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SUMÁRIO

Palavras da professora-pesquisadora ......................................................... 364364

Croqui do percurso .................................................................................. 365365

Mapa Conceitual ...................................................................................... 370370

Desempenho do percurso ......................................................................... 371371

UNIDADE I: A GESTÃO DE PRÁTICAS PEDAGÓGICAS CENTRADAS NA PROTEÇÃO INTEGRAL DA CRIANÇA .................................................................. 372372

Visões sobre a criança: breve explanação histórica ...................................... 372372

Do direito à educação no cenário internacional ............................................ 378378

Panorama nacional: a doutrina do direito penal do menor e o código de menores .................................................................................................

385385

O direito à educação consagrado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente .... 391391

UNIDADE II: A PROTEÇÃO INTEGRAL DA CRIANÇA .......................................... 394394

Doutrina da proteção integral: conceito e características ............................... 394394

Cidadania e educação: uma articulação necessária ....................................... 399399

Promoção da cidadania na educação infantil: uma articulação entre direitos e deveres ..................................................................................................

3535402402

O pleno desenvolvimento da pessoa ........................................................... 405405

UNIDADE III: A GESTÃO DA PRÁTICA PEDAGÓGICANA EDUCAÇÃO INFANTIL .................................................................................. 407407

Trabalhando com projetos didáticos ........................................................... 407407

Projeto didático “respeitar os direitos humanos também é coisa de criança” .... 409409

Projeto didático “direitos e deveres da criança” ............................................ 413413

Projeto didático “meio ambiente e desenvolvimento humano sustentável” ....... 417417

Trilhas do Aprendente, Vol. 7 - Estágio Supervisionado em Magistério da Educação Infantil VI

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Palavras da professora-pesquisadora

Caros(as) aprendentes, Parabéns! Um novo percurso se inicia. Sua especifi cidade consiste na realização de uma síntese entre as Trilhas do Estágio Supervisionado e na adoção da educação em direitos e deveres da criança como eixo temático, que articula as discussões e os desafi os desse percurso.No componente curricular Estágio Supervisionado VI, estudaremos a problemática da construção de práticas pedagógicas, na educação infantil, centradas na educação em direitos humanos, especifi camente, na educação em direitos e deveres da criança. Enfatiza-se a perspectiva de que a criança é uma pessoa em desenvolvimento, que necessita de cuidados e proteção especiais, mas se constitui como um sujeito de direitos e deveres. Afi rma-se, portanto, uma perspectiva de cidadania infantil, que articula direitos e responsabilidades.

A educação em direitos humanos consiste numa temática já tratada no componente curricular Estágio Supervisionado II, momento em que refl etimos sobre a necessidade de promoção dos direitos humanos na escola, sob a ótica dos documentos que afi rmam e reconhecem os direitos da criança, tais como a Declaração dos Direitos da Criança, de 1959, e a Convenção dos Direitos da Criança, de 1989. Agora, no Estágio Supervisionado VI, aprofundaremos o que iniciamos em Estágio II, destrinchando e detalhando as questões ligadas à formação da criança como um sujeito de direitos, mas que assume responsabilidades perante a escola, a família e a comunidade. Aprofundam-se, portanto, refl exões iniciadas outrora. Lembramos da necessidade de dedicação de vocês, aprendentes, pois este componente exige uma postura mais ativa e mais estudo sobre as questões aqui colocadas. Portanto, para que se amplie a qualidade de nossas discussões, faz-se necessária a sua participação, por intermédio do estudo dos objetos de aprendizagem, do posicionamento nos fóruns e debates, na realização das atividades requeridas. A interação é fundamental, pois precisamos acompanhar o processo de aprendizagem e nos informar das dúvidas que vocês vivenciam. Informamos, também, que, nessa etapa do percurso, nos debruçaremos nos projetos didáticos, uma forma de gestão do trabalho pedagógico que possibilita a construção do conhecimento de maneira interdisciplinar e contextualizada. Estamos à disposição para esclarecer quaisquer dúvidas e nos comprometemos com a constante melhoria da qualidade do nosso curso. Tenham um bom percurso e que, neste marco, possamos ampliar, aprofundar e qualifi car nossas interações!

Com compromisso,

Profa. Dra. Maria Creusa de A. Borges

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Croqui do Percurso

UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASILUNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA

CURSO DE PEDAGOGIA - MODALIDADE A DISTÂNCIAESTÁGIO SUPERVISIONADO EM MAGISTÉRIO DA EDUCAÇÃO INFANTIL VI

Professora: Dra. Maria Creusa de Araújo BorgesColaboradora: Taísa Caldas Dantas (advogada e mestranda em Educação – PPGE/UFPB)E-mail: [email protected]

MARCO VII

Componente Curricular: Estágio Supervisionado em Magistério da Educação Infantil VI

60 horas/aula 04 créditos

Ementa: Gestão de práticas pedagógicas na educação infantil, fundamentadas na educação em direitos humanos e na concepção de criança como pessoa em desenvolvimento, que precisa de cuidados e proteção especiais, e, sobretudo, numa perspectiva de cidadania infantil que articula direitos e deveres.

Objetivo Geral: Problematizar a gestão da prática pedagógica na educação infantil, fundamentada na construção da cidadania infantil e na concepção de criança como um sujeito de direitos e deveres.

Objetivos Específi cos:- Compreender as noções necessárias à construção de uma prática pedagógica baseada na educação em direitos e deveres da criança na educação infantil;

- Enfatizar o papel da educação formal, na primeira etapa da educação básica, na promoção dos direitos humanos da criança;

- Construir práticas pedagógicas críticas e refl exivas, baseadas na articulação entre teoria e prática, cujo eixo temático focalize a educação em direitos e deveres da criança.

Competências e habilidades a ser desenvolvidas:- Produção, análise e síntese de textos; - Leitura crítica de fi lmes e imagens;- Interação, no Moodle, entre os aprendentes, professor e mediadores;- Elaboração de projetos didáticos.

Etapas do percurso:

UNIDADE I: A GESTÃO DE PRÁTICAS PEDAGÓGICAS CENTRADAS NA PROTEÇÃO INTEGRAL DA CRIANÇA

- Visões sobre a criança: breve explanação histórica- Do direito à educação no cenário internacional- Panorama nacional: a doutrina do direito penal do menor e o código de menores- O direito à educação consagrado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente

Trilhas do Aprendente, Vol. 7 - Estágio Supervisionado em Magistério da Educação Infantil VI

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UNIDADE II: A PROTEÇÃO INTEGRAL DA CRIANÇA

– Doutrina da proteção integral: conceito e características– Cidadania e educação: uma articulação necessária – Promoção da cidadania na educação infantil: uma articulação entre direitos e deveres– O pleno desenvolvimento da pessoa

UNIDADE III: A GESTÃO DA PRÁTICA PEDAGÓGICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL

– Trabalhando com projetos didáticos– Projeto didático “respeitar os direitos humanos também é coisa de criança”– Projeto didático “direitos e deveres da criança” – Projeto didático “meio ambiente e desenvolvimento humano sustentável”

Metodologia: Este componente curricular está fundamentado num conjunto de estratégias que buscam articular as etapas do percurso, por intermédio do estudo dos objetos de aprendizagem, da análise de videoaula e de fi lme; análise e construção de práticas pedagógicas críticas e refl exivas; realização dos desafi os colocados ao fi nal de cada unidade, elaboração de projetos didáticos.

Recursos técnico-pedagógicos: objetos de aprendizagem; videoaula; fi lmes; desafi os; fóruns.

GPS:Os instrumentos de avaliação dos(as) aprendentes são diversifi cados, de modo a atender aos objetivos de um acompanhamento sistemático, numa perspectiva global, articulando-se as etapas do percurso de aprendizagem. Assim, fazem parte da avaliação os seguintes instrumentos: respostas aos desafi os e participação nos fóruns de cada unidade; prova escrita presencial; elaboração dos projetos didáticos e vivência na educação infantil. Os desafi os de cada unidade devem ser postados no Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA), dentro do prazo estipulado pelo(a) professor(a)-pesquisador(a), juntamente com os mediadores pedagógicos, e os fóruns perpassam todo o percurso, devendo, também, ser postados no AVA (Moodle). Na avaliação da participação dos(as) aprendentes, são considerados como critérios de avaliação: a interação no Moodle, avaliada por intermédio da “presença” dos(as) aprendentes no ambiente virtual (fóruns; postagem dos desafi os); domínio do referencial teórico a ser demonstrado nas interações; capacidades de análise e síntese na produção dos textos.

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REFERÊNCIAS

ALMEIDA, Luciano Mendes de. In: CURY, Munir (Coord.). Estatuto da Criança e do Adolescente comentado: comentários jurídicos e sociais. 8. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2006.

ALVES, José Augusto Lindgren. Os direitos humanos como tema global. São Paulo: Perspectiva, 2007.

ARANTES, Esther Maria. Contexto Histórico do Código de Menores ao Estatuto da Criança e do Adolescente – Mudanças Necessárias. Disponível em: <http://www.webartigos.com/articles/19148/1/contexto-historico-do-codigo-de-menores-ao-estatuto-da-crianca-e-do-adolescente--mudancas-necessarias-/pagina1.html>. Acesso em: 05/08/2009.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 05/08/2009.

__________. Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8069.htm>. Acesso em: 05/08/2009.

__________. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9394/96). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/l9394.htm>. Acesso em: 13/08/2009.

COELHO, João Gilberto Lucas. In: CURY, Munir (Coord.). Estatuto da Criança e do Adolescente comentado: comentários jurídicos e sociais. 8. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2006.

Convenção dos Direitos da Criança de 1989. Disponível em: <http://www.unicef.pt/docs/pdf_publicacoes/convencao_direitos_crianca2004.pdf>. Acesso em: 04/08/2009.

COSTA, Antônio Carlos Gomes da. In: CURY, Munir (Coord.). Estatuto da Criança e do Adolescente comentado: comentários jurídicos e sociais. 8. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2006.

CURY, Munir (Coord.). Estatuto da Criança e do Adolescente comentado: comentários jurídicos e sociais. 8. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2006.

Declaração dos Direitos da Criança de 1959. Disponível em: <http://www.culturabrasil.pro.br/direitosdacrianca.htm>. Acesso em: 04/08/2009.

Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948. Disponível em: <http://www.mj.gov.br/sedh/ct/legis_intern/ddh_bib_inter_universal.htm>. Acesso em: 14/08/2009.

DEL – CAMPO, Eduardo Roberto Alcântara; OLIVEIRA, Thales Cezar de. Estatuto da Criança e do Adolescente. São Paulo: Atlas, 2009.

DIAS, Adelaide Alves. Infância e direito à educação. In: BITTAR, Eduardo C. & TOSI, Giuseppe (Orgs.). Democracia e educação em direitos humanos numa época de insegurança. Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, 2008.

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DONNELLY, Jack. International human rights: a regime analysis, international organization, Massachuts Institute of Techonology, 40,3, p. 599-642, Summer, 1986.

ELIAS, Roberto João. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente. São Paulo: Saraiva, 1994.

FERREIRA, Windyz Brazão. Aprendendo sobre os direitos da criança e do adolescente com defi ciência: Guia de Orientação à Família, Escola e Comunidade. Rio de Janeiro: Walprint, 2003.

ISHIDA, Valter Kenji. A infração administrativa no Estatuto da Criança e do Adolescente. São Paulo: Atlas, 2009.

LAMENZA, Francismar. A proteção da criança e do adolescente portadores de defi ciência. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=1244#_ftn8)>. Acesso em: 04/08/2009

OLIVEIRA, Romualdo Portela (Org.). Organização do ensino no Brasil: níveis e modalidades na Constituição Federal e na LDB. 1.ed. São Paulo: Xamã, 2002.

PEREIRA, Tânia da Silva. O princípio do “melhor interesse da criança”: da teoria à prática. Disponível em: <http://www.gontijo-familia.adv.br/2008/artigos_pdf/Tania_da_Silva_Pereira/MelhorInteresse.pdf>. Acesso em: 04/08/2009

RANGEL & CRISTO. Breve Histórico dos Direitos da Criança e do Adolescente. Disponível em <http://www.pailegal.net/chicus.asp?rvTextoId=1099220789>. Acesso em: 04/08/2009.

RANGEL, Vicente Marotta. Direito e relações internacionais. 8.ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005.

RASI, Mauricio Sponton. Criança e adolescência: risco e proteção. Leme: BH Editora, 2008.

TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. Tratado de direito internacional dos direitos humanos. Porto Alegre: S. A. Fabris, 1997. v. 1.

UNICEF. A Convenção sobre os Direitos da Criança. Assembléia Geral nas Nações Unidas, 1989. Disponível em: <http://www.unicef.pt/artigo.php?mid=18101111&m=2)>. Acesso em: 04/08/2009.

VASCONCELOS, Hélio Xavier. In: CURY, Munir (Coord.). Estatuto da Criança e do Adolescente comentado: comentários jurídicos e sociais. 8. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2006.

Bibliografi a complementar:

BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. 9ª ed. Rio de Janeiro: Campus, 1992.

COMPARATO, Fábio Konder. A afi rmação histórica dos direitos humanos. IV edição. São Paulo: Saraiva, 2005.

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Lista de sites indicados:

http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=290&Itemid=816

http://www.dhnet.org.br/

www.direitoshumanos.usp.br

www.mec.gov.br

http://www.unicef.org/brazil/pt/

http://www.scslat.org/web/index.php

http://www.promenino.org.br/DireitoseDeveresnaEscola/tabid/173/Default.aspx?gclid=CNme35CCm6ECFQuB5QodGiqZRQ

http://www.portaldafamilia.org.br/datas/criancas/direitosdacrianca.shtml

www.direitosdacrianca.org.br/

http://www.culturabrasil.org/direitosdacrianca.htm

www.fundabrinq.org.br/

http://www.mds.gov.br/programas/rede-suas/protecao-social-especial/programa-de-erradicacao-do-trabalho-infantil-peti

www.direitonet.com.br/

http://www.canalkids.com.br/cidadania/direitos/crianca.htm

www.onu-brasil.org.br/documentos_direitoshumanos.php

www.safernet.org.br

www.presidencia.gov.br/sedh/

www.gddc.pt/direitos-humanos/.../universais.html

CORRAL, Benito Aláez. Nacionalidad, ciudadanía y democracia. A quién pertenece la constitución? Madrid: Tribunal Constitucional/Centro de Estúdios Políticos y Constitucionales, 2005.

MARSHALL, Thomas. & BOTTOMORE, Tom. Ciudadanía y clase social. 1ª ed. Buenos Aires: Losada, 2004. OLIVEIRA, Romualdo Portela de. O direito à educação na Constituição Federal de 1988 e seu restabelecimento pelo sistema de justiça. Revista Brasileira de Educação, nº 11, mai/jun/ago, 1999.

SANTOS, Boaventura de Sousa. (Org). A globalização e as ciências sociais. São Paulo: Cortez, 2002.

SARLET, Ingo Wolfgang. A efi cácia dos direitos fundamentais. 7. ed. rev. atual. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007.

Trilhas do Aprendente, Vol. 7 - Estágio Supervisionado em Magistério da Educação Infantil VI

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UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASILUNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA

CURSO DE PEDAGOGIA - MODALIDADE A DISTÂNCIAESTÁGIO SUPERVISIONADO EM MAGISTÉRIO DA EDUCAÇÃO INFANTIL VI

Professora-pesquisadora: Maria Creusa de Araújo Borges

DESEMPENHO NO PERCURSO

Aulas Desafi os Pontuação Desempenho obtido

Prazo de fi nalização

UNIDADE I

Aula 1 Resolução e postagem de desafi os 2,5 2ª semana

Aula 2 Resolução e postagem de desafi os 2,5 3ª semana

Aula 3 Fóruns e participação no MOODLE 2,5 4ª semana

Aula 4 Fóruns e participação no MOODLE 2,5 5ª semana

Total de pontos na Unidade I 10,0

UNIDADE II

Aula 5 Resolução e postagem de desafi os 2,5 7ª semana

Aula 6 Resolução e postagem de desafi os 2,5 8ª semana

Aula 7 Fóruns e participação no MOODLE 2,5 9ª semana

Aula 8 Fóruns e participação no MOODLE 2,5 10ª semana

Total de pontos na Unidade II 10,0

UNIDADE III

Aula 9 Resolução e postagem de desafi os 3,0 13ª semana

Aula 10 Resolução e postagem de desafi os 3,0 14ª semana

Aula 11 Fóruns e participação no MOODLE 2,0 15ª semana

Aula 12 Fóruns e participação no MOODLE 2,0 16ª semana

Total de pontos na Unidade III 10,0

Avaliação presencial (prova escrita) 10,0 Final doPercurso

TOTAL DE PONTOS OBTIDOS NO PERCURSO

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UNIDADE I

A GESTÃO DE PRÁTICAS PEDAGÓGICASCENTRADAS NA PROTEÇÃO INTEGRAL DA CRIANÇA

AULA 1: VISÕES SOBRE A CRIANÇA: BREVE EXPLANAÇÃO HISTÓRICA

Até o Século XVII, não era possível se falar de infância ou de uma concepção de criança. Somente a partir da Modernidade, a criança passou a ser considerada como um ser que precisava obedecer às normas da sociedade e, por essa razão, foram criadas as instituições assistenciais, com o fi m de educá-la na ordem moral e religiosa. Os Séculos XVIII e XIX foram protagonistas de grandes transformações na concepção de sociedade, de família, de escola e, consequentemente, de criança e de infância (DIAS, 2008).

No Século XIX, começou a se delinear um modelo universal de criança, assentado no papel que ela passou a assumir no interior da sociedade burguesa. Com a Revolução Industrial e a consequente necessidade de mão de obra, a criança passou a ser percebida como um ser que precisa de mais proteção e escolarização, para que pudesse exercer o seu papel na sociedade. Dessa forma,

com o processo de industrialização e a consequente necessidade de especialização da mão de obra, a criança, que antes possuía um papel produtivo direto, passa a ser percebida como um ser que necessita ser preparado e escolarizado para exercer seu papel na sociedade (DIAS, 2008, p. 211).

O intenso processo de industrialização, desencadeado a partir do Século XVIII, repercute na concepção de família e de criança. As mudanças advindas dessa re(organização) familiar e societal provocam a emergência de um novo sentido para os direitos da criança. As funções de cuidado e de assistência dos fi lhos foram, paulatinamente, sendo substituídas, quando as mulheres ingressaram no mundo do trabalho, e a questão da guarda e da educação das crianças ganhou destaque no debate político, na legislação e nas reformas escolares. Nesse sentido, Kuhlmann Jr. afi rma:

O fi nal do Século XIX e início do Século XX demarcaram um período em que a infância e sua educação integraram os discursos sobre a edifi cação dessa sociedade moderna. São parte do modelo geral referencial das instituições e das estruturas do estado para uma nação avançada, que se difunde no processo de transformação ocorrido (...) Os cuidados com a infância tornam-se um aspecto a ser considerado nesse modelo de nação moderna, com suas políticas sociais e instituições (KUHLMANN JR, apud DIAS, 2008 p. 213).

UNIDADE IIUNIDADE I UNIDADE III

Aula 1 Aula 2 Aula 3 Aula 4

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UNIDADE IIUNIDADE I UNIDADE III

Aula 1 Aula 2 Aula 3 Aula 4

Desde então, as formas de perceber a criança vêm assumindo novos contornos, e sua visibilidade social tem sido constantemente afi rmada. Intensifi cam-se estudos fundamentados na noção de criança, não mais como um ser indefeso ou incapaz, mas como sujeito ativo de sua aprendizagem, recolocada como sujeito de direitos e, consequentemente, o reconhecimento da educação como um direito da criança (DIAS, 2008).

Compreendida como um ser humano criativo e inteligente, a criança passa a ser valorizada pela sua singularidade, como categoria social e, mais ainda, a ser considerada, na sociedade, como cidadã, e, portanto, detentora de direitos e de deveres. Como explana Kramer,

crianças são sujeitos sociais e históricos, marcados, portanto, pelas contradições das sociedades em que estão inseridas. Crianças são cidadãs, pessoas detentoras de direitos, que produzem cultura e são nela produzidas (...) (KRAMER, apud DIAS, 2008, p. 215).

Com o advento da concepção de criança como sujeito de direitos, seus direitos e a preocupação social com a população infantil foram as principais conquistas do início do Século XX, cujo marco principal foi a promulgação, em 1959, da Declaração Universal dos Direitos da Criança, documento que resulta do trabalho legislativo da Organização das Nações Unidas (ONU).

A DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA

A inspiração de reconhecer proteção especial para as crianças não é nova. Em 1924, sob a égide da Liga das Nações, por intermédio da Constituição de Genebra, afi rma-se a necessidade de proporcionar à criança uma proteção especial, inaugurando-se uma nova fase de reconhecimento dos seus direitos, com a assunção de obrigações por parte dos Estados de elaborarem uma legislação específi ca, voltada para a proteção das crianças (RASI, 2008). A Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, afi rmava que “a maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistência especiais”.

Como resultado da visão da criança como sujeito de direitos, inspirada na Constituição de Genebra de 1924, e tendo como principal fundamento a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a Assembleia Geral das Nações Unidas proclama a Declaração dos Direitos da Criança, no dia 20 de novembro de 1959, por aprovação unânime. Por intermédio desse instrumento, constitui-se uma enumeração de direitos e liberdades a que faz jus toda e qualquer criança.

Integrando o movimento de especifi cação dos direitos humanos, cujo marco principal consiste na Declaração Universal de 1948, a Declaração dos Direitos da Criança, de 1959, signifi cou um marco histórico-legal na consagração da criança como sujeito de direitos e como um documento necessário à efetivação de seus direitos.

Apesar dos direitos e das garantias fundamentais afi rmados na Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, oponíveis a todos os cidadãos indistintamente, alvitrou-se, no entanto, que as condições especiais da criança exigiam uma declaração à parte. A Declaração dos Direitos da Criança, então, enuncia princípios e diretrizes que todos devem observar, incluindo os pais, as organizações voluntárias, as autoridades locais, os governos e a escola, no sentido de reconhecer e concretizar os direitos e as liberdades enunciados.

Trilhas do Aprendente, Vol. 7 - Estágio Supervisionado em Magistério da Educação Infantil VI

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Tal declaração trouxe visibilidade à criança como ser humano distinto de seus pais e da família, cujos interesses podem, inclusive, contrapor-se aos de seus genitores. Ou seja, a criança deixou de ser considerada extensão de sua família e passou a ter direitos próprios, oponíveis, inclusive, aos de seus pais ou aos de qualquer outra pessoa (RANGEL & CRISTO, s/d).

Redigida em 10 princípios, a Declaração afi rma os direitos da criança, com o objetivo de que lhe seja dada proteção especial e para que lhe sejam asseguradas oportunidades que permitam o seu desenvolvimento em condições de liberdade e dignidade. O dever de protegê-la foi posto mais especifi camente em seu Princípio 2º, nos seguintes termos:

A criança deve gozar de proteção especial, e a ela devem ser dadas oportunidades e facilidades, pela lei e outros meios, para permitir a ela o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social de um modo saudável e normal e em condições de liberdade e dignidade. Na edição de leis para esse propósito, o melhor interesse da criança deve ser a consideração superior.

Sua importância consiste no fato de ter sido a semente da construção fi losófi ca da Doutrina da Proteção Integral das Nações Unidas para a Infância, em que foi erigido o princípio norteador de todas as ações voltadas para a infância, em que a base para todas elas deveria ser o melhor interesse da criança. Dessa forma, o preâmbulo da Declaração de 1959 afi rma, prioritariamente, que “a criança, por motivo da sua falta de maturidade física e intelectual, tem necessidade de uma proteção e cuidados especiais, nomeadamente de proteção jurídica adequada, tanto antes como depois do nascimento”. E prossegue, afi rmando que à criança a humanidade deve prestar o melhor de seus esforços (DECLARAÇÃO, 1959). Trata-se do surgimento da semente que, posteriormente, iria ser consagrada como a Doutrina da Proteção Integral.

Tais princípios enumeram estes direitos: o direito a um nome e a uma nacionalidade, a partir do nascimento; o direito a gozar os benefícios da previdência social, inclusive alimentação, habitação, recreação e assistência médica adequadas; o direito a criar-se num ambiente de afeto e segurança e, sempre que possível, sob os cuidados e a responsabilidade dos pais; e o direito de todos à educação.

O Princípio 7 da Declaração, reafi rmando e aprofundando o direito à educação, determinando a sua gratuidade e o lazer infantil, dispõe:

A criança terá direito a receber educação, que será gratuita e compulsória pelo menos no grau primário. Ser-lhe-á propiciada uma educação capaz de promover a sua cultura geral e capacitá-la a, em condições de iguais oportunidades, desenvolver as suas aptidões, sua capacidade de emitir juízo e seu senso de responsabilidade moral e social, e a tornar-se um membro útil da sociedade.

Os melhores interesses da criança serão a diretriz a nortear os responsáveis pela sua educação e orientação; essa responsabilidade cabe, em primeiro lugar, aos pais.

A criança terá ampla oportunidade para brincar e divertir-se, visando os propósitos mesmos da sua educação; a sociedade e as autoridades públicas empenhar-se-ão em promover o gozo deste direito (DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA, 1959).

UNIDADE IIUNIDADE I UNIDADE III

Aula 1 Aula 2 Aula 3 Aula 4

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Ao dispor do direito à educação, conforme explicitado acima, algo importante a destacar é que a Declaração coloca o ensino escolar como meio para desenvolver aptidões, a capacidade de emitir juízo e o senso de responsabilidade moral e social, ou seja, assim como na Declaração Universal de Direitos Humanos, consagra uma educação voltada para a cidadania.

Outro ponto a ressaltar é que a Declaração coloca, primeiramente nos pais, a responsabilidade pela educação e orientação da criança, diferentemente dos instrumentos legais posteriores, tanto no plano internacional quanto local, conforme explanaremos adiante. A Declaração prescreve, ainda, que a diretriz norteadora dos responsáveis pela educação da criança será o seu melhor interesse.

Assim, ao tratar do direito à educação, a Declaração de 1959 coloca, como um dever das autoridades públicas e da sociedade, a garantia do direito da criança ao lazer e à diversão, visando aos propósitos da sua educação. Isso signifi ca que garantido está o direito a uma educação lúdica. A respeito dessa questão da ludicidade na educação como um direito, Muller expressa:

Entre os direitos fundamentais, não podemos deixar de reivindicar também que se cumpra a condição para a arte, a brincadeira, a diversão, o movimento, a oportunidade da criação em amplos níveis como fazendo parte do cotidiano infantil (MÜLLER, apud DIAS, 2008, p. 221).

Ao integrar o movimento de especifi cação dos direitos humanos do documento-símbolo de 1948 (a Declaração Universal dos Direitos Humanos), consagrando a criança como sujeito de direitos, a Declaração foi o fundamento de diversas outras leis, que vieram ampliar ainda mais a proteção integral da criança e o seu direito à educação, conforme explanaremos a seguir.

DA CONVENÇÃO DOS DIREITOS DA CRIANÇA

A consolidação da Doutrina da Proteção Integral efetiva-se na Convenção Interamericana de Direitos Humanos – Pacto de San José da Costa Rica, em 1969, cujo artigo 19 estabelece: “Toda criança tem o direito de proteção que sua condição de menor requerer, por parte da família, da sociedade e do Estado”.

Nesse caminho, em 1979, proclama-se o Ano Internacional da Criança. Tendo como fundamento a necessidade de se garantir uma proteção especial à criança, como foi enunciada pela Declaração dos Direitos da Criança de 1959 e pelo Pacto acima enunciado, foi promulgada, em 20 de novembro de 1989, a Convenção dos Direitos da Criança (CDC), documento normativo no qual a proteção integral dispensada à criança encontra suas raízes mais próximas.

A Convenção de 1989 enuncia um amplo conjunto de direitos fundamentais – os direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais – de todas as crianças, bem como as respectivas disposições para que sejam aplicados. Esse tratado internacional é um importante instrumento legal, não apenas por ser uma declaração de princípios gerais, mas devido ao seu caráter universal e vinculante que, quando ratifi cado, representa um vínculo jurídico para os Estados que a ela aderem, os quais devem adequar as normas de direito interno às da Convenção, para a promoção e a proteção efi caz dos direitos e das liberdades nela consagrados (UNICEF, 1989).

UNIDADE IIUNIDADE I UNIDADE III

Aula 1 Aula 2 Aula 3 Aula 4

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Na Convenção, pela primeira vez, a criança foi conceituada como <qualquer pessoa com menos de 18 anos de idade>. Esse documento proclama a proteção aos direitos da criança à sobrevivência e ao pleno desenvolvimento; à oferta do melhor padrão de saúde possível; a ter um nome, uma nacionalidade; a brincar; à proteção contra todas as formas de exploração; à educação da melhor qualidade, entre outros (DIAS, 2008). Como se observa, grande parte dos direitos elencados no referido documento foi fundamentada na Declaração dos Direitos da Criança de 1959, representando um instrumento de efetividade dos direitos da criança, já que tem força jurídica obrigatória para todos aqueles que pactuaram com o tratado.

A Convenção, especificamente em seu artigo 3º, representa um marco para o desenvolvimento histórico-legal dos direitos da criança, ao determinar, expressamente, que todas as ações relativas às crianças (conceituadas como menores de 18 anos) devem considerar, primordialmente, seu interesse superior, quer dizer, a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança consagrou a Doutrina da Proteção Integral. Dessa forma, a criança é reconhecida como sujeito de direitos, mas também vulnerável e hipossufi ciente, e o seu interesse superior deve ser considerado prioridade. Nesse sentido, assim dispõe o artigo 3º da Convenção:

Todas as ações relativas às crianças, levadas a efeito por instituições públicas ou privadas de bem-estar social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar, primordialmente, o interesse maior da criança.

Um desses direitos fundamentais, consagrados pela Convenção e que merece, de forma incontestável, proteção integral da família, da sociedade e do Estado, é o direito à educação. Os quatro pilares, sob os quais estão fundamentados todos os direitos da Convenção, também se aplicam ao direito à educação, quais sejam: a não discriminação; seu interesse superior; a sobrevivência e o desenvolvimento e sua opinião.

O direito à educação, embasado nos pilares acima expostos, é disciplinado pelo artigo 28 da CDC e impõe, como responsabilidade dos Estados Partes, o reconhecimento do direito da criança à educação, especialmente:

a) Tornar o ensino primário obrigatório e disponível gratuitamente para todos; b) estimular o desenvolvimento do ensino secundário em suas diferentes formas, inclusive o ensino geral e profi ssionalizante, tornando-o disponível e acessível a todas as crianças, e adotar medidas apropriadas tais como a implantação do ensino gratuito e a concessão de assistência fi nanceira em caso de necessidade; c) tornar o ensino superior acessível a todos, com base na capacidade e por todos os meios adequados; d) tornar a informação e a orientação educacionais e profi ssionais disponíveis e acessíveis a todas as crianças; e) adotar medidas para estimular a frequência regular às escolas e a redução do índice de evasão escolar (CONVENÇÃO, art. 28).

Existem as e s p e c i f i c i d a d e s nacionais quanto à faixa de idade a ser considerada na defi nição de uma pessoa como criança.

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Em relação ao direito à educação, previsto na Declaração de 1959, a Convenção apresenta novas dimensões e desafi os para o ensino. Primeiramente, confi rma que o ensino deverá ser obrigatório e gratuito para todos, o que nos leva a considerar a educação, ao mesmo tempo, um direito e um ônus, já que se torna indisponível para as crianças do ensino primário. Segundo, pela primeira vez, um instrumento legal trata do ensino secundário, fazendo menção ao geral e ao profi ssionalizante, em vigor ainda na década de 80, quando foi promulgada a Convenção. Terceiro, o tratado estabelece o acesso ao ensino superior baseado na capacidade, colocando também como direito das crianças o acesso à informação e à orientação educacionais. Por último, a Convenção demonstra uma preocupação acerca da frequência escolar e redução do índice de evasão, problemas recorrentes na rede pública de ensino.

No artigo 23 da Convenção dos Direitos da Criança, há uma grande conquista no que se refere ao direito à educação, ao fornecer os elementos legais para a elaboração de estratégias de inclusão e formas de garantir que todas as crianças, incluindo aquelas com defi ciência, tenham acesso à escolarização (FERREIRA, 2003). Como se observa, a consagração, no plano internacional, dos primeiros alicerces da Doutrina da Proteção Integral e do reconhecimento de inúmeros direitos à criança, consiste nos primeiros passos em direção ao reconhecimento do interesse da criança como prioridade.

Após a promulgação da Convenção, no ano de 1990, a ONU convocou uma reunião da Cúpula Mundial da Criança, que aconteceu na Tailândia. Entre as principais metas estabelecidas para o bem-estar da criança, no decênio seguinte, estavam: a garantia do desenvolvimento integral da criança; o apoio à família e a Escola para todos. Todo esse universo histórico internacional foi também recepcionado pela legislação interna brasileira, ao longo dos anos, com o objetivo de assegurar os direitos à criança.

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AULA 2: DO DIREITO À EDUCAÇÃO NO CENÁRIO INTERNACIONAL

Nos últimos anos, a temática referente ao direito à educação alcança centralidade no debate político internacional, com repercussões no âmbito interno dos Estados. O resultado desse debate é a proliferação de documentos normativos que realçam a centralidade da educação, em todas as etapas, na sociedade contemporânea, onde o conhecimento assume valor fundamental. A ampliação desse direito tem sido a tendência marcante no processo histórico de reconhecimento dos direitos humanos. No Brasil, presencia-se a ampliação desse direito no âmbito de reconhecimento da educação infantil como uma etapa necessária ao processo de escolarização das crianças. Essa etapa não pode mais ser entendida como um cuidado dissociado da formação pedagógica.

Considerando esses aspectos, é necessário compreender um dos documentos mais importantes no processo de afi rmação dos direitos humanos, sobretudo do direito à educação, o qual tem infl uenciado o debate internacional e local, para podermos repensar o planejamento da gestão das práticas pedagógicas na educação infantil.

A DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS

O movimento contemporâneo relativo aos direitos humanos toma impulso decisivo com a aprovação da Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), em 10 de dezembro de 1948, em Paris, pela Assembleia Geral das Nações Unidas. A partir desse documento, os países ocidentais, os aliados, vencedores da Segunda Grande Guerra, intitulados de <Nações Unidas>, estabelecem uma agenda, no cenário internacional, de reconhecimento e de proteção dos direitos humanos.

Por intermédio do trabalho legislativo da Organização das Nações Unidas (ONU), da atuação de seus diversos órgãos e das agências especializadas, os direitos humanos passam a ser objeto de preocupação internacional, cuja proteção é assumida como propósito das Nações Unidas.

Na condição de documento-símbolo, “(...) ponto de partida do processo de generalização da proteção internacional dos direitos humanos (...)” (TRINDADE, 1997, p. 28), padrão comum de reconhecimento e de proteção dos direitos humanos (ALVES, 2007), a Declaração representa o registro histórico, político e jurídico

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Fonte: <http://1.bp.blogspot.com/_h3tZ6zQA7Hc/R1kpZNF1vBI/AAAAAAAAAC0/6t0yu33qhL8/s400/Direito+%C3%A0+educa%C3%A7%C3%A3o.jpg>.

A DUDH foi adotada e proclamada pela Resolução 217A (III) da Assembleia Geral da ONU.

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da repulsa às violações aos direitos humanos cometidas por Estados totalitários no âmbito da Segunda Grande Guerra. Indica, portanto, a construção de uma nova ordem mundial, baseada em relações democráticas e pacífi cas entre os Estados. Essa ordem tem por fundamento a proteção dos direitos do ser humano.

Essa nova ordem se baseia, juridicamente, na Carta da ONU, um documento que estabelece os propósitos e as diretrizes de atuação das Nações Unidas no cenário internacional e consiste numa referência no processo de formulação dos instrumentos internacionais de proteção dos direitos humanos, que resultam tanto do trabalho legislativo das Nações Unidas quanto de outras organizações de caráter regional, como é o caso da Organização dos Estados Americanos (OEA). Esses instrumentos, de natureza e efeitos jurídicos variáveis, são infl uenciados pelos princípios assumidos na Carta, a qual é explicitada em vários <preâmbulos> de instrumentos internacionais de direitos humanos desde a aprovação da Declaração de 1948. Portanto, a compreensão da Declaração requer a sua articulação com os princípios, objeto e propósitos afi rmados na Carta das Nações Unidas.

Na Carta, não estão descritos e catalogados os direitos humanos, tarefa levada a cabo pelo comitê de redação, responsável pela elaboração da DUDH. Diante da lacuna presente nos dispositivos da Carta da ONU, em relação à defi nição dos direitos humanos a serem objetos de proteção, a Declaração passa a se constituir em fonte de interpretação dos dispositivos acerca dos direitos humanos afi rmados na Carta.

A escrita da Declaração envolveu o trabalho de vários órgãos, antes de sua submissão à Assembleia Geral. Assim, o Conselho Econômico e Social (ECOSOC) encaminhou a sua subseção, a Comissão de Direitos Humanos (CDH), sob a liderança de Eleanor Roosevelt, o trabalho de escrita de uma declaração internacional, pois o plano geral era de elaboração de uma Carta Internacional de Direitos Humanos, da qual a DUDH seria uma parte, considerada mais como uma declaração de princípios, no estilo de preâmbulo, complementada por disposições substantivas, constantes dos instrumentos obrigatórios, tais como o Pacto de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e o de Direitos Civis e Políticos, ambos de 1966.

A CDH encarregou o comitê de redação - composto por representantes de países como Austrália, China, Chile, Filipinas, França, Iugoslávia, Líbano, Reino Unido, a então União das Repúblicas Socialistas Soviéticas e Uruguai - de elaboração de um esboço da Declaração para ser submetido ao ECOSOC, que encaminhou a proposta à Assembleia Geral, órgão legislativo principal da ONU, onde cada membro tem direito a voto, com peso igual (ALVES, 2007).

No processo de escrita da Declaração, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) desempenhou papel relevante (TRINDADE, 1997; POOLE et al, 2007). Ao examinar os principais problemas teóricos relativos à formulação da Declaração, essa agência especializada da ONU explicitou questões referentes às relações entre liberdades individuais e responsabilidades coletivas, questões que perpassam a problemática dos direitos humanos na contemporaneidade e interferem no seu processo de reconhecimento.

A Declaração, elaborada em menos de dois anos, nas três primeiras sessões da CDH, foi aprovada na primeira sessão da Assembleia Geral a que foi submetida (a III Assembleia Geral

fonte: <http://pt.wiktionary.org/wiki/preâmbulo>.

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das Nações Unidas). Dos 58 Estados-membros, 48 votaram a favor, nenhum contra, oito se <abstiveram> e dois se ausentaram da ocasião (RANGEL, 2005). Portanto, a relevância desse documento não advém do quantitativo dos Estados que a aprovaram, mas, sobretudo, do fato de que representa a formulação jurídica da noção de direitos inerentes ao ser humano - afi rmada, mas não detalhada na Carta da ONU -, formulação alçada ao plano internacional a partir da aprovação da DUDH (TRINDADE, 1997). Na qualidade de “(...) primeira expressão dos direitos humanos de forma abrangente em escala internacional” (POOLE et al, 2007, p. 91), a DUDH, defi nitivamente, coloca o ser humano no cerne do debate político internacional,reconhecendo que a proteção dos direitos humanos se constitui em preocupação dos Estados, independentemente da condição desfrutada pelo ser humano (nacional ou estrangeiro; rico ou pobre).

Aprovada sob a forma de uma resolução não impositiva da Assembleia Geral, a Declaração não tem força vinculante. Contudo, na mesma lógica de Alves (2007), Poole et al (2007) reconhecem a existência de elementos coativos, tanto interna quanto externamente, na DUDH. No plano interno, distinguem-se, na Declaração, preâmbulo e artigos, muitos desses se constituindo em obrigações, a base dos artigos obrigatórios dos Pactos de 1966. Externamente, a DUDH consiste numa grande referência no cenário internacional, infl uenciando a produção normativa sobre a matéria, constituindo-se em referência explícita em diversos instrumentos internacionais que a sucedem.

A DUDH é um instrumento decisivo, ao servir como modelo e ponto de partida para o processo de generalização da proteção internacional relativa aos direitos humanos. É um processo de generalização marcado pela proteção do ser humano, não mais restrita a determinadas condições ou a setores delimitados, como no caso da proteção aos trabalhadores sob a égide das primeiras convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Nesse processo, presencia-se a proliferação de diversos tratados sobre a matéria, em que a DUDH se constitui numa referência explícita, sendo citada literalmente nos preâmbulos de diversas <convenções>.

A Declaração Universal afi gura-se, assim, como a fonte de inspiração e um ponto de irradiação e convergência dos instrumentos sobre direitos humanos em níveis tanto global quanto regional. Esse fenômeno vem a sugerir que os instrumentos globais e regionais sobre direitos humanos, inspirados e derivados de fonte comum, se complementam (...) (idem, p.43).

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Convención relativa a la lucha contra las discriminaciones en la esfera de la enseñanza (1960); Convención Internacional sobre la Eliminación de todas las Formas de Discriminación Racial (1965); Pacto Internacional de Derechos Económicos, Sociales y Culturales (1966); Pacto Internacional de Derechos Civiles y Políticos (1966); Convención Internacional sobre la Represión y el Castigo del Crimen de Apartheid (1973); Convención sobre la Eliminación de todas las Formas de Discriminación contra la Mujer (1979); Convención sobre los Derechos del Niño (1989).

Abstenções da África do Sul, Arábia Saudita, Bielorrússia, Iugoslávia, Polônia, Tchecos lováqu ia , Ucrânia e União Soviética.

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Portanto, o valor jurídico da DUDH não pode ser minimizado. A interação interpretativa entre a Declaração e a Carta da ONU e outros instrumentos constitutivos de organizações internacionais e de base convencional, além de sua incorporação nos ordenamentos jurídicos estatais, indica a posição de destaque da DUDH no sistema normativo internacional e no nacional relativo aos direitos humanos.

Nesse âmbito, os direitos humanos, afi rmados na Declaração, são objetos de várias propostas de classifi cação. Uma delas é a sugerida por Donnelly (1986), que a classifi ca em: direitos pessoais, direitos judiciais, liberdades civis, direitos de subsistência, direitos econômicos, direitos sociais e culturais e direitos políticos.

Integram os direitos pessoais (arts. 2º a 7º e 15): o direito à vida; à nacionalidade; ao reconhecimento da personalidade jurídica, à igualdade de proteção perante a lei, à proteção contra tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes, à proteção contra a discriminação racial, étnica, sexual ou religiosa (idem).

Os direitos judiciais (arts. 8º a 12) referem-se: ao acesso a remédios por violações de direitos reconhecidos em lei, à presunção da inocência, à garantia de um processo público, imparcial, dirigido por um tribunal competente e independente, à irretroatividade das leis penais, à proteção contra prisões ou exílios arbitrários, à proteção contra ingerências na privacidade, na família, no domicílio, na correspondência e na reputação (idem).

As liberdades civis (art. 13 e arts. 18 a 20) são estas: liberdade de circular livremente no território de um Estado, de pensamento, de consciência, de religião, de reunião e associação pacífi cas (idem).

Os direitos de subsistência (art. 25) são os referentes à alimentação, a um padrão de vida adequado, à saúde e ao bem-estar próprio e da família (idem).

Integram os direitos econômicos (arts. 22 a 26): o direito ao trabalho, com remuneração equitativa e condições adequadas, à associação sindical, ao descanso e ao lazer (idem). Nessa classifi cação, o autor exclui o direito à propriedade, regulado no artigo 17 da Declaração Universal.

Os direitos sociais e culturais (arts. 26 a 28) são constituídos pelos direitos à educação, à participação livre na vida cultural da comunidade e nos resultados do progresso científi co (idem).

Os direitos políticos (art. 21): à participação livre no governo, por intermédio de representantes eleitos, ao acesso, em condições de igualdade e às funções públicas (idem).

Os direitos humanos, reconhecidos na Declaração, ainda podem ser relacionados em dois grupos: os direitos civis e os políticos (arts. 3º a 21) e os direitos econômicos, sociais e culturais (arts. 22 a 28) (ALVES, 2007). Essa categorização é largamente utilizada na doutrina e na jurisprudência internacionais de direitos humanos.

Distinguem-se, na DUDH, o preâmbulo, em que se encontram as motivações políticas - base da Declaração -, e trinta artigos, nos quais são objetos de regulação os direitos civis, os políticos, os econômicos, os sociais e os culturais. Adota-se a concepção de que todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos (DUDH, art. 1º), e os direitos humanos consistem em direito de todos, sem distinção alguma (idem, art. 2º).

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Em relação à ‘educação’, trata-se de uma matéria discutida, inicialmente, no preâmbulo. Nessa parte, destaca-se que “el desconocimiento y el menosprecio de los derechos humanos han originado actos de barbarie ultrajantes para la conciencia de la humanidad” (idem, Preâmbulo). O texto também faz referência, <mais uma vez> , às atrocidades cometidas com os seres humanos no contexto da Segunda Grande Guerra, às violações dos direitos humanos e à ausência de conhecimento sobre esses direitos. A Declaração, portanto, confere à educação um papel relevante na construção de uma nova ordem internacional, pautada no respeito aos direitos humanos. Assim, exige um trabalho educativo voltado para a conscientização sobre os direitos do ser humano, para evitar que haja outros atos de barbárie, tais como aqueles ocorridos no supracitado confl ito mundial.

Reconhece-se, no preâmbulo da Declaração, que “una concepción común de estos derechos y libertades (...)” (DUDH) assume relevância fundamental para que os Estados, em cooperação com as Nações Unidas, cumpram com o compromisso de assegurar o respeito universal e efetivo aos direitos humanos. Assim, o conhecimento e a conscientização sobre os direitos humanos são colocados, reiteradamente, como uma forma de prevenção de novas violações a eles.

Com base nessa compreensão, a Assembleia Geral da ONU proclama a DUDH, como um ideal comum, uma fonte de inspiração para que as nações promovam, por intermédio do ensino e da educação, o respeito a esses direitos (idem). A noção de ensino remete às atividades realizadas na escola, no âmbito formal. Por sua vez, a educação, compreendida como uma prática social, que se realiza além do espaço escolar, abrange as práticas culturais, os movimentos sociais, o trabalho, entre <outras>.

No ordenamento jurídico nacional brasileiro, a concepção de que a educação é um direito de todos, é reiterada:

A educação, direito de todos e dever do Estado e da <família>, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualifi cação para o trabalho (CF/88, art. 205).

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Na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 9.394/96, em seu artigo 1º, afi rma-se uma concepção ampla de educação, compreendida como uma prática social que extrapola os ‘muros’ da escola, não obstante a referida Lei regular as práticas que se desenvolvem, predominantemente, em espaços escolares.

Na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96), essa relação se inverte, e a educação passa a se constituir, primeiramente, em dever da família (art. 2º).

A primeira referência explícita encontra-se na Carta das Nações Unidas.

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Não obstante a afi rmação da concepção de educação como um direito de todos, reconhece-se, de forma restrita, o princípio da gratuidade. Esse princípio deve nortear toda a educação, mas se estabelece que essa gratuidade deve ser concretizada pelo menos na instrução elementar e na fundamental. No ordenamento jurídico nacional, há uma especifi cidade. A gratuidade é reconhecida como um princípio, de hierarquia constitucional, que deve nortear toda a educação pública. Consiste, como afi rma o Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, em parecer de 2008, em núcleo axiológico do sistema de ensino brasileiro. Portanto, não se restringe a uma etapa da educação, devendo estar presente na educação básica e na superior.É o que se afi rma na CF, art. 206, IV: “O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: (...) IV- gratuidade do ensino público nos estabelecimentos ofi ciais (...)”.

A afi rmação da obrigatoriedade é enfática na Declaração de 1948, quando se refere à instrução elementar. No caso brasileiro, essa obrigatoriedade incide no ensino fundamental, que deve ser obrigatório e gratuito (CF, art. 208, I). O acesso ao ensino obrigatório e gratuito constitui direito público subjetivo, e o seu não oferecimento ou sua oferta irregular por parte do Estado implica responsabilidade da autoridade competente (idem, art. 208, 1º e 2º).

O ensino profi ssionalizante, na DUDH, deverá ser generalizado. No Brasil, essa modalidade de ensino não é contemplada no art. 208 da CF, artigo que regula o dever do Estado em relação à educação. Na LDB/96, Capítulo III, é feita referência à educação profi ssional, que deve ser oferecida de forma integrada às diferentes formas de educação e visa ao desenvolvimento de aptidões para a vida produtiva (art. 39).

Na DUDH, o acesso aos estudos superiores é possibilitado, de forma igual, a todos, orientando-se pelo mérito individual. Na CF/88, o acesso aos níveis mais elevados de ensino pauta-se na capacidade individual. Reitera-se a concepção de educação superior como um direito de todos, cujo acesso depende da capacidade do indivíduo. Assim, a responsabilidade do Estado de garantir o acesso aos estudos superiores é retirada e passada para o indivíduo.

A Declaração traz, também, os objetivos da educação, que deverá promover o desenvolvimento da personalidade humana e, tendo por referência os propósitos das Nações Unidas, deve fortalecer o respeito aos direitos humanos e colaborar com as atividades da ONU em prol da manutenção da paz. Aos pais cabe a escolha do tipo de educação para os seus fi lhos, e a família torna-se a responsável por participar do processo educativo.

Percebe-se que o reconhecimento do direito à educação na DUDH se dá de forma ampla, abarcando várias etapas e níveis de educação. Entretanto, esse reconhecimento não ocorre de maneira igual, pois se restringe à garantia desse direito aos níveis elementares, deixando a responsabilidade de acesso aos níveis superiores para o indivíduo, com base no critério da capacidade.

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A educação, nesse documento, assume papel fundamental no desenvolvimento dos propósitos das Nações Unidas: promoção do respeito aos direitos humanos, por meio de um trabalho educativo de conhecimento e de conscientização; atividades em prol da manutenção da paz e da segurança internacionais, por intermédio, inclusive, da cooperação de caráter científi co e educacional, liderada pela UNESCO.

Na DUDH, a afi rmação do direito à educação, mesmo não se constituindo em obrigações de caráter convencional para os Estados, infl uencia, como visto, a regulação desse direito nos ordenamentos jurídicos nacionais. Questões referentes à gratuidade e à obrigatoriedade, colocadas na Declaração, repercutem na confi guração do dever do Estado em matéria educacional. No Brasil, não obstante a obrigatoriedade se restringir ao nível do ensino fundamental, como na DUDH, o princípio da gratuidade constitui a referência fundamental do sistema de ensino, abarcando todas as etapas do percurso educacional em estabelecimentos ofi ciais.

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AULA 3: PANORAMA NACIONAL: A DOUTRINA DO DIREITO PENAL DO MENOR E O CÓDIGO DE MENORES

O Direito da Criança e do Adolescente, conhecido, inicialmente, como Direito do Menor, passou por três fases marcantes: a doutrina do Direito Penal, concentrada nos Códigos Penais de 1830 e 1890; a doutrina jurídica da situação irregular, aplicada no Código de Menores; e a doutrina da proteção integral, que passou a vigorar a partir da década de 80, consubstanciada na Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente.

A Doutrina do Direito Penal do Menor, concentrada nos Códigos Penais de 1830 e 1890, preocupou-se, especialmente, com a delinquência, baseando a imputabilidade no discernimento do menor. Ou seja, a imputação da responsabilidade ao menor ocorria em função de seu entendimento quanto à prática de um ato criminoso. Ao Juiz era atribuída a competência para determinar se o jovem era ou não capaz de dolo, considerando, para isso, sua vida pregressa, seu modo de pensar e sua linguagem, pois não se justifi cava basear-se, apenas, numa razão, obrigando-o, assim, a pesquisar o conjunto dos elementos informadores.

No início da República, iniciam-se os primeiros passos sobre a normatização do direito da infância e da juventude. Dessa forma, a primeira legislação sobre a matéria ocorreu com a Lei n. 4.242, de 1921, que autorizava o governo a organizar o serviço de assistência e proteção à infância. Em seguida, os Decretos nº 16.272 e 16.273, de 1923, instituíram o primeiro juizado de menores. E nesse sentido, o Decreto 17.943-A, de 12 de outubro de 1927, consolidou toda a legislação promulgada até o momento, denominando-se Código de Menores, também conhecido por Código Mello Matos (ISHIDA, 2009).

Essa legislação, que antecede o Estatuto da Criança e do Adolescente, tem um caráter discriminatório, que associa pobreza à “delinquência”, e encobria as reais causas das difi culdades vividas por esse público, tais como a desigualdade de renda e a falta de alternativas de vida. Havia a ideia de que os mais pobres tinham um comportamento desviante e certa “tendência natural à desordem”, por isso não podiam se adaptar à vida em sociedade. Os meninos e as meninas que pertenciam a esse segmento da população, considerados “carentes, infratores ou abandonados”, eram, na verdade, vítimas da falta de proteção.

A doutrina da situação irregular, que vigorava no Código de Menores, revelava uma situação trágica:

Veja o texto completo em: <http://www.g o n t i j o - f a m i l i a .a d v . b r / 2 0 0 8 /art igos_pdf/Tania_da_S i l va_Pere i ra /MelhorInteresse.pdf>.

Veja mais em: <http://www.redeandibrasil.org.br/eca/sobre-o-eca/o-antigo-codigo-de-menores>.

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Os “menores” eram sempre objeto de alguma política pública, mas nunca eram verdadeiramente objetos de direitos, e, por tal razão, supondo o Estado ser o melhor para a sociedade e também para o menor, priorizava as privações de liberdade, ora em internatos, ora em instituições totalmente despreparadas para o atendimento daquele “menor”, o qual passava a ser tratado como uma “coisa” e denominado “menor delinquente abandonado” (RASI, 2008, p. 79).

Um dos grandes problemas da doutrina da situação irregular era que o menor era visto como objeto de compaixão e de repressão, e toda a preocupação era voltada para os “delinquentes” que estavam nas instituições e nos internatos e que eram vistos como carentes, infratores, abandonados, e todos aqueles que não se encontravam em situação irregular não precisavam de proteção, conforme preconizava o Código de Menores. A dimensão preventiva não era prioridade, interessando-se a repressão e a intervenção direta do Estado-Juiz. As instituições eram vistas como um meio inibitório para evitar o crescimento de delitos infanto-juvenis, e o magistrado poderia determinar indistintamente a internação, desde o menor carente ao infrator (RASI, 2008).

Essa formulação de modelos de atendimento não signifi cava a diminuição da pobreza ou de seus efeitos. Nesse sentido, a assistência destinada aos menores estava longe de concorrer para a mudança nas condições concretas de vida da criança, constituindo-se muito mais em uma estratégia de criminalização e medicalização da pobreza (ARANTES, 1999).

Em 1979, foi instituído um novo Código de Menores, por meio da Lei nº 6.697, de 10 de dezembro de 1979, o qual não representou, em si, mudanças expressivas, mas trouxe pressupostos e características que colocaram as crianças e os jovens pobres como elementos de ameaça à ordem vigente (idem). O novo Código passou a dispor sobre a assistência ao menor de 18 anos e, excepcionalmente, os maiores de 18 e menores de 21 anos, nos casos expressos em lei. As medidas supressoras da liberdade poderiam ser impostas independentemente da prática de ato infracional. O Código atuava no sentido de reprimir, corrigir e integrar os supostos desviantes de instituições como FUNABEM, FEBEM e FEEM, valendo-se dos velhos modelos correcionais (ALVES, apud ISHIDA, 2009). Importante afi rmação faz Arantes (1999, p. 258) acerca desse Novo Código de Menores, ao dispor que

(...) todas as crianças e jovens tidos como em perigo ou perigosos (por exemplo: abandonado, carente, infrator, apresentando conduta dita anti-social, defi ciência ou doente, ocioso, perambulante) eram passíveis, em um momento ou outro, de serem enviados às instituições de recolhimento. Na prática, isto signifi ca que o Estado podia, através do Juiz de Menor, destituir determinados pais do pátrio poder através da decretação de sentença de “situação irregular do menor”. Sendo a “carência” uma das hipóteses de “situação irregular”, podemos ter uma idéia do que isto podia representar em um país onde já se estimou em 36 milhões o número de crianças pobres.

Diante da perversidade de tais práticas nas instituições, bem como da inefi cácia de seus resultados, houve, nos segmentos das sociedades, ao longo dos anos, indignações éticas e políticas, principalmente no que se refere aos direitos humanos. Nesse cenário, a legislação pátria do menor foi, paulatinamente, sofrendo infl uência da doutrina propagada pela Organização das Nações Unidas, através de suas declarações e convenções referentes à infância, que passaram

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a enfocar a criança e o adolescente como sujeitos de direitos e não, apenas, como objetos de proteção, como explanado acima.

A CONSTITUIÇÃO DE 1988 E O ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

Conforme posto anteriormente, a sociedade brasileira, durante muitos anos, colocou as crianças e os adolescentes em polo de dominação dos adultos, tratando-os como “coisas” ou “objetos”, desrespeitando seus direitos fundamentais e submetendo-os a tratamentos desumanos, sob a justifi cativa de corrigi-los. Porém, marcada pelas diretrizes internacionais em relação aos direitos das crianças e dos adolescentes, a legislação brasileira foi se transformando no sentido de reconhecer a criança como sujeito de direitos, adotando a doutrina de proteção integral como expoente dessa nova fase.

Dentro desse panorama, o primeiro marco do ordenamento jurídico pátrio, nesse sentido, foi a aprovação, em 1988, da Constituição Federal, conhecida como <Constituição Cidadã>.

O texto constitucional de 1988 representou um grande avanço no campo de normatização de direitos e garantias fundamentais, resultado do processo de democratização do Estado de Direito.

Em decorrência da Carta Magna de 1988 é que se reconheceram a criança e o adolescente como titulares de interesses juridicamente protegidos. Assim, passaram a ser sujeitos de direitos relacionados ao desenvolvimento saudável e de garantias atinentes à sua integridade. Esse novo panorama surge em contraposição ao modelo do antigo Código de Menores, onde havia uma legislação assistencialista voltada ao menor infrator (ISHIDA, 2009).

Quando se faz a leitura da Constituição Brasileira, especialmente do artigo 227, compreende-se o desejo do legislador de criar um novo modelo de Justiça e de atendimento voltados para as crianças e os adolescentes brasileiros, respeitando os fundamentos do Estado democrático de Direito, especialmente a cidadania e a dignidade do ser humano (SAUERBRONN apud RASI, 2008, p. 29).

A Constituição foi minuciosa na previsão de direitos e situações subjetivas de vantagens para crianças e adolescentes, estendendo, no artigo 227, uma série de garantias e normas tutelares de proteção que, se efetivadas, trariam uma nova perspectiva de construção de uma sociedade menos violenta (RASI, 2008). O referido artigo consagra a Doutrina de Proteção Integral no âmbito nacional, assim dispondo:

Fonte: www.afogadosdaingazeira.pe.gov.br

Disponível em: <www.p l a n a l t o . g o v . b r /ccivil_03/Constituicao/Constituicao htm>.

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É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à Criança e ao Adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profi ssionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-la a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, art. 227, grifo nosso).

Pela primeira vez, na história da realidade brasileira, a Constituição Federal de 1988 traz a criança como prioridade absoluta e trata da sua proteção sob esse prisma, como responsabilidade da família, da sociedade e do Estado. Portanto, o apoio e a proteção à infância e à juventude devem fi gurar, obrigatoriamente, entre as prioridades dos governantes, cabendo ainda à família e à sociedade igual responsabilidade pela execução dos direitos fi xados no dispositivo constitucional mencionado (RASI, 2008).

Antes da promulgação da Constituição de 1988, era garantida às crianças e aos adolescentes apenas uma proteção relativa, já que o Código de Menores, atualmente revogado, restringia-se a garantir os direitos dos menores delinquentes e infratores. Com o advento da Magna Carta de 1988 e, posteriormente, do Estatuto da Criança e do Adolescente, ao ser consagrada a doutrina de proteção integral, colocou-se em prática o preceito de que as leis internas e todo o sistema nacional devem satisfazer às necessidades de todas as crianças e adolescentes, incluindo não só o aspecto penal, como na legislação anterior, mas todos os direitos fundamentais do ser humano, tais como o direito à vida, à liberdade, à educação, ao lazer, à saúde, à profi ssionalização, além de diversos outros, tendo como fi m precípuo a busca do melhor interesse da criança.

Tendo como fundamento tais preceitos constitucionais, visando ampliar a proteção aos direitos da criança, o Brasil sanciona a Lei n. 8069/90, que institui o <Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA> que substituiu o anterior Código de Menores. Importante observação faz Ishida (2009, p. 08), ao afi rmar que

O Estatuto da Criança e do Adolescente contrapõe-se à lógica do Direito do Menor, representado pelo anterior Código de Menores, que se baseia na concepção de que crianças e adolescentes são meros objetos de intervenção do mundo adulto e da teoria da situação irregular, baseado na situação de patologia social, na ausência de rigor procedimental, com desprezo às garantias relacionadas ao princípio do contraditório e o elevado grau de discricionariedade da autoridade judiciária.

O ECA ratifi ca o que o constituinte prescreveu, estabelecendo, em seu art. 1º, a doutrina de proteção integral, como diretriz única e principal no atendimento de crianças e adolescentes, rompendo defi nitivamente com a doutrina da situação irregular, presente no antigo Código de Menores (Lei 6.697/79) (CURY, 2006).

Oportuna observação faz Luciano Mendes de Almeida a respeito da importância dessa doutrina para o Brasil, qual seja:

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Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8069.htm>.

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O Estatuto tem por objetivo a proteção integral da criança e do adolescente, de tal forma que cada brasileiro que nasce possa ter assegurado seu pleno desenvolvimento, desde as exigências físicas até o aprimoramento moral e religioso. Esse estatuto será semente de transformação do País. Sua aplicação signifi ca o compromisso de que, quanto antes, não deverá haver mais no Brasil vidas ceifadas no seio materno, crianças sem afeto, abandonadas, desnutridas, perdidas pelas ruas, gravemente lesadas em sua saúde e educação (ALMEIDA, 2006, p. 17).

Esse conjunto de normas relativas à criança e ao adolescente é formado por inúmeros dispositivos, que contêm proteção de direitos coletivos e individuais da infância e da juventude. Incluem-se, entre esses interesses, o direito à vida, à saúde, à educação, à cultura, ao lazer, à dignidade, à convivência familiar e comunitária, entre outros. Nesse sentido, o artigo 3º do Estatuto dispõe:

A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata essa Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fi m de lhes facultar o desenvolvimento físico e mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade.

Numa explanação acerca do referido artigo, Coelho (2006, p. 35) esclarece:

O art. 3º do Estatuto inicia por proclamar a abrangência dos direitos fundamentais da pessoa humana à criança e ao adolescente, vinculados à “proteção integral”, para a qual destina-se a própria lei (...). Reafi rma os direitos e cuida de que tenham, no caso da criança e do adolescente, uma aplicação ajustada à condição de pessoa em desenvolvimento.

O Estatuto é um importante instrumento na efetivação dos direitos da criança e do adolescente e no reconhecimento dela como sujeito de direitos, posto que representa um complemento da Constituição Cidadã de 1988. O ECA defi ne criança como qualquer pessoa entre 0 e 12 anos de idade, e adolescente, a pessoa entre 12 e 18 anos, colocando os seus interesses como absoluta prioridade, como consagra o artigo 4º:

É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profi ssionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária (ECA, art. 4, grifo nosso).

Como se observa, a doutrina de proteção integral é a fonte inspiradora do Estatuto. Essa lei, fundamentada tanto na Declaração dos Direitos da Criança, proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, quanto na Convenção Internacional de 1990, dos quais o Brasil é signatário, preconiza a garantia aos direitos fundamentais das crianças e dos adolescentes.

A adoção da referida Doutrina no ECA representou um grande avanço para o Brasil, já que o enfoque de proteção integral à criança e ao adolescente, com responsabilidade jurídica e

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social, supera em muitos aspectos o anterior Código de Menores, em que a condição de “menor infrator” levava-o a ser enxergado como um objeto, alguém que deveria sofrer a intervenção do poder estatal e, na maioria das vezes, era recomendável sua segregação dos laços sociais e afetivos (RASI, 2008).

Se, antes, a proteção do Governo era destinada ao menor que fosse infrator ou delinquente, a vigência do ECA trouxe afastamento da doutrina da situação irregular, que compreendia como objeto de atenção apenas as crianças e os adolescentes em situação irregular, quer dizer, aqueles em confl ito com a lei ou privados de assistência (DEL CAMPO; OLIVEIRA, 2008). A partir do Estatuto, essa proteção integral se tornou universal para todas as crianças e adolescentes, indistintamente. Essa proteção é destinada também aos direitos relativos à criança, como ocorre com o direito à educação.

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AULA 4: O DIREITO À EDUCAÇÃO CONSAGRADO PELO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

No tocante à garantia do direito das crianças à educação, o Estatuto assegura uma educação voltada para o pleno desenvolvimento da pessoa, tornando clara a prática para a cidadania e a capacitação para o trabalho. Nesse sentido, o artigo 53 dispõe:

Art. 53. A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualifi cação para o trabalho, assegurando-se-lhes: I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; II - direito de ser respeitado por seus educadores; III - direito de contestar critérios avaliativos, podendo recorrer às instâncias escolares superiores; IV - direito de organização e participação em entidades estudantis; V - acesso à escola pública e gratuita próxima de sua residência. Parágrafo único. É direito dos pais ou responsáveis ter ciência do processo pedagógico, bem como participar da defi nição das propostas educacionais.

Como se observa, ao garantir o direito à educação, o Estatuto coloca, prioritariamente, o pleno desenvolvimento do educando como pessoa, em segundo lugar, o preparo para o exercício da cidadania e, por último, a qualifi cação para o trabalho. Nesse mesmo sentido, a <Lei nº 9394/96, de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, LDB>, em seu art. 22, acrescenta, como fi nalidades da educação básica, uma educação voltada para a cidadania, para o trabalho e para o prosseguimento em estudos posteriores, quando assim dispõe:

A educação básica tem por fi nalidades desenvolver o educando, assegurar-lhe a formação comum indispensável para o exercício da cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores (BRASIL, 1996, art. 22).

Fonte: <http://www.cutceara.org.br/images/conteudo/%7B1C882EAA-7182-4285-9CB9-BF48AF207C90%7D_EDUCAO.JPG>.

Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/l9394.htm>.

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Acerca do tema, Costa faz esta importante afi rmação:

Essa hierarquia estabelece o primado da pessoa sobre as exigências relativas à vida cívica e ao mundo do trabalho, reafi rmando o princípio basilar de que a lei foi feita para o homem e não o contrário. Isto signifi ca que a pessoa é fi nalidade maior, devendo as esferas da política e da produção levarem em conta esse fato na estruturação e no funcionamento de suas organizações (COSTA, 2006, p. 194).

Além de efetivar o valor do desenvolvimento da pessoa como prioridade sobre o exercício da cidadania e sua qualifi cação para o trabalho, os cinco incisos em que se desdobra o artigo ora analisado asseguram direitos de “acesso e permanência na escola”, o de “ser respeitado por seus educadores”, de poder “contestar critérios avaliativos”, “direito de organização e participação em entidades estudantis” e o “acesso a escola pública e gratuita”.

Assegurando tais direitos, o Estatuto objetiva que todas as crianças brasileiras tenham acesso a uma escola pública gratuita, de boa qualidade, e que seja realmente aberta e democrática, capaz, portanto, de preparar o educando para o pleno e completo exercício da cidadania (VASCONCELOS, 2006).

Importante destacar, ainda, que, no inciso I, o artigo garante não apenas a igualdade de acesso à escola, mas também de permanecer nela. A luta pela permanência na escola é hoje o grande desafi o do sistema educacional. É imprescindível, pois, que todos os que se engajam nesse combate saibam que esse direito está juridicamente tutelado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. Resumindo, pois, o artigo 53, é ele que traz as conquistas básicas do estado democrático de direito em favor da infância para o interior da instituição escolar (COSTA, ibid, 2006).

O direito à educação ainda está assegurado no artigo 54, onde é posto o dever do Estado no que concerne à educação. O dispositivo tem sete incisos e três parágrafos, que guardam inteira simetria com a Constituição Federal, ampliando o seu signifi cado. O inciso I, que representa uma inovação, garante o ensino fundamental obrigatório e gratuito para todos, indistintamente, inclusive aqueles que não tiveram acesso na idade própria, fazendo desaparecer toda e qualquer discriminação em relação àqueles que não estão na faixa etária adequada (VASCONCELOS, ibid, 2006).

Assim como na Convenção dos Direitos da Criança, explanado anteriormente, o ECA também garante, através do referido artigo, o atendimento educacional especializado, preferencialmente, na rede regular de ensino, aos portadores de defi ciência, efetivando, mais uma vez, uma escola inclusiva, onde desapareça toda forma de preconceito e discriminação por qualquer motivo.

Outro avanço para a educação brasileira também está posto no referido artigo, em seu inciso VII, em que prevê a existência de programas suplementares para suprir as necessidades dos alunos das camadas populares para que permaneçam na escola, como material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde. Isso signifi ca que o Estado tem o dever de proporcionar todo o suporte didático que seja necessário para o bom desempenho dos alunos.

Todos esses serviços estabelecidos pela Constituição brasileira fazem parte dos deveres do Estado relativos à garantia do direito à educação, uma vez que, para grande parcela dos alunos,

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esses serviços são essenciais à frequência e à permanência na escola. É preciso realmente entender a garantia desses serviços auxiliares como constitutivos do próprio direito à educação ou a exclusão escolar continuará a ser gerada por fatores econômicos (OLIVEIRA, 2002).

Como se observa, no âmbito da proteção aos direitos fundamentais dada pelo Estatuto, o direito à educação foi especialmente assegurado e disciplinado. Tal direito humano, consagrado pelo ECA como de natureza obrigatória, tem a peculiaridade de ser indispensável, o que demonstra o valor que a ele foi atribuído para o desenvolvimento pleno da criança.

Apesar do longo caminho que ainda precisa ser percorrido para efetivar o direito da criança à educação, que vai desde a ampliação do acesso e passa pela permanência e pela oferta de uma educação de qualidade, é possível afi rmar que o Estatuto representou, no plano nacional, um grande avanço para o País, no que se refere à proteção dos direitos da criança, e expressa, claramente, que o apoio e a proteção à infância e à juventude devem fi gurar, obrigatoriamente, como prioridade do Poder Público, e estender também essa responsabilidade à família, à comunidade e à sociedade em geral. Tal exigência constitucional demonstra o reconhecimento da necessidade de ser destinado um cuidado especial às pessoas que, devido à sua fragilidade natural, correm maiores riscos. Ou seja, a criança passou da condição de objeto, de dominação dos adultos, para ser prioridade das políticas públicas e de toda a população de um modo geral.

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A PROTEÇÃO INTEGRAL DA CRIANÇA

AULA 5: DOUTRINA DA PROTEÇÃO INTEGRAL: CONCEITO E CARACTERÍSTICAS

O Estatuto da Criança e do Adolescente tem por objetivo proteger integralmente a criança e o adolescente, de forma que, desde o seu nascimento, possam ter assegurado o seu pleno desenvolvimento, desde as exigências físicas até o aprimoramento moral (ALMEIDA, 2006). Segundo Ishida (2009, p. 07), pode-se conceituar proteção integral

(...) como um sistema em que crianças e adolescentes fi guram como titulares de interesses subordinantes frente à família, à sociedade e ao Estado. Signifi ca a imposição de obrigações aos mesmos entes, colocando a criança e o adolescente como sujeitos ativos das relações jurídicas.

A Doutrina ora comentada tem como fundamento a defesa da dignidade do ser humano criança, concebido como sujeito de direitos civis, sociais e coletivos e, nas palavras de Castro,

afi rma o valor intrínseco da criança como ser humano; a necessidade de especial respeito à sua condição de pessoa em desenvolvimento; o valor prospectivo da infância e da juventude, como portadores da continuidade do seu povo, da sua família e da espécie humana e o reconhecimento da sua vulnerabilidade, o que torna as crianças e os adolescentes merecedores de proteção integral por parte da família, da sociedade e do Estado, o qual deverá atuar por meio de políticas específi cas para o atendimento, a promoção e a defesa dos seus direitos (CASTRO, apud, RANGEL & CRISTO, s/d).

Para Tânia da Silva Pereira, a vigência da Doutrina de Proteção Integral consagra a ideia de que “a população infanto-juvenil, em qualquer situação, deve ser protegida, e seus direitos,

Fonte: <www.cidadedosaber.org.br/.../2009/07/eca.gif>.

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garantidos, além de terem reconhecidas prerrogativas idênticas às dos adultos”, isto é, a principal característica da Doutrina consagrada pelo Estatuto é reconhecer crianças e adolescentes como sujeitos de direitos, os quais têm a seu favor uma proteção jurídica adequada, caso esses direitos não sejam efetivados.

Ainda nesse sentido, Roberto João Elias (1994) manifesta-se acerca do que seria essa Proteção Integral, afi rmando que é “(...) aquela que abranja todas as necessidades de um ser humano para o pleno desenvolvimento de sua personalidade”. Ou seja, através da Doutrina de Proteção Integral, que se baseia no princípio do melhor interesse da criança, o Estado tem o dever de garantir todas as necessidades da pessoa em desenvolvimento (de até 18 anos de idade), com o objetivo de garantir o seu desenvolvimento em todas as áreas, seja ela física, mental, espiritual ou social, conforme dispõe o art 3º do Estatuto.

Na fase da infância até a adolescência, é quando se estrutura a personalidade e a defi nição do que o ser humano será por toda a vida. Também é durante esse período que ocorre o desenvolvimento físico da criança e do adolescente, e o bem-estar da criança depende da estrutura que se constrói durante essa fase. Sendo assim, com o atendimento integral dos direitos desses indivíduos, garante-se a passagem para a vida adulta com um mínimo de qualidade de vida, eliminando-se todos os riscos para a esfera física e psíquica, que os envolve em estágio de desenvolvimento (LAMENZA, 2008). Rangel e Cristo (s/d) fazem uma importante observação quando afi rmam:

Proteção integral porque, ao reconhecer, amparada em dados biológicos, psicológicos e sociais, a infância como uma fase específi ca da vida humana e a condição peculiar da criança como pessoa em desenvolvimento, ainda não apta a se auto determinar e manter, sustenta a imprescindibilidade de se assegurar a essa população cuidados e proteção especiais, diferenciadas, em virtude dessas diferenças, dessas peculiaridades

Para que esses interesses da infância e da juventude sejam plenamente efetivados, o ECA adotou o Princípio da Cooperação, cujo ponto principal é estabelecido pelo artigo 18 do Estatuto, dispondo que “é dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor”.

Nesse contexto, o trinômio família-sociedade-Estado apresenta-se como decisivo para a implementação e o respeito aos direitos da criança e do adolescente, sem que haja a exclusão de um deles quando da atuação do outro. Mas, por outro lado, com a colaboração de todos, somam-se esforços para o alcance de uma vida satisfatória para as crianças e os adolescentes. Se do ponto de vista fi losófi co, é construída uma visão solidária a respeito dessa parceria, do ponto de vista legal, deve haver plena responsabilidade dos três atores no plano de atendimento das necessidades infanto-juvenis (LAMENZA, 2008). Discorrendo a respeito desse princípio da cooperação, o autor afi rma que

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não apenas a família é responsável, com a atribuição inicial dos valores fundamentais a respeito do bem agir no meio comunitário. Temos a obrigação concorrente por parte do Estado, na condição de ente com poder superior, que atuará sempre que houver necessidade, e da sociedade, na qualidade de agente cooperativo, e todos com o objetivo comum de propiciar aos infantes e jovens um ambiente sadio e livre de riscos de toda espécie.

É importante destacar que família é toda entidade familiar derivada do matrimônio, da união estável e de qualquer núcleo formado por qualquer dos pais e os fi lhos (art. 226, CF). Sociedade, por sua vez, é o conjunto de pessoas físicas ou jurídicas. O Estado, como ordem jurídica soberana, tem por fi nalidade o bem comum de um povo situado em determinado território (ISHIDA, 2009). Nesse sentido, deve haver todo um encaminhamento da atividade estatal, através da consecução de políticas públicas, para que seja garantida à criança e ao adolescente uma proteção da forma mais ampla possível.

Portanto, dentro do conceito de proteção integral, é preciso considerar todas as iniciativas por parte da família, da sociedade e do próprio Estado, no sentido de garantir à criança e ao adolescente um ambiente propício a seu regular e peculiar desenvolvimento. Lamenza (2008) considera que

o paradigma da proteção integral dos infantes e jovens é estabelecido numa tomada de atitudes positivas, amplas e irrestritas por todos os envolvidos nesse processo ligado intimamente à vida das crianças e dos adolescentes, de modo que não se excluam quaisquer gestos tendentes a assegurar seus direitos fundamentais.

Convém enfatizar que essas atitudes não se limitam a uma forma positivista, mas vão além do texto legal do Estatuto, ao assegurar à criança e ao adolescente, “por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades”. Ou seja, além da lei, destacam-se também outras iniciativas, desde que sejam compatíveis com os ideais de moralidade e de ética, em favor das crianças e dos adolescentes. A proteção a que se refere o Estatuto da Criança e do Adolescente é aquela total, sem limitação no campo da ação nos parâmetros éticos, do ponto de vista lógico-formal (ibidem, 2008).

Em relação à proteção integral aos interesses infanto-juvenis, o artigo 6º do ECA apresenta-se como imprescindível na compreensão de que os direitos das crianças e dos adolescentes não se encontram restritos ao Estatuto, já que o referido artigo dispõe que,

na interpretação desta Lei, levar-se-ão em conta os fi ns sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento.

Dito de outra forma, para o cumprimento das metas estabelecidas pela Lei nº 8069/90, no que se refere à proteção integral, devemos fazer uma leitura cuidadosa desse conjunto de normas, de modo que não se aja sob a ótica meramente formalista. Se determinado direito da criança e do adolescente não estiver porventura previsto na legislação (vista de um modo global, não se restringindo apenas ao Estatuto da Criança e do Adolescente), isto não servirá de óbice para o atendimento das necessidades infanto-juvenis (ibidem, 2008).

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Nessa perspectiva, uma das dimensões da doutrina de proteção integral é atender a todos os interesses necessários ao desenvolvimento da criança e do adolescente, mesmo se alguns desses interesses não estiverem claramente descritos no ECA.

Não basta que se proceda à população infanto-juvenil apenas visando a uma boa ação por parte da sociedade, de boa conduta ou de caridade comunitária. A proteção a que se refere o ECA é aquela total, sem limitação no campo da ação nos parâmetros éticos do ponto de vista lógico-formal (LAMENZA, 2008).

Justifi ca-se a inteira tutela dos direitos das crianças e dos adolescentes, pelo fato de serem pessoas em peculiar estágio de desenvolvimento, que estão crescendo para enfrentar todas as difi culdades que o mundo impõe e, portanto, necessitam de um meio circundante que lhes propicie elementos sufi cientes para que direitos básicos como vida, saúde, convivência sócio-familiar e educação lhes sejam garantidos na integralidade (ibidem, 2008). Assim, a grande razão e justifi cativa da Doutrina de Proteção Integral,

(...) reside na necessidade de garantir a petizes e jovens todos os direitos fundamentais que lhes são inerentes enquanto pessoas em condição peculiar de desenvolvimento, removendo-se todos os obstáculos que eventualmente surjam no caminho vital que estão a trilhar, mediante a adoção de medidas (nas órbitas comunitária, administrativa, judicial etc.) para a defesa intransigente de seus interesses.

Portanto, a Doutrina da Proteção Integral compreende todas as ações voltadas para a criança, dispensadas pela família, pela sociedade e pelo Estado, no sentido de lhes proporcionar um desenvolvimento seguro e sadio, tendo como princípio o melhor interesse da criança.

DO DIREITO À EDUCAÇÃO NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

A CF/88 constitui um avanço em relação à introdução de instrumentos jurídicos voltados para a efetivação do direito à educação pública e gratuita. Quanto à possibilidade de se exigir concretamente esse direito, na Carta Magna brasileira, são introduzidos mecanismos que podem ser acionados no processo de cobrança judicial, quando negada pelo Estado a garantia do direito à educação.

No dispositivo legal em tela, o direito à educação é declarado de forma mais precisa e detalhada, priorizando, como enfatiza Oliveira (1999), os outros direitos sociais <(art. 6º/CF/88)>. No <art. 205>, do mesmo dispositivo legal, a educação é defi nida como dever do Estado e da família . No art. 208, é especifi cada a efetivação, por

“Art. 6º - São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.” “Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualifi cação para o trabalho”. Na lei específi ca da educação, Lei de Diretrizes e Bases, LDB nº 9.394/96, há uma inversão, pois o dever da família vem antes do dever do Estado.

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parte do Estado, do direito à educação, por intermédio de algumas garantias. Há, também, a enumeração de metas e objetivos a ser alcançados (incisos I ao VII, incluindo os parágrafos 1º e 2º). No parágrafo primeiro, o acesso ao ensino obrigatório e gratuito é considerado como um direito público subjetivo; no parágrafo 2º, é regulada a responsabilidade do Poder público, no caso do não oferecimento do ensino obrigatório pela autoridade competente. O ensino considerado obrigatório e gratuito é o fundamental <(art. 208, I)>. Por sua vez, o acesso à educação superior baseia-se na capacidade de cada um <(art. 208, V, CF/88)>, reafi rmando-se o princípio contido na Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 (art. 26, I).

A educação, como um direito de todos, que poderá ser cobrado judicialmente, importando a responsabilidade do Poder Público, somente abarca o ensino fundamental, pois esse é o único nível de ensino considerado obrigatório a ser garantido pelo Estado. O ensino médio é tratado como um nível ainda a ser universalizado, de forma progressiva, e o acesso à educação superior depende da capacidade individual.

E, por fi m, os direitos humanos, no plano normativo internacional, são tratados como direitos universais, universalidade compreendida em relação a três aspectos: titularidade, aspecto temporal e cultural. A titularidade diz respeito ao fato de que os direitos humanos devem ser titularizados por todos os seres humanos, sem distinções de qualquer natureza. Além de se referirem ao ser humano, sem discriminações, os direitos humanos devem permear todas as culturas, e o fator cultural não pode ser alegado para obstaculizar o gozo desses direitos, não obstante a justifi cativa cultural ser utilizada para desencadear possíveis violações de direitos humanos.

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“I – ensino fundamental obrigatório e gratuito, assegurada, inclusive, sua oferta gratuita para todos os que a ele não tiveram acesso na idade própria.” “V- acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um.”

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AULA 6: CIDADANIA E EDUCAÇÃO: UMA ARTICULAÇÃO NECESSÁRIA

Compreender o papel da educação na promoção da cidadania requer, primeiramente, o exame de algumas concepções desse termo. Parte-se do pressuposto de que a cidadania não é efetivada sem a ocorrência de processos formativos próprios da educação formal, da educação infantil à educação superior. Para isso, a ação do Estado consiste numa ação fundamental no sentido de concretizar o direito à educação na perspectiva de formar para a cidadania, que consiste numa das fi nalidades da educação, explicitadas na CF/88, art. 205:

A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualifi cação para o trabalho.

A cidadania é uma condição que possibilita ao indivíduo participar plenamente da sociedade. Não se restringe, portanto, à participação política, que envolve os aspectos sociais, econômicos e culturais (CORRAL, 2006; MARSHALL & BOTTOMORE, 2004). Isso signifi ca dizer que somente a existência da garantia legal de participação do indivíduo nos processos eleitorais de uma sociedade não é sufi ciente para a efetivação da cidadania, visto que ela se encontra “(...) asociada con el concepto de membresía plena de una comunidad (...)” (MARSHALL & BOTTOMORE, op. cit., p. 19).

A condição do indivíduo de se integrar à sociedade como membro pleno signifi ca “(...) la pretensión de poder compartir la herencia social (...)”MARSHALL & BOTTOMORE, op. cit., p. 19), sem a qual a integração do indivíduo fi ca limitada à questão política e, nesse sentido, a educação fi caria restrita à preparação do cidadão, apenas, para votar. Essa preparação é imprescindível, pois a capacidade de votar, de maneira consciente, requer uma formação educacional voltada para a construção dessa capacidade, mas essa preparação não garante a inserção plena do indivíduo como cidadão, a qual se articula aos aspectos socioeconômicos e culturais.

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Los derechos civiles daban poderes legales cuyo uso se veía drásticamente reducido por el prejuicio de clase y la falta de oportunidad económica. Los derechos políticos daban poder potencial cuyo ejercício demandaba experiência, organización y un cambio de ideas en cuanto a las funciones apropriadas del gobierno (MARSHALL & BOTTOMORE, op. cit., p. 52).

Percebe-se, portanto, que a concepção de cidadania aqui defendida requer a integração plena do indivíduo na sociedade. Nessa perspectiva, a educação, como um direito social, ganha relevância, assumindo papel de destaque, no sentido de formar sujeitos críticos e conscientes de sua condição social e econômica, promovendo a sua inserção como membros plenos de uma sociedade.

A integração plena dos indivíduos na sociedade, no que concerne aos aspectos sociais, econômicos, políticos e culturais ou, como afi rma Corral (op. cit.), nas distintas esferas de comunicação social, requer, também, a recepção das expectativas individuais no ordenamento jurídico estatal, por intermédio dos direitos humanos fundamentais, que “(...) constityuen los mecanismos a través de los cuales el ordenamiento jurídico articula la participación del individuo en las diversas esferas de comunicación social, esto es, a través de los cuales esse se convierte en mayor o menor grado en ciudadano” (CORRAL, op. cit., p. 196).

Quanto maior o nível de complexidade social, as aspirações individuais de participação nas diferentes esferas de comunicação social serão elevadas e variáveis, fazendo-se necessária a construção de distintos níveis de cidadania contemplados pelo próprio ordenamento jurídico estatal. Assim, “(...) el individuo pertenece a la comunidad política en la medida en que el ordenamiento lo integra como sujeto, y no como mero objeto, de los procesos de comunicación social jurídicamente reglados (político, social, econômico, cultural, etc ...)” (CORRAL, op. cit., p. 199).

Nessa perspectiva, a cidadania independe da condição de nacionalidade do indivíduo, pois indica sua plena participação nos aspectos social, econômico, político e cultural de uma sociedade, o que requer a ocorrência de processos educacionais formais para favorecer essa participação. Assim, todos os integrantes de um Estado, nacionais ou estrangeiros, exerceriam a condição de cidadão, pois estariam submetidos ao mesmo ordenamento jurídico, que lhes daria a possibilidade, por intermédio dos direitos fundamentais, de usufruir da cidadania.

En la democracia contemporânea todos los ciudadanos son activos, lo que sucede es que lo son en distinto grado y en distintas esferas. Así, también menores, incapaces y otros grupos de personas privadas del ejercicio del derecho de sufragio participan en diversos âmbitos sociales y políticos (...) (CORRAL, op. cit., p. 219).

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TEXTO COMPLEMENTAR Processos de globalização e cidadania: questões para o debate

Profa. Dra. Maria Creusa de Araújo Borges

Com a intensifi cação dos processos de globalização (SANTOS, 2002), novas questões são colocadas em relação à condição de cidadania, demandando novas respostas, sobretudo, do ponto de vista educacional. Assim, problemas relativos às migrações, às diferenças de gênero, à diversidade étnica e cultural tocam na questão do exercício da cidadania e da necessidade de uma formação educacional com vistas ao favorecimento dessa condição.

Um dos relevantes problemas, de repercussão global, tem sido a questão das migrações e da necessidade de se integrarem os migrantes na sociedade na qual residem. Entretanto, a condição de cidadania tem sido negada com base em critérios excludentes ligados à nacionalidade. Como a cidadania constitui uma condição para o exercício de certos direitos fundamentais, o indivíduo, excluído dessa condição, fi ca à margem da sociedade, não participando, como membro pleno, das distintas esferas de comunicação social enfatizadas por Corral (2006).

Nesse contexto, a educação, como um direito fundamental de natureza social, assume relevância no sentido de construção de uma sociedade mais inclusiva, habilitando os indivíduos a participarem da vida em sociedade, nos aspectos políticos, sociais, econômicos e culturais.

Primeiramente, o exercício dos direitos civis e políticos só alcança plenitude se realizado por indivíduos capacitados a exercerem tais direitos. A simples existência legal desses direitos não garante o seu pleno exercício. A educação se insere nessa problemática, no sentido de formar os indivíduos para o exercício consciente dos direitos civis e políticos.

Segundo, a restrição da condição de cidadania ao exercício dos direitos civis e políticos, sem a garantia dos direitos sociais e econômicos, fere o princípio da dignidade humana. Esta não se efetiva sem a presença de um mínimo de condições sociais (educação, saúde, trabalho, entre outras). Restringir, portanto, a cidadania, apenas, aos elementos civis e políticos não garante a efetivação do princípio constitucional da dignidade humana (art. 1º, III, CF/88).

Por fi m, a efetivação da condição de cidadania requer uma ação positiva por parte do Estado. Este, por intermédio da implantação de políticas públicas, principalmente, voltadas para a promoção da educação formal, contribui para a consolidação da condição da cidadania.

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Nessa perspectiva, as crianças, mesmo não integrando a faixa de idade legal para votar, podem se constituir como cidadãs, pois se entende que a cidadania diz respeito à condição de ser membro pleno de uma sociedade em diferentes graus. Assim, a educação formal cumpre papel preponderante na perspectiva de formar os indivíduos para a cidadania, como uma condição que favorece sua integração e participação plena na sociedade. Essa integração e participação requerem uma formação que se baseie, sobretudo, em três aspectos, a saber: desenvolvimento da personalidade, formação para a cidadania stricto sensu e qualifi cação para o trabalho (art. 205, CF/88), aspectos facilitadores da integração e da participação ativa do indivíduo na sociedade.

É importante ressaltar a necessidade de se considerar a cidadania não, apenas, pelo ângulo dos direitos, mas como uma condição voltada para os direitos e os deveres. Como membros plenos de uma sociedade, os indivíduos assumem deveres em relação à organização social e política, em que os atos do cidadão “(...) estén inspirados en un vivo sentido de la responsabilidad hacia el bienestar de la comunidad” (MARSHALL & BOTTOMORE, op. cit., p. 73). A obrigação pessoal em relação à sociedade é, pois, constituinte da condição da cidadania. A educação, nesse sentido, volta-se para a formação de atitudes e de valores necessários à construção de vínculos entre o cidadão e a sociedade.

Trilhas do Aprendente, Vol. 7 - Estágio Supervisionado em Magistério da Educação Infantil VI

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AULA 7: PROMOÇÃO DA CIDADANIA NA EDUCAÇÃO INFANTIL: UMA ARTICULAÇÃO ENTRE DIREITOS E DEVERES

A concepção contemporânea de cidadania é pensada na perspectiva de articulação entre direitos e deveres. Não podemos pensar que cidadão é aquela pessoa que usufrui de certos direitos, muitas das vezes restritos ao exercício dos direitos civis e políticos. Os direitos civis e políticos são muito importantes – não esqueçamos a luta dos negros em prol do reconhecimento de sua personalidade, de serem considerados como pessoas, e não, como uma mercadoria, avaliada e vendida no mercado lucrativo do tráfi co negreiro em tempos de latifúndio de cana-de-açúcar e de exploração da cultura cafeeira no Brasil, da Colônia ao Império. O direito a um nome e a sua proteção jurídica; a luta das mulheres pelo direito à participação política, na escolha dos governantes brasileiros; a luta pela escola pública, especialmente, pela inclusão dos pobres e das mulheres no processo educacional escolar, entre tantos direitos.

Entretanto, ao lado desses direitos, devemos ressaltar a necessidade de considerarmos os deveres correlatos. Para que a cidadania se constitua de forma plena, faz-se necessária a promoção dos direitos individuais, sociais, políticos, econômicos e culturais, juntamente com a formação dos indivíduos, na perspectiva de se construírem condutas, valores e crenças que ressaltem a dimensão do dever que cada um deverá assumir em relação à sociedade.

Vamos, então, analisar tais deveres:

1. Deveres perante a sociedade

As pessoas têm o dever de conviver com as demais. Não estamos isolados no mundo, precisamos dos outros para viver e completar/enriquecer as nossas vidas. Já dizia o fi lósofo Aristóteles, na Antiguidade Clássica, que o homem é um animal político, isto é, um ser da polis, da cidade, do espaço público. E para vivermos nesse espaço mais amplo, que é a cidade, precisamos estabelecer relações com outras pessoas, considerar os pontos de vista dos nossos pares na perspectiva de tornar as nossas vidas melhores. O sociólogo Durkheim falava de uma solidariedade orgânica, que se efetiva eminentemente por intermédio do trabalho, considerado, por excelência, uma prática social que une/fortifi ca os laços entre os seres humanos.

O desenvolvimento da personalidade humana, uma das fi nalidades da educação básica, segundo a LDB nº 9.394/96, enriquece-se por intermédio do estabelecimento de relações com os

Sobre uma concepção de cidadania,

consulte o Trilhas do Apredente v. 6,

Componente Curricular Seminários Temáticos de Prática Curricular V, e assista à videoaula

“Descobrindo a cidadania infantil”,

também, da professora Melissa

Gusmão.Fonte:<http://www.canalkids.com.br/cidadania/genteboa/imagens/cidadania2.gif>.

403

outros. Basta nos lembrarmos da criança, ser em desenvolvimento e foco da prática da educação infantil, a qual necessita ser socializada para que se efetive, sem problemas, o desenvolvimento de sua personalidade. Tanto a socialização primária, construída no meio familiar, quanto a secundária, tendo a escola como agente principal, são fundamentais para o desenvolvimento integral da criança.

2. Deveres com os fi lhos e os pais

Os pais assumem deveres em relação a seus fi lhos, tais como o cuidado, a formação de atitudes e valores condizentes com uma vida digna em sociedade e a educação escolar obrigatória. Constitui dever do Estado fazer a chamada pública da matrícula na rede ofi cial de ensino, ao passo que cabe aos pais ou responsáveis o dever de matricular as crianças em idade escolar obrigatória e zelar pela sua frequência à escola. Os pais têm o dever primordial de cuidar das crianças, zelar pela sua alimentação e higiene, bem como protegê-las de possíveis agressões. Entretanto, percebemos que existem muitos casos de negligência e abandono de crianças pequenas, que terminam indo a óbito pela ausência desse cuidado. A escola, nesse caso, assume, também, papel primordial: promover o desenvolvimento integral da criança, protegendo a sua personalidade e construindo práticas preventivas que minimizem possíveis abusos. Por sua vez, a escola assume o papel de formar seres humanos capazes de retribuir e cuidar dos seus pais na ocasião em que eles precisem, dispensando o cuidado e a atenção necessários. Casos de abandonos de idosos também são constantes. A mídia noticia, cotidianamente, tais abandonos, e muitos chegam a falecer. Assim, a formação de atitudes e de valores que fortaleçam o vínculo familiar constitui uma das tarefas da educação escolar.

3. Deveres de instrução

Todas as pessoas devem ter acesso à educação escolar, pelo menos no nível obrigatório. No Brasil, essa obrigatoriedade incide sobre o ensino fundamental, do primeiro ao nono ano, na idade escolar dos seis aos quatorze anos. Assim, cabe ao Estado garantir o ensino fundamental, e à família, zelar pela frequência das crianças à escola, podendo ambos ser responsabilizados legalmente pelo não cumprimento desse dever.

4. Dever de sufrágio

A participação política, sobretudo em relação à escolha dos governantes de nossa sociedade, constitui um dever de todas as pessoas que almejam se constituir como cidadãs. Para isso, precisam estar aptas a participar, de maneira consciente e crítica, como também se habilitar para tal por intermédio do registro na condição de eleitor. Entretanto, somente o registro não garante a participação como um cidadão pleno. É necessário saber escolher o governo de uma sociedade. A educação, portanto, assume o papel de conscientizar criticamente os futuros eleitores, trabalhando na construção da cidadania desde a educação infantil.

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O texto integral desta Declaração pode ser encontrado no site: <www.dhnet.org.br/direitos/sip/oea/oeadel.htm>.

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5. Dever de obediência à lei

Toda pessoa, independentemente de condição econômica, política, cultural e social, tem o dever de respeitar a Lei maior de um país e outros mandamentos legais, elaborados por intermédio de um processo legítimo e participativo. Não deve, também, infringir as leis do país em que se encontrar. A educação, nesse aspecto, assume a tarefa de formar as crianças e jovens na perspectiva da construção de condutas adequadas à convivência em sociedade, e uma delas consiste no reconhecimento das leis legítimas de um país como um instrumento que pode favorecer a segurança e a paz social.

6. Dever de servir à comunidade e à nação

Toda pessoa, satisfeitas as devidas habilitações, tem o dever de prestar os serviços civis e militares que a pátria exigir para a sua segurança e manutenção. Nos casos de calamidade pública, prestar os serviços necessários na medida de suas possibilidades. Da mesma maneira, tem o dever de exercer os cargos políticos para os quais foi eleita no Estado em que for nacional. A educação, nessa seara, deve promover atitudes cívicas, formando seres humanos solidários e responsáveis, incrementando, assim, os vínculos sociais.

7. Deveres de assistência e previdência sociais

Toda pessoa tem o dever de cooperar com o Estado e com a coletividade na assistência e na previdência sociais, na medida de suas possibilidades e de acordo com as circunstâncias. No mesmo sentido, a educação assume a tarefa de formar atitudes e valores que fortaleçam os vínculos sociais.

8. Dever de pagar os impostos

Toda pessoa tem o dever de pagar os impostos necessários à manutenção dos serviços públicos, bem como aqueles imprescindíveis ao desenvolvimento social e econômico sustentável. A obrigação de pagar impostos deve se basear no princípio da legalidade, segundo o qual o imposto só pode ser criado pela lei. A educação escolar assume a tarefa de informar os alunos sobre o papel dos impostos na prestação dos serviços públicos e de desenvolver atitudes de fi scalização da aplicação desses impostos.

9. Dever de trabalhar

Toda pessoa tem o dever de trabalhar, dentro de suas capacidades e possibilidades, a fi m de obter os recursos necessários a sua sobrevivência ou em benefício da coletividade. A qualifi cação para o trabalho consiste numa das fi nalidades da educação escolar, ao lado do desenvolvimento pleno da pessoa e do preparo para o exercício da cidadania, tanto na educação básica quanto na superior.

Os deveres trabalhados nesta aula baseiam-se na Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, aprovada na Nona Conferência Internacional Americana, em Bogotá, 1948.

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AULA 8: O PLENO DESENVOLVIMENTO DA PESSOA

Após a análise de uma das fi nalidades da educação básica – a formação para o exercício da cidadania, esta última pensada na perspectiva da articulação entre direitos e deveres –, passa-se ao estudo do desenvolvimento pleno da pessoa, como ser humano, como o cerne da educação. De fato, em todas as etapas do processo educacional escolar, a pessoa constitui o centro da prática pedagógica, que deve ser voltada para o seu pleno desenvolvimento.

Vários documentos internacionais sobre direitos humanos afi rmam o desenvolvimento pleno da pessoa como uma das fi nalidades da educação. Por exemplo, na Declaração Universal dos <Direitos Humanos> (1948), o ser humano constitui o sujeito dos direitos humanos, e o princípio da dignidade humana é a referência fundamental dos direitos humanos. Assim, o ser humano adquire valor substancial.

Nesse documento, é realçado, ainda, o valor do ser humano, que deverá ser protegido de atos de barbárie – uma referência às atrocidades cometidas por Estados no contexto da <Segunda Guerra Mundial>. Assim, afi rma-se a centralidade da proteção dos direitos humanos como paradigma para a construção de relações amistosas entre os povos, tendo por base o valor e a dignidade humana. Nesse propósito, a educação, sobretudo a escolar, assume a tarefa de promover, por intermédio do conhecimento e da conscientização, o respeito aos direitos do ser humano.

São reconhecidas a liberdade e a igualdade de todas as pessoas em relação ao exercício dos direitos humanos, <sem discriminações de qualquer natureza>, baseadas em raça, cor, sexo, idioma, religião, opinião política ou qualquer outra condição (art. 2º, 1). Nessa perspectiva, a educação escolar deve favorecer o pleno desenvolvimento da pessoa, independentemente de sua condição social, política ou econômica, contribuindo para a superação de relações discriminatórias ou de qualquer outro tipo de violência que, frequentemente, aparece sob a forma de violência simbólica. Esta, por ser dotada de sutileza, torna-se mais efi caz na produção da distinção social.

Fonte: <http://1.bp.blogspot.com/_zftZPJb3sdU/RnVkfg3n4HI/AAAAAAAAAB0/APHA9ZWpmvE/s400/imagen_pedagogia.jpg>.

Sobre os atos de barbárie supracitados, assistir aos fi lmes Olga e A Lista de Shindler.

Na Constituição Federal brasileira de 1988, afi rma-se a igualdade de todos perante a lei, sem distinções de qualquer natureza, e homens e mulheres são reconhecidos como pessoas iguais em direitos e obrigações (art. 5º).

Sobre a Declaração Universal dos Direitos Humanos, consultar o componete curricular Estágio Supervisionado em Magistério da Educação Infantil II, Trilhas do Aprendente vol. 3, elaborado pela professora Maria Creusa Borges.

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Assim, um dos princípios que norteiam a educação escolar é a não discriminação. Ao promover o respeito aos direitos humanos, tendo a pessoa como valor fundamental nas relações sociais, a educação escolar contribui para a superação de preconceitos, crenças e valores que distinguem e separam as pessoas, unicamente, pela sua condição.

Na LDB/1996, a educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como uma de suas fi nalidades o desenvolvimento integral da criança (0 a 5 anos), nos aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade (art. 29, atualizado com a publicação da Lei de Ampliação do Ensino Fundamental para nove anos).

Várias situações relatadas pela mídia demonstram a ausência de respeito ao ser humano criança. Os castigos engendrados, as posturas adotadas pelo docente, a não consideração dos interesses da criança realçam atitudes discriminatórias e a compreensão da criança como um objeto. A adoção dessa postura por parte do educador vai de encontro, portanto, ao entendimento de que a criança constitui um sujeito de direitos e deveres em desenvolvimento.

Como estimular esse desenvolvimento? Quais situações de ensino e de aprendizagem podem favorecer o desenvolvimento pleno da criança? Quais práticas pedagógicas realçam a criança como pessoa, um sujeito dos processos de aprendizagem?

Não esqueçamos, também, as crianças com defi ciência. Vários documentos enfatizam que as pessoas com defi ciência detêm direitos e deveres em relação aos outros. Como incrementar a inclusão dessas pessoas na escola e na sociedade como um todo?

Esses questionamentos nos direcionam para uma refl exão importante: à escola cabe um papel fundamental na formação da criança como uma pessoa, um cidadão e um trabalhador qualifi cado, produtivo e consciente de seus direitos e deveres. Surge, assim, a necessidade de se pensarem práticas pedagógicas comprometidas com a formação integral da criança, voltadas para o seu pleno desenvolvimento, seu preparo para o exercício da cidadania e a formação para o trabalho, fi nalidades da educação enunciadas na Constituição Federal de 1988 (art. 205) e LDB/1996 (arts. 22 e 29). Nesse sentido, a universidade assume a tarefa primordial de formar profi ssionais qualifi cados para o enfrentamento desses desafi os contemporâneos.

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A GESTÃO DA PRÁTICA PEDAGÓGICANA EDUCAÇÃO INFANTIL

Nesta unidade, será focalizada a gestão das práticas pedagógicas na educação infantil. Elabora-se uma proposta de trabalho voltada para crianças de 0 a 5 anos, fundamentada em projetos didáticos. Primeiramente, justifi ca-se a opção por essa proposta. Em seguida, são citados projetos didáticos que têm por referência os temas trabalhados nos Estágios Supervisionados das Trilhas do Aprendente. Espera-se, assim, a efetivação de uma proposta de Estágio baseada na articulação entre teoria e prática.

AULA 9: TRABALHANDO COM PROJETOS DIDÁTICOS

Os projetos didáticos constituem instrumentos efi cazes para a gestão da prática pedagógica na educação infantil, pelos motivos abaixo enumerados:

1. Centram-se numa concepção de prática pedagógica apoiada na <interdisciplinaridade>, permitindo, assim, a apreensão de conhecimentos de maneira articulada e contextualizada, em que conceitos e noções são utilizados por vários campos científi cos. Dessa forma, possibilita-se à criança, desde cedo, uma refl exão mais ampla, crítica e situada.

2. Possibilitam o trabalho com temáticas que compõem os <temas transversais> do currículo, como ética, justiça, cidadania, pluralidade cultural, entre outros, perpassando todos os componentes curriculares.

Fonte: <http://3.bp.blogspot.com/_8HQGeDaYMVI/SuYTuxbvJ-I /AAAAAAAACAE/r9cg6L9Y_Yw/s320/cidadania_escola.gif>.

Assista a vídeoaulaCiência e

Interdisciplinariedade: o conhecimento com

fronteiras abertas no século XXI, da professora Edna

Brennand.

Sobre os temas transversais, consultar o site: http://portal.m e c . g o v. b r / s e b /arquivos/pdf/livro081.pdf

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3. Permitem uma maior interação criança-criança e professor-criança no processo de ensino e aprendizagem, pois exige uma postura mais ativa da criança, sujeito do processo, e do docente, que deverá acompanhar o seu desenvolvimento.

4. Permitem um planejamento pedagógico centrado no interesse superior da criança, a ser identifi cado pelo docente, por intermédio de um diagnóstico prévio de sua turma.

5. Requerem, sobretudo, um planejamento didático-pedagógico participativo, em que o docente deverá pensar todas as etapas do processo de ensino e aprendizagem, com um necessário acompanhamento, mediante avaliação do desenvolvimento da criança.

Portanto, não restam dúvidas de que o trabalho com projetos didáticos incrementa o processo de ensino e aprendizagem e estimula a apreensão de conhecimentos, de forma articulada e contextualizada. Para isso, requer uma conduta mais ativa e uma maior intervenção da criança no seu entorno social. Mas, também, exige uma maior refl exão por parte do docente sobre sua prática, a qual reclama constantes atualizações. De fato, os projetos didáticos têm por referência a concepção de criança como um sujeito de direitos e deveres, contribuindo para o seu pleno desenvolvimento como pessoa. Exigem, pois, uma formação docente qualifi cada socialmente e apta a oferecer as ferramentas necessárias à efetivação de uma prática pedagógica transformadora e consciente das novas demandas sócio-históricas.

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AULA 10: PROJETO DIDÁTICO “RESPEITAR OS DIREITOS HUMANOS TAMBÉM É COISA DE CRIANÇA”

Justifi cativa

O trabalho pedagógico, centrado na construção de uma cultura de respeito aos direitos humanos, deve ser iniciado desde a primeira etapa da educação básica. Por se tratar de um trabalho de formação de mentalidades e atitudes, o respeito aos direitos do ser humano exige, prioritariamente, uma prática de conscientização que só a educação, sobretudo a escolar, pode promover. Conscientização e prevenção andam juntas nesse processo. As crianças, na educação infantil, por se constituírem como pessoas em desenvolvimento e por estarem no início do processo de socialização, ainda não têm preconceitos enraizados. Dessa forma, um trabalho educativo em direitos humanos, desde cedo, pode contribuir para a prevenção de atitudes que violam os direitos humanos.

Objetivos

- Conceituais

• Conhecer e compreender, de modo contextualizado, noções básicas relativas aos direitos humanos;

• Analisar as práticas sociais que violam os direitos humanos e as que respeitam esses direitos;

• Reconhecer que o respeito aos direitos humanos constitui prática fundamental para o desenvolvimento equilibrado das relações entre as pessoas.

- Procedimentais

• Demonstrar ações que favoreçam o respeito aos direitos humanos, nas relações com os outros, na escola e na comunidade.

Fonte: <http://www.panoramablogmario.blogger.com.br/AUTO_ivan_etica.jpg>.

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- Atitudinais

• Praticar atitudes de respeito aos direitos humanos;

• Comportar-se de maneira consciente de seus deveres, demonstrando senso de responsabilidade e solidariedade nas relações com os outros;

• Preocupar-se em assumir práticas na escola, em casa e na comunidade de respeito, mas, sobretudo, de promoção dos direitos humanos.

Público-alvo

Crianças de zero a cinco anos de idade.

Tempo estimado

Poderá ocorrer durante todo o ano letivo, possibilitando-se o trabalho com outros temas correlacionados.

Material necessário

• Imagens de revistas e jornais que retratam situações de violações aos direitos humanos, bem como aquelas que realçam a proteção da dignidade humana;

• Tesoura sem ponta;

• Cola;

• Lápis de cor;

• Cartolinas.

Desenvolvimento

O trabalho com o tema “direitos humanos” tem como função principal contribuir para a formação de cidadãos conscientes, aptos a atuarem na realidade social, de maneira a reconhecer, respeitar e promover os direitos humanos das outras pessoas, a começar pelas relações construídas no interior da escola e na família. No entanto, muitas crianças sentem, cotidianamente, o desrespeito aos próprios direitos. São tratadas como objetos, pessoas passivas. Essas atitudes vão de encontro a essa concepção de criança. Portanto, recomenda-se, desde cedo, que se formem crianças críticas, que se posicionam diante da realidade, para a construção de um mundo melhor.

Para isso, o educador deve garantir, em sala de aula, a problematização de situações extraídas da realidade socioeconômica, contribuindo, assim, para a construção de atitudes, valores e comportamentos eticamente adequados à convivência humana.

Nessa perspectiva, o trabalho com imagens, fotos e desenhos que demonstram situações de respeito e de violações aos direitos humanos, que possam suscitar discussões entre as

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Fonte: <http://www.fi ocruz.br/biosseguranca/Bis/infantil/

direitos_humanos4.jpg>.

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crianças, é fundamental para a construção de atitudes condizentes com os direitos humanos.

O professor constitui um modelo, um exemplo de prática a ser imitada. Por isso, deve ter certo cuidado ao falar e com as atitudes e os valores que expressa, pois as crianças, nesse momento preliminar de socialização, encontram-se bem atentas e observadoras dos acontecimentos que ocorrem no seu entorno social.

Avaliação

A avaliação será realizada considerando-se a participação e o interesse da criança diante das situações relacionadas ao tema. O docente deverá, também, avaliar como as crianças se posicionam, em relação ao respeito e à promoção dos direitos humanos, em suas relações com os outros no ambiente escolar.

Orientações ao(à) Professor(a)

• Ralize novamente o percurso do componente curricular Estágio Supervisionado do Magistério da Educação Infantil II, no Marco III. Ele contém informações e conhecimentos importantes para o(a) professor(a) trabalhar na perspectiva da educação em direitos humanos.

• As atividades propostas devem priorizar a problematização de situações que respeitem e violem os direitos humanos. O(A) docente deve levar a criança a valorizar atitudes que realcem e protejam a dignidade humana.

• É importante que as crianças sejam estimuladas a falar e a se posicionar diante das situações colocadas pelo(a) docente. Nessa fase, elas costumam falar muito e se expressam bastante, devendo, portanto, ser orientadas a se colocarem sobre determinado tema.

• As crianças devem ser estimuladas a usar técnicas diferentes para os desenhos, tais como pintura, colagem e dobradura. Nas atividades artísticas, o(a) docente poderá cantar com as crianças, utilizar-se de dramatizações de curta duração e de outras atividades que realcem o respeito aos direitos humanos.

TEXTO COMPLEMENTAR

Formação Universitária em Direitos Humanos

Profª Drª Maria Creusa Borges

A universidade assume um papel essencial na difusão de valores e concepções de mundo. É uma instituição que capitaneia todo o sistema de ensino. Por isso, não pode se abster de garantir a transmissão da herança cultural valorizada por determinada sociedade, bem como promover o debate e o conhecimento acerca de questões novas, que demandam a construção de um pensamento crítico, fundamental para o enfrentamento dessas questões.

Assim, diante dos desafi os colocados na contemporaneidade, algumas temáticas e questões devem integrar a agenda de ensino, pesquisa e extensão, a ser desenvolvida na universidade. Essa agenda se fundamenta em alguns princípios, tais como a educação superior como um direito de todos e a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão. Tendo como referência os princípios citados, entende-se que a universidade deve contribuir, primeiramente, para a

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formação do cidadão crítico e consciente de seu papel na sociedade. A educação, sobretudo a universitária, constitui uma prática social necessária à construção e ao desenvolvimento da condição da cidadania, que não é efetivada sem a ocorrência de processos formativos próprios da educação formal.

A condição de cidadania requer a integração plena do indivíduo na sociedade. Nessa perspectiva, a educação universitária, como um direito social, ganha relevância, assumindo papel de destaque no sentido da formação de sujeitos críticos e conscientes de sua condição social e econômica, promovendo a sua inserção como membros plenos de uma sociedade.

Assim, a educação universitária cumpre papel preponderante na perspectiva da formação para o exercício da cidadania como uma condição que favorece a integração e a participação plena do indivíduo na sociedade. Essa integração e participação requerem uma formação, que se baseia em prepará-lo, sobretudo, para a cidadania stricto sensu e a qualifi cação para o trabalho (art. 205, CF/88), aspectos facilitadores da sua integração e participação ativa na sociedade.

Importa, também, realçar a necessidade de se considerar a cidadania não, apenas, pelo ângulo dos direitos, mas como uma condição que se refere a direitos e deveres. Os indivíduos, como membros plenos de uma sociedade, assumem deveres em relação à organização social e política, em que seus atos estejam voltados para o bem-estar da comunidade (MARSHALL & BOTTOMORE, op. cit., p. 73). A obrigação pessoal em relação à sociedade é, pois, constituinte da condição da cidadania. A educação universitária, nesse sentido, se volta para a formação de atitudes e valores necessários à construção de vínculos entre o cidadão e a sociedade.

(Revista Verba Juris: Anuário da Pós-graduação em Direito, v. 7, n. 7, 2008).

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AULA 11: PROJETO DIDÁTICO “DIREITOS E DEVERES DA CRIANÇA”

Justifi cativa

No processo histórico de afi rmação dos direitos humanos, vários documentos foram elaborados com vistas à proteção dos direitos da criança, sobretudo após a aprovação da Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948. Nesse movimento de especifi cação dos direitos humanos, as crianças passam a se constituir como pessoas em desenvolvimento, que precisam de cuidados e proteção especiais, mas, principalmente, como sujeitos de direitos e deveres. Assim, no processo de socialização escolar, elas devem ter a oportunidade de discutir sobre os seus direitos, com base nos documentos que as protegem, e, ao mesmo tempo, ser levadas a assumir responsabilidades perante a escola, a família e a comunidade.

Objetivos

- Conceituais

• Conhecer, de modo contextualizado, noções básicas relativas aos seus direitos, na condição de pessoas em desenvolvimento que necessitam de cuidados e proteção especiais;

• Analisar situações do cotidiano que demonstram o respeito aos direitos da criança;

• Compreender que os direitos das crianças exigem, em contrapartida, a assunção de responsabilidades perante a escola, a família e a comunidade.

- Procedimentais

• Valorizar e demonstrar ações que traduzam o cuidado e a proteção necessários à promoção da dignidade do ser criança.

- Atitudinais

Fonte: <http://3.bp.blogspot.com/_gjvsd8ySzh0/SpGhUFY7sSI/AAAAAAAAAFM/LY28nGcE3nk/s1600-R/cidadania.JPG>.

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• Praticar atitudes de respeito aos direitos das crianças;

• Comportar-se, de maneira consciente de seus deveres, demonstrando senso de responsabilidade em relação à escola, à família e à comunidade.

Público-alvo

Crianças de zero a cinco anos de idade.

Tempo estimado

Poderá ocorrer durante todo o ano letivo, possibilitando-se o trabalho com outros temas correlacionados.

Material necessário

• Imagens de revistas e jornais que retratam situações de violações aos direitos humanos, bem como aquelas que realçam a proteção da dignidade humana;

• Cartilhas e gibis sobre os direitos e os deveres das crianças;

• Tesoura sem ponta;

• Cola;

• Lápis de cor;

• Cartolinas.

Desenvolvimento

O trabalho com o tema “direitos e deveres da criança” é de fundamental importância, pois, desde cedo, as crianças devem ser orientadas na perspectiva da conscientização sobre seus direitos, mas devem estar aptas a praticar atitudes que demonstrem um senso de responsabilidade e preocupação com o outro. A convivência humana requer a existência de direitos e deveres que reforcem os laços sociais. Assim, a construção de relações amistosas faz-se necessária para o alcance da paz social. A educação formal, nessa ótica, assume papel na formação de crianças aptas a viverem em sociedade, na condição de cidadãos conscientes de seus direitos e de seus deveres perante a comunidade.

Nessa perspectiva, as crianças devem ser estimuladas a observar o seu entorno, os jornais, as revistas, mídias eletrônica e televisiva, meios que informam e retratam situações do cotidiano em que, muitas vezes, as crianças são castigadas, submetidas a situações de violência, que agridem o desenvolvimento de sua personalidade. Muitas crianças sentem, cotidianamente, o desrespeito aos seus próprios direitos. São tratadas como objetos, pessoas passivas. Isso vai de encontro a essa concepção de criança. Portanto, recomenda-se, desde cedo, a formação de crianças críticas, que se posicionam diante da realidade, contribuindo para a construção de um mundo melhor.

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Aula 9 Aula 10 Aula 11 Aula 12

Fonte: <http://3.bp.blogspot.com/_u0b81TDUJ_k/R68G-hMP8II/AAAAAAAAA04/0GrY-6DstL0/s400/

clip_image001.jpg>.

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Portanto, o educador deve garantir, em sala de aula, a problematização de situações extraídas da realidade socioeconômica, que versam sobre a proteção da criança, bem como aquelas que demonstram a agressão aos seus direitos. A educação, dessa forma, poderá contribuir para a construção de atitudes, valores e comportamentos eticamente adequados à convivência humana e que possam desenvolver pessoas sadias e comprometidas com o outro.

Nesse caso, deve-se, também, iniciar o trabalho pedagógico com imagens, fotos e desenhos que problematizam situações do cotidiano, que possam suscitar conversas entre as crianças, fomentando a sua participação na construção de um texto coletivo, constituído de imagens e de poucas palavras. O professor assume um papel fundamental, como condutor do processo, fazendo as opções ética e moralmente corretas, adequando as situações à faixa etária e ao nível de desenvolvimento da turma. Por isso, o docente deverá ter certo cuidado em sua fala, atitudes e valores que expressa, pois as crianças, nesse momento preliminar de socialização, encontram-se bem atentas e observadoras dos acontecimentos que ocorrem no seu entorno social.

Avaliação

A avaliação será realizada considerando-se a participação e o interesse da criança diante das situações relacionadas ao tema. O docente deverá, também, avaliar como as crianças se posicionam diante de situações do cotidiano que demonstrem o desrespeito aos seus direitos, bem como sobre situações em que se realce a necessidade de construir responsabilidades perante o outro.

Orientações ao(a) Professor(a)

• Realize novamente os percursos dos componentes curriculares Estágio Supervisionado do Magistério da Educação Infantil II e VI dos Marcos III e IV, respectivamente, das Trilhas do Aprendente. Eles contêm informações e conhecimentos importantes para o(a) professor(a) trabalhar na perspectiva dos direitos e deveres da criança. As atividades propostas devem priorizar a problematização de situações que respeitem e agridam os direitos das crianças.

• Recomenda-se a adoção de momentos de integração entre a escola e a comunidade, que oportunizem o envolvimento dos pais na compreensão da criança como pessoa em desenvolvimento, a qual requer cuidados e proteção especiais, bem como a necessidade de se educarem as crianças na ótica da assunção de deveres perante a escola, a família e a comunidade.

• Os momentos de integração podem ser realizados por intermédio dos seguintes mecanismos: realização de debates coletivos sobre os direitos das crianças; ofi cinas para os pais e responsáveis sobre a temática; construção de cartilhas coletivas, com a participação das crianças sobre seus direitos e deveres, tendo por base a Convenção dos Direitos da Criança.

• É importante que a prática docente estimule a participação da criança, contribuindo para a sua formação como sujeito de direitos e deveres.

• As crianças devem ser estimuladas a usar técnicas diferentes para os desenhos, tais como pintura, colagem e dobradura. Nas atividades artísticas, o(a) docente poderá cantar com as crianças, utilizar-se de dramatizações de curta duração e de outras atividades que realcem o respeito aos direitos humanos.

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Trilhas do Aprendente, Vol. 7 - Estágio Supervisionado em Magistério da Educação Infantil VI

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TEXTO COMPLEMENTAR O experimento do Nepal em educação sobre os direitos da criança

Gopal Siwakoti A educação em direitos humanos, na busca por objetivos de desenvolvimento, tem sido amplamente utilizada na Ásia, especialmente entre as democracias em transição da região. A região, por vezes, é vista como mais complexa do que outras quando se trata de questões de direitos humanos devido à sua diversidade histórica, política, religiosa e cultural. O Nepal – um reino himalaico encravado entre a China, ao norte, e a Índia, ao sul – é um país singular no qual todas as ideologias políticas – monarquia, liberal e comunista – convivem sob o sistema da democracia parlamentar estabelecido pela Constituição nepalesa de 1990. Antes de 1990, o Nepal funcionava como uma monarquia absoluta que havia banido os partidos políticos, mas hoje é possível encontrar educação em direitos humanos e atividades de capacitação patrocinadas por ONGs em todos os setores e em muitas partes do Nepal (...). Após o sucesso do movimento nepalês pela democracia, em 1990, o governo de transição ratifi cou a Convenção sobre os Direitos da Criança (CDC), juntamente com as Convenções sobre Tortura e sobre a Mulher, assim como os pactos internacionais. Sem dúvida, esses tratados cobrem uma ampla diversidade de direitos humanos e obriga os Estados a tomar medidas efi cazes nas áreas legislativa, judicial e administrativa (...). Por exemplo, o Artigo 42 da Convenção sobre os Direitos da Criança declara: “Os Estados signatários comprometem-se a dar aos adultos e às crianças amplo conhecimento dos princípios e Dispositivos da Convenção, mediante a utilização de meios apropriados e efi cazes” (...). As crianças também participaram do Seminário Nacional de ONGs, voltando em seguida às suas comunidades para compartilhar sua aprendizagem. O Seminário das Crianças, que resultou desse trabalho, discutiu o status das crianças e suas responsabilidades, assim como os deveres dos pais, da comunidade, dos órgãos governamentais locais e dos partidos políticos.

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AULA 12: PROJETO DIDÁTICO “MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO HUMANO SUSTENTÁVEL”

Justifi cativa

As temáticas do <meio ambiente> e desenvolvimento sustentável encontram-se, intimamente, articuladas, pois a construção de um projeto de desenvolvimento sustentável implica que se coloque a proteção do meio ambiente no centro desse processo. O trabalho pedagógico, portanto, precisa ter como uma de suas fi nalidades essenciais a conscientização dos educandos para que se tornem agentes multiplicadores de práticas voltadas para a construção de um meio ambiente equilibrado, nos aspectos ecológicos, sociais e econômicos. Implica, também, a construção de ações preventivas, pois um dano ambiental pode ter consequências avassaladoras para uma determinada comunidade. Assim, fazer os educandos pensarem sobre ações cotidianas, na escola, na família e na comunidade, as quais sejam adequadas à proteção do meio ambiente, consiste no primeiro passo. Segundo, faz-se necessário discutir e refl etir sobre concepções de meio ambiente. Há muito tempo, não se compreende mais meio ambiente como, somente, o conjunto da fauna e da fl ora de uma determinada localidade. Além desses aspectos, integra o meio ambiente o patrimônio artístico e cultural de um dado lugar. Portanto, uma concepção ampla de meio ambiente envolve os aspectos socioeconômicos, físicos, a fauna, a fl ora, os recursos naturais e minerais e o patrimônio artístico e cultural. Assim, os projetos de desenvolvimento devem ser reconceptualizados tendo em vista a proteção desses recursos e a minimização dos impactos em termos de violação aos direitos humanos.

Fonte: <http://noolhar.fi les.wordpress.com/2008/08/meio-ambiente-rute5.jpg>.

Sobre meio ambiente, consultar o componente curricular Ciências Naturais na Educação Infantil II, no Trilhas do Aprendente Vol. 6, elaborado pelas professoras Betânia Barreto, Pamella Gusmão e Virgínia Farias.

Trilhas do Aprendente, Vol. 7 - Estágio Supervisionado em Magistério da Educação Infantil VI

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Objetivos

- Conceituais

• Compreender o conceito de meio ambiente numa perspectiva ampla e contextualizada;

• Analisar práticas sociais que provocam danos ao meio ambiente e ações que o protegem;

• Reconhecer quais ações cotidianas são fundamentais para a construção de um meio ambiente equilibrado;

• Conhecer projetos de desenvolvimento que agridem o meio ambiente e aqueles que se baseiam numa concepção de desenvolvimento humano sustentável.

- Procedimentais

• Demonstrar ações que contribuam para a proteção do meio ambiente, na família, na escola e na comunidade.

- Atitudinais

• Praticar atitudes de respeito ao meio ambiente;

• Comportar-se de maneira consciente, demonstrando senso de responsabilidade no tocante à proteção do meio ambiente;

• Preocupar-se em assumir práticas de proteção ao meio ambiente na escola, em casa e na comunidade.

Público-alvo

Crianças de zero a cinco anos de idade.

Tempo estimado

Poderá ocorrer durante todo o ano letivo, possibilitando-se o trabalho com outros temas correlacionados.

Material necessário

• Imagens de revistas e jornais que retratem situações de dano ambiental, bem como aquelas que realcem a proteção ao meio ambiente;

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• Revistas em quadrinhos que tratem da temática da proteção ao meio ambiente (podemos encontrar exemplos desse tipo de quadrinhos no componente curricular Ciências Naturais na Educação Infantil II no Trilhas do Aprendente vol. 6);

• Filme Ilha das Flores (o(a) professor(a) poderá recortar as cenas que melhor visualizem a agressão ao meio ambiente);

• Exemplos de projetos de desenvolvimento causadores de danos ambientais, como, por exemplo, a construção de usinas hidroelétricas. As crianças podem ser estimuladas a compreender as consequências da construção de uma represa para uma determinada localidade;

• Tesoura sem ponta;

• Cola;

• Lápis de cor;

• Cartolinas.

Desenvolvimento

O trabalho com o tema “meio ambiente e desenvolvimento sustentável” tem como função principal contribuir para a formação de cidadãos conscientes, aptos a atuarem, com ações preventivas, na realidade social, de maneira a reconhecerem a necessidade de proteção do meio ambiente, no interior da família, da escola e da comunidade. Muitas crianças presenciam, cotidianamente, as consequências de ações danosas ao meio ambiente, tais como a poluição de um rio causada por indústrias, o lixo acumulado em locais impróprios. Portanto, o educador poderá começar problematizando situações, extraídas da realidade socioeconômica, que causam danos ao meio ambiente, bem como aquelas que promovem o equilíbrio ambiental.

Assim, o trabalho com imagens, fotos e desenhos que demonstrem situações de desrespeito ao meio ambiente, como também fi lmes, que possam suscitar refl exões e discussões entre as crianças, são fundamentais para a construção de atitudes conscientes e preventivas em relação ao meio ambiente.

Os simples atos de jogar papel no lixo e de não provocar poluição sonora podem servir de exemplos de atitudes de respeito ao meio ambiente. A promoção dessas atitudes constitui a fi nalidade do processo educativo na educação infantil, momento em que as crianças iniciam a sua socialização, para além da família.

Avaliação

A avaliação será realizada considerando-se a participação e o interesse da criança diante das situações relacionadas ao tema. O(A) docente deverá, também, avaliar como as crianças se posicionam na perspectiva do respeito ao meio ambiente, bem como na promoção de ações que previnam a ocorrência de sérios danos ambientais.

Orientações ao(à) Professor(a)

• Realize novamente o percurso dos componente curricular Ciências Naturais na Educação

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Trilhas do Aprendente, Vol. 7 - Estágio Supervisionado em Magistério da Educação Infantil VI

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Infantil II, no Marco VI das Trilhas do Aprendente. Ele contém informações e conhecimentos importantes para o(a) professor(a) trabalhar com o tema meio ambiente.

• As atividades propostas devem priorizar a problematização de situações que respeitem e agridam o meio ambiente. O(A) docente deve levar a criança a valorizar atitudes que promovam o equilíbrio ambiental em sua comunidade.

• É importante que as crianças sejam estimuladas a falar e a se posicionar diante das situações colocadas pelo(a) docente. Nessa fase, elas costumam falar muito e se expressam bastante, devendo, portanto, ser orientadas a expor seu ponto de vista sobre determinado tema.

• Incentive as crianças a valorizarem e praticarem ações que promovam o equilíbrio ambiental. Elas poderão desenhar, realizar pinturas, colagens, confecção de dobraduras, utilizando, como pano de fundo, o tema do meio ambiente. Nas atividades artísticas, o docente poderá cantar com as crianças, utilizar-se de dramatizações de curta duração, atividades que realcem o respeito ao meio ambiente.

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