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Universidade de Brasília JUNIVAN RODRIGUES DE SOUSA TEMA: Uma tentativa de ruptura do modelo esportivista com alunos do ensino médio, um relato de experiência. São Paulo 2007

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Universidade de Brasília

JUNIVAN RODRIGUES DE SOUSA

TEMA: Uma tentativa de ruptura do modelo esportivista com alunos do

ensino médio, um relato de experiência.

São Paulo

2007

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JUNIVAN RODRIGUES DE SOUSA

Uma tentativa de ruptura do modelo esportivista com alunos do ensino médio, um relato de

experiência.

Trabalho apresentado ao Curso de Especialização em Esporte Escolar do Centro de Educação à Distância da Universidade de Brasília em parceria com o Programa de Capacitação Continuada em Esporte Escolar do Ministério do Esporte para obtenção do título de Especialista em Esporte Escolar. Orientador: Profª. Ms. Luciana Venâncio

São Paulo

2007

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RODRIGUES DE SOUSA, Junivan.

Uma tentativa de ruptura do modelo esportivista com alunos do ensino médio, um relato de experiência. São

Paulo, 2007.

23 p.

TCC (Especialização) – Universidade de Brasília. Centro de Ensino a Distância, 2007.

1. Ensino Médio 2. PCN’s. 3. Educação Física.

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JUNIVAN RODRIGUES DE SOUSA

Uma tentativa de ruptura do modelo esportivista com alunos do ensino médio,

um relato de experiência.

Trabalho apresentado ao Curso de Especialização em Esporte Escolar do Centro de Educação à Distância da Universidade de Brasília em parceria com o Programa de Capacitação Continuada em Esporte Escolar do Ministério do Esporte para obtenção do título de Especialista em Esporte Escolar pela Comissão formada pelos professores:

Presidente: Professora Mestre Luciana Venâncio Universidade Estadual de São Paulo

Membro: Professor Doutor Marcos Garcia Neira

Universidade de São Paulo

São Paulo (SP), 18 de agosto de 2007.

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DEDICATÓRIA

A Deus, fonte de vida. A meus pais, pelo incentivo e carinho constantes. Aos meus familiares que compõem uma base que me dá sustentação. E, finalmente, a Marli que é minha eterna companheira.

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AGRADECIMENTOS

Agradecemos a todos aqueles que, direta ou indiretamente contribuíram para a

elaboração deste relato de experiência e, de modo especial a Professora Mestre Luciana

Venâncio, pelo incentivo constante e pela orientação.

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“Eu não estou interessado em nenhuma teoria, em nenhuma fantasia nem no algo mais... Minha alucinação é suportar o dia-a-dia, meu delírio é a experiência com coisas reais... Amar e mudar as coisas, amar e mudar as coisas me interessa mais”

Belchior.

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RESUMO

A partir da elaboração dos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN’s, em 1997, ficaram

melhor definidos os conteúdos da educação física para sua atuação junto ao Ensino Médio,

ainda assim o modelo de educação física esportivista segue desconsiderando o que

preconizam os PCN’s, e continua formando alunos preocupados apenas com o seu rendimento

esportivo, por meio de atividades totalmente desvinculadas de objetivos que possam

contribuir para uma mudança qualitativa da educação física escolar. Este trabalho tem o

propósito de relatar uma experiência com alunos do ensino médio de uma escola estadual da

cidade de São Paulo, que teve como objetivo iniciar naquela escola uma ruptura com o

modelo de educação física esportivista, por meio de atividades que estimularam nos alunos a

discussão acerca dos temas: Copa do Mundo; Atividade física e saúde; E, por fim, Políticas

Públicas de Educação Física e Lazer.

PALAVRAS CHAVES: Ensino médio, PCN’s, educação física.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 10 2 LEITURA DA REALIDADE ..................................................................................... 11 3 LEITURA DA REALIDADE ESPECÍFICA ............................................................ 12 4 ASPECTOS POSITIVOS E NEGATIVOS OBSERVADOS

NA LOCALIDADE ............................................................................................... 15 5 ANÁLISES, CRÍTICAS E SUGESTÕES ................................................................... 16 6 CONCLUSÃO.............................................................. .................................................. 22

REFERÊNCIAS ... ......................................................................................................... 23

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1 INTRODUÇÃO

A educação física historicamente sempre esteve confusa quanto aos seus

conteúdos para aplicação no universo escolar, aspecto esse que reiteradas vezes

contribuiu para que sua relevância fosse questionada pelas políticas

educacionais.

O documento Parâmetros Curriculares Nacionais – Educação Física, para o

ensino médio concluído em 1.999 orienta os professores para atuação junto aos

seus estabelecimentos de ensino. Sobre os conteúdos, encontramos nos PCN’s

que o aluno deve possuir sólidos conhecimentos da cultura corporal.

O fato é que após quase 8 anos da elaboração inicial dos PCN’s para a

educação física, percebemos que o modelo esportivista ainda prevalece

arraigado entre grande parte do professores de educação física, e assim os

alunos do ensino médio aprendem exatamente os mesmos conteúdos que

tiveram oportunidade de conhecer no ensino fundamental.

O propósito deste trabalho é relatar a experiência que tive junto aos alunos

do 1° ano do ensino médio da Escola Estadual Profª Apparecida Rahal,

localizada no bairro de Itaquera, na zona leste da cidade de São Paulo.

O objetivo do trabalho foi o de promover uma ruptura, do modelo

esportivista de educação física escolar. Para isto foram propostas atividades

sobre três eixos temáticos: Copa do Mundo; Atividade Física e Saúde; e

Políticas Públicas de Educação Física e Lazer

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2. LEITURA DA REALIDADE

A Escola Estadual Professora Apparecida Rahal está localizada no bairro de

Itaquera, Zona Leste da Cidade de São Paulo. Itaquera é um bairro que abrigou no

passado um grande número de fábricas, porém atualmente boa parte delas encontram-

se desativadas, em função disto a grande maioria das pessoas que estão empregadas

trabalham em outras regiões da cidade.

Assim como todo bairro periférico, Itaquera necessita de uma maior atenção do

Poder Público, principalmente no que diz respeito a melhorias nos sistemas de saúde,

educação e transportes.

Como alternativas de lazer a população utiliza-se das quadras de algumas escolas

estaduais e municipais que abrem suas portas à comunidade nos finais de semana,

além disto a população conta com o Parque Municipal do Carmo e também com uma

unidade do SESC.

A escola Profª Apparecida Rahal foi inaugurada em 1.975, desde aquela época vem

atendendo alunos da 1ª série do ensino fundamental II ao 3° ano do ensino médio. No

total são aproximadamente 1.800 alunos divididos em três períodos: manhã, tarde e

noite. (dados do ano de 2.006)

Trata-se de uma escola de grande porte, composta por 17 salas de aula, biblioteca,

sala de vídeo, sala multiuso, pátio de convivência, e uma quadra poliesportiva.

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2 LEITURA DA REALIDADE ESPECÍFICA

Pretendo abordar neste relato a experiência que tive no ano de 2.006 com os alunos

do 1° ano do ensino médio nas aulas de educação física na Escola Estadual Profª Apparecida

Rahal.

O ano em que concluí minha graduação foi 1.999, e desde 2.000 venho atuando

como professor de educação física em escolas particulares e da rede municipal de ensino da

cidade de São Paulo, atuando junto aos alunos de ensino fundamental II. A partir de 2.006

tive a oportunidade de ingressar na rede pública estadual de ensino e com isso passei a

trabalhar também com alunos do ensino médio.

No início achei que não haveria maiores problemas, pois se já trabalhava com

alunos da 7ª e 8ª séries, imaginava que não sentiria dificuldades em trabalhar com alunos um

pouco mais velhos. Após as primeiras aulas percebi que o conteúdo que estava ensinando não

era muito diferente do que ensinava para alunos do ensino fundamental II, o conteúdo quase

que se resumia aos jogos esportivos coletivos, e então surgiram os meus primeiros

questionamentos.

Para responder estes questionamentos passei a pesquisar na bibliografia voltada à

educação física escolar, e constatei que temos poucos autores que escrevem sobre conteúdos

para o ensino médio, e o que encontrei me dava poucos subsídios para formatar um

planejamento condizente com a realidade que tinha em mãos. Foi quando passei tomar

conhecimento dos conteúdos estabelecidos pelos PCN’s do ensino médio, com o qual havia

tido pouco contato até então.

Ao me deparar com uma sala de ensino médio, senti uma necessidade de dar uma

contribuição mais efetiva no sentido de possibilitar a formação de um aluno mais crítico, e

para isto necessitava acrescentar alguns elementos à minha prática pedagógica.

Os alunos da escola estavam acostumados com a metodologia de uma educação

física esportivista e evidentemente, eles só consideravam a aula atrativa quando era abordada

uma das modalidades esportivas coletivas: handebol, voleibol, basquetebol ou futebol, de

preferência que fosse esta última.

Aos poucos, comecei a mostrar aos alunos que as nossas aulas tinham a necessidade

de avançar em algumas questões, e para isso teríamos que diminuir as nossas atividades

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predominantemente práticas e criar alguns momentos de discussão sobre o conteúdo das

aulas.

Apesar da resistência inicial de alguns alunos, percebi que o grupo na sua maioria

demonstrava interesse em novas metodologias para as aulas de educação física. Foi quando

estabeleci junto aos alunos que haveria uma alternância entre aulas teóricas e práticas.

Quando utilizo o termo “aula teórica” não me refiro especificamente à giz e lousa, mas

principalmente a utilização de recursos audiovisuais e artigos de jornais e revistas.

Ao longo do ano foram abordados alguns temas importantes como: Copa do Mundo,

Atividade Física e Saúde, e Políticas Públicas de Educação Física e Lazer.

Apesar da escassez de publicações para educação física voltada ao ensino médio que

pudessem fundamentar a minha prática pedagógica, encontrei nos PCN’s um grande respaldo

para levar adiante a minha experiência com os alunos.

O tema Copa do Mundo por despertar muito a atenção dos alunos foi o meu ponto de

partida na tentativa de desenvolver um aprofundamento teórico com os alunos. Utilizei como

estratégia inicial a exibição do filme “Boleiros” de Ugo Giorgetti, produzido no ano de 1.998.

O filme trata do universo real da vida do jogador de futebol, mostra que apenas uma

minoria ganha altos salários e é bem sucedida, evidencia o lado obscuro do futebol na figura

de empresários que se aproveitam da falta de conhecimento por parte dos jogadores para obter

lucro em suas negociações.

Nas aulas seguintes após a exibição do filme, os alunos, divididos em grupos de 5

participantes cada, tiveram que expor aos demais o seu entendimento sobre os temas

abordados no filme. Os alunos foram incentivados no sentido de buscar elementos para sua

apresentação, através de consultas a jornais e revistas que pudessem fundamentar suas

afirmações perante o grupo.

Ao término desta etapa, o que ficou evidenciado foi que os alunos não haviam se dado

conta de que o jogador de futebol é tratado como mercadoria por empresários, dirigentes e

órgãos de imprensa, neste sentido a exibição e a discussão sobre o filme foi bastante produtiva

para que pudessem ter uma leitura mais crítica sobre a realidade que envolve o futebol

brasileiro.

O tema Atividade Física e Saúde foi trabalhado com os alunos em duas etapas:

Inicialmente realizamos algumas aulas práticas introduzindo diferentes atividades como

sessões de alongamento, ginástica, exercícios de resistência aeróbia, e de resistência muscular

localizada. Nas aulas seguintes solicitei aos alunos para que elaborassem um questionário para

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ser aplicado junto aos seus pais, vizinhos, e professores , à respeito do nível de atividade física

destas pessoas.

A partir da vivência dos alunos e da investigação que fizeram sobre a prática de

atividade física de seus familiares, vizinhos, e professores, pudemos aprofundar a discussão

sobre a importância da atividade física no sentido não só da melhoria e manutenção da saúde,

mas também de uma valorização do conceito de qualidade de vida.

Após a experiência obtida na exploração destes dois últimos temas, percebi que a

resposta do grupo de alunos foi extremamente positiva, e permitia que pudéssemos avançar

em outras questões importantes.

A Escola Estadual Profª Apparecida Rahal até o ano de 2.006 fez parte do programa

“Escola da Família” mantido pelo Governo do Estado de São Paulo. Aproveitei o fato da

escola fazer parte do programa e abrir aos finais de semana para a a comunidade e iniciei

junto aos alunos uma discussão sobre as Políticas Públicas de Educação Física e Lazer, como

muitos dos alunos freqüentavam a escola aos finais de semana, eles contribuíram muito nas

discussões em sala levantando os problemas que observavam no desenvolvimento do projeto,

à partir destas discussões foi possível esclarecer aos alunos que uma das competências que a

educação física pode desenvolver no ensino médio é justamente a de formar o aluno

consciente da utilização dos espaços públicos de lazer, levando-o a refletir sobre a realidade e

incentivando-o a tentar modificá-la.

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3 ASPECTOS POSITIVOS E NEGATIVOS OBSERVADOS NA LOCALIDADE. Baseado na experiência que tive no ano de 2.006 junto aos alunos do 1° ano do ensino

médio, entendo que esta apresentou alguns aspectos positivos tanto no que diz respeito ao seu

aproveitamento por parte do professor quanto dos alunos.

O que ressalto como mais significativo para o professor foi a possibilidade de

vivenciar uma prática pedagógica que mesmo tendo sido alvo de resistência no princípio, com

o passar do tempo foi se consolidando e ao final do ano já era bem aceita pela maioria do

grupo.

Como aspecto negativo eu observo que muitos professores não aproveitam as

oportunidades de experimentar o novo, e isto ocorre por diversos motivos, o fato é que o

aluno acaba sendo prejudicado, e neste sentido não podemos nos incomodar por ele não

valorizar devidamente a educação física.

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4 ANÁLISES, CRÍTICAS E SUGESTÕES A educação física foi, e continua sendo até hoje, objeto de debates, conflitos e

negociações acerca do seu papel na escola. Neste sentido chama a atenção a falta de

posicionamento dos professores de educação física, que muitas vezes tem se omitido em

decisões políticas no âmbito escolar.

Diante do contexto das mudanças ocorridas na educação brasileira ao longo dos anos 80

e 90, as escolas de ensino médio vem lidando com o desafio da construção coletiva de uma

outra identidade para esta etapa da educação básica.

De acordo com o que preconiza os PCN’s, a educação física no currículo escolar do

ensino médio deve garantir aos alunos:

- acúmulo cultural no que tange à oportunização de vivência das práticas corporais;

- participação efetiva no mundo do trabalho no que se refere à compreensão do papel do

corpo no mundo da produção, no que tange ao controle sobre o próprio esforço e do direito

ao repouso e ao lazer;

- iniciativa pessoal nas articulações coletivas relativas às práticas corporais comunitárias;

- iniciativa pessoal para criar, planejar ou buscar orientação para suas próprias práticas

corporais;

- intervenção política sobre as iniciativas públicas de esporte, lazer e organização da

comunidade nas manifestações, vivência e na produção de cultura.

De um modo geral, o que se espera é que os alunos do ensino médio tenham a oportunidade

de vivenciarem o maior número de práticas corporais possíveis. Ao realizarem a construção e

vivência coletiva dessas práticas, estabelecem relações individuais e sociais, tendo como pano

de fundo o corpo em movimento.

Assim, a idéia é de que esses jovens adquiram maior autonomia na vivência, criação,

elaboração e organização dessas práticas corporais, e que também assumam uma postura

crítica quando estes estiverem no papel de espectadores das mesmas.

Espera-se, portanto, que os saberes da educação física tratados no ensino médio possam

preparar os jovens para uma participação política mais efetiva no que se refere à organização

dos espaços e recursos públicos de prática do esporte, ginástica, dança, lutas, jogos populares,

entre outros.

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A educação física historicamente sempre esteve confusa quanto aos seus conteúdos para

sua aplicação no universo escolar, aspecto esse que reiteradas vezes contribuiu para que sua

importância fosse questionada pelas políticas educacionais. Entre outros objetivos, a

elaboração dos PCN’s tinha como premissa organizar melhor os conteúdos da área, para sua

aplicação no âmbito escolar.

Diversos papéis foram atribuídos à educação física na escola: preparação do corpo do

aluno para o mundo do trabalho eugenização e assepsia do corpo, buscando uma “raça forte e

enérgica”; formação de atletas; terapia psicomotora; e até como instrumento de

disciplinarização e interdição do corpo. (PCN’S)

De acordo com os PCN’s: “...Os alunos, por sua vez, não deixaram de utilizar o

tempo/espaço desse componente curricular de diversas maneiras, tais como: relaxamento de

tarefas demandadas por outras disciplinas; tempo e espaço de encontro com os amigos;

possibilidade de realização de suas práticas de lazer; momento de ócio, etc.”

Quando percebemos que para os alunos a aula de educação física é apenas um momento de

recreação sem uma finalidade, sem um objetivo, temos que considerar que esta visão foi

construída à partir da omissão dos professores de educação física em aplicar aquilo que se

define como conteúdo curricular desta área do conhecimento.

O processo de seleção e a conseqüente escolarização desses conteúdos sempre estiveram

relacionados ao contexto social e político da época. Assim, mais uma vez, é importante

destacar que a seleção desses conteúdos não é realizada de forma natural, sendo fruto de um

campo de disputa de interesses e intencionalidades, explicitando escolhas e concepções acerca

do papel da educação física no processo de formação dos sujeitos.

Na última década observamos um grande aumento na produção teórica sobre educação

física escolar, sobretudo no que diz respeito ao ensino fundamental. Observa-se, porém, que o

ensino médio, especificamente, não tem sido objeto de muitas pesquisas acadêmicas.

Ao observarmos, sobretudo as características do ensino médio na rede pública, onde

segundo estudos, 70% dos alunos estudam no período noturno e a educação física é

facultativa e realizada fora da grade horária, encontramos em parte um explicação para a

diminuta produção teórica da área, tendo em vista que a educação física tem sido

historicamente priorizada aos alunos de ensino fundamental. (Brandl, 2003, p.80)

Esta questão da falta de produção teórica na educação física voltada ao ensino médio não

é o foco principal deste projeto de pesquisa, trata-se apenas de um dado concreto que, talvez,

contribua para esclarecer algumas questões que levantarei ao longo desta proposta de

trabalho.

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A discussão que aqui proponho é sobre os conteúdos para a educação física no ensino

médio. Historicamente temos observado a prática pedagógica dos professores de educação

física escolar baseada no ensino do esporte, e muitas vezes esta prática compreende todo o

período do ensino fundamental e médio, ou seja, o aluno aprende os mesmos conteúdos no

ensino fundamental e no ensino médio.

De acordo com Moreira (1.995, p.16), a educação física escolar sempre foi marcada pela

atuação mecânica de seus profissionais, que reproduziam os mesmos testes no início e no final

dos períodos letivos, ao longo dos anos.

Segundo o documento dos PCN’s para o ensino médio: “A hegemonia da esportivização,

que ao longo da história desempenhou papéis distintos, muitas das vezes a serviço da indústria

cultural, acabou por gerar o processo de seleção de poucos para as práticas. Vários foram os

discursos que sustentaram esse modelo esportivo tal como está colocado na nossa sociedade:

o discurso da necessidade de ter um “País olímpico”, no qual nossos “heróis” seriam um

exemplo para crianças e jovens e motivo de “orgulho da nação”; o discurso econômico no

qual o consumo de produtos e serviços, bem como do próprio espetáculo esportivo é gerador

de emprego e renda; o discurso da prática esportiva como solução para problemas de saúde,

uso de drogas e outras mazelas sociais...”

Sobre este tema, o da esportivização, o autor Daólio (1.995, p.55) defende que a prática de

educação física na escola deve contextualizar a prática esportiva na realidade sociocultural

onde ela se encontra.

Não é minha intenção aqui, diminuir a importância do esporte como conteúdo dentro da

educação física escolar, a pergunta que faço é se a educação física não estaria exagerando na

sua aplicação dentro da escola, e sobretudo da forma descontextualizada e baseada na

repetição do modelo esporte-rendimento?

Voltando à questão do ensino médio, evidencia-se a falta de seqüencialidade da educação

física escolar, pois, a educação física tem ensinado os mesmos conteúdos para alunos de

diferentes faixas etárias e séries. (Moreira, 1.995, p.24)

O modelo esportivista ainda prevalece arraigado na escola, exacerbando a

competitividade e o individualismo do aluno, (Moreira, 1.995, p.19)

A confusão acerca dos conteúdos que podem ser trabalhados na educação física escolar

sempre existiu, porém o debate acadêmico desenvolvido nas décadas de 80 e 90,

principalmente, serviu para trazer à tona importantes abordagens pedagógicas que passaram a

ser um referencial imprescindível ao professor de educação física.

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A elaboração do Parâmetros Curriculares Nacionais para o ensino médio foi finalizada

no ano de 1.999 e se tornou um importante recurso para os professores de educação física

escolar estabelecerem melhor os conteúdos para cada série ou faixa etária.

Os PCN’s baseiam-se no princípio do pleno desenvolvimento humano, que se caracteriza

pelas competências cognitivas e culturais, e não mais de “conformação” para o mundo do

trabalho.

O texto dos PCN’s caracteriza essa sociedade como decorrente da revolução tecnológica,

fato que gera desdobramentos na produção e na área da informação. Para se adequar a esta

nova realidade a educação passa a seguir um novo paradigma que admite correspondências

entre as competências exigidas para o exercício da cidadania e para as práticas produtivas.

Os avanços tecnológicos, a expansão da economia, o deslocamento das oportunidades de

trabalho do setor industrial para o setor terciário trazem conseqüências como o desemprego,

violência, pobreza e intolerância. A educação assume papel fundamental nesse contexto.

(MEC, 1999,)

À partir da conclusão dos PCN’s, ficam definidos alguns pilares da educação nas

sociedades contemporâneas: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver com os

outros, aprender a ser.

Baseado nestes pilares, o novo ensino que se propõe não se limita a ser um mero

transmissor de conhecimento, mas concentram-se no desenvolvimento de competências e

habilidades necessárias para a integração efetiva de jovens à sociedade. (MEC, 1.999)

Os PCN’s do ensino médio advertem, no entanto, que não é possível desenvolver

competências se não houver conteúdo. E define o que deve ser conteúdo: “Os conteúdos

curriculares são uma seleção de saberes de diversas naturezas: conceitos, raciocínios,

linguagens, valores, atitudes, interesses, condutas...; Reconheçam-se, nessa definição, três

tipos de conteúdos: Fatos e conceitos; Procedimentos e atitudes; Valores e normas.

Os conteúdos acima definidos, de acordo com os PCN’s, podem transitar nas três

categorias e deve-se trabalhar os conteúdos de forma inter-relacionada. Essa seleção de

saberes abrange tudo aquilo que é considerado essencial pela sociedade em que o aluno vive.

Assim, nem todos os saberes participam do elenco de conteúdos, mas aqueles cuja

apropriação é considerada fundamental. (MEC, 1999)

Dentro da proposta dos PCN’s as disciplinas estão agrupadas em três segmentos:

Ciências humanas e suas tecnologias; Ciências da Natureza, matemática e suas tecnologias; e

o bloco que engloba a educação física: Linguagens, Códigos e suas Tecnologias.

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A educação física é definida nos PCN’s como “uma disciplina que deve tratar da cultura

corporal em sentido amplo: sua finalidade é introduzir e integrar o aluno a essa esfera,

formando o cidadão que vai produzir, reproduzir e também transformar essa cultura”.

Os conceitos estruturantes, competências e habilidades a serem desenvolvidas pela

educação física, estão divididos em três eixos: 1) Representação e Comunicação; 2)

Investigação e Compreensão, propicia que o aluno entenda e analise a realidade das práticas

corporais e reflita sobre o seu contexto; 3) Contextualização Sociocultural.

De acordo com Darido (1.999) : “como disciplina escolar, a educação física deverá

propiciar aos alunos que ordenem, de forma articulada, os dados de experências comuns aos

membros de uma determinada comunidade lingüística, assim como possibilitar a compreensão

da linguagem corporal como interação social que amplia o reconhecimento do outro e de si

próprio, instrumento do entendimento mútuo”.

Conforme informações contidas nos PCN’s, (...) “em função da ênfase esportiva, a

educação física tem deixado de lado importantes expressões da cultura corporal produzidas

ao longo da história do homem, bem como o conhecimento sobre o próprio corpo. Tais

expressões – as danças, as lutas, os esportes ligados à natureza, os jogos – e conhecimentos

podem e devem constituir-se em objeto de ensino e de aprendizagem”. Por exemplo, as

danças podem estar presentes com maior freqüência nas aulas de educação física.

À partir da proposta dos PCN’s, fica claro que a educação física deve valorizar e

priorizar em seus conteúdos atitudes como: “pesquisar, selecionar informações, analisar,

sintetizar, argumentar, negociar significados, cooperar, de forma que o aluno possa participar

do mundo social, incluindo-se aí a cidadania, o trabalho e a continuidade dos estudos...”

(Brandl, 2003, p. 72)

Sem dúvida que a proposição de aulas que contemplem a formação de um aluno

mais consciente das suas possibilidades enquanto cidadão já poderia estar sendo feita mesmo

antes do surgimento dos PCN’s, porém à partir da sua elaboração fica melhor definido “o

quê” trabalhar com os alunos.

Segundo os PCN’s, o ensino médio deve ser entendido como uma etapa da formação

básica especificamente pensada para alunos cujo perfil não se resumo a sua condição de

jovem, mas também é caracterizado pela condição sociocultural que define o sentido que

esses mesmos dão às experiências vivenciadas na escola. Devemos levar em consideração que

os alunos ao chegarem nas escolas de ensino médio já são portadores de saberes e praticantes

de determinadas experiências construídas em outros espaços e tempos sociais.

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As experiências trazidas pelos alunos do seu contexto social, podem e devem ser

discutidas coletivamente nas aulas de educação física, tendo em vista que as práticas corporais

desenvolvidas em clubes, academias e outros espaços, muitas vezes têm acentuada

característica mercadológica e reforça o discurso da mídia, que trata de eleger os padrões de

beleza ideais para mercantilização dos seus produtos.

Brandl (2003, p. 82) considera que à partir da elaboração dos PCN’s para o ensino

médio, houve um salto de qualidade para a educação física, tendo em vista que ela deixou de

ser tratada como uma atividade isolada dentro da escola e passou a ser uma disciplina como as

outras engajada no processo educacional.

É importante ressaltar que a utilização dos PCN’s como abordagem pedagógica não

resolverá todos os problemas da educação física escolar, porém não podemos deixar de

considerar que os parâmetros curriculares nacionais foram elaborados por autores como

Mauro Betti e Suraya C. Darido, entre outros, os quais tem vasta produção teórica e se

credenciaram ao longo dos últimos anos como importantes pensadores da educação física

brasileira.

Os PCN’s talvez não devam ser considerados como uma abordagem pedagógica, mas

como uma compilação das principais linhas de pensamento definidas ao longo das décadas de

80 e 90. Este, aliás, é um fator importante, pois, considero que cada abordagem traz consigo

elementos importantes, e uma não deve descaracterizar a outra.

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5 CONCLUSÃO Como já foi dito em algum lugar deste relato, a educação física viveu momentos de

crise nas décadas de 80 e 90, e esta crise foi objeto de muitas publicações por parte dos

principais autores da área, bem como foi motivo de muitas discussões em congressos por todo

o Brasil, o fato é que hoje vivemos uma outra época, é o momento de cada professor assumir

que modelo ou que parâmetros quer seguir, o debate histórico sobre o nosso papel dentro da

escola tem que ficar no passado, já são quase oito anos da publicação dos PCN’s e entendo

que este documento não deve ser seguido como um modelo obrigatório a todos os professores,

porém ele assegura e legitima a nossa função e a nossa importância dentro da escola.

A experiência que tive na Escola Estadual Profª Apparecida Rahal, me mostrou um

caminho interessante que pode e deve ser aperfeiçoado, mas o que fortalece um educador é

saber que está seguindo um caminho que possibilita a formação de um cidadão pleno, de uma

pessoa que conhece e tem autonomia sobre o seu corpo, que sabe de sua importância no

contexto social.

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