sonho de ordem (omb)

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  • 1. Sonho de OrdemDivergncias na Ordem dos Msicos do Brasil

2. Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)Equipe:(Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)Andr Carbone, Helena Ladeira, Lucas Caram, So58 Marcela Rahal e Vinicius AndreoliSonho de Ordem: Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasil /Andr Carbone et al. 2007.72 f.Monograa (graduao em Jornalismo) Faculdade de Jornalismo e RelaesPblicas da Universidade Metodista de So Paulo, So Bernado do Campo, 2007.Orientao de: Herom Vargas. So Paulo : All Print Editora, 2007.1. Ordem dos Msicos do Brasil 2. Msicos Prosso3. Msicos Sindicato I. Carbone, Andr CDD 070.4 Sonho de Ordem Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasil Projeto Experimental, na modalidade Livro-reportagem apresentado emcumprimento parcial s exigncias do Curso de Jornalismo, da Faculdadede Jornalismo e Relaes Pblicas, da Universidade Metodista de So Paulo, para obteno do ttulo de Bacharel em Comunicao Social,Habilitao Jornalismo. Projeto desenvolvido pelos alunos: AndrCarbone, Helena Ladeira, Lucas Caram, Marcela Rahal e Vinicius Andreoli, sob a orientao do professor Herom Vargas. 2007 SO PAULO - BRASIL 3. SONHO DE ORDEMDivergncias na Ordem dos Msicos do BrasilCopyright 2007 by Andr Carbone, Helena Ladeira,Lucas Caram, Marcela Rahal e Vinicius AndreoliTodos os direitos reservados. Edio nica proibida a venda e reproduo parcial ou total sem autorizao dos autores.Capa, projeto grco, editorao e impresso:www.allprinteditora.com.br [email protected](11) 5574-5322CAPA: Fernando Augusto AlvesReviso de texto:Rosana Vargas UMESP Universidade Metodista de So PauloREITOR: Marcio de Moraes VICE-REITOR: Clovis Pinto de Castro FAJORP Faculdade de Jornalismo e Relaes Pblicas Curso de Jornalismo DIRETORA DA FAJORP: Maria Aparecida Ferrari COORDENADOR DO CURSO DE JORNALISMO: Rodolfo Carlos Martino classe musical brasileira,COORDENADORA DOS PROJETOS EXPERIMENTAIS: Vernica Patrcia Aravena Cortes que enriquece a cultura nacional 4. Agradecimentos Obrigado a Antnio Carlos Jobim, Vincius de Moraes, ChicoBuarque, Elis Regina, Edu Lobo, Milton Nascimento, Djavan, NoelRosa e tantos outros que emprestaram seu talento e vida para que amsica se tornasse uma das paixes do brasileiro. Este trabalho no seria possvel sem a colaborao de algu-mas pessoas: nosso orientador e amigo, professor Herom Vargas,a professora Veronica Corts, nossos familiares e amigos, que ti-veram a pacincia de nos aturar nos ltimos meses, e a aquelesque, de uma maneira ou outra, estiveram ligados ao trabalho destelivro-reportagem. Um agradecimento a todos os entrevistados, que emprestaramseus relatos a este trabalho, em especial aos maestros Osmar Barutti,Eduardo Camenietzki, Nelson Ayres, Amlson e Adylson Godoy, Nel-son Macedo e Randolf Miguel, aos advogados Marcel Nadal e Rober-to Mello, ao socilogo Amaudson de Souza, aos compositores JucaNovaes e Jos Carlos Costa Netto, ao presidente do Conselho Regio-nal de So Paulo da OMB, Wilson Sandoli, e seu vice, Roberto Bueno,ao presidente federal da entidade, Joo Batista Vianna, e ao advogadoda Ordem dos Msicos paulista, Humberto Pern Filho. 5. SumrioUma Classe Desordenada ....................................... 11Captulo I Um sonho para poucos Criao da Unio dos Msicos do Brasil ....................... 15 Cenrio musical e a criao da OMB ............................ 16 Os primeiros anos da OMB e o caso Ary Barroso ......... 20 O Golpe Militar e o incio da Era Sandoli .................... 23Captulo II A Ditadura ............................................ 27 Caa aos alienados ..................................................... 29 De quem so os Direitos Autorais? ................................ 33Captulo III A ameaa da democracia................... 43 Despertar dos Msicos................................................... 54Captulo IV Ordem gera desordem....................... 57 Ordem e Sindicato.......................................................... 62 Fim ou recomeo?.......................................................... 63Ordem para cantar? ................................................. 65 Muito Obrigado ............................................................... 65Referncias Bibliogrficas ....................................... 67 Entrevistas realizadas ..................................................... 68 Arquivos Consultados .................................................... 70 Sites consultados ........................................................... 71 6. Uma Classe DesordenadaA msica brasileira reconhecida mundialmente como uma dasgrandes virtudes do nosso povo. Lapidada ao longo dos anos, ela trazconsigo a identidade do brasileiro, o talento imprevisvel e difcil deexplicar, comparvel nossa intimidade com a bola nos ps j co-roada com cinco ttulos mundiais. Assim como o msico, o boleirotambm um artista, ainda que em uma viso romntica demais paraos novos tempos.Na classe musical, muitos compositores ganharam nome no ex-terior depois de fazerem sucesso no Brasil, como Tom Jobim, Car-men Miranda, Caetano Veloso, Gilberto Gil e Lenine. Por outro lado,este reconhecimento sempre foi inversamente proporcional ao dosmsicos acompanhantes. Por este mesmo motivo, gnios como Mo-acir Santos, Hlio Delmiro e Toninho Horta tiveram de deixar o paspara conquistar o pblico.Foi pensando nisso que, h 47 anos, Jos Siqueira convenceuo ento presidente Juscelino Kubitscheck a criar uma entidade parafiscalizar e valorizar a profisso do msico, a Ordem dos Msicos doBrasil (OMB). Porm, assim como Siqueira, o sonho de ordem naclasse acabou frustrado. Com apenas quatro anos de vida, a entida-de sofreu interveno da ditadura militar. Hoje, 43 anos depois, pelomenos um dos interventores continua no poder, o presidente da re-gional paulista e ex-crooner Wilson Sandoli.Depois de Siqueira, muitos tambm tentaram organizar, politi-camente ou no, a categoria; quase todos sem sucesso. Os relatos serepetem, com o inevitvel final: constitui-se uma associao, a adesoda classe grande mas, depois de certo tempo, o apoio se esvai pau-latinamente. Porm, a verdade que, desde o comeo, a organizaopoltica da classe pela Ordem esteve restrita a um grupo seleto: osmsicos eruditos. Os chamados msicos populares, que formam amaioria, ficaram de fora das decises da OMB, com direito a apenasuma carteira de trabalho. Aos msicos eruditos, foi garantida a opor-tunidade de se elegerem e de votarem, sob o pretexto de que os ou-tros seriam instigados a buscar mais especializao para poderemparticipar das decises polticas da classe. 7. 12 SONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasil No entanto, o que se viu foi exatamente o inverso. Os msicospassaram a sobreviver apesar da OMB e da desorganizao da classe eacabaram por tornar-se uma categoria cada vez mais desprotegida. Do sonho de Siqueira, passando pela crise dos direitos autorais,pelo fim da ditadura e chegando aos dias de hoje, a Ordem dos M-sicos do Brasil pouco mudou. Uns defendem sua extino, outros aretomada de poder pelos msicos. 25 anos atrs, a Virada Paulistareconhecia que estes profissionais precisavam se organizar fora dospalcos para existir dentro deles. Este um livro baseado nos relatos das pessoas que, nos lti-mos anos, tentaram organizar politicamente a classe musical, dentroe fora da Ordem, e de como estas tentativas quase sempre termina-ram em fracasso. Captulo IUm sonho para poucos 8. 12 de setembro de 1960, jardins do Palcio do Catete, cinco ho-ras da manh. Ningum dorme, o som de uma orquestra, sob a re-gncia do maestro Eleazar de Carvalho, toca a folclrica cano PeixeVivo. o dia do aniversrio de Juscelino Kubitschek. Sinal de apreoao presidente? No, esta foi a maneira encontrada por um grupo demsicos, organizados desde 1957 na Unio dos Msicos, para fazercom que o presidente e o Brasil acordassem para o problema da regu-lamentao da profisso de msico no pas. Este ato simblico foi eficaz. Trs meses depois, no dia 22 de de-zembro, o presidente sancionou a lei 3.857/60 responsvel pela cria-o da Ordem dos Msicos do Brasil (OMB). Criao da Unio dos Msicos do Brasil Estamos em 1957. Os msicos so vistos pela elite da sociedadebrasileira e pela classe mdia como marginais. Qualquer um que por-te em pblico um violo j logo taxado de malandro e de contribuirpara a vadiagem. Descontente com essa viso, o paraibano Jos de Lima Siqueira,compositor, regente, musiclogo e advogado, lana as bases para acriao da UMB Unio dos Msicos do Brasil. Com ela, esperavasolucionar a questo essencial para a categoria: a regulamentao, avalorizao e o reconhecimento legal da profisso de msico. Siqueira no estava sozinho nessa empreitada. Maestros consa-grados como Heitor Villa-Lobos, Radams Gnatalli e Francisco Mig-none abraaram sua idia e contriburam para tentar unir a classemusical, antes to omissa e dividida. 9. 16 SONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasil SONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasil 17 De 1957 at 1958, a Unio dos Msicos atuou como uma espciefase desenvolvimentista do ento presidente Juscelino Kubitscheck. Ade associao musical que abrigava desde sindicatos estaduais at as cultura do ps-guerra norte-americana e a forte influncia do proces-bandas militares que lutavam por maior autonomia e segurana dos so de industrializao culminaram na gerao de novos gneros mu-msicos profissionais. sicais, como a bossa nova, as canes de protesto e a jovem guarda. Durante o ano em que comandou a UMB, Siqueira redigiu umA consolidao da indstria cultural contribua para a pulsan-anteprojeto de lei para a criao da Ordem dos Msicos do Brasil.te divulgao de recentes artistas e grupos musicais, popularizadosA proposta deu certo e o paraibano viu seu sonho se concretizarcom os inmeros festivais promovidos pelas emissoras de televisoquando foi eleito presidente da OMB em 1960, ano de sua criao. da poca, o que colocava em pauta, entre outras, a questo do direitoO sonho, porm, durou apenas quatro anos. O golpe militar ps fimautoral, objeto da Ordem dos Msicos do Brasil.ao comando da entidade que representava a mais refinada e criativa O samba e a marchinha, antes confinados aos morros e su-msica brasileira. Acusados de pertencerem ao Partido Comunista, brbios do Rio de Janeiro, conquistavam o pas e todas as classesJos de Lima Siqueira e outros dirigentes regionais, como Constan- sociais nas dcadas de 1930 e 1940. E a influncia sempre crescentetino Neto (que presidia o Conselho da Ordem em So Paulo e do da msica estrangeira contribuiu para que o samba dessa fase fosseSindicato), foram afastados de seus cargos. Siqueira foi uma das grandes figuras da msica brasileira dochamado por muitos crticos musicais de antiquado ou mesmosculo XX. Sua importncia como educador e o papel de lideranaquadrado, produto do contato com a indstria fonogrfica e comque exerceu no meio musical de sua poca transformaram-no em a msica norte-americana. No final de 1950, jovens compositorespea fundamental para a histria da msica no pas, principalmente e intrpretes criaram uma batida diferente e novas cadncias parapor defender os interesses da msica brasileira e de seus profissio- o samba que ficaram conhecidas como bossa nova, um gnero quenais. Toda a obra de Siqueira est vinculada a uma esttica naciona- foi responsvel pela criao de comportamentos que mudaram olista, com forte influncia do nordeste brasileiro.panorama musical nacional. Jos de Lima Siqueira faleceu, aos 78 anos de idade, na cidade do Elementos desse novo movimento eram diferentes do corpo so-Rio de Janeiro, no dia 22 de abril de 1985. Alm de peras, cantatas cial que sempre caracterizou a msica popular brasileira. Os ideali-e concertos, deixou um currculo de agitador cultural incomparvel zadores da bossa nova eram oriundos da classe mdia carioca, compara a poca. Criou e dirigiu trs orquestras a Sinfnica Brasileira,educao escolar e musical mais formal e completa que qualquer ou-a Sinfnica do Rio de Janeiro e a Sinfnica Nacional e era membrotra gerao anterior de msicos populares. O novo ritmo, os diferen-fundador da Academia Brasileira de Msica, alm de professor dates acordes e melodias criavam uma msica sofisticada aos ouvidosEscola de Msica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). da sociedade, com canes influenciadas pelo jazz norte-americano combinadas com a msica impressionista, a incorporao de disso- nncias, letras que falavam sobre as belezas do Rio de Janeiro, Co- Cenrio musical e a criao da OMB pacabana, mulheres cariocas, o Corcovado. Tudo fazia lembrar umaA riqueza musical produzida nas dcadas de 1950 e 1960 levou cidade maravilhosa que no apresentava problemas sociais. legitimao de um novo campo cultural incitando o surgimento Joo Gilberto, Tom Jobim e Vinicius de Moraes transformaramde demandas voltadas para a valorizao do direito autoral e da pro- a bossa nova em msica popular brasileira para exportao, com umfissionalizao, domnio que a criao da OMB procurava atender. estilo musical capaz de juntar a alegria do ritmo brasileiro com as so-Nesse perodo, o Brasil atravessava um momento impulsionado pela fisticadas harmonias do jazz americano. A msica brasileira comeou 10. 18 SONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasil SONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasil 19a se destacar fora do pas, principalmente nos Estados Unidos, paravigente na sociedade que consumia produtos estrangeiros. Enquantoalm do exotismo marcado por Carmen Miranda. a bossa nova seguia cantando o amor, o sorriso e a flor, as canes deEm outra linha, a chamada cano de protesto tinha como ca-protesto falavam a respeito dos problemas da vida cotidiana, de fatosracterstica a valorizao da arte nacional e popular e no via comreais do dia-a-dia.bons olhos as inovaes tecnolgicas que eram introduzidas por ou- A criao do CPC tem lugar no governo de Joo Goulart (1961-tros grupos musicais, como a guitarra eltrica, nem simpatizava com1964), em um contexto de forte mobilizao poltica, com a expan-as letras centradas no amor e rica em imagens, como a do barquinhoso das organizaes de trabalhadores, no campo e nas cidades. Aa deslizar no macio azul do mar dos compositores da bossa nova. militncia poltica e o engajamento cultural andavam juntos j queOs adeptos dessa linha eram, em sua grande maioria, ligados ao os temas do debate poltico repercutiam diretamente nas produesCPC (Centro Popular de Cultura) da Unio Nacional dos Estudantes artstico-culturais.(UNE) e ao Partido Comunista Brasileiro (PCB), que ocupava lugar O golpe militar de 1964 traz consigo o fechamento do CPC, ade destaque no quadro cultural da poca, alm de atrair formadores priso de artistas e intelectuais e o exlio poltico. Mesmo assim, elesde opinio, como jornalistas, artistas, intelectuais e profissionais libe- atuam clandestinamente e ecos do projeto cepecista refletem em ini-rais em geral. ciativas posteriores, como no clebre show Opinio, em dezembro deCriado em 1961, na cidade do Rio de Janeiro, o CPC tinha 1964, que rene Z Kti, Joo do Vale e Nara Leo.como finalidade a tentativa de construir uma cultura nacional, po-O surgimento de um outro movimento musical, aparentementepular e democrtica, por meio da conscientizao das classes po-muito mais apoltico que os outros da poca, foi o da jovem guar-pulares. A idia norteadora do projeto diz respeito noo de arte da. Sob influncia do rock, apresentava a rebeldia do jovem dos anospopular revolucionria, concebida como instrumento privilegiado 1950 e incio de 1960. Cantavam melodias alegres e letras que exalta-da revoluo social. vam os carres, os amores perdidos e as festas de arromba. A jovemA encenao de peas de teatro em portas de favelas e sindi- guarda acabou por invadir os meios de comunicao com seus pro-catos, a publicao de cadernos de poesia vendidos a preos popu-gramas de auditrios.lares, a realizao pioneira de filmes autofinanciados; tudo isso eraO movimento, apesar de no defender nenhuma transformaoimpulsionado pelo CPC, cuja proposta ideolgica fora sistematizada poltica, revolucionou o mercado fonogrfico brasileiro revelandono Anteprojeto do Manifesto do Centro Popular de Cultura, de au- Roberto Carlos, Erasmo Carlos, Wanderla, entre outros que colo-toria do socilogo Carlos Estevam Martins (1962), primeiro diretor cavam o i-i-i como mais um gnero musical. Tratava-se de umda instituio.movimento otimista, como eles mesmos caracterizavam. No faziamDe acordo com o Manifesto, a arte do povo de ingnua cons-msica para reclamar da vida, falar da fome ou da seca e sim paracincia, desprovida de qualidade artstica e de pretenses culturais. ajudar o pobre sofredor a sorrir e a cantar, sem faz-lo lembrar de suaPara os cepecistas, fora da arte poltica no existia arte popular.vida miservel, apenas fazendo-o danar.Um dos primeiros resultados dessa linha foi lanado em 1962Os anos de 1960 consolidaram a TV no Brasil. Os programas dee trata-se do compacto duplo chamado O Povo Canta, editado pelomsica surgiram como um movimento indito de valorizao paraCPC. O disco trazia msicas como O Subdesenvolvido, de Carlinhos esses gneros musicais e, principalmente, para os artistas, que viramLyra e Francisco de Assis, Joo da Silva ou um falso nacionalista, deneste meio uma maneira de aproximar a populao dos seus traba-Billy Blanco, e Z da Silva um homem livre, composto por Geni Mar- lhos. Isso marcou a TV e a prpria msica brasileira. Nessa poca,condes e Augusto Boal, canes que falavam do povo e da alienaoexplodiram os musicais. A TV Record resolveu agrupar novos canto- 11. 20 SONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do BrasilSONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasil 21res e compositores em diversos programas que produzia. O sucessoCom isso, foi criada a Revista Brasileira de Msica, nome ado-dessa investida fez com que a emissora incentivasse a realizao de tado pelo Conselho Federal, que serviria tambm como voz oficialFestivais de Msica Popular. Eles revelaram e confirmaram talentosdo que acontecia na OMB. Com circulao trimestral, esse peridicocomo Chico Buarque de Holanda, Elis Regina, Vinicius de Moraes, apresentava matrias informativas, crticas e pesquisas musicolgicasCaetano Veloso, Geraldo Vandr, Toquinho, Edu Lobo, Gilberto Gilcom a inteno de prestar um servio relevante msica e aos msi-e Roberto Carlos. O sucesso artstico e de pblico desse empreen- cos brasileiros.dimento da Record (nos anos de 1966, 1967 e 1968), levaram a TV O maestro Jlio Medaglia conta que a inteno de Jos SiqueiraGlobo (Rio) a realizar os Festivais Internacionais da Cano, que du- foi usar a Ordem dos Msicos para transmitir uma viso no to sin-raram at o incio dos anos de 1970 e atraram nomes consagrados da dicalista e sim um olhar mais cultural, mais humano, mais artsticomsica brasileira e da estrangeira. At hoje, os programas musicais sob a entidade. Ele pretendia fazer com que o msico, por meio dee os festivais da Record so considerados como a poca de ouro da uma instituio de classe, se valorizasse.msica brasileira na televiso. Mas isso no foi suficiente. Siqueira e seus aliados enfrentaramDiante de toda essa riqueza e diversidade musical produzida nas problemas com a classe musical, pois nem todos compartilhavam asdcadas de 1950 e 1960, e por causa da consolidao e da legitimaomesmas idias dos comandantes da Ordem. O ano de 1963 foi o maisde um novo campo cultural, que se d a criao da OMB.conturbado para o Conselho. Seus integrantes foram muito criticadospor cometerem irregularidades dentro da entidade. A OMB era alvode constantes acusaes por parte da imprensa, principalmente por Os primeiros anos da OMB e o caso Ary Barrosoaqueles que no escondiam suas preferncias polticas anticomunis-Quando a Ordem iniciou suas atividades, em 1960, estava provi-tas, como a imprensa marrom, que dominava os grandes jornais dasoriamente instalada no Edifcio Marqus do Herval, na Avenida Riopoca. O termo criado em 1959 por jornalistas do Dirio da Noite,Branco, 185, sala 1316 no Rio de Janeiro. Uma das primeiras medidas do Rio de Janeiro, designa os jornais sensacionalistas que no tmdo Conselho Federal da OMB foi colocar em prtica a estruturaocompromisso com a descrio fiel dos fatos. Um dos grandes mestresadministrativa da Ordem em todo o pas. Isso quer dizer, fazer comem escrever matrias deste tipo era o jornalista David Nasser, comoque todos os Conselhos Regionais, e seus respectivos presidentes, semostra o jornalista Luiz Maklouf Carvalho, no livro Cobras Criadas,empenhassem na tarefa de inscrever em seus quadros todos os pro-em que conta a trajetria de Nasser e seus ideais de direita e pr-Ge-fissionais msicos em atividade naquelas regies. Apenas os Conse-tulista. Alm de jornalista, Nasser se destacaria, ao lado de Heriveltolhos de So Paulo e da Guanabara (o municpio do Rio de janeiro, atMartins, como letrista de inmeros clssicos da msica popular, entreento Distrito Federal, passa a ser o Estado da Guanabara, devido eles Atiraste uma Pedra, Hoje quem paga sou Eu e Baio da Penha.transferncia para a nova capital, Braslia) encontravam-se em fase dele a maioria das matrias publicadas contra a OMB e seusconclusiva de organizao, j obtendo, inclusive, sede prpria. dirigentes neste perodo. Em 9 de fevereiro de 1963, a revista O Cru-Em 1962, a Ordem dos Msicos do Brasil foi definitivamentezeiro, na matria intitulada O Jango do samba, Nasser fez duras crticasinstalada no 7 andar do Edifcio Piau, na Avenida Almirante Bar-a OMB: A Ordem dos Msicos do Brasil uma idia sublime postaroso, 72, no Rio de Janeiro. A sede do Conselho abrigava a redaoem mos de moleques. Alguns deles tiveram encrencas contbeis nade um rgo publicitrio de divulgao musical cujo objetivo era oOrquestra Sinfnica, outros so filiados a organizaes comunistas.de levar ao pas e ao exterior uma viso mais ampla e detalhada daArrecada a nova entidade dezenas de milhes em todo o Brasil, cons-realidade musical.tri instalaes luxuosssimas, o dinheiro anda a solta. 12. 22 SONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do BrasilSONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasil 23A Ordem no vivia em um mar de rosas como podem perceber.tence ao rgo especfico, no caso a Sociedade Brasileira de AutoresMuitos crticos da poca no mediam esforos para debater sobre oCompositores e Escritores de Msicas (Sbacem) que, naquele tempo,verdadeiro poderio da entidade, e nem de deixar de falar duras pala- era presidida pelo consagrado compositor e cantor Herivelto Martins.vras a respeito das preferncias polticas de sua cpula. O jogo polti- Segundo o jornal O Globo, o prprio Ary, em seu relato sobre oco comeava a dar as caras.caso, afirmou que a obrigatoriedade da filiao de todos os msicosEssa ira acabou ganhando foras de boa parcela da sociedade Ordem, defendida por Jos Siqueira, no deveria proceder, j que,quando, em 1963, a OMB resolveu suspender e proibir de serem exe-pela lei, nenhum msico pode trabalhar no Brasil sem que se registrecutadas as msicas do grande compositor e pianista Ary Barroso, nono departamento competente do Ministrio do Trabalho. Para ele, aos pelos msicos como pelas emissoras de rdio e televiso. Naquelaque parece, seria nica exigncia legal existente.poca, Ary era conhecido mundialmente pelas composies Aquare-Aps trs dias da publicao daquela nota, que fazia meno la do Brasil, No Rancho Fundo, No Tabuleiro da Baiana, entre outrasfalta de pagamento da Ordem, Ary Barroso foi procurado pelo Sr.msicas que ganharam vida nas mais diversas vozes de artistas bra- Guedes, do Conselho Regional da OMB na Guanabara, que ofereceusileiros, como Carmen Miranda, Elizete Cardoso e Silvio Caldas. Elea quitao da carteirinha da entidade sem que ele precisasse efetuar oera considerado patrimnio nacional por muitos crticos musicais,pagamento. O perdo da dvida de Ary, anunciado pela Ordem doscompositores e cantores da poca.Msicos do Brasil, foi mais uma tentativa para ridicularizar o con-E tudo isso aconteceu porque Ary estava em dbito com a OMB. sagrado autor, afirma Herivelto Martins em uma nota publicada noEm todos os setores da opinio pblica cresceu uma vaga de indigna-jornal ltima Hora.o e protestos. As emissoras de rdio e televiso produziram progra-Este ocorrido acabou por agravar a situao, gerando divergn-mas especiais com msicas de Ary Barroso. Os compositores, por sua cias entre compositores populares e o recm-criado organismo mu-vez, organizaram uma passeata, com um show de msicas do grandesical. A OMB estava bastante desgastada. Sua diretoria era alvo decompanheiro, que aconteceu na Praa Serzedelo Correia, em Copaca-diversas acusaes, como a de ter cometido irregularidades no maubana. A manifestao acabou transformando-se numa noite de festa.uso das verbas arrecadadas e de abrigar comunistas. A entidade aca-A multido presente pde ver o show do Trio de Ouro e cantar com bara por sofrer fortes abalos na sua verdadeira contribuio para aVicente Celestino e Dorival Caymmi, alm de ouvir os diretores das classe que representava.Sociedades de Compositores e representantes do Sindicato, da Coope-rativa dos Autores Musicais e do Clube dos Compositores que estavam O Golpe Militar e o incio da Era Sandolil apoiando a causa e demonstrando solidariedade a Ary Barroso.A confuso, que ganhou severo destaque em pginas de jornais Em 31 de maro de 1964, veio o golpe militar que deixaria o pasda poca, comeou quando Ary disse que no pagou a anuidade da mergulhado em uma ditadura por 21 anos. E a represso tambmOrdem dos Msicos do Brasil porque no o procuraram para cobr-se fez sentir na OMB. Seu presidente, o maestro Siqueira, e outrosla e nem sequer o alertaram sobre a suspenso. Falou que tomou co- dirigentes regionais como Constantino Milano Neto, em So Paulo,nhecimento dos fatos por notcia divulgada pela imprensa, e nenhum e Gentil Filho, no Rio foram acusados de pertencerem ao Partidocomunicado oficial lhe foi dirigido nesse sentido. Comunista e acabaram destitudos aps uma interveno federal.Rebateu a afirmao do maestro Jos Siqueira de que teria dito O novo regime poltico, inaugurado em 1 de abril de 1964, res-no pertencer Ordem, esclarecendo que a ela est filiado como dire-tringiu as participaes populares e inibiu quaisquer reivindicaestor de orquestra e no como compositor, porque nesta qualidade per-ou movimentos de oposio. A ditadura militar, nos primeiros meses, 13. 24 SONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do BrasilSONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasil 25realizou uma devassa nos diversos setores da sociedade brasileira, dentre outros nomes, por Wilson Sandoli. A interveno foi oficiali-suspendeu direitos polticos, cassou mandatos, prendeu, demitiu ezada em 8 de abril de 1964 (apenas uma semana aps o golpe militar)aposentou polticos, sindicalistas e trabalhadores identificados com pela portaria n 72 da Delegacia Regional do Trabalho.os ideais de esquerda ou aqueles identificados com a busca pelos di- Foram designados interventores Raul Dias Laranjeira, Ubaldoreitos civis e por igualdade econmica e social. de Abreu e Aldo Nilo Losso. No lugar de Ubaldo, porm, apareceuNo caso da OMB, o novo interventor Wilson Sandoli possuaWilson Sandoli, indicado por Clvis de Oliveira, da Delegacia douma funo no muito diferente. Responsvel por restaurar os valo-Trabalho, representante do Dops. A Junta foi instituda para apurarres nacionais e libertar o pas dos comunistas e vermelhos, agiu na irregularidades que estariam sendo praticadas na OMB seco SP, atentidade como outros interventores, no seu papel de vigiar e punir ento sob direo de Constantino Milano Neto, que dirigia tambmos comunistas, com a misso de fazer reinar a tranqilidade necess- o Sindicato dos Msicos. Num primeiro momento, a OMB de Soria na msica brasileira e controlar a efervescncia poltica e culturalda poca.Paulo ficou sob interveno de Raul Laranjeira. De acordo com a car-O Arquivo Pblico do Estado de So Paulo d acesso a docu- ta enviada ao diretor do Dops, Sandoli encarregou-se dos assuntosmentos do antigo Dops (Departamento de Ordem Poltica e Social), ligados msica popular na OMB, e passou a hostilizar Laranjeira,rgo do governo brasileiro criado durante o Estado Novo, cujo ob- chamando-o de comunista, ttulo que, em 1964, era o insulto maisjetivo era controlar e reprimir movimentos polticos e sociais contr- perigoso que algum poderia receber.rios ao regime no poder. Tais registros demonstram como SandoliAgindo como se fosse presidente do Conselho Regional dase aproveitou da conjuno poltica para chegar ao poder, no qual se OMB, Wilson Sandoli recebia msicos na sua sala, assinava carteirasmantm h mais de 40 anos. e documentos. Ainda segundo a mesma carta, quando era sub-te-Um dos documentos uma carta, datada de 1 de setembro de soureiro na gesto de Milano Neto, Sandoli se ops ao presidente e1965, enviada pelo violonista Raul Dias Laranjeira (um dos integran- tentou se eleger presidente do Sindicato. Na ocasio, no conseguiu.tes da Junta Interventiva nomeada pelo governo federal aps o golpeMas, pouco tempo depois, conseguiu o controle da Ordem de Sode estado de 1964) a Odilon Ribeiro de Campos (ento diretor doPaulo e do Sindicato dos Msicos, feito mais fcil de conseguir na-Dops), que conta como Sandoli ganhou o poder no Conselho Regio-quele momento, j que Constantino Milano Neto no mais presidianal de So Paulo. Anexo carta, consta um convite para a posse da di- nenhuma das entidades, deixando o caminho livre.retoria do Sindicato dos Msicos Profissionais, eleita para comandar De acordo com outro documento do Dops, datado de 1 de ju-por dois anos (1958 e 1960) esta entidade. A cerimnia fora realizada lho de 1965 e denominado Informao Reservada, foram os pr-em 1 de agosto de 1958, s 15 horas, na sede social do edifcio Am- prios interventores que fizeram um relatrio que levantava a suspei-rica, 8 andar, conjunto 823. Na ocasio, o presidente do Sindicato eraConstantino Milano Neto e o sub-tesoureiro era Wilson Sandoli. ta de irregularidades na entidade. Na poca, a secretria da OMB,Este documento indica que Sandoli, na verdade, integrava a di- Esmeralda Barros, era conhecedora de toda corrupo e subversoretoria do Sindicato dos Msicos Profissionais desde 1958, ou seja,ali existentes.antes at da criao da Ordem dos Msicos do Brasil. O presidenteTerminado o relatrio, perderam os cargos Milano Neto, osdo Sindicato e tambm do Conselho Regional, Constantino Milano conselheiros Joo de Souza Lima, Silvio Baccarelli, bem como os su-Neto, foi depois afastado, sob a acusao de ser comunista, propician- plentes Arthur Kauffmann, Luiz Arruda Paes, Pedro Francisco Con-do a nomeao da Junta Interventiva, pela ditadura militar, integrada, tesini e Severino Antonio Silva. 14. 26 SONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do BrasilCom a antiga diretoria da OMB-SP totalmente destituda, forammarcadas novas eleies para eleger o presidente da entidade. Doisinterventores saram como candidatos: Laranjeira e Sandoli.Antes das eleies, Sandoli enviou um release (datado de 11 deabril de 1965) ao jornal Dirio de S. Paulo pedindo votos para suachapa e acusando Laranjeira de ter feito acordo com Milano Neto,preso durante a Revoluo de 31 de Maro.Sandoli acaba por vencer as eleies. A posse da diretoria doConselho Regional do Estado de So Paulo, sob sua presidncia,aconteceu no Teatro Record, s 20h30 do dia 16 junho de 1965.Assim, aps ter chegado ao posto maior da instituio em SoPaulo, Sandoli tinha agora como objetivo o Sindicato dos Msicos, jque, segundo ele, a onda vermelha e os comunistas ainda ameaa-vam o futuro da classe musical brasileira.Um documento, datado de 31 de novembro de 1965 e escrito porum investigador do Dops, relata como se deu a eleio no Sindicato,realizada entre os dias 26 e 28 de outubro daquele ano, na Rua SoBento, 405: No primeiro dia de votao houve ameaa de agressoCaptulo IImtua entre os srs. Wilson Sandoli (candidato da chapa Azul ni-ca) e o mesrio Amadeu Ablio Campos, que tentava convencer osA Ditaduraeleitores a no votar. Naquela ocasio, foi registrado um Boletim deOcorrncia do tumulto mencionado na Central de Polcia.A chapa de Sandoli venceu a eleio e at hoje ele permanece frente do Sindicato e da OMB. 15. Caa aos alienadosEm 1967, a liberdade de expresso da sociedade brasileira jtinha sofrido abalos. Desde 1964, o regime comeou a nomear seusinimigos, a cassar mandatos de deputados e senadores e a calar aclasse artstica. Os militares j governavam sem oposio quando,em 24 de janeiro de 1967, o congresso aprovou a nova ConstituioFederal. A recente Carta aumentava ainda mais o poder dos presi-dentes militares, alm de instituir a Lei de Segurana Nacional que,nos anos seguintes, serviria de desculpa para prises e torturas semdireito a julgamento.Em meio s turbulncias polticas do pas, a classe musical en-contrava-se dividida. De um lado, a jovem guarda, falando de carros egarotas, inspirada nos Beatles e nos Rolling Stones. Do outro, a MPB,que lotavam os festivais de msica com letras de protesto e de fortecunho poltico. Para os artistas da MPB, os cantores da jovem guardaeram alienados. J Roberto Carlos e companhia tachavam GeraldoVandr de careta.O ano de 1967 foi tambm conturbado para a Ordem dos Msi-cos do Brasil. No dia 19 de maro, o Ministrio do Trabalho assinouum despacho criando a Junta Governativa da OMB, cuja principalfuno era determinar que fossem tomadas todas as medidas neces-srias para a normalizao da vida da entidade, sem comando efetivodesde o golpe de 1964. Tambm foi estabelecido o Grupo de Traba-lho, responsvel por rever a legislao atinente profisso do msicoe propor uma reforma na estrutura da entidade.A Junta, que governou por 90 dias seguidos, teve Lisanias DiasMaciel como presidente, Heitor Alimonda como secretrio e Joo Je- 16. 30 SONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasil SONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasil 31ronimo de Meneses como tesoureiro. O Grupo de Trabalho foi cons-sidade de Sandoli. Quando Oliveira perguntou ao presidente o quetitudo por estes trs integrantes, alm de Maria Augusta Joppert, Jos fazer, ele respondeu: Dia 25, voc pode passar por aqui e receberVieira Brando, Clo Goulart, Osvaldo Lira, Leda Coelho de Freitas, uma autorizao para cantar em programas sertanejos. Para outrosHenrique Morelenbaum, Roberto de Regina, Henrique Nirenberg,programas, voc tem de estudar e prestar outro exame.Alberto Jaffe, Nelson de Macedo, Oscar Castro Neves, Emilio Batista No Rio de Janeiro, os exames tiveram uma reprovao bemde Matos Filho, Orlando Silva de Oliveira Costa e Mozart Ituau.menor; 70% dos mil inscritos foram aprovados. Os 30% reprovadosOs meses seguintes foram marcados por confuses nos Con-tambm teriam um prazo de seis meses para fazer um novo exame.selhos Regionais de So Paulo e Rio de Janeiro, comandados porEntre eles, estavam membros do Brazilian Beatles, grupo conhecidoWilson Sandoli e Geraldo Miranda, respectivamente. Ambos eram na poca. Entretanto, existia diferena na realizao das provas nograndes entusiastas da MPB e tinham como dolos os mesmos artis-Rio e em So Paulo. Enquanto os paulistas s tinham uma chance, ostas que faziam sucesso nos festivais da poca, como Chico Buarque cariocas possuam duas para serem considerados reprovados. Outrae Edu Lobo. diferena que, em So Paulo, todos os testes foram feitos em umaMesmo frente de um rgo que representava toda a classe nica semana; j no Rio, segundo o presidente Geraldo Miranda,musical, Sandoli e Miranda comearam a deixar transparecer suas eram promovidos todas as sextas-feiras.preferncias musicais. Eles se posicionaram publicamente contra osDias depois de realizados os testes, o presidente do Conselhogrupos de i-i-i, gnero que se propagava no Brasil, dizendo queFederal Lisanias Dias Maciel deu uma explicao pouco convincenteeste tipo de msica desvalorizava a cano nacional.sobre as reprovaes nos exames da OMB. Afirmou que o ndice deNa semana de 13 de julho de 1967, houve em So Paulo o pri- 90% de reprovao em So Paulo era grande porque os candidatosmeiro exame da OMB para aquisio da carteira de msico para tocarrelaxam um pouco na hora do exame, por ser realizado somenteem shows, bailes e programas de televiso no Estado. O exame seriade seis em seis meses. Maciel reiterou que apenas estava se fazen-feito somente para aqueles que no eram filiados Ordem ou no do cumprir as leis, no estava inventando outras. E falou, ainda, queestavam com os pagamentos em dia. Foram inscritos 2,5 mil msicos,toda a reao popular era fruto da presso de fbricas de guitarras,sendo que 704 apresentaram-se para realizao da prova e apenas 129 que vendiam 20 mil instrumentos por ms e temiam ver suas vendasforam aprovados. Entre os aprovados, destacavam-se no cenrio re- caindo, e das emissoras de rdio e TV, que exploravam os conjuntosgional De Kalafe e Turma e Roberta e Rosely. Foram reprovados Ne- de i-i-i apresentando-os sem lhes pagar.tinho, baterista, e Nen, contrabaixista do grupo Os Incrveis, e Ded, Ainda em 1967, o presidente do Conselho Regional da Guana-baterista do RC-7 (grupo de Roberto Carlos). Sandoli disse que os bara, Geraldo Miranda, estruturou uma campanha de valorizaoreprovados estavam proibidos de se apresentarem at o final daquele profissional do msico, com instituio de uma tabela de pagamentoano e que, em dezembro, haveria novos testes. A fiscalizao seriade cachs em bailes, shows e programas de televiso (assim como jexercida pela Polcia Federal e pela Secretaria de Segurana Pblica. existia em gravaes) em combinao com o sindicato dos msicos.Segundo relato do jornal Folha de S.Paulo, aps o exame muitosEle ponderava que a proibio das apresentaes de grupos de i-i-perguntavam a Sandoli se as provas poderiam ser feitas no interior, e i, como acontecia em So Paulo, era um paliativo, pois os problemaso presidente respondia que at poderiam, mas no dava para apren-de desvalorizao e desemprego dos profissionais da msica tm ra-der a matria do exame em dois dias. Na ocasio, porm, Durval zes mais profundas. Havia, por exemplo, o uso indiscriminado deNunes de Oliveira, cantor sertanejo de So Caetano do Sul (SP) quefitas magnticas com gravaes em boates e clubes, e videoteipes emestava vestido modestamente, foi reprovado e contou com a genero- televiso repetindo atuaes de msicos em outros estados. 17. 32 SONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasil SONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasil 33Miranda afirmava que o i-i-i desvalorizava a msica nacio-riedade da carteira. A infrao para esse tipo de ao era de Cr$100nal, mas j estava em fase de saturao; ia passar, como o baio havia (moeda corrente na poca o salrio mnimo era de Cr$ 105).passado. Admitia que tinha esperana na msica brasileira em ChicoBuarque, Gilberto Gil, Caetano Veloso e Edu Lobo.Aps a reprovao de vrios msicos nos exames da OMB, Eras-De quem so os Direitos Autorais?mo Carlos e Roberto Carlos deram declaraes polmicas no programa A dcada de 1960 trouxe tambm novidades que revoluciona-Jovem Guarda, na TV Record. Disseram que no conseguiriam passar ram a profisso de msico quanto ao alcance da cano. As gravado-nos exames da Ordem dos Msicos do Brasil. Alguns boatos alegavam ras agora tinham uma poderosa parceira para aumentar a vendagemque a carteira de Roberto Carlos, filiado OMB do Rio de Janeiro des- de discos e a propagao da msica de seus contratados: a televiso, ede 1961, seria cassada. Geraldo Miranda negou a informao. com ela, os festivais. Alm disso, os antigos discos eram, ao longo daPorm, as declaraes de Roberto irritaram, principalmente, dcada, substitudos por long plays de 12 polegadas e 331/3 rotaes,Wilson Sandoli, que considerava o membro da jovem guarda um mais modernos, resistentes e baratos.amigo. Ele alegou que, por diversas vezes, Roberto Carlos manifes- A msica popular brasileira se tornou, aos poucos, paixo na-tou-se a favor dos exames, e que certamente houve presses de ele- cional, assim como o futebol. Isto porque os msicos brasileiros com-mentos interessados em explorar a juventude, forando-o a se mani- provavam que, em matria de arte, nosso talento incomum. E mais:festar contra a Ordem. Disse ainda: s vezes, penso que o Roberto espontneo. Para os torcedores de Fluminense, Corinthians, Botafo-Carlos nem sabe o que est falando. Mas a irritao de Sandoli nogo, Santos, Palmeiras, Flamengo, existiam Chico Buarque, Caetanoparou por a.Veloso, Roberto Carlos, Tom Jobim. Por isso, assim como no estdioDepois de algumas semanas, ele mandou os fiscais da OMB in-do Maracan, o pblico tambm ia torcer nos festivais. E as televises,terromperem o programa Jovem Guarda enquanto todos os membrosassim como transmitiam Garrincha e Pel defendendo seus clubes,do conjunto de Roberto Carlos no estivessem devidamente regulari- tambm exibiam os festivais, com Elis Regina e Milton Nascimentozados na OMB. O cantor subiu ao palco e disse que, por determinaoapresentando suas canes.da Ordem dos Msicos do Brasil, naquele dia no haveria programa.O domnio estrangeiro trazido pelo surgimento do rock no fimHoje, Sandoli se diverte com a histria e afirma que j viajou com da dcada de 1950 foi inversamente proporcional ao que se viu no fimRoberto Carlos a vrios pases e o cantor continua seu amigo.da dcada de 1960. Em 1959, de cada 10 discos vendidos no Brasil,Outro atrito do presidente do Conselho de So Paulo era com osete eram estrangeiros. Em 1969, acontecia o contrrio. A partir dediretor de Diviso de Diverses Pblicas da Secretaria de Segurana1965, as gravadoras comeavam a ver na efervescncia musical bra-Pblica, J. Pereira, que estava declaradamente contra a Ordem, divul-sileira uma mina de ouro. Acertaram. Nos dez anos seguintes, cres-gando que ningum pode proibir o msico de tocar. Sandoli rebateuceriam quase que na medida em que seus artistas se consagravam:dizendo que, se fosse preciso, recorreria Polcia Federal, ao Minist- 444% e, at 1980, 813%.rio do Trabalho e Secretaria de Segurana Pblica. Os donos de TVs da poca tambm viam no cenrio musi-Em 1967, a fiscalizao de casas de shows e contratantes pelacal brasileiro uma oportunidade para crescer, passando a apoiar e aOMB j podia ser considerada ineficiente. Na poca, existiam no es-promover estes artistas. Com a criao da Embratel, em 1965, o al-tado do Rio de Janeiro quatro fiscais para os 12 mil msicos. O pre- cance do sinal televisivo deu um salto tecnolgico importante parasidente Geraldo Miranda lamentava que, principalmente em bailesa popularizao dos aparelhos televisivos. Tanto que, dois anos de-realizados nos bairros distantes, no tinha como cobrar a obrigato-pois do incio da transmisso por microondas, em 1968, abrangen- 18. 34 SONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasil SONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasil 35do todos os cantos do Brasil, eles j eram realidade para 24,1% da e compartilhamento dos direitos, se reuniam na Socinpro, chegandopopulao brasileira. E, ao final dos dez anos seguintes, este nmeroa um dilema: a quem repassar os direitos dos msicos acompanhan-j chegava a 56%.tes? E eles chegaram a um acordo. E o fizeram a seu modo. Em meio ao processo de democratizao das TVs, surgia no Bra- Cientes de que no poderiam centralizar todos os recursos pro-sil a Era dos Festivais. A TV Excelsior era uma das promotoras. De-venientes da execuo pblica das obras dos artistas, a entidade co-pois de ter lanado a telenovela diria, em 1962 (2-5499 Ocupado, commeou a repassar estes recursos ao Conselho Federal da Ordem dosTarcsio Meira e Glria Menezes), a Excelsior era tambm pioneira, Msicos do Brasil, em uma espcie de convnio, para que estes fos-em abril de 1965, com o I Festival de Msica Popular Brasileira. O sem investidos em obras de assistncia social para a laboriosa classeBrasil agora podia ver Elis Regina, Elizeth Cardoso e Chico Buarque. musical. Pela lei, a Ordem funcionava como representante dos msi-Elis venceu com Arrasto (Edu Lobo/Paulo Csar Pinheiro) e, no ms cos acompanhantes. O dinheiro era arrecadado pelo rgo federal.seguinte, estreou o sucesso O Fino da Bossa, ao lado de Jair Rodrigues,A situao comeou a se agravar quando os msicos descobri-na TV Record. O programa ficaria, ainda, trs anos no ar.ram a manobra da Ordem, na poca presidida pela Junta Interventiva. Enquanto isso, as gravadoras iniciavam uma trajetria deNo Rio de Janeiro, a classe musical comeou a fazer barulho contra ocrescimento espantoso, impulsionadas pela relao dos artistas dos acordo entre OMB e Socinpro. Liderados por Antnio Carlos Jobim,festivais e pela popularizao dos long plays. Somente entre os anos Chico Buarque, Jards Macal e Srgio Ricardo criaram a Sociedadede 1968 e 1979, a venda de discos saltou de 14 milhes de unidades dos Msicos Brasileiros, a Sombrs, que teria mais valor poltico dopor ano para 64 milhes. Enquanto CBS, Philips e Odeon traziam que prtico. O prestgio de Tom Jobim e de nomes como Chico Bu-as principais estrelas para seus casts, a RGE surgia ao descobrirarque, j consagrados no meio, se converteu em presso dentro dosChico Buarque. rgos de classe, na Ordem e nos sindicatos do Rio e de So Paulo. A onda dos festivais tornava a disputa entre as gravadoras mais O presidente da Ordem dos Msicos do Rio de Janeiro, Nelsonjusta. Neles, o pblico tinha a oportunidade tambm de ver os msi-Macedo, ao saber da manobra do Conselho Federal, agendou umacos menos conhecidos, e tambm de se identificar com eles. Com o reunio na sede da Socinpro para discutir com a diretoria da asso-crescimento do mercado, as gravadoras sentiram a necessidade de se ciao o rompimento do contrato, alegando defender o direito dosorganizar e criaram a Sociedade Brasileira de Administrao e Prote- msicos. Deu prazo de 30 dias, aceitos pela Socinpro, que deixouo de Direitos Intelectuais, a Socinpro.de repassar os direitos aos rgos de classe. A iniciativa de Macedo Um ano depois, a lei 4.944/66 foi assinada pelo presidente gene-atraiu os msicos da Sombrs para o seu lado, e tambm trouxe pres-ral Castello Branco, estabelecendo os produtores de disco como in- tgio e apoio ao maestro. O cume da presso foi em 1973, com a Leitermedirios da arrecadao dos recursos conquistados com a venda5.988/73, ou a Lei dos Direitos Autorais.e execuo pblica de fonogramas. A lei dizia que os produtores de A nova lei regulamentava a distribuio e arrecadao do direitodisco deviam repartir os proventos pecunirios resultante das exe-autoral no Brasil. Entre as mudanas importantes, estava a criao decues pblicas das obras, descontadas as despesas. Porm, a prpriaum Conselho Nacional do Direito Autoral (CNDA), que fiscalizaria alei deixava uma lacuna quanto arrecadao dos direitos conexos dos distribuio destes recursos. Desta vez, a lei no permitia a rgos demsicos acompanhantes. No existia uma associao que os repre-classe e sindicatos receberem os direitos pela categoria. S poderiamsentasse poca, enquanto os autores principais das obras compo-receber os direitos autorais as associaes de artistas registradas nositores, intrpretes, editoras e produtores de discos j eram organi-Escritrio Nacional de Arrecadao e Distribuio (Ecad), que, po-zados em associaes. Os produtores, responsveis pela arrecadao rm, ainda no existia, assim como o conselho. 19. 36 SONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do BrasilSONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasil 37A inexistncia do Ecad impossibilitava a aplicao da lei. O im- nesto Geisel. O primeiro presidente, Carlos Alberto Menezes Direito,passe continuava, pois o CNDA ainda no estava formado, o que nohoje ministro do Supremo Tribunal Federal, assumiu a entidade comdava mostras de que o escritrio central sairia to cedo. As associa-a misso de criar e normatizar o Ecad. Ele, ento, estabeleceu umes ainda estavam se organizando e no havia consenso na classe conselho com trs membros do Governo Federal indicados pelos mi-artstica quanto diviso de recursos.nistrios da Educao e Cultura, Trabalho e Justia. As outras duasAs associaes estavam divididas em duas vertentes. As maiscadeiras seriam formadas por indicados pelas associaes: o cantorantigas, Unio Brasileira dos Compositores (UBC), Sociedade Bra- Roberto Carlos, indicado pela UBC, e o escritor Fernando Lobo, paisileira de Autores, Compositores e Escritores de Msica (Sbacem),de Edu Lobo, ligado s associaes de teatro e literatura.Sociedade Administradora de Direitos de Execuo Musical do Bra-Na primeira reunio do conselho, Menezes Direito baixou a Re-sil (Sadembra) e Socinpro, estavam reunidas no Servio de Defesa soluo N. 1, com 27 artigos. O quinto deles passava o controle dosdo Direito Autoral (SDDA). A UBC era formada pelos compositoresDireitos Autorais ao Estado, ou seja, delegava o Ecad ao governo mi-mais antigos, como Pixinguinha, Jota Candeio, Braguinha, e ainda oslitar. As resolues entrariam em vigor no dia 1 de janeiro de 1977.jovens Edu Lobo, Gonzaguinha e Chico Buarque. Na Sbacem, esta-Ao saber da medida de Menezes Direito, a Sicam convocou reu-vam Gonzago e Humberto Teixeira, enquanto a Sadembra contavanio com o SDDA para discutir as resolues do conselho. As socieda-com Tom Jobim e Ary Barroso, e a Socimpro, alm dos principais des entraram em comum acordo: o Ecad deveria ser controlado pelasprodutores de discos, tinha Tito Madi e Slvio Csar.associaes. Contrataram, ento, o advogado Clvis Ramalhete, quePorm, os novos msicos comearam a se organizar na Socie- seria ministro do Supremo Tribunal Federal no governo de Joo Bap-dade Independente dos Compositores e Autores Musicais (Sicam). tista Figueiredo (1979-1984) para represent-los contra as medidas doEntre eles, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Ivan Lins, Taiguara, Djavan, CNDA. Um ms antes das resolues entrarem em vigor, em dezem-a dupla Antnio Carlos e Jocafi, Benito de Paula, o grupo Novos Baia-bro de 1976, o Supremo Tribunal de Justia julgou o mandado de se-nos, Suely Costa e o trio S, Rodrix & Guarabyra. O presidente era o gurana movido pelo SDDA e a Sicam. Com o voto decisivo do minis-compositor Adylson Godoy, irmo do maestro Amlson Godoy e dotro Armando Leite Rollemberg, as associaes conseguiram o direitopianista do grupo Zimbo Trio, Amilton Godoy. A maioria dos conesde criar o Ecad. Porm, teriam de faz-lo at o dia 1 de janeiro.da nova MPB estava reunida, formando a segunda mquina arreca-Uma das normas baixadas pelo CNDA ainda dizia que a arreca-dadora de direitos, alternativa ao SDDA. A iniciativa dos msicos co-dao do Ecad s poderia ser instalada por uma agncia autnoma.meou ainda na dcada de 1960, quando a arrecadao dos composi- A Sicam, representada por Adylson Godoy, e a Sbacem, representadatores ainda era quase nula. Apesar disso, os msicos acompanhantes por Nilton Teixeira, o autor do sucesso A deusa da minha rua, ficaramcontinuavam sem uma associao que os representasse. ento responsveis pela implantao e funcionamento do rgo. OA Sombrs, em 1975, resolveu fazer uma srie de shows para efetivo de funcionrios do SDDA na arrecadao chegou a ser cogita-pressionar o governo federal a fazer cumprir a lei dos Direitos Auto-do, mas no tinha condies de se habilitarem em to pouco tempo.rais, criando o CNDA e o Ecad. Quase todos os principais artistas daCom dificuldades, SDDA e Sicam conseguiram, enfim, criar opoca participaram das manifestaes, como Edu Lobo, Paulo Csar Escritrio Central para a Arrecadao dos Direitos. O primeiro pre-Pinheiro, Altamiro Carrilho, Clementina de Jesus, Caetano Veloso e sidente foi Henrique de Almeida, ligado Sbacem, com Jos LoureiroGal Costa. como vice. Adylson Godoy assumiu como secretrio-geral.E o jogo comeou a mudar em 1976, quando o CNDA final-Em So Paulo, Elis Regina, que j conhecia Wilson Sandoli damente saiu do papel pelas mos do governo recm-empossado de Er- polmica entre Socinpro e OMB, decidiu criar uma instituio pa- 20. 38 SONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasil SONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasil 39ralela, a Associao de Intrpretes e Msicos (Assim), a primeira aCom a formao da chapa de Ayres, Sandoli comeou a se arti-brigar pelo direito dos msicos acompanhantes. Era uma iniciativacular na Ordem para impedir a eleio do maestro na entidade. Di-gerada na prpria classe para organiz-la. Entre os msicos da As- zia-se chateado e trado e julgava a chapa de oposio uma idia semsim, estavam o baterista do grupo mineiro Som Imaginrio, Frede- sentido. Valendo-se destes argumentos e de promessas de que regula-ra, o maestro Amlson Godoy, o trompetista Demtrio Santos Limarizaria, ele mesmo, a questo dos direitos dos msicos, ganhou adep-e o compositor Marco Vencio Moror de Andrade.tos no apenas entre seus pares e eleitores indecisos, mas tambmO entusiasmo a partir da criao do rgo foi grande, mas as na prpria chapa de Nelson Ayres. O maestro, porm, desconheciabrigas tambm. A prestao de contas e os registros do Ecad eram o apoio de seus aliados a Sandoli, e chegou a acreditar que poderiaimprecisas e burocrticas, o que deixava uma margem grande paraeleger sua chapa.erros e corrupo no rgo. Dentro da Assim, os msicos sofriamNo dia da eleio, Nelson Ayres se mostrava ainda mais otimista.com o pouco interesse poltico da classe, as cises internas e o inex- Pelas suas contas, ele havia recebido o apoio da maioria dos presentespressivo peso entre as associaes. Pouco mais de um ano depois de na votao. Mas no levou o voto. Por uma larga vantagem e em meioassumir a presidncia da associao, Elis Regina se cansou de gerira relatos de que o presidente era quem fazia auto-propaganda e levavatantas brigas e egos e preferiu passar o basto para Amlson Godoy.as urnas s votaes, Wilson Sandoli se reelegeu. Decepcionado, Nel-Parei! No nasci pra ser bab de msico. Se eles quiserem, eles que son Ayres chegou a uma concluso com o amigo Amlson Godoy: Ose organizem. msico tem medo de perder o que no tem.Em 1979, o maestro Nelson Ayres fazia sucesso no meio musicalNo Rio de Janeiro, quem ganhava apoio era o maestro Nelsoncom uma Big Band, com a participao de msicos conhecidos maisMacedo, que ficara famoso, meia dcada antes, ao romper o acordopelos apelidos do que pelo nome de batismo: Isidoro Longano, o Bo- entre Socinpro e Ordem dos Msicos. Macedo agora flertava com alo, Eduardo Pecci, o Lambari, Geraldo Aurieni, o Felpudo, Dorival presidncia do Sindicato dos Msicos do Rio de Janeiro, que tinha naAuriani, o Buda, entre outros; todos msicos acompanhantes que sen-presidncia o compositor Oswaldo Lyra. Com o prestgio conquista-tiam no dia-a-dia a polmica em torno de seus direitos autorais. Todos do nos anos anteriores, Macedo conseguiu vencer a chapa de Lyra,msicos eruditos, na maioria tambm ligados a Wilson Sandoli.tornando-se o novo presidente do rgo.Nelson Ayres j era maestro renomado pelo mundo, mas nem A principal preocupao de Nelson Macedo era com o dinhei-por isso recebia estes direitos. Rodeado destes msicos, resolveu for- ro dos msicos acompanhantes, que no tinham encontrado destinomar uma chapa de oposio nas eleies do Conselho Regional de desde o rompimento de contrato cinco anos antes. Ele, ento, con-So Paulo da OMB para lutar, dentro do rgo, por seus direitos. Jun-vocou assemblia para discutir a criao de uma associao que de-tou-se ainda ao obosta Salvador Mazano, ao maestro Amlson Go-fendesse estes msicos. O presidente do Sindicato e da OMB de Sodoy e a Paulo Csar Willcox para enfrentar Sandoli na renovao do Paulo, Wilson Sandoli, esteve presente na assemblia que, ao final,tero do conselho paulista.decidiu que a destinao destes recursos ficaria a cargo dos sindicatosA fama de truculento atribuda a Wilson Sandoli no se justifi-do Rio de Janeiro e de So Paulo, novamente com Macedo e Sandoli.cava quando os msicos o procuravam pedindo favores. Ele era, na No mesmo ano, o presidente Joo Baptista Figueiredo, ltimomaioria das vezes, cordial e solcito com aqueles que chegavam at ele presidente da ditadura militar, assumia o poder e indicava o escritorcom um pedido. Porm, quando estes msicos questionavam sua au-Eduardo Mattos Portella para o Ministrio da Educao e Cultura.toridade ou procuravam outros meios de solucionar estes problemas, Portella teria a difcil misso de reformular o CNDA e, conseqente-a histria era outra.mente, tornar o Ecad ativo. Ele ficaria ainda famoso no mesmo ano, 21. 40 SONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do BrasilSONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasil 41ao responder a um jornalista sobre seu futuro no governo militar: Eu A interveno contou com o apoio da Sicam e a primeira opono sou ministro, eu estou ministro. era por uma comisso mista para intervir no escritrio, com nomesO primeiro nome de Portella para o CNDA era Antnio Cha-representativos para cada rea do direito autoral. Porm, o conse-ves, professor e jurista, considerado um dos maiores especialistaslho viu-se acusado de ter dado um golpe nas associaes e de poucade direito autoral no Brasil. Porm, Chaves havia acabado de acei-transparncia nas aes dos interventores. A informatizao do Ecadtar a diretoria da Faculdade de Direito da Universidade de So Paulocomeou, ao mesmo tempo em que as denncias sobre os interven-(USP), no Largo So Francisco, em So Paulo (SP). O professor ficou tores respingavam no CNDA. Apesar de informatizado, as acusaesde indicar um nome para seu lugar e, para a surpresa de todos, node pouca preciso, de superfaturamento de contratos e de acordosescolheu nenhum de seus colegas de faculdade, mas um estudante de com multinacionais para deixar de cobrar os direitos recaam sobremestrado, Jos Carlos Costa Netto, que havia se formado em direitoa diretoria do Conselho e sobre Costa Netto. As associaes pressen-em 1976, mas que tinha poucos casos defendidos no currculo.tiam as articulaes de Portella, que era ligado a associaes de teatroSurpreso com o convite, Costa Netto viu sua frente uma opor-e literatura, no CNDA.tunidade de se tornar conhecido e crescer na profisso. Mudou-seEm denncia ao jornal O Estado de S. Paulo, o ex-interventorpara Braslia para morar sozinho e, no primeiro contato com Portella, do conselho do Ecad do Rio de Janeiro, advogado Luiz Roberto Fon-recebeu o pedido para que formasse um conselho neutro na tentativatoura de Carvalho, acusava a diretoria do CNDA e o Ecad de teremde cessar com as brigas internas das associaes. Costa Netto, ento, superfaturado o contrato com a empresa Informa-Som, responsveltrouxe consigo as pessoas que mais respeitava na matria: seus pro- pelo processamento de dados, em Cr$ 4 milhes (moeda corrente nafessores de faculdade, entre eles o prprio Antnio Chaves, seu vice- poca). Segundo Carvalho, a margem de erro da entidade continuavapresidente. Alm disso, recebeu trs indicaes para o conselho, vin- alta, chegando a 50% durante o carnaval. Carvalho tambm reveloudas das sociedades e associaes: Henry Jessen, presidente da Odeon que Costa Netto havia feito acordo com o Grupo Po de Acar parae ligado Socinpro, Jota Pereira, jornalista indicado pela Sicam, e Jair deixar de cobrar Cr$ 2 milhes em direitos. Porm, nenhuma dasAmaral, presidente da UBC, maior sociedade de msicos da poca. acusaes foi comprovada e a interveno continuou.No CNDA, Costa Netto encontrou logo de cara a resistncia Com a melhora no funcionamento do Ecad, comeavam a sur-das associaes mais antigas para a modernizao da arrecadao dogir associaes para a defesa do msico acompanhante. Em 1980,Ecad. Sem o apoio da maioria das associaes, as reformas e o fun-msicos de So Paulo, liderados pelo maestro Zezinho, redigiramcionamento pleno do escritrio, atribudos nova diretoria, estavamabaixo-assinado para Wilson Sandoli pedindo para que ele formasseprejudicados. O impasse continuava. As entidades mais antigas ti- uma nova sociedade em defesa da classe. Entre os msicos, a maiorianham a seu favor o ento presidente do Ecad, Adelino Moreira, que deles de orquestras e ligados a Sandoli, estavam os integrantes da Bigsubstitua Henrique de Almeida. Moreira tambm era reticente quan-Band de Nelson Ayres que, um ano antes, haviam prometido apoioto s alteraes de estrutura propostas pelo CNDA.ao maestro: Buda, Bolo, Lambari e Felpudo. Era a deixa para queA primeira medida do conselho foi dividir a arrecadao emSandoli voltasse a representar os msicos na arrecadao dos direitos.trs cmaras: msica, teatro e literatura. Porm, a principal briga doMas ele no tomou medidas prontamente.CNDA com as sociedades ainda estava por vir. Costa Netto via a ne-Em 1982, o presidente da OMB recebeu em sua sala o clarinetis-cessidade de informatizar a arrecadao, mas no encontrava apoio ta Demtrio Santos Lima, famoso por suas interpretaes em discosno Ecad. Com tantas brigas e pouco resultado, o CNDA decidiu em de Cartola e de Nelson Gonalves, o mesmo que havia sido expulsovotao pela interveno no escritrio central. da Assim em 1977. Os sindicatos e a OMB no recebiam os direitos 22. 42 SONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasildos msicos desde a normatizao do Ecad, em 1977. Demtrio que-ria criar uma associao para fazer valer a arrecadao dos direitos.Sandoli se disponibilizou a conseguir uma sede para a sociedade, queteria o nome de Associao Brasileira de Msica e Artes (Abramus),mas imps uma nica condio: ele seria o presidente.A presidncia de Sandoli frente da Abramus, porm, no du-raria muito. Com interesses diferentes aos da diretoria da associao,ele usava da truculncia para vencer as discusses internas do rgo.Agindo desta forma, colecionou desafetos e acabou saindo por von-tade prpria, em 1984.Ainda em 1982, no Rio de Janeiro, outro dissidente da Assim,Marco Vencio Moror de Andrade, se juntava a Nelson Macedo eMaurcio Tapajs para criar tambm outra entidade: a Associao deMsicos Arranjadores e Regentes (Amar), herdeira tambm de al-guns idealizadores da Sombrs e do sindicato do Rio de Janeiro.Com a presso de trs associaes em defesa dos msicosacompanhantes, os direitos finalmente comearam a ser destinadospelo Ecad.Captulo III A ameaa da democracia 23. Desde o fim dos anos 1970, a ditadura militar entrou em pro-cesso de enfraquecimento. O clima tenso que tomou conta das ruasdepois da decretao do AI-5, em 1968, que dava plenos poderes aosmilitares, estava se dissipando. A ameaa comunista do incio dosanos 1970 tinha sido, quase toda, anulada. O apoio do governo nor-te-americano aos militares tambm havia se enfraquecido, principal-mente pela guinada da opinio pblica dos Estados Unidos depoisdo fracasso da Guerra do Vietn (1964-1975). A represso estava emprocesso de decadncia, mas ainda deixava duras marcas na socieda-de brasileira. Porm, o que mudou mesmo foi que o medo diminuiu.Em 1979, o ento ministro da Educao e Cultura Eduardo Portellaenviou ao Congresso, com autorizao do presidente Joo BaptistaFigueiredo, mais uma de suas leis de segurana nacional. Porm,desta vez, ela tratava da anistia aos crimes polticos praticados pormotivao poltica. Os acusados apareciam, desde 1964, nas listas desuspenso dos direitos polticos e cassao de mandatos. O Congres-so, pressionado por mais de trs mil pessoas que acompanhavam avotao do lado de fora, aprovou a lei, por 206 votos contra 201. Oregime baixava a guarda. O presidente Geisel j falava em uma tran-sio lenta, gradual e segura.Com a aprovao da Lei da Anistia, os temidos inimigos do re-gime comeavam a retornar ao pas. Em sua maioria, eram artistas,intelectuais, jornalistas e polticos de esquerda. As manifestaes p-blicas voltaram a acontecer sem represso da polcia e o pas flertavanovamente com a democracia.Na classe musical no era diferente. Com a criao do Conse-lho Superior de Censura (CSC), a ao dos censores foi reduzida,permitindo aos artistas entrarem com recurso, a ser julgado por 24. 46 SONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do BrasilSONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasil 47este rgo, quando se sentissem injustiados. Porm, mesmo assim, Alm de Vianna, ainda concorriam eleio os membros damsicas dos compositores mais combatidos pelos censores ainda Unio Brasileira dos Msicos, representando a chapa de situao esentiam as limitaes na liberdade artstica, como Chico Buarque, ligados ao fundador Jos Siqueira, a chapa de Turbio Santos, que eraRaul Seixas e Taiguara. ligada ao sindicato e contava com o apoio de Nelson Macedo e deNa Ordem dos Msicos do Brasil, os msicos tambm se ani- Ivan Lins, e a quarta, encabeada pelo Maestro Gentil Guedes.mavam com a possibilidade de poder participar das decises polti-Vianna, porm, com o apoio de outros msicos militares no in-cas da profisso. Wilson Sandoli passava a conceder mais favores aosterior, conseguiu renovar o conselho a seu favor, elegendo-se presi-msicos que necessitavam de ajuda, mostrando-se prestativo a cada dente com maioria em plenrio.nova demanda da classe. Ele ganhava apoio e fora poltica entre aUma vez na Ordem dos Msicos do Brasil, Eduardo Cameniet-categoria para chegar presidncia federal da OMB. zki comeou a se aborrecer com os rumos das discusses. Apesar deSeu sonho realizou-se em 1981, dois anos depois de ter enfren-no entrar em atrito, suas iniciativas no eram consideradas pela di-tado a chapa de oposio de Nelson Ayres em So Paulo. Em votao retoria e no entravam em votao. Camenietzki tambm estranhouindireta, os presidentes e membros do conselho federal o elegeram o fato das reunies no possurem registro em atas e as votaesnovo presidente mximo da entidade. acontecerem de maneira verbal.No conselho, uma nova figura comeava a chamar a ateno, e a Enquanto isso, em So Paulo, comeava a se questionar a pre-conquistar apoio na entidade carioca: Joo Batista Vianna, ex-trom- sena de Wilson Sandoli frente da OMB. Alguns msicos comenta-vam abertamente achar um absurdo algum indicado pela ditadurapetista de exrcito. Vianna elegera-se conselheiro, em 1975, atravscomandar uma entidade de artistas, alm de questionarem os bene-de interveno federal no Conselho do Rio de Janeiro, quando o go-fcios trazidos pela entidade na fiscalizao da profisso e sobre a suaverno militar fundiu a cidade-estado da Guanabara com o estado dopermanncia no sindicato.Rio de Janeiro, centralizando ainda mais o controle estatal a Braslia.Em 1984, com a iminncia do fim da ditadura militar, o pianistaEm seus primeiros anos, conquistou o apoio de pessoas influentes naOsmar Barutti voltou ao Brasil depois de uma temporada de estudosOMB, como os maestros Ciro Braga e Paulo Moura, o trompetistanos Estados Unidos. Reencontrou amigos e comeou a reatar os la-Formiga e o professor Hlio Senna.os perdidos enquanto esteve fora. Percebendo uma classe desunida eNas eleies para reformulao do tero do conselho carioca,abandonada, passou a utilizar estes encontros para discutir os rumosde 1982, Vianna esperava finalmente chegar presidncia do conse-da profisso, que quela poca estava bastante desvalorizada.lho fluminense. As eleies seriam disputadas, com quatro chapas, Eram tempos de recesso na economia brasileira, com a inflaomas ele estava extremamente confiante de sua vitria. No incio decada vez maior e com o primeiro governo civil depois da ditadura,sua campanha, conquistou o apoio de Eduardo Camenietzki, jovempresidido por Jos Sarney, passando por uma crise profunda.maestro comunista que havia acabado de se formar como regente naOs msicos chegavam a ganhar aproximadamente 50 dlaresUniversidade Federal do Rio de Janeiro. A influncia de esquerda de por uma noite de trabalho, sendo que a fiscalizao das casas no-Camenietzki trouxe para a chapa pessoas que normalmente seriamturnas pela Ordem era ineficaz. Ao lado do compositor Arismaravessas figura militar de Vianna, como militantes do PT (Partidodo Esprito Santo, de Leandro Braga, Benjamin Taubkin e Renatodos Trabalhadores) e do movimento sindical da poca.Loyola, iniciaram uma oposio ao Sindicato dos Msicos do Esta-Mesmo com o apoio dos mais jovens, Vianna tratou de acalmar do de So Paulo, dirigido por Sandoli. Queriam formar seu prprioCamenietzki. No esquenta. No interior a gente ganha, disse.sindicato, municipal e livre de convnio com a OMB. Com o apoio 25. 48 SONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasil SONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasil 49da Assim e de Amlson Godoy, criaram a Associao dos Msicos Embora Sandoli no tenha conseguido cumprir suas ameaas, oProfissionais, que logo depois se tornaria o Sindicato dos Msicosnome de Barutti comeou a circular em uma lista negra dos princi-do Municpio de So Paulo.pais restaurantes de So Paulo. Na lista figuravam ex-funcionrios eBarutti nunca havia tido relaes cordiais com Wilson Sandoli.artistas que haviam processado os empregadores por causa de proble-Nas vezes em que esteve na Ordem, reclamava das clusulas de con- mas trabalhistas. No SBT, porm, Osmar permaneceu trabalhando.trato, do tratamento dos contratantes e pedia uma posio do rgoNo Rio de Janeiro, Vianna continuava sem ser ameaado pelapara seus problemas. Ficou marcado ao ponto de evitar comparecer oposio. Nas eleies de 1987, ele conseguiu demover outro gru-entidade e encontrar com o presidente, que j o via com desafeto. po de jovens msicos formados pela Universidade Federal do Rio deEm 1988, o pianista resolveu que no pagaria mais as anuidadesJaneiro (UFRJ) de constituir uma chapa de oposio. Assim que oda Ordem, pois no se sentia por ela representado e no a via comoaluno Randolf Miguel chegou OMB para registrar a chapa na reno-rgo fiscalizador da profisso. Mas queria continuar trabalhando,vao do tero do conselho, foi tambm chamado por Vianna parauma vez que era pianista conhecido tocando na banda do programa compor a sua chapa, que contava novamente com Ciro Mendes comoJ Soares, que na poca era transmitido pelo SBT. vice, o professor Hlio Vianna, Paulo Moura e Formiga.Osmar procurou o advogado Marcel Nadal, que j havia tentadoCiente de que no conseguiria disputar com tantos nomes depor algumas vezes desobrigar os msicos do pagamento das anuida-peso, o grupo de Randolf Miguel se aliou a Vianna, buscando con-des da OMB. Ao abrir processo a pedido de Osmar Barutti, Nadalquistar um lugar na OMB para mudar a crise que se abatia na profis-viu-se obrigado a provar em juzo a desnecessidade de tal pagamento so. No dia do pleito, Miguel torceu o p em uma partida de futebole, para isso, precisava de notas contratuais da carreira de Barutti que e j estava decidido a no comparecer s eleies. Recebeu um tele-estavam arquivadas no Conselho Regional da OMB de So Paulo.fonema de Vianna disponibilizando um carro para busc-lo em casa.Como j conhecia Sandoli, Nadal convidou Barutti para acom- Neste caso, aceitou comparecer e conseguiu seu lugar no conselhopanh-lo e o convite foi aceito pelo pianista. Ao chegarem ao Conse-por uma larga vantagem.lho Regional, Barutti e Nadal foram levados para a ante-sala de Wil-Porm, logo na primeira reunio ele percebeu que algo esta-son Sandoli. O presidente ainda no havia chegado e despachos comova errado. A prestao de contas no era lavrada em atas, como deo requerido pela dupla s poderiam ser autorizados na presena do costume. Uma das pautas da votao era para reformar dois veculosmesmo. Esperaram por mais de meia hora. pertencentes OMB do Rio, uma Kombi e um Chevette. A maioriaSandoli, que no esperava encontrar novamente Barutti nado conselho desconhecia a existncia de ambos. Todas as votaesOMB, se enfureceu com os pedidos de Marcel Nadal. Rodeado por eram feitas sem discusso das pautas.seguranas, expulsou os dois do prdio, achacando-os: Ao entender o funcionamento da OMB do Rio de Janeiro, Ran- Saiam daqui, seus moleques! Quem vocs pensam que so?dolf comeou a levar para fora do rgo as prticas do grupo de Vian-No contente em expulsar Barutti e Nadal do local, Sandoli pas- na. Conseguiu mobilizar um de seus professores, o maestro Guerrasou a tratar para que o pianista no conseguisse mais trabalho. No diaPeixe, para formar nova chapa de oposio. E o maestro trouxe con-seguinte, ligou para o saxofonista Derico, companheiro de Barutti nasigo alguns de seus alunos, como Antnio Adolfo, Rildo Hora, CliaBanda do J:Vaz, Raul Pena Firme e o compositor Sivuca. Fala para o seu colega que eu vou ferrar com o trabalho dele. Sivuca havia se envolvido em uma polmica com um fiscal daSe ele continuar com esta histria eu vou melar o contrato dele com Ordem alguns meses antes. Dez minutos antes de um show do san-o SBT.foneiro, um dos fiscais da entidade surgiu exigindo comprovao de 26. 50 SONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasil SONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasil 51pagamento das anuidades de todos os integrantes da banda, caso con-Sem o controle das eleies no interior, ele procurou suspendertrrio no haveria espetculo. Sivuca tentou conversar com o fiscal, o pleito enquanto no houvesse comprovao de idoneidade dos votosargumentou que o show estava para comear e que no seria possvel de fora da capital carioca. Conseguiu entrar com um mandado de se-todos comprovarem as anuidades naquele momento. O fiscal no re- gurana em Niteri para embargar as eleies at segunda instncia.trocedeu, dizendo que no haveria show. Os nimos se acirraram e osQuando o pleito estava quase terminando, um oficial de justi-dois tiveram que ser apartados para no chegarem s vias de fato.a chegou OMB para cumprir o mandado de segurana. Vianna,Antes das eleies, Randolf Miguel fez chegar tambm a Guerraquando deu conta do ocorrido, reuniu seu conselho do lado de foraPeixe a informao de que as eleies do interior do estado poderiam do prdio, procura do maestro Guerra Peixe. Entendeu a atitude doser manipuladas pelos fiscais do pleito, todos indicados por Joo Ba-maestro como uma declarao de guerra. Em meio a ofensas pessoaistista Vianna. Algumas sedes funcionavam na prpria casa dos fiscais. e morais, o conselho lavrou ata condenando o maestro. O compositorConseguiu apoio de um capito do Corpo dos Bombeiros do Rio de Mauro Senise, que acompanhava o maestro, entrou em choque.Janeiro, Jos Cndido, para que os prprios bombeiros fiscalizassemApesar de conseguirem embargar o pleito, Guerra Peixe e os ou-as eleies de 1989. tros membros da chapa precisavam provar o ato ilcito do pleito antesA fora de Vianna no Rio de Janeiro j comeava a incomodarque o mandato de segurana fosse cassado. No conseguiram. ViannaWilson Sandoli. Guerra Peixe telefonou para Sandoli, pois julgavafoi mais rpido, conseguiu a cassao e validou as eleies.abuso alguns pontos do Estatuto Eleitoral baixado pelo presidenteNo ms seguinte, o conselho se reuniu para anunciar o resulta-naquele mesmo ano. Recebeu de pronto um no de Sandoli. O maes-do final da renovao do tero do conselho. Ao invs de divulgaremtro ento ameaou o presidente com um grande movimento nacionala contagem de votos, os membros receberam os nmeros finais emcontra a Ordem dos Msicos do Brasil. E Sandoli cedeu. porcentagem. Vianna teve mais de 80% dos votos. Randolf MiguelNo dia das eleies, Vianna deu tratamento especial aos seus percebeu, ento, uma incongruncia no resultado final: a soma doseleitores. Enquanto mandava os fiscais exigirem anuidades em dia resultados superava 100%. Contestou o resultado final, lavrado empara membros da chapa de Guerra Peixe, perdoava os inadimplentes ata, mas no teve apoio para levar o caso adiante.que os apoiavam. O guitarrista Alexandre Carvalho, que na pocaDerrotado nas eleies, Guerra Peixe sabia que havia ganhadotocava com o compositor Joo Bosco, havia sido aluno de Guerra um inimigo pessoal. At a sua morte, em 1993, o maestro foi perse-Peixe, e se disps a comparecer ao pleito para ajudar o ex-professor.guido por Vianna, que tentava cassar sua carteira de msico. ChegouQuando chegou, foi surpreendido por um dos membros do conselho a tirar uma foto do maestro dormindo, supondo que ele estava bba-chamando-o sala de Vianna. O presidente j o esperava. do, para conseguir seu feito. No foi feliz na tentativa.Assim que Carvalho entrou na sala de Vianna, o presidente abriuAlm da polmica com Guerra Peixe, Vianna se envolvia em ou-a primeira gaveta sua direita, tirou um revlver e repousou-o sobretros problemas no Rio de Janeiro, mas sempre era aparado por Ciroa mesa. O guitarrista engoliu seco. Com o dedo em riste, Vianna deuBraga e sua tropa de choque. Era acusado de subfaturar os contratossomente um recado: dos shows internacionais, que por lei tinham que destinar 10% de seu Avise a seus amigos que eu s saio daqui morto.valor para a Ordem dos Msicos do Brasil. Tambm fazia acordosDepois da ameaa, Guerra Peixe recebeu outra m notcia. O com donos de casas noturnas para encaixar bandas ligadas a ele emCorpo de Bombeiros no estava fiscalizando as eleies no interior.bailes de carnaval e outras apresentaes concorridas. Para isso, acei-Vianna, que esteve no exrcito, conseguiu neutralizar as tentativas da tava assinar notas contratuais abaixo do preo do mercado. Aos seusoposio. A eleio de Guerra Peixe estava praticamente perdida. amigos, distribua-as com sua assinatura, mas em branco. 27. 52 SONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do BrasilSONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasil 53Um dos membros do conselho, Renato Mspero, comeou a ter mas segundo os amigos mais prximos, depois de algum tempo queproblemas com o Ministrio do Trabalho no incio dos anos 1990. Vianna se manteve no cargo federal, um no conseguia mais olharEra acusado de achacar casas noturnas e aplicar multas dizendo-se para o outro.fiscal do ministrio. Foi descoberto, e logo depois fugiu.A histria comeou em 1999, quando Sandoli conseguiu apro-Enquanto a economia brasileira se fortalecia com o Plano Real,vao do Conselho Federal, por unanimidade, para o perdo das d-a figura de Vianna e Sandoli frente dos escritrios da OMB do Rio vidas dos conselhos estaduais. Inclusive, o documento contou com ade Janeiro e de So Paulo (respectivamente) tornavam os dois rgos assinatura de Vianna. Entretanto, quando o carioca chegou a Braslia,cada vez mais obsoletos. As unidades, que deveriam fiscalizar a pro-em agosto de 2006, disse que a dvida de So Paulo era muito grandefisso, tinham cada vez menos fora poltica e comeavam a diminuir em relao a dos demais estados. A partir da, todos os estados teriama arrecadao com anuidades. A fora e o apoio poltico dos anosde voltar atrs e pagar suas dvidas antigas.1970 e 1980 haviam acabado. Entre os prprios msicos, a OMB s Vianna e seu advogado Itamar Ribeiro de Carvalho acusaramtinha importncia burocrtica.Sandoli de um desvio de verbas de cerca de R$ 1,4 milho, suposta-No Rio de Janeiro, Vianna estreitava os laos com uma das con-mente transferidos a ttulo de emprstimo, do Conselho Federal paraselheiras, Clia Silva, preparando-a para assumir seu lugar na presi- a regional paulista.dncia regional. O representante fluminense da entidade no pensava O vice-presidente de So Paulo e membro do Conselho Fe-em se aposentar to cedo, mas queria realizar um de seus maioresderal, Roberto Bueno confirmou que seu estado pagava todos ossonhos: tornar-se presidente federal. vencimentos com muito sacrifcio. Apesar do pagamento, SandoliMas a iniciativa de Vianna em escolher Clia como sua sucesso-no ficou satisfeito e tentou, de todas as formas, tirar Vianna dara causou cimes em uma das pessoas em que ele mais confiava: sua presidncia federal.secretria particular, ngela. Ao perceber que sua lealdade no seria O primeiro ensaio deu frutos em 25 de abril de 2007, quando arecompensada to cedo, ela levou para casa o dinheiro arrecadadoeleio de Vianna foi considerada inconstitucional e ele teve de deixarpela Ordem e nunca mais voltou. o cargo. Os vcuos jurdico e de poder foram preenchidos por Hum-Apesar do baque, o momento de Vianna chegou em 2006. En-berto Pern Filho, advogado de Sandoli desde 1988.quanto Sandoli se preparava em Braslia para, mais uma vez, tomar Sandoli e Pern Filho diziam que Vianna fez uma srie de irre-posse da presidncia da OMB Federal, veio por fax uma deciso dagularidades enquanto exercia o cargo de presidente federal. Na oca-Justia de que, a partir de ento, o acmulo de cargos estadual e fede- sio, na sede federal, os dois teriam sido os protagonistas das supostasral estava proibido; portanto, ele deveria escolher entre a presidncia agresses verbais e fsicas, registradas em votos de repdio dos con-estadual de So Paulo e a federal. Na presidncia estadual desde 1965 selheiros de Sergipe, Rio de Janeiro e Distrito Federal. As acusaese acumulando os dois cargos desde 1981, Sandoli preferiu manter o foram negadas tanto pelo advogado quanto por Sandoli.cargo na OMB estadual.Pern Filho ficou no cargo at conduzir a eleio de 2 de julho.O indicado natural de Sandoli para a federal era seu vice em SoA nica chapa a concorrer foi a que era comandada pelo presiden-Paulo desde 2001, Roberto Bueno, porm ele recusou o cargo. Bueno te da OMB da Paraba, Benedito Honrio. Sandoli entrava na chapaalegou que no poderia largar sua vida de msico em So Paulo, onde como tesoureiro, para no cair novamente no problema de acmulotinha um conservatrio e era produtor de bandas de casamento. de cargos.Assumiu ento o vice-presidente federal eleito na chapa deVianna, obviamente, no concorreu s eleies de Honrio eSandoli, Vianna. A amizade entre Vianna e Sandoli sempre existiu, Sandoli. O resultado tambm no foi aceito pela justia, que consi- 28. 54 SONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do BrasilSONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasil 55derou vlida a eleio de Vianna, reempossado em 6 de julho. No-msicos amadores no tm lucro econmico com a msica, portantovamente no sonhado cargo de presidente federal, Vianna realizou no so profissionais para se submeterem s normas da OMB.o sonho de homenagear um de seus grandes dolos, o maestro Jos Advogado da OMB de So Paulo desde 1988, Humberto PernSiqueira, idealizador da Ordem dos Msicos do Brasil, criando umFilho, j est cansado dos processos contra a organizao. Ele disseauditrio com o seu nome. Vianna se orgulha de suas realizaes noque as decises dos juzes so variadas. Em alguns casos, eles conce-Rio de Janeiro, como colnia de frias e atendimento mdico aos m- dem liminares, mas muitas vezes a Ordem ganha.sicos, e declara que gostaria de dar notoriedade ao Conselho Federal, Quando entrevistado, Pern Filho mostrou dois documentossegundo ele, desconhecido dos msicos brasileiros.em que a entidade saiu vitoriosa. Em uma delas, o juiz Srgio Henri-que Bonachela indeferiu o pedido de nove msicos. A juza ClaudiaRinaldi Fernandes tambm indeferiu processos de msicos, alegan- Despertar dos Msicosdo que, como outras profisses, eles podem exercer suas atividadesamadorstica e profissionalmente. Entretanto, a juza encarou que oCom a ascendncia de Gilberto Gil ao Ministrio da Cultura, trabalho do msico com remunerao e com o propsito de promo-em 2002, a classe musical ficou entusiasmada. Era a primeira vez quever a subsistncia da pessoa passa a ser msico profissional, e comeaalgum da importncia e do conhecimento do compositor chegava a interessar a uma possvel regulao Estatal, no caso a Ordem dosao ministrio, uma pessoa que conhecia a classe profundamente, eMsicos do Brasil.que havia se envolvido com a parte poltica da profisso ainda na Em 2004, no Rio de Janeiro, o sindicato convocou uma reuniodcada de 1960. para propor mudanas na lei de criao da Ordem, 3.857/60. Os m-Os primeiros meses, ento, confirmaram o otimismo. Gil criou os sicos temiam pelo fim da entidade. O msico Eduardo Camenietzki,fruns permanentes de msica, que serviriam para discutir os rumosque j conhecia o presidente da OMB fluminense Joo Batista Vian-da msica brasileira, por aqueles que viviam dela. Compositores, maes-na, desde as eleies de 1982, foi escolhido, ento, para conversar comtros e msicos se reuniriam periodicamente para trocar experincias e Vianna sobre as alteraes na lei, possivelmente com o afastamentopropor solues para a situao do msico e da msica brasileira. do ento presidente. Joo Vianna, evidentemente, no gostou da ini-Desde 2000, a Ordem dos Msicos do Brasil sofria com a absten-ciativa dos msicos e sentiu-se ameaado. No assim que voc vaio no pagamento de anuidades e com derrotas na justia, a primeira conseguir chegar presidncia, aconselhou Vianna. Camenietzki foidelas para a Banda Sinfnica do Estado de So Paulo, que ganhou o irnico. Muito obrigado por me lanar candidato, mas pode ficardireito de no pagar a entidade para exercer a profisso. A partir da, com isto aqui e enfiar no seu cu, respondeu, bateu na mesa e deixouas liminares se multiplicaram, apesar de nenhuma deciso ainda tera sala da presidncia regional.sido tomada pelo Supremo Tribunal Federal.Depois da briga, Camenietzki resolveu desabafar sua fria naEm junho de 2002, 25 msicos de Florianpolis (SC) consegui-internet. Em trocas de e-mails com amigos, o msico acusou Viannaram a liberao para se apresentarem sem a carteira j em segunda de papa-defunto, uma aluso ao servio de funeral da Ordem parainstncia. H registros tambm no mesmo ano em Curitiba (PR). Mas msicos cujas famlias no tm dinheiro para realizar o enterro, ea primeira vitria na justia contra a OMB ocorreu em Belo Horizon- ainda acusou Sandoli de irregularidades administrativas. Era a deixate (MG). E no foi de um msico. O bar A Obra sofreu uma autuao para os presidentes iniciarem um processo de cassao ao msico.da Ordem por sediar apresentaes de msicos amadores sem cartei- Inicialmente, o conselho da Ordem cassou a carteira do maestrora da entidade. O argumento usado pelo bar, e aceito pelo juiz, foi que carioca. Porm, enquanto recorria da deciso na justia, Camenietski 29. 56 SONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasilcomeou a montar o que seria a maior manifestao de msicos con-tra a OMB desde sua criao, o Fora de Ordem.Estavam presentes nos Arcos da Lapa, no Rio de Janeiro, emshow para pouco mais de mil pessoas, nomes como Alcione, ArthurVerocai, Baro Vermelho, Batacot, Beth Carvalho, Boca Livre, Camade Gato, Clia Vaz, Claudio Zoli, Cristina Conrado, Darcy da Man-gueira, Eduardo Bentes, Flvio Oliveira, Ivo Meirelles & Funknlata,Jards Macal, Joo Carlos Assis Brasil, Jorge Arago, Kate Lyra, Leni-ne, Lngua Solta, Lcia Turnbull, Mrcio Malard, Nivaldo Ornelas,Pery Ribeiro, Robertinho Silva, Rodrigo Quik, Sandra de S, SidneyMattos, Tibrio Gaspar, Tunai, Victor Biglione, Wagner Tiso, WandaS e Zlia Duncan.O Fora de Ordem acabou pouco tempo depois por falta de re-cursos, mas teve como repercusso a criao de cooperativas em Mi-nas Gerais, Rio de Janeiro, Pernambuco, Distrito Federal (Associaodos Msicos do DF e Entorno) e So Paulo (Sindicato dos MsicosProfissionais Independentes).Camenietski teve, meses depois, sua carteira de volta, obtidaCaptulo IVatravs de liminar. A deciso demorou mais do que o esperado por-que o maestro carioca acusou seu primeiro advogado de ser amigoOrdem gera desordemde Vianna e, portanto, adiar muito a apresentao de seu recursona Justia. 30. ... a situao do msico brasileiro est num estado depenria total. Alm de no ganhar nada, ainda tem quepagar a Ordem. Tem que pagar para trabalhar.Edi Franco, diretor da Sociedade Independentedos Autores e Compositores Musicais (Sicam).... uma entidade que vive s nossas custas sem con-tribuir em nada para o aprimoramento profissional eque ocasionalmente nos cria problemas nos ambien-tes de trabalho com posturas policialescas na polticade fiscalizao.Frejat, cantor.... uma merda enorme e vergonhosa e intil e parasita. Lobo, cantor.... uma camisa de fora totalmente desnecessria nos diasatuais. Se a contribuio OMB fosse facultativa, duvidoque algum msico jovem se filiasse a essa entidade. Luiz Tatit, professor e compositor.... eu queria acabar com a Ordem dos Msicos. Ela nun-ca fez nada pelos msicos. Julio Medaglia, maestro. 31. 60 SONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasil SONHO DE ORDEM Divergncias na Ordem dos Msicos do Brasil 61A msica na poca da ditadura fazia muito barulho. A genteanos 1970, favorvel a qualquer iniciativa que desestabilize a OMB.cantava caminhando e cantando. Ela era muito forte. Existia um inte- Acredita que o rgo no representa nada da msica atual, mas seresse pblico da ditadura. Tudo isso fruto da Ordem dos Msicos.justifica: confesso que no tenho tempo nem interesse em lidar com assim que o msico Paulo Santana, presidente do Sindicato dosisso. S toro para que perea o mais rpido possvel.Msicos Profissionais Independentes, interpreta o comeo do rgoA revolta dos msicos com a Ordem evidente. A desunio daque fiscaliza a profisso. classe tambm. Crticas, denncias e manifestaes ainda no foramSegundo Santana, o conselho nasceu para aumentar o conheci-suficientes para alterar a situao do rgo. Esse comportamentomento tcnico dos msicos por causa do grande nmero de orques-pouco engajado dos msicos em relao OMB pode ser compa-tras que existiam na poca. Com a regulamentao, eles tinham querado ao conceito de lmpen-proletariado de Karl Marx. No livro 18aprender a ler partitura.Brumrio de Luis Bonaparte, o autor analisa histrica e politicamen-Em 1975, ocorreu a separao entre msicos profissionais e m- te os fatos que desencadearam a revoluo de 18 Brumrio, quandosicos prticos. Apenas os primeiros tm direito a voto, mesmo repre- Luis Bonaparte, sobrinho de Napoleo, deu um golpe de estado e im-sentando 5% da categoria. O restante obrigado a pagar, a estar emplantou uma ditadura na Frana, no ano de 1852. Segundo Marx, odia com a OMB, mas no vota e nem pode ser votado. Tal situaolmpen-proletariado o trabalhador que se desprende da sua classe um dos fatores que, em princpio, inviabiliza mudanas estruturais e no possui esprito de luta por seus direitos. O prprio Bonaparte na entidade. considerado por Marx como o chefe do lmpen-proletariado. Ele re-Os dirigentes no se mobilizam para que isso mude. Muito peloencontra os interesses que ele pessoalmente persegue, que reconhececontrrio, defendem a permanncia do regimento. Na prpria lei nessa escria, nesse refugo, nesse rebotalho de todas as classes a nica3.857/60 no existe nenhum artigo que mencione essa diferenciao. classe em que ele pode apoiar-se incondicionalmente para poder darTratou-se de uma das inmeras resolues da gesto Wilson Sandoli. o golpe, afirma Marx. O autor define os lmpens como:Os ms