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STAT CRUX STAT CRUX “Permanece a Cruz enquanto o mundo gira” São Bruno Fraternidade São Pio X Priorado Imaculado Coração de Maria Santa Maria RS Setembro e Outubro de 2016 R$ 7,00 EDITORIAL Estimados fiéis, na presente edição de nosso boletim damos continuidade à série de textos de Dom Tihamer Toth a respeito do Decálogo. E avançando pelo seguro caminho da lei divina, deparamo-nos com o sexto e o nono Mandamentos, com estes dois preceitos de suma importância que, sobretudo no ambiente contemporâneo de profunda e crescen- te imoralidade, erguem-se como faróis a guiar todos quanto anseiam e se esforçam por ter uma vida pura, em conformidade à vontade de Deus. Veremos, portanto, qual é o plano de Deus ao fazer o homem participar de seu poder, decretando a geração da vida natural a partir da união entre um homem e uma mulher, e como quis Ele ainda promulgar duas leis para defender esta santa união e proi- bir tudo aquilo que não corresponde ao legítimo uso dessa força criadora. Em seguida, consideraremos a rebeldia do homem que, desde tempos imemoriais, vem desviando de seu fim aquilo que Deus determinou que fosse o meio pelo qual se propagasse o gênero humano. E ainda de que forma os pais e educadores podem fazer com que suas crianças cresçam protegidas dos constantes ataques à virtude da pureza a fim de que elas possam, como lhes admoesta o rito batismal, levar suas vestes brancas sem mancha até o tribunal de Nosso Senhor. Por fim, o prelado húngaro questionará se será possível guardar a casti- dade ante a violência com que o mundo moderno se lança contra a menor manifestação de uma vida virtuosa, e concluirá afirmando que sim, é possível, se tivermos a coragem necessária para lutarmos contra os braços da impureza, que se estendem de modo amea- çador sobre todos nós. Confiantes de que encontrarão neste boletim um auxilio à este heróico combate, desejamos a todos uma boa leitura.

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STAT CRUXSTAT CRUX “Permanece a Cruz enquanto o mundo gira”

São Bruno

Fraternidade São Pio X Priorado Imaculado Coração de Maria

Santa Maria — RS

Setembro e Outubro de 2016 R$ 7,00

EDITORIAL Estimados fiéis, na presente edição de nosso boletim damos continuidade à série de

textos de Dom Tihamer Toth a respeito do Decálogo. E avançando pelo seguro caminho da lei divina, deparamo-nos com o sexto e o nono Mandamentos, com estes dois preceitos de suma importância que, sobretudo no ambiente contemporâneo de profunda e crescen-te imoralidade, erguem-se como faróis a guiar todos quanto anseiam e se esforçam por ter uma vida pura, em conformidade à vontade de Deus.

Veremos, portanto, qual é o plano de Deus ao fazer o homem participar de seu

poder, decretando a geração da vida natural a partir da união entre um homem e uma mulher, e como quis Ele ainda promulgar duas leis para defender esta santa união e proi-bir tudo aquilo que não corresponde ao legítimo uso dessa força criadora. Em seguida, consideraremos a rebeldia do homem que, desde tempos imemoriais, vem desviando de seu fim aquilo que Deus determinou que fosse o meio pelo qual se propagasse o gênero humano. E ainda de que forma os pais e educadores podem fazer com que suas crianças cresçam protegidas dos constantes ataques à virtude da pureza a fim de que elas possam, como lhes admoesta o rito batismal, levar suas vestes brancas sem mancha até o tribunal de Nosso Senhor. Por fim, o prelado húngaro questionará se será possível guardar a casti-dade ante a violência com que o mundo moderno se lança contra a menor manifestação de uma vida virtuosa, e concluirá afirmando que sim, é possível, se tivermos a coragem necessária para lutarmos contra os braços da impureza, que se estendem de modo amea-çador sobre todos nós.

Confiantes de que encontrarão neste boletim um auxilio à este heróico combate, desejamos a todos uma boa leitura.

C om o presente capítulo iniciamos o estudo do sexto Mandamento.

Enquanto pensava na matéria a tratar, os meus olhos depararam com a notícia da última hora, que bem pode servir de introdução do estudo do sexto Mandamento, e que nos obriga a meditar.

Morreu em Paris, na maior das misérias, uma mulher velha; uma mulher que muitos conheciam de vista nos subúrbios do Montmar-tre, porque passava ali dia atrás dia, empurran-do a sua velha carroça de legumes, oferecendo ao público as suas mercadorias. Poucas pessoas sabiam quem fora, noutros tempos, esta velha alquebrada andrajosa. A pobre vendedeira de hortaliças tinha sido a beldade mais festejada e adorada de toda Paris. O seu nome teatral era La Goule; e quarenta anos antes era a mais céle-bre bailarina do Moulin Rouge. Jactava-se ela própria, da vida frívola que levava; e de cada vez que aparecia em cena, os jovens parisienses a quem distinguisse com um sorriso, sentiam-se as pessoas mais felizes do mundo.

O tempo murchou a formosura; a bailarina idolatrada espatifou à doida, de modo que ia decaindo... decaindo... e a última etapa de sua carreira artística foi num circo ambulante. E até este recurso lhe roubou a velhice, expulsando-a do circo vagabundo. Agora, havia quinze anos que por ali andava, a vender hortaliças... no cenário dos seus antigos triunfos...

Pode haver ilustração mais impressionante para o rigor e severidade dos Mandamentos? E, ao mesmo tempo, que rigorosa argumentação para fazer pensar a sério no Sexto Mandamento! Não ignoro que é tarefa grave e delicada para o sacerdote a de falar neste tema, seria mais cômo-do passar por ele sem parar.

Alcançaríamos, porém o nosso fim? Seria melhor não aprofundar? Havíamos de conseguir que toda a gente fale deste assunto e não como Deus quer que fale, que fale o teatro, o cinema, a novela, o diário, a sociedade, a pintura, o escaparate, toda gente... menos o sacerdote? Passa em silencio o tema que Deus considerou de tanta importância e transcendência para a vida, que deu dois Mandamentos, o sexto e o nono, para a defender?

Havemos de nos calar quando é o pecado que mais grita? Grita nas costas abauladas dos jovens, na algazarra das noitadas, na música infernal dos cabarets, do fundo dos berços ilegíti-mos, dos presídios, dos manicômios! E há-de ser então, o sacerdote quem se receie do assunto?

Quando a tentação sensual ataca os homens por mil formas: no teatro, no cinema, nos diá-

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Sexto e Nono Mandamentos “Não pecar contra a castidade; não cobiçar a mulher do próximo”

Dom Tiamer Toth

Santa Filomena

rios, nas revistas ilustradas, nos escaparates, na sociedade, nos divertimentos, quando flutua por toda parte o pó que seca a medula dos ossos , pó que transforma em aguadilha o sangue das vei-as, pó que faz murchar a primavera, a força, a alegria da alma, apodrecida e melancólica... é licito que fique de lábios cerrados aquele que tem a missão de cuidar das almas?

Havemos de nos calar quando vemos com claridade meridiana a verdade das palavras assustadoras, quase inacreditáveis de Santo Afonso?

Entre os condenados que povoam o inferno não há um que não pecasse contra o sexto Mandamento; e noventa e nove por cento condenaram-se por esse pecado.

Não! Quando no mundo inteiro este pecado abre caminho com ruído de feira; quando milhares de emissários do inferno procuram, com diabólico refinamento, empurrar os homens para esse vício, porque sabem que podem levá-los, por esse caminho, à condenação... Não podem os ministros do Senhor conservar-se em silêncio.

Com estes pensamentos, graves e piedosos, é que haveis de ler a exposição do sexto e nono Mandamentos, e pedi comigo ao Pai celestial que consigamos tratar com a devida unção tema tão delicado e que estas cogitações nos façam compreender a sublimidade dos planos de Deus e nos comuniquem forças na luta que tivermos de sustentar para o cumprimento de sua lei.

I

Qual é o plano de Deus?

Segundo os admiráveis planos de Deus criador, o homem - abstratamente, no seu conceito puro, não existe. O que existe é um homem e mulher. O homem e a mulher precisam um do outro e assim se completam. O homem distingue-se por seu trabalho criador que exige valentia e espírito de atividade; tem vontade coberta e decisão firme; alegra-se quando pode resistir com firmeza do carvalho ao furacão da existência. A mulher tem caráter diferente: o seu lugar é no brando ninho familiar, aonde com amor e inesgotável espírito de sacrifício, cuida do marido e dos filhos e cha-ma um ar de riso nos lábios do esposo, quando ele regressa do áspero labor quotidiano. A sua força criadora não é tão grande como a do homem; em compensação excede-o em perseverança, em paciência e na resistência ao sofrimento. É Indispensável que haja no mundo homem e mulher. É necessário que ao lado da força do homem exista a ternura da mulher; que à vontade robusta do homem corresponda o sentimento da mulher... Ambos, conjuntamente, realizam o conceito total da pessoa.

Que sublime pensamento do Deus criador e ao mesmo tempo que requintada fineza para com o homem foi este decreto eterno! Para encher as brechas abertas pela morte, o homem será dotado de forças criadora; e a procriação humana conseguir-se-á com a colaboração fecunda do homem e da mulher unidos no sacramento do matrimônio.

a) Plano sublime! b) Enternecedora delicadeza! a) Plano sublime! O Senhor poderia criar todos os homens diretamente, por Si mesmo, e em

estado de completo desenvolvimento, como aos nossos primeiros pais. Mas não foi essa a sua santa vontade. Deu ao homem uma prova de inefável confiança, comunicando-lhe um raio da sua força criadora, e desse modo encheu a vida terrena de encanto e calor indizíveis... mas, por outro lado, sobrecarregou o homem com uma tremenda responsabilidade.

Imaginemos por um momento quão diferente seria a vida, muito mais fria, mais monótona, mais árdua, se o Senhor tivesse disposto de outra forma, diversa da atual, o nascimento dos homens.

Em primeiro lugar, não haveria crianças no mundo; seriamos todos graves senhores ou respeitáveis damas. Não ressoariam na vida as gargalhadas das crianças que brincam. Não have-

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ria infância e nos seriam desconhecidas as inúmeras, deliciosas, despreocupadas alegrias da infância.

Ainda mais: não haveria família, amor de pais, de filhos, de irmãos; cada qual se sentiria só, isolado, órfão, sem parentes no mundo; não haveria nação nem pátria; faltaria o nobre pensa-mento da fraternidade humana.

Porém o Senhor, no seu plano sublime, não quis que fosse assim. Em conseqüência da santa força criadora que comunicou ao homem flui em palpitações de vida, através de todas as gerações pas-sadas, presentes e futuras a única e grande corrente do sangue dos nossos pais; e assim ficou estabelecida a grande fraternidade humana.

Todos os homens, começando no primeiro e contando até o último que haverá de viver na terra, desde o imperador ao mendigo, desde o poderoso ao humilde, desde o aristocrata ao prole-tário, desde o sábio ao analfabeto, todos têm o mesmo sangue, a mesma solidariedade, o mesmo Pai nos céus.

Que indizível amor o de Deus, ao escolher justamente esta maneira de conservar a espécie humana! Diretamente, só criou o primeiro homem e a primeira mulher; mas deu a estes dois, e mediante eles a todos os demais, algo da sua própria força criadora; estabeleceu que fossem eles que dessem vida corporal aos demais homens, e apenas reservou para Si a criação da alma. Que maravilhoso, santo e sublime o plano de Deus criador!

b) Avancemos um pouco e estaremos perto de compreender o sexto Mandamento. Plano sublime o Deus; mas que requintada bondade e comovedora confiança para com o homem! E a nossa res-ponsabilidade é tanto maior quanto mais nos honra esta confiança. Representa distinção para nós que no labor da renovação constante da Humanidade, tarefa realmente criadora, Deus haja permitido a colaboração do homem; mas não é menor a nossa responsabilidade na obrigação que nos cabe de aproveitar esta força unicamente par ao fim santo que Deus lhe destinou dentro do quadro legal que o fixou desde o princípio: dentro do matrimônio indissolúvel, que liga a um só homem uma única mulher!

Não é devido ao acaso, não carece de fundamento a circunstância de ter Deus colocado a seguir ao quinto o sexto Mandamento. O quinto Mandamento protege a vida; o sexto defende a fonte da vida. O quinto ordena: “Não matarás”, isto é, não derramarás sangue. Ordena o sexto: “Não fornicarás”, isto é, não corromperás esse mesmo sangue. E assim como aquele não permite que se cau-se dano à vida dos outros, nem à própria, também este não permite que se prejudique a fonte da vida com atos ou desejos que a profanem, quer em outra pessoa quer na própria.

A força mais sublime e santa da natureza é de comunicar a vida. Também o homem a pos-sui; como os outros seres vivos podem comunicar a vida, também ele pode dar origem a um novo ser humano; mas assim como a alma eleva o homem muito acima das demais criaturas visí-veis, assim o homem haverá de dignificar esta atividade criadora, espiritualizando-a com o cum-primento mais consciencioso da lei moral, sublimando-a, libertando-a do círculo da matéria pura e transplantando-a para o mundo do espírito. Renunciaríamos ao nosso mais formoso privilégio, à nossa “natureza racional”, se consentíssemos em nós uma única manifestação da vida corporal que não fosse sublimada por uma espiritualidade consciente e elevada, deste modo, acima da ati-vidade puramente animal.

Ponderando bem estes princípios já podemos abranger toda a extensão do sexto Mandamento. À primeira vista ele regula apenas uma parte da questão sexual. Não fornicarás

(Deuteronômio, V, 10). Quer dizer: não abrirás as fontes da vida fora do matrimônio. O nono Mandamento vai mais longe e proíbe, além do ato exterior, o mero pensamento ou desejo: Não desejarás a mulher de teu próximo (Deuteronômio, V, 18). Mas ainda assim, poderia alguém pensar, só se trata de defender a pureza e os foros do matrimônio. Parece que o Senhor não condena as outras manifestações da vida sexual. Quem pensasse desse modo erraria em absoluto. A santidade do

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matrimônio está defendida diretamente pela Lei de Deus, porque a vida conjugal ordenada segundo os planos do Senhor é a solução de toda questão sexual; porque a única possibilida-de de exercício legítimo da força criadora outor-gada por Deus é a vida conjugal, o matrimônio monogâmico que dura até ao túmulo; e isto não é invenção humana, não é uma convenção sujei-ta ao capricho de tempo, mas a manifestação exterior das mais requintadas qualidades exteri-ores do homem.

Sim, à primeira vista o sexto e o nono Mandamentos apenas defendem a santidade e a necessidade do matrimônio; mas, na realidade, proíbem toda espécie de pecados contra a pureza. Isto ressalta à evidência dos repetidos ensinamentos de Nosso Senhor Jesus Cristo e dos Apóstolos, segundo os quais toda impureza é pecado grave. Jesus Cristo disse, por exemplo: “É do coração que saem os maus pensamentos, os homicídios, adul-térios, impurezas... São estas as coisas que mancham ao homem” (MT. XV, 19-20). E S. Paulo escreve deste modo aos Efésios: “Que nenhum de vós nomeie sequer, como é próprio dos santos, a fornicação e qualquer espécie de impureza ou avareza nem, do mesmo modo, palavras torpes, chocarrices, que não con-vém ao vosso estado” (Efésio V, 3-4).

Mas se toda a impureza é pecado, pecado é tudo quanto ela induz. A proibição do quinto Mandamento “não matarás’, compreende também a ira, porque pode conduzir ao assassinato; de modo análogo a proibição do sexto Mandamento, “não fornicarás”, compreende tudo quanto pode conduzir a este pecado: pensamentos, olhares, conversas, leituras ou qualquer outro perigo. Porque em ponto algum se cumpre mais rigorosamente a palavra Sagrada da Escritura: “Quem amo o perigo morrerá nele” (Eclesiástico, III, 27).

Eis aí o objetivo do sexto Mandamento, o plano sublime de Deus. Em que elevado conceito a nossa religião sacrossanta tem o homem e a mulher! O exercício da vida conjugal, dever comum do homem e da mulher, não só não é pecado, como, pelo contrário, é pensamento subli-me de Deus, pensamento santo, que nos honra. E o sexto e o nono Mandamento proíbem justa-mente que se adultere esse santo pensamento, que se dê outro destino à força vital, burlando as disposições de Deus.

II A rebeldia do homem

Se ficarmos no que acabamos de expor, meditando os planos sublimes de Deus, o quadro

que passaremos a contemplar parecerá triste. Vimos que sublime é o plano de Deus. Vejamos agora quão terrível é a rebeldia do homem. A) Olhemos à nossa volta... Que vemos? O mundo mudou em todos os sentidos, mas talvez não tenha mudado em ponto algum

como neste assunto. Não há muito li as melancólicas observações de um homem solteiro: os homens modernos não se atrevem a casar-se porque as idéias predominantes na atualidade são em tudo

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Santo Henrique e sua esposa Santa Conegunda

mais licenciosas do que eram em tempos passados. Antigamente não tínhamos aviões, escreve ele,

mas as almas puras elevavam-se em vôo livre; não havia rádio, mas os corações puros encontravam-se com mais facilidade.

Antigamente as moças insistiam com as mães para vestir a primeira saia comprida; agora mãe e filha andam à porfia a ver quem usa a saia mais curta.

Noutros tempos, os filhos falavam com humilda-de aos pais, tratando-os com respeito. E hoje? Tratam-nos por tu ou você, dando-lhes conselhos.

Em tempos antigos era com dor, com preocupa-ção, com certo acanhamento que se falava deste ou daquele casal separado; hoje é assunto muito interessan-te... Desprezavam-se, dantes, os casais infiéis; hoje podem-se contar sem receios e até com vaidades as últi-mas aventuras.

Nas épocas passadas contraía-se o matrimônio diante do altar e era ratificado no Céu; agora conside-ram-no como instituição antiquada, falida, e pede-se a sua reforma radical.

Antigamente os casais caminhava lado a lado a vida inteira; hoje acotovelam-se no tribunal onde se trata a causa do divórcio.

A mulher queria conquistar com sua feminilidade, com a educação de seus filhos, com o asseio da sua casa, com o esmero da cozinha. Com que armas luta a mulher moderna? Com as diversões, o vestuário reduzido e a conversa licenciosa.

Assim se lastima um homem sério. Quem se atreve a contestar que tenha alguma razão? Perguntai a qualquer homem sério (não é necessário que seja cristão, basta que ande pelo

mundo com olhos abertos) e vereis como reconhece que o demônio da vida sexual, quebradas as cadeias da religião, se transformou em perigo cadente para a sociedade humana, e a vai impelin-do para a morte.

B) Porque se transmudou em perigo? Porque quanto mais augusto é o fim de um processo vital, tanto mais grave é o perigo e o pecado de desviá-lo.

Não há em todo o mundo um ser vivo que possa atraiçoar as leis santas do Criador; só o homem possui tal privilégio. O homem pode adulterar com mão pecadora o desígnio criador de Deus ou então cometer pecado contra o sexto Mandamento. O homem pode perturbar a ordem estabelecida pelo Criador, pode frustrar a sua santa vontade, pode rebaixar à categoria de sim-ples prazer e a frívolo divertimento a atividade que Deus, no seu altíssimo plano, destinou unica-mente à fonte de nova vida, a dar origem a rebentos humanos.

“O corpo não é joguete, mas instrumento, instrumento de criação nas mãos de Deus”. Deveria ser este o pensamento cristão. Mas olhamos à nossa volta, o que é que vemos?

a) Ainda que os homens ingratos tenham aproveitado para o mal quase todos os dons de Deus, podemos afirmar com profunda tristeza que em ordem alguma foi tão deturpado o plano de Deus como na que diz respeito às relações entre homem e mulher.

O plano de Deus é manifesto: a união de um homem e de uma mulher numa vida matri-monial indissolúvel, com o fim de dar mais seres à Humanidade. Mas contra o plano de Deus milhares e milhares de peças teatrais, filmes, quadros, fotos, novelas, jornais, livros e pseudo-profetas gritam hoje à sociedade que o homem e a mulher, ainda antes de fundar uma família,

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São Luiz Gonzaga

fora do matrimônio, têm o direito de gozar aquele prazer corporal, que segundo o plano do Cria-dor só é permitido no matrimônio da vida familiar.

Nunca a imoralidade da vida moderna se revela em atos mais abomináveis que nos horrores do peca-do contra o sexto Mandamento.

b) Não quero exagerar. Não quero sustentar que só na nossa época se pratica tal pecado e que os antigos estavam ausentes dele. Não o afirmo, porque não é verdade. Também antigamente sabiam triunfar os incentivos rebeldes.

Vai, contudo, uma diferença enorme, da queda do homem antigo à queda do homem moderno. Qual? É que no homem antigo, quando a paixão triunfava da alma, isso era considerado como uma derrota, tido na conta do pecado, e o delinqüente era obrigado a esconder-se da sociedade, enver-gonhado.

Antigamente a imoralidade era uma nódoa; mas hoje, exibi-se como prova da liberdade de pensamento. Antigamente a vida honesta era um belo ideal; hoje é tida por antiquada hipocrisia. O homem atual comete seus pecados à luz do sol, abertamente, jactando-se, filosofando, racioci-nando, chegando ao extremo de negar que aquilo seja pecado. Hoje em dia poucos acusam na queda a derrota da alma, e até a consideram como um legítimo direito do corpo. “Atualmente a nossa técnica é diversa, diz-se, portanto, é diversa a nossa moral”.

E o que causa assombro não é tanto a multidão dos pecados, como este sofisma. Daqui pro-vém toda a miséria usual da nossa época.

Miséria que não quero pintar nem com uma única pincelada. O coração deixa de bater quando encaramos a corrente suja, corrente de esgotos, extravasando dos seus condutos normais e inundando as almas que formam o vergel de Deus. A urbanização moderna sabe suprimir os miasmas, os bacilos de doenças contagiosas por meio de canalizações magníficas; mas... para haver mais sobreviventes a quem se transmita a epidemia da imoralidade?

***

Acode-me à memória um assunto bíblico, cuja evocação apesar de ocorrido há milhares de anos, fica bem no final deste capítulo.

É conhecido de todos o episódio da Bíblia em que Deus comunica a Abraão que tenciona destruir Sodoma e Gomorra, por causa da imoralidade dos seus habitantes, que “atingiu o cúmu-lo” (GN. XVIII, 20).

Abraão começa a implorar: Senhor, se nestas cidades se encontrarem cinqüenta justos, suspendereis o castigo? Deus consente. Abraão pensa, com pavor, que talvez não haja tantos justos. Continua a

implorar. Senhor, contenta-te com quarenta e cinco... com quarenta... com trinta... com vinte...

Senhor, mesmo que haja apenas dez, perdoa às cidades! E o Senhor consente. Mas não se encontraram nem dez justos. É verdade que não eram cristãos. Mas, ai! Se tivéssemos de regatear, hoje, com o Senhor,

na capital de um país católico... seria mais fácil a nossa tarefa que a de Abraão? Se tivéssemos de acompanhar o Senhor pelas exposições, pelas ruas... Se tivéssemos de o

levar ao cinema, ao teatro, aos salões... Se Lhe mostrássemos as revistas, os livros atuais, que diria?

Senhor, abre os nossos olhos e fortalece as nossas almas; que na queda vertical dos valores morais sejam ao menos os teus fiéis aqueles “dez” por cujas almas puras te compadeças deste mundo apodrecido.

Digamos todos com humildade e fervor de oração: Senhor! Eu quero estar entre os “dez”... entre aqueles “dez”...

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Educar para uma vida pura!

Branca, rainha de França, disse um dia a seu filho, que mais tarde seria honrado sobre os

altares, S. Luís: “meu filho, quero-te mais que ao meu próprio coração. És a minha única alegria na terra; és a esperança do país; pois, apesar de tudo... preferia ver-te morto a saber que havias prati-cado um pecado mortal”.

Palavras sublimes! Dignas de uma cuidadosa e boa mãe. Em muitas ocasiões afirmou S. Luís terem-lhe produzido profunda impressão estas palavras de sua mãe, que lhe serviram de alento e guia durante a vida inteira.

Quantas vezes o mesmo cuidado oprime o coração das mães dos nossos dias! Quando tem a seu lado o filho ou a filha adolescentes, oh! como se angustia o coração materno. “Quem dera que pudésseis ficar sempre assim! Quem dera que nunca a revolta imundície da vida chegasse a tocar as vossas almas límpidas! Oxalá pudésseis ficar sempre assim, tranquilos e serenos, aos olhos de vossos pais...”

Que difícil é o tema da educação. Como podemos educar para uma vida pura o nosso apreciado tesouro, a juventude atual.

Porque não basta saber que Deus exige do jovem uma vida perfeita, continente, pura até o altar. É um dever santo para nós pais, mestres, sacerdotes, ajudar os rapazes nesta árdua luta e afastar-lhes do caminho, quanto possível, os perigos. Os nossos jovens hão de chegar ao casa-mento com a sua pureza intacta, é o Mandamento do Senhor. Como podemos ajudá-los? De que os haveremos de defender?

I

Como os podemos ajudar?

Podemos resumir em três deveres as obrigações que cabem aos educadores de auxiliarem os jovens. Hão de ajudá-los: 1. A conhecerem-se a si próprios; 2. A estimularem-se; 3. A trabalharem na formação de sua personalidade, no robustecimento da sua vontade.

1. - Ajudemos os jovens a conhecerem-se a si próprios. Costumamos chamar “inocente” ao menino de tenra idade, porque não entende nem ao

menos conhecem certas coisas. Porém essa inocência não é ainda virtude e sim falta de desenvol-vimento, própria da idade. Pelo contrário considera-se já virtude o ato do adolescente que toma posições perante as desordens sexuais: do adolescente e do jovem que, perdida já a ingenuidade de criança, pensa, contudo, com a maior piedade e devoção, nas forças novas que vão despertan-do em si, a respeito do segredo da vida que pretende manifestar-se.

Oxalá pudesse haver, junto de cada adolescente, pai, mãe, diretor espiritual compreensivo, de coração afetuoso; um desses que em vez de verem no “guri” e na “guria” caricaturas ingratas e enervantes, observam também neles as forças novas que se manifestam a medo, como a apalpa-delas. Com tais educadores seria muito fácil a juventude atingir a maturidade na observância do espírito do sexto Mandamento.

Durante a mocidade uma acumulação de desejos, de anseios e de sentimentos redemoi-nham no intimo dos jovens, sem que eles saibam a origem, o fim, o destino de tais sentimentos. O jovem atravessa os dias nebulosos da puberdade. Como poderá conhecer o que se agita dentro de si? Como conceber que aqueles pensamentos novos, aqueles sentimentos desconhecidos, toda aquela estranha agitação representa o plano de Deus?Não é pecado sentir o instinto, não é peca-do sentir as manifestações desse instinto, mas fazer mau uso dele.

Como o jovem saberá essas coisas se os educadores mais indicados as calam diante dele? Mas então, alegam os pais, nós havemos de falar-lhes de assunto assim espinho-so? É tão delicado!

Por certo que haveis de ser vós. Em cada adolescen-te manifesta-se um dia ou outro o desejo de ver claro, a sede de saber. Não há meio de impedir; mas, de resto, os jovens têm esse direito. O mal não está na sede do homem, e sim na fonte onde apaga a sede e na maneira de apagar. O delicado amor paterno sabe achar também neste ponto uma água cristalina. E se vos coibis de fazê-lo e não dais dela ao vosso filho, ele terá de beber da água suja da beira do caminho.

Mais vale que sejais vós a dizer-lhe, de modo gra-dual, o que o jovem tem direito a saber a respeito do assunto, sem confiar essa tarefa de iniciação às vitrines, revistas, filmes, ou amigos suspeitos. Não é o saber perigo-so em si mesmo; representa apenas o metal de que será cunhada a moeda para a vida do adulto; e se esta se abriga sob a inspeção dos pais, terá em si a efígie da Bendita Vir-gem.

O primeiro passo, portanto, é este: ajudar o jovem a compreender-se a si próprio.

2. - Segundo dever, não menos importante: ajudar o jovem a ter consideração por si próprio. O apreço da própria pessoa manifesta-se por muitas vezes, no jovem, de maneira esquisita: é a pró-pria estima desvirtuada. Mas do reto apreço nada temos a temer; ainda mais, devemos sugeri-lo. Mostremo-nos respeitosos perante o misterioso porvir, ante as exuberantes possibilidades da vida. Façamos-lhe sentir que deles esperamos grandes coisas. Deste modo educamos os jovens no reto apreço de si próprios, que não lhes permite rebaixarem-se com o pecado da imoralidade, tor-nando-se ordinários, débeis, flores murchas, futuro para sempre frustrado.

Não podemos sequestrá-los do mundo, não podemos encerrá-los hermeticamente, para preservá-los da tentação; inculquemos-lhe, portanto, o respeito de si próprios, um modo de pen-sar elevado, asco ao lodo, a felicidade de pensar que nada no mundo pode privar-lhe da brancura da alma.

3. E deste modo chegamos ao terceiro dever: ajudar o jovem a trabalhar na formação da sua pessoa, no robustecimento da sua vontade.

Vontade! Vontade forte! Qualidade excelsa que se vai extinguindo. Quantas vezes os edu-cadores verificarão com tristeza como até os jovens bem intencionados são levados, sem oferece-rem a menor resistência, pelas vagas da indolência e da voluptuosidade, só porque em casa os edu-caram com mimos excessivos.

A maior parte das quedas morais poderiam evitar-se dedicando-se mais à educação, ao robustecimento da vontade dos jovens. Por falta dessa formação a vida do jovem e naturalmente, mais tarde, também a vida do adulto, parece uma candeia acesa em lugar sujeito a correntes de ar: a chama inclina-se, débil e impotente, a cada sopro.

Podemos e devemos educar a vontade por meio de livros, com juízo reto e espírito de abnegação. Mas não basta. Na confissão e comunhão temos duas forças tão apreciáveis, de tal valor educativo, que por causa delas nos olham com inveja todos os sistemas educativos pedagó-gicos do mundo; esforcemo-nos para que a juventude tire abundante proveito de tão apreciado

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Santa Inês

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tesouro. Este é o auxílio positivo que se deve prestar aos jovens, educando-os para uma vida pura.

No entanto, há uma parte negativa. Não basta ajudar os jovens; é nosso dever defendê-los tam-bém, defendê-los dos perigos que em nossos dias os cercam em numero e medida espantosos. Se alguma vez foi coisa fácil conservar a vida pura, no meio dos excessos desenfreados da época presente é obra, simplesmente, de herois.

II De que é que temos de defendê-los?

1. Em primeiro lugar, temos de defender os jovens da imprudência e leviandade de certas

mães. Como? Será possível? Defender os filhos das próprias mães? Mães! Dirijo-vos algumas palavras, palavras sinceras, só para vós. Se vos disser sem dis-

farce que a vossa filha, jovem piedosa, de alma límpida, atenderia, muitas vezes, com mais solici-tude, à sua alma, vestir-se-ia com mais decência, andaria com mais pudor, se a sua própria mãe a não obrigasse a usar outras vestes e tomar outras atitudes? Obriga-a... por amor, por ternura, concedo; mas por amor errado.

Sei que acabo de abordar um assunto difícil que acarretará inúmeros rancores. Procuro, pois, aliviar-me um pouco, sacudir de antemão o peso das responsabilidades. Não censurei nin-guém, não farei mais que repetir o caso de Lot e suas filhas, referido na Bíblia. Como se corrom-peram as filha de Lot? A Bíblia não explica pormenorizadamente, não conta o modo de pensar da mulher de Lot; mas imagino que deveria pensar mais ou menos do seguinte modo:

Lot, ao principio, não habitava em Sodoma; vivia com o seu parente Abraão. Mas com o decorrer do tempo o espaço tornou-se demasiado pequeno. Seria a mulher de Abrão que , aborre-cida com a simplicidade rural, lhe indicou o partido que devia optar? Para um casal de idosos como Abraão e Sara, tudo bem... mas para mim, que tenho filhas solteiras, viver sempre no cam-po?

Que diferente é a vida em Sodoma! Ali poderemos apresentar nossas filhas na sociedade mais distinta. Acostumar-se-ão às maneiras finas, chamarão a atenção com os vestidos da moda, podendo encontrar, assim, um bom marido. Sim, sim, minhas filhas, só deste modo conseguireis casar... Que dizeis? Que os jovens de Sodoma são frívolos? Ah! Isso é o que dizem os que lhes tem inveja!

Além disso, mesmo que estejam bem humorados de vez em quando e se permitam certas liberalidades, não se deve assustar-se com tão pouco. É necessário fazer vista grossa a certas coi-sas... E, além disso, minhas filhas, tereis muito cuidado convosco, e se realmente lavrar certa fri-volidade entre os moços de Sodoma, não será convosco que tal acontecerá. Deus nos livre! Nem eu em tal consentiria! Por outro lado, não deixa de ser verdade que só se é novo uma vez na vida e só se vive uma vez...

Era assim, pouco mais ou menos, que pensava a esposa de Lot, perante as filhas. Não o consigna a Sagrada Escritura, mas alguma coisa o afirma. Diz que as filhas de Lot, que junto do piedoso Abraão viam, até aí, bons exemplos, e os seguiam; em Sodoma viram uma imensidade de pecados e, por fim, elas próprias delinqüiram de modo assustador (GN. XIX, 31-38).

E não teriam chegado a essa ruína se a mãe não as tivesse levado, levianamente, para um meio daqueles. Não seria demais que as mães meditassem na sorte das filhas de Lot.

2. - Defendamos os nossos jovens. De quê? Dos mil e mil perigos do grande mundo. Pais! Sabeis, por acaso, que livros lê a vossa filha e com quem se corresponde? Que com-

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panheiros tem o vosso filho e quem são os seus ami-gos íntimos?... Não digo que andeis sempre atrás deles; não seria o mais acertado. Mas se as relações entre pais e filhos forem de absoluta confiança, então a filha não lerá, em segredo, livros suspeitos, de que a mãe nada sabe, nem o filho terá patuscadas às escondidas dos pais. Certa mãe apresenta-se no médico, muito inquieta: - Venho por causa do meu filho, Doutor. Tem dezessete anos. Gostaria que o examinasse. Mas vim adiante para lhe contar certas coisas. Há uns meses que o pequeno anda muito nervoso, ensimesmados, sem apetite. Fala pouco, está sempre a ler... - Perdão, minha senhora – interrompe o médi-co. - Que livros é que o seu filho lê? - Que livros lê? Ah... Não sei bem... Afinal de contas não posso estar sempre a vigiar um rapaz tão crescido. - Hum... Outra pergunta, se me permite: o seu filho passa as noites em casa? - Sim... quero dizer... Ás vezes, passa. Mas vai freqüentemente ao teatro, ao cinema, a bailes. - Sim, já se vê. Mas decerto acompanhado pelo pai... - Ora, doutor! Como é que seria possível acompanhar um rapaz daquela idade? Não sabe que em Paris enviam até às próprias moças convites com estas letras: «S.b.» - S.b.? Que quer isso dizer? - Sans bagage. Vem sem bagagem, quer dizer: não venhas com os pais. De resto o nosso filho diz-nos que freqüenta uma boa sociedade: como é que podíamos ir indagar se é verdade? - Obrigado, minha senhora – cortou o médico. Está feito o meu diagnóstico. Em vez de me trazer o rapaz leve-o a um confessor. - A um confessor? – perguntou, surpreendida, a mãe, que há muito não se confessava. - Sim, a um confessor. Porque o seu filho tem um mal que não há de ser curado pela ciên-cia médica, mas pela religião. Defender os jovens dos milhares de perigos que os ameaçam! 3. – Outro dever: Defendê-los – tanto quanto possível – do mau exemplo que lhes dão os homens já feitos. Transcrevo algumas linhas duma carta que me foi dirigida por certa mãe. «Um filho meu, de dezoito anos, estava em uma clínica com uma pneumonia; um compa-nheiro de cinqüenta e dois anos contou-lhes as suas viagens, a vida noturna, os excessos de Paris...» Não continuo. Gela-se-me o sangue. Faz-me lembrar uma cena da obra insigne do grande poeta católico Dante Alighieri, uma cena que produz calafrios. Segue através do inferno e vê que uma asquerosa serpente acomete um desgraçado réprobo. Enrosca-se-lhe no corpo, cinge-o desde a cabeça aos pés, une-se a ele como a hera à árvore. Os circunstantes notam com espanto como se conforma o rosto daquele homem, como vai adquirindo o aspecto repulsivo da serpente, à medi-

Santa Luzia

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da que esta lhe silva ao ouvido: «Quero que te arrastes na lama, como eu!» Que gozo infernal o dos homens corrompidos, que sentem uma satisfação particular quan-do iniciam nos pecados mais tremendos os jovens que nada sabem, ainda não contaminados! Parece que nunca ouviram as palavras fulminantes do Senhor: «Quem escandalizar a um destes pequeninos que acreditam em mim, mais lhe valera que lhe atassem ao pescoço uma dessas pedras de moi-nho que um burro faz mover e assim o lançassem às profundezas do mar» (S. Mateus, XVIII, 6). Saibam esses o que deixou escrito o nosso grande Pázmány: «Apenas duas vezes vemos no Evangelho que Cristo haja agredido alguém durante a sua passagem pela terra: e só aqueles que profana-vam o templo... Ele que era a própria mansidão, que curava os males e os próprios pecados pela palavra, bateu, azorragou, enxotou e perseguiu os que não respeitavam o templo feito de pedra; que fará com os que profanam o templo vivo de Deus; e o profanam, não vendendo animais para o culto divino, mas sim com horrorosas imundícies?» Que corrupção horrível a daquele que procura com entusiasmo, para companheiros de vício, justamente os que ainda nada sabem do pecado! Que será que move e aguilhoa e tortura estas almas inteiramente corrompidas, para que não possam sofrer a seu lado as puras, as incon-taminadas, as inocentes? Quase nos inclinaríamos a acreditar no que nos conta um antigo escritor, Plínio, a respeito dos elefantes. Afirma ele que um elefante sedento, se chegar a um rio, em cujas águas veja espe-lhada a própria imagem, se assanha horrorosamente e com a tromba e os pés remove, espezinha o lodo até que a água se turve completamente e então é que a toma em longos sorvos. Os natura-listas já desmentiram esta ingênua afirmação; contudo parece haver homens que dão realidade à fábula, que se enraivecem à aproximação da água pura, que são dominados pela cólera ao desco-brirem, na pureza daquela, a imagem da sua própria corrupção e procuram espezinhar, com pés sujos, aquela alma, até que fique igualmente enlameada. Pais! Educadores! Defendei as almas puras, as almas límpidas que vos foram confiadas! Sou obrigado a exprimir a terrível verdade. Até mesmo a Roma pagã se preocupava mais com a moralidade que as grandes cidades dos atuais países cristãos. Um dia fez-se em Roma uma terrível descoberta. Sabia-se que uma sociedade secreta, de uns oito mil membros, seguia este principio fundamental: «Saber que no mundo nada é proibido. Eis toda a religião!» Horrível princípio! E assim era a sua vida: nas suas reuniões praticavam as mais atrozes imoralidades... Um dia, porém, encontrou-se a pista desse ninho de víboras, tornou-se público o segredo. E o povo romano fechou as portas da cidade e prendeu todos os membros da seita... depois pro-cedeu ao julgamento. E embora entre os culpados houvessem jovens distintos, senadores idosos, mulheres, a nada cedeu Roma: os quatro mil principais culpados – quatro mil! – foram executa-dos, desterrados os restantes. Tudo isto podemos ler circunstanciadamente no livro 39 de Tito Livro. Assim defendia a Roma pagã a sua moralidade. Sigamos agora pelas ruas de uma grande cidade moderna e sentiremos oprimir-se-nos o coração: pobres jovens! São presa inerme dos horroro-sos pecados que os espreitam a cada esquina! De vez em quando toda a sociedade é percorrida por um calafrio, porque numa sessão dos Tribunais se descobre, no seu horripilante realismo, um foco de imoralidade da nossa época. Que horror! Causa medo tamanha corrupção! Agora pergunto eu: E poderia ser de outra maneira? Teatro, cinema, revistas ilustradas, literatura, rua, montras, sociedade, tudo, tudo, dia após dia, entoa hosannas à frivolidade e festeja o pecado. Não há na grande cidade moderna um lugar único, nem tão pequenino como a planta do pé, onde o homem possa viver a salvo de excitação

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artificial dos instintos. E há de causar-nos espan-to que nos olhos dos nossos jovens de quinze ou dezenove anos arda já o fogo devorador dos desejos que queimam o corpo e a alma, extin-guem toda a alegria e entusiasmo pelo trabalho? E havemos de admirar-nos se nos peitos juvenis erguerem a voz forças e desejos que não é possí-vel satisfazer sem enorme desgaste, nem lícito atender sem aceitar os sagrados compromissos que dizem respeito à geração futura? E há de surpreender-nos que este pecado vá dizimando e que, por onde passe, torne pálidos os rostos juvenis onde fenecem as rosas da vida, se turve o brilho dos olhos, se verguem os ombros? Homens! Homens de idade madura! Não vos irriteis se vos digo sem hesitações: Perdem-se os nossos jovens e em grande parte sem culpa sua. Corrompem-se e não são eles os responsáveis. A culpa de se poder assassinar em massa uma geração moça deve-se, em primeiro lugar, aos homens que já atingiram a maturidade. O movimento anti-tuberculoso em França lançou, anos atrás, um belo selo de beneficência. Uma moça abre a janela e de rosto radiante grita a plenos pulmões, olhando para o sol: vida! Vida! Pois bem: possuímos um tesouro mais valioso que a vida corporal: a vida do espírito; e existe um perigo de contágio mais grave que o da tuberculose: o veneno da imoralidade. Há muitas coisas incompreensíveis neste mundo. Mas a que menos compreendo é esta: que haja homens adultos, pais que podem olhar impassíveis, sem proferir palavra, para a propa-gação desse bacilo e ver que a rua, as montras, as licenciosas peças teatrais, o cinema, a revista ilustrada, os comerciais, espezinham, com botas enlameadas, as mais delicadas flores da alma juvenil, corrrompendo-lhe a saúde, destruindo-lhe o espírito, curvando-lhe os ombros... contami-nando toda a pátria e levando-a por caminhos de perdição. Falamos, neste capítulos, de coisas muito tristes. Não vamos encerrá-lo em meio de tão sombrio desalento. Tive necessidade de mostrar muitas sombras negras da vida; agora, porém, no final, há de um raio de sol rasgar as nuvens negras e dar expressão a este pensamento: «Ah! quão bela é a geração casta!» Esta frase, cheia de santo entusiasmo, é da Sagrada Escritura. O texto, na íntegra, é como segue: « Oh! Quão bela é a geração casta de esclarecida virtude! Imortal é a sua memória e honrada perante Deus e os homens. Quando está presente imitam-na e quando se ausenta sentem-lhe a falta e, coroada, triunfa eternamente, ganhando o prêmio dos combates pela castidade» (Sabedoria, IV, 1-2). De onde brota este entusiasmo desusado da Sagrada Escritura? Que é que comunica tanta formosura e tanto valor à virtude da pureza? É o fato de por meio dela se restaurar entre o corpo e a alma a harmonia que Deus outor-gou ao homem quando da criação e que foi destruída pelo pecado original. O campo de ativida-de do nosso espírito é o corpo; o seu dever é assegurar a supremacia da razão e da vontade sobre

Santo Estanislau

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a matéria e os instintos. Assegurar esta supremacia da alma é que constitui a maior dificuldade no terreno do sexto Mandamento; mas também, quando se consegue esse objetivo – e é ao que chamamos virtude da pureza – é que melhor se restaura o equilíbrio interior, que se alcança a ordem, a paz, a alegria. E essa alegria íntima da alma não fica oculta, antes comunica um encanto especial também ao exterior, ao corpo, e dá tal formosura sobrenatural às feições, manifesta-se de tal forma em todos os atos do homem, na sua personalidade, que todos exclamam com as pala-vras do escritos sagrado: Oh! Quão bela é a geração casta! Estes homens que sabem sorrir constantemen-te, até no meio da desgraça! Estas almas cheias de sol mesmo sob a tempestade! Estes «super-homens» que triunfam e cantam vitória sobre os pântanos dos desejos instintivos! Estes invictos heróis do caráter e da vontade firme! Quereis que sejam assim os vossos filhos? Quereis que sejam assim as vossas filhas? - Queremos. - Quereis? Então ajudai-os; então defendei-os; então educai-os de maneira que no roble milenário da nação desabroche na sua fragrância, como chuva de flores, uma juventude de olhos como estrelas, de fronte ergui-da, de rosto aberto, de corpo robusto... uma juventude casta.

Será possível guardar o sexto Mandamento?

É um quadro que infunde pavor o que apresenta o Danúbio, com aqueles enormes blocos de gelo, ao cabo de um inverno rigoroso. Nas margens, os paredões que formam o canal: entre eles a corrente impetuosa. Um bloco segue-se a outro bloco, e, entrechocando, quebram-se, trituram-se, moem-se. O gelo despedaça-se com grande fragor e lá vão aos encontrões... Dois mundos potentes, de forças contrárias, estão em luta: um é fortaleza firme – o paredão da margem; outro é o rio caudaloso, atulhado de blocos de gelo. Ai do pedaço que, impelido pela corrente, vai chocar com a parede! Parte-se, esmigalha-se, desfaz-se em água. Pior sorte seria a do homem que se atrevesse a descer da margem firme e a instalar-se em um desses blocos! Contudo é corrente caudalosa, levando adiante de si blocos de gelo, a que hoje arrasta a Humanida-de. Muros firmes sãos as duas tábuas de pedra do Decálogo. Principalmente o sexto e o nono Mandamentos erguem-se como dois paredões, nas margens do rio cheio, para que as águas lodo-sas e a malária não invadam a terra lavradia da vida humana digna deste nome... No rio flutuam os blocos: os blocos dos princípios modernos, sedutores, agradáveis, frívolos; os blocos dos dese-jos instintivos, das paixões devoradoras, dos falazes sistemas filosóficos e dos sofismas; e estes blocos partem, mordem, gastam a força da vontade. Quem pode ser bastante esforçado? Quem há aí que não fraqueje? Será possível cantar vitória sobre os blocos precipitados? Será possível guardar o sexto Mandamento? Assim fica indicado o tema do presente capítulo. Será possível guardar em nossos dias o sexto Mandamento? Vivemos num mundo alvoroçado! Não há um palmo de terra livre de tentação. É tão pavoroso o número de faces que a sedução apresenta! Será possível seguir as normas da moral neste mundo moderno? Será possível viver puros até ao altar e fiéis até à sepultura? Eis o grave problema que se debate neste capítulo. E a minha resposta será esta breve fra-se: É possível se tivermos coragem. Coragem? Para quê? I. – Para nos manifestarmos. II. – Para confiar. III. – Para lutar. Serão as três partes deste capítulo.

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I Coragem para nos manifestarmos

É uma triste evidência que o pecado seja sempre

atrevido e a virtude tímida e acanhada. Também a Humanidade de hoje se inclina timidamente perante os conceitos altissonantes da imoralidade descarada que contagia o sentir geral. E poderá surpreender-nos ainda que a corrupção cante vitória à nossa volta e que nas suas chamas envoltas em fumarada pereçam tão facil-mente as almas jovens que tão bem podiam manter-se como tochas luminosas no caminho da vida honrada? A vela só arde com luz brilhante e tranqüila enquanto a sua chama se dirige para o céu; assim que a volvemos para a terra consome-se logo.

Há muito quem seja de Jesus Cristo, a ocultas; mas não quando se encontra em presença de inimigos declarados. Muitos que guardariam a pureza da alma, se não se vissem expostos aos contínuos ataques da zombaria. Muitos que não encetariam uma conversa frívola, nem mergulhariam as almas no charco, se não se sentissem aterrorizados pelo «que dirão». Pois bem: nós buscamos almas corajosas, pessoas que se atrevam a manifestar-se contra o terror que infundem os pecadores. Espíritos fortes que não se deixem amarfanhar pelas mentiras. Valentes que possam servir de apoio aos fracos bem intencionados, como o roble à hera. Quem conheceu a história das revoluções – recordemos a Revolução Francesa ou a Revolução Comunis-ta de 1919, na Hungria – sabe que na maioria dos casos os maus vencem unicamente por causa da timidez ou da covardia dos bons. O primeiro postulado, portanto, é este: Valentia para nos manifestarmos absolutamente a favor do sentido moral da pureza. Não devemos ser espalhafatosos nem temos necessidade de nos mos-trarmos rudes. Podemos defender os nossos princípios com tanta delicadeza e espírito como fez certo missionário. A caminho da Europa, de regresso de África, o seu lugar à mesa de bordo era ao lado de uma senhora vestida no rigor da moda, isto é, muito pouco vestida. O missionário sentia-se irri-tado e pensava no melhor modo de chamar sem descortesia a atenção da sua companheira de viagem. No fim do jantar serviram fruta e a senhora, muito amavelmente, convidou o missioná-rio: «Olhe que linda maçã, Padre. Sirva-se dela». «Obrigado, minha senhora. Mas eu preferia que a comesse a senhora». «Mas por que havia de ser eu?» perguntou ela. «Porque... porque... sabe?... talvez se repetisse a cena que conta a Sagrada Escritura, a respeito de Eva... A senhora deve estar lembrada... assim que ela deu uma dentada na maçã, abriram-se-lhe os olhos e viu que... não esta-va vestida!»

Não há tema que não se possa abordar, contanto que se faça convenientemente. Não deve-mos ofender nem sequer aqueles que a cada passo ofendem as nossas convicções morais; mas, por outro lado, não devemos ser covardes nem contemporizar quando se trata de sair em defesa da moral. Ainda mais: Não só devemos ter coragem, mas ainda sentir-nos orgulhosos. Devemos ter orgu-lho de que a moral católica trabalhe pelo advento dum futuro mais formoso, mais sério, mais conseqüen-

Santa Maria Goretti

te. Porque, neste ponto, o mundo moderno é inconseqüente de todo. Em nossos dias não se estende a mão ao homem de quem se sabe que roubou a fortuna a outro – e é bem feito! -; mas ao mesmo tempo pode ser homem à modo e triunfar na sociedade aquele que roubou a pureza, a moral da alma alheia. Haverá lógica nesta maneira de proceder? Em nossos dias um estudante universitário que passe fome vai ao médico e queixa-se de que tem muita necessidade, quer dizer, em linguagem científica, que o seu instinto de conserva-ção se revolta; e o médico não lhe aconselhará o pecado, não lhe dirá que roube; mas se o jovem se queixa de que está nervoso e que o seu instinto de conservação da espécie se alvoroça, então o médico aconselha-lhe imediatamente, em nome da «higiene», que cometa o pecado... Haverá lógica nisto? Se uma mulher é hipócrita e não cumpre as suas promessas, as amigas põem-na de parte; mas se vive em adultério com o terceiro e quarto homem, e se ri dos juramentos, isso não impede que na sociedade todos a admitam. O que às escondidas tocou, uma vez que fosse, em bens alheios, deixa de ser um «cavalheiro» e não é recebido na sociedade; mas o que rouba a pureza moral de uma ou mais pessoas, descaradamente, gabando-se, contando o pecado, pode ser ainda presidente de um cír-culo e cavalheiro «comme il faut». Se alguém se apresentasse na sociedade com as vestes cheias de nódoas, as calças esfiapa-das e a cara suja seria mal visto; mas não importa que as manchas e sujidade da vida imoral lhe desfeiem completamente a alma. O que importa é que o exterior seja elegante, encantador. É como as garrafas de comerciais nos escaparates dos vendedores de vinho: por fora estão cobertas de vinhetas aliciantes, selos prateados e dourados; mas no interior apodrece um líquido cheio de miasmas. Não, não. Não é permitido escolher caprichosamente nas leis do Decálogo. Quero crer que virá uma época em que os homens condenem do mesmo modo aquele que pecou contra o sexto Mandamento e o que infringiu o sétimo ou o oitavo. Porque todos os Mandamentos do Decálogo são obrigatórios e obrigam gravemente.

II Coragem para confiar

Será possível guardar o sexto Mandamento? Sim, se tivermos confiança. Se estivermos fir-

memente convencidos de que a vida continente, a vida pura é possível, já a luta é mais fácil. E sabemos que é possível pela simples razão de que no-la exige Deus, aquele Deus que conhece melhor que ninguém os mistérios do livre arbítrio e as forças naturais e sobrenaturais de que pode dispor a alma. Mas sabemo-lo também porque, graças a Deus, é coisa provada por milhares e milhares de exemplos edificantes. 1. - «Não há meio de guardar o sexto Mandamento. Uns confessam-no abertamente, enquanto que outros o negam com hipocrisia. Na realidade não há quem o guarde. Todos vivem em luta com ele». Quantas vezes hão-de os nossos jovens ouvir este filosofar derrotista, justamente dos lábi-os dos adultos! Ah! quantos que triunfaram na luta viram o seu vôo cortado por tais locubrações e tais desatinos! Como o vitríolo corrói a rosa a abrir, assim a mentira corrói a alma dos que lutam. Sim, a mentira! Pois aquele que fala assim, além de tudo o mais, dá provas manifestas de que no seu interi-or o animal venceu realmente o homem.

Vêm moços de boa vontade queixar-se: «Ah, sim! Bem gostaríamos de levar uma vida continente, mas poderá ser? Dirija o seu olhar para o mundo atual. Não há uma única pessoa conhecida por quem eu pusesse a mão no

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fogo. Não é possível...» Assim falam muitas vezes os mais bem

intencionados. Teremos de que nos admirar se, em semelhantes disposições de ânimo, chegam a cair deveras? Acontece-lhes o mesmo que aconteceu a um tenente com um cavalo que pertencia ao capitão. Um capitão tinha um cavalo de sela, magnífico, de muita fibra, excelente animal, mas que não podia suportar as locomotivas. Nunca puderam conseguir que se aproximasse de um comboio. Em certa ocasião o oficial teve de se ausentar por uma temporada e encarre-gou um tenente de lhe treinar o cavalo todos os dias. E vejam que prodígio! O cavalo passou sem dificuldade ao lado do comboio. À noite um sargento perguntou surpreendido: «Como é que o meu tenente conseguiu que o cavalo se não encabritasse quando passou o comboio? O nosso capitão nunca foi capaz de o segurar». O tenente ficou surpreendido, porque nem sequer tinha ouvido de tal dificuldade do capi-tão. Mas no dia seguinte falhou também: não conseguiu que o cavalo passasse junto do com-boio; bastou-lhe pensar que «o capitão nunca tinha sido capaz», para ele perder o domínio dos nervos e a segurança da mão a guiar.

E é assim que caem muitos jovens bem intencionados, quando percebem que outros não puderam sair vitoriosos. Não é assim que have-mos de entrar na batalha, mas com este pensamento: É preciso, porque o Senhor quer. Então há de ser.

2. – Tenho de recordar aqui um sofisma extraordinariamente pernicioso, que prejudica de modo incalculável o ânimo de luta e a tenacidade dos que combatem. É a opinião geral nos nos-sos dias, mas falsa em absoluto, segundo a qual a continência exigida pelo sexto Mandamento, além de ser impossível, prejudica a saúde.

Sobe-nos o sangue à cabeça, de indignação, quando ouvimos semelhantes sandices e sabe-mos que, ao queixarem-se alguns moços de vertigens ou mal estar, os aconselham de maneira indigna a sacrificar a pureza, a sua pureza guardada com solicitude até à data e lhes garantem que passarão as tonturas. Não há no mundo um médico bastante ousado para exprimir em letra de imprensa a opinião de que a vida continente seja prejudicial à saúde. Mais ainda, especialistas de nome afirmam exatamente o contrário; e contudo sabemos que alguns, na clínica particular, dão conselhos totalmente opostos. Leitor amigo: se algum médico te disser que a vida de continência é impossível e que, durante a sua larga prática de várias dezenas de anos não encontrou um único jovem continente, não te admires. Claro está que não o encontrou entre os seus clientes. Os que levam uma vida pura não vão ao médico por tais achaques. Não sofrem as conseqüências do pecado, não consultam o médico por doenças que permitam esse diagnóstico. Compreende-se que alguns médicos che-guem a acreditar que a vida casta é impossível. Mas será lícito pôr a ética cristã ao nível da opini-

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Santa Gemma Galgani

ão dum médico? Será lícito suprimir o sol no céu, por causa dos que têm a vista má? Será lícito atirar ao fogo a farinha flor, por causa dos diabéticos e obrigar todos a comer pão de Graham? Acredita, jovem leitor: acredita no confessor, que é procurado pelos que pecam e pelos que lutam; pelos que sucumbem e pelos que triunfam. Acredita-me. A vida pura é possível. Que digo? «Possível?» Muito mais: contam-se aos milhares os que vivem nessa felicidade e se lançam para as alturas pelo impulso vivificante que a pureza lhes comunica.

«Mas a tentação está sempre à espreita dos meus passos e não me deixa descansar» - poderão obje-tar-me. Ah! mas isso é outra coisa! A tentação, em si, não é pecado. Ainda mais, o vencê-la é um mérito, uma virtude. Nem o próprio S. Paulo se via livre de tentações, de modo que escreve: «Foi-me dado o estímulo da minha carne que é como um anjo de Satanás, para me esbofetear». Ainda que te acometa cem vezes a tentação! Ainda que repita uma e outra vez os seus ataques! Nunca pactues com ela!

Pode servir de grande consolação às almas que lutam o caso de Santa Catarina de Sena. Viu-se acometida pelas tentações; e quando no espírito lhe entrou a bonança, perguntou, magoa-da, ao Senhor: «Ó meu Jesus, onde estavas quando aqueles horrores me atormentavam o cora-ção?» E o Senhor perguntou-lhe: «Agradavam-te?» - «Ah! de modo algum!» - respondeu a santa. «Pois fica sabendo que, mesmo nesse momento eu estava no teu coração e ajudava-te para que não encontrasses prazer nas tentações, antes te afastasses delas».

3. – Vêm outros, espíritos tristes, desalentados, almas caídas e dizem chorando: «Ai! para mim

já é tarde! Fraquejei. Haverá maneira de escalar novamente as alturas de onde caí? Vale a pena a luta para aquele que já destruiu a sua alma?»

Vale a pena. Depois da pureza intacta o mais belo adorno da alma é a pureza reconquista-da. É essa justamente a mais consoladora doutrina do Cristianismo; a qual afirma que os que se arrependem dos seus desvios e querem voltar atrás encontrarão sempre abertos os braços de Nosso Senhor Jesus Cristo. O nosso arrependimento e a santa confissão lançam um véu sobre o passado. A ternura do Senhor, cheia de misericórdia, é tão delicada, que não desperta as recorda-ções do passado desde que vivamos segundo o seu espírito no presente.

É possível que alguém caísse no pecado por leviandade da juventude e agora, em plena idade madura, tenha de reunir todas as suas forças para contra lutar o mau hábito, inveterado, de muitos anos. É possível que alguns sintam grande desânimo ao constatar que os seus melhores propósitos se inutilizam devida à fraqueza da vontade e reincidam uma ou outra vez no pecado que de toda a sua alma quereriam impedir. Não importa. O essencial é não permanecer no peca-do. Lutar constantemente! Não desanimar! O Senhor não deixa desamparados os nossos bons propósitos enquanto lutamos. A todo aquele que chora sobre o seu pecado, a todos os irmãos que lutam heroicamente, pode servir-lhes de consolação o que vão ler: Judas não calcou aos pés o sexto Mandamento e... apesar disso condenou-se, porque não quis emendar-se; em compensação Maria Madalena, que passou anos infringindo o sexto Mandamento... chegou a ser santa, porque se converteu e seguiu a Cristo.

II Coragem para lutar

Será possível guardar, hoje, o sexto Mandamento? Sim, se tivermos coragem para lutar. S. Jerônimo escreveu que os pagãos representavam a deusa da castidade com lança e bro-

quel, como se tivessem querido significar que sem luta constante não se conserva a virtude da pureza. E S. Bernardo pôde afirmar que a «castidade nos jovens é um martírio incruento». Ai! que diria

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ele hoje, quando todos os poderes adversos se conjuram contra ela!

1. – Se alguém diz que «não é possí-vel guardar o sexto Mandamento» não tem razão. Mas se disse que «em nossos dias é extraordinaria-mente difícil guardar o sexto Mandamento», então estamos de acordo. Duas circunstâncias o tornam difícil. Por um lado as manifestações da vida social moderna oferecem tentações mais numerosas e mais fortes que antigamente. Por outro lado as atuais condições de vida dificultam muito o contrair matrimônio e desse modo constituem obstáculos para a legítima solução do problema. Não podemos passar por alto a triste realidade dos jovens que crescem no meio dos mil perigos do mundo moderno, tão desvairado, e das mulheres que se vêem obrigadas a ganhar o seu pão na oficina, no estabele-cimento, expostas a muitas tentações que noutros tempos eram completamente desconhecidas.

Em nossos dias não há perseguições aos cristãos e, contudo, há mártires de Cristo. Os heróis da pureza são hoje os mártires de Jesus Cristo.

Nas sepulturas dos que morriam vítimas das antigas perseguições lemos, freqüentemente, estas palavras: «Virgo et Martyr» «virgem e mártir».

Em nossos dias não pagamos com a vida nossa fé cristã, mas a conservação da pureza implica uma luta sangrenta. Vejamos, pois, escritas na fronte dos que triunfam, nessas colunas graníticas da sociedade, as palavras honrosas: Virgo et martyr, puro e mártir.

2. – Profetas modernos, salvadores do mundo, é a vós que me dirijo agora. O homem moder-no está doente, sem cor, anêmico, achacado, sem forças, aborrecido da vida, não é verdade? É também a vossa opinião. De acordo.

Mas que remédio poderá curá-lo? A vossa receita consiste em: muito sol, ar puro das matas, céu cheio de estrelas, boas canalizações, caminhos sem poeiras... Está certo. Eu também peço tudo isso.

Mas não basta. Não se curará se não acrescentarmos o sol da fé, o ar oxigenado da moral, o céu estrelado da religião; não melhorará se não soubermos canalizar a imundície da imoralidade que transborda e desinfetar as nossas ruas dos miasmas corruptores.

Reclamais, vós, estradas de piso suave, amplas, para que as pessoas não caminhem aos solavancos. Como não havemos de concordar? Mas queremos também, com maior urgência, que a sua vida, o seu coração não dêem guarida a pensamentos e atos pavorosos.

Que mais nos é preciso ainda? Artistas! Artistas da vida espiritual. Modelar e conservar a vida pura é a mais formosa obra de arte. O bloco de mármore de Carrara não passa de rocha bru-ta; e é devido ao trabalho do artista que adquire formas belas; de modo análogo o homem que não segue a lei dos instintos, se transforma devido à inspiração, à força, à beleza, à santidade cri-adas pelo combate renhido em defesa do ideal moral e da pureza.

3. – Venha, pois, fogo; fogo; fogo... para este mundo moderno em riscos de gelar. Tanto a pureza como a impureza são fogo: são força tanto a vida casta, como a vida relaxa-

da. É paixão a ânsia de ascender e paixão o desejo de rastejar...; mas a diferença é tanta como a que vai do céu à terra.

A pureza é fogo que dá maturidade ao caráter, como à rosa o raio de sol; a impureza é

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São Gabriel da Virgem Dolorosa

fogo que destrói a vida, como a lava fumegante. A pureza é força, força ordenada que impele ao trabalho e robustece para a luta da vida; a impureza é força, força desenfreada, que derruba os diques, enche de lodo os campos de vida, que afoga num pântano as forças do homem.

A pureza é paixão que comunica coragem de viver, energias, gênio criador, vontade capaz de vencer o mundo; a impureza é paixão que faz cair inertes os braços, que transforma o coração em esponja, o sangue em podridão, em putrefação a medula. A pureza dá vida; a impureza tudo afoga em miséria. À pureza alia-se a virtude e a alegria da vida; com a impureza juntam-se o dia-bo e a morte.

Digamos, pois, sem disfarces: A sociedade mantêm-se e eleva-se quando se apóia em jovens que sabem conservar-se incólumes até no meio da vida moderna, inficionada de peste; quando conta com jovens que sabem passar, puros, por cima dos esgotos do mundo atual que tudo salpi-cam de imundícies. Estes jovens assemelham-se ao mundo de sonho dos magníficos palácios e templos de Veneza. Por baixo os canais, com águas sujas e talvez fétidas; dominando-as, erguem-se templos e palácios que de há séculos vêm deslumbrando os homens. Como podem esses palá-cios de conto de fada conservar-se puros como o ouro e firmes como o granito por cima desses canais sórdidos e movediços? Milhares e milhares de estacas fortíssimas, mergulhadas na água, cravadas no fundo, servem-lhes de fundamento, suportando o peso dos palácios.

O homem de vida pura é a única estaca em que pode firmar-se confiadamente a sociedade humana. No final do capítulo pergunto novamente: Será possível, em nossos dias, guardar o sexto

Mandamento? Sim, se tivermos coragem para nos manifestar, para confiar e para lutar; se, no meio deste mundo apodrecido, tivermos coragem para gritar: Guardá-lo-ei, apesar de tudo!

Mesmo quando este mundo frívolo destrua com mãos bárbaras o ideal de pureza, já irá crescendo entre nós a geração moça que grita com firmeza: Apesar de tudo, contra todos os ventos!

Se a impureza murcha a alma em flor, a pureza suscita em nós briosas energias; por tanto: Guardá-la-emos, apesar de tudo!

Se a impureza transforma em lava o coração, corrompe o sangue, rebaixa o homem ao nível dos escravos e lança ao pescoço da vítima as cadeias dos instintos, a pureza, em compensa-ção, forma caracteres disciplinados, conscientes, firmes, que não se arreceiem da luta, ainda que lhes custe golpes e feridas e triunfa na guerra santa dos filhos de Deus. Portanto: Guardá-la-emos, apesar de tudo...; seremos heróis!

Sejam para esses, para estes heróis, para os heróis da vida pura, para esta geração casta, as minhas últimas linhas. Rapazes! Moças! Há morte heróica e há vida heróica. Respeito e louvor aos dois. Respeito e louvor, decerto, aos jovens universitários que morreram heroicamente na guerra e cuja recordação se perpetua com lápides; mas respeito e louvor igualmente aos que vivem uma vida heróica.

Heróis, mártires incruentos, é a vós que me dirijo. Sois heróicos, vós, jovens de dezoito, vinte, vinte e quatro anos de idade, que, mesmo no

meio dos bacilos pestíferos que se resolvem aos milhões por esse mundo moderno, soubestes guardar a pureza.

Sois heroínas, vós, jovens donzelas, que, mesmo no meio dos pântanos do mundo moder-no apodrecido até ao fundo, soubestes conservar-vos como alvos e perfumados lírios do Senhor.

Sois heróis, vós, jovens universitários, colegiais, empregados, que, apesar do exemplo dos vossos companheiros, da vossa sociedade, dos vossos superiores, soubestes ser, no meio dos blo-cos de gelo, os triunfadores da pura moral.

Sois heroínas, vós, moças, empregadas de oficinas, de armazém, que dia a dia haveis de ouvir dos lábios das vossas companheiras, dos vossos chefes, gracejos de duplo sentido e propos-tas... que só têm um; e, contudo, estais dispostas a sofrer mofas, a ser preteridas, talvez a perder o

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emprego, de preferência a ceder num único ponto que vos daria aumento de soldo, uma nomea-ção, um avanço na escala, mas que...

E sois heróis vós, os «que através» das nuvens, nuvens de perfumes e de fumo de cigarros, nos salões frívolos, sabeis avistar o Monte Sinai e que apesar do palavriado oco dos «meninos bem» que fazem chacota da moral, sabeis ouvir o som trovejante da palavra de Deus. (Prohászka). Rapazes, moças, sois heróis, sois heroínas! Deus vos abençoe!

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Fraternidade Sacerdotal São Pio X - Priorado do Imaculado Coração de Maria Rua Tuiuti, 590 – Santa Maria/RS

Tel.: (55) 3028-3896 / www.fsspx-brasil.com.br

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DATAS a recordar... Setembro

3 Sábado – SÃO PIO X, PAPA E CONFESSOR 4 Domingo – XVI° Domingo depois de Pentecostes 8 Quinta – Natividade de Nossa Senhora 11 Domingo – XVII° Domingo depois de Pentecostes 14 Quarta – Exaltação da Santa Cruz 15 Quinta – As Sete Dores da Santíssima Virgem 18 Domingo – XVIII° Domingo depois de Pentecostes 21 Quarta – São Mateus, Apóstolo e Evangelista e Têmporas 23 Sexta – Têmporas 24 Sábado – Têmporas 25 Domingo – XIX° Domingo depois de Pentecostes 29 Quinta – DEDICAÇÃO DE SÃO MIGUEL ARCANJO

Outubro

2 Domingo – XX° Domingo depois de Pentecostes 7 Sexta – Nossa Senhora do Rosário 9 Domingo – XXI° Domingo depois de Pentecostes 11 Terça – Maternidade da Santíssima Virgem 12 Quarta – NOSSA SENHORA DA CONCEIÇÃO APARECIDA 16 Domingo – XXII° Domingo depois de Pentecostes 18 Terça – São Lucas, Evangelista 23 Domingo – XXIII° Domingo depois de Pentecostes 28 Sexta – Santos Simão e Judas, Apóstolos 24 Quarta – São Bartolomeu, Apóstolo 30 Domingo – CRISTO REI

CATECISMO NO PRIORADO

Preparação para a Primeira Comunhão e Crisma.

Crianças & Adultos Todos os sábados às 15h no salão parroquial

Inscrição na saída da Missa do domingo