teorias dos crimes falimentares

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE DIREITO DEPARTAMENTO DE DIREITO PRIVADO DISCIPLINA DE FALENCIAS E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS Antonio Luiz Garcia Junior (manhã) TEORIAS ACERCA DOS CRIMES FALIMENTARES

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Page 1: TEORIAS DOS CRIMES FALIMENTARES

UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁFACULDADE DE DIREITO

DEPARTAMENTO DE DIREITO PRIVADODISCIPLINA DE FALENCIAS E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS

Antonio Luiz Garcia Junior(manhã)

TEORIAS ACERCA DOS CRIMES FALIMENTARES

Fortaleza/CE2010

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1. INTRODUÇÃO

O estudo do Direito Falimentar requer uma visão global de todos os ramos do direito,

visto que se encontra intimamente ligado à questões cíveis, constitucionais, penais,

processuais e até de certo modo tributárias, dentre outras.

Exemplo disso é a análise de questões como os Crimes Falimentares, cuja natureza

jurídica requer enlaces com o direito penal, bem como o estudo da Ação Revocatória, que

necessita de um liame processual para seu debate.

Desta forma, no presente trabalho, buscaremos analisar, em duas partes,

primeiramente as Teorias acerca da Natureza Jurídica dos delitos falenciais, que geram dentro

da doutrina civilista e penalista grandes discussões acerca do tema; após, na segunda parte,

analisaremos de forma mais ampla mas não menos salutar a ação revocatória, instrumento

processual embutido no Direito Falimentar cujo objetivo se assemelhar com o da Ação

Pauliana, como veremos.

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2. DAS TEORIAS ACERCA DOS CRIMES FALIMENTARES

Antes de adentrarmos no cerne do primeiro tema deste trabalho (qual seja, a natureza

jurídica dos crimes falimentares), é de bom alvitre e de salutar importância que conheçamos o

“instituto” dos delitos falimentares, devendo para tanto tecermos alguns comentários acerca de

sua evolução histórica no ordenamento jurídico pátrio bem como delineando e analisando sua

conceituação legal e doutrinária. Senão vejamos:

2.1. Breve apanhado histórico no ordenamento brasileiro

A nova lei de Falências (lei 11.101/05) veio em substituição ao Dec.-lei 7.661/45

trazendo em seu corpo toda a regulamentação da situação empresarial da “bancarrota”,

inovando em certos aspectos (como a criação da figura da Recuperação de Empresas) e

repetindo outros institutos já existentes no dispositivo anterior.

Dentre as figuras já existentes no Dec.-lei 7.661/45 que também se no apresentam na

nova regulamentação de 2005 temos as figuras dos Crimes Falimentares, que, com algumas

modificações no texto legal, continuam sendo regulamentadas não pelo Código Penal, mas

pela legislação especifica falimentar.

Tal situação, qual seja, a de os crimes falimentares serem regulados por legislação

falimentar especifica e não pela legislação criminal se perfaz desde o Código Penal de 1940,

quando o Brasil adotou o sistema da autonomia legislativa, destinando desta forma a matéria

dos crimes falimentares à legislação especifica, excluindo-a assim da apreciação do Direito

Penal e mantendo-a sob a égide civilista, por assim se dizer, ao tratar do assunto no Decreto-

lei acima citado. Assim entendem GUERRA e LITRENTO em sua obra de comentários à

nova Lei de Falências ao afirmarem que

o Brasil adotou o sistema de autonomia legislativa destinando a matéria do crime falimentar à legislação especial somente a partir do Código Penal de 1940, excluindo os delitos da falência do âmbito do Direito Penal e passando a tratar da matéria no Decreto-lei 7.661/451.

Citado posicionamento vem ao longo dos anos causando certas discussões entre os

estudiosos do Direito Penal e do Direito Civil, sendo constantemente deixada de lado por 1 GUERRA, Èrica, e LITRENTO, Maria Cristina Frascari. “Nova Lei de Falências. Lei 11.101 de 9/2/2005 Comentada”. EZN Editora, Campinas-SP, 2005.

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ambos os estudiosos de referidas ramificações, visto que os civilistas consideram a questão

nitidamente penal, enquanto os penalistas observam sua vinculação ao Direito Falimentar, de

domínio do direito Civil.

A questão é sem duvidas complexa e possui como meio de resolução três correntes

de pensamento que são sabiamente explicadas por SHEREDER, THIESEN, DE PAULA e

CERQUEIRA em trabalho apresentado e publicado na Universidade UNIRG nos termos que

seguem. Senão vejamos:

devido a complexidade da matéria surge grande controvérsia diante da locação legislativa dos crimes falimentares, tendo em vista os vários ordenamentos jurídicos. Existe, sistematicamente, três posições quanto ao tema:a) Sistema da autonomia criminal;b) Sistema da autonomia legislativa;c) Sistema eclético.O sistema de autonomia criminal sustenta que os crimes falimentares pertencem aos domínios das leis penais, como na Suíça, Argentina, Peru e outros. O sistema de autonomia legislativa destina a matéria à lei especial, integrando, pois, a Lei de Falências. Adotam-no Itália, Brasil, Chile e países anglo-saxões como a Inglaterra e Estados Unidos. Em terceiro lugar temos o sistema eclético, que conjuga duas legislações: os crimes falimentares, como descrição da conduta punível, no Código Comercial, e a especificação das sanções no Código Penal, com expressa referência às prescrições da lei comercial. Esse sistema é o adotado pela França2.

Deste modo fica claro que, como citado acima, o Brasil resolveu adotar, a partir do

Código Penal de 1940 e sob nítida influência do direito italiano, o sistema da autonomia

legislativa, tratando do tema dos crimes falimentares no Decreto-lei 7.661/45.

Ressalte-se que referidos institutos, por seu turno, não foram inovações do

dispositivo legal supra citado, vez que sua figura já se perfazia desde a época do Império,

quando era regulamentada pelo Código Penal do Império de 1830, que previa e punia o crime

de bancarrota nos termos da legislação comercial, sendo ainda objeto de regulamentação pelo

Código Comercial de 1850, que por sua vez previa a punibilidade da falência fraudulenta ou

culposa.

Como vimos, a partir do Código Penal de 1940, a regulamentação dos crimes

falimentares deixou de ser de responsabilidade da legislação penal passando assim a ser

regulamentada pelo Decreto-lei 7.661/45, que limitava-se a normatizar as situações de fato

que configurariam crime em questão, sem contudo se preocupar com questões classificatórias.

2 SHEREDER, Magno; THIESEN, Renata Piovesan; DE PAULA, Silmar; e CERQUEIRA, Marcio Rodrigues. “Crimes Falimentares”. Publicado no sítio eletrônico da Universidade de Guripi (UNIRG). http://professores.unirg.edu.br/roveroni/dir_arq/com/com_03/sem_falencias_arq/2004_01/05_crimes_falimentares_2004_1.pdf

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Todavia, com o advento do novel dispositivo legal promulgado em 2005 (lei

11.101), com algumas modificações no corpo normativo com relação À redação do Dec.-Lei,

a secção que tratava dos crimes da falência passou a ser dividida, tendo os crimes enumerados

em sua espécie um a um, alem de conter disposições comum e procedimentais.

2.2. Conceito de Crimes Falimentares

A legislação pátria não traz em seus dispositivos qualquer conceituação legal de

crimes falimentares, nos trazendo unicamente a tipificação contido na Lei 11.101/05 nos arts.

168 a 178 do referido dispositivo. Deste modo, observam o principio da Legalidade ou da

Reserva Legal, pois só são considerados crimes aquelas situações cujo tipo estejam inseridas

no rol dos artigos supra citados, podendo serem praticados pelo devedor ou por terceiro antes

ou depois da decretação da falência, da decretação de recuperação judicial ou homologação da

recuperação extrajudicial.

Assim, limitou-se a legislação falimentar a tipificar os crimes, bem como a delinear

sua legitimidade ativa e passiva, bem como sua aplicação no tempo com relação à decretação

de certos atos e o cometimento dos delitos.

Segundo entendimento de OLIVEIRA, “a conceituação do crime falimentar é objeto

de funda controvérsia, o que se explica não apenas pelas dificuldades próprias da matéria, mas

também pela diversidade de critérios utilizados no tratamento do assunto3”.

Todavia, com a mestria que lhe é costumeira, REQUIÃO afirma de maneira simples

e direta que “os delitos falimentares são os chamados crimes do colarinho branco. Isto porque,

a prática criminosa pelo empresário possui certos requintes que a distingue da delinqüência

comum4.”

A nosso entender, percebemos que por Crimes Falimentares temos sendo aqueles

atos praticados pelo falido (devedor) ou terceiros (contadores, técnicos, auditores, juiz,

representante do Ministério Público, o administrador judicial, o gestor judicial, o perito,

avaliador, escrivão, oficial de justiça, leiloeiro, entre outros) que se encontram enumerados

nos arts. 168 a 178 da lei 11.101/05, podendo ser antes ou após a decretação da falência, da

recuperação judicial ou homologação da recuperação extrajudicial.

3 OLIVEIRA, Celso Marcelo. “Comentários à Nova Lei de Falências”. 1ª ed. São Paulo, IOB Thonson Editora.4 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Falimentar. 16ª ed. São Paulo: Saraiva, 1.995.

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2.3. Da Natureza Jurídica dos delitos falimentares

Ao tratar da Natureza Jurídica dos crimes falimentares, adentramos finalmente no

cerce da primeira parte de nosso trabalho, que consiste em analisar as teorias doutrinarias

apresentadas acerca do tema. Trata-se, basicamente, da análise do bem jurídico resguardado

pela tipificação dos delitos em comento.

A análise da Natureza Jurídica de referidos delitos tem causado, ao longo dos anos,

inúmeros debates entre doutrinadores não só no Brasil, mas por todo o mundo. Doutrinadores

italianos, franceses, americanos e de outras nacionalidades já se debruçaram sobre o assunto e

delinearam as diretrizes e limites que contribuíram para a formação das teorias mais

amplamente difundidas no mundo acadêmico hodierno.

Tal discussão traz problemas inclusive para a própria conceituação de Delitos

Falimentares, como aduz o já citado autor OLIVEIRA em sua obra de comentário à Nova Lei

de Falências. Complementado o que afirmou sobre a dificuldade de conceituar-se os crimes de

bancarrota, afirma referido autor que

com efeito, se uns consideram o crime falimentar como delito contra a fé pública, outros dele se ocupam ora como crime contra a administração da justiça, ora contra o crédito. As dificuldades que assinalam o tema mais se evidenciam na medida em que se verifica a divergência existente quanto a sua exata localização. Assim, enquanto nos sistemas jurídicos há quem o inclua no âmbito das leis penais, outros o enquadram nos domínios da Lei Falencial. Entre ambos nota-se ainda a presença dos que cuidam da matéria conjugando as duas legislações.5.

A questão da natureza dos crimes falimentares nos parece, assim, estar intimamente

ligada aos sistemas anteriormente citados quando falamos da regulamentação dos delitos pelo

Codigo Penal ou por lei específica, como ocorre no Brasil.

PAES DE ALMEIDA, ao tratar do assunto da classificação e localização dos delitos

falenciais no ordenamento jurídico enumera as três principais teorias acerca do assunto.

Segundo referido autor cita, as principais correntes de pensamento sobre o tema enquadram os

crimes falimentares como: crimes contra o patrimônio, crimes contra a fé pública e crimes

contra a atividade comercial. Todavia, analisando outros autores, notamos a existência de

outras correntes/teorias não citadas pelo ilustre autor. Exemplo destas são aqueles autores que

enquadram os delitos em comento como sendo contra a administração da justiça e outros vão

5 OLIVEIRA, Celso Marcelo. “Comentários à Nova Lei de Falências”. 1ª ed. São Paulo, IOB Thonson Editora.

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mais longe ao afirmar que possuem natureza pluriobetiva, portanto tratar-se-ia de crime de

natureza hibrida.

Passemos então a comentar cada teoria separadamente.

2.3.1. Crimes contra o Patrimônio

É sem duvidas a posição doutrinaria mais antiga. Prova disso é que os próprios

regimentos normativos antigos por todo o mundo assimilavam referidos crimes com o de

furto, punindo inclusive o praticante do delito com as mesmas penas do tipo penal citado.

Outros autores, como REQUIAO, identificam referidos delitos com o crime de estelionato, ou

uma variedade deste para tentar classificar o crime. Todavia, para que se caracterize o crime

de estelionato, requer-se o emprego de artifícios para iludir a confiança de outrem. O que não

ocorre ou é elementar de qualquer dos tipos falimentares.

Autores como Puglia, Ramella, Carvalho de Mendonça, Galdino de Siqueira, dentre

inúmeros outros defendem que os crimes falenciais se constituem como tendo natureza

patrimonial por ofenderem os bens materiais dos credores.

VALVERDE, em defesa a essa teoria afirma que

o objeto jurídico do crime é o dano causado ao patrimônio dos credores, bem jurídico que está sob a imediata tutela da lei, porque assim ordena o interesse público, que constitui, na realidade, sempre e necessariamente, o objeto jurídico do crime 6.

Todavia, percebe-se que o problema de tal teoria reside no caso em que o crime é

cometido pelo próprio falido, pois a diminuição do seu patrimônio não poderia identificar-se

ao tipo do crime de furto, uma vez que não se concebe a subtração de bens pelo próprio dono,

residindo ai a principal mácula, ao nosso ver, deste posicionamento.

Não obstante referida critica, a teoria que enquadra os crimes falimentares dentro

daqueles contra o patrimônio é ainda a mais difundida e predominante entre a doutrina pátria,

recebendo assim bastante respaldo e embasamento por parte de seus adeptos.

2.3.2. Crimes contra a Fé Pública

6 VALVERDE, Trajano de Miranda. Comentários à Lei de Falências. 3. ed. rev. atual. São Paulo: Forense, 1962. v. 3.

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No sentido de classificar os crimes falimentares como sendo de natureza contra a Fé

Pública temos autores como Carrara, Lemmo, dentre outros.

A Teoria afirma que os crimes falimentares são delitos que atentam contra a fé pública

baseiam-se principalmente na idéia de que o comércio se perfaz através da confiança entre

credores e devedores, o que interessa por sua vez toda a sociedade.

Deste modo, segundo assevera CARRARA citado por STEVENSON, os crimes

falimentares ocasionam-se “por tal modo que ocasionar criminalmente o descrédito próprio

significa ofender um direito da sociedade. 7”

O mérito desta classificação está à seu caráter social, uma vez que eleva a confiança,

ou seja, boa fé objetiva do crédito ao patamar de bem jurídico tutelado pela tipificação dos

crimes falimentares.

2.3.3. Crimes contra a Economia Pública ou Atividade Comercial

Os que defendem referido posicionamento afirmam que os delitos falenciais assim se

enquadram pois a lesão se configura ao interesse do comércio, vez que, sendo abalada a

lealdade comercial, a confiança pública decai, acarretando-se assim em prejuízo à atividade

comercial como um todo.

TRONCOSO JUNIOR afirma que “o Crime Falimentar deve ser capitulado como

sendo contra o comércio, dentro de uma visão genérica dos crimes contra a economia

pública.8”

Para referida teoria, seria o comércio quem receberia os impactos do crime cometido,

recebendo assim a “ofensa imediata” através dos danos causados aos credores prejudicados

pelo cometimento do delito. Por sua vez, o credor prejudicado não o é apenas pela

circunstancia de não ter seu credito satisfeito, mas sofre prejuízos também no sentido de que

referida não-prestação acarretará repercussão danosa em seu próprio comércio, o que

prejudicaria a atividade econômica como um todo através de uma espécie de efeito cascata.

Portanto, acima do direito particularizado dos credores à satisfação pelo patrimônio do devedor, e porque as economias privadas se solidarizam e se interpenetram intimamente, sobreleva o interesse do comércio, manifestação específica da economia pública9.

7 STEVENSON, Oscar. Do crime falimentar. São Paulo: Livraria Acadêmica, Saraiva & Cia, 1939. p. 59.8 TRONCOSO, José Jr..Direito Penal Falimentar. São Paulo: Saraiva, 1986. p. 02.9 STEVENSON, Oscar. Do crime falimentar. São Paulo: Livraria Acadêmica, Saraiva & Cia, 1939. p. 89.

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Referido posicionamento pertence a STEVENSON e embasa seu posicionamento,

que defende a natureza social do crime contra o comercio dentro de um contexto amplo dos

crimes contra a economia pública.

O prejuízo dos credores será critério subsidiário para a graduação da pena, que deve antes proporcionar-se à desconfiança diminuída ou extinta nos comerciantes, o dano da pública economia. Não há que reprochar nesse entendimento senão a sua amplitude. Na economia pública se entrosam todos os interesses privados. Mediatamente lhe constitui um gravame o crime falimentar10.

2.3.4. Crimes Contra a Administração da Justiça

Teoria difundida principalmente entre os penalista que atribui aos crimes

falimentares como tendo por bem jurídico tutelado a administração da Justiça para a tutela

jurisdicional do processo de Falência.

Os principais autores e defensores desta doutrina são os penalistas Landrove Diaz e

Pietro Nuvolone. REQUEIÃO, citando NUVOLONE, afirma e explica de maneira minuciosa

as diretrizes desta doutrina dizendo que

uma vez que as normas incriminadoras decorrem de um pressuposto concursal e a união dos credores é concebida como massa (não são vistos como simples indivíduos), isto significa que o interesse jurídico lesado é publicístico-processual, ou seja, além de serem lesionados os interesses patrimoniais, a outra parte aproveita-se da natureza do interesse processual, que é o abrigo defensivo do bem substancial.11

Todavia, referida doutrina tem sido refutada em razão de que seus defensores

parecem desconhecer que o processo é um instrumento dirigido a realizar garantia de

interesses substanciais.

2.3.5. Crimes Pluriobjetivos de natureza híbrida

Autores mais cautelosos vêem os crimes falimentares como pluriobjetivos, ou seja,

possuidores de não apenas um único bem jurídico tutelado, mas sim vários, o que acarretaria

na sua natureza jurídica híbrida através da fusão dos interesses tutelados, vez que não se

poderia elevar um determinado bem em detrimento de outros tantos. Todavia, não há consenso

10 STEVENSON, Op. Cit., p 88. 11 REQUIÃO, Rubens. Curso de direito falimentar. São Paulo: Saraiva, 1992.

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entre os defensores desta teoria acerca dos bens tutelados que formariam essa natureza hibrida

dos crimes falenciais.

MIGLIARI JUNIOR defende que tais delitos são de natureza híbrida por ferirem a

economia pública e o crédito, acarretando assim em uma total instabilidade na atividade

comercial e suas relações, acabando de vez com a rede comercial.

Assim, há uma instabilidade econômica geral, devendo ser considerada como pública, posto que os danos causados pela quebra são difusos e sem condições de comensuração, somente auferível pelo volume de insatisfeito que aportam no processo falencial.12

Por fim, a posição tomada pelo Professor Sady Cardoso de Gusmão possui opinião

eclética, caracterizando-se o delito como pluriobjetivo, pois não há como definir a

objetividade do crime falimentar. Os próprios artigos 168 a 178 da Lei de Falências mesclam

delitos contra a fé pública, contra o comércio e a economia, contra a administração da justiça e

contra a propriedade.

O crime, entretanto, não se pode classificar nesta ou naquela forma, no concernente à

sua objetividade, por isso que tal objetividade se apresenta complexa e daí a separação desse

tipo de delito, com feição ou caráter profissional (expressão que se não deve tomar sob a

significação constante do direito penal), dos demais. Donde a admitir-se não só o caráter

patrimonial do delito, como também o que vem argüindo, em relação ao crédito, ao comércio

e à economia.

2.4. Conclusão acerca da natureza jurídica dos crimes falimentares

Assim, após analisarmos as teorias existentes acerca da natureza jurídica dos crimes

falimentares, quais sejam, as que classificam referidos delitos como sendo contra o

patrimônio, contra a fé pública, contra a atividade comercial, contra a administração da

justiça e crimes de natureza híbrida/pluriobjetivos, nos parece salutar afirmar que aquela que,

apesar de não ser a mais defendida, se nos apresenta como sendo a mais correta dentre todas,

ao nosso ponto de vista, é a que enquadra o delito falencial como sendo crime contra a

atividade comercial, cabendo assim, por fim, trazer o entendimento definitivo do ilustre autos

STEVENSON, que defende o tema com maestria ao afirmar que

12 MIGLIARI JR., Arthur. Crimes Falimentares. São Paulo: CS Edições Ltda., 2002. p. 15.

Page 11: TEORIAS DOS CRIMES FALIMENTARES

os crimes falimentares são contra o comércio (empresa), não se admitindo crimes contra o patrimônio, pois não atinge o patrimônio dos credores, mas sim do próprio falido. É o comércio (empresa) quem recebe a ofensa imediata, por meio de danos dos credores. É que seja cometido pelo devedor, seja por outras e determinadas pessoas, não se dirige à propriedade dos credores, mas do próprio falido. Os direito de garantia acaso ofendidos não bastam para emprestar-lhe o caráter patrimonial.13

3. DA AÇÃO REVOCATÓRIA

Terminados os comentários acerca do primeiro objeto de nosso presente estudo,

passemos então a discutir acerca da Ação Revocatória contida na Lei de Falências e

Recuperação de Empresas (lei 11.101/05).

Como feito nos tópicos acima, passaremos por uma analise do instituto dentro do

ordenamento jurídico analisando sua origem e regulamentação no Ordenamento Jurídico

pátrio, além de sua conceituação, desta vez de maneira mais aprofundada vez que a análise em

si do próprio instituo já é objeto da segunda parte deste trabalho. Após termos uma visão

global acerca do tema, possamos explanar e dissecar o assunto com maior especificidade.

Assim, vejamos:

3.1. Da Origem do Instituto – co-relação com Ação Pauliana e o

Direito Romano

Os autores são unânimes ao afirmar que o surgimento da Ação Revocatória está

umbilicalmente ligada a Ação Pauliana, remetendo-se assim sua origem ao Direito Romano,

que através da Ação Pauliana e do interdito restituitório fornecia a possibilidade de se

recuperar os bens alienados de forma fraudulenta ao patrimônio do devedor a fim de que os

créditos existentes fossem adimplidos.

Remonta (a revocatória) ao direito romano, o qual, coação pauliana e o interdito restituitório, fornecia a possibilidade de recuperação dos bens saídos do patrimônio do devedor, quando não houvesse outras atividades perseguíeis ou suficientes para a satisfação do credor, quando na alienação o devedor tivesse tido a intenção de prejudicar os credores e o outro contraente tivesse tido consciência de tal intenção, consciência que para impugnação dos atos a título gratuito sequer era requerida. No direito medieval, a revocatória assume natureza de remédio complementar na execução coletiva.14

13 STEVENSON, Oscar. Do crime falimentar. São Paulo: Livraria Acadêmica, Saraiva. 1999. p. 103.14 PROVINCIALE, Renzo. Manuale de Direito Falimentare.

Page 12: TEORIAS DOS CRIMES FALIMENTARES

Deste modo, a Ação Revocatória surgiu para resguardar os interesses dos credores

frente ao propósito escuso de se forjar um estado de insolvência, ou agravar um já existente,

em busca do não adimplemento da obrigação resguardada.

Assim, entendemos que a ação Revocatória nasce da necessidade que possuem os

credores diante de uma situação onde seu devedor teve seu estado de insolvência caracterizado

ou agravado pela saída fraudulenta de algum bem de seu próprio patrimônio com o animus de

realmente frustrar a quitação do débito dos credores. Assim nos ensino OLIVEIRA ao afirmar

que

no seu surgimento, a ação revocatória se baseava na fraude do devedor, seja no Direito Romano, seja no Justinianeu, a ação revocatória sempre foi de concebida como ação de natureza pessoal – actio in personam – encontrava na fraude o próprio pressuposto fundamental, e com tais características ela se oferece à indagação dos doutrinadores da Idade Média.15

Atualmente, a ação revocatória encontra-se regulamentada dentro da Lei

11.101/2005, que trata dos procedimentos falimentares e da Recuperação de Empresas. De

forma mais precisa, referido instituto está inserido no contexto dos arts. 129 à 138, na Secção

que diz respeito à questão jurídica da ineficácia e revogação dos atos praticados antes da

falência.

Deste modo, terminados os comentários breves acerca da origem do presente

instituto, passemos agora a conceituação da Ação Revocatória.

3.2. Conceito de Ação Revocatória

A nosso ver, não há conceituação mais clara do que a que nos é fornecida por

PONTES DE MIRANDA, citado por OLIVEIRA, ao firmar que

ação revocatória falencial é a ação constitutiva negativa, pela qual o sindico, ou algum credor falencial, se não a propôs antes da decretação de falência, o sindico, no prazo legal, revoga o ato fraudulento do devedor e do terceiro, se houve intenção de prejudicar credores16.

15 OLIVEIRA, Celso Marcelo. “Comentários à Nova Lei de Falências”. 1ª ed. São Paulo, IOB Thonson Editora.16 OLIVEIRA, op.cit., p. 507.

Page 13: TEORIAS DOS CRIMES FALIMENTARES

Por este conceito podemos retirar tanto a natureza jurídica da sentença que julga a

Ação Revocatória quanto os elementos específicos para caracterização da circunstancia que dá

ensejo à necessidade de prestação jurisdicional ora comentada.

Segundo o mesmo autor, a ação revocatória pode ser movida com o ensejo de se

desconstituir qualquer ato jurídico que tenha retirado patrimônio do devedor, sejam eles

negócios jurídicos, como compra e venda, trocas, assunção de dividas, ou atos jurídicos

processuais, como renuncias, desistências inclusive de recursos; atos jurídicos strictu sensu,

como quitação, restituição de penhor, por exemplo.

Outra definição bastante explicativo nos é dada por NELSON ABRAO, também

citado por OLIVEIRA, que define ação revocatória como

levando em consideração a finalidade, o procedimento mediante o qual se visa a recuperar e, favor da massa os bens que saíram indevidamente de seu patrimônio chama-se ação revocatória, sendo proposta tanto em relação aos atos ineficazes, como aos atos revogáveis17.

No que tange à natureza jurídica deste tipo de ação, Pontes de Miranda defende ser

ela constitutiva negativa, indo de encontro a alguns autores que defendem o entendimento de

que são meramente declaratórias. Todavia, os ensinamentos do autor já citado em conjunto

com a doutrina trazida por FERREIRA nos dá força suficiente para afirmar ser a ação

revocatória de natureza constitutiva e não declaratória meramente.

Não é a ação destarte simplesmente declaratória. Reveste-se de natureza constitutiva. Verifica-se por seu procedimento, e se delcara, a existência de condições, em razão das quais se modificará a relação jurídica, antes da falência estabelecida entre o devedor e terceiros, que com ele contrataram fraudulentamente, em prejuízo da coletividade dos credores.

3.3. Consilium Fraudis e Eventus Damni

Para enquadramento do ato como sendo passível de revogação pela ação em estudo,

deve ele ser fraudulento, requerendo para tanto a concorrência de dois elementos: o objetivo,

conhecido como eventus damni, e o subjetivo, que é chamado de consilium fraudes.

O elemento objetivo diz respeito ao resultado danoso caracterizado pelo resultado

prejudicial oriundo do negocio jurídico cuja ineficácia é pretendida. Corresponde basicamente

à insolvência do devedor causada ou agravada pelo ato impugnado. Desta forma, deve o ato de

17 OLIVEIRA, Celso Marcelo. Op. Cit., p. 509.

Page 14: TEORIAS DOS CRIMES FALIMENTARES

alguma forma trazer prejuízo ao credor de modo subseqüente, vez que a insolvência

decorrente da situação afasta a pretensão de adimplemento imediato da obrigação pretendida.

Segundo Trajano de Miranda Valverde, citado por OLIVEIRA “o eventus damni existe

quando o ato praticado pelo devedor concorre para diminuir as garantias que seu patrimônio

oferecia aos credores e, de tal forma, que o que lhe sobra não basta para a satisfação completa

deles18”.

Ocorre que a insolvência pode não decorrer diretamente do ato, mas de uma

sequencia de atos praticados pelo devedor ou terceiros, o que torna o aferimento do elemento

objetivo bastante difícil e complexo.

Assim surge a discussão sobre a necessidade da demonstração do nexo causal entre a ação entre a intenção de dano e o dano real produzido. Portanto, demonstrado o nexo causal entre a ação ou omissão e o estado de crise econômico-financeiro é possível torná-lo inefixaz19

No que diz respeito ao elemento subjetivo, ou seja, o consilium fraudis, temos que

este é a consciência de estar causando um dano no processo falimentar. É, a grosso modo, o

liame psicológico, o animus de prejudicar o andamento do processo de execução coletiva,

embaraçando assim o adimplemento das obrigações a que os credores fazem jus.

Todavia, deve-se ressaltar que o conhecimento do estado de insolvência do devedor

pelo terceiro que com ele contrata é chamado de scientia damni, devendo-se destacar ainda

que a fraude que dá ensejo ao ajuizamento da ação revocatória não prescinde da presença do

animus nocendi. Basta a intenção especifica de prejudicar e a consciência de que o ato

praticado acarretará em danos aos credores.

Deste modo, verificamos que para o ajuizamento da demanda em questão faz-se

necessário que o promovente comprove a existência dos elementos objetivos e subjetivos do

ato que busca revogar, sob pena de indeferimento de seu pedido. Assim, torna-se importante a

analise minuciosa dos fatos, com provas documentais ou até mesmo testemunhais para

comprovar a existência do consilium fraudis e do eventus damni.

3.4. Aspectos processuais da ação revocatória

18 OLIVEIRA, Celso Marcelo. Op. Cit., p. 506.19 OLIVEIRA, Celso Marcelo. Op. Cit., p. 506

Page 15: TEORIAS DOS CRIMES FALIMENTARES

O próprio regulamento falencial determina que a ação deve ser conhecida e julgada

pelo juiz falimentar que conhece da Ação de Falência propriamente dita, devendo correr em

apenso aos autos principais de Falência, reconhecendo-se assim a competência universal do

juízo falimentar para conhecer das ações referentes à causa principal.

Ademais, no que tange ao rito que deve ser observado, a própria lei de Falências, em

seu art. 134 afirma que “a ação revocatória correrá perante o juízo da falência e obedecerá ao

procedimento ordinário previsto na Lei n o   5.869, de 11 de janeiro de 1973  - Código de

Processo Civil”.

Deste modo, além dos pressupostos específicos referentes a ação revocatória em si, o

procedimento em questão deverá também obedecer os quesitos listados nos arts. 282 e 283 do

Código de Ritos pátrios.

Os elementos específicos são aqueles já enumerados acima, a saber, os elementos

objetivos e subjetivos conhecidos como Consilium Fraudis e Eventus Damni,

respectivamente. Tais quesitos são retirados pela doutrina a partir da leitura do art. 130 da lei

11.101/05 que afirma serem “revogáveis os atos praticados com a intenção de prejudicar

credores, provando-se o conluio fraudulento entre o devedor e o terceiro que com ele contratar

e o efetivo prejuízo sofrido pela massa falida”. Análise mais pormenorizada já foi feita em

tópico anterior, motivo pelo qual nos resguardamos a apenas citar tais requisitos.

Passando a diante, temos que a legitimidade ativa e passiva da ação em questão

também já se encontra delineada pela própria legislação falimentar.

3.4.1. Legitimidade Ativa

No que atine à legitimidade ativa o art. 132 aduz que “a ação revocatória, de que

trata o art. 130 desta Lei, deverá ser proposta pelo administrador judicial, por qualquer credor

ou pelo Ministério Público no prazo de 3 (três) anos contado da decretação da falência”.

A atribuição da propositura pelo Administrador Judicial da Massa Falida é inerente à

sua função, vez que é seu dever resguardar, administrar e organizar os bens da Massa para que

futuramente possam prover as obrigações da empresa falida junto aos credores, sendo seu

dever diligenciar a proteção dos interesses destes credores.

Para a doutrina, em sua maioria, a legitimidade do credor ou do Ministério Público

seriam subsidiária a do Administrador, só podendo, em decorrência deste entendimento,

referidas pessoas ajuizarem a ação revocatória após a inércia do “legitimado geral”, por assim

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dizer. Todavia, esse não nos parecer ser o entendimento mais correto, visto que não se poder

esperar que os credores, maiores interessados na resolução da falência, ou o próprio parquet,

na sua função de fiscal da lei, aguardem por certo prazo a inércia do Administrado Judicial da

Massa para agirem. Seria, no mínimo, irrazoavél.

Deve-se ainda ter em mente que o principal interesse defendido na ação é o interesse

da massa falida, e não do devedor, avalistas ou fiadores, mesmo por que esses não podem se

beneficiar da ineficácia.

3.4.2. Legitimidade Passiva

No que diz respeito à legitimidade passiva, o art. 133 da Lei 11.101/2005 (Lei de

Falência e Recuperação de Empresas) é clara ao afirmar que

Art. 133. A ação revocatória pode ser promovida:I – contra todos os que figuraram no ato ou que por efeito dele foram pagos, garantidos ou beneficiados;II – contra os terceiros adquirentes, se tiveram conhecimento, ao se criar o direito, da intenção do devedor de prejudicar os credores;III – contra os herdeiros ou legatários das pessoas indicadas nos incisos I e II do caput deste artigo

Pontes de Miranda, citado por OLIVEIRA, afirma que a” ação revocatória falencial

dirige-se contra o receptor da prestação a respeito da qual se pede a retirada da vox do devedor

ou sicessor. Porem, não se pode negar a posição passiva do devedor, também ele há de ser

citado.20”

Assim, não nos parece restar qualquer dúvida quanto a legitimidade passiva daqueles

que afiguram no negocio que se deseja revogar, seja como garantidor ou garantido, ou como

beneficiário, ou contra qualquer de seus herdeiros ou legatários em caso de morto.

3.4.3. Do prazo para ajuizamento da Ação Revocatória

Novamente o próprio dispositivo de lei nos traz a rsposta de maneira clara a questão

processual ao afirmar no final do art. 132 que o prazo será de 3 (três) anos a contar da data de

decretação de falência, e não do cometimento ou da ciência do ato que se busca revogar.

20 OLIVEIRA, Celso Marcelo. Op. Cit., p. 512.

Page 17: TEORIAS DOS CRIMES FALIMENTARES

Resta saber se se trata de prazo decadencial ou prescricional.

Neste sentido, Trajano de Miranda Valverde cita de forma límpida que “a prescrição

pressupõe um direito já adquirido e que se perde com o não exercício; a decadência pressupõe

um direito que se pode adquirir, agindo em certo tempo, que transcorrido inteiramente,

impede a aquisição do direito21”.

Assim entendemos que o prazo de que fala o artigo supracitado não pode ser visto

como prescricional, mas sim, decadencial. Assevera nesse sentido PONTES DE MIRANDA,

enumerando ainda os efeitos práticos de tal conceituação, afirmando que “a regra jurídica, que

firmou ‘é o da preclusão’. Mao há suspensão nem interrupção do prazo. É de decadência o

prazo, por isso mesmo, insuspensível.22”

3.4.4. Efeitos da sentença da Ação Revocatória

É a sentença que julga referida ação, como visto alhures, de natureza Constitutiva

Negativa. O art. 135 da Lei 11.101/2005 aduz que a “sentença que julgar procedente a ação

revocatória determinará o retorno dos bens à massa falida em espécie, com todos os

acessórios, ou o valor de mercado, acrescidos das perdas e danos”, servindo assim a seu

objetivo precípuo, qual seja, restituir à Massa Falida o bem usurpado por meio de ato

fraudulento que visou impedir o processamento devido da Falência.

Assim, devem as partes retornarem ao status quo ante diante da sentença de

procedência da ação em comento, resguardando-se ao contratante de boa-fé o direito à

restituição dos bens ou valores entregues ao devedor, nos termos do art. 136 e seus parágrafos.

Como ocorre em qualquer processo, a ação revocatória também se encontra

prejudicada por um problema que se faz presente em todo o Judiciário, qual seja, o da

morosidade processual. Assim, visando resguardar a eficácia da medida requestada, para que

após o possível grande lapso temporal que possa decorrer entre a propositura da ação e seu

julgamento, a lei de Falência, em seu art. 137, prevê a possibilidade de o juiz, a requerimento

da parte, e observando os pressupostos do CPC, conceder medida preventiva (cautelar) de

seqüestro dos bens retirados do patrimônio do devedor que estejam em posse de terceiro.

Assim, por fim, cabe destacar ainda que da sentença que julgar referida ação caberá

apelação nos termos do Código de Ritos pátrio.

21 VALVERDE, op. cit., p. 78.22 MIRANDA, op. cit., p. 69.

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3.5. Revogação de ato mesmo que praticado com base em decisão

judicial

Por fim, mas não menos importante, cabe trazer a baila no presente estudo a questão

da revogação de ato mesmo que praticado com base em decisão judicial transitada em julgado.

Tal situação nos é trazida através do art. 138 da lei 11.101/2005, que afirma que “o ato

(fraudulento) pode ser declarado ineficaz ou revogado, ainda que praticado com base em

decisão judicial.”

À primeira vista, pode parecer que se trata de uma espécie de usurpação da

“competência” delegada à Ação Rescisória insculpida no CPC, cujo prazo decadencial é de 2

anos da sentença impugnada. Todavia, uma analise pormenorizada retira esta idéia. Vejamos.

Explica OLIVEIRA

A ação revocatória não visa rescindir a sentença, mas ao reconhecimento de sua ineficácia em relação a Massa Falida para declaração que mentem integro o ato judicial em tudo aquilo que não se inclua como efeito danoso À massa. A competência é do juízo universal da Falência. Só neste caso vale indagar se o ato, formalmente valido, contaminou-se do propósito fraudulento de lesar credores da falida.23

Assim vemos que o objeto da ação em comento não pode se confundir com o da ação

rescisória, posto que visa unicamente a declaração de ineficácia do ato fraudulento, e não a

impugnação da sentença em sua totalidade e formalidade, permanecendo validos os atos não

maculados pelo ato revogado.

O próprio autor acima citado afirma ainda e de maneira sábia que não se admitindo a

ineficácia da sentença para com os atos inerentes a massa falida, teríamos inúmeros casos de

processos simulados, o que macularia todo o ordenamento jurídico do país.

Por fim e de maneira conclusiva e elucidativa, cabe trazer o ensinamento de

PACHECO que afirma de maneira sábia que mesmo estando o ato fraudulento resguardado

por uma sentença judicial transitada em julgado, seja por que o juiz da causa não percebeu a

simulação, seja por qualquer outro motivo, “nem por isso, tais atos fraudulentos, praticados

com a intenção de prejudicar credores, podem deixar de ser revogados, desde que se prove a

fraude do devedor e do terceiro.24”

23 OLIVEIRA, Celso Marcelo. Op. Cit., p. 512.24 PACHECO, Jose da Silva. Processo de Falência e Concordatas: comentários à lei de Falências: Doutrina, prática e Jurisprudência. Rio de Janeiro.

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4. CONCLUSÃO

Através do presente estudo pudemos conhecer as teorias acerca da Natureza Jurídica

dos crimes falimentares, posicionando-se inclusive no sentido de adotar uma das teorias sem

contudo desprezar as demais, que, de certo modo, complementam-se umas às outras.

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Num segundo momento, pudemos ainda conhecer de maneira mais ampla o instituto

tão importante da ação revocatória, cujo objetivo é tão importante no ordenamento pátrio para

o cumprimento efetivo da execução coletiva que ocorre na Falência em si.

Com isso julgamos ter atingido nosso objetivo que era uma análise dos referidos

institutos através do estudo ora elaborado.

5. BIBLIOGRAFIA

1. GUERRA, Èrica, e LITRENTO, Maria Cristina Frascari. “Nova Lei de Falências. Lei 11.101 de 9/2/2005 Comentada”. EZN Editora, Campinas-SP, 2005;

2. SHEREDER, Magno; THIESEN, Renata Piovesan; DE PAULA, Silmar; e CERQUEIRA, Marcio Rodrigues. “Crimes Falimentares”. Publicado no sítio

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eletrônico da Universidade de Guripi (UNIRG). http://professores.unirg.edu.br/roveroni/dir_arq/com/com_03/sem_falencias_arq/2004_01/05_crimes_falimentares_2004_1.pdf;

3. OLIVEIRA, Celso Marcelo. “Comentários à Nova Lei de Falências”. 1ª ed. São Paulo, IOB Thonson Editora;

4. REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Falimentar. 16ª ed. São Paulo: Saraiva, 1.995;

5. VALVERDE, Trajano de Miranda. Comentários à Lei de Falências. 3. ed. rev. atual. São Paulo: Forense, 1962. v. 3;

6. STEVENSON, Oscar. Do crime falimentar. São Paulo: Livraria Acadêmica, Saraiva & Cia, 1939. p. 59;

7. TRONCOSO, José Jr..Direito Penal Falimentar. São Paulo: Saraiva, 1986. p. 02.

8. MIGLIARI JR., Arthur. Crimes Falimentares. São Paulo: CS Edições Ltda., 2002. p. 15

9. PROVINCIALE, Renzo. Manuale de Direito Falimentare

10. PACHECO, Jose da Silva. Processo de Falência e Concordatas: comentários à lei de Falências: Doutrina, prática e Jurisprudência. Rio de Janeiro

11. http://www.heraclito.com.br/Acao_Revocatoria.pdf

12. http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6631

13. http://professores.unirg.edu.br/roveroni/dir_arq/com/com_03/sem_falencias_arq/ 2004_01/05_crimes_falimentares_2004_1.pdf