define e compara osbenefícios com os custos da mitigação de uma dadasituação de risco e, nesse sentido, constitui umaferramenta que permite tomar decisões. Comparadirectamente os benefícios de uma estratégia com osseus riscos potenciais, usando sempre a mesmaunidade de medida. Uma fraqueza do método é queos benefícios e os custos podem ser difíceis dequantificar. Como calcular, por exemplo, o valorestético do centro histórico de uma cidade destruídapor um sismo?

Na orçamentação e planeamento governamental,a análise de custo-benefício é a tentativa de medir osbenefícios sociais de um determinado projecto, emtermos monetários, e fazer a comparação com oscustos respectivos (ENCYCLOPAEDIA BRITANNICA, 2009,).

O procedimento, que já tem mais de 160 anos, foiproposto, pela primeira vez, pelo engenheiro francêsA. J. DUPUIT (NEWMAN, 2003), mas não erasistematicamente aplicado, até que, em 1936, nosEstados Unidos, na sequência do aparecimento de umalei de controlo de inundações, que requeria que osbenefícios dos projectos de controlo de cheias einundações fossem maiores que os seus custos, passou

a ser usado. Como é evidente, esta era a melhor maneirade obrigar os decisores a estudarem os problemascom realismo e a não gastarem dinheiros públicos comdecisões espúrias ou pouco amadurecidas.

A peça fundamental, a produzir pelo processo deanálise, é uma ratio de custo-benefício, que sedetermina dividindo os benefícios da iniciativa deprotecção civil pelos seus custos. Como se depreende,têm de ser consideradas variáveis em número muitoelevado, muitas delas de índole qualitativa, tais comoa qualidade de vida ou a protecção ambiental, namedida em que o valor dos benefícios pode serindirecto ou a iniciativa pode projectar-se muito longeno tempo, no futuro. Certamente que tudo isto tornaestes estudos difíceis, requerendo a colaboração deanalistas avalizados e a existência de uma matrizteórica institucionalizada na Protecção CivilNacional, para que tudo resulte integrado econsistente. Mas, qual é a dificuldade para se começara trabalhar nesta base?

Muito importante, é que o recurso à análise decusto-benefício pode permitir não só a comparaçãoobjectiva de vários projectos e decisões em presença,mas também incentivar a discussão pública dasgrandes decisões. Se, além disso, o Sistema tambémtiver em conta as opiniões vindas de fora, por definiçãomais desapaixonadas e mais distantes das pressõesinternas, os seus responsáveis terão não só maiselementos disponíveis para tomarem decisões, mastambém mais caminhos desbravados por onde épossível caminhar. Claro que estas decisões podemenvolver outros instrumentos, tais como planos deemergência externos, de barragens, grandes meios decombate aos incêndios florestais, ou a profundidadeda reabilitação, ou a intensidade dos programas detreino e, claro, para todos eles, a utilização da análisecusto-benefício só pode trazer vantagens.

Desde os anos cinquenta, do século passado, queos analistas tentam fornecer métodos rigorosos econsistentes para medir os benefícios – os custos sãomais fáceis de medir – e decidir se os projectos sãorobustos, isto é, se não acarretam mais custos do queos benefícios que deles se esperam. No presente,algumas dificuldades técnicas dos métodos ainda nãoestão completamente resolvidas mas os fundamentosjá estão bem estabelecidos. Por exemplo, todos osaspectos de um projecto, positivos e negativos, jásão expressos em termos de uma unidade comum, amonetária, ou seja, o dinheiro.

Um dos aspectos mais interessantes da análisecusto-benefício é encontrar opções do passado querevelem os valores de permuta ou equivalência daspreferências. Por exemplo, a valorização do benefíciodas pessoas não terem as suas casas sujeitas ao riscode inundação pode ser estabelecido investigando

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quanto (menos) custa o arrendamento ou compra decasas localizadas em áreas sujeitas a cheias que, deoutro modo, seria idêntico ao das casas delocalização mais protegida. É curioso notar que ovalor atribuído pelas pessoas à protecção contrainundação das suas casas, como é revelado pelomercado, parece ser menor do que a avaliaçãoretórica da sua “protecção”.

Parecer/Opinião de Peritos

O parecer de peritos usa-se quando os riscos nãopodem ser previstos com suficiente rigor, com recurso,apenas, aos dados históricos existentes. O método é,igualmente, apropriado para os riscos que ocorramcom baixa frequência ou irregularidade, quandoprobabilidades mais rigorosas não podem serobtidas por via quantitativa. Existem diversas técnicaspara obter a “opinião” dos especialistas, desde asolicitação directa a peritos, individualmente, aorecurso a grupos de trabalho ou à utilização dométodo Delphi.

Em termos gerais, qualquer pessoa comconhecimentos especiais num determinado campopode ser um expert nesse campo. Como se depreende,a questão fundamental, relativamente ao perito, é ado reconhecimento do seu valor enquanto tal, o que éfeito através da apreciação do seu trabalho activopassado, da avaliação das suas contribuiçõesteóricas e do sucesso do seu desempenho em situaçõessimilares àquelas a que é chamado a opinar. Porexemplo, na lei europeia é o tribunal que decide quempode ser um perito, fazendo a selecção, geralmentea partir de uma lista formal previamente construída,para garantir que os peritos designados possam serimparciais. De modo algum, os peritos deverão serindicados pelas partes interessadas. (ENCYCLOPAEDIA

BRITANNICA, 2009). Na análise de risco de tipo qualitativa,

sobretudo quando não há dados históricossuficientes sobre desastres, naturais ou antrópicos,é dos peritos que pode vir a melhor informação debase. Os melhores parâmetros de entrada nosmodelos da análise, sejam eles deterministas ouprobabilistas, são fornecidos pelos peritos comconhecimento especializado e experiência noscampos a que são chamados a dar a sua opinião.Na maior parte das situações, eles não sepronunciam relativamente aos factos que podemocorrer, em si mesmos, mas sobretudo retiramconclusões sobre as suas consequências. Com efeito,no tribunal, as simples testemunhas só se podempronunciar relativamente aos factos, não podemexpressar opiniões, contrariamente aos peritos, quedevem, sem dúvida, poder emitir opiniões.

Nos métodos de análise de risco, em que serecorre à opinião de peritos, a melhor maneira decontornar as dificuldades que existem na selecção dosexperts e no “balanceamento” das suas opiniões, quesó por milagre pode acontecer serem coincidentes, é ade seguir algumas regras formais, designadamente:

· Permitir ao perito interno, da área, a conduçãoda análise de risco e a coordenação daactuação dos peritos chamados do exterior;

· Capturar a opinião dos peritos, através dadisciplina imposta por uma estrutura deindicadores de risco e causas primeiras, queassegurem a boa qualidade das opiniõessubjectivas;

· Documentar as auto-avaliações dos peritos,relativamente aos processos em discussão, paraidentificar “O que pode acontecer de errado?”com base na sua experiência valiosa,alicerçada no seu grande conhecimento dasmatérias envolvidas;

· Avaliar as opiniões, para determinar se énecessário tomar qualquer acção;

· Formalizar o processo de mitigação, para darcontinuidade às “opiniões” e esboçar um planode acção, que tenha em conta tanto os dadoshistóricos, como a análise tradicional;

· Monitorizar o plano de acção, para assegurarque ele efectivamente atinge o objectivo, e nãose trata, apenas, de uma ferramenta de“representação”.

Deste modo, um expert, ou perito profissional, éum avaliador de situações ou acontecimentos que,em virtude da sua educação, treino, competência ouexperiência, se acredita ser detentor de conhecimentoselevados relativamente a uma matéria particular,conhecimentos que vão muito além dos detidos pelageneralidade das pessoas, e em grau suficiente paraque outros possam, oficial e legalmente, apoiar-se nasua opinião especializada para, assim, julgarem outomarem as decisões mais apropriadas.

Metodologia baseada em Árvores de Falhas

É o método preferido nas situações cujos riscospotenciais múltiplos podem conduzir a um únicoresultado adverso. Toma em consideração osaspectos dinâmicos do cenário e é relevante quandoas causas do risco variam com o tempo. Só éaplicável quando é possível atribuir probabilidadesdo risco com níveis elevados de precisão.

As árvores de falha são frequentemente usadaspara caracterizar riscos para os quais não há dadoshistóricos disponíveis. Permitem traçar todas aspossibilidades relevantes e determinar aprobabilidade de um impacte final.

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De entre os métodos descritos na bibliografia,mencionamos os dois seguintes:

FTA - Fault tree analysis

A análise de árvore de falhas é um conceito que teveorigem nos Bell Telephone Laboratories, em 1962, pararealizar uma avaliação de segurança do sistema de con-trolo de lançamento dos mísseis balísticos Minutemen.

Trata-se de um diagrama lógico dedutivo, quemostra a relação entre a falha de um componente, umacontecimento indesejável, e as consequentes falhasde outros componentes do sistema. Em primeiro lugar,é estabelecido um evento indesejável e, depois,identifica-se o relacionamento causal das falhas queconduzem ao acontecimento.

A árvore de falhas inicia-se no extremo final dasequência de acontecimentos, com o acidente que sepretende estudar, e, por sucessivas considerações dassuas causas próximas, vai andando “para trás” atéchegar às causas primárias {http://www.exprobase.com/Default.aspx?page=10}.

FTA - Event tree analysis

A análise de árvore de acontecimentos consistena análise de causas possíveis, começando a níveldo sistema e investigando para baixo, através dosistema, subsistema, equipamento e componente,identificando todas as causas.

Estes métodos de avaliação pretendem determinara probabilidade existente entre um acidente e o riscoque lhe está associado e baseiam-se na descriçãográfica das sequências de eventos, recorrendo atécnicas ETA (European Technical Approval) {http://www.lnec.pt/qpe/marcacao/introducao_eta_geral}.

Trata-se de um método lógico para analisar comoe porquê um desastre pode ocorrer.

A árvore de acontecimentos, parte de um primeiroacontecimento, considera os resultados possíveis epara cada resultado vai repetindo o processo. Aanálise quantifica as frequências e a probabilidadede cada sequência de acontecimentos {http://www.exprobase.com/Default.aspx?page=10}.

Metodologia baseada em dados

Estes métodos, designadamente as análisesdescritivas e as análise de tendência, são apropriadosquando há registos sobre eventos, impactes ecircunstâncias sob que ocorreram. Recorrem atécnicas estatísticas para descobrir a contribuiçãorelativa dos potenciais factores de risco.

Um método de análise descritiva é o tornado plot,no qual o conjunto de contribuições relativas de cada

factor, para um dado resultado, é estabelecidovisualmente, colocando o factor de maior contribuiçãona parte superior do quadro, seguido pelo factor decontribuição e, assim, por diante {http://www.slb.com/media/services/software/whitepaper/whitepaper_dfdp.pdf}.

Métodos Qualitativos e Quantitativos

Presentemente, a análise de risco, utiliza váriasdezenas de métodos específicos, nos seus várioscampos de aplicação. A título meramenteexemplificativo, indicam-se alguns desses métodos,dentro dos que estão a ser mais adaptados parautilização no planeamento de Protecção Civil.

A existência de diversos tipos de dados, por vezes,com características bem diferentes, permiteestabelecer diferentes métodos para o seu tratamento,de que indicamos alguns dos mais conhecidos,agrupados em dois grandes conjuntos.

Metodologia Qualitativa

Recorre-se à avaliação qualitativa para identificar“causas primeiras” dos riscos e para adoptar as melho-res medidas de mitigação na base do custo-eficácia.Precisa sempre da opinião de peritos familiarizados comos processos, cenários e situações em estudo, pois são--lhe necessários mais conhecimentos práticos do quegrandes e profundas teorias. Habitualmente, esta me-todologia segue uma aproximação baseada em cená-rios, que procura identificar as vulnerabilidades e osimpactes associados à manifestação dos riscos.

Os métodos qualitativos usam-se, sobretudo,quando escasseiam dados estatísticos sobre osacidentes, como no caso de acontecimentossingulares, sempre diferentes entre si e de ocorrênciapara ocorrência. No entanto, uma análise qualitativabem conduzida, apoiada na experiência dosespecialistas, pode valer mais do que uma análisequantitativa baseada em dados escassos ou muitoincertos. O cerne da metodologia qualitativa residena avaliação de cada aspecto que afecte o risco,seguindo por raciocínios sistemáticos apoiados nacompetência dos peritos e na experiência adquiridacom ocorrências anteriores.

De entre os diferentes métodos qualitativos,mencionamos alguns dos mais conhecidos:

Matriz de riscos

A ferramenta por excelência da metodologiaqualitativa é a, bem conhecida, Matriz de Riscos(QUADRO I), com as suas tabelas associadas deProbabilidade de Ocorrência (frequente, ocasional,

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remoto, improvável e quase impossível) e deSeveridade dos Danos (catastrófico, elevado,moderado, reduzido, insignificante).

Na matriz, cruzam-se as probabilidades/frequências com as severidades/magnitudes dosriscos e os resultados da análise são comparadoscom critérios de aceitabilidade dos riscos e expressoscomo combinações de probabilidades de ocorrência(em linhas) e das suas consequências (em colunas).Uma sugestiva coloração das células da matriz podechamar melhor a atenção para a gradação dosriscos, desde o inaceitável (áreas vermelhas), aoaceitável (células amarelas) e, até, ao insignificante(rectângulos verdes). {http://www.bellsoftware.net/articles%5CRisk Matrix Apr 05.pdf}

OPERA- Optimal Progressive Error RecoveryAlgorithm

O algoritmo progressivo optimizado pararecuperação de erros tem como objectivo aidentificação de todos os tipos de eventos nãodesejáveis, relativos a uma dada realização, atravésdas suas fases operacionais, para reduzir o risco aum nível aceitável, via acções de mitigação. O métodotem sido essencialmente usado na resolução de redesneurais, por exemplo em telecomunicações {http://www.egr.msu.edu/waves/people/Saad_files/SECON%20Draft.pdf} e estão a aparecer agora assuas variantes para aplicação a sistemas complexos,como são as catástrofes naturais.

FMEA -Failure Mode Effect Analysis

A análise de efeito do modo de falha foidesenvolvida nos anos cinquenta, do século passado,para determinar problemas com origem em mausfuncionamentos de sistemas militares. Cada potencial

modo de falha é analisado para determinar o seuefeito e para o classificar de acordo com a suaseveridade {http://en.wikipedia.org/wiki/Failure_mode_and_effects_analysis}.

FMECA - Failure Mode and Effects CriticalityAnalysis

A análise de efeito crítico do modo de falha surgequando a FMEA, descrita no item anteior, écomplementada com uma análise de criticismo.

A inclusão da análise de criticismo permite construirgráficos que relacionam a probabilidade dos modosde falha com a severidade das suas consequências.

Podem, assim, identificar-se os modos de falha commaiores probabilidades de ocorrência e as intensidadesdas consequências, dirigindo os recursos para assituações onde sejam mais eficazes (custo-benefício){http://www.weibull.com/basics/fmea.htm}.

Metodologia Quantitativa

A metodologia quantitativa começou por ser usadana engenharia de fiabilidade e nas disciplinas com elarelacionadas. Relativamente às catástrofes naturais, afalta de dados relativos à generalidade dos eventospassados é um factor limitativo do seu uso, em virtudeda existência de dados históricos ser um pré-requisitodos métodos quantitativos, uma vez que, com dadosde partida, a análise quantitativa é meritória, mas, semdados, é desprovida de qualquer sentido (MUNTEANU,2007). Quando é possível construir modelos realistase os dados de entrada estão suficientementequantificados, a metodologia proporciona uma boavisão de problemas marcados pela incerteza, como éo caso dos riscos naturais e antrópicos.

Na literatura sobre riscos públicos, não sãodescritos métodos quantitativos detalhados quesuscitem muita confiança. A maior parte das obrasaborda, apenas, a estrutura geral da gestão de riscos,não descrevendo métodos quantitativos concretos,nem apresentando quaisquer fórmulas “mágicas”.Deste modo, em protecção civil, não se vê para brevea substituição total dos métodos qualitativos pelosmétodos quantitativos. É necessária mais investigaçãoe, sobretudo, mais algum tempo de amadurecimento,para termos planos de emergência com valores dosimpactes razoavelmente quantificados. Mas éinquestionável que, desde os começos deste século,a tendência já está na direcção dos métodosquantitativos (SANSFORD, 2005).

São cada vez mais necessárias unidades finais demedida que proporcionem comparações legítimas e queestabeleçam a indispensável base de rigor que tornemais difícil aos poderes instituídos manipularem,

QUADRO I – Matriz de riscos.

Risco Inaceitável: 5A, 5B, 5C, 4A, 4B e 3A (necessárias medidasde gestão);Risco Inaceitável: 5D, 5E, 4C, 3B, 3C, 2A e 2B (necessáriasmedidas de mitigação);Risco Aceitável: 4D, 4E, 3D, 2C, 1A e 1B (necessárias medidasde adequação);Risco Aceitável: 3E, 2D, 2E, 1C, 1D e 1E (sem restrições).

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interpretarem e fazerem da protecção civil um “assunto”político, na procura de votos. Os desastres ou catástrofesnão podem, de modo algum, ser palco de interesses –só podem ser terreno de acção de profissionais eamadores, de funcionários e voluntários, de homens emulheres fardados e de outros sem uniforme, mas usandotodos o emblema do altruísmo, que, desde sempre, foi apedra de toque da Protecção Civil.

Com teoria, muita prática e recurso extensivo aexemplos concretos, os teóricos do sistema e osanalistas de risco têm por missão convencer-nos dasvantagens da modelação quantitativa do risco. Orecurso às ferramentas informáticas pode facilitar-nosimensamente o trabalho. Contam-se já por dezenas,os pacotes de software aplicacional dedicados aosmétodos quantitativos da análise.

De entre os muitos métodos quantitativos, referimosalguns dos que podem ter maior aplicabilidade emProtecção Civil:

Métodos de Engenharia de Fiabilidade

De entre os que se podem agrupar neste conjunto,indicamos os seguintes:

RA - Reliability Allocation

A atribuição de fiabilidade é um processo “decima para baixo” que, mais abaixo, subdivide osrequisitos de fiabilidade dos sistemas em requisitos anível de subsistemas e componentes.

É realizada para traduzir o requisito geral defiabilidade em requisitos de nível inferior, mais fáceisde trabalhar {http://www.cs.colostate.edu/~cs530/rh/section6.pdf}.

RP - Reliability Prediction

A predição de fiabilidade é o processoquantitativo de estimar a fiabilidade de um sistema,realizando-se ao nível mais baixo para o qual sedisponha de dados.

As fiabilidades dos subníveis são depoiscombinados para chegar às predições ao nível global.

A aplicação da técnica RP, durante os estudos, éusada como uma marca de nível (benchmark) paraposteriores avaliações de fiabilidade, fornecendouma base racional para a tomada de decisão (http://www.epsma.org/pdf/MTBF%20Report_24%20June%202005.pdf).

Métodos de Engenharia Industrial

Do mesmo modo, de entre os deste grupo,indicamos dois tipos de análise:

Análise de Tendência

A tendência é uma caracterização estatística dedados, que usa técnicas gráfico-descritivas, apoiadasnos conhecidos diagramas de controlo.

A ferramenta de análise mais simples e mais eficazé o diagrama de Pareto, que compreende várias fasesna sua elaboração: extracção da informação relativaao problema da base de dados; normalização dascontagens grosseiras para taxas de ocorrênciabaseadas em parâmetros primários; lançamento dosdados normalizados para estabelecer diagramas defrequência; ajustamento da curva de tendência nospontos de frequência; análise da curva para procurarcomportamentos {http://www.magmutual.com/mmic/articles/QP-ParetoDiagram-IHI.pdf}.

Análise Estrutural Probabilista

É uma ferramenta usada para caracterizar proba-bilisticamente os projectos e analisar a sua fiabilidade,recorrendo aos modelos de falha da engenharia.

Avalia a fiabilidade esperada de umcomponente, a partir da sua capacidade estruturale das características do seu ambiente de trabalho.

Usa-se quando não há dados históricosdisponíveis e a situação se caracteriza porinfluências complexas ou, então, quando é muito“sensível” a cargas, a propriedades dos materiais ea caracterizações ambientais.

Permite compreender as incertezas e as áreas derisco elevado, para, depois, se poderem realizar asanálises de sensibilidade e os estudos de optimizaçãonecessários {http://en.wikipedia.org/wiki/Structural_analysis}.

Outros métodos

A Análise Estrutural Probabilista antes descritaremete-nos para outro tipo de agrupamentometodológico, que também é usado nacaracterização da exposição ao risco e que,rotineiramente, se subdivide em determinista eprobabilista, embora possa incluir outras formas,designadamente as que se indicam a continuação.

Metodologia Determinista

Nas análises deterministas, objecto destesubcapítulo, aplicam-se valores singulares, ou pontosde estima, como parâmetros de entrada dos modelosdescritivos dos riscos. Como os pontos sãoseleccionados para maximizar a exposição ao risco,a análise determinista é vulgarmente encarada comouma avaliação dos “casos piores’’.

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Pelo contrário, na análise probabilista, tambémchamada estocástica e tratada adiante, sãoconsideradas distribuições de probabilidade dosparâmetros de exposição, em que as estimativasde risco são expressas como funções de densidadede probabilidade.

Na avaliação “real” de risco, utiliza-se de início aanálise determinista, para caracterizar o máximoplausível, isto é, o “pior caso’’. A seguir, porcomparação com os dados existentes, conclui-se,normalmente, que a análise deve prosseguir pormétodos probabilísticos. É, este, o modo de assegurarque as incertezas, associadas com a avaliação,conduzam a uma caracterização conservadora dorisco, no bom sentido da palavra.

A análise determinista, apresentada a seguir, tema seu favor os seguintes argumentos: assume “porcima”, o que lhe permite assegurar a melhorprotecção; é realizada mais rapidamente do que aanálise probabilista; é de fácil compreensão ecomunicação; tem por base equações padronizadase exposições-tipo; é consistente com os dadoshistóricos dos riscos {http://www.ieee802.org/3/ba/public/jan09/li_01_0109.pdf}.

Análise Determinista

Em termos matemáticos, um sistema deterministapressupõe que não está envolvida aleatoriedadealguma no desenvolvimento e evolução futura dosistema, ou seja, os modelos deterministas produzemsempre os mesmos outputs para as mesmascondições de partida. (WIKIPEDIA, “DeterministicSystems [mathematics]”).

Considerando a doutrina filosófica dodeterminismo, vamos encontrar a mesma explicaçãopara o modelo conceptual de um sistemadeterminístico, ainda que usando outras palavras:tudo o que ocorre ou pode ocorrer no sistema ébaseado nas consequências físicas da causalidade.

Deste modo, nos métodos determinísticos deanálise, cada acção ou causa, deve produzir umareacção ou efeito, e, por sua vez, cada reacção torna--se causa de reacções subsequentes. A totalidadedesta cascata de eventos pode, em princípio, mostrarexactamente como o sistema se deverá comportarem cada momento.

É, assim, evidente que, nos modelos deterministas,os parâmetros de entrada têm de ser constantes, paraque, em cada instante, o sistema tenha um único futurofisicamente possível. As saídas do modelo sãodeterminadas com toda a precisão, através derelações conhecidas entre estados e eventos, semhaver lugar a quaisquer hipóteses eivadas devariações aleatórias. Em tais modelos, um dado input

produz sempre o mesmo output, trate-se de umareacção química, do ruir de uma ponte ou do iníciode um incêndio.

Em oposição, os modelos estocásticos, ouprobabilistas, usam gamas de valores como variáveisde entrada, na forma de distribuições de probabilidadee, as saídas, obviamente, só podem apresentar-setambém como probabilidades de acontecimento.

Os métodos determinísticos, para um mesmoconjunto de parâmetros de entrada, apresentam umúnico ou um conjunto de resultados, enquanto que,nos métodos probabilísticos, os resultados de saídavariam, mesmo que os parâmetros de entrada sejamos mesmos.

Em apoio dos métodos determinísticos há técnicasmatemáticas, tais como os modelos Box-Jenkins,baseadas no conceito de que o comportamento futuropode ser previsto com precisão a partir docomportamento passado de conjuntos de dadosexistentes (WIKIPEDIA, “Box-Jenkins”). O grandeproblema resulta de que as amostras de dados têmde ser significativas, o que não acontece, na maiorparte das vezes, quando se trata de desastres,naturais ou antrópicos. Assim, a essência destesmétodos é ignorar a existência de perturbações ou“choques” externos, que possam alterar o padrãofuturo dos dados históricos.

Estas técnicas também recorrem a equações oualgoritmos que foram previamente desenvolvidos parasituações similares ou idênticas, as quais nãoenvolvem quaisquer aproximações estocásticas ouestatísticas. De facto, os métodos determinísticos são,de um modo geral, simples e rápidos na sua aplicaçãoe, por eles próprios, facilmente conduzem aaplicações informáticas dedicadas. Contudo, comose depreende, eles não podem fornecer os modelosdetalhados e precisos que, na maior parte das vezes,o bom planeamento de emergência requer.

Os modelos matemáticos deterministas darealidade são, de longe, o mais importante tipo derepresentação do mundo real. Essencialmente,qualquer coisa do mundo físico, natural, tecnológicoou envolvendo qualquer tipo de intervenção humana,pode ser sujeita a análise usando estes modelos,bastando, para isso, ser passível de descrição emtermos de fórmulas ou expressões matemáticas. Então,a análise de risco, recorrendo aos referidos métodos,pode ser usada para modelar os processos, naturaise antrópicos, avaliando, assim, os riscos eidentificando os perigos, em ordem a prevenir, mitigare, subsequentemente, reabilitar os cenários dasocorrências inesperadas, sempre devastadoras emtermos de perdas de vidas humanas, infra-estruturasvitais e bens materiais.

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Metodologia Probabilista

A avaliação de risco, através da metodologiaprobabilista, só emergiu, como uma ferramentapopular de análise de risco, na última década doséculo passado (STAMATELATOS, 2004). Neste caso, orisco é caracterizado por dois elementos quantitativos:a intensidade das consequências (severidade oumagnitude) e a probabilidade (baseada nafrequência) de ocorrência. Desde logo, notou-se queesta metodologia continha os ingredientes necessáriosque lhe permitiriam ser também aplicada aosdesastres naturais, o que efectivamente está a ser feitodesde há 10 a 15 anos atrás.

A base da metodologia probabilista é, natural-mente, a teoria das probabilidades, que se desen-volveu em duas escolas diferentes: a frequentista e abayesiana. A primeira, expressa a probabilidade pelafrequência da ocorrência dos fenómenos. É, normal-mente, utilizada para caracterizar situações repre-sentadas por uma única variável. A segunda procurair mais além, ao aceitar a interpretação subjectivadas probabilidades e ao considerar que as estimati-vas podem ser revistas, periodicamente (WIKIPEDIA, “In-terferência frequentista” e “Interferência bayesiana”).

Se a interpretação frequentista caracterizafenómenos passados, sobre os quais existem dadoshistóricos, a interpretação bayesiana ambicionaquantificar o futuro, melhorando cada vez mais asestimativas. Neste contexto, as distribuições deprobabilidade são a base para a análise probabilista,designadamente através das funções de probabilidadede BERNOULLI, bem como as binomial e geométrica e,também, as distribuições de POISSON (WIKIPEDIA,“Distribuição de Bernoulli”, “Distribuição binominalnegativa”, “Distribuição geométrica” e “Distribuiçãode Poisson”).

A opinião dos peritos também é de crucialimportância na construção dos modelos matemáticosde previsão de riscos. O processo de modelaçãoinicia-se com a selecção do evento a estudar e dosespecialistas a consultar, devendo estes salientar osníveis de indícios e as razões de probabilidade quelhes atribuem. A probabilidade do evento é, então,calculada a partir dessas razões, pela fórmula deBAYES (WIKIPEDIA, “Bayes’ theorem”). O modelo criado,necessita de ser validado pela comparação dasprevisões com a opinião dos peritos.

As metodologias probabilistas têm de serencaradas como inclusivas de todos os eventosdeterministas, com uma probabilidade finita deocorrência (MCGUIRE, 2006). Contudo, o sucesso dosmodelos da probabilidade não está noconhecimento das regras e teoremas probabilistas,mas sim no conhecimento das causas e efeitos dos

eventos e na capacidade de usar os modelos paracomprovar esse conhecimento.

A favor da análise probabilista costuma salientar--se que: permite informação quantitativa sobre avariabilidade e a incerteza; dá, em escala, asestimativas do risco; identifica os “drivers” do risco,por análise de sensibilidade; fornece melhorinformação do que os métodos deterministas; podeidentificar quebras de fiabilidade dos dados; fornecelimites de confiança para as estimativas do risco.

De entre os métodos probabilistas, indicamos osdois seguintes, por serem dos mais conhecidos:

PRA - Probabilistic Risk Assessment

A avaliação probabilista de risco é, neste caso,um processo que segue uma aproximação quantitativana determinação do risco de eventos indesejáveis edas incertezas das causas associadas.

As principais ferramentas usadas nos PRA’s são:árvores de falha, diagramas de sequência, árvores deacontecimentos e diagramas de blocos de fiabilidade.

Um processo típico de PRA envolve: identificaçãodos estados finais, a serem avaliados; identificaçãodos estados iniciais que conduzem a esses estadosfinais; desenvolvimento dos diagramas evento-sequência para os eventos iniciadores; quantificaçãodos diagramas evento-sequência (árvore de eventos);agregação dos riscos para cada processo e estado;análise de risco, que deve incluir a classificação dorisco, a redução do risco e a análise de sensibilidade{http://www.hq.nasa.gov/office/codeq/doctree/praguide.pdf}.

Simulação de Monte-Carlo

A simulação de computador tem a ver com autilização de modelos, quer para estudar a vida realquer para fazer previsões. Quando se cria um modelo,tem-se um certo número de parâmetros de entrada ealgumas equações que usam esses dados parafornecer um conjunto de saídas (variáveis de resposta).

Este tipo de modelo é, geralmente, determinista, oque significa que se obtêm os mesmos resultados,não importando quantas vezes se repetem os cálculos.

A simulação de Monte-Carlo consiste, pois, nummétodo iterativo de avaliação de modelosdeterministas, com recurso a conjuntos de númerosaleatórios como entradas. Usa-se, sobretudo, quandoo modelo é complexo, não-linear, ou envolve muitosdados de entrada. Uma simulação deste tipo pode,tipicamente, fazer 10 000 avaliações do modelo, umatarefa que no passado era apenas possível usandosuper-computadores {http://kochanski.org/gpk/teaching/0401Oxford/MonteCarlo.pdf}.

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Metodologia Possibilista

A teoria das probabilidades tem sido umaexcelente ferramenta para a abordagem à incertezae à quantificação dos riscos. Entretanto, nas últimasdécadas, começaram a desenvolver-se teoriasalternativas, nomeadamente a teoria dos conjuntosvagos e a teoria das possibilidades, ambas baseadasna lógica de FUZZY.

A lógica difusa, ou lógica de FUZZY, tambémconhecida como “lógica nebulosa”, recorre aosconjuntos propostos pelo matemático FUZZY. Trata-sede uma extensão da Lógica de BOOLE, admitindoinfinitos valores intermédios entre FALSO (0) eVERDADEIRO (1), e abrangendo ainda o valor médioTALVEZ (0,5). Esta lógica engloba, de certa forma,conceitos estatísticos e deve ser vista mais como umaárea de pesquisa, ou uma família de modelosmatemáticos dedicados ao tratamento da incerteza,do que como uma verdadeira lógica.

Desde os passados anos setenta que a lógica deFUZZY é aplicada aos problemas de análise de risco,com as seguintes vantagens: pode representarvariáveis incertas ou vagas; modela os problemas,quando as teorias clássicas são de difícil aplicação;pode representar os conhecimentos dos especialistaspelas chamadas variáveis linguísticas; temadaptabilidade e flexibilidade na assimilação denovos conhecimentos; e, muito importante, modela aforma de pensar do ser humano {http://www.aifb.uni-karlsruhe.de/WBS/gqi/papers/qpj07b.pdf}.

De entre os métodos possibilistas, indicamos ostrês seguintes:

Inferência MAMDANI

Proposto por Ebrahim MAMDANI, no ano 1975, é otipo de inferência mais conhecida na lógica FUZZY.Este método foi o primeiro a ser aplicado ao controlode sistemas, recorrendo à teoria FUZZY {http://www.mathworks.com/access/helpdesk/help/toolbox/fuzzy/index.html?/access/helpdesk/help/toolbox/fuzzy/fp351dup8.html}.

Inferência monotónica

Na inferência monotónica, a obtenção do resultadofinal é conseguida directamente da função de pertinênciado conjunto FUZZY antecedente (idem, o c.).

Método de KARWOSKI e MITAL

Este método propõe-se avaliar o risco com basena possibilidade de ocorrer um acontecimento (L), ainfluenciar o aparecimento do evento (E), que provoca

determinadas consequências (C). Concretamente, osautores do método consideram que L, E e C podemser avaliados por valores linguísticos, em vez dostradicionais valores numéricos {http://www2.dbd.puc-r i o . b r / p e r g a m u m / t e s e s a b e r t a s /9925055_03_pretextual.pdf}.

Metodologia dos Sistemas Dinâmicos

O conceito de sistema dinâmico nasce daexigência de se construir um modelo geral de todosos sistemas que evoluem segundo uma regra, a qualliga o estado presente aos estados passados(WIKIPEDIA, “Sistemas dinâmicos”).

Método do Grafo de Falhas

Recorre à teoria dos grafos e à sua linguagem denós e caminhos, usando portas AND e OR em vez deoperadores dependentes e independentes. A matrizde conectividade, derivada da matriz de adjacênciado sistema, mostra se um nó de falha pode levar a umevento de primeira linha. As matrizes são depoisanalisadas por computador para fornecer singletons(componentes singulares que podem causar a falhade sistema) ou doubletons (pares de componentesque podem causar a falha de sistema){http://pachome1.pacific.net.sg/~thk/risk.html - 3.2}.

Modelos de MARKOV

É a técnica clássica de modelação usada paraavaliar o comportamento, dependente do tempo dossistemas dinâmicos.

Nas cadeias de MARKOV as transições entre estadosassumem-se como ocorrendo apenas em instantesdiscretos sendo, no entanto, permitido que as transiçõespossam ocorrer em quaisquer instantes. Para processoscomplexos, os estados discretos podem ser definidostanto em termos de bandas das variáveis do processocomo em termos de estado de componentes. O métodotambém incorpora o tempo explicitamente e pode seralargado a situações onde os parâmetros do problemasão independentes do tempo.

Os estados de probabilidade do sistema P(t) naanálise de MARKOV contínua são obtidos pela soluçãode um conjunto de equações diferenciais de primeiraordem, dP/dt = M.P(t), onde M é uma matriz decoeficientes cujos elementos não-diagonais constituema taxa de transição e cujos elementos diagonaisconstituem colunas da matriz de soma zero {http://en.wikipedia.org/wiki/Markov_chain}.

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Aplicações da análise e gestão de risco

São inúmeras as áreas de actividade onde existe“risco”. Logo, são inúmeras as áreas de aplicaçãoda análise e gestão de risco, desde as que forampioneiras (Seguros, Financeira) até aquelas onde, nosdias de hoje, a análise está com maiordesenvolvimento (Gestão de Activos, Protecção Civil,…), designadamente e entre outras, as seguintes:

~ Economia; Seguros; Banca (crédito) e Finanças(engenharia financeira);

~ Indústria (petrolífera, química, nuclear, mineira);~ Gestão de Projectos e Gestão de Activos;~ Engenharia (fiabilidade e segurança; civil,

ambiente, biológica, etc.);~ Segurança (informação, terrorismo, investimentos,

informática, etc.);~ Empresas (segurança, contingência)~ Saúde Pública; Ecologia; Poluição; Mudanças

climáticas;~ Análise de sistemas (clássicos, dinâmicos,

complexos);~ Desastres/Catástrofes Naturais e Antrópicas

(Tecnológicas, Sociais e Biofísicas);~ Planeamento de Emergência;~ Protecção Civil (prevenção, socorro e

reabilitação).Deste modo, presentemente, a análise e gestão

de risco, tem aplicação em vários campos deactuação na esfera da Protecção Civil, que podemosestruturar em torno dos seus três grandes pilares desustentação ou eixos de orientação: prevenção,socorro e reabilitação.

A Prevenção e a Gestão do Risco

Relativamente à prevenção, existem diferenças naesfera das obrigações, organização e métodos detrabalho, quanto ao modo como os vários serviçosde protecção civil cumprem as suas tarefas deprevenção. Há uma divisão clara entre aqueles paraquem as medidas de prevenção significam apenas asacções limitadas de contenção dos efeitos negativosdos desastres e aqueles que consideram acçõesespecíficas para eliminar realmente as causas.

No nosso país sobressaem, apenas, as políticasdestinadas a limitar os efeitos negativos dos desastres,e, mesmo estas, ainda não estão numa fase avançadanem são substancialmente homogéneas. Tambémexistem muitos problemas, alguns de fundo, queimpedem que a prevenção seja mais eficaz.

Por exemplo, a Protecção Civil tem apenas funçõesconsultivas relativamente a outros ministérios comresponsabilidades no território (agricultura,indústria,…), limitando-se a assinalar as condições

de risco, sem poder intervir. As acções consideradascomo prioritárias nas análises da protecção civil nãoestão escoradas numa organização com poderinstitucional para, eventualmente, as levar a cabo eos autores “externos” das análises de risco não têmmeios, nem autoridade, para dar o passo seguinte,que é o da elaboração dos planos de acção.

Se aqueles que promovem as análises e gestão derisco não têm competência para eliminar as causas ese aqueles que têm competência não dispõem dos meiosnecessários, as cartas de risco pouca utilidade têm.Ficam reduzidas à condição de instrumentos menoresque só servem para “apurar responsabilidades” depoisdos desastres.

Aparentemente, é muito mais simples contactargrandes empresas e comprar equipamento, tal comopoderosas bombas de esgoto de águas para asinundações, do que realizar reuniões com osdecisores que têm a responsabilidade de autorizarema construção em áreas onde as inundações são umrisco efectivo.

Do mesmo modo, a decisão de comprar umCanadair para o combate aos incêndios florestaisapenas depende de considerações financeiras,enquanto a organização de equipas de sapadoresflorestais já apela a procedimentos complexos eenvolve diversos tipos de “interesses”, desde os dasassociações que os enquadram até aos de algumasdúzias de desempregados que, nem sempre, estãodisponíveis para abdicar dum subsídio dedesemprego em troca de um trabalho poucoconsentâneo com os modelos “valorizados” nos meiosde comunicação social.

Todos sabemos que não é possível evitar muitosdos riscos e que a melhor forma de minimizar os seusefeitos, em caso de manifestação, será preveni-losatravés de uma adequada gestão do risco em concreto.

Contudo, a prevenção, porque os seus efeitos sãopoliticamente pouco visíveis, tem sido um pilar desustentação fraco e um eixo de orientação pobre, nosistema de protecção civil. E, mesmo quando,aparentemente, não o foi, nessas circunstâncias elatem servido, muitas vezes, para equipar “forças” que,embora possam contribuir para a prevenção,preferencialmente se dedicam a outras actividades.

O sucesso das operações de protecção civilassentam numa prevenção eficaz. Se ela não existir,o edifício estará desequilibrado e, por conseguinte,não poderá proteger os cidadãos da formaconsiderada como a mais adequada.

Planos de Emergência

O planeamento de emergência consiste, por umlado, na criação e implementação dos diversos planos

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de acção, gerais e específicos, e, por outra parte, noestabelecimento das bases dos planos detalhados edo seu acompanhamento, supervisão e treino.

É uma área que, em geral, lida com os riscos públicos,tendo em vista evitá-los ou diminuir os seus impactes(KEMPTHORNE, 2006) e que reconhece que a “preparação”dos desastres é feita antes de eles ocorrerem.

Deste modo, as respostas devem estar preparadas,prontas, antes da ocorrência dos acidentes, pois, aténum verdadeiro paraíso terrestre, a comunidaderesidente enfrenta riscos reais (fig. 5) e tem de seorganizar e trabalhar para minimizar esses riscos, namedida em que a comunidade não pode “confiar”,apenas, no auxílio que possa vir de do exterior (fig. 6).

Sistemas de Aviso e Comunicação

Na sociedade da informação, estes sistemas têma ver tanto com o planeamento da disseminação dainformação e com o estabelecimento das normasgerais e de procedimentos para a educação dopúblico em protecção civil, como com a comunicaçãodas emergências em curso, dos procedimentosoperacionais e dos avisos e alertas de protecção adifundir à população.

Para que possam funcionar em plenitude, no casode manifestações de riscos, estes sistemas têm de estardevidamente planeados e testados, nomeadamenteatravés da realização de simulacros, de acordo com oestipulado nos planos de emergência, em que se avaliamas respostas e a eventual necessidade de introduzirmelhorias no funcionamento dos diversos sistemas.

Programas e Documentação

Dizem respeito aos programas e planos deformação e treino para os agentes de protecção civil,fazendo o relacionamento com as universidades,institutos e consultores privados, e mantendo oscentros de documentação vivos e actualizados.

Por outro lado, têm também a ver com programas,de sensibilização e de educação, destinados àpopulação em geral ou a públicos-alvo específicos,mais vulneráveis a determinados riscos. Estesprogramas não se esgotam em acções pontuais, porvezes de grande mediatismo mas de pouca eficácia.São também necessários programas que assegurem acontinuidade das acções e a transmissão dos saberesao longo do tempo, para que a doutrina produzida etransmitida possa dar origem a uma verdadeira culturade prevenção. Serão, porventura, menos mediáticosdo que os anteriores, mas permitem obter retorno aoinvestimento neles feito, ao contrário do que sucedecom muitas das acções pontualmente realizadas.

Trata-se de áreas fundamentais, mas que nemsempre têm merecido a devida atenção, razão porque,por vezes, a resposta nem sempre é tão eficaz quantoo poderia ter sido se, anteriormente, tivesse sido dadamais atenção a estes aspectos, do mesmo modo quemuitos efeitos poderiam ser bem mais mitigados se,antes, tivesse havido investimento sério e continuadonestes programas.

O Socorro e a Gestão de Emergências, comoresposta às Crises

A gestão de emergências é um processo contínuopelo qual cada indivíduo, grupo ou comunidadeenfrenta os riscos num esforço comum para evitar ouminimizar os seus impactes. As acções a tomar

Fig. 5 – Até no paraíso há risco!(Fonte: http://www.alp-s.at/cms/pics/P1000273kl_03.jpg).

Fig. 6 – Os cidadãos e a Protecção Civil(Fonte: http://www.azores.gov.pt/.../302363/protecaocivil.jpg

Fotografia obtida durante a realização de um exercício deProtecção Civil. Ponta Delgada, Janeiro de 2009).

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dependem, em parte, da percepção do risco por partedaqueles que a ele estão expostos. Uma boa gestãode emergências faz a integração completa, a todosos níveis, dos planos de emergência, que foramelaborados com vista à mitigação dos efeitos em casode manifestação do risco, e envolve os sectorespúblico e privado.

A gestão das emergências realiza-se, assim, emquatro fases principais, algumas delas mais ou menossobrepostas em função da crise em concreto, quedizem respeito à Preparação, Resposta, Reabilitaçãoe Mitigação. Enquanto que as duas primeiras estãodirectamente relacionadas com a resposta, em termosde socorro, sobretudo de pessoas, as duas últimasdizem respeito à resposta, em termos de recuperação,sobretudo de bens, para devolver a normalidade defuncionamento à área afectada. Por esse motivo, agestão da emergência aparece distribuída por doissubcapítulos, correspondentes, respectivamente, aossegundo e terceiro pilares de sustentação ou eixosorientadores da missão de Protecção Civil: o Socorroe a Reabilitação.

Preparação

Corresponde ao estado que antecede asocorrências, onde se decide como responder aosacidentes catastróficos ou conjuntos decircunstâncias desastrosas, através do planeamentodo comando, controlo e repartição de tarefas entreparceiros e da adopção de medidas concretas deprontidão, incluindo:

~Planos de comunicação;~Treino dos planos, serviços e equipas de

intervenção;~Estabelecimento de métodos de aviso e alerta;~Estabelecimento de abrigos de emergência e

planos de evacuação;~Gestão do armazenamento e abastecimentos

necessários;~Organização e treino dos voluntários;~Previsão de vítimas – um aspecto importante,

pois pode fornecer aos responsáveis uma ideiados recursos a colocar no terreno.

Digamos que é uma fase de transição entre aprevenção, a qual, como vimos, visa essencialmentea gestão do risco, para, se possível, evitar a suaocorrência ou, não sendo possível, para mitigar osseus efeitos em caso de manifestação, e o socorropropriamente dito, enquanto resposta adequada àssituações de emergência.

Embora decorra no período anterior à crise, asoperações não são propriamente de prevenção, umavez que dizem essencialmente respeito aoestabelecimento de procedimentos e ao treino dos

agentes a envolver directamente nas operações desocorro relativas aos diferentes tipos de risco.

Como é óbvio, a eficácia e a qualidade daresposta depende muito do empenho posto nesta fasede preparação.

Resposta

A resposta é a intervenção que se segue àmanifestação do risco, através da respectivaocorrência, passando a executar-se segundo osplanos de acção estabelecidos. Pode envolver algumaimprovisação, devido a falhas nos planos, sempreinevitáveis, dada a natureza singular da maior partedos desastres.

A resposta às emergências envolve todo um corpoprévio de conhecimentos e de acção, tanto deprofissionais e amadores, como de voluntários, queparticipam na concepção, desenvolvimento,avaliação, treino e execução dos planos deemergência, a nível local, regional, ou nacional.

Mesmo dispondo do suporte de uma boa análisede riscos, e antes de entrar nela ou de se traçaremquaisquer planos, há sempre um trabalho prévio quenão se dispensa: conhecer a importância daprontidão, as responsabilidades dos sectores públicoe privado, as vantagens da gestão integrada, a teoriados riscos, a legislação em vigor, as orientaçõessuperiores e o histórico dos maiores desastres dopassado (NFPA, 2007).

Embora os processos que geram as diversascatástrofes, naturais e antrópicas, sejam diferentes,as técnicas para avaliar o risco, criar a prontidão eassistir na resposta, têm muito em comum e podempartilhar e beneficiar dos progressos de uma ciênciaem franco progresso, a ciência da informaçãogeográfica. A aquisição de dados e sua integração,a modelação e a análise, a própria operacionalidadee, até, questões de responsabilidade, podem ser maisfacilmente resolvidas por essa via. A utilizaçãogeneralizada do computador na gestão deemergências, tem permitido que a informaçãogeográfica esteja a desempenhar um papel muitoimportante nos processos de tomada de decisão econdução das operações no terreno.

Contudo, é necessário e fundamental garantirqualidade na produção dessa informação, a qualnão se compadece apenas com o domínio dastécnicas ou das diversas ferramentas, mas tem de sersustentada em profundos conhecimentos emanadosdas ciências cindínicas.

Ora, a resposta diz respeito ao conjunto deintervenções de emergência tendentes a que os pioresefeitos dos acidentes sejam, de algum modo,atenuados. Tem a ver, principalmente, com o socorro,

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o qual envolve evacuação de populações, acolhimento,reabilitação e auxílios para a retoma da vida normal epode ser vista como uma combinação de “know-how”científico e técnico, apoiado em métodos apropriadosde ajuda à decisão. Necessita, fortemente, da análisede risco, para poder fazer a necessária ligação entreas diferentes interacções do Homem com a Sociedadee a Natureza.

Um aspecto fundamental da resposta é aprontidão. Assim, no tratamento da prontidão daresposta, é importante pensar e agir em termos desistemas complexos, em consideração com oambiente, natural e social, envolvente.

Com efeito, o ambiente é confinado com diferentesconjuntos de constrangimentos, que formam oscenários, e é afectado pelo sistema, cujos atributospodem mudar. Os riscos existem e manifestam-seatravés dos desastres, que acontecem quando não épossível controlar as relações dentro do sistema equando não se conhecem os impactes das alteraçõesdo ambiente. Há, sem dúvida, muitas maneiras dereconstruir o mundo após os desastres, mas, sequeremos fazer mais e melhor, temos que conhecer eagir antes (BIERI, 2009).

A experiência da protecção civil tem mostradoque, para implementar um sistema integrado capazde fazer face aos desastres, é necessário construirtambém uma estrutura institucional complementarbaseada em acordos e relações activas entre aspartes envolvidas, o sector público e o sector privado(MAINETTI, 2008).

Deste modo, devem existir directivas, para que oplaneamento de emergência considere todos oseventuais parceiros, públicos ou privados, e de modoa que todas as regiões e municípios não só disponhamde uma metodologia comum para a elaboração dosplanos, mas também tenham estruturas operativasidênticas e modelos partilhados de intervenção.

Assim sendo, as acções de prevenção, socorro ereabilitação podem ficar todas dentro de uma doutrinageral, saindo do “específico” de cada caso, de moldea conseguir que as filosofias seguidas a nível local,regional e nacional, sejam essencialmente as mesmas.

A protecção civil terá dificuldade em obter umbom desempenho, se não começar por estar bemorganizada ao nível local. A razão é simples, pois,quando ocorrem as emergências, é no nível local queestá o “teatro de operações”.

De facto, dadas as distâncias, bloqueios deestradas, diminuição de recursos e pressão do factortempo, não há substituição credível para a prontidãoe a intervenção localmente organizadas. Por cima,os outros níveis do governo ou da hierarquiaadministrativa, apenas devem harmonizar e coordenar- e não suplantar - os esforços locais.

Quanto ao socorro, trata-se principalmente damobilização dos serviços de emergência e dosprimeiros socorristas para área dos desastres. É a“vaga” inicial de auxílio verdadeiro, com bombeiros,forças de segurança e emergência médica, porventuracom o apoio de outros serviços de emergênciasubsidiários, nomeadamente com equipas de resgate.Havendo planos de emergência bem estruturados, épossível desenvolver um nível adequado decoordenação do socorro, com os esforços de buscae salvamento a começarem suficientemente cedo, demodo a diminuírem o número de vítimas.

Mas, para que se obtenha a desejado efeito, énecessário que aqueles que previnem, socorrem ereabilitam trabalhem não só em conjunto, mas tambémem coordenação e com competência. É algocomplexo, como o demonstra o elevado número dedisciplinas, com relevância na protecção civil, queestão envolvidas nestas matérias, pelo menos 35(PNTD, 2007).

Como é sabido, muitos dos problemas dasintervenções ocorrem entre as organizações ougrupos, porque não trabalham coordenadamente,pelo menos ao nível que as situações requerem, e nãotanto dentro do sistema em si.

De facto, durante a emergência, as prioridadessão conservar e proteger as vidas humanas, salvar eevacuar as pessoas, tornar o ambiente seguro erestabelecer condições aceitáveis de continuação devida, tudo isto tão cedo quanto possível.

Ora, o cumprimento destes objectivos exigeprogramas, planos, protocolos, procedimentos,normas, regulamentos e estruturas legais. Na suaessência, o planeamento não é sobre procedimentos,é sobre coordenação entre os vários actores, paraintervirem de acordo com cenários particulares deacidentes e respostas.

É necessário o desenvolvimento de uma linguagemcomum e de uma cultura da protecção civil, com oenvolvimento dos simples cidadãos nas diferentestarefas, além do seu encorajamento para virem aconhecer os riscos que, talvez um dia, terão de enfrentar.

Comunicação

A comunicação que tem lugar durante asemergências é um aspecto muito importante, que nãopode ser negligenciado. Deve ser entendido mais nosentido de um apoio aos comunicadores de primeiralinha, do que, apenas, no sentido de “porta-voz” ou derelações públicas, pois cada ocorrência requerflexibilidade e ajustamentos enquanto os acontecimentosse desenvolvem.

O Plano de Comunicação, constitui a base paraa disseminação da informação e para as interacções

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com todos os parceiros actuantes, activa oupassivamente (CDC, 2002).

O plano deve prever o apoio de especialistas devárias disciplinas: desastres, análise de risco,processos de decisão, comportamentos ecomunicação social.

A Reabilitação e a Gestão de Emergências, no pós-Crise

A gestão de emergências, sobretudo no períodopós-crise, é um processo que, por um lado, visaminimizar os impactes da crise e, por outra parte,pretende retomar a normalidade, no mais curtoespaço de tempo, dentro da área afectada.

Reabilitação

A reabilitação é, pois, o conjunto de acções que seseguem à resposta imediata (socorro), mormentequando é preciso restabelecer a situação no local dodesastre e ajudar as pessoas a ultrapassar as suasperdas, incluindo as psicológicas.

Deste modo, o objectivo imediato é o de restauraras áreas afectadas e, dentro do possível, levá-las aoseu estado inicial.

Difere da resposta, porque a recuperação tem aver, em primeiro lugar, com acções que levam àreconstrução da propriedade destruída, aorealojamento das pessoas, à sua sobrevivênciaeconómica e à reparação das infra-estruturas vitaispara a continuação da vida e, posteriormente, porqueos temas e as decisões são tomadas depois dasnecessidades serem conhecidas.

Um aspecto interessante da recuperação é quepode tirar vantagem das “janelas de oportunidade”criadas, para a implementação de medidas demitigação que, de outro modo, seriam malrecebidas. As pessoas estão mais propensas aaceitar medidas impopulares, quando o desastreainda está fresco na memória.

Todavia, as áreas da protecção civil, no nosso país,por enquanto, ainda são estruturalmente apenas duas:a Prevenção e o Socorro. A Reabilitação continua aaguardar a sua entrada formal no sistema.

Mitigação

A mitigação corresponde a um conjunto de acçõesgerais que envolvem diversos passos tendentes a diminuiros potenciais impactes ou a assegurar que não voltam aocorrer as mesmas situações. Na essência, traçam-senovos planos ou faz-se a revisão de planos já existentes,com vista a que, se o risco se voltar a manifestar, osseus efeitos possam ser bem menos nefastos.

Deste modo, os esforços de mitigação tentamevitar que os riscos se manifestem plenamente, atravésde catástrofes, ou, então, procuram reduzir os efeitosdos desastres. Orientam-se mais para medidas delongo prazo, tendentes a reduzir ou eliminar o risco.

E aqui coloca-se a grande questão: os custos demitigação dos riscos públicos são “despesas” ou são“investimentos”? Parece óbvio que devem serconsiderados como investimentos e, como tal, nãodevem ser realizados sem os adequados estudos decusto-benefício.

É possível fazer esta mudança de paradigma(fig. 7), só é pena que não seja fácil mostrar a urgênciadessa mudança...

A implementação de estratégias de mitigaçãoconsidera-se uma parte do processo de reabilitação,quando é aplicada depois da ocorrência. As medidasde mitigação são estruturais, quando usam soluçõestécnicas, como diques para suster as inundações, enão-estruturais, se recorrem a legislação, planeamentoda utilização dos solos e, eventualmente, aos seguros.

Quanto maior for o risco, mais necessário se tornaque as vulnerabilidades sejam resolvidas por esforçosde mitigação e prontidão. Como é sabido, se não existirvulnerabilidade, não existe risco, como é o caso de umsismo, numa zona desértica, onde ninguém vive.

Conclusão

Segundo parece, a palavra risco deriva do latim,de risicare, que tinha o significado de arriscar, terousadia. Nesse sentido da palavra, relativamente aorisco público, é necessário ter grandes opções decombate e não considerá-lo simplesmente como umamá sorte. Pode começar-se, desde logo, porconsiderar a protecção civil como uma actividade deinvestimento e não como uma actividade de despesa.A análise de risco, face aos riscos públicos, constitui

Fig. 7 – A mudança de paradigma.

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a Linha Zero de defesa das sociedades, ainda antesda 1.ª Linha da Prevenção, da 2.ª Linha do Socorro eda 3.ª Linha da Reabilitação.

Procurou mostrar-se que a análise e gestão deriscos, já largamente praticada nas empresas, podemter idêntica utilização no tratamento dos riscospúblicos, procurando melhores soluções, comvantagens na vertente custos-benefícios.

Pela utilização sistemática da análise de risco épossível melhorar o nível da Prevenção, do Socorro eda Reabilitação e, no fim de contas, elevar aqualidade da protecção de todos nós.

Procurou mostrar-se, igualmente, que seriaimportante institucionalizar a análise de risco e colocá--la ao lado do Planeamento de Emergência, seguindono mesmo trilho.

Os múltiplos desafios que se colocam à ProtecçãoCivil, com a clara necessidade de lhe inculcar padrõesde economia e eficácia, passam pela necessidadeda alteração substancial do modelo de gestão vigente,introduzindo-lhe características intensivas deplaneamento, em lugar das características intensivasdo equipamento, do passado. A dinâmica dedesenvolvimento do sistema deve ter um sentido maispreventivo do que socorrista e, outrossim, deve abrirmais lugar à reabilitação.

Do exposto, sempre na perspectiva de umaprotecção civil moderna, com antecipação, avaliaçãode riscos, prevenção, prontidão, resposta e reabilitação,pode concluir-se que o Planeamento de Emergência,integrando o melhor do conceito, será tanto melhorquanto mais recorrer à Análise e Gestão de Risco, nasua dimensão total, de avaliação, percepção, gestão ecomunicação de risco. Assim, será mais fácil darseguimento aos seguintes pressupostos:

I. Definir os principais riscos públicos - sismos,inundações, riscos geotécnicos, incêndiosurbanos e florestais, mudanças climáticas eambientais - e vulnerabilidades, com base emíndices de risco, e fazer o mapeamento das zonascom diferentes níveis de risco (uma óptima ajudapara o planeamento das emergências);

II. Desenvolver as regulamentações e osprocedimentos mais adequados (um modo decriar, simultaneamente, uma cultura de“protecção civil”);

III. Continuar com a gestão de risco, depois daavaliação e percepção do risco, evidenciandoque não basta avaliar, mas que também épreciso agir (não é suficiente a cidade disporde uma análise de risco sísmico, não tendo osplanos de acção que materializem a resposta);

IV. Privilegiar as estratégias de prevenção e nuncadeixar de fora as da reabilitação (osproblemas levantados e as soluçõespreconizadas podem levar a prevenção e areabilitação para o nível do socorro);

V. Encontrar a melhor solução para o problemados grandes incêndios florestais, pondo atónica na gestão desses activos, em paralelocom a sensibilização conjunta dos sectorespúblico e privado (pode pensar-se nosSeguros, a fazerem, um dia, parte do Sistema);

VI. Levar à consciencialização de que os principaiscustos em protecção são investimentos e nãodespesas (haverá mais parcimónia na aplicaçãodos recursos e haverá estudos de custo-benefíciopara a sua atribuição);

VII. Permitir uma distribuição racional dos meiosexistentes (no caso dos incêndios florestais, comoexemplo, há assimetria territorial na distribuiçãodos meios face às necessidades reais, mais juntoao mar do que no interior do país);

VIII.Entrar nos “tempos modernos”, que são temposde mais planeamento e de menos equipamento(é possível atingir os mesmos objectivos commenos equipamento e com mais planeamento,mais optimização da utilização dos meios,mais treino e mais preparação do pessoal);

IX. Evidenciar que a Protecção Civil não se esgotano socorro vigoroso, na prevenção débil e nareabilitação inexistente (no pós-desastre énecessário criar, de modo organizado, ascondições para que as pessoas, rapidamente,retomem as suas vidas normais);

X. Criar condições para que o sistema daprotecção civil adquira cultura própria, construaconhecimento científico e disponha de uma boabase teórica (as opiniões espontâneas, avulsas,sem fundamento, não deverão ter os canaisabertos na comunicação do risco);

XI. Propor sempre as soluções mais económicas(o estudo de um problema cuja solução estáem dois helicópteros a voar, não poderáresultar na compra de oito helicópteros paraficarem no heliporto);

XII. Evitar os compartimentos estanques, trazendoos conceitos de integração e equilíbrio paraprimeiro plano (a Protecção Civil é um banco,mas não é as três pernas desse banco,consideradas individualmente, - prevenção,socorro, reabilitação - em que uma daspernas é normal, a outra é curta e a terceiraquase inexistente).

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