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Anais do V Encontro do REA disponível em: www.unifal-mg.edu.br/geres/rea/anais 21 TERRITORIALIZAÇÃO DA MOBILIDADE POPULACIONAL ENTRE OS MUNICÍPIOS DE CARMO DO RIO CLARO-MG E SANTA LUZ-BA 1 Haroldo Junior Martins Cardoso Grupo de Estudos Regionais e Socioespaciais UNIFAL/MG Mestrando em Geografia UFMG. [email protected] Flamarion Dutra Alves Prof. Dr. UNIFAL/MG Líder do Grupo de Estudos Regionais e Socioespaciais [email protected] Resumo Os deslocamentos populacionais no Brasil configuram as dinâmicas dos fluxos de pessoas, que migram em busca de melhores condições de vida e trabalho. O presente trabalho buscou analisar a dinâmica migratória entre os municípios de Santaluz BA e Carmo do Rio Claro MG, destacando a direção dos fluxos migratórios para o distrito de Vilelândia. A pesquisa teve como objetivo o levantamento de informações sobre a migração entre os dois municípios, ressaltando alguns aspectos específicos, tanto na escala regional quanto na escala local. A análise tem como fundamento o levantamento de dados históricos a nível macro, que caracterizam os aspectos regionais dos dois municípios, permitindo a comparação das duas estruturas e a formação de centros de atração e repulsão de mão de obra. No nível micro, que busca informações junto aos migrantes e a população local, utilizando questionário com questões pré-estabelecidas sobre as alterações na dinâmica das relações socioespaciais. As proposições teóricas e metodológicas sobre os movimentos migratórios desenvolvidos no seio da Geografia, contribuírem para reforçar as perspectivas dos deslocamentos populacionais. A compreensão das formas de migração e dos processos inseridos nos deslocamentos populacionais, compreendendo a partir da perspectiva dos entrevistados a dinâmica socioespacial, os processos de des-re-territorialização e configuração de uma rede de fluxos, denominada rede social de migração. Palavras-chave: Migração, Desigualdades regionais, Des-re-territorialização. Abstract Population shifts in Brazil configures the dynamic flows of people, who migrate in search of better conditions of life and work. The present study searched to analyze the migration dynamics between the municipalities of Santaluz - BA and Carmo do Rio Claro - MG, highlighting the direction of flows for the district of Vilelândia. The survey was aimed at collecting information on migration between the two municipalities, highlighting particular aspects, both on the regional scale and at the local scale. The analysis is based 1 Este trabalho é resultado do trabalho de conclusão de curso em Geografia Licenciatura pela Universidade Federal de Alfenas.

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TERRITORIALIZAÇÃO DA MOBILIDADE POPULACIONAL ENTRE OS MUNICÍPIOS DE CARMO DO RIO CLARO-MG E

SANTA LUZ-BA1

Haroldo Junior Martins Cardoso Grupo de Estudos Regionais e Socioespaciais – UNIFAL/MG

Mestrando em Geografia UFMG. [email protected]

Flamarion Dutra Alves

Prof. Dr. UNIFAL/MG – Líder do Grupo de Estudos Regionais e Socioespaciais [email protected]

Resumo

Os deslocamentos populacionais no Brasil configuram as dinâmicas dos fluxos de

pessoas, que migram em busca de melhores condições de vida e trabalho. O presente

trabalho buscou analisar a dinâmica migratória entre os municípios de Santaluz – BA e

Carmo do Rio Claro – MG, destacando a direção dos fluxos migratórios para o distrito de

Vilelândia. A pesquisa teve como objetivo o levantamento de informações sobre a

migração entre os dois municípios, ressaltando alguns aspectos específicos, tanto na

escala regional quanto na escala local. A análise tem como fundamento o levantamento

de dados históricos a nível macro, que caracterizam os aspectos regionais dos dois

municípios, permitindo a comparação das duas estruturas e a formação de centros de

atração e repulsão de mão de obra. No nível micro, que busca informações junto aos

migrantes e a população local, utilizando questionário com questões pré-estabelecidas

sobre as alterações na dinâmica das relações socioespaciais. As proposições teóricas e

metodológicas sobre os movimentos migratórios desenvolvidos no seio da Geografia,

contribuírem para reforçar as perspectivas dos deslocamentos populacionais. A

compreensão das formas de migração e dos processos inseridos nos deslocamentos

populacionais, compreendendo a partir da perspectiva dos entrevistados a dinâmica

socioespacial, os processos de des-re-territorialização e configuração de uma rede de

fluxos, denominada rede social de migração.

Palavras-chave: Migração, Desigualdades regionais, Des-re-territorialização.

Abstract

Population shifts in Brazil configures the dynamic flows of people, who migrate in search

of better conditions of life and work. The present study searched to analyze the migration

dynamics between the municipalities of Santaluz - BA and Carmo do Rio Claro - MG,

highlighting the direction of flows for the district of Vilelândia. The survey was aimed at

collecting information on migration between the two municipalities, highlighting

particular aspects, both on the regional scale and at the local scale. The analysis is based

1 Este trabalho é resultado do trabalho de conclusão de curso em Geografia Licenciatura pela Universidade Federal de Alfenas.

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a survey of the historical macro level, featuring regional aspects of the two counties,

allowing the comparison of the two structures and the formation of centers of attraction

and repulsion of labor data. At the micro level, seeking information with migrants and the

local population, using a questionnaire with predetermined questions about the changes

in the dynamics of socio-spatial relations. The theoretical and methodological

propositions on migratory movements developed within the Geography, contribute to

reinforce the prospects of population displacement. Understanding the forms of migration

and the processes inserted in population displacement, including from the perspective of

the respondents socio-spatial dynamics, the processes of de-re-territorialisation and

configuration of a network of flows, called social network migration.

Keywords: Migration, Regional inequalities, Des-re-territorialization

INTRODUÇÃO

O processo de formação do território brasileiro é marcado por deslocamentos

populacionais, ocupando e explorando novos e velhos espaços. A dinâmica dos

deslocamentos ocorre por inúmeros fatores, sobretudo políticos, econômicos e

ideológicos. Estes direcionam a mão de obra disponível, visando atender às necessidades

dos diferentes setores da economia. No contexto nacional, as migrações internas se

tornam significativas a partir da década de 1940, com a intensificação da industrialização,

da urbanização brasileira, reflexo também da concentração fundiária nacional. Nas

décadas de 1970 e 1980, a estagnação econômica produziu um grande contingente de

trabalhadores desempregados ou subempregados, período em que, o Estado continuou a

ter papel influente na determinação do sentido e da dinâmica dos fluxos migratórios.

Na década de 1990, com a intensificação do processo de globalização

identifica-se um novo padrão migratório, caracterizado pela migração de retorno e pelas

migrações temporárias e/ou sazonais. Estas últimas se territorializam principalmente no

campo, onde a modernização tecnológica produziu alterações significativas na

organização espacial. O formato da inserção desigual da modernização capitalista no

espaço agrário brasileiro, enfatizou as desigualdades regionais e propiciou a constituição

dos centros de atração e repulsão de força de trabalho, que perpetuam até os dias atuais.

Como exemplo, a região Nordeste e o Norte de Minas representaram historicamente um

exército de mão de obra para atender as necessidades capitalistas (PÒVOA, 1999;

BECKER, 2006). Embora as perdas populacionais destas regiões tenham ocorrido

sobretudo no século XX, ainda hoje o movimento migratório para o Centro-sul do Brasil

permanecem. O sul de Minas Gerais tem recebido grande quantidade de migrantes

nordestinos para o trabalho na cafeicultura.

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As formas de pensar a mobilidade populacional, acompanharam as

perspectivas de análise das correntes do pensamento geográfico. Cada vertente

privilegiou análises da mobilidade populacional sob uma ótica, proporcionando

contribuições significativas para a análise do fenômeno. Contudo existem lacunas e

discussões ainda pertinentes sobre as formas de análise dos deslocamentos populacionais,

principalmente aos métodos de análise da mobilidade populacional temporárias e/ou

sazonais, embora exista uma vasta gama de trabalhos em diversas campos científicos,

como a Sociologia, Antropologia, Economia, etc.

Este trabalho teve como objetivo a análise da mobilidade sazonal, entre os

municípios de Santaluz- BA e Carmo do Rio Claro – MG, sendo o primeiro município a

origem dos trabalhadores e o segundo o destino. Para realização da análise foram

estabelecidos alguns percursos metodológicos que permitiram o levantamento e a análise

das informações. A adoção de uma metodologia multiescalar na pesquisa, se deu a partir

da incorporação dos aspectos de nível macro e micro, no caso representado pelas escalas

regionais relacionados aos modos de produção predominantes tanto na origem quanto no

destino, buscando compreender os aspectos históricos-estruturais que contribuem para a

configuração da mobilidade entre as localidades. A segunda escala de análise compreende

o nível local, com a finalidade obter informações atreladas aos indivíduos. As

informações foram obtidas com base em questionários com questões pré-estabelecidas,

aplicas com o sessenta trabalhadores migrantes e com cem pessoas residentes no distrito

de Vilelândia em Carmo do Rio Claro. A exposição teórica de Barbieri (2005) indica que

mobilidade da população afeta tanto a origem quanto o destino, alterando as estruturas

socioeconômicas dos domicílios e da comunidade, o próprio autor ressalta que o

trabalhador migrante não se desloca sozinho, atribuindo a categoria das redes na análise

da mobilidade da população para o trabalho.

Migração ou Mobilidade: repensando conceitos

As reflexões teóricas a respeita da migração, apontam para dois enfoques

principais. O primeiro corresponde ao Neoclássico, concebendo o fenômeno migratório

como um fator positivo na economia, capaz estabelecer equilíbrio entre os espaços,

analisando a migração a partir de métodos de quantificação dos fluxos populacionais,

considerando os fatores de atração e repulsão da força de trabalho como critério de

análise, e a migração como uma escolha individual. Dentre os principais autores dessa

vertente, destaca-se Ravenstein (1885), o qual teve como foco as migrações no Reino

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Unido. Em sua análise, buscou identificar o padrão migratório, no contexto da Revolução

Industrial, no século XIX, estabelecendo leis que determinavam os padrões e os processos

integrados aos deslocamentos populacionais, relacionados a busca por trabalho nos

centros industriais (SILVA, 1999; PORTO, 2014).

Após mais de meio século, sem formulações capazes de serem generalizadas, o

demógrafo estadunidense, Lee (1966) retoma as discussões sobre a mobilidade

populacional, dedicando-se principalmente na compreensão das fatores que produzem a

migração, a partir dos aspectos presentes no local de origem e no local de destino. “Sua

proposição envolvia um conjunto de fatores negativos e positivos na áreas de origem e

destino dos migrantes, um conjunto de obstáculos intervenientes e uma série de fatores

pessoais” (BECKER, 2006, p. 327).

As críticas a esta vertente se dão em função da exclusão de fatores inerentes ao

próprio desenvolvimento do sistema capitalista, que propicia o fenômeno da migração,

uma vez, que os neoclássicos analisavam a migração, com base nas concepções

deterministas, reduzindo o fenômeno a identificação dos fluxos e sua quantificação,

considerando o migrante como elemento capaz de equilibrar o espaço (BECKER, 2006,

p. 332; PÓVOA, 1999; PORTO, 2014).

A abordagem Neomarxista, atrela a migração à fatores exclusivamente

econômicos, avaliando a migração como um processo determinado pelo capitalismo,

aplicando o enfoque dialético numa análise histórico-estrutural, considerando a migração

como um processo determinado por fatores pretéritos, que produzem estruturas sociais

condicionadas a mobilidade. Dentre os precursores dessa vertente, destaca-se as

contribuições de Singer (1987), pela incorporação dos aspectos históricos-estruturais nas

análises da migração, enfatizando a incorporação do sistema capitalista aos modos de

produção agrícola, considerado pelo autor como “fatores de mudança”, expropriando o

pequeno produtor, dedicado a agricultura de subsistência. A manutenção da agricultura

de subsistência representa os “fatores de estagnação”, pela dificuldade de inserção dos

produtos no mercado capitalista e pelas limitação da produção, atrelado as condições

físicas da terra, como é o caso do Nordeste. Singer (1987, p. 38) aponta como os fatores

de mudança e estagnação favorecem a mobilidade dos trabalhadores, sobretudo no seio

nas atividades agrícolas, onde o trabalhador ou é expropriado da terra ou dos meios de

produção.

[...]Os fatores de expulsão que levam às migrações são de duas ordens: fatores

de mudança, que decorrem da introdução de relações de produção capitalistas

nestas áreas, a qual acarreta a expropriação de camponeses, a expulsão de

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agregados, parceiros e outros agricultores não proprietários, tendo por objetivo

o aumento da produtividade do trabalho e a conseqüente redução do nível de

emprego; [...] e fatores de estagnação, que se manifestam sob a forma de uma

crescente pressão populacional sobre uma disponibilidade de áreas cultiváveis

que pode ser limitada tanto pela insuficiência física de terra aproveitável como

pela monopolização de grande parte da mesma pelos grandes proprietários.

Peek (1978), relacionou a migração a transição da produção agrícola não

capitalista para a capitalista, nos países em desenvolvimento, principalmente na América

Latina. Já Gaudemar (1977), partiu do enfoque neomarxista, para explicar que a

mobilidade acompanha os movimentos do capital. Assim, a mobilidade seria uma decisão

forçada, divergindo da visão neoclássica, onde o migrante tomava a própria decisão de

migrar, tornando-se força de trabalho sujeita ao capitalismo como mercadoria com valor

agregado. A obra de Gaudemar (1977, p. 64) se apoia na dialética marxista, para entender

as forças econômicas que provocam a mobilidade, a qual ele inicia uma diferenciação

conceitual entre migração e mobilidade populacional.

[...]na linguagem dos praticantes, entre “mobilidade” e “migração”, indica

claramente a elaboração indutiva à qual eles se entregam: não podendo, através

de estatísticas e das diferentes observações da vida econômica, considerar

senão os próprios movimentos dos homens, são estes movimentos que para

eles qualificam o conceito de mobilidade.

As críticas a este enfoque estão atreladas ao fato de desconsiderar as perspectivas

dos próprios migrantes, como critério para análise da migração (PÓVOA, 1999;

MENEZES, 2012; BECKER, 2006). A partir dessa breve exposição é relevante enaltecer

que ambas as vertentes contribuíram e contribuem para análise dos deslocamentos

populacionais, cabendo ao pesquisador atribuir-lhes significado durante a realização da

pesquisa.

Retomando a discussão conceitual sobre mobilidade e migração (grifo nosso),

Becker (1997, p. 323) aponta que a migração possa ser compreendida como “mobilidade

espacial da população”. Hogan (2005, p. 326) afirma que o termo mobilidade envolve

fatores para além da mudança permanente ou temporária de residência. “O termo

mobilidade é usado como um conceito mais amplo que migração, já que considera que

uma parte crescente dos movimentos população com impactos sociais, econômicos,

políticos e ambientais”.

A noção do termo migração, como simples mudança de residência, está atrelada

ao uso do termo nos censos demográficos realizadas pelo IBGE, que possibilita

correlacionar alguns fatores ligados a migração, principalmente a “origem” e o “destino”

dos deslocamentos populacionais (LOBO, 2009, p. 77-78). Para Mattos (2011, p.130) o

migrante pode ser caracterizado como indivíduo que realizou “um movimento entre dois

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municípios no intervalo de dois censos, ou o que fez diversas mudanças de domicílio ao

longo da sua vida”. Esse breve arcabouço conceitual referenda a perspectiva neoclássica,

a qual tinha como objetivo uma análise quantitativa e a formulação de leis gerais sobre

os deslocamentos e desconsidera fatores importantes para a compreensão do fenômeno.

Devido a amplitude dos fatores relacionados ao deslocamento

populacional, que será abordado neste trabalho, a opção pelo conceito de mobilidade

populacional é recorrente, por abarcar uma dimensão maior dos fatores e processos

relacionados ao movimento das pessoas no espaço, e por abarcar a dimensão do

deslocamento para o trabalho. O conceito de mobilidade permite uma aproximação no

campo da Geografia enquanto ciência. Haesbaert (2011, p. 238) expõem que, “pode-se

definir a mobilidade como a relação social ligada à mudança de lugar, isto é, como o

conjunto de modalidades pelas quais os membros de uma sociedade tratam a possibilidade

de eles próprios ou outros ocuparem sucessivamente vários lugares”, o que possibilita que

os indivíduos se desloquem e criem laços com diferentes lugares. Ele também define o

migrante como uma “parcela integrante ou que está em busca de integração numa (pós)

modernidade marcada pela flexibilização e precarização das relações de trabalho”.

A modalidade de mobilidade temporária corresponde aos deslocamentos para

atender a demanda por mão de obra em diferentes regiões do país, onde trabalhadores se

deslocam para aturem em diversas atividades tanto no campo quanto na cidade, e com o

fim do período de trabalho retornam aos seus lugares de origem.

A mobilidade sazonal da população, que também se enquadra como

temporária, é determinada pelas necessidades produtivas, com relevância para os períodos

das safras agrícolas. No Brasil este tipo de mobilidade ocorre, sobretudo, na colheita da

laranja, da cana-de-açúcar, no café, no algodão, entre outras monoculturas (CARMO,

2012). Essa caracterização da migração sazonal, demonstra a relação entre a migração e

a necessidade do migrante por trabalho, mesmo que temporário.

Dentro do contexto da mobilidade especificamente a sazonal, vale destacar que os

deslocamentos para outras regiões à procura de trabalho, permitem que o trabalhador se

mantenha no seu local de origem, garantindo a sobrevivência tanto no campo quanto na

cidade, mesmo que, exista uma submissão a longas jornadas de trabalho, para conseguir

atingir suas metas ou metas impostas pelos empregadores. Nesse sentido as contribuições

dos trabalhos desenvolvidos por Silva (1999), relacionando as questões dos trabalhadores

do campo com as migrações temporárias e/ou sazonais, abordando as condições de

trabalho nas lavouras de cana de açúcar, laranja, café do interior paulista, partindo do viés

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da dominação de classe pela expropriação dos modos de produção, enfatizando o processo

de transformação dos pequenos produtores em trabalhadores assalariados, migrantes,

volantes, pelo processo de socialização para o trabalho, são bastante relevantes.

No movimento de saída do lugar de origem e de chegada no lugar de destino e

retorno, o trabalhador estabelece múltiplas relações socioespaciais. Nesse processo de

deslocamento, como demonstra Haesbaert (1998), ao analisar as implicações territoriais

da migração de gaúchos para outras regiões do país, os mesmos carregavam suas

identidades do lugar de origem, mantendo algumas tradições e incorporando novas

manifestações de identidade. O que Silva (1999) relacionou às múltiplas identidades dos

trabalhadores migrantes no campo, Haesbaert (2001, p. 246), denominou de des-re-

territorialização, afirmando que a migração é um processo que está para além da

desterritorialização, “pode ser vista em diversos níveis de des-reterritorialização” e “não

há desterritorialização sem (re)territoriliazação”.

Ao mesmo tempo que esse movimento dos migrantes produz uma rede

migratória, Haesbaert (1998, p. 62), define essa interação da seguinte forma: “territórios

são marcados sobretudo pela horizontalidade espacial e especialmente quando

fragmentados necessitam de redes (ainda que imateriais) para sua articulação”. Saquet e

Montardo (2008, p. 119) enfatizam que a migração “coincide com um processo de

construção e interação territorial em rede. Portanto a mobilidade espacial da população

produz, através de uma interação em rede, a construção de territórios interligados entre

si, tanto nos aspectos econômicos, culturais e políticos.” A formação da rede, ocorre a

partir dos fluxos de informação e comunicação entre o lugar de origem e o lugar de

destino, no processo de ir e vir e nos laços sociais estabelecidos pelo migrante,

constituindo uma multiterritorialidade formada a partir da rede social estabelecida na

trajetória do migrante (HAESBAERT, 1998; SAQUET, MONTARDO, 2008). A

utilização das redes como categoria de análise, oferece o suporte necessário para

compreender a mobilidade sazonal da população entre os municípios de Carmo do Rio

Claro-MG e Santaluz-BA.

CONTEXTO HISTÓRICO E A REALIDADE SOCIOESPACIAL DOS

MUNICÍPIOS DE CARMO DO RIO CLARO-MG E SANTALUZ-BA

A necessidade de contextualizar as diferentes regiões, onde se inserem os dois

municípios em questão, serve para representar as realidades socioespaciais intrínsecas

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que denotam os caráteres de atração e expulsão da população, mesmo de forma

temporária. A intensão é remontar o contexto histórico de formação dos municípios

levando em consideração a questão regional. Este levantamento histórico permite

ressaltar alguns elementos que fomentam as disparidades regionais e que configuram e

intensificam a mobilidade populacional entre os dois municípios, possibilitando o

entendimento dos processos de apropriação do espaço nas diferentes regiões e como estes

configuram o quadro para análise da migração.

Figura 1: Mapa representativo do movimento migratório entre Santaluz - BA e Carmo do Rio Claro - MG.

A cafeicultura no Sul de Minas e a formação de Carmo do Rio Claro - MG

O município de Carmo do Rio claro está inserido no contexto da microrregião

do Sul/Sudoeste de Minas gerais e na microrregião de Alfenas. Sobre os processos

históricos de constituição do contexto regional é importante destacar o papel da

cafeicultura. Conforme análise bibliográfica, a região ampliou sua dinâmica de fluxos de

mercadorias e pessoas, pela instalação da cafeicultura, promovendo o desenvolvimento

das pequenas vilas, no decorrer da segunda metade do século XIX.

A ferrovia representa o avanço da modernização no espaço sul-mineiro, que

possibilitou não somente o escoamento da produção, mas também o meio de articulação

política das elites locais. “Com o crescimento acelerado da produção cafeeira, aumentam

também as necessidades, de melhoria na infraestrutura de sua produção, mão de obra e

transporte” (CAÇÃO, 2012, p. 8), portanto a ferrovia se instala como precursora da

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modernização, agregando novas possibilidades para a efetivação da cafeicultura como

principal fonte de renda, durante o fim do século XIX. “As principais linhas férreas da

região foram: Estrada de Ferro Minas e Rio, Estrada de Ferro Sapucaí, Companhia

Mogiana de Estrada de Ferro e a Estrada de Ferro Muzambinho.” (CASTILHO, 2012, p.

50). Neste momento intensificam-se as relações políticas, econômicas e sociais,

sobretudo com a elite paulista, propiciado pelo ferrovia.

A rubiácea iniciou sua expansão pelo Sul de Minas na freguesia de Dores de Guaxupé,

em 1875, [...] Segundo Oliveira e Grinberg: “terras férteis em abundância e quase a

custo zero, mão-de-obra ociosa, expansão das linhas ferroviárias e, principalmente,

um longo período de preços atraentes do café explicam a rápida expansão cafeicultora

no Sul de Minas. (CASTILHO, p. 33-34)

Saes e Avelino (2012, p. 76) trazem dados referentes aos aspectos

populacionais, destacando uma população escrava nos municípios sul-mineiros. No

município de Carmo do Rio Claro existiam cerca de 1.227 escravos em 1885, marcando

os períodos de fim do regime Imperial no Brasil e consequentemente a transição da força

de trabalho escrava pelo imigrante europeu. Esse processo é influenciado diretamente

pelo desenvolvimento dos transportes ferroviários, que possibilitando a distribuição dos

imigrantes para o interior. A cristalização da monocultura do café e os subsídios

oferecidos pelo governo impulsionaram a imigração sobretudo após 1880 mantendo os

fluxos até a Primeira Guerra Mundial (BOTELHO et al 2007, p. 156).

Nesse processo, que são ocupadas as terras, onde se encontra o distrito de

Vilelândia, fundando em meados do século XIX, por famílias de sobrenome Vilela. De

acordo com Soares (2011, p. 498), estas famílias vieram de Campos Gerais-MG e

Coqueiral-MG, fixaram residência no local denominado Três Barras, “demarcaram vastas

áreas de terra para a prática da agricultura e da criação de gado” (ROSA, 2004, p.57). O

enfoque abordado por Soares (2011) é a genealogia da família Vilela em Carmo do Rio

Claro, bem como, no distrito da Vilelândia, que recebe este nome pela sua fundação por

duas famílias de origem Vilela. Conforme a exposição de Rosa (2004, p. 57), as terras

eram:

[...]propriedade do Sr. José Leonel Vilela e do Sr. Olímpio Leonel Vilela. Ambas,

com áreas de extensas, não se conhecendo os números reais, apresentavam colônias

com número superior a vinte famílias cada. Com a venda de partes dessas terras para

sobrinhos e doação a herdeiros, a população da região compreendida entre as duas

fazendas amentou substancialmente.

Os relatos mostram que prevaleceu a grande propriedade e comumente a

monocultura, com a dispersão destas grandes propriedades dividias entres as famílias.

Hodiernamente, a agricultura se baseia na produção familiar com a presença da

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monocultura do café, nas áreas que são possíveis uma produção ainda rentável, as outras

áreas, divide-se entre a pastagem, a produção de milho para silagem ou grão.

Figura 2: Principal avenida do distrito de Vilelândia.

Fonte: Pesquisa de campo (Maio, 2013).

A Tabela 1, mostra a distribuição de terras no município de Carmo do Rio

Claro e permite inferir a presença de uma estrutura fundiária, baseada elevada distribuição

de terras, demonstrando a presença de um modelo de agricultura familiar, voltado para a

exportação da commodity. Conforme os critérios estabelecidos pelo INCRA as

propriedades com estrutura fundiária de 23 à 87 ha, que utiliza mão de obra familiar, a

renda deve predominantemente estar ligada as atividades exercidas na propriedade e o

estabelecimento ser gerido pela família, caracterizando o modelo de agricultura familiar

no município (MNINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO, 2006). A partir

da definição é possível inferir que, cerca de 50% das propriedades do município são

destinadas a prática da agricultura familiar, sendo 85,86% (IBGE, 2006) tem como

principal atividade a cafeicultura. (CARDOSO, ALVES, 2014).

Os apontamentos dos aspectos regionais, relacionados a constituição da

cafeicultura como principal atividade agrícola, juntamente com os aspectos locais,

explicitamente a elevada distribuição de terras e predomínio da agricultura familiar,

gerando uma demanda por mão de obra nos períodos de colheita, favorecendo a

constituição de um centro de atração de atração de migrantes.

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Tabela 1 - Número de estabelecimento agropecuários por unidade de área no

município de Carmo do Rio Claro – MG em 1996

Tamanho dos

estabelecimentos Número de estabelecimentos

Até 1 ha 12

1 a 2 ha 23

2 a 5 ha 173

5 a 10 ha 166

10 a 20 ha 175

20 a 50 ha 252

50 a 100 ha 138

100 a 200 ha 104

200 a 500 ha 50

500 a 1000 ha 12

1000 a 2000 ha 1

2000 a 5000 ha 0

Total 1.106 Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE (2012)

O Território do Sisal e formação de Santaluz – BA

O município de Santaluz, está localizado na mesorregião do Nordeste Baiano

e da microrregião da Serrinha, segundo a divisão regional realizada pelo IBGE, com uma

extensão territorial 1.597,202 Km². Fundada em 1935, hodiernamente tem como fonte de

renda a agricultura, a pecuária, extração de minérios como ouro, cromo, magnésio e prata

e a produção de sisal, sendo a mais representativa no município. (PREFEITURA

MUNICIPAL DE SANTALUZ, 2013)

De acordo com a definição de Nascimento (2008, p. 27), o processo de

ocupação econômico-espacial da mesorregião nordeste da Bahia, onde se insere o

município de Santaluz, deu-se a partir da pecuária extensiva e as rotas comerciais entre

as principais fazendas da região. Em função da baixa fertilidade do solo que inviabilizava

as produções agrícolas, propiciando uma ocupação nas proximidades dos rios, lagos e

brejos, tanto pelas melhores condições para produzir quanto pela disponibilidade de água.

A introdução do sisal na região ocorre por volta de 1903, contudo, sua maior

representatividade econômica ocorre a partir de 1940. No período pós-guerra, “o sisal foi

considerado a 2“planta redentora”, recuperando econômica e socialmente, um vasto

2 O interesse na produção do sisal estava atrelado a utilização da fibra para fabricação de cordas,

destinadas à indústria naval. Este tipo de produção perde espaço no mercado, pela introdução da fibra

sintética, proveniente do petróleo, produzindo a crise da produção sisaleira na década de 1970.

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território que vivia em “extremo pauperismo”, com sua população flagelada pela pobreza

e sujeita periodicamente aos êxodos rurais” (SILVA, 2012, p. 133).

[...] as políticas públicas de “construção de represas e escavação de poços” sempre

estiveram dirigidas às áreas particulares dos fazendeiros, privando (e privatizando)

boa parte do volume de água. (CODES SISAL, 2010, p. 23) Em síntese, a “indústria

da seca” em nada contribui para reduzir a pobreza e a exclusão social, permanecendo,

até hoje, como “moeda de troca”. (SILVA, 2012, p. 132)

Na década de 1960, o estado da Bahia lidera a produção nacional de sisal,

promovendo a integração regional a economia nacional. “Nesse período, a expansão da

produção do sisal ganhou força em razão das políticas de industrialização implantadas no

país – favorecendo a adoção de processos de mecanização do desfibramento, por meio da

máquina paraibana” (ibid. p. 134 – grifo do autor). Na década de 1970, com o

desenvolvimento da fibra sintética, a produção sisaleira entra em decadência, agravando

a situação econômica e social da região. Na década de 1990, como forma de revitalizar a

produção é implantado o Território do Sisal, englobando os municípios produtores de

sisal. Santos e Silva (2010, p. 75), afirmam que a implantação do Território do Sisal não

tem uma importância somente econômica, mas representa o força motriz dos movimentos

sociais na Bahia. É possível entender que o sisal, devido a sua importância regional,

representa uma monocultura, da mesma forma que outras monoculturas (eucalipto, cana

de açúcar, soja) existentes no restante do país. Como toda a monocultura, a concentração

de terras muitas vezes demonstra a forma de apropriação desigual do capitalismo.

A Tabela 2, mostra a distribuição de terras no município de Santaluz – BA,

relacionando ao contexto da produção sisaleira, que favorece um padrão de latifúndios.

Os dados do senso agropecuário mostram que 60% dos estabelecimento agropecuários

possuem extensão entre 1 a 20 hectares, não se enquadrando no perfil de agricultura

familiar e que dificulta a participação em programas de financiamento e incentivo do

governo, como o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura (PRONAF), O

Programa de Aquisição de Alimento (PAA), O Programa Nacional de Habitação Rural,

entre outros que favorecem a manutenção das famílias nas atividades em suas atividades

agrícolas. Dos estabelecimentos restantes 29% se encaixam no perfil de pequena

propriedade de agricultura familiar, que mesmo não sendo tão expressiva, encontra

dificuldades de produzir, sobretudo pelo quadro natural da região do semiárido baiano e

a ausência de políticas e programas efetivos, que atendam as reais necessidades dos

pequenos produtores de Santaluz.

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Tabela 2 – Tamanho e número de estabelecimento agropecuários por unidade de

área no município de Santaluz - BA em 1996

Tamanho de estabelecimentos Número de estabelecimentos

Até 1 ha 108

1 a 2 ha 123

2 a 5 ha 381

5 a 10 ha 329

10 a 20 ha 338

20 a 50 ha 454

50 a 100 ha 154

100 a 200 ha 111

200 a 500 ha 73

500 a 1000 ha 23

1000 a 2000 ha 11

2000 a 5000 ha 2

Total 2.107 Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE (2012).

Perfil socioeconômico e perspectivas dos trabalhadores migrantes

Conforme os dados obtidos a partir de questionários aplicados com 61

migrantes, no período de maio a agosto de 2013. A proporção dos dados mostra que, dos

entrevistados 57 são homens, destes 48 tem idade entre 20 a 40 anos e 25 são casados. O

perfil do migrante com idade economicamente ativa e que busca melhores condições de

trabalho e renda, para se manter no lugar de origem.

Woortmann (1990) exemplifica o papel do homem migrante, que se desloca

em busca de melhores condições, sobretudo camponeses, que assumem seu papel

patriarcal e migra com o intuído de assegurar o sustento da família e manter a sua

hierarquia. São as necessidades e as responsabilidades que impulsionam e configuram a

migração sazonal para oferecer a força de trabalho em outros espaços. “Migrar ou não

poderá depender então, não só da sazonalidade ou da alternância de anos bons e ruins,

mas igualmente das possibilidades de outros usos alternativos do tempo e dos recursos

disponíveis, realizando a cada ano um cálculo das vantagens relativas de permanecer.”

(WOORTMANN, 1990, p. 40).

Ao serem questionados sobre as motivações que os levam a decisão de se

deslocar, 84% os trabalhadores apontaram se deslocam em busca de melhores condições

de trabalho, renda e pela falta de trabalho no lugar de origem, somente 16% atrelaram a

motivação de se deslocar com o problema ao quadro natural da seca. A busca por

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melhores condições de trabalho e renda é ressaltada, quanto a renda dos migrantes, onde

72% dos entrevistados afirmaram ter renda de menos de um salário mínimo.

Santos e Silva (2010, p. 78), apontam que “especificamente no Território do

Sisal verificamos, em atividade de campo realizado no mês de agosto de 2009, que o

trabalho remunerado era 15,00 o dia enquanto o salário mínimo no Brasil era de R$

465,00”. Silva (2012, p. 137), também levanta os questionamentos sobre a exploração

dos trabalhadores no processo de produção e beneficiamento do sisal, destacando o modo

perverso de exploração do trabalho, “quem não se sujeitava à servidão do sisal ficava sem

alternativas de ocupação e renda”. Os aspectos referentes as condições de trabalho na

colheita do café, os trabalhadores migrantes avaliaram o trabalho como “Bom”,

enaltecendo as dificuldades do trabalho no local de origem, mas sabe-se que o trabalho

na colheita do café, representa um trabalho árduo, mesmo assim, os migrante o considera

como um trabalho “Bom”. O caso do trabalho migrante na cafeicultura, se diferencia dos

modos de exploração do trabalho na cana de açúcar, contudo não se extingue a relação de

exploração do trabalho.

As perspectivas dos migrantes, permitiu observar alguns fatores como os

desejos e anseios impulsionam o movimento migratório. Portanto, ao perguntar sobre o

quanto os trabalhadores pretende ganhar com seu trabalho, 87% dos entrevistados

responderam que pretendem ganhar dois mil a quatro mil reais, descontando os gastos

com o transporte de Santaluz até o distrito de Vilelândia, além do alimentação durante o

período da colheita. Esses valores são significativos, quando relacionados a renda que o

migrante tem em Santaluz, sendo que 41 dos entrevistados exercem atividades ligadas ao

campo, seja como proprietário de pequena propriedade e/ou como trabalhador

assalariado, principalmente na produção sisaleira.

A configuração da rede, ocorre a partir da necessidade do trabalhador

migrante em se manter no local de origem, impulsionado pelos desejos de adquirir e ou

possuir algum bem. Cabe destacar que, a rede se consolida pela demanda do cafeicultor

por mão de obra e pela busca do migrante por melhores condições de trabalho e renda.

Neste caso além da rede, se formar pelas trocas materiais (os fluxos de trabalhadores), ela

também se constitui pela imaterialidade, pois o indivíduo carrega suas identidades e

valores, desejos e anseios, uma gama de informações que se deslocam junto com o grupo.

A formação de uma rede social de mobilidade ocorre, pelas trocas imateriais

que os migrantes exercem entre o lugar de origem, constituída pelos suas relações sociais

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e pelo sentimento de pertencimento com o lugar. Haesbaert3 (1998, p. 62), define essa

interação, pois os “territórios são marcados sobretudo pela horizontalidade espacial e

especialmente quando fragmentados necessitam de redes (ainda que imateriais) para sua

articulação”. A fragmentação corresponde ao processo de desterritorialização, pois o

trabalhador migrante deixa seus laços sociais no lugar de origem, para se reterritorializar

no lugar destino, carregando alguns aspectos que permite essa reterritorialização. O que

foi observado in lóucus, pois os migrantes se deslocam em grupos, como exposto por

Saquet e Montardo (2008, p. 109) enfatizam que a migração “coincide com um processo

de construção e interação territorial em rede. Desse modo, a mobilidade espacial da

população produz, através de uma interação em rede, a construção de territórios

interligados entre si tanto econômica como cultural e politicamente” por amigos e

familiares (pai, filho, primo, sobrinho, etc), formando uma rede social de migração.

CONCLUSÃO

Os resultados obtidos com a pesquisa revelam o contexto da migração sazonal

entre os municípios de Santaluz e Carmo do Rio Claro, impulsionado por fatores

históricos e atuais, que proporcionaram a constituição da rede migratória entre os dois

municípios. Destaque, para as precárias condições de trabalho e renda no município de

origem (Santaluz), impulsionadas pelo contexto de implantação da produção sisaleira,

intensificado com a implantação do Território do Sisal, que favoreceu a precarização das

condições de vida no aspecto regional. A cafeicultura por sua vez, proporcionou a

colonização e a dinamização da produção no contexto regional e favoreceu a agricultura

familiar, sobretudo no município de Carmo do Rio Claro. Mas a falta de mão de obra,

produz o cenário de atração de mão de obra, principalmente com a ascensão da produção

cafeeira. Portanto, os pequenos agricultores de Santaluz, geralmente homens casados se

deslocam em busca de melhores condições de trabalho e renda, como forma de

manutenção da vida no campo, no lugar de origem. A estratégia não ocorre de maneira

pontual, pois os trabalhadores esperam poder voltar para a colheita no próximo ano.

A análise da mobilidade populacional entre os dois municípios, a partir da

ótica da Geografia, permitiu compreender os processos inseridos no movimento com

relevância para a formação da rede social de migração e as alterações na dinâmica

3 Haesbaert (2012), aponta o processo de des-re-territorialização relacionado aos deslocamentos populacionais, partindo da ideia da multiterritorialidade.

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socioespacial, compreendido a partir da análise do processo de des-re-territorialização,

representado na investigação de como os entrevistados observam as diferenças entre a

origem e o destino, bem como, o papel das redes possibilitam o deslocamento. E para não

concluir, as relações estabelecidas entre trabalhadores migrantes e cafeicultores,

ultrapassa a linha da relação e empregado e portanto criam-se relações mesmo que

sazonais, as quais demandam uma nova análise envolvendo novas dimensões e

categorias.

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