teoria da culpa no erro médico
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Teoria da culpa no erro mdico
Tem-se que concordar com o que diz Hildegard Taggesell Giostri(1), em seu
livro Erro Mdico Luz da Jurisprudncia Comentada pois, fora de dvida, a
responsabilidade no erro mdico segue os mesmos ditames gerais daresponsabilidade civil genrica, ou seja, obrigao de quem, consciente e capaz,
praticar uma conduta, de maneira livre, com inteno de faz-lo ou com simples
culpa, ressarcir obrigatoriamente os prejuzos decorrentes do seu ato.
Mas, em se tratando de responsabilidade civil no erro mdico
indispensvel uma prova inequvoca de que houve culpa no proceder do mdico.
atribuio do paciente (autor, vtima) fazer prova de que o profissional mdico
laborou com culpa. Isso porque o Cdigo Civil Brasileiro, em seu artigo 1545(2) (e
art. 159 do mesmo Cdigo), adotou a teoria subjetiva teoria da culpa - que
depende da presena de culpa no agir do agente causador do dano, no caso, o
mdico. Da a definio de erro mdico dada por Jlio Cezar Meirelles Gomes e
Genival Veloso Frana em sua obra "Erro Mdico"(3):
"Erro Mdico a conduta profissional inadequada que supe uma inobservnciatcnica, capaz de produzir um dano vida ou sade de outrem, caracterizada porimpercia, imprudncia ou negligncia".
A impercia, a imprudncia ou a negligncia, estando presentes em um ato mdico
que cause dano a um paciente, caracterizam a presena de culpa. Mas essa culpatem que ser provada pelo paciente, seu o nus da prova. Como diz Miguel KfouriNeto(4): "Segundo a teoria subjetiva, esposada pelo nosso Cdigo Civilespecialmente em seus arts. 159 e 1.545, vtima incumbe provar o dolo ou culpastricto sensu do agente, para obter a reparao do dano". Sobre isso, convenienteacrescentar o que diz A. Siqueira Montalvo(5): "Para a caracterizao da culpamdica, basta a simples voluntariedade de conduta, sendo portanto a intenodesnecessria, pois, a culpa ainda que levssima obriga a se indenizar". Mesmo que,em se tratando de vida humana, no se admita culpa "pequena ou levssima", sema prova desse elemento subjetivo da responsabilidade civil, a culpa, tudo h de serdebitado ao infortnio.
Nesse sentido tambm comenta Vera Maria Jacob de Fradera(6):
"A considerao da natureza da responsabilidade mdica como contratual no temcomo efeito tornar presumvel a culpa. ao paciente, ou, se for o caso, a seusfamiliares que incumbe demonstrar a inexecuo da obrigao, por parte doprofissional. Provada a culpa do profissional com relao aos cuidados dispensadosao doente, ser aquele constrangido reparao do dano causado".
Em acrdo, do qual a ementa vai abaixo transcrita, evidencia-se a necessidade dademonstrao, via de regra, da culpa na conduta do profissional em casos de erromdico:
"RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO ESTTICO. ERRO MDICO NO-CONFIGURADO. O
tratamento ministrado a paciente sendo o adequado molstia apresentada,submetido com as cautelas recomendadas e no havendo prova de ter o
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profissional da medicina se equivocado, por imprudncia, negligncia ou impercia,ao ministr-lo, no h como pretender a obrigao de indenizar, porque noconfigurado comportamento culposo que implique responsabilidade civil. Recursoimprovido".(7)
Essa culpa, emergindo do artigo 1545 do Cdigo Civil ptrio que abraou ateoria da culpa, no que se refere a mdicos, consiste num agir ou no agir
consciente, voltado busca de um resultado determinado ( um querer
deliberadamente realizar certa conduta) ou quando a imprudncia, impercia ou
negligncia estiverem presentes nos atos desses profissionais. A negligncia, do
latim neglegentia (de neglegera) tem caracterstica omissiva um ato de omisso
aos deveres que um caso exigir seria uma absteno do comportamento indicado
para aquela situao um no agir (inao, inrcia, indolncia, preguia psquica);
a imprudncia, do latim imprudentia, tem caracterstica comissiva um ato
precipitado, intempestivo, irrefletido seria um agir sem a cautela necessria no
caso; a impercia, do latim imperitia (de imperitus), se caracteriza por um agir sem
conhecimentos tcnicos suficientes ou com m aplicao dos conhecimentos que
possuir seria uma falta de maestria na profisso um agir incompetente, inbil.
Uma dessas formas de culpa deve estar no agir do mdico, em caso de erro, como
diz o acrdo(8): "Para efeito de responsabilizao por erro mdico, cedio que a
culpa, em uma de suas formas tradicionais, h que ficar devidamente
comprovada".
Ensina Miguel Kfouri Neto(9):
"No propriamente o erro de diagnstico que incumbe ao juiz examinar, mas simse o mdico teve culpa no modo pelo qual procedeu ao diagnstico, se recorreu ouno, a todos os meios a seu alcance para a investigao do mal, desde aspreliminares auscultaes at os exames radiolgicos e laboratoriais todesenvolvidos em nossos dias, mas nem sempre ao alcance de todos osprofissionais bem como se doena diagnosticada foram aplicados os remdios etratamentos indicados pela cincia e pela prtica".
o que acontece no erro profissional, pois sendo o erro, intrnseco s
insuficincias da profisso mdica e s caractersticas do ser humano, como
paciente, o erro existe e acontecer. Nesse caso no pode a culpa pelo mesmo ser
imputada ao mdico. escusvel tal erro e invencvel. H que se diferenar entre
um erro que resulte de algo imprevisvel, tendo o mdico, cnscio de seus deveres,
atuado com as precaues devidas, dentro do razovel para as circunstncias, que
pode-se chamar de erro honesto, daquele erro que vem acompanhado da culpa
erro culposo - resultando em leso aos direitos do paciente, que teriam sido
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evitados com uma atitude profissional competente, ou seja, no caracterizada pelo
agir com imprudncia, negligncia ou impercia.
Compete ao juiz, pois, verificar se houve culpa e, sobre isso, conveniente
lembrar o que diz, em seu livro, Suzana Lisba Lumertz(10): "No preciso que a
culpa do mdico seja grave: basta que seja certa". Tem que haver certeza na
presena de culpa, no agir do mdico como, tambm, assevera o acrdo(11): "A
atribuio de responsabilidade e condenao por erro mdico exige elementos
objetivos e seguros e no meras possibilidades ou conjecturas de que males que
surgem aps a interveno mdica sejam frutos dessa interveno".
Esse agir culposo do mdico necessita do nexo causal, ou seja, deve ser o
causador do dano ao paciente. Assim, tem-se os trs pressupostos da
responsabilidade civil, no caso, do mdico, o ato lesivo (culposo), o dano e
o nexocausal. Esses, quando ocorrem juntos, geram a obrigao de indenizar. Na
falta de um deles, no caso o nexo causal, no h porque haver indenizao, como
bem ilustra o acrdo em sua ementa:
"APELAO. RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO MDICO. AUSNCIA DE NEXO CAUSALENTRE A AO DO MDICO E O RESULTADO. Ausente o nexo causal entre a ao eo resultado, resta afastada a responsabilidade civil do mdico. Apelo desprovido".(12)
Tambm nesse sentido h o acrdo(13): "Entendo, assim, no ter agido
com culpa o demandado em qualquer de suas formas. O nexo causal est ausente".
A teoria da res ipsa loquitur, ou in re ipsa ou "de que a coisa fala por si
mesma" aplicada quando ocorre prejuzo, por fatos que no causariam dano, a
no ser que o agente lesante tenha obrado com culpa (qualquer forma). Nesses
casos o juiz diante da evidncia de erro mdico (podendo at mesmo serem
dispensados os peritos) chega ilao e admite a culpa do profissional, como uma
evidncia circunstancial, de que tal fato no teria acontecido sem a culpa domdico. Isso ocorre, por exemplo, em caso de morte do doente ou amputao de
um membro. H, assim, presuno de culpa contra o mdico, conforme o seguinte
acrdo:
"APELAO CVEL. RESPONSABILIDADE MDICA. OFTALMOLOGISTA. CIRURGIAELETIVA DE CORREO DE MIOPIA. SUBSEQENTE PERDA DA VISO. APLICAO DADOUTRINA DA CULPA IN RE IPSA. DANOS MATERIAIS E MORAIS. Merece ser acolhidapretenso de indenizao (por gastos mdicos e de terapia psicolgica) e dereparao (por dano moral) de quem submetendo-se a cirurgia de eleio, paracorreo de deficincia em um dos olhos, vem a obter, como resultado, a perda de
viso. Ainda que se no flagre a uma obrigao de resultado, inegavelmente dessase aproxima a denominada cirurgia funcional, merecendo ser responsabilizado o
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mdico que, por razes insuficientemente comprovadas, no s no logra xito -que no lhe era exigido - mas termina por deixar o paciente em situaoextremamente pior do que se encontrava antecedentemente, pois sem visojustamente no olho operado. Merece prestgio, em casos que tais, a doutrina daculpa in re ipsa, na medida em que o sistema de responsabilidade civil do mdico o da responsabilidade subjetiva (art. 1545 do Cdigo Civil)".(14)
Tambm tem por objeto a avaliao da culpa a teoria da "perda de umachance" (perte dune chance(15)). Admite-se, nessa teoria, que a culpa do mdicotenha comprometido as possibilidades de viver do paciente ou a sua integridade. Ojuiz no precisa estar convencido de que o prejuzo leso ao paciente foicausado por culpa do mdico, pois, segundo essa teoria, necessrio apenas advida de que isso aconteceu por culpa do mdico. H, assim, aqui tambm,presuno de culpa contra o mdico. Os tribunais aceitam o nexo causal existenteentre dano e culpa, pois ela se constitui no fato de no ter dado o mdico todas asoportunidades ao paciente. O doente no teve todas as chances a que tinha direitode se recuperar. A referida teoria tem sua aplicao, em nossos Tribunais, bemdemonstrada atravs da transcrio da ementa de acrdo que tem por relatorconhecido jurista gacho:
"Responsabilidade civil. Falha do atendimento hospitalar. Paciente portador depneumonia bilateral. Tratamento domiciliar ao invs de hospitalar. Perda de umachance. responsvel pelos danos, patrimoniais e morais, derivados da morte dopaciente, o hospital, por ato de mdico de seu corpo clnico que, aps terdiagnosticado pneumonia dupla, recomenda tratamento domiciliar ao paciente, aoinvs de intern-lo, pois, deste modo, privou-o da chance (perte dune chance) detratamento hospitalar, que talvez o tivesse salvo. 2. Apelao provida. votovencido".(16)
A teoria da culpa nem sempre conveniente na abordagem do mdico em
sua atividade como profissional liberal, conforme nos explana Oscar Ivan Prux(17):
"A teoria da culpa no adequada para ser aplicada em todos os casos de
responsabilidade civil de ordem pessoal dos profissionais liberais. Nas obrigaes
"de resultado", ela se revela inadequada e, nas agresses aos direitos dos
consumidores que so perpetradas atravs de condutas e prticas de mercado (na
oferta, na propaganda enganosa, na cobrana de dvidas, no uso de prticas e
clusulas abusivas, etc.) ela se revela alm de inadequada, quase impertinente.
Exemplo: por dispositivo expresso do Cdigo de Defesa do Consumidor (art.
38), havendo publicidade/propaganda que seja enganosa, quem tem de provar a
veracidade da mesma o fornecedor, logo a teoria subjetiva fundada na
demonstrao antecipada da culpa por parte de quem acusa, revela-se, nesse caso,
ser totalmente inadequada at impertinente".
No Projeto atual de Cdigo Civil Brasileiro, a teoria da culpa mantida.
Nota-se porm, a supresso do art. 1545 do Cdigo Civil Brasileiro vigente,(18)tendo a responsabilidade civil no erro mdico, nesse Projeto, seu regramento
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englobado na legislao geral da responsabilidade civil. Nele os artigos que tratam
deste assunto so: arts. 929 a 945, que regram a obrigao de indenizar e os arts.
946 a 956, os quais tratam da indenizao nos casos de responsabilidade civil. O
Senado Federal, ao analisar o projeto, no parecer de n 842, de 1997, esquematizou
o tema da seguinte maneira: "Parte Especial Livro I - Do Direito das Obrigaes,
Captulo I Da Obrigao de Indenizar, arts. 926 a 942 e Captulo II Da
Indenizao, arts. 943 a 953".
Nota-se, pela leitura do Projeto, uma preocupao em aumentar a
amplitude do conceito de dano prejuzo abrangendo tambm o dano moral. O
vocbulo dano, etimologicamente, vem de demere que significa tirar, apoucar,
diminuir. Assim, classicamente, seria como uma diminuio do patrimnio, tanto do
ponto de vista material, como do ponto de vista moral.Para satisfao do dano, na responsabilizao do profissional mdico na
rea civil, tem que ser feita prova da sua culpa. Mas h necessidade de leso, pelo
ato mdico nexo de causalidade - a um bem jurdico, contrariando assim o
princpio: neminem laedere. As provas tm a funo de fazer emergir esse liame.
Tem que haver relao de causa e efeito entre o agir do mdico e o dano verificado.
Pelo Cdigo Civil ptrio, somente os danos diretos e efetivos so passveis de serem
ressarcidos pelo causador do damnum. necessria uma conduta com culpa em
sentido estrito e a previsibilidade (evitabilidade do procedimento antijurdico)
constitui o ponto nuclear da culpa - sendo com esse proceder violada uma norma
com um conseqente resultado lesivo. No havendo damnum, no haver lugar
para configurao de delito, salvo se a conduta do mdico, por si s, j prevista
como fato punvel. Caso contrrio, para se configurar o delito precisa acontecer a
transgresso ao dever de, na vida de relao, evitar danos a interesses e bens
alheios. O agir com impercia, imprudncia ou negligncia a ao delituosa que a
norma probe no caso de erro mdico.
H necessidade de ressarcimento de dois tipos de dano: a saber, o
patrimonial e o moral. O Cdigo Civil vigente refere-se s perdas e danos que nada
mais so que os prejuzos decorrentes, para o paciente, do erro mdico. A
palavra dano tem significao ampla no Cdigo Civil Ptrio atual, abrangendo tanto
os danos materiais (leso aos direitos reais e pessoais), como os danos morais
(direitos da personalidade e da famlia). Nesses est includo, como espcie, o dano
esttico(19). Se qualquer desses danos ocorre, por erro mdico, h necessidade de
averiguar-se qual a repercusso econmica negativa que causaram ao paciente
vtima do erro mdico. Sendo o dano material (incluindo o dano emergente(20) e os
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lucros cessantes(21)), ser indenizvel pelo valor da detrimncia no patrimnio do
paciente. Sobre os lucros cessantes, diz Jurandir Sebastio(22): "Perspectivas de
ganho futuro ou lucro potencial, hipottico e aleatrio, no so contempladas".
O dano moral ficou, a partir da Constituio Federal de 1988, admitido
explicitamente no art. 5, inciso X(23), e ser o valor da indenizao determinado
em juzo. Ensina-nos Jos de Aguiar Dias(24): "Ora, o dano moral o efeito no
patrimonial da leso de direito e no a prpria leso , abstratamente
considerada". conclusivo o que diz Miguel Kfouri Neto(25): "O dano moral puro
gera obrigao de reparar luz do art. 159, do C.C., que nodistingue entre
direitos patrimoniais e no patrimoniais".
Excluem a responsabilidade do mdico o caso fortuito e a fora maior, a
interferncia de terceiros, agindo com dolo ou culpa e no estando subordinados aomdico e a conduta com culpa do paciente, alterando assim, essas situaes
citadas, a relao de causalidade. Se houver culpa exclusiva do paciente a relao
de responsabilidade, envolvendo o mdico, desaparece.
Em caso de culpa concorrente mdico e paciente no vai haver excluso
da responsabilidade, mas cada uma das partes, envolvidas no atendimento mdico,
vai responder por uma parcela da culpa que lhe couber. A responsabilidade vai ser
bipartida entre o profissional mdico e seu cliente. Nesse caso, o dever deindenizar, por parte do mdico, pode diminuir, se o paciente contribuiu para a
produo do evento danoso. Isso pode acontecer, por exemplo, no caso de o
paciente no seguir as orientaes mdicas ou omitir ao mdico informaes
importantes. O concurso de culpas caracteriza uma concorrncia de
responsabilidades que justificam uma diminuio do valor da indenizao princpio
da indenizao proporcional nos casos de responsabilidade concorrente. No consta
no atual Cdigo Civil, mas o Projeto do Cdigo Civil, que tramita no Congresso,
explicitou o princpio em seu artigo 947: "Se a vtima tiver concorrido culposamente
para o evento danoso, a sua indenizao ser fixada, tendo-se em conta a
gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano". Esse princpio se
explica pela anlise atravs da teoria da causalidade adequada(26), ou seja, o que
levado em considerao o grau de causalidade bilateral cada um
responsabilizado apenas pelo parcela do damnum da qual foi o causador. Por ter
fora jurdica, por lgico e justo, a aplicao desse princpio da indenizao
proporcional, mesmo ausente no atual direito positivo brasileiro, tem aplicabilidade
na prtica judiciria. Portanto, a conduta do paciente considerada na avaliao da
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culpa, como afirma o acrdo(27): "Por bvio tudo pode ser afastado ao longo do
feito, posto que vrios fatores havero de ser examinados, desde a conduta dos
agravados como tambm a cooperao positiva ou negativa da paciente para sua
recuperao".
Exoneram, tambm, o mdico, da responsabilidade civil, em caso de dano
ao paciente, a fora maior ou o caso fortuito. A fora maior considera-se um fato
natural, superior s foras humanas, no sendo possvel ao ser humano evitar sua
ao e conseqncias, apesar de identificada e previsvel. No se resiste a ele
mesmo que se queira. Portanto, a fora maior se caracteriza por ser um evento
externo relao mdico-paciente, ao contrrio do caso fortuito, em que a
caracterstica haver um acontecimento inerente pessoa humana. Por isso,
Rogrio Marrone de Castro Sampaio(28) chama a fora maior de fortuito externo.Ao caso fortuito ele chama de fortuito interno. O caso fortuito aquele fato que
decorre da conduta humana, tendo como caracterstica no poder ser previsto e
evitado pelos participantes da relao mdico-paciente. Assim, independe a sua
ocorrncia tanto do mdico, como do paciente. obra do acaso no esperado na
conjuntura do que est ocorrendo em um determinado momento. No h, em
qualquer instante, a atuao culposa do profissional mdico, tanto no caso fortuito,
como na fora maior. Ambos, caso fortuito e fora maior causam a mesma ao de
liberar o mdico do cumprimento da obrigao contratual. H exonerao da
responsabilidade civil do mdico se a leso ao paciente decorrente de caso
fortuito ou fora maior. O Cdigo Civil Brasileiro incluiu ambos em seu art. 1058(29)
pois, mesmo diferentes, suas conseqncias, seus aspectos prticos so os
mesmos.
H independncia entre as responsabilidades civil e penal, o que se
depreende da abordagem que faz Fabrcio Zamprogna Matielo(30) das
repercusses da sentena penal na rea cvel. Mas, a culpa estando juridicamente
determinada, advindo da uma condenao em termos penais, h efeitos na rea
cvel, tanto em uma ao por erro mdico, como em qualquer outra causa de
responsabilizao civil por dano a outrem. Semelhante a natureza jurdica da
repercusso penal na rea cvel, quer se trate de erro mdico ou ao de
responsabilidade civil em geral. O art. 1525 do Cdigo Civil assim dispe sobre essa
repercusso: "A responsabilidade civil independente da criminal; no se poder,
porm, questionar mais sobre a existncia do fato, ou quem seja o seu autor,
quando estas questes se acharem decididas no crime". No caso de uma deciso
penal condenatria, transitada em julgado, esta ser utilizada na rea cvel como
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um ttulo executivo, ou seja, h dispensa da instaurao de processo de
conhecimento para decidir sobre a matria, j que o mesmo se fez na rea penal.
Tem o paciente, com a sentena condenatria na rea criminal, em suas mos, um
ttulo executivo judicial (art. 584 do Cdigo de Processo Civil, em seu inciso II(31)).
Cabe a execuo desse, atravs do competente processo, para ser ressarcido dos
danos que sofreu com o erro mdico.
Caso a sentena penal for absolutria (dispe sobre isso o art. 386 do
Cdigo de Processo Penal, em seus incisos de I a VI(32)) por insuficincia de provas,
cabe a devida ao cvel por parte do paciente. Pode, atravs de um processo de
conhecimento, demonstrar no juzo cvel a validade da sua pretenso de
ressarcimento por danos decorrentes de erro mdico. Compete ao paciente provar
a existncia do fato, que lhe causou dano, e a culpa do mdico em demanda nojuzo cvel. Nesse sentido, expe-se a ementa de acrdo: "Responsabilidade civil.
Erro mdico. Absolvio criminal. Desimporta, aos efeitos da perquirio da
responsabilidade civil, que tenha sido o agente absolvido na esfera penal,
especialmente se o foi com fundamento no inciso VI do art. 386 do CPP
(insuficincia de provas). Danos materiais e lucros cessantes".(33)
Na hiptese de sentena absolutria por comprovada inexistncia do fato
alegado pelo paciente, torna-se invivel juridicamente qualquer demanda cvel. A
coisa julgada, nesse caso, impede a pretenso, em termos de responsabilidade civil,
conforme disposto na segunda parte do art. 1525 do Cdigo Civil. Se for o caso de
absolvio, por falta de prova conclusiva de que tenha acontecido o fato, aberto
est o caminho para a lide jurdica. Na rea cvel caber a demanda por
ressarcimento, por parte do paciente. Caber ao autor da ao fazer as provas da
existncia do fato.
Na eventualidade da ao penal concluir que o fato atribudo ao mdico
no se constitui num crime, danos porventura atribudos, pelo paciente, como de
autoria do mdico, podem ter sua indenizao reivindicada na rea do juzo cvel.
vlido citar, por ilustrativo, os casos de absolvio do mdico por
crime impossvel (em que o paciente que sofreu danos pode, assim mesmo, pleitear
ressarcimento na rea cvel), de falta de previso daquela conduta do mdico no
Cdigo Penal (o paciente tambm ter, sempre, o juzo cvel como possibilidade
para se recompor do prejuzo sofrido), de excluso do dolo na conduta do
mdico (h possibilidade de ressarcimento no juzo cvel), depresena de
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descriminantes putativas (tambm pode ser instaurada a devida ao civil de
responsabilizao civil) e de coao irresistvel ou ordem hierrquica (o responsvel
pelo ressarcimento o autor da ordem ou o responsvel pela coao).
O prazo prescricional para ingressar com uma ao de indenizao pelos
danos sofridos por parte do paciente regulado pelo art. 177 do Cdigo Civil ptrio,
que estabelece ser vintenria a prescrio. O prazo passa a ser contado da
constatao do dano. Sobre isso manifesta-se Jos de Aguiar Dias(34):
"A durao do prazo prescricional da ao de reparao do dano objeto
de severas crticas por parte de muitos juristas, que censuram no legislador
conservar, em face do ritmo da vida moderna, critrio cabvel nos remotos tempos
em que as comunicaes se resumiam na precariedade e na lentido das viagens a
cavalo".
NOTAS
1. GIOSTRI, Hildegard Taggesell. Erro Mdico Luz da Jurisprudncia
Comentada. Curitiba: Juru, 1998, p.38.
2. Art. 1545 do Cdigo Civil Brasileiro: "Os mdicos, cirurgies,
farmacuticos, parteiras e dentistas so obrigados a satisfazer o dano, sempre que
da imprudncia, negligncia, ou impercia, em atos profissionais, resultar morte,inabilitao de servir, ou ferimento".
3. GOMES, Julio Cezar Meirelles; FRANA, Genival Veloso. Erro Mdico Um
Enfoque Sobre Sua Origem e Conseqncias. Montes Claros (MG): Unimontes, 1999,
p.25.
4. KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Mdico. 3.ed. So Paulo:
Revista dos Tribunais, 1998, p.49.
5. MONTALVO, A. Siqueira. Erro Mdico Teoria, Legislao e
Jurisprudncia. Campinas/SP: Julex, 1998, v.I, p.19.
6. FRADERA, Vera Maria Jacob de. A Responsabilidade Civil dos
Mdicos. Ajuris: Revista da Associao dos Juizes do Rio Grande do Sul. Porto
Alegre, v.55, p.123.
7. TJRS Processo n 598014397 6 Cmara Cvel Rel. Joo Pedro Freire
- 07/04/99.
8. TJRS Processo n 595184680 6 Cmara Cvel Rel. Jorge Alcibades
Perrone de Oliveira 06/08/96.
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9. KFOURI NETO, Miguel. Op. cit., p.76-77.
10. LUMERTZ, Suzana Lisba; LUMERTZ, Paulo Roberto Rukatti Lumertz;
LUMERTZ, Marcelo Lisba.Responsabilidade Jurdica do Mdico. Porto Alegre:
Renascena, 1997, p.38.
11. TJRS Processo n 595064916 6 Cmara Cvel Rel. Milton Carlos
Lff 31/10/95.
12. TJRS Processo n 598548873 6 Cmara Cvel Rel. Joo Pedro
Freire 25/08/99.
13. TJRS Processo n 598438307 4 Grupo de Cmaras Cveis Rel.
Maria Berenice Dias 13/08/99.
14. TJRS Processo n 598068245 6 Cmara Cvel Rel. Antnio Jandyr
DallAgnol Jnior 11/11/98.
15. Criada pela jurisprudncia francesa a partir de 1965.
16. TJRS Processo n 596070979 5 Cmara Cvel Rel. Araken de Assis
15/08/96.
17. PRUX, Oscar Ivan. Responsabilidade Civil do Profissional Liberal no
Cdigo de Defesa do Consumidor.Belo Horizonte: Del Rey, 1998, p.188.
18. No Cdigo Civil ptrio, em vigncia, so abordados os temas da
responsabilidade civil, em geral, nos arts. 1.518 a 1.553: "Das Obrigaes por atos
ilcitos", nos arts. 1.518 a 1.532; "Da Liquidao das Obrigaes", que se compe de
"Disposies Gerais" e "Da liquidao das Obrigaes Resultantes de Atos Ilcitos",
nos artigos 1.533 a 1.553.
19. No caso, por exemplo, de uma mulher ser a lesada, a maior ou menor
beleza fsica , anterior, vai influir significativamente no arbitramento do valor da
indenizao por dano moral (dano esttico).
20. O que efetivamente perdeu a vtima de erro mdico.
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21. O que deixou de ganhar. Aquilo que, realmente, o paciente, vtima de
erro mdico, deixou de auferir no exerccio de seu trabalho em decorrncia direta
da leso sofrida.
22. SEBASTIO, Jurandir. Responsabilidade Mdica Civil, Criminal e tica -
Legislao Positiva Aplicvel. Belo Horizonte: Del Rey, 1998, p.36.
23. Art. 5, inciso X da CF: "- so inviolveis a intimidade, a vida privada, a
honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenizao pelo dano
material ou moral decorrente de sua violao;".
24. DIAS, Jos de Aguiar. Da Responsabilidade Civil. 10.ed. Rio de Janeiro:
Forense, 1995, v.2, p.737.
25. KFOURI NETO, Miguel. Op. cit., p.184.
26. Dentro da tica do direito, a teoria da causalidade adequada procura
qual a mais provvel e compatvel causa circunstancial do fato danoso, inclusive
cronologicamente, e, assim, poder atribuir ao agente o dever obrigacional de
ressarcir o lesado. Levando-se em conta o que ocorre habitualmente, uma
determinada condio a adequada para desencadear o fato, se o ato efetuado
pelo agente que lesou foi significativo para ocasionar o dano. Ao contrrio ser a
no adequada e sem significao, se para ocasionar o dano for totalmente
indiferente a presena desta condio, tendo este dano ocorrido por motivos fora
do normal e extraordinrios que ocorreram num determinado caso.
27. TJRS Proc. n 596045534 6 Cmara Cvel Rel. Osvaldo Stefanello
04/06/96.
28. SAMPAIO, Rogrio Marrone de Castro. Direito Civil - Responsabilidade
Civil. So Paulo: Atlas, 2000, p. 85
29. Art. 1.058 do Cdigo Civil Brasileiro: "O devedor no responde pelos
prejuzos resultantes de caso fortuito, ou fora maior, se expressamente no se
houver por eles responsabilizado, exceto nos casos dos arts. 955,956 e 957.
Pargrafo nico. O caso fortuito, ou de fora maior, verifica-se no fato necessrio,
cujos efeitos no era possvel evitar, ou impedir".
30 MATIELO, Fabrcio Zamprogna. Responsabilidade Civil do Mdico. Porto
Alegre: Sagra Luzzato, 1998, p.179-194..
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31. Art. 584, inciso II do CPC: "So ttulos executivos extrajudiciais: II
sentena penal condenatria transitada em julgado;".
32. Art. 386 do CPP: "O juiz absolver o ru, mencionando a causa na parte
dispositiva, desde que reconhea: I estar provada existncia do fato; II no haver
prova da existncia do fato; III no constituir o fato infrao penal; IV no existir
prova de ter o ru concorrido para a infrao penal; V existir circunstncia que
exclua o crime ou isente o ru de pena (arts. 17,18,19,22 e 24, 1, do Cdigo
Penal); VI no existir prova suficiente para a condenao."
33. TJRS Processo n 595143801 4 Cmara Cvel Rel. Ramon Georg
Von Berg 15.05.96.
34. DIAS, Jos de Aguiar. Op. cit., p.710.
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