"temporão" - nena balthar

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NENA BALTHAR 2013 Temporão

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Registro da exposição TEMPORÃO, de Nena Balthar, realizada na ESTÚDIO DEZENOVE, no Rio de Janeiro, entre os dias 7 e 29 de setembro de 2013.

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Page 1: "Temporão" - Nena Balthar

NENA BALTHAR

2013Temporão

Page 2: "Temporão" - Nena Balthar

“Temporão”

O movimento parece ser um dos motes da presente exposição de Nena Balthar. Em torno das paredes da galeria, numa ocupação do espaço que toma das bordas do teto até, literalmente, o chão (numa dobradura fictícia do branco desse cubo), está ladeada uma extensa série de desenhos. Como seu próprio título, “Um desenho para cada dia” diz respeito a uma produção de imagens que tem relação com aquilo que já se sucedeu, a saber, o ano de 2012. O exercício essencial de iniciar as atividades de trabalho e concentração no ateliê através de um desenho feito com nanquim daquilo que via através de sua janela ganha o estatuto de um monumento artístico e, portanto, merece ser lembrado pelas mãos da artista com um caráter memorialista em 2013.

Do mesmo modo que a janela, metáfora de grande parte da tradição da pintura no Ocidente ao menos desde o Renascimento, pode ser em forma-to de um quadrado ou retângulo, estas folhas de papel optadas pela artista remetem ao próprio recorte segundo o qual poderia observar o seu jardim. O olhar atento perceberá que as linhas mais eretas e retilíneas dos primeiros meses cedem espaço, lentamente, a configurações mais curvi-líneas e experimentações não só de diferentes cromatismos do cinza, mas também de figura e fundo. O exercício que poderia ser repetitivo e pautado numa ansiedade pela mimese, se torna espaço para a criação e a imaginação. O ponto de chegada vira ponto de partida. O que parecia ser estático e corriqueiro, ganha movimento e agora pode se movimentar fisicamente através do vento que percorre a galeria e faz com que estas imagens lem-brem os calendários que ostentamos em nossas casas

Outro olhar dimensionado por um recorte de quatro lados é o da tele-visão. Com “Pour Garrincha”, Nena Balthar faz um vídeo que, mais do que homenagear uma transmissão televisiva poligonal, diz respeito ao girar de um círculo, de uma bola. Garrincha, aquele que é convocado junto com Zito e Pelé para o confronto entre Brasil e Rússia, na Copa do Mundo de 1958, é a estrela do vídeo e uma daquelas da partida. Esse objeto estático, a bola, que apenas faz sentido dentro do jogo de futebol quando acionada pelo corpo dos jogadores e, mais do que isso, pela fé de que é possível faz com que ela entre ou seja distanciada de um gol, também é ressignifcada

através do gesto tradicional do desenho através do uso das mãos e, nova-mente, do papel como suporte.

Das linhas que compõe um diário para os traços brutos dessa forma geométrica perfeita segundo Platão, o círculo. Nanquim sobre papel, grafite sobre um fundo ou, em outras palavras, preto e branco. “Porção escura”, caderno apresentado sobre uma mesa, também depende do movi-mento, mas por parte do público. Folhear suas páginas é perceber os intervalos de sobreposição e criação de novas composições através do uso da soma de todas as cores e da ausência delas. Também um desenho, mas em formato editorial, poderíamos dizer que é um trabalho que versa sobre o tempo, a distância e o acúmulo...

Mas e o título da exposição, esse “temporão”? Segundo o dicionário, esse livrinho que parece dar certeza de todas as coisas, a palavra tem significa-dos diferentes e que foram dados com o percurso da língua portuguesa. Inicialmente, dizia respeito a algo que ocorre antes do tempo esperado, mas com o decorrer dos séculos, no Brasil, passou a ser utilizado para designar, precisamente, aqueles filhos que parecem nascer depois do tempo biologicamente tido como ideal dos pais.

Tenho a impressão, portanto, que os trabalhos de Nena Balthar reunidos aqui podem ser lidos através desse pêndulo dos diferentes significados dessas palavras. Se os trabalhos versam sobre o movimento dos dias, sobre o mover de uma bola de futebol, ou até mesmo sobre as mãos necessárias do espectador, podemos dizer, por consequência, que eles versam sobre o tempo. Não estaria esse subjugado, ao menos graficamente, ao espaço? E não seria essencial a distância de 2012 para que esses desenhos temporãos tenham nascido? Ou mesmo a entrada em campo, precipitada para muitos, mas celebrada instantaneamente de Garrincha, para que o Brasil vencesse a Copa de 58?

Entre precipitações e lentidões, os trabalhos da artista me parecem ter potência por, mais do que falar sobre arte, tecerem comentários sobre algo maior do que isso, ou seja, a própria vida, seus momentos bruscos e a necessidade, vez ou outra, de freios e retornos.

Raphael Fonseca

Page 3: "Temporão" - Nena Balthar

“Temporão”

O movimento parece ser um dos motes da presente exposição de Nena Balthar. Em torno das paredes da galeria, numa ocupação do espaço que toma das bordas do teto até, literalmente, o chão (numa dobradura fictícia do branco desse cubo), está ladeada uma extensa série de desenhos. Como seu próprio título, “Um desenho para cada dia” diz respeito a uma produção de imagens que tem relação com aquilo que já se sucedeu, a saber, o ano de 2012. O exercício essencial de iniciar as atividades de trabalho e concentração no ateliê através de um desenho feito com nanquim daquilo que via através de sua janela ganha o estatuto de um monumento artístico e, portanto, merece ser lembrado pelas mãos da artista com um caráter memorialista em 2013.

Do mesmo modo que a janela, metáfora de grande parte da tradição da pintura no Ocidente ao menos desde o Renascimento, pode ser em forma-to de um quadrado ou retângulo, estas folhas de papel optadas pela artista remetem ao próprio recorte segundo o qual poderia observar o seu jardim. O olhar atento perceberá que as linhas mais eretas e retilíneas dos primeiros meses cedem espaço, lentamente, a configurações mais curvi-líneas e experimentações não só de diferentes cromatismos do cinza, mas também de figura e fundo. O exercício que poderia ser repetitivo e pautado numa ansiedade pela mimese, se torna espaço para a criação e a imaginação. O ponto de chegada vira ponto de partida. O que parecia ser estático e corriqueiro, ganha movimento e agora pode se movimentar fisicamente através do vento que percorre a galeria e faz com que estas imagens lem-brem os calendários que ostentamos em nossas casas

Outro olhar dimensionado por um recorte de quatro lados é o da tele-visão. Com “Pour Garrincha”, Nena Balthar faz um vídeo que, mais do que homenagear uma transmissão televisiva poligonal, diz respeito ao girar de um círculo, de uma bola. Garrincha, aquele que é convocado junto com Zito e Pelé para o confronto entre Brasil e Rússia, na Copa do Mundo de 1958, é a estrela do vídeo e uma daquelas da partida. Esse objeto estático, a bola, que apenas faz sentido dentro do jogo de futebol quando acionada pelo corpo dos jogadores e, mais do que isso, pela fé de que é possível faz com que ela entre ou seja distanciada de um gol, também é ressignifcada

através do gesto tradicional do desenho através do uso das mãos e, nova-mente, do papel como suporte.

Das linhas que compõe um diário para os traços brutos dessa forma geométrica perfeita segundo Platão, o círculo. Nanquim sobre papel, grafite sobre um fundo ou, em outras palavras, preto e branco. “Porção escura”, caderno apresentado sobre uma mesa, também depende do movi-mento, mas por parte do público. Folhear suas páginas é perceber os intervalos de sobreposição e criação de novas composições através do uso da soma de todas as cores e da ausência delas. Também um desenho, mas em formato editorial, poderíamos dizer que é um trabalho que versa sobre o tempo, a distância e o acúmulo...

Mas e o título da exposição, esse “temporão”? Segundo o dicionário, esse livrinho que parece dar certeza de todas as coisas, a palavra tem significa-dos diferentes e que foram dados com o percurso da língua portuguesa. Inicialmente, dizia respeito a algo que ocorre antes do tempo esperado, mas com o decorrer dos séculos, no Brasil, passou a ser utilizado para designar, precisamente, aqueles filhos que parecem nascer depois do tempo biologicamente tido como ideal dos pais.

Tenho a impressão, portanto, que os trabalhos de Nena Balthar reunidos aqui podem ser lidos através desse pêndulo dos diferentes significados dessas palavras. Se os trabalhos versam sobre o movimento dos dias, sobre o mover de uma bola de futebol, ou até mesmo sobre as mãos necessárias do espectador, podemos dizer, por consequência, que eles versam sobre o tempo. Não estaria esse subjugado, ao menos graficamente, ao espaço? E não seria essencial a distância de 2012 para que esses desenhos temporãos tenham nascido? Ou mesmo a entrada em campo, precipitada para muitos, mas celebrada instantaneamente de Garrincha, para que o Brasil vencesse a Copa de 58?

Entre precipitações e lentidões, os trabalhos da artista me parecem ter potência por, mais do que falar sobre arte, tecerem comentários sobre algo maior do que isso, ou seja, a própria vida, seus momentos bruscos e a necessidade, vez ou outra, de freios e retornos.

Raphael Fonseca

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NENA BALTHAR

2013Temporão

http://vimeo.com/41331663