sociedade guerreira no japao feudal

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Introdução O presente trabalho visa desenvolver uma reflexão sobre uma tra pouco conhecida, ou melhor, bem conhecida, porém, por meio deturpam a realidade deste assunto que é tradição “ninja”. O perod remete " lon#a duração, embora enfati$e mais os momentos de maior a no %apão, que remonta a, pelo menos, &'' anos atrás. O tema que será discutido nasceu de uma necessidade pessoal de profundamente, uma cultura que tem relação muito pr!xima com min praticante de artes marciais desde a inf(ncia e como ass )ltimo de$ anos. *o che#ar no final da #raduação em hist!ria, decid de conclusão de curso, articular essa minha dupla formação de apren ninjutsu+ a. * falta de obras sérias na ln#ua portu#uesa foi outra motivaçã fim. -udo o que havia sido publicado em nossa ln#ua sobre o ninja, “a arte do ninja” de 0acem 1ou#hari, eram traduç2es de mestres farsantes se aproveitam do sucesso do ninja para explorar pessoas e fa$er din 1ou#hari foi, inclusive, uma inspiração para or#ani$ar+me na direçã trabalho sério de pesquisa. *lém disso, sempre vi a necess persona#em tão mal interpretado pela mdia, e conseq4entemente, pe nesse sentido que o presente trabalho mono#ráfico busca dar sua peq O ninja é um persona#em de #rande import(ncia na hist!ria do %a pode passar despercebido. * exist5ncia da sociedade ninja, além de virá a enriquecer a hist!ria da cultura japonesa, pois é também atr consci5ncia de que o %apão, militarmente e culturalmente falando, n “samurais”, mas foi também lu#ar de uma diversidade de culturas. O fi#ura que carece de explicaç2es. 6m ponto que se deve levar em consideração na pesquisa sobre o pesquisa eu enfrentei, é a #rande escasse$ de obras na ln#ua port mesma maneira, poucas obras em outras ln#uas são di#nas de confian representam #randes empecilhos na pesquisa sobre tal tema. 7

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IntroduoO presente trabalho visa desenvolver uma reflexo sobre uma tradio at ento pouco conhecida, ou melhor, bem conhecida, porm, por meios pouco confiveis que deturpam a realidade deste assunto que tradio ninja. O perodo histrico abordado remete longa durao, embora enfatize mais os momentos de maior atividade da arte ninja no Japo, que remonta a, pelo menos, 700 anos atrs.

O tema que ser discutido nasceu de uma necessidade pessoal de conhecer, mais profundamente, uma cultura que tem relao muito prxima com minha vida, como praticante de artes marciais desde a infncia e como assduo estudante da arte ninja nos ltimo dez anos. Ao chegar no final da graduao em histria, decidi, atravs deste trabalho de concluso de curso, articular essa minha dupla formao de aprendiz de historiador e de ninjutsu-ka.

A falta de obras srias na lngua portuguesa foi outra motivao que me levou a esse fim. Tudo o que havia sido publicado em nossa lngua sobre o ninja, at 2006, antes da obra a arte do ninja de Kacem Zoughari, eram tradues de mestres farsantes e picaretas, que se aproveitam do sucesso do ninja para explorar pessoas e fazer dinheiro. Essa obra de Zoughari foi, inclusive, uma inspirao para organizar-me na direo de procurar fazer um trabalho srio de pesquisa. Alm disso, sempre vi a necessidade de esclarecer este personagem to mal interpretado pela mdia, e conseqentemente, pela sociedade atual. E, nesse sentido que o presente trabalho monogrfico busca dar sua pequena contribuio.

O ninja um personagem de grande importncia na histria do Japo e que no pode passar despercebido. A existncia da sociedade ninja, alm de tudo o que representou, vir a enriquecer a histria da cultura japonesa, pois tambm atravs dela que temos conscincia de que o Japo, militarmente e culturalmente falando, no foi feito somente de samurais, mas foi tambm lugar de uma diversidade de culturas. O ninja , portanto, uma figura que carece de explicaes.

Um ponto que se deve levar em considerao na pesquisa sobre o ninja, e que nesta pesquisa eu enfrentei, a grande escassez de obras na lngua portuguesa, no obstante, da mesma maneira, poucas obras em outras lnguas so dignas de confiana. Estes fatores representam grandes empecilhos na pesquisa sobre tal tema.

As obras ocidentais que se dedicam apenas ao tema ninja reclamam da falta de espao dedicado para o ninja na histria japonesa relatada pela historiografia japonesa. Esse um srio problema, pois prolonga uma viso que, segundo Masaaki Hatsumi, o ninja que sempre teve, pois foi alvo de lendas e mitos, e se providncias no forem tomadas, continuaro o sendo, nesta Era da Informao. Portanto, os historiadores com interesse nesta rea devem entrar mais a fundo nessa discusso. Hatsumi, como grande autoridade da arte ninja, demonstra um descontentamento constante pela falta de ateno da historiografia japonesa a este assunto, e alerta para a necessidade de enxergarem com maior ateno esta histria.

A maior parte das obras, que vo se empenhar no esclarecimento do ninja, so de origem ocidental, e o fazem a partir da necessidade de entendimento dessa figura que aparece no nosso cenrio mundial, em meados da dcada de 70.

Portanto, os autores selecionados para esta pesquisa, so, cada qual ao seu modo, autoridades no tema, com bastante reconhecimento pela seriedade de seus trabalhos. Atualmente, existe o herdeiro, a voz ativa desta tradio, o Gro-mestre Masaaki Hatsumi, que considerado o nico ninja, na plena acepo da palavra, ainda vivo, e que dedicou bastante de seu tempo para esclarecer quem era o ninja histrico, primeiramente ao Japo e posteriormente ao resto do mundo. Hatsumi fornece, atravs de suas experincias e heranas, descries fundamentais sobre o ninja e sua arte. Suas explicaes englobam aspectos histricos, polticos, culturais e tcnicos.

Os outros autores selecionados para a presente pesquisa foram ocidentais. O ingls, historiador e especialista em histria oriental, Stephen Turnbull, e o francs, historiador especialista em histria de artes marciais, Kacem Zoughari. A contribuio de ambos , sem dvida, expressiva, rica em detalhes de eventos de guerra, descries geogrficas e caracterizaes do ninja. So trabalhos dignos de reconhecimento. Turnbull fez profundas pesquisas nas obras japonesas e ocidentais para concretizar seu trabalho, enriqueceu-a mais ainda com raras gravuras e pinturas que representam a poca. Zoughari aprofundou-se, especialmente, nos pergaminhos herdados por Hatsumi de seu mestre, e pde desta maneira fazer um estudo detalhado nunca feito antes. Alm do mais, Zoughari fez estudos aprofundados em antigos relatos escritos no Japo na poca e pde associar a vrios acontecimentos histricos convencionais.

A apresentao da presente pesquisa ficou dividida em dois captulos, e um espao dedicado para as consideraes finais. O primeiro captulo se trata de uma reflexo sobre a memria histrica do mais autorizado especialista em ninjutsu, Masaaki Hatsumi. Considerado um tesouro vivo no Japo e grande difusor da cultura japonesa pelo mundo, Hatsumi hoje em dia vive no Japo beirando os 80 anos. Ele considerado a maior autoridade e grande mestre do ninjutsu na atualidade. Hatsumi tambm o responsvel pela abertura do ninjutsu para o mundo em meados dos anos 70, e foi a partir dele que existiu um despertar para os historiadores ocidentais para o estudo deste tema to pouco trabalhado.

O capitulo um estar dividido da seguinte forma: primeiramente, ser dada uma introduo ao autor, e uma explanao de suas obras; em seguida, as implicaes do caractere ninja segundo o autor; um pouco sobre motivos da revelao desta arte ao mundo; as demais artes marciais neste mbito; em seguida sero vistas idias desta tradio segundo o autor, como, por exemplo, seus mtodos de transmisso de conhecimentos de forma que o sigilo fosse mantido, a regra de conduta do ninja; o sistema de treinamento do ninja; a parte filosfico-religiosa que o ninja cultuava, e mais explicaes sobre as influncias continentais; a histria da tradio Togakure, que a que o autor pertence; paralelo entre a cultura ninja e a cultura predominante na poca. Desta maneira, a pesquisa das obras Ninjutsu History and Tradition, Essence of Ninjutsu e The way of the ninja, todos da autoria de Hatsumi, foram as principais bases do presente trabalho para a composio do primeiro captulo.

No segundo captulo foram selecionadas duas obras para a anlise historiogrfica: A arte do Ninja de Kacem Zoughari, e Ninja The true history of Japans Secret Cult de Stephen Turnbull. Na introduo deste captulo, ser visto rapidamente, os motivos que levaram estes historiadores a entrarem incisivamente no estudo deste tema. Sendo um dos principais motivos, a necessidade de explicar esse novo personagem que se apresentava ao mundo ocidental.

A primeira anlise ser da obra de Stephen Turnbull, onde sero observados seus pontos de vista na concepo do guerreiro ninja, as caractersticas, e aspectos blicos, e um comparativo entre os aspectos culturais predominantes e os marginais, especificamente, dos ninjas. Ter um espao dedicado apenas s caracterizaes atribudas, por Turnbull e pela historiografia japonesa, aos ninjas, que a de mercenrio, espio, assassino, etc, e ainda as associaes do surgimento da arte ninja, aos escritos de A arte da guerra do general chins Sun Tzu. No final da apresentao da obra de Turnbull, sero esboados alguns eventos de grande importncia na histria japonesa em que os ninjas estiveram envolvidos.

A segunda parte do segundo captulo, ser dedicada obra de Zoughari, enfatizando seu trabalho crtico de fontes, sua grande contribuio ao tema. A riqueza crtica que Zoughari demonstra, em sua obra, se deve ao acesso direto aos documentos do Mestre Hatsumi, alm de haver pesquisado em documentos encontrados em grandes museus do Japo. Desse modo, traa diretrizes para que possamos compreender melhor a realidade da arte ninja: o desenvolvimento e a transmisso da arte atravs dos sculos, comparada s demais artes marciais nipnicas, e a situao ps revoluo Meiji. Tambm foi dedicado um espao para expor as idias desse autor sobre as associaes que se fazem quando se escuta a palavra ninja, tanto no Japo, quanto no mundo ocidental. Por fim, so apontadas documentaes de referncia para o estudo e pesquisa do tema ninja, disponveis apenas no Japo.

As consideraes finais desta pesquisa iro fazer um balano do que se pde esclarecer sobre o ninja, que o principal objetivo deste trabalho, apontar as lacunas deixadas, e apontar alguns possveis caminhos para futuras pesquisas.

Captulo 1 - O Guardio de uma Memria.

(_*_)O presente captulo procura mostrar como se apresenta hoje a memria Ninja(), atravs de seu mais autorizado guardio, Masaaki Hatsumi, herdeiro de uma tradio milenar, representante da 34 gerao do cl ninja, chamado Togakure. Esse depoimento sobre a histria dessa, outrora, sociedade secreta est contido nas obras Ninjutsu: History and tradition, Essence of Ninjutsu e The way of the ninja, que trazem grande riqueza de informaes sobre diversas dimenses da antiga sociedade. Segundo Masaaki Hatsumi, a sociedade Ninja viveu no Japo h pelo menos 500 anos, perpetuando seus saberes e valores em segredo at que por volta de 1970, quando ele prprio rompe o segredo e passa a difundir pelo mundo a arte praticada outrora pelo Ninja, o Ninjutsu. Para Hatsumi, o Ninja, j ento, no mais existe, porm sua arte, que sobrevivera, poderia se perpetuar atravs dos ninjutsu-ka, ou seja, os praticantes de Ninjutsu.

A escrita japonesa caracterizada pela multiplicidade de significaes e conseqente multiplicidade de interpretaes para um mesmo Kanji (ideograma). No ideograma Ninja, chamado tambm de shinobi, o significado geral o de espionagem, de escondido ou de segredo. Nesse sentido, Hatsumi explica que o ideograma nin de ninja possui um significado difcil de traduzir para outras lnguas, porm, de maneira singela significa: resistncia e perseverana nos aspectos fsicos e mentais. Mas, para explicar de maneira mais completa, se faz necessria uma compreenso etimolgica da escrita nipnica. O ideograma nin composto por dois ideogramas distintos: na parte superior do nin existe o ideograma Tsuru ou lmina, e no inferior, Kokoro ou corao. Portanto, a construo escrita do ideograma nin, implica que o corao, ou fora de vontade, est direcionado de maneira que crie a efetividade da lmina, como um instrumento para completar a sua tarefa. Em outro sentido, nin significa ter controle sobre o prprio corpo, mente e percepo do certo e do errado.

O motivo da revelao dessa arte ao mundo, a partir dos anos setenta, deve ser creditado perda das condies para a existncia do Ninja histrico. A arte Ninja veio a perder sua serventia nas prticas particulares e em trabalhos de espionagem, em decorrncia do fim do Xogunato de Tokugawa, ao quais remanescentes da arte ninja estavam vinculados desde a ascenso desta dinastia. O ltimo ninja a trabalhar prximo s estruturas de governo foi Shinryuken Masamitsu Toda, instrutor de esgrima da famlia Xogunal por volta de 1860, mestre de Toshitsugu Takamatsu, este ltimo, mestre de Masaaki Hatsumi. A arte que fora passada em segredo at meados de 1970, foi ento aberta ao mundo por Hatsumi, pois ele percebeu que a filosofia e os caminhos marciais que o Ninjutsu ensinava no deveriam permanecer confinados, pois poderiam trazer vrios benefcios sociedade moderna mundial, e permitir, desta forma, a sobrevivncia dessa arte para alm de suas condies histricas de criao.

De fato, tanto a arte Ninja quanto s demais artes marciais perderam muito de sua antiga importncia a partir da Revoluo Meiji (1868), poca de transformao cultural em que reinou a tendncia de abandonar tradies em favor das inovaes tecnolgicas industriais, com uma abertura ao estrangeiro, incluindo o Ocidente, principalmente naquilo que pudesse contribuir ao aumento do poderio econmico e militar japons. Durante o perodo final do Xogunato de Tokugawa vrias famlias tradicionais de samurais, que protegiam seu conhecimento durante sculos, fragmentaram-se e desapareceram. Nessa derrocada da aristocracia samurai, as artes marciais que persistiram, embora no todas, tornaram-se esportes, como uma maneira de escapar ao esquecimento se adaptando s novas condies. Caso exemplar desse fenmeno foi o aparecimento do Jud, que significa caminho da flexibilidade, resultante de uma adaptao das antigas tcnicas do Bushi, combinadas a certos conhecimentos Ocidentais.

1.1 A tradio Ninja na voz do herdeiro

Portanto, se faz necessria a compreenso dos aspectos culturais da tradio ninja, que so temas to enfatizados na memria que emerge dos relatos e ensinamentos da obra de Hatsumi, para ento se entender as condies em que surgiram o Ninja histrico.

Ao longo de sua histria, a tradio Ninja se utilizou e desenvolveu mtodos para a sua elaborao e preservao. O que exigiu um grande esforo, em razo de seu carter circunscrito e secreto de ensinamentos que passavam de mestre para discpulo, durante geraes. O Kuden transmisso oral de conhecimento foi, durante a maior parte da existncia dos Ninjas, o meio privilegiado de transmisso de conhecimentos de mestre para aluno. Para isso, o Ninja possua um conjunto de regras para evitar a exposio de seu grupo sociedade e preservar, assim, a sua integridade.

Tais regras ditavam certos princpios do disfarce e da espionagem, como o de se infiltrar no campo inimigo e observar a situao que este se encontrava e, caso o ataque fosse necessrio, enxergar maneiras de surpreender o adversrio para sair vivo a qualquer custo. Mas tambm ditavam toda uma tica de deveres e obrigaes, dentro da qual o ninja deveria trabalhar para o soberano e sua nao, atravs de um esprito nobre de justia, para proteger a vida de seu mestre e familiares; assim, como tambm, o ninjutsu no deveria ser utilizado em proveito prprio, desejo pessoal ou com alguma outra inteno malvola.

Em razo desses princpios norteadores o ninjutsu atribui grande importncia ao Kyojitsu Tenkan Ho (mtodos de alternar o falso com o verdadeiro). Portanto, sem se revelar ao adversrio, o Ninja deve praticar a tcnica sem armas ou, ento, utiliza-las somadas s tcnicas de confundir o adversrio. Essas estratgias enfatizam mais o ataque sobre a mente do que sobre o corpo de outrem. Ou como afirma Hatsumi:

na luta pela sobrevivncia, o lutador superior utiliza todas as vantagens a seu alcance, incluindo as influncias mentais. Como um meio de enfraquecer a fora o adversrio, o velho Ninja desenvolveu a estratgia do kyojitsu tenkan ho, que significa: alternar conceitos de verdadeiro e falso. Uma estratgia de vencer que confia na apresentao do verdadeiro e do falso de maneira que iluda o adversrio. O kyojitsu tenkan ho o conceito que est presente em todas as atividades do Ninjutsu, na maneira de agir e na de pensar.

Disso resulta todo um conjunto de prescries: o ninja deve fazer uso da plvora, dos seus equipamentos, e das drogas medicinais venenosas e curativas para o cumprimento de suas misses; o ninja deve gastar um considervel tempo aperfeioando o uso de suas armas, de maneira que possa manejar qualquer instrumento que se depare; o contato com a me natureza de grande importncia, por isso o guerreiro deve aprender a metereologia, fisiografia e geografia, para prever as vantagens climticas; os guerreiros Ninja que quebrassem as regras com desordem eram severamente punidos, por isso deveriam ser treinados regularmente em situao de alta presso, levados aos limites das regras, para desenvolverem a necessidade de evitar, a todo o custo, o confronto direto, enfatizando a fuga; o ninja no deve, portanto, matar as pessoas, roubar ou machucar cidados honestos; e tambm, deve tomar cuidado consigo mesmo, fortificar seu corpo, ser imediato nas aes, estudar vrias coisas e dominar vrias habilidades.

Dessa maneira, com vrias regras para se manter o sigilo do grupo praticante face sociedade japonesa, a arte Ninja preservada neste sistema at meados dos anos setenta do sculo XX, quando Hatsumi abre as portas do Ninjutsu para o mundo. O Ninja que, em sua poca urea, viveu do perodo Muromachi (1336-1573) at fins do perodo Edo (1603-1867), deveria aprender o Ninja Juhachi Kei (as dezoito reas de treinamento do Ninja), como disciplinas obrigatrias para que pudesse exercer seu papel.

Atualmente, a tradio de Togakure no est mais relacionada com as atividades diretas de combate e de espionagem. Mas, no sculo XVI, antes da unificao do Japo, era necessrio para o ninja de Togakure operar em todas as reas a que fossem requisitados. Razo pela qual, segundo apresenta Hatsumi, eles eram treinados para serem especialistas em dezoito reas fundamentais de treinamento, que se iniciava com a pureza psquica, relacionada ausncia de maus pensamentos, seguida de um vasto campo de treinamento fsico e mental.

1 Seishin Teki Kyoyo (refinamento espiritual) que consistia em desenvolver e apurar o conhecimento de si mesmo, por exemplo, suas vantagens fsicas, suas aptides, e seus pontos fracos. O ninja deveria ter uma mente clara quanto a seus compromissos, e suas motivaes. Eram praticados exerccios de resistncia mental e ensinada uma perspectiva apropriada para quando estivessem avaliando as situaes diversas:

o ninja de Togakure se desenvolvia com uma compreenso mstica do processo universal, o guerreiro de Togakure se tornava um guerreiro-filsofo. As suas motivaes para entrar em combate eram motivadas pelo amor ou reverncia, e no pela emoo do perigo, ou por recompensas.

2 Tai Jutsu ou combate desarmado era a segunda categoria de treinamento do ninja, onde iria iniciar seu aprendizado com o Dakentaijutsu(Tcnica de uso de ataques como chutes, socos e bloqueios), Jutaijutsu(Estrangulamento, combate corpo a corpo como no Jud, e evitar que o adversrio o agarre) e, finalmente, o Taihenjutsu(movimentao furtiva, acrobacias e posturas).

3 Ninja Ken, o manejo do sabre Ninja. A espada Ninja era considerada a sua ferramenta primria de combate. Era mais curta do que a tradicional Katana utilizada pelo Samurai, e possua apenas um gume. A habilidade de fazer o saque com rapidez era um ponto fundamental. Toda espcie de armamento para um Ninja tinha uma conotao bem diferenciada daquela de um Samurai, que reverenciava sua espada, pois sua alma estaria nela encerrada. Da advindo o grande zelo que todo samurai tinha por esse objeto. Bem diferente era o Ninja, que via a espada, ou qualquer outra arma, como uma ferramenta facilitadora do cumprimento de seus deveres. Alm disso, a espada ninja era mais frgil, pois no passava pelo longo processo artesanal de uma katana.

4 Bo Jutsu (arte de manejar o basto). O ninja tinha a habilidade de manejar o mesmo basto utilizado pelos samurais, o Bo, ou basto de seis ps de comprimento. Tambm existia o Hambo (basto de trs ps de comprimento ), utilizado pelos guerreiros de Togakure, mas sua grande especialidade era esconder vantagens sob as armas, chamada de Shinobi-zue: os bastes tinham um aspecto comum, mas escondido neles encontravam-se lminas, correntes e at animais venenosos.

5 Shuriken Jutsu (arte de arremesso de lminas) - bem peculiar dos ninjas, que escondiam as lminas nos bolsos de suas vestimentas. Em Togakure especificamente, eles utilizavam tanto a estrela metlica de quatro pontas, a Senban Shuriken, quanto a Bo Shuriken, a lmina em forma de basto.

6 Yari Jutsu (arte de manejar a lana) - o Ninja era perito no manejo da Yari (lana), mas tambm possua um tipo incomum de lana para os guerreiros da poca, a chamada Kama Yari, uma lana de nove ps com dois ganchos que apontavam para baixo, junto a parte pontiaguda. Esta arma servia para capturar a arma do adversrio e, mesmo, para escalar superfcies altas.

7 Naginata Jutsu (arte de manejar a alabarda) - a Naginata, arma tpica do Samurai, apropriada para contra-ataque, tambm fazia parte do arsenal do guerreiro de Togakure. um basto longo, que na ponta possui uma lamina semelhante de uma espada curta. Em Togakure, existe um tipo maior de Naginata, de influncia chinesa, chamado Bisento, que possui uma lmina muito pesada. Esta arma servia para destruir armaduras e para cortar as pernas dos cavalos usados pelos cavaleiros.

8 Kusari-gama Jutsu (arte de manejar a foice-corrente) a corrente tinha de seis a nove ps de comprimento com uma bola de ferro na ponta e servia para bloquear ataques de espada e tambm para capturar. A foice, tradicionalmente utilizada para colher o arroz, ficava colada na outra ponta da corrente, e servia para eliminar o adversrio. Em Togakure, existia um tipo particular de Kusari-gama, chamado Kyoketsu Shoge, que, em vez de corrente, se utilizava de cabelos de mulher ou de rabo de cavalo, na sua ponta tinha, ainda, uma argola de ferro, onde poderia se colocar fogo ou algum animal peonhento e, anexado foice, havia a ponta de uma lana.

9 Kayaku Jutsu (arte de manejar o fogo e explosivos) aps a introduo das armas de fogo no Japo pelos portugueses (sculo XVI), os ninjas passaram tambm a dominar a percia do fogo e dos explosivos. Eles aprendiam a implantar explosivos, como sabotadores, com habilidade formidvel no uso da plvora negra e de outras tcnicas.

10 Henso-Jutsu (arte do disfarce e da despersonificao) a arte do disfarce e da despersonificao, era uma habilidade de espionagem fundamental. O Ninja assumia falsas identidades e movia-se sem ser percebido nas suas reas de operao. Segundo Hatsumi, mais do que apenas vestir uma roupa diferente, o sistema de disfarce no Ninjutsu envolvia a adaptao a qualquer circunstncia inesperada, o que inclua traos de personalidade, reas de conhecimento e dinmicas do corpo, que faziam parte da identidade assumida. Significava uma capacidade de se moldar segundo as necessidades: Ele ou ela, literalmente assumiam uma nova personalidade, interpretando o papel de um monge, de um navegador, ou de um mendigo.

11 Shinobi Iri tcnicas de ocultamento e mtodos de invaso. Segundo Hatsumi, a tcnica Ninja de mover-se em silencio, de invadir, e de ganhar acesso a reas inacessveis, tornaram-se lendrias no Japo feudal. O Ninja de Togakure era treinado em um mtodo especial de caminhar e de percorrer longas distncias, passando sobre pisos silenciosamente encobertos pela sombra quando se moviam, de maneira que facilitasse a entrada e a sada do local.

12 Ba Jutsu(montaria) o Ninja aprendia a andar e combater montado a cavalo, sendo a montaria escassa e um privilgio da aristocracia.

13 Sui Ton nadar em silncio e de maneira invisvel, usar tipos especiais de bias e barcos para cruzar caminhos aquticos, e ainda combater na gua, eram habilidades aprendidas pelo Ninja de Togakure.

14 Bo Ryaku (estratgia) - eram utilizadas mtodos no convencionais de engano, de batalha e, mesmo, de influencia poltica. O ninja, sem que chamasse a ateno, utilizava artimanhas para manipular o adversrio no campo de batalha e, s vezes, antes do confronto direto, de modo a causar discrdia e confuso no campo adversrio.

15 Cho Ho (espionagem) os guerreiros Shinobi chegaram a um estado avanado da espionagem, com capacidade de detectar espies infiltrados, e recrutar pessoas para fornecer obter informaes. A espionagem est intimamente atrelada s habilidades de ocultamento, aos movimentos silentes e arte do disfarce.

16 Inton Jutsu (arte de escapar e de mesclar-se com o ambiente) os Ninjas eram tambm mestres na arte de utilizar o meio ambiente para cobrir suas sadas e fugas, mesclar-se na natureza utilizando a tcnica do Gotonpo. O elemento terra, do Do Ton, era utilizado para soterrar o corpo e cobrir-se por pedras, de maneira que o indivduo no fosse localizado pelo inimigo. O Suiton era o mtodo de utilizar a gua para permanecer invisvel. Existia um tipo de canudo de bambu, por onde respiravam enquanto estavam submersos na gua. O Katon, ou mtodos de utilizar o fogo, fumaa ou explosivos para manter-se invisvel, era utilizado como um meio de fuga e, principalmente, como distrao para o ocultamento. A conhecida bomba de fumaa usada pelo Ninja tornou-se um estigma graas ao cinema norte americano. O Kinton consistia em utilizar metais ou superfcies espelhadas para distrair o adversrio. Por fim, havia o Mokuton, que consiste em mesclar-se com as rvores, escalando, usando as folhagens e mantendo-se escondidos para evitar a viso do inimigo.

17 Ten-Mon (metereologia) o Ninja desenvolveu a capacidade de entender os cmbios no clima, nos ventos e na fauna, para prever a situao ambiental e utilizar como vantagem durante o cumprimento do seu dever;

18 Chi Mon (geografia) - O estudo e a necessidade de conhecer bem a geografia do territrio adversrio foi uma tarefa primordial para o Shinobi antes da sua ao.Em suma, essas dezoito reas, como nos apresenta Hatsumi, configuram o sistema tradicional de treinamento do Ninja histrico e expressa todo um embasamento fundamental da prtica no Kyojitsu Tenkan Ho. 1.1.1 A espiritualidade do guerreiro

As crenas filosfico-religiosas que formavam a concepo de mundo da comunidade Ninja se formaram, em larga medida, atravs de laos do Japo com o continente, por via de relaes comerciais, culturais e polticas. A ndia, a China e o Tibete esto entre as mais importantes regies com as quais se estabeleceram esses laos, muitas vezes atravs da Coria, que durante sculos funcionou, para o arquiplago japons, como regio-ponte, ligando-o ao continente. Nessas relaes circularam conhecimentos msticos, como os do Mikkyo, do tantra e do ekkyo, alm de outros mtodos de experimentar e interpretar a vontade e a fluncia dos fenmenos. As tcnicas, as tticas e o espiritualismo do Ninjutsu incorporaram o simbolismo da natureza forjados nesse universo relacional do Japo com o continente, e o Ninja se fundamentou nesses simbolismos para o desenvolvimento de suas prticas.

Nessa direo filosfica, como enuncia Hatsumi, existem dois grupos simblicos usados harmnica e coordenadamente, que iro indicar o como as coisas funcionam, e o como as coisas so. As duas dimenses co-existem exatamente ao mesmo tempo e momento, podendo, at, aparecer de maneira separada se, por exemplo, as coisas forem vistas curta distncia. Contudo, o entendimento s se completa verdadeiramente na articulao das duas dimenses.

A primeira das dimenses destacadas faz meno ao domnio da verdade final, ou melhor, s cinco manifestaes naturais Go Dai, que so: chi, sui, ka, fu, ku, respectivamente: terra, gua, fogo, vento e vazio. Estes elementos simbolizam a criao do universo, e demonstram a maneira pela qual a matria fsica se manifesta em potenciais atmicos desprovidos de forma, tais como: gases, comburentes, lquidos e slidos. Desta maneira eles buscam explicar como as coisas so.

Da perspectiva da dimenso da matria real, surge o Go Gyo, que so os cinco elementos primrios. Estes iro descrever a inter-relao e operao das coisas. Eles so representados por: Do, Sui, Ka, Moku e Kin, que so respectivamente terra, gua, fogo, madeira e metal, e so elementos em constante trabalho de interao, pois eles criam e destroem entre si. Hatsumi descreve o ciclo do Moku para ilustrar: a gua nutre uma rvore para o seu crescimento; logo o metal surge para destruir a vida da rvore; o fogo transforma a madeira em cinzas; e de novo ela volta ao ciclo. Hatsumi informa, ainda, que os cinco elementos podem operar simbolicamente na regulagem da sade de um ser humano.

Os conhecimentos de gogyo e godai esto relacionados com os conhecimentos transmitidos por sbios taostas advindos da China, somado a isso, devido s circunstncias da necessidade e da proximidade que o Shinobi no mono(sinnimo de ninja) tinha com a natureza, criou-se um novo conhecimento, o Gotonpo, ou seja, a utilizao dos cinco elementos da natureza para escapar do inimigo. Essa foi a tcnica utilizada pelo guerreiro Ninja para esconder-se de seu adversrio.

Tambm necessrio destacar a existncia de uma prtica religiosa, desenvolvida por monges msticos do Tibete e do Norte da China, difundida na sia atravs da estrada de seda. Estes ensinamentos passaram por outras localidades, seguiram em desenvolvimento, e foram introduzidos no Japo na poca da dinastia Tang na China. Este mtodo esotrico passou a ser chamado mikkyo, e possua um ritual, assim descrito por Hatsumi: o Kuji (nove slabas) era freqentemente usado em dois possveis sistemas. Kuji-in(os selos das nove slabas) so as posies das mos em que os dedos ficam entrelaados de 9 maneiras diferentes, e Kuji Kiri( cortes com as nove slabas) que uma grade de poder imaginria, na qual a mo direita faz cortes no ar. As posies das mos e a grade de cortes so na verdade apenas um tero do conceito de Kuji. Eles tem o papel da ao fsica, a eles dever ser implementada a ao da inteligncia e da vontade para que possa produzir algum resultado. Ento estes trs pontos de pensamento, palavra e ao, coordenados e harmonizados vo compor os princpios o Kuji. Este tipo de prtica na verdade uma maneira de eliminar o vcuo que separa a inteno da ao bem sucedida. Quando a tcnica do Kuji era dominada, o Ninja tinha ento o poder de criar uma realidade fsica baseado na sua inteno.

Por conseguinte, quando essa habilidade de concentrao aplicada nos combates, segundo Hatsumi, ela aparenta conceder ao guerreiro uma energia que desafia as leis fsicas. Porm, no so simples truques ou alguma magia, mas tcnicas avanadas de meditao que eliminam os limites que restringem a grande capacidade que o ser humano comum tem de armazenar energia no seu corpo.

Alm desses ensinamentos esotricos, o ninja foi constantemente associado aos rituais de magia advindos de tcnicas utilizadas por antigos mgicos e ilusionistas no Japo. A primeira chamada de Gen Jutsu (- Tcnica de Ilusionismo) foi influenciada pelo taosmo chins e pelo Mikkyo. A outra arte chama-se Yo Jutsu, que uma arte sombria, onde so feitos truques que enfatizam os poderes sobrenaturais dos espritos. Da maneira que o Gen Jutsu demonstra iluses no espao fsico, o Yo Jutsu demonstra truques materiais. Segundo o livro Essence of Ninjutsu de Masaaki Hatsumi, as tcnicas de iluso eram auxiliadas por alucingenos e controle das luzes. Com o largo conhecimento da mente humana, os mestres ilusionistas conseguiam enganar as pessoas comuns. O ninja, durante seu treinamento, aprendia os vrios princpios do Gen Jutsu e Yo Jutsu, conseqentemente, sendo um portador de tal habilidade, ele poderia identificar facilmente os truques de um mgico. Somado a esse fator, o Ninja utilizava o ilusionismo com freqncia em suas tcnicas de Inton Jutsu (tcnicas de ocultamento).1.2 A histria contada pela tradio

J tendo esboado o significado da palavra ninja e de suas prticas, atravs dos dados fornecidos sobre sua formao e sua crena, faz-se mister, nesta parte do captulo, expor a histria segundo os textos do guardio da tradio Togakure, para, em seguida, proceder anlise.

Togakure-Ryu escola do porto oculto uma linhagem tradicional de Ninjutsu que aparece no perodo Muromachi (1336-1573), e manteve-se durante o perodo Sengoku Jidai, quando a atividade ninja altamente requisitada. Nesse perodo, os senhores feudais que deviam fidelidade ao Xogum, comeam a se emancipar separadamente do poder central. Cada shugo, nome pelo qual eram chamados na poca, necessitavam de proteo para suas propriedades e terras, proteo que o poder central no podia oferecer. Os shugo, ento, comearam a criar sua prpria fora armada, que priori serviria para a prpria proteo, mas logo passaram a conquistar as zonas territoriais de suas circunvizinhanas e auto-intitularem-se de Daimyo grande nome, assim, a autoridade central descartada e se inicia o perodo de guerra civil pelo poder.

Contudo, a fundao da tradio de Togakure no possui datao precisa. Hatsumi em suas obras Ninjutsu History and tradition, The way of the Ninja e Essence of Ninjutsu apresenta a estimativa de 800 anos atrs(+- sc. XII-XIII), mas no fornece maiores detalhes e dedica pouco espao para tal. Porm, deve-se levar em conta que, da poca estimada em que a escola foi fundada at o final do perodo Edo, a maioria dos conhecimentos que envolvem a histria do Ninjutsu, inclusive os conhecimentos tcnicos, foram passados por Kuden, ou seja, por via oral, portanto, existem poucos documentos escritos e, mesmo esses, em cdigo. A inteno de codificar os documentos era proteger os conhecimentos da escola no caso de serem perdidos ou roubados. Por conseguinte, boa parte do conhecimento que se tem hoje em documentao foi uma contribuio dos ltimos mestres que resolveram registrar, pois a necessidade de esconder j no cabia na nova sociedade que surgia. No entanto, surgem alguns problemas quanto a estes registros, pois neles no esto contidos nenhuma referencia datas em que foram escritos.

Portanto, no que concerne parte histrica, especfica da escola, as nicas fontes escritas referenciais so os documentos guardados por Masaaki Hatsumi, ao que se deve somar os artefatos encontrados no museu de Togakushi, antiga Togakure. Portanto, o relato que emerge dos trabalhos de Hatsumi resultante das lies aprendidas em seu treinamento e passadas pela tradio Togakure, referenciados nesses documentos escritos e vestgios arqueolgicos.

Dessa maneira, a fundao da escola primeiramente assim narrada por Masaaki Hatsumi:Oito sculos de histria e tradio para trs nos leva de volta ao fundador de nosso sistema, Daisuke Nishina da vila de Togakure. Aps ser derrotado pelas tropas de Heike, Daisuke escapa de sua cidade natal, Nagano, e passa a viver na regio remota de Iga. Neste local ele muda seu nome para Daisuke Togakure, e reconhecido como fundador desta tradio.

J em outro relato, Hatsumi evoca uma verso mais detalhada: De acordo com o Densho(pergaminhos escritos) da escola Togakure, este estilo de Ninjutsu foi fundado por Togakure Daisuke. Iniciaram-se os fatos que iriam desembocar na fundao em 1181, quando o exrcito de Taira avanou com mais de dez mil homens para subjugar Kiso Yoshinaka(1154-84), este que havia criado um exrcito para tir-lo do poder. Yoshinaka reagiu para interceptar este ataque e comandou seu exrcito partir de uma caverna, negligenciando o rio Susobana, este que passava pelas montanhas de Togakure (na atualidade chamado Togakushi). O local onde Yoshinaka estabilizou suas tropas, e levantou o grito de guerra, conhecido at hoje como Caverna do Lorde Kiso. No exrcito de Yoshinaka um vassalo de 16 anos chamado Shima Kosanta Minamoto no Kanesada, que havia se submetido um austero treinamento na regio de Togakure, e adquirido maestria nas reas de Senban-Nage (arremesso de lminas) e Hicho Jutsu (meios de neutralizar a tcnica do oponente), e no decorrer do treinamento, foi apresentado a um aprendizado similar ao Shugendo, que um tipo de ascetismo montanhs que estava se espalhando pelo pas.A sorte de Yoshinaka foi pequena, e ele morreu em batalha. Enquanto isso, Shima Kosanta Kanesada estava gravemente ferido, pois ele havia atravessado um grupo de 3000 cavaleiros que estavam sobre o comando de Fujiwara Hidehira, e assim ele desmaiou por causa de suas feridas obtidas em combate. Ele foi socorrido por um sbio taosta conhecido pelo cognome Kasumi-Gakure(escondido na nvoa), e foi levado para as montanhas de Iga. Nessa poca, o sbio o aceitou como seu discpulo, e o treinou nos caminhos marciais do Ninjutsu. Shima Kosanta Minamoto no Kanesada, posteriormente mudou seu nome para Daisuke Togakure, e estabeleceu o estilo Togakure-Ryu como um novo estilo de Ninjutsu na rea de Iga.

No povoamento da regio e Iga, Hatsumi informa que, assim como a escola de Togakure se formou, outras escolas tambm se iniciaram com militares derrotados nas proximidades de Iga. Isso se explicaria pelo fato de fazer parte das prticas guerreiras da poca que, depois de derrotado, o exrcito perdedor fosse perseguido at ser eliminada qualquer possibilidade de resistncia. Portanto, o recurso dos derrotados foi, geralmente, o de procurar abrigo nas reas mais isoladas. As regies de Iga e de Koga, poca, se enquadravam perfeitamente nesse perfil. Da que: (...) fugitivos do cl Fujiwara, assim como os derrotados durante o conflito Taira-Minamoto, e depois do confronto entre as cortes do norte e sul (1336-92), viram refgio em regies como Iga e Koga, e se estabeleceram como samurais rurais. No entanto, eles eram caados rigorosamente, e desta maneira eles se viram obrigados a refinar as tcnicas de Tongyo (ocultamento), para que eles e suas famlias pudessem sobreviver e escapar. Isto e os esforos deles foi o que sistematicamente evoluiu e deu luz ao Ninjutsu.

Todavia, em outro livro, Hatsumi descreve a fundao da escola de modo diferente: A escola de Togakure de Ninjutsu, datada anteriormente a Togakure Daisuke no perodo Oho(1161-62). Ele recebeu seu treinamento em Ninjutsu por Kagakure Doshi. Durante o perodo Hogen(1156-59), Shima Kosanta Minamoto no Kanesada, de 16 anos, junto a um poderoso cl da provncia de Ise, uniu-se ao exrcito de Minamoto Yoshinaka, e lutou contra 3000 cavaleiros do exrcito de Fujiwara Hidehira. Cado na batalha, ferido seriamente, Shima foi salvo e levado para as montanhas de Iga por Kagakure Doshi. dito que ele recebeu treinamento em artes marciais, assim como Ninjutsu, de Kagakure Doshi. Anos depois, ele foi celebrado como o segundo sucessor da escola de Togakure.

Durante o perodo Oho, aproximadamente cem anos antes da era Jiryaku, Kagakure Doji, que era discpulo de Hakuun Doji, treinou Togakure Daisuke no Ninjutsu, para que em troca, ele tomasse conta de Shima Kosanta.

Como bem chama a ateno o autor Paul Richardson, na introduo de seu livro An introductory history to the schools of Bujinka: Hatsumi sempre reconta a histria dos mesmos eventos de maneira diferente. Contudo, preciso considerar que Hatsumi no tem a mesma preocupao, nem a formao especializada, de um historiador. Seu objetivo fundamental, e plenamente alcanado, o de ensinar a arte Ninja. Para tanto, com respeito fundao da escola, apenas tenta transmitir a idia essencial do mundo em que se forjou essa arte. Tambm bom salientar que, ele relata, acontecimentos, referenciado numa documentao marcada pela memria oral tradicional, com suas lendas e contos, nem sempre muito clara para padres atuais. Nesse sentido, uma rica documentao para o olhar historiogrfico, mas que requer toda uma crtica de erudio e interpretao.

Em suma, sem levar em conta a necessidade de estabelecer-se uma data, uma exatido de nomes, ou at mesmo uma corroborao entre as histrias da fundao de Togakure, Hatsumi oferece verses distintas, uma na qual o Daisuke Togakure seria o fundador desta tradio, seguido de Shima Kosanta, que estava sob sua guarda. Noutra verso, ele mostra Daisuke Togakure, como sendo o prprio Shima Kosanta aps ter seu nome alterado. De qualquer modo, percebe-se, nessas verses diferentes, uma mesma significao fundametal: como uma prtica guerreira nova nasce do retiro, criando toda uma tradio como resultado das lies de uma derrota militar em aliana com os ensinamentos espirituais monsticos.

1.3 A difuso de uma arte e a reelaborao de uma memria.Para se esclarecer os motivos dos comportamentos e atitudes do Ninja histrico, frente realidade japonesa de sua poca, importante reconhec-lo como uma contracultura e no uma cultura dominante. A grande parte do Japo vivia, ento, os reflexos das tradies dos Bushi ( sinnimo para samurai). O Ninja, particularmente, como coloca Hatsumi, diferia dos Bushi da poca, ainda que ambos professassem o princpio da no utilizao de suas artes em benefcio prprio.

No caso do Ninja, o aprendizado da arte teria a funo de proteger a famlia e a nao da qual ele fazia parte, valorizando sua vida e buscando estar de acordo com as leis da natureza, sem servir especificamente a nenhum Daimyo. J os Bushi seguiam um elaborado cdigo de honra, o Bushido, ao qual deveriam obedecer de maneira competente. O Bushido, dentre vrias caractersticas, enfatizava a obedincia e a serventia de um guerreiro para com o seu senhor, portanto, o termo Samurai significa: aquele que serve. O desrespeito e a desonra de si prprio ou do seu senhor eram a maior desgraa que um samurai poderia passar, da a existncia de um suicdio ritualizado, seppuku ou harakiri, como uma maneira de readquirir a honra em casos extremos.

O Bushido era um cdigo moral passado oralmente. Existia, antes, como um ideal e, posteriormente foi registrado sob a forma escrita por samurais aristocratas que viveram na Era de Paz do Japo Xogunato Togukawa (1603 a 1867). Dois grandes exemplos so as obras: Bushid de Daidoji Yuzan e Hagakure de Yamamoto Tsunetomo, que enfatizam o ideal senhorial de lealdade e respeito, enaltecendo a fidelidade ao senhor acima do valor individual do guerreiro. A entrega da prpria vida pelo seu senhor torna-se, nesse contexto, a expresso mxima de tal fidelidade.

Portanto, face submisso senhorial do Bushi, o Ninja diferia, por conceber a prpria vida como valor transcendente fidelidade a um senhor feudal. Nesse sentido, Hatsumi critica os livros de histria japoneses, como limitados, ao se referirem aos ninjas: Nos livros mais recentes, de uma gerao atrs, Hanzo Hattori, o cabea de uma das mais influentes famlias Ninja em Iga e tambm dirigente dos ninja que permaneceram no Xogunato de Tokugawa Ieyasu, era mencionado como: bushi da distante provncia de Iga. A hesitao em falar abertamente do Ninja na construo da sociedade japonesa, talvez resida na glorificao do conceito de tica proveniente do samurai, que tornou-se bem popular aps a restaurao Meiji (1868).

Dessa maneira, o perodo da dinastia Tokugawa (1603 1868), que teve como o dcimo quinto e ltimo Xogum, Tokugawa Yoshinobu, se encerrou com a Revoluo Meiji. As profundas modificaes, que da emergiram, alteraram a sociedade japonesa na direo de uma acentuada modernizao, como j se assinalou. Os antigos valores tradicionais da cultura japonesa comearam, ento, a serem rearticulados por valores modernos. Nesse processo, os valores do samurai permaneceram no mago da sociedade japonesa, ressignificados ao servio do culto da extrema dedicao nova ordem modernizante. Esse trao de dedicao caracterstico se expressa na ritualizao tradicional das mais diferentes atividades sociais do povo japons, do que so exemplos: a cerimnia do ch, o Ikebana (arte do arranjo de flores), e, tambm, as artes marciais.

Nesse Japo transformado pela modernizao Meiji, o grupo ninja, adotou a postura de retirada, talvez em razo de seus laos com a famlia xogunal Togukawa, destituda do poder central. Essa recluso, por seu turno, deve ter contribudo, pela ausncia de visibilidade social, com sua associao a vrios mitos construdos durante o perodo Edo, nos quais o ninja era figurado como um guerreiro sombrio, que agia apenas na noite, sempre vestindo o negro e com poderes sobrenaturais. Desse modo, sua histria tornou-se uma espcie de mitologia para os japoneses, que no lhe dispensaram pesquisas aprofundadas.

Os historiadores modernos ficam intrigados ao falarem sobre o Ninja. A documentao escassa, somada falta de acesso, fez com que alguns historiadores chegassem concluso que: O mundo dos ninjas profundo e complexo; a histria do ninja longa e antiga. Por este motivo, torna-se to difcil que a sociedade japonesa tome conhecimento dos caminhos factuais que o ninja percorreu.

No entanto, o Ninja teve um papel de grande importncia na histria japonesa, um exemplo disso foi quando o conhecido lder Ninja Hattori Hanzo, que conduziu uma escolta de Ieyasu Tokugawa, na sua marcha para o poder, atravs de Iga e Koga, conseguindo que o futuro Xogum atravessasse ileso estas regies, repletas de bandidos e saqueadores. Desde ento, os ninjas do grupo Hattori passaram a formar a guarda pessoal do Xogum em 1603.

Em torno da figura de Hattori Hanzo, foram criadas toda uma srie de lendas, tambm expressa em pinturas que o caracterizam como um mgico que desaparecia, caminhava na gua e lia a mente. Esse esteretipo mostrou-se poderoso na cultura japonesa. Hoje em dia, ao atrair o publico internacional, essas histrias que encobrem o ninja histrico se tornaram atraes teatrais, cinematogrficas e temas de romances.

Entretanto esse processo no de mo nica, em razo da difuso da arte ninja, tambm emergiu um esforo de resgatar a histria e a tradio desse grupo. Hatsumi tornou-se o guardio vivo dessa tradio e nos mostra certa face desse grupo, ressaltando os aspectos culturais que lhe chegaram e que considera centrais para difuso da arte. Tambm cabe aqui registrar a preocupao de outros pensadores/pesquisadores tambm empenhados em elucidar, atravs de pesquisas em anais imperiais e crnicas de guerra, essa histria to envolta em silncios e segredos.

1.3 (A)Uma histria entre mitos e lendas.

Hatsumi comenta em seu livro Ninjutsu history and tradition que o ninjutsu no possui uma data nem um lugar de origem especfico, mas existem vrias verses para seu surgimento. vlido observar que muito do que se sabe sobre os Ninjas, antes de sua estabilizao nas provncias Iga e Koga, foi passado oralmente em contos e fbulas. Nestes contos, o ninja sempre estava associado aos mistrios da magia negra, ocultismo e aparies em forma de distintos animais, por exemplo, como um Tengu demnio com o rosto de um corvo.

O que se tem de mais concreto sobre o Ninja est associado sua presena nas provncias de Iga e Koga. Os registros restantes foram apenas alguns pergaminhos que contavam a histria de sua regio por monges dos templos que se encontravam nesta rea. Os Iga no Mono, ou moradores de Iga, tiveram sua histria narrada nos registros familiares que se encontram ainda hoje no museu de Iga, e tambm tiveram registradas suas relaes com uma proeminente famlia Samurai numa regio vizinha.

preciso salientar que, os homens e mulheres chamados hoje de ninja no se rotulavam desta maneira. Segundo Hatsumi, eles se consideravam meros praticantes de poltica, religio e estratgias militares, que se opunham, ou que se diferenciavam dos modelos convencionais da poca. O modo de vida do ninja diferia e muito do modelo em evidncia na poca. O fato de estarem numa regio isolada por cadeias montanhosas de difcil acesso, contribuiu de maneira marcante em seu modo de vida. Enquanto o restante do Japo vivia sobre a presso e a cobrana de impostos de determinados Daimyos, o povoado Ninja vive uma relao harmoniosa com o Daimyo da provncia de Ise, este que tinha poderes polticos sobre a rea, porm temia e respeitava a famosa habilidade guerreira dos habitantes dessa regio, entrando, inclusive, num acordo com os lderes das famlias a residentes. Dessa maneira, a sociedade de onde provem o ninja possua gama de prticas militares e religiosas particulares que a singularizava.

Realmente se torna bastante difcil ter algo concreto de uma prtica marcada pelo segredo, da qual poucos registros foram escritos, ou so pouco detalhados. Como j foi dito, o que restou destas tradies foram documentos que provinham de famlias residentes na regio, registros de relaes entre a provncia vizinha Ise e as provncias de Iga e Koga, e documentos escritos por monges que habitavam os templos nas provncias. Os escritos da maioria das famlias e dos templos foram incendiados com a invaso das provncias pelo exrcito de Oda Nobunaga no sculo XVI. Resultante destes eventos nos sobra uma quantidade escassa de documentos para trabalhar esta histria. Hatsumi, portador de vrios artefatos da cultura ninja e possuidor das documentaes familiares do ninja de Iga e Koga, pode ser considerado um dos maiores detentores dessa cultura. As suas obras e seu conhecimento sobre a cultura ninja certamente nos fornecem uma das fontes documentais sobre o Ninja, ainda que, em certos momentos e passagens, se mostre com imprecises histricas e de carter lendrio tradicional.

Nesse sentido, Hatsumi indica uma lenda que talvez seja a primeira citao da atividade ninja no Japo, e liga-se s origens do Estado nipnico. Nesse relato, dois tipos de Ninja teriam ajudado o imperador Jimmu a sair vitorioso de uma batalha: As foras de Jimmu estavam confrontando as tropas do castelo de Iso, e a batalha estava sendo perdida. Num sonho noturno, o futuro imperador teve uma viso, em que o pedia para moldar uma embarcao sagrada com a argila do monte Amakaga. O monte Amakaga era uma montanha sagrada que estava situada no meio do territrio assegurado pelas foras de Isso. Consciente de que a argila crua representava a inteno de Jimmu, ele resolve suceder seu plano de conquista do castelo. Shinetsuhiko e Otokashi, ambos servos de Jimmu, se disfaram respectivamente de um velho campons e sua mulher. Bem sucedidos na tarefa de invadir o territrio do inimigo, os dois servos conseguem pegar a argila e retornam salvos. Jimmu fez ento exatamente o que havia sonhado, moldando a argila no barco sagrado, e ofereceu aos deuses da fortuna. Logo em seguida foi em busca de sua vitria, a qual ele acreditava indubitavelmente que seria seu destino.

Hatsumi, como sucessor de uma linhagem que at ele foi passada em segredo, herdou pergaminhos e livros manuscritos, que lhe chegaram atravs de seu mestre, Toshitsugu Takamatsu, ltimo ninja em atividade e que viveu sua vida de ninja em completo segredo. Ele era reconhecido no Japo como grande mestre de artes marciais. Sua identidade de ninja era desconhecida pela prpria famlia, tendo sido revelada s aps sua morte.

Esses pergaminhos herdados do algumas indicaes sobre o aparecimento do Ninja: Dos documentos de Ninjutsu(...) existem alguns que falam da imigrao de ex-patriotas chineses, que abandonaram sua terra natal para encontrar abrigo nas ilhas japonesas. Dentre eles estavam guerreiros, estudiosos, e monges, que vieram em busca de novas vidas nas regies selvagens de Ise e Kii, situadas na regio sul da capital Nara e posteriormente Kyoto.

Hatsumi complementa afirmando que sbios taostas teriam trazido, para as regies e Iga e Koga, um conhecimento acumulado de sculos, que envolvia estratgias militares, filosofia religiosa, folclore, conceitos de cultura e prticas medicinais. Alm da imensa influncia chinesa, esses sbios trouxeram saberes e referncias culturais de lugares os mais diversos como ndia, Tibete, Sudoeste da sia e at da Europa Oriental. Hatsumi ilustra essas migraes, citando a lenda de um antigo general chins: Yi Gou, que fora derrotado numa batalha e fugiu para as proximidades de Ise, regio prxima a Iga, e se escondeu numa caverna para praticar a meditao Zen. Ao que parece, este mestre dominava a arte de Hicho Ongyo No Jutsu, que literalmente significa mtodo sobre-humano de ocultar-se de um inimigo eliminando qualquer possibilidade de que ele aja com eficcia.

Esse general, portanto, seria um dos exemplos de refugiados de guerras da China, que dominavam as artes marciais e estabeleceram-se nas proximidades de Iga, e que, certamente, influenciaram bastante o desenvolvimento da arte Ninja.

Segundo Hatsumi aponta, devemos estar conscientes de que, a partir da estabilizao das migraes para as regies de Iga e Koga, a sociedade ninja comea a fundar-se, ao mesmo tempo em que, no resto do Japo, constitua-se uma sociedade rigidamente estruturada, categorizada e estilizada, em relao a qual, os ancestrais do Ninja, comeavam a formar uma sociedade parte, composta por naturalistas e msticos de diferentes origens. sobre essa estruturao que ir se debruar o olhar historiogrfico moderno, como se ver no captulo a seguir. Mas que, em suma, s toma sentido considerando a fundamental posio de Masaaki Hatsumi como guardio da memria ninja, aberta ao mundo ainda recentemente.

Captulo 2 - Um olhar historiogrfico sobre o ninja

Para compreender os motivos pelos quais a historiografia ocidental criou interesse pelo tema Ninja, importante antes saber os caminhos percorridos na difuso do Ninjutsu pelo mundo, at o boom dos anos 80.

Aps longos anos mantidos em segredo, nos anos setenta Masaaki Hatsumi torna pblica a existncia da sua arte ninja, da mesma maneira ele passa a oferecer a oportunidade de se aprender esta modalidade como uma arte marcial pblica. Os primeiros ocidentais a praticar a arte Ninja se interessaram por esta arte no subitamente, atravs de uma propaganda, mas por indicao pessoal, fazendo referncia a um mestre que dominava uma antiga e secreta arte marcial. O primeiro a ir ao encontro de Hatsumi foi Doron Navon, no incio dos anos 70. Um praticante de Jud israelense, que na oportunidade de estar no Japo, fora indicado a conhecer Masaaki Hatsumi. Ele foi o primeiro a tornar possvel a prtica desta arte fora do Japo, quando abriu seu Dojo (Academia), em Israel, no ano de 1974.

O segundo praticante e difusor da arte Ninja foi Stephen K. Hayes, um americano que saiu em busca de Hatsumi no ano de 1975 no Japo. Aps ser aceito como aluno de Hatsumi e se dedicar a alguns anos de treino, Hayes volta aos Estados Unidos abre seu dojo, entre a metade e o final dos anos 70, em Atlanta, depois, por volta do ano 1980, ele se transfere, definitivamente, para Ohio. Hayes foi o responsvel, ainda, pela difuso da arte ninja tambm na Europa. difcil precisar responsabilidades, mas logo em seguida a esse trabalho de difuso, a arte tomou enormes propores: o boom do ninja dos anos 80. Hayes escreveu mais de dezenove livros sobre o Ninja, nos quais se percebe a elaborao de uma imagem mstica e sombria deste personagem.

Aps o sucesso de Bruce Lee nos anos 70, o grande destaque mundial, em artes marciais, seria o Ninjutsu. Depois de difundida sua imagem como um guerreiro da noite e mgico como destacado por Hayes o Ninja foi retratado, tambm nos romances, como o vilo da histria, assassino, ladro. Desse modo estereotipado, o ninja logo foi incorporado pela indstria cinematogrfica americana, do que so exemplos: American Ninja, A Ressureio do Ninja, Tartarugas Ninja. A imagem mitificada pelo tratamento miditico permaneceu, apesar do esforo de Hatsumi, para reverter esse quadro, nas suas obras escritas nos anos 80, como j se anotou no captulo anterior.

Portanto, dentro desse enquadramento que surgem alguns historiadores, com a preocupao de compreender, para alm do esteretipo miditico, os fundamentos histricos de uma arte marcial, at ento, desconhecida. O presente captulo ser uma tentativa de analisar os pontos mais importantes das obras de dois desses historiadores ocidentais que, atravs de suas pesquisas, contriburam de maneira importante para o entendimento dessa figura histrica.

A primeira obra a ser apresentada a do historiador britnico, Stephen Turnbull, formado em Cambridge, doutorado na Universidade de Leeds, ps-doutorado em teologia e em histria militar, perito em histria militar oriental, especificamente do Samurai. Sua obra se intitula: Ninja:The true story of japans secret cult. Em seguida ser apresentada a obra recentemente lanada no Brasil: A arte do Ninja, do francs Kacem Zoughari, professor e pesquisador da Instituio francesa INALCO (Institut National de Langues et Civilizations Orientales), doutor em Histria, Filosofia e Artes marciais Japonesas, membro da Nihon Budo Gakkai (Organizao Japonesa de pesquisadores de Artes marciais), tradutor dos pergaminhos de Masaaki Hatsumi, pesquisador de Ninjutsu, Kobujustu(antigas artes marciais) e Ko Ryuha(antigas escolas de tradies marciais).2.1 O ninja histrico pelo olhar de Turnbull

No prefcio escrito por Hatsumi ao livro Ninja, de Turnbull, enfatizada a importncia do trabalho realizado, como sendo um grande esforo para resgatar uma histria pouco conhecida pelos prprios japoneses. O trabalho de Turnbull, segundo Hatsumi, seria uma obra de fundamental referncia para o estudo do ninja.

Para estudar a obra de Turnbull, sero enfatizados os pontos considerados chave para o entendimento de sua idia sobre o ninja. Ele explica que, na sua obra, foram adotadas duas linhas de explicao, na primeira ele discorre sobre o desenvolvimento da imagem do ninja como um super-homem, e na segunda, sobre os estranhos caminhos que a arte do ninja percorreu, perturbando os valores samurais.

2.1.1 A contracultura da classe guerreira japonesa e suas influncias

Turnbull explica que, estudar o ninja significa estudar todos os aspectos no convencionais da cultura guerreira japonesa, que compem a rede de inteligncia, o assassinato, a guerrilha e o trabalho noturno. O ninja pode ser considerado uma quebra na tradio japonesa, apesar de sua proporo bem reduzida frente quantidade de guerreiros samurai.

O guerreiro samurai era a classe guerreira da Japo, surgiram como personagens importantes nas disputas de poder, servindo tanto classe aristocrtica, quanto aos camponeses aldees possuidores de terra, durante o processo de formao do Estado no Japo. No sculo XII, a importncia do samurai torna-se central na reestruturao das relaes de poder poltico e social, com o surgimento do Xogum, espcie de grande senhor-lder militar, ao qual todos os shugo (senhores de terra anteriores aos Daimyos) deveriam respeitar e obedecer. A figura do Imperador permanece com funes simblicas, mas passa a um segundo plano no governo do Estado japons.

O ideal samurai aristocrtico, que emerge mais claramente aps o sculo XII, considerava importante ser um guerreiro de boa educao, de boa famlia, bem treinado nas artes marciais, leal aos seus senhores, corajoso no campo de batalha, e que lutasse de igual para igual em desafios contra um oponente. Mesmo aps a incluso das armas de fogo em 1550, o samurai sempre considerava uma glria ser o primeiro a desafiar um adversrio no campo de batalha. A vitria era apenas consumada quando o vencedor trazia a cabea de seu adversrio para mostrar a seu senhor. Quando ele era derrotado sem perder sua vida, o samurai se considerava altamente desonrado, e dessa maneira cometia o ato de seppuku. Para o samurai no existia espao para as artimanhas da guerra.

Em uma direo diferente, o tipo de estratgia e habilidade que o ninja utilizava era de grande importncia para a definio de uma batalha, no via honra em ser o primeiro a combater num campo de batalha. O cdigo tico do ninja diferenciava-o do samurai, no deixava espao para desafios. Tambm, em contraste lealdade absoluta do ideal samurai ao seu senhor, o ninja no servia cegamente a um senhor, buscava os senhores que servissem melhor aos seus interesses e que tambm pudessem remuner-lo. Porm, segundo Turnbull, o ninja no deve ser apenas associado a um grupo que age em operaes sorrateiras, como um mercenrio e individualmente, importante reconhec-lo como um grupo de elite, com uma casta hereditria, ou como uma irmandade secreta.

Turnbull considera imprprio, em certas passagens, chamar o guerreiro ninja de - Ninja, pois, segundo ele, nem sempre foram assim chamados. A maneira mais comum, com que os ninjas so mencionados em crnicas de guerra, dirios e peas, de shinobi no mono -, uma variao na pronncia do mesmo ideograma. Mas tambm existem outras designaes utilizadas, em crnicas da famlia Takeda e em algumas outras crnicas, por exemplo, o ninja poderia ser chamado de kusa e rappa.Nesse sentido, para se entender o surgimento do Ninjutsu, Turnbull remete s ondas migratrias da China para o Japo. Situando a tradio militar chinesa como fundamento para a compreenso das elaboraes diferenciadas do ninja histrico. Dentro dessa tradio, destaca Sun Tzu, escritor do tratado A arte da Guerra, que viveu entre os sculos VI e IV AC., o primeiro a escrever sobre a importncia das tticas de guerrilha para uma batalha bem sucedida. Para ele, um exrcito deveria apenas atacar o outro, quando este outro houvesse se tornado vulnervel por falhas prprias. Este processo envolveria intrigas, rumores e espionagem.

Sun Tzu dedica o dcimo terceiro capitulo de sua obra apenas espionagem, e ele denomina o espio de kan, que significa espao entre dois objetos, ou seja, uma referencia a capacidade que um agente secreto possua de intrigar aliados. Tzu identifica 5 tipos de espies: os Inkan, que eram espies habitantes da rea inimiga; os Naikan, agente internos que eram geralmente oficiais descontentes com seus senhores;os Yukan, so os agente duplos que so descobertos quando espionam nosso exrcito, e so comprados para espionar o adversrio; os Shikan, so agentes que tem a misso de serem capturados pelos inimigos, e em seguida fornecerem informaes falsas; os Shokan so os agentes que invadem o territrio adversrio e retornam com informaes valiosas.

Desse universo relacional com a China que Turnbull destaca a primeira evidncia da origem da atividade do ninja no Japo: A vinda do tratado A arte da guerra para as terras nipnicas foi possvel graas ao embaixador Kibi Makibi(693-775) que visitou a China duas vezes, e trouxe de l vrios textos clssicos. Entretanto, existe um documento japons anterior vinda do livro de Tzu, apresentado no ano de 714, contendo relatos de um assassinato no estilo ninja. Este livro o Kojiki, ou seja, relatos de eventos antigos, e o proto-ninja o conhecido Prncipe Yamato, filho do Imperador Keiko.

Levando em conta as ondas migratrias da China e as deseres de guerra no Japo, as regies isoladas e pouco habitadas foram ocupadas, nesse contexto. Segundo Turnbull, as regies que merecem maior destaque para a entrada de imigrantes e crescimento da arte ninja no Japo so Iga e Koga. A geografia da regio pode fornecer uma pista de como se formou uma sociedade com um tipo de pensamento to independente do resto do Japo. O fato de ser uma terra cercada por cadeias montanhosas e vrias defesas naturais permitiu um isolamento, e, portanto, o desenvolvimento de valores e de uma cultura bem diferente. Em sua argumentao, em favor dessa tese, Turnbull procede comparao da situao de Iga com a Sua, onde cadeia de montanhas permitiam uma boa defesa natural e seus habitantes forneciam servios mercenrios aos pases da Europa, mais ou menos mesma poca.

2.2.2 Mercenrios, invasores e assassinos.

Vrios contos, como destaca Turnbull, se referem s montanhas de Iga como um reduto de bandidos que agiam como ladres de estrada na Tokaido (importante via de trnsito e comrcio no Japo Feudal), e tambm como piratas, que agiam na costa martima, prximo a provncia de Ise. Muitos dos mitos sobre os ninjas certamente vieram destas histrias de gangues de assaltantes.

Para comprovar os aspectos mercenrios que o ninja incorporava, Turnbull apresenta, em seu livro, um artigo, do qual no menciona autoria, em qual so apresentadas vrias evidncias arqueolgicas, na regio de Koga, em que foram encontradas vrias fortificaes, com vrios indcios de atividades militares do perodo Sengoku:

(...) Kyowasei ou o republicanismo de Koga, no qual as famlias estavam reunidas num complexo hierrquico de suporte mtuo, eram providas condies necessrias para a atividade mercenria ser tornar bem sucedida.

Existe uma crnica interessante, relatada no dirio do abade Eishun de Tamon-in, no ano de 1541, na qual, segundo o dirio, menciona-se uma ocasio em que os ninjas de Iga foram utilizados para incendiar um castelo, chamado Kasagi, cujo daimyo, Kisawa Nagamasa, era influente nas provncias de Yamato e Kasagi. Esse daimyo fora beneficiado na guerra Onin, o que despertara a cobia e forte ambio de conquista da parte de um grupo liderado pelo jovem Miyoshi Chokei: Os homens de Iga invadiram o castelo Kasagi em segredo e atearam fogo em alguns quartos. Eles tambm colocaram o fogo nas estruturas externas e em vrios lugares dentro da terceira fortificao. Eles capturaram a primeira e a segunda fortificaes.

Atravs de relatos como esse, que, toma corpo, a idia de alguns grupos de ninja serem mercenrios e sabotadores. A habilidade mais conhecida e requisitada do ninja era sua habilidade de entrar despercebido em castelos inimigos. No havia duvida entre os daimyos quanto s habilidades do ninja, e durante o perodo Sengoku seus servios foram constantemente requisitados para a obteno de informaes, para as sabotagens e para os assassinatos.

Atualmente, o ninja sempre associado vestimenta negra, em virtude do esteretipo de sombrio, porm, na maioria das vezes, ele agia utilizando trajes normais, importante estratgia de disfarce. Como exemplifica o relato Mikawa Go-Fudo-Ki, sobre a ocasio acontecida por volta do ano 1550, em que, um lder ninja de Koga, chamado Tomo Yoshichiro Sukesada, fora solicitado para invadir e tomar um castelo. A ao ocorreu usando o artifcio do encobrimento pela escurido da noite, porm, ao entrar no castelo, todos se vestiram com os trajes do inimigo, causando grande confuso, assim, obtendo sucesso no objetivo de eliminar o lder local.

A imagem que emerge desses relatos sobre os feitos do ninja, aumentam a percepo de que os ninjas, de Iga e Koga, prestavam apenas um tipo particular de servio: o de invaso com sabotagem. Como eles no serviam a nenhum Daimyo especificamente, os seus servios eram recompensados com algum tipo de pagamento, mas que permanece em mistrio.

Porm, como Turnbull anota, existiam, na mesma poca da grande demanda de ninjas tradicionais, os shinobi, os ninjas que no tinham nenhuma conexo com os de Iga e Koga, e que eram servos fiis de um daimyo. A nica diferena entre eles seria apenas a questo das motivaes para ao, que era a fidelidade e a no fidelidade. Na prtica eles no diferenciavam um do outro. O tipo de ninja que era fiel, constitua a parte efetiva das tropas de um daimyo, formando um grupo de elite especial, exercendo os trabalhos de espionagem e de sabotagem.

Tendo em vista esta diferenciao, muitos daimyos optavam pelo uso privado do ninja para certos servios, por exemplo, os ninjas de Iga e Koga no eram freqentemente utilizados para os servios de captura de informaes, esta tarefa seria passada para um agente de total confiana, pois como diria Sun Tzu: o espio que traz as informaes deve estar muito prximo ao general do exrcito; e como mercenrios, estes shinobi no eram dignos de confiana. O contrrio acontecia com os ninjas que faziam parte de um exrcito, como foi o caso de Takeda Shingen.

Como demonstra Turnbull, muito provvel que os ninjas tambm tenham trabalhado, em alguns casos, como assassinos de aluguel. a partir de um evento muito conhecido na historia japonesa que ele vem argumentar sobre essa possibilidade: o assassinato, atribudo a um ninja, de um daimyo de grande importncia no perodo Sengoku, a partir de ordens de seu grande rival. Uesugi Kenshin, o assassinado, fora rival, durante uma vida toda, de Takeda Shingen, por motivos de disputas territoriais. Ambos eram grandes generais e aspirantes ao poder central do Japo no perodo Sengoku.

A morte de Kenshin envolta em mistrios, porm, segundo a teoria registrada nos relatos dos ninjas, um shinobi de tamanhos reduzidos, enviado por Shingen, invadiu a fortificao de Kenshin e, de alguma maneira, conseguiu se esconder na sua latrina para esperar o momento mais oportuno de tirar sua vida. Quando surgiu a oportunidade, o ninja introduziu uma adaga pelo nus de Kenshin, e pouco tempo depois ele morreu. Porm no se tem certeza se, o que o levou a morte, foi o ato de um ninja o foram complicaes na sade. Esta considerada uma das mortes mais bizarras e misteriosas na histria do Japo. Turnbull aponta a possibilidade de Kenshin estar muito doente durante essa fase, se tal fato fosse comprovado, a possibilidade de assassinato ficaria ameaada, pois no haveria necessidade de eliminar um moribundo.

Este rumor deu vazo criao de lendas das astcias do ninja, que o retratavam como um perspicaz assassino. A possibilidade de o ninja ser um assassino, apenas corresponderia, e confirmaria mais ainda, a sua funo de agente secreto de elite, e, alm disso, o aproximaria mais dos modelos de espio descritos no captulo de espionagem de Sun Tzu, referncia fundamental do saber militar do perodo.

2.1.3 Unificao do Japo e dispora dos ninjas de Iga

Durante o processo de unificao do Japo liderado pelo general Oda Nobunaga, a sociedade ninja viveu um dos momentos mais dramticos na sua histria. Dando seguimento ao processo de invaso e imposio aos seus poderes a todas provncias do Japo, e no admitindo nenhuma discordncia que afetasse seu poder, Nobunaga autoriza a invaso de todos os domnios por ele considerados rebeldes. Assim como enfatiza Turnbull, este momento culminou para a sociedade dos ninjas de Iga, a sua disperso, aps as invases.

Nos momentos importantes do Perodo Sengoku os ninjas estiveram presentes, intervindo nas horas decisivas. No entanto, a provncia de Iga no fora diretamente atingida pelos conflitos de disputa pelo poder central japons, e foi, de certa forma, beneficiada pela condio geogrfica deste local, at 1579, ocasio em que seus habitantes se viram forados a proteger suas terras e famlias de aes de guerra.

Toda essa eventualidade tem uma grande relao com a provncia vizinha de Iga, Ise, localizada num trecho de grande importncia, a estrada de Tokaido, que servia tambm de comunicao entre as provncias de Owari e Mino, ambas sobre o poder do generalssimo Oda Nobunaga. Logo, sendo uma regio de interesse de Oda, porm pertencendo a outro Daimyo, que era da famlia Kitabake, inicia-se um plano ambicioso de conquista da regio. Nobunaga, atravs de seu general Takigawa Saburohei, sitiou o castelo de Kitabake em Ise durante 50 dias at propor os termos de paz. Nobunaga, como um gesto de confiana, entrega seu filho Oda Nobuo a Takigawa para que fosse adotado como seu filho legtimo, mas com a esperteza de esperar a morte de Takigawa para ento receber a provncia por herana.

O drama se desenvolve com o filho de Nobunaga alguns anos depois. O povo de Iga, aps reclamar da m situao em que Nobuo vinha deixando a provncia, fez com que este avanasse para conquistar o local, tomando como desculpa a insatisfao dos provincianos com a sua administrao. Nobuo envia vrias tropas de invaso para eliminar este grupo ameaador. Com muita dificuldade na invaso, gerada pelas habilidades de prever e causar confuso que o ninja tinha, depois de duas tentativas frustradas, Nobuo num ataque massivo com mais de 40.000 soldados destri toda a resistncia de Iga. A provncia Ninja contava 4000 habitantes em mdia. Desta maneira pode-se ter uma idia da grande habilidade de guerrilha dos ninja.

2.1.4 Preparao do guerreiro

Como enfatizou Hatsumi, visto no captulo anterior, mas tambm salientada por Turnbull, a habilidade do ninja deveria ser creditada ao seu rduo treinamento na guerrilha e nas artes marciais. Estas so caractersticas pelas quais se qualificavam os ninjas como guerreiros sobre humanos. O sistema das artes marciais, assim como toda cultura de Iga e Koga, desenvolveu-se de maneira paralela s artes marciais vigentes no Japo. Cada famlia que conservava a tradio ninja desenvolveu um tipo diferente de habilidade e especialidade, que possua suas prprias regras de conduta, tradio e segredos. Para preservar esse conhecimento, cada membro do cl deveria manter esse conhecimento em total segredo, caso contrrio teria que pagar com a prpria vida. As tcnicas especiais mais secretas do cl eram passadas apenas do mestre para seu mais destacado discpulo, ou seja, seu futuro sucessor.

Turnbull informa que existem importantes fontes documentais onde esto ilustradas vrias das habilidades do ninja, porm sem especificar qual famlia exatamente pertence cada tcnica. Um dos mais destacados exemplos ducumentais o Bansen Shukai, escrito em 1676, por Fujibayashi Yasutake, supostamente um ninja. Outro documento foi o Shonin ki, tambm considerado um manual do ninja. Estes livros ilustram e fornecem informaes, por exemplo, como: a tcnica que o ninja utilizava para saber a hora atravs dos olhos do gato. Tambm caracterizam os disfarces que o ninja utilizaria: danarino, samurai errante, komuso, yamabushi (Monges ascetas das montanhas), mercadores, etc. Em alguns destes disfarces os ninjas carregariam instrumentos peculiares a suas vestimentas, e nelas escondiam as armas, por exemplo, um cajado que o monge carregava poderia ter dentro dele uma corrente, ou um punhal. As armas escondidas e os disfarces eram usados de maneira que o personagem no levantasse nenhuma suspeita de sua real identidade.

Como consta nestes manuais, o ninja desenvolveu uma grande percia para a sobrevivncia, resistindo fome e a sede com vrias tcnicas avanadas em misses duradouras. Por exemplo, o ninja possua a tcnica de purificar a gua salgada, fervendo-a em um pote de barro, onde o sal ficaria retido na panela. Eles tambm, com o auxlio da farmacologia, criaram raes compostas por vrias ervas e carboidratos para enfrentar a fome, e estas ficavam do tamanho de um pssego e substituam uma refeio. Existiam tambm as plulas para saciar a sede. Dos equipamentos para realizao de misses, foram desenvolvidos tipos de botes compactos para atravessar a gua, um dos mais curiosos era o sapato para a gua, feito de bias de madeira, acopladas aos ps para a flutuao; mas tambm havia tanques para stio de castelo, por exemplo.

Em suma, no estudo de Turnbull, se enunciam os fundamentos histricos, para alm das lendas e esteretipos, da percia do ninja histrico, que envolvia sua capacidade de sobrevivncia, resistncia, estratgia, combatividade, invaso de castelos, disfarces, dentre outras, que em sua poca o tronavam um guerreiro mpar.

2.2 Estudos Histricos sobre o Ninja Zoughari

Na obra A arte do Ninja de Zoughari, pode-se perceber uma aproximao maior cultura e a histria do ninja, ou seja, uma maior preciso em alguns momentos da histria. Este fato se d por vrios motivos. Em primeiro lugar, Zoughari tem acesso direto aos pergaminhos herdados por Masaaki Hatsumi, e sem dvida, sendo aluno dele e dominando a antiga escrita japonesa, ele pde ter acesso a essas informaes, que antes nunca foram alvo de pesquisas acadmicas. Em segundo lugar, por ter tido acesso a muitas crnicas referentes aos perodos de existncia do ninja nos acervos do governo japons. No entanto, tudo isso no desmerece de forma alguma o trabalho de Turnbull, pelo contrrio, o trabalho de Turnbull, como Hatsumi havia falado, uma grande referencia quando se fala de histria ninja. Inclusive, o Zoughari possui em sua bibliografia o ttulo da obra estudada anteriormente, na presente pesquisa.

Este trabalho de pesquisa ir abordar os seguintes pontos da obra de Zoughari: A criao do mito ninjutsu e o seu desenvolvimento como uma arte, e a leitura de documentos imprescindveis para o estudo desta histria.

Segundo Zoughari, o Ninjutsu desenvolveu-se, evidentemente, separado das demais artes marciais japonesas. O que torna mais difcil o estudo histrico dessa arte. As origens e o decorrer do ninjutsu so cercados de lendas e mistrios. Um dos motivos que a imagem que se espalhou do ninja nunca correspondeu vivncia do ninja, quase tudo o que se sabe, no senso-comum, sobre o ninja uma deturpao. A imagem que predomina do ninja a de um superespio vestido de negro, um ilusionista, assassino e acrobata habilidoso.

Zoughari indica pontos importantes para a formao deste imaginrio, como, por exemplo, a criao de vrias pinturas em que retratavam o ninja invadindo castelos, despercebido nos seus trajes negros e estuprando mulheres. Muitas dessas pinturas se inspiraram no teatro Kabuki, que o retratava da mesma maneira, vestido de negro, e realizando magias, nas quais se transformava em rato ou em sapo, aps a realizao de um ritual que envolve o entrelaamento dos dedos. E, como afirma Zoughari: ... a lista continua. No entanto, essas referncias s fornecem informaes vagas sobre o ninjutsu. Essa imagem do ninja est em quase todas as epopias, peas de teatro, novelas e romances do Japo. Essa inclusive a imagem que o povo japons tem sobre o ninja, no diferente, os ocidentais desfrutam da mesma opinio.

De acordo com Kacem Zoughari, para se conhecer o ninjutsu verdadeiro, torna-se necessrio diferenci-lo das demais artes japonesas, ou bud. O caminho traado pelo ninjutsu foi diferente das demais artes marciais durante o perodo Meiji, mas tambm antes. Como j se sabe, dentre vrios significados, ninjutsu significa arte de permanecer invisvel, tendo isso em mente foi que o ninja, durante a histria, viu todas as artes se desenvolverem, enquanto ele permanecia invisvel, parte da histria convencional. Entendendo isso, saberemos que o anonimato e os segredos foram a chave da perpetuao do ninjutsu at o sculo passado.

A base das tcnicas de estratgia de guerra a trapaa, e o ninjutsu era perito nesta rea. O ninjutsu, alis, era um treinamento na trapaa, e por isso todas suas tcnicas e armas foram criadas com a inteno de enganar o inimigo, para venc-lo efetivamente. Em vez de encarar o inimigo, o ninja usa a fraude, o engano e os truques necessrios para realizar com sucesso o combate ou a misso. Enfatizando mais ainda: O ninja um especialista na esquiva, na ao direta e rpida. No passado, uma de suas funes como espio era semear a desordem e a confuso nas tropas inimigas depois de ter realizado sua tarefa de roubar a informao

Para explicar o desenvolvimento da habilidade de estrategista do ninja, Zoughari enfatiza a importncia do ambiente em que a arte do ninja se desenvolveu. As reas de Iga e Koga eram selvagens e pouco habitadas. O contato e a observao da natureza, dos hbitos e costumes das pessoas so pontos a serem considerados. O treinamento nas montanhas selvagens fez com que eles desenvolvessem capacidades refinadas de observao e de adaptao a condies adversas. Ser paciente e saber observar so capacidades que devem acompanhar os mais hbeis espies. Os ninjas, portanto, se tornaram mestres na arte de observar e adquirir informaes. A atribuio da denominao de fantasmas ao ninja, no era toa, ele deveria passar por um rduo treinamento, de encobrimento e disfarce, desde sua infncia.

Diferente do que se pensa, a arte ninja no consistia simplesmente em uma tcnica de assassinar. Reafirmando o significado que Hatsumi deu ao caractere nin, Zoughari significa o nin como: (...) aplicar os pensamentos e o ego ao corte da espada, ou seja, vigiar os atos e pensamentos constantemente, e ter firmeza no corao. Portanto, essa definio sugere uma imagem bem distinta da apresentada por filmes e novelas. Segundo Zoughari, (...) o ninjutsu mais do que uma tcnica de guerrilha, mas uma tcnica cujo significado jaz na aquisio de uma capacidade de vigilncia, e uma abertura para enxergar vrias possibilidades, permitindo a pessoa ser ela mesma.

A prtica do ninjutsu permitiu a sobrevivncia dos seus adeptos. Era uma maneira eficiente de enfrentar o perigo, e permanecer invisvel. Como j foi dito no capitulo anterior, Hatsumi informa, assim como Kacem, que o ninja passava por um austero treinamento que envolvia vrias disciplinas. O ninja como tal deveria dominar completamente estas disciplinas que faziam parte fundamental do seu treinamento. admirvel pensar na capacidade de absorver e ter grande maestria em 18 habilidades, ao mesmo tempo, torna-se difcil acreditar nisso. Porm no sistema de combate do ninja foi desenvolvida uma tcnica de adaptao a qualquer circunstancia e manejo de qualquer tipo de armas, esse sistema de treinamento do ninja era todo baseado no ninpo taijutsu, ou seja, tcnica de uso do corpo para resistir, perseverar e sobreviver. E com esta tcnica o ninja poderia dominar atravs de um rduo treinamento o ninja juhachi kei, ou dezoito reas de conhecimento do ninja.

2.2.1 Documentao histrica de relevncia para o estudo do ninja

Evitando entrar em redundncia de temas, pois Zoughari em muitas partes de seu trabalho captura vrios pontos do livro de Turnbull, ser abordada neste momento uma temtica pouco vista at este momento na presente pesquisa. O autor apresenta um trabalho pioneiro no que se refere ao acesso direto as fontes historiogrficas do ninja. Zoughari comenta em seu trabalho que a abordagem dos documentos ser enfatizada sob duas ticas: a do contexto histrico, relatada por fontes j conhecidas; e a do fluxo interno da histria do ninjutsu, que est contida nos pergaminhos das escolas, outrora transmitidas de mestre a discpulo. A anlise histrica a partir dos pergaminhos, segundo Zoughari, revela um outro vis para situaes idnticas.

Sobre a dificuldade em se situar na veracidade dos dados fornecidos pelos documentos internos das famlias do ninjutsu, Zoughari afirma: A anlise do desenvolvimento histrico do ninjutsu baseada em interpretaes de documentos diversos, que fornecem informaes muitas vezes contraditrias e embaralhadas. difcil discernir o falso do verdadeiro.Um exemplo que corrobora esta afirmao o da histria apresentada pelos pergaminhos da escola Togakure, fundada entre os anos 1192 e 1333, no perodo Kamakura, transmitida ininterruptamente at os dias de hoje. Os Torimaki, ou pergaminhos da escola Togakure, foram escritos na lngua japonesa clssica, o kanbun, num estilo cursivo e muitas vezes artstico. Alm dos pergaminhos existem tambm os densho, ou livros com ensinamentos, que foram escritos provavelmente no perodo Edo (1603-1867). Porm, em ambos, os casos, no consta nenhuma meno s datas em que foram escritos, alm disso, os fatos histricos no so amplamente contemplados e so escritos de maneira muito breve.

Tambm h que se considerar que se torna muito difcil a leitura dos caracteres escritos nesses documentos porque a escrita japonesa est intimamente relacionada com a personalidade do escritor. Dessa maneira, em alguns momentos da leitura, identificar o ideograma japons torna-se um problema. Toda a documentao na parte que se refere transmisso dos ensinamentos, filosofia e histria, est repleta de metforas e histrias que remontam a eras mitolgicas do Japo. Para o estudo histrico, Zoughari informa que estar limitado traduo dos documentos, pois ele atenta para o fato de que, apenas um adepto desta arte estaria apto a compreender as entrelinhas contidas nesses documentos.

De qualquer modo, segundo Zoughari, pode-se perceber que no perodo mais intenso na demanda dos servios ninja, o Sengoku, a grande parte dos guerreiros que passavam pelo intensivo treinamento ninja no sobreviveu at uma idade mais madura para poder suceder seu mestre. Dessa forma, muitas escolas compostas pelas famlias de Iga e Koga, nesta poca, se desfizeram e foram perdidas para sempre. Estima-se que, nesse perodo, as escolas de ninjutsu se multiplicaram em Iga e Koga chegando a um numero que variou entre 70 e 80, muitas delas sendo ramificaes de outras escolas mais importantes. Contudo, no que se refere transmisso atravs da documentao escrita, este foi um privilgio das escolas que sobreviveram at o perodo Edo, favorecidas pelo perodo de paz promovido pela dinastia Tokugawa (1603 1868). Dentre os documentos que restaram, e perduraram at a atualidade, existem os hi-densho, ou seja, documentos secretos escritos pelos ninjas que priorizam suas tcnicas.

Nesses documentos, que chegaram at hoje, de uma maneira geral, h poucas indicaes escritas com uns poucos desenhos. Como afirma Zoughari: So livros manuscritos, desprovidos de quaisquer conceitos filosficos, religiosos, at mesmo de terminologia budista, taosta, etc., usados por vrios autores, para clarificar as suas idias. Dentro desses documentos, as tcnicas de combates no aparecem claramente, justamente porque o ninjutsu foi transmitido, de maneira prioritria, oralmente ou por meio prtico. Os aspectos descritos nos documentos seriam apenas aqueles exteriores do ninjutsu. Noutras palavras, existiam os tipos de transmisso: kuden (oral), shinden (transmisso espiritual, isto , a imagem do mestre, pela memria dos movimentos e das palavras do mestre) e o taiden( as experincias vividas pelo corpo), que constituiriam nas formas mais verdadeiras de se transmitir o ninjutsu.Os principais documentos de pesquisa disponveis hoje em dia, alm da documentao possuda por Masaaki Hatsumi, compem o: Bansen Shukai (Oceano de dez mil rios), que considerado uma enciclopdia do ninjutsu, escrito partir de 1676, o quarto ano da era Enpo(16731681), por um ninja de Iga, chamado Fujibayashi Yasutake. Seus 22 volumes registram contedos relativos a estratgia, espionagem, astronomia, filosofia e geografia,etc., de 49 escolas que formavam a base de Iga, em 1580.

Tambm h que se registar o Shonin ki (registros dos usos e das tcnicas dos ninjas), so trs volumes escritos em 1681, na Era Enp, por um mestre da arte militar, chamado Natori Sanjuro Masazumi. Esses volumes contem lies tericas e as tcnicas de combate da escola Kishu. H, ainda, o Ninpiden (conhecimentos secretos dos ninjas), que era um manuscrito da era Joo em 1654, de autoria de um descendente da destaca famlia ninja Hattori. Esse documento descreve os ensinamentos do famoso ninja de Iga, chefe da polcia do primeiro Xogum Tokugawa, Hattori Hanzo. E, finalmente, existe o Ninpo Hikan (rolos e pergaminho secretos do ninpo), escrito por um descendente direto de uma famlia ninja de Iga, Inue Masayasu. Trata-se de um nico volume com os ensinamentos secretos da escola Iga de ninjutsu.

No computo geral, o trabalho de pesquisa de Zoughari, ao procurar as articulaes entre a memria apresentada por Hatsumi e as referncias documentais existentes, tambm considerando a pesquisa do historiador militar ingls, Turnbull, apresenta a riqueza temtica da histria do ninja e conclama ao aprofundamento histrico-crtico de pesquisas a serem realizadas.

Consideraes Finais

Analisando os captulos escritos neste trabalho de pesquisa, v-se que a inteno foi explicar, ou melhor, desmistificar essa figura to estereotipada entre ns, hoje, o ninja. Esse personagem de grande importncia na histria japonesa, mas pouco trabalhado por ela, mas mesmo assim, presente em momentos de suma importncia para o Japo.

A idia de fazer histria sobre o Ninja, que o que intencionam os autores utilizados para compor a pesquisa, enriquecedora, e esclarece muitos pontos em relao ao ninja, at ento, tido como uma mitologia, retratada em teatros, contos e pinturas. A iniciativa, e o relativo desprezo, ou seria receio, que o prprio povo japons nutre pelo ninja foi durante muito tempo uma barreira que distorceu sua imagem. A pesquisa aqui realizada pode ser considerada uma tentativa de esclarecer os reais propsitos do ninja, ou pelo menos, uma busca pela aproximao do que eles foram e pensaram.

No primeiro captulo, existe a tentativa de extrair, das obras lanadas por Hatsumi, uma realidade vinda de dentro da prpria cultura ninja, fora de uma perspectiva acadmica, mais preocupada com a narrativa dos fatos, das tradies, e a necessidade de informar. Ele demonstra, atravs de suas vivncias com seu mestre, e a partir de suas documentaes, o que veio a ser o ninja. Muito contrrio do que todos imaginariam, o ninja no se tratava de apenas um assassino, mercenrio e espio, muito alm disso, o povo, que veio a produzir a arte ninja, foi alvo de uma riqussima mescla de culturas vindas do continente, somado cultura local.

O resultado foi o aparecimento de uma sociedade que se diferenciava, e muito, da tradicional sociedade japonesa, com uma religio prpria, uma cultura guerreira prpria, e um sistema poltico que veio a desafiar o maior poder do Japo. Como foi bem dito, o povo ninja representava uma contracultura, e teve um desenvolvimento desigual do resto do Japo. Hatsumi nos excita a ir busca de um maior esclarecimento em relao ao ninja, o que ele nos explica sobre a histria, tal qual ela se encontra nas suas documentaes herdadas, com pitadas de misticismo, lendas, e pouca preciso histrica. Mas seu discurso enriquecedor, por dar acesso ao imaginrio cultural ninja, reelaborando sua memria, e, assim, fornecer detalhes e informaes que dificilmente seriam adquiridas sem o seu consentimento.

Fazendo um balano do primeiro captulo, desde o comeo est claro que um trabalho que aborda a memria viva, e que por isso, ficou mais voltado para a narrativa e descrio. Mas pde-se observar que a inteno inicial era a de situar-nos sobre o ninja, explicar quem ele foi, o que fazia e como era treinado. Estas so questes, que, creio eu, estejam bem esclarecidas a partir dos pontos abordados. Afinal, a inteno, como j foi dito, era de concretizar a figura ninja para ento entrar nos detalhes histricos.

Uma lacuna que se pde observar, e que poder ser preenchida por futuros estudos relativos a este tema, a de desenvolver uma pesquisa, em que seria importante observar, a partir da documentao de Hatsumi, a relao das lendas para com a realidade histrica em comparao com obras historiogrficas japonesas, e tambm, buscando relacionar e esclarecer de forma mais precisa a relao das informaes contidas nas documentaes de Hatsumi, com documentos contemporneos.

Um estudo mais profundo sobre a obra de Hatsumi, levada para um vis historiogrfico, poderia contribuir de maneira importante para o estudo do Ninja a partir do olhar ocidental, motivado pela difuso dessa arte. Apenas Kacem Zoughari que teve acesso direto aos pergaminhos de Hatsumi, sendo assim, ele se torna um meio importante de penetrao neste meio.

A anlise historiogrfica que procede no captulo dois foi enfocada em duas obras principais, e ambas consideradas referncias no estudo deste tema. Stephen Turnbull, principalmente, tem uma abordagem histrica bastante tradicional, voltada mais para a descrio, no entanto, rica em detalhes como nomes, datas e fatos de importncia para a composio da histria do ninja. A histria que vemos em seu livro, em vrios momentos, est recheada de eventos que no tem uma continuidade. Isso se d, talvez, pelo fato de os guerreiros ninja terem uma atividade na histria relativamente esparsa, e ainda mais, pouco documentada. Isso resulta, sem dvidas, numa histria repleta de lacunas. Ento, um dos motivos pelo qual um aprofundam