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Teologia das Religiões Rumo a um Inclusivismo bíblico Sílvio Murilo Melo de Azevedo Editora Clube de Autores 2015

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Teologia das Religiões

Rumo a um Inclusivismo bíblico

Sílvio Murilo Melo de Azevedo

Editora Clube de Autores

2015

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Copyright © Sílvio Murilo Melo de Azevedo, estando proibida a reprodução total ou

parcial desta obra sem o devido consentimento do autor.

Diagramação e revisão: Estefane de Oliveira e Murilo Oliveira

Azevedo, Sílvio Teologia das Religiões. Rumo a um Inclusivismo bíblico / Sílvio Murilo Azevedo – Editora Clube de Autores, 2015. pp. 327 1. Teologia – Teologia das Religiões – Hermenêutica – Pós-moderismo – Secularismo -Diálogo inter-religioso.

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Apresentação

Esta investigação tem como finalidade a construção de uma visão panorâmica da discussão hoje

transcorrente no Ocidente sobre o status do Cristianismo frente às outras religiões mundiais e as

disposições pós-modernas e pós-religiosas que pretendem por meio de uma relativização

generalizada equalizar todas as religiões, desprezando suas singularidades. Não buscamos, porém,

uma mera revisão bibliográfica das teorias de teólogos católicos, protestantes e evangélicos sobre o

tema, mas procuramos criar nossa própria teoria a partir de um retorno ao Novo Testamento, que tem

tratamento no último capítulo.

Obviamente, nosso ponto de partida não é um generalismo teológico aconfessional, até porque isto

não existe. Temos como referencial teórico a teologia evangélica e protestante mais moderada, visto

vermos nela a única possibilidade de manutenção para o mote reformado da sola Scriptura.

Conforme o próprio leitor verificará, isto não constitui impedimento para a inclusão de teólogos

católicos no projeto, porque, se não são adotados como textos fundantes no percurso, são, entretanto,

importantes companheiros de caminhada, com grandes contribuições para a assunção ao nosso

objetivo.

De resto, as ideias aqui apresentadas já foram em algum momento perfiladas por outros. Nossa

contribuição será agregar novos argumentos a elas, bem como perseguir uma hermenêutica bíblica

mais sólida, trazendo para esta discussão na área da Teologia Sistemática aportes provindos da

Teologia Bíblica, que é o que trato de fazer no penúltimo capítulo.

Procurei dar a este trabalho o máximo de utilidade possível, de modo que ele possa ser lido como um

manual à Teologia das Religiões, ou seja, que esclarece sobre as principais discussões e sobre os

principais debatedores, classificando-os, organizando-os e analisando seus resultados. Mas, além

disto também procuro fazer contribuições à discussão com a formulação de um Inclusivismo de

nossa própria lavra, pautado na teologia do reino de Deus, como ocorre na pregação de Jesus Cristo.

Se terei atingido ou não este objetivo, diga-o o leitor.

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Sumário

Introdução. A odisseia pós-moderna no oceano religioso..….12

1.a. Entre Cylla e Caribde.........................................................12 1.a.1. A demanda empírica..........................................15

1.a.1.a. Secularismo.........................................16 1.a.1.b. Pós-modernidade................................23

1.a.1.c. Globalização.........................................25 1.a.1.d. Mundialização do Cristianismo............33

1.a.1.e. O testemunho da história....................38 1.a.2. A demanda escriturística....................................40

1.a.2.a. Hermenêutica Teológica......................43 1.a.2.a.1. Fenomenologia da religião....44

1.a.2.a.2. Hermenêutica Pós-moderna..47 1.a.2.a.3. Hermenêutica normativa.......50

1.b. Status questionis da Teologia das Religiões.......................51

1.b.1. Introdução...........................................................51 1.b.2. Algumas taxonomias classificatórias...................62

2. Capítulo II. Exclusivismo........................................................69

2.a. Introdução..........................................................................69

2.b. Igreja Pré-constantiniana...................................................71

2.b.1. Evangelhos: textos polêmicos.............................72 2.b.2. O contexto religioso neotestamentário..............74

2.c. Exclusivismo Católico Romano...........................................84

2.d. Exclusivismo Protestante...................................................86

2.d.1. Karl Barth.............................................................88

2.d.2. Emil Brunner........................................................93

2.e. Exclusivismos de Organizações Ecumênicas, Evangélicos, Independentes e Pentecostais..............................................................................96

2.e.1. Organizações Ecumênicas...................................96 2.e.2. Evangélicos………..…………………………………………..102

2.e.2.a. Robert Sproul e Ronald Nash..............104

2.e.2.b. Gabriel Frackre….................................108 2.e.2.c. John R. W. Stott e J. E. Sanders...........109

2.e.3. Independentes...................................................113 2.e.3.a. Santos dos Últimos Dias......................114

2.e.3.b. Igreja Adventista do Sétimo Dia..........115 2.e.4. Pentecostais.......................................................116

2.e.4.a. Veli-Matti Kärkkäinen……………………….117 2.f. Conclusão...........................................................................119

3. Capítulo III. Inclusivismo.......................................................120

3.a. Introdução.........................................................................120 3.b. Inclusivismo Evangélico-Pentecostal.................................123

3.b.1. Clark Pinnock......................................................124 3.b.2. Amos Yong..........................................................129

3.c. Inclusivismo Católico Romano...........................................135

3.c.1. Karl Rahner..........................................................138 3.c.2. Jacques Dupuis....................................................141

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3.c.3. Edward Schillebeckx.....................................................145 3.d. Conclusão....................................................................................149

4. Capítulo IV. Pluralismo...................................................................150

4.a.Introdução....................................................................................150 4.b. Pluralismo Particularista.............................................................151

4.b.1. Jüngen Moltmann.........................................................154 4.c. Pluralismo Sintético…………………………………………………………………159

4.c.1. John Hick……………………………………………………………………167 4.c.2. Paul Knitter………………………………………………………………..175

4.c.3. Claude Geffré…………………………………………………………….180 4.c.4. Raimon Panikkar………………………………………………………..184

4.c.5. Michel Amaladoss………………………………………………………192 4.c.6. Hans Küng………………………………………………………………….195 4.c.7. Stanley Samartha……………………………………………………….199

4.d. Conclusão………………………………………………………………………………..201

5. Capítulo V. O “reino de Deus” e a Teologia das Religiões..............206

5.a. Introdução....................................................................................206

5.b. Escatologia da época de Jesus.....................................................209

5.b.1. Essênios.........................................................................217

5.b.2. Profetas de sinais..........................................................219

5.b.3. Profetas da destruição..................................................219

5.b.4. Fariseus..........................................................................221

5.b.5. Zelotes...........................................................................227

5.c. A escatologia de Jesus..................................................................229

5.c.1. O conceito de santificação de Jesus..............................231

5.c.2. A taumaturgia de Jesus..................................................241

5.d. Jesus e os Gentios.........................................................................247 5.d.1. A mesa aberta e o banquete escatológico....................251

5.d.2. A purificação do templo................................................255

5.d.3. O julgamento ético-práxico...........................................257 5.d.4. Abba...............................................................................259

5.e. Os Gentios e o programa missiológico de Jesus na redação das Fontes ................................................................................................................................................ ......

..............................................................................................................261 5.e.1. Marcos............................................................................261

5.e.2. Mateus............................................................................265 5.e.3. Lucas-Atos.......................................................................270

5.e.4. João.................................................................................277 5.f. Outras convergências neotestamentárias.....................................278

5.f.1. Paulo................................................................................273 5.g. Conclusão......................................................................................282

6. Capítulo VI. As religiões em face ao diálogo....................................286

7. Referências......................................................................................296

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Àqueles a quem devo tudo: Madalena, Estefane e Murilo.

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Abreviaturas

AR Approaching religion Ag. Ap. Against Apion Ant. Antiguidades Judaicas ATh Acta theologica BR Bible Review BEThS Bulletin of the Evangelical Theological Society BThT Biblical Theology Bulletin CBR Currents Biblical Research CR Cerpit Review Ciberteologia Revista de Teologia e Cultura Concilium International Journal of Theology CTP Cadernos de Teologia Pública EA Estudio Agustiniano EAPR East Asian Pastoral Review EF Educação e Filosofia EMQ Evangelical Missions Quarterly ER Ecumenical Review Études Guerra Guerra dos Judeus Horizons HTR Harvard Theological Review HTS Hervormde Teologiese Studies IR An International Review IRM International Review of Mission JES Journal of Ecumenical Studies JETS Journal of the Evangelical Theological Society Jeevadhara JHCS Journal of Hindu-Christian Studies JTR Journal of Theological Reflection L&S Letter & Spirit LS Louvain Studies Micromega Missiology An International Review NIB New Interpreters Bible NRT Nouvelle Revue Théologique Numen Revista de Estudos e Pesquisa da Religião PI Promotio Iustitiae Ribla Revista de interpretação bíblica latino-americana RTL Revue Theologique de Louvain RHPR Revue du Histoire et Philosophie Religieuse RP Raisons Politiques RS Religião e Sociedade ReS Religious Studies Spiritus SM Studia Missionalia ST Selecciones de Teología ST Scripta Theologica. Teocomunicação

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ThT Theology Today TC Teología y Cultura TD Theology Digest TJ Trinity Journal TS Theological Studies TTJ Torch Trinity Journal TV Teología y Vida VE Verbum et Ecclesia Voices WFI World Faiths Insights As abreviaturas da Bíblia seguem as da versão Revista e Atualizada de João Ferreira de Almeida.

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INTRODUÇÃO

1. A odisseia Pós-moderna no oceano religioso

1. a. Entre Cylla e Caribde

Como lembra Paul Ricoeur, o Cristianismo nasceu sob o signo da hermenêutica1.

Primeiro, porque vem ao mundo como interpretação do Antigo Testamento à luz do advento

de Jesus Cristo e de sua pregação – sem esquecer que o próprio AT também nasce do esforço

de entender a ação de Deus em Israel. Também, porque esta mesma interpretação canônica

agora dirige um convite aos ouvintes de outros tempos, que também interpretem sua existência

à luz do texto. Portanto, há uma cadeia de interpelações sobre o que Deus manifesta aos

homens, quando os chama a conhecer a salvação. Cada nova geração também interroga a

Palavra em busca da compreensão. Isto ocorre porque nem o texto que questiona os homens

nem estes que são questionados são entidades genéricas. A Palavra de Deus foi registrada e

transmitida por homens santos de certo lugar e tempo e não primariamente destinada a seus

ouvintes atuais. Cada leitor que não pertence a este círculo hermenêutico original é convidado

a empreender novamente o vórtice hermenêutico, infelizmente, descendente, num processo

dialético, como entendido por Sto. Agostinho: (crê para compreender e compreende para crer).

Em suma, cada novo tempo faz novas perguntas ao texto bíblico, para que, pelas

inesgotáveis riquezas da revelação divina, possam ser respondidas, e é esta traducibilidade, ou

seja, esta capacidade de falar a todos os homens, independendo de tempos e lugar (de suas

condições históricas, sociais, econômicas e geográficas), que possibilitou ao Cristianismo

tornar-se a religião de maior expansão mundial.

1 Paul Ricoeur. Le conflit des interprétations. Essais d’Hermeneutique (Paris, Éditions du Seuil, 1969), p. 372.

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Entretanto, uma conclusão tão pronta e evidente esconde perigos. Por exemplo, em que

medida deve-se fazer depender a mensagem bíblica da capacidade ou incapacidade de seus

leitores e ouvintes de interpretá-la? A traducibilidade da Escritura não pode ser entendida em

termos meramente humanos. A incapacidade hermenêutica pode resultar da contumácia e

rebeldia dos ouvintes (por causa de sua condição caída e parcialmente destituída da imago Dei)

e não da falta de habilidade dos pregadores. Também pode ser agravada pela rigidez de

instituições seculares e religiosas e por contextos histórico-sociais desfavoráveis a certas

verdades. Ou seja, os questionamentos humanos à Palavra de Deus não devem ser considerados

todos legítimos. Cada nova questão imposta pelos tempos à Palavra deve ser examinada pela

hermenêutica teológica, para que os homens e as culturas também sejam postos em questão.

Dentre as novas questões que os tempos nos trazem, queremos destacar em especial uma

referida ao âmago mesmo do Cristianismo, porque lida com sua identidade e seu legado num

contexto onde tais coisas têm sua importância limitada ao âmbito afetual: o mundo pós-

moderno. Nesta sociedade de relativismos tão onipresentes cabe perguntar: o Cristianismo

ainda possui uma mensagem sui generis a dar ao mundo, ou, pelo contrário, sua mensagem

religiosa é uma entre outras? Mantida a singularidade, impõe-se nova indagação: como pode o

evangelho relacionar-se com os ensinos das demais religiões sem ofendê-las e sem ofender

aqueles que, ainda acreditando-se cristãos, creem que o multiculturalismo e o Pan-ecumenismo

são valores?

2

Com justa razão diz-se que o problema hermenêutico atual é um “impasse de área”,

dado o número extraordinário de teorias antagônicas que se apresentam para resolver o

proposto problema. Alguns pensam que a mensagem cristã deve adotar um tom mais ameno e

conciliador, o que significa, por exemplo, considerar legítimos os esforços salvíficos das

2 Michel Barnes. Theology and the dialogue of religions (Cambridge: Cambridge University Press, 2002), p. 13.

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outras religiões. Outros creem que fazer isto implicaria tornar imperativo o descarte de todas

as passagens bíblicas que enfatizem a especificidade, a singularidade e exclusividade religiosa

do Cristianismo, o que não estão dispostos a fazer.

E aqui o impasse: não podemos fazer uma coisa ou outra, mas tampouco deixar de fazer

algo. Esta necessidade de contextualização da mensagem cristã nos empurra para uma práxis

que ainda hoje não conta com suficiente iluminação teórica, ainda que tão necessária. Lidamos

com duas demandas igualmente importantes que exigem de teólogos, missiólogos e

evangelistas uma solução salomônica, cujo objetivo é a preservação da vitalidade e da validade

do Cristianismo. Por vitalidade entende-se a capacidade de falar ao coração dos homens de

todas as eras; por validade, a habilidade de dizer a mesma coisa aos homens de todas as eras, a

saber, que todos pecaram e carecem da glória de Deus (Rm. 3: 23).

Esta não é uma situação inteiramente nova. Sempre que quando mudanças ideológicas

muito profundas são experimentadas nas sociedades humanas a hermenêutica teológica é

solicitada. O diferencial é que hoje o cumprimento da missão da pregação ao mundo

globalizado está revestida de tantas dificuldades que a prudência recomenda o uso da palavra

crise. Pois para manter a relevância da mensagem cristã deve-se atender a ambas as exigências:

a contextualização e a preservação, numa medida de conciliação que anda longe do consenso.

A propósito, há os que preferem ver na questão acima um problema sem solução, que é

bem definido por meio de um oxímoro: ou negamos a essência das Fontes _discurso absoluto

sobre Deus e sobre a condição humana, e isto o evangelho nos proíbe categoricamente; ou

abrimos mão da proclamação da mensagem ao mundo, e isto o evangelho nos obriga

terminantemente. Dito de outra forma: (a) entregamos as Fontes em rejeição ao seu

exclusivismo essencial, na tentativa de tornar o evangelho relevante para o homem

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contemporâneo, então, por este mesmo feito, fazemo-la irrelevante por relativizá-la; ou (b) não

as entregamos e com isto fazemo-la perder de igual modo a relevância por incompatibilizá-la

com o entendimento de seu ouvinte contemporâneo.

Nos relatos homéricos há uma passagem que já serviu de ilustração para muitos

discursos e que agora cai-nos como luva. Trata-se da difícil travessia de Ulisses, pelo estreito

de Messina, entre dois rochedos onde viviam duas criaturas monstruosas, cujos nomes eram,

Cylla e Caribde. O primeiro rochedo escondia um monstro cujo tragar produzia um

sorvedouro onde desapareciam os navios juntamente com suas tripulações; o segundo,

ocultava uma criatura, da qual só se se conheciam os longos braços que arrebatavam os

marinheiros ocupados em livrar a embarcação de Cylla.

Este episódio, citado mais de uma vez para ilustrar dilemas difíceis, quando algum tipo

de consequência funesta é inevitável (cabendo, portanto, fazer a opção menos danosa) serve

bem para representar a atual situação do Cristianismo, que, por um lado não pode deixar de

responder à situação na qual está seu ouvinte; por outro, tampouco pode entregar as Fontes.

Duas exigências, duas demandas, que impelem a fé cristã a se repensar e a se reposicionar face

ao mundo. (a) Uma exigência empírica: o mundo a que deve dirigir uma mensagem; e (b) uma

demanda teológica: a necessidade de conservar a validade de suas Fontes, que recém

completam três milênios e seis séculos de existência nunca antes tão questionadas.

1.a.1. A demanda empírica

O que aqui se chama demanda empírica refere-se à necessidade de a mensagem cristã

adequar-se a seus ouvintes no decurso das eras que atravessa e das que ainda atravessará, até

que todos a tenham ouvido. Nenhum período da história tem sido mais pródigo em

cosmovisões; e nenhum, tão repleto de ideologias. Entretanto, nenhuma destas opções, parece

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merecer maior e mais urgente consideração do que o problema da relação do Cristianismo com

as outras religiões num ambiente globalizado.

Antes, porém, de seguir nesta direção, faz-se necessário um breve exame de demandas de

outros tempos, que, somadas a esta, formam a matriz cultural atual. Não caímos no estado atual

de paraquedas. O que somos hoje é a soma do que vimos sendo há duzentos anos. Do ponto de

vista histórico-ideológico nossa atual condição é complexa e merece consideração cuidadosa.

O entendimento dos fenômenos analisados ficaria muito prejudicado não fossem considerados

também fatores que, se hoje não estão mais na ordem do dia, permanecem influenciando o

comportamento social. Com efeito, as contradições de nosso tempo são produto desta mescla

de elementos que não se excluem, mas se completam e se unem para tornar mais complexa a

nossa missão de entender o que está acontecendo ao mundo ao qual devemos uma mensagem.

1.a.1.a.Secularismo

A primeira demanda empírica de nosso tempo é o secularismo, processo de

obsolescência das instituições religiosas ora em curso no Ocidente. Seu fiat perde-se nos

alvores do século XIX, quando o Iluminismo já se entronizara como ideologia dominante no

Ocidente. Há uma expressão weberiana que pretende esclarecer em parte o que ocorreu: “o

desencantamento do mundo” (die Entzauberung der Welt), entendido como a racionalização

das relações sociais e a consequente separação da dominação estatal daquela exercida pelas

instituições religiosas. Esta racionalização, por sua vez, teria sido resultado de uma

racionalização da religião cristã provocada pelo aparecimento de um Protestantismo de

natureza logocêntrica, em que aspectos litúrgicos e cúlticos característicos do Catolicismo

Romano perdem importância e espaço. Segundo M. Weber os homens neste ambiente

racionalista e dessacralizado são levados a destituir o discurso religioso de sua

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autoridade, substituindo-o pelo discurso de outras instituições societárias mais seculares: as

instituições políticas, produtivas, acadêmicas e midiáticas. Em outras palavras:

[Secularização é] um processo pelo qual o abrangente e transcendente sistema religioso é reduzido nas sociedades funcionalmente diferenciadas a um subsistema ao lado de outros subsistemas, perdendo neste processo sua prerrogativa de incluir os outros subsistemas. Como resultado o significado social da religião é grandemente

diminuído3.

O processo não ocorreu da mesma forma e com a mesma intensidade em todos os

lugares da Europa. Na França foi motivado pelo anticlericalismo decorrente da Revolução

Francesa, como expressão do repúdio à aliança do alto clero Católico Romano com a nobreza

francesa, cujo consórcio produziu o empobrecimento da população. Na Alemanha foi resultado

de uma longa linha de defensores da autonomização e individualização da religião que começa

por Martinho Lutero, passa por Kant e termina na crítica textual dos séculos XVIII e XIX. Na

Inglaterra foi produto de uma teologia da prosperidade de que nasceu a Revolução Industrial e

cujas origens radicam no Calvinismo4. Obviamente, trata-se de ênfases histórico-sociais e não

de exclusividades dos países acima relacionados.

Peter Berger aduz a partir da sociologia do conhecimento que o principal problema da

religião cristã é uma “perda de plausibilidade”, ou seja, sendo a principal função da religião a

“cosmificação” da realidade, a organização do mundo humano que inclui tanto o mundo natural

como o social, a perda de plausibilidade dá-se quando os significados fornecidos pela religião

perdem relevância no mundo da tecnologia. Assim em nossos dias o aspecto mais importante

desta cosmificação não ocorre mais por meio do discurso religioso, mas pela ciência.

3 K. Dobbelaere apud Katarzyna Zielinska. “Concepts of religion in debates on secularization” (AR, volume 3,

no. 1, 2013), p. 27. 4 Max Weber. A ética protestante e o “espírito” do Capitalismo (São Paulo: Companhia das Letras, 2007).

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mas através da linguagem científica5. Parece que a religião perdeu a capacidade de dar uma

visão unificadora da realidade. Os mitos científicos têm para o homem contemporâneo mais

plausibilidade porque parecem satisfatórios na realização desta tarefa.

Com efeito, a cosmificação religiosa é a modalidade mais antiga e eficaz 6 e tem

acompanhado a humanidade desde os seus primórdios. O Ocidente, porém, a partir do

Renascimento, o vem abandonando gradativamente. No início foi o monólogo religioso do

Teocentrismo medieval, depois adotou paralelamente motivos seculares que caracterizaram o

Antropocentrismo renascentista. A mudança paradigmática ocorre por uma divinização do

humano e por uma humanização do divino em todas as áreas da vida social: na política, na

filosofia, na literatura, nas ciências e nas artes. A decadência espiritual da Igreja Católica, a

opulência material das cidades e o consequente afrouxamento dos estames societários da Idade

Média, o desenvolvimento das ciências da natureza e a redescoberta dos clássicos gregos,

contam-se entre os principais fatores que levaram a alta sociedade desta época a uma espécie de

ateísmo prático.

P. Berger diferencia o secularismo deles do nosso dizendo que o secularismo

contemporâneo atingir todas as camadas populacionais do mundo Ocidental e não apenas a

parte mais educada da sociedade, como é o caso renascentista:

Provavelmente, pela primeira vez na história, as legitimações religiosas do mundo

perderam sua plausibilidade não apenas para uns poucos intelectuais e outros

indivíduos marginais, mas para amplas massas de sociedades inteiras. Isto ocasionou

uma crise aguda não apenas para a nomização das grandes instituições sociais, mas

também para a das biografias individuais. Em outras palavras, surgiu um problema de

‘significado’ tanto para instituições como o Est ado e a economia, quanto para as

rotinas ordinárias da vida cotidiana. O problema é claro, tem se colocado de modo

intenso para vários teóricos (filósofos, teólogos, psicólogos, etc.), mas há boas razões

para se crer que também tem sido bastante agudo para pessoas comuns que 5 P. Berger. O dossel sagrado. Elementos para uma teoria socioló gica da religião (São Paulo: Edições Paulinas,

1985), p. 40. Cf. Lestor R. Kurtz. Gods in the global village. The world’s religion in sociological perspective (Thousand Oaks, CA: Pine Forge Press, 1995). 6 Ibid..

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não são dadas a especulações teóricas e apenas procuram resolver as crises de suas

próprias vidas 7.

Outro sociólogo do conhecimento, também alemão de origem, Niklas Luhmann, opina que

não se trata apenas de a religião ter perdido sua capacidade “nomizante” 8. Ele é ainda mais

pessimista. Na atual fase da história o sistema religioso entra em processo terminal, por ter

perdido sua autonomia em relação aos outros sistemas. O subsistema religioso tende daqui em

diante a ter seu espaço invadido pelos outros subsistemas (política, arte, ciência, medicina, etc.),

os quais subtraem-lhe gradativamente as atribuições sociais até que nada mais lhe reste, senão

uma vaga função interpretativa, que melancolicamente se reduz em realizar uma distinção entre o

absoluto do relativo 9, com quase nenhuma aplicação prática. A visão holística do mundo

provida pela religião esvai-se sendo substituída pela visão atomizada da ciência. A religião já

não consegue reunir em seu discurso toda a realidade fragmentada do mundo científico

contemporâneo e, o que é pior, é atacada por todos os lados.

Mas, os cristãos não aceitam sua expulsão da vida do Ocidente de braços cruzados.

Muitos teólogos procuraram dar uma resposta à nova situação cultural e social. Com este

mesmo propósito, desde a segunda metade do século XIX, a teologia Protestante europeia,

principalmente a alemã, já procurava alinhar-se ao projeto iluminista de Kant e Hegel, dando

nascimento ao que mais tarde ficaria conhecido como Teologia Liberal. O resultado,

infelizmente, não foi ter tornado a mensagem cristã mais aceitável na Alemanha secularizada,

antes expandiu o secularismo para dentro das igrejas protestantes. Mais tarde, na virada do

século XIX para o XX, o fracasso moral e espiritual desta geração de teólogos tornou-se

patente pelo fato de seus mais ilustres membros terem subscrito um vergonhoso

7 P. Berger. O dossel sagrado. Elementos para uma teoria sociológica da religião , p. 137.

8 Termo originário da sociologia de E. Durkheim cujo radical é nomos, lei, e quer dizer que a principal função da

sociedade é criar um sentido de ordem e de ética comportamental que biologicamente o ser humano não possui. A tese de Berger seguindo a sociologia clássica é de a que a religião é a principal força nomizante da sociedade. 9 Roberto Cipriani. Manual de Sociologia da Religião (São Paulo: Paulus, 2007), p. 305.

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manifesto de apoio ao belicismo imperialista alemão no alvorecer da Primeira Grande

Guerra10.

A partir deste fato ultrajante surge um grupo de teólogos decididos a retomar os

caminhos da teologia no lugar que os liberais haviam os haviam abandonado: o texto bíblico.

Os dialéticos (F. Gogarten, E. Thurneysen, R. Bultmann, K. Barth e E. Brunner), cada um a

seu modo, tentaram responder ao desafio de pregar a Palavra de Deus em um mundo

secularizado. A princípio, o que os moveu foi uma atitude profética, instilada pelo socialismo

religioso (Herman Kutter e Christoph Blumhardt). Além disso, houve o influxo da filosofia

existencialista de S. Kierkegaard e a liderança teo lógica de Karl Barth. Mais tarde, porém,

cada um adotou sua medida de conciliação com o Ilum inismo e seu próprio caminho

teológico.

Uma parte da teologia Católica chamada progressista também tomou para si o mesmo

encargo. Adotando uma perspectiva menos radical, a intenção era a mesma. Aproximar a

pregação da Palavra de Deus dos homens do século XX, por meio da tradução de doutrinas

historicamente sustentadas pelo Catolicismo Romano para uma linguagem supostamente mais

compreensível ao homem contemporâneo e a seu modo de ver a realidade e o mundo.

Entre os vários teólogos católicos que seguiram esta linha pode-se citar Edward

Schillebeeckx, teólogo belga de língua flamenga, para quem o ouvinte da Palavra

contemporâneo estaria sofrendo de “um déficit de experiência” 11. Para ele a revelação tem

duas fontes empíricas, a experiência originária dos escritores dos textos bíblicos e a

experiência dos leitores modernos. Portanto, para desvendar o sentido da Escritura deve-se

10 Rosino Gibelini. A Teologia do século XX (São Paulo: Loyola, 1998), p. 18.

11 E. Schillebeeckx. Jesús, la historia de un viviente (Madrid: Ediciones Cristianidad, 1981), p. 58.

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fazer uma correlação entre estas duas experiências12. Se ela não for feita, como costuma

acontecer em nossos tempos, isto é indício de uma perda da dimensão hermenêutica do

Cristianismo:

A conversa sobre Deus e a salvação em Jesus, é expressa nos termos de uma cosmovisão de outros tempos, não fazendo sentido e nem sendo portadora de

significado para os seres humanos, do ponto de vista intelectual ou prático13

.

A seu ver, a teologia esquecera que tanto o AT como NT são interpretações: o primeiro, da

ação divina na história de Israel; o segundo, interpretação do AT à luz do evento escatológico

de Cristo14. Para Schillebeeckx, portanto, a mesma busca de compreensão que nossos

antepassados espirituais empreenderam deve acompanhar as leituras contemporâneas do

Novo Testamento, ou seja, devemos interpretar a Escritura à luz de nossa própria condição

de habitantes de um mundo secularizado.

K. Rahner, um dos arquitetos do concílio Vaticano II, denunciou a teologia católica de

seu tempo como portadora de uma doença teológica que ele chama de calcificação,

endurecimento doutrinal (Fixierung). No século XIX a Igreja Católica estava acuada por

ataques liberais (instilados pelas ideias de J. Locke) contra seus privilégios políticos. Esta

situação de defensiva promoveu a hegemonia de um movimento ultraconservador na Igreja

que ficou conhecido pela posteridade como “a era dos Pios”, responsável por várias ações

autoritárias: o Silabus errorum (lista de livros proibidos pela Igreja por conterem ideias

liberais), a declaração da infalibilidade do Magistério (ex cathedra), a proibição da diversidade

teológica e o retorno do Tomismo (Neotomismo) à ordem do dia na filosofia da Igreja, etc.

12 E. Schillebeeckx. Jesus and the Christ (New York: Crossroads, 1981), p. 50.

13 E. Schillebeeckx apud Marguerite Abdul-Masih. Edward Schillebeeckx and Hans Frei. A conversation on method and Christology (Toronto: Canadian Corporations for Studies in Religion, 2001), p. 59.

14 Rosino Gibelini. A teologia do século XX, p. 326.

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Era uma reação natural a Igreja Romana erguer barre iras teológicas contra o mundo que a agredia15 e procurasse proteger seu status quo das investidas de setores da sociedade que

desejavam diminuir ainda mais sua participação na v ida civil, como viria a ocorrer com a

laicização do Estado. Mas, para Rahner, teria também aumentado o isolamento do Catolicismo,

fazendo-o perder sua capacidade hermenêutica. O medo do modernismo fizera-o parar de

pensar, limitando-o à repetição de velhas fórmulas confessionais e conciliares, como se isto

fosse sua raison d’etre. Deveria apenas tê-las tomado como ponto de partida para novas

reflexões, conforme os tempos fossem exigindo16. E não sua transformação em dogmática

morta, fiel à letra, mas desinteressada da realidade humana17.

Em relação à Schillebeeckx, o projeto hermenêutico de Rahner, dá um passo atrás. Seu

interesse teórico é a pré-condição do homem como ouvinte da Palavra, ou seja, o que produz

nos humanos a disposição para a escuta da Palavra de Deus. Esta perspectiva antropológica o

põe a salvo de cooptações ideológicas que, por exemplo, são riscos reais no projeto

hermenêutico de E. Schillebeeckx. Rahner também percebe que os instrumentos teóricos

fornecidos pelos conceitos neotomistas de seus colegas não eram suficientes para levar a cabo

a tarefa e assim decide substituí-los por ferramentas conceituais mais adequadas aos novos

tempos. Para produzir um conceito de compreensão mais profunda são mais adequados Kant,

os existencialistas e Heidegger. Em suma, em hermenêutica “não se trata apenas de saber a fé,

mas de compreender a vida”18.

A oclusão semântica da mensagem cristã que vem aqui deplorada também foi

preocupação de Hans Küng. A solução proposta, entre tanto, é a de um historiador do

15

Dermot Lane. The Experience of God: An Invitation to do Theology (New York: Paulist Press, 1981), p. 1. 16

Karl Rahner apud Érico J. Hammes. “Conceito e missão da teologia em Karl Rahner” ( CTP, Ano 1 . Nº 5, 2004), p. 9. 17 Idem apud ibidem.

18 Rosino Gibelini. Op. cit., p. 226.

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Cristianismo, e não a de uma hermenêutica que corre atrás de novidades seculares, ou de um

contínuo aggiornamento da mensagem cristã tão em voga em sua época. A nova hermenêutica

deveria se inspirar nas fontes primordiais, longe da influência e interferência dos Concílios e do

Magistério da Igreja, segundo ele, as raízes dos dogmatismos da atualidade:

Não seria apropriado numa nova era, em vez de se estar simplesmente repetindo os velhos dogmas helenísticos, concentrarmo-nos outra vez na mensagem do Novo Testamento e interpretá-la de novo para os cristãos contemporâneos, tal como os teólogos helenistas uma vez corretamente fizeram para seu tempo?19

Para Küng, a era de ouro da hermenêutica bíblica foi o segundo século de nossa era.

Tudo o que se situe antes e depois, será, respectivamente, semitismo ou helenismo, ambos

classificáveis como abordagens dogmáticas das Fontes, haja vista o enorme número de heresias

que estes dois tempos produziram. De fato, a verdadeira abertura para o outro, tendo como

projeto a inclusão religiosa do mundo não cristão, só ocorreria verdadeiramente com a teologia

dos Pais Apologetas (Justino, Irineu e Clemente). Com isto o autor de Ser Cristão já dá os

primeiros passos no terreno da Pós-modernidade apesar de inicialmente se situar entre aqueles

cuja preocupação era o discurso da ciência.

1.a.1.b. Pós-modernidade

Alguns anos depois de as preocupações dos teólogos com o secularismo começarem a

ocupar as páginas da literatura especializada um novo e inquietante desafio surge. Desta vez,

por um excesso de experiência não por falta. Ou seja, a nova dificuldade hermenêutica do

Cristianismo, ironicamente, ocorre num contexto de “revanche do sagrado”20, quando o

interesse pela espiritualidade retorna em toda sua pujança. É a assim chamada Pós-

modernidade.

19 Hans Küng. Christianity. The religious situation in our time (London: SCM Press, 1995), p. 95.

20 Leszek Kolakowski. “A revanche do sagrado na cultura profana” (RS, Maio (1), 1977), pp. 153-162.

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É sempre difícil apontar fatores causais nas Ciências Humanas, mas pode-se dizer que a

Pós-modernidade é uma ambiência cultural produzida em grande parte pelos fracassos

ideológicos sucessivamente apresentados no século XX como solução para os problemas

humanos (Nazismo, Fascismo, Comunismo, Capitalismo). Reflete também o nascimento de

uma consciência holística que surgiu como reação ao excesso de fragmentação epistemológica

da ciência; o esgotamento do dogmatismo da Modernidade e de outros ‘ismos’ éticos e

estéticos derivativos; o fim do humanismo, cujo canto de cisne foi J. P. Sartre; o surgimento de

epistemologias fracas, mais ou menos ligadas às mudanças na forma de ver a matéria e a

energia (Eisenstein, Einstein, etc.).

Resumindo, é difícil arrolar tudo o que concorreu para o nascimento da Pós-

modernidade. Contudo, diante de tal massa de fatores, pode-se suspeitar que a Pós-

modernidade seja uma espécie de ressaca da modernidade, “uma forma extrema de

decomposição do modelo racionalista da modernidade” 21. Como se os destroços de tudo o

que este modelo produziu repousassem agora numa imensa praia por onde passeiam os

contemporâneos. Os conceitos, as ideias, os valores , todos os produtos de uma era estão aí a

degradar-se ao sol já posto da razão calculadora, sob cujos raios gélidos já estarão

amadurecendo as sementes da nova barbárie, parafraseando a bela imagem filosófico-

profética de Horkheimer 22 .

Com efeito, do ponto de vista social, está em curso um processo de dissociação,

desencadeado pela degradação das instituições criadas quando os grandes Estados nacionais

foram inventados no século XVI. A Igreja teve suas funções reduzidas na nova composição

do Estado laico. As instituições políticas que aparentemente haviam herdado dela as

prerrogativas ideológicas sofreram em Maio de 1968 na França um golpe do qual ainda não se

21 Allain Touraine. Crítica da modernidade (Petrópolis: Vozes, 2002), p. 266.

22 Max Horkheimer. O Conceito de Iluminismo (São Paulo: Editora Abril Cultural, 1983), p. 109.

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recuperaram, em que própria democracia perdeu sua representatividade e os dogmatismos

ideológicos não interessam a mais ninguém. As instituições sociais antes garantes da razão

instrumental perderam também sua capacidade de lastrear o processo de nomização,

transferindo ao indivíduo, por inércia, este encargo:

A situação do pós-social é o produto de uma completa separação entre a instrumentalidade e o sentido, a primeira é gerida por empresas, econômicas ou políticas, em concorrência entre elas nos mercados; o segundo, tornou-se puramente

privado, subjetivo 23

.

Este estado de impermanência que envolve tudo o que se encontra distraidamente

atirado à nossa frente tem sua explicação filosófica no famoso conceito de Lyotard sobre “o

fim das metanarrativas” 24. As narrativas legitimantes (a ciência, a Revolução Industrial, o

conhecimento acadêmico, o progresso, a moral burguesa, o Iluminismo, etc.) sobre as quais os

modernos pretendiam colocar os fundamentos da razão, fora da transitoriedade dos discursos

e ali reproduzir um raciocínio absolutamente isento, capaz de gerar verdades certas, seguras e

indubitáveis encontram seu final quando se percebe que a mera possibilidade de existirem é

uma ilusão.

Com a virada linguística promovida por Wittgenstein ao criticismo kantiano, chegou-se

à conclusão cética de que não há um fora da linguagem epistemologicamente falando (e se

houvesse ninguém poderia saber, já que ninguém pode pensar sem linguagem).

Consequentemente, é impossível qualquer tipo de dogmatismo. A certeza e a verdade só são

possíveis dentro de sistemas linguísticos fechados; o erro, idem. Derrida, seguindo o conceito

wittgensteiniano de jogos de linguagem, dirá “não há um fora-do-texto” (Il n’y a pas de hors-

23 Allain Touraine. Crítica da Modernidade, p. 198.

24 As metanarrativas, ou seja, as narrativas das narrativas, e são assim chamadas por terem a pretensão de se colocarem fora de si mesmas, num plano racional superior, sobre uma plataforma veritativa universal e transcendental, de onde supostamente poderiam julgar o transcurso da história humana. Cf. Jean-François Lyotard. La condición postmoderna (Madrid : Ediciones Cátedra, 1987), p. 4.

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texte), o que significa que “não há nada de real que não seja textuado, construído, simbolizado e contextuado – interminavelmente” 25.

Resumindo, o ser humano está reduzido a uma imanência miseravelmente limitadora de

sua capacidade de raciocinar e julgar. Aos homens, portanto, só restam razões menores para

tomar decisões (éticas, religiosas e estéticas) e para justificar sua existência. Sua condição de

juiz do universo foi melancolicamente trocada pela de um caminhante solitário que como

“turista [rodeia] o jardim da história, que considera um depósito de máscaras teatrais que

podem ser usadas e abandonas conforme o seu prazer, o seu gosto, e a sua utilidade”26. Faltou

rigor a Lyotard ao falar do fim das metanarrativas, por utilizar argumentos auto-refutantes 27,

mas a condição pós-moderna pode ser definida como o naufrágio de um sujeito que sem

referenciais já não consegue manter-se à tona da história e da própria realidade .

Na verdade, a rigor, do ponto de vista epistemológico, não pode nem mesmo ser

considerado um sujeito. Roland Barthes, interpretado além de si mesmo, pode dizer que para

os pós-modernos o homem como sujeito deixa mesmo de existir, nada sendo exceto o que as

máscaras que usa digam que é. A inferência parte da conclusão literária de Barthes sobre a

morte do autor, presente em célebre passagem onde ele interpreta as observações de H. Balzac

sobre a condição feminina ínsitas em Ilusões Perdidas. Segundo sua leitura, elas são apenas

25

Joseph Margolis. Interpretation radical but not untruly . The new puzzle of the arts and history (Berkeley CA: University of California Press, 1995), p. 172. 26

Rossano Pecoraro. Niilismo e (pós) modernidade: introdução ao“ pensamento fraco” de Gianni Vattimo (Rio de Janeiro: Editora da Puc, 2005), p. 70. 27

Segundo J. Habermas, Lyotard, ele mesmo, oferece com este argumento uma metanarrativa que pode ser

chamada ironicamente de “a grande narrativa do fim das grandes narrativas”. Habermas chama nossa atenção para o fato de que o desmascaramento dos críticos da Escola de Frankfurt ou a desconstrução levada a e feito pelos pós-modernos só seria possível se eles possuíssem um padrão racional transcendental, ou seja, um a teoria que revelasse as máscaras da ideologia (Richard Rorty. “Habermas, Lyotard e a Pós-modernidade” – Educação e Filosofia, 4 (8), Jan – Jun – p. 76). Em suma, sendo toda e qualquer teoria imanente a determinado sistema nada pode dizer sobre as outras a não ser no campo opiniático .

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as manifestações mais acabadas do espírito de uma época 28, não podendo mesmo serem

tributadas a Balzac como se ele fosse o autor de observações inteligentes sobre a alma

feminina.

Voltando à questão religiosa e concluindo, para os pós-modernos, as religiões não têm

meios para julgar umas às outras, dado que é impossível sair dos sistemas religiosos onde

cada qual se diz, diz o mundo e diz a Deus (não há ninguém capaz de abstrair-se aos seus

próprios jogos-de-linguagem). Desaparece a questão da verdade ante a impossibilidade

epistêmica de uma verdade universal. Há tantas verdades quanto crentes nelas. Esvai-se a

noção de erro, posto que erro só o é dentro de um dado sistema. Como consequência assiste-

se ao nascimento de um relativismo que não permite qualquer possibilidade normativa, exceto

os normativismos menores, decorrentes de razões subjetivas e afetuais. O homem pós-

moderno encontra-se, perdido dentro do labirinto da imanência, sem o fio de Ariadne e sem as

asas de Ícaro; não sabe quem é, e muito menos de onde vem ou para onde vai.

Como já se pode suspeitar, “a revanche do sagrado” não nos trouxe de volta aos marcos

pré-modernos. A frustração com o não cumprimento das promessas das metanarrativas

modernas não tornou as igrejas europeias e norte-americanas mais habilitadas a cobrir o atual

hiato existencial humano. Afinal, o Cristianismo europeu foi partícipe do projeto fracassado

da Modernidade, adotando os princípios iluministas, abraçou um racionalismo insuficiente

para dar solução aos problemas humanos e que, pelo contrário, só tem causado novos e mais

inquietantes. Não é por este motivo que a maioria das pessoas no Ocidente sente uma

verdadeira ojeriza por posicionamentos religiosos estritos e exclusivistas, que buscam a

conformidade e desprezam as diferenças?

28 Roland Barthes. O rumor da língua (Brasília: Editora Brasiliense, 1988), p. 284.

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Neste contexto, qualquer atitude religiosa, ética e ideológica mais incisiva será

considerada politicamente incorreta. A exclusiva pretensão veritativa hoje se tornou

inaceitável pelo ressaibo às diversas e fracassadas experiências dogmáticas pretéritas. O

período moderno, com seus numerosos disputantes (racionalismo, empirismo, criticismo,

empirismo lógico, filosofia analítica), não conseguiu estabelecer com absoluta segurança uma

verdade, uma metodologia ou doutrina epistemológica exclusiva. De igual maneira, o fracasso

das ideologias político-econômicas para solucionar os problemas econômicos (Fascismo,

Nazismo, Comunismo, Capitalismo), lançaram o mundo em duas guerras totais, que geram

como consequência um ethos onde as religiões e as ideologias são apeadas de sua metafísica e

solicitadas a apresentarem-se apenas como práxis, pela qual passam a ser julgadas:

É um clima no qual é natural pensar nas religiões como diferentes, mas igualmente válidos caminhos para a salvação, igualmente válidas respostas ao Real. As asserções religiosas apenas são verdadeiras no sentido estrito de serem

existencialmente significativas 29

.

O relativismo contemporâneo gera a falsa ideia de que diminui a rejeição ao

Cristianismo no mundo Ocidental. Se há esta sensação de aceitação, ela não é específica, mas

dirige-se a todos os tipos de espiritualidades. Permanece aquele déficit de plausibilidade do

Cristianismo constituído no contexto do secularismo. O discurso científico não foi suplantado

ou substituído por narrativas religiosas cristãs. O que ocorreu foi um enfraquecimento da

capacidade cosmificadora da ciência que faz com que os indivíduos busquem supri-la por

outros meios: através de epistemologias fracas, pensamento holístico, a espiritualidade. A

religiosidade, portanto, retorna pela porta dos fundos, pois as instituições societárias

permanecem estruturadas como na época da Modernidade, sem dar acesso ao espaço público

a estas modalidades de cosmificação. O Cristianismo , bem como as demais, continua exilado

29

Clark H. Pinnock. A wideness in God’s mercy: the finality of Jesus Christ in a world of religions (Grand Rapids, MI: Zondervan, 1992), p. 10.

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1.a.1.c.Globalização

Outro fator que favorece o ambiente relativista é a Globalização. Por meio dela torna-se

mais evidente a diversidade cultural e religiosa do planeta. As ondas migratórias hodiernas,

produzidas pelas condições macroeconômicas, têm colaborado para aproximar as culturas e as

religiões. Não por acaso, Os Estados Unidos, a nação mais rica do mundo, “tem se tornado

[também] a nação mais religiosamente diversificada do mundo” 32 . A Europa, depois do

boom econômico dos anos 90 também se tornou importante destino de levas de imigrantes. A

França recebe sem acolher os mulçumanos oriundos de sua antiga colônia. A Inglaterra é

anfitriã de hindus e a Alemanha, de turcos muçulmanos. As religiões vêm invadindo o

Ocidente levadas na bagagem não só de i migrantes, mas de estudantes, turistas e homens de

negócios, aventureiros, etc. Aquelas outras religiões que sabíamos existir em algum lugar

remoto do mundo, põe agora sua cara em nossa janela, dispensando apresentações e discursos

introdutórios. Além disso , na ‘aldeia global’ também é possível ter acesso direto às religiões

pela internet, conhecendo seus ritos, sua espiritualidade, seus homens santos, etc.

Mulçumanos, Budistas, Hindus, Xintoístas, Confucionistas agora estão entre nós. As

palavras de Hans Küng resumem bem a atual situação: “pela primeira vez na história é

impossível para qualquer religião existir em esplêndido isolamento, ignorando as demais” 33.

As teorias interpretativas que até pouco tempo ajudavam o Ocidente a entender o legado

cristão no contexto religioso mundial perderam sua utilidade. In nuce já estavam equivocadas,

porque nasceram não com a intenção de compreender, mas de reduzir, de combater e dominar.

32 Diana Eck. A new religious America: How a Christian country has become the world most religiously diverse nation (New York: Harpercollins, 2001), pp. 4-5.

33 Hans Küng. Ser Cristão (Rio de Janeiro: Imago, 1976), p. 89.

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Hoje deixam de exercer qualquer atração sobre as pessoas, porque o que elas querem é

conhecer e compreender aqueles que não adoram como elas e são seus vizinhos.

Andrés T. Queiruga fala de duas grandes ampliações no mundo humano responsáveis

por estas inquietantes constatações: (a) uma ampliação do horizonte histórico e (b) uma

ampliação do horizonte geográfico, decorridas principalmente no século XX, que fizeram com

que um Cristianismo ensimesmado, ocupado apenas com suas diferenciações paroquianas,

perdesse sentido34.

(a) A ampliação histórica. O Ocidente descobriu que antes que nascessem os profetas

bíblicos já havia civilizações na Ásia, com cultura, tecnologia e religiões avançadas, como é o

caso da chinesa, da indochinesa e da indiana. Sobre isto há a conhecida a tese do historiador

Erik Voegelin, a qual fala a respeito do “alcance e significação da extraordinária experiência

espiritual que surgiu simultaneamente em vários focos da civilização”35, num período que se

estende do oitavo ao segundo século a. C.. Chamado por K. Japers de “era axial” 36 este

período foi testemunha do nascimento das mais importantes religiões mundiais. É deveras

impressionante como todos estes movimentos religiosos e filosóficos em que estão incluídos,

os grandes profetas reformadores do Antigo Testamento, Buda e os Pré-socráticos,

apresentem uma “surpreendente homologia estrutural e temática em suas mensagens,

operando uma verdadeira revolução n o universo simbólico das grandes civilizações” 37. Uma

explosão criativa sobre o sagrado que muitos estudiosos atribuem à ampliação das relações

comerciais entre as nações e ao advento de uma situação de prosperidade material inaudita.

34 Andrés T. Queiruga.O diálogo das religiões (São Paulo: Paulus, 1997), p. 13.

35 Henrique C. de Lima Vaz. Escritos de Filosofia III. Filosofia e Cultura (São Paulo: Edições Loyola, 1997), p. 202.

36 Apud Karen Armstrong. Uma história de Deus. Quatro milênios em busca do Judaísmo, Cristianismo e Islamismo (São Paulo: Companhia das Letras, 2008), p. 43.

37 Henrique C. de Lima Vaz, Escritos de Filosofia III. Filosofia e Cultura, p. 202.

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(b) Ampliação geográfica. A contemporaneidade se caracteriza pelo espaço mais plural

e simultaneamente menor, onde as diferenças tendem a ser absorvidas por um processo que

envolve vários fatores. O transporte aéreo torna hoje possível que milhões se movimentem de

um extremo ao outro do globo em algumas horas, permitindo que nós ocidentais vejamos

rostos recém emersos de um contexto cultural bem diferente do nosso do modo como são,

sem retoques. As redes sociais tornam a realidade social conhecida sem a interferência

censora das instituições.

De outra parte, grandes megalópoles como Mubai, São Paulo – Rio (São Paulo, Rio de

Janeiro, Campinas e Santos), Bos-wash (Boston, New York, Filadélfia, Baltimore e

Washington), Tokkaido (Tokyo, Kawasaki, Yokohama), a megalópole do vale do rio Reno

(Amsterdã, Düsseldorf, Colônia, Bonn, Sttutgart) não só se constituem como conglomerados

de cidades, mas também como conglomerados dos subúrbios que existem entre elas; enfim,

lugares onde a distinção entre o rural e o urbano desaparece, o que os torna lugares mais

tolerantes em relação aos diferentes.

Há que se destacar também a natureza cosmopolita destes grandes conglomerados

urbanos. Los Angeles, talvez a cidade mais cosmopolita do mundo, conta entre seus 18

milhões de habitantes (Grande Los Angeles), asiáticos (chineses, japoneses, tailandeses,

filipinos, vietnamitas, armênios, iranianos), afro-americanos e latinos (mexicanos, porto-

riquenhos, salvadorenhos, brasileiros, colombianos, etc.), além das tradicionais populações

caucasianas originárias da velha Europa. Em LA estas populações se agregaram formando

redutos étnicos: os filipinos vivem num bairro chamado Filipotown; os tailandeses, em

Thaitown. O resultado prático disto é que não é preciso mais ir às Filipinas para conhecer o

modo de vida dos sul-asiáticos (inclusive sua religião).

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Toda esta proximidade só poderia produzir ao fim de diversos mitos sobre os não

cristãos. Hoje é inegável, por exemplo, o fato de estas tradições serem portadoras de uma

sabedoria milenar que rivaliza com a ciência Ocidental (a medicina, por exemplo) e mesmo

em se tratando de religião, seus ensinamentos contém muitas ‘verdades’. A propósito disto, a

superioridade moral do Cristianismo, tão decantada por teólogos e filósofos europeus e

protestantes do século XIX – especialmente aqueles inscritos sob a rubrica do Idealismo

alemão (von Harnack, Troeltscht, Ritschil, Herrmann)38, perdeu muito de sua força persuasiva

depois que se descobriu que a assim chamada “regra de ouro” dos evangelhos, considerada

marca singular da ética cristã – “faze aos outros aquilo que queres que te façam” – está

presente em praticamente todas as grandes tradições religiosas mundiais 39. Enfim, há nas

religiões uma sabedoria incompatível com o lugar acanhado reservado a elas pelo Ocidente40.

1.a.1.d.Mundialização do Cristianismo

A atual situação do Ocidente inundado por tantos ritos e crenças não significa,

necessariamente um Cristianismo acuado. Embora em seu território de origem isto seja

verdadeiro por causa da expansão do Islã, do Secularismo e do Consumismo, a fé cristã cresce

em outros terrenos fora da Europa. Dois terços dos cristãos hoje vivem em países da Ásia,

África e América do Sul e é nestes países que o Cristianismo hoje enfrenta seus maiores

desafios missiológicos. É aí onde o encontro dos Cristãos com as religiões mundiais ocorre

mais inquietantemente.

38 Rosino Gibellini. A teologia do século XX, p. 19.

39 Mahabharata: Shanti parva CCLX21: “que nenhum homem cometa contra o outro, ato que não gostaria fosse cometido contra si mesmo”. Analectus de Confúcio, livro 12:2: “não faças aos outros o que você não quer que façam com você. Udanavarga budista, v. 18: “não machuque os outros com algo que dói em você”. Andrew Wilson (org.). World Scripture. A comparative anthology of sacred texts (New York: International Religious Foundation/Paragon House Publishers, 1991.

40 Raimon Panikkar. “The pluralism of truth” (WFI, no. 26, 1990), p. 7.

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O Cristianismo europeu enfrenta uma consistente decadência que já é secular, o que

permite definirem alguns nosso tempo como processo de “descristianização”, que ao final

produzirá um “Pós-cristianismo” 41. Contudo, em outras partes do mundo os cristãos

experimentam uma expansão sem precedentes, que nem os mais otimistas missiólogos

imaginavam fosse ocorrer, tornando-se hoje o movimento religioso mais dinâmico do mundo.

De fato, durante o século XX tornou-se a mais universal e extensiva religião da história. Há hoje cristãos e igrejas cristãs organizadas em todos os lugares habitados da terra. A Igreja é pela primeira vez na história, ecumênica no sentido literal da

palavra: seus limites são coextensíveis com a oikumene, todo o mundo habitado42

.

O crescimento do Cristianismo na África é especialmente impressionante,

principalmente após o fim do colonialismo, com a independência da maioria das nações

africanas. No início do século XX havia apenas 8.7 milhões de cristãos no continente

africano, algo ao redor de 9 % de sua população. Os mulçumanos nos superavam na

proporção de 4 por 1. Com o fim do período colonial o Cristianismo experimentou um rápido

crescimento que começou com 60 milhões no fim da década de 80, pulou para 330 milhões

em 1998 e em 2000 já atingia o patamar de 350 milhões43. Hoje, já há mais cristãos na África

do que adeptos do Animismo, sua religião original (existem por volta de 300 milhões de

animistas na África atualmente)44. E quando a Europa ameaça ser totalmente coberta pela

bandeira verde do crescente, quem enche as igrejas vazias europeias são cristãos étnicos

originários da África Central. “A grande Paris tem 250 igrejas étnicas protestantes, a maior

parte delas formada por negros africanos” 45.

41 Phillip Jenkins. God’s continent: Christianity, Islam and Europe’s religious crisis (Oxford: Oxford University Press, 2005). 42 David Barret, George Kurian and Todd Johnson. World Christian Encyclopedia: a comparative survey of churches and religions in modern world (New York: Oxford University Press, 2001), p. 15.

43 Lamin Sanneh. Whose religion is Christianity? The gospel beyond the West (Grand Rapids, MI: Wm. B. Eerdmans, 2003), pp. 14-15.

44 Chad Meister. Introducing Philosophy of religion (London/New York: Routledge, 2009), p. 6.

45Phillip Jenkins. God’s continent: Christianity, Islam and Europe’s religious crisis, p. 94.

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Na Ásia a mensagem cristã também se expande com grande velocidade. Há países quase

completamente cristianizados como é o caso das Filipinas. Entre os que estão sendo

evangelizados mais recentemente, há a China. Embora não haja dados confiáveis sobre a

China (leis locais proíbem o proselitismo), sabe-se que lá os cristãos já se contam aos

milhões. Os dados oficiais do governo chinês somente levam em conta as congregações

regularmente estabelecidas, por isso tendem a subestimar a taxa de crescimento do

Cristianismo bem como o número total de adeptos. Em 2006 havia lá 21 milhões de cristãos,

destes 16 milhões eram Protestantes e 5 milhões, Católicos. Fontes extraoficiais, entretanto,

apontam para números mais expressivos, algo em torno de 12 milhões de Católicos e 30

milhões de Protestantes46.

A Coreia do Sul é o caso missiologicamente mais notável. Inicialmente um país

budista (até o século XIX), hoje encontra-se bastante cristianizado. Cerca de 25 % da

população professa a fé cristã 47. Com pouco mais de cem anos de história as igrejas

coreanas tem atingido notável crescimento e força. As megaigrejas coreanas resignificaram

a palavra mega para muito além do que pensa o Ocidente cristão, com congregações

variando entre 8 mil (Yodo Full Gospel Church) e 30 mil membros (Sung Rar Baptist

Church) 48. O mais impressionante é que apesar do tamanho são extremamente organizadas,

experimentando intenso fervor missionário. De 1995 para cá o Catolicismo os Pentecostais

crescem na Coreia enquanto os Protestantes históricos, a exemplo dos Presbiterianos, estão

estagnados49. De qualquer modo o dinamismo do Cristianismo coreano é inegável.

46 Lian Jiang. Visiting parents from China: their conversion experiences in America and contribution to Christianity at home (tese de doutoramento, Faculty of Bright Divinity School, 2006), p. 50.

47 Mark Mullins. “The Empire strikes back. Korean Pent ecostal mission to Japan”. In Karla Powe (ed.). Charismatic Christianty as a global culture (Columbia SC: University of South Carolina Press, 1994), p. 88.

48 Ibid., pp. 89 e 90.

49 Han Soo Park. A study of missional structures for the Korean church for its postmodern context (An Harbor MI: Umi dissertation publishing, 2008), p. 42.

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Na Índia há igrejas cristãs vigorosas e antiquíssimas, cuja fundação ocorreu há milênios,

como é o caso da igreja Católica de rito siríaco. Outras chegaram ao final do século XIX com

as missões de Metodistas, Presbiterianos e Batistas; e outras já no decorrer do século XX

(Adventistas do Sétimo Dia e outros Independentes). Porém, apesar desta história milenar, O

Cristianismo na Índia é apenas a terceira maior força religiosa, contando aproximadamente 24

milhões de seguidores, o que significa 2.3 % da população total do país 50, estando a grande

maioria da população ainda sob a lealdade do Hinduísmo. Ou seja, isto significa dizer que os

cristãos são minoria e que nem mesmo nas províncias mais expressivamente cristãos (Kerala)

seus membros não ultrapassam os 10 % da população 51. E nem podemos dizer que

experimentem um crescimento vigoroso por que os números oscilam em volta desta taxa, para

mais ou para menos, há décadas.

Com tudo isto e à medida que avançam os esforços e os resultados missionários

cristãos, cresce a necessidade de se teorizar sobre os limites da aculturação de sua mensagem,

face aos perigos que se escondem por atrás de pressões por um crescimento mais rápido:

sincretismos, heresias, faccionismos, etc.. Esta teorização vem sendo chamada de teologia

das missões e pretende justamente lidar com três aspectos da evangelização que necessitam

ser equilibradamente abordados: (a) o texto bíblico, (b) a fé da comunidade e (c) o contexto

missionário 52. Sendo minoria, os Cristãos são constantemente tentados a facilitar a conversão

de seus ouvintes, tendendo a descurar do texto bíblico, quando quer que haja grandes

dificuldades transculturais.

Quanto a isto, um dos ocorridos mais sérios do mundo das missões dá-se na Coreia do

Sul. Relatos dão conta de que igrejas pentecostais estão sofrendo influências litúrgicas e

50 Wikipedia, verbete: Christians in India (Government of India, Ministry of Home Affairs, Census commissions, Census 2001).

51 Leonard Fernando e G. Gilpert Sauch. Christianity in India. Two Thousand years of faith (New Delhi: Penguins Book India, 2004), xiii.

52 Charles R. van Engen. What is theology of missions (TC, ano 1, vol. 1, Ago, 2004), p. 45.

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teológicas do animismo local, chegando a experimentar um processo de xamanização, com

pastores emulando o papel dos xamãs coreanos, especialmente no que diz respeito às curas

espirituais:

Na sociedade tradicional coreana os xamãs (mudang) servem de link entre o povo comum e o mundo espiritual, habitado por inúmeros deuses, por ancestrais e espíritos. Através de rituais e oferendas os xamãs podem controlar o mundo espiritual, transformando espíritos malévolos em espíritos protetores; realizando

curas e exorcismos e produzindo benefícios concretos aos indivíduos53

.

Andrew Walls escreve sobre a necessidade de teologizar todas as vezes que são

cruzadas novas fronteiras culturais, já que em o fazendo o Cristianismo se depara com

situações que lhe colocam novas questões intelectuais antes não consideradas54. Esta

necessidade se comprova pelos vários congressos missiológicos e teológicos convocados ao

redor do mundo a partir do segundo quartel do século XX, quando se intensificou a

penetração do evangelho no mundo não cristão 55.

Alguns historiadores do Cristianismo, contudo, defendem a livre propagação

evangelística no mundo, ainda que com inovação doutrinal motivada por necessidades locais,

o que ocorrendo seria até um indício de maturidade espiritual:

Quando os teóricos das missões em décadas passadas falaram de três autonomias

como meta para igrejas mais novas, incluíram o autofinanciamento, o autogoverno e

a autopropagação. Eles não perceberam a autointerpretação ou a autoteologização

como igualmente uma necessidade. Eles esperavam que a teologia continuasse sendo

o que sempre foi, porque o significado do evangelho era perfeitamente entendido

53 Ibid., p. 92.

54 Andrew Walls. “The rise of global theologies”. In Jeffrey P. Greeman e Gene L. Green. Global Theology in evangelical perspective. Exploring the contextual nature of Theology and mission (Downers Grove, IL: Intervarsity Press, 2012), p. 20.

55 “International Congress on World Evangelization in Lausanne (1974); Willowbank Consultation on Gospel and

Culture (1978); International consultation on Simple Lifestyle (1980); Pattaya Consultation on World Evangelization

(1980); International Consultation on the Relationship between Evangelism and Social Responsibility (1982);

International Conferences for Itinerant Evangelists (1983, 1986); Lausanne II in Manila (1989); Theological

Commission’s Consultation on the Unique Christ in our Pluralist World, Manila (1992); Mission Commission’s

Iguassu Missiological Consultation; Forum for World Evangelization, Pattaya (2004). (Lamin Sanneh. Whose

religion is Christianity?, p. 25-26).

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pelas Igrejas mães, e tudo o que as mais novas deviam fazer era continuar

proclamando a mesma mensagem56

.

Não podemos esquecer que nem todas as demandas locais devem ser satisfeitas, pois por

trás delas, segundo as Escrituras, há uma humanidade caída, propendente ao mal e ao pecado.

Como já foi afirmado no início desta investigação, cabe à Teologia analisar a legitimidade das

demandas para que o evangelho não caia em armadilhas ideológicas, como já ocorreu no

passado quando uma parte expressiva de Cristãos no II século d. C. adotou o Neoplatonismo

como quadro ideológico por meio do qual a mensagem cristã passou a ser compreendida.

Infelizmente, aquela experiência transcultural acabou degenerando em Gnosticismo.

Deve-se discernir entre o transitório e o eterno, o que significa entender que muitas

reivindicações culturais estão atreladas a conjunturas socioeconômicas que rapidamente

desaparecem se são subtraídas de seus fatores predisponentes. A teologia da prosperidade é um

exemplo bastante contundente do que pode acontecer à pregação do evangelho se as

necessidades das massas forem as únicas guias dos pregadores. O que inicialmente poderia ser

considerado um legítimo clamor popular por socorro divino diante de dificuldades

relacionadas à própria sobrevivência (saúde, endividamento, dificuldades econômicas) acabou

se degenerando em soberba espiritual, somada ao consumismo e ao materialismo, como hoje

se vê. Em suma, as relações dos homens entre si e em relação a Deus distorcidas pela

mediação da mercadoria e do capital (Karl Marx).

1.a.1.e. O testemunho da história

Ao longo da história, o Cristianismo, em especial a Igreja pós-constantiniana, tem sido

marcado por uma atitude opressora em relação às religiões e às suas diversas não autorizadas

56

Justo Gonzales. Mañana. Christian Theology from Hispanic perspective (Nashville, TS: Abingdon, 1990), p. 49.

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religiosas na Alemanha e Suíça (Anabatistas, Menonitas e Espiritualistas, seguidores de

Muntzen), lideradas ou pelo menos inspiradas pelo silêncio dos reformadores. Até que o

espírito intolerante crescente desencadeou uma hecatombe sangrenta que custou a vida de

milhões de Católicos e Protestantes na Guerra dos Trinta Anos.

Ainda no século XVI, nas Américas, uma das histórias mais infamantes reputada ao

Cristianismo. Com a perda de territórios para o Protestantismo na Europa, os Ibéricos Católicos

se voltaram para as Américas, vindo seu impulso missionário e civilizatório a se defrontar com

as civilizações pré-colombianas, que não conheciam e ainda assim consideravam

inferiores. Como resultado, o gigantesco morticínio que ceifou a vida de milhões de seres

humanos, pelo único fato de não serem cristãos e viverem de forma diferente. Sabe-se que a

difamação simbólica destes povos, foi não poucas vezes injustificada e produzida com o único

objetivo de legitimar sua vergonhosa exploração57.

Assim, com exceção das circunstâncias históricas excepcionais citadas, infelizmente,

sustentadas não por iniciativa de Cristãos, o convívio do Cristianismo com outras religiões

tendo sido violento, deixando genocídios e/ou etnocídios no rastro de sua passagem, provoca-

nos hoje com a pergunta: até que ponto o projeto ‘civilizatório’ desses cristãos é tributário das

Fontes do Cristianismo? Ou, dizendo de outra maneira, há algo de intrinsecamente intolerante

e violento na mensagem cristã, que nos obrigaria hoje a nos repensar como Cristãos?

1.a.2. A demanda escriturística

Estas perguntas nos remetem ao texto primordial do Cristianismo, não se esgotando a

tarefa hermenêutica em reconhecer a existência de um novo ambiente global multicultural e

plurirreligioso e sua suposta pré-condição para um novo balizamento nas relações inter-

57

Cf. Tzvetan Todorov. The conquest of America. The question of the other (New York: Harper Collins, 1999).

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religiosas. Outra obrigação não menos importante que lhe compete é a conservação das

Fontes Cristãs (I Co 4: 1 e 2), apesar das pressões ideológicas em contrário.

Esta não é a primeira vez que isto ocorre. A Igreja Pré-constantiniana viveu diante do

desafio do mundo greco-romano por pelo menos dois séculos e sobreviveu sem fazer

concessões doutrinárias, ainda que pressionada por ideologias tão poderosas quanto as

existentes hoje, como é o caso do Neoplatonismo. Embora neste tempo tenha havido muitos

desvios da ortodoxia, a maioria das igrejas cristãs guardou o depósito da fé, sem com isto,

necessariamente, ter voltado as costas para o mundo. O modo como as igrejas venceram este

tempo de crise foi a definição mais precisa do que era e do que não era canônico com respeito

às tradições cristãs existentes. É evidente que a decisão dos bispos fosse necessária para

evitar que as ideias de Valentino e Márcion tomassem o lugar de Jesus e dos apóstolos.

Em segundo lugar, embora se fale aqui de tradição (parênesis), conservar as fontes não

é tarefa museológica, destinada a uma idolatria da letra, uma grafolatria. Significa antes

rechaçar quaisquer tentativas de destruir a essência da Palavra de Deus, ou seja, aquilo que

seu próprio nome indica que ela é. Em nosso contexto, significa, diante do atual processo de

esvaziamento de seu significado salvífico, reafirmar sua relevância como agência especial de

Deus para a salvação de todos os homens. Significar á isto etnocentrismo destrutivo, como os

pós-modernos concluem? Ou aspectos de uma ingenuidade epistemológica pré-iluminista,

como preferem os modernos?

Quanto à primeira pergunta, o fato de para os antropólogos e sociólogos ocidentais Pós-

modernos a pretensão da mensagem cristã ao absoluto ser intrinsecamente violenta contra as

outras culturas, deve-se responder com outra pergunta: não seria a mesma pretensão nos

outros igualmente violenta contra Cristãos? Ademais , estes teóricos parecem ter como

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teológica é o lugar onde estas duas demandas se encontram para serem examinadas em sua

relação dialética.

1.a.2.a. Hermenêutica teológica

O campo da hermenêutica teológica assenta-se sobre três fundamentos: (a) a revelação

divina, (b) a linguagem pela qual é expressa e (c) a contextualização desta linguagem de

acordo com o tempo e a cultura de seus intérpretes: crentes e teólogos. Quanto à revelação (a),

nada tem sido tão debatido quanto qual é o ponto de partida desta revelação? Sobre isto dois

teólogos não pensam da mesma maneira Há os que prefiram começar pela experiência humana

do sagrado, como o já citado E. Schillebeeckx, no que é acompanhado por muitos outros 58.

Mutatis mutandis, para Tillich a experiência é apenas o meio, não a fonte da revelação 59. Mas,

em vez de dizer que a fonte é Deus, afirma que ela ocorre no momento da irrupção do

incondicionado na existência do condicionado. Ou seja, Deus é transmudado de Alguém que

fala e se manifesta aos homens, num Ser que é a base da realidade e a fonte do sentimento do

divino, e a Escritura perde sua dimensão assertiva, passando a ser apenas uma coletânea de

símbolos a qual recorrem os homens quando suas perguntas filosóficas ficam sem resposta e

perde sua relevância porque pode se fazer teologia tomando como escopo unicamente a cultura

(método correlacional) 60. É inegável que a Bíblia tenha uma dimensão simbólica que em

muitos casos a aproxima das religiões mundiais, mas reduzi-la a isto seria mutilá-la.

Como se pode perceber entre Schillebeeckx e Tillich não há contraposição. Eles apenas

representam dois grupos que adotam métodos diferentes para atingir o mesmo objetivo: a

58 Peter Hodgson. Winds of Spirit. A constructive Christian Theology (Louisville, KT: Westminster John Knox Press, 1994), p. 13.

59 Paul Tillich. Systematic theology (Chicago: University of Chicago Press, 1953), vol. 1: 59-66; vol. 2: 14.

60 Paul Tillich. Systematic theology, vol. 1: 22-28.

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continuidade entre a cultura e a teologia, por uma destranscendentalização do divino 61. Os

representados por Tillich que adotam o princípio filosoficamente ligado à Fenomenologia, que

despreza o aspecto factual da Escritura em nome de uma essência religiosa compartilhada por

todas as religiões. Os seguidores de Schillebeeckx, que reforçam o princípio (c), tendo por

finalidade a superação do exclusivismo da Bíblia (o maior obstáculo para o diálogo inter-

religioso), enfatizando sua condição hermenêutica, especialmente o NT, e desconsiderando sua

natureza de testemunha autoritativa do evento crístico.

1.a.2.a.1. A Fenomenologia da Religião

O princípio (a) que se reporta à experiência religiosa, naturalmente ligada ao texto, passa

na fenomenologia a ser uma essência não doutrinária, uma experiência pré-linguística que tem o

poder de se tornar a base de uma síntese religiosa, dado que quanto a esta essência todas se

parecem, tendo os mesmos componentes estruturais. O exemplo mais famoso deste tipo de

abordagem é a obra de Rudolf Otto, O sagrado, onde seu autor toma a Escritura como manual

de exemplos das essências religiosas, comparando-as com as experiências de outras religiões.

É inegável que em muitos aspectos as experiências religiosas se assemelhem. Primeiro

porque todos os que as experimentam são seres humanos com estrutura biopsicossocial

parecida. Contudo, é preciso também levar em conta as profundas diferenças que as separam,

manifestas especialmente no modo de ver o sagrado, a salvação e a relação com o divino, o

certo e o errado nas práticas sagradas e profanas, os agentes espirituais e sua forma de atuar no

mundo; enfim, a própria maneira d e ver a realidade e a vida. A experiência religiosa não se

forma no vácuo intencional fenomenológico. Pelo contrário, o texto sagrado conforma as

61

L. Peacore. “Theology of experience” in William Dyrness and Veli-Matti Kärkkäinen. Global Dictionary. A resource for the worldwide Church (Downers Grove, IL/ Nottingham, UK: InterVarsity Press, 2008), p. 307.

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explicar as peculiaridades espirituais das diversas religiões do mundo, exceto sendo

considerado o processo educativo a que se submetem os povos mediante os mitos e ritos de

suas próprias religiões 67.

No caso específico do Cristianismo, as ideias de revelação, pecado e queda, de salvação

mediante unicamente Jesus, de Juízo, de restauração de todas as coisas, não podem ser

simplesmente alegorizadas ou metaforizadas. Sua acomodação a uma ideologia dominante –

como é o caso da Pós-modernidade – põe em perigo o Cristianismo como um todo. Não é

como pensam os incautos admiradores da fenomenologia, uma questão menor, ligada a

doutrinas que devem ser desprezadas em favor de uma essência comum. Os Cristãos não

podem, sem mais, deixar de levar em conta o fundamento de sua fé, as Escrituras, quando

buscam recontextualizar sua mensagem no mundo atual. Exceto se quiserem vê-la destruída.

1.a.2.a.2. A Hermenêutica Pós-moderna

Outra forma de jeitosamente colocar o exclusivismo das Escrituras fora das

considerações para entender o mundo plurirreligioso é negar à Bíblia sua condição

autoritativa, de veículo da revelação divina. Em se tratando do NT, o cerne das disputas sobre

o diálogo inter-religioso, segundo esta concepção, tem prioridade apenas cronológica. Ela é a

testemunha do esforço interpretativo dos cristãos p ara entender o evento crístico, que tiveram

o mesmo objetivo que temos ao ler sua história: tentar identificar o sentido mais profundo da

67

“Aqui não é o lugar de definir as características típicas de todas as religiões. Mas pode ser útil ilustrar por

exemplos os princípios expostos. Eis aí algumas delas: os antigos egípcios foram fascinados pelo mistério da

morte; todos os restos de sua civilização testemunham sobre esta intensa preocupação com a vida absoluta que surge depois da morte. Os gregos se confrontam com o problema da relação entre a forma e a vida criadora. Amaram um estilo grave e belo na arte, no comportamento, na filosofia, a loucura sagrada que rompe com todas as formas e que conduz o homem por trilhas estranhas. Os romanos apreciaram o valor do direito, no respeito

profundo pelos ‘numina’, eles seguiam prescrições determinadas para estar de acordo com as regras no culto, na vida social e na conduta pessoal. A sabedoria dos antigos chineses era viver em harmonia com a ordem do universo, o caminho, o grande Tao. O Judaísmo é caracterizado por um temor sagrado diante de Deus, sua santidade, um sentimento que anima o culto e a vida corriqueira. O Islã tira seu nome de uma total obediência de seus adeptos a Alá” (C. J. Bleeker. The Sacred bridge – Leiden: E. J. Brill, 1963, p. 34).

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esta ampliação estar ligada a uma deflação do texto bíblico, com sua metamorfose em meras

interpretações não normativas dos eventos neotestamentários, passíveis de serem substituídas

quando os tempos e os leitores forem outros. Digam o que quiserem os defensores deste

posicionamento, mas o nome disto é relativismo e isto destrói a capacidade normativa da

teologia. De acordo com estas teorias fica difícil responder por que os textos gnósticos não

fazem parte do NT hoje? Alguns estudiosos contemporâneos partidários da visão não

normativa do NT nos responderiam devolvendo-nos a pergunta: quem disse que não? 70

Para Geffré a empresa hermenêutica baseia-se em um conceito de Palavra de Deus que

não coincide com o de Escritura Sagrada, pois passa a ser entendida como testemunha

parcial da revelação divina, remetendo a plenitude semântica do evangelho a uma ordem

escatológica71. Isto significa que o texto dos evangelhos pertence à ordem do transitório e do

superável e, portanto, requer uma constante atualização de sua mensagem, não tendo ainda

chegado o tempo da consumação. O próprio Jesus, proclamado Cristo pela comunidade cristã

primitiva, possui uma dimensão histórica e humana que não esgota todas as possibilidades

revelacionais do Logos eterno. Portanto, faz parte da experiência cristã do sagrado a busca de

um Cristo desconhecido, que se apresenta em todas as experiências religiosas de todos os

seres humanos72. O círculo hermenêutico de Geffré, portanto, amplia-se e inclui também a

experiência religiosa humana, que exige a interpretação das Escrituras também à luz do

religioso não cristão, à medida que este seja identificado com o humano na sua acepção mais

profunda: o humano como o que se descentra e busca a transcendência 73.

De forma diferente o que todos dizem é que as dimensões histórica e textual dos relatos

bíblicos não são mais os referenciais hermenêuticos preferenciais. O sentido do texto não é

70 John D. Crossan. O Jesus histórico - A vida de um camponês mediterrâneo (Rio de Janeiro: Imago, 1994); The birth of Christianity (San Francisco/New York: Harper, 1998).

71 Claude Geffré.Le Christianisme au risque de l’interprétation (Paris: Cerf, 1988), p. 20.

72 Claude Geffré. De Babel à Pentecôte : Essais de théologie interreligieuse (Paris: Cerf, 2006), p. 32.

73 Claude Geffré.Crer e interpretar. A virada hermenêutica da Teologia (Petrópolis: Vozes, 2004), p. 148.

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especialmente os ensinos do Senhor Jesus, busca-se dar uma resposta às questões postas pelos

novos tempos. Nenhuma novidade em relação à plataforma hermenêutica reformada: sola

Scriptura, sola fides et sola gratia. Com a diferença de se enfrentar um problema novo e de se

demandar por ferramentas teóricas novas.

Não gostaríamos de nos delongar neste lugar para não repetir o que aqui seria dito

quando chegar o momento de detalhar o que neste lugar está sugerido, ou seja, no

fechamento deste trabalho. A seguir apresentamos as principais teorias e teóricos que

disputam as possíveis soluções para a questão levantada.

1. b. O status questionis da Teologia das Religiões

1.b.1. Introdução

O quadro é complexo e começou a se desenhar no começo da segunda metade do

século XX e toma hoje proporções de uma tarefa hermenêutica maior, que não cabe mais na

mera contextualização da pregação cristã. A crescente presença e importância das religiões

não cristãs requer a criação de uma nova disciplina teológica que doravante fica designada

como Teologia das Religiões, disciplina da subárea da Apologética, que nasce da

necessidade de justificar teologicamente o exclusivismo religioso cristão em face das

pretensões salvíficas da religiões mundiais. De acordo com Dupuis, a Teologia das

Religiões ganhou um status de disciplina autônoma na enciclopédia teológica no início da

década de setenta com a publicação de uma obra de V. Bonblik, Teologia delle Religioni 74.

Ela ganha este status por causa do alto grau de complexidade, patente pela enorme gama

74 Apud Michel Barns. Theology and the dialogue of religions, p. 7.

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metodologias e teorias, propostas por teólogos e filósofos da religião de todas as confissões.

Como consequência, fala-se hoje de Teologia das Religiões como há algumas décadas

falava-se de Religiões Comparadas, ou seja, como um a disciplina teológica e autônoma. Não

mais estudada no capítulo da doutrina da salvação, em que era especulada a condição salvífica

dos que nunca ouviram a pregação do evangelho, ou ocupada meramente com a justaposição

comparativa de doutrinas, credos religiosos e suas possíveis origens históricas e sociais, como

objetivava o estudo de Religiões Comparadas.

Mas, afinal, como é definida hoje esta nova disciplina por teólogos e filósofos da

religião? Algumas proposições são feitas, a seguinte é uma das mais esclarecedoras:

Teologia das religiões é uma disciplina de estudos teológicos que tenta avaliar teologicamente o significado e o valor das outras religiões. [...] pensar teologicamente sobre o que significa para os cristãos conviverem com povos de

outras religiões e sobre o Cristianismo com as outras religiões75

.

A repetição da palavra teologia e teológico indica que uma definição problemática está

aí oculta. Precisamos primeiro esclarecer o que é teologia ou teológico, O entendimento de

teologia das religiões depende do conceito de teologia. Teologia de um ponto de vista

epistemologicamente forte é uma ciência normativa que se baseia em textos sagrados para

definir o certo e o errado no campo religioso e axiológico e o verdadeiro e o falso no campo

ontológico. Teologia de uma perspectiva epistemologicamente fraca é um estudo explicativo

e classificatório das crenças religiosas e sua evolução histórica, por isso ela é facilmente

confundida com outra disciplina: História das Religiões. Se se adota a primeira definição de

Teologia pode-se usar dois nomes para a disciplina: Teologia da Religião e Teologia das

75

Veli-Matti Kärkkläinen. An introduction to the theology of religious (Downers Grove IL: Intervarsity Press, 2003), p. 20.

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(3) Teologias das Religiões, também conhecida como teologia pluralista das religiões,

pode ter um caráter meramente descritivo, se for ocaso de nos atermos à classificação e

tipologização das crenças religiosas, o que nos faria compartilhar seu objeto com a História

das Religiões. Mas, pode ser também normativa, se sua proposta for o diálogo inter-religioso

e o fim da violência simbólica. Neste caso, porém, apesar de atuar no campo axiológico, não

deve ser considerada uma disciplina teológica, pois o critério de sua normatização não seria

bíblico, mas filosófico.

A primeira e a última opção metodológica serão descartadas nesta pesquisa. A primeira,

por desconsiderar o terceiro princípio, isto é, ignora a realidade empírica das outras religiões.

A última, por não levar em conta o segundo princípio, ou seja, não faz das Escrituras seu

ponto de partida e, eo ipso, torna-se uma proposta metarreligiosa, por a filosofia abandonar

sua coadjuvância lógica, com que aparece na primeira e segunda opção, para torna-se o eixo

teórico principal. Na verdade, na melhor das hipóteses, ela deveria ser classificada em outro

lugar da enciclopédia das Ciências da Religião: Filosofia da Religião; e, na pior das hipóteses,

deveria ser considerada uma abordagem negativa às religiões, característica daqueles que

delas são inimigos, dado que destrói a relevância do discurso religioso, relativizando-o82.

Esta metodologia nega à religião sua essência: sua pretensão ao absoluto, considerada

um problema, por supostamente estar na origem dos conflitos religiosos mundiais. Na prática,

porém, ao o discurso das religiões ser relativizado, ao ser extraído deles sua essência – sua

pretensão à verdade, o que resulta desta operação n ada ganha em termos de diálogo inter-

religioso, pois troca-se um exclusivismo pelo outro. O que os filósofos da religião subtraem

das religiões assumem eles mesmos, posto que a abolição de seu absoluto decorre de uma

absolutização de um ponto de vista metarreligioso. Portanto, permanece a subscrição dos

82 Mário F. Miranda.O Cristianismo em face das religiões (São Paulo: Loyola, 1998), p. 22.

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filósofos da religião a um projeto iluminista83 e kantiano, que é adversário das religiões,

apesar de seus protestos em contrário. A religião segundo a ‘simples razão’, ou, deveríamos

dizer, ‘segundo a absoluta razão’ é uma religião mutilada e derruída de seus valores mais

importantes.

De sorte que, dada a incongruência dos resultados deste tipo de metodologia com o que

pretendem os teóricos que a defendem – o diálogo inter-religioso, deveríamos chamá-los de

inclusivistas e até de exclusivistas, mas nunca de pluralistas. Inclusivistas porque intencionam

incluir todas as religiões em seu quadro conceitual reducionista. Exclusivistas, pelo fato de

julgarem todas as religiões por um único e exclusivo método: o racionalista, rejeitando

qualquer outro que não se lhe submeta 84.

Os conceitos mais importantes produzidos por este tipo de empreendimento e inscritos

em sua linhagem como seus ascendentes foram “o sentimento da dependência absoluta” de F.

Schleiermacher85, “o sagrado” de Rudolf Otto e “a preocupação última” de Paul Tillich86. A

influência da primeira crítica de Kant é visível em todos estes pensadores, por se tratarem de

tentativas de definir a religião a partir de uma experiência reduzida a uma forma, esvaziada

de seu conteúdo. Ou seja, pela descoberta de um a priori, que possa ser apontado como uma

essência geral da religião, restrita a uma experiência abstrata e de natureza transcendental, de

acordo com o significado kantiano da palavra 87.

83 Gavin D’Costa (edt.). The meeting of religions and trinity (Maryknoll, NY: Orbis Books, 2000), pp. 1 e 2; Cf.

G. D’Costa. Christian uniqueness reconsidered. The myth of pluralistic theology of religions (Maryknoll, NY: Orbis Books, 1990; Mark Heim. Salvations. Truth and differences in religion (Maryknoll, NY: Orbis books, 1995).

84 Mark Heim. Salvations. Truth and differences in religion (Maryknoll NY: Orbis books, 1995).

85 Sobre a religião: discursos aos seus menosprezadore s eruditos (São Paulo: Novo Século/Fonte Editorial, 2000).

86 The new being (New York: Scribners, 1955); What’s religion? (New York/London: Harper & Row Publishers, 1973).

87 Aquilo que está fora da experiência, mas é sua condição de possibilidade.

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ou qualquer outra coisa, dos textos sagrados que a conformam, entretanto, há evidências

gritantes do contrário atestando que há uma relação dialética entre estas duas coisas.

Portanto, o projeto de chegar à essência da religião tendo como ponto de partida

nenhuma religião esbarra numa impossibilidade metodológica e epistemológica. Quanto à

primeira, é impossível fazer uma síntese de todas as religiões por causa de suas diferenças

irredutíveis, fazendo com que todos os pontos de contato entre as experiências religiosas

sejam superficiais 90. Uma analítica deste tipo serve apenas para distinguir o religioso do não

religioso, não serve para lançar pontes entre um tipo de experiência e outro.

Quanto à impossibilidade epistemológica, é impossível separar a prática religiosa de

suas doutrinas. Como já afirmado e reiterado, também se rejeita a opção (3) por um motivo

epistemológico. Não é possível fazer da Teologia da s Religiões uma colcha de retalhos que

reúna elementos de todas as religiosidades, pois o ponto de partida deverá ser sempre alguma

religião 91, porque, embora interpretando os mesmos fenômenos: a vida, a existência, o

sagrado, a relação com Deus, a salvação, as religiões sempre estão falando de coisas

diferentes. Para fazer sentido, a interpretação de cada aspecto desta realidade multifária, por

mais isolado que seja, tem que ter como referência um sistema como um todo 92 . Por

90 Um exemplo desta dificuldade é o conceito de amor: “a compaixão budista, o amor cristão – e se me for permitido citar um fenômeno quaserreligioso – a fraternidade da França revolucionária, não são modificações variadas de uma única consciência, emoção, atitude ou sentimento humano, mas são radicalmente (isto é, desde as raízes) distintas formas de experimentar e ser orientado em relação a si mesmo, ao próximo e ao cos mo.” (George Lindbeck apud Paul Hedges. Controversies in interreligious dialogue and the theology of religious – London: SCM Press, 2010, p. 154).

91 O. Thomas. “Religious plurality and contemporary philosophy: a critical survey” (HTR, April, 1994), p. 198.

92 Baseio-me aqui na semântica de L. Wittgenstein: “Uma vez escrevi “a proposição está colocada em

relação à realidade como uma vara de medir...” Eu agora prefiro dizer que um sistema de proposições está

colocado em relação à realidade como uma vara de medir. O que e u quero dizer é o seguinte. Se eu comparo a

vara de medir com um objeto espacial, eu comparo todas as linhas de graduação ao mesmo tempo... Se eu sei

que o objeto se estende até a linha 10, eu também sei imediatamente que ele não se estende até as linhas 11 e 12,

e assim por diante. As declarações descrevendo-me o comprimento de um objeto formam um sistema, um

sistema de proposições. Agora é este sistema de proposições que é comparado à realidade, não uma única

proposição .” (Friedrich Waismann e B. F. McGuiness (orgs.). Wittgenstein und die Wiener Kreis, Gespräche.

(Schriften 3, Frankfurt am Main, Suhrkamp Verlag, 1969), entrada de 25.12.1929.

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conseguinte, o corpo doutrinário das religiões são sistemas fechados, estruturas sistêmicas, e

não meramente poemas e/ou definições éticas justapostas, como parecem pensar alguns

teólogos. Para W. C. Smith, por exemplo, o dado empírico da sabedoria religiosa não cristã é

motivo suficiente para o Cristianismo adotar algumas de suas doutrinas:

Daqui em diante qualquer séria declaração intelectual sobre a fé cristã deve incluir necessariamente, se quiser atingir seu propósito entre os homens, algumas doutrinas das outras religiões. Nós explicamos o fato da via láctea mediante a

doutrina da criação, mas como explicar a existência do Bhagavad Gita?93

Os que defendem a possibilidade e a legitimidade de uma “teologia global” 94

caleidoscópica formam um grupo numeroso. Além do já citado Wilfred C. Smith95, também

Leonard Swidler96, Ninian Smart97, Keith Ward98. Estes autores laboram mais no campo

filosófico do que no teológico. Seu quadro epistemológico é pós-moderno, que se caracteriza

pela perda da visão sistêmica da realidade religiosa. Ou seja, assumem implicitamente que o

papel nomizante da religião foi mesmo transferido p ara a ciência claramente, cabendo à

religião uma dimensão estético-ética. Tornando discutível mesmo se neste contexto ainda

faria sentido falar de fé como categoria religiosa essencial, já que a religião não significaria

mais a adoção de um sistema de pensamento como um t odo, no interior do qual as pessoas

religiosas colocam-se e entendem a realidade que as rodeia.

Obviamente, o grau de comprometimento com certo discurso religioso pode variar de

época para época e de pessoa para pessoa, como é caso de compararmos a religiosidade dos

povos tradicionais e a dos industriais e pós-industriais. Contudo, é mais do que certo que

jamais poderá se tratar de mero assentimento intelectual, ou da experiência estética de um

93 Wilfred C. Smith apud A. Race. Christians and religious pluralism, p. 2.

94 Anselm Kyong Suk Min. The solidarity of others in a divided world: a postmodern theology after postmodernism (London: T & T Clark, 2004), p. 176.

95 Towards a World Theology: Faith and the Comparative History of Religion (Maryknoll, NY: Orbis, 1981).

96 Toward a Universal Theology of Religion (Maryknoll, NY: Orbis, 1987).

97 The world’s religions (Cambridge: the Press of Syndicate of University of Cambridge, 1998).

98 Religion and creation (Oxford: Oxford University Press, 2002); Religion and community (Oxford: Oxford University Press, 2000); Religion and human nature (Oxford: Oxford University Press, 2002).

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ignorando as outras ideologias societárias, ainda presentes no mundo. De que justificativa se

valem estes teólogos para elegerem os parâmetros pós-modernos como paradigmáticos para a

teologia se nem sequer a realidade empírica lhes presta total apoio?

Contra o que chamávamos pluralismo ‘colcha de retalhos’ também argumenta P.

Ricoeur, que é filósofo e sem estar diretamente envolvido no debate, pois parece defender um

ponto de vista pluralista particularista, tem uma posição que por ora serve de contraponto:

Se no fundo de minha fé Deus é verdadeiramente outro, não somente em relação a mim, mas outro em relação a todas as minhas representações, então posso confessar

que sua alteridade revelou-se e revela-se também em outro lugar, por intermédio de

outras escrituras. [...] Não posso confessar isto se não estiver eu mesmo ancorado em algum lugar, se não me puser a aprofundar e a escavar lá mesmo onde me encontro, esperando ouvir o eco da sonda e do trabalho de sondagem que os meus irmãos longínquos estão realizando em outros sítios, longe do meu, na superfície das culturas [...] [Porque] Não é possível de modo algum voar acima das culturas e das religiões: não existe um ponto de vista da estrela Sirius, porque não ser ia um ponto de vista: não se tem

acesso ao religioso a não ser por meio de uma religião específica 103

.

Evitando o relativismo que ainda se entremostra nas palavras de Ricouer, faz-se aqui um

adendo. Primeiro que, quanto ao problema kantiano das representações, nenhum cristão

minimante pensante hoje cogita que nossos conceitos sobre Deus sejam informação sobre sua

essência. Já Lutero, por sua vez, baseando-se em Paulo104, falava sobre o Deus revelatus ser

conhecido apenas no contexto da economia da salvação e o Deus absconditus ser Deus em sua

essência, é incognoscível por uma incompatibilidade ontológica: finitum non capax infinitus.

Em segundo lugar, quanto a um ponto fixo, peremptoriamente negado nestes tempos, pode-se

dizer que sim, há um ponto fixo, uma estrela Sirius em todo este universo religioso mundial:

Jesus Cristo, que julga as religiões, e se constitui como critério exterior e superior a elas.

103 Apud Carlos Cantone (org.). A reviravolta planetária de Deus(São Paulo: Paulinas, 1995), p. 54.

104 A palavra mistério (mysterion), assim como dela faz uso a teologia paulina, demonstra as limitações de nossa

compreensão do divino. Os diversos mistérios citados nas cartas de Paulo: “mistério de Deus” (I Co 4:1 ), “mistério de Sua

vontade” (Ef 1:9), “mistério do amor de Cristo por Sua Igreja (Ef 5:32), “mistério do Evangelho” (Ef 6:19), “mistério de

Cristo” (Cl 4:3) , “mistério da fé” (II Tm 3:9), “mistério da piedade” (I Tm 3:16), etc.

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Dizer isto, porém, não significa que como cristãos tornemo-nos juízes dos demais

adoradores, porque, não raro, estamos sob a a mesma palavra profética de Jesus, já que o que

torna uma religião verdadeira não é só um correto discurso sobre Deus – a ortodoxia –, mas

também uma práxis correta em relação às criaturas de Deus, que somos todos, cristãos e não

cristãos – a ortopráxis. E nisto todos ficamos a dever, não cabendo a ninguém a prerrogativa

de julgar, exceto ao Senhor. O vínculo institucional nada significa diante da demanda

profética que nos é dirigida. A sombra do juízo obscurece todas as práticas e discursos.

Portanto, a última palavra sobre as religiões necessita de uma “verificação escatológica” 105.

Ressalve-se que esta expressão não refere-se a um evento futuro, finalmente revelador de

quais religiões passam pelo escrutínio divino e quais não 106. A própria história terrena de

Jesus já se constitui como verificação escatológica por meio do conceito de “reino de Deus”.

Concluindo, resta-nos citar Harold Netland, cuja definição do âmbito da Teologia das

religiões sumariza o quadro de interesses da disciplina nascente que é adotada pela

investigação transcorrente:

(1) a questão soteriológica do destino dos não evangelizados; (2) a explicação teológica sobre o fenômeno da religiosidade humana; e (3) a questão missiológica sobre em que medida podemos nos adaptar e construir o estabelecimento da Igreja

em vários contextos culturais a partir de aspectos de outras tradições religiosas 107

.

Com a ressalva que o segundo ponto (2) não será alvo de exame senão colateralmente,

dadas as dimensões limitadas deste trabalho. Em seu lugar será considerado o status salvífico

das religiões. Ou seja, coloca-se como pergunta inicial orientadora: como harmonizar a

peculiaridade do Cristianismo, seu privilégio salvífico e revelacional na pessoa de Jesus

105

Adolphe Gesché, “O cristianismo e as outras religiões”, in: Faustino TEIXEIRA (Org.), Diálogo de pássaros, (São Paulo: Paulinas, 1993), p. 42. 106

E. Schillebeeckx. História humana, revelação de Deus (São Paulo, Paulus, 1994), p. 211. 107

Harold Netland. Encountering religious pluralism. The challenge to Christian faith and mission (Downers Grove: InterVarsity, 2001), p. 310.

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Cristo, com o devido respeito às religiões e à sua sabedoria religiosa? Antes de seguirmos

nesta direção é necessário analisar o estado da questão atual. Em que pé se encontram as

discussões? Quem são os principais disputantes quanto à sistematização da área ora em

formação?

1.b.2. Algumas taxonomias classificatórias

Não há uma única forma de responder a pergunta pela nova configuração religiosa

mundial e quanto ao modo de o Cristianismo colocar-se neste quadro. Uma vasta gama de

teorias tem sido convocadas para classificar e sistematizar o modo como o Cristianismo pode

se relacionar com as outras religiões. Apresenta-se a seguir, algumas das mais importantes

abordagens tipológicas e seus respectivos proponentes.

Entre Católicos, conta entre as mais antigas a tipologia de J. P. Schneller108, que a meu

ver não é boa, pois não define com suficiente abrangência as possibilidades conceituais e os

sujeitos religiosos implicados: (a) o universo eclesiocêntrico - proposta exclusivista, alusivo

ao famoso lema católico romano: extra ecclesiam nulla salus (fora da Igreja não há salvação);

(b) o universo cristocêntrico - proposição inclusivista que toma o logos (o Cristo pré-

existente) como eixo central do diálogo religioso:extra Christo nulla salus; (c) e o universo

teocêntrico – proposta pluralista que faz de Deus uma experiência universal e o centro do

diálogo religioso: extra Deo nulla salus. Como se pode perceber, os sujeitos definidos por

esta tipologia habitam preferencialmente o espaço teológico Católico Romano e em menor

medida o Protestante histórico, dado que sua ênfase é eclesiológica. Não seria adequada, por

exemplo, para a teologia Evangélica e para os Independentes, que são franca minoria.

108

Apud Jacques Dupuis, Rumo a uma teologia cristã do pluralismo religioso (São Paulo: Paulinas, 1999), p. 255.

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adequado para o diálogo inter- religioso segundo Knitter111.

Uma alternativa tipológica semelhante é a de H. Küng, baseada não mais na intenção

institucional do Cristianismo em relação às demais religiões, mas na questão da verdade

religiosa: (1) nenhuma religião é verdadeira, (2) somente uma religião é verdadeira, (3) todas

as religiões são verdadeiras, (4) uma religião é verdadeira, as outras são verdadeiras à medida

que participam desta verdade112. Para Küng, do ponto de vista salvífico, todas as religiões são

verdadeiras, mas a que carrega a vida e a obra de Jesus Cristo é a única eticamente

normativa113.

De todas as tipologias a de A. Race114, a meu ver, permanece como a mais interessante,

pela abrangência e pela simplicidade conceitual, e porque de certa forma faz jus a todos os

disputantes (Católicos, Protestantes, Evangélicos, Independentes e Pentecostais). Como foi

dito mais acima compreende três tipos: (a) O Exclusivismo, em que o dado material da

existência das outras religiões é desprezado em favor da importância salvífica do

Cristianismo; (b) o Inclusivismo, em que há uma tentativa de se manter tanto a importância

salvífica do Cristianismo como o amor de Deus pelo gênero humano (a vontade salvífica

universal de Deus também se manifesta nas religiões, ainda que de maneira secundária); e,

finalmente, (c) o Pluralismo, segundo o qual a importância salvífica do Cristianismo

111 Esta tipologia merece sérias ressalvas, contudo, ela de início está declarada Católica, o que esvazia nossa

intenção de fazê-las. O projeto imperialista, por exemplo, que está implícito em sua formulação, especialmente

do modelo da Substituição, só faz sentido na missiologia Católico Romana; o mesmo se aplica ao modelo do

Cumprimento, que tem por pano de fundo a doutrina da presença sacramental da Igreja Romana na vida de

todos os seres humanos. Estas ideias serão desdobradas ma is adiante, quando ocorrer a discussão específica. 112 Hans Küng. “What is true religion? Toward an ecumenical criteriology” in Leonard Swidler (ed.) Toward a universal theology of religion (Maryknoll, NY: Orbis Books, 1987), pp. 231-250.

113 Mais a frente, no tópico sobre Hans Küng, isto será discutido com mais profundidade. 114 Christians and religious pluralism; patterns in the Christian theology of religions (New York: Orbis Books, 1986). Logo depois Gavin D’Costa publicou Theology and religious pluralism: the challenge of other religions

(London: SCM Press, 1986), seguindo a mesma terminologia.

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desaparece diante da importância do amor de Deus, que, por um desígnio universal de

salvação, está destinado a todos e manifesta-se em todas as religiões.

A distribuição denominacional atual desses posicionamentos, quase invariavelmente

parece ser a seguinte: os teólogos exclusivistas geralmente são: Protestantes Históricos mais

tradicionais, Evangélicos, Pentecostais, Independentes (Adventistas do Sétimo Dia, Santos dos

Últimos Dias e Testemunhas de Jeová) e teólogos católicos que ainda resistem às ‘conquistas’

do Concílio Vaticano II; os inclusivistas são alguns evangélicos, mas principalmente teólogos

católicos; e os pluralistas, ex-religiosos Católicos, Protestantes Liberais, em sua maioria

professores de teologia em faculdades não confessionais.

Sob o risco de algumas omissões importantes, podemos tentar apontar os pensadores mais

representativos de cada grupo. Entre os exclusivistas estão: os Protestantes, Karl Barth 115, Emil

Brunner 116; a maior parte dos Evangélicos: Clark Pinnock117, Gerald R. McDermott118, Harold

Netland119; e os pentecostais: Veli-Matti Kärkkäinen (obra já citada) e Amos Yong 120. Entre os

inclusivistas, estão grandes expoentes da teologia Católica pós Vaticano II: Karl Rahner 121,

Jacques Dupuis122, John A. DiNoia 123 e Edward Schillebeeckx124.

115 Principalmente, Epistle to the Romans (New York, Oxford University Press, 1980), mas também em sua obra magna: Church Dogmatics (Edinburgh, T & T Clark, 1961).

116 Natural Theology (London: Backwell, 1951).

117 A wideness in God’s mercy: the finality of Jesus Christ in a world of religions, op. cit.

118 God’s rivals. Why has God allowed different religions? Insights from the Bible and the early church

(Downers Grove: intervarsity Press, 2006); Can evangelicals learn from world’s religions? (Downers Grove, IL: InterVarsity Press, 2000.

119 Encountering religious pluralism. The challenge to Christian faith (Downers Grove, IL: Intervarsity Press, 2001); with Edward Rommen (eds.). Christianity and the religions. A biblical theology of world religions

(Pasadena: Evangelical Missiological Society, 1995).

120 Discerning of the Spirit (s). A Pentecostal-Charismatic contribution to Christian Theology of Religions

(Sheffield, UK: Sheffield Academic Press, 2000).

121 Curso fundamental da fé(São Paulo, Paulinas, 1989).

122 Teologia a caminho, fundamentação para o diálogo ecumênico(São Paulo, Paulus, 1999).

123 The diversity of religions: a Christian perspective (Washington, DC: The Catholic University of America Press, 1992).

124 Jesús, la historia de un viviente (Madrid, Ediciones Cristianidad, 1981).

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Figuram entre os pluralistas primeiramente os teólogos calólicos: Paul Knitter 125, Hans

Kûng 126, Claude Geffré 127, Roger Haight 128, Galvin D’Costa 129; teólogos asiáticos: católicos

– M. Amaladoss 130, R. Panikkar 131, e o protestante S. Samartha 132. Depois os protestantes,

começando com o propositor desta classificação, Allan Race, também J. Moltmann 133, John

Hick 134, H. Coward 135, S. Mark Heim 136, etc.

Obviamente, esta lista tem vários problemas. Além das inevitáveis omissões e da

parcialidade que caracteriza alguém que escreve da perspectiva Ocidental – sem levar em

conta a teologia da Igreja oriental, por exemplo –, estamos cientes do quanto é perigoso fazer

categorizações tão genéricas, quase sempre incapazes de definir de forma exata e adequada a

posição dos debatedores, muitos deles injustamente incluídos numa ou outra categoria.

Gavin D’Costa tem várias ressalvas em relação à tipologia de A. Race. A primeira delas

diz respeito à complexidade do pensamento de alguns desses pensadores, como é o caso de K.

Barth, K. Rahner e J. Hick, respectivamente classificados, segundo a tipologia de Race, como

exclusivista, inclusivista e pluralista. Contudo, D’Costa chama nossa atenção para o fato de

que todos defendem uma reconciliação universal (apocatástasis) final, tal

125 No Other Name? (Maryknoll, NY: Orbis Books, 1985); One Earth Many Religions (Maryknoll, NY: Orbis

Books, 1995); Jesus and the other names. Christian mission and global responsability (Maryknoll, NY: Orbis

Books, 1996).

126 Ser cristão (Rio de Janeiro: Imago, 1976); Christianity. The religious situation of our times (London: SCM

Press, 1995). 127 De Babel à Pentecôte: Essais de théologie interreli gieuse (Paris: Du Cerf, 2006).

128 Jesus, symbol of God (Maryknoll NY: Orbis Books, 1999).

129 Theology and religious pluralism: the challenge of other religions (Oxford: Basil Blackwell, 1986). 130 The Asian Jesus (Maryknoll, NY: Orbis Books, 2006). 131 The unknown Christ of Hinduism: towards am ecumenical Christophany (London: Danton, 1964). 132 One Christ, many religions: towards a revised Christology (Maryknoll, NY: Orbis Books, 1991.

133 The Church in the Power of the Holy Spirit (London: SCM Press, 1977); Experiências de reflexão teológica: caminhos e formas da teologia cristã (São Leopoldo, RS: Unisinos, 2004).

134 The Myth of Christian Uniqueness: Toward a Pluralistic Theology of Religions (New York: Orbis Books,

1987). 135 Pluralism: challenges to world religions (Maryknoll, NY: Orbis Books, 1985).

136 Salvations. Truth and differences in religions (Maryknoll, NY: Orbis Books, 1995).

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como já foi afirmado, há teorias tão complexas que não faz o menor sentido chamá-las de

exclusivistas, inclusivistas ou pluralistas. A própria abordagem bíblica do tema, por exemplo,

apresenta esta complexidade. A seguir passamos a apresentar, em que pesem as ressalvas, a

tipologia de Race, com seus principais representantes, seguindo uma ordem cronológica (da

mais antiga para as mais recentes). Deploramos não ser possível senão uma apresentação

sucinta das ideias dos debatedores devido aos limites deste trabalho, proposto como discussão

introdutória. No último capítulo será apresentado o princípio escatológico de Jesus, conforme

nossa leitura dos evangelhos.

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CAPÍTULO II

Exclusivismo

2. a. Introdução

A visão exclusivista foi hegemônica durante a maior parte da era cristã, variando apenas

quanto à ênfase ou ao grau. São dois mil anos de exclusivismos, atenuados apenas nas últimas

décadas do século XX. Contudo, o Exclusivismo não é um bloco monolítico onde imperam

pretensões salvíficas monopolistas: extra ecclesiam nula salus. Não existe um exclusivismo,

mas vários. A palavra implica de si uma carga semiótica dúplice: quem exclui e quem é

excluído. Com efeito, do latim originariamente, exclaudere significa fechar, expelir. Encerrar

algo para usufruto de alguns e por extensão impedir o usufruto de outros. Temos aí, portanto,

quatro possibilidades de ênfase. Quanto ao aspecto afirmativo, (a’) ela significa a salvação por

um único meio, (a’’) também o acesso exclusivo de um determinado grupo à salvação; quanto

ao aspecto negativo, pode significar (b’) a exclusão dos outros meios salvíficos e (b’’) a

exclusão de outros grupos. Por óbvio que afirmar (a’ e a’’) é por extensão afirmar (b’ e b’’),

com uma pequena, mas importante diferença: afirmar (a’) pode significar exceções em (b’’);

mas, afirmar (b’ e b’’) não deixa margem a exceções.

Algo semelhante Ronald Nash diz em seu livro, ainda que de modo mais simples.

Entre os exclusivistas existem dois grupos: o Exclusivismo-ponto, que enfatiza (b), e, por

conseguinte, não admite exceções; e o Exclusivismo-mas, que ressalta (a) e, mas deixa aberta

a possibilidade para exceções 139. Podemos por isso chamá-los (a) Exclusivismo forte

139 Ronald Nash. Is Jesus the only savior (Grand Rapids: Zondervan, 1994), prefácio.

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As sutilezas específicas de cada tipo de abordagem serão esclarecidas à medida que forem

sendo apresentadas.

2.b. Igreja Pré-constantiniana

Não se pode classificar a Igreja do Novo Testamento como exclusivista tout court.

Além desta problemática ambiguidade entre as versões fraca e forte do Exclusivismo, o fato

de ela defender a capacidade salvífica exclusiva de Jesus Cristo, bem como o exclusivo

agenciamento divino da Igreja, também não significa várias coisas. Por exemplo, não significa

a subsunção das outras modalidades salvíficas sob o que seria um suposto guarda-chuva

sacramental da Igreja, que é um desenvolvimento teológico posterior; e não quer dizer

também um projeto expansionista da religião que caminhe pari passu com um expansionismo

imperialista ou colonialista; e tampouco é a capacidade ou o direito de perseguir modalidades

de Cristianismo consideradas estranhas à fé hegemônica sob sua custódia. Todas estas

atribuições pertencem à Igreja Pós-constantiniana, ou seja, àquela Igreja transformada em

religião oficial do Império Romano Oriental por decreto de Constantino. Foi esta Igreja que se

organizou em bispados, cujo modelo administrativo e a jurisdição coincidiam com as regiões

geográficas das províncias imperiais. Foi ela que recebeu autoridade judicial e a repassou a

seus bispos, foi também ela que promoveu uma guerra religiosa contra Donatistas,

Monofisitas, Maniqueus, Nestorianos, etc.140, e que de certo modo preparou o terreno para a

expansão do islamismo em território antes dominado pelo Cristianismo.

O exclusivismo da Igreja Primitiva é um exclusivismo de um movimento minoritário

buscando converter indivíduos presentes naquela grande assembleia que a globalização

helenista vinha reunindo ao redor do mundo desde o III século a. C. Onde não havia religião

140

Roger Haight. Christian Community in history. Historical ecclesiology (New York: The continuum international publishing group, 2004), p. 202.

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redation Criticism) 141. Este aspecto foi extremamente negligenciado tanto pela História da

Forma (Formegeschichte) como pela primeira geração da História da Redação

(Redaktiongeschichte), mas sem o que a questão do significado dos textos não se resolve. Do

ponto de vista da semântica pode-se dizer que nos evangelhos existem dois tipos de referentes.

O referente textual preocupado em contar a história de Jesus e o referente social, que visa à

experiência das comunidades e dos potenciais ouvintes dos evangelhos. Sua técnica redacional

consistia em fazer a comunidade se reconhecer nas histórias de Jesus, dos discípulos e outros

personagens dos evangelhos; fazer uma história incluir a outra; fazer com que o passado de

Jesus e o dos discípulos refletisse o presente das comunidades ou leitores destinatários142.

As comunidades receptoras das tradições de Jesus travavam uma luta encarniçada para

sobreviver num ambiente hostil à sua fé, com grau de oposição que crescia à medida que

também expandiam seus limites. A reconstrução da história de Jesus levada a efeito por cada

uma destas comunidades deveria ter em conta estas lutas. Para eles era essencial que Jesus se

lhes assemelhasse e fosse um modelo a ser contemplado e seguido, face às dificuldades que

enfrentavam.

Além disso, as comunidades receptoras e difusoras das tradições de Jesus também se

debatiam com profundas transformações internas. Isto significa que estes textos foram

redacionados em períodos de crise identitária, por causa de perseguições imperiais ou

judaicas, por estarem deixando de ser um ramo do Judaísmo143. Com efeito, Mateus e Lucas

141

Gerd Theissen in epílogo de R. Bultmann. Historia de la tradición sinóptica (Salamanca: Ediciones Sígueme, 2000). p. 422. 142 François Viljoen. “Mathew, the church and anti-Sem itism” ( VE, 28, 2, 2007), p. 699.

143 O antagonismo entre Cristãos e Judeus cresceu muit o depois da destruição do templo na primeira Guerra judaica (68-70

d. C.). O Judaísmo em formação daque la época não tendo mais um templo ao redor do qual orbitar, foi gradativamente

transferindo sua lealdade para o Rabinismo, movimento originário do Farisaísmo. (J. A. Overman. O evangelho de Mateus e o

Judaísmo formativo. O mundo social da comunidade de Mateus – São Paulo: Loyola, 1997), p. 45.

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com Tillich de quase-religiões147, tinham sido fundadas por filósofos, e inicialmente até

possuíam um impulso ético e moral bastante elevado, mas época neotestamentária já tinham

caído no mais puro hedonismo, como é exemplo dos Epicureus.

(b) O Cristianismo como religião minoritária, num esforço para constituir sua identidade

e conquistar seu lugar ao sol era pressionado tanto por Judeus como por Gentios. Daí a

tendência de apresentar uma face polêmica e agressiva quando com eles se relacionava:

Os escritores do Novo Testamento se alinharam completamente ao Judaísmo, que já tinha desenvolvido polêmicas contra a religião pagã e que era a contraparte do agressivo antissemitismo dirigido contra os Judeus. Os profetas do antigo Israel zombavam do politeísmo de seus vizinhos gentios, definindo sua adoração como idolatria. E esta tradição teve continuidade no acerbo antagonismo dos Judeus contra

a adoração da população majoritária da diáspora helenística148

.

Este espírito polêmico penetrara primeiro na Septuaginta (LXX, 250 a. C.), num

derrame de duras traduções do hebraico, que viriam a comprovar-se de enormes

consequências para as futuras relações entre Cristã os e não Cristãos. Salmo 96:5 diz: “os

deuses das nações são ídolos”; “os deuses das nações são demônios (daimonia)” (Sl. 95:5),

portanto, colocando todas as religiões gentílicas sob o signo do demoníaco149. Apesar de a

Septuaginta ter sido a base do NT, a redação cristã não adotou este espírito intolerante, muitas

vezes abertamente hostil contra a gentilidade, que antes refletia as dificuldades dos Judeus

para preservar sua fé no mundo helenístico durante o período selêucida. Todos incluíram os

Gentios no projeto do reino de Deus, variando apenas quanto ao grau de submissão às práticas

147 Conceito aplicado por P. Tillich às ideologias radicais de esquerda e de direita do século XX (Nazismo, Fascismo, Comunismo) por conta de suas pretensões totalitárias que incluíam mesmo a dimensão religiosa da vida societária. Cf. Paul Tillich. El futuro de las religiones (Buenos Aires: Ed. La Aurora, 1976). 148 Ibid., p. 2.

149 Outros textos do AT não são menos encomiásticos: “vaidade, obra ridícula” (Jr. 10: 15); “carentes de sopro vital” (Jr 51: 17); “nada” (Is 44: 9); “vazio” (Jr 2: 5; 16: 19); “mentira” (Jr 10: 14; Am 2: 4); “demônios” (Dt 32: 17. Os deuterocanônicos e/ou apócrifos os acompanha m de perto: “coisas mortas” (Sb 13: 10); “mentira” (Br 6: 50); “as feras valem mais do que eles” (Br 6:67); “ causa e fim de todo mal” (Sb 14: 17).

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seus reproches, nele os Judeus são chamados “sinagoga de Satanás” (Ap 2: 9) e os Gentios

são seguidores da Grande Meretriz (cap. 17).

O quadro não é simples. O Novo Testamento possui páginas elogiosas à gentilidade,

especialmente dirigida aos representantes dignos e justos que aceitaram o convite do

evangelho; por outro lado, há as referências vergonhosas, como as citadas. A gentilidade

neotestamentária é tudo menos simples e rotulável. Para o NT há gentios e gentios, mais e

menos distanciados do Cristianismo. Além disto, tratava-se de uma realidade dinâmica e em

constante mutação, inundada por antigos e novos credos, todos sofrendo transformações

profundas por causa do intenso sincretismo que unia tudo num caudal cultual comum 152.

Vindos de todas as partes para disputar espaço no mundo globalizado greco-romano, os

deuses e as religiões contavam-se aos milhares. Os deuses agrários originários da antiga

sociedade romana (Lares); os deuses gregos de Homero e Hesíodo; os deuses das religiões de

mistéricas gregas (mistérios eleusinos, dionisíacos e órficos)153 e os mistérios importados do

Egito e da Ásia Menor (Isis, Cibele, Atargatis154 e Adônis, respectivamente; os deuses de

religiões míticas de origem persa (Mitra)155 e siríaca (Júpiter Doliqueno)156, levados

152

Depois das conquistas de Alexandre (III século a. C.) o koiné mediterrâneo apresentava aos indivíduos os

novos desafios e oportunidades de uma salvação individualista, onde o sincretismo ocorria ao sabor do gosto e inclinações de cada um (John Anton. “Theourgia – De miourgia: a controversial issue in Hellenistic thought and religion. in Richard T. Wallis (ed.). Neoplatonism and Gnosticism - Albany: State University of New York Press, 1992, p. 28). 153

“A partir do quarto século, a forma da religião grega que atraía a maioria das pessoas mais educadas não era

a religião dos deuses olímpicos, mas aqueles dos mistérios, que davam aos indivíduos uma relação mais pessoal com a divindade” (Werner Jaeger. Early Christianity and Greek Paideia – Cambridge: Belknap Press of Harvard University Press, 1961, p. 55). 154

Como deusa da reprodução seu símbolo mais importante é o falo. Segundo Apuleio no Asno de Ouro, seus sacerdotes são homens emasculados e invertidos sexuais, praticantes da prostituição ritual. (Jaime Alvar. “Cultos sírios”. In Jaime Alvar et al.Cristianismo primitivo y religiones mistérica – Madrid: Cátedra, 1995, pp. 446 e 447. 155

“Ahura-Mazda ocupa a posição hegemônica do panteão [persa], enquanto Mitra aparece como comandante militar, chefe dos exércitos da justiça, defensor da ordem contra o caos e da luz em confronto com as trevas”. (Jaime Alvar. “El misterio de Mitra”. In Jaime Alvar et al.Cristianismo primitivo y religiones mistéricas, p. 508).

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(Augusto César) e, segundo os dons concedidos por Asclepius – deus da Medicina, curar

doentes (Vespasiano),160.

Títulos tais como ‘Senhor’, ‘Salvador’, ‘Filho de deus’, eram usados pelos suplicantes para

interpelar os imperadores romanos em orações. O próprio termo evangelho (euaggelion), ou ‘Boas

novas’ era usado pelos arautos do imperador quando anunciavam seu beneplácito aos cidadãos de

uma determinada cidade: distribuição gratuita de cereal e convite para participação em

festividades cívicas, promovidas para comemorar novas conquistas territoriais, etc.161.

Não se deve subestimar a força dessa religião civil. Ela era o cimento que unia os povos

subjugados em torno de Roma, a capital do mundo, ainda que entre estes povos e na própria

cidade ‘eterna’ fossem adorados numerosos deuses, como vimos demonstrando. As elites

locais dos povos dominados tinham grande interesse em patrocinar o culto ao imperador162.

Fazendo-o, atraíam a si o favor de suas legiões, para garantirem seus impostos, e ficarem

protegidos contra revoluções e insurreições locais e invasões de outros reis-clientes.

Mas não era só uma questão de pragmatismo político, o que fazia o culto ao imperador

crescer e ganhar popularidade.

A permeabilidade e a dispersividade intrínsecas do politeísmo fizeram do culto ao imperador não apenas uma prática inteligível como também lógica. Se a divindade se revelava por sua efetiva presença e poder, então aqueles que exercessem o domínio imperial sobre toda a oikoumene eram verdadeiramente theoi phenomenoi

(deuses visíveis)163

.

160

Amy-Jill Levine, Dale C. Allison Jr., John D. Crossan. The historical Jesus in context, Princeton: Princeton University Press, 2006, p. 28. 161 Ibid., p. 29.

162 Havia em Atenas treze pequenos altares dedicados exclusivamente a Augusto. O imperador Cláudio, sob cujo

reinado Paulo chegou a Atenas, é descrito em uma das inscrições dedicadas a ele como “Senhor e Benfeitor”.

Também havia um culto completo a Antônia Augusta, designada como θεα Άvτovία, com sacerdotes e mais

tarde com sumos sacerdotes, já que Atenas era considerada o lugar de sua concepção (David Gill e Conrad

Gempf (eds.). The book of Acts in its first century setting – Grand Rapids: Wm. B. Eerdmans, 1994, p. 85).

163 Luke T. Johnson, Among Gentiles, p. 37.

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forte proselitismo166, merecendo por isso observações ferinas de escrito res clássicos latinos.

Horácio, poeta latino do I século a. C., declara: se “não queres vir voluntariamente, faremos os Judeus te obrigarem a vir” 167. Por conta deste proselitismo surgiu a figura religiosa do

temente a Deus (pheboumenos ton theon), piedoso ou adorador de Deus (theosebes),

sebomenon proselyton (prosélitos) (At 13: 43). Ou seja, Judeus não étnicos, mas religiosos,

que observavam a lei de Moisés tal como um Judeu de nascimento, ou, pessoas que

observavam a lei sem nunca chegarem a se deixar circuncidar, ou ainda, pessoas

simpatizantes do Judaísmo.

A evidência para Gentios aderentes do Judaísmo, contudo, não pode se limitar a esta terminologia. [...] Declarações de Philo e Sêneca falam sobre a expansão das leis judaicas e Josefo argumenta que os Judeus de Antioquia incorporaram parcialmente

admiradores Gentios168

.

Quando as missões cristãs começaram a penetrar nos lugares onde as missões judaicas

já atuavam, obviamente os Judeus não gostaram nada de ver concorrentes para atrapalhar seus

esforços de ganhar o mundo para sua fé. O livro de Atos apresenta a seus leitores um grande

número de Gentios justos que apesar de não abraçar e m abertamente ao Judaísmo, mormente

por causa da incompatibilidade de sua ocupação no serviço público (onde teriam que prestar

culto ao imperador), ainda assim se mostravam dispostos a ouvir a pregação dos apóstolos e

evangelistas cristãos: o centurião Cornélio (At. 10: 1 – 5), o centurião cujo servo fora curado

(Lc. 7: 2 – 4), o pro cônsul Sergio Publius (At. 13: 7, 12), o carcereiro filipense (At. 16: 25-

34), o pro cônsul Gálio (18: 12 – 14) e Publius, principal da ilha de Malta (28:7-10).

166 “As massas desde muito têm mostrado entusiástico desejo de adotar nossas observâncias religiosas, e não há

uma cidade, grega ou bárbara, nem uma única nação,a qual nosso costume de nos abster do trabalho aos sábados e

onde jejuns e a festa das luzes e muitas de nossas proibições em questões de alimentação não sejam observadas” (

Ag. Ap. 2: 282).

167 Apud Daniel Rode “el Todopoderoso en la misión de bendecir a todas las etnias”. In Elias Brasil. Teologia e metodologia da missão (Cachoeira: Ceplib, 2011), p. 430.

168 John J. Collins. Between Athens and Jerusalem. Jewish identity in the Hellenistic Diaspora (Grand Rapids: Eerdmans Publishing, 2000), p. 266.

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Ao longo do primeiro século a situação só pioraria, também por causa de seguidos

decretos imperiais que interditavam a prática da religião cristã 169, agora não mais identificada

como uma seita do Judaísmo, mas como religião independente. Como se sabe o Estado romano

nunca moveu perseguições contra os cristãos nem promoveu investigações para apurar quem

praticava o Cristianismo clandestinamente. Apenas se limitava a deter e julgar aqueles que eram

acusados de serem seguidores de Cristo170. Ao que parece que alguns Judeus devem ter delatado

Cristãos e com isto desencadeado todo um processo inamistoso que atravessou os séculos.

Com tudo isto, o Exclusivismo Forte do NT não pode ser superestimado. O Novo

Testamento possui várias passagens que apontam nesta direção. Os escritores do NT são claros

em declarar Jesus Cristo como único e suficiente salvador “não existe nenhum outro nome pelo

qual importa que sejamos salvos” (At 4: 1 2); “só existe um mediador entre Deus e os homens”

(Tm 2: 5); “Eu sou o caminho a verdade e a vida e ninguém vem ao Pai senão por mim” (Jo 14:

6). E sua Igreja como agência difusa de sua mensagem (Mt 28: 19). O Exclusivismo Fraco do

NT, contudo, transparece na convicção de que a vontade divina é pela salvação de todos os

povos da terra, inclusive daqueles que praticam religiões não cristãs (II Pd 3: 9; I Tm 2: 4). A

convicção de que todos são filhos do mesmo Deus, de que o mesmo Espírito opera em todos

(Jo 3: 8), e ainda que ignorem o que expressamente está declarado nas Escrituras serão todos

julgados pela mesma lei, pois todos têm-na impressa na consciência (Rm 2: 15) e podem

perceber o Criador pelas obras de suas mãos (Rm 1: 20).

Em suma, o NT é exclusivista, mas pode ser mais ou menos, de acordo com a ênfase

colocada em determinadas passagens. O Cristianismo, repetindo a história de suas fontes, tem

169

No tempo do imperador Trajano, por volta do ano 101 d. C., como dá conta a correspondência entre o governador da Bitínia e o citado (Justo Gonzalez, Uma história ilustrada do Cristianismo, vol. 1, 1991, p. 62). 170

A recomendação de Trajano era de que não se devia mover investigações contra Cristãos, mas se alguém

fosse acusado desta prática e se negasse a prestar culto ao imperador deveria ser supliciado. Assim, por volta de 107 d. C. Inácio de Antioquia foi condenado à morte. Depois muitos outros cristãos o seguiram às feras (Ibid., pp.64 e 66).

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2.c. Exclusivismo Católico Romano

Dos seus primórdios o Catolicismo Romano progrediu rapidamente para um

Exclusivismo mais restrito. Ainda se discute o que o teria levado a esta guinada oclusiva tão

rápida desde o início do período pós-constantiniano (325 d. C.). Vários fatores podem ser

apontados: (a) o primeiro foi o fortalecimento institucional e a politização da esfera religiosa,

graças ao vácuo administrativo deixado pela mudança da capital de Roma para

Constantinopla173. Secundariamente sob esta mesma rubrica, houve também a adoção do

bispado monárquico como forma de governo eclesiástico e o constante enfrentamento de

dissidências internas e externas.

O segundo fator, agora de uma (b) perspectiva teológica, o pensamento de Agostinho foi

uma influência muito importante. Em Agostinho há uma visão profundamente pessimista da

humanidade, para ele, em sua condição caída, massa danata, gerada pela concupiscência

humana (relação sexual)174. Toda a teologia da queda, do pecado original e da incapacidade

humana de evitar o pecado e promover o Bem (non posse non peccare ou impossibilitas non

peccandi), conforme aparecem na controvérsia com Pelágio, faziam pensar que fora da graça

divina tudo já estivesse de antemão condenado 175. Como corolário de toda esta teologia

lapsariana, surgem os sacramentos e sua imprescindibilidade para a salvação dos mortais, vindo

daí a prática do batismo infantil e a criação de um lugar especial para os justos nascidos fora do

espaço sacramental da Igreja: o limbo, onde estariam Platão e Aristóteles.

Esta concepção atravessou os séculos na Igreja Católica e persuadiu até grandes mentes

como Tomás de Aquino a endossar firmemente e até contribuir para seu aprofundamento,

173 Helen C. Evans e William D. Wixom. The glory of Byzantium. Art and culture of the middle Bizantine era

(New York: The metropolitan museum of art, 1997), p. 21. 174 Sto. Agostinho apud K. Armstrong. Uma história de Deus, p. 166.

175 De Corretione et gratia. In Jean Chené e Jacques Pintard (eds.). Oeuvres de Saint Agustin. Bibliothéque augustinien (Paris: Desclée de Brower, 1962), p. 344.

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fazendo uso, por exemplo, do método exegético alegórico usado pela Patrística, especialmente

grega, para pontificar: “fora da Igreja não há salvação; ela é como a arca de Noé no tempo do

dilúvio”176.

Resumindo, ao fim da Idade Média, a Igreja Católica Romana via-se como exclusiva

mediadora da graça divina, a única porta pela qual poderia passar quem quisesse escapar da

danação eterna. Daí a conclusão categórica do discípulo de Sto. Agostinho, Fulgêncio de

Ruspe, no apagar das luzes da assim chamada Idade Escura e que acabou sendo adotada pelo

concílio de Florença (1442) como doutrina oficial d a Igreja Romana:

O concílio crê firmemente, professa e anuncia que ninguém, que viva fora da Igreja,

não apenas pagãos, mas também os Judeus, os Hereges ou Cismáticos, poderá ter parte

na vida eterna; todos eles irão para o fogo e terno, preparado para o diabo e seus anjos

(Mt. 25: 41), se antes do fim da vida não aderirem a ela. [...] Mesmo que um tivesse

dado muitas esmolas e tivesse inclusive derramado o sangue para Cristo, se não viveu

em união com a Igreja Católica não poderá ser salvo 177

.

O concílio de Trento (1545-1563) tentou amenizar um pouco esta disposição extremada,

decretando que os Pagãos podiam se salvar in voto, ou seja, se desejassem o batismo, ou se

desejassem pertencer à Igreja, sendo suficiente um desejo implícito, desde que precedido por

um propósito da própria consciência e seguido de uma vida condizente com ela. Além desta,

foram formuladas outras teorias como revelação primitiva ou geral e a conversão no leito de

morte, aplicadas à salvação de pessoas honestas que tinham vivido fora da Igreja178.

Mais adiante, no Concílio Vaticano I, ainda no século XIX, surgem outras sutilezas para

amenizar a rigidez da decisão conciliar. O conceito de “ignorância invencível” é um exemplo.

Diz o papa Pio IX:

Naturalmente é necessário afirmar, de fé, que fora da Igreja Apostólica Romana ninguém pode se salvar, que esta é a única arca de salvação, e que quem nela não

176 Veli-Matti Kärkkäinen. An introduction to the theology of religions, p. 69.

177 Enchiridion symbolorum in C. Cantone. A reviravolta cósmica de Deus (São Paulo: Paulinas, 1996), p. 91.

178 J. Wong. “O Deus de Jesus Cristo em perspectiva pn eumatológica”. In C. Cantone. A reviravolta planetária de Deus), p. 415.

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entrar, perecerá no dilúvio; porém, deve-se considerar igualmente certo que aqueles que se encontram na ignorância da verdadeira religião, se esta ignorância for

invencível, não tem nenhuma culpa perante os olhos do Senhor179

.

Mais tarde a encíclica Quanto conficiamur moerore (1863), do mesmo papa vem a

explicitar o alcance da “ignorância invencível”: ela diz respeito não só a cristãos não

católicos, como também aos adeptos de outras religiões 180. Pio XII, na encíclica Mystici

corporis (1943), identificou a Igreja Romana com o corpo místico de Cristo e com ela

relacionou “todos os qu e por certo anseio e desejo inconsciente sejam direcionados para o

corpo do redentor” 181. Dupuis presume que este “desejo inconsciente” (inscio desiderio)

“estaria implícito na vontade sincera de cumprir a vontade de

Deus em relação a si mesmo” 182.

Concluímos observando que neste ponto já se está a um passo das disposições

conciliares do Vaticano II, porque o que separa este documento daquele é uma sutileza da

língua latina. O primeiro traz ordinantur (ordenado, orientado), palavra que indica uma

disposição dos não cristãos ao Catolicismo mediante este desejo; o segundo (no Lumen

Gentium no. 15), ocorre o registro de coniuncti (unidos). Neste caso os Gentios são incluídos

na Igreja Católica Romana mediante a dilação da função sacramental da Igreja e não são

meramente orientados, como afirmava o primeiro documento.

2.d. Exclusivismo Protestante

Entre os Protestantes históricos (Luteranos, Reformados, Presbiterianos) o Exclusivismo

inicialmente significou o mesmo que para os Católicos, ou seja, sua modalidade forte.

Diferenciando-se deste apenas pela menor ênfase eclesial-sacramental e maior

179 Singularem quadam in J. Dupuis. Rumo a uma teologia cristã do pluralismo religioso , p. 175.

180 Enchiridion symbolorum in J. Dupuis. Op. Cit., p. 175.

181 Ibid.

182 Ibid.

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Com o fim da guerra dos Trinta Anos e o início do processo de laicização do Estado, sob

a presunção de que isto fosse a solução do problema da intolerância, teve início também a

influência das ideias iluminista sobre a teologia Protestante. A superioridade religiosa do

Cristianismo transferiu-se do campo religioso para o da ética e da cultura, via Kant e Hegel. O

racionalismo com a pretensão de aniquilar a intolerância faz nascer formas mais sutis e

perniciosas desta gerando o eurocentrismo de vai se alimentar o colonialismo. No campo

teológico, contudo, há desenvolvimentos recentes que ainda fazem perdurar entre nós esta

noção, embora não mais sobre as antigas bases fundamentalistas ou racionalistas, antes por

meio de um refinamento teológico, da lavra de algumas dos maiores teólogos do século XX.

2. d. 1. Karl Barth

Karl Barth, o teólogo reformado, que ficou famoso como o fundador de uma nova escola

teológica conhecida como Neo-ortodoxia e por que inicialmente liderou outros dialéticos (R.

Bultmann, F. Gogarten e E. Brunner) na revolta contra Teologia Liberal; não é menos

conhecido pela força de seus textos e pelo radicalismo de suas posições. Com efeito, por causa

deste radicalismo apriorístico186 que rejeita qualquer tipo de aproximação humana ao divino,

seja ela de origem mística ou racional, ele sequer tomou conhecimento dos debates que

tiveram lugar ainda em seus dias sobre o diálog inter-religioso. Contudo, alguns dos teólogos

que tiveram participação importante nestas discussões tomaram-no como mentor intelectual:

Hendrik Kraemer e Visser't Hooft.

186

Peter Berger relata uma conversa deveras interessante entre Barth e o clérigo anglicano D. T. Niles, o primeiro

bispo da Igreja Unida do Sul da Índia. Eles discutiam a propósito da tese barthiana “Religion ist Unglaub”. A certa altura da entrevista Niles pergunta a Barth: “com quantos hindus o senhor já conversou?”. A resposta de Barth: “nenhum”. “Como o senhor sabe então que o Hinduísmo é incredulidade?” A resposta d e Barth revela o âmago de sua metodologia: “a priori”. (Peter Berger. The Heretical Imperative. Contemporary possibilities of

religion affirmation, London: Collins, 1980, p. 84).

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As características teológicas que geralmente são apontadas como basilares para a

composição do ideário barthiano na verdade não servem para identificar o cerne de seu

pensamento. Nem seu alegado existencialismo de inspiração kierkegaardiana da primeira fase

nem a influência de Anselmo da virada da Dogmática Eclesial constituem o que realmente

levou Barth de volta às Escrituras. Em Barth, os princípios protestantes, sola gratia, sola fides

e sola Scriptura, têm um significado muito mais radical do que usualmente, pois seu ponto de

partida é um espírito profético dos dois primeiros mandamentos do decálogo: o primeiro que

diz respeito a quem seja Deus e o segundo, que tipo de adoração que lhe é devida 187.

Obviamente, o contexto histórico onde Barth fez ouvir sua voz, a saber, o ambiente

moral e religiosamente decadente do Protestantismo europeu instilado pela Teologia Liberal foi

a moldura sem a qual a reação barthiana não poderia ser plenamente entendida. Ele foi o único

dos dialéticos que teve a coragem de reconhecer que a Palavra de Deus está acima de seus

ouvintes, e se, portanto, houver desacordo entre ela e eles, o juízo divino deve ser proclamado

sobre os homens não foram capazes de entendê-la, apesar de todas as pressões em contrário.

Ele não agiu como alguns de seus antigos colegas, entendendo hermenêutica como a mera

promoção da adequação do evangelho aos seus ouvintes, ou seja, se os ouvintes não entendem

a culpa é dos pregadores.

Com efeito, o tema da descontinuidade entre o divino e o humano atravessa toda a

teologia barthiana. A infinita diferença qualitativa entre Deus e o homem é um obstáculo que

nenhum ser humano pode transpor. É um fosso indevassável, que não admite nenhuma

passagem gradual do divino para o humano, nenhuma continuidade entre a graça e a

187

I. W. C. van Wik. “God and the gods: Faith and hum an-made idols in the theology of Karl Barth” (HTS, 63-4, 2007).

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extrema do Exclusivismo: “a revelação de Deus como abolição da religião” 191; “a religião em si

mesma e como tal não é nunca e em nenhum lugar verdadeira, verdadeira quer dizer ser

conhecimento verdadeiro, adoração a Deus e reconciliação do homem com Deus” 192. O

famoso moto barthiano “Religion ist unglaub” (religião é des-fé, incredulidade) significa que

as religiões estão fundamentadas no orgulho e na va idade humana e não na fé (Glaub): “nós

começamos com a afirmação: a religião é descrença, a religião é uma preocupação – nós

podemos em realidade dizer que é a preocupação – de uma humanidade sem Deus 193”.

As religiões resultam de um processo religioso invertido, que começa com o ser humano

e tem como destino Deus, enquanto o verdadeiro processo começa com Deus e tem como

destino final o homem perdido em sua transgressão (Gn 3: 8 e 9). As religiões, por estarem fora

da graça reveladora de Deus, agem como os construtores da torre de Babel, tentando solucionar

os problemas humanos em desconsideração à Palavra de Deus: “as águas não mais se tornarão

em dilúvio para destruir toda carne” (Gn 9; 15). Portanto, a religião é um tipo de pecado.

Neste rol encontram-se todas as religiões mundiais, sem exceção. O Deus dos

muçulmanos, por exemplo, é um ídolo, por sua rejeição ao Filho de Deus 194 (a cristologia

muçulmana não apresenta um Jesus completamente humano; foi uma aparência de Jesus o que

foi pendurado na cruz, não o próprio – Docetismo). O Islamismo é uma religião cultural,

extremamente dependente de valores atrelados ao modo de vida da sociedade islâmica 195,

portanto, seus fundamentos são ideológicos, padecendo do mesmo defeito dos “ismos”

contemporâneos rejeitados por Barth.

191 K. Barth. Church Dogmatics, vol. I/2, p. 26.

192 K. Barth. Church Dogmatics, vol. I/2, p. 356. 193 K. Barth. Church Dogmatics, vol I/2, p. 280. 194 K. Barth. Church Dogmatics, vol. IV/ p. 432.

195 K. Barth. Church Dogmatics, vol. IV/2, p. 615.

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Passado o calor da discussão e atenuado o ardor profético contra os liberais, mais tarde,

atingindo Barth a plena maturidade, sua pena sofre uma inflexão importante. No tomo 23 de

sua Dogmática ele admite a possibilidade de um testemunho silencioso sobre Deus na natureza

e na história: “as luzes, palavras e verdades da criatura podem ser o lugar onde brilha a eterna

Palavra de Deus” 199. O seja, sub-repticiamente ele admite que as religiões podem ser usadas

pela revelação divina para manifestar faíscas de sua verdade. Ainda não se pode dizer que

com esta afirmação ele já teria rejeitado o particularismo, em que uns poucos apenas estão

votados à salvação enquanto a maioria da humanidade está destinada à danação final. Não.

Barth é um tipo de universalista esperançoso. Ora, sendo a salvação resultante de uma escolha

de Deus e não dos seres humanos, ele espera que no final os efeitos salvíficos e expiatórios do

Calvário sejam aplicados a todos pela divina decisão. Pois se o desejo de Deus é que todos se

salvem (I Tm 2:4), então cumpra-se Sua vontade, porque o que Deus quer ele faz 200.

2.d.2. Emil Brunner

Dentro desta linhagem protestante e dialética que defende o exclusivismo avulta a figura

de Emil Brunner, outro teólogo reformado suíço, cuja maior parte da docência deu-se na

Universidade de Zurich. Brunner é o mais importante defensor de um exclusivismo fraco,

sobre cujas bases boa parte dos teólogos protestantes e evangélicos contemporâneos continua

laborando.

Ele acompanha Barth na distinção entre “revelação” e “religião”, e por isso também

rejeita as abordagens fenomenológicas que produzam uma paridade entre o Cristianismo e as

religiões não cristãs, como é o caso já citado de Schleiermacher. O conceito de revelação é um

conceito religioso sui generis do Cristianismo. Por isso não se pode pensar na religião

199 Karl Barth. Church Dogmatics, XXIII, p. 171. 200 Karl Barth. Church Dogmatics, IV/3, pp. 477-478.

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cristã como um gênero entre espécies religiosas genus (inter species). Jesus continua sendo a

verdade que as religiões buscam em vão, porque não se baseiam na revelação, sim em teorias

imanentistas201.

Entretanto, Brunner é defensor de uma modalidade mais atenuada de exclusivismo,

porque rejeita o cristomonismo de Barth, acreditando numa revelação natural geral, além da

especial, a qual fora atuante nos profetas, autores sacros e em Jesus Cristo. Nisto segue a trilha

aberta por João Calvino 202, transformando, entretanto, sua ênfase negativa e judicativa quanto

ao conteúdo das religiões em algo positivo, veritativo e válido como conhecimento para a

salvação 203. Brunner segue a tradição reformada de Zwinglio, que via toda a bondade, a verdade,

honestidade, coragem, porventura presente em Gentios, como sinais da eleição divina204.

Voltando à discussão com Barth, a ruptura entre os dois começa em 1929, com a

publicação de seu artigo “a outra tarefa da teologia”, pelo qual procura encontrar no homem

“uma ponte de inserção” para o aporte da palavra de Deus205. Tal como Barth, ele crê na

diferença absoluta entre Deus e o ser humano e que esta distância não pode ser vencida senão

pela graça divina e por sua iniciativa. Contudo, contrariando Barth, para ele deve haver um

ponto de contato na natureza humana, sendo isto o que nos torna capazes de entender a

revelação e nos congraça a todos numa mesma família humana.

201 A. Race. Christians and religious pluralism, p. 18 e 19. 202 “Está fora de discussão que é inerente à mente humana, certamente por instinto natural, algum sentimento da divindade” (João Calvino. A instituição da religião cristã – vol. 1, São Paulo: Editora Unesp, 2008, p. 43. 203 […] a fim de que ninguém recorra ao pretexto da ignorância, Deus incutiu em todos uma certa compreensão

de sua deidade, da qual renovando com frequência a memória, instila de tempos em tempos novas gotas, p ara

que, quando todos, sem exceção, entenderem que há um Deus e são sua obra, sejam condenados, por seu próprio

testemunho, por não cultuarem e não consagrarem a própria vida à vontade d’Ele ( Ibid., idem).

204 Apud Philip Schaff. Creeds of Christendom, vol. 1, p. 380. 205 Rosino Gibellini. A teologia do século XX, p. 24.

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Em último plano, estão as demais religiões mundiais, que, como portadoras da imago

Dei formal, têm ainda sob sua custódia verdades elementares, relacionadas especialmente a

aspectos éticos e morais. Portanto, ainda que não completamente destituídas de insights

religiosos verdadeiros, salvificamente estas religiões nada têm a oferecer. Brunner é tão

pessimista quanto a de K. Barth. Nenhum destes conhecimentos naturais sobre Deus,

favorecidos pela imago dei formal, pode ser convenientemente pensado como salvífico212,

visto que a revelação natural é incapaz de desdobrar o plano de Deus para salvar a

humanidade, por meio dos ensinos, da vida e da morte de Jesus Cristo, autor e consumador da

fé, sem a qual ninguém verá a Deus.

2.e. Exclusivismo de Organizações Ecumênicas, Evangélicos, Pentecostais e

Independentes.

2.e.1. Organizações Ecumênicas

Os encontros missiológicos do conselho Missionário Internacional (IMC)213, as reuniões

do Comitê Lausanne sobre Missão e Evangelização Mundial (LC) 214 as conferências do

Conselho Mundial das Igrejas(WCC)215, demonstram as fortes disputas no interior das igrejas

protestantes. A princípio produzidas pela presença perturbadora de uma ala liberal que tentou

em várias ocasiões no transcurso dos anos levar os conciliares a adotar o pluralismo, ou pelo

menos um inclusivismo, em relação às demais religiões. Mais recentemente, por meio de

teorias pluralistas mais refinadas e por influência do ambiente Pós-moderno prevalecente. O

211 Emil Brunner. Revelation and reason, p. 79.

212 Daqui em diante IMC. 213 A partir deste ponto só LC. 214 A partir daqui WCC.

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certo é que a duras penas os encontros (meetings) e conferências têm mantido a posição

exclusivista, sendo hoje, entretanto, incerto, o futuro do exclusivismo nestas organizações,

considerando as últimas decisões.

Desde o primeiro encontro do IMC em Edinburgh (1910) já havia preletores que

defendiam um ecumenismo mais amplo que considerasse o papel salvífico das religiões.

Muitas destas disposições vinham de uma leitura da própria Escritura e do contanto dos

missionários com não cristãos. A antiga ideia do cumprimento, extraída de certas passagens de

Lucas-Atos e das Cartas de Paulo, gerava o entendimento de que as outras religiões eram

preparação para o evangelho 216. Outras concepções de inspiração iluminista via teóricos das

ciências da religião (M. Müller, R. Otto, E. Troeltsch) reconhecem nas religiões uma presença do

impulso religioso, ainda que o Cristianismo seja o coroamento: “apesar do profundo abismo entre

as duas [Cristianismo e religiões não cristãs] há uma evolução ininterrupta entre elas” (T. E.

Slater e J. N. Farquhar) 217. Além destas havia ainda outra fonte de inspiração de concepções

pluralistas. A ideia de revelação progressiva sustentada por estudiosos do AT atrelados à Alta

Crítica. Ora, se a própria religiosidade do Antigo Testamento experimentou uma evolução de

concepções religiosas rudimentares, tribais até o clímax ético e religioso dos profetas

posteriores, por que não se daria o mesmo com as religiões não cristãs.

Concluindo, o impacto destas ideias foi tão forte n esta ocasião que os organizadores do

evento tiveram necessidade de convocar uma comissão para redigir considerandos finais mais

concordes com a boa teologia:

Em nenhum lugar foi encontrado o mais leve fundamento para a ideia de que o Cristianismo é apenas uma religião entre as demais, ou que todas as religiões são simplesmente caminhos diferentes para buscar o mesmo Pai, e de que são, portanto,

216 Jan van Lin. Shaking the fundamentals. Religious plurality and ecumenical movement (Amsterdam: Rodopi B. V., 2002), p. 19. 217 Jan van Lin. Shaking the fundamentals. Religious plurality and ecumenical movement, p. 20.

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igualmente agradáveis à Sua vista. Uma enorme convicção anima a completa

evidência de que Jesus completa e substitui todas as religiões 218

.

Em Jerusalém (1928), as disputas sobre a questão começam nas reuniões preliminares

que antecederam ao concílio propriamente dito. Um grupo norte-americano de tendências

liberais, originários especialmente da Universidade de Harvard (que ainda não tinha sentido o

impacto das ideias de Karl Barth), assumiu o encargo de redigir estes documentos preliminares.

Kenneth Saunders, depois de vários anos de experiência com o Budismo, chama a atenção de

seus leitores para “o fato... de que p or atrás de todas as religiões há a religião e a consciência

religiosa do homem” (destaque nosso). “Este reconhecimento”, ele argumenta, “compele os

missionários a entrar em parceria com os povos da Ásia numa grande busca espiritual” 219.

As declarações deste documento preliminar viriam a ser questionadas. Uma semana antes

do encontro em Jerusalém, numa rodada de discussões no Cairo, teólogos europeus fizeram

reparos no documento norte-americano. Liderados pelo famoso teólogo de missões holandês,

Hendrik Kraemer, o documento preliminar deu um passo atrás em busca do solo mais seguro

da completa e absoluta singularidade do Cristianismo: “o Cristianismo é uma religião sui

generis no sentido mais estrito da palavra” 220, o que também não deixa de ser um exagero, se

não se fala a partir da teoria da descontinuidade barthiana, verdadeira inspiradora de Kraemer e

demais redatores.

No final, o documento conciliar sai no formato de conclusão conciliadora que tentava

manter a paz entre os antípodas, sem, contudo, esclarecer muito. Por um lado, afirma: “nós

somos mensageiros de Deus para proclamar a única redenção que não pode ter qualquer

218 Ibid., p. 25. 219 James L. Cox. “Jerusalem 1928. It’s message for today” (Missiology, 1981, 9, no. 139), p. 143. 220 James L. Cox. “Jerusalem 1928. It’s message for today”, p. 144.

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si mesmo sem testemunhas, o que se torna manifesto nos valores religiosos das outras religiões” 225.

Em Evanston (1954) as ideias iluministas começam a perder força, mas o problema não

desapareceu. O ambiente Pós-moderno ganha aderência no meio cristão porque apesar de o

resultado final da conferência ter sido o reconhecimento de que “tudo o que Deus tem feito

em e através de Cristo forma o centro de toda a história humana”, esta confiança é

“pressionada pelo fato de os Cristãos terem de vive r num mundo religiosamente plural” 226.

Problema que novamente recoloca-se em 1961, Nova Delhi.

Nesta nova rodada de discussões, teólogos cristãos indianos (Paul Devanandan, D. T.

Nilles, Sabapathy Kulendran) trouxeram novos argumentos buscando aproximarem-se das

religiões não cristãs. As razões agora decorriam de motivos civis e sociais. Visto a Índia ter

recém obtido sua independência do império britânico, estes teólogos reivindicavam para si o

direito de colaborar com as religiões não cristãs da Índia para a construção nacional227. É neste

contexto que aparece pela primeira vez o conceito de diálogo inter-religioso, inserido num

programa de melhoramento do IDH das antigas colônias, que viria a ser a marca do evangelho

social que despontava na Europa, Américas do Sul e Central. Além disto, é o princípio do

desconforto das teologias terceiro-mundistas com o eurocentrismo destas organizações, o que

as tornava bem pouco sensíveis a necessidades locais que não fosse m religiosas.

O comitê Lausanne sobre missão e evangelização mundial (LC) (1974), que reuniu

2.500 delegados de mais de 150 países, procurou reagir aos excessos da teologia liberal,

instalada sorrateiramente na WCC. Para os conciliares ainda existe a revelação geral presente

225 Jan van Lin. Shaking the fundamentals, p. 260. 226 Ibid., p. 265. 227 Wesley Ariarajah, verbete “Interfaith dialogue” in Dictionary of the Ecumenical Movement.

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Jerusalém. Há um estudo sobre a contribuição da África para a religiosidade mundial

em vias de ser publicado233

.

A conclusão de Jan van Lin, diretor do setor de encontro inter-religioso da WCC na

Holanda, demonstra que a discussão em torno da teologia das religiões ganhou os contornos

de uma crise: “Nesta discussão pareceu/parece que d entro do movimento ecumênico

houve/há muitos e diferentes conceitos, que produziram/produzem demasiadas confusões e

tem como resultado a WCC estar sendo desafiada hoje por uma crise de identidade” 234.

2.e.2. Evangélicos

Primeiro, definindo quem são os Evangélicos supracitados, genericamente, no Ocidente,

todos os que não são Católicos Romanos nem Ortodoxos dizem-se Evangélicos. Porém, com

o fortalecimento da Teologia Liberal entre Protestantes Históricos, convencionou-se

chamarem-se Evangélicas todos os que sustentam “uma versão mais ortodoxa do Cristianismo

em oposição à ala liberal”235, sendo fundamentalistas ou não. Todas, porém, declarando

confiança nas Escrituras e fazendo delas sua regra de fé e prática.

Em comparação com Católicos e Protestantes, só muito tardiamente este grupo começou a

por em consideração o tema (a partir da década de 1980 236), e ainda assim em seu aspecto

pragmático: o que inquietava os teólogos evangélicos era o destino dos não evangelizados237,

233 Wesley Ariarajah, verbete “Interfaith dialogue” in Dictionary of the Ecumenical Movement. 234 Jan van Lin. Op. cit., p. 269. 235 Veli-Matti Kärkkläinen. Introduction to Theology of Religions, p. 144. 236 Na verdade a primeira obra da cepa evangélica a tratar da questão foi da autoria de sir James N. Ander son. Christianity and comparative religions (Downers Grove, IL: Intervarsity, 1970).

237 D. A. Carson. The Gagging of God: Christianity confronts pluralism (Grand Rapids, MI: Zondervan,

1996); Ajith Fernando. The Christians attitude toward world religions (Wheaton III: Tydale House, 1987);

Gabriel Fackre, Ronald Nash, John Sanders. What about those who that have never heard? Three views on the

destiny of the unevangelized (Downers Grove, IL: InterVarsity Press, 1995); John Piper. Let the nations be

glad (Grand Rapids, MI: Baker, 1993); Ramseh Richard. The population of Heaven: a biblical response to the

inclusivista position on who will be saved (Chicago: Moody Press, 1994); John Sanders. No others name: an

investigation

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haja vista o incremento da percepção do mundo não cristão, potencializada pela globalização

e os outros fatores apresentados no primeiro capítulo. Os princípios básicos do Exclusivismo

propostos por J. Stott o demonstram:

a) Reconhecimento da autoridade da Escritura, b) a perdição do ser humano separado de Cristo, c) salvação em Jesus Cristo som ente, d) os Cristãos são testemunhas “pela palavra e pelos atos” (sem negar a responsabilidade social cristã e nem fazer disto nossa única e consumadora missão), e e) a necessidade de

evangelizar e salvar as almas238

.

Historicamente, o ingresso dos Evangélicos nas questões pertinentes à teologia das

religiões deu-se em 1970, com a redação da ‘Declaração de Frankfurt’, documento produzido

como reação à teologia das religiões liberal do WCC. O proeminente missiólogo, Peter

Bayerhaus, redacionou o documento que entre outras coisas dizia: “a Bíblia é o mais apropriado

quadro de referência e de critérios para as relações do Cristianismo com outras religiões. A

salvação pode ser obtida apenas pela cruz de Cristo, por meio da participação na fé” 239.

Contudo, diferentemente das organizações ecumênicas, não há neste grupo desacordos

tão sérios, estando o grupo fechado com o Exclusivismo. O que marca posições aqui é quanto

ao tipo a ser adotado, havendo adeptos das duas modalidades apresentadas na introdução. Há

teólogos adeptos de um Exclusivismo Forte, também chamado Restritivista240: Robert C.

Sproul241 e Ronald Nash242, Gabriel Fackre243; e teólogos que esposam um Exclusivismo

Fraco: John Sanders 244 , John Stott 245 . O grupo Forte é mais homogêneo, todos os seus

into the destiny of the unevangelized (Grand Rapids, MI: Eerdmans, 1992); Terrance Tiessen. Who can be saved? Reassessing salvation in Christ and world religion (Downers Grove, IL: InterVarsity Press: 2004). 238 Apud Marianne Moyart. Fragile identities: towards a theology of interreligious hospitality , p. 16. 239 Velli-Matti Kärkkläinen. Trinity and religious pluralism, p. 97. 240 Gerald R. McDermott. Can evangelicals learn from world religions? p. 40. 241 Reason to believe (Grand Rapids, MI: Zondervan, 1978). 242 Is Jesus the only savior (Grand Rapids, MI: Zondervan, 1994).

243 What about those who have never heard? (Downers Grove, IL: InterVarsity, 1995). 244 Idem.

245 David Edwards e John Sttot. Evangelicals Essentials: a Liberal-Evangelical dialogue (Downers Grove, IL: InterVarsity Press, 1988).

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Paulo escreve em sua Carta aos Romanos 5: 6: que Cristo morreu por nós sendo nós ainda

pecadores. Jesus nos ensinou a perdoar nossos inimigos e abençoar aos que nos amaldiçoam

(Mt 5: 44-45), por que não faria isto Ele mesmo?

Ronald Nash (1936-2006) foi professor de Filosofia e Teologia em Western Kentucky

University, em Reformed Theological Seminary, e por fim em Southern Baptist Theological

Seminary, Louisville, Kentucky, até o dia de sua morte por complicações decorrentes de um

AVC em 2006, depois de uma vida dedicada ao ministério e ao magistério, além de inúmeras

publicações sobre temas bíblicos e espirituais. Assim como Sproul, o DNA teológico de Nash

vem de uma tradição calvinista via a confissão que abraçou: Batistas do Sul. A Bíblia é

palavra final para qualquer controvérsia teológica, contudo, indo além como fundamentalista,

adota um exclusivismo literal: “não há outro salvador ou outra religião, nós cremos, que possa

trazer os seres humanos à graça redentora de Deus” 250. A afirmação de Jesus em João 14: 6:

“eu sou o caminho, a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai senão por mim” é entendida por

ele de modo mais restrito possível (daí a denominação de Exclusivismo restritivista). A partir

de um texto paulino: “se com tua boca confessares que Jesus é o Senhor e se em teu coração

creres que Deus o levantou dentre os mortos, serás salvo”, também restringe a salvação à

convicção de que uma fé explícita em Jesus Cristo. A confissão, portanto, é conditio sine qua

non da salvação 251. Nos termos colocados por Sanders a salvação em Jesus Cristo é uma

exigência ontológica e epistemológica. Se alguém no transcurso de sua vida (Hb 9: 27-28) não

teve a oportunidade de confessar seus pecados e de aceitar a Jesus como seu salvador pessoal,

mesmo que nunca tenha ouvido falar do evangelho, e tenha vivido uma vida irreprochável do

ponto

250 Gabriel Fackre, Ronald Nash, John Sanders. What about those who that have never heard? Three views on the destiny of the unevangelized, p. 107; Cf. Ronald Nash. Is Jesus the Only Savior, p. 16. 251 Gabriel Fackre, Ronald Nash, John Sanders. What about those who that have never heard? p. 108.

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de vista moral e de sua religiosidade, estará perdido tanto quanto o pior dos apóstatas.

O problema de Nash, como também o de Sproul, é elidir os textos bíblicos que falam do

amor universal de Deus pelos seres humanos. Ainda mais quando este fato é potencializado

pelo dado estatístico inescapável de bilhões de pessoas que não ouviram nem ouvirão “a boa

nova da salvação”. Como calvinista ele não crê que a morte de Jesus tenha efeito vicário para

todos e, por conseguinte, será efetiva apenas àqueles que crerem (Jo 3: 16), estando os demais

condenados e sem justificativa para sua ignorância. Mas, Paulo pergunta a Nash “como crerão

naquele de quem nada ouviram? E como ouvirão, se não há quem pregue?” (Rm 10: 14). Paulo

não podia ter consciência da enormidade do problema que suas próprias palavras propõem. O

mundo ‘conhecido’ em que ele viveu resumia-se ao mare nostrum romano (Mediterrâneo) e

adjacências orientais. Portanto, somos forçados a pensar, por amor ao decreto divino: “não

querendo que ninguém pereça, mas que todos cheguem ao arrependimento” (I Pd 3: 9), que

este crer não pode ser tão específico, assim como não foi o crer dos patriarcas e outros santos

não israelitas que se encontram na galeria da fé de Hebreus 11.

Do contrário fazemos de Deus um tirano cruel que admite salvar apenas alguns de uma

enormidade de criaturas que o ofenderam, ainda que Sua graça seja suficiente para salvar a

todos. O monergismo calvinista só serve para ratificar a injustiça divina em salvar alguns por

uma vontade arbitrária, supostamente baseada no livro de Romanos, e enviar a estes que por

Sua Graça atenderam a seu chamado estender o convite a outros e, falhando estes, deixar que

estes outros que não ouviram se percam e tenham como destino eterno a danação.

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2.e.2.b. Gabriel Fackre

Gabriel Fackre (1926-), clérigo da Igreja Unida de Cristo (United Church of Christ), que

resultou da fusão da Igreja Evangélica e Reformada (Evangelical and Reformed Church) de

Reinhold Niebuhr, com a Igreja Congregacional cristã (Congregational Christin Church). É

autor de uma extensa lista de obras teológicas e foi professor de teologia e cultura em Andover

Newton Theological School, e como professor visitante em diversas outras. Também esteve

envolvido com as reuniões ecumênicas da WCC, tendo sido o representante de sua confissão

em Amsterdã (1948) e Evanston (1954).

Sua posição teológica sobre a condição dos que não ouviram é um pouco reflexo de seu

envolvimento com o movimento ecumênico. Por que então não está relacionado como

pluralista? Por que Fackre é exclusivista e, além disso, é restritivista (requer tanto o princípio

ontológico quanto o epistemológico). O que o torna mais aberto que seus colegas é o fato de

dar aos que não ouviram uma chance post mortem de ouvirem, chance por intermédio de uma

evangelização escatológica imediatamente antes da volta de Cristo252.

Para sustentar sua tese Fackre baseia-se em uma das passagens mais controversas das

Escrituras: “Ele também foi e pregou aos espíritos em prisão, que em outros tempos foram

desobedientes, quando Deus pacientemente esperava nos dias de Noé, enquanto a arca estava

sendo construída” (I Pd 3: 18-20). Secundariamente também utiliza I Pedro 4: 6: “Por esta

razão, o evangelho foi pregado mesmo aos que agora estão mortos, para que sendo julgados de

acordo com o corpo, possam viver de acordo com o espírito; e João 5: 25: “em verdade vos

252 Há uma linhagem de importantes teólogos cristãos do passado que advogaram esta doutrina: Melito, Hipólito, Clemente de Alexandria, Orígenes, Atanásio e Gregório Nazianzeno. Após Agostinho a doutrina caiu em descrédito, vindo a ganhar adeptos novamente no séc.XIX. (John Sanders, No other name, 184-188).

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Stott nunca escreveu nenhuma obra tratando especificamente do tema de nosso, sem,

contudo, aqui e acolá deixar de dizer o que pensa. Na verdade não há muito a dizer por que a

ideia é exatamente esta, calar-se sobre o que não está explicitamente revelado nas Escrituras,

pela opção por um agnosticismo soteriológico. Admitida a vontade salvífica universal de Deus,

apresentada em vários lugares na Escritura, deduz-se que alguma maneira Deus irá salvar estas

pessoas, conquanto não saibamos como isto ocorrerá, já que a obra divina para a salvação dos

que não ouviram é um mistério:

Eu creio que a postura mais cristã é permanecer agnóstico sobre esta questão [...] o fato é que Deus, ao lado dos avisos mais solenes quanto à nossa responsabilidade em responder aos apelos do evangelho, não tem revelado como tratará com aqueles que

nunca os tenham ouvido.254

Parece ainda que Stott adota um tipo de princípio epistemológico. Ou seja, os que serão

salvos provindos das outras religiões deverão apresentar algum grau de conhecimento do

evangelho, mas “exatamente quanto de conhecimento do evangelho as pessoas necessitam

antes de clamarem a Deus e serem salvas” 255, ele continua, “isto nós não sabemos”.

Não é uma convicção solitária, desde que a maioria dos pregadores das missões

estrangeiras do século XIX já adotava este posicionamento, sustentando a necessidade da

evangelização, sem, no entanto, extinguir a esperança daqueles que nunca chegariam a ouvir o

evangelho. Arthur Pierson, líder presbiteriano, por exemplo, diz:

Se há em algum lugar uma alma anelante por Deus, seguindo a luz da natureza e a sua consciência, na confiança e na fé de que o Grande Desconhecido irá de alguma maneira dar mais luz, e guiar a vida e a bem-aventurança, deixemos descansar tal nos

braços dos paternais cuidados 256

. 254 David Edwards e John Stott. Evangelicals essentials: A Liberal-Evangelical Dialogue (Downers Grove, IL, III: InterVarsity Press, 1988), p. 327.

255 John Stott. The Contemporary Christians: Applying God’s Word to Today’s World (Downers Grove, IL: InterVarsity Press, 1992), p. 319.

256 Apud Harold Netland. Encountering Religious Pluralism. The Challenge to Christian Faith and Mission

(Downers Grove, IL: InterVarsity, 2001), p. 51.

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numa “soberania geral” que se preocupa apenas com as estruturas gerais de seu plano de

governo260.

Deve-se levar em conta este pano de fundo arminiano extremo, para entender a teologia

das religiões que lhe é consequente. Isto nos impediria de pensar acompanhando Kärkkäinen

que Sanders é inclusivista 261. Os meios de graça apresentados pelo teólogo pentecostal e

atribuídos a Sanders, não são desta forma definidos, são apenas sugestões. Suas afirmações

sobre a salvação dos que nunca ouviram o evangelho estaria calcada numa espécie de

liberdade por Deus concedida aos mortais, e não num plano divino que contemple um meio de

graça específico para eles. Todos os meios de graça citados por Kärkkläinen aparecem no

livro de John Sanders em apenas um parágrafo 262, o que significa não serem ponto crucial de

sua teologia. O fundamental para ele é o “princípio da fé”, segundo sua própria definição, uma

convicção que reúne três elementos fundamentais: verdade, confiança e ação efetiva: “fé em

Deus contém alguma verdade, venha esta verdade da Bíblia ou do trabalho de Deus na

criação” 263. Páginas antes Sanders já havia usado a alegoria do abrigo que o salvara

milagrosamente de uma tempestade. Aqui o ponto em que me baseio para classificar Sanders

um passo a frente de Stott por reduzir ainda mais a necessidade de conhecer a obra de

salvação de Deus. O abrigo salva, saibamos ou não quem o construiu e com que propósito.

260 John Sanders. The God Who Risks: A Theology of Providence, p. 197.

261 Kärkkäinen destaca cinco pontos que o fazem perceber Sanders como inclusivista: “(1) enquanto os Cristãos são salvos

pela sua fé em Jesus Cristo, outros podem ter acesso à salvação ao responder fielmente à luz que lhe foi dada,

mesmo não tendo sido alcançados pelo evangelho; (2) a revelação geral não apenas serve para prepara o povo

para receber o evangelho, mas também como mio salvífico; (3) O Espírito do Deus Triuno pode atingir

salvificamente aqueles que não receberam o evangelho; (4) a exclusividade e a singularidade de Cristo como

manifestação de Deus (através da encarnação) não tornar sem sentido outras manifestações do Logos; (5) a Igreja

através do ensino bíblico e da experiência missionária, tem achado evidências da obra redentora de Deus em

culturas não previamente expostas à pregação da mensagem cristã ” (Veli-Matti Kärkkäinen. Introduction to

Theology of Religions, 144-145). 262 John Sanders. No other name, p. 36.

263 Ibid, idem.

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sua efetividade salvífica. E em seguira conclui fazendo uma crítica à noção intelectualista da

fé que salva 264.

Sanders termina citando C. S. Lewis quando pensa num processo salvífico mais amplo:

“eu penso que cada oração que é sinceramente feita mesmo a um falso deus é aceita pelo

verdadeiro Deus, e que Jesus Cristo salva muitos que não pensam que Ele os conhece” 265.

Como exatamente isto ocorre? Qual a forma exata como Deus trabalha nas religiões? 266 É

impossível saber, dado que o próprio Deus desconhece, segundo Sanders, como a liberdade

humana responderá às suas disposições salvíficas. De sorte que os princípios fornecidos por

Kärkkläinen são apenas possibilidades de uma salvação que só será conhecida de fato em

perspectiva escatológica. Em suma, para Sanders o a gnosticismo epistemológico atinge o

próprio Deus.

2.e.3. Independentes

Obedecendo a um critério cronológico este grupo é ratado em seguida aos Evangélicos,

embora, suas convicções sejam mais restritivas do que as deles. O que os agrupa numa seção à

parte do mundo cristão é sua condição, como seu nome indica, de não ser descendência direta

ou indireta do movimento religioso que teve origem na Reforma do século XVI. Sua origem é

completamente norte-americana e engloba três igrejas que se originaram das expectativas

escatológicas que floresceram neste país na primeira metade do século XIX: Igreja de Jesus

Cristo dos Santos dos Últimos Dias, as Testemunhas de Jeová e os Adventistas do Sétimo Dia.

Além de serem movimentos religiosos marcantemente norte-americanos uma outra

264 Ibid, p. 37. 265 John Sanders. No other name, p. 45.

266 “Há pessoas nas outras religiões que estão sendo guiadas pela secreta influência de Deus a se concentrar

naquelas partes de sua religião que está de acordo com o Cristianismo, as quais, assim, pertencem a Cristo sem

conhecê-lo” (Ibid., idem).

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característica sua é adotarem outros textos inspirados além da Bíblia, ainda que o grau de

inspiração dos ditos textos varie entre estas denominações.

2.e.3.1. Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias

Os Santos dos Últimos Dias, como preferem ser chamados, são quase universalistas,

visto que, no final da história deste mundo, poucas pessoas irão experimentar a danação

eterna267. Mesmo os ladrões, mentirosos, assassinos e outros transgressores da lei divina,

mesmo aqueles que rejeitaram a pregação do evangelho, terão seu quinhão de bem-

aventurança. Mas, isto não nos impede de classificá-los como exclusivistas, malgrado todas

as peculiaridades de sua soteriologia. Eles sustentam que todos são salvos pela graça de Deus

em Jesus Cristo, conhecendo-a ou não, aceitando-a ou não. A solução teológica adotada para

preservar a justiça divina é a hierarquização da salvação, a criação de vários graus de

salvação, mais precisamente três reinos para onde irão no final de tudo as almas dos homens:

o celestial, o terrestrial e o telestial. Para o primeiro irão aqueles que em vida cumpriram

todas as prescrições divinas (éticas e cerimoniais), mas também aqueles que não as

cumpriram, porque post mortem, todos terão esta oportunidade. Na teologia mórmon o

evangelho é pregado às almas dos que já morreram, podem ser batizados vicariamente

quando seus familiares o são, podem se casar para a eternidade (se o viúvo ou a viúva assim o

desejar), etc. Para o segundo irão os não mórmons, ou seja, aqueles que não confiaram na

origem divina das revelações de J. Smith, aqueles que receberam o evangelho post mortem e

o rejeitaram, aqueles que se deixaram cegar pela iniquidade do mundo268. Para o terceiro

plano irão todos os que rejeitaram o evangelho, o testemunho de Jesus (as revelações de

Joseph Smith), o testemunho dos profetas e do concerto eterno; também os

267 Douglas Davies. The Mormon Culture of Salvation (Aldershot, England: Ashgate, 2000). 268 Joseph Smith. Doctrines and Covenants of the Church of Jesus Christ of Latter Days Saints (Whitefish, MO: Kessinger Publishing, 2010), 76: 72-79.

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mentirosos, adúlteros, assassino, a todos os que zombaram dos mandamentos de Deus. Seu

castigo será ressuscitarem apenas depois do milênio 269.

Segundo a maior autoridade da igreja mórmon, Joseph Smith, o destino dos não

Cristãos é a salvação: “todos os homens e mulheres que morreram sem o conhecimento do

evangelho, mas que o teriam recebido caso tivessem tido oportunidade, estes serão herdeiros

do reino celestial”. Também diz que “aqueles que morreram sem terem tomado conhecimento

do evangelho, mas que se o tivessem conhecido o teriam abraçado de todo coração, serão

herdeiros do reino”270. Por que então não classificar os Mórmons como inclusivistas? Por que

o conhecimento do evangelho, como o texto indica, está implícito. Além disto, há ainda a

evangelização post mortem, de modo que a melhor conclusão sobre eles é a de que são

adeptos de um Exclusivismo fraco.

2.e.3. b. Adventistas do Sétimo Dia

Entre os independentes, a posição dos Adventistas do Sétimo Dia é a mais aberta ao

diálogo inter-religioso 271. Basicamente, quanto ao status salvífico das religiões, sustentam

ideias muito próximas a de E. Brunner, acreditando na revelação geral da natureza, desde que

são criacionistas. Além disto, creem na hierarquia revelacional de Brunner e dirigem seus

esforços missionários à conversão de Judeus e Mulçumanos. Adotam atitude dialógica,

269 Ibid., 76: 81-86. 270 Ibid., 137: 7-8. 271

“Como membros da Igreja Adventista do Sétimo Dia, alegramo-nos por Deus amar e cuidar de sua criação

– todo ser humano de qualquer raça, cultura e crença. Nós reconhecemos que Deus tem se revelado de várias maneiras, o que inclui certos valores e verdades encontradas nas grandes religiões do mundo. Respeitando as crenças dos povos das outras religiões, nós como crentes em Jesus, queremos compartilhar importantes e únicas verdades reveladas na Santa Bíblia. Queremos fazer isto numa linguagem e modo que sejam significativos e compreensíveis aos povos, no contexto de suas próprias culturas.” Este texto foi composto pelo Comitê para questões da missão global dos Adventistas do Sétimo Dia. (Stefan Höschele. Interchurch and interfaith relations. Seventh-day Adventist statements and documents (Frankfurt am Main: Peter Lang, 2010).

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o envio do Espírito no dia de Pentecostes resultou num organismo vivo”, que não pode ser

controlado por instituições humanas 273.

2.e.4.a. Veli-Matti Kärkkäinen

Professor fino-americano de Teologia Sistemática no Fuller Theological Seminary nos

Estados Unidos e em outras instituições, autor prolífico de várias obras teológicas importantes.

Numa dessas faz uma análise abrangente da teologia das religiões, aproximando-se das

proposições de C. Pinnock, mas distinguindo-se do teólogo canadense quanto à apreciação

ligeiramente mais positiva das religiões pela adoção de uma eclesiologia com ênfase

pneumatológica. Para ele, as religiões contêm elementos de verdade que podem instruir os

Cristãos. O Espírito atua também fora da Igreja e entre as religiões. Ele não está subordinado a

Cristo e isto abre possibilidade para serem encontradas boas coisas e verdades nas religiões 274.

Contudo, as religiões de si não podem salvar 275. A salvação nas religiões ocorre apenas na

encruzilhada onde elas e o Cristianismo se encontram. A salvação só ocorre quando as coisas

boas e as verdades das religiões tornam possível o ingresso do Cristianismo na vida destas

comunidades. Veli-Matti, portanto, defende uma espécie de síntese religiosa entre o

Cristianismo e as religiões, com prevalência do Cristianismo. Ele está ciente de que não é uma

tarefa fácil colocar o Cristianismo lado a lado com outras religiões. O próprio autor o

demonstra quando compara o Cristianismo e o Islamismo e percebe que o conceito de trindade

gera uma incompatibilidade insuperável, como ele próprio reconhece276. Quanto às reais

possibilidades de colocar o Cristianismo em diálogo com as outras religiões, ele faz várias

tentativas usando a Cristologia como base. Os problemas são

273Amos Yong. The Spirit poured out on all flesh. Pentecostalism and the possibility of global theology, (Grand Rapids, MI: Baker Academics, 2005), p. 173. 274 Veli-Matti Kärkkäinen. An introduction to ecclesiology (Downers Grove, IL: InterVarsity, 2002), p. 24.

275 Veli-Matti Kärkkäinen. An introduction to theology of religions (Downers Grove, IL: InterVarsity, 2003), p.

139. 276 Veli-Matti Kärkkäinen. An introduction to theology o religions, p. 157.

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inevitáveis. Veli-Matti começa seu arrazoado com argumentos pacíficos sobre a natureza

plural das cristologias neotestamentárias e de outras cristologias ao longo da história 277:

1. Cristologia encarnacional

2. A Cristologia da cruz

3. A Cristologia da Ascensão e Ressurreição

4. Cristologia do poder

1. Igreja Primitiva e Catolicismo

2. Protestantismo histórico

3. Igreja Oriental

4. Pentecostalismo e Movimentos

Carismáticos

Até este ponto podemos ir sem problema. Todos estes movimentos religiosos partem da

Escritura ou de partes delas, usadas para atender a necessidades hermenêuticas peculiares de

um tempo e lugar. Porém, quando o processo refere-se a “cristologias contextuais” 278, em que

uma síntese entre as culturas religiosas é ensaiada então o resultado dá em soneto mal

ajambrado, pois os limites da ortodoxia são cruzados, deixando a Bíblia de ser texto normativo.

Nas culturas africanas, por exemplo, onde vários conceitos religiosos favorecem o

encontro com o Cristianismo, gerando o que ele chama de cristologia “Cristo como ancestral”.

Contudo, há coisas na teologia cristã que são fundamentais, mas que não encontram paralelo na

cultura africana, com exceção de algumas etnias. É o caso do conceito de salvação e pecado,

com toda a carga metafísica que possui no Cristianismo. Ou seja, Cristo não poderia ser

chamado de Salvador, levando-se em conta apenas as tradições africanas 279.

De igual maneira a Cristologia asiática “Cristo como salvador universal” teria grande

dificuldade de se adequar à teologia joanina do Logos e estaria mais a vontade entre

Apolinaristas e outros Docetistas, dado que nega a história e o valor da irrupção do divino na

história. Aqui, de novo, um problema com o conceito de salvação, que para as religiões

277 Veli-Matti Kärkkäinen. Christology. A global introduction. An ecumenical international and contextual perspective (Grand Rapids, MI: Baker Publishing Group, 2007), p. 17.

278 Veli-Matti Kärkkäinen. Christ and reconciliation (Grand Rapids, MI: Wm. B. Eerdmans Publishing, 2013), p.

71. 279 Veli-Matti Kärkkäinen. Christ and reconciliation, p. 73.

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CAPÍTULO III

Inclusivismo

3.a. Introdução

O Inclusivismo tem uma longa história no Cristianismo. Alguns acham até que ela tenha

começado em seus primórdios, nos dias apostólicos, com Paulo e as teologias lucana e

marcana, onde se percebe certa visão continuísta na passagem de uma cultura gentílica para

uma cristã, que poderia ser classificado como um Inclusivismo brando280. Contudo, como

vimos expondo desde o capítulo anterior, nossa opção metodológica é não considerá-lo

Inclusivismo pela confusão que isto geraria.

O primeiro e mais importante princípio do Inclusivismo é a conjunção de dois outros

princípios: (a) a vontade salvífica universal de Deus e (b) a salvação somente por meio do

ministério de Jesus. Contudo, este hibridismo ainda não dá conta da singularidade do

Inclusivismo se comparado com as outras abordagens, já que o Exclusivismo sustenta ambos.

A distinção reside no fato de que para o Inclusivismo a salvação somente por meio de Cristo

não precisa ser algo sobre o que os adeptos salvos das outras religiões tenham consciência:

280

Na teologia lucana, por exemplo, Paulo falando aos Gentios em Listra, registra-se que “Deus não se deixou

ficar sem testemunho de si mesmo, fazendo o bem”, d ando-lhes do céu chuva e estações frutíferas, enchendo-lhes o coração de fartura e alegria (At. 14: 17). E m Atos 17, onde aparentemente o registro de Paulo pregando aos atenienses dá uma clara apresentação da ideia de continuidade entre o paganismo dos gregos e a adoração do Deus verdadeiro, na verdade é uma referência à religiosidade, ao impulso religioso, dos gregos e não à sua

religião 280

. Ademais o motivo da ignorância gentílica permanece subentendido, posto que Paulo se apresente

como revelador da identidade do Deus que eles adoravam sem conhecer. Ainda Paulo em Romanos, capítulo 2, argumentando com base na revelação natural, diz que mesmo aqueles que nunca ouviram a pregação do evangelho não serão considerados inocentes. Contudo , parece que para o apóstolo das gentes a revelação natural não é suficiente para salvar, mas o é para perder aqueles que se desviarem dos propósitos divinos impressos como digitais de Deus em Sua criação. Podemos mencionar ainda II Pedro 3: 9 e I Timóteo 2: 4, ambos textos usados para sustentar a vontade salvífica universal de Deus. Porém, o que nestes textos está dito sobre o desejo de Deus de salvar a todos nada alude sobre uma ação divina nas religiões nem quanto à eficácia salvífica delas como meio, ainda que secundário, de salvação. Podemos concluir que estes textos geralmente usados para sustentar o Inclusivismo neotestamentário só tem a dizer sobre as religiões o que é reticente e inespecífico, o que só reforça a ideia da inexistência neles de uma teologia das religiões.

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A visão em que, embora Jesus seja o único salvador do mundo, a pessoa não precisa crer no evangelho para ser salvo. O Inclusivismo concorda com o Exclusivismo quanto a Jesus ser o único salvador da humanidade: nenhum ser humano será jamais salvo do pecado e do inferno por nenhum outro a não ser por Jesus. Mas Exclusivismo e Inclusivismo dissentem quanto à necessidade de pessoas não salvas

precisarem confiar em Jesus para a salvação 281

.

Em outras palavras o Inclusivismo concorda com o Exclusivismo no campo ontológico:

só há salvação em Jesus Cristo; mas não concorda no campo epistemológico: não é necessário

que a pessoa que é salva creia nele, ou sequer tenha ouvido seu nome alguma vez na vida282.

Pronto, temos aí a marca singular do Inclusivismo. Contudo, isto ainda não basta, pois

precisamos distinguir entre dois Inclusivismos: o Evangélico-pentecostal e o Católico.

Também já afirmado em outro lugar que o Inclusivismo Evangélico é de cunho soteriológico e

o Católico eclesiológico. Assim, na modalidade inclusivista Evangélico-pentecostal as não

Cristãos são salvos por Cristo, mas não tomam conhecimento disto. Esta salvação ocorre

sempre por meio de Cristo, mas o instrumento pode ser o Espírito, que segundo esta concepção

atua fora dos limites da Igreja, ou pode ser através da revelação natural, que, segundo certos

inclusivistas, tem função positiva: é suficiente para guiar as pessoas para Deus. No caso

Católico Romano, além de todas estas razões, os Gentios são salvos por Cristo também

indiretamente, por meio do papel sacramental da Igreja.

Porque não começamos a falar do Inclusivismo pela Igreja neotestamentária? Faltar-nos-

ia embasamento textual. O NT não é inclusivista porque os princípios acima citados não se lhe

aplicam. Não se apresenta no Novo Testamento nem a ideia do Espírito atuante fora da

circunscrição da Igreja, embora haja exemplos da atuação do Espírito fora dos limites

geográficos da Igreja. Em outras palavras, a atuação extra eclesial do Espírito Santo não

281

Robert A. Pearson’s introduction in Christopher W. Morgan (org.). Faith comes by hearing (Downers Grove, IL: InterVarsity Press, 2008), p. 12. 282

Ibid., p. 13.

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doutrina de um Logos trans-temporal à parte de Jesus Cristo crido e afirmado pelos teólogos

asiáticos .

Por tudo isto, fica patente que o principal objetivo dos Pais Apologetas era demonstrar

que o Cristianismo era uma “filosofia”, ou seja, tinha respaldo intelectual, estava ligada

historicamente a outras manifestações religiosas e filosóficas, e que, portanto, não era uma

superstitio nova e excêntrica; ou ainda, uma amixia/misantropia, praticada por indivíduos

marginalizados, o que de certa forma era verdade, dada a condição ilegal das práticas

religiosas cristãs. Em suma, sua intenção era vencer o preconceito contra o Cristianismo e

favorecer sua expansão entre os mais letrados de seu tempo. Nada tendo a ver com o projeto

de poder alternativo de um Catolicismo Romano outrora hegemônico e dominante, tampouco

tem relação com a ideia de outras manifestações do Logos antes de Jesus Cristo, como

infelizmente tem sido a interpretação de alguns.

3.b. Inclusivismo Evangélico-pentecostal

Este Inclusivismo surge como resultado das inquietações evangélicas com os que nunca

ouviram o evangelho, que posteriormente evoluiriam de um Exclusivismo fraco, pela

postulação de argumentos bíblicos que enfatizam a vontade salvífica universal de Deus.

Colocamos esta designação dupla mais para deixar cl ara a origem dos autores do que para

demonstrar alguma peculiaridade teológica. Claro que os autores a seguir concordam entre si e

têm consciência disto, mas além da influencia mútua que exerce todo aquele que lê e é lido,

nada mais os une, sendo oriundos de suas respectivas denominações. O campo teórico comum

entre eles está resumido por Robert A. Pearson:

(1) A revelação de Deus sobre si mesmo na criação e na consciência não apenas condena, mas também salva. De acordo com isto, pessoas podem ser salvas sem nunca terem ouvido de Jesus, ao responder positivamente à revelação geral.

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(2) Muitos inclusivistas levantam a questão da justiça de Deus: seria injusto se Deus condenasse pessoas meramente porque nunca ouviram o evangelho de Cristo. Para que Deus seja justo e misericordioso deve haver outros meios de vir a Ele.

(3) Muitos inclusivistas, não todos, têm argumentado que os adeptos das religiões não cristãs mundiais podem ser salvos sem crer no evangelho. Não que estas

religiões por si mesmas ensinem o caminho da salvação, mas que Deus em Sua graça

aceita aqueles que sinceramente se arrependem e seguem-No nos limites de sua religião.

(4) É comum aos inclusivistas retratar os crentes do Antigo Testamento como

exemplos de pessoas salvas sem a mensagem de Jesus. Inclusivistas também lhes

atribuem a categoria de “santos pagãos”, figuras bíblicas tais como Melquideseque e

Cornélio, sobre os quais é declarado terem sido salvos sem a revelação especial.

Aqueles nos dias atuais que nunca ouviram falar de Jesus e são informacionalmente

a. C., são aceitos por Deus, se eles, como os santos pagãos , voltarem- se para Ele.

(5) Todos os inclusivistas alegam que nas Escrituras algumas pessoas são salvas não especificamente pela fé em Jesus, mas com base em um princípio de fé mais genérico. As pessoas não alcançadas de hoje, de maneira semelhante, podem ser

salvos sem o evangelho baseados no mesmo princípio285

.

Um pouco destas ideias vão aparecer em cada um dos autores avaliados abaixo,

diferindo apenas quanto à ênfase e o modo como são elaboradas por cada um deles.

3.b.1. Clark Pinnock

Clark Pinnock, batista, canadense, professor emérito de teologia no McMaster Divinity

College, tem sido acusado de se aproximar demasiadamente do pluralismo por causa de suas

convicções mais abertas com respeito à teologia das religiões. Ele se entende, entretanto, num

ponto de equilíbrio, não sendo nem restritivista nem universalista, segundo suas próprias

palavras, os dois maiores perigos para o teólogo da s religiões 286. De um lado, há textos

bíblicos que demonstram o desejo universal de Deus de salvar muito mais do que grupelhos

autorreferidos como eleitos (II Pd 3: 9; I Tm 2: 4); de outro, há textos que expressamente

declaram a universalidade e a exclusividade salvífica de Jesus Cristo (I Tm 2: 5; Jo 3: 16)287.

285 In Christopher W. Morgan (org.). Faith comes by hearing (Downers Grove, IL: InterVarsity Press, 2008), p.

15. 286 Clark Pinnock. A wideness in God’s mercy: the finality of Jesus Christ in a world of religions (Grand Rapids: Zondervan, 1992), p. 12. 287 Clark Pinnock. A wideness in God’s mercy , p. 18-19.

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promessa de “preservação física da humanidade”, mas também de salvação 292. O concerto

com Abraão é ainda mais evidentemente salvífico com a promessa: “em ti serão benditas todas

as famílias da terra” (Gn 12: 3).

Dos capadócios ele extrai uma eclesiologia pneumatológica, que até hoje marca a Igreja

Oriental, enquanto na Igreja Ocidental impera uma eclesiologia cristológica, onde a ênfase está

sobre a hierarquia e não sobre os dons espirituais. A visão de Pinnock tem fundamento

trinitário. Ou seja, não se trata meramente de colocar os holofotes no Espírito Santo, mas de

iluminar o aspecto pneumatológico da Trindade para recuperar sua natureza comunitária,

perdida por uma ênfase indevida na assim chamada economia da salvação, onde há uma

relação de subordinação funcional (apenas no contexto da salvação humana) entre as três

pessoas da Trindade, em que o Pai envia o Filho, o Filho envia o Espírito; O Espírito conduz a

Cristo e Cristo, ao Pai. Por conta deste arranjo perdeu-se a noção da Trindade como

comunidade em amor 293, substituída por um modelo hierárquico, que mais retrata o bispado

monárquico que o defendeu do que a vida trinitária divina:

Deus é um processo interpessoal, uma comunidade de pessoas que amam uma a outra

e experimentam uma unanimidade. [...]. As três pessoas de Deus, embora distintas,

cada uma tendo processos de consciência próprios, formam juntas uma vida

compartilhada que é o perfeito ideal 294.

Abandonada a rigidez da economia da salvação, Pinnock abre espaço para uma noção

mais universalizada da obra do Espírito, a qual será o fundamento dos convênios universais de

Deus mencionados mais acima. Assim como ao Espírito coube uma ação preparatória na

criação, desde que antes que o mundo fosse criado o Espírito pairava sobre as águas (por assim

dizes apaziguando o caos para que a Palavra pudesse trazer a vida à luz), da mesma

292 Clark H. Pinnock. A wideness in God’s mercy , p. 22.

293 Cf. Miroslav Volf. After our likeness: The Church as Image of the Trinity (Grand Rapids, MI, Wm. B. Eerdmans, 1998).

294 Clark H. Pinnock. Flame of Love. A theology of the Holy Spirit (Downer Grove, IL: InterVarsity Press, 1996), p. 41.

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sorte, há uma obra do Espírito Santo antes da fundação da Igreja, da qual fazem parte dos

convênios citados, e que funcionam como praeparatio evangeli. O Espírito, portanto, realiza

uma obra salvífica tão importante e universal quanto o do Logos eterno:

Nós somos realmente autorizados a uma perspectiva m ais universal quando o Espírito pode ser visto como buscando o que o Logos também intenciona e onde se

pode crer e esperar que ninguém esteja além do alcance da graça. Um fundamento é

lançado para a universalidade se de fato o Espírito permeia o mundo e não há lugar cerrado à sua influência 295.

O lugar no quadro de discussão onde Pinnock se insere é complexo, porém, a meu ver

não abandona o espaço ortodoxo:

Minha proposta é exclusivista em afirmar decisivamente a redenção em Jesus Cristo, embora isto não negue a possibilidade de salvação d os povos não cristãos. Semelhantemente, ela pode ser chamada inclusivista por recusar limitar a graça de Deus aos limites da Igreja, apesar de não chegar a afirmar que as outras religiões sejam veículo de salvação por elas próprias. E pode ser chamada pluralista à medida que reconhece o trabalho gracioso de Deus nas vidas humanas em todos os lugares [...]. Não pode, porém ser chamada de pluralista no sentido de eliminar a

normatividade de Cristo ou cair no relativismo296

.

Esta complexidade deve-se às próprias fontes cristãs, que, além daquela dimensão

polêmica aventada linhas acima, negativas às religiões, possuem textos que demonstram a

graciosa disposição divina de salvar os homens e as mulheres de todas as raças e credos do

mundo, ainda que os chamando para uma situação espiritual melhor:

De acordo com a Bíblia, também existem entre as nações religiões que estão do outro

lado do espectro [não estão sob a condenação de Deus]. Ela reconhece fé, não cristã e

nem judaica, que é, não obstante, nobre, edificante e sã. E a nós vêm nesta fé

primordial e na categoria de santos pagãos, crentes tais como Abel, Enoque, Noé, Jó,

Daniel, Melquisedeque, Ló, Abimeleque, Jetro, Raabe, Ruth, Naamã, Rainha de

Sabá, o centurião romano, Cornélio e outros. Eles foram crentes, homens e mulheres

que experimentaram um correto relacionamento com Deus e viveram vidas santas, sob os termos mais amplos do concerto feito com Noé

297.

Para Pinnock, porém, nem de longe significa uma licença bíblica para o pluralismo.

Todos os elogios da citação acima são dirigidos a pessoas, seres humanos, que, a despeito de

295 Clark H. Pinnock. Flame of Love, p. 63. 296 Clark H. Pinnock. A wideness in God’s mercy, p.15.

297 Ibid., p. 92.

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Ou seja, o fato de o Espírito atuar no coração de todos os homens em todos os tempos, não

quer dizer que aja em instituições religiosas não cristãs, qualquer que seja a medida com que

isto ocorra. Por outro lado, apenas aludindo ao que já foi dito na introdução, a ação extra

eclesial do Espírito dá apenas numa dimensão geográfica, pois todas as vezes que esta ação é

aventada nas Escrituras há conexão com a Igreja ou com o povo de Deus, não existindo

nenhum relato de pessoas impressionadas pelo Espírito que vivam ignorando a tradição

bíblica. Isto, obviamente não vale para os patriarcas pré-abraâmicos. Na conclusão sobre as

concepções pentecostais retomaremos esta questão.

3.b.2. Amos Yong

Até aqui, tem sido evidente que o referencial teológico pentecostal, tal como o

evangélico, é bíblico e exclusivista, marcado por seus dois aspectos fundamentais: (a) a já

referida teologia das religiões negativa, que não admite a adesão de uma dimensão salvífica às

religiões, e (b) a ação do Espírito está sempre atrelada ao ministério de Jesus 300. Veli-Matti

Kärkkäinen e Amos Yong, contudo, demonstram ter abandonado estes princípios.

Tal como Pinnock, Yong não se mostra satisfeito com os resultados das teologias das

religiões que conhece e não se vê incluído em nenhum dos três grupos tipológicos de Race,

Yong também não é partidário de um Exclusivismo forte, porque não acha correto decidir a

priori que as religiões sejam irrelevantes; não é inclusivista, porque esta perspectiva sugere que

as religiões sejam substituídas ou completadas pelo Cristianismo; não é adepto de um

Pluralismo sintético por causa da metanarrativa filosófica usada para constituir a síntese da

religiosidade humana301. Seu objetivo é constituir uma teologia das

300 Steve Studebaker. From Pentecost to the Triune God, p. 210.

301 Amos Yong. Pneumatology and the Christian-Buddhist dialogue. Does the Spirit blows through the middle way (Leiden: Brill, 2012), p. 14.

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figura menor da Trindade, submetida ao Filho e sem liberdade para atuar no mundo fora da

Igreja305.

Se não chega a afirmar o Spirituque, “para não multiplicar termos potencialmente

controversos que nada fazem para aumentar a solidariedade entre as confissões religiosas”,

Yong rejeita todo tipo de subordinação em nome de uma “mutualidade das economias da

Palavra e do Espírito para evitar tanto o fanatismo, o entusiasmo e o individualismo de uma

teologia dominada pelo Espírito, como também o dogmatismo, hierarquismo e o

institucionalismo de uma teologia dominada pela Palavra” 306.

Restaurada teologicamente a liberdade do Espírito, A. Yong pode concluir que o

Espírito tem a liberdade de atuar diretamente relacionado ao Pai, como sua segunda mão

(além de Jesus, a primeira)307 e contrabalançar a singularidade de Jesus com uma

universalidade que caracteriza o Espírito. Como é evidente, suas conclusões abrem espaço

para a admissão das religiões na esfera do mistério divino, sob os auspícios da ação livre do

Espírito, coordenada unicamente à vontade salvífica do Pai308. Isto nos leva, como a princípio

foi dito, à conclusão de que Yong defende uma espécie de Inclusivismo, à moda rahneriana,

ou algo para lá do limite entre o Exclusivismo e o Inclusivismo, tendo por base em vez de

uma antropologia teológica, uma teologia bíblica:

Eu sugeri em outro lugar que as religiões nem são acidentes da história nem usurpações da divina providência, mas, de diversas maneiras, instrumentos do trabalho do Espírito Santo a partir dos propósitos divinos no mundo e que se os não evangelizados são salvos, são-no através do trabalho de Cristo pelo Espírito (mesmo

que por meio das crenças e práticas religiosas a eles disponíveis)309

. 305 Amos Yong. The Spirit poured out on all flesh, p. 216. 306 Ibid., p. 226.

307 Amos Yong. Beyond the Impasse: Toward a Pneumatological Theology of Religions (Grand Rapids: Baker Academic, 2003), p. 69. 308 Amos Yong. “A P(new)matological Paradigm for Christ ian Mission in a Religiously Plural World”. In

Missiology: An International Review, XXXIII no. 2 (April, 2005), p. 176. 309 Amos Yong. The Spirit poured out on all flesh, p. 236.

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Portanto, é uma ilusão teológica categorizar que a obra de um é isto, e a obra de outro é aquilo.

Contudo, também não há respaldo bíblico para a clivagem entre as obras do Espírito e

do Filho, como defendido por Yong. A Palavra, o Espírito e o Pai trabalham em consonância.

Foi assim no início da criação, quando o Espírito p airava sobre as águas caóticas primordiais

e Deus criava o mundo pela Palavra ou Logos (Jesus) de seu poder. De igual maneira ocorreu

na fundação da Igreja, onde impera uma mutualidade, para usar uma palavra cara a Yong. A

liberdade do Espírito defendida através de diversos textos não significa que o Espírito trabalhe

dissociado do Filho, quer dizer que o Espírito não depende de elementos humanos para efetuar

sua obra. É a Igreja que é usada pelo Espír ito e não o contrário. A igreja não atua sem o

Espírito, mas o Espírito pode prescindir da Igreja. A obra da Igreja pertence à história da

salvação; a obra do Espírito pertence à eternidade:

Se a igreja (com todas as suas tarefas e faculdades) se entende a si mesma no Espírito e a partir de sua história, também entenderá sua particularidade como momento da atividade do Espírito e não necessitará afirmar sua forma concreta e sua missão especial com exigências de um destrutivo absoluto, Tampouco olhará com desconfiança ou com inveja para a atividade salvífica do Espírito, que tem lugar no exterior dela mesma; antes as aceita agradecida como um sinal de que o campo de ação do Espírito é mais amplo do que a Igreja e que a vontade salvífica de Deus

ultrapassa seus limites 311

.

O Espírito pode, sim, atuar fora da Igreja, e aí a importância da nota enfática de Yong e

dos outros teólogos que valorizaram a pneumatologia, trazendo à luz a misteriosa ação do

Espírito. Mas é teologicamente incorreto transforma este ‘pode’ em um ‘deve’, esquecer que

‘fora dos limites da Igreja’, é apenas uma ação supletiva do Espírito; sua ação principal dá-se

nos limites da Igreja. A obra do Espírito pode se distanciar dos instrumentos humanos

comissionados quando estes falham, mas isto não é uma prescrição. Quando se diz que a obra

do Espírito pode ocorrer fora dos limites da Igreja, é ortodoxo pensar que Ele pode agir e falar

311

Jürgen Moltmann. La iglesia fuerza del Espíritu. Hacia una eclesiología mesiánica (Salamanca: Ediciones Sígueme, 1978), 88.

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Portanto, o resgate da importância da obra do Espírito para a salvação dos homens é

louvável e bem vinda, Yong merecer nosso aplauso por isto. Porém, a ideia de fazer o Espírito

trabalhar diretamente nas religiões como agente inspirador de outras Escrituras é doutrina

perigosa e heterodoxa, que fortalece as religiões não cristãs e enfraquece o Cristianismo aos

olhos de seus próprios adeptos.

3.c.Inclusivismo Católico Romano

O Inclusivismo Católico começa sua elaboração teológica no Vaticano II, um concílio

convocado por João XXIII e realizado nos anos de 1962 a 1965, quando o Catolicismo saía da

era dos Pios, cujo símbolo maior foi o Sylabus errorum, uma lista de obras proibidas pela Sé, o

ápice da síndrome megalomaníaca de uma Igreja em guerra com o mundo. Ocorre também

nesta época a condenação do pluralismo teológico e o consequente estímulo ao renascimento do

Tomismo (Neotomismo), a declaração da infalibilidade papal, a condenação da doutrina liberal

do Estado laico, o repúdio curial à liberdade religiosa, e a censura aos regionalismos litúrgicos,

que tiveram por consequência uma crescente romanização do Catolicismo popular.

O concílio Vaticano II foi em sentido inverso ao do Vaticano I, rumo a uma abertura à

diversidade teológica e à diversidade religiosa. O primeiro passo para esta abertura

generalizada foi a Igreja ter admitido um novo conceito de verdade, verdade relacional, que a

faz abandonar o modelo antigo de verdade proposicional. A participação de Marie Dominique

Chenú foi decisiva para esta reviravolta hermenêutica da Igreja Católica. Seu método histórico

recuperou a dimensão conjuntural da verdade divina, que faz com que o conceito de revelação

não seja mais prioritariamente um conjunto de verdades fáticas sobre Deus e o ser humano,

mas autocomunicação de Deus ao homem. A concepção de verdade antagônica a erro assim

perde espaço para uma ideia de verdade completa contraposta a verdades parciais.

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Embora não tratem exclusivamente do problema das religiões não cristãs, como já

sugerido acima, todos os documentos conciliares falam algo do tema, entre estes,

especialmente, Lumen Gentium, Nostra Aetate e Ad Gentes. Neles estão desenvolvidos três

temas: (1) a salvação dos que estão fora da Igreja Católica; (2) Valores autênticos que podem

ser encontrados nos não Cristãos e em suas tradições religiosas; (3) a recepção destes valores

na Igreja Católica, ou seja, a atitude da Igreja em relação às suas tradições religiosas e seus

membros314. A diferença entre as disposições conciliares do Vaticano II e as dos outros

concílios e encíclicas, é que o problema da salvação nas religiões não é mais tratado num

âmbito meramente pessoal, mas num contexto institucional, isto é, trata do status salvífico das

instituições religiosas a que pertencem os indivíduos não cristãos.

Outra mudança significativa foi o banimento dos documentos conciliares de termos

ofensivos preconceituosos tais como paganus e gentilis. Os textos reconhecem aos não cristãos

“as riquezas espirituais dos povos”, “coisas verdadeiras e boas”, “bens preciosos, religiosos e

humanos”, “sementes do Verbo”, “elementos de verdade e graça, frutos de uma secreta

presença divina”. Porém, apesar de todas estas expressões reconhecerem nas religiões um

valor humano e religioso que lhes é peculiar, não se chega a conceder-lhes um status salvífico

próprio – as pessoas são salvas nas religiões, não mais apesar delas, e, no entanto, ainda não

através delas. Cristo é o salvador universal e o Espírito, o agente difusor desta salvação. E com

a conclusão de que “a religião verdadeira é necessariamente a Igreja Católica, ainda que

possam ser encontrados ‘elementos’ (vestigia) da vera religio também em outras religiões” 315.

Na prática o Vaticano II serviu apenas para que as interpretações mais tolerantes quanto

às religiões pudessem sair dos subterrâneos da Igreja Católica, dominada até então pela

314 J. Dupuis. Rumo a uma teologia cristã do pluralismo religioso , p. 228 a 229.

315 F. Conesa. “Sobre la religión verdadera: aproximac ión al significado de la expresión” ( ST, vol. XXX, Enero – Abril, 1998), p. 47.

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atitude de autodefesa do Vaticano I. A prova disto é que as declarações conciliares são

generalistas e, por isso, propositalmente consensuais, permitindo que suas ambiguidades sigam

gerando interpretações e servindo a lados diametralmente opostos na arena teológica. Com a

diferença de que ideias como as dos teólogos subsequentemente apresentados podem ser

expressas sem gerar perseguições hierárquicas silenciadoras, embora as constrangedoras ainda

permaneçam.

Dentro do Inclusivismo católico, ainda é possível distinguir três modalidades: (1) um

Inclusivismo rahneriano mais próximo ao Exclusivismo, já que entende toda experiência

humana como resultante indiretamente do mistério crístico em sua atuação universal, levando à

conclusão de que todo ser humano, sendo religioso ou não (e se religioso), sua religião sendo

qual for, é um cristão anônimo 316. (2) A outra concepção é mais próxima do Pluralismo, pois

amplia o ministério de Jesus de modo a que se torne abrangente a respeito das outras religiões.

Esta é a posição de Jacques Dupuis e Edward Schillebeeckx. Vale ainda ressaltar, que os

membros de ambos os grupos também estão envolvidos com um projeto hermenêutico voltado

para o mundo secularizado, com pensadores que não serão tratados no resumo a seguir. É o caso

de Juan Luis Segundo, apesar de to da a sua importância e envergadura teológica 317.

316

“[o homem] já aceita a revelação [de Deus] quando quer que ele realmente aceite a si próprio inteiram ente,

porque ela [a revelação] já fala nele. Antes de uma fé eclesiástica oficial tomar uma forma explícita, onde quer que uma pessoa se comprometa e viva o dever de cada dia na quieta sinceridade da paciência, na devoção a seus deveres materiais às demandas feitas a eles pelas pessoas sob seus cuidados... Portanto, não importa o que um homem declare em sua conceitual, teorética, reflexão religiosa, qualquer um que não diga em seu coração, ‘não existe Deus’(como o tolo do salmo), mas dá testemunho dele pela radical aceitação de seu ser, é um crente. Mas se neste percurso ele crê de fato e de verdade no santo mistério de Deus, se ele não suprimir esta verdade, mas dar a ela livre curso, então a graça desta verdade pela qual ele permite a si mesmo ser levado é sempre já a graça do Pai em seu Filho. E qualquer um que se deixe guiar por esta graça pode ser chamado com muita justeza de

‘cristão anônimo’ ”(Karl Rahner. Theological Investigations Vol. 6, pp. 394-395). 317

La historia perdida e recuperada de Jesús de Nazaret. De los Sinópticos a Pablo (Santander: Editorial Sal Terrae, 1991).

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ao ser absoluto” 320. Como mais tarde Rahner explicaria, além de uma atividade categorial da

consciência explícita objetiva, uma atividade implícita existencial, em que se apresentam

como constituintes fundamentais a vontade e a liberdade humanas, que nos remetem a algo

colocado além dos objetos conhecidos pela consciência explícita321. Em suma, na experiência

transcendental humana (aquela que é condição de possibilidade de qualquer experiência),

existe uma abertura para o mistério divino.

Baseado nesta “experiência atemática” do divino, experiência não cooptada por tradições

ou doutrinas, e cuja pré-condição é a graça divina, ele encontra a base comum de todas as

religiões do mundo. A estrutura cognitiva humana, que parece ter sido preparada para a

percepção subjetiva do transcendente, é testemunha da vontade salvífica universal de Deus,

pois ela se torna “condição de possibilidade de significativos e verdadeiros atos salvíficos de

Deus” 322. Todos os seres humanos estão estruturalmente incluídos na graça de Deus, existindo,

entretanto, aqueles que sabem qual a natureza desta abertura ao transcendente e aqueles que não

sabem. Os primeiros são Cristãos explícitos; os segundos, Cristãos implícitos ou anônimos. Do

ponto de vista antropológico, não há nenhuma diferença importante entre eles. A diferença dá-se

no campo cognitivo: “o cristão sabe o que é e o não cristão não o sabe; é um cristão anônimo”

323.

Nós preferimos a terminologia segundo a qual o home m é chamado um ‘cristão

anônimo, que de um lado tem de fato aceito por sua liberdade esta graça auto-

ofertada da parte de Deus através da fé, esperança, e amor; enquanto por outro lado,

ele ainda não é um cristão no nível social (por meio do batismo e da filiação à

Igreja), ou no sentido de ter conscientemente objetivado o Cristianismo para si

mesmo em sua mente (pela fé cristã explícita resultando da audição à explícita

mensagem cristã). Devemos colocar como segue: o ‘cristão anônimo’, no sentido

que damos ao termo, é o pagão depois do início da missão cristã, que vive no estado

da graça de Cristo, pela fé, esperança e amor, embora ele não tenha o conhecimento 320 Carlos Schickendantz. “Una relación entre Martin H eidegger y Karl Rahner. Una recepción y diferenciac ión todavía por escribir”, p. 376.

321 Karl Rahner. Curso Fundamental da Fé: introdução ao conceito de Cristianismo (São Paulo: Edições Paulinas, 1989), pp. 33 e 34.

322 Karl Rahner apud Faustino Teixeira.”Karl Rahner e as religiões”. In Pedro R. R. Oliveira e Cláudio Paul. Karl Rahner em perspectiva (São Paulo: Loyola, 2004), p. 249.

323 J. Morales. “La teología de las religiones” ( ST, vol. XXX, Sept.-Dic., 1998), p. 765.

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explícito do fato de que sua vida está orientada para a graça salvadora de Jesus

Cristo324

.

Apesar de Rahner conceder valor salvífico às religiões, isto só é possível em sua

subordinação ao Cristianismo, porque embora não o saibam, sua salvação ocorre através da

ação redentora de Cristo. As religiões, portanto, não têm status salvífico próprio. Sua

sensibilidade religiosa precisa ser reinterpretada pelas categorias religiosas cristãs. Contudo,

elas salvam assim mesmo, bastando ao adorador não cristão ser fiel ao mistério divino ao qual

aportou pelos meios de que social e culturalmente dispunha. Com razão ecoa a crítica de

Henri de Lubac quanto à perda de relevância da mensagem cristã: “se um cristianismo

implícito é suficiente para a salvação de quem não conhece outro, por que colocar-se em

busca de um cristianismo explícito?” 325

J. Dupuis afirma que este conceito de “cristão anônimo” não só nega às religiões um

status salvífico próprio, como também vê em seus adeptos uma deficiência existencial, porque o

conteúdo temático das religiões não é levado em conta, e é valorizado apenas em sua abertura

ao mistério divino. O adorador não cristão fica restrito a um estágio preliminar místico que lhe

fornece apenas a condição de possibilidade do conhecimento de Deus, cuja realização ocorre

em outro lugar: no contexto sacramental da Igreja Católica Romana. O Cristianismo anônimo,

deste modo, permaneceria como realidade fragmentária, incompleta e radicalmente mutilada,

que alimenta em si dinâmicas que o impulsionam a aderir ao Cristianismo explícito326.

H. Küng faz duras críticas à teoria do cristianismo anônimo de Rahner. Para ele a teoria

rahneriana trata-se de um “truque metodológico” 327, que considera a religião cristã como a

324 Karl Rahner, Theological Investigations, Vol. 14 (London: Darton, Longman & Todd, 1976), p 283. 325 Apud Faustino Teixeira. “Karl Rahner e as religiões”, p. 255.

326 K. Rahner apud J. Dupuis. Rumo a uma teologia cristã do pluralismo religioso , p. 205.

327 H. Küng. Teologia a caminho. Fundamentação para o diálogo ecumênico(São Paulo: Edições Paulinas,

1999), p. 270.

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o projeto teológico de Dupuis: um inclusivismo sintético parecido à proposta de A. Yong, com

exceção de que em seu caso os textos basilares não sairão apenas das Escrituras.

Com efeito, a respeito ao texto ou o dado da fé, ele opta pelo método “genético” ou

“histórico evolutivo”, o qual se baseia nas Escrituras, mas também nas disposições finais do

concílio Vaticano II, que atribui também à Tradição e ao Magistério a qualidade de texto fonte

do Cristianismo. Isto faz com que o teólogo sistemático, mesmo ao proceder um estudo

exegético da cristologia do NT, tenha que estender seus estudos à cristologia da tradição pós-

bíblica dos Padres e do Magistério332 . A intenção deste método, segundo Dupuis, visa a

impedir que a pluralidade das cristologias neotestamentárias sejam reduzidas a uma

diversidade amorfa e sem unidade. A reflexão cristo lógica pós-neotestamentária é, portanto,

um prolongamento canônico que ocorre sob o signo do ministério do Espírito, em resposta a

uma necessidade hermenêutica. Mas, sempre como “processo orgânico de desenvolvimento”,

ou seja, de forma evolutiva, em uma “substancial unidade de conteúdos”333.

Através desta concepção Dupuis é levado a pensar a cristologia do NT como

fundamentalmente diacrônica. Ou seja, ela vai atingindo patamares mais elevados à medida

que a reflexão teológica progride, até culminar no prólogo joanino 334. Este é o motivo por que

a exegese de Dupuis se ocupa unicamente em explorar teologicamente o Logos joanino para

fundamentar sua teologia das religiões. Nisto ele segue a tradição dos Padres Apologetas, cuja

teologia do Logos se desenvolveu dialogando com a cultura (filosofia) grega. Portanto, a

conclusão de Dupuis é de que “é o Verbo de Deus que salva, e não propriamente o Verbo-

feito-carne, isto é, Jesus Cristo” 335.

332 Ibid., pp. 14 e 15.

333 J. Dupuis. Rumo a uma teologia do pluralismo religioso, p. 22. 334 Ibid., p. 101. 335 Ibid., p. 274.

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glória de Filho único junto ao Pai”. Não é por acaso que o verbo habitou entre nós, mantendo sua

glória junto ao Pai. Ele está no tempo e fora do tempo simultaneamente. Ou seja, ele está lá e cá

no mesmo lapso temporal, paradoxalmente, permanecendo único e o mesmo aqui ou lá. E não,

como ensinam estes teólogos, como entes diferentes, um maior: o Logos, e um menor: o Jesus

histórico, que participa de maneira parcial d a natureza do Logos 342.

Isto é comum no texto joânico. Nos lábios de Jesus, o verbo eimi (ser) aparece no presente

do indicativo mesmo quando a referência temporal esteja no passado: “antes que Abraão

existisse eu sou” (Jo 8: 57); ou, no futuro: “[e vos levarei comigo,] para que onde estou estejais

vós também” (Jo 14: 3). Nisto a teologia joanina é coerente com o conceito de reino de Deus dos

sinóticos, onde também aparece esta tensão entre o já e o ainda não. Não havendo, portanto,

nenhuma alteração importante entre as fontes, exceto o fato de que a referência das primeiras é

reino de Deus e a da segunda é a pessoa de Cristo. A funcionalidade está presente em ambas, a

saber, demonstrar uma realidade espiritual atuante no contrapelo da história, mas não fora dela.

Portanto, abstrair o Logos joanino da realidade temporal é uma operação infiel à teologia

joânica. Uma ontologização do Logos é algo estranho ao pensamento semítico do qual

compartilha João, não sendo seu objetivo outro além de demonstrar que a ação divina no

contexto humano realiza-se na pessoa de Jesus, tal como se realizou no passado na

maravilhosa libertação de Israel do jugo da servidão egípcio. Com a diferença de que no

342

A teoria platônica da participação não pode ser encontrada no evangelho de João, nem aí ou qualquer outro

lugar. Não se trata da realidade do Logos e sua sombra humana, Jesus Cristo, uma realidade passageira ou temporária, cuja existência é derivativa e não essencial. Jesus Cristo é o Logos no tempo. Ele, o Logos, não está no topos uranos tendo uma sombra projetada na terra, Jesus de Nazaré. Ele está no céu junto ao Pai e está na terra, perto de seus discípulos. Ele é onipresente, embora sua divindade esteja oculta na humanidade. Crer na doutrina da participação nos torna Docetistas, doutrina condenada já no primeiro século e que teve a condenação ratificada no concílio de Nicéia.

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contexto cristão esta ação não é mais pontual e isolada343. É uma presença constante na vida

da Igreja, seja pelo reino de Deus, seja por meio do Logos, ou, pelo Espírito, o Consolador.

O que se pode dizer como conclusão é que, lamentavelmente, a síntese pretendida por

Dupuis falhou. Ficou a dever ao texto, o dado da fé. Efetivamente, foram contemplados

apenas os outros dois aspectos de sua metodologia: a situação histórica e a interpretação

hodierna. Ele comete o erro que caracteriza os pluralistas como um todo: a subsunção à

pressão dos tempos, desprezando ou descurando do texto bíblico. Em seu caso ainda houve a

pressão eclesiástica que o impediu de sequer ser coerente com seu próprio pensamento, pois

ao final não se sabe realmente o que pensou Dupuis, haja vista a multidão de adendos e glosas

agregados a seus textos.

3.c.3. Edward Schillebeeckx

Teólogo católico romano, dominicano, nascido na Bélgica em 1914 e faleceu em 2009,

na Holanda. Estudou em Paris com diversos teólogos pré-conciliares, tais como Chenu, Yves

Congar, Henri de Lubac, De Petters, entre outros. Depois de ter sido docente em Louvain

terminou sua carreira no seminário de Nijmegen, na Holanda. Com K. Rahner e H. Küng,

Schillebeeckx teve o nome ligado ao concílio Vaticano II, onde atuou, assim como os demais,

como teólogo consultor, e foi influenciado por seus resultados344. Dedicou boa parte de suas

obras a dar continuidade às reflexões teológicas in auguradas pelo concílio que ajudou a

construir, sempre em diálogo com o mundo e com a teologia secularizada, por isso em muitas

situações durante sua vida atritou com a hierarquia romana345.

343 Ainda que se tenha consciência de que ela se repete todas as vezes que o povo eleito clama debaixo do jugo a

opressão, o primeiro ato de libertação de Deus permanece como arquétipo que explica os demais e do qual os

mais tiram seu sentido. 344 Erik Borgman. Edward Schillebeeckx. A theologian in his history (London: Continuum, 2003), p. 2.

345 Existem alguns exemplos: sua decisiva colaboração para a formação do Conselho Pastoral Holandês, cujos membros eram eleitos e podiam ser leigos, e que foi vetado pela cúria romana, por não admitir ingerência leiga

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Em suma, Schillebeeckx cria uma hermenêutica quebrada, em que a relação entre a

tradição e a modernidade é dialética no espírito do teólogo 352. Na prática, uma teologia

bifronte que faz com que cada afirmação especulativa tenha que ser compensada por outra, fiel

reprodutora do pensamento da Tradição, malgrado, em não poucas ocasiões, estejam sendo

postas lado a lado ideias contraditórias. Pode-se citar como exemplo o que segue:

É a primeira vez que manifesto minha reflexão sobre a Trindade tão abertamente. Para mim, a Trindade é o modo de Deus ser pessoa. Admito todas as exigências do dogma sem correr o risco de falar de três pessoas de uma espécie de família, e, de

fato, de um triteísmo, que é bastante popular na fé cristã 353

.

A verdade é que o teólogo flamengo está às turras com o pensamento dogmático católico

que lhe antecede. Sua intenção ao sustenta r afirmações contraditórias é manter as aparências e

safar-se de sanções curiais, tal como ocorrera a seu colega J. Dupuis. Com efeito,

Schillebeeckx não crê no Espírito Santo 354. Também não crê que Jesus seja Deus 355, e menos

que tenha ressuscitado 356. Sua cristologia é baixa e completamente secularizada, sua teologia

das religiões embasada numa eclesiologia ampliada e todo-abarcante, que na realidade elide o

elemento sacramental: “o mundo, a gora definido de modo mais específico e concreto, é ele

mesmo mediador da presença de Deus” 357.

352 A. T. Queiruga. Repensar a teologia, sondagens para um novo paradigma, p. 127. 353 Ibid., idem.

354 “Aceito plenamente o credo, porém na profissão de fé, não estão as três pessoas divinas. Creio em Deus

Onipotente, em Jesus Cristo, o amado do Pai, filho de Deus por excelência; creio no Espírito, que paramim é o

verdadeiro problema. Na Bíblia, O Espírito é um dom, não uma terceira pessoa, é o próprio modo de ser de Deus

[...]. Confesso a Trindade, mas estas especulações sobre as três pessoas não me dizem nada [...]. (Schillebeeckx

apud Queiruga. Repensar a cristologia, sondagens para um novo paradigma, p. 150).

355 Schillebeeckx considera ridícula a ideia “de um ho mem divino, isto é, um Deus terrestre disfarçado de homem” (E. Schillebeeckx, Jesús, historia de un viviente, p. 27); em outro lugar diz que “em sua humanidade Jesus é tão intimamente algo que vem do Pai que precisamente por isso é Filho de Deus (logo, não enquanto Verbo)” ( Ibid., p. 697).

356 Sobre a ressurreição Schillebeeckx se expressa de forma ambígua e pusilânime: “algo deve ter ocorrido de modo a ter produzido a conversão dos discípulos” ( Ibid., p. 400).

357 Daniel S. Thompson. The language of dissent: Edward Schillebeeckx and the crisis of authority in the Catholic Church (Notre Dame, Indiana: University of Notre Dame Press, 2003), p. 89.

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Extra mundum nula salus, expressão cunhada por Schillebeeckx, depois transformada em

lema do pluralismo, quer significa “a presença criativa e salvífica de Deus é mediada pelos

seres humanos” em sua experiência de Deus. Esta experiência, para ele é a última palavra para

validação da salvação, que decorre do senso de finitude criatural. Neste lastro ele procura fazer

uma fenomenologia da experiência religiosa a partir da manifestação de Jesus Cristo: Deus

como Abba, a entrega total à vontade divina – a páscoa. Estes são os elementos fundamentais

para entender a religião em geral, a relação de Jesus com Deus. A experiência religiosa de

Jesus, entretanto, não é normativa nem serve para aferir a experiência religiosa das outras

religiões. Não podemos ter uma visão total da divindade por meio de Jesus:

Jesus não somente revela a Deus, mas também o oculta, visto que apareceu entre nós

como criatura humana e não em forma divina. Como homem é um ser contingente, histórico, que de modo algum pode representar a plenitude de Deus [...], a não ser se

negarmos a realidade de sua autêntica humanidade.

Isto impede toda a pretensão exclusivista: quem não leva a sério o fato do existir concreto e particular de Jesus, precisamente em sua qualidade de homem condicionado geograficamente, e marcado culturalmente, e por isto mesmo limitado, faz de Jesus uma emanação, ou um efeito divino necessário, com a consequência de que todas as

outras religiões desaparecessem no nada358

.

O que nos impede então de classificar Schillebeeckx como pluralista, haja vista tantos

indícios em seus escritos de ser este seu direcionamento. Porque embora abra a possibilidade da

experiência de Deus ocorrer fora dos limites das igrejas cristãs e mesmo entre aqueles que não

professam nenhuma religião, ele nunca abandona o ponto as referências cristãs. E talvez seu

próprio projeto teológico não tenha contribuído para que isto ocorresse, a saber, falar ao

homem secularizado europeu e não aos adeptos das outras religiões.

358 E. Schillebeeckx. História humana, revelação de Deus,, p. 254.

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Eles são mutuamente incompreensíveis no sentido mais profundo da palavra. A base do que

dizem os utentes das linguagens religiosas são “formas de vida”, que resultam de ‘experiências

linguísticas’ diferentes. Uma experiência linguística para Wittgenstein significa algo mais

amplo e profundo do que mera troca de informação por meio de signos linguísticos, envolve o

entorno dos utentes da linguagem, de onde também lhe vem o significado. A comunicação

existe porque há um complicado contexto em que estão relacionadas ações sociais, linguísticas

e extralinguísticas 361. A linguagem sem estas ações perde seu quadro referencial Em suma,

assim como a linguagem, as religiões são “jogos de linguagem” incompatíveis.

Seguindo Wittgenstein um pouco mais adiante, chega a ser difícil até mesmo fazer

comparações entre experiências religiosas aparentemente semelhantes, mas pertencentes a

religiões diferentes. Elas são “semelhanças de família”, isto é, tal como os membros de uma

mesma família são parecidos de forma desigual por meio de aspectos morfológicos similares e

não coincidentes para a maioria: um tipo de nariz, de boca, cor de cabelo, etc. Assim também

as religiões podem estar aparentadas somente se consideradas em aspectos isolados. No quadro

geral o que existe é uma diversidade irredutível362.

Considere-se um dos mais universais conceitos religiosos: salvação 363. Salvação para os

cristãos significa a ressurreição da carne, novos céus e nova terra onde habita a justiça e uma

comunhão mais estreita com o Criador, ou seja, a beatitude. O caminho para ela é Jesus Cristo,

esperança da glória. Para um budista salvação é nirvana, libertação da roda da samsara. É

anatman (não eu), uma imersão na imensidão do cosmo, com consequente perda de

subjetividade e a extinção da dor e do desejo, origem de toda infelicidade humana; numa

361 L. Wittgenstein. Philosophical Investigations / Philosophische Untersuchungen (G. E. M. Anscombe & R. Rhees (eds.), U. S. A., The Macmillan company, 1969), parágrafo: 205.

362 L. Wittgenstein. Philosophical Investigations / Philosophische Untersuchungen, parágrafo 67;Cf. Zettel, (G. E. M. Anscombe e G. H. von Wright (ogs.), Lisboa, Edições 70, 2000), parágrafo 646.

363 Paul Hedges. Controversies in interreligious dialogue and the theology of religions, pp. 187 e 188.

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palavra, a serenidade. Para um hindu, salvação é moksha, que na tradição bahkti significa sair

da lei do karma, ficar fora do constante ciclo de nascimento e morte e o mergulho em

Brahman, do pós-morte a suprema deidade, ou seja, o repouso. “E isto pode ser obtido por

três caminhos (margas): (1) o caminho do conhecimento (jnanamarga), (2) o caminho da

devoção (bhaktimarga), (3) o caminho da ação (karmamarga)” 364.

Em suma, nada pode ser mais diferente do que conceitos teológicos. Eles carregam uma

imensa carga semiótica de séculos de discussões e reflexões. Ou seja, não podemos deixar de

notar certo agnosticismo nesta posição, logo tratado de ser atenuado pelo benéfico da dúvida

proveniente do argumento escatológico. Só saberemos ou conheceremos a verdade em sua

plenitude no final dos tempos.

Quando introduzíamos este tópico pluralista um pouco desta modalidade mais sofisticada

de Pluralismo, que consegue evitar todas as contenções colocadas em relação aos pluralistas

sintéticos. Como veremos mais adiante o Pluralismo particularista merece outras. Malgrado

grandes diferenças entre seus defensores, podem ser destacados alguns pontos em comum:

1. Cada fé é única. A alteridade é enfatizada em vez de a similaridade. Consequentemente, os elementos comuns da experiência religiosa ou das doutrinas são considerados superficiais.

2. Só é possível falar de experiência religiosa a partir de uma tradição específica; não pode existir uma interpretação pluralista.

3. O Espírito Santo deve estar trabalhando em outras religiões, merecendo, portanto, o respeito e a dignidade.

4. Não existe nenhum poder salvífico nas outras religiões, não obstante elas estão incluídas nos planos de Deus para a humanidade, mas por maneiras que nós não

conhecemos.

5. Nós precisamos trabalhar [missiologia] a partir de uma posição baseada na pós-modernidade e na cosmovisão pós-liberal.

364 Chad Meister. Philosophy of Religion (Abingdon,UK/ New York: Routledge, 2006), p. 25.

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6. As doutrinas ortodoxas sobre Cristo e sobre a Trindade são os pontos básicos a

partir dos quais deverá ocorrer nossa abordagem das outras religiões. 365

O Conselho Mundial das Igrejas (WCC – World Council of Churches), fundado em 1948,

adota integralmente estes pontos. Não foi uma decisão fácil. Pelo contrário, uma caminhada

relutante e paulatina. Primeiro, os delegados aceitaram fazer um addendum na declaração das

políticas sobre outras religiões em 1971. Depois de uma década de difíceis controvérsias o

WCC aceitou incluir nos documentos conciliares, especificamente no Guidelines on Dialogue,

a declaração teológica: “nós sentimos poder assegurar aos nossos parceiros de diálogo que nós

não nos aproximamos como manipuladores, mas como peregrinos companheiros” 366.

O ceticismo particularista preserva praticamente todos os pontos doutrinários

fundamentais do Cristianismo, como pode ser percebido na lista apresentada, exceto um: a

obrigação de cumprir o mandado de evangelizar o mundo. Porque nesta modalidade

missiológica o ímpeto missionário se enfraquece e se seculariza, dado que o objetivo da

pregação não é mais um reino de Deus transcendente que invade a realidade humana desde

fora, a partir da realidade divina, e sim um reino de Deus imanente que cresce no meio de nós,

à medida que acudimos ao pobre e ao necessitado, libertamos o oprimido e preservamos o

planeta. Jüngen Moltmann é um exemplo de defensor deste tipo de missiologia.

4.b.1. Jürgen Moltmann367

Ao lado de W. Pannenberg, J. Moltmann é atualmente a figura mais representativa da

teologia Protestante depois do desaparecimento de seus grandes nomes (K. Barth, P. Tillich,

D. Bonhoeffer e O. Cullmann). “Marcado pela tradição barthiana, ele insiste em abandonar

365 Paul Hedges. Controversies in interreligious dialogue and the theology of religions, pp. 146-147.

366 Apud Stanley Samartha. “The Cross And the Rainbow – Chr ist in a Multireligious Culture” in John Hick and Paul Knitter (eds.) The Myth of Christian Uniqueness, p. 70. 367 O tratamento dado às ideias de Moltmann neste lugar terá menos espaço do que julgaríamos adequado, isto devido ao fato de muito de sua argumentação já ter sido usado na introdução aos pluralistas particularistas.

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Moltmann, cuja aparição ocorreu na coletânea já citada, The myth of Christian uniqueness

reconsidered 372: “É a teologia pluralista útil para o diálogo entre as religiões mundiais?”, onde

dirige suas críticas mais veemente ao relativismo decorrente das noções dos pluralistas citados.

Resumindo, apesar d e exígua, sua contribuição é coerente e decisiva, especialmente quando

critica J. Hick e P. Knitter; a ela recorremos em vários pontos de nossa própria avaliação.

Neste artigo Moltmann aponta-lhes três principais problemas: (a) a questão da verdade é

deslocada de sua centralidade, e isto não pode ocorrer se não o debate perde completamente a

relevância; (b) o diálogo inter-religioso não pode ser conduzido como se fosse um critério

metodológico: o diálogo inter-religioso é resultado e não ponto de partida; e (c) conforme se

observa na modalidade de Hick e Knitter, uma teologia das religiões pluralista pode ser tão

imperialista quanto uma teologia das religiões cristológica.

Quanto à questão da verdade, é bem óbvio que nada s e ganha elidindo-a em favor de um

relativismo baseado na filosofia de Kant. Isto não é bom nem para Cristãos nem para não

Cristãos. Para Cristãos não é útil porque o diálogo que daí decorre será ao preço de sua própria

fé; para não Cristãos, o secularismo subjacente a estas ideias também os acaba atingindo. Por

isso, Moltmann conclui, “os representantes das outras religiões não querem conversar com os

modernos relativistas religiosos. Eles estão interessados em Cristãos e Judeus convictos [...]”

373. Porque o diálogo inter-religioso ocorre não pela relativização do discurso dos debatedores,

mas à medida que todos submetem seu próprio discurso à crítica do outro e evitando a

pressuposição de que sairão do diálogo assim como nele entraram, sem terem aprendido nada

uns com os outros374. Outrossim, o diálogo inter-religioso não é sobre nenhum dos debatedores

mas sobre um terceiro assunto: a paz entre os seres humanos e entre

372 “Is pluralistic theology useful for the dialogue of world religions?”

372 Jürgen Moltmann. Experiences in theology. Ways and forms of Christian Theology, p. 19. 374 Jürgen Moltamann. “Is pluralistic theology useful for the dialogue of world religions”, p. 153.

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estes e o planeta, a luta para que não haja opressão do homem pelo homem e nem da natureza

pelo homem375.

De acordo com Moltmann, o papel salvífico das religiões decorre primeiro do fato de

todos os homens serem capazes de se voltar para o transcendente, de que é prova o grande

número de religiões existente no mundo. Por outro lado, a salvação nas religiões pode ser

pensada inclusivamente, que Jesus morreu por todos, reconciliando consigo o mundo inteiro.

Esta questão não fica muito clara em Moltmann nem vê necessidade em clarificá-la, estando

completamente dominado por razões pragmáticas, tendo em vista a preservação da vida e do

planeta (o que nos leva a pensar que seu conceito de salvação é imanente): “De fato, as

religiões, para serem aceitas no mundo, isto é, para se tornarem religiões mundiais, precisam

promover e garantir a segurança e o bem estar do se r humano, que depende da sobrevivência

da terra e de outras criaturas” 376.

O diálogo inter-religioso não deve ser orientando, portanto, por um pensamento de

consumação fatalista, mas por um “enfoque e valorações fundadas na promessa peculiar feita

ao Cristianismo e orientados ao futuro universal da humanidade no reino de Deus” 377, sob

cujo guarda-chuva todas as religiões devem ser incluídas 378. Neste contexto o papel da missão

cristã muda completamente de objetivo. Já não é mais uma missão quantitativa, voltada para a

implantação e o crescimento de igrejas nos campos missionários. Este novo papel “consiste em

contagiar os homens, sejam de que religião forem, com o espírito da esperança, do amor e da

responsabilidade para com o mundo” 379. Tendo abandonado a concepção de verdade absoluta

o novo papel do Cristianismo é o de “catalisador” religioso do mundo:

375 Jüngen Moltmann. Experiences in theology, p. 20.

376 Jüngen Moltmann. Experiences in theology, p. 21.

377 Jüngen Moltmann. La iglesia fuerza del Espíritu, p. 185.

378 Jüngen Moltmann. The coming of God: Christian eschatology (Minneapolis: Augsburg Fortress Press,

1996), p. 250-255.

379 Idem, La iglesia fuerza del Espíritu, p. 188.

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A unidade do Deus triúno não é mais vista num aspecto de divina homogeneidade nem como divina identidade, mas como eterna perichoresis do Pai, do Filho e do Espírito [...]. As ideias monárquicas, hierárquicas patriarcais, usadas para legitimar o conceito de Deus estão, portanto, tornando-se obsoletas. Comunidade, companheirismo, é a

natureza e o propósito do Deus triuno384

.

Moltmann conclui na mesma página fazendo uma aplicação política, mas que pode ser

estendida à sociedade multicultural e multirreligiosa da atualidade:

Deus é uma comunidade de Pai, Filho e Espírito, cuja unidade é constituída pelo mútuo habitar e recíproca interpreta. Assim, encontramos o reflexo mundano desta

divina sociedade, não numa autocracia de um governante solitário, mas na

comunidade democrática dos povos livres.

4.c. Pluralistas sintéticos

Os recursos hermenêuticos de que se valem os pluralistas sintéticos para superar o

Exclusivismo bíblico, como é de se esperar, são perigosos: (A) o esvaziamento do conceito de

verdade; (B) o esvaziamento de conceitos peculiares à Escritura, tais como, pecado, revelação

e salvação; (C) o esvaziamento da relevância salvífica das instituições religiosas; (D) o

esvaziamento da função salvífica do Jesus histórico.

(A) A corrosão gradual e constante do conceito de ‘verdade’ no discurso teológico

cristão remonta ao século XIX. Contudo, o início deste processo recua a tempos mais

remotos. Começou quando o Protestantismo deu nascimento ao pensamento secular, por meio

de Lutero, por ter ele colocado sua consciência acima de suas obrigações políticas e sociais.

Não que esta ideia radical da liberdade cristã esteja errada, mas ela abalou os fundamentos da

Cristandade monolítica do Catolicismo Romano e abriu caminhos para outras contestações

mais perniciosas. Depois, este mesmo valor supremo da honestidade intelectual e moral do

homem e de suas ideias faz nascerem as universidades e os estudos acadêmicos seculares.

384

Jürgen Moltmann. History of triune God: contributions to Trinitarian theology (New York: Crossroad, 1992), p. xii.

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estupefação. Seu erro, contudo, havia sido cometido nos anos do século XIX, quando pela mão

de W. Wrede, J. Wellhalser e outros críticos a Escritura fora atirada nos braços do Idealismo

alemão. A negação da veracidade do discurso propriamente religioso das Escrituras (milagres,

revelação e salvação) não deixou outra opção à teologia, senão procurar guarida na filosofia

que eles próprios haviam ajudado a constituir, consumando assim sua perdição.

Mas ainda não era o fundo do poço. Mesmo os teólogos mais conservadores – pelo

menos os não adeptos da inerrância – reconhecem que os escritores da Bíblia, além de

inspirados são humanos e que por isso, não raro, deixam-se influenciar pelos usos e costumes

de seu tempo, justificando práticas inaceitáveis do ponto de vista ético, tais como

patriarcalismo, sexismo, escravismo, colonialismo. As teologias críticas podiam vasculhar as

páginas das Escrituras e se multiplicar à medida que seus objetos também se multiplicavam.

Mas, em nada esta devassa fazia ainda perigar a fé cristã, por conta de dois princípios

hermenêuticos que a salvaguardavam: (a) a Escritura é resultado de uma revelação evolutiva,

que vai se aperfeiçoando até atingir sua plenitude na palavra de Jesus Cristo (Gl 1:8; Hb 1: 2);

(b) a inerrância bíblica não deve ser entendida em termos absolutos, pois ela diz respeito

apenas ao aspecto salvífico do texto.

Contudo, neste novo contexto teológico, que marca o nascimento da teologia das religiões,

não se pode mais contar com esta salvaguarda. Neste caso não são alguns elementos da Escritura

que são colocados em questão, mas ela em sua totalidade. Neste ambiente a Bíblia deixa de ser um

texto sagrado, revelado e definitivo, e que pretende dar acesso ao absoluto; passando a ser, num

degrau mais abaixo, apenas um escrito “espiritual”, contingente e perspectivo. A revelação perde

o conceito duro de manifestação de verdades proposicionais e em seu lugar se lhes pespega uma

ideia fluida e secularizada: “a revelação ocorre quando

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de sua mensagem, apresenta seu livro sagrado como mera fonte de espiritualidade, não lhe

cabendo nenhum privilégio epistemológico ou teológico.

Este esvaziamento do conteúdo específico do Cristianismo surge como uma mudança

estrutural, um novo paradigma ecumênico 391, que nasce e cresce à sombra do diálogo inter-

religioso392. O que por si só não é negativo, senão pelo modo como este diálogo pode

decorrer. Por exemplo, que, no afã de apagar um sentimento de culpa por um passado de

violência simbólica e cumplicidade com a injustiça social do mundo393, e na tentativa de

conquistar as graças de um mundo pluricultural no presente, o Cristianismo pratique o puro e

simples descarte ou a relativização de seus conceitos teológicos fundamentais, tais como

revelação, pecado, inspiração e salvação, transformando-os em metáforas piedosas, por

exemplo, a afirmação de que Jesus Cristo encarnou simbolicamente. Ou, que Deus interveio

simbolicamente na história de Israel, quando estava sob o jugo da servidão no Egito.

Evidentemente, negar a fatuidade destes eventos é ingressar numa fé que já não é cristã 394.

391 H. Küng. Christianity. The religious situation of our time (London: SCM Press, 1995). 392 Depois da formação do Concílio Mundial de Igrejas em 1948, órgão inter-denominacional criado para fomentar

o diálogo entre os Cristãos, e do Concílio Vaticano II, convocado pelo papa João XXIII para oficializa r aquilo que

muitos teólogos católicos já estavam fazendo, o Ecumenismo transbordou do ambiente cristão rumo a todas as formas

de religiosidade da Terra, para abraçá-las como coirmãs. Na declaração conciliar Nostra aetate de 28 Outubro de 1965,

pela primeira vez em sua história, a igreja católica reconheceu solenemente que as religiões não cristãs produzem raios

da verdade que iluminam todos os homens e exortam a seus fieis a dialogar e colaborar com elas, “para

reconhecimento, preservação, e para fazer progredir os valores espirituais, morais e socioculturais de que são

portadoras”. E para que isto não ficasse como letra morta, dois decênios depois, o papa João Paulo II convidou os

chefes das principais religiões do mundo para um encontro em Assis, na Itália. O lugar escolhido tem um sentido

simbólico. Sendo a cidade de nascimento de S. Francisco de Assis, significa que a Igreja Católica abandona sua

soberba espiritual e a dota uma atitude mais humilde em relação às outras religiões. 393 David Bosch. Missão transformadora. Mudança de paradigma na teologia da missão (São Leopoldo: Sinodal, 2002), p. 20.

394 “Muitos estudantes da História das religiões destacam três principais correntes, pelas quais tais desenvolvimentos tomam lugar. Uma delas é a corrente semítica, que começa com a crença hebraica num Deus

tribal que liberta da opressão, e desenvolve uma tradição profética de julgamento da injustiça de libertação

rumo a uma verdadeiramente justa e compassiva sociedade. Nesta corrente, a ideia de Deus como uma

autoridade moral e transformadora da história torna-se a dominante imagem da Bíblia hebraica. O ideal da

humanidade é visto o estabelecimento de uma sociedade de justice e misericórdia, onde os indivíduos podem

complementar suas distintivas personalidades relacionando-se uns com outros. A corrente Indiana desenvolve

um caminho diferente, de rituais sacrificais a deuses e espíritos da natureza e daí a uma suprema realidade de

sabedoria e

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Do outro lado da arena, entretanto, esta não é a opinião de R. Panikkar, cuja análise

prefere ver uma mudança paradigmática 395, pela qual contemporaneamente há o abandono do

paradigma doutrinário (o Cristianismo), do mesmo modo como no passado foi superado o

paradigma político-religioso (a Cristandade). O novo paradigma atualmente em formação é a

espiritualidade, denominado Cristiânia 396, mais a frente voltaremos à questão quando

estiverem em discussão as ideias de Panikkar.

Nesta ambiência relativista, em que se confunde tolerância com um relativismo

indiscriminado, as doutrinas religiosas são meras manifestações do humano com o sagrado,

revestidas de circunstâncias históricas, geográficas, econômicas e sociais, também diferentes.

Neste contexto, a pretensão das religiões ao absoluto deve ser entendida mais como intenção

do que como realização. Pensar nelas como realização é cometer o pecado da idolatria.

A questão da verdade é de fundamental importância para que sejam marcadas as

posições. O Exclusivismo atesta que só há uma fé verdadeira, as outras sendo, portanto,

falsas; o Inclusivismo liga-se à ideia de coroamento, ou seja, todas as religiões têm verdades,

mas apenas uma delas é a verdade completa e final: o Cristianismo; o Pluralismo sintético

ensina que todas as religiões possuem verdades parciais e imperfeitas e que devem, por

bem-aventurança que se diversifica num universo finito, unidade que só pode ser imaginada pela mente s e

retirados os sentidos. Nesta corrente a ideia de Brahmam como a mais íntima realidade das coisas, a ser

conhecida pela renúncia da ação e do desejo, torna- se a imagem dominante dos Upanishads. O universo está sob

a influência da lei do karma, e o objetivo dominante da religião é obter a libertação desta lei do karma, não

retornando a renascer neste mundo. A corrente oriental, na qual Budismo, Taoísmo e Confucionismo interagem,

desenvolveu-se de formas de animismo para a ideia de uma ordem cósmica, um caminho de equilíbrio e

harmonia, seguindo os quais atinge-se a estabilidade e a calma da mente, e paz e correta ordem social. Nesta

corrente há pouca ênfase no ser absoluto ou Deus. A ênfase é colocada em viver em meio a um fluxo sem fim de

seres, sem se fixar em nenhum deles, mas com cuidado e compaixão por todos os seres sofredores. O objetivo é

abandonar qualquer ideia de ego, de dualidade objeto-sujeito, e experimentar o vibrante fluxo do ser, além da

paixão e do apego.” (Keith Ward. God, faith and the new millennium. Christian belief in an age of science -

Oxford: One World Publications, 2002, pp. 153 e 154). 395

Sobre esta questão da mudança paradigmática vide Márcio Fabri dos Anjos (org.). Teologia e novos paradigmas (São Paulo: Soter/Loyola, 1996). 396

“Cristiania, dimensione nascosta del Cristianesimo ” (Micromega, 2, 2001), p. 274.

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conseguinte, buscar o diálogo umas com as outras para se aperfeiçoarem, ampliando sua base espiritual 397:

“[o diálogo inter-religioso] é uma peregrinação comum rumo à verdade, cada um dentro de sua respectiva tradição, compartilhando o caminho com o outro, quanto

àquilo que tem chegado a entender para responder a esta verdade” 398

.

Com o conceito de verdade provisória, verdades relativas que surgem como resposta à

verdade absoluta divina, os pluralistas pretendem escapar à acusação de sucumbirem ao

raciocínio tertium non datur (o terceiro excluído), que é a base da conclusão de A. Race, por

exemplo: “se todas as religiões são igualmente verdadeiras, todas são igualmente falsas.” 399.

Para estes pluralistas de última geração, portanto, o que as religiões pretendem oferecer não é

um acesso exclusivo ao absoluto, mas apenas um caminho, um absoluto – relativo, em que o

objeto é absoluto, mas os meios para atingi-lo são relativos, pelo que, nunca pode ser

plenamente atingido. Usando uma linguagem jaspersiana, as religiões são apenas cifras do

absoluto400. Há uma farta fundamentação filosófica para a realização desta operação. Tanto no

Ocidente – como já vimos ser o caso de Kant, quanto no Oriente – especialmente as filosofias

hindus.

(C) O esvaziamento dos conceitos teológicos duros mencionados (salvação, pecado,

revelação) tem como corolário o esvaziamento das instituições que se pretendem suas

mediadoras. Assim, ao repúdio antigo e iluminista à religião, motivado pelas guerras

religiosas que varreram a Europa no século XVII, junta-se na contemporaneidade um outro,

que não é mais antirreligioso, mas plurirreligioso. Ou seja, o ambiente pós-moderno não

propõe mais a substituição da religião por ideologias políticas quase religiosas (Comunismo,

Nazismo), como no tempo da modernidade; pelo contrário, considera as religiões um Bem e

397 Galvin D’Costa. “The impossibility of a pluralist view of religions” (RS, June – 1996), pp. 223-226.

398 Nicholas Lossky (et.al.). Dictionary of the Ecumenical Movement (Geneva/Grand Rapids: WCC Publications/William B. Eerdmans Publishing Company, 1991), p. 285.

399 A. Race. Christians and religious pluralism, p. 78.

400 Karl Jaspers. La fe filosófica ante la revelación (Madrid: Gredos, 1968).

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pluralistas sintéticas em três grupos: (a) cristologia mitológica ou metafórica de J. Hick, (b) as

cristologias logocêntricas de P. Knitter, C. Geffré dos teólogos asiáticos R. Panikkar, M.

Amaladoss (c) as cristologias basilocêntricas (têm como centro o reino de Deus) de H. Küng e

S. Samartha. Separamos Stanley Samartha do grupo de teólogos asiáticos, dentro do qual

geralmente é classificado. Justificamo-lo porque a cristologia de Samartha rejeita a o conceito

do Logos joânico e é constituído exclusivamente com base nos Sinóticos, o que,

metodologicamente, torna-o muito mais próximo de Küng do que dos outros teólogos asiáticos.

4.c.1. John Hick

John H. Hick é um dos pluralistas mais polêmicos destacados. Inglês de nascimento,

eclesiástico ligado à igreja presbiteriana, Hick não é propriamente um teólogo, antes um

filósofo da religião 402. Com passagem em pelo menos meia dúzia de universidades importantes do

velho e do novo mundo de fala inglesa, tem contribuições nas áreas de teodiceia, epistemologia,

filosofia da religião e diálogo inter-religioso. É escritor profícuo que pôs sua assinatura em

numerosas e importantes obras sobre o tema em discussão, o que o tem colocado nas últimas

décadas no pluralismo como figura de proa, prova disto foi a coedição com P. Knitter de uma obra

que reuniu artigos de alguns dos pluralistas mais destacados do mundo, O mito da peculiaridade

cristã 403.

O percurso da reflexão de J. Hick começa com o problema cristológico. Para ele o

primeiro grande obstáculo para um diálogo inter-religioso é efetivamente a exclusividade e a

singularidade da mediação crística entre Deus e os homens. Como outros pluralistas, entende

ser necessário abandonar a doutrina do papel central de Jesus na salvação da humanidade:

402 Cf. C. Gillis. “Radical Christologies? An analysis of the Christologies of John Hick and Paul Knitter”. In T. Merrigan e J. Haers (edt.). The myriad Christ (Leuven: Leuven University Press, 2000.

403 The myth of Christian uniqueness, op. cit..

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Se Jesus foi literalmente o Deus encarnado, e se é somente através de sua morte que

os homens podem ser salvos, e se somente pela resposta a ele é que eles podem se apropriar desta salvação, então o único caminho para a vida eterna é a fé cristã. O

que se segue deste fato é que a grande maioria da raça humana não tem sido salva. Mas é crível que o Deus de amor e Pai de todos os homens, desse modo houvesse decretado que somente os que tivessem nascido dentro de uma particular história humana devessem ser salvos? Não é esta uma ideia excessivamente paroquial, apresentar Deus, com efeito, como uma deidade tribal do Ocidente

predominantemente cristão? 404

Foi em 1973 que Hick começou seu percurso rumo a um pluralismo amplo com sua

obra, Deus e o universo das religiões 405, escrita em 1973. Nela pretende retirar de Jesus o

protagonismo salvífico e entregá-lo a Deus. A operação é chamada “revolução copernicana”

na teologia, isto é, a necessária renúncia ao dogma de que o Cristianismo é o centro religioso

do mundo406, e de que detém o monopólio da verdade salvadora e da vida eterna. E ainda mais

que isto, deve nos levar a abandonar até mesmo a perspectiva ‘inclusivista’, descartando

também qualquer necessidade de uma participação do ministério salvífico de Jesus para a

validação das religiões não cristãs. As religiões salvam por si mesmas e não em virtude da

atuação mística de Jesus nelas, como ensinam as declarações do Concílio Vaticano II.

O “giro copernicano” a que se refere Hick foi tomado de empréstimo da astronomia. É uma

metáfora que antes já havia sido aplicada à guinada kantiana em tirar o interesse da filosofia do

objeto e trazê-lo para o sujeito. Por ela Hick compara sua missão na teologia em transferir o eixo

central de Jesus para Deus com a realização de Copérnico em demonstrar que o centro do sistema

solar não era a terra, mas o sol. “Temos que compreender”, diz Hick, “que o universo religioso

está centrado em Deus, não no Cristianismo ou em outra religião. É Ele o

404 J. Hick. “Jesus and the world religions”. In J. HICK. The myth of God incarnate (London: SCM Press,

1977), p. 180.

405 J. Hick. God and the universe of religions (Oxford: One World, 1993).

406 Ibid, p. 131.

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como a justificação pela fé que nela se baseia, não existiu: “um perdão que deveria ser

efetivado pelo pleno pagamento de uma dívida moral, de fato não é perdão” (destaque nosso)

413 . Não é preciso ler a expressa declaração de Hick sobre a superfluidade da proclamação do

evangelho para concluir que suas ide ias o levariam a tal ponto414.

Mais tarde, numa obra escrita em 1990, Uma interpretação da religião415, Hick

responde a objeções dirigidas à insuficiente abertura de seu pluralismo, por achar-se ainda

estar preso ao conceito teísta de Deus, incompreensível para o Budismo Theravada e religiões

animistas e xamânicas, por exemplo. Para resolver o problema ele desenvolve o conceito de

Real, a realidade última sinônimo de sagrado. As grandes religiões do mundo têm formas

diferentes de dar corpo a este real, daí a grande diversidade religiosa existente. Cada qual dá

uma resposta diferente à mesma manifestação do sagrado: “o real revela-se à humanidade e a

humanidade responde-lhe por meio de uma forma histórica e culturalmente condicionada” 416.

Esta abordagem não é propriamente uma novidade. Outro neokantiano estudioso das

religiões, Ernst Troeltsch, o pai do relativismo histórico, já o havia proposto no século XIX.

Segundo esta concepção, o absoluto manifesta-se na história do mundo, contudo, todas estas

manifestações são históricas, isto é, estão condicionadas às estruturas socioculturais em que

aparecem, não podendo ser, por isso, universalizadas417.

A conclusão de Troeltsch e de Hick é que todas as religiões são verdadeiras, mas não

absolutamente verdadeiras; apenas sua intenção é verdadeira, ou seja, tentar traduzir este

413 J. Hick. Disputed questions in theology and philosophy of religions, p. 98.

414 J. Hick. “A philosophy of religious pluralism”. In R. J. Plantinga, (ed.), Christianity and the plurality, (Malden, MS: Blackwell Publishers Inc., 1999), p. 339.

415 J. Hick. An interpretation of religion. Human responses to the Transcendental (London: Palgrave Macmillan, 2004). 416 Ibid., p. 240.

417 Ernst Troeltsch. Christian Thought: its history and application (London: University of London Press, 1923),

p. 22.

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ponto de partida. Este descaso pelas fontes faz com que os leitores de Hick tenham a

impressão de se depararem com um filósofo da religião, não com um teólogo cristão.

O segundo problema é a aproximação funcional ao problema do diálogo inter-religioso,

ao qual se subsumem todas as razões, contrárias ou não. Seria legítimo simplesmente descartar

várias passagens da Escritura com a justificativa de serem mitos piedosos, só para não

obstarem o diálogo inter-religioso em termos paritários? Este tipo de abordagem, no entanto,

sequer do ponto de vista pragmático é positivo, pois acaba produzindo um efeito contrário ao

pretendido, por propor a permanência e dum resíduo religioso humanisticamente aceitável, sem

considerar com seriedade o que as religiões dizem sobre si mesmas. Ele promove a redução das

religiões a um formato específico – neste caso a filosofia crítica de Kant, que as distorce, e que

em fim de contas, torna-se tão violenta do ponto de vista simbólico, como o exclusivismo por

ele execrado.

O terceiro problema é a extrema dependência de Hick em relação à Kant. O ‘Real -

coisa em si’, sempre está além de todos os conceitos que possam ser criados para representá-

lo, estando ao alcance do conhecimento apenas o ‘Real - coisa como a podemos conhecer’,

toda a pretensão ao absoluto das religiões deve desaparecer. Em seu lugar restarão apenas

tentativas de alcançar este absoluto, a que todas as religiões se reportam. As diferenças entre

as religiões, portanto, são supérfluas e sendo a causa da desarmonia, devem ser abandonadas

em favor de uma práxis do amor e da compaixão. Quanto à questão da verdade, como

consequência da clivagem entre o Absoluto e o mundo humano, predomina “o conceito de

verdade mito lógica, que não tem adequação com a realidade, mas simplesmente

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humano de um grande outro com seu rosto423. E isto não é suficiente para fundamentar

nenhuma religião, qualquer que seja.

Na filosofia kantiana os argumentos pro a existência de Deus aparecem nas duas

primeiras críticas e em ambas são muito mais fracos do que o resto de sua argumentação. Na

Crítica da razão pura, Deus “é apenas a relação entre um ente em si totalmente desconhecido a

mim e a máxima unidade sistemática do universo [...] esquema do princípio regulador do maior

uso empírico possível de minha razão” 424, ou seja, é uma ideia que gera um pressuposto: é

natural à razão humana esta dilação. Na Crítica da razão prática, sua existência é provável e

até necessária do ponto vista de prático; do contrário, a ação moral não passaria de um

absurdo. Sem estes dois elementos: fé e felicidade, todo dever, ainda que auto imposto,

desumaniza o ser humano, tornando-o, em vez de autônomo, autômato 425. Em suma, na

primeira crítica Deus pode ser pensado, mas não pode ser conhecido; na segunda, Deus é

apenas “um postulado da razão”, ou seja, uma hipótese sem a qual a existência moral dos

homens careceria de fundamento. Numa e noutra obra, apenas um elemento essencial para

completar um sistema, uma hipótese de trabalho e não uma certeza fundante.

O resultado de toda este arrazoado sustentado por Hick não é um diálogo inter-religioso

mais eficaz, mas a destruição da religião, pela prática de uma espécie de agnosticismo:

O pluralismo de Hick emascara a defesa do deus liberal da modernidade, neste caso

por meio de uma forma de agnosticismo ético. Se os agnósticos éticos sugerissem

que a melhor maneira para lidar com os conflitos religiosos, é cada um torna-se um

ético agnóstico, não só falhariam em lidar com a pluralidade, mas também

falhariam em tomar a pluralidade a sério, ao dissolvê-la em configurações mítico-

instrumentais426

.

423 Ludwig Feuerbach. A essência do Cristianismo(Campinas, SP: Papirus. 1988).

424 Crítica da razão pura - do propósito último da dialética natural da razão pura (São Paulo: Nova Fronteira,

1999).

425 I. Kant. Os Progressos da Metafísica (Lisboa: Edições 70, 2000); Cf. também Kant. Crítica da razão prática (São Paulo: Vitório Civita, 1982) - Dialética da razão prática na determinação do sumo bem, livro V.

426 Galvin D’Costa. The meeting of religions and the Trinity (Maryknoll, NY: Orbis Books, 2000), p. 26.

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À semelhança de J. Hick, a principal preocupação teórica de P. Knitter é o diálogo inter-

religioso e a ele devem submeter-se todas as doutrinas cristãs, inclusive a singularidade e

exclusividade de Jesus, sua mensagem e seu papel salvífico428. Porém, diferentemente de

Hick, esta priorização do diálogo em detrimento das declarações cristológicas exclusivistas

não se faz a partir de bases completamente empírica s, mas também textuais, embora sejam

sempre evitados textos que põe em risco a hermenêutica pluralista:

Para evitar o imperialismo político, cultural e religioso nas chamadas terras de

missão, Knitter indica qual deveria ser a função da teologia: da mesma forma que os

teólogos se referem às primeiras noções de Iahweh como uma “divindade tribal” –

posteriormente “purificada” pelos profetas Judeus – a tarefa atual da teologia

consiste em passar, através da revisão cristológica, de uma “cristologia tribal” a uma

cristologia universal que permita aos cristãos verem a obra de Cristo em todo lugar

sem assumir que possuam o monopólio do que o Ministério lhes revelou de um

modo único429

.

No contexto desta revisão cristológica, Jesus “não é a verdade total, definitiva e

insuperável de Deus, mas traz uma mensagem universal, decisiva e indispensável” 431. Knitter

faz uma longa defesa destes novos conceitos, compostos para fundar uma nova confissão de

fé relativamente a Jesus. Quanto à primeira afirmação ele argumenta de que Jesus é

totalmente Deus, mas Deus não é totalmente Jesus431. Ou seja, o Jesus histórico não esgota a

divindade nem o poderia. Deus se manifesta de outras formas em outras comunidades

humanas.

Os cristãos não podem simplesmente anunciar que Jesus é a plenitude da Palavra ou

da Divindade, e deixá-lo assim. Essas afirmações devem ser qualificadas para reconhecer e afirmar tanto a universalidade como a incompreensibilidade do Divino.

Acho que semelhante “afirmação – com – qualificação” se expressa na distinção utilizada comumente: cristãos podem e devem proclam ar que Jesus é totus Deus–

totalmente divino, mas eles não podem afirmar que J esus é totum Dei – a totalidade

do Divino432

.

428 As declarações tradicionais cristãs sobre Jesus co mo final, completo e insuperável, é, para dizer o menos,

uma ameaça ao diálogo, e é contrário ao imperativo moral, que exige a cooperação entre as religiões. Qualq uer

coisa que torne o diálogo problemático é ele mesmo um problema e deve ser descartado. P. Knitter citado por

G. D’Costa. The meeting of religion and the Trinity, p. 37.

429 Albert Moliner. “A cristologia relacional” (Ciberteologia, ano V, no. 24), p. 28.

430 P. Knitter. Jesus and the other names. Christian mission and global responsibility (Maryknoll, NY: Orbis Books, 1996), p. 79.

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A base escriturística desta afirmação é a teologia do Logos, que Knitter compartilha

com outros teólogos pluralistas, todos não muito fieis às fontes. Com efeito, o que João 1: 1

diz é que Jesus pré-existe à sua manifestação carnal e que é Deus com o Pai, desde o

princípio. Contra isto pode-se argumentar que uma teologia da palavra, responsável pela

conexão do Logos joanino com a sabedoria (hokmah) do livro de Provérbios ou com a palavra

(memra) dos Targumim é bastante especulativa, não havendo elementos textuais ou

extratextuais que o atestem 433. O texto silencia também sobre a extrapolação do Logos em

relação ao Jesus histórico, com manifestação em outras figuras históricas e religiosas, e quem

o afirma faz uma ilação sem base exegética, seja de João ou de qualquer outro lugar nas

Escrituras. O que o quarto evangelho afirma é que o verbo se fez carne e habitou entre nós e

não que o espírito do Logos tivesse encarnado no menino Jesus. Esta compreensão da

encarnação fere a boa hermenêutica por fazer uma transposição indevida da história sagrada

das margens do Jordão para as ribanceiras do Ganges, dando origem a um Neodocetismo.

Outro câmbio terminológico sugerido por Knitter é a substituição de “definitivo” por

“decisivo”. Para ele “definitivo” é uma afirmação idolátrica 434, já que o humano jamais

poderá conter o divino, o que se supõe ocorresse caso Jesus fosse revelação definitiva de

Deus. Esta objeção é comum à grande maioria dos pluralistas, e baseia-se na rejeição do

conceito encarnacional tradicional defendido pelos concílios, pelo qual se entende Jesus

Cristo como Deus e homem simultaneamente. Deve-se a argumentação a uma secularização

das Escrituras e a uma negação iluminista daquilo que não existe em nosso cotidiano. Em

suma, Jesus pode ter sido um homem excepcional, mas que ainda assim permaneceu sendo

um ser humano, não podendo, portanto, ser a revelação definitiva de Deus.

433 K. Armstrong, Uma história de Deus , p. 125.

434 Ibid., p. 74.

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Portanto, levando em conta as fontes, a revelação definitiva de Jesus não é idolátrica por

três motivos: (a) Esta revelação não foi dada por um mero ser humano – Hb 1: 1-2: “Havendo

Deus antigamente falado muitas vezes, e de muitas maneiras , aos pais, pelos profetas, nestes

últimos dias a nós nos falou pelo Filho, a quem constituiu herdeiro de todas as coisas, e por

quem fez também o mundo”; (b) toda revelação ocorre no contexto da economia da salvação,

por isso ela se destina apenas a indicar o caminho aos seres humanos, não tendo a pretensão

esgotar a riqueza infinita da divindade; (c) o próprio Jesus histórico, a quem Knitter se refere,

tinha como mensagem principal a vinda do reino de Deus que não é deste mundo.

E por último, sobre a sugestão de Knitter, de cambiar “insuperável” por “indispensável”,

de novo a noção de ídolo é utilizada. Ele evoca a promessa do Espírito Santo (Parácletos)

como indicio de que o canal revelacional ao mundo se mantém aberto 435, mas Jesus restringiu

a plenitude do dom do Espírito à Igreja Cristã, embora não tenha o tenha interditado a outros

povos. Em suma, a promessa do Espírito é dada primariamente à igreja e secundariamente às

religiões, de sorte que a inversão desta ênfase é biblicamente indevida.

Para encerrar sua argumentação cristológica, ele toma de empréstimo as reflexões dos

teólogos da libertação com o objetivo de evitar a redução do reino de Deus à aparição de Jesus

na Palestina. O reino de Deus permanece como promessa latente orientando a caminhada da

Igreja rumo aos confins da terra, não para impor sua confissão, mas para compartilhá-la com

as outras crenças. Pois a relevância do evangelho não se perdeu nem sua normatividade,

apenas não é a única mensagem a ser proclamada nem a única normatividade a ser aplicada. A

boa nova dos evangelhos define Deus, mas não o confina436. Há outras definições de Deus que

435 P. Knitter. Jesus and the other names, p. 75.

436 P. Knitter. Jesus and the other names, p. 77.

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são necessárias para que se mantenha a infinitude das riquezas da divindade e a melhor

imagem de Deus é a que leva todas estas definições em conta.

Em uma de suas últimas obras, Uma Terra, muitas religiões 437, Knitter procura responder

àqueles que o chamavam de relativista, criando um princípio normativo. Nesta obra ele reconstrói

alguns conceitos básicos do Cristianismo, como por exemplo, salvação. Para ele “soteria [...]

deve definir amplamente o bem-estar eco-humano” 438. E religião neste quadro pode variar,

mas todas concordam com a necessidade de buscar o bem-estar da comunidade humana a

saúde ecológica da terra439. Se houver alguma exceção a esta regra, deve-se negar a

legitimidade religiosa a esta exceção. Também será impossível um diálogo inter-religioso

entre uma religião que busque ser uma agência de salvação e uma outra que não o faça. Este

então passa a ser o critério definidor dos parceiros no diálogo e a pedra de toque que confere

autenticidade às religiões 440. Este critério, porém, ao fim e ao cabo, transforma-o em teólogo

das religiões inclusivista, pois as religiões ditas proféticas serão favorecidas por ele e as

chamadas místicas ou devocionais serão desfavorecidas, o Hinduísmo seria uma delas441.

Resumindo nossas impressões sobre as ideias de P. Knitter podemos dizer que sua

evolução teológica na verdade parece-se mais com o tatear cego de alguém que busca

construir um caminho novo, mas encontra-se perdido por onde quer que ande. Propôs a si

mesmo uma missão titânica que é a de incluir todas as religiões – inclusive o Cristianismo –

num projeto humanístico universal, contudo, não tem um ponto de partida religioso bem

definido. No inicio de sua evolução, seu pluralismo adota uma teologia soteriocêntrica e

logocêntrica afeita ao conceito de avatar do Hinduísmo. No meio, advoga uma teologia das

religiões ecolibertadora que supostamente livraria o Cristianismo da pecha de religião do

437 P. Knitter. One earth, many religions (Maryknoll, NY: Orbis Books, 1995).

438 P. Knitter. One earth, many religions, p. 58.

439 Ibid., p. 98.

440 James Frederiks. Faith among faiths. Christian Theology and non-Christianity religions (New Jersey: Paulist Press, 1999), p. 132.

441 James Fredericks. Faith among faiths, p. 133.

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opressor. No Ocidente até que isto tem pertinência, porém, se estamos no Oriente, Médio ou

Próximo, então as coisas se invertem, pois a religião cristã é a minoria oprimida. O conceito

de reino de Deus que ele utiliza em sua última fase é uma tentativa de aproximação em

relação às religiões proféticas. No entanto, ainda que estas ideias sejam entendidas como

complementares, seus argumentos carecem de sistematicidade e por isso parecem ser usados

ad hoc, estando aí apenas para sustentar uma argumentação pro diálogo inter-religioso.

4.c.3. Claude Geffré

Claude Geffré nasceu em Niort (Deux-Sèvre) na França. Dominicano, em Saulchoir

completou seu noviciado e estudos teológicos preliminares, vindo a doutorar-se em Roma em

1957. Como professor, Geffré passou por inúmeras faculdades teológicas, chegando ao ápice

da carreira em 1990 na Escola Bíblica e Arqueológica de Jerusalém, da qual foi o diretor.

Porém, seus escritos e palestras fizeram-no sofrer algumas sanções eclesiásticas que o

impediram de receber distinções acadêmicas oferecidas por instituições católicas de ensino.

Por exemplo, um doutorado honoris causa oferecido pela Faculdade de Teologia de Kinshasa

e cuja cerimônia acabou não ocorrendo por um veto da congregação para a doutrina da fé,

provavelmente motivado pela publicação de seu último livro, De Babel à Pentecôte, o qual

em suas primeiras páginas já recomenda uma revisão da teologia católica tradicional:

Neste início do século XXI, a teologia deve-se confrontar com um novo desafio,

este do pluralismo religioso. E, além disso, não se trata apenas de agregar um novo

capítulo ao edifício solidamente construído da teologia clássica. Trata-se de realizar uma reinterpretação da fé que entranha os lugares mais importantes no interior dos

capítulos fundamentais de uma dogmática cristã 442

.

442

C. Geffré.De Babel à Pentecôte. Essais de théologie interreli gieuse (Paris : Du Cerf, 2006), p. 28.

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Diferindo de outros pensadores que tendem a transformar religião cristã numa

lealdade a uma abstratação, o Logos, Geffré está reconhece a importância do Jesus histórico

para a teologia: sem a manifestação concreta de Jesus na Palestina do primeiro século não

há conhecimento de Deus. “Só podemos conhecer o Deus de Jesus a partir da

particularidade da história de Jesus” 449. Por outro lado, também não entende a encarnação

como poesia ou metáfora piedosa. O verbo é realmente o Deus encarnado. Contudo, o Jesus

histórico não esgota como “absoluto concreto” toda a riqueza da manifestação divina:

Depois da idade apostólica, a Igreja confessou Jesus como Filho de Deus. Mas uma

teologia prudente deve se guardar de identificar o elemento crístico contingente de

Jesus a seu elemento crístico divino. A manifestação do absoluto de Deus na

particularidade histórica de Jesus de Nazaré nos ajuda a compreender que a

unicidade de Cristo não é exclusiva em relação a outras manifestações de Deus na

história. Há uma identificação de Deus com Jesus, segundo a forte expressão da

epístola aos Colossenses (2: 6): “a plenitude da divindade habita nele

corporalmente”. Porém, esta identificação nos reenvia ela mesma ao mistério

inacessível de Deus que escapa a toda identificação . O Cristianismo não é, portanto,

não exclui as outras tradições religiosas que de outra forma identificam a realidade

última do universo 450

.

Geffré também adverte o leitor quanto ao perigo de o Jesus histórico tornar-se um ídolo, ao se pensar nele como limite e continente do divino 451. Jesus é ícone, é sinal, é horizonte

humano pelo qual se pode vislumbrar o divino, mas assim como o céu não cabe no horizonte,

o Logos não se esgota em Jesus. Nossa limitação não é só ontológica, mas também histórica,

em face às circunstâncias históricas e geográficas em que todos os humanos estão envolvidos.

Ou seja, a revelação de Deus em Jesus é completa e definitiva, mas sua compreensão plena

nos remete ao ministério do Espírito, que para Geffré é uma promessa para toda a humanidade

e não só para a Igreja 452.

449 C. Geffré. “O sentido e o não sentido de uma teologia não-metafísica” (Concilium, no. 6, 1972), p. 790. 450 C. Geffré. “La théologie des religions ou le salutd’une humanité plurielle (RP 2001/4), p. 117.

451 Idem. Crer e interpretar. A virada hermenêutica da teologia (Petrópolis: Vozes, 2004), pp. 164-165.

452 C. Geffré. “La verdad del Cristianismo en la era del pluralismo religioso” (ST, v. 37, no. 146, 1998), p. 138.

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compartilhar verdades, para tornar-se melhor e conhecer-se melhor, à medida que

conhecemos melhor a salvação divina também agindo nas outras religiões.

4.c.4. Raimon Panikkar

Raimon Panikkar foi um religioso católico romano, filho de mãe espanhola, católica, e de

pai indiano e hindu. Graduado em Filosofia, Química e Teologia e doutor nas três áreas (1946,

1958 e 1961, respectivamente), foi também um profundo conhecedor da filosofia e religião

hindu e budista, o que o qualificou à tentativa de realizar uma grande síntese do pensamento

religioso contemporâneo, aproximando três religiões mundiais: o Cristianismo, o Hinduísmo e o

Budismo. Seu projeto não é um expediente meramente teórico, mas algo que tem relação com

sua experiência inter-religiosa, obtida por nascimento e educação 456. Atuou na docência nas

mais importantes instituições de ensino do mundo (Harvard, Universidade da Califórnia), tendo

se notabilizado na metafísica, hermenêutica, filosofia, diálogo inter-religioso, ciências e

educação457. Escritor profícuo e solicitado pelas mais renomadas editoras do mundo, tem sua

assinatura em mais de 40 obras, além de centenas de artigos, sendo a mais importante delas

456 “Tem havido um companheiro de viagens em minhas jor nadas para as diferentes terras dos homens. Os filhos

de meu tempo e ambiente, / pensamento/souberam bem quem era o companheiro em minhas visões intelectuais e

espirituais de mais de meio século atrás. Ocorreu,porém, um momento crítico quando eu atingi meu lar ancestral

no ápice de minha vida: meus passos para a cidade da paz, para procurar e talvez encontrar meu companheiro

outra vez, eu prossegui sozinho, para o campo de batalha perpassado de guerras fratricidas. Chocado e

envenenado eu me recusei a permanecer lutando contra qualquer dos partidos... Eu permaneci um consciente

opositor, rejeitado por ambos... Arriscando minha vida ao oferecer meus serviços a todos sem aceitar s uas

respectivas dialéticas, eu me encontrei de repente no mundo do tempo. E daí me veio a sacralidade de tudo,

mesmo do secular, raiando sobre mim. Assim, eu estou na confluência (sangam) de quatro rios: as tradições

Hindu, Cristão, Budista e Secular.” (Raimon Panikkar. The unknown Christ of Hinduism, p. 23) 457 Camilia G. MacPherson. A critical reading of the development of Raimon Panikkar’s thought on the Trinity

(Lanham, Ml: University Press of America, 1996), p. 2.

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vivemos sob a égide de uma mudança paradigmática, segundo a qual nossa forma de pensar

mais profunda está sofrendo transformações irreversíveis.

A base desta ideia está fundada no conceito de Thomas Kuhn 461, filósofo da ciência, que

demonstrou que a objetividade científica é um mito. A ciência não evolui por alguma

qualidade intrínseca, mas porque certas teorias se tornam insustentáveis em face à realidade

que as contraria reiteradamente, tornando necessária a quebra de paradigmas. Nos longos

períodos em que a ciência permanece estacionada por seu próprio dogmatismo as questões

institucionais pesam mais do que o suposto amor ao conhecimento e à verdade dos cientistas,

de modo que elementos sociológicos também são levados em conta no processo de validação

das descobertas científicas.

Esta, no entanto, não é a parte da tese de Kuhn que interessa aos teólogos citados,

definida por ele como “ciência normal”. O que lhes interessa são os momentos de crise em

que as anomalias não se encaixam no sistema corrente, obrigando à ciência a adoção de um

novo sistema462. Para alguns teólogos (H. Küng e J. Dupuis) as anomalias que impedem a

manutenção do paradigma religioso anterior são: (a) a decadência ou refluxo do Cristianismo,

causado pelo secularismo, e (b) eflorescência das outras religiões mundiais. Estes eventos

produziram furos naqueles sistemas teológicos pré Vaticano II e obrigaram a teologia a olhar

para o mundo como uma realidade multirreligiosa. Para Panikkar, assim como para P.

Knitter, além destes problemas, deve-se colocar uma nota enfática nos problemas ambientais

e na nova percepção holística planetária.

461 The structure of scientific revolutions (Chicago: University of Chicago Press, 1970).

462 Usando a metáfora da construção civil, paradigmas são as estruturas dos prédios que servem de suporte e ao mesmo tempo de modelo no qual cada tijolo, janela, porta devem ser encaixados, definidos pelo mesmo modelo, o lugar de cada um. Os paradigmas são estruturas construídas para receber objetos ainda desconhecidos, porque a

ciência não pode trabalhar com o caótico, por isso estes modelos são chamados de teorias. Momentos d e crise

paradigmática ocorrem quando existem objetos, informações do mundo factual, que não se encaixam na estrutura

teórica previamente construída: anomalias . Quando isto ocorre é necessário a substituição do paradigma, ou do

modelo, em sua totalidade.

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Como vimos páginas acima, Panikkar compreende a história da religião cristã por

meio de três paradigmas sucessivos: A cristandade, marcada pela unidade político e

sociocultural da Idade Média; o Cristianismo, caracterizado pela uniformidade doutrinal na

Idade Moderna e Contemporânea; e a Cristiânia, assinalada por uma solidariedade espiritual

cósmica, que caracteriza os tempos pós-modernos:

Com o nome de Cristiânia quero representar uma nova consciência crística. A novidade é mais que tudo sociológica e consiste na passagem de uma consciência mística interior, reservada a poucos à sua manifestação na vida de cada dia (secularidade). [...] Trata-se de uma mudança eclesial na mesma autocompreensão cristã, um salto na história do Ser mediante um novo grau de consciência no homem e por isso uma mudança em sua própria natureza, cuja essência é a autocompreensão. Cristiânia se constituiria na contribuição cristã a esta mudança

cósmica na aventura do universo, na qual todos nós estamos implicados463

.

A contribuição do Cristianismo de que fala a citação pode ser, por exemplo, uma visão

trinitária da realidade religiosa, chamada cosmoteândrica, em sua dimensão ontológica: “a

totalidade da realidade poderia ser chamada usando uma linguagem cristã, Pai, Filho e

Espírito Santo” 464. Na dimensão religiosa a estrutura ecumênico-trinitária estaria dividida nos

modos como Deus é adorado, que ele aprendeu com a tradição hindu, os quais consistem em

três tipos de espiritualidade, cada uma delas correspondendo a uma das pessoas da Trindade,

Pai, Filho e Espírito Santo, respectivamente: Jnana-mag, a espiritualidade do silêncio, da

consciência e da meditação; Bhakti-mag, a espiritualidade da devoção; e Karma-mag, a

espiritualidade das ações cúlticas ou rituais 465. No diálogo inter-religioso também existe uma

estrutura trinitária, subjacente às espiritualidades: “o silêncio do Pai, expresso no Budismo; o

Logos encontrado no Judaísmo, Islamismo e Cristianismo; e a diversidade dos movimentos do

Espírito presente nas múltiplas formas de Hinduísmo 466”.

463 R. Panikkar. “Cristiania, dimensione nascosta del Cristianesimo”, p. 278.

464 R. Panikkar. “A christophany for our time” ( TD, Spring, 1992), p. 37.

465 Apud Francis X. D’Sa. “How Trinitarian is Panikkar’s Tri nity (CR, no. 3, supplement), p. 38.

466 Ilia Delio. Christ in evolution (New Delhi: Logos Press, 2010), p. 140.

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Na formulação cosmoteândrica ou teantropocósmica 467, a unidade da realidade é vista

pelo prisma cristológico, sendo Cristo o símbolo de uma unidade, dividida em três elementos

inseparáveis, mas distinguíveis: o cosmo, o homem e Deus, perceptíveis por três faculdades

humanas, respectivamente, sentido, mente e consciência468, que por sua vez também são

inseparáveis: a realidade em sua relação469.

A intenção de Panikkar é claramente uma síntese teológica das religiões mundiais

(Catolicismo, Hinduísmo e Budismo) e dos irreligiosos secularizados. Alguns teólogos

mostram-se, porém, céticos a ela por causa das liberdades hermenêuticas de Panikkar 470.

Faltam-lhe bases mais sólidas na argumentação teológica. Além do método alegórico da

Patrística grega, aplicado de forma mais ampla do que ousaram seus criadores, não há nada

mais para aplicar conceitos cristãos à experiências religiosas não cristãs.

Por exemplo, na relação entre o Pai e a conscientização ou Jnana-mag, seria mais

correto substituir a palavra Pai por Brahman 471 e conscientização por Ioga 472, pois o deus que é

perceptível por meio da meditação não é o Deus bíblico, que ouve, comunica-se e atua, mas

apenas a condição de possibilidade da realidade, ou ainda, o poder que tudo mantém, no qual

467

Haveria muito que esclarecer sobre este conceito de Panikkar e seu aparente monismo inspirado, na filosofia

hindu (advaita) que rejeita a tricotomia cartesiana homem, Deus e mundo. Vamos deixar este capítulo de lado. O autor nos adverte, contudo, trata-se de uma intuição mística e não analítica. Ou seja, não é uma rubrica subscrita ao capítulo da ontologia filosófica, desde que não está pensada em relação à epistemologia, mas à teologia e à mística. Contudo, em outro lugar vem afirmado que são “três dimensões do real” (R. Panikkar. Entre Dieu et le cosmes. Entretiens avec Gwendoline Jarczyk – Paris: Albin Michel, 1998, p. 135). 468 Muitos intérpretes têm apontado para a natureza excessivamente esquemática dessas ideias, em que, por exemplo, o número três acaba servindo de pretexto para estas aproximações do Cristianismo e as outras religiões, ou melhor dizendo, atitudes em relação a o Real, ou seja, baseado em dados materiais bem irrisórios. A exemplo do artigo já citado de Francis X. D’SA. “How trinitarian is Panikkar’s Trinity”, p. 40.

469 R. Panikkar. The rhythm of being. The Glifford Lectures (New York: Orbis Books, 2010), p. 183.

470 Rudolf von Sinner. Confiança e convivência: reflexões éticas e ecumênicas (São Leopoldo RS: Sinodal, 2007), p. 102.

471 “O mundo inteiro era visto como atividade divina brotando do misterioso Brahman, o significado oculto de

toda a existência. Os Upanishads estimulavam as pessoas a cultivar o senso de Brahman em todas as coisas. Era

um processo de revelação no sentido literal da palavra: um desvelar da base sagrada de todo ser, tudo o que

acontecia constituía numa manifestação do Brahman: o verdadeiro discernimento estava na percepção da

unidade existente por trás dos fenômenos”. (Karen Armstrong. Uma história de Deus, p. 46).

472 “As técnicas da yoga levam os adeptos a conscientização da existência de um mundo interior, que éAtman, princípio eterno um com o Brahman”. (Karen Armstrong. Uma história de Deus , p. 47).

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187

sacramentos e, em última instância, por meio do mistério ativo no interior das duas

religiões 476

.

Prosseguindo em sua argumentação Panikkar aproxima o conceito cristão do Logos do

conceito vedanta do Ishvara. Há alguns pontos de contato: o Ishvara é o revelador de

Brahman, o deus originador de todas as coisas. E este é a origem não originada de tudo, o

princípio criador e unificador de tudo o que existe e o que não existe. Mas, é um deus

impessoal, muito parecido com o primeiro motor imóvel de Aristóteles. Ato puro e por isso,

por não haver nele movimento, desde que nele não há o trânsito entre potência e ato, é um

deus inerte, incapaz de se ocupar de outra coisa a não ser de si mesmo. Brahman é o “abstrato

fundamento do ser, a mera pré-condição da existência” 477. Ishvara é o rosto de Brahman,

seu aspecto pessoal, o criador, o revelador de Brahman, o que desce aos homens em forma

de avatar, o que é idêntico e ao mesmo tempo diverso em relação a Brahman 478.

Se seguirmos comparado as similitudes se esgotam. Por exemplo, (a) Brahma e

Yaweh/Elohim não coincidem. Brahman é um típico deus otiosus (deus ocioso), conforme a

tipologia eliadiana 479; o Deus judeu-cristão é ativo e pessoal, que intervém na história

humana. (b) a missão de Ishvara e do Logos joânico também divergem. A missão de Jesus é a

salvação dos homens, por inaugurar a chegada do reino de Deus e por sua morte vicária; a

missão dos avatares é a salvação dos homens por ajudá-los a encontrarem o caminho para fora

do ciclo do karma. Sem falar em outras diferenças como as definições de pecado, tempo, etc.

Panikkar reconhece a impossibilidade de uma completa equalização simbólica entre o

Ishvara e o Logos 480. Não importa. Tudo o que ele pretende é retirar a ênfase religiosa cristã

476 Idem. The unknown Christ of Hinduism, p. 85.

477 Raimon Panikkar. The unknown Christ of Hinduism., p. 106.

478 Raimon Panikkar. The unknown Christ of Hinduism, p. 122-124.

479 Origens (Lisboa: Edições 70, 1989), p. p.66.

480 R. Panikkar. The unknown Christ of Hinduism, p. 132.

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homem pelo homem. A questão ambiental é uma questão ética e a questão ética é religiosa.

A hermenêutica inter-religiosa de R. Panikkar fecha assim seu círculo, convidando o

Cristianismo e as demais religiões ao diálogo. Segundo ele, somente deste modo será possível

a plena realização da evolução e do desenvolvimento humanos: “o verdadeiro Atman de (em)

cada um de nós é Brahman. A essência de Buda subjaz no fundo de cada ser. Todos estamos

chamados a compartilhar a natureza divina” 486.

4.c.5. Michael Amaladoss

Jesuíta, nascido em 1936 em Tamil Nadu, Índia, doutorou-se em Teologia pelo Institute

Catholique de Paris. Atualmente é diretor do programa de Pós-graduação em Teologia no

Vidyajyoti College of Theology em Delhi, professor visitante na Universidade de Virginia

nos Estados Unidos e diretor do Institute for dialogue with cultures and religions, Chenai,

além de conferencista requisitado pelas mais importantes instituições educacionais e políticas

do mundo.

Como seus colegas apresentados mais acima, Amaladoss é um teólogo das religiões

pluralista, preocupado com a convivência pacífica das religiões na Índia, onde o Cristianismo

é minoritário e os conflitos religiosos são comuns. Esta preocupação permeia toda sua

trajetória como clérigo católico e como pensador cristão, desde meados da década de 70,

quando ele começou a ganhar projeção nos círculos cristãos de seu país. Naquela época,

porém, o que o desafiava era o problema da enculturação 487, ou seja, a necessidade de

486 Idem. Sobre el diálogo intercultural(Salamanca: Editorial San Esteban, 1990), p. 96.

487 Em inglês o autor usa a palavra inculturation. Há um pequeno imbroglio linguístico envolvendo esta palavra.

Aparentemente trata-se de um neologismo, criado pelo autor para evitar o uso da palavra aculturação, por conta

do cunho negativo que possui, vinculado ao colonialismo e suas mazelas. Em português está consagrado uso da

palavra aculturação para designar a adoção de uma n ova cultura e enculturação para a socialização da criança na cultura do lugar onde nasceu. Para evitar a carga semântica negativa, achamos por bem conservar a palavra usada pelo autor na tradução, apesar de não existir na língua portuguesa. Inculturação neste caso tem o objetivo

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adaptar o evangelho à cultura dos povos, para que não houvesse mera tradução das palavras

do evangelho, mas sim uma simbiose não alienante do novo com o antigo. O modelo de

Amaladoss naquela altura eram as igrejas paulinas, que não se satisfizeram com a mera

replicação do modo de vida judaico, mas adaptaram o evangelho às suas próprias práticas e

vivências greco-romanas 488.

Ainda ligado à perspectiva inclusivista Amaladoss publicou sua obra mais famosa The

Asian Jesus, onde apresenta as várias imagens enculturadas de Jesus, para fundamentar a tarefa

que toma por encargo: o delineamento das faces asiáticas de Jesus. A partir daí Amaladoss

passa em revista vários conceitos que consistentemente tinham sido aplicados a Jesus por

outros pensadores hindus: Jesus como mestre da moral; Jesus como avatara, encarnação de

Vishnu; Jesus como satyagrahi, seguidor da verdade e da não-violência (ahimsa); Jesus como

advaitin, aquele que entendia a sua relação com Deus de um modo não dual: “eu e o Pai somos

um”; Jesus solidário com a humanidade sofredora; Jesus como Bodhisattva, o iluminado que

adia sua entrada no nirvana a fim de mostrar o caminho da libertação a outros seres humanos

489. Amaladoss por assim dizer dá por concluída esta primeira fase de sua reflexão, com a

execução de um projeto de aculturação asiática da figura de Jesus.

Porém, as coisas não ficariam neste pé. O teólogo indiano percebe que a enculturação

não só possibilita um ganho para a cultura que recebeu o evangelho e o amalgamou ao seu

modo de viver, mas o próprio evangelho ganha ao ser enculturado porque se enriquece pela

manifestação de aspectos inéditos da verdade, provocados pela nova situação 490. Nesta esteira,

de ressalvar, o fato de que não se trata de mera substituição de uma religião por outra e nem de sincretismo indiscriminado. 488 M. Amaladoss. “Inculturation: theological perspect ives” (Jeevadhara, 33, 1976), p. 300.

489 Cf. Jacques Dupuis. Jésus-Christ à la rencontre des religions (Paris: Desclée, 1989). 490 M. Amaladoss. “Théologie indienne” (Études , n. 3783, 1993), p. 342.

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relaciona com outras religiões como colaboradores do projeto de realização do reino de

Deus no universo” 496.

Obviamente, o conceito de missão não permanece o mesmo. A Igreja neste novo

contexto é chamada a colaborar com o reino de Deus e com a obra do Espírito, atuante onde

homens e mulheres estejam se abrindo para o mistério de Deus. A missão da Igreja é dialogar

e colaborar, principalmente em três frentes: com os pobres, com a riqueza cultural e com as

ativas religiões da Ásia 497. Em última instância, promover a harmonia e a paz entre os povos.

Conceitos missiológicos também sofrem alteração. Por exemplo, a conversão torna-se algo

secundário na vida da Igreja Católica Asiática. Ou seja, são bem-vindos aqueles que se

julgarem chamados por Deus a abandonar sua religião originária e se unir à Igreja, mas o

contrário também é verdadeiro. Se alguém quiser abandonar a Igreja e se unir ao Hinduísmo,

por exemplo, poderá fazê-lo. Não se pode obstar a liberdade do Espírito de Deus498.

4.c.6. Hans Küng

Hans Küng é um teólogo católico atualmente proibido de ensinar teologia católica e

atuando apenas no magistério superior secular, já que na Europa, especialmente na Alemanha,

teologia é conhecimento científico e universitário. Sua defecção em relação à Igreja Católica

ocorreu aos poucos, mas a ruptura foi definitiva: o pensamento de Küng diverge em vários

pontos com o dogmatismo romano, primeiramente no campo metodológico, e depois no

cristológico.

De fato, Küng faz teologia quase como um protestante liberal, ou seja, sem amarras

dogmáticas. Em suas palavras: “a situação atual não exige a separação entre teologia e as

496 M. Amaladoss. “O Deus de todos os nomes e o diálogo inter-religioso”, p. 15.

497 M. Amaladoss. “Nuevas imágenes de misión” (PI, 94, 2007-1), p. 23.

498 M. Amaladoss. “Religions: an Indian Christian point of view of conversions” (JHCS, vol. 15, 2002), p. 4.

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ciências da religião (pace Karl Barth). Mas, tampouco deve ser defendida uma completa

identificação com a consequente redução da teologia às ciências da religião ou vice-versa.

Deve haver sim uma cooperação crítica entre as duas.” 499 Esta metodologia não é uma

novidade, Küng só está retomando um projeto de P. Tillich, que, infelizmente, ficou na

intenção devido à sua morte 500.

O método de Küng tem três momentos o texto, o contexto e as constantes do

Cristianismo ou a essência. O texto é fundamental. Ele é a matéria prima para a obtenção do

que é essencial no Cristianismo. Porém, concernente a esta questão Küng faz duras críticas ao

magistério da Igreja Católica, especialmente em referência às decisões conciliares de

Vaticano II, porque as declarações estabelecem a paridade e a indissolubilidade entre as

Escrituras, a Tradição e o Magistério. Para Küng a precedência é das Escrituras “critério

supremo e instância definitiva para a reforma da Igreja”. Segundo ele a decisão conciliar

acaba produzindo um “círculo vicioso” que alimenta dogmatismo eclesial, desde que

estabelece como Palavra de Deus não só as Escrituras, mas também a Tradição (logo também

as definições papais) 501.

Por este motivo Küng reconhece a necessidade da aplicação do método indutivo

também nos estudos cristológicos 502, ou seja, pensar a cristologia a partir de baixo, a partir do

testemunho do NT sobre Jesus e daí subir à compreensão do trabalho de Deus nele 503.

Küng crê que o NT procede cristologicamente da mesma maneira. O que é central em

sua mensagem é a morte e ressurreição de Jesus, e não o “motivo encarnacional”. Também,

seguindo sua interpretação, em nenhum lugar do NT h á qualquer menção sobre o tornar-se

499 H. Küng. Teologia a caminho. Fundamentação para o diálogo ecumênico, p. 287.

500 Idem. Proyecto de una ética mundial(Madrid; Planeta-Agostini, 1994), p. 149.

501 H. Küng. Teologia a caminho, p. 70.

502 C. LaCugna. Theological methodology of Hans Küng (New York: Scholars Press, 1982), p. 28.

503 Ibid., p, 29.

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Küng ataca a fossilização da teologia cristã reclamando dela uma adaptação aos novos

tempos:

Não seria adequado numa nova era, em vez de estar simplesmente repetindo os velhos dogmas helenísticos, concentrarmo-nos outra vez na mensagem do Novo Testamento e interpretá-la de novo para os cristãos contemporâneos, tal como os

teólogos helenistas uma vez, corretamente fizeram p ara seu tempo508

.

Portanto, a meu ver, em dois pontos a teologia das religiões de Küng fica exposta à

crítica. (1) Primeiro, uma contenção metodológica, a saber, sua tese sobre os paradigmas, em

especial sobre a mudança paradigmática em curso na atualidade. A hermenêutica de Küng é

muito frouxa, discricionária mesmo, pois não há qualquer argumento aduzido que discipline

as atualizações hermenêuticas das quais fala. Ora, isto equivale a relativismo. Em tempos

greco-romanos devemos enfatizar o Logos, as cristologias do alto, como os Pais Apologetas;

em tempos pós-modernos, o Jesus histórico, as cristologias de baixo. Ou seja, a união crítica

entre a Teologia e as Ciências da Religião não se apresenta de uma forma coerente, porque

não há um critério claro de quando a crítica das ciências da religião devem calar as Escrituras

e quando não. Ou então o critério determinante para a mudança paradigmática é histórico e

significa meramente acompanhar as mudanças ideológicas do mundo. Sendo isto verdade

estamos fora dos trilhos faz tempo, desde que a igreja se recusou a endossar o Gnosticismo de

Márcion, Valentino e Nag Hamaddi.

(2) A segunda contenção é relativa aos resultados práticos do Pan-ecumenismo de

Küng. A normatividade e a definitividade do Cristianismo mantidas são contraproducentes em

relação ao que se propõem, pois no final sua conclusão é de que existe uma única religião

verdadeira: a cristã; as demais são “provisoriamente verdadeiras”, que respondem

basicamente a critérios gerais (tanto éticos como religiosos)” 509. O problema é evidente. Sua

intenção de manter uma dialética entre a normatividade e definitividade de Cristo e uma

508 H. Küng. Christianity. The religious situation of our time, p. 195.

509 Idem. Proyecto para una ética mundial, p. 126.

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pessoas que buscam e também encontram seu caminho da salvação em outras religiões, sem

relação com Cristo” 511.

A cristologia pluralista de Samartha baseia-se nos Sinóticos e por isto todas as

declarações cristológicas das tradições paulina e joanina são rejeitadas, e, a fortiori, também

as declarações conciliares. Samartha acolhe os resultados do criticismo histórico e o utiliza

como ponto de partida. Para ele, não há sinal da doutrina da encarnação, da pré-existência, do

segundo componente da trindade, nos relatos do Jesus histórico, devendo, portanto, ser

eliminados. Há aí apenas um homem, imbuído de um espírito profético, separado pelo

Espírito para uma missão especial em Israel 512, que também não fez milagres, não ressuscitou

de fato e não ascendeu aos céus. Todos estes ornatos teológicos são produto da fé pós-pascal

da Igreja, pois nos relatos sinóticos se apresenta como teocêntrica513. Sua consciência de Deus

e do reino é mais útil para estabelecer novas relações com vizinhos de outras religiões 514 do

que as cristocêntricas dos hinos cristológicos paulinos e do Logos joânico.

Tendo esvaziado a cristologia do NT de seu conteúdo exclusivista, Samartha volta-se

para uma teologia teocêntrica, baseada na doutrinado Espírito Santo, o qual não pode ser

restrito ao canal cristomonista. Não se pode limita r o Espírito a um determinado tempo, lugar

e povo 515; aqui Samartha faz uma referência negativa à crença cristã do Espírito agindo

exclusivamente na Igreja. O Espírito é livre para cumprir o mandato de Deus de agir e levar a

salvação a todos, inclusive naqueles que creem de uma forma diferente 516.

511 Christine Lienemann-Perrin. Missão e diálogo inter-religioso (São Leopoldo: Sinodal/EST, 2005), p. 122.

512 S. Samartha. One Christ, many religions: towards a revised Christology (Maryknoll NY: Orbis Books,

1991), p. 120.

513 Idem. “The cross and the rainbow – Christ in a multirel igious culture”. In John Hick and Paul Knitter. The myth of Christian uniqueness, p. 86.

514 Idem. One Christ, many religions: towards a revised Christology, p. 77.

515 Ibid. p. 97.

516 S. Samartha. “The Holy Spirit and people de other faiths” (ER, 42, 1990), p. 255.

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É o mesmo Espírito que pairou sobre as águas de toda a criação, que falou através dos profetas no Antigo Testamento, que estava presente com Jesus nos momentos críticos de sua vida e ministério, e que se manifestou sendo derramado nos Atos, é o

que também ativou Yajnavalkya, Buda, o profeta Maomé e (por que não?) Gandhi,

Karl Marx e Mao Tse Tung517

.

Neste contexto a missão dos cristãos não deve ser u m fato isolado, mas compartilhado com

as outras religiões. Nada tem a ver com a expansão estatística do Cristianismo no mundo, mas

com o combate à miséria, à exploração, à intolerância, à doença, e tudo que negue o desígnio

último de Deus, que é a salvação da humanidade. Todas as religiões que possuem esta agenda são

chamadas a compartilhar com os cristãos sua vocação. Devemos reconhecer que a ação salvífica

de Deus ocorre também fora dos limites da Igreja518.

4.d. Conclusão

Um aspecto fundamental que une os pluralistas é a distinção entre o Logos e o Jesus

histórico, em flagrante oposição à decisão conciliar de Calcedônia, com exceção de S.

Samartha, não por acaso o único dos teólogos asiáticos que não é católico. Ele rejeita a

doutrina do Logos como um todo, adotando exclusivamente uma “cristologia de baixo”,

transferindo completamente as bases do diálogo inter-religioso para os conceitos de Reino de

Deus e para o Espírito Santo.

À propósito, este é um procedimento metodológico comum a todos os pluralistas:

afastar os indícios fontais que se tornem impeditivos para a hermenêutica pluralista que

praticam. Os outros farão o mesmo que Samartha, obnubilando por sua vez a relevância do

Jesus histórico. O que importa neste tipo de abordagem é evitar as fontes quando elas não

517 Idem. Courage for dialogue: ecumenical issues in inter-religions relationships (Geneva: World Council of Churches), p. 11.

518 S. Samartha. “The Quest for Salvation and the Dialogue between R eligions” (IRM, October, 1968), p. 425.

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estão de acordo com a percepção pluralista da realidade religiosa. Portanto, as fontes têm

papel secundário se comparadas com a exigência empírica plurirreligiosa.

Ainda atrelado à mutilação da Cristologia, pela qual “a cristologia de baixo” é negada,

ou então, separada da “cristologia do alto” (fazendo com que o Logos e o Jesus histórico já

não coincidam, como numa espécie de Neo-nestorianismo), há uma inflação da

Pneumatologia e da Eclesiologia. Negada a cláusula filioque, o Espírito não procede mais do

Filho, mas do Pai e age em todos aqueles que se abrem ao mistério divino e o conceito de

reino de Deus, que absorve o da Igreja, caracterizando uma mudança paradigmática profunda

no modo de os Cristãos se verem e verem os outros:

A teologia cristã sempre reconheceu que as pessoas pertencentes a outras religiões poderiam ser salvas por Deus, se elas fossem sinceras à sua consciência. O novo é que hoje nós cremos que Deus está estendendo a mão às pessoas, não apesar de sua

religião, mas em e através de suas religiões 519

.

A exclusividade religiosa de Jesus fica assim resolvida. No caso dos pluralistas radicais,

reduz-se a mero simbolismo, cuja relevância restringe-se àqueles interessados em estudar

fenômenos religiosos de um ponto de vista não religioso. No caso dos pluralistas moderados,

a exclusividade e peculiaridade de Jesus mantêm-se apenas se a referência for o conceito de

Logos ou de Cristo, e este passe a cooptar conceitos religiosos similares das outras religiões.

Não se pode negar que a doutrina do Logos tem o mérito de tornar o Cristianismo

menos escandaloso à religiosidade hindu, contexto religioso onde todos os teólogos citados

trabalham ou trabalharam. Com efeito, no mundo religioso hindu há duas características

fundamentais, uma favorece a aceitação não só do Cristianismo, mas também de outras

religiosidades; a outra desfavorece a aceitação do Cristianismo, respectivamente: (a) uma

519

M. Amaladoss. “O Deus de todos os nomes e o diálogo inter-religioso”, p. 13.

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longa história religiosa sincrética, que passou por várias etapas, reformas, e que possui

milhares de deuses em seu panteão; (b) uma tendência natural a abstrair o deus supremo

(Brahman) de toda e qualquer realidade palpável. Os Vedas já falavam deste mundo como

maya (véu), que em sua multiplicidade obsta a visão do Uno, sendo, portanto, um obstáculo à

compreensão do divino. Desta forma, causa perplexidade à compreensão hindu dizer que Deus

pode entrar na história e assim fazer parte desta multiplicidade ilusória do mundo.

A crux da questão é a incoerência intelectual de teólogos que tomam o secundário por

primário e vice-versa. O Logos da Escritura não é um conceito filosófico, porque é crido e

descrito como pano de fundo do Jesus histórico. A abordagem logocêntrica não faz justiça à

intenção da fonte; é má hermenêutica. Por causa da referência religiosa e cultural acima, tenta-

se sacrificar a história terrena de Jesus no altar do diálogo inter-religioso. Dela restando apenas

uma espriritualidade, pois perde a marca da ação divina, deixa de ser o lugar privilegiado da

ação divina.

Obviamente, a última solução é melhor do que a primeira por manter as características

do discurso e das práticas religiosas. Contudo, cabe ainda perguntar se esta inflação do Logos

constitui-se realmente em teologia das religiões de uma perspectiva cristã. A capacidade de

acomodar novas ideias religiosas em seu seio é uma qualidade do Hinduísmo, não do

Cristianismo. Não seria mais verdadeiro dizer que a teologia do Logos, assim como entendida

pelos pluralistas moderados, tem apenas uma aparência cristã e deve ser entendida como um

capítulo importante na teologia das religiões da perspectiva hindu? Não teria ocorrido algo

parecido na história do Cristianismo quando o Gnosticismo, fundamentado no Neoplatonismo

e nas religiões de mistério se apresentaram ao mundo antigo com uma face cristã? Se não

vejamos, praticamente todas as características da cooptação gnóstica do Cristianismo fazem-

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CAPÍTULO V

O “reino de Deus” e a teologia das religiões

5.a. Introdução

Ao entrarmos neste novo capítulo devemos abandonar a metodologia teológico-

sistemática até aqui adotada e nos aventurarmos em terreno bíblico. É necessário, pois este é o

único modo de considerar com seriedade o elemento escriturístico daquela tríade metodológica

prescrita no primeiro capítulo (a revelação, a linguagem e a contextualização). Até aqui a

revelação manifestou-se apenas genericamente e de modo negativo, restrita a indicar o que a

teologia das religiões não pode ser. A partir de agora buscaremos desvendar seu aspecto

positivo, demonstrando como as Escrituras podem ser a base de uma teologia das religiões.

Não é de todo novo este projeto. Outros já realizaram trabalhos importantes usando a

metodologia proposta. Podemos citar todos os teólogos Católicos, Evangélicos e Protestantes520

que tentaram basear suas ideias nas Escrituras. A meu ver, entretanto, estes trabalhos não

atingiram seu objetivo porque quanto ao tema as Escrituras não têm uma norma clara e una; sua

perspectiva varia muito, dependendo dos tempos a que pertencem seus documentos, sendo mais

ou menos tolerantes. Como já foi dito, “há uma tensão entre os textos” 521, que possibilita

visões diametralmente opostas da situação plurirreligiosa. Por exemplo, de um lado um C.

Pinnock que com ajuda dos Pais da Igreja consegue encontrar nas Escrituras nelas tantos

“santos pagãos”; de outro, Robert C. Sproul e Ronald Nash conseguem ler que todos os que

520 Dois teólogos dentre tantos de grande valor que gos taríamos de citar como inspiração de nossa investig ação

foram Clark Pinnock (Wideness in God’s mercy ) e, principalmente, Veli-Matti Kärkkäeinen ( Introduction to

Theology of Religions, especialmente a parte 1, em que aparece o tópico “Jesus e os Gentios”). Bem como todos

os que perceberam no conceito de “reino de Deus” a chave para uma teologia das religiões cristã. 521 C. S. Cowles et al. Show them no mercy. Four views on God and canaanite genocide (Grand Rapids, MI: Zondervan, 2003), p. 15.

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não aceitaram a Jesus como seu salvador pessoal estão perdidos. Nossa conclusão parece

inevitável: não é impossível construir uma obra sistemático-normativa deste modo522, a saber,

pela mera coleção de textos probatórios. É preciso encontrar um eixo teológico firmemente

estabelecido textualmente, com comprovada relevância hermenêutica e a partir dele organizar

toda esta diversidade textual e definir a norma para estes novos tempos. Não é necessário

imergir em profundas reflexões para identificar este eixo. Nada é mais central na Escritura do

que a palavra de Jesus (Hb. 1:1) e nada é mais importante nos ensinos de Jesus do que “o

reino de Deus” 523, os estudiosos dissentem apenas quanto ao que significa exatamente este

reino de Deus. Stanley Samartha, Claude Geffré e outros teólogos das religiões, já haviam

chegado à mesma conclusão, mas não pela perspectiva que pretendemos. Estar

completamente comprometido com o que diz a Bíblia, ainda que isto não nos agrade ou não

vá tão longe como desejamos.

Em suma, há muitas vantagens nessa opção metodológica. O conceito de “reino de

Deus”: (a) é adequado: por ser menos difícil de lidar teologicamente (o que não quer dizer

que seja fácil); (b) é normativo, pois conta com uma prioridade revelacional presumida; (c) é

apodítico, vale para todos os tempos, desde os dias de Jesus até a consumação final, e para

todos os lugares, da Galileia até os confins da tera (At. 1: 8).

Como já foi dito, o princípio escatológico ou a mensagem do reino de Deus de Jesus

como eixo norteador de uma teologia das religiões bíblica não é entendido aqui somente como

um evento ainda no futuro, a saber, um Juízo sobre as religiões, a última palavra de Deus

sobre as religiosidades humanas ainda a ser proferida na consumação de todas as coisas.

522

Não se pode olvidar que há uma ruptura teológica importante entre o AT e o NT. Saí de cena a doutrina da

eleição restrita a Israel (com todos os seus desdob ramentos teológicos, por exemplo, a teocracia) e en tra em cena a eleição geral de todos os povos da terra e desdob ramentos, por exemplo, a convivência dos Cristãos com as outras religiões e sua submissão aos poderes consti tuídos (Rm. 13: 1-7). 523

James D. G. Dunn. Jesus remembered (Grand Rapids, MI: Wm. B. Eerdemans, 2003), capítulo 12. Para um

survey sobre o tema cf. também George E. Ladd. A theology of the New Testament (Grand Rapids, MI: Wm. B. Eerdemans, 1993).

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5.b.2. Profetas de Sinais

A literatura extrabíblica é copiosa em exemplos deste tipo de Messianismo chamado por

E. Stegemann e W. Stegemann de "profetas de sinais"553. F. Josefo menciona vários deles,

alguns aludidos também pela Bíblia (At. 5: 36). Este é o caso de Teudas, o comandante de uma

revolta na Judeia anos após o suplício de Jesus (46 d. C.), o qual tendo assumido o modelo

profético de Josué, pretendeu dividir com sua palavra o rio Jordão, aparentemente, para fazer

com o povo o caminho inverso, rumo ao deserto, onde lhes manifestaria sinais da libertação (

Ant. 20: 97ss.). Outro profeta que encarnou este mesmo modelo profético ficou conhecido

como o Egípcio (Ant. 21: 38). Em ocasião de grande morticínio pretendeu à sua ordem fazer

ruírem os muros de Jerusalém, tal como ocorrera com os muros de Jericó (Guerra 2: 262ss e

Ant. 30: 169ss.), coisa que não acontecendo, facilitou o trabalho de Félix em desbaratar a

multidão amotinada e fazer capitula r os revoltosos. Em todas estas manifestações populares de

profetismo apocalíptico percebe-se o extremo antagonismo destes e seguidores em relação à

sociedade, que segundo estes porta-vozes do juízo divino já havia sido rejeitada por Deus.

5.b.3. Profetas da destruição

Outro tipo de messianismo apocalíptico corrente nos dias de Jesus eram os “profetas da

destruição” 554, para os quais nada mais importava senão anunciar o fim iminente. Em contexto

extracanônico temos alguns exemplos deste tipo de m essianismo apocalíptico. Flávio Josefo, por

exemplo, menciona um tal Jesus Ben Ananias (Guerra 6: 300ss.), o qual vindo à Jerusalém quatro

anos antes da revolta começar (68 d. C.), passou a anunciar a destruição do Templo, da cidade e

553 Ekkehard Stegemann e Wolfgang Stegemann. História social do Protocristianismo (São Leopoldo RS/São Paulo: Sinodal e Paulus, 2004), p. 194. 554 Ekkehard Stegemann e Wolfgang Stegemann. História social do Protocristianismo , p. 198.

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CAPÍTULO VI

As religiões em face ao diálogo

O mundo cristão mudou radicalmente no século que ficou para trás. Deixou de ser branco

e euro-americano e se globalizou. Além da heterogeneidade decorrente disto – hoje, os Cristãos

adoram a Deus em mais de dois mil diferentes grupos linguísticos 717, há divergências mais

profundas entre duas grandes categorias de Cristianismo: (a) um Cristianismo Ocidental, em

franca decadência, que tenta se tornar relevante em um ambiente secular e pós-moderno; e (b)

um Cristianismo globalizado que sente as dores do crescimento em alguns lugares, e em outros

luta para não sucumbir às pressões dos que estão incomodados com sua sobrevivência.

Os teólogos do Ocidente ensejam guiar seus pupilos não ocidentais a uma teologia mais

‘aberta’, condizente com o que veem na Europa e Estados Unidos. Os teólogos do terceiro

mundo e países emergentes encontram-se numa encruzilhada: ou acompanham seus mentores

na adoção de um pensamento pós-moderno relativista, supostamente pró diálogo inter-

religioso, ou reforçam sua herança cristã, que, de um ponto de vista sociológico, talvez condiga

mais com sua condição de minoria em seus próprios países. O que eles mesmos constatam é

que os teólogos defensores do relativismo religioso, a pretexto de favorecerem o diálogo inter-

religioso, na realidade prestam-lhes um desserviço, reforçando o discurso dos inimigos do

evangelho e sob os quais vivem politicamente submetidos. Estes teólogos Ocidentais, sempre

muito operosos na proteção das culturas e religiões minoritárias e ameaçadas pela expansão do

Cristianismo, esquecem-se de que é o próprio que agora se encontra sob ameaça na janela

10/40, por exemplo, onde o fundamentalismo islâmico indispõe-se com eles e impõem-lhes

717

Lamin Sanneh apud Harold Netland. Globalization and Theology today. in OTT, Craig e Harold NETLAND.

Globalizing Theology: Belief and practice in an Era of World Christianity (Grand Rapids, MI: Baker Publishing Group), 2006, p. 15.

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sanções e novas proibições à profissção de sua fé.

Além disso, a ideologia de países hindus e budistas adotam alegremente as disposições

pluralistas (sintéticos) por já o fazerem há séculos sem terem tido necessidade de nehuma de

suas teorias. De sorte que, os cristãos nestes países além de estarem pressionados pelas

maiorias religiosas não cristãs agora também são vítimas do “fogo amigo” do Pan-

ecumenismo sintético, cujos ensinos e palestras relativizam o Cristianismo, destituem-no de

sua relevância religiosa e ainda se veem como benfeitores da humanidade e colaboradores da

paz mundial. Na realidade não colaboram nem com os Cristãos subjugados dos países

islâmicos e tampouco satisfazem aqueles com quem presuntivamente pretendem abrir diálogo,

porque os lideres das religiões não Cristãs não querem ouvir que os ensinos de suas religiões

são metáforas piedosas, sem fundo veritativo 718. Em suma, de um lado ou de outro, os

Cristãos minoritários nestes países são prejudicados e as religiosidades como um todo.

Considerando o terceiro bloco do Cristianismo aquele que diz repeito às Américas e a

África, onde não existe o secularismo, mas tampouco perseguição religiosa, as razões contra

o relativismo não são menos contundentes. Não são mais favoráveis aí, pois o ecumenismo

pós-moderno chega a um ambiente cultural onde a fé já se encontra sob fogo da ideologia

secular, construída pelo processo de urbanização e industrialização recentes. Em quaisquer

das grandes cidades do planeta, igrejas cada vez mais fragmentadas, ideológica e

institucionalmente, dão nascimento a um novo fenômeno sociorreligioso: a dupla filiação

religiosa – grandes cidades da América do Sul 719.

718 Ho Jin Jun. “Evangelical challenges to religious pl uralism in Asian context” ( TTJ, no. 2, 2007), p. 29. 719

Franz Damen. “Panorama das religiões no mundo e na América Latina”, in Pelos muitos caminhos de Deus (Goiás: Editora Rede, 2003), pp. 45 e 46.

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ardorosos defensores desde o início da década de 80, com a publicação de vários artigos

onde propunha uma espécie de decálogo para o diálogo entre as religiões 724. Fiel à sua

posição relativista e filosófica, o primeiro preceito de seu “dialogue decalogue” é: o diálogo

inter-religioso deve significar que seus participantes devem antes de tudo buscar “uma

mudança e um crescimento na compreensão da realidade” 725.

É inegável que não se pode pensar em diálogo entre as religiões como mera conversa

entre posições religiosas diferentes. Deve haver um objetivo comum, deve haver um projeto

(segundo preceito) 726. Contudo, conforme vimos apresentando, um esperanto religioso é um

equívoco epistemológico e teológico em nada contribuinte para o fortalecimento das religiões,

exceto a religião universal iluminista. Mas, o diálogo é uma necessidade empírica decorrente

da multiculturalidade e plurirreligiosidade das sociedades humanas no mundo globalizado.

Como Martin Forward esclarece, o significado etimológico da palavra diálogo não é a

mera conversa a dois, como se o radical dia se referissem aos dois participantes do bate-papo.

Dia não é di (dois), antes quer dizer através, enfatizando um meio e um objetivo. “Diálogo

significa cosmovisões sendo arguidas até chegarem a conclusões potencialmente

transformadoras” 727, tal como ocorrem nos diálogos platônicos. O esclarecimento

etimológico é bem-vindo, mas a conclusão parece-me ainda vaga em termos práticos,

rejeitada a possibilidade de inter-influência doutrinal entre as partes.

724 Leonard Swidler. “the dialogue decalogue: ground rules for interreligious dialogue” (Horizons, vol. 10,

1983), p. 350.

724 Os outros mandamentos são: (2) um projeto bilateral levado a cabo dentro de duas comunidades religiosas, (3) completa honestidade e sinceridade por parte de cada participante, (4) cada participante assume a completa honestidade e sinceridade por parte do outro, (5) cada participante deve definir-se a si mesmo, (6) cada participante deve vir ao diálogo sem preconceitos econceitos superficiais sobre o outro, (7) o diálog só pode ocorrer entre iguais (par cum pari), (8) o diálogo só pode acontecer num ambiente de mútua confiança, (9) cada participante deve ser autocrítico em relação à sua tradição religiosa e (10) cada participante deve eventualmente tentar experimentar a religião do parceiro no diálogo. 726 Ibid, p. 351.

727 Apud Paul Hedges. Controversies in interreligious dialogue and theology of religions (London: SCM Press,

2010), p. 63.

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Hans Küng, por sua vez, tem uma proposição mais realista, por reconhecer que os

entendimentos inter-religiosos devem se destinar aos esforços para o desenvolvimento de uma

ética global. Como tivemos oportunidade de examinar, para Küng o papel dos ensinos de Jesus

no contexto multirreligioso é normativo, daí as diretivas ou as bases do diálogo entre as

religiões serem pautadas em seus Ensinos, resumidos em quatro grandes prescrições: “(1) não

violência e respeito pela vida, (2) solidariedade e justa ordem econômica, (3) tolerância e

uma vida de veracidade e (4) direitos iguais e parceria entre homens e mulheres” 728.

O reparo de Küng é bem-vindo, mas seu projeto ainda suscita contenções quanto à

viabilidade. Primeiramente, porque a ambição do projeto permanece propondo marcos além do

que é possível. A diversidade da religiosidade humana é de tal sorte que uma ética global

parece um projeto utópico; nenhum dos princípios poderia incluir todas elas. O primeiro

preceito é pacífico, mas ainda excluiria as religiões animistas (por causa de práticas sacrificais

de não humanos). O segundo preceito parece pressupor um capitalismo com melhor

distribuição de renda como a ordem econômica justa, o que não também não seria pacífico por

causa do coletivismo dos povos arcaicos e outras formas organização econômica que não

endossam “as conquistas” capitalistas. A organização social por vezes tem profundas

implicações religiosas como é o caso das castas do Hinduísmo 729, em que a posição social

(varna) está ligada ao dharma730. A terceira prescrição é a menos contenciosa: a tolerância e a

veracidade são valores religiosos universais. O quarto e último preceito entra em choque com

as sociedades patriarcalistas tradicionais do Oriente Próximo e do Extremo Oriente.

728 Hans Küng e Karl-Josef Kuschel (eds.). A global ethic. The declaration of the Parliament of the World’s

religions (New York: The Continuum International Publishing Group Inc., 2006), pp. 24-33. Cf. Hans Küng. Proyecto de una ética mundial(Madrid: Planeta – Agostini, 1994).

729 Paul Hedges. Controversies in interreligious dialogue and theology of religions, p. 259.

730 É a lei espiritual que deve governar as ações dos q ue estão sob a lei cósmica do karma, que, por sua vez, determina o destino de todos os seres. Ser obediente ao dharma é aceitar as condições sociais, a casta onde nasceu, e torná-la sua missão para retornar em outra encarnação numa posição mais elevada e prosseguir

evoluindo até o fim do ciclo.

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era “a singularidade do Cristianismo e não a base c omum das religiões” 733. O desinteresse

neste tipo de estudo parece fundar-se numa pressuposição básica extremamente maniqueísta:

Deus no lado Cristão e o Diabo no outro lado; embora não haja na Escritura nada que o

recomende. Pelo contrário, como vimos, a Escritura fala de um plano divino para salvar a

todos, desde os concertos de Adão, Noé e Abraão até o programa missiológico inclusivo de

Jesus, que só terminará nos confins da terra (At. 1: 8).

No evangelho de João Jesus ora por ovelhas que não são do aprisco sob Seus cuidados

diretos (Jo. 10:16) e no início do mesmo livro já havia dito que Deus não dá Seu Espírito por

medida (Jo. 3: 34); em Atos o Espírito é derramado sobre Gentios (At. 10: 47), que com

certeza foi evento interpretado pelos apóstolos escatologicamente à luz de Joel 2: 28: “e

acontecerá, depois, que derramarei de meu Espírito sobre toda a carne”. Sabemos, entretanto,

que por mais inclusivos que pareçam estes textos, nada neles nos autoriza a conclusão de uma

apokatástasis (salvação universal) religiosa ou secular declarada no final da história a todos,

ou mesmo um empreendimento teológico em busca dos sinais do Espírito nas doutrinas e

práticas das religiões. Este tipo de escrutínio não nos pertence nem isto foi requerido de

qualquer Cristão. O trabalho da pregação não coloca sobre os Cristãos o dever de interferir ou

julgar as instituições não Cristãs, mas de alcançar seus adeptos, dentre quantos estejam

dispostos a ouvir o evangelho (no mundo globalizado a Igreja Pós-constantiniana faleceu sem

deixar saudades).

Por outro lado, o ministério do Espírito não pode se restringir à Igreja, pois a própria

obra da pregação estaria impossibilitada fosse isto verdade. Como escreve Paulo, sem o

trabalho do Espírito ninguém poderia chegar à conclusão de que Jesus é o Senhor (I Co. 12:3)

e, portanto, salvar-se. Devemos, por conseguinte, abandonar o maniqueísmo que nos faz ver

733

William A. Dyrness. Learning about theology from the third world (Grand Rapids, MI: Zondervan, 1990), p. 156.

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os ouvintes do evangelho provindos das religiões mundiais como se no momento em que dão

ouvidos à Palavra de Deus pela primeira vez seja o marco zero de sua espiritualidade. Como se

antes de se depararem com a mensagem da cruz não tivessem sido guiados em sua caminhada

espiritual ao Cristo, do qual pelo mesmo Espírito somos também impelidos a pregar.

Esta é a grande novidade que estes novos ventos trazem ao mundo Cristão,

especialmente evangélico: uma modéstia religiosa. O Espírito atua na Igreja porque é o

objetivo de Deus salvar a todos, não sendo seu obje tivo o engrandecimento da Igreja e de seus

líderes. A Igreja é apenas instrumento, agência, não a razão de ser da missão. A soberba

espiritual antes tão facilmente desenvolvida nos meios Cristãos, por causa dos retratos

caricaturizados das outras religiões e por causa dos muitos retoques no seu próprio, deve agora

ceder lugar à humildade, de ser uma entre outras no mundo multirreligioso. E, pela certeza de

que “Deus amou o mundo” (não um pequeno número de crentes) “de tal maneira que deu Seu

Filho unigênito, para que todo aquele que Nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo. 3:

16), poder dar à sua mensagem o enf oque hermenêutico correto.

Portanto, a crise imposta pelo desenvolvimento da Pós-modernidade neste início de

século XXI pode também significar um kairós, uma grande oportunidade de pregação, para

completar obra iniciada por Jesus e levar a cumprimento Sua palavra: “até os confins da

terra”, porque sem os controles políticos ou religiosos das instituições religiosas Pós-

constantinianas, que criam obstáculos à pregação, cada um pode ser chamado a dar uma

resposta livre aos apelos do evangelho e os disputantes da verdade religiosa podem esforçar-se

por ganhar seus ouvintes sem tentarem se destruir mutuamente.

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