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SOCIEDADE DOM BOSCO DE EDUCAÇÃO E CULTURA FACULDADE DIVINÓPOLIS CURSO DIREITO MARIANA CRISTINA FERREIRA COSTA A INCOSTITUCIONALIDADE DO SISTEMA DE COTAS RACIAIS DIVINÓPOLIS 2018

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SOCIEDADE DOM BOSCO DE EDUCAÇÃO E CULTURA

FACULDADE DIVINÓPOLIS

CURSO DIREITO

MARIANA CRISTINA FERREIRA COSTA

A INCOSTITUCIONALIDADE DO SISTEMA DE COTAS RACIAIS

DIVINÓPOLIS

2018

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MARIANA CRISTINA FERREIRA COSTA

A INCOSTITUCIONALIDADE DO SISTEMA DE COTAS RACIAIS

Monografia apresentada à Sociedade Dom Bosco de

Educação e Cultura, Faculdade Divinópolis como requisito parcial do programa do Curso de Direito para

a obtenção do Título de Bacharel em Direito. Orientador:

Prof. Ms. Eduardo César Russo Leal.

DIVINÓPOLIS

2018

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Dedico este trabalho a minha família, eis que eles são os que realmente acreditam em meu potencial e são testemunhas da minha perseverança em vencer este desafio que é concluir o curso de Direito.

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AGRADECIMENTO

Primeiramente, agradeço a Deus, que foi meu Guia durante o curso.

Agradeço a minha mãe, que é minha inspiração e sem ela não teria concluído o curso,

pois foi quem cuidou do meu bebê todas as noites para que eu pudesse estudar e

concluir o curso.

Agradeço a minha família, base de tudo em minha vida, minha gratidão eterna a vocês.

Agradeço aos meus padrinhos Cláudio e Jussara, sem vocês esta graduação não

seria possível.

Agradeço ao professor Eduardo Cesar Russo Leal que, além de professor e

orientador, se tornou amigo.

Ao meu grande amigo Samuel, exemplo de retidão e inteligência, companhia nestes

anos de estudo.

Agradeço aos meus colegas de sala e aos demais professores da FACED.

Agradeço, ao meu companheiro, amigo, marido e amor Gleison, que não me deixou

desistir do curso sabendo que este era meu grande sonho e me ajudou de todas as

formas que pôde a conclui-lo.

Agradeço ainda, aos meus filhos, que apesar de serem tão pequenos, saibam que

todo meu esforço, todas as minhas conquistas e todo o sucesso que com a benção

divina irei alcançar são todas para vocês, meus amores.

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“Eu tenho um sonho. O sonho de ver meus filhos

julgados por sua personalidade, não pela cor de sua

pele.” (KING Junior, 1963, p.1).

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RESUMO

O objetivo principal do presente estudo foi abordar a inconstitucionalidade do sistema de cotas raciais instituído no Brasil. O referido sistema tem a finalidade de conferir à população negra e descendentes, a reserva de vagas nos cursos do ensino superior concedidos pelas universidades brasileiras. Porém, a Constituição Federal vigente não tem estipulado em seu texto a distinção relacionada à cor ou raça, para poder ter acesso à direitos. Pelo contrário, tem elencado em seu corpo princípios que asseguram a igualdade de todos os cidadãos brasileiros, sem nenhuma exceção. O objetivo principal deste trabalho é demonstrar que o referido sistema não está de acordo com os preceitos constitucionais vigentes. Em suma, concluiu-se que o referido sistema é inconstitucional, pois viola o princípio da igualdade entre outros preceitos fundamentais elencados e assegurados pela Carta Magna de 1988.

PALAVRAS-CHAVE: Inconstitucionalidade. Principio da igualdade. Ações

afirmativas.

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ABSTRACT

The main objective of the present study was to address the unconstitutionality of the system of racial quotas established in Brazil. This system has the purpose of conferring on the black population and descendants the reservation of places in the higher education courses granted by the Brazilian universities. However, the current Federal Constitution has not stipulated in its text the distinction related to color or race, in order to have access to rights. On the contrary, it has listed in its body principles that ensure the equality of all Brazilian citizens, without exception. The main objective of this work is to demonstrate that the said system is not in accordance with the prevailing constitutional precepts. In sum, it was concluded that this system is unconstitutional, as it violates the principle of equality among other fundamental precepts listed and guaranteed by the 1988 Constitution.

KEYWORDS: Unconstitutionality. Principle of equality. Affirmative actions.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .........................................................Erro! Indicador não definido.10

2 A HISTORIA DO NEGRO NO BRASIL ..................Erro! Indicador não definido.12

3 O SISTEMA DE COTAS BRASILEIRO ................Erro! Indicador não definido.17

4 O NEGRO E O SISTEMA DE COTAS ...................................................................... 23

5 A ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL ADPF

186 ................................................................................................................................... 27

6 CONCLUSÃO.............................................................................................................. 30

REFERÊNCIAS ........................................................................................................... 33

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1 INTRODUCAO

O Brasil é um país o qual a desigualdade social é uma realidade lastimável e

devastadora. Porém, há alguns anos vários programas sociais foram desenvolvidos e

outros foram aperfeiçoados para atingirem o maior número de pessoas carentes

possível. Ademais, uma das principais iniciativas do governo foram programas

estudantis, para ajudar os jovens brasileiros pobres a ingressarem nas universidades.

Então, programas como FIES (financiamento estudantil), PROUNI (Programa

Universidade Para Todos) e Educa Mais Brasil, foram estabelecidos e aprimorados.

Além dos programas estudantis, foi sancionada a Lei 12.711, em 29 de Agosto

de 2012 pela ex-presidente Dilma Rousseff. Que determina em seu texto que as

instituições federais de ensino superior, vinculadas ao Ministério da educação deverão

reservar 50% (cinquenta por cento) de suas vagas, para alunos oriundos do ensino

médio público, que a renda familiar não ultrapasse um salario mínimo e meio, e

pessoas autodeclaradas negras, pardas ou indígenas.

Sendo este ultimo quesito o motivo de tanta controvérsia sobre o tema, pois a

grande parte dos brasileiros apoiam as cotas sociais, considerando-as justas e

necessárias para diminuir a desigualdade social e acreditam que as mesmas irão dar

suporte a quem realmente precisa. Já as cotas raciais geram tanta discordância, pois

seu principal fundamento é a dívida histórica, que teria sido gerada devido ao período

da escravidão estabelecido no Brasil durante 1539 a 1888. Então, é alegado que toda

pessoa branca tem uma dívida histórica com todos os negros, pois, devido à

escravidão os negros nunca tiveram reais chances de se reestabelecerem na

sociedade, além de ser o suposto motivo de ‘‘todo’’ negro viver na marginalidade e e

possuir baixa renda.

Contudo, olhando o atual cenário brasileiro não há como negar que apesar de

ser considerado um dos países, se não o mais miscigenado do mundo e obter

também, uma das maiores populações negras do planeta, o povo brasileiro ainda é

um povo muito racista. E este mal tão obsoleto deve ser ferrenhamente combatido.

Porém deve ser feito da maneira correta, que é a conscientização, e com penas mais

rígidas, que envolvam este crime.

Ademais, ainda há o problema na legislação das cotas raciais, pois foram

feridos importantes preceitos constitucionais, o princípio da igualdade por exemplo.

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Que está elencado no artigo quinto da Carta Magna brasileira. Este meio não é o mais

viável para tentar por fim ao racismo e marginalização do negro no Brasil, pois a

Constituição Federal em seu artigo 5º rege que:

“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes...”.

Ou seja, este equívoco de ignorar princípios constitucionais vitais a sociedade

brasileira, pode ao longo prazo causar danos irreversíveis, ademais dos que já esta

causando e dividir ainda mais o povo brasileiro. Além das próprias cotas raciais serem

de cunho racista, ao menosprezar o potencial do negro em comparação ao restante

da sociedade.

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2 O NEGRO E A HISTORIAS DO BRASIL

Após um longo período usando os índios como mão de obra principal, os

portugueses aderiram à prática de vários colonizadores europeus e começaram a

importar africanos para o Brasil, a fim de usá-los como escravos. Os índios não tinham

muita disciplina ou aptidão para trabalhos pesados, levando em consideração o estilo

de vida que eles tinham antes da chegada dos colonizadores. Ademais, os

pagamentos em objetos da civilização europeia não estavam mais os agradando tanto

como no início.

Estima-se que aproximadamente cerca de cinco milhões de africanos foram

trazidos para o Brasil. Este número poderia ser bem maior, levando em conta que

devido à superlotação e péssimas condições que as pessoas eram submetidas nos

navios negreiros, ocorria a fatalidade de vários africanos virem a óbito no percurso da

viagem e serem descartados como objetos no mar.

As caravelas portuguesas tinham capacidade de transportar aproximadamente

500 cativos por viagem. Já os navios a vapor faziam o transporte de aproximadamente

350 escravos. E as dietas nos navios tinham a base de azeite e milho. E por causa da

pobreza em vitamina C, muitos negros sofriam com o escorbuto, doença bastante

comum aos marinheiros e seus tripulantes na época.

Em razão das plantações de cana e engenhos estarem situadas na região

nordeste, os principais portos eram os de Salvador e Recife. E o fluxo de tráfico de

escravos era tanto que os negros chegaram a compor 75% da população da região

que hoje é situada a Bahia. Após a descoberta das minas de ouro em Minas Gerais,

o porto do Rio de Janeiro passou a ser o mais movimentado da colônia.

Ao chegarem às terras brasileiras, os africanos estavam em sua grande maioria

muito debilitados, desnutridos ou doentes, por causa da viagem desumana a qual

eram submetidos. Então para valorizar a “mercadoria”, os africanos eram limpos,

tinham os cabelos e barbas cortados, eram bem alimentados, tudo isso para dar a

eles uma aparência mais saudável e comerciável.

Porém, o movimento contra a escravidão na Inglaterra foi aumentando e

influenciando vários países europeus a abolirem a escravidão, inclusive no ano de

1845, foi aprovada pelo parlamento inglês uma Lei denominada Bill Aberdeen, que

dava a esquadra naval britânica, poderes para apreender embarcações que estavam

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traficando escravos, em qualquer lugar do mundo. O Brasil acabou cedendo às

pressões inglesas e em 1850 foi sancionada a Lei Eusébio de Queirós, que proibia o

tráfico negreiro para o Brasil.

Contudo, a extinção do tráfico transatlântico de escravos refletiu no aumento

excessivo do valor dos mesmos e aumentando respectivamente o tráfico interno

dentro do Brasil.

Nos anos de 1870, movimentos abolicionistas ganharam cada vez mais força,

inclusive do próprio exército e intelectuais respeitados como José Patrocínio Joaquim

Nabuco. Além dos próprios escravos começarem a se rebelar cada vez mais e lutarem

pelo fim da escravidão. Ademais, existiam as pressões externas dos ingleses, que

consideravam a escravidão totalmente retrograda e um crime hediondo contra a

humanidade. Sendo assim, em 1871 foi sancionada Lei do Ventre Livre, a qual toda

criança nascida de mãe escravizada seria considerada automaticamente livre. Essa

Lei ainda previa que o escravo teria direito de comprar sua alforria se ele possuísse

pecúnia.

Com a crescente resistência dos escravizados, e do movimento abolicionista

foi promulgada em 1885 a Lei do Sexagenário, a qual decretava que todo escravo

com mais de 65 anos estaria livre, uma espécie de aposentadoria mas obviamente

sem direito ao pagamento.

Após tantas lutas, resistência, e pressões estrangeiras, o Brasil foi o último país

do mundo a abolir a escravidão. Na data de 13 de maio de 1888 a princesa imperial

regente Isabel assinou a Lei Áurea, que em seu texto trazia a libertação de todo negro

em solo brasileiro da condição de escravo para sempre.

Ao final do século XIX, foi instaurado no Brasil a “política do branqueamento”,

o país na época contabilizava aproximadamente 15 milhões de habitantes e após a

promulgação da Lei Áurea, havia incontáveis negros desempregados perambulando

pelas ruas. Como havia o interesse oculto de não ser uma nação atrasada e questões

de status e até mesmo estética, o Brasil sancionou a abolição dos escravos, mas não

se preocupou em instaurar politicas para inserir os milhares de negros a sociedade,

os deixando totalmente desamparados. Então, a solução para diminuir a quantidade

de negros era miscigenar e branquear a população.

O Brasil começou a importar europeus (italianos, portugueses, alemães...) para

trabalharem no lugar dos escravos, obviamente com remuneração razoável e boas

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condições de trabalho, até porque os europeus eram vistos como povos superiores e

jamais aceitariam viver em condições análogas a de escravos.

“Chama a atenção o fato de que a reflexão e o projeto da intelligentsia brasileira, desde que começou a pensar num possível fim da escravidão, estiveram vinculados à proposta de importar mão-de-obra européia. Sabemos que num período de menos de 25 anos (de 1890 a 1914) chegaram 2,5 milhões de europeus ao Brasil; quase um milhão deles (987.000) tinha suas viagens de navio financiadas pelo Estado. Um documento, publicado pela Diretoria Geral de Estatística e assinado por Oliveira Vianna (apud ANDREWS, 1997, p. 97; ênfase no original),3 avalia o resultado do censo de 1920 da seguinte maneira: [constata-se] ―uma tendência que está se tornando mais visível e definida: (…) [a] progressiva arianização de nossos grupos regionais. Ou seja, o coeficiente da raça branca está se tornando cada vez maior em nossa população.” (HOFBAUER, 2011, p.2).

Com a fome e falta de empregos na Europa, italianos, alemães e espanhóis

vieram em massa para Brasil, atrás de um paraíso tropical que prometia emprego e

terras. O governo realmente dava incentivo para os europeus virem, já que foi criada

uma lei no fim século XIX que pagava uma boa parte das passagens para os

imigrantes virem, além de dar 20 mil-réis a cada família imigrante para começarem

suas vidas.

As lavouras de café estavam em ascensão, e com o desfalque dos escravos a

imigração pareceu um ótimo recurso para os fazendeiros e latifundiários que tinham

cafezais, mas logo houve desentendimentos. Os fazendeiros não estavam muito

felizes em ter que pagar os imigrantes o combinado. Estavam acostumados a obterem

lucros de quase 100% (cem por cento) em cima do trabalho escravo, mesmo

exportando milhões de toneladas de café, eles ainda queriam mais lucro. Porém, os

fazendeiros não podiam comparar os europeus com os escravos, estes últimos foram

criados a vida inteira para servir sem questionar e ainda não receber pelo seu trabalho.

Já os europeus estavam familiarizados a terem salários justos e reivindicarem direitos,

já que a Europa havia passado por varias manifestações exigindo melhorias nas

condições de trabalho nas indústrias.

Com os crescentes desentendimentos com os fazendeiros, muitos europeus

seguiram em direção ao sul do Brasil, fazendo suas próprias colônias e comunidades.

Poucos foram os imigrantes que optaram por retornar para suas nações, até porque

o clima da Europa já não estava muito pacifico o motivo de algumas décadas a frente

se dar início a primeira Grande Guerra. E sendo o Brasil situado em um continente

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distante de todo aquele caos que a Europa vivia, se tornou muito mais viável e seguro

para muitos europeus continuarem residindo no ocidente.

Alguns anos mais tarde, deu-se início a outra movimentação militar na

Alemanha que acabou resultando na Segunda Guerra Mundial. Evento que atraiu

ainda, mais de 14 (quatorze) mil judeus para o Brasil e os números de estrangeiros

aumentou cada vez mais durante este período de guerra.

Desde então, o Brasil passou a ser muito bem visto em relação ao acolhimento

de estrangeiros, se tornando um refúgio para vários povos. Por sua “fama” de ser uma

nação acolhedora e obter um povo muito carismático e receptivo além de oferecer

oportunidades de trabalho, o Brasil até hoje é um dos principais destinos escolhido

por imigrantes, que fogem das guerras, da pobreza ou até mesmo de regimes

ditatoriais.

Levando em consideração que é um país que não exige muita burocracia para

imigração e possuir leis que favorecem a permanência dos estrangeiros, o Brasil atraiu

ao longo das décadas incontáveis imigrantes. Se tornando um dos países mais

miscigenado do mundo, onde cada brasileiro carrega em seus genes inúmeras

descendências como indígenas, africanas, europeias, asiáticas entre outras. Com

exceção dos índios, é quase impossível encontrar o que se denomina de brasileiro

puro, afinal, o Brasil é formado por inúmeras etnias, raças e cores.

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3 O SISTEMA DE COTAS BRAILEIRO

Como toda grande nação que visa o desenvolvimento social, desde a era do

regime militar já era instaurado no Brasil alguns programas estudantis como o Crédito

Estudantil criado em 1976, que mais tarde se tornou o FIES (financiamento estudantil),

com a finalidade de constituir um país mais instruído. E nos últimos anos vários

programas para facilitar a entrada de jovens com baixa renda nas universidades foram

criados ou melhorados. Afinal, quanto mais instruída uma nação melhor é para seu

desenvolvimento, além de que investir em educação é uma das melhores armas para

erradicar diversos problemas sociais de um país.

Conforme dispõe Menezes (2001), originalmente, o sistema de cotas foi

iniciado na índia em 1940, pois como existe um sistema de castas centenário que rege

o país até nos dias atuais, impedia que pessoas de castas inferiores tivessem

participação no parlamento indiano. Então o sistema de cotas veio para derrubar este

benefício que se estendia apenas as pessoas de castas mais abastadas. Obviamente,

houve muitas manifestações, já que mudar algo que esta há séculos regendo um país

da mesma forma é sempre uma mudança drástica e visto pelas pessoas que detém o

poder como algo além de afrontoso, avassalador. Portanto, não sendo muito bem

aceito de início pelas pessoas ricas.

Segundo Genovese (1976), nos Estados Unidos foram criadas as “ações

afirmativas” (affirmative action), para remediar e intermediar o grande problema do

racismo que assolava e ainda assola o país, com o intuito de garantir direitos civis

iguais aos dos brancos. Além de pleitearem oportunidades também igualitárias e o fim

das leis segregacionistas. Nos Estados Unidos houve guerras para acabar com a

escravidão e até um movimento separatista que quase separou o país, quando Lincoln

era presidente. Pois ele era um defensor ferrenho da abolição da escravidão, o que

gerou certa impopularidade para o presidente na época. E diferente do Brasil, os

negros não foram simplesmente esquecidos e marginalizados após o fim da

escravidão, eles foram perseguidos, mortos, torturados sem nenhum impedimento por

parte do governo, que ignorava o genocídio que ocorria.

As pessoas saiam para trabalhar e muitas vezes não voltavam, pois eram

sequestradas e mortas. Nem as crianças eram poupadas da barbárie segregacionista

e infelizmente também eram alvo dos perseguidores de negros.

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Foram criadas seitas que compactuavam com o extermínio negro, sendo a mais

conhecida a Ku Klux Klan, que em seu auge chegou a obter quase cinco milhões de

integrante. Eles matavam negros enforcados, queimados e na maioria das vezes

torturados e ainda exibiam os corpos das vítimas com orgulho. Os integrantes do

grupo de extermínio usavam máscaras a fim de esconder sua identidade, pois a KKK

tinha em sua composição pessoas com importantes cargos políticos e cargos sociais

como policiais, professores e empresários poderosos. E apesar de contar com um

grande número de integrantes, e ter se espalhado com facilidade na América, era

crime previsto em lei o que eles faziam e não era bem visto na sociedade ser membro

de uma seita extremista, apesar de ser um povo muito racista os americanos precisam

manter sua postura perante o cenário internacional.

Ainda houve a questão da segregação, havia bairro para negros, banheiros

para negros, bares e estabelecimentos para negros, era inadmissível que um negro

ocupasse o mesmo lugar que um branco. O filme ‘’Estrelas Além do Tempo’’ lançado

em 2017, que inclusive foi indicado ao Oscar de melhor filme, retrata muito bem a

segregação dentro da NASA nos Estados Unidos em si. As escolas eram segregadas,

e quando algum negro quebrava essa barreira e ia estudar em escolas direcionadas

a pessoas brancas, muitas vezes as crianças ou jovens não suportavam o bullying e

os maus tratos e acabavam abandonando os estudos. Portanto, sendo os Estados

Unidos um dos países mais racistas do mundo, se fizeram realmente necessárias as

diversas leis e ações afirmativas, para diminuir a desigualdade no país, já que os

negros eram constantemente lembrados pelos brancos que eram inferiores e mortos

por isso.

Apesar de seu plano de governo esquerdista, Barack Obama ao ser eleito o

primeiro presidente negro da América foi um homem importantíssimo na luta contra o

racismo nos Estados Unidos, que diferente do Brasil não é nem um pouco ‘‘velado’’,

mas escancarado e é deliberadamente sofrido pelos negros até hoje. E é interessante

que apesar de todo este racismo, a América é um dos países que mais consomem e

exportam músicas de negros, possuindo um enorme acervo de artistas e cantores

negros. Controvérsias que não fazem muito sentido, mas que aos poucos vão

mudando o conceito dos americanos sobre os negros e ajudando a erradicar o

racismo.

No Brasil, as cotas raciais ganharam visibilidade a partir dos anos 2000, quando

universidades e órgãos públicos começaram a adotar tal medida em vestibulares e

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concursos. Através de uma lei estadual no ano de 20003 a Universidade do Estado

do Rio de Janeiro (UERJ) foi pioneira ao adotar o sistema de cotas raciais. No ano

seguinte foi a vez da universidade federal de Brasília (UnB) adotar o sistema. Desde

então, cada vez mais instituições de ensino vieram aderindo ao sistema de cotas

raciais, até as mesmas serem obrigatórias pela Lei 12.711 criada em 2012.

Em Agosto de 2012 foi sancionada a Lei nº 12.711, a controversa lei de cotas,

que teria como principal objetivo diminuir a desigualdade racial dentro das

universidades e tentar remediar a suposta dívida histórica que todo brasileiro branco

teria com os afrodescendentes. Esta lei veio em forma de ação afirmativa, que são

medidas temporárias, com previsão de reavaliação para poder saber ao certo se a

referida ação afirmativa obteve êxito ou não. Sendo previsto para 2022, o ano em que

o poder executivo ira reavaliar os resultados provenientes do sancionamento do

referido dispositivo legal.

A lei inicialmente tem em seu texto pré-requisitos bem equânimes, exigindo que

seu pretendente tenha cursado integralmente o ensino médio integralmente na rede

pública e ser proveniente de família pobre. Porém, no que se diz respeito à renda,

apenas 25% (vinte e cinco por cento) das vagas são destinadas a estudantes

provindos da rede pública com renda igual ou inferior a 1,5 salário mínimo, 25% para

candidatos que estudaram integralmente no ensino médio público e que possuem

renda igual ou superior a 1,5 salário mínimo e, ainda, um percentual para pretos,

pardos e indígenas, conforme o último Censo Demográfico do IBGE da região.

Um dos fatores mais atacados pela sociedade no que se diz respeito ao sistema

de cotas raciais é onde ele falha constitucionalmente, pois ele beneficia um grupo

étnico apenas pelo fato da pigmentação da sua pele. O que o torna inconstitucional,

já que fere o princípio da igualdade resguardado pela Carta Magna do Brasil em seu

artigo 5º:

“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes...”.

E o artigo 3º no seu inciso IV que também normatiza questões sobre o bem

social, onde este deve ser direcionado a todos sem exceções “promover o bem de

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todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade, e quaisquer outras formas

de discriminação”.

A inconstitucionalidade das cotas raciais é algo que vem sendo ignorado e que

até os Ministros do Supremo Tribunal Federal tiveram a audácia de dizer que elas são

necessárias e constitucionais. Porém, uma lei que privilegia um grupo étnico que até

ignora a condição social do cotista é uma afronta a todos o brasileiros. Com a criação

desta lei, tudo que o princípio fundamental da igualdade representa é desconsidera

por nem uma dúzia de pessoas e isso reflete na vida de mais de 200 milhões de

brasileiros. É até um pouco cômico, que ministros que foram indicados pelo o partido

com maior envolvimento em corrupção da historia do Brasil, decidam questões tão

importantes como desconsiderar um dos princípios que regem o país para

simplesmente se adequarem ao politicamente correto. Portanto, por mais que eles são

os represente da mais alta classe da justiça brasileira, é necessário lembrar que eles

são apenas homens e homens falham. Além, dos precedentes avassaladores que

podem ser abertos com essa desconsideração do principio da igualdade.

Então, apesar de haver o julgado sobre o tema abordado, que tornam

supostamente a lei 12.711 de 2012 constitucional, ela está em total desacordo com a

Constituição Federal de 1988 que é a lei maior no país.

No entanto, as cotas raciais foram até equiparadas por seus defensores, as

reservas de cargos em cargos públicos assegurados pela Constituição Federal em

seu artigo 37. Porém, é heteróclito comparar um indivíduo que possui alguma

deficiência que é biologicamente a falta ou mau funcionamento de algum membro ou

órgão que sempre o dificultara de desenvolver alguma atividade, com outro indivíduo

que é completamente normal sem nenhum impedimento físico, e que seu único

diferencial é ser negro.

Ademais, ainda tem a parte do seu texto que discorre sobre à autodeclaração

do interessado a cota em negro, pardo ou indígena, não especificando nada a respeito

sobre o fenótipo ou genótipo na declaração do pretendente a cota disposto no artigo

3º:

‘’Em cada instituição federal de ensino superior, as vagas de que trata o art. 1o desta Lei serão preenchidas, por curso e turno, por autodeclarados pretos, pardos e indígenas e por pessoas com deficiência, nos termos da legislação, em proporção ao total de vagas no mínimo igual à proporção respectiva de pretos, pardos, indígenas e pessoas com deficiência na população da unidade da Federação

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onde está instalada a instituição, segundo o último censo da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE.’’

Portanto, um dos pontos em que a Lei 12.711 deixou a desejar foi a falta de

fiscalização em relação ao termo de autodeclaração. Pois, Independentemente do tipo

de cota racial, o individuo precisa apenas assinar um termo autodeclarando sua raça

e, raramente, mas pode ocorrer do interessado a cota ter que passar por uma

entrevista ou sabatinado pelo chamado ‘‘ tribunal racial’’. E nesta entrevista fica uma

das maiores polêmicas que cercam o sistema se cotas raciais, devido a falta de

transparência e coerência deste ‘‘tribunal racial’’. Por exemplo, um fato curioso

ocorreu envolvendo gêmeos idênticos em 2007, ao tentarem ingressar na

Universidade Federal de Brasília (UnB), onde um pôde concorrer pelo sistema de

cotas raciais e o outro não foi aprovado, ou seja, um dos gêmeos univitelinos foi

considerado negro e outro não. Porém diante da enorme repercussão, a Universidade

se retratou e admitiu os dois irmãos na instituição como negros, através do sistema

de cotas raciais.

Ainda tem a questão do Brasil ser um país de dimensões continentais, o que

influencia no clima e consequentemente na pigmentação da pele das pessoas. Por

exemplo, uma pessoa morena clara pode tranquilamente ser considerada negra na

região sul do Brasil onde a maioria das pessoas tem descendências europeias, o que

reflete nas características físicas desses indivíduos serem semelhantes aos de seus

ancestrais (brancas de olhos e cabelos claros). E esta mesma pessoa morena clara

pode ser considerada como branca no nordeste e norte brasileiro, onde são

predominantes os descendentes diretos dos africanos.

Ou seja, a autodeclaração e a fiscalização da mesma sempre serão um

problema, visto que já houve vários casos de pessoas que tem a pele clara e seriam

passíveis de serem declaradas como brancas adentrarem nas universidades através

das cotas se autodeclarando pardas ou ate mesmo pretas, por possuírem

ascendência negra e então se declaram negras por causa do genótipo. No que se diz

respeito à fiscalização, várias universidades fazem a pesquisa sobre as instituições

que o cotista estudou, se era uma instituição pública e ainda pesquisam a fundo a

respeito da renda. Mas quando se adentra no quesito racial, as universidades ficam

impotentes, pois a lei não dá respaldo ou alguma diretriz sobre como proceder no

quesito da fiscalização destes que se autodeclaram pardos, pretos ou indígenas e

além de ser uma atitude racista de taxar as pessoas conforme sua cor. Então a não

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ser em casos polêmicos onde alguns movimentos negros interferem, as universidades

se abstém quando o interessado a vaga pela cota racial se autodeclara negro.

Outro caso mais recente que gerou tumulto, ocorreu na Universidade Federal

de Minas Gerais (UFMG), pois, integrantes do movimento negro da universidade se

sentiram ofendidos pelo fato de pessoas que para os membros do movimento negro

teriam a pele clara adentraram na universidade através do sistema de cotas raciais.

Mas a universidade não tinha como proceder em desfavor destas pessoas, pois a lei

12.711/2012 não possui previsão de verificação a respeito destes autodeclarados e

os cotistas possuíam ascendência negra. Em entrevista ao jornal Estado de Minas o

pró-reitor da universidade Ricardo Takahashi explicou a situação da universidade

nestes casos. “No que diz respeito à condição de autodeclaração, não existe nem na

Lei 12.711, de 29 de Agosto de 2012, nem na Portaria 18/2012, nenhuma previsão de

mecanismo de verificação”.

É interessante ressaltar, que de início iria ser usado como parâmetro de

avaliação para os interessados em adentrar nas universidades através das cotas o

Coeficiente de Rendimento (CR) obtido a partir da média aritmética das notas do

Ensino Médio. Porem, o artigo foi extinto do projeto e, a partir de então, o Exame

Nacional do Ensino Médio (Enem) passou a ser adotado como critério único de

seleção dos candidatos.

O Brasil é o segundo país com a maior população negra do mundo, ficando

atrás apenas da Nigéria. O que faz a Lei de cotas perder seu sentido, já que um dos

seus pretextos para ser criada foi alegar que negros são minorias, analisando toda a

historias do Brasil desde os primórdios da escravidão é inegável que a população

negra sofreu abusos inimagináveis. Mas ser promulgada uma lei depois de quase dois

séculos da extinção do regime escravocrata não faz sentido, não há dívida histórica

alguma. O solo brasileiro abriga um dos povos mais miscigenados do mundo, não é

atoa que uma das polêmicas que mais acercam o sistema de cotas seja a

autodeclaração do cotista.

Ademais, é nítido que o Brasil é um país que abrange inúmeros programas

sociais direcionados a população carente, além de fornecer ensino público que se

inicia desde creches com crianças de três anos até o ensino médio. Então se existe

duas pessoas nas mesmas condições, porém uma negra e uma branca, que são

pessoas que possuem a mesma baixa renda familiar, que sempre estudaram em

escolas públicas, então não existem motivos para dar uma bolsa proveniente do

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sistema de cotas raciais ao jovem negro apenas pelo fato de sua cor. Todos os

brasileiros devem ter iguais oportunidades, desde que tenham as mesmas condições.

Sendo assim, além da nítida inconstitucionalidade da lei 12.711 de 2012, os

argumentos que dizem fazer necessária a manutenção das cotas raciais são

insustentáveis e utópicos. Tirar a chance de um brasileiro porque ele não é negro é

uma forma de racismo inverso, os jovens de hoje não podem ser punidos por crimes

que brasileiros e portugueses cometeram há quase 200 anos atrás. O senso de justiça

no país já esta abalado com a falta de punição e com a proteção demasiada que os

bandidos vêm recebendo do governo e de seus simpatizantes políticos. Então punir

jovens que segundo os movimentos negros tiveram o privilegio de nascerem brancos

independentes de sua condição social é algo surreal. Apesar de ser por enquanto uma

ação afirmativa com estimativa para ser analisada dentro de dez anos, quantas

pessoas serão prejudicadas por crimes que não cometeram e que com certeza a

maioria nem compactua e até repudiam o que foi feito a 200 anos atrás.

A Constituição Federal também traz em seu artigo 5º XLV o princípio da

intranscendência ou da pessoalidade ou, ainda, personalidade da pena, preconiza que

somente o condenado, e mais ninguém, poderá responder pelo fato praticado, pois a

pena não pode passar da pessoa do condenado, derrubando este argumento

infundado sobre esta suposta dívida histórica que os brancos supostamente devem

pagar aos negros.

‘‘Artigo 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XLV - nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido; ’’

Ainda no que se refere à constitucionalidade, também é necessário citar o artigo

208, inciso V da Constituição Federal de 1988. O referido artigo traz em seu corpo, o

princípio do mérito, que segundo o qual, o acesso ao nível superior deve ser feito

segundo a capacidade de cada um:

“Artigo 208 - O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a

garantia de:(...)

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V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação

artística, segundo a capacidade de cada um”;

O sistema de cotas raciais se mostra mais uma inconstitucional, uma vez que

vai contra ao principio do mérito, tendo em vista que se a seleção baseia-se na escolha

dos melhores alunos (critério merecimento/meritocracia), as cotas tiram a

oportunidade de quem obteve notas mais elevadas nas faculdades, dando a chance

a quem teve notas mais baixas, mas que contou com o acréscimo que é dado aos

autodeclarados negro. As cotas distorcem o fundamento do sistema, ou seja, alunos

com notas inferiores ingressam na faculdade, ao passo que outros, com melhores

notas, são reprovados. A inconstitucionalidade é nítida, levando em consideração as

limitadas e concorridíssimas vagas nas universidades, mais uma vez tendo que se

falar no prejuízo que os demais sofrem.

Portanto a Lei 12.711 de 2012 se mostra além de prescindível, um emaranhado

de inconstitucionalidade que fere princípios fundamentais além de punir pessoas por

uma dívida histórica a qual nem seus avós tiveram participação na escravidão já que

a referida foi abolida há quase duzentos anos atrás, tirando a oportunidade destas

pessoas de concorrer de forma justa pela chance de ingressar na universidade.

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4 O NEGRO E O SISTEMA DE COTAS

A justificativa para a existência do sistema de cotas raciais nas universidades,

é que a grande maioria dos universitários são pessoas brancas. E que infelizmente os

negros não teriam as mesmas oportunidades que um branco, mesmo que este

também seja pobre. Fazendo com que o negro seja privado de ter acesso à educação

de qualidade, que consequentemente os levam a ocupar vagas de empregos menos

favoráveis e com poucas chances de conseguirem uma melhor condição de vida e

financeira.

Além da justificativa da dívida histórica, segundo muitos movimentos negros

esquerdistas, se o indivíduo nasce branco ele já é um privilegiado. Pelo simples fato

de que segundo eles, este jovem branco nunca será abordado por um policial por ser

branco, nunca será abordado por um segurança de uma loja e terá sua mochila

revistada apenas por ser branco. E esse jovem sempre terá preferência a qualquer

vaga de emprego pelo simples e único fato de ser branco. Segundo vários integrantes

destes movimentos negros, o jovem branco sempre será um privilegiado em tudo e

sempre ‘‘usurpará’’ as oportunidades do negro.

Porém os números não mentem, e os números de pessoas que se

autodeclararam negras é bem menor do que os brancos nas universidades. E que

decorrente dos programas estudantis do governo este quadro vem mudando aos

poucos.

A meritocracia é algo totalmente utópico para os integrantes dos movimentos

negros, pois a concorrência com o jovem branco sempre será desleal. E a população

negra nunca teve a oportunidade de se recuperar de fato dos danos causados pela

escravidão, segundo eles. Levando em conta que a população negra foi simplesmente

marginalizada após a abolição da escravidão. De fato nunca houve um programa de

governo para inserir aqueles exs escravos de volta a sociedade.

Muitos exs escravos continuaram a trabalhar de graça para seus antigos donos

em troca de moradia e comida, e outros migraram para as cidades em busca de

oportunidades de empregos, porém, poucos conseguiram. Porque não era bem visto

pela sociedade um negro trabalhando em lojas ou comércio, já que há pouco tempo

no que se refere à época da escravidão, os negros eram considerados mercadorias e

objetos, e agora se quisesse obter trabalhos de um negro deveria ser como

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empregado pagando a ele um salário. Então muitos foram para os quilombos

comunidades, negreiras criadas durante o período da escravidão para servir como

refúgio para os negros que conseguiram escapar das fazendas e de seus ‘‘donos’’.

Porém, apesar destes serem os principais argumentos de quem defende as

cotas raciais, evidentemente eles não são sólidos e pouco sustentáveis. Porque, como

já dito, o governo vem a décadas fazendo programas estudantis, que tem como

público alvo, jovens pobres, indiferente de sua cor, raça ou credo, os programas são

direcionados a quem possui baixa renda. Sabendo que mais da metade da população

brasileira é negra ou parda, esses programas resultaram em um aumento

considerável de jovens pobres e negros nas universidades nos últimos anos.

No que tange ao argumento relativo à dívida histórica, as ações afirmativas

foram iniciadas nos Estados Unidos devido ao real problema de discriminação racial

o qual o país ainda passa. Mas diferente dos EUA, o Brasil nunca segregou os negros.

Após o período escravocrata eles foram esquecidos e marginalizados, mas não foram

perseguidos por serem negro. Não foram criados bairros, escolas, lugares apenas

para negros, para eles não se misturarem com os brancos. Existe um problema de

racismo ‘‘velado’’ entranhado na sociedade. Mas, as leis brasileiras têm em seu

ordenamento jurídico, punições severas e corretas a respeito do racismo.

Os serviços públicos brasileiros não tinham problemas de racismo em seus

concursos e a meritocracia era a porta de entrada para os cargos pública. Até as cotas

raciais se entranharem nos concursos públicos, aumentando ainda mais a

impopularidade do sistema de cotas e já até serem declaradas inconstitucionais por

um juiz da 8ª vara do trabalho de João Pessoa e fazendo crescer as ações de

inconstitucionalidades das cotas raciais. Ou seja, um dos precedentes que as cotas

raciais nas universidades abriram, foi o de se instaurar nos concursos públicos. Então,

agora ao que se parece tudo deverá ter sua parcela de cotas raciais para que seja

saldada esta dívida histórica de valor imensurável e que todos que não carregam os

genes negros deverão pagar. Às vezes é surreal tratar deste assunto, e rebater os

argumentos incoerentes dos defensores das cotas raciais. É normal e louvável que

grupos menos favorecido lutem por direitos e IGUALDADE, mas, ver um grupo o qual

metade da nação se enquadra lutar e exigir privilégios chega a beira do ridículo.

Portanto, apesar dos esporádicos incidentes de racismo no Brasil, é tranquilo

afirmar que as populações negras e brancas viviam pacificamente. Não há registros

de perseguições às pessoas negras, e quando os apoiadores das cotas raciais vêm

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com aquele discurso de ‘‘coitadismo’’ com requintes de inferioridade que no Brasil o

negro tem menos oportunidades e que eles são minorias em cargos mais almejados

e em universidades. Bom, não existe lei que proíbe a entrada de negro em

universidades e nem em concursos públicos ou em qualquer outro lugar do Brasil, até

porque, o princípio da igualdade sempre garantiu tratamento igualitário a todos os

brasileiros. O problema do baixo número de negros nestes lugares é consequência do

fator social econômico. E de acordo com a atual situação da educação brasileira, é

obvio que uma criança que estudou em escolas públicas, independente de sua cor,

não conseguirá competir em paridade com uma criança oriunda do ensino privado,

onde o ensino é de fato mais forte e muito mais eficaz.

A solução seria fortalecer a educação pública, porém, a educação não é algo

o qual o governo tenha de fato mostrado interesse em melhorar. Parece que o real

interesse do governo são apenas os números de crianças que concluíram o ensino

fundamental e médio, para mostrar estes números satisfatórios às entidades

internacionais a fim de ganhar visibilidade, mas que são de longe eficazes e que não

retratam a real situação da educação brasileira. Portanto, as cotas sociais além de se

mostrarem necessárias, são mais justas e uma solução de fato correta para o atual

cenário brasileiro.

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5 ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL (ADPF

186)

Anteriormente fora dito quais as origens das cotas raciais, onde a Universidade

de Brasília (UnB) foi uma das instituições pioneiras ao adotar o sistema de cotas no

Brasil. Porém, o partido politico Democratas (DEM) ajuizou em 2009 uma Arguição De

Descumprimento De Preceito Fundamental a ADPF 186. O DEM alegou na época,

que as atitudes tomadas pela Universidade, eram inconstitucionais e que feriam vários

preceitos fundamentais, tais como o da igualdade elencado no artigo 5º, o princípio da

dignidade humana, além de dispositivos que estabelecem o direito universal à

educação. Conforme o DEM, o sistema de cotas fere os seguintes artigos:

‘‘O arguente alega, em suma, que tais atos ofendem os arts. 1º, caput, III, 3º, IV, 4º, VIII, 5º, I, II, XXXIII, XLI, LIV, 37, caput, 205, 206, caput, I, 207, caput, e 208, V, todos da Constituição Federal. Sustenta, em síntese, que a discriminação supostamente existente no Brasil é uma questão social e não racial.’’ (ADPF 186, p.12)

O DEM além dos artigos supracitados, fez varias alegações as quais já previam

os desastres que seriam gerados em longo prazo e os prejuízos que este falho sistema

traria para a sociedade brasileira.

‘‘Afirma, a seguir, que a constitucionalidade do sistema de cotas raciais nas universidades brasileiras tem sido objeto de decisões contraditórias por parte da magistratura de primeira e segunda instâncias, nos âmbitos estadual e federal, com resultados contraditórios. Sustenta, ainda, que se institucionalizou na UnB um verdadeiro tribunal racial para definir quem é negro e quem não é, questionando os critérios utilizados para esse fim.(...) Assevera, também, que os defensores dos programas afirmativos adotam a “Teoria da Justiça Compensatória”, a qual Afirma, contudo, que não se mostra factível a adoção dessa teoria, seja porque não se pode responsabilizar as gerações presentes por erros cometidos no passado, seja porque é impossível identificar quais seriam os legítimos beneficiários dos programas de natureza compensatória(...). O arguente, de resto, aponta para uma “manipulação” dos dados estatísticos, asseverando que ora os pardos são incluídos entre os negros, para se afirmar, por exemplo, que estes representam metade da população, ora aqueles são excluídos para se dizer que apenas 3% dos negros estão na universidade. Além disso, critica o sistema “birracial” de classificação norteamericano”, o qual só admitiria duas “raças”, brancos e negros, inaplicável, no seu entender, à realidade multirracial brasileira, caracterizada por intensa miscigenação, que

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inviabilizaria os programas afirmativos, entre nós, baseados nesse critério.’’ (ADPF 186, p.14,15,16).

Apesar de sólidas e coerentes as afirmações feitas pelo DEM, a ADPF foi

julgada improcedente com unanimidade pelos Ministros. Foram ao todo 10 (dez) votos

a favor das cotas raciais, além de vários pedidos de ingresso como amicus curiae1

incluindo da Central Única dos Trabalhadores do Distrito Federal – CUT/DF, que se

mostrou muito interessada em participar do processo, obviamente por questões

políticas. O partido dos Democratas foi taxado de racista por vários veículos de

informações e movimentos negros, que acusaram o partido de estar ignorando o

passado escravos dos negros.

Mesmo não obtendo nenhum voto em desfavor das cotas raciais, o Ministro

Gilmar Mendes em seu voto fez vários questionamentos a respeito da eficácia das

cotas e sobre o ‘‘o tribunal racial’’ que realmente havia se formado e se mostrado falho.

‘‘Embora haja o modelo, diga-se, um modelo de autodesignação, há um tipo de pergunta que tem sido revelada na mídia, que é feito por esse tribunal chamado órgão de seleção ou esse tribunal racial. E nós já vimos que ele está longe de ser infalível, como se demonstrou da tribuna, aquela situação de gêmeos univitelinos em que um foi reconhecido como negro e o outro, não, gerando um tipo de situação de difícil aceitação no sistema como um todo. Então, parece-me que esse é um ponto que precisa ser enfatizado.’’ (MENDES, p.164)

E em seu extenso e sensato voto, o Ministro Gilmar Mendes se apresentou

realmente preocupado com as consequências que este sistema poderia gerar.

Enfatizando que a questão social dos candidatos às cotas seria mais importante, ao

contrário do aspecto da suposta dívida histórica. Se mostrando a favor das cotas

apenas por elas serem ações afirmativas, sendo assim temporárias. Mas reconheceu

que este sistema não deveria ser considerado totalmente constitucional, levando em

conta os precedentes que as cotas poderiam abrir, além do fato do Brasil ser uma país

muito miscigenado, algo que de fato iria interferir nos próprios candidatos que se

declaram negros. Questionando a respeito de quais seriam os verdadeiros parâmetros

para selecionar um candidato, se seria o aspecto do fenótipo ou genótipo, já que para

1 Amicus curiae ou amigo da corte ou também amigo do tribunal (amici curiae, no plural) é uma expressão em Latim utilizada para designar uma instituição que tem por finalidade fornecer subsídios às decisões dos tribunais, oferecendo-lhes melhor base para questões relevantes e de grande impacto.

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ele é complicado diferenciar negros de pardos. Questionamentos que se mostraram

atualmente uma das principais controvérsias do sistema de cotas raciais.

‘‘Então, essa distorção precisa ser realmente enfocada. E é preciso dizer: o modelo da UnB padece desse vício, podendo gerar distorções e perversões a ponto de pessoas negras que estudaram em escolas privadas, que tiveram todas as mais adequadas condições, agora, no final, optam pelo vestibular e vão se submeter a esse tribunal racial, gerando essa distorção(...).Não é razoável que alguém se invista na universidade neste tipo de poder de dizer quem é branco e quem é negro para essa finalidade. Seria muito mais razoável adotar-se um critério objetivo de referência, de índole sócio-econômica. Porque todos podemos imaginar as distorções eventualmente involuntárias, como esses casos estão a demonstrar, mas também eventuais distorções de caráter voluntário, a partir desse tribunal que, segundo se diz, pelo menos na mídia, opera com quase nenhuma transparência. Então, veja que se conferiu, aí, a um grupo de iluminados esse poder que ninguém quer ter, de dizer quem é branco, quem é negro, numa sociedade altamente miscigenada(...). (...) eu gostaria apenas de pontuar essas ressalvas quanto à fundamentação, tendo em vista que eu entendo realmente necessária a revisão desse modelo. Quer dizer, as próprias críticas que hoje se fazem indicam a necessidade de que esse modelo seja revisto. Nesse sentido, eu não chancelaria a fórmula como totalmente constitucional. Mas eu diria, na linha do que temos sustentado aqui, as chamadas sentenças intermédias, quer dizer: é uma lei ainda constitucional; é um modelo que pode tender, se for mantido, se não for revisto, para um quadro de inconstitucionalidade. Quando se apontam as distorções, e elas são sérias, tanto a possibilidade de cooptação, ricos que se aproveitam da cota, pervertendo, portanto, o sistema; ou decisões discricionárias ou até arbitrárias de servidores das universidades nesse órgão de seleção racial; já a ideia do tribunal racial evoca a memória de coisas estranhas, Presidente, não é? Enfim, não é um bom modelo, especialmente numa sociedade miscigenada; quer dizer, há uma dificuldade muito grande em relação a isso.’’ (MENDES, p.167,168)

Após a ADPF 186 ser julgada totalmente improcedente em 26 de abril, foram

abertas as portas para as cotas raciais serem de fato regularizadas. Então em agosto

de 2012 foi sancionada a Lei 12.711, não apenas reconhecendo as cotas raciais, mas

também as tornando obrigatórias. E em 2014 as tornando obrigatórias nos concursos

públicos, desde então o que vimos no Brasil são mais e mais projetos de leis a respeito

de cotas, tendo agora em evidência o grupo LGBT que também esta tentando sua

parcela de cotas nos concursos. Mostrando o quanto a meritocracia esta sendo

marginalizada e desvalorizada e a igualdade esta se tornando sinônimo de racismo,

machismo, homofobia e afins.

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6 CONCLUSÃO

As cotas raciais foram criadas para dar oportunidade aqueles que estavam

marginalizados, mas quando algo não é devidamente estudado antes de ser colocado

em prática pode causar mais danos que benefícios almejados. Porém é necessário

que seja reconhecido o erro, pois uma norma que está sendo constantemente atacada

por não estar de acordo com a Carta Magna que é a Lei maior do país, deve realmente

ser revista.

Enxergar a inconstitucionalidade incontestável na Lei 12.711 /12 está longe de

ser um ato de racismo e sim um ato racional levando em conta a atual situação do

Brasil. Ou seja, existe racismo em todos os lugares do mundo e ter como prioridade a

igualdade entre todas as pessoas independentemente de raça, cor ou credo é uma

das principais e mais eficaz maneira de erradicar o problema. Mas ao invés de ter a

igualdade dos cidadãos como diretriz, a referida Lei simplesmente segregou ainda

mais a população. Abrindo precedentes inescrupulosos para a criação de incontáveis

tipos de cotas, dividindo cada vez mais a nação e uma nação dividida é uma nação

fraca, que não evolui e nem cresce.

A Constituição Federal de 1988 prevê as cotas para deficientes em seu artigo

37, inciso ll. Mas estas cotas jamais devem ser comparadas as cotas raciais por

motivos óbvios. Um deficiente não poderá competir igualmente com uma pessoa

completamente saudável, sendo neste caso necessária as cotas para ajudar os

deficientes adentrarem no mercado de trabalho.

Para findar o problema de pessoas de classe baixa nas universidades, as cotas

sociais são a solução mais viável e justa colocando em pauta o atual cenário brasileiro.

Pessoas que compactuam da mesma condição social e que tiveram o mesmo ensino

devem competir entre si por vagas nas universidades, esta seria a maneira certa do

governo remediar o déficit na educação pública que ele tem gerado e ignorado por

anos. Visto que um aluno proveniente do falido ensino público não teria chances de

competir com alunos do ensino privado, fazendo as cotas sociais fundamentais para

reparar o referido problema.

O sistema de cotas raciais feriu diversos preceitos constitucionais além de ser

frequentemente alvo de polêmicas devido à complexidade de se definir quem é negro

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e quem não é. A miscigenação influencia muito neste quesito, já que a maioria dos

brasileiros tem ascendência negra, mesmo que sua pele seja relativamente clara. E

não foi normatizado na Lei de cotas raciais nada a respeito do fenótipo ou genótipo

serem critérios para concorrer às cotas, bastando apenas a autodeclaração do

pretendente a cota.

Ademais, como previu o senhor Ministro Gilmar Mendes em seu voto, as cotas

raciais deveriam ter sido formuladas com mais cautela, visto que os precedentes que

poderiam abrir e de fato abriram poderiam ser irremediáveis. E isto já foi pautado

inúmeras vezes, pois vários grupos têm pleiteado cotas em universidade e concursos

públicos como já citado no presente artigo os grupos LGBTs. Além do ilustríssimo

Ministro também ter defendido as cotas sociais, por ser uma medida mais equânime

que se encaixa com os problemas sociais que o Brasil tem enfrentado.

Portanto as cotas raciais se tornaram uma adversidade que divide opiniões,

além de prejudicar pessoas inocentes que muitas vezes, são quem realmente

mereciam estas vagas. Uma Lei que em tese seria para diminuir a desigualdade e

acaba a aumentando deve ser reparada prementemente, pois além de prejudicar

pessoas as pune por crimes que elas não cometeram. E como já ocorreram diversas

vezes, as fraudes através do sistema de cotas raciais estão se tornando cada vez

mais corriqueiras provando sua ineficiência e aumentando o repudio da população

contra este sistema. Deixando claro o fato de que além de inconstitucionais as cotas

raciais também são prescindíveis, devendo as mesmas ser revogadas.

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REFERÊNCIAS

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