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TEMA 01: NECESSIDADE DE PRÉVIA AUTORIZAÇÃO LEGISLATIVA PARA A ABERTURA DE CRÉDITOS SUPLEMENTARES E ESPECIAIS. OBSERVÂNCIA AO TEXTO DA CONSTITUIÇÃO.

Matéria de cunho orçamentário-constitucional, o enfrentamento da matéria trilhará

também pela legislação infraconstitucional, mais notadamente a Lei nº 4.320/64, porém

tendo como principal vetor de orientação a CARTA DE OUTUBRO, a Constituição Federal

do Brasil.

Tal matéria fora objeto de questionamento nesta Corte de Contas, apresentando como

justificativa a seguinte circunstância fática:

O norteamento faz-se necessário, tendo em vista que há indícios que entidade municipal vinculada a esta Inspetoria Regional, tenha promovido alterações orçamentárias, de natureza de créditos especiais, na forma estabelecida no decreto municipal, sendo que no mês posterior foi aprovada a Lei Municipal, com efeito retroativo ao mês anterior, contemplando as novas dotações implementadas ao orçamento municipal. (grifos nossos)

Delineados os contornos da controvérsia, segue breve digressão doutrinário

jurisprudencial.

I – DA INTRANSPONÍVEL OBSERVÂNCIA AO COMANDO CONSTITUCIONAL

Ab initio, cumpre anotar que é de clareza solar que o art. 167, inciso V apresenta um

comando expresso, acerca da controvérsia:

Art. 167. São vedados:

V - a abertura de crédito suplementar ou especial sem prévia autorização legislativa e sem indicação dos recursos correspondentes;

O comando constitucional, portanto, é de que a abertura de créditos suplementares e

especiais deve ser, de forma inequívoca, precedida de prévia autorização legislativa, o

que sepulta qualquer possibilidade de Lei autorizativa posterior aos Decretos editados

pelo Executivo, ou ainda, de edição de leis com efeito retroativo com o fito de alcançar os

referidos decretos do Executivo anteriormente baixados.

Nesta toada, os decretos de abertura de créditos especiais, presentes na circunstância

fática retromencionada, apresentam uma peculiaridade, na medida em que se destinam a

inserção de novas dotações orçamentárias não previstas, originariamente, na Lei

Orçamentária Anual – LOA; o que carece, à luz do claro comando constitucional, de uma prévia autorização legislativa para tal inserção.

O que subjaz o comando constitucional retromencionado é o respeito e a observância de

PRÉVIA LEI, espécie normativa constante do art 59 da CF, de uso exclusivo do Poder

Legislativo, que tem a característica de generalidade e abstração, e tem como desiderato

inovar a ordem jurídica, possuindo o poder de obrigar a todos (erga omnes).

A prerrogativa da referida espécie normativa é do Poder Legislativo, e neste caso a

autorização do referido poder para a inserção de novas dotações orçamentárias, através

de créditos especiais, visa a consolidação da independência dos poderes esculpida na

Constituição Federal de 1988, em seu artigo 2º, dispositivo constitucional este que

consagra o Princípio da Separação de Poderes no Estado brasileiro ao dispor que são

Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o

Judiciário.

Não é despiciendo registar que a arquitetura constitucional brasileira, que tem uma das

suas maiores premissas a distribuição tripartite, não autoriza a adoção de um modelo de

Estado dotado de poderes totalmente independentes, e sim reclama uma atuação eficaz e

harmônica, inclusive com mecanismos que permitam uma efetivação dos direitos

fundamentais, que, em última ratio, cabe ao Poder Judiciário, quando provocado, adotar

medidas para que estes direitos não se traduzam apenas em meros anunciados sem

nenhuma eficácia.

Tal projeção constitucional caminha na direção das célebres lições do prof. JOSÉ

AFONSO DA SILVA, que aduz em sua obra:

“cabe assinalar que nem divisão de funções entre órgãos do poder nem sua independência são absolutas. Há interferências, que visam ao estabelecimento de um sistema de freios e contra pesos, à busca do equilíbrio necessário à realização do bem da coletividade e indispensável para evitar o arbítrio e o desmando de um em detrimento do outro e especialmente dos governados”.1 (grifo nosso)

Nesta linha de intelecção, a abertura de créditos suplementares e especiais sem lei

anterior revela a inobservância do Poder Executivo a uma prerrogativa inerente ao Poder

Legislativo, na função e poder típicos de legislar, calcados no Princípio da Especialidade.

Ainda na seara constitucional, se deve pontuar que a função primordial da Lei

Orçamentária é a salvaguarda do princípio da prévia autorização, com o fito de evitar

quaisquer abusos pelo Executivo na abertura de créditos suplementares e especiais, e

cabe, por sua vez, a esta Corte de Contas, em seu papel fiscalizatório, atribuído pela Lex

Legum, em consagração ao Princípio do Controle, realizar a análise da execução

orçamentária com base no que determina a Lei do Orçamento municipal, oriunda da

manifestação coletiva dos Edis; sendo ilegal qualquer movimentação orçamentária sem a

apreciação prévia da CASA DAS LEIS.

Poder Legislativo este que cumpre importante papel fiscalizatório das ações do Executivo,

através da aprovação e do acompanhamento da Lei Orçamentária, que, por sua vez, não

apresenta conteúdo meramente formal. Com sua eloquência ímpar, BECKER2 conclui o

seguinte sobre a natureza jurídica da lei orçamentária:

“A regra jurídica que aprova o Orçamento Público é a regra de Direito Positivo na qual se concentra o mais intenso grau de positividade; ela é, a priori, a mais constitucional das regras jurídicas. Reconheceu Gustavo Ingrosso que a lei orçamentária (regra jurídica que aprova o Orçamento Público) é a mais importante dentre todas as leis de organização, e concluiu que ela (a lei orçamentária): "contempla toda a inteira administração do Estado, e também a função legislativa e a função jurisdicional; de todas é um instrumento jurídico indispensável: com efeito, ela a todas põe em movimento. Ora, sendo a sua função assim vasta e complexa e fundamental para a vida do Estado, decorre, como razão preliminar e sintetizadora, a conclusão de que o Orçamento Público não pode ser reduzido às modestas proporções de um plano contábil ou de um simples ato administrativo. Em vez disso, ele é o maior produto da função legislativa para fins do ordenamento jurídico e da atividade funcional do Estado". (grifo nosso)

1 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros Editores, 30ª Ed, 2009, p. 110.2 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário, Ed. Lejus, 12ª. ed, 1998, pgs. 230 e231.

O orçamento se constitui, portanto, em um diploma normativo de natureza jurídica material, criador de direitos e que inova na ordem jurídica, apresentando todas as

características de uma lei, quais sejam: “a impossibilidade de que suas normas sejam

derrogadas ou modificadas por simples regulamentos e a possibilidade de modificar e até

derrogar as normas precedentes de hierarquia igual ou inferior”; sendo necessária a fiel

observância pelo Executivo aos dispositivos contidos na LOA.

Parafraseando as palavras do célebre jurista espanhol Saiz de Bujanda (1988)3, o

orçamento é “lei em sentido pleno, de conteúdo normativo”, e tem “eficácia material

constitutiva e inovadora”, e neste caso Lei prévia é condição anterior e sine qua non para

abertura de créditos suplementares e especiais.

II – DA NECESSÁRIA ATENÇÃOÀ LEI Nº 4.320/64

No âmbito infraconstitucional, a Lei nº 4.320/64, conhecida como Lei Geral do Direito

Financeiro, antes da edição da CARTA MAGNA, já estabelecia:

Art. 42. Os créditos suplementares e especiais serão autorizados por lei e abertos por decreto executivo

A leitura do comando da Lei traz a inequívoca necessidade de lei para abertura de

créditos suplementares e especiais, lei esta, portanto, anterior à data de emissão/edição

dos decretos, e este é o único procedimento, inclusive admitido doutrinariamente, como

por exemplo, se extrai nas célebres de lições do Prof. J. TEIXEIRA MACHADO e HERAL

DO DA COSTA REIS em obra conjunta:

Assim, toda vez que ficar constatada a inexistência ou a insuficiência orçamentária para atender a determinada despesa, o Executivo terá a inciativa das leis que autorizem os créditos adicionais, especiais e suplementares e, posteriormente à sua aprovação pelo Legislativo, efetivará sua abertura por decreto.4 (grifo nosso)

3 BUJANDA, Fernando Sainz de. Lecciones de Derecho Financiero, 6ª ed. Universidad Complutense, Madrid,1988.4 MACHADO JR., José Teixeira. REIS, Heraldo da Costa. A Lei 4.320 comentada. 31 ed. rev. Atual. Rio

de Janeiro, IBAM, 2002/2003. p 111

E crava, por fim, os renomados autores, na linha de análise deste opinativo jurídico:

Ocorre, no entanto, que o limite fixado para a abertura dos créditos suplementares pode esgotar-se, Nesse caso, então, o Executivo terá necessidade de pedir autorização ao Legislativo, ou tantas autorizações quantas forem necessárias para abertura de novos créditos suplementares.5

A jurisprudência nesta Corte de Conta é uníssona em relação a prévia autorização

legislativa para abertura de créditos suplementares, inclusive não admitindo a prática, como no caso em tela, de lei orçamentária com efeitos retroativos. Assim já se

manifestara o Pleno, como, por exemplo, no processo de Denúncia nº 02209/00:

Quando à conduta do prefeito, que abriu créditos suplementares sem autorização legislativa no importe de R$78.976,00 (setenta e oito mil, novecentos e setenta e seis reais), no mês de agosto, e, objetivando legalizar essa situação, encaminhou projeto de lei à Câmara Municipal, resultando na Lei nº 1.076, de 08.11.99, a sua responsabilidade é pessoal, afronta o quanto contido no inciso V do art. 167 da Constituição da República, que exige autorização legislativa prévia para a abertura de créditos adicionais (suplementares ou especiais), o que não houve. Tanto assim é, que o gestor, ao encaminhar o projeto de lei que originou na Lei nº 1.076/99, fez constar do art. 2º que “Os efeitos desta Lei retroagem ao dia 01.08.99;” numa clara confissão de que utilizou-se de créditos suplementares nesse interregno sem a indispensável autorização legislativa. É válido salientar que a indigitada lei, conquanto não resolva a pendência, minimiza-a, dado que o ato normativo pretendeu convalidar a abertura de tais créditos reconhecendo como legítima a despesa realizada, portanto, não se trata, em verdade, de autorização porque esta há de ser sempre anterior à prática do ato; tanto é assim que, se a Lei Maior quisesse deixar ao legislador municipal a liberdade de escolher o momento para conceder a autorização, não teria se utilizado da expressão “prévia autorização”, afastando qualquer possibilidade da sua ocorrência “a posteriori”.6

Avançando no campo jurisprudencial, em brilhante voto referente ao Processo nº 6905-

1/2012, o CONSELHEIRO SUBSTITUTO LUIZ HENRIQUE LIMA do Tribunal de Contas

do Estado de MATO GROSSO, assim se pronunciara:

[...]

O apontamento realizado refere-se ao fato de que houve autorização tardia para abertura de alguns créditos adicionais. A Constituição é enfática ao enunciar em seu art. 167, V que é vedada a abertura de crédito suplementar ou especial sem prévia autorização legislativa.

5 . p 1126 Extraído em consulta ao sistema SICCO deste Tribunal de Contas.

Analisando com mais minúcia os fatos, observa-se a irregularidade dos procedimentos adotados e a tentativa de mascará-los. No que concerne à Lei no 428/2011, os eventos se sucederam da seguinte forma:

a) Em 15 de dezembro, foi feito o empenho e o pagamento no valor de R$ 100 mil para Francisco Marino Fernandes EPP;b) No mesmo dia, foi enviado o projeto de Lei no 18/2011 para o Legislativo Municipal;c) O Projeto foi aprovado em 22 de dezembro e sancionado no dia seguinte, convertendo-se na Lei no 428/2011;d) Posteriormente é publicado o Decreto no 41/2011 de abertura de crédito suplementar, que cita o número da lei, mas é datado de 1º de dezembro.

A narrativa acima evidencia o desrespeito à norma constitucional. Não se sustenta a tese da defesa invocando a possibilidade de retroatividade de lei tributária, a começar pela distinção entre direito financeiro e orçamentário e direito tributário. O Tribunal de Contas tem jurisprudência assente neste sentido (Acórdão 2.986/2006: Planejamento. LOA. Alteração. Possibilidade de alteração do limite de abertura de créditos adicionais suplementares pelo Executivo. “A nova lei somente produzirá efeitos a partir da data de sua publicação em veículo de comunicação oficial”).

Além da Constituição, nos procedimentos descritos houve violação de dispositivos da Lei no 8.666/1993, da Lei no 4.320/1964 e da Lei de Responsabilidade Fiscal. (grifo nosso)

Desta forma, à luz da doutrina e jurisprudência pátrias, e sobretudo a partir do comando

constitucional alhures mencionado, conclui-se como standard prévio, que obviamente

merece ser densificado no caso concreto, que a abertura de créditos suplementares e especiais deve ser, de forma inequívoca, precedida de prévia autorização legislativa, assim como lei posterior, nesse contexto, que busca retroagir seus efeitos para convalidar o vício pretérito, encontra óbice de um lado, nos contornos da teoria do direito, na medida em que o vício não diz respeito à formalização do ato (se

decreto ou lei), mas à sua essência, pois, como sobredito, a questão posta ultrapassa a

mera retificação da materialização do ato, que assim se afigura nulo desde a origem, o

que afeta o plano da sua validade; e de outro, nas entranhas da política, haja vista que

essa medida de regularização tomada a posteriori é mais suscetível de ser barganhada,

de ficar ao talante de ajustes, acordos e negociatas políticas que não se coadunam com a

escorreita condução dos assuntos de Estado, além de tornar ineficaz o basilar princípio

fundamental da República Federativa do Brasil, que é o da Separação dos Poderes e

seus controles recíprocos.

TEMA 02: PRESTAÇÃO DE CONTAS DE ENTIDADE CIVIL – CLUBES DE FUTEBOL

Ab initio, cabe asseverar que os clubes de futebol profissionais em sua totalidade são

empresas privadas com fins lucrativos e sem fins sociais. Assim dispõe a Lei regedora da

matéria de nº 9.615, de 24 de março de 1998, que instituiu normas gerais sobre desporto

regulamentada pelo Decreto nº 2.574/98:

Art. 27. As atividades relacionadas a competições de atletas profissionais são privativas de:

I – sociedades civis de fins econômicos;II – sociedades comerciais admitidas na legislação em vigor;III - entidades de prática desportiva que constituírem sociedade comercial para administração da atividades de que trata este artigo.

Ademais quanto aos clubes de futebol, se apresenta o seguinte cenário desenhado por

minucioso parecer exarado pelo Ministério Público Estadual do Rio Grande do Norte em

caso semelhante (divulgação ou fomento aos clubes de futebol ABC, AMÉRICA,

ALECRIM e SANTA CRUZ, através de repasse de recursos públicos):

- as competições esportivas de que participam os clubes de futebol profissionais não se resumem a mera atividade lúdica, sendo organizadas, em caráter privado, por federações e confederações de clubes, mediante o pagamento de ingressos em estádios e concessões onerosas de transmissão de rádio e televisão, visando o lucro e sem qualquer retorno para a coletividade, apenas usufruindo desse espetáculo aquelas pessoas que por ele podem pagar;

- os recursos auferidos pelos clubes e federações de futebol incorporam-se direta ou indiretamente ao patrimônio de seus sócios proprietários, empregados e jogadores;

- os recursos e interesses públicos são indisponíveis, não sendo facultado aos Gestores Públicos transferi-los a particulares no estrito interesse desses últimos e, ainda, que a discricionariedade administrativa não lhes confere o arbítrio de dispor dos recursos públicos como lhes aprouver, devendo sempre respeitar a Constituição, as leis do País e os Princípios norteadores da Administração Pública;

- não há qualquer demonstração de que o patrocínio a clubes de futebol atenda o interesse da coletividade ou de que a inserção dos dizeres “Prefeitura do Natal” ou “Governo do Rio Grande do Norte” nos uniformes dos clubes vá trazer qualquer benefício a esses Entes Públicos ou incremento turístico ao Estado;

- fere o Princípio Constitucional da Moralidade repassar recursos públicos a empresas privadas sem qualquer atuação social em detrimento do interesse da coletividade, cujas demandas sociais são muitas e urgentes, especialmente diante

do notório desajuste orçamentário e financeiro da Prefeitura do Natal e do Governo do Estado do Rio Grande do Norte, com salários de servidores atrasados, diversas categorias profissionais em greve e atividades essenciais à população prejudicadas;

Quanto a utilização de recursos públicos para fomento de um clube de futebol, ainda de

forma lapidar se manifestara o douto Ministério Público supracitado:

Considerando, também, que não é razoável que seja realizado repasse de verbas públicas a um restrito grupo de pessoas em detrimento de toda a comunidade e sem qualquer benefício desta, quando há evidente necessidade de serem alocados recursos públicos para suprir as deficiência nas áreas de educação, saúde, segurança, saneamento básico, esportes comunitários, lazer, entre outros, em todo o Estado do Rio Grande do Norte e em especial no Município de Natal;

Considerando que facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial dos entes estatais constitui ato de improbidade administrativa, tipificado no art. 10, Inc, I, da Lei nº 8.429/92;

Considerando que o patrocínio a alguns clubes do Estado em detrimento dos demais ofende o Princípio Constitucional da Isonomia e causa desequilíbrio entre as equipes;

Considerando que “é dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não-formais, como direito de cada um, observada a destinação de recursos públicos para a promoção prioritária do desporto educacional e, em casos específicos, para a do desporto de alto rendimento” (Art. 217, Inc. II, da Constituição Federal);

Considerando, por outro lado, que o incentivo governamental ao esporte não se apresenta como um fim em si mesmo e sim pelas vantagens que a prática esportiva pode representar, contribuindo para o desenvolvimento integral do indivíduo, para o exercício da cidadania, para a promoção da saúde e da educação e para a preservação do meio ambiente, vantagens essas inerentes, apenas, ao esporte de educação ou de participação, mas não ao esporte profissional;

Considerando, ainda, que o repasse de recursos públicos a clubes de futebol profissional não se afigura como incentivo ao esporte porque não traz em seu bojo as vantagens anteriormente descritas;

E conclui o Parquet:

Por fim, considerando que a Administração Pública de qualquer dos poderes do Estado deve necessariamente obedecer aos princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, nos termos do artigo 37 da Constituição da República, e que a violação de tais princípios importa

ato de improbidade administrativa, punido na forma da Lei nº 8.429/92;

Resolve RECOMENDAR ao Ilustríssimo Sr. SECRETÁRIO MUNICIPAL DE TURISMO E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO - SETURDE que anule os processos administrativos nº 051872/2010-28, 051873/2010-72 e 040199/2010-09, cujos beneficiários são o ABC Futebol Clube (R$ 130.000,00), o AMÉRICA Futebol Clube (R$ 130.000,00) e o ALECRIM Futebol Clube (R$ 100.000,00), abstendo-se de repassar recursos públicos a clubes de futebol profissionais sob qualquer forma de contratação ou convênio;

Resolve RECOMENDAR ao Excelentíssimos Senhores SECRETÁRIO DE ESTADO DO PLANEJAMENTO e CHEFE DO GABINETE CIVIL que anulem qualquer contrato ou convênio de patrocínio, divulgação ou fomento aos clubes ABC, AMÉRICA, ALECRIM e SANTA CRUZ, abstendo-se de repassar recursos públicos a clubes de futebol profissionais sob qualquer forma de contratação ou convênio; (grifos originais)

Desta forma, conclui-se prima facie que não há proteção legal para fomento a clube de futebol pelo município, não se revestindo a agremiação de futebol citada (pelo conjunto probatório apresentado), portanto, em uma “associação sem fins lucrativos”, o que possibilitaria, por exemplo, o repasse de verbas públicas através de Convênio, instrumento normativo autorizador de despesas de natureza subvencional, o que não se aplica in casu.

Aprofundando ainda o tema, a jurisprudência no âmbito das Cortes de Contas, caminha

na direção da vedação de repasse de recursos públicos a clubes de futebol7:

TCE/SC

Prejulgado 1828

… 5. Pode a Administração Municipal repassar auxílios a entidades desportivas não-profissionais, mediante prévia autorização legislativa e obediência aos ditames da Lei Federal nº 4.320/64, principalmente o disposto em seus arts. 12, §3º, I, e 16, os quais impedem a concessão de subvenções sociais a entidades desportivas profissionais, assim conceituadas no art. 27, §10, da Lei Federal nº 9.615/98, observando, contudo, as prescrições contidas no art. 26 da Lei Complementar nº 101/2000.

TCE/RS

Número : 33830200076 Exercício : 2006Recursos : 26580200080

7 Trecho de Processo de Consulta respondida pelo TCE-MT nº 4.673-6/2011

(…) a Auditada repassou valores ao GRÊMIO ESPORTIVO SAPUCAIENSE, para aplicação em projetos na área de educação esportiva, recreação e lazer, que acabaram sendo aplicados em despesas realizadas com o time de futebol profissional da entidade, sem qualquer amparo legal e/ou convenial. A Lei Orgânica Municipal não prevê qualquer possibilidade de auxílio ao desporto profissional, apenas ao desporto educacional e a promoções desportivas de clubes locais. Conforme entendimento do Tribuna de Justiça do Rio Grande do Sul e desta Corte, tais despesas configuram aplicação de recursos sem finalidade pública, pelo que é sugerida a devolução de R$ 42.375,00, aplicados nas atividades de futebol profissional do GRÊMIO ESPORTIVO SAPUCAIENSE

TCE/SP

TC-1171/005/04 – Recurso Ordinário – Irregularidade de prestação de contas.Condenação de beneficiária juntamente com ex-Prefeito a restituírem os valores devidos. Jurisprudência. Conhecido e não provido. Outrossim, alertou aos interessados que, conforme vem decidindo este Tribunal em casos análogos, a concessão de futuros auxílios/subvenção só será admitida no caso de a entidade comprovadamente demonstrar e permanecer sem finalidade lucrativa e dedicada exclusivamente ao esporte amador – DOE: 15.9.2005.

TCE/PR

Tribunal de Contas do Estado do Paraná - Resolução n. 8622/98, por unanimidade, sessão de 23/6/98).

Consulta. Impossibilidade de o município prestar ajuda financeira a particulares, anão ser nos casos específicos do artigo 19 da Lei n. 4.320/64, dentre os quais nãose enquadra clube de futebol. Tal ajuda implicaria em desvio de finalidade.

É digno de nota que, apesar da previsão constitucional específica neste Estado, amparada pela Constituição Federal (art. 217, inciso II), não se pode admitir a concessão de recursos públicos sem a demonstração de sua finalidade e, principalmente, sem a devida e regular prestação de contas, sob pena de violação aos princípios republicanos e democráticos, tão caros à nossa sociedade.

Neste rastro, considera-se ilegal a previsão de repasse de recursos públicos como prêmio ou incentivo, haja vista que a simples previsão para concessão de recursospúblicos nestes casos, sem a regulamentação de quais despesas poderão ser custeadas com o dinheiro público e sem previsão sobre a prestação de contas, viola o princípio da publicidade, moralidade, impessoalidade e obrigatoriedade na prestação de contas. Da mesma forma e pelas mesmas razões, considera-se é ilegal a previsão para concessão de recursos públicos para cobrir despesas genéricas. (grifos nossos)

A Assessoria Jurídica deste tribunal de contas, em outros processos envolvendo a matéria

(vide por exemplo, Processo TCM nº 00751)-14, já traçara os vetores de orientação para

repasse de recursos municipais a entidades desportivas sem fins lucrativos, na

seguinte direção:

Ab initio, cabe asseverar que a Resolução TCM n° 1121/05, norma que “dispõe sobre a fiscalização, pelo Tribunal de Contas dos Municípios, de recursos repassados pelo Município a entidades civis sem fins lucrativos”, estabelece nos seus dispositivos iniciais, arts. 1° e 2°, os requisitos indispensáveis para o repasse de recursos municipais a entidades civis:

Art. 1º O repasse de recursos por órgãos ou entidades da administração direta ou indireta municipal a entidades civis sem fins lucrativos, reconhecida por lei municipal como de utilidade pública, a título de subvenção ou auxílio, observará o quanto disposto nos arts. 16 e 17 da Lei Federal nº 4.320/64 e art. 26 da Lei Complementar nº 101/00.

Art. 2º A transferência de recursos a que se refere o artigo anterior dar-se-á mediante convênio, acordo, ajuste ou outros instrumentos congêneres e dependerá de prévio empenho da despesa, devendo a movimentação financeira realizar-se entre instituições bancárias da rede oficial, ressalvados os casos previstos em lei.

Desta forma é imperioso reconhecer que para a consecução do repasse retromencionado, a título de subvenção ou auxílio, se faz necessário a presença dos seguintes requisitos extraídos na norma acima consignada:

- a entidade civil não deve visar fins lucrativos, assim como deve ser reconhecida como de utilidade pública, através de lei municipal;

- os recursos repassados realizar-se-ão através de convênio, acordo, ajuste ou outros instrumentos congêneres, dependendo de prévio empenho da despesa, assim como devendo a movimentação financeira realizar-se entre instituições bancárias da rede oficial.

Cumpridos os requisitos acima discriminados, não há ilegalidade, à luz da Resolução TCM n° 1121/05, no repasse de recursos municipais a entidades civis; não oferecendo esta norma quaisquer exceções em face do objetivo aludido na exordial: “repasse de recursos municipais a entidades civis para a prática e/ou manutenção de eventos esportivos, pagamentos de serviços a arbitragem, despesas com hospedagem de atletas, aquisição de material esportivo, dentre outros”.

Avançando no plano normativo, anota realçar que a Lei n° 4.320/64 estabelece no art. 16:

Fundamentalmente e nos limites das possibilidades financeiras a concessão de subvenções sociais visará a prestação de serviços essenciais de assistência social, médica e educacional, sempre que a suplementação de recursos de origem privada aplicados a esses objetivos, revelar-se mais econômica.

Desta forma, o diploma infraconstitucional de Direito Financeiro condiciona o repasse a serviços essenciais de assistência social, médica e educacional, e neste caso, os gastos promovidos com a prática do DESPORTO, apresentam

como fim a cobertura de despesas de custeio da entidade beneficiada, cujo desiderato é a valorização do futebol amador. Ou seja, a Lei permite o repasse a serviços na área educacional, e neste caso se pode concluir que o fim “educacional” guarda relação direta com a prática do DESPORTO, integrando as despesas com hospedagem, material esportivo e outros, incorridas pela Liga Feirense de Desporto, ao modus operandi da prática esportiva

Impende destacar que in casu sub examinem se revela adequado o enquadramento do objeto do Termo de Convênio, “Cooperação financeira para pagamento de material de consumo visando a realização da 1ª fase do Campeonato Intermunicipal de futebol amador, referente a edição 2013”, ao regramento normativo supracitado, mais notadamente à prática educacional, que contempla, por sua vez, a prática do Desporto; inclusive tendo este parecerista já se manifestado, através do Processo TCM nº 03178-14, nos seguintes termos: […]

[…] Logo, as despesas descritas às pág. 274/280 do relatório exarado pela Unidade Técnica, além de, pelos motivos retromencionados, estarem enquadradas aos objetivos delineados pela Lei nº 4.320/64 quanto ao repasse de recursos municipais às entidades subvencionais, se amoldam, também, perfeitamente aos gastos incorridos com a prática do Desporto amador. (grifos originais)

Se reveste, portanto, de ILEGALIDADE, IRRAZOABILIDADE e ILEGITIMIDADE a

atuação da governo municipal no sentido de abrir seus cofres para manter, ainda que

temporariamente, clubes de futebol profissional, não obstante ao fato de que as

administrações dessas entidades não podem e não devem sofrer influências da

Administração Pública, muito menos receber verbas para manutenção/fomento, assim

como “o repasse de recursos públicos a clubes de futebol profissional não se afigura

como incentivo ao esporte”, diante da ausência das “vantagens que a prática esportiva

pode representar, contribuindo para o desenvolvimento integral do indivíduo, para o

exercício da cidadania, para a promoção da saúde e da educação e para a preservação

do meio ambiente, vantagens essas inerentes, apenas, ao esporte de educação ou de

participação, mas não ao esporte profissional”, conforme aduz o Ministério Público

Estadual do Rio Grande do Norte no parecer acima consignado.

TEMA 03: RENÚNCIA DE SUBSÍDIOS

O caso submetido a esta Corte de Contas se caracteriza pela renúncia integral pelos

secretários municipais dos seus subsídios tendo em vista, o atendimento às metas

estabelecidas pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Todavia, esta renúncia fora apenas

comprovada pela administração municipal, no caso submetido a análise desta Corte de

Contas, através de “Declaração” subscrita pelos secretários, sem porém nenhum ato legal

que precedesse tal procedimento, o que careceu de análise à luz das premissas

estatuídas na CARTA DE OUTUBRO.

Ab initio, cabe asseverar o que dispõe a Instrução TCM n° 001/04 (alterada pelas

Instruções TCM n° 001/06, 01/2011 e 01/2012), na direção do mandamento constitucional

previsto no art. 37, X da CARTA DE DIREITOS e do art. 34, § 4° da Constituição do

Estado da Bahia:

I – DA FIXAÇÃO DOS SUBSÍDIOS

2. Os subsídios dos Prefeitos, Vice-Prefeitos, Vereadores e Secretários Municipais serão obrigatoriamente fixados, em valores absolutos, por Lei de iniciativa da Câmara Municipal. (grifos nossos)

De plano, portanto, insta acentuar que a legalidade na definição/alteração na

remuneração dos subsídios dos agentes públicos supracitados terá como vetor de

orientação a edição de LEI ESPECÍFICA, instrumento normativo adequado para o fim acima citado. Assim, portanto, dispõe a CARTA MAGNA:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

X - a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) (grifo nosso)

Em que pese a renúncia de subsídios não se amolde precisamente nas expressões

constitucionais de “fixação” ou “alteração”, e que se possa sustentar que a renúncia seja

uma espécie de alteração do modus de definição do subsídio ou até mesmo alteração

deste, a Segurança Jurídica, como corolário legal de sedimentação da harmonia e equilíbrio das instituições, remete à necessidade de edição de LEI ESPECÍFICA, e

esta tem sido a linha de intelecção do Supremo Tribunal Federal - STF em inúmeras

ocasiões, que se pronunciara acerca do fato, na seguinte direção:

As resoluções da Câmara Distrital não constituem lei em sentido formal, de modo que vão de encontro ao disposto no texto constitucional, padecendo, pois, de patente inconstitucionalidade, por violação aos arts. 37, X; 51, IV; e 52, XIII, da CF.” (ADI 3.306, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 17-3-2011, Plenário, DJE de 7-6-2011.)

"Em tema de remuneração dos servidores públicos, estabelece a Constituição o princípio da reserva de lei. É dizer, em tema de remuneração dos servidores públicos, nada será feito senão mediante lei, lei específica. CF, art. 37, X; art. 51, IV; art. 52, XIII. Inconstitucionalidade formal do Ato Conjunto 1, de 5-11-2004, das Mesas do Senado Federal e da Câmara dos Deputados. Cautelar deferida." (ADI 3.369-MC, Rel. Min. Carlos Velloso, julgamento em 16-12-2004, Plenário, DJ de 1º-2-2005.) No mesmo sentido: AO 1.420, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 2-8-2011, Primeira Turma, DJE de 22-8-2011; ADI 3.306, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 17-3-2011, Plenário, DJE de 7-6-2011. (Grifos nossos)

Desta forma, a Corte Constitucional é categórica ao afirmar que “em tema de remuneração dos servidores públicos, nada será feito senão mediante lei, mais notadamente através de lei específica”.

Quanto ao posicionamento da doutrina, esta é majoritária acerca do indispensável

respeito ao PRINCÍPIO DA RESERVA LEGAL; e neste caso releva notar as sempre

precisas lições do PROF. UADI LAMMÊGO BULOS8:

Agora, tanto a remuneração como o subsídio só podem ser fixados ou alterados por lei ordinária determinada para esse fim. Excluem-se, pois a possibilidade do uso de medidas provisórias bem como a adoção de resoluções administrativas. (grifo nosso)

8 BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. 6. ed rev. e atual. - São Paulo:Saraiva, 2011, p. 1034.

Retornando, mais uma vez, ao âmbito jurisprudencial, em decisão do Supremo Tribunal

Federal, através da Ministra CARMEN LÚCIA, remetendo à jurisprudência consolidada na

referida Corte, em face de uma possível colisão entre os arts. 29, inciso VI e 37, X, firmara

o seguinte entendimento:[…] O exame da presente causa evidencia que o acórdão ora impugnado diverge da diretriz jurisprudencial que esta Suprema Corte firmou na análise da matéria em referência. Sendo assim, pelas razões expostas, conheço e dou provimento ao presente recurso extraordinário (CPC, art. 557, § 1º-A), em ordem a julgar procedente a ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul (DJ 22.6.2011, grifos nossos). E: RE 440.429/MG, Relator o Ministro Ayres Britto, decisão monocrática, DJ 8.2.2010. 7. Na mesma linha foi o parecer da Procuradoria Geral da República: 2. A questão de fundo está em saber se é possível a fixação de subsídios dos vereadores mediante resolução da própria Câmara Municipal, como sustenta a recorrente, ou se há necessidade de aprovação de lei em sentido estrito. E, bem examinada a questão, tem-se que a pretensão recursal não merece ser acolhida, pois a Corte local, ao decidir como decidiu, adotou entendimento que se harmoniza com a jurisprudência da Suprema Corte a respeito da remuneração de agentes públicos. Com efeito, o Supremo Tribunal Federal possui firme orientação no sentido de submeter à reserva absoluta de lei a matéria relativa à fixação de remuneração de agentes públicos. A esse respeito, confira-se o aresto proferido no RE-AgR nº 494.253/SP (Rel. Exma. Sra.Min. Ellen Gracie, DJe 15.03.2011), assim ementado: 3. Como se vê, a fixação da remuneração dos vereadores - agentes políticos municipais - deve observar as prescrições contidas na Carta Magna. E a interpretação sistemática que se faz da Constituição Federal, a partir da leitura do art. 37, inciso X ,c/c art. 39, § 4º, leva à conclusão de que é imprescindível lei em sentido estrito para fixar o subsídio de vereadores.(...) 4. Assim, a despeito de o art. 29, inciso VI, da CF/88 nada dispor expressamente a respeito da necessidade de lei para o fim de fixar o subsídio de vereadores, a interpretação conjunta dos arts. 37, inciso X, e 39, § 4º, da Lei Maior, não permite outra conclusão a não ser a que reputa indispensável lei em sentido estrito para regular a matéria. Nada há a prover quanto às alegações da Recorrente. 8. Pelo exposto, nego seguimento a este recurso extraordinário (art. 557, caput, do Código de Processo Civil e art. 21, § 1º, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal). Publique-se. Brasília, 1º de agosto de 2013. Ministra CÁRMEN LÚCIA. Relatora (grifos nossos)

Logo, a INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA que se faz da Constituição Federal, a partir da

leitura do art. 37, inciso X c/c art. 39, § 4º, esta inclusive utilizada pelo STF, leva à conclusão de que é imprescindível lei em sentido estrito para fixação, alteração e até mesmo renúncia de subsídio por parte dos agentes políticos, e no caso

específico da renúncia, a LEI apresenta o cóndão de disciplinar o período/mês da adoção

do procedimento de contenção de despesa, evitando, desta forma, inclusive, demandas

judiciais futuras propostas por tais agentes que poderiam alegar um possível

enriquecimento ilícito da administração, gerando, de outro giro, prejuízo aos cofres

públicos.

Outro aspecto importante é que o Poder Legislativo apreciaria as razões de tal proposta

de renúncia de subsídios, realizada pelo Executivo através de Projeto de Lei,

consolidando, portanto, o “sistema de freio e contrapesos” - Checks and Balances (que se

originara do princípio dos poderes harmônicos e independentes), o qual os atos gerais,

praticados exclusivamente pelo Poder Legislativo, consistentes na emissão de regras

gerais e abstratas, limita o Poder Executivo, que só pode agir mediante atos especiais,

decorrentes da norma geral; não se podendo olvidar que com o fito de coibir a

exorbitância de qualquer dos poderes de seus limites e competências, ainda dar-se-á a

ação fiscalizadora do Poder Judiciário.

Recorrendo mais uma vez a doutrina, quanto ao supracitado "remédio supremo" 9 aos

desmandos de um determinado Poder, urge ressaltar as lições do Prof. AUGUSTO

ZIMMERMANN:

[…] a separação de poderes e o Checks and Balances seriam perfeitamente compatível com o Estado democrático, limitando-se o poder, mas garantido-se a plena liberdade política dos indivíduos e do direito das minorias. Possibilita, de igual forma, a formação do Estado de Direito, na medida em que ele previne o abuso governamental submetendo-se governantes e governados ao rule of law, donde ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de prévia determinação legal...10

A necessidade de LEI ESPECÍFICA, conforme alhures enfrentado, tendo guarida em

sólida jurisprudência do STF, visa a concretização da Democracia, do Princípio da

República, e sobretudo, do Estado Constitucional, que consoante lições de KARL

LOEWENSTEIN11, se distingue da autocracia, e se consubstancia no princípio da

distribuição do poder, que apenas se aperfeiçoa na medida em que vários e

independentes detentores de poder participam da formação da vontade estatal,

submetidos todos a controles; ou seja, para o referido autor, a existência de uma

sociedade estatal baseada na liberdade e na igualdade, consequentemente pluralista, é

correlata do constitucionalismo.9 HAMILTON, Alexander; JAY, John e MADISON, James. O Federalista. 2ª Edição. Campinas: Russell

Editores, 2005, p. 72.10 ZIMMERMANN, Augusto. Teoria Geral do Federalismo Democrático. 2ª Edição. Rio de Janeiro:

Lumen Juris, 2005.11 LOEWENSTEIN, Karl. Teoria da la Constitución. Trad: Alfredo Gallego Analbitarte. Barcelona: Editorial

Ariel, 1976.

Por fim, cabe asseverar que a importância de LEI ESPECÍFICA para fixação, alteração e

até mesmo redução de subsídios além de se enquadrar à moldura constitucional dos

dispositivos retromencionados, e acompanhar a jurisprudência no seio da Corte

Constitucional - STF, visa, indubitavelmente, oferecer, através da perspectiva do Checks

and Balances, uma solução essencial para que a convivência entre os poderes se revista

de um mínimo de segurança, indispensável para que se faça "ordem social", quando na

ocorrência de contrapostos interesses políticos ou até mesmo diante de divergência entre

os produtores do Direito, seja o legislador, seja o administrador, seja o magistrado, ou

quantos possam dizer autoritativamente o Direito, que integram um sistema de poder

político.

Esta Nota Técnica visa colaborar com a Presidência, Conselheiros, Ministério Público de Contas e técnicos deste tribunal na busca de decisões que se

coadunem com a Jurisprudência e Doutrina pátrias, e com vistas ao atendimento das premissas estabelecidas na Constituição Federal de 1988.