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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Registro: 2012.0000539040 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0050254- 28.2009.8.26.0562, da Comarca de Santos, em que é apelante/apelado FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO, é apelado/apelante SOCIEDADE BIBLICA DO BRASIL - SBB. ACORDAM, em 3ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Por maioria, vencido o 3º juiz, negaram provimento aos recursos. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores AMORIM CANTUÁRIA (Presidente sem voto), ANTONIO CARLOS MALHEIROS E JOSÉ LUIZ GAVIÃO DE ALMEIDA. São Paulo, 9 de outubro de 2012. Ronaldo Andrade RELATOR Assinatura Eletrônica

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PODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro: 2012.0000539040

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0050254-28.2009.8.26.0562, da Comarca de Santos, em que é apelante/apelado FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO, é apelado/apelante SOCIEDADE BIBLICA DO BRASIL - SBB.

ACORDAM, em 3ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Por maioria, vencido o 3º juiz, negaram provimento aos recursos. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores AMORIM CANTUÁRIA (Presidente sem voto), ANTONIO CARLOS MALHEIROS E JOSÉ LUIZ GAVIÃO DE ALMEIDA.

São Paulo, 9 de outubro de 2012.

Ronaldo AndradeRELATOR

Assinatura Eletrônica

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Voto nº 1684

Apelantes : FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO e SOCIEDADE BÍBLICA

DO BRASIL - SBB

Apelados : OS MESMOS

Comarca : SANTOS

Recurso nº 0050254-28.2009.8.26.0562

Juíza de 1º Grau: DR. MÁRCIO KAMMER DE LIMA

ICMS Entidade assistencial sem fins lucrativos - Importação de matéria-prima para confecção de capas para Bíblias - Exigência de pagamento do ICMS por ocasião do desembaraço aduaneiro - Impossibilidade Entidade abrangida pela imunidade tributária prevista no artigo 150, inciso VI, alínea “c”, da Constituição Federal - Prova de que a matéria-prima importada é fundamental ao cumprimento de suas finalidades essenciais - Não incidência de ICMS na aludida importação Precedentes Impossibilidade, entretanto, de declaração de imunidade para importações futuras Sentença mantida Recursos não providos

Tratam-se de recursos de apelação interpostos pela Fazenda do Estado

de São Paulo e pela Sociedade Bíblica do Brasil em face da R. Sentença de fls. 299/302

que julgou procedente o pedido e declarou a inexistência de obrigação tributária

relativamente à cobrança de ICMS das mercadorias relacionadas na inicial.

Recorre a Fazenda do Estado de São Paulo (fls. 310/323) sustentando

que a imunidade prevista no artigo 150, VI, “c” e § 4º da Constituição Federal confere o

benefício somente para tributos relativos ao patrimônio e à renda. Alega que no caso a

importação de rolos de couro, couro reconstituído e tecido não tem relação com a

finalidade essencial da apelada que é a de “difusão da Bíblia e sua mensagem” e que as

hipóteses de imunidade de ICMS estão expressas na Constituição Federal.

A Sociedade Bíblica do Brasil recorre (fls. 344/358) requerendo a

reforma da R. Sentença para que seja declarada de forma ampla a imunidade tributária

de ICMS incidente sobre a importação de bens destinados aos seus fins essenciais e

assistenciais estendendo, assim, a decisão a eventos futuros.

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Foram apresentadas contrarrazões (fls. 326/358 e 363/366).

É o breve relatório.

A Sociedade Bíblica do Brasil propôs ação declaratória de imunidade

tributária cumulada com anulatória de crédito tributário relatando ser entidade

beneficente de assistência social sem fins lucrativos, cuja atividade precípua é traduzir,

produzir e difundir a Bíblia, divulgando a crença religiosa, sendo para tanto detentora do

Certificado de Entidade de Fins Filantrópicos desde 1967.

A fim de produzir as capas das bíblias, necessitou importar rolos de

couro, couro reconstituído e tecido, materiais não disponíveis no mercado nacional.

Entretanto, ao tentar o desembaraço das mercadorias, a Fazenda do Estado de São Paulo

determinou a apresentação de guia de recolhimento do ICMS, ignorando o fato da

autora ser imune.

Assim, com fundamento no artigo 150, VI, “c” da Constituição

Federal, requereu a antecipação de tutela para desembaraço das mercadorias sem

incidência de ICMS e, ao final, a declaração de sua imunidade tributária com relação à

incidência de ICMS sobre produtos importados destinados aos seus fins assistenciais.

A tutela antecipada foi indeferida (fls. 21), decisão contra a qual a

autora interpôs agravo de instrumento no qual foi deferida a antecipação recursal (fls.

260).

A ré contestou (fls. 244/258) alegando inaplicabilidade do artigo 150,

VI, “c” da Constituição Federal, pois o benefício da imunidade somente incide em

impostos relativos ao patrimônio e à renda, como o Imposto Predial e Territorial, o

Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis e o Imposto de Renda. Alegou ainda que

as hipóteses constitucionais de imunidade do ICMS não fazem menção à exclusão de

tributação em relação à importação de mercadorias por instituições beneficentes e que

os produtos importados pela autora não têm relação com as atividades essenciais por ela

desenvolvidas.

Houve réplica (fls. 282/297).

Sobreveio então a R. Sentença que deverá ser mantida.

O artigo 150, inciso VI, “c”, da Constituição Federal assim dispõe:

“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e

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aos Municípios:(...)VI - instituir impostos sobre:(...)c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei”.

E o Código Tributário Nacional assim dispõe:

“Art. 9º - É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:(...)IV - cobrar imposto sobre:(...)c) o patrimônio, a renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, observados os requisitos fixados na Seção II deste Capítulo;

“Art. 14. O disposto na alínea c do inciso IV do artigo 9º é subordinado à observância dos seguintes requisitos pelas entidades nele referidas:I não distribuírem qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título; II - aplicarem integralmente, no País, os seus recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais;III - manterem escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão”.

A autora comprovou ser uma entidade de assistência social sem fins

lucrativos, conforme de verifica dos documentos de fls. 135/137, 139 e 141.

E a imunidade de recolhimento de ICMS nos casos de mercadoria

importada para o fim da atividade da entidade já é matéria pacífica neste E. Tribunal,

conforme se verifica dos julgados abaixo transcritos:

“Apelação cível ICMS - importação - Preliminares afastadas - Importação de pedras para construção de templo religioso - Imunidade reconhecida nos termos do art. 150, VI, b, § 4o, da CF -

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Precedentes do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Sentença reformada - Recurso provido”. (TJSP 3ª Câmara de Direito Público Apelação nº 0012510-03.2011.8.26.0053 Rel. Desembargador Marrey Uint j. 19.06.2012).

“APELAÇÃO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. ICMS. IMPORTAÇÃO DE EQUIPAMENTOS PARA INTEGRARATIVO FIXO DO SENAI E UTILIZÁ-LOS DE ACORDO COM SUAS FINALIDADES INSTITUCIONAIS. ENTIDADE DE CARÁTER INDUVIDOSAMENTE ASSISTENCIAL E SEM FINS LUCRATIVOS. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA. CONFIGURAÇÃO. ART. 150, INCISO VI, “C”, DA CF, C.C. ART. 14 DO CTN. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. RECURSO DESPROVIDO”. (TJSP 3ª Câmara de Direito Público Apelação nº 0009146-23.2011.8.26.0053 Rel. Desembargador Amorim Cantuária j. 19.06.2012).

“Apelação cível - Mandado de segurança - Imunidade - ICMS - Importação de bens por entidade de assistência social, sem fins lucrativos, inteligência do disposto no art. 150, VI, “c”, da Constituição Federal - Imunidade tributária reconhecida - Sentença mantida - Recursos oficial e voluntário do Estado de São Paulo improvidos”. (TJSP 3ª Câmara de Direito Público - Apelação nº 0038130-51.2010.8.26.0053 Rel. Desembargador Marrey Uint j. 03.07.2012).

“Note-se que sobre a utilização do equipamento (uma máquina de serra de livros) que é objeto de importação, o mesmo enquadra-se nos objetivos institucionais da Sociedade Bíblica do Brasil, configurando-se útil e indispensável ao patrimônio da impetrante, que possui como natureza filantrópica a difusão da bíblica como transformação espiritual, moral e social do povo. Nesse sentido, confira julgados deste Tribunal:

ICMS - Imunidade - Sociedade de natureza religiosa, filantrópica e educativa, tendo por finalidade primordial promover e intensificar a difusão da Bíblia - Importação de equipamento para integrar seu patrimônio, e muito tem a ver com os serviços que presta - Aplicação do art. 150, inc. VI, "a", da CF - Impetrante que atende todos os requisitos do art. 14, do CTN - Recursos desprovidos. APELAÇÃO CÍVEL N- 199.382-5/9-00, Relator PAULO TRAVAIN, j . 11/08/2004.

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ICMS - Importação de equipamentos e produtos utilizados por instituição de educação, sem fins lucrativos, no desempenho de suas atividades Bem destinado a compor o ativo fixo e não inserto na cadeia de circulação de mercadorias - Não sujeição de pessoa jurídica que, até então, não era contribuinte habitual do ICMS - Existência, ainda, da imunidade prevista no art . 150, VII , c, da CF. Segurança concedida - Recursos não providos. (Apelação n- 656.894.5/6, rei. Des. Urbano Ruiz, j . 30-07-2007)” (TJSP 12ª Câmara de Direito Público Apelação nº 409.770-5/3-00 Rel. Desembargador Luiz Burza Neto j. 25.11.2009).

Esse também é o entendimento do E. Supremo Tribunal Federal:

“E M E N T A: AGRAVO DE INSTRUMENTO - ICMS INCIDÊNCIA OPERAÇÃO DE IMPORTAÇÃO, POR ENTIDADE DE ASSISTÊNCIA SOCIAL SEM FINS LUCRATIVOS, DE BENS RELACIONADOS COM SUAS FINALIDADES ESSENCIAIS IMPOSSIBILIDADE - TRANSGRESSÃO À NORMA CONSTITUCIONAL DA IMUNIDADE TRIBUTÁRIA (CF, ART. 150, VI, “c”) - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO.(...)Com efeito, tal como ressaltado na decisão ora agravada, a controvérsia suscitada em sede recursal extraordinária já foi dirimida por ambas as Turmas do Supremo Tribunal Federal (AI 484.661-AgR/RS, Rel. Min. AYRES BRITTO RE 203.755/ES, Rel. Min. CARLOS VELLOSO RE 311.626-AgR/PA, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, v.g.):

“TRIBUTÁRIO. ICMS. IMUNIDADE. OPERAÇÕES DE IMPORTAÇÃO DE MERCADORIA REALIZADA POR ENTIDADE DE ASSISTÊNCIA SOCIAL. AGRAVO IMPROVIDO.I - A jurisprudência da Corte é no sentido de que a imunidade prevista no art. 150, VI, c, da Constituição Federal abrange o ICMS incidente sobre a importação de mercadorias utilizadas na prestação de seus serviços específicos. II - Agravo improvido.” (AI 669.257-AgR/RS, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI)

“AGRAVO REGIMENTAL. PROCESSUAL CIVIL. CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS DE COMUNICAÇÃO E DE TRANSPORTE INTERMUNICIPAL E INTERESTADUAL. ICMS. IMPORTAÇÃO. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA. ENTIDADE BENEFICENTE. ALEGADA

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INAPLICABILIDADE DA REGRA CONSTITUCIONAL DADO QUE O PRETENSO CONTRIBUINTE NÃO TERIA ARCADO COM A CARGA TRIBUTÁRIA. RAZÕES DE RECURSO CONTRADITÓRIAS.1. Na tributação das operações de importação, o contribuinte por excelência do tributo é o importador (que tende a ser o adquirente da mercadoria) e não o vendedor. Há confusão entre as figuras do contribuinte de direito e do contribuinte de fato. 2. Assim, não faz sentido argumentar que a imunidade tributária não se aplica à entidade beneficente de assistência social nas operações de importação, em razão de a regra constitucional não se prestar à proteção de terceiros que arquem com o ônus da tributação. ........ 4. Agravo regimental ao qual se nega provimento.” (AI 476.664-AgR/RS, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA)

Cumpre ressaltar, por necessário, que esse entendimento vem sendo observado em sucessivos julgamentos, proferidos no âmbito desta Corte, a propósito de questão essencialmente idêntica à que ora se examina nesta sede recursal (AI 675.567/RS, Rel. Min. DIAS TOFFOLI AI 719.014/SP, Rel. Min. ELLEN GRACIE AI 831.455/SP, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA AI 836.299/SP, Rel. Min. MARCO AURÉLIO RE 386.125/RS, Rel. Min. GILMAR MENDES, v.g.)”. (STF - Ag.reg, no Agravo de Instrumento nº 785.459/RS Rel. Ministro Celso de Melo 29.11.2011).

A insurgência da ré, em verdade, refere-se aos materiais importados

pela autora e objetos desta ação, quais sejam, rolos de couro, couro reconstituído e

tecido, pois entende que não são destinados à atividade essencial da entidade.

No entanto, a autora afirma que os produtos importados serão

empregados na produção das capas das bíblias, ou seja, para execução da sua atividade

fim.

E, como bem ponderou a R. Sentença, eventual aplicação dos

materiais importados em atividade diversa, deverá ser fiscalizada pelos agentes da

Fazenda.

Assim, verifica-se que a autora preenche os requisitos da imunidade

tributária, vez que comprovou ser entidade assistencial sem fins lucrativos e os produtos

importados destinam-se à sua atividade fim.

O recurso da autora também não merece provimento.

Não é possível estender os efeitos da decisão que concede imunidade

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tributária a todas as importações a serem feitas pela autora, pois as condições de futuras

e eventuais importações dependem da análise dos critérios que determinam a imunidade

e esses somente podem ser aferidos quando de sua ocorrência.

A 11ª Câmara de Direito Público deste E. Tribunal, ao julgar caso

semelhante a este bem decidiu esta questão, valendo a transcrição de trechos do V.

Acórdão:

“Sem razão a autora em seu inconformismo, não havendo como deferir a pretensão também constante da inicial de que a declaração de imunidade tributária ao ICMS, postulada na presente ação, seja extensiva a todas as importações de bens destinados a suas finalidades essenciais, bem assim a “consequente nulidade de todos os créditos tributários eventualmente lançados;” (textualmente, fls. 34). Isto significaria prolação de sentença de cunho normativo e condicionado, à maneira de norma jurídica: sempre que ocorrido o evento futuro e incerto consistente na violação do direito da autora, aplicar-se-ia a decisão normativa, como disse o MM. Juiz sentenciante, não haveria como conferir à autora “verdadeiro 'bill' de imunidade que lhe permita alforria antecipada de incidência de norma tributária sobre operações futuras, ...” (fls. 334). A lide haverá de ser real e palpável, descabendo tutela jurisdicional de cunho condicionado e normativo.

(...)

E deste Tribunal de Justiça, em didático precedente, colige-se: “A jurisprudência firmou orientação segundo a qual "o interesse de agir por meio de ação declaratória envolve a necessidade, concretamente demonstrada, de eliminar ou resolver a incerteza do direito ou relação jurídica" (RTJ 83/934). Ou seja: a ação declaratória "exige para sua propositura que haja incerteza objetiva e jurídica, isto é, relativa a direitos e obrigações já existentes e atuais e não apenas possíveis" (STJ, REsp.n.72.417/RJ). Sem a referência a uma concreta operação de importação, inclusive nas hipóteses em que o Fisco ainda não realizou qualquer autuação, a ação declaratória se desnatura em mero pedido de caráter normativo, função a qual o Poder Judiciário não pode avocar. Sob outro prisma: a apelante não logrou comprovar que necessita da intervenção da Jurisdição, justamente porque não deduziu qualquer dúvida objetiva acerca de uma determinada relação jurídica. Caso existisse uma operação de importação de mercadoria delineada nos autos, então se cogitaria da presença de interesse de agir. Disso se depreende que, a respeito do pedido de declaração de inexistência de

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relação jurídico-tributária que fundamente a exigência de ICMS incidente sobre operações externas de aquisição de bensdestinados ao patrimônio fixo, a apelante carece de interesse processual, porquanto o pleito não se refere a qualquer operação concreta.” (TJSP, 8ª Câmara de Direito Público, Apelação Cível 9061997-21.2006.826.0000, j. 06.04.2011, Rel. o Des. JOSÉ SANTANA).

No mais, a autora pretende a declaração de imunidade tributária, bem assim a anulação de crédito tributário referente a ICMS exigido no desembaraço aduaneiro quando da importação de matérias-primas (“rolos de couro”) necessárias à confecção de capas para Bíblias, descritas na Declaração de Importação DI nº 10/2085632-9, acostada a fls. 97.

(...)

A autora acostou à inaugural documentação suficiente a qualificá-la como entidade de utilidade pública (fls. 103/134), assim, por exemplo, Certidão do Ministério da Justiça mantendo tal título, datada de 7 de julho de 2010 (fls. 112). A leitura de seus estatutos igualmente reforça a convicção de se cuidar de entidade civil de assistência social, sem fins lucrativos, a embasar a imunidade à incidência de impostos sobre seu patrimônio, rendas ou serviços.

A autora comprova ser entidade civil assistencial sem fins lucrativos e é certo que a matéria-prima importada do exterior (rolos de couro) tem relação direta com suas finalidades essenciais. O artigo 4º de seu Estatuto dispõe sobre sua missão primordial, “in verbis”: “Art. 4º - A SSB, como associação definida no Art. 1º, tem como missão primordial promover, sem fins lucrativos, a difusão da Bíblia e sua mensagem como instrumento de transformação espiritual, de fortalecimento dos valores éticos e morais e de incentivo ao desenvolvimento humano, nos aspectos espiritual, educacional, cultural e social, em âmbito nacional.” (cópia de fls. 41). E o § 2º, alínea “b”, assim dispõe: “§ 2º - Para cumprir sua missão, a SBB se dedica a: (...) b) Desempenhar atividades editoriais e gráficas de impressão e encadernação de livros e de desenvolvimento de outros produtos relacionados à Bíblia por meio de instalações próprias ou de serviços terceirizados, exportando e importando livros e outros produtos relacionados à Bíblia, adquirindo papel e outros materiais para a sua impressão e produção no mercado interno ou externo, bem como prestando serviços gráficos e editoriais a terceiros, no Brasil e no exterior;” (fls. 42).

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Necessária às suas finalidades essenciais, a matéria-prima mencionada na documentação acostada à inaugural acaba por tornar-se parte integrante de seu patrimônio, não devendo realmente sofrer a incidência do ICMS quando do desembaraço aduaneiro, preenchendo os requisitos constitucionais e legais para tanto. A jurisprudência confere amplo respaldo a esse entendimento, em casos análogos:

(...)

“TRIBUTÁRIO. ICMS. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA. INSTITUIÇÃO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL. C.F., art. 150, VI, c. I. - Não há invocar, para o fim de ser restringida a aplicação da imunidade, critérios de classificação dos impostosadotados por normas infraconstitucionais, mesmo porque não é adequado distinguir entre bens e patrimônio, dado que este se constitui do conjunto daqueles. O que cumpre perquirir, portanto, é se o bem adquirido, no mercado interno ou externo, integra o patrimônio da entidade abrangida pela imunidade. II. - Precedentes do STF. III. - Agravo não provido.” (Agr. Regimental no Recurso Extraordinário n. 225.778-SP, 2ª Turma, j. 16.09.2003, Rel. o Min. CARLOS VELLOSO, DJU 10.10.2003, pág. 38).

No mesmo sentido:

Apelação Cível nº 280.056.5/7-00, Rel. o Des. REBELLO PINHO, j. 27.09.2006; Apelação Cível nº 322.974.5/0-00, Rel. o Des. TOLEDO SILVA, j. 20.12.2006; Apelação Cível nº 313.331.5/6-00, Rel. o Des. DANILO PANIZZA, j. 10.04.2007; Apelação Cível nº 994.09.373619-3 (952.068-5- 5), Rel. o Des. RICARDO DIP, j. 18.01.2010.” (Apelação nº 0045729-66.2010.8.26.0562 Rel. Desembargador Aroldo Viotti j. 12.03.2012).

Diante do exposto, de rigor a manutenção da R. Sentença.

Consideram-se pré-questionados, para fins de possibilitar a

interposição de recurso especial e de recurso extraordinário todos os dispositivos de lei

federal e as normas da Constituição Federal mencionadas pelas partes.

Diante do exposto, pelo meu voto nego provimento aos recursos.

RONALDO ANDRADE

RELATOR