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1 UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS SUPRESSÃO DA VOGAL POSTÔNICA NÃO-FINAL: Uma tendência das Proparoxítonas na Língua Portuguesa com Evidências no Falar Sapeense ANDRÉ PEDRO DA SILVA JOÃO PESSOA 2006

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS

SUPRESSÃO DA VOGAL POSTÔNICA NÃO-FINAL: Uma tendência das Proparoxítonas na Língua Portuguesa com

Evidências no Falar Sapeense

ANDRÉ PEDRO DA SILVA

JOÃO PESSOA

2006

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS

SUPRESSÃO DA VOGAL POSTÔNICA NÃO-FINAL: Uma tendência das Proparoxítonas na Língua Portuguesa com

Evidências no Falar Sapeense

André Pedro da Silva

João Pessoa 2006

UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES

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CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS

SUPRESSÃO DA VOGAL POSTÔNICA NÃO-FINAL: Uma tendência das Proparoxítonas na Língua Portuguesa com

Evidências no Falar Sapeense

André Pedro da Silva

Prof. Dr. Dermeval da Hora

(Orientador)

João Pessoa 2006

SUPRESSÃO DA VOGAL POSTÔNICA NÃO-FINAL: Uma tendência das Proparoxítonas na Língua Portuguesa com

Evidências no Falar Sapeense

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André Pedro da Silva

Dissertação de Mestrado apresentada à coordenação do Curso de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal da Paraíba, em cumprimento às exigências para obtenção do Grau de mestre em Língua Portuguesa.

João Pessoa 2006

SUPRESSÃO DA VOGAL POSTÔNICA NÃO-FINAL: Uma tendência das Proparoxítonas na Língua Portuguesa com

Evidências no Falar Sapeense

André Pedro da Silva

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Dissertação aprovada em: 24 de abril de 2006.

Examinadores:

________________________________________ Dermeval da Hora Oliveira

(Orientador)

________________________________________ Marígia Ana de Moura Aguiar

(1ª Examinadora)

_________________________________________ Marianne Carvalho Bezerra Cavalcante

(2ª Examinadora)

JOÃO PESSOA 2006

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“The key to a rational conception of

language change – indeed, of language

itself – is the possibility of describing

orderly differentiation in a language

serving a community”.

Weinreich, Labov e Herzog, (1968, 101)

DEDICATÓRIA

A Deus, pai onipotente, sempre presente em minha vida, dando-me

força e coragem para ultrapassar as barreiras no decorrer deste

trabalho.

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A Margarida Targino e José Maria, meus pais, pelo apoio e

incentivo constantes.

Às grandes mestras e amigas, Juliene Pedrosa e Rosângela Neres,

pela importante e especial amizade, as quais sempre se

dispuseram, de forma constante e fundamental, a me “socorrer” em

momentos difíceis deste trabalho.

A todos os meus amigos que contribuíram, das mais diversas

formas, na execução deste.

AGRADECIMENTOS

Ao Professor Dr. Dermeval da Hora, pela orientação, oportunidade, confiança, incentivo, amizade e, principalmente, por acreditar no meu trabalho e representar meu principal exemplo de pessoa, mestre e pesquisador.

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), pelo apoio financeiro que me proporcionou dedicação exclusiva a este trabalho.

À Coordenação de Pós-Graduação em Letras, pelo incentivo e colaboração.

Às Professoras Mônica Nóbrega e Marianne Cavalcante pela assídua assistência e cooperação.

A Maria Aparecida e Veralúcia – respectivamente, secretária do VALPB e secretária do GELNE – que inúmeras vezes pela dedicação e preocupação mais se assemelharam a mães.

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Às grandes amigas Sílvia Ribeiro e Fernanda Rosário Mello pela importante e especial amizade, companheirismo e ajuda sempre constantes e fundamentais nos momentos difíceis durante a realização deste trabalho.

Ao Flávio, Linduarte, Caline, Anna Libia, Jailma, Waléria, Walison, Romair, Débora, Lucirene, Emmanuel, Andréa, Carol e, em especial, a Wilson Eduardo, por fazerem dos momentos difíceis, os mais amenos, graças aos momentos de distração e companheirismo e caloroso convívio.

A Rubens, Valéria Viana, Ana Clarissa, Rafaela, Renata, Marla, Greice, Anamaria, Luciana, Germana, Alessandra, Josilene, Keith Corbit, que diversas vezes não foram apenas companheiros de Projeto, mas fiéis e valiosos amigos, os quais guardarei no meu coração para sempre.

Aos grandes amigos Wagner Luiz e Matheus Coller pelo precioso auxílio na codificação dos dados e transposições das gravações de MD para CD, respectivamente.

A Graça e Madja, duas pessoas maravilhosas, que sempre acreditaram em mim e deram-me, no momento certo, o fôlego necessário aos estudos.

A Renilde Pereira e Ramos Lins, grandes amigos e companheiros de trabalho, por acreditarem em minha capacidade e sempre me incentivarem.

Aos informantes que compuseram meu corpus, por terem sido tão receptivos e agradáveis, não havendo imposição destes, em momento algum, às etapas da realização das entrevistas.

SUMÁRIO

LISTA DE QUADROS, TABELAS E GRÁFICOS ......................................................

xi

RESUMO ..........................................................................................................................

xiv

ABSTRACT ......................................................................................................................

xv

INTRODUÇÃO ............................................................................................................... xvi 1 OBJETO DE ESTUDO .............................................................................................

01 1.1 A SÍNCOPE .............................................................................................................

02

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1.2 PROCESSO DE ENFRAQUECIMENTO SILÁBICO ............................................ 05

2 METODOLOGIA ......................................................................................................

07 2.1 SELEÇÃO DOS INFORMANTES ..........................................................................

08 2.2 POPULAÇÃO E AMOSTRA ..................................................................................

08 2.3 COLETA DE DADOS .............................................................................................

10 2.4 DEFINIÇÃO OPERACIONAL DA VARIÁVEL ...................................................

11 2.4.1 Variável dependente ..............................................................................................

11 2.4.2 Variável independente ...........................................................................................

12 2.4.2.1 Variáveis extralingüísticas ..................................................................................

12 2.4.2.1.1 Sexo ................................................................................................................ 13 2.4.2.1.2 Faixa etária ..................................................................................................... 14 2.4.2.1.3 Anos de escolarização .................................................................................... 15 2.4.2.2 Variáveis estilísticas ........................................................................................... 16 2.4.2.3 Variáveis extralingüísticas .................................................................................. 16 2.4.2.3.1 Contexto fonológico precedente ...................................................................... 17 2.4.2.3.2 Contexto fonológico seguinte .......................................................................... 17 2.4.2.3.3 Traço de articulação da vogal .......................................................................... 18 2.4.2.3.4 Estrutura da sílaba ........................................................................................... 18 2.4.2.3.5 Extensão da palavra ......................................................................................... 19 2.5 LEVANTAMENTO E CODIFICAÇÃO DOS DADOS .........................................

19 2.5.1 Método de análise: o programa VARBRUL .........................................................

19

3 A SOCIOLINGÜÍSTICA: TEORIAS E PERSPECTIVAS .................................. 23

3.1 BREVE HISTÓRICO DA SOCIOLINGÜÍSTICA .................................................. 24

3.2 MUDANÇA DE LÍNGUA ....................................................................................... 39

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4 ESTRUTURA PROSÓDICA DO PORTUGUÊS ..................................................

41 4.1 SÍLABA ...................................................................................................................

42 4.2 CONDIÇÕES DE BOA-FORMAÇÃO ...................................................................

44 4.3 O ACENTO .............................................................................................................

46 4.3.1 O acento latino e sua natureza no período clássico ..............................................

47 4.3.2 Particularidade do acento .....................................................................................

49 4.3.3 O pé silábico ..........................................................................................................

50 4.4 AS VOGAIS E SUAS CARACTERÍSTICAS NO PB ............................................

51 4.4.1 A regra variável de redução da postônica não-final .............................................

55

5 ANÁLISE DOS DADOS ........................................................................................... 56

5.1 FATORES SOCIAIS ............................................................................................... 57

5.1.1 Anos de escolarização ........................................................................................... 58

5.1.2 Faixa etária ............................................................................................................ 60

5.1.3 Sexo ....................................................................................................................... 62

5.2 FATORES ESTILÍSTICOS ..................................................................................... 64

5.2.1 Tipo de entrevista .................................................................................................. 65

5.3 FATORES LINGÜÍSTICOS .................................................................................... 67 5.3.1 Contexto fonológico seguinte ...............................................................................

68 5.3.2 Contexto fonológico precedente ...........................................................................

69 5.3.3 Extensão da palavra ..............................................................................................

71 5.3.4 Estrutura da sílaba .................................................................................................

72 5.3.5 Traço de articulação da vogal ...............................................................................

74 6 CRUZAMENTO DAS VARIÁVEIS ....................................................................... 76

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7 CONFRONTO COM OUTROS TRABALHOS .................................................... 82 7.1 FATORES EXTRALINGÜÍSTICOS ...................................................................... 83 7.2 FATORES LINGÜÍSTICOS ................................................................................... 84

8 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 88 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA ............................................................................ 95 ANEXOS ......................................................................................................................... 101 Anexo 1 - FORMAÇÃO DO CORPUS ........................................................................... 102 Anexo 2 - FICHA SOCIAL DO INFORMANTE ............................................................ 103 Anexo 3 - LEITURA DAS PALAVRAS NO TEXTO .................................................... 104 Anexo 4 - FIGURAS UTILIZADAS NAS ENTREVISTAS .......................................... 105 Anexo 5 - PERGUNTAS PARA OBTENÇÃO DAS PROPAROXÍTONAS ................. 113 LISTA DE QUADROS, TABELAS E GRÁFICOS

QUADRO 1 – CARACTERIZAÇÃO DOS INFORMANTES ............................. 09 QUADRO 2 – COMPARAÇÃO ENTRE OS DIALETOS CARIOCA vs

SAPEENSE NO ESTILO FORMAL ...........................................................................

53

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QUADRO 3 – COMPARAÇÃO ENTRE OS ESTILOS FORMAL E

INFORMAL .................................................................................................................... 54

QUADRO 4 – COMPARAÇÃO ENTRE OS ESTILOS FORMAL E

INFORMAL NOS DIALETOS CARIOCA E SAPEENSE .....................................

54

QUADRO 5 – OS FATORES INFLUENCIADORES NO APAGAMENTO

DA VOGAL POSTÔNICA NÃO-FINAL EM VOCÁBULOS

PROPAROXÍTONOS .................................................................................................... 92

TABELA 1 – ANOS DE ESCOLARIZAÇÃO (Apagamento da vogal postônica

não-final) ............................................................................................................................

59

TABELA 2 – FAIXA ETÁRIA (Apagamento da vogal postônica não-final) ..............

61

TABELA 3 – SEXO (Apagamento da vogal postônica não-final) ................................

64

TABELA 4 – TIPO DE ENTREVISTA (Apagamento da vogal postônica não-

final) .................................................................................................................................. 67

TABELA 5 – CONTEXTO FONOLÓGICO SEGUINTE (Apagamento da vogal

postônica não-final) ...........................................................................................................

68

TABELA 6 – CONTEXTO FONOLÓGICO PRECEDENTE (Apagamento da

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vogal postônica não-final) .................................................................................................

70

TABELA 7 – EXTENSÃO DA PALAVRA (Apagamento da vogal postônica não-

final) ...................................................................................................................................

71

TABELA 8 – ESTRUTURA DA SÍLABA (Apagamento da vogal postônica não-

final) ...................................................................................................................................

73

TABELA 9 – TRAÇO DE ARTICULAÇÃO DA VOGAL (Apagamento da vogal

postônica não-final) ...........................................................................................................

74

TABELA 10 – CRUZAMENTO FAIXA ETÁRIA vs ESCOLARIZAÇÃO

(Apagamento da vogal postônica não-final) ......................................................................

76

TABELA 11 – CRUZAMENTO SEXO vs ESCOLARIZAÇÃO (Apagamento da

vogal postônica não-final) .................................................................................................

78

TABELA 12 – CRUZAMENTO SEXO vs FAIXA ETÁRIA (Apagamento da

vogal postônica não-final) .................................................................................................

80

GRÁFICO 1 – CONTEXTO FONOLÓGICO PRECEDENTE (Apagamento da

vogal postônica não-final) .................................................................................................

71

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GRÁFICO 2 – CRUZAMENTO ENTRE FAIXA ETÁRIA E

ESCOLARIZAÇÃO (Apagamento da vogal postônica não-final)

..................................................................... 77

GRÁFICO 3 – CRUZAMENTO ENTRE SEXO E ESCOLARIZAÇÃO

(Apagamento da vogal postônica não-final) ......................................................................

79

GRÁFICO 4 – CRUZAMENTO ENTRE SEXO E FAIXA ETÁRIA

(Apagamento da vogal postônica não-final)

............................................................................................. 81

GRÁFICO 5 – CONFRONTO DOS DADOS DO SEXO (Apagamento da

vogal postônica não-final) .................................................................................................

83

GRÁFICO 6 – CONFRONTO DOS DADOS DA VARIÁVEL CONTEXTO

FONOLÓGICO SEGUINTE (Apagamento da vogal postônica não-final) .................

85

GRÁFICO 7 – CONFRONTO DOS DADOS DA VARIÁVEL ESTRUTURA

DA SÍLABA (Apagamento da vogal postônica não-final) ..............................................

85

GRÁFICO 8 – CONFRONTO DOS DADOS DA VARIÁVEL TRAÇO DE

ARTICULAÇÃO DA VOGAL (Apagamento da vogal postônica não-final) ..............

86

GRÁFICO 9 – INVERSÃO DA VARIÁVEL TRAÇO DE ARTICULAÇÃO

DA VOGAL (Apagamento da vogal postônica não-final) ..............................................

87

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RESUMO

Esta pesquisa foi realizada com a finalidade de analisar e descrever o

comportamento lingüístico de um fenômeno bastante habitual no Brasil, e,

especificamente na cidade de Sapé - PB: a síncope da vogal postônica não-final em

vocábulos proparoxítonos (música > musca; maiúsculo > maiusclo; abóbora > abobra).

Sob a égide da Teoria da Variação Lingüística, investigamos as restrições tanto

lingüísticas quanto sociais no processo de escolha entre o apagamento ou não destes

vocábulos. Para isto, foram empregados registros de fala espontânea de 36 informantes,

estratificados socialmente com relação ao sexo, à faixa etária e à escolarização. Os

resultados estatísticos foram obtidos através do pacote de programas VARBRUL

(PINTZUK, 1988) e evidenciam que o principal grupo de fatores que determina a

aplicação do apagamento é o contexto fonológico seguinte, em que a vibrante apresenta-

se como contexto mais favorável. Entre os fatores extralingüísticos, a escolarização é o

principal fator que leva ao apagamento das vogais postônicas não-finais, quando os

menos escolarizados aparecem como maiores usuários deste fenômeno lingüístico.

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ABSTRACT

This paper analyzes the common phenomenon of syncope by speaken in the city

of Sapé, Paraíba, Brazil in post-tonic, non-final vowels in proparoxytones. Using the

Linguistic Variation Theory as a point of reference, this paper studies the specific

linguistic and social restrictions that affect the elision of said vowels. The study is

comprised of the recorded, spontaneous speech of 36 informants and the data were

coded in relation to the following independent variables: sex, age, and education. The

statistical program VARBRUL (Pintzuk, 1988) was utilized to evaluate the data. The

results show that the determining factor for elision of post-tonic, non-final vowels in

proparoxytones is the phonological context. As the results show, education and age are

factors. They show that both the older and less educated informants are more inclined

to use syncope within their speech.

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INTRODUÇÃO

As línguas atravessam vários momentos de sua evolução natural como qualquer

ser vivo, sofrendo, assim, influências, mudanças, e, conseqüentemente, ficando expostas

à variação. Com base nessa idéia de evolução é que vamos observar, em estágio de

variação, o apagamento das vogais postônicas não-finais, em que essas vogais são

sincopadas e, consequentemente, havendo ressilabação entre as sílabas restantes, ora

acontece uma mera união da sílaba precedente com a sílaba seguinte (quando é possível

manter o padrão de boa formação silábica), como, por exemplo, em árvore > arvre,

abóbora > abobra etc; ora havendo um retorno ao padrão CV, do Português Brasileiro,

como em câmara > cama, crédito > creto.

Ao retomarmos as idéias de Probo, criador do Appendix Probi, onde specullum

non speclum, dando origem à divergência entre o latim clássico e o vulgar, podemos

observar que essa simplificação na língua, que o gramático tentava corrigir, prosseguiu

livremente seu curso, na Península Ibérica, originando as palavras portuguesas espelho

(de speclum), olho (de oclum), velho (de veltum).

Apresentamos, pois, a supressão da vogal postônica não-final, exposta neste

trabalho. De acordo com Faraco (1991, p. 97), a história dos homens não é linear nem

homogênea, logo as sociedades são heterogêneas e essa heterogeneidade do social é

determinante da heterogeneidade lingüística e condicionante da mudança.

O mesmo acontece com a mudança; da variação lingüística está intrinsecamente

ligado a condições como o momento histórico em que a língua vive, o espaço

sociocultural em que se encontra e o canal lingüístico em que se comunica. Os estudos

variacionistas, tomando por base tais condicionamentos, buscam apresentar o caráter

sistemático da variação lingüística que, muitas vezes, resulta de um longo processo

evolucionário. Weinreich, Labov e Herzog (1968, p.100-1) afirmavam que: Se uma língua tem que ser estruturada para funcionar eficientemente, como as pessoas continuam falando enquanto a língua muda, isto é, enquanto passa por períodos de reduzida sistematicidade? Alternativamente, se pressões determinantes forçam a língua a mudar, e se a comunicação é

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menos eficiente nesse ínterim (como poderia dedutivamente seguir pela teoria), por que tais deficiências não podem ser observadas na prática?1

A supressão da vogal postônica não-final (como em oclus (oculus), masclus

(masculus), altra (altera), socrus (socerus)) é um fenômeno que teve início no latim

vulgar e hoje, até certo ponto, vem se difundindo na fala popular de algumas regiões do

nosso país, se é que já não esteja presente em todo o território nacional.

Há, na realidade, poucos estudos acerca do apagamento das vogais postônicas

não-finais no Brasil. Nossa pesquisa2 baseou-se no trabalho de Amaral (1999), realizado

na região sul do Brasil, na cidade de São José do Norte – RS, a partir do qual,

resolvemos fazer o levantamento de um corpus na cidade de Sapé – PB – pelo fato de já

termos um certo contato com esse município e de já haver percebido o uso dessa

variável na comunidade. Sem falar que esse fenômeno ainda não havia sido estudado, o

que nos levaria a uma pesquisa pioneira no estado.

Antes do início da coleta dos dados, algumas hipóteses foram levantadas

baseadas em observações de leituras realizadas para a elaboração do trabalho.

Referente à influência dos fatores sociais, a primeira hipótese pensada foi a de

que os falantes com mais anos de escolarização tendem a reduzir menos as

proparoxítonas em paroxítonas de que os falantes com menos anos de escolarização,

que fazem maior uso dele. Essa hipótese foi levantada por haver uma predominância

maior das formas lingüísticas padrão em falantes com mais anos de escolarização em

literatura lingüística previamente lida (PEDROSA, 2000; ALVES, 2001; SILVA, 2001).

Uma segunda hipótese levantada para os fatores extralingüísticos foi a de que as

mulheres evitam a contração das proparoxítonas mais do que os homens. Alguns

estudos sociolingüísticos confirmam essa tendência da variável sexo (PEDROSA, 2000;

MARTINS, 2001) e apresentam essa variável como detentora de um papel bastante

significativo em relação à variação e à mudança. 1 After all, if a language has to be structured in order to function efficiently, how do people continue to talk while the language changes, that is, while it passes through periods of lessened systematicity? Alternatively, if overriding pressures do force a language to change, and if communication is less efficient in the interim (as would deductively follow from the theory), why have such inefficiencies not been observed in practice? (Weinreich, Labov e Herzog, 1968, p. 100-1). 2 Vale salientar que nosso trabalho foi realizado a partir de uma visão sincrônica, pois, como falamos anteriormente, essa variação já era observada no latim, dando origem, assim, ao latim clássico e ao latim vulgar.

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Acreditamos que há uma forte tendência de variação estável em determinados

vocábulos, os quais, ao sofrerem o processo de apagamento da vogal postônica não-

final, não apresentam uma ressilabação adequada à estrutura silábica do português. Isso

se confirma em palavras do tipo lâmpada > lampda; máquina > makna; pacífico >

pacifco, etc.

Quanto à influência de fatores lingüísticos, acreditamos que todos os contextos

aqui elencados (o contexto fonológico precedente, o contexto fonológico seguinte, a

extensão da palavra, a estrutura da sílaba precedente e o traço de articulação da vogal)

estão correlacionados mais positivamente à contração, uma vez que esses contextos

foram condicionadores em outros trabalhos já realizados, como no de Amaral (1999),

em que os fatores contexto fonológico seguinte, traço de articulação da vogal, estrutura

da sílaba precedente e contexto fonológico precedente; e no de Martins (2001),

extensão do vocábulo, contexto fonológico seguinte e contexto fonológico precedente,

também foram condicionadores dos fenômenos observados pelas pesquisadoras.

Sabemos que é através da língua que se dá a interlocução social, de forma que o

emissor e o receptor (retomando o conceito acerca das funções da linguagem de

Jakobson, 1999) de uma determinada idéia exigem compreensão mútua. Esse é o

principal fator que leva as comunidades a se organizarem em torno de uma fala em

comum, de traços compartilhados e muitas especificidades.

O desenvolvimento deste trabalho, compreendendo a síncope ou a supressão da

vogal postônica não-final nos vocábulos proparoxítonos, deu-se na cidade de Sapé, com

um corpus formado por 36 informantes, residentes na zona urbana, sob a perspectiva

laboviana da Teoria da Variação e da Mudança Lingüística.

Resolvemos abordar nesta pesquisa apenas os aspectos da variação

sociolingüística, deixando, para um trabalho posterior, em nível de doutoramento, a

união desta com os dados do VALPB para análise em nível fonético-fonológico, dando-

nos, assim, um trabalho mais coeso, em termos de teoria/dados/análises/resultados e,

certamente, uma importante fonte de pesquisa, servindo também de subsídio ao ensino

da Língua Portuguesa em todos os graus.

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20

Com o intuito de desenvolver as idéias que norteiam este trabalho, o texto foi

estruturado em oito capítulos, descritos a seguir:

No primeiro capítulo, exporemos, resumidamente, o objeto de estudo, uma breve

apresentação do fenômeno da supressão da vogal postônica não-final em vocábulos

proparoxítonos, e uma rápida exposição do processo de enfraquecimento silábico,

buscando apresentar como se dá o apagamento da sílaba, tendo por base a escala de

força e a escala de sonoridade, de acordo com Katamba (1993). Paralelamente,

apresentaremos também o fenômeno e as hipóteses que norteiam este trabalho.

No segundo capítulo, explicitaremos a metodologia utilizada, delimitando o

corpus utilizado na análise (com a seleção e caracterização dos informantes), a forma

como aconteceu o levantamento do corpus, o método computacional empregado para a

rodada dos dados e, ainda, a definição operacional das variáveis dependentes e

independentes, também designadas de extralingüísticas ou sociais, que tiveram o

propósito de ratificar ou refutar as nossas hipóteses, que também serão apresentadas

neste capítulo em relação a cada fator estudado.

No terceiro capítulo, discutiremos a fundamentação teórica do nosso trabalho,

apresentando um breve levantamento histórico acerca de como se deu a síncope no

latim e alguns pensamentos sobre a Linguagem no século XX. Enfocaremos, ainda no

século XX, os primeiros estudos que relacionaram a Língua e o Social e o advento da

Sociolingüística Quantitativa, que enfatiza o envolvimento dos fatores extralingüísticos

no fenômeno da mudança lingüística e os problemas das restrições apresentados por

Weinreich, Labov e Herzog (1968).

No quarto capítulo, versaremos sobre a estrutura prosódica do português,

abordando as sílabas, os princípios de boa-formação, que condicionam o apagamento da

postônica não-final em palavras proparoxítonas, o acento e as vogais do português

brasileiro, dando uma visão geral dos fatores que, até certo ponto, acarretam esse

fenômeno.

No quinto capítulo, descreveremos os resultados e procedemos da análise

quantitativa dos dados, explicitando as variáveis lingüísticas e extralingüísticas que

foram selecionadas pelo VARBRUL como relevantes estatisticamente para o fenômeno.

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No sexto capítulo, visando a um maior aprofundamento da pesquisa,

realizaremos uma segunda rodada, efetuando cruzamentos entre as variáveis sociais, ou

extralingüísticas. Para alcançar tal intento, levaremos em consideração os fatores mais

relevantes selecionados pelo pacote de programa computacional VARBRUL.

No sétimo capítulo proporemos a comparação entre os nossos resultados, obtidos

no estado da Paraíba, e os resultados de Amaral (1999), alcançados na região sul do

país, sobre o mesmo fenômeno lingüístico – apagamento da vogal postônica não-final,

em que apreciaremos as convergências e divergências entre as pesquisas acerca do

apagamento da vogal postônica não-final.

No oitavo e último capítulo, faremos as considerações finais em relação a cada

variável relevante para o fenômeno lingüístico pesquisado e algumas reflexões sobre a

importância da teoria da variação lingüística no ensino da língua.

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1 OBJETO DE ESTUDO

Sabemos que há, nas palavras de algumas línguas do mundo, uma sílaba mais

forte e outra mais fraca (com exceção das línguas tonais); a forte recebe o nome de

tônica, e a fraca de átona. A percepção distintiva dessas sílabas está no acento, que é o

modo de proferir um som ou grupo de sons com mais proeminência do que outros. As

acentuadas (tônicas) e as não-acentuadas (átonas) diferenciam-se de acordo com a

dosagem, maior ou menor, de certas qualidades físicas que caracterizam os sons da fala

humana. Esse acento pode ser apontado como sendo de intensidade (força, dinâmico,

expiratório ou icto), quando o relevo consiste em um maior esforço expiratório, e

musical (tom ou altura), quando o relevo está na elevação ou maior altura da voz. Um

termo usado em FONÉTICA para referir-se ao grau ou à força usada na produção da

SÍLABA. A distinção usual é entre sílabas tônicas (acentuadas) e átonas (não-

acentuadas), o formador sendo mais proeminente que o último e marcado na

TRANSCRIÇÃO com uma linha vertical crescente, [']. A proeminência geralmente é

devido ao aumento da SONORIDADE da sílaba tônica, mas aumentos em EXTENSÃO

e às vezes em PICO podem contribuir para a impressão total de proeminência3

(CRYSTAL, 2004).

Na língua portuguesa, dentre essas três subdivisões supra citadas, os vocábulos

proparoxítonos são os menos produtivos e, por sua vez, os mais especiais. Registram-se

no dicionário Aurélio, de acordo com Amaral (1999), 8.520 proparoxítonos de um total

de aproximadamente 120.000 verbetes, razão pela qual são considerados pelos

estudiosos formas marcadas no léxico, ou seja, exceções. Há alguns anos, os vocábulos

proparoxítonos obedecem, na fala, ao padrão canônico português, tornando paroxítono o

que é proparoxítono.

3 A term used in PHONETICS to refer to the degree or force used in producing a SYLLABLE. The usual distinction is between stressed and unstressed syllables, the former being more PROMINENT than the latter and marked in TRANSCRIPTION with a raised vertical line, [']. The prominence is usually due to an increase in LOUDNESS of the stressed syllable, but increases in LENGTH and often PITCH may contribute to the overall impression of prominence.

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1.1 SÍNCOPE

Neste trabalho, analisaremos o enfraquecimento da vogal postônica não-final em

vocábulos proparoxítonos, que leva esses vocábulos a sofrerem uma conseqüente

supressão dessa vogal, como, por exemplo, em abóbora > abobra; cócega > cosca;

árvore > arvre. A síncope é, pois, a queda ou supressão de um fonema interno ou

medial em determinada palavra. Embora vários fatores possam concorrer, às vezes,

concomitantemente, para a aplicação desse fenômeno lingüístico, como, por exemplo, o

comprimento do vocábulo, a maior ou menor rapidez da elocução, a natureza dos

fonemas circunvizinhos etc., a sua causa preponderante é, sem dúvida, o acento

intensivo (FARIA, 1955, p. 162).

A síncope, em latim, atingia unicamente as vogais breves e átonas, e,

principalmente, aquelas situadas na vizinhança da sílaba tônica. Conservando o latim

pré-histórico e proto-histórico o primitivo acento itálico, que sempre incidia sobre a

sílaba inicial do vocábulo, é natural que, nesse período da língua, a síncope atingisse

necessariamente a segunda sílaba da palavra. Por outro lado, como a síncope ocorre nos

diversos dialetos itálicos, deve ser considerada como um fenômeno geral do itálico,

assumindo naturalmente características próprias em cada um dos dialetos, ou grupos

dialetais em que se subdividiu a antiga unidade itálica.

Quando a síncope ocorria depois das soantes r, l, n, não podendo as mesmas

construírem centro de sílaba no itálico e no latim, onde só desempenhavam o papel de

consoantes, esses fonemas passavam a desenvolver antes de si um timbre vocálico,

mudando para er, il, in. O desenvolvimento desse timbre vocálico tomou o nome de

samprasárana, denominação tomada dos gramáticos hindus (*sacrodotis > *sacrdotis >

sacerdotis; *agrolos > *agrlos > *agerlos > agellus – diminutivo de ager).

Em sílaba final, a síncope não teve, em latim, a mesma extensão que no osco-

umbro, em que e, i, o breves, seguidos de s, sempre caíam. Em latim, exceção feita para

o e breve, numerosos são os exemplos de síncope do i e do o breves em sílaba final

terminada por –s, principalmente nas terminações -ros e -ris, como: pueros > *puers >

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puer (com a simplificação da geminada em final absoluta rr > r); *soceros > *socers >

socer; sacros (forma atestada sob a grafia sakros).

Na 3ª declinação, é freqüente a síncope do i, no nominativo-vocativo de palavras

do gênero masculino e do feminino, quando esse i vinha precedido de uma consoante

oclusiva (*atrocis > atrocs; *cots > cos; *dotis > dots > dos, etc.).

Uma vez que o latim pré-histórico conservava o antigo acento itálico, que

sempre incidia sobre a sílaba inicial do vocábulo, era natural que neste período da

língua a síncope atingisse necessariamente a segunda sílaba da palavra (FARIA, 1955,

p. 187).

O Appendix Probi, valioso documento de fala corrente, refuta as formas

sincopadas: speculum non speclum, masculus non masclus, vetulus non vetlus, articulus

non articlus, permitindo deduzir que as formas correntes (e erradas, de acordo com

Probo) eram speclum, masclus, vetlus, articlus (ILARI, 2000).

É notório que nem todas as diferenças são sinais de mudança. Algumas, como

afirma Lucena (2001), decorrem de características próprias da oralidade em oposição

àquelas próprias da escrita.

No português arcaico, que se estende do século XII aos meados do século XVI,

eram raras as proparoxítonas. Encontravam-se apenas algumas palavras semi-eruditas –

eclesiásticas, jurídicas, medicinais etc., como os nomes de contribuições: hospedádego,

eirádega, montádega. Com o renascimento, os esdrúxulos (proparoxítonos) portugueses

passaram a constituir a parte principal das palavras cultas, poéticas e eruditas

reintroduzidas a partir do século XV (Cf. AMARAL, 1999), cuja maioria decorre de

empréstimos de palavras do latim clássico, entre as quais, palavras do grego adaptadas à

estrutura latina (CAMARA JR., 1979). Luís Vaz de Camões, dentre os quinhentistas e

os seiscentistas, foi quem mais enriqueceu a língua nacional e elevou a cultura pátria

com elementos da antiga civilização. Nos Lusíadas (1572), já apareciam proparoxítonos

como trêmulo, lúcido, rúbido, nítido, túmulo, diáfano, fatídico, belígero, entre outros

(AMARAL, op. cit.).

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No português moderno, os proparoxítonos são, na maioria, vocábulos eruditos.

Mesmo os populares, como árvore, estômago, câmara, pela lei de menor esforço4, pelo

princípio de economia ou por tendência a seguir o padrão da língua, são transformados

pelos falantes em paroxítonos, como, respectivamente, arvre, estomo, cama.

No Brasil, estudos sistemáticos sobre as proparoxítonas são escassos. Tem-se

conhecimento de “O destino das palavras proparoxítonas na linguagem popular”, de

Briam Head (1986); “Descrição e análise da redução das palavras proparoxítonas”,

dissertação de Mestrado, de Valmir Caixeta (1989); “Aspectos Fonéticos das

Proparoxítonas no Falar de Fortaleza”, de Maria do Socorro Silva de Aragão (1999) e

“As Proparoxítonas: teoria e variação”, tese de Doutorado de Marisa Porto do Amaral

(1999).

Desde o surgimento da sociolingüística que o tema fonologia, e, em específico, a

supressão de segmentos, vem se configurando em estudos na área da variação. Primeiro,

com Labov (1966), quando investigou o apagamento da consoante /r/ em palavras como

farm e fair, no inglês falado em Nova Iorque, e comparou-o com o inglês RP (received

pronunciation), falado pela classe média-alta da Inglaterra.

No Brasil, Paiva (1996) investigou a supressão das semivogais nos ditongos

decrescentes no Rio de Janeiro. Brandão (1991), em um estudo sobre dialetos rurais,

observou a incidência de apagamento de flaps. Vandresen (1999), em um estudo sobre o

português falado na Região Sul, pesquisou a queda da vibrante em posição de coda.

As formas sincopadas e não-sincopadas resultam de processos de supressão de

segmento e/ou segmentos. Usamos esses dois termos, pois há, em determinado

momento, apenas o apagamento da vogal postônica não-final e, em outro, além deste, o

apagamento da consoante de menor soância. Em ambos os casos, uma vez confirmada a

queda da vogal postônica não-final, a estrutura silábica também é modificada, passando,

no primeiro caso (i), do padrão consoante/vogal (CV) para o padrão

consoante/consoante/vogal (CCV). No segundo (ii), acontece tal qual o primeiro, com

uma pequena modificação no que concerne à boa-formação silábica, isto é, vocábulos

que resultarem em sílabas com formações não aceitas pelo Princípio de Seqüenciamento

4 Quando o falante tende a reduzir um ou mais fonemas visando fazer um menor esforço músculo-articulatório.

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de Soância5 (CLEMENTS, 1990) sofrerão uma outra síncope, e, agora, perderão a

segunda consoante, voltando, assim, ao padrão consoante/vogal (CV). Vale lembrar

que, em ambos os casos, haverá a perda de uma sílaba, surgindo, assim, a necessidade

de uma reestruturação silábica. Podemos perceber esse processo no exemplo que segue:

(i) ['aΦvΥrΙ] ['aΦvrΙ]

ár-vo-re (3 sílabas) ar-vre (2 sílabas)

(padrão silábico: CV em todas) (padrão silábico: CV e CCV)

(ii) ['cagədΥ] ['cagΥ]

cá-ga-do (3 sílabas) ca-go6 (2 sílabas)

(padrão silábico: CV em todas) (padrão silábico: CV e CV)

Neste último processo, há uma acomodação da estrutura silábica ao padrão CV,

considerado o padrão silábico canônico no português brasileiro.

Este trabalho busca apresentar evidências da influência dos diversos fatores

presentes no processo da preferência de uso das variantes da síncope da postônica não-

final. Tais fatores encontram-se relacionados a aspectos fonológicos e sociais, como

apresentaremos a seguir.

1.2 PROCESSO DE ENFRAQUECIMENTO SILÁBICO

O processo de enfraquecimento é regido por uma escala de força (strength

hierarchy) que se baseia no modo de articulação. Quanto maior a obstrução de um som,

mais forte ele será e, quanto menor essa obstrução, mais fraco ele será. A escala de

sonoridade é uma reafirmação inversa da escala de força (MARQUES, 2001). De

5 Esse princípio diz que a sílaba apresenta um contorno de soância crescente no ataque e decrescente na coda. Ver capítulo 2.3.2 deste trabalho para melhor entendimento. 6 Como seria impossível a formação cagdo no sistema silábico português, há uma síncope da segunda consoante (uma vez que ambas têm soância 0) resultando, dessa forma, em cago. Retomando, assim, o padrão silábico CV do português.

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acordo com o esquema apresentado por Katamba (1993), tanto a sonorização quanto o

enfraquecimento caminham rumo à vocalização ou ao apagamento:

ESCALA DE SONORIDADE ESCALA DE FORÇA

( - Sonoridade) ( + força) 1 oclusivas surdas (p, t, k) 8 2 oclusivas sonoras (b, d, g) 7 3 fricativas surdas (f, s, š) 6 4 fricativas sonoras (v, z, ž) 5 5 nasais (m, n, nh) 4 6 líquidas (r, l, lh) 3 7 glides (y, w) 2 8 vogais (a, e, é, i, o, ó, u) 1

( + Sonoridade) ( - força)

Dessa forma, as oclusivas envolvem as obstruções mais fortes, e as

aproximantes (nasais, líquidas, glides e vogais), as mais fracas, com o restante dos sons

ficando entre elas. A perda total de um som é a forma final de enfraquecimento

(OCLUSIVA > AFRICADA > FRICATIVA > APROXIMANTE > ZERO)7.

Um conhecido “princípio” de mudança lingüística, segundo Coutinho (1976b, p.

112), é o de que consoantes mediais surdas latinas, quando em posição intervocálica,

sonorizam-se em português nas suas homorgânicas, e as sonoras geralmente caem, a

exemplo de: vita > vida, ibam > ia. Esse é um exemplo clássico de um processo de

enfraquecimento.

Acreditamos que, em nosso trabalho, esse enfraquecimento também ocorra, pois,

ao observar a queda da postônica não-final no vocábulo música, vemos que há as

seguintes possibilidades de manutenção: musca, sem sonorização, apenas síncope da

vogal “i”, como árvore > arvre; retângulo > retanglo, etc., e musga, com a sonorização

do -k- em -g-. Como também pode ocorrer o contrário. Observando a palavra cócega,

vimos que, quando neste vocábulo cai a postônica não-final, há simplesmente um

ensurdecimento da velar, ou seja, o -g- passa a -k- (cócega > cosca).

7 (>) indica um passo em direção a uma fraca pronunciação.

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2 METODOLOGIA

Para o desenvolvimento deste trabalho, tomamos por base o modelo teórico-

metodológico da sociolingüística quantitativa ou modelo laboviano, porquanto somos

sabedores de que a heterogeneidade lingüística é ordenada, isto é, passível de descrição

por regras. De acordo com Naro (1992, p. 17), essas regras favorecerão ou não,

variavelmente e com pesos específicos, as formas usadas em cada contexto analisado,

sendo chamadas de regras variáveis, havendo, assim, a possibilidade de identificar uma

série de categorias independentes que influenciarão na ocorrência de uma ou outra

variante.

As ocorrências foram extraídas de entrevistas feitas na cidade de Sapé,

localizada no interior da Paraíba. Esse município conta com 47.353 pessoas, 35.516 das

quais são moradores da zona urbana, de acordo com o último censo realizado em 2000,

pelo IBGE. Levantamos, assim, nesse município, um corpus de língua falada que

representasse a comunidade de falantes em estudo como um todo. E, para alcançar tal

intento, tomamos por base um dos critérios básicos, segundo Tarallo (2002), que é a

seleção de informantes por amostragem aleatória:

Tal critério deverá ser usado especialmente no caso de a comunidade estudada ser um grande centro urbano. A amostragem aleatória lhe dará a certeza de que você ao menos tenha dado a chance a todos os membros da comunidade de serem entrevistados. A consulta ao censo da comunidade é imprescindível, bem como a reflexão cuidadosa sobre os critérios de classificação dos informantes em grupos socioeconômicos.

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As entrevistas8 foram gravadas em situações naturais de interação social. Realizamo-las com base no interesse dos informantes, levando em consideração as informações presentes nos questionários anteriormente aplicados.

2.1 SELEÇÃO DOS INFORMANTES

Para a seleção dos informantes, seguimos o modelo de amostragem aleatória,

conforme falado anteriormente, e os informantes foram selecionados seguindo os

seguintes critérios9:

i) ser natural de Sapé ou morar nessa cidade desde os cinco anos de

idade;

ii) nunca ter passado mais de dois anos consecutivos fora dessa

comunidade.

2.2 POPULAÇÃO E AMOSTRA

Neste trabalho, priorizamos apenas a zona urbana da cidade de Sapé. Aplicamos,

primeiramente, um questionário visando traçar um perfil das pessoas passíveis de serem

selecionadas para as entrevistas. Uma vez aplicado esse questionário, observamos quem

melhor se encaixava no perfil estabelecido pela pesquisa e voltamos a falar com essas

pessoas, preenchendo uma ficha social do informante, que nos serviria de base à seleção

da amostragem.

8 Conferir anexos 4 e 5. 9 De acordo com os critérios estabelecidos pelo VALPB (Projeto de Variação Lingüística no Estado da Paraíba).

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A população desta pesquisa compõe-se de 36 informantes, sendo 18 homens e

18 mulheres da zona urbana da cidade. Dentre esses informantes, encontramos pessoas

que exercem as seguintes profissões: professor, pedreiro, comerciante, horticultor,

motorista, bibliotecário, auxiliar administrativo, vigilante, como também senhoras do

lar, aposentados e estudantes.

A seleção dos informantes seguiu o modelo da amostragem aleatória

estratificada, conforme abordado anteriormente. Estratificamos, assim, 18 células,

seguindo as variáveis sexo, faixa etária e anos de escolarização. Cada célula é formada

por 2 informantes, obedecendo à seguinte distribuição:

i) Sexo: masculino e feminino

ii) Faixa etária: 15 – 25 anos; 26 – 49 anos e 50 anos em diante

iii) Anos de escolarização: Pouca escolarização até 2 anos; 6 – 8 anos e

mais de 9 anos

Ao combinar as três variáveis, temos, o quadro 1:

QUADRO 1 – CARACTERIZAÇÃO DOS INFORMANTES

SEXO FAIXA ETÁRIA ANOS DE ESCOLARIZAÇÃO

1. Masculino 15 – 25 anos Pouca até 2 anos 2. Masculino 15 – 25 anos 6 – 8 anos 3. Masculino 15 – 25 anos Mais de 9 anos 4. Masculino 26 – 49 anos Pouca até 2 anos 5. Masculino 26 – 49 anos 6 – 8 anos 6. Masculino 26 – 49 anos Mais de 9 anos 7. Masculino 50 anos em diante Pouca até 2 anos 8. Masculino 50 anos em diante 6 – 8 anos 9. Masculino 50 anos em diante Mais de 9 anos 10. Feminino 15 – 25 anos Pouca até 2 anos 11. Feminino 15 – 25 anos 6 – 8 anos 12. Feminino 15 – 25 anos Mais de 9 anos 13. Feminino 26 – 49 anos Pouca até 2 anos 14. Feminino 26 – 49 anos 6 – 8 anos

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15. Feminino 26 – 49 anos Mais de 9 anos 16. Feminino 50 anos em diante Pouca até 2 anos 17. Feminino 50 anos em diante 6 – 8 anos 18. Feminino 50 anos em diante Mais de 9 anos

Conforme a estratificação acima, a amostra contém 18 células sociais com dois

informantes em cada uma, totalizando, assim, 36 informantes (anexo 1).

2.3 COLETA DE DADOS

Realizamos a coleta de dados de agosto a dezembro de 2004. Um aspecto que

ajudou bastante foi o fato de o entrevistador/pesquisador já ter morado nesse município,

ser conhecedor dos bairros e ter certa noção de onde poder encontrar os prováveis

informantes da pesquisa.

Contrariando em parte as advertências de Tarallo (2002), ao afirmar que:

Seja qual for a comunidade, seja qual for o grupo, jamais deixe claro que seu objetivo é estudar a língua tal como é usada pela comunidade ou grupo. Se você inadvertidamente o fizer, ou mais grave ainda, se o fizer conscientemente, é muito provável que o comportamento de seus informantes – já prejudicado pelo uso do gravador e por sua presença – se altere ainda mais, e a pesquisa, conseqüentemente, se torne ainda mais enviesada. Procure, portanto, colocar ao informante os objetivos de sua pesquisa fora do campo da linguagem. Lembre-se também de que, sendo a língua propriedade do grupo estudado, seus informantes poderão se sentir ameaçados e embaraçados.

foi levado ao conhecimento dos informantes que estavam ali para desenvolver um

trabalho para a universidade, visando à coleta de depoimentos e de conhecimento de

mundo deles, uma vez que nosso tipo de entrevista não se dava por estilo livre e, sim,

por conversa dirigida. Essa conversa dirigida acontecia de duas formas: inquérito

fonético (fazendo-se uso de gravuras para o surgimento das formas lingüísticas que se

queria observar10) e a leitura de palavras no texto11 (em que se usaram frases guias para

a leitura e o aparecimento das formas lingüísticas por nós observadas).

10 Vale esclarecer que, nessa etapa, mostrava-se um cartão com um grupo de figuras e, a partir daí, criava-se um diálogo entre o entrevistador e o informante, dando-se, então, o uso das variáveis em estudo, conforme o anexo 4. 11 Ver anexo 5.

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Esses dois modelos (inquérito fonético e leitura de palavras no texto) foram

empregados porque as palavras proparoxítonas são menos freqüentes em nossa língua,

e, conseqüentemente, em nossa fala. Como necessitávamos do uso dessas palavras,

pelos informantes, para a criação do corpus, resolvemos montá-lo conforme explicado

acima, visto que registrar dados de fala natural não é tarefa fácil, pois se corre o risco de

os falantes não enunciarem as palavras desejadas.

Antes de iniciar a gravação da entrevista, havia uma conversa prévia com o

informante, com o preenchimento de uma segunda ficha (anexo 2), com mais alguns

dados dos entrevistados. Fazíamos isso conscientemente com o intuito de deixá-los mais

à vontade e certos de que estavam prestando uma grande ajuda à execução deste

trabalho.

2.4 DEFINIÇÃO OPERACIONAL DA VARIÁVEL

Certos de que os falantes fazem escolhas de certas formas de falar, consciente ou inconscientemente, faz-se necessário selecionar prováveis condicionadores lingüísticos (variável dependente) e extralingüísticos (variável independente) da variação na pronúncia das proparoxítonas, objeto deste estudo, na fala dos informantes da amostra.

2.4.1 VARIÁVEL DEPENDENTE

A variável dependente é caracterizada pelas diferentes formas, que dependem de

determinados ambientes, no nosso caso, duas (presença ou ausência da vogal postônica

não-final), que correspondem a diferentes formas de se dizer a mesma coisa, num

mesmo contexto, com o mesmo valor de verdade (TARALLO, 2002, p. 8). Logo, a

síncope regeria a variação em nosso estudo. De acordo com alguns autores, a síncope é:

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Um fenômeno muito freqüente de desaparecimento de um ou mais fonemas no interior de uma palavra. As vogais e sílabas átonas estão particularmente sujeitas a isso (DUBOIS, 1973). A perda de um fonema medial de um vocábulo. Na evolução do românico lusitânico, há duas síncopes sistemáticas e muito importantes: 1) síncope da vogal postônica posterior do grupo consonântico resultante; ex.: apícula > apicla (donde port. – abelha), teneru- > tenru- (donde port. – tenro); 2) síncope de consoante sonora entre vogais: ... (CAMARA JR., 1978). É um termo usado na FILOLOGIA COMPARATIVA, e algumas vezes na FONOLOGIA moderna, para se referir ao APAGAMENTO da VOGAL dentro de uma PALAVRA; freqüentemente contrastado com AFERES e APÓCOPE12 (CRYSTAL, 2004).

Assim, com as proparoxítonas, temos o seguinte esquema de representação da

variável dependente:

['aΦvΥrΙ]

<'aΦvΥrΙ>

['aΦvrΙ]

Para Tarallo (2002), “as variantes de uma comunidade de fala encontram-se sempre em relação de concorrência”. No nosso caso, essa relação é averiguada com a variante árvore, que corresponde à variante padrão vs arvre, considerada não-padrão.

2.4.2 VARIÁVEL INDEPENDENTE

12 A term used in COMPARATIVE PHILOLOGY, and sometimes in modern PHONOLOGY, to refer to the DELETION of a VOWEL within a WORD; often contrasted with APHAERESIS and APOCOPE.

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A variável independente é tida como um conjunto de fatores que orientam a ocorrência das variáveis dependentes, a partir de comprovações de que fatores extralingüísticos (externos/sociais) e lingüísticos (internos/estruturais) têm-se mostrado bastante pertinentes aos estudos variacionistas, atuando como fortes condicionadores em determinadas pesquisas.

2.4.2.1 Variáveis extralingüísticas

Também chamadas de variáveis sociais, são aquelas que levam em consideração os aspectos sócio-culturais dos informantes. Segundo Tarallo (op. cit.):

Tudo aquilo que servir de pretexto e co-texto à variável (isto é, tudo aquilo que não for estritamente lingüístico) poderá ser relevante para a resolução de seu “caso”. A formalidade vs a informalidade do discurso, o nível socioeconômico do falante, sua escolaridade, faixa etária e sexo poderão ser considerados como possíveis grupos de fatores condicionadores.

Essa variável vem mostrando uma significante influência nos estudos já realizados em algumas línguas, como o Português e o Inglês. Podemos citar, por exemplo, trabalhos em português, em que fatores externos ao ambiente lingüístico mostram-se relevantes nesses estudos, muitas vezes, sendo até selecionados com um alto índice estatístico, como é o caso do enfraquecimento das fricativas sonoras (MARQUES,

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2001), a palatalização das oclusivas dentais (HORA, 1997), a concordância nominal (SCHERRE, 1988), dentre outros.

Apresentaremos aqui as quatro variáveis extralingüísticas:

a) Sexo;

b) Faixa etária;

c) Anos de escolarização.

2.4.2.1.1 Sexo

A variável sexo sempre foi apontada em diversos estudos sociolingüísticos (PEDROSA, 2000; MARTINS, 2001, MARQUES, op. cit.) como um fator bastante importante, levando em consideração que é condicionante da heterogeneidade lingüística. Segundo Silva (2001),

É sabido que o papel social da mulher difere, em vários aspectos, do papel social do homem, que, obrigatoriamente, não necessita de afirmação social. As mulheres têm mais consciência das formas de status social do que os homens, além disso, são mais receptivas à atuação da norma escolar. A responsabilidade na educação dos filhos também contribui para que detenham um comportamento lingüístico mais esmerado.

Sabemos que as mulheres são mais sensíveis à forma padrão do que os homens

que, por sua vez, fazem maior uso da forma não-padrão em situação estável. Mas vale

frisar que as mulheres aceitam mais e fazem mais uso da forma mais nova; já os homens

se mostram mais conservadores. A partir daí, Romaine (2000) faz a seguinte observação

acerca do status dedicado pela sociedade ao gênero feminino:

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As mulheres podem estar usando meios lingüísticos como uma forma de obtenção de status negado a elas através de outras épocas. Desde que foi negada à mulher a igualdade com o homem até onde oportunidades de emprego e educação interessam. Não há indicadores confiáveis para o status feminino ou ao status que ela almeja ter. Assim, o lugar no mercado de trabalho estabelece o valor do homem em condições econômicas, mas o único tipo de valor que a mulher pode ter é simbólico. Ela pode ser uma “boa” dona de casa, uma “boa” mãe, uma “boa” esposa, etc., com respeito às normas da comunidade para o comportamento apropriado13.

As mulheres são apontadas em muitos estudos como uma peça fundamental e de

grande valor no mecanismo de mudança lingüística. Assim, tomando como base todas

essas afirmações acerca da variável sexo, consideramos bastante relevante sua inclusão

neste trabalho, ficando essa variável assim definida:

a) masculino;

b) feminino.

2.4.2.1.2 Faixa etária

A faixa etária é um fator de grande relevância para o estudo

sociolingüístico, pois é a partir dele que se torna possível o esboço do estágio

que uma regra variável desempenha dentro do sistema lingüístico: variação

estável ou mudança em progresso. De acordo com Tarallo (2002), deve haver uma

correlação das variantes ao fator idade, após análise dos fatores condicionadores

internos. O autor afirma ainda que:

A relação de estabilidade das variantes (situação de contemporização) avultará, se entre a regra variável e a faixa etária dos informantes não houver qualquer tipo de correlação. Se, por outro lado, o uso da variante mais inovadora for mais freqüente entre os jovens, decrescendo em relação à idade dos outros informantes, você terá presenciado uma situação de mudança em progresso...

13 Women may be using linguistic means as a way to achieve status denied to them through other outlets. Since women have long been denied equality with man as far as educational of a woman’s status or the status she aspired to. Thus, the market-place establishes the value of man in economic terms, but the only kink of capital a woman can accumulate is symbolic. She can be a ‘good’ housewife, a ‘good’ mother, a ‘good’ wife, etc., with respect to the community’s norms for appropriate behavior.

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A literatura pertinente (LUCENA, 2001; MARTINS, 2001; MARQUES,

2001) afirma que os falantes mais velhos de uma dada localidade geralmente são mais

conservadores em relação à mudança ou à estabilidade de um fenômeno lingüístico. Por

isso, a busca para saber se os falantes de maior faixa etária mostram evidências de que

esse processo (o de apagamento da postônica não-final) seja característico deles. Dessa

forma, estratificamos em:

a) de 15 a 25 anos;

b) de 26 a 49 anos;

c) de 50 anos em diante.

3.4.2.1.3 Anos de escolarização

Para estudos que analisam o comportamento social de uma determinada

comunidade, a escolarização é tida como um fator de grande relevância, pois distingue

o estilo de fala padrão do não-padrão. O estilo de fala não-padrão está sempre

relacionado às formas inovadoras, estigmatizadas ou não, a depender do contexto social

no qual estejam inseridas. Vale salientar que as formas não-padrão são, na maioria dos

casos, combatidas pelas instituições educacionais, o que vem fundamentar que, quanto

maior o ano de escolarização do falante, maior a sua consciência do uso da forma

considerada padrão (PEDROSA, 2000; LUCENA, op. cit.; SILVA, 2001). Quanto à

escolarização, traçamos as seguintes restrições:

a) Pouca escolarização até a 2ª série do fundamental;

b) de 5ª a 8ª série do fundamental;

c) do 1º ano do médio em diante.

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2.4.2.2 Variáveis estilísticas

Para que este trabalho tivesse sucesso e credibilidade, apostamos na qualidade

do corpus selecionado. A coleta desses dados foi feita de modo direcionado, uma vez

que os vocábulos aqui trabalhados são de difícil ocorrência, pela sua escassez na língua

portuguesa. Tomamos por base, então, dois tipos de coletas: a entrevista dirigida

(inquérito fonético) e a leitura (onde havia um grande número de palavras

proparoxítonas). O uso dessas duas formas de entrevista apenas teve o objetivo de

assegurar um número satisfatório de palavras proparoxítonas, devido à sua ausência,

conforme mencionado acima. Para isso usamos a seguinte nomenclatura:

a) entrevista dirigida

b) leitura das palavras no texto14.

2.4.2.3 Variáveis lingüísticas

Ao falarmos em variáveis lingüísticas, tomamos por base a reunião de fatores

estruturais que, por sua vez, podem condicionar a escolha e/ou o uso de uma dada

variante. Neste estudo, essa variável está intrinsecamente ligada ao domínio da

fonologia.

No estudo da vogal postônica não-final, nossa preocupação é verificar o motivo

dessa síncope, isto é, que fonema, em particular, faz com que haja essa supressão. A

noção de direcionalidade é de suma importância neste estudo, pois é a partir dele que

podemos dizer se um fonema tem maior afinidade com o som que o precede ou que o

antecede (Cf. KATAMBA, 1993). Dessa forma, neste trabalho, observaremos a

circunvizinhança da vogal postônica não-final, objetivando descrever que elemento

mais se afina com o seu enfraquecimento e em que posição ele se encontra (se

precedente ou seguinte ao segmento analisado).

14 Cf. anexo 3.

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Definimos, então, cinco variáveis lingüísticas:

a) Contexto fonológico precedente;

b) Contexto fonológico seguinte;

c) Traço de articulação da vogal;

d) Estrutura da sílaba;

e) Extensão da palavra.

2.4.2.3.1 Contexto fonológico precedente

Em muitas pesquisas sociolingüísticas (AMARAL, 1999; MARTINS, 2001;

MARQUES, 2001), de cunho laboviano, esse fator tem se mostrado bastante relevante

e, neste estudo, mais ainda, tendo em vista que contexto fonológico precedente vem a

desempenhar certo efeito em nossa variável, principalmente quanto ao ponto de

articulação. Daí a seleção dessa variável para a análise de nossos dados. Serão

observados os seguintes contextos:

a) oclusiva (xícara)

b) fricativa (árvore)

c) nasal (estômago)

d) líquida vibrante (espírito)

e) líquida lateral (parabólica)

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2.4.2.3.2 Contexto fonológico seguinte

Sabemos que a síncope de segmentos que precedem as líquidas r e l são de

tradição histórica, sem falar que essa variável tem sido relevante em alguns trabalhos

variacionistas (GUY, 1981; MAGY & REYNOLDS, 1997). Devido a essa idéia,

resolvemos verificar a influência do segmento consonantal seguinte da postônica não-

final nesse processo de supressão. Nessa variável, analisaremos os seguintes contextos:

a) líquida vibrante (pássaro)

b) líquida lateral (pérola)

c) não-líquida (médico)

2.4.2.3.3 Traço de articulação da vogal

Com a seleção dessa variável, queremos verificar se o traço de articulação das

vogais, ou seja, se os traços de pontos ativados para a realização das vogais (Cf.

AMARAL, 1999) promovem alguma influência sobre o apagamento das postônicas

não-finais, objeto da nossa pesquisa. Para isso, analisaremos os contextos:

a) labial (fósforo)

b) dorsal (máscara)

c) coronal (físico)

2.4.2.3.4 Estrutura da sílaba

Esperamos, com esse fator, investigar a qualidade da sílaba (Cf. AMARAL,

1999; LUCENA, 2001), isto é, se a sílaba anterior leve (aberta) ou pesada (fechada)

propicia ou não a supressão da sílaba postônica não-final. A sílaba é leve, quando for

terminada em vogal, e pesada, quando terminada em consoante.

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a) leve (fí.ga.do)

b) pesada (mús.cu.lo)

2.4.2.3.5 Extensão da palavra

Sabemos que, para ser considerado proparoxítono, um vocábulo deve ter, pelo

menos, três sílabas. Assim, resolvemos observar se a extensão das palavras

proparoxítonas também exerceria algum papel de destaque no apagamento da postônica

não-final. Esse fator se fez relevante em alguns trabalhos, como o de Martins (2001),

Amaral (op. cit.) etc.

a) 3 sílabas (úl.ce.ra)

b) 4 sílabas (re.tân.gu.lo)

2.5 LEVANTAMENTO E CODIFICAÇÃO DOS DADOS

Os dados foram levantados a partir de entrevistas dirigidas e inquérito fonético,

feitos com o uso de um gravador digital (MD). Após as gravações, passamos todo o

conteúdo dos mini-discos para CDs, os quais facilitavam bastante o manuseio e o

trabalho de escuta, e, conseqüentemente, a respectiva transcrição do material coletado.

Com os dados transcritos, analisar-se-iam as ocorrências do fenômeno variável, com a

aplicação ou não da regra, no contexto em que se encontravam inseridas. Em seguida,

havia o armazenamento, acompanhado da codificação, de acordo com os fatores

investigados, visando ao uso do pacote de programas do VARBRUL, utilizado para

fazer a análise estatística dos dados.

2.5.1 MÉTODO DE ANÁLISE: O PROGRAMA VARBRUL

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De posse da amostra de dados, transcrita, armazenada e codificada, os dados

foram digitados num arquivo de texto (.txt), com seus códigos para submetê-los, então,

à análise, usando os programas apropriados do pacote VARBRUL.

Vários outros modelos estatísticos foram desenvolvidos para a verificação dos

estudos lingüísticos variacionistas. O que teve verdadeiro destaque, no entanto, foi o

modelo introduzido por Rousseau e Sankoff (1978). Baseado nesse modelo estatístico,

Sankoff desenvolveu um programa computacional para pesquisas variacionistas, que foi

posteriormente adaptado aos microcomputadores do tipo IBM, por Susan Pintzuk, em

1988 e 1992, passando a denominar-se VARBRUL 2S, programa computacional

utilizado para análise dos dados nesta pesquisa.

O pacote de programas VARBRUL é constituído de um conjunto de programas

ordenados, denominados de: CHECKTOK, READTOK, MAKECELL, IVARB,

TVARB, MVARB. Os três últimos variam de acordo com a quantidade de células a

serem verificadas. O CROSSTAB, o TEXTSORT e o TSORT são programas auxiliares

que também fazem parte do pacote e operam no tratamento dos dados.

O primeiro programa do pacote, o CHECKTOK, tem a função de localizar erros

de digitação ou de codificação existentes no arquivo de texto. Após a conferência, o

programa gera um arquivo que vai servir de entrada para o segundo programa, o

READTOK, que efetuará leves modificações nos dados corrigidos pelo CHECKTOK,

criando um novo arquivo que contém apenas as codificações, excluindo qualquer outro

tipo de informação que o pesquisador colocou no arquivo de texto. Esse novo arquivo

servirá de entrada para o programa seguinte: o MAKECELL, ao qual cabe a tarefa de

gerar as células responsáveis pelas porcentagens dos grupos de fatores em relação à

variável. Esse programa utiliza o arquivo gerado no READTOK e um novo,

denominado de arquivo de condições, em que constam o grupo de fatores da variável

dependente e os grupos que dizem respeito às variáveis independentes, para que

possíveis modificações sejam feitas, sem que haja necessidade de alterar o arquivo de

ocorrências.

O arquivo gerado pelo MAKECELL será o arquivo de entrada do IVARB (duas

variáveis, ou binário), TVARB (três variáveis ou ternário) ou MVARB (4 ou 5 variáveis

ou eneário), dependendo do número de variáveis que são trabalhadas. Para isso, é

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indispensável que não haja knockouts (aponta comportamento invariável do fator, se

este apresentar 0% ou 100% de realização) nem single group (quando há apenas um

fator dentro de um grupo de fatores), visto que o propósito do programa é estabelecer

valores aos contextos variáveis.

O programa IVARB destaca-se por possuir níveis de análise variados. No nível 1

ou step up, calcula o peso relativo dos fatores de cada uma das variáveis, de forma

isolada, em relação ao input, calculando sua verossimilhança máxima (log-likelihood) e

seu nível de significância. A partir desses níveis, o programa realiza, então, a seleção de

uma das variáveis. No nível 2 ou step down, o programa trabalha com a variável

selecionada pelo nível anterior, observando o seu comportamento em correlação com

cada uma das demais variáveis, duas a duas, estabelecendo-lhes o log-likelihood e seus

respectivos níveis de significância, selecionando uma segunda variável. O mesmo

processo se repete, incluindo e comparando na rodada cada uma das variáveis,

destacando a mais relevante de cada um dos grupos em análise e colocando-as em

interação com as demais. Esse processo de seleção das variáveis é denominado de step

up.

Após o processo de seleção das variáveis mais relevantes para o fenômeno em estudo, o IVARB executa o procedimento de seleção de forma inversa, eliminando as variáveis menos significativas no processo de variação. Quando um dos grupos é eliminado, o programa faz a verificação dos demais grupos não significativos, um a um. Esse processo é denominado de step down.

Tomando por base uma escala de valores entre 0 e 1,

o modelo binário estabelece que o ponto neutro é de 0.50. Da mesma forma, valores acima de 0.50 são interpretados como favorecedores à aplicação da regra; abaixo de 0.50, como inibidores. O peso relativo 0.50 indica que há uma possibilidade de que o fato ocorra 50 vezes em cada 100 casos.

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Nesse sentido é válida a observação feita por Silva (2001):

Mesmo sendo o programa computacional bastante importante na verificação estatística dos fenômenos variáveis, cabe direta e irrestritamente ao pesquisador coletar, codificar, armazenar, estabelecer os grupos de fatores que condicionam a ocorrência do fenômeno em estudo e analisar os dados, com base na teoria variacionista. A função do programa computacional no processo de análise é de caráter coadjuvante, cabendo ao pesquisador o conhecimento necessário de todo o processo para a interpretação dos resultados.

Após explicação dos procedimentos metodológicos

que utilizamos para este trabalho, podemos, então, partir para o próximo capítulo, o da Fundamentação Teórica, no qual abordaremos as teorias que norteiam nosso objeto de estudo: a supressão da vogal postônica não-final nos falantes da cidade de Sapé.

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3 A SOCIOLINGÜÍSTICA: TEORIA E PERSPECTIVAS

Neste capítulo pretendemos traçar um panorama da lingüística a partir do

momento em que os estudos lingüísticos passaram a ser vistos com maior

sistematicidade.

No século XX, a lingüística passou pela mesma tensão15 de épocas anteriores ao

foco “universalista” e o foco “particularista” na abordagem dos fenômenos da língua e

da linguagem. Ainda no século XX, surgiram grandes campos de investigação e

avançaram em direção a uma interdisciplinaridade crescente, a uma intersecção com a

filosofia e com outras ciências humanas como a sociologia, a antropologia, a psicologia,

a neurociência, a semiótica etc. E, a partir desse momento, surgem os novos ramos ou

novas correntes lingüísticas, como a psicolingüística, sociolingüística, análise do

discurso, antropologia da lingüística, filosofia da linguagem, dentre outras.

A sociolingüística, ramo que nos norteia nessa pesquisa, estuda as línguas na sua

relação com as sociedades que as empregam. Ela procura responder a questões do tipo

15 Podemos observar essa tensão, nas dicotomias saussurianas (língua e fala) e de Chomsky (competência e desempenho), sendo que em ambos os autores o objeto da lingüística é definido pelo viés do elemento “abstrato”, “universalista”, “sistêmico”, “formal”.

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“quem fala o quê?, onde?, quando?, como? e por quê?” e tenta mostrar que toda e

qualquer língua é constituída de variedades de formas com o mesmo valor de verdade.

Sob esse ponto de vista, as línguas não podem ser encaradas como blocos homogêneos.

Sob a ótica sociolingüística, a competência lingüística humana ultrapassa o

monolingüismo. O ser humano detém uma capacidade inata para o plurilingüismo

dentro de sua própria língua: em casa, falamos o idioma familiar; na escola,

modificamos a linguagem, adaptando-a a outras variantes regionais e/ou sociais. De

acordo com o meio, as línguas humanas se acostumam a novos socioletos16 e assim se

percebe, pouco a pouco, que as línguas se constituem de um aglomerado de níveis de

expressão, atestando que nenhuma comunidade é inteiramente homogênea. De fato,

cada falante é, ao mesmo tempo, usuário e agente modificador de sua língua (mesmo

que inconscientemente), nela imprimindo marcas geradas pelas novas situações com

que se depara.

Pretendemos mostrar aqui uma retrospectiva da evolução do estudo da variação

e da mudança lingüística, que tem sido objeto de pesquisa desde os séculos passados.

Para alcançar tal intento, nos subcapítulos que seguem, traçaremos um panorama da

história da sociolingüística para melhor entendimento deste trabalho.

3.1 BREVE HISTÓRICO DA SOCIOLINGÜÍSTICA

A concepção de língua como objeto de estudo da Lingüística foi desenvolvida

pelo Estruturalismo, com Ferdinand de Saussure, que, através de sua concepção de

língua, conseguiu responder à problemática inicial de que, segundo Lucchesi (1998, p.

171), dispunha-se à Lingüística naquele momento: produzir uma concepção de língua

globalizante que pudesse orientar todos os estudos que dela se fizerem. Dessa forma, o

Estruturalismo alcançou a posição de hegemonia no cenário da ciência lingüística com

essa perfeita articulação teórica entre a maneira de conceber a língua como objeto e o

modo de aprendê-la através da análise lingüística (LUCCHESI, op. cit., p. 171). 16 Variedade lingüística de cunho social, isto é, variedade característica dos falantes pertencentes a um determinado estrato social (BRANDÃO, 1991: 82).

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Assim, a grande questão que marca o desenvolvimento estruturalista da

lingüística é a de como a língua funciona, centrada na identificação das suas unidades

funcionais e no estabelecimento das relações objetivas que lhe garantem o

funcionamento enquanto um processo organizado e autônomo. Inicia-se, assim, a luta

por uma concepção social da língua. O lingüista francês, Antoine Meillet, insistiu em

numerosos textos como sendo a língua um fato social, dando um conteúdo bem preciso

a essa característica. Em seu artigo, “Comment les mots changent de sens”17 (Como as

palavras mudam de sentido), ele propunha uma definição desse “fato social”,

enfatizando, ao mesmo tempo e sem ambigüidade, sua filiação ao sociólogo Émile

Durkheim (cf. CALVET, 2002):

– “os limites das diversas línguas tendem a coincidir com os dos grupos

sociais chamados nações; a ausência de unidade de língua é o sinal de um Estado recente, como na Bélgica, ou artificialmente constituído, como na Áustria”;

– “a linguagem é eminentemente um fato social. Com efeito, ela entra exatamente na definição proposta por Durkheim; uma língua existe independentemente de cada um dos indivíduos que a falam e, mesmo que ela não tenha nenhuma realidade exterior à soma desses indivíduos, ela é, contudo, por sua generalidade, exterior a eles”;

– “as características de exterioridade ao individuo e de coerção pelas quais Durkheim define o fato social aparecem na linguagem como evidência última”. (Meillet, Comment lês mots changent de suns apud Calvet, 2002, p. 13-14)

Apesar de Meillet ter sido apresentado como discípulo de Saussure, com a

publicação do Curso de Lingüística Geral (doravante CLG), ele tomou distância e,

segundo Calvet (2002, p. 14), Meillet ressalta que, ao separar a variação lingüística

das condições externas de que ela depende, Ferdinand Saussure a priva de realidade;

ele a reduz a uma abstração que é necessariamente inexplicável. Dessa forma, Meillet

entrava em desacordo com, pelo menos, uma das dicotomias saussurianas

(sincronia/diacronia) e com uma das frases mais importantes do curso (“a lingüística

tem por único e verdadeiro objeto a língua considerada em si mesma e por si mesma”).

Enquanto Saussure procurou elaborar um modelo abstrato da língua, Meillet se vê em

conflito entre o fato social e o sistema que tudo contém. Ou seja, para Meillet, era

impossível compreender os fatos da língua sem fazer referência à diacronia, à história.

17 Publicado em L’Anné socilogique, 1905-1906, reimpresso em Linguistique historique et linguistique générale, Paris, Champion, 1921.

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Com toda essa precisão com que Meillet definia a noção de fato social, as

passagens em que Saussure declarava, em seu CLG, que a língua é parte social da

linguagem ou que a língua é uma instituição social, chocam por sua definição teórica.

Para ele, o fato de ser a língua uma instituição social é simplesmente um princípio geral,

uma espécie de exortação que muitos lingüistas estruturalistas retomarão depois, sem

nunca prover os meios heurísticos para assumir essa afirmação. Para Meillet, essa

afirmação deveria, ao contrário, ter implicações metodológicas, ela deveria centrar-se na

teoria lingüística.

Apesar de Saussure e Meillet utilizarem quase a mesma fórmula, eles não dão o

mesmo sentido. Para Saussure, a língua é elaborada pela comunidade e somente nela

que é social; já Meillet da à noção de fato social um conteúdo mais preciso. Na

realidade, enquanto Saussure distingue cuidadosamente estrutura de história, Meillet

quis uni-las.

Dessa forma, Meillet não demorou a se opor às concepções da lingüística

saussuriana. Com efeito, um exame dos escritos de Saussure mostra que, para ele, o

termo social significa simplesmente pluri-individual, nada sugerido da interação social

sob seus aspectos mais gerais. No capitulo oito, de Sociolinguistic Patterns (LABOV,

1992), encontramos uma retomada das idéias de Meillet, “Estudo da língua em seu

contexto social”, e uma passagem que mostra claramente o laço que une Labov a

Meillet:

Para nós, nosso objeto de estudo é a estrutura e a evolução da linguagem no seio do contexto social formado pela comunidade lingüística. Os assuntos do ‘lingüística geral’: fonologia, morfologia, sintaxe e semântica [...]. Se não fosse necessário destacar os contrastes entre este trabalho e o estudo da linguagem fora de todo contexto social, eu diria de bom grado que se trata simplesmente de lingüística. (LABOV, 1972 [1963], p. 258)

Daí a impossível distinção entre uma lingüística geral, que estudaria as línguas, e

uma sociolingüística, que levaria em conta o aspecto social dessas línguas. Ou seja, a

sociolingüística é a lingüística. Radicalizando Meillet, Labov leva a sério até o fim a

definição da língua como fato social, mas pára por aqui a comparação. Meillet trabalhou

com línguas mortas; já Labov trabalha continuamente com situações contemporâneas

concretas, ou seja, constrói um instrumento de descrição que tenta ultrapassar,

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integrando os métodos heurísticos da lingüística estrutural. E, dessas suas pesquisas,

nasce a lingüística variacionista.

A consciência da iminência dos “problemas” que a mudança representava à sua

teorização já era clara para Saussure, como bem atesta Labov (1982, p. 19-20 apud

Lucchesi, 1998, p. 173):

A existência de mudança lingüística dentro da comunidade de fala cria sérios problemas para aqueles que trabalham com a expectativa de uma estrutura homogênea. Se a língua X está em processo de mudança, não há em princípio apenas uma resposta à questão “como a língua X funciona”. Ela funciona de várias e diferentes maneiras. O primeiro passo na construção de uma teoria geral desse tipo não é então unicamente determinada. Como Weinreich, Labov e Herzog (1968) destacaram, há uma contradição implícita entre a visão estruturalista de língua e os fatos da mudança: à proporção em que a Lingüística se tornava mais impressionada com o caráter sistemático da estrutura da língua, tornava-se mais difícil conceber a mudança dentro do sistema.

Essa se torna a principal contradição desse modelo, pois há uma incoerência

teórica entre sistema e mudança gerada pelo Estruturalismo na Lingüística, sendo essa

oposição (entre sistema e mudança) que constituirá uma das vigas fundamentais para a

sustentação, edifício teórico saussuriano.

O Círculo Lingüístico de Praga e a tendência funcionalista do Estruturalismo

Lingüístico dirigida por André Martinet promoveu o aprimoramento da teoria

saussuriana, articulada à concepção estrutural. A noção de funcionalidade se aplica à

estruturação interna do sistema lingüístico, como também às funções que esse sistema

desempenha na sociedade (daí o porquê de a língua ser vista como um sistema

funcional). Essa tendência do Círculo Lingüístico de Praga constituiu um novo ciclo no

desenvolvimento do Estruturalismo, de acordo com Lucchesi (1998, p. 173), por duas

razões:

(i) formalizou um modelo de análise que permitiu a aplicação dos princípios teóricos gerais de Saussure à análise concreta dos fatos lingüísticos; e (ii) buscou superar a contradição estabelecida por Saussure entre sistema e mudança, com o objetivo de dar maior concretitude à apreensão e representação do objeto de estudo da Lingüística.

Nesses dois planos, uniu-se à noção de funcionalidade a concepção saussuriana

de língua, desempenhando um papel decisivo, pois, segundo Lucchesi (op. cit., p. 173-

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4), permitiu-se a integração do nível fônico da língua, antes excluído por Saussure, no

campo lingüístico. Assim, o sistema fonológico que marcou profundamente os estudos

lingüísticos nas décadas de 30, 40 e 50, já que a fonologia tornou-se o principal nível de

estudo da língua, desfrutando do Estruturalismo seus maiores êxitos consagra-se como a

mais completa realização analítica da concepção de língua como sistema.

A transição entre um sistema lingüístico e outro se explicaria tanto pelo

funcionamento interno do sistema fonológico, quanto por sua funcionalidade externa

como forma de comunicação social, articulada aos limites impostos pelo formato do

aparelho fonador reunido num conceito de economia, criado por Martinet.

Porém, os desafios de explicar diacronicamente uma língua só demonstraram as

limitações do método estrutural e corroboram a assertiva de Saussure sobre a

impossibilidade da sua utilização no estudo da dimensão histórica do fenômeno

lingüístico. Desse modo, no início do Estruturalismo Diacrônico, para se comprovar a

mudança, era preciso abranger os chamados fatores externos ao sistema lingüístico, e,

conseqüentemente, seria necessário alargar a visão de língua com a qual se operava.

Porém, sob o ponto de vista estrutural, a mudança deveria ser sistemática e absoluta18.

Ou seja, como bem mostra Lucchesi (1998, p. 176), se uma mudança afeta um fonema

num dado contexto, ela deve atingir todas as realizações desse fonema nesse contexto,

com a mesma direção e intensidade.

Estudos posteriores demonstraram que pelo menos uma parte das mudanças

fônicas não são lexicalmente rudes como defendem os neogramáticos e como o

consolidaram os estruturalistas que viam a mudança fonológica como sistemática.

Lucchesi (op. cit., p. 176) ainda mostra que o Estruturalismo, vendo a língua como um

sistema homogêneo e unitário, só pôde admitir uma lógica atuando em nível do sistema:

... a mudança fonológica devia ser regida por uma lógica única e operar sistematicamente. A demonstração de que a mudança fonológica não é regida por uma única lógica sistemática, mas por “várias lógicas concorrentes”, não apenas demonstra a incapacidade de a abordagem estrutural apreender adequadamente os processos de mudança lingüística como também atinge a sua concepção de língua. Se o sistema lingüístico é realmente unitário e homogêneo, como explicar que várias lógicas concorrentes atuem no seu interior? Ou, como explicar que ele opera de várias maneiras?

18 Conseqüência de adesão de Martinet à visão sistemática de língua do Estruturalismo.

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No programa do Estruturalismo Diacrônico, porém, a análise sincrônica da

língua deveria permanecer intacta, pois, assim, o processo histórico de constituição de

uma língua deveria ser encarado como estados sincrônicos, ligados por períodos de

mudança, emergindo, desse modo, a necessidade de considerar a mudança observando

sistematicamente a variação no plano do sistema lingüístico, unindo a variação à

representação da língua. E como essa variação inerente cria determinados problemas

àqueles que tratam essa questão básica com a esperança de se deparar com uma

estrutura homogênea, os dias desse sistema uniforme, formado por unidades e regras

invariáveis, estavam contados. Assim, o estudo da mudança tornou-se terreno

privilegiado para que a Sociolingüística desenvolvesse um novo aparato teórico-

metodológico, baseado numa nova forma de representar a língua como objeto de estudo,

como bem apresenta Labov (1982, p. 19-20 apud Lucchesi, op. cit., p. 178):

Por que então Weinreich, Labov e Herzog (1968) propuseram princípios especificamente como fundamentos para a teoria da mudança Lingüística? A primeira razão é tática. A demanda por homogeneidade, e a conseqüente retratação ao idioleto são movimentos razoáveis como primeiros passos de uma descrição lingüística. Mas, no estudo da mudança lingüística, é totalmente diferente. É possível estudar mudanças concluídas, como uma série de substituições discretas de elementos em sistemas homogêneos. Mas ninguém jamais perdeu de vista o fato de que a mudança é o processo de substituição, não o resultado desse processo. Quando nós estudamos esse processo diretamente, nós somos confrontados imediatamente com o caráter heterogêneo do sistema lingüístico. Mudança implica variação; mudança é variação.

Daí a diferente abordagem da Sociolingüística em relação ao Estruturalismo.

Para Saussure, a organização estrutural do sistema lingüístico é gerada de forma alheia à

ação do falante, à sua prática lingüística ou às estruturações onde essa prática se efetiva.

Enquanto que, no modelo Sociolingüístico, oferece-se um sistema heterogêneo, no qual

o falante atua de acordo com aptidões estruturadas em que a prática lingüística se

atualiza. Assim, o falante, num dado momento, escolhe, meio que conscientemente,

uma em meio às variantes concorrentes na estrutura lingüística. Ou seja, o falante optará

por uma variante de acordo com a situação a que ele esteja exposto, pois a opção é

estabelecida, muitas vezes, pelo propósito de o falante facilitar a sua admissão num

dado ambiente ou segmento social, segundo mostra Labov (1982):

Como os sistemas lingüísticos mudam, eles oferecem para seus locutores um alcance mais amplo de possibilidades para reconhecimento de relações, por acomodar a outros, e por negociar diferenças sociais. Três recentes estudos empíricos afetam as funções de variação lingüística em interação social. (…)

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Hindle (1980) localizou a realização de vogais da Filadélfia por um único locutor registrado num dia de trabalho (novamente a agência de viagens), um jantar em família, e amigos no jogo de ponte. Armado em desenvolvimento com um modelo de doze variações na comunidade de Filadélfia, Hindle pôde mostrar como o locutor preferiu um determinado uso de uma variável de acordo com o contexto social, o sexo do destinatário e o escritório fixado, e as formas mais avançadas em interação com perscruta no jogo de ponte. A atmosfera relaxada do jantar familiar era intermediária.19

O termo “Sociolingüística” apareceu pela primeira vez em 1953, num trabalho

de Haver C. Currie. O estudo dessa disciplina desenvolveu-se nas décadas de 50 e 60,

nos Estados Unidos, e o interesse despertado pela pesquisa deve-se à grande divulgação

dos estudos de comunicação, à necessidade de maior aproximação com outros povos, ou

de conhecimento melhor da própria comunidade e à divulgação dos estudos de

Sociologia e Lingüística. Era uma volta às teorias de Humboldt, segundo as quais a

língua organizaria a visão do mundo, peculiar a cada povo. É comum, numa sociedade

falante, encontrarmos as formas lingüísticas de variação mais conhecidas por variantes.

Segundo Tarallo (2002, p. 8), variantes lingüísticas são diversas maneiras de se dizer a

mesma coisa em um mesmo contexto e com o mesmo valor de verdade. A um conjunto

de variantes dá-se o nome de variável lingüística.

Todo e qualquer trabalho envolvendo variação pode e deve ser sistematizado,

como mostra Tarallo (op. cit., p. 10):

... Tal sistematização consiste em primordialmente: 1. Um levantamento exaustivo de dados de língua falada para fins de

análises, dados estes que refletem mais fielmente o vernáculo da comunidade;

2. Descrição detalhada da variável, acompanhada de um perfil completo das variantes que a constituem;

3. Análise dos possíveis fatores condicionadores (lingüísticos e não-lingüísticos) que favorecem o uso de uma variante sobre a(s) outra(s);

4. Encaixamento da variável no sistema lingüístico e social da comunidade: em que nível lingüístico e social da comunidade pode ser colocado;

5. Projeção histórica da variável no sistema sociolingüístico da comunidade. A variação não implica necessariamente mudança lingüística (ou seja, a relação entre contemporização entre as variantes). A mudança, ao contrário, pressupõe a evidência de estado de variação anterior, com a resolução de morte para uma das variantes.

19 As linguistic systems change, they offer their speakers a wider range of possibilities for self identification, for accommodating to others, and for negotiating social differences. Three recent empirical studies bear on the functions of linguistic variation in social interaction. (…) Hindle (1980) traced the realization of Philadelphia vowels by a single speaker recorded through-out a working day (again at travel agency), at family dinner, and friends in the bridge game. Armed with a template of twelve changes in progress in the Philadelphia community, Hindle was able to show how the speaker shifted her use for the variables according to the social context, the sex of the addressee, and the office setting, and the most advanced forms in interaction with peers in the bridge game. The relaxed atmosphere of the family dinner was intermediate.

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Debate que se ascendeu no grupo da Sociolingüística foi o que se verificou no

confronto das posições de Bernestein e Labov a respeito da maneira de interpretar as

oposições dos níveis socioletos numa determinada comunidade lingüística.

A oposição de Bernestein (1964) é conhecida como “teoria ou hipótese do

déficit”, ao passo que a de Labov (1992) é a das “regras variáveis”. Os trabalhos de

Bernestein nesse domínio começaram em 1958. Seus estudos derivam de uma base

teórica, mas procuram um apoio empírico através de uma série de testes de

reconhecimento e de verificação levados a efeito por ele mesmo ou por discípulos ou

seguidores.

Do ponto de vista teórico, podemos destacar inicialmente a presença da chamada

hipótese de Sapir-Whorf, segundo a qual as diferentes línguas não se definem

simplesmente como se fossem meio de expressão do pensamento humano, mas são elas

mesmas conformadoras das idéias que os homens fazem sobre o mundo.

Bernestein (1964) parte de uma oposição mítica entre classe média ou superior e

classe baixa ou inferior, e, nesse ponto, é devedor do pensamento de Marx, para quem

as sociedades estão sempre divididas em classes antagônicas. No seu entender, as

condições de vida, numa determinada classe, levam também à constituição de uma certa

forma de linguagem. Por isso, em princípio, Bernestein distinguiu a língua popular de

classe baixa de uma língua culta da classe média, em 1958. Mas, a partir de 1962,

preferiu falar em código restrito e código elaborado.

A partir desses estudos, Labov (1982) chegou a conclusões de caráter social, ou

seja, não levando em consideração o conceito de déficit. Assim, contrariamente a

Bernestein, não aceita a teoria do déficit lingüístico que levaria a um déficit mental. Isto

é, não concorda com a posição dos que julgam que um vocabulário “pobre” e uma

gramática “pobre” levem a uma situação de inferioridade intelectual, o que justificaria

uma educação compensatória para eliminar esse déficit.

Apesar de esse modelo expor divergências junto aos mais importantes princípios

teóricos que chefiavam o estudo da mudança até então, podemos representar alguns dos

seus precursores através das referências feitas pelo próprio Labov (1992). Na década de

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20, Antoine Meillet pensava a explicação de mudança a partir da consideração do

contexto social. Meillet também é mencionado como aquele que corroeu a rígida

dicotomia do mestre de Genebra entre análise sincrônica e diacrônica, através de suas

análises estruturais de variações sucedidas no passado20.

Mas é a averiguação de Gauchat (1905), na comunidade francófona suíça de

Charmey, que é tida como “protótipo” da abordagem sociolingüística da mudança21. Os

estudos de Gauchat destacam-se por serem pioneiros, objetivando a mudança lingüística

em progresso. Ele analisou a variação em seis traços fonológicos na comunidade de

fala, e, observando a diversidade a partir de três faixas etárias, concluiu a existência de

mudanças em progresso nos traços fonológicos estudados.

Essa união dos estudos de Labov (1992) aos estudos de Gauchat (op. cit.)

explicita um propósito de análise sociolingüística: rever a idéia de que a mudança

lingüística não podia ser estudada diretamente, e sim, só após concluída22. Para superar

esse obstáculo, Labov (1992) procurou perceber a mudança em progresso na variação

observada na língua num dado momento, estabelecendo-a como estudo da mudança no

tempo aparente. Desse modo, o estudo sincrônico abria caminhos para a superação

terminante da dicotomia supracitada.

No entanto, para provar a relação entre variação e mudança como elemento

norteador para se observar o processo da mudança lingüística, era necessário aceitar a

variação como parte inerente do sistema lingüístico, para que ela constituísse objeto de

análise lingüística sistemática, rompendo, definitivamente, com a visão estruturalista de

que tal sistema seria o domínio da invariância. Determinar a sistematicidade da variação

faz-se necessário para considerar os chamados fatores externos na análise lingüística,

tornando-se sistemático quando correlacionado com os fatores sociais e estilísticos. A

explicação para a descoberta dos padrões que nortearam a variação na estrutura

20 O que, mais uma vez, comprova a tese de que o Estruturalismo Diacrônico abriu cominhos para o molde sociolingüístico. 21 The prototype of close studies of sound change in a single community is Gauchat’s (1905) investigation of the patois of Charmey, in French-speaking Switzerland. (LABOV, 1972 [1963], p. 22-23) 22 Discorrendo sobre os empecilhos impostos pela tradição lingüística à sua forma de interpretar a mudança, Labov (1972 [1963], p. 19-20) destaca, além da inflexível dicotomia de Saussure – diacronia vs sincronia – a impossibilidade apontada por Bloomfield e Hochett de se analisar diretamente a mudança lingüística: “Bloomfield defened the regularity of sound change against the irregular evidence of the present by declaring (1933, p. 364) that any fluctuations we might observe would only be cases of dialect borrowing. Next Hockett observed that while sound change was too slow to be observed, structural change was too fast (1958, p. 457)”.

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lingüística foi encontrada na estratificação social e na avaliação social das variantes

lingüísticas, tanto no estudo de Martha’s Vineyard quanto no estudo de Nova Yorque.

Superava-se, assim, a visão estruturalista de que a análise lingüística restringia

os limites das relações internas ao sistema lingüístico. A teoria sociolingüística afirmava

que apenas a consideração desses fatores estruturais internos não era suficiente para

constituir a explicação da mudança (LUCCHESI, 1998). Dessa forma, o modelo

sociolingüístico de explicação da mudança quebra as fronteiras impostas pelos

estruturalistas, dilatando a visão do encaixamento estrutural esboçada por Martinet

(1955).

O ano-chave para a eclosão da Sociolingüística nos Estados Unidos é 1964, com

a publicação de livros de Gumperz, Labov, Hymes e a conferência de William Bright

em Los Angeles, vinda lume dois anos depois. Para Bright, o escopo da Sociolingüística

seria “mostrar a sistemática co-variação da lingüística e da estrutura social e talvez até

mostrar uma relação causal numa ou noutra direção”.

Segundo Bell (1976, p. 28 apud ELIA, 1987, p. 65):

... a Sociolingüística (distinta da Sociologia da Linguagem) estaria enriquecida com dados de natureza social, o que lhe permitiria ir além da frase, no sentido de uma gramática da interação falante/ouvinte. Na verdade a Sociolingüística tem procurado realizar o projeto de Meillet de estudar a covariação entre a estrutura social e a lingüística, mas numa perspectiva sincrônica. Contudo as pesquisas dessa natureza têm produzido fracos resultados. E a razão é que as estruturas morfossintáticas pouco têm a ver com a estrutura social.

Weinreich, Labov e Herzog (1968) confirmam a existência da nova teoria,

trazendo seus princípios empíricos. Assim, a sociolingüística enfrenta o desafio de

tentar processar, analisar e sistematizar o universo aparentemente caótico da língua

falada. A sociolingüística quantitativa surgiu, então, através do teórico-metodológico

William Labov, americano e primeiro sociolingüista a surgir no campo da investigação

lingüística. Segundo Tarallo (2002, p. 7), podem ser chamados de sociolingüistas todos

aqueles que entendem por língua um veículo de comunicação, de informação e de

expressão entre os indivíduos da espécie humana.

Entre sociedade e língua não há uma relação de mera casualidade. Desde que

nascemos, um mundo de signos lingüísticos nos cerca, e suas inúmeras possibilidades

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comunicativas começam a tornar-se reais a partir do momento em que, pela imitação ou

associação, começamos a formular nossas mensagens. Sons, gestos e imagens cercam a

vida do homem moderno, compondo mensagens de toda ordem, transmitidas pelos mais

diferentes canais. Em todos, a língua desempenha um papel preponderante, seja ela oral

ou escrita.

Desse modo, a corrente Sociolingüística, iniciada na década de 60, com esses

estudos práticos, elaborada numa teoria geral da mudança lingüística, buscava

desenvolver uma nova concepção do estudo da lingüística. Com sua afirmação, visando

conceber o objeto de estudo, a Sociolingüística ocupava uma posição central no

processo de ruptura epistemológica através do qual um modelo teórico sucede o outro,

na disputa pela hegemonia que caracteriza o desenvolvimento histórico de uma ciência

(Lucchesi, p. 1998). Isso fez com que a Sociolingüística Variacionista se tornasse uma

das candidatas à sucessão do Estruturalismo como modelo hegemônico da ciência

lingüística, cuja origem é definida pela exasperação da contradição entre mudança e

sistema no âmago do estruturalismo. A partir dessa contradição, surge não apenas a

Sociolingüística, mas também outras duas correntes ou programas de pesquisa: a

Etnografia da Fala e a Sociologia da Linguagem, capitaneadas respectivamente por Dell

Hymes e Joshua Fishman.

Hymes destaca a importância da diversidade que caracteriza a dimensão sócio-

histórica do fenômeno lingüístico dentro do seu programa de pesquisa; ao passo que

Fishman enfatiza a interação entre língua e sociedade. Sendo que nessas duas correntes,

a língua deve ser entendida como forma verbal e comunicação social, institucionalizada

por uma comunidade de falantes. O que importa agora é investigar o modo como as

forças sociais atuaram no sentido de unificação lingüística dessas comunas, bem como

identificar os resíduos resultantes desse processo de planificação e os focos que a ele

resistiram ou o dificultaram.

De forma geral, todas essas novas tendências centralizam o desenvolvimento de

um modelo capaz de dar conta, de forma satisfatória, da dimensão sócio-histórica do

fenômeno lingüístico, ou seja, dos fatos concernentes à variação e à mudança lingüística

e à interação entre a língua e a sociedade.

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Já à Sociolingüística é atribuído o estudo das relações entre língua e sociedade.

Aqui, língua deve ser entendida como um sistema de vários níveis integrados num todo

historicamente estruturado. A sociolingüística se ocupa, assim, com o estudo da

possível incidência das forças sociais sobre os estratos fonológicos, morfológicos,

sintáticos e semânticos das línguas.

Foi William Labov que voltou a estudar a relação entre língua e sociedade e na

posição, virtual e real, de sistematizar a variação existente e própria da língua falada.

Depois de seu primeiro estudo, em 1963, sobre o inglês falado na ilha de Martha’s

Vineyard, no estado de Massachusetts (EUA), vários outros surgiram com estudos sobre

a estratificação social do inglês falado na cidade de Nova Yorque (1966)23; a língua do

gueto, entre outros.

Como podemos observar, os estudos de Labov, no campo da Sociolingüística,

datam da década de 60 e seu objeto de estudo segue uma orientação anti-saussuriana, ou

seja, contrária à corrente dominante e que deu origem ao Cours de Linguistique

Générale. Assim, ao invés da langue, como fez Saussure, Labov centra seus estudos na

parole. E ainda opondo-se ao mestre de Genebra, enfoca o estudo da parole de um ponto

de vista social e não individual. A pesquisa realizada em Martha’s Vineyard, de acordo

com Elia (1987, p. 81), tem por base a:

... tendência para “centralizar” a primeira vogal desses grupos, ou seja, para torná-la mais “alta” (caminhando num sentido de e). Interrogou a respeito 69 informantes, tomando em consideração fatores de natureza intra- e extralingüísta. Dentre os primeiros: a posição tônica ou átona do ditongo, o seu ambiente fonético, “quais as consoantes entre as quais está colocada”, a influência estilística (estilo familiar, emotivo, cuidado e lido). Fatores extralingüísticos seriam a condição de habitantes ou veranistas, a profissão, a idade, a origem étnica. Estabeleceu ainda Labov uma escala de quatro graus quanto à maior ou menor abertura do primeiro elemento do ditongo, ou seja, detectou quatro alofones na pronúncia dos mencionados ditongos, se quisermos usar a conhecida e útil nomenclatura estruturalista. Observou ainda que a “centralização declinou fortemente para fins dos anos 30 e depois tornou a subir com o término da guerra”. Das suas pesquisas, concluiu Labov que: a) o alteramento é fenômeno dialetal, isto é, próprio da ilha de Martha’s Vineyard; b) que, na própria ilha, houve tendência para a normalização, ou seja, no sentido das pronúncias /ay/ e /aw/, próprias da língua-padrão; c) que, para essa evolução, concorreram causas sociais, como contatos maiores com o continente, através, principalmente, de uma considerável leva periódica de veranistas, que tem apenas tendências de recreio na ilha; mas também por meio da escola, particularmente a superior, aonde vão estudar os filhos de famílias locais.

23 Sob a orientação de Uriel Weinreich.

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A língua funciona como elemento de interação entre o indivíduo e a sociedade

em que ele atua. É através dela que a realidade se transforma em signo, pela associação

de significantes sonoros e significados arbitrários, processando, assim, a comunicação

lingüística. Preti (1977, p. 2) afirma que a sociedade não é possível a não ser pela

língua; e pela língua também o indivíduo. O despertar da consciência na criança

coincide sempre com o aprendizado da linguagem, que a introduz pouco a pouco como

indivíduo na sociedade.

Os estudos de Labov, acerca de mudança em progresso, conduziam-no a uma

nova teoria da mudança. O Empirical Foundations for a Theory of Language Change,

escrito por Uriel Weinreich, William Labov e Marvin Herzog, entre 1966 e 1968, traz,

além dos estudos labovianos sobre Martha’s Vineyard e dos de Nova Yorque, os

estudos de Herzog sobre a dialectologia do iídiche no norte da Polônia, e o trabalho de

Weinreich no Language and Culture Atlas of Ashkenazic Jewry (WEINREICH, U.

LABOV, W & HERZOG, M., 1968).

O ato de remir a historicidade da língua é uma outra maneira referente à forma

de compreender o objeto de estudo entre a Sociolingüística e o Estruturalismo. O objeto

de estudo da lingüística passa a ser produto do processo histórico de constituição da

língua, deixando de ser independente e não-histórico (LUCCHESI, 1998). Em relação

aos princípios universais, Labov (1982, p. 20-21) assevera que:

(...) a doutrina histórica defende que as coisas não são idênticas: explicações baseadas em princípios universais da natureza humana ou a relativamente constante fisiologia dos seres humanos não são suficientes para explicar eventos históricos. Isso implica que as condições iniciais e os ambientes contextuais de um conjunto de mudanças lingüísticas são significativamente diferentes de um outro conjunto. (...) Pode haver universais da mudança lingüística, independentes das condições históricas. Muitas teorias da mudança lingüística são inteiramente devotadas à sua busca. Mas nós veremos que, se tais generalizações a-históricas existem, elas são raras. Isso, por si só, pode explicar os sucessos limitados dos recentes esforços em utilizar técnicas formais para desenvolver teorias gerais da mudança lingüística24.

O Empirical Foudation for a Theory of Language Change impunha nova

realização analítica da língua, integrando o conjunto de realizações sociais, culturais e

24 Pegar original no seu livro.

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ideológicas25. Dessa forma, a língua não seria um sistema homogêneo, unitário; e sim,

um sistema heterogêneo e plural. Weinreich, Labov e Herzog (1968) reforçam a aptidão

do falante em lidar com essa heterogeneidade do sistema, sem que haja um

comprometimento da eficácia da comunicação lingüística. Esse ajuste da competência

lingüística do falante em relação à heterogeneidade lingüística é mostrado como

empiricamente valioso à sustentação da concepção da língua, de acordo com a

Sociolingüística, como bem mostram Mattos e Silva (1980/81, p. 96-7 apud

LUCCHESI, op. cit., p. 186-7):

O fundamental dessa nova proposta se insere num entendimento novo da estrutura lingüística. A especulação lingüística a partir de uma visão de estrutura lingüística como homogênea pelos estruturalistas e gerativistas é considerada ineficaz por não ser compatível com a realidade; para os chamados sociolingüistas americanos, a estrutura é intrinsecamente heterogênea, e heterogeneidade e estrutura não são incompatíveis, ao contrário, são necessárias para o funcionamento real de qualquer língua. Prova-se isso pela capacidade e competência do individuo em codificar e decodificar essa heterogeneidade. A partir dessa visão de estrutura lingüística, os autores propõem que as variáveis contextuais, estilísticas, etárias, sociais se insiram nas regras de competência e não sejam consideradas como fenômeno de desempenho.

Essa nova relação entre a língua e o falante está ligada a dois planos distintos do

produto teórico: a formalização da língua como um sistema heterogêneo e variável e a

visão de uma competência lingüística igualmente heterogênea (LUCCHESI, 1998).

A Sociolingüística Variacionista destaca cinco problemas que foram reunidos e sistematizados para resolver a questão crucial da mudança lingüística: o problema das restrições (constraints problem), o problema da transição (transition problem), o problema do encaixamento (embedding problem), o problema da avaliação (evaluation problem) e o problema da implementação (actuation problem). O primeiro problema, o das restrições, define que condições favorecem ou

restringem as mudanças, e, conseqüentemente, apresentará um bloco de possíveis

variantes lingüísticas. Ao estabelecer hipóteses que possam regular as variáveis

25 Conjunto de relações que se atualizam nessa representação.

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lingüísticas, comprova que não existe variação livre, uma vez que esta é estabelecida

por fatores sociais e estruturais.

O outro problema colocado, o da transição, foi a necessidade de definir e

investigar o percurso realizado pela mudança. O tempo real seria o estudo da variável

em diferentes tempos, ou seja, diacronicamente26. Sincronicamente, esse estudo seria

realizado em função da faixa etária dos informantes, para se alcançar a primeira

dimensão histórica da análise (TARALLO, 2002). Desse modo, torna-se possível, com

esses dois tempos, adquirir duas direções básicas na variação lingüística: a variação

estável e a mudança em progresso27.

O problema do encaixamento é fundamentado na máxima do Estruturalismo

Diacrônico, de que só haveria mudança lingüística quando houvesse introdução de uma

variante no sistema lingüístico, no qual ela se inserisse. Esse problema procura

comprovar ou não o encaixamento lingüístico e social de uma dada variável. No modelo

sociolingüístico, é o encaixamento na estrutura social que revela o seu maior avanço.

Desse modo, a explicação dos fatos lingüísticos exige um maior número de dados,

compreensão escrupulosa da rede de relações sociais, onde as atividades lingüísticas se

atualizam. Por fim, a tarefa mais árdua é precisar em que medida e grau de intensidade

apresenta a covariação entre as diferenças nos padrões sócio-culturais e ideológicos e a

mutação observada no processo de estruturação da língua.

Um outro problema, o da avaliação, baseia-se exatamente na avaliação dos

membros da comunidade a respeito de dada variável. Esse tratamento sociolingüístico,

relembra Saussure em um princípio em que o indivíduo aceita o processo de

estruturação lingüística passivamente. Essa avaliação pode ser feita através de

comparativos em vários estilos de fala, com um cruzamento entre classes sociais

analisadas, ou testes que estimulem o uso de uma dada variável pelos informantes (teste

de produção) e, ainda, questionamentos sobre indicadores e os marcadores lingüísticos

que não se mostram em nível de conhecimento na comunidade: a diferença entre as duas

26 Observaria uma variante hoje, e, num outro momento, observar-se-ia a mesma variante com os mesmos informantes; daí se saberia que direção essa variante tomou. 27 Variação estável seria a estabilidade das adversárias e/ou subsistência das variantes de forma estável, ao passo que a mudança em progresso seria a indicação de duelos de morte entre as variantes, havendo, assim, a consolidação em dois tempos: aparente ou real. (Tarallo, 2002, p. 62)

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consiste no fato de determinados marcadores permitirem essa variação lingüística

(TARALLO 2002, p. 62).

O problema da implementação desvenda onde e quando determinada mudança

ocorreu:

Em outras palavras, inicia-se o processo de investigação

no momento presente; volta-se ao passado para o devido encaixamento histórico das variantes, retornando-se, a seguir, ao presente para o fechamento do ciclo de análise. (Tarallo, 2002, p. 64).

A necessidade de a investigação ter início no presente (tempo aparente) e retornar ao passado (tempo real) se justifica pelo princípio da uniformidade.

Segundo esse princípio, as forças que atuam no momento sincrônico presente são (ou deveriam ser) as mesmas que atuam no passado e vice-versa. Portanto uma teoria da mudança lingüística deve guiar-se por uma articulação teórica e metodológica entre presente e passado e presente. (TARALLO, 2002, p. 64).

Como observamos, o problema da implementação estabelece que a mudança da

língua começa quando um dos traços característicos da variação da fala se espalha por

todo um subgrupo da comunidade de fala.

Desse modo, a pesquisa Sociolingüística busca sistematizar a variação. Para que

isso aconteça, devemos formular um corpus fundamentado em dados naturais de fala,

descrever detalhadamente uma dada variável e suas respectivas variantes, estabelecer

quais os possíveis fatores lingüísticos e sociais que influenciam a variável, encaixar

lingüisticamente, avaliá-la e observar os processos de transição e implementação que a

envolve. Assim damos conta da dimensão social, cultural e histórica de determinado

fenômeno lingüístico.

Todavia, como mostra Tarallo (2002, p. 84), a pesquisa sociolingüística não pára

por aqui: Uma teoria geral de mudança lingüística para ser satisfatória deverá dar conta das condições que determinam o início, a velocidade, a direção, a propagação e o término de uma determinada mudança, e, eventualmente, a

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partir de dados analisados de vários sistemas, generalizar o conjunto de tais condições para a mudança lingüística.

As variáveis serão apresentadas pela incidência dos mesmos efeitos lingüísticos e sociais em iguais processos. Dessa forma, essa sistematicidade torna-se o foco de estudos na pesquisa sociolingüística.

3.2 MUDANÇA DE LÍNGUA

Atribulações históricas têm feito com que numerosos povos mudem de língua no

curso dos tempos. A adoção de um idioma novo acarreta o esquecimento, a morte do

antigo, que as novas gerações vão progressivamente desprezando. São, de fato, os povos

que, seduzidos pelo superior prestígio de uma outra língua, adotam-na em prejuízo

daquela que haviam recebido dos antepassados.

A mudança da língua é um fenômeno muito complexo. A morte de uma delas é

precedida de um período de bilingüismo, mais ou menos longo, em que se trava árdua

luta pela supremacia. O que decide a vitória é o prestígio que decorre de: valor utilitário,

glória literária e situação social dos falantes (cf. SILVA NETO, 1957). Pouco a pouco,

o que menos satisfaz essas condições vai sendo falada por um número cada vez menor

de pessoas e acaba por ser relegada ao uso das camadas sociais inferiores. Breve é

totalmente esquecida nos centros urbanos, e o seu emprego se limita a círculos rurais

cada vez mais afastados. Finalmente chega o dia em que morre a última pessoa capaz de

entendê-la.

De acordo com Silva Neto (1957), no período do bilingüismo, característico do

contato, a língua principal está sujeita às seguintes conseqüências:

1. Simplificação do seu sistema gramatical, pois aos aloglotas escapam às

finuras e sutilezas da língua que aprendem; 2. Precipitação das tendências de sua deriva, pois em estrutura social incerta

há um enfraquecimento da norma e relaxam-se as sanções do uso considerado bom. As crianças encontram à roda numerosos meios de expressão, e o grupo que com elas convive não é capaz de afogar no nascedouro as informações infantis;

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3. decalques e cruzamentos, decorrentes da coalescência dos sistemas que, assim, podem interpenetrar-se.

4. ação simultânea e idêntica dos hábitos lingüísticos pré-exixtentes, sobre novas condições. É a ação do substrato.

(grifos do autor)

Como se vê, o bilingüismo pode consistir em manejo de duas línguas diversas,

ou de um falar local e uma língua comum.

4 ESTRUTURA PROSÓDICA DO PORTUGUÊS

Uma das noções básicas da lingüística é a de constituintes. Constituinte é,

segundo Bisol (2001, p. 229), uma unidade lingüística complexa, formada de dois ou

mais membros, que estabelecem entre si uma relação do tipo dominante / dominado.

Daí, a preocupação maior da prosódia ser o conhecimento da sílaba predominante,

chamada tônica, uma vez que todo constituinte pressupõe, como antes mencionado, um

dominante (cabeça) e um ou mais dominados.

Como o constituinte fonológico, sintático ou morfológico tem suas próprias

regras e princípios, é de suma importância que se tenha em mente que o constituinte

prosódico não apresenta compromissos de isomorfia com os constituintes de outras

áreas da gramática.

De acordo com Bisol (op. cit., p. 230), os constituintes prosódicos dispõem-se hierarquicamente na seguinte forma:

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Hierarquia Prosódica enunciado U (do inglês utterance) frase entonacional I (do inglês intonacional phrase) frase fonológica Φ grupo clítico C palavra fonológica ω pé Σ sílaba σ E ainda por diagrama arbóreo: U enunciado

I (I) frase entonacional

Φ (Φ) frase fonológica

C (C) grupo clítico

ω (ω) palavra fonológica

Σ (Σ) pé

σ (σ) sílaba Bisol (2001, p. 230) ainda diz que os princípios que regulam a hierarquia

prosódica, anteriormente apresentada, são: i) cada unidade de hierarquia prosódica é composta de uma ou mais unidades categóricas imediatamente mais baixa; ii) cada unidade está exaustivamente contida na unidade imediatamente superior de que faz parte; iii) os constituintes são estruturas n-árias; iv) a relação de proeminência relativa, que se estabelece entre nós irmãos, é tal que a um só nó se atribui o valor forte (s) e a todos os demais o valor fraco (w).

Os constituintes prosódicos, aos quais nos deteremos neste estudo, serão a

sílaba, o acento e o pé, tendo em vista que estes são característicos na síncope da

postônica não-final.

4.1 SÍLABA

Para melhor entendermos esse subcapítulo, expusemos, a seguir, algumas

definições lingüísticas acerca da sílaba.

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Os fonemas (vogais e consoantes) funcionam na enunciação lingüística

combinados numa unidade superior, que é conhecida tradicionalmente pelo nome

grego de “sílaba” (Camara 1973, p. 26).

Dentro da fonética pura, tem-se procurado definir sílaba, levando-se em conta

ou a emissão do ar, ou a energia da emissão, ou a variação da perceptibilidade numa

enunciação contínua (Camara 1977a, p.70).

Sílabas são constituídas de vogais – que representamos por V – e consoantes –

que representamos por C (...) A vogal é sempre obrigatória (...) A vogal é o núcleo da

sílaba, e as consoantes ocupam as partes periféricas (Silva 2002, p.152).

De acordo com as definições acima, observa-se que os autores têm pelo menos

um ponto em comum acerca da sílaba: de que ela tem como núcleo a vogal. A

enunciação da sílaba, quando esta é completa, dá-se por um aclive, um ápice e um

declive. Ao ápice, sempre corresponderá uma vogal, uma vez que a vogal é o momento

essencial da sílaba. É sabido que a sílaba do português é formada por três estruturas

fundamentais: V (sílaba simples), CV (sílaba complexa, aberta ou leve por terminar no

silábico) e, como sílabas fechadas ou pesadas, VC (em que falta o aclive) e CVC (sílaba

completa, com aclive e declive). Dessa forma, temos o seguinte quadro de possíveis

formações silábicas no português, conforme destacado em negrito:

V a - sa

VV eu - ro - pa

VC ar - pa

VCC ins - pi - rar

CV ca - bo

CVC par - te

CVCC mons - tro

CCV bra - vo

CCVC in - glês

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CCVCC trans - tor - no

CVV lei - to

CCVV de - grau

CCVVC claus - tro - fo – bia

De acordo com essas estruturas, o menor padrão silábico do português é o V, e o

maior, CCVCC28, definindo, dessa forma, o tamanho mínimo e o máximo de segmentos

da sílaba. Vale salientar que, para haver uma boa-formação, não basta que os segmentos

se adaptem ao padrão silábico da língua, mas que haja um ajustamento às condições de

boa-formação.

4.2 CONDIÇÕES DE BOA-FORMAÇÃO

Em português, o ataque máximo é de dois elementos, sendo o primeiro uma

oclusiva ou fricativa29 labial, e o segundo, uma não-nasal. Essa Condição de Ataque dá

origem à seqüência Obstruinte + Líquida (OL), seja esta líquida vibrante simples ou

lateral. A partir daí, Amaral (1999, p. 78) apresenta os seguintes ataques complexos na

língua portuguesa:

br brisa cr cravo dr quadro fr fraco gr grupo pr primo tr trevo vr livre bl bloco cl clave dl Edler (raro) fl flácido gl glicose pl pluma tl atlético vl Vladmir (raro)

28 Nas formas VV, CVV, CCVV e CCVVC, o segundo V equivale a um glide e, de acordo com Bisol (1989), desempenha função de consoante, encaixando-se, assim, no padrão CCVCC. 29 Não será permitido seqüenciamento de fricativas e líquidas do tipo /sl/, /sr/, /zl/, /zr/.

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As seqüências, acima mencionadas, estão de acordo com o Princípio de

Seqüenciamento de Soância (PSS), desenvolvido por Clements (1990). Essa é a

proposta para as generalizações que governam a ordem periférica de segmentos dentro

da sílaba, colocada por alguns gramáticos, desde o princípio do século passado. De

acordo com esse princípio, a partir de uma escala de soância, os segmentos com posição

mais alta ficam no núcleo da sílaba; já os segmentos com posição mais baixa ficam nas

margens. E essa regularidade de estrutura da sílaba deve-se ao Ciclo de Soância

(CLEMENTS, op. cit., p. 284), no qual o contorno da soância da sílaba ótima aumenta

maximamente no início e cai minimamente no final como uma curva. Os sons

obstruintes são os menos soantes, e as vogais são as mais soantes. A ordem da escala de

soância é: O > N > L > G > V30.

Desse modo, as seqüências br e fl são permitidas no português pelo fato de

crescerem em direção ao núcleo. Já *rb e *lf não são, uma vez que violam o PSS, já que

o segundo elemento decresce em relação ao núcleo. A definição de soância se dá em

termos de traços binários, envolvendo as quatro maiores classes de traços:

O > N > L > G > V

- - - - + silábico

- - - + + vocóide

- - + + + aproximante

- + + + + soante

0 1 2 3 4 grau de soância

Como podemos observar, as vogais têm maior grau de soância (4) e as

obstruintes têm o menor grau (0). Desse modo, a seqüência dr de drama é bem-formada

porquanto o contorno de soância cresce em direção ao pico. Mas *rda.ma seria mal

formada, pois o segundo elemento do ataque é menos soante do que o primeiro, o que

violaria o princípio.

30 Tais termos significam, respectivamente, O - Oclusivas; N - Nasais; L - Líquidas; G - Glides e V - Vogais.

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Assim, a tendência do português, como a de outras línguas, de preferir sílabas

com elementos adjacentes separados por uma distância mínima de dois graus na escala

de soância, faz com que seqüências do tipo OO, ON, NN e NL sejam bloqueadas.

Não nos aprofundaremos mais na questão de sílabas, pois, para a análise deste

estudo sociolingüístico, importa-nos o padrão universal CV (apesar de o padrão CV

implicar em CCV, porém, vale ressalvar que o ataque complexo não influi no peso da

sílaba, mas sim, a coda) representando uma sílaba aberta canônica da posição postônica

não-final das proparoxítonas (ár-vo-re). A sílaba precedente também pode ser leve ou

pesada. Leve (CV) terá apenas uma mora; pesada (CVC), duas moras.

No que tange à coda, somente as soantes /l, n, r/ e /s/, de acordo com a Condição

de Coda, podem estar nessa posição: cal-do, bar, can-ga, cos-tu-me. Uma seqüência das

duas também é válida (hífens), mas outras, não31.

Sabe-se que a sílaba postônica não-final das proparoxítonas tem como molde a

sílaba universal (CV ou CCV), como os exemplos que seguem:

plás ti co mú si ca mús cu lo fá bri ca elé tri ca CV CV CV CCV CCV e deve ajustar-se às seguintes condições, de acordo com Amaral (1999, p. 80):

1. O ataque pode ser simples ou complexo32. Qualquer consoante pode representar o ataque simples. (pé.ta.la) 2. O ataque complexo tem que atender às Condições do Ataque: em C1, uma consoante [-cont] ou [+cont, +lab]33, em C2 uma soante líquida. (fá.bri.ca). 3. A sílaba não pode ter coda. (*mú.sir.ca)

O ataque requer dois elementos que não sejam adjacentes na escala de soância,

assim como no espanhol: obstruinte > nasal > líquida, prevendo a distância de dois

31 Se, por exemplo, houver uma consoante oclusiva numa posição inicial e medial, /p/ e /t/ em pneu e ritmo, a primeira consoante não pode ser associada a um nó silábico, deixando o contexto propício à criação de uma epêntese: pineu ou peneu, ritmo. Neste último caso, é interessante observar que a vogal epentética cria uma proparoxítona em nível de superfície. 32 Simples quando houver uma só consoante formando o ataque e complexo havendo mais de uma, como em, respectivamente, cá.ga.do e grá.vi.da. 33 Leia Cont por contínua e Lab por labial.

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graus entre eles, o que caracteriza o ataque ótimo. A sílaba precedente da postônica não-

final pode ter coda preenchida por soante (l, n, r) ou por /S/ (pól.vo.ra, prín.ci.pe,

ár.vo.re, mús.cu.lo).

4.3 O ACENTO

De acordo com Camara (2002), tanto no português quanto no espanhol, a

acentuação paroxítona é mais generalizada decorrendo para a língua um ritmo

‘grave’, que contrapõe ao ritmo esdrúxulo italiano, resultante da retenção dos

proparoxítonos latinos e ao ritmo agudo do francês, que é uma língua de acento fixo,

constituída de vocábulos oxítonos. Com um amplo empréstimo léxico do tupi e das

línguas africanas, o português brasileiro se diferencia do europeu por uma maior

quantidade de vocábulos oxítonos. Concomitantemente, a língua padrão brasileira

distingue-se da língua popular em detrimento da manutenção dos proparoxítonos, que

tende a reduzir-se a paroxítonos pela supressão do segmento postônico, como exérço

por exército (Cf. Camara, 2002, p. 65).

4.3.1 O acento latino e sua natureza no período clássico

O acento do primitivo indo-europeu diferia, quanto à posição no vocábulo, do

acento latino e mesmo do acento grego. Enquanto nessas línguas deveria incidir apenas

sobre as três últimas sílabas da palavra, no indo-europeu, era inteiramente livre,

podendo recair sobre qualquer sílaba inicial, medial ou final, por mais extenso que fosse

o vocábulo. Quanto ao acento do indo-europeu, é provável que, num momento anterior

às primeiras migrações arianas, fosse um acento de caráter preponderantemente musical,

um tom. Seria uma tendência dialetal da língua primitiva, que atuaria principalmente

nos domínios orientais do território em que se falava o indo-europeu, tendo-se

conservado assim nas línguas da Índia e no grego.

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Alguns lingüistas falam numa origem indo-européia para a intensidade inicial

que deveria primitivamente incidir sobre a raiz, a parte mais importante da palavra, que

encerra a sua significação geral, e que na morfologia do primitivo indo-europeu, que

não conhecia a prefixação, era o elemento inicial do vocábulo, ao qual se seguiam,

sempre na mesma ordem, os sufixos e as desinências. Esse seria o caráter do primitivo

acento latino, que continuava desse modo a tradição do itálico. Esse acento inicial,

fortemente intensivo, predominou em latim até um, ou, no máximo, dois séculos, antes

da época literária. Como acontece em qualquer língua que possua um acento intensivo,

as palavras muito extensas costumam apresentar, além do acento principal, uma espécie

de contra acento secundário, como, por exemplo, em português, palavras como

consideravelmente, impresumível.

Assim, por ocasião da vigência da intensidade inicial em latim, os vocábulos

mais extensos recebiam em sua parte final um acento secundário, que deveria recair na

penúltima sílaba da palavra se a referida sílaba fosse longa, e na antepenúltima se, ao

contrário, fosse breve. Ainda antes do período literário, sofreria o acento latino uma

transformação, tornando-se esse contra acento final o acento principal da palavra,

passando a intensidade inicial do vocábulo a atuar como um acento secundário. A causa

dessa transformação, que veio atingir apenas a localização do acento (e não, a sua

natureza, pois que continuava sendo um acento intensivo), parece acordar na analogia

da maior parte das palavras da língua, que não contavam mais de duas ou três sílabas,

confundindo-se assim acento inicial e final.

Mesmo com os primeiros documentos literários, não se teria completado

inteiramente essa transformação, podendo, em determinadas circunstâncias, incidir o

acento na primeira sílaba dos tetrassílabos (fácillus), ou nas palavras desse tipo de mais

de quatro sílabas, conservando-se antes da penúltima sílaba, como no caso de puéritia.

Um vestígio da intensidade inicial permaneceria na conservação dos fonemas de

palavras, que geralmente se mantêm inalterados não só em todo o período da língua

latina, como também na fase do romance e das modernas línguas neolatinas. Apareceria

ainda como um processo estilístico, principalmente na poesia arcaica, no emprego da

aliteração.

Os gramáticos latinos costumavam referir-se a três espécies de acento em latim:

agudo, circunflexo e grave, seguindo as teorias dos gramáticos gregos. No latim, porém,

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não havia necessidade de se empregarem tais sinais pela extrema simplicidade das

regras de acentuação. Entretanto, os gramáticos latinos insistem na afirmação da

existência das três espécies de acento.

É interessante observar que estudos modernos de fonométrica experimental

venham, de certo modo, trazer o seu consentimento, senão mesmo quase que uma

categórica justificativa a essa teoria da concomitância da altura e da intensidade. Ora,

isso se aplica a qualquer língua, por conseguinte, ao latim clássico. Verifica-se também

que a intensidade, do ponto de vista fisiológico, é produzida essencialmente por uma

contração violenta dos músculos localizados abaixo do tórax. Quanto à altura, esta é

produzida pelas vibrações das cordas vocais, dependendo da freqüência dessas

vibrações do comprimento e da tensão das mesmas. Mas além dessa tensão mecânica

das cordas vocais, há de se considerar também o que os foneticistas e fisiológicos

costumam denominar a sua tensão passiva. Ou seja, a simples passagem de ar mais

violentamente expelido dos pulmões, o que sempre acontece na produção da

intensidade. Assim, combinam-se no acento latino três elementos – intensidade, altura e

quantidade. Não se pode negar, pois, uma natureza musical. Entretanto, após a

explanação supracitada, observa-se que essa natureza musical não era o caráter único,

nem mesmo dominante, no acento latino.

4.3.2 Particularidade do acento

O sistema acentual do português possui muita semelhança com o sistema de

acento de outras línguas (AMARAL, 1999, p. 93-5), a saber:

1. Genérica: uma sílaba da palavra lexical possui o acento primário, e isso vem

caracterizar formalmente uma determinada unidade de cadeia falada. Logo, o acento

individualiza as unidades semânticas no continuum da fala;

2. Culminativa: as sílabas de acento secundário subordinam-se à portadora do acento

primário. Mas vale salientar que há uma diferença prosódica entre as sílabas átonas no

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vocábulo. Ao se ouvir uma proparoxítona, por exemplo, tem-se a nítida impressão de

que há uma leve diferença entre as duas postônicas: a postônica não-final parece ser

mais débil que a final. Já as pretônicas são diferenciadas das postônicas por possuírem

uma ligeira força expiratória maior;

3. Delimitativa: o acento localiza-se nas proximidades das bordas do domínio. Isso

porque o acento secundário mais forte tende a estar ao lado oposto do domínio do

acento primário. Como no português só se acentuam as três últimas sílabas, o acento

primário fica próximo à borda direita da palavra ou radical (domínio), e o acento

secundário mantém-se ao lado esquerdo do domínio do acento primário;

4. Peso silábico: este afeta a localização do acento, apesar de haver certa controvérsia na

literatura a esse respeito34;

5. Alternância rítmica: a limitação de sílabas acentuadas ou não evita seqüências

uniformes e choques acentuais. Em português, as sílabas tendem a agrupar-se da direita

para a esquerda (duas a duas), sendo proeminentes à esquerda. Num outro nível, os dois

acentos se agrupam, dando ao da direita, o mais saliente, o acento da palavra.

4.3.3 O pé silábico

As sílabas se organizam em pés, e esses pés, em palavras. A relação de

relevância relativa apresenta um dos elementos do pé como o mais forte, e entre os pés,

o mais relevante. Assim, a sílaba tônica de uma palavra ocorre sobre o relevante mais à

direita.

O pé binário ou dissilábico é o mais comum e é caracterizado por uma sílaba

forte e uma sílaba fraca. A mais forte, relevante, chamamos cabeça do pé. No que tange

à relevância silábica, podemos nomear os pés em iambo, troqueu e dátilo35, quando

34 Cf. Amaral, 1999, p. 94-5. 35 Iambo é o pé binário cuja proeminência do acento se dá à direita da palavra; e troqueu, é o pé cuja proeminência se dá à esquerda de palavras com pés binarios. Já o dático, é quando a proeminência acontece à esquerda, porém este se dá em pés ternários (AMARAL, op. cit., p. 100). Ver também acerca das propriedades rítmicas dos pés silábicos em Collischonn, 2005, p. 45-51.

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forem respectivamente oxítonos, paroxítonos e proparoxítonos. Vejamos os exemplos

que seguem:

σw σs σs σw σs σw A R A R A R A R σs σw σs A R A R A R b a l é c a s a n ú m e r o (iambo) (troqueu) (dático)

pés binários pé ternário

Afirmando que o idioma português é caracterizado pelo pé binário, Bisol diz que

as proparoxítonas revelam um pé ternário no nível de palavra prosódica pronta, mas

internamente desenvolvem um pé binário, na regra geral. Lee analisa com privilégio o

iambo, no entanto considera as proparoxítonas como troqueus. Tendo em vista que o

português é uma língua de pés limitados (binários), as proparoxítonas constituem uma

exceção no sistema de acento. Dessa forma, é necessário fazer uso da

extrametricidade36, para encaixar as proparoxítonas no tipo de pé básico da língua (no

máximo, duas sílabas num pé).

4.4 AS VOGAIS E SUAS CARACTERÍSTICAS NO PB

As vogais portuguesas constituem o que Trubetzkoy chamou de sistema vocálico

triangular. Seriam vogais anteriores, produzidas através de um avanço da parte anterior

da língua com elevação gradual; vogais posteriores, causadas por um recuo da parte

posterior da língua seguida também de uma elevação gradual e um progressivo

arredondamento dos lábios, entre as quais, tem-se a vogal /a/ como vértice mais baixo

do triângulo de base para cima. Com a elevação gradual da língua, tanto na parte

36 A extrametricidade designa um constituinte prosódico como invisível para os propósitos de aplicação da regra: ela analisa a forma como se a entidade extramétrica não estivesse presente. Apenas constituintes fonológicos ou morfológicos (segmento, mora, sílaba, pé, sufixo, etc.) podem ser marcados como extramétricos.

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anterior quanto na posterior, classificam-se articulatoriamente como vogal baixa, vogais

médias abertas (1º grau), vogais médias fechadas (2º grau) e vogais altas. Segundo

Camara (2002, p. 41), ter-se-ia o seguinte quadro:

altas /u/ /i/ médias /o/ /e/ (2º grau) médias / / /ε/ (1º grau) baixa /a/ posteriores central anteriores

Assim, no contexto da sílaba tônica, os sons vocálicos são simétricos e criam

oposições como b[a]to, b[e]co, b[ε]to, b[o]to, b[ ]to, b[i]co, b[u]le. Vale salientar que

se classificam em vogais nasais (ou nasalizadas, de acordo com CAMARA, 2002.),

tônicas, pretônicas e postônicas orais, e estas últimas se subdividem em postônicas

finais e mediais. Câmara (op. cit., p. 43-44) faz o seguinte quadro para as vogais nasais

ou nasalizadas, ou seja, quando diante de consoante nasal na sílaba seguinte:

altas /ũ/ /ĩ/ médias /õ/ /ẽ/ baixa /ã/ [â]

exemplificadas como: c[ã]to, b[ẽ]to, c[õ]to, b[ĩ]go e m[ũ]ito. Já o das vogais

pretônicas seria:

altas /u/ /i/ médias /o/ /e/ baixa /a/

como por exemplo: p[a]nela, m[e]diocre, m[o]leque, m[i]nhoca e b[u]zina37. O quadro

das postônicas dos proparoxítonos ou penúltimas vogais átonas ficaria assim:

altas /u/ /i/ médias /.../ /e/ baixa /a/

37 No registro do dialeto carioca (informal), as oposições /o/ – /u/ e /e/ – /i/ ficam prejudicadas, pois há uma tendência a harmonizar a altura da vogal pretônica com a da vogal tônica quando esta é átona. Esse fenômeno, de acordo com Câmara (2002, p. 44), foi chamado de Harmonização Vocálica por Silveira (1960).

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como: sáb[a]do, câm[e]ra, mús[i]ca e cúm[u]lo. No que diz respeito às vogais átonas

finais38, apresentar-se-ia da seguinte forma:

altas /u/ /i/ baixa /a/

e teríamos como exemplos os seguintes vocábulos: cas[a], bol[u] e fom[i].

Como sabemos, as vogais constituem o ápice da sílaba. A sílaba, por sua vez,

apresenta-se como pretônica, tônica e postônica, a depender da intensidade (força

expiratória), associada, por conseguinte, a uma ligeira elevação da voz (tom). Nesse

sentido, deter-nos-emos aqui apenas à postônica, uma vez que esta está intrinsecamente

ligada ao nosso estudo, o da síncope das postônicas não-finais.

As vogais postônicas não-finais ocorrem entre a vogal tônica e a vogal átona

final nos vocábulos proparoxítonos. Por exemplo, na palavra música, a vogal i ocupa

essa posição de vogal postônica não-final. Em alguns dialetos do português brasileiro,

encontramos essa variação de pronúncia das vogais postônicas não-finais; isso, devido

ao estilo de fala: formal e informal. Tem-se a maioria dos dialetos do português

brasileiro, em estilo formal, as vogais [i,e,a,o,u] ocorrendo em posição postônica não-

final. Já em alguns outros dialetos, como o da região Nordeste, por exemplo, as vogais

[ε, ] ocorrem em posição postônica medial em estilo formal. Vejamos como se daria

essa possibilidade de variação entre o dialeto carioca e o dialeto sapeense:

QUADRO 2 – COMPARAÇÃO ENTRE OS DIALETOS CARIOCA E SAPEENSE NO ESTILO FORMAL

Estilo Formal Dialeto Carioca Dialeto Sapeense música mús[i]ca mús[i]ca pêssego pêss[e]go pêss[e]go cérebro cér[e]bro cér[ε]bro pétala pét[a]la pét[a]la agrônomo agrôn[o]mo agrôn[o]mo abóbora abób[o]ra abób[ ]ra círculo círc[u]lo círc[u]lo

38 Esteja essa vogal diante ou não de /s/ no mesmo vocábulo.

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Observemos que, em ambos os dialetos, todas as cinco vogais [i,e,a,o,u]

aparecem. A distinção de alguns dialetos acontece quanto à ocorrência das vogais [ε, ].

A ocorrência das vogais [e, o] e [ε, ] em posição postônica não-final depende

principalmente da vogal tônica que a precede (Cf. SILVA 2002, p. 87).

Em um estilo informal, a distribuição da vogal postônica não-final, na maioria

dos dialetos do português brasileiro, que ocorrem no estilo formal como [i,a,u], é

reduzida respectivamente a [Ι, ↔, Υ] no informal. Vejamos os exemplos:

QUADRO 3 – COMPARAÇÃO ENTRE OS ESTILOS FORMAL E INFORMAL

Estilo Formal Estilo Informal pacífico pacíf[i]co pacíf[Ι]co chácara chác[a]ra chác[↔]ra triângulo triâng[u]lo triâng[Υ]lo

Remetendo-nos agora à redução das vogais médias

[e, ε, o, ] em posição postônica não-final, observa-se que as vogais postônicas [o, ] são reduzidas a [Υ] na maioria dos dialetos do português brasileiro.

QUADRO 4 – COMPARAÇÃO ENTRE OS ESTILOS FORMAL E INFORMAL NOS DIALETOS CARIOCA E SAPEENSE

Dialeto Carioca Dialeto Sapeense Estilo Formal Estilo Informal Estilo Formal Estilo Informal

pérola pér[o]la per[Υ]la pér[ ]la pér[Υ]la cócora cóc[o]ra cóc[Υ]ra cóc[o]ra cóc[Υ]ra

Assim, pode-se afirmar que o grupo [e, ε] apresenta a maior variação fonética

dentre as vogais postônicas mediais. Segundo Silva (2002, p. 90):

Em alguns casos, o “e ortográfico postônico medial” pode reduzir-se a [Ι]. Nestes casos temos pronúncias como “hipó[tΣΙ]se, almôn[dΖΙ]ga” em que a palatalização do t/d demonstra a ocorrência da vogal alta anterior i. O “e

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ortográfico postônico medial” pode também se reduzir a zero (...). Neste caso temos grupos consonantais anômalos ocorrendo em posição postônica: númro/número; hipótze/hipótese. Em algumas palavras, a omissão da vogal postônica medial causa a omissão concomitante da consoante que a segue: númo/número; câma/câmara.

Há o caso em que o “e ortográfico postônico medial”, como coloca Silva

(2002), pode aparecer como uma vogal centra alta não-arredondada [⎞], ocorrendo em

posição postônica não-final no português brasileiro, em fala informal, como nas

palavras número, cérebro, helicóptero. Já no português europeu, essa vogal corresponde

ao e ortográfico, que pode ser opcionalmente omitido: [‘numrΥ] ~ [‘num⎞rΥ] “número”;

[‘pzaΡ] ~ [p⎞‘zaΡ] “pesar”.

4.4.1 A regra variável de redução da postônica não-final

Observamos anteriormente, com a análise de Camara (2002) que, na posição

postônica não-final, há a neutralização da vogal labial [o], em posição exclusivamente

pretônica, uma vez que, de modo postônico, a única que se realiza é o [u]: fósfuru por

fósforo. Dessa forma, tomamos por base Wetzels (1992, p. 27), com a seguinte

formulação da regra que neutraliza a oposição entre [o] e [u] não-final:

X

Domínio: pé métrico

vocóide

[+ab2] [labial]

Com essa representação, Wetzels propõe que o domínio da regra de

neutralização da postônica não-final seja o pé. Nos vocábulos proparoxítonos, a última

sílaba é considerada extramétrica e fica fora da formação do pé. Conseqüentemente, o

pé troqueu moraico de cabeça à esquerda começa a ser formado e faz com que a sílaba à

direita converta-se num elemento fraco, como (bo) na palavra abóbora, onde o pé tem

duas sílabas leves (bobo); e (fo) em fósforo, que está fora do pé (Cf. AMARAL, 1999,

p. 87).

A regra de neutralização da postônica não-final tem como alvo de aplicação a

vogal labial do membro débil do pé métrico e que, de acordo com Amaral (op. cit.), ao

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haver o desligamento do traço [+ab2]39, dá-se a eliminação diferencial entre as vogais

médias e as altas, culminando no favorecimento da vogal alta: pólv[u]ra, pér[u]la,

côm[u]da, árv[u]ri, fósf[u]ru.

Nossos dados mostram que há uma pequena variação (elevação da vogal

postônica não-final e/ou abertura dessas vogais) apesar da grande influência de

neutralização, tendo em vista a análise ser feita em falar coloquial de uma cidade

nordestina. Assim, temos mais árv[u]ri e/ou árv[ ]ri que árv[o]ri; núm[i]rus e/ou

núm[ε]rus que núm[e]rus; abób[u]ra e/ou abób[ ]ra que abób[o]ra.

5 ANÁLISE DOS DADOS

A sociolingüística, há anos, vem estudando a influência que os fatores sociais –

como classe social, sexo, faixa etária, entre outros – exercem sobre a fala. Os

sociolingüístas perceberam, com estudos sistemáticos, que tais fatores atuavam

probabilisticamente no fenômeno da variação, correlacionando, assim, aspectos sociais

e estruturais a determinados fenômenos lingüísticos, chamados de variáveis.

Como sabemos, há uma coexistência entre o aspecto social e lingüístico de uma língua e que cada elemento lingüístico tem um aspecto ou avaliação social. No geral, estruturas lingüísticas e sociais são domínios isolados, que não suportam uma sobre a outra. Mas a força da avaliação social, positiva ou negativa, é geralmente quem leva a suportar os aspectos superficiais da língua: o léxico e a fonética. Ou seja, não é o som que recebe estigma ou prestígio, mas o uso de um determinado alofone para outro fonema.

39 Leia [+ab2] por traço de articulação referente ao no de abertura das vogais, dentro da teoria gerativista.

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Chambers (1995) diz que classe social, sexo e idade são três fatores sociais que são determinantes na vida do ser humano, porquanto esses fatores influenciam diretamente a sua forma de falar.

Quando há uma inovação lingüística numa sociedade,

a inovação pode ser ou não adotada por estar de forma simultânea e uniforme. Os grupos que a adotam são chamados de inovadores. Em contrapartida, os que não a adotam são chamados de conservadores, uma vez que mantêm as formas já estabelecidas pela comunidade. Labov (1972 [1965]) concebe que a escolha de certas variantes deve-se à associação dos valores sociais, às quais as formas lingüísticas são associadas, os quais são caracterizadores dos falantes que a utilizam. Isto é, quando se associa a dado falante ou grupo social de status considerado superior, uma variante lingüística adquire prestígio, sendo aceita por pessoas desse grupo, como também copiada por falantes de grupos considerados inferiores. Por outro lado, quando realizadas por falantes de baixa classe social, tais variantes são tidas como estigmatizadas. Esse conceito de variante estigmatizada ou de prestígio é relacionado às variantes padrão (formal, culto) ou não-padrão (informal).

Por isso, com base na teoria laboviana, também denominada teoria variacionista,

partimos do pressuposto de que a variação não é aleatória, mas condicionada por fatores

lingüísticos e sociais. Analisamos um total de 3590 dados de fala da comunidade de

Sapé, referentes ao apagamento ou não das vogais postônicas não-finais nos vocábulos

proparoxítonos, evidenciando os resultados estatísticos de sua ocorrência e

especificando os fatores que a favorecem.

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5.1. FATORES SOCIAIS De fundamental importância para os estudos sociolingüísticos, as variáveis

sociais são consideradas condicionadoras do comportamento lingüístico do falante. O

ambiente em que o indivíduo vive, as pessoas com as quais interage, o seu nível escolar,

tudo isso corrobora para sua forma peculiar de falar.

Dados relevantes em pesquisas sociolingüísticas já foram levantados sobre a fala do brasileiro. É apontado na literatura sociolingüista que falantes do sexo feminino são detentores do prestígio lingüístico, da mesma forma que os falantes de faixa etária e nível de escolarização mais elevados também são detentores desse prestígio.

Neste capítulo, apresentaremos os resultados obtidos na análise dos fatores

sociais. Observamos que esses fatores exercem uma influência bem significativa no

processo de variação que envolve o apagamento da vogal postônica não-final em

vocábulos proparoxítonos. Todas as variáveis sociais foram selecionadas como

relevantes para o fenômeno lingüístico em estudo (sexo, faixa etária, anos de

escolarização e tipo de entrevista). Porém o resultado mais significante foi em relação à

variável anos de escolarização, que veio confirmar nossas hipóteses.

Passemos, então, para a descrição detalhada dos

resultados dessas variáveis.

5.1.1. Anos de escolarização

O fator social escolarização foi selecionado pelo VARBRUL como sendo o

mais relevante para a aplicação da redução da vogal postônica não-final, assim como

também aconteceu no trabalho, de mesmo tema, feito por Amaral (1999), na zona rural

da cidade de São José do Norte - RS.

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Acreditamos que quanto maior for o ano de escolarização maior será o

conhecimento do falante em relação à língua por ele utilizada, sem falar que esse fator

tem sido apontado, através de diversos estudos de língua falada, como tendo uma forte

influência na escolha de uma variante em detrimento de outra. Labov (1966), estudando

o inglês de Nova Iorque, observou que os falantes menos escolarizados, freqüentemente,

usavam mais as formas não-padrão, enquanto que as formas padrão eram mais

utilizadas pelos mais escolarizados. Essa é uma tendência encontrada em muitos

trabalhos lingüísticos quantitativos até o presente momento. Scherre (1996) aponta

evidências de que a escolarização mostrou ser um fator decisivo para a atuação dos

fenômenos lingüísticos já estudados sobre o português do Brasil. Segundo a autora, a

escola pode agir de forma direta ou indireta na modificação do comportamento

lingüístico dos falantes.

Em relação a anos de escolarização, Bezerra (2004) afirma que:

[...] direta ou indiretamente, a participação da escola acaba sendo decisiva como condicionante do comportamento lingüístico. O trabalho que ela faz com os alunos a fim de levá-los a falar segundo a norma culta é determinante para que eles coloquem em prática o que é passado, e mesmo aqueles que rejeitam tal norma apresentam na fala alguns traços da atuação da escola. O próprio fato de os alunos conviverem com outros de nível de escolarização superior, ou até mesmo com os professores, também é condicionante para que eles privilegiem a forma padrão. Sendo assim, os falantes analfabetos têm tendência bem maior de falar a forma não padrão, já que não têm acesso à escola, e muitas vezes, relacionam-se com pessoas de mesmo nível de escolaridade.

O fator anos de escolarização foi a variável social mais significativa, uma vez

que a hipótese corrente é de que informantes mais escolarizados usam mais as formas

padrão, de prestígio, e os não ou menos escolarizados utilizam mais as formas não-

padrão, estigmatizadas.

Utilizamos, em nossa pesquisa, apenas três grupos de escolarização: Pouco

escolarizado a 2 anos de escolarização, 6-8 anos e de 9 anos em diante. Distribuímos

assim pela necessidade de restringir nossa amostra, já que os dados foram coletados de

forma mais diretiva.

Ao analisarmos esse fator, percebemos que, à medida que esses informantes vão

elevando seu grau de instrução, vão utilizando menos a variante não-padrão, preferindo,

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assim, o uso da considerada padrão. Observamos também que, em termos de

porcentagem, os informantes de 6-8 anos (24%) e mais de 9 anos de escolarização

(24%) se equiparam. Eles mantêm-se um pouco distanciados no que se refere ao peso

relativo, sendo (.45) e (.43), respectivamente. Através da tabela abaixo, podemos ter

acesso aos resultados numéricos acerca do apagamento das postônicas não-finais.

TABELA 1 - ANOS DE ESCOLARIZAÇÃO (Apagamento da vogal

postônica não-final)

ANOS DE

ESCOLARIZAÇÃO

Aplicação/

Total

%

PR

0 – 2 anos 364/781 46% .71

6 – 8 anos 304/1250 24% .45

Mais de 9 anos 378/1559 24% .43

Com base nos dados expostos acima, podemos supor

que os falantes do ensino médio e os universitários aplicam menos a regra de simplificação da vogal postônica não-final. Dessa forma, privilegiam o uso da variante de prestígio, não sincopada. Ou seja, tendem a apagar menos do que aqueles que nunca foram à escola ou foram até a 2ª série, no máximo. Confirmamos, assim, a hipótese de que o fator anos de escolarização tem um papel importante na preservação da forma padrão das palavras.

Observamos, na tabela 1, que há uma ocorrência

maior do apagamento da postônica não-final, estabelecendo uma proporção inversa em relação à escolaridade: quanto maior o ano de escolarização, menor o uso desse apagamento.

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5.1.2. Faixa etária

O segundo fator social selecionado como relevante para o processo de variação

do apagamento da vogal postônica não-final foi a faixa etária.

O estudo de Louis Gauchat (1905) é o primeiro a apontar diferenças entre o

comportamento lingüístico de pessoas de maior e de menor idade. Esse estudo deu-se

numa aldeia suíça, sobre a lateral palatal /λ/, demonstrando que os mais jovens estavam

preferindo a pronúncia /y/, ficando o /λ/, mais conservadora, para os mais velhos. A

classe intermediária utilizava ambas as realizações.

Estudos feitos por Labov sobre a pronúncia retroflexa do /r/ pós-vocálico em

Nova Iorque (1966) e em Martha’s Vineyard, Massachussets (EUA), sobre a

centralização dos ditongos /ay/ e /aw/ (1963), por exemplo, corroboraram as descobertas

de Gauchat. Seus resultados, também, anunciaram a tendência dos mais jovens em

privilegiar as pronúncias mais inovadoras, enquanto que os mais velhos utilizam mais as

formas conservadoras.

O estudo da variação entre as formas lingüísticas relacionadas à faixa etária pode ter duas direções: a estabilidade de variantes, que consiste na variação e convivência pacífica das variantes sem a implicação de mudança; ou a mudança lingüística, que resulta na morte de uma ou mais variantes, restando apenas uma das formas. Assim, a faixa etária é tomada como indicadora de possíveis mudanças, funcionando como evidência do que Labov (1972 [1963]) denominou de tempo aparente, quando abordada sincronicamente. Dos fatores sociais, segundo Labov (1994), é a idade do falante que pode

informar, mais precisamente, algo sobre o processo de mudança de um fenômeno,

através do tempo aparente. Nesse tipo de estudo, devemos fazer um recorte transversal

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numa amostra sincrônica da comunidade de fala, em função da faixa etária dos

informantes para, então, apresentar uma primeira dimensão histórica à análise. Ao

descrever esse fator, Tarallo (2002) afirma que:

A relação de estabilidade das variantes (a situação de contemporização) avultará, se entre a regra variável e a faixa etária dos informantes não houver qualquer tipo de correlação. Se, por outro lado, o uso da variante mais inovadora for mais freqüente entre os jovens, decrescendo em relação à idade dos outros informantes, você terá presenciado uma situação de mudança em progresso [...]

Em nossa pesquisa sobre o apagamento das vogais postônicas não-finais em

proparoxítonas, primeiramente distribuímos os falantes em três faixas etárias: de 15 a

25, de 26 a 50 e mais de 50 anos.

Os falantes mais velhos (mais de 50 anos) apresentam um índice de (.58) nas

formas sincopadas, isto é, fazem maior uso da variável estigmatizada (não-padrão). Não

muito distante, vêm os falantes de 26 a 50 anos com (.55)40. Analisando os dados,

percebemos que nossa hipótese de que os jovens se correlacionariam mais

positivamente ao apagamento das postônicas não finais em proparoxítonas foi negado,

pois, como se vê, são eles que mantêm (.37) a variável padrão, o que vem de encontro

às literaturas pertinentes, que colocam os jovens como inovadores. Vejamos a tabela

referente à idade quanto ao apagamento das postônicas não-finais:

TABELA 2 – FAIXA ETÁRIA (Apagamento da vogal postônica não-final)

FAIXA ETÁRIA

Aplicação/ Total

%

PR

15 – 25 anos 275/1271 21% .37

26 – 50 anos 392/1185 33% .55

Mais de 50 anos 379/1134 33% .58

40 Como se vê, os falantes com 26 a 50 e mais de 50 anos de idade apresentam resultados semelhantes, quanto à freqüência, tornando um pouco divergente apenas quanto ao peso relativo.

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Esta tabela mostra que o fenômeno do apagamento da postônica não-final

acontece mais na idade avançada em direção aos mais novos. Ou seja, os idosos fazem

menos uso do padrão, seguidos dos adultos, e os mais jovens fazem maior uso da

variável de prestígio.

A partir da tabela 2, é possível observarmos que o apagamento é bastante usado

pelos mais velhos, seguido de um uso análogo pelos adultos, tendo o jovem como maior

favorecedor da forma padrão. Segundo Beserra (2004):

A idade pode influenciar quanto às redes sociais do falante, determinando as suas necessidades por variedades lingüísticas. Assim, uma possível explicação para a utilização mais freqüente da forma padrão por parte dos jovens é o fato de que estes são regidos pela instituição escolar, além da preocupação com concursos, como vestibular, que exige o uso da forma padrão. Entre 26 e 49 anos, os falantes já estão exercendo seu potencial de trabalho, o que os possibilita “relaxar” na fala. Os falantes idosos variam de comportamento porque, mesmo em sua maioria aposentados, alguns utilizam a variável padrão como forma de reafirmar sua posição na sociedade, enquanto outros, por não mais trabalharem, sentem-se livres para fazer uso das variáveis não-padrão.

5.1.3. Sexo

Fisher (1964) foi quem primeiro controlou o fator sexo, quando analisou a variação entre -ing e -in na fala de crianças de uma comunidade rural da Nova Inglaterra (EUA), mostrando a preferência dos falantes femininos pelo uso da forma de prestígio -ing, comprovando, assim, a sensibilidade do sexo feminino pelo uso das formas padrão e de prestígio.

Há uma grande diferença entre homens e mulheres. Chambers (1995) apresenta

duas: pré-natal e pós-natal. A primeira está, sem dúvida, no aspecto físico e fisiológico,

denominado de diferença pré-natal – genitálias diferentes, tipo sangüíneo,

desenvolvimento do feto, entre outras. A segunda diferença, a pós-natal, está

relacionada aos papéis que o homem e a mulher assumem na sociedade (i.e. o homem é

o cabeça da casa, por sua vez, deve trabalhar, e a mulher fica a cuidar de casa).

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Uma das questões de interesse no estudo da relação língua e sociedade diz

respeito às diferenças lingüísticas entre homens e mulheres. A questão é: seriam

diferenças de ordem biológica ou sociocultural? As diferenças biológicas estão ligadas

ao sexo, e as socioculturais são concernentes ao gênero. O sociólogo britânico Anthony

define sexo como diferenças biológicas ou anatômicas entre homem e mulher, enquanto

gênero diz respeito às diferenças psicológicas, sociais e culturais entre machos e fêmeas.

A esse respeito, Beserra (2004) faz a seguinte observação: Enquanto a maioria dos estudos sociolingüísticos tradicionais tem reportado o uso de variantes lingüísticas de prestígio ao valor econômico num mercado lingüístico, estudos mais recentes têm dado maior atenção às ideologias de feminilidade e masculinidade, reafirmando assim a importância do gênero para uma análise mais apurada da questão da variação.

A importante questão no estudo do conhecimento de língua e gênero,

empiricamente, desse ponto, concerne à correlação de sexo. Assim, precisamos de mais

definições de diferenciação. Várias questões têm sido discutidas, como por exemplo:

Todas as pessoas biologicamente fêmeas desenvolvem gênero feminino? Nas

perspectiva de construção social, contudo, tanto o sexo quanto o gênero são vistos como

desenvolvimento de status social.

A relação de poder entre os sexos dá margens a algumas explicações. Enfatiza-se

que o comportamento feminino é mais expressivo que o masculino, numa tentativa de

auto-afirmação de sua posição diante da supremacia masculina em situações políticas e

econômicas. Segundo Amaral (1999):

Na visão popular, as mulheres falam melhor ou mais corretamente do que os homens. Em comunidades desfavorecidas, a sensibilidade a padrões externos de correção está associada à mobilidade social ascendente. Em comunidades negras, estudantes femininas mostram maior sucesso do que os homens na escola e maior capacidade para conseguir emprego.

Labov (1966), em seu estudo na cidade de Nova Iorque, também observou a influência da variável sexo e comprovou que as mulheres dão preferência às formas de prestígio. No Brasil, vários estudos também apontam para o mesmo caminho. Silva & Paiva (1996, apud LUCENA, 2001) analisaram a influência de variáveis sociais em doze trabalhos sociolingüísticos sobre o português falado na

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cidade do Rio de Janeiro e chegaram à seguinte conclusão: a correlação sexo / variação, dentro de muitos estudos Sociolingüísticos, mostra que as mulheres tendem a preferir formas socialmente valorizadas, tendência esta freqüente em situação de variação estável. Os nossos resultados confirmam a literatura, como vimos acima, acerca desse

fator, que indica as mulheres como mais favorecedoras das variantes padrão. Em nossa

análise, elas aplicam mais a variante considerada padrão (.47). Vejamos a tabela 3:

TABELA 3 – SEXO (Apagamento da vogal postônica não-final)

SEXO

Aplicação/

Total

%

PR

Homem 558/1790 31% .53

Mulher 488/1800 27% .47

Aqui a nossa hipótese de que as mulheres teriam o maior índice de aplicação da

forma não-sincopada, ou seja, que a mulher seria detentora da forma padrão, foi

confirmada. A tabela mostra que os falantes do sexo masculino utilizam mais a variável

estigmatizada, ou seja, faz maior apagamento da vogal postônica não-final em

vocábulos proparoxítonos (.53), e os falantes de sexo feminino favorecem a forma

padrão, isto é, não fazem o apagamento desses vocábulos (.47).

Como podemos ver, não há grande diferença entre a variável sexo em nossos

dados. Nesse caso, o sexo até pode não desempenhar um papel muito significativo,

posto que os resultados, um tanto próximos do ponto neutro, parecem indicar que essa

variável pouco interfere na aplicação do fenômeno aqui estudado.

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5.2 FATORES ESTILÍSTICOS

Para se conseguir dados representativos do desempenho lingüístico dos falantes,

é necessário que o pesquisador use entrevistas estruturadas ou formais. Este tipo de

procedimento nos dá margem de separação da fala cuidada – formal –, em que os

falantes costumam dar certa atenção a sua fala, da fala casual, relaxada – informal –,

que se ouve nas ruas, ao telefone, em conversas entre amigos, nos lares, etc.

Para se fazer esse tipo de estudo, é necessária uma vasta quantidade de dados.

Como seguimos o modelo laboviano, ou seja, de natureza quantitativa, a

representatividade do corpus será sempre avaliada em função da variável estudada. O

objetivo do pesquisador é estudar a língua falada em situações naturais de fala, ou seja,

de modo espontâneo. Considerando que se busca estudar a língua falada em situações

naturais de comunicação, como fazer para colher uma grande quantidade de dados, sem

que a presença do pesquisador interfira na naturalidade da situação de comunicação? A

esse fato, Labov chama de paradoxo do pesquisador. Assim, é necessário minimizar o

efeito da presença do pesquisador e do gravador na naturalidade da situação, o que não é

fácil conseguir.

Para alcançar tal intento, deve-se fazer uso de instrumentos que possam ter a

melhor utilização na coleta de dados que se quer investigar, como o questionário, que

resulta em um estilo mais cuidado, e a conversa livre, em que ocorre o estilo informal.

5.2.1 Tipo de Entrevista41

Em nosso estudo, as entrevistas foram organizadas em entrevista dirigida e

leitura de palavras no texto, já que nosso objeto de estudo se pauta em vocábulos de

difícil recorrência na língua portuguesa.

A entrevista dirigida pode ser direta ou indireta. De acordo com Chambers &

Trudgill (1980), a aplicação do questionário de Gilléron por Esmond Edmont é o 41 Vale ressaltar que esta variável não teve tamanha relevância à pesquisa, conforme se pode observar nos resultados obtidos.

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exemplo clássico do uso direto: uma lista com aproximadamente 1.500 itens, em que o

entrevistador fazia perguntas claras a seus informantes, do tipo “Como você diz

‘cinqüenta’?”. Jaberg e Jud (alunos de Gilléron), que criaram o estilo de questões

indiretas, em seu levantamento de áreas de fala italiana, inovaram levando os

informantes a darem respostas mais naturais a perguntas do tipo: “O que é isto?”,

segurando uma xícara. Mais tarde, tanto pesquisadores americanos quanto ingleses

resolveram aderir às perguntas de uma forma mais natural, colocando o questionário de

lado.

Assim, fizemos uso deste último tipo apresentado aqui, isto é, levamos não

objetos, mas gravuras, onde os informantes só teriam um tipo de resposta. Interrogava-

se o informante da seguinte forma: “O que temos nesta ficha?” [Mostra-se uma figura

de uma árvore] (logo, árvore será a resposta!).

Há críticas sobre essa técnica para levantamentos de dados, porque elas resultam

em um estilo cuidadoso de fala do informante. Sabe-se que estilos mais casuais

aumentam a ocorrência de acentos regionais e vocábulos simples. Daí nós colocarmos

várias figuras42 em cada ficha, promovendo, assim, uma maior espontaneidade por parte

do informante.

Apesar de muito parecida com a mencionada anteriormente, A leitura de

palavras no texto nos dá noção de uma entrevista mais formal. Ou seja, o informante lê

as palavras que queremos que ele pronuncie, não de forma solta, mas inseridas em

frases, como: “Todo sábado, um bêbado pacífico freqüentava um círculo católico,

embaixo de uma árvore, numa chácara”. Dessa forma, o informante pronunciava as

palavras proparoxítonas sem perceber que elas eram o nosso verdadeiro objeto de

estudo.

A primeira parte, a entrevista dirigida, consistiu de 18 fichas, onde havia um

total de 83 possíveis palavras a serem pronunciadas. A maioria das palavras era de uso

cotidiano dos informantes. Para evitar certa tensão, apenas perguntávamos: “O que

temos nesta ficha?”. Daí o informante falava o que viesse em mente e, caso não

aparecesse o vocábulo que estávamos esperando, fazíamos uma pergunta na qual,

possivelmente, esta viria a surgir. Assim, os informantes ficavam do modo mais natural 42 Cf. Anexo 4.

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possível durante o transcorrer da entrevista. Ao término da leitura das gravuras, era feito

um questionário com 16 perguntas43, cujas respostas eram precisas, como: “Qual o dia

da feira em Sapé?” (Sábado).

A segunda parte, a coleta de dados, deu-se através de 10 frases, que os

informantes liam. No meio delas, estavam as palavras proparoxítonas, que eram

observadas. Por exemplo: “A prática de esporte, segundo meu médico, faz bem ao

músculo e ao cérebro. Nos faz perder a aparência tísica e melhora nosso estado de

espírito”. A tabela 4 nos mostra o resultado obtido com essas entrevistas:

TABELA 4 – TIPO DE ENTREVISTA (Apagamento da vogal postônica não-final)

TIPO DE ENTREVISTA

Aplicação/

Total

%

PR

Dirigida 713/2145 33% .52

Leitura das Palavras 333/1445 23% .47

Embora a maior freqüência de apagamento ocorresse na fala dirigida, ou seja, na

aplicação da ficha induzida, cujos ambientes de muitas palavras propiciavam o

apagamento, os resultados acima mostram que o peso relativo aponta para (.52) de

significância na entrevista dirigida e (.47) na leitura das palavras em frases. Com isso,

pode-se dizer que a leitura de palavras em frases favorece o uso-padrão dos vocábulos

proparoxítonos. Já a entrevista dirigida propicia um maior surgimento de variáveis não-

padrão.

Através da tabela 4, confirmamos a tese de que há maior elaboração, por parte

dos falantes de uma dada língua, em relação ao que eles pronunciam, quando estão

lendo. Em contrapartida, há um maior descuido quando eles se encontravam em

situações de maior informalidade, isto é, quando pronunciavam o nome da figura que

estavam vendo nas fichas.

43 Cf. Anexo 5.

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5.3. FATORES LINGÜÍSTICOS

Nesta seção, apresentaremos os resultados de todas as variantes lingüísticas

pertinentes a este estudo, uma vez que o pacote de programas VARBRUL, selecionou

como relevantes todas as variantes. Aqui também serão colocadas algumas

interpretações que podem explicar o comportamento da variável dependente em relação

a cada fator selecionado.

5.2.1. Contexto fonológico seguinte

Dentre os grupos de fatores lingüísticos, o contexto fonológico seguinte foi

selecionado pelo programa como sendo o mais relevante. O resultado é muito

significativo. Em nossa rodada, dividimos o fator contexto fonológico seguinte em

líquida vibrante, líquida lateral e não-líquidas, conforme a tabela 5.

TABELA 5 – CONTEXTO FONOLÓGICO SEGUINTE (Apagamento da vogal postônica não-final)

CONTEXTO FONOLÓGICO

SEGUINTE

Aplicação/

Total

%

PR

Líquida Vibrante 288/707 40% .63

Líquida Lateral 221/557 55% .84

Não-Líquidas 537/2485 21% .40

Através dessa tabela, observamos que a líquida lateral /l/ é quem mais favorece o

processo, seguida da líquida vibrante /r/. Já as não-líquidas são as que apresentam maior

rejeição ao apagamento da postônica não-final. Isso se dá pela presença da lateral (.84)

como menor detentora do padrão: músculo > musclo; pétala > petla; óculos > oclus;

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maiúsculo > maiusclo; triangulo > trianglo, seguido da vibrante (.63): árvore > arvre;

chácara > chacra; xícara > xicra; abóbora > abobra; mascara > mascra. Já as não-

líquidas (.40) mostram-se como desfavorecedoras do processo da síncope: príncipe >

prinspe; música > musca; física > fisca; cócega > cosca; próximo > prosmo. Sabemos que o padrão silábico CCV do português permite a formação de ataque

complexo desde que a segunda consoante seja uma líquida (abóbora > abobra; triângulo

> trianglo). Ao formar o novo vocábulo, através da queda da vogal, esse padrão surge,

como nos exemplos supracitados, ou seja, resulta em ataque complexo bem formado.

Os resultados desse fator só vêm comprovar que a líquida vibrante é a melhor

consoante para a formação do ataque complexo bem formado (Cf. cap. 4.2). Daí ter-se

maior número de grupos consonantais com /r/ do que com /l/.

Se pensarmos, no entanto, na escala de força de Katamba, (1993 – Cf. cap. 1.2),

veremos que a líquida vibrante /r/ é a que tem menor força consonantal. E, observando,

ainda, a Hierarquia de Soância de Kiparsky (1979, p.432), veremos que ela possui maior

soância, como se vê no esquema:

Hierarquia de Soância: oclusivas, fricativas, nasais, l, r, w, y, u, i, o, e, a.

Já as não-líquidas (oclusivas, fricativas e nasais), não sendo licenciadas para

formar a segunda consoante do ataque complexo, ficam sujeitas ao apagamento junto

com a vogal postônica não-final, como em: lâmpada > *lampda > lampa. Em nossos

dados, também se observaram formas como: máquina > makna; cômoda > comda44.

Sendo assim, o padrão geral da tabela 5 encaixa-se na expectativa da hierarquia

de soância. As não-líquidas (oclusivas, fricativas e nasais), por serem menos soantes,

têm um nível muito baixo de apagamento. Portanto, o maior índice está com as líquidas

que agregam a consoante que flutua na sílaba seguinte, criando um novo ataque.

44 Mas, vale salientar que essas formas só aparecem na forma oral e não escrita, uma vez que não é possível tal formação silábica.

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Logo, as proparoxítonas mais propícias ao apagamento da vogal não-final são

aquelas com que a consoante perdida forma um grupo consonantal licenciado pelo

sistema ao serem ressilabadas, como: xí.ca.ra > xí.cØ.ra > xi.cra; a.bó.bo.ra >

a.bó.bØ.ra > a.bo.bra; cír.cu.lo > cír.cØ.lo > cir.clo; tri.ân.gu.lo > tri.ân.gØ.lo >

tri.an.glo.

5.2.2. Contexto fonológico precedente

Com essa variável, observamos o apagamento da vogal postônica não-final em

relação ao ponto de articulação do seguimento anterior. Observemos a tabela 6 para

melhor visualização desse fator do fenômeno estudado:

TABELA 6 – CONTEXTO FONOLÓGICO PRECEDENTE (Apagamento

da vogal postônica não-final)

CONTEXTO FONOLÓGICO PRECEDENTE

Aplicação/

Total

%

PR

Oclusiva 525/1526 34% .53

Vibrante 43/304 14% .34

Fricativa 350/941 37% .63

Nasal 105/587 17% .38

Lateral 23/232 9% .33

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A fricativa (.63), como podemos ver, é o fator que mais favorece o apagamento

(música > musca; fósforo > fosfro; próximo > prosmo; cócega > cosca; acido > asdo;

físico > fisco; príncipe > prispe); a oclusiva (.53) encontra-se próxima do ponto neutro

(sábado > sabo; chácara > chacra; fígado > figo; máscara > mascra; triângulo >

trianglo; bêbado > bebo; círculo > circlo), – mas isso não implica dizer que, pelo fato

de estar próxima ao ponto neutro, também aplica o processo em estudo. A nasal (.38)

vem em seguida, apresentando um rápido favorecimento ao uso da síncope (número >

numo; câmara > cama; fenômeno > fenomo; agrônomo > agromo; estomago >

estomo). Já a vibrante (cérebro > ceibro; espírito > esprito; perola > perla; elétrico >

eletro; fotográfo > fotogra) e a lateral (cólica > coica; católico > catoico; parabólica

> parabola) apresentam-se como as menos favorecedoras do processo de apagamento

da postônica não-final, com (.34) e (.33), respectivamente. Elas são as mais

conservadoras do padrão na comunidade em estudo. No gráfico 1, esse fator é expresso

com mais clareza:

GRÁFICO 1 – CONTEXTO FONOLÓGICO PRECEDENTE (Apagamento

da vogal postônica não-final)

PESO RELATIVO

Nasal .38

Vibrante.34Fricativa

.63

Lateral.33

Oclusiva.53

oclusiva vibrante fricativa nasal lateral

Assim, a partir desses resultados, podemos observar bem a influência da Escala de Força e de Sonoridade (Cf. cap. 1.2). Como as oclusivas e fricativas têm maior força e menor sonoridade, é de fácil entendimento que elas sejam

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menos resistentes à supressão, junto à vogal postônica não-final. Já as laterais e nasais, como têm menor força e maior sonoridade, apresentam-se com menor flexibilidade ao apagamento, razão pela qual palavras como cólica, católico, estômago, número, entre outras, sofrem, com menor freqüência, apagamento da postônica não-final.

5.2.3. Extensão da palavra

A extensão da palavra com bastante relevância neste trabalho e vindo como a

terceira mais significante, dá-nos um panorama acerca dos vocábulos que mais são

afetados com a síncope da postônica não-final. Vejamos a tabela 7:

TABELA 7 – EXTENSÃO DA PALAVRA (Apagamento da vogal postônica não-final)

EXTENSÃO DA PALAVRA

Aplicação/ Total

%

PR

3 Sílabas 1583/2415 66% .45

Mais de 3 Sílabas 961/1175 82% .61

Como se pode observar, as palavras com apenas três sílabas (.45) mantêm o

padrão, ou seja, são mais conservadoras (câmara, máquina, fórmula, crédito, cântico),

ao passo que as com mais de três sílabas, ou polissílabas (espírito, retângulo,

maiúsculo, católico, abóbora, semáforo), são mais propícias ao apagamento (.61).

Isso leva a crer que, no “continuum” da fala, é mais fácil reduzir com mais de

três sílabas, levando em consideração os ambientes propícios à redução (como a

síncope) de palavras cujas vogais postônicas não-finais são, em geral, antecedidas por

uma obstruinte e seguidas por uma líquida (espírito > esprito). Há trissílabos que

perdem dois segmentos (câmara > cama) por razões antes apresentadas, relacionadas no

fator contexto seguinte.

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Acreditamos que a velocidade de fala, que não foi controlada por nós nesta

pesquisa, tenha a ver com esse fenômeno, que Caixeta (1989) afirma acontecer não só

pelo falante analfabeto, como também pelo falante com alto grau de escolarização, para

o qual foi levada em consideração a velocidade, o que provou que, em estilos mais

rápidos, as proparoxítonas tendem a ser sincopadas.

5.2.4. Estrutura da sílaba

Para essa variável, consideramos as estruturas silábicas leve (quando a sílaba é terminada em vogal) e pesada (quando terminada em consoante). A partir da tabela 8, observa-se que a sílaba leve (.47) favorece o uso padrão mais do que a pesada (.59), conforme expressa a tabela 8:

TABELA 8 – ESTRUTURA DA SÍLABA (Apagamento da vogal postônica não-final)

ESTRUTURA DA SÍLABA

Aplicação/ Total

%

PR

Leve 655/2671 24% .47

Pesada 391/919 42% .59

Uma sílaba que possui estrutura CV é leve ou aberta; se possuir CVC ou CVV é pesada ou fechada. Os segmentos que atuam como núcleo silábico ou como coda dependem das restrições de uma língua específica e de uma escala de soância. Em relação ao peso, a sílaba leve

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possui uma só mora (péµ); a sílaba pesada possui mais de uma (maµlµ) e tem de atender ao requisito de que haja uma diferença de soância, ainda que mínima, entre as duas moras, e em sentido crescente a partir do núcleo. Para a posição sub-silábica da segunda mora de uma sílaba pesada que é

igualmente restrita, há termos de soância, de acordo com a língua específica. Por isso,

os segmentos que podem ocupar a segunda mora ou a coda da sílaba, em português, são

os coronais /r/, /s/, /l/ e /n/, que têm menos soância do que a vogal que é portadora de

soância máxima e de mais fácil articulação. O gráfico 8 mostra com clareza que a

estrutura silábica pesada ou fechada (plástico > plasco; menúscula > menuscla;

lâmpada > lampra; relâmpago > relampro; exército > exerço), com (.59), mantém a

vogal postônica não-final, e, conseqüentemente, que a leve, ou aberta (ácido > asdo;

física > fisca; elétrico > eletro; óculos > oclus; xícara > xicra; básica > basca; fígado

> figo), com (.47), é mais favorável à síncope. Isso nos leva a pensar que a quantidade de soância da sílaba acentuada não esteja funcionando como um elemento motivador para a preservação do vocabulário, como se a saliência fônica não estivesse a exercer papel algum. 5.2.5. Traço de articulação da vogal

Essa variável apresentou-se bastante significativa em nossos dados. A tabela 9

mostra que as vogais labiais /o, u/ são as que apresentam o menor peso relativo (.38), ou

seja, são as que apresentam maior uso da forma padrão, enquanto que o peso maior (.55)

incide nas sílabas com vogais coronais /e, i/, que são as maiores favorecedoras da

síncope. As sílabas com vogal dorsal /a/ aparecem muito próximas do ponto neutro

(.49). Podemos observar melhor esses dados na tabela que segue:

TABELA 9 – TRAÇO DE ARTICULAÇÃO DA VOGAL (Apagamento da vogal postônica não-final)

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TRAÇO DE ARTICULAÇÃO

DA VOGAL

Aplicação/

Total

%

PR

Labial /o, u/ 316/770 41% .38

Dorsal /a/ 245/801 30% .49

Coronal /e, i/ 485/2019 24% .55

Clements & Hume (1995) estabelecem para as vogais os mesmos traços de constrição que atribuem às consoantes labial, coronal e dorsal, equivalentes aos traços posterior e arredondado da teoria padrão. Portanto, /o/ e /u/ possuem os traços dorsal e labial, /a/ é uma vogal dorsal, mas não labial, e /e/ e /i/ são vogais coronais.

Camara (2002), baseado no dialeto culto do Rio de Janeiro, assevera que a vogal

/e/ permanece ao lado do /i/. Já o /o/ não se mantém ao lado de /u/, ou seja, nessa

oposição houve uma neutralização. Camara (op. cit.) propõe, então, um subsistema de

quatro vogais átonas para as proparoxítonas. Mas vale salientar que, nos dialetos do sul,

não dá para descartar o sistema de cinco vogais, uma vez que há a elevação variável, e

não categórica, nessa oposição.

O que nos chamou a atenção foi a informação que diz respeito à vogal dorsal /a/

tida como a mais resistente a tais processos. Vasconcelos (1912, p. 254) refere-se a ela

como a vogal mais persistente, menos exposta a alterações, e Nunes (1969, p. 56)

entende que, das vogais átonas, é o a a mais resistente. Em nossos dados, embora o

resultado se aproxime do ponto neutro (.49), a dorsal (estômago > estomo; cágado >

cago; chácara > chacra; xícara > xicra; pássaro > passo; sábado > sabo; pétala >

petla) também está sujeita à síncope.

Referente à /e/ e /i/, ou seja, à coronal (.55), não houve preservação, como consta

na literatura (cócega > cosca; música > musca; técnico > tecno; número > numo;

príncipe > prinspe; máscara > masca; ácido > asdo). Nossos dados

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revelam que a coronal apareceu como sendo a mais favorecedora à síncope, embora a literatura aponte o contrário. Lemle (1978, p.66) atribui a essa vogal a propensão de palavras proparoxítonas que não se reduzem, considerando-a mais resistente à queda (político, cólica, pacífico). Aragão (1999) observa que, mesmo as pessoas com menor escolarização, mantêm as proparoxítonas, como em (ótima, fábrica, político). Podemos dizer, então, que as vogais coronais são as menos resistentes, em relação ao apagamento da postônica não-final, na cidade de Sapé.

Assim, podemos observar que as vogais labiais (músculo > musclo; pérola >

perla, árvore > arvre; fósforo > fosco; maiúsculo > maiusclo; óculos > oclus), com

(.38) são as grandes detentoras do uso padrão, ou seja, são menos propícias à queda do

que as outras. Dentre elas, a vogal baixa mostra-se relativamente mais sensível do que

as coronais.

6 CRUZAMENTO DAS VARIÁVEIS

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Em busca de um maior aprofundamento em nossa análise, procedemos a uma

segunda rodada, cruzando os fatores sociais, com o intuito de averiguar onde o

apagamento da vogal postônica não-final estava mais presente.

O cruzamento mais relevante para o programa VARBRUL foi entre as variáveis

Faixa Etária e Escolarização. Esses resultados podem ser confirmados na tabela 10:

TABELA 10 – CRUZAMENTO ENTRE FAIXA ETÁRIA E TEMPO DE ESCOLARIZAÇÃO (Apagamento da vogal postônica não-final)

FAIXA ETÁRIA

15 - 25 anos 26 - 50 anos Mais de 50 anos TEMPO DE

ESCOLARIZAÇÃO

Aplic/Total Freq. Aplic/Total Freq. Aplic/Total Freq.

Pouco a 2 anos 93/335 27% 152/265 57% 119/181 65%

5 a 8 anos 79/459 17% 132/438 30% 93/353 26%

Mais de 9 anos 103/477 21% 108/482 22% 167/600 27%

Esse cruzamento comprova que os idosos (mais de 50 anos) analfabetos e/ou

com pouca escolaridade (pouca escolaridade a 2 anos) são os que mais apagam a vogal

postônica não-final, com 65% de freqüência e com peso relativo de (.76); em seguida,

vêem os dos adultos (26 - 50 anos), também analfabetos (de pouca escolarização a 2

anos), os quais têm 57% na freqüência de uso da regra, além de um total de (.65) no

peso relativo. Os adultos (26 a 50 anos / de 5 a 8 anos de escolaridade) aparecem logo

em seguida com 30% da freqüência e com peso relativo de (.58).

Os idosos (mais de 50 anos) com ensino médio e superior (mais de 9 anos) se

equiparam àqueles (mais de 50 anos) com ensino fundamental (de 5 a 8 anos de

escolaridade). Estes têm praticamente a mesma freqüência de ocorrência,

respectivamente, 27% e 26% e peso relativo bastante próximo também (.54 e .53,

respectivamente). Logo em seguida, aparecem os jovens (15 - 25 anos) não e/ou pouco

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escolarizados (pouca escolaridade a 2 anos), com uma freqüência de 27% e (.30) de

preso relativo.

Os adultos (26 - 50 anos) e os jovens (15 - 25 anos) com ensino médio e superior

(mais de 9 anos) também se equiparam. Ambos têm praticamente a mesma freqüência

de aplicação da regra de supressão da vogal postônica não-final, com o valor de 22% e

21%, respectivamente, e peso relativo também próximo de (.47) e (.45).

Logo, são os jovens (15 - 25 anos) com ensino fundamental (de 5 a 8 anos de

escolaridade) os grandes detentores da forma prestigiada, ou seja, são eles que menos

fazem uso da regra de redução da vogal postônica não-final. De acordo com o

programa, eles aparecem com 17% da freqüência e com peso relativo de (.38). Podemos

observar melhor os resultados obtidos no gráfico 2:

GRÁFICO 2 – CRUZAMENTO ENTRE FAIXA ETÁRIA E

ESCOLARIZAÇÃO (Apagamento da vogal postônica não-final)

CRUZAMENTO ESCOLARIZAÇÃO/FAIXA ETÁRIA

.76

.65

.30

.53

.58

.38

.54

.47

.4515 - 25anos

26 - 50anos

Maisde 50anos

Faix

a Et

ária

PESO RELATIVO

Mais de 9 anos5 a 8 anosNenhum a 2 anos

Acreditamos que o fenômeno acima descrito ocorre pelo fato de que esses jovens têm de manter o uso padrão posto que ainda estão engajados nas atividades escolares, havendo assim uma preocupação com vestibulares, concursos e uma série de atividades acadêmicas a serem seguidas. Nos idosos, o uso freqüente da forma

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desprestigiada ocorre pelo fato de serem aposentados, ou seja, não exercem mais suas atividades profissionais. Isso proporciona mais flexibilidade e liberdade à forma que empregam no ato de comunicação. O segundo cruzamento que o programa computacional VARBRUL tomou como relevante foi entre Sexo e Faixa Etária. Nesse cruzamento, nossa hipótese de que as mulheres seriam as maiores detentoras da forma padrão não se confirma completamente, pelo menos em se tratando das não escolarizadas ou com pouca escolaridade, porquanto são elas que mais realizam o fenômeno aqui observado. Já nas demais categorias, as mulheres se sobressaem aos homens. Vejamos a tabela 11:

TABELA 11 – CRUZAMENTO ENTRE SEXO E ESCOLARIZAÇÃO (Apagamento da vogal postônica não-final)

SEXO

MASCULINO FEMININO ESCOLARIZAÇÃO

Aplic/Total Freq. Aplic/Total Freq.

Pouca a 2 anos 176/397 44% 188/384 48%

5 a 8 anos 140/570 24% 164/680 24%

Mais de 9 anos 242/823 29% 136/600 18%

Podemos perceber que, com 48% da freqüência, as mulheres analfabetas e/ou

com poucos anos de escolarização (de pouca escolaridade a 2 anos) são as maiores

usuárias das formas sincopadas e também apresentam o maior peso relativo (.70) em

relação aos demais entrevistados. Em seguida, vêm os homens, também analfabetos,

e/ou com poucos anos de escolarização, que apresentam freqüência de 44% e peso

relativo de (.66). Como comentado no item anterior, acredita-se que a explicação para

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essa freqüência acentuada nos idosos esteja no fato de já serem aposentados e estarem

afastados de suas atividades profissionais, não mais necessitando fazer um

monitoramento de sua fala.

Fato interessante ocorre com os que cursaram o ensino fundamental (de 5 a 8

anos de escolaridade). Sejam homens ou mulheres, eles têm a mesma freqüência, de

24%, e o peso relativo está bastante próximo, respectivamente (.46 e .45). O que

também vem comprovar nossa tese de que os pertencentes a essa camada escolar

tendem a manter o uso padrão, uma vez que ainda vivem e respiram a escola,

preparando-se, assim, para alcançarem seus objetivos de vida, o que depende do uso da

forma padrão.

Quanto aos pertencentes à camada mais elevada de escolaridade, ou seja, os que

cursaram o ensino médio e o superior (mais de 9 anos), ocorre um fato bastante

relevante, comprovando nossa hipótese de que as mulheres são as maiores detentoras

desse fenômeno. Aqui os homens surgem como sendo os grandes favorecedores das

formas sincopadas, pois aparecem com uma freqüência de 29%, enquanto que as

mulheres encontram-se com apenas 18%, firmando-se, assim, como as maiores

detentoras da forma padrão. Ao observarmos o peso relativo, os homens aparecem com

(.52), e as mulheres, donas do uso padrão, com (.36).

GRÁFICO 3 – CRUZAMENTO ENTRE SEXO E ESCOLARIZAÇÃO

(Apagamento da vogal postônica não-final)

CRUZAMENTO SEXO/ESCOLARIZAÇÃO

.52

.46

.66

.36

.45

.70Nenhuma 2 anos

5 a 8anos

Mais de9 anos

Esco

lariz

ação

Peso Relativo

FemininoMasculino

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104

Esse gráfico expressa uma melhor visão em relação ao peso relativo do cruzamento aqui realizado. Mais uma vez, reafirmamos que as mulheres com maior nível de escolaridade são as maiores detentoras da forma padrão e, as que detêm menor escolarização são as maiores usuárias da forma não-padrão. O VARBRUL descartou o cruzamento realizado entre as variáveis Sexo e Faixa Etária. Os resultados obtidos foram bastante próximos, tanto em relação à freqüência quanto ao peso relativo. Observemos a tabela 12 para melhor visualização dos resultados:

TABELA 12 – CRUZAMENTO ENTRE SEXO E FAIXA ETÁRIA (Apagamento da vogal postônica não-final)

SEXO

MASCULINO FEMININO FAIXA ETÁRIA

Aplic/Total Freq. Aplic/Total Freq.

15 - 25 anos 168/649 25% 107/622 17%

26 - 50 anos 204/619 32% 188/566 33%

Mais de 50 anos 202/575 35% 177/559 31%

Como podemos notar, os percentuais de freqüência andam bastante próximos e confirmam os resultados e hipóteses anteriormente mencionados. Aqui os homens mais velhos (com mais de 50 anos) são os maiores realizadores do apagamento da postônica não-final em vocábulos proparoxítonos, com freqüência de 35%. E esse valor, em comparação com as mulheres de mesma faixa

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105

etária, não está muito distante, já que a freqüência referente a elas é de 31%. Em relação ao peso relativo, homens e mulheres também estão bastante próximos. Vale, no entanto, ressaltar que, quando comparado o peso relativo entre eles, (.51) para os homens e (.55) para as mulheres, elas se destacam como maiores usuárias da forma não padrão. Em relação aos adultos, os resultados referentes à freqüência foram muito parecidos, os homens, com 32% e as mulheres, com 33%. Porém, quando visto o peso relativo acerca desse cruzamento, constatamos uma pequena diferença, mas que não chega a ser tão significativa. Nessa perspectiva, o peso relativo das mulheres foi de (.53), e dos homens, de (.50). Percebemos, aqui, a partir do peso relativo entre eles, um maior uso da variável padrão por parte dos homens e, em contrapartida, um uso maior da variável estigmatizada pelas mulheres, o que mantém ainda os homens como maiores usuários do uso da norma padrão. Quanto aos jovens – os que menos fazem uso da regra de apagamento da vogal postônica não-final em proparoxítonas – os valores também são bastante próximos. Mas, aqui, os homens é que aparecem como maiores usuários da síncope. Os resultados para a freqüência foram os seguintes: homens, com 25%, e mulheres, com 17%. Essa diferença também é visível quando observado o peso relativo nesse cruzamento. As mulheres permanecem com o menor valor de uso da variável não-padrão (.40), e os homens, com (.51). Para melhor exposição dos pesos relativos, expomos abaixo o gráfico 4, com os valores referentes ao peso relativo nesse cruzamento:

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106

GRÁFICO 4 – CRUZAMENTO ENTRE SEXO E FAIXA ETÁRIA

(Apagamento da vogal postônica não-final)

CRUZAMENTO SEXO/FAIXA ETÁRIA

.51

.50

.51

.40

.55

.53

15 - 25anos

26 - 50anos

Mais de50 anos

Faix

a Et

ária

Peso Relativo

FemininoMasculino

A partir desse gráfico, observamos que os valores estão bastante próximos, com

exceção dos valores referentes aos jovens, os quais apresentam maiores nos valores em

relação às demais faixas etárias.

7 CONFRONTO COM OUTROS TRABALHOS

Neste capítulo, apresentaremos resultados obtidos neste trabalho, confrontando-o

com outro trabalho sobre o mesmo fenômeno lingüístico, realizado por Marisa Porto do

Amaral, em 1999, utilizando um corpus composto por informantes da cidade de São

José do Norte – RS. Amaral analisou a variação acerca do apagamento da vogal

postônica não-final em proparoxítonas na fala de 40 informantes da zona rural, do

município supracitado, sob a perspectiva laboviana da Teoria da Variação, da Mudança

Lingüística e em princípios da fonologia moderna, compreendendo a Fonologia

Prosódica e a Fonologia Métrica.

Os trabalhos aqui confrontados não expressam muita divergência, em relação

aos fatores por eles observados. Foram, praticamente, levados em consideração, em

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ambos, os mesmos fatores sociais e lingüísticos. Os corpora só divergem em dois

aspectos:

1º. O nosso corpus é composto por informantes de três faixas etárias (15

– 25 anos, 26 – 50 anos e mais de 50 anos); enquanto que o de Amaral é constituído de

apenas duas faixas etárias (20 – 50 anos e mais de 50 anos);

2º. Em relação à escolaridade, nosso corpus consta de três níveis (pouca

escolaridade até 2 anos, 6 – 8 anos e mais de 9 anos); o corpus do trabalho de Amaral

(op. cit.) contém apenas dois níveis (0 – 4 anos e mais de quatro anos de escolaridade).

Apesar dessas diferenças, há muito em comum entre os trabalhos, e essas

semelhanças são colocadas neste capítulo para que seja melhor entendido o português

falado no Brasil.

Faremos os confrontos obedecendo à seguinte organização: primeiro, são

confrontados os fatores extralingüísticos e, logo após, os fatores lingüísticos.

7.1 FATORES EXTRALINGÜÍSTICOS No que concerne aos fatores extralingüísticos, em ambos os trabalhos, a variável

com maior expressividade foi a escolaridade, a qual fizemos alusão, mesmo que ela

tenha sido observada de forma meio distinta, como já foi explicado acima, uma vez que

as variáveis se assemelham no que tange à baixa e à alta escolarização. Ou seja, em

ambos os trabalhos, há pessoas com menor e maior escolarização, sendo possível,

assim, fazer um paralelo entre eles.

Os trabalhos apresentaram praticamente o mesmo resultado em se tratando da

variável sexo, tal como foi previsto, tanto em nosso estudo quanto no de Amaral (1999).

A hipótese levantada por ambos os pesquisadores foi a de que os informantes de sexo

masculino estariam mais propícios ao apagamento das vogais postônicas não-finais em

palavras proparoxítonas (Cf. cap. 5.1.3). Vejamos os dados no gráfico 5 para

visualização e entendimento dos resultados.

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108

GRÁFICO 5 – CONFRONTO DOS DADOS DO SEXO (Apagamento

da vogal postônica não-final)

CONFRONTO ENTRE SEXO

5347

56

450 20 40 60 80 100 120

MASCULINO

FEMININO

SILVA AMARAL

No trabalho de Amaral (op. cit.) os resultados revelam que os falantes

masculinos realizam mais a supressão (.56), e as mulheres o fazem com menos

freqüência (.45). Em nossa pesquisa, o resultado ficou nesse parâmetro. Os informantes

masculinos apresentaram-se como sendo os maiores realizadores, com peso relativo de

(.53), e as mulheres aparecem como maiores mantedoras da variável padrão (.47).

Esses resultados já eram esperados, pois, quando a variação não representa uma mudança em progresso, como parece o fenômeno em estudo, em ambos os trabalhos, as mulheres tendem a usar mais a forma padrão ou a de prestígio do que os homens. Tem-se aqui a confirmação de uma tendência em estudos sociolingüísticos, a de que, em situações estáveis, os homens usam mais as formas não-padrão. Essa variante, em ambos os trabalhos, desempenha um papel pouco

significativo, posto que os resultados aparecem um tanto próximos do ponto neutro e,

conseqüentemente, indicam que essa variável pouco interfere na realização do processo

de apagamento das vogais postônicas não-finais em proparoxítonos.

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109

7.2 FATORES LINGÜÍSTICOS

A primeira variável confrontada, entre os dois trabalhos, em relação aos fatores

lingüísticos, foi o Contexto Fonológico Seguinte. Os resultados obtidos foram meio

divergentes. Em nosso trabalho, o contexto fonológico seguinte que mais favorece a

supressão da vogal postônica não-final é a líquida lateral /l/ com (.84), seguida da

líquida vibrante /r/ com (.63) e, por fim, encontram-se as não-líquidas (oclusivas,

fricativas, nasais), com peso relativo de (.40). Já no trabalho desenvolvido por Amaral

(1999), a líquida vibrante /r/ é a maior favorecedora da supressão, com (.83), seguida da

líquida lateral /l/ com (.54), ficando, também, as não-líquidas como as menos

favorecedoras do processo aqui estudado, com um valor de (.25). Como podemos

observar no gráfico 6, há uma inversão nos valores obtidos pelos trabalhos:

GRÁFICO 6 – CONFRONTO DOS DADOS DA VARIÁVEL

CONTEXTO FONOLÓGICO SEGUINTE (Apagamento da vogal postônica

não-final)

CONFROTO ENTRE CONTEXTO FONOLÓGICO SEGUINTE

6384

40

8354

25

0 50 100 150 200

líquida vibrante

líquida lateral

não-líquidas

SILVA AMARAL

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110

Resultado invertido também ocorre quando observada a Estrutura da Sílaba. Em

nosso estudo, a estrutura silábica mais propícia ao apagamento é a sílaba pesada, com

(.59). Já a sílaba leve aparece com peso relativo de (.47). No trabalho desenvolvido por

Amaral (1999), a estrutura silábica mais favorável é a de sílaba leve, com (.53), ficando

a sílaba pesada com menor peso (.38). No gráfico 7, podemos visualizar melhor essa

inversão.

GRÁFICO 7 – CONFRONTO DOS DADOS DA VARIÁVEL

ESTRUTURA DA SÍLABA (Apagamento da vogal postônica não-final)

CONFRONTO ENTRE ESTRUTURA DA SÍLABA

4759

5338

0 20 40 60 80 100 120

leve

pesada

SILVA AMARAL

Como podemos perceber, mais uma vez houve oposição entre os dados

observados.

Em se tratando de Traço de Articulação da Vogal, observamos que também há

uma pequena inversão quanto às vogais labiais /o, u/ e coronais /e, i/, porém, quando

confrontadas as vogais dorsais /a/, o resultado é mais próximo. O gráfico 8 expressa

com mais clareza esses resultados.

GRÁFICO 8 – CONFRONTO DOS DADOS DA VARIÁVEL TRAÇO

DE ARTICULAÇÃO DA VOGAL (Apagamento da vogal postônica

não-final)

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CONFRONTO ENTRE TRAÇO DE ARTICULAÇÃO DA VOGAL

3849

55

6247

43

0 20 40 60 80 100 120

labial

dorsal

coronal

SILVA AMARAL

Como podemos ler no gráfico 8, no que tange às

vogais dorsais, o resultado é bastante parecido tanto na pesquisa de Silva (no prelo) quanto na de Amaral (1999), respectivamente (.49) e (.47). Porém, ao se observarem as vogais labiais e coronais, há, mais uma vez, a inversão de resultados. Em nossa pesquisa, as coronais aparecem como sendo as mais favoráveis à aplicação da regra de apagamento da vogal postônica não-final em vocábulos proparoxítonos, com peso relativo de (.55). Já as vogais labiais surgem como sendo as menos favorecedoras da regra, com (.38). Poder-se-ia até traçar a seguinte seqüência para a nossa pesquisa: coronal > dorsal > labial.

O contrário acontece no trabalho de Amaral (op. cit.), em que, as vogais se comportam da seguinte forma: as labiais são as mais favoráveis (.62), seguidas das dorsais (.47) e das coronais (.55). Assim, a seqüência referente ao traço de articulação das vogais, neste trabalho, ficaria da seguinte forma: labial > dorsal > coronal, deixando bem visível a inversão nos resultados, expostos no gráfico 9 a seguir:

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112

GRÁFICO 9 – INVERSÃO DA VARIÁVEL TRAÇO DE

ARTICULAÇÃO DA VOGAL (Apagamento da vogal postônica não-final)

labial dorsal coronal

SILVAAMARAL

Em se tratando dos fatores lingüísticos, como podemos observar nos confrontos

realizados acima, nosso trabalho diverge, em parte, do trabalho de Amaral (1999).

Sempre há uma certa inversão nos resultados comparados. Já em relação aos resultados

dos fatores extralingüísticos, houve uma convergência e, certamente, a confirmação de

uma tendência nos estudos sociolingüísticos45, em relação ao sexo.

Com o confronto dos resultados obtidos em duas distintas regiões do país –

Nordeste e Sul –, podemos chegar a algumas conclusões a respeito desse fenômeno do

português falado no Brasil. Comprovamos, com os resultados obtidos pelas pesquisas

aqui apresentadas, que elas divergem em alguns aspectos, evidenciando que, mais do

que um fenômeno observável apenas em pontos isolados do país, o fenômeno do

apagamento da vogal postônica não-final, em vocábulos proparoxítonos, tem um caráter

abrangente.

8 CONSIDERAÇÕES FINAIS

45 Cf. Cap. 2.4.2.1.1.

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113

O estudo do apagamento da vogal postônica não-final, em vocábulos

proparoxítonos, no português falado, na cidade de Sapé-PB, possibilitou-nos verificar o

comportamento lingüístico da presença > síncope da vogal supracitada, a fim de

detectarmos se o fenômeno lingüístico em questão sofre ou não interferências de fatores

lingüísticos e/ou extralingüísticos.

Com base nos resultados, é possível que sejam feitas algumas deduções sobre o fenômeno aqui pesquisado. Porém não esperamos esgotar todas as indagações a esse respeito, mas contribuir com outros trabalhos já realizados (ver Cap. 1.1).

De acordo com os resultados obtidos, concluímos que:

1. O fator anos de escolarização é o grande influenciador do uso desse

fenômeno, no que tange aos fatores sociais ou extralingüísticos. Conforme

previsto em nossas hipóteses, os menos escolarizados são os que mais

realizam o apagamento da vogal postônica não-final. E, à medida que se

eleva a escolarização, o uso estigmatizado da variável vai cessando. Assim,

confirmamos a idéia de que, quanto mais próximos da escola, mais os

falantes empregam a variante padrão.

2. Um segundo fator bastante relevante do nosso trabalho foi a idade. Os

informantes com mais de 50 anos são detentores do maior uso da variante

não-padrão. A partir desse resultado, a hipótese de que os informantes mais

jovens ajam mais positivamente à variante inovadora, cai por terra.

Acreditamos, assim, que o que leva os mais velhos a realizarem a variante

estigmatizada é o fato de não estarem mais exercendo suas funções no

mercado de trabalho, sentindo-se, portanto, livres para o uso da forma não-

padrão.

3. O fator sexo só veio nos confirmar o uso da variável padrão pelos

informantes femininos. Assim, acreditamos que as mulheres podem estar

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114

usando meios lingüísticos como uma forma de obtenção de status negado a

elas em outras épocas.

4. O fator tipo de entrevista não se demonstrou muito favorecedor do uso

ou não do apagamento da vogal postônica não-final em vocábulos

proparoxítonos. Apesar de ter sido considerado pelo pacote de programa

computacional VARBRUL, esse fator ficou bem próximo do ponto neutro,

com (.52) de significância na entrevista dirigida e (.47) na leitura das

palavras em frases. Mesmo assim, o primeiro fator aparece como o maior

favorecedor da forma padrão.

5. Ao rodarmos os fatores lingüísticos, o VARBRUL considerou como

mais significante o contexto fonológico seguinte, confirmando a nossa

hipótese de esse fator ser correlacionado mais positivamente com o

apagamento ou não da postônica não-final. Sabemos que o padrão silábico

CCV do português permite a formação de ataque complexo desde que a

segunda consoante seja uma líquida (abóbora > abobra; triângulo > trianglo).

Ao formar o novo vocábulo, através da queda da vogal, esse padrão surge,

resultando, assim, em um ataque complexo bem formado. Logo, a líquida

lateral (.84) é a menor detentora do padrão: músculo > musclo; pétala >

petla; óculos > oclus; maiúsculo > maiusclo; triangulo > trianglo, seguido

da líquida vibrante (.63): árvore > arvre; chácara > chacra; xícara > xicra;

abóbora > abobra; mascara > mascra.

6. Em se tratando do contexto fonológico precedente, as fricativas

apareceram como sendo as mais propícias ao apagamento da vogal postônica

não-final, seguidas da oclusiva. Isso porque as oclusivas e fricativas têm

maior força e menor sonoridade, de acordo com a Escala de Força e de

Sonoridade (Cf. cap. 1.2), tornando de fácil entendimento que elas sejam

menos resistentes à supressão.

7. Um outro fator considerado relevante no apagamento da postônica não-

final foi a extensão da palavra. Palavras polissílabas – com mais de três

sílabas – são as grandes favoráveis ao apagamento. Isso nos leva a crer que,

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115

no “continuum” da fala, é mais fácil reduzirem-se os polissílabos, levando

em consideração os ambientes propícios à redução (como a síncope) de

palavras, cujas vogais postônicas não-finais são, em geral, antecedidas por

uma obstruinte e seguidas por uma líquida (espírito > esprito).

8. Quanto às estruturas leves e pesadas, conforme foram observadas no

fator estrutura da sílaba, observamos que a sílaba leve (.47) favorece o uso

padrão mais do que a pesada (.59). Para explicar esse fenômeno, tomamos

por base a idéia de que os segmentos que atuam como núcleo silábico ou

como coda dependem das restrições de uma língua específica e de uma

escala de soância. Em relação ao peso, a sílaba leve possui uma só mora

(péµ), e a sílaba pesada possui mais de uma (maµlµ). A pesada tem de atender

ao requisito de que haja uma diferença de soância, ainda que mínima, entre

as duas moras, e em sentido crescente a partir do núcleo. Para a posição sub-

silábica da segunda mora de uma sílaba pesada que é igualmente restrita, há

termos de soância, de acordo com a língua específica. Por isso os segmentos

que podem ocupar a segunda mora ou a coda da sílaba, em português, são os

coronais /r/, /s/, /l/ e /n/, que têm menos soância do que a vogal que é

portadora de soância máxima e de mais fácil articulação.

9. O traço de articulação da vogal também deu sua contribuição ao nosso

trabalho. Aqui ficou claro que as vogais labiais /o, u/ são as que apresentam

maior aceitabilidade ao padrão. Enquanto o peso maior (.55) incide nas

sílabas com vogais coronais /e, i/, sendo esta a maior favorecedora da

síncope, as sílabas com vogal dorsal /a/ aparecem muito próximas do ponto

neutro.

10. Ao cruzarmos os dados referentes aos contextos extralingüísticos,

podemos concluir que, em relação ao cruzamento escolarização vs idade, os

idosos analfabetos e/ou com poucos anos de escolarização são os que mais

realizam o apagamento da vogal postônica não-final, ficando os jovens com

ensino fundamental como os grandes detentores da forma padrão. A

explicação se dá pelo fato de esses jovens freqüentarem ambiente escolar,

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116

havendo assim uma preocupação com vestibulares, concursos e uma série de

atividades acadêmicas a serem seguidas.

Já com o cruzamento sexo vs escolarização, concluímos que as

mulheres analfabetas e/ou com poucos anos de escolarização são as maiores

usuárias das formas sincopadas, quando pertencentes à camada mais elevada

de escolaridade, destacam-se como as maiores detentoras do padrão.

O VARBRUL descartou o cruzamento realizado entre as variáveis

Sexo e Faixa Etária, pelo fato de os resultados estarem bem próximos e não

oferecerem nenhum diferencial à nossa pesquisa.

11. Por fim, quando comparado o nosso trabalho ao de Amaral (1999),

podemos concluir que, em ambos, houve uma inversão de resultados. Ou

seja, nossos dados entraram em desacordo acerca dos fatores lingüísticos, em

especial. Quanto ao contexto fonológico precedente, apesar de ambos terem

sido tomados como os mais relevantes nas duas pesquisas, em nosso

trabalho, a líquida lateral /l/ foi a mais propícia ao apagamento. Já no

trabalho de Amaral (op. cit.), a líquida vibrante /r/ é a maior favorecedora da

supressão, apesar de esse fonema ser bastante forte no sul do país.

Igualmente invertidos, se deram os resultados referentes à estrutura da

sílaba. Em nosso estudo, a estrutura silábica mais propícia ao apagamento é

a da sílaba pesada. No trabalho desenvolvido por Amaral (op. cit.), a de

sílaba leve é a mais favorável.

Ao observarmos o traço de articulação da vogal, percebemos mais

uma vez uma inversão nos resultados. Em nossa pesquisa, as coronais

aparecem como sendo as mais, e as labiais, as menos favoráveis à aplicação

da regra de apagamento; na pesquisa de Amaral (op. cit.), as labiais são as

mais favoráveis, e as coronais, as menos.

Podemos ilustrar o fenômeno da síncope da vogal postônica não-final com o

quadro 5 que exibe os fatores influenciadores de uma forma mais sintética:

QUADRO 5 – OS FATORES INFLUENCIADORES DO APAGAMENTO DA VOGAL POSTÔNICA NÃO-FINAL EM VOCÁBULOS PROPAROXÍTONOS

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117

SUPRESSÃO DA VOGAL POSTÔNICA NÃO-FINAL: Uma tendência das Proparoxítonas na Língua Portuguesa com

Evidências no Falar Sapeense

FATORES ESTRUTURAIS

FATORES SOCIAIS

Traço de Articulação da Vogal

(Vogais Coronais /e, i/)

Estrutura da Sílaba (Sílaba Leve)

Extensão da Palavra (Mais de Três Sílabas)

Contexto Fonológico Precedente

(Fricativas)

Contexto Fonológico Seguinte

(Líquida Lateral)

Tipo de Entrevista (Entrevista Dirigida)

Sexo

(Homens)

Idade

(Mais de 50 anos)

Anos de Escolarização

(Pouca escolarização = Semi-analfabetos)

É de grande importância estabelecer o papel que cada variável desempenha

dentro do processo de variação, pois só assim é possível traçar o perfil da comunidade

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118

em estudo e permitir que se façam comparações com estudos sobre o mesmo fenômeno

realizados em outras partes do país.

Além das conclusões específicas do fenômeno aqui estudado, cabe também,

neste capítulo, uma referência à importância dos estudos sociolingüísticos, hoje em dia,

tanto para a aprimoração da lingüística teórica, quanto para a prática dos resultados, que

pode ser trabalhada pela lingüística aplicada.

A partir do panorama histórico traçado neste trabalho, podemos observar que,

embora muitos admitam que a língua mude, há muitas controvérsias no que diz respeito

às causas dessas mudanças. Alguns atestam que a causa é estrutural ou funcional; outros

admitem a influência social nessas mudanças. Todas essas posições foram retomadas,

de uma forma ou de outra, pela teoria da variação lingüística, que tornou o estudo da

variação e da mudança mais sistemático.

Vale salientar, porém que a variação lingüística não pode ser desprezada. Como

tudo na vida está ligado a um equilíbrio, a língua também incide nessa regra. A língua

existe em função do equilíbrio de duas forças – uma conservadora, que a faria parar,

caso não fosse bem equilibrada, e outra que tende a mudá-la e que, também não sendo

bem trabalhada, a faria destruir-se e dissolver-se. É exatamente a luta entre essas duas

forças que produz a variação lingüística.

No estudo da mudança lingüística, está o descobrir de muitos outros fenômenos

e características de outras línguas. Um alargamento sobre o passado das línguas, unido

aos métodos mais modernos de observação de um recorte sincrônico da língua

produzirão, ainda, sem dúvida, novas teorias sobre a variação e a mudança nos sistemas

lingüísticos.

A igualdade e a disparidade, nos resultados dos estudos aqui apresentados, só

vêm mostrar que, por mais controversos que sejam os resultados obtidos, quando

comparado este trabalho com o de Amaral (1999), acerca da supressa da vogal

postônica não-final em vocábulos proparoxítonos, observamos que esse não é um

fenômeno restrito a áreas específicas do país. Ele tem um caráter abrangente, atingindo,

talvez, a totalidade do território brasileiro. E, sendo um fenômeno nacional, esperamos

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119

que esta pesquisa, somada a outras investigações lingüísticas, possa contribuir

fornecendo subsídios para ampliar o conhecimento do português falado no Brasil.

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ANEXOS

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ANEXO 1

FORMAÇÃO DO CORPUS 36 Informantes Sexo 18 Masculino 18 Feminino Idade 6 (15-25anos46) 6 (26-49anos) 6 (+49) 6 (15-25anos) 6 (26-49anos) 6 (+49) 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 Anos de Escolari- até 2a 6-8a +9a até 2a 6-8a +9a até 2a 6-8a +9a até 2a 6-8a +9a até 2a 6-8a +9a até 2a 6-8a +9a dade

46 No que concerne a anos de escolarização, dividimos em três grupos: Pouca escolarização até 2 anos, de 6 – 8 anos e + de 9anos.

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ANEXO 2

UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES

FICHA SOCIAL DO INFORMANTE

Entrevistador: André Pedro da Silva Data: ___/ ___/ 2004 1. Nome: _____________________________________________________________ 2. Endereço: __________________________________________________________ 3. Data de nascimento: ____/_________________/______ 4. Você estuda: ( ) SIM ( ) NÃO ( ) NUNCA ESTUDOU 5. Qual série? _______________________________ 6. Até que série você cursou? ______________________________ 7. Porque não continuou? ________________________________________________ 8. Você trabalha? ( ) SIM ( ) NÃO 9. Que tipo de atividade você faz? _________________________________________ 10. Você é financeiramente independente? ( ) SIM ( ) NÃO 11. Você recebe alguma ajuda financeira? De quem? ( ) FAMÍLIA ( ) OUTROS 12. Além de você, quantas pessoas moram em sua casa? ( ) NENHUMA ( ) DE UMA A DUAS ( ) MAIS DE TRÊS 13. Qual a relação de parentesco que há entre vocês? ( ) PARENTES ( ) NÃO PARENTES 14. Você costuma ver TV? ( ) SIM ( ) NÃO 15. Que programa(s) você assiste? ( ) NOVELA ( ) NOTICIAS ( )OUTROS 16. Você costuma ouvir rádio? ( ) SIM ( ) NÃO 17. Em que horário você ouve? ______________________________ 18. Você lê jornal? ( ) NÃO ( ) DIARIAMENTE ( ) DE VEZ EM QUANDO 19. Qual(is) jornal(is)? ____________________________________________________ 20. Que revista você lê? ___________________________________________________ 21. Qual a sua diversão favorita? ____________________________________________ 22. Você gosta de carnaval? ( ) SIM ( ) NÃO 23. Você gosta de futebol? ( ) SIM ( ) NÃO 24. Você pratica algum esporte? ( ) SIM ( ) NÃO 25. Qual esporte? __________________________________ 26. Você pratica alguma religião? ( ) SIM ( ) NÃO 27. Qual? ____________________________________________ 28. Você é uma pessoa que: ( ) NUNCA SAI DE SAPÉ ( ) SÓ SAI A NEGÓCIO ( ) SEMPRE SAI PARA PASSEAR 29. Passa muito tempo fora? ( ) MENOS DE DOIS MESES ( ) MAIS DE DOIS MESES

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ANEXO 3

LEITURA DAS PALAVRAS NO TEXTO

1. Todo sábado, um bêbado pacífico freqüentava um círculo católico, embaixo de uma

árvore, numa chácara.

2. O príncipe adorava doce de abóbora com uma bela xícara de chá.

3. Certo dia, uma professora de matemática resolveu instalar uma parabólica em sua

casa e tomou um choque elétrico, caindo, assim, sobre a cômoda, quebrando seus

óculos.

4. A prática de esporte, segundo meu médico, faz bem ao músculo e ao cérebro. Nos

faz perder a aparência tísica e melhora nosso estado de espírito.

5. Ao comer pêssego, uma grávida passou mal. Seu marido, agrônomo, a levou ao

médico. Ela imaginava ser uma úlcera ou fígado, algo relacionado ao estômago, mas na

realidade foi constatado que eram apenas cólicas.

6. Numa fábrica, a máquina de fósforo parou. Chamaram o mecânico. Numa análise

básica, o técnico observou que havia sido um problema elétrico e não físico.

7. O número de pessoas desacreditadas nesse político é grande. Nem os econômicos

aceitam sua candidatura. Logo seu crédito foi pelo ralo!

8. A máscara de plástico cor de pérola causava cócegas e irritava o rosto da criança.

9. Aconteceu um fenômeno intrigante no clube. A lâmpada explodiu, clareando tudo

como um relâmpago. Assustado, um rapaz do exército pediu para parassem a música e

os cânticos.

10. Aconteceu algo trágico no jardim de Margaridas, por acidente entornaram ácido nas

pétalas das flores e todas morreram, dando-me um grande prejuízo.

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ANEXO 4

FIGURAS UTILIZADAS NAS ENTREVISTAS

Ficha 1

1. Mágico, mágica, número, matemática, abóbora.

Ficha 2

2. Música, elétrico, pétala, árvore.

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Ficha 3

3. Educação física, árvore, xícara, ônibus.

Ficha 4

4. Plástico, máquina, número, matemática, grávida, cólica.

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132

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Ficha 5

5. Católico, evangélico, cântico, chácara, árvore, semáforo, trânsito.

Ficha 6

6. Médico, músculo, xícara, cômoda, lâmpada.

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133

133

Ficha 7

7. Fábrica, técnico, farmacêutico.

Ficha 8

8. Abóbora, música, músico, cágado, hipopótamo, máquina, câmera, fotógrafo.

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Ficha 9

9. Óculos, fósforo, cócega.

Ficha 10

10. Helicóptero, fábrica, máquina, mecânico, elétrico, cômoda.

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135

Ficha 11

11. Pássaro, pêssego.

Ficha 12

12. Maiúsculo, minúsculo, cérebro.

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136

136

Ficha 13

13. Máscara, bêbado, relâmpago, crédito, atlântico, pacífico, índico.

Ficha 14

14. Exército, político, máquina, termômetro, parabólica.

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137

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Ficha 15

15. Fígado, estômago, pérola, triângulo, retângulo, matemática.

Ficha 16

16. Estômago, úlcera, fígado

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ANEXO 5

PERGUNTAS PARA OBTENÇÃO DAS PROPAROXÍTONAS

1. Como se chama aquela disciplina que a gente faz exercícios e depois fica jogando na

quadra? Educação Física

2. Qual o dia da feira em Sapé? Sábado

3. Você sabe fazer o sinal da cruz? Pode fazer? Espírito

4. Como se chama o filho do rei? Príncipe

5. Rubinho Barrichello participa de que tipo de corrida? Fórmula 1

6. Você pode me falar o nome daquela doença que queima o estômago? Úlcera

7. Como se chama essas pessoas que estão se candidatando a prefeitos, vereadores?

Políticos

8. Como se chama aquela dor que as mulheres sentem antes e durante a menstruação?

Cólica

9. Como chamamos uma pessoa que está muito fraca e magra? Tísico

10. O homem que trabalha na EMATER é um...? Agrônomo

11. Quando uma pessoa mexe em nossa barriga, fazendo a gente rir, falamos que ela está

fazendo...? Cócega

12. Você poderia falar dois principais mandamentos da Lei de Deus? Próximo

13. Como se chama aquela borracha que fica cheia de ar, dentro do pneu? Câmara

14. Como chamamos aquele sitio pequeno que geralmente as pessoas vão passar fim de

semana pra se distraírem? Chácara

15. O jogo Brasil x Argentina terminou 2x2. Como foi que o Brasil ganhou? Pênaltis

16. Como é que Galvão Bueno chama o Ronaldo? Fenômeno

17. Quando nos abaixamos, ficamos de...? Cócoras

18. Como se chama o nome do pó que fica dentro das bombas de São João? Pólvora

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