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Sobre a revista.
Neste número inaugural da REVISTA DE INICIAÇÃO CIENTIFICA DA FCAP/UPE estão sendo publicados oito artigos originários dos projetos de iniciação científica premiados na 9ª e 10ª edição do Seminário de Iniciação Científica da FCAP.
Representam, assim, a produção de excelência em projetos de pesquisa de iniciação científica desenvolvidos na FCAP, resultado de
um processo de co-geração de ideias e imaginações advindas da integração do ensino, pesquisa e extensão, particularmente no que diz respeito ao envolvimento de professores (as) e orientadores (as).
Os artigos dos alunos resultam, portanto, dessa convergência interpessoal e interdisciplinar que vem se afirmando no ambiente
acadêmico da FCAP, enquanto exploração de dimensões múltiplas da experiência humana em ambientes administrativos e de gestão. Nessa 1ª edição, os trabalhos discorrem sobre: a importância da assessoria de imprensa para a construção da imagem organizacional; a questão do “poder” e da “competição” nas organizações; o empreendedorismo feminino na cidade do Recife; processos de
recrutamento e seleção nas empresas juniores brasileiras; a interação entre cliente e empresa de software; análise comparativa acerca da competitividade entre os portos de Suape, Salvador e Pecém, sob a ótica dos custos, do tempo e da segurança; a teoria da expectância nas empresas e, finalmente, a exploração crítica sobre saberes pedagógicos na visão dos professores da FCAP- UPE.
José Luiz Alves.
Coordenador do Núcleo de Pesquisa.
Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica,
vol. 01, jan. / jun. 2007 ISSN 0000-0000 - v. eletrônica
A CULTURA DA INOVAÇÃO Nádia Torreão Doutora Faculdade de Ciências da Administração de Pernambuco Universidade de Pernambuco
“Não existe nada mais difícil de conduzir, nem nada mais incerto e perigoso que
Iniciar uma nova ordem das coisas”. Maquiavel
1 INTRODUÇÃO É muito difícil afirmar que existe uma única cultura na empresa, já que o habitual é a diversidade
cultural, mas podemos falar de uma cultura dominante que prevaleça sobre as demais. Cada
organização tem sua identidade, sua cultura própria (Thevenet, 1986), resultante de diversos
fatores: valores, comportamentos, ambiente, etc.
O tema cultura é muito amplo e complexo, uma vez que permite diferentes definições e
diferentes pontos de vista. O conceito de cultura organizacional (corporativa ou empresarial)
surgiu com a Teoria da Contingência (Lawrence e Lorsch, 1973) e da tecnologia ( Thompson,
1976). A teoria da contingência enfatiza que todas as coisas são relativas, devendo as
organizações desenvolver estratégias e estruturas apropriadas a estes fatores externos.
Outro aspecto a ser levado em conta se refere a gestão da cultura corporativa. Os expertos
indicam a cultura como chave para a execução de uma mudança estratégica (Gasalla, 1995;
Lorsch, 1986; Sathe, 1985, Schein, 1985; Schrivastava, 1984), porque a estratégia vem definida
pela conjunção dos pontos fortes e débeis da cultura e de suas competências (situação interna),
mais o conjunto de oportunidades e ameaças que provêm do entorno (situação externa).
Portanto, podemos dizer que o êxito das estratégias vem condicionado pelo grau de congruência
com a cultura organizacional.
Dentro do domínio de análise e gestão da mudança cultural, os especialistas coincidem quanto
ao momento para determinar a implantação de mudanças culturais:
• Crises externas (Mintzberg, 1978; Tichy, 1982)
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• Lutas de poder na sucessão interna (Bertero, 1989)
• Socialização de novos membros da organização (Van Haanem, 1978).
O ótimo conhecimento da cultura organizacional e de suas características é fundamental para a
correta gestão das organizações complexas. Estas estão constituídas pelo que podemos chamar
a luz, isto é, os aspectos visíveis, como as tarefas, a hierarquia, a tecnologia, a produtividade,
etc. e pelas sombras, ou seja, os sentimentos das pessoas, suas atitudes, emoções,
mecanismos de defesa, etc. O equilíbrio da dinâmica organizacional exige o estudo de ambos os
aspectos (o claro e o escuro) da empresa.
Hofstede (1986) analisa a cultura desde uma perspectiva holística, enfocando os pontos fortes e
fracos das organizações vistas como uma instituição humana em seu conjunto. Nestes tempos
de profundas mudanças, da chamada idade do paradoxo (Handy, 1994), de novos paradigmas,
de cenários substancialmente modificados, as empresas devem adaptar-se a este contexto
através de um processo de mudança constante.
A mudança não é um fenômeno que se produza em um momento determinado e de forma
isolada, mas sim um processo em que a organização perde seu equilíbrio estático. Por isso é
necessário realizar um Modelo de Análise e Gestão da Mudança que leve em conta uma série
de condicionantes, entre os quais se destaca a resistência à mudança, tanto no nível individual
ou grupal como organizacional. Devem ser analisadas todas as implicações que a mudança
cultural tem para o desenvolvimento interno das organizações, assim como as ações para
enfrentar os novos cenários globais. Para isso partimos do conceito de cultura.
2 DEFINIÇÕES DE CULTURA
São inúmeros os conceitos de cultura que se pode encontrar na literatura especializada.
Em um sentido literal, se identifica a palavra cultura com o cultivo da terra; recorrendo ao
dicionário encontramos as seguintes definições:
• Ato, modo ou efeito de cultivar;
• Conjunto de características humanas que não são inatas e que se criam e se
preservam ou aprimoram através da comunicação e cooperação entre indivíduos
em sociedade;
• Cultivo em geral, especialmente das faculdades humanas: cultura física, estética,
moral, intelectual;
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• Conjunto de modos de vida e costumes, conhecimentos, guia de desenvolvimento
artístico, científico, industrial, em uma época ou grupo social, etc.
• Conjunto complexo de códigos e padrões que regulam a ação humana individual
e coletiva, tal como se desenvolvem em uma sociedade, ou grupo específico, e
que se manifestam em praticamente todos os aspectos da vida;
• Categoria dialética de análise do processo pelo qual o homem, por meio de sua
atividade concreta (espiritual e material), ao mesmo tempo em que modifica a
natureza, cria a si mesmo como sujeito social da história.
Do ponto de vista antropológico, a cultura faz referência ao estilo de vida total de um
grupo de pessoas, as quais sentem, atuam e pensam sob determinadas pautas ou padrões.
Tylor (1973), também desde a antropologia, define a cultura em seu sentido etnográfico
amplo, como um conjunto complexo que inclui conhecimentos, crenças, arte, moral, leis,
costumes e todas as outras capacidades e hábitos adquiridos pelo homem como membro da
sociedade.
Outros autores conceituam a cultura como a complexa mescla de supostos, condutas,
relatos, metas, metáforas e demais idéias que se encaixam umas com as outras e definem o que
significa ser membro de uma sociedade concreta (Stoner, Freeman e Gilbert, 1996).
Para Pittigrew (1979) cultura é o conjunto de interpretações ou significados
compartilhados por um grupo de pessoas, publicamente aceitos e coletivamente operados, em
um determinado momento. Malinowski (1948) considera cultura um conjunto integral constituído
pelos utensílios e bens dos consumidores, pelo corpo de normas que rege os diversos grupos
sociais, pelas idéias e artesanatos, crenças e costumes.
Segundo Gasalla (1997), cultura organizacional é o conjunto de crenças que se traduzem
em valores, símbolos, rituais e hábitos compartilhados pelos integrantes da organização, os
quais determinam uma identidade específica e diferencial tanto de cara aos próprios membros,
como em relação ao meio-ambiente no qual a organização está inserida.
Conceituamos cultura, de uma maneira simples e de fácil entendimento, como o
comportamento cotidiano das pessoas no entorno em que vivem e atuam. Assim, cultura
organizacional é o comportamento cotidiano das pessoas em seu ambiente de trabalho.
Todas essas definições assinalam a cultura como uma necessidade peremptória do ser
humano em sua faceta social, isto é, como algo subjacente de toda forma de organização social.
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Por outro lado, a cultura nas organizações é o componente psicossocial, coesivo, identificador e
diferenciador das mesmas, além de influir no comportamento organizacional como um poderoso
fator de contingência. Consideramos que a definição mais completa e exata de cultura
organizacional é o proposto por Schein (1988):
Um modelo de presunções básicas, descobertas, criadas ou desenvolvidas por
um grupo determinado, ao ir aprendendo a resolver seus problemas de adaptação
externa e integração interna, que tenham exercido a suficiente influência como
para ser consideradas válidas e, em conseqüência, ser ensinadas aos novos
membros como a maneira correta de perceber, pensar e sentir para enfrentar-se
a ditos problemas.
A cultura somente será um conceito adequado na medida em que permita compreender o
funcionamento das organizações e resolver seus problemas. Portanto, se identificamos as
chaves culturais de uma empresa, temos condições de descobrir a base das suas práticas de
direção, sua coerência interna e, sobretudo, os eventuais paradoxos e oportunidades de
mudança.
3 NÍVEIS DA CULTURA
Para uma mais fácil compreensão do que se entende por cultura, Schein (1988) diferencia três
níveis de cultura:
• Artefatos Processos e estruturas visíveis da organização
(difícil de decifrar)
• Valores aceitos Estratégias, metas, filosofias
(justificações adotadas)
• Supostos básicos fundamentais Crenças, percepções, pensamentos e
Sentimentos inconscientes que se considera
Corretos e aceitados.
O nível 1 – dos artefatos – é o nível mais visível; representa os comportamentos
das pessoas na empresa e aqueles elementos que podem estar mais influenciados pelo entorno
(tecnologia, estrutura, etc).
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O nível 2 – valores adotados – reflete o que deveria ser na organização. Permite a
integração das pessoas e sua identificação com a empresa, constituindo-se aspectos chave que
afetam aos perfis de personalidade, aos costumes, ao ritual e à comunicação.
O nível 3 – supostos básicos fundamentais – é o mais profundo, é a essência da cultura.
Nos referimos à natureza da realidade, do espaço e do tempo, à natureza do comportamento
humano e das relações humanas.
Nós entendemos que aos níveis anteriores de cultura deve se acrescentar um quarto
nível: a Dimensão do Poder como um fator que também influencia tanto às organizações quanto
os indivíduos. Na dimensão do poder estão incluídas as relações interpessoais que legitimam a
ordem vigente ou ocultam as contradições e as relações de dominação existentes na
organização (Pagès, 1987).
4 IDENTIFICAÇÃO COM A CULTURA
As pessoas se identificam com a sua cultura de diferentes maneiras:
• Forma natural, quando a personalidade e ideologia dos membros coincidem com os da
empresa. Exemplo, as empresas que são constituídas ao mesmo tempo em que
recrutam seus membros: eles criam sua cultura.
• Forma seletiva, quando a empresa recruta e seleciona seus membros de acordo com a
identificação da empresa com a cultura.
• Forma calculada, quando as pessoas tratam de alcançar suas próprias metas e se valem
da cultura reinante para lográ-las.
5 A MUDANÇA CULTURAL
Desde finais dos anos 80 se vem falando da era da mudança, contudo, a mudança em si
não é algo novo, mas sim o ritmo, a compulsão, a múltipla natureza e a generalização da
mesma. Tanto é assim que o tempo disponível para a solução de problemas diminui.
Quanto a mudança em si, não se trata de seguir sua inércia ou ritmo, mas de
ANTECIPAR-SE a mesma. Temos que deixar de ser reativos a mudança para ser pró-ativos, o
que exige uma flexibilidade absoluta, tanto para a organização como para seus membros.
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A sobrevivência da empresa implica em que a mesma seja capaz de impulsionar suas
atividades, adaptando-se rápida e constantemente às mudanças externas e internas, com tal
flexibilidade que não se produzam crises organizacionais (mudança como oportunidade de
aprendizagem e desenvolvimento). Caso contrário, nos encontraríamos em uma mudança
obrigada e não antecipada.
Para enfrentar as mudanças é necessário ter definidas claramente a visão, missão e
estratégias, assim como determinar as pessoas como centro de atenção.Existem certos fatores
que determinam a predisposição à mudança de uma organização:
• A cultura como potencializadora da INOVAÇÃO e da aceitação da incerteza,
assim como impulsionadora de um alto dinamismo e integração interna propiciará
um clima aberto e de apoio.
• Um ESTILO DE DIREÇÃO PARTICIPATIVA, orientada às pessoas:
- favorece a satisfação pessoal no trabalho
- ajuda a resolução de conflitos
- facilita o trabalho em equipe
- fomenta a iniciativa individual
• As estratégias têm objetivos de LONGO PRAZO visando potencializar:
- o crescimento
- a melhoria da qualidade
- a inovação
- a liderança.
• Uma estrutura organizacional FLEXÍVEL, cujas chaves são:
- A polivalência e o profissionalismo das pessoas
- A formação contínua das pessoas
- Uma ampla comunicação interna (formal e informal).
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• A atividade que desenvolve a empresa promove a AUTONOMIA e o
desenvolvimento da CRIATIVIDADE e da INTERAÇÃO.
Uma organização necessita desenhar um sistema cultural que lhe permita
desenvolver-se com certo equilíbrio. Esta cultura, uma vez implantada, pode converter-se em
tradição. De uma forma, se muda para, no fundo, permanecer como organização.
Segundo Schein (1988), um conflito de mudança aparece quando certos grupos
concebem a necessidade de promover a mudança de alguns aspectos culturais, enquanto
outros não. Aparecem as contraculturas e se perde a integridade da cultura como
organização. Um exemplo desse conflito é o da sucessão em empresas familiares quando
há oposição ou divergências entre herdeiros que atuam na organização.
Em um sentido positivo, estes grupos podem aportar flexibilidade à empresa, em uma
situação de turbulência do entorno. Mas, no sentido negativo, a diferenciação pode dar lugar
a dificuldades de comunicação porque, funcionalmente, divide interesses e formas de
atuação, tanto no nível grupal como individual. Isto nos diz que existe uma ambivalência de
significados, pelo que para introduzir uma efetiva filosofia comum de propósitos, esta não
será imposta desde o topo, mas será desenvolvida compreendendo as necessidades e
características das distintas culturas.
6 A GESTÃO DA MUDANÇA
A organização constitui um equilíbrio dinâmico de forças, umas que apóiam e outras que
dificultam qualquer ação. A resistência à mudança é um dos comportamentos mais
generalizados da natureza humana, tanto no nível individual como grupal, assim como também
das dificuldades técnicas. Podemos destacar três tipos de resistência:
• Psicológica ou emocional, relacionada com as atitudes e sentimentos individuais
referentes à mudança;
• Sociológica, relacionada com os interesses e valores do grupo, a pertença a um
grupo condiciona a resposta à mudança. Neste caso, é importante identificar os
líderes naturais que estão influenciando o grupo;
• Operativa ou Técnica, que surge do tempo, do esforço e dos recursos necessários
para adaptar-se à nova situação.
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O psicólogo social Claes Janssen sugere que as reações das pessoas ante a mudança
são como se elas estivessem movendo-se dentro de um apartamento de quatro quartos, onde só
se pode passar de um cômodo a outro, de um em um, isto é, que o aperfeiçoamento ou a
renovação não são possíveis sem mudanças. O “apartamento de quatro quartos” constitui uma
experiência dinâmica de mudança, conceito que tem influenciado as práticas organizacionais de
mudança em todo o mundo. Uma idéia simples, fácil de entender e conectada com o dia a dia
das pessoas.
Parte-se de uma situação de complacência (ou contentamento) onde se percebe
estabilidade e equilíbrio. Quando se dá a mudança – produzida ou provocada – ela é
interpretada como uma ameaça. Por isso, a primeira reação é ignorar o que está ocorrendo
(negação). Uma vez reconhecidos os medos, se passa ao cômodo da confusão. As pessoas se
sentem inseguras, a chave para sair deste quarto é aceitar que a confusão é o único modo de
chegar à renovação, que é algo positivo a longo prazo, razão pela qual se tem que desligar-se
do passado. Alcançada essa fase, a organização abandona o passado e que estará preparada
para enfrentar o futuro. Uma vez superado o quarto da renovação – onde se implantam as
mudanças de forma positiva – se volta ao cômodo do contentamento. (Janssen apud Weisbord
et al. 1996 e Weisbord e Janoff, 2000).
Uma proposta metodológica do mecanismo de mudança de cultura foi elaborada por
Lewin e aperfeiçoada posteriormente por Schein. Essa metodologia se compõe de três passos:
1. Descongelamento
Fazer que a necessidade de mudança seja tão evidente que a pessoa, o grupo ou a
organização possam ver e aceitar sem problemas que a mudança deve ser implementada.
Supõe a supressão de idéias e velhos procedimentos para que os novos sejam
apreendidos. Destacam-se diversas ações:
- identificar a natureza da mudança;
- visualizar os aspectos da organização nos quais vai influenciar;
- considerar a influência da cultura vigente: valores de conservadorismo,
fidelidade, hierarquia, autoridade, etc. muito comuns nas organizações
tradicionais, constituem um freio a nível global da organização; a própria
empresa projeta seu medo e desconfiança à mudança através dos
impulsores da mudança;
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- exigir a adaptação e a aprendizagem, continuando como até o momento;
- evitar o possível temor à mudança organizacional que prejudique a
posição atual: com freqüência, este é o posicionamento individual
predominante nas organizações, ao prevalecer os interesses individuais
sobre os organizacionais, sobre a segurança e permanência, considerados
obsoletos para as empresas inovadoras;
- procurar um clima laboral proclive à mudança: terá que cuidar o alcance
da mudança e a forma de solicitar a co-participação que se pode levar a
cabo na empresa;
- localizar os líderes de opinião: contar com os agentes possuidores de uma
influência clara nos diferentes níveis da empresa. são pessoas com
influência, conseguida à base de seus conhecimentos, experiência,
carisma, informação, dotes de oratória, afiliação política, etc.
- comunicar a natureza e as necessidades da mudança: comunicar com
clareza as razões que exigem a mudança, com o fim de ir comprometendo
a todos, aumentando a consciência corporativa – se lhes vai inculcando os
sacrifícios e as vantagens que levarão consigo.
2. Mudança
Encontrar e adotar atitudes, valores e condutas novas, com a ajuda de um agente de
mudança específico que dirigirá as pessoas, os grupos ou a organização ao longo do processo;
para que se identifiquem com os valores, atitudes e condutas do experto de mudança e os
interiorizem quando percebam sua eficácia para o desempenho. É a implantação da mudança. É
a ação da mudança. Há que se considerar as seguintes etapas e atividades:
- Traçar um projeto de mudança: de forma que seja claro para todos os
receptores;
- Comunicar e sensibilizar: tentar eliminar tensões e angústias, divulgando e
explicando o projeto. Necessita-se “vender o tempo”, isto é, concretizar os
benefícios e vantagens com a mudança;
- Propor desafios: há que romper com a rotina ou a burocracia por meio de
desafios e proposições atrativas que incitem a moverem-se;
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- Formar e treinar: frente a possíveis resistências, a formação e o
treinamento favorecem a disposição de abertura à mudança e possibilitam
a colocação em marcha do projeto;
- Dar feedback: há que ir recebendo informação da mudança, de como está
sendo recebida, assimilada, assumida e aplicada.
3. Congelamento
Converter em norma um padrão de conduta novo, mediante mecanismos de reforço e
apoio. Nesta fase integra-se na atividade diária o aprendido e fixam-se medidas de apoio para
mantê-lo. Fatores a levar em conta:
- Destacar a colaboração dos participantes: fase de assentamento da
mudança; dar-se-á a conhecer as vantagens e benefícios que se alcançou.
O inconformismo dos seres humanos é o que faz com que avancemos e
melhoremos;
- Fazer o seguimento da implantação da mudança: controle e seguimento
de forma contínua e com possibilidade de flexibilizar os aspectos que não
tenham conseguido o ajuste previsto;
- Celebrar os êxitos alcançados: celebrá-lo conjuntamente;
- Criar e fomentar a atitude de curiosidade: na busca de avances e
desenvolvimentos. O animal curioso sempre pensa que sabe pouco e que
há muitas coisas que ainda não conhece e isso o faz estar sempre alerta e
disposto a colocar energia nessa busca.
Esse processo pode ser mais bem compreendido se, de forma cronológica,
acrescentamos outros passos, como os propostos pelos autores Claver, Llopis e Gascó (Revista
Capital Humano, Espanha, março de 1995) em seu denominado processo de modificação
consciente da cultura empresarial:
- diagnóstico da cultura
- argumento de variação
- definição dos valores desejados
- conscientização dos dirigentes
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- comunicação aos empregados
- reflexo na formação
- mudança de símbolos
- revisão periódica de valores.
O processo será utilizado quando se deseje implantar uma mudança planejada,
preparando-se a organização para que esta se adapte às mudanças em suas metas e direção.
Convém destacar que as mudanças que se podem fazer na organização se logram
mudando sua estrutura, sua tecnologia, suas pessoas ou uma combinação de todos esses
elementos. O mais complexo será a mudança nas pessoas.
7 PROCESSO BÁSICO DE DESENHO CULTURAL
Do ponto de vista empírico, define- se três fases para o processo de mudança cultural:
1. Determinar o posicionamento cultural que abarca a análise e o diagnóstico da cultura
atual de uma empresa. Essa fase se leva a cabo na empresa. Com a realização de
entrevistas, observação de instalações, formas de trabalho, etc. Nesse diagnóstico
recolhemos os seguintes pontos para definir a cultura corporativa:
- Os sintomas culturais da organização
- Os elementos chave do sistema de direção e o perfil dos seus dirigentes
- A orientação estratégica da empresa.
2. Formular a cultura desejável para a organização, compatibilizando os valores da
sociedade e das pessoas e estratégias da empresa.
3. Realizar uma análise do desvio existente entre a cultura atual e a que se pretende
alcançar.
8 MODELOS DE CULTURA
Depois de determinado o processo de desenho e a possível mudança, se apresenta-se três
possíveis modelos de cultura:
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• Modelo de Cultura Forte: este modelo tenta conseguir um espírito de empresa
distintivo e concreto, que seja percebido de forma unitária por todos os
membros da empresa. Essa cultura é característica de empresas sólidas, com
estilo próprio, nas quais foram definidos valores essenciais de sua cultura como
uma clara orientação ao cliente ou de desenvolvimento. Ela costuma ser
característica em modelos hierarquizados, podendo ser um obstáculo sua
adaptação a estruturas mais flexíveis.
• Modelo de Cultura alinhada com a Estratégia: quanto maior o grau de
congruência entre cultura e estratégia, maior êxito terá a organização.
• Modelo de Cultura Flexível: destacam-se aqueles valores e pautas de
comportamento que ajudam a empresa e a sua cultura a enfrentar uma
contínua mudança e adaptação, facilitando a exploração de novas
oportunidades. Alguns valores desta cultura são: a adhocracia, assunção de
riscos, pró-atividade, criatividade e a inovação. Uma cultura flexível e inovadora
tem um maior desenvolvimento nas organizações atuais, especialmente de cara
ao futuro, devido ao entorno em que nos movemos, em contínua mudança, e a
uma maior exigência por parte de todos os grupos de pessoas vinculadas ou
relacionadas com a organização: trabalhadores, clientes, provedores,
inversores, etc. O próprio da cultura corporativa é introduzir, de forma
permanente, aqueles valores ou comportamentos que se derivam de mudanças
estruturais e estratégicas, constatadas na economia. Por isso, quando estas
alcançam uma dimensão que questiona a realidade socioeconômica, é
necessário iniciar a gestão da mudança cultural e adotar novos padrões de
conduta que configurem o que denominamos cultura inovadora.
9 PROCESSO DE MUDANÇA CULTURAL
Conforme propõe Schein, (1988) o processo de mudança cultural pode se dar de
diversas maneiras:
• Mudança como um processo de evolução geral: como um elemento inevitável
na vida da organização;
• Mudança como um processo de adaptação, aprendizagem ou processo de
evolução específico: se a mudança se produz como um processo de evolução
científica, a prioridade é dada pelos agentes internos. Mas se a mudança se
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produz como um processo de adaptação ao entorno ou como um processo de
aprendizagem, os agentes externos cobram protagonismo e adaptação ao
entorno se entende como necessidade e como oportunidade de sobrevivência;
• Mudança como processo terapêutico: a mudança vem de dentro da
organização, mas como resultado da interação entre agentes externos e
internos;
• Mudança como um processo revolucionário: o poder é uma variável chave e é
inevitável quando o poder se traduz em conflitos e lutas entre diferentes grupos.
Neste caso, os fatores culturais passam a um segundo plano, já que o poder se
alia com o controle dos recursos, a habilidade para premiar ou castigar e a
possessão de informação importante;
• Mudança como um processo controlado pela direção: destaca-se o papel do
líder.
10 MÉTODOS PARA LEVAR A CABO UM PROCESSO DE MUDANÇA
Sparrow-Hiltrop, (1994) propõe alguns métodos para desenvolver um processo de mudança
através de:
• Pessoas
Mudança cultural por meio de mudanças nos processos de seleção, plano de carreiras,
rotação interna, rotação externa e recolocação. Os membros antigos não a verão como uma
mudança cultural, mas como uma nova política de direção e desenvolvimento de pessoas.
• Estrutura
As mudanças estruturais podem influir nos processos; podemos assinalar a melhora
contínua da organização ou uma reengenharia de processos, como exemplos. Algumas
mudanças estruturais que influem sobre a cultura podem ser:
a) Processos de alianças, fusões, absorções;
b) Processos de descentralização;
c) Redimensionamento;
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d) Mudança de orientação da organização.
• Sistemas
Pode-se atuar sobre:
- Sistemas de comunicação interna;
- Sistemas de controle;
- Sistemas de direção, como a direção por objetivos;
- Sistemas de remuneração e formação;
- Sistemas de mudanças em qualidade (qualidade total, assegurar a
qualidade...);
- Sistemas de melhora comparada (benchmarketing).
11 REQUISITOS MÍNIMOS NO PROCESSO DE MUDANÇA CULTURAL (em toda a organização)
Para se obter êxito no processo de mudança cultural, alguns fatores devem sr levados em
consideração:
• Existência de uma razão, entendida e assumida por todos os que propõem a
necessidade de mudança;
• Uma concessão de credibilidade, fomentada por um incremento da transparência e da
claridade nas mensagens;
• Liderança proveniente da alta direção, evitando incongruências entre o manifestado e o
realizado;
• Natureza voluntária do processo. As mudanças por imposição provocam resistências no
seio da organização, pois as pessoas as visualizam como ameaças;
• Flexibilidade, graduação, pragmatismo e continuísmo na sua implantação;
• Co-participação ativa de agentes internos dentro da organização (líderes de opinião,
posições chave, etc.);
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• Fixar um tempo mínimo do processo, assim como um tempo máximo, passado o qual o
processo de mudança perde sua efetividade;
• Ir avançando simultaneamente nos novos sistemas sociotécnicos;
• Conseguir pactos socioculturais que relacionam os diferentes mapas culturais que
possam existir na organização;
• Implantar um sistema de reconhecimento, com incentivos por aceitar as mudanças que
se vão produzindo;
• Programar e coordenar o trabalho conjunto e integrado de uma equipe de consultores
externos e outra interna;
• Determinar resultados parciais que se vão conseguindo, periodicamente, durante todo o
processo e que reforçam o mesmo;
• Impulsionar a inovação.
12 PARA ONDE SE DIRIGEM OS ESTUDOS SOBRE CULTURA?
Os estudos sobre cultura não se esgotam porque a cultura evoluiu e vai se transformando ao
longo do tempo, necessitando, constantemente, ser ser revisada e novamente analisada.
As pesquisas sobre cultura organizacional seguem diferentes direções. Morcillo (1997)
destaca três delas:
a) Inspirada no modelo de gestão japonês: baseada nos aspectos de
cooperação, trabalho em equipe, consenso entre os membros
pertencentes à organização (direção empresarial);
b) A cultura considerada como fator de competitividade, chave responsável
pelo êxito empresarial;
c) A cultura analisada do ponto de vista das propriedades diferenciais dos
hemisférios cerebrais do ser humano (Roger Sperry), que atribui ao
hemisfério esquerdo os processos de organização do raciocínio lógico,
racional, analítico e do uso da palavra, enquanto que o hemisfério direito é
intuitivo, imaginativo e criativo. A linguagem deste último é de imagens, do
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visual, auditivo, emocional e sensitivo. Deste último ponto de vista se
analisa o que se entende por cultura da inovação.
Com relação à pesquisa e análise da cultura organizacional se destacam duas grandes
correntes:
- A cultura sob a ótica da antropologia cognitiva, como um sistema de
conhecimentos compartidos, classificando-se em: produção (funcional); bem estar social
(política) e desenvolvimento pessoal (indivíduos). Dessa
perspectiva se entende a cultura como uma variável interna da organização, algo que ela
possui.
- A cultura, sob a ótica da antropologia simbólica, é definida como um sistema
de símbolos que necessitam ser interpretados. Considera a organização como um
sistema sociocultural único. A organização pode ser vista como um mecanismo adaptável
ao entorno, produzindo bens e serviços assim como variáveis culturais (rituais, lendas,
cerimônias, etc.). Nestas condições se entende a cultura como uma variável de
superestrutura e sua gestão muito difícil e imprevisível (Da Matta, 1981; Freitas, 1991;
Alves, 1997). Outros modelos, mesmo no campo da antropologia, já foram desenvolvidos
para o estudo e análise da cultura, seja na macro sociedade, seja nas micro sociedades
que são as organizações.
Os expertos neste tema propõem diferentes modelos para a análise e compreensão do
que é Cultura Organizacional. Um possível modelo indica que quando se quer modificar a cultura
existente em uma organização, ou simplesmente, se deseja revisa-la, será necessário primeiro
analisar os seguintes pontos para uma possível intervenção futura:
- visão e valores de referência
- valores e crenças empresariais
- valores relacionados com o quadro de pessoal
- entorno empresarial
- processo de tomada de decisões
- sistema de gestão
- sistema de comunicação.
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Acrescentamos a estes pontos o poder, o sistema de gênero e a organização do trabalho
como relevantes quando se trata de analisar a cultura e desenvolver ações e estratégias para
modificá-la.
Kotler e Heskett (apud Stoner, 1996) estabelecem diferenças entre culturas adaptáveis e
não adaptáveis; em outras palavras, aquelas que se podem mudar e aquelas que são mais
difíceis de faze-lo. Eles afirmam que a cultura tem uma profunda influência no desempenho das
organizações e que a liderança, desde a direção, constitui um elemento crítico e fundamental
para o êxito de uma mudança cultural.
Se nós partimos da complexidade e da dificuldade de definir a cultura de uma
organização, teremos, todavia, mais problemas para modificá-la. Entretanto, hoje é indiscutível
que no entorno no qual vivemos as empresas necessitam adaptar-se aos novos cenários
globais, ao entorno externo e interno, a uma mudança cultural e, ao nos referirmos a mudança
cultural, esta deve ser orientada para uma Cultura de Inovação.
13 O QUE ENTENDEMOS POR CULTURA DE INOVAÇÃO?
Para compreendermos em que consiste a Cultura de Inovação recorremos a Morcillo (1997) que
assim a define:
“Uma forma de pensar e atuar que gera, desenvolve e estabelecem valores e
atitudes na empresa, propensos a suscitar, assumir e impulsionar idéias e
mudanças que suponham melhoras no funcionamento e eficiência da mesma,
ainda que isso implique em uma ruptura com o convencional ou tradicional”.
Para uma melhor compreensão do que vem a ser a Cultura da Inovação é necessário
definir o que é inovação. Vergara (1988) afirma que “inovação tecnológica/técnica é o processo
consistente em casa por primeira vez, em um país ou âmbito espacial preciso, uma nova
oportunidade tecnológica com uma necessidade ou com uma demanda solvente. A origem de
uma inovação tecnológica pode ser uma invenção ou o produto mais imediato de uma
transferência de tecnologia”.
Vergara diz que quando se menciona a mudança técnica se faz referência ao conjunto de
temas que compreendem a invenção, a inovação, a transferência e a difusão de tecnologias e de
técnicas, assim como seus efeitos e impactos. Simplesmente INOVAR é realizar o que ninguém
antes imaginou.
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Uma classificação proposta para as inovações é a que faz distinção entre:
• Inovação técnica ou não técnica;
• Inovação de produto ou de processo;
• Inovação radical ou gradual (incluídas as diversas formas de aprendizagem)
• Inovação incorporada ou não incorporada.
Organização inovadora: fatores de êxito Segundo Ana Maria Barañano (1994) em sua tese de Doutorado, pela Universidad
Autônoma de Madrid, afirma que Organização Inovadora se define como:
Aquela que de maneira contínua mantém, como parte de sua estratégia global, o
lançamento de inovações, mediante a realização dos denominados desenhos
robustos, na terminologia de Rothwell (1988), os quais, sendo inovadores radicais,
dão lugar a uma cascata de inovações menores; e também mediante o
lançamento de inovações graduais baseadas nas inovações radicais realizadas
por outras entidades.
Partindo desse conceito temos que destacar os fatores determinantes da inovação, os
quais devem ser levados em conta quando se deseja inovar. São eles:
a) Os elementos que provocam a aparição de inovações e, em especial, o papel da
oferta e da demanda;
b) A direção, no sentido da seleção de problemas que aparecem como relevantes e que
absorvem recursos e vieses nos tipos de soluções que se adotam;
c) Os fatores que determinam o êxito ou o fracasso da atividade inovadora;
d) Os fatores dos quais dependem o nível, o ritmo e a intensidade da inovação.
Uma das pesquisas conduzidas por Freeman (1974) – o projeto SAPHO – determina as
características relevantes das empresas que obtiveram êxito em suas inovações, destacando
dez pontos:
i. Intensificação de Pesquisa + Desenvolvimento profissional dentro da
empresa;
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ii. Realização de pesquisa básica ou estreita conexão com quem realiza tal
pesquisa;
iii. Uso de patentes para assegurar-se de proteção e poder de negociar com
os competidores;
iv. Tamanho suficientemente grande para financiar gastos em P + D durante
longos períodos;
v. Prazos de decisão mais curtos que os dos competidores;
vi. Inclinação a assumir fortes riscos;
vii. Rápida e imaginativa identificação de um mercado potencial;
viii. Cuidadosa atenção ao mercado potencial e esforços consideráveis para
captar, educar e ajudar aos usuários;
ix. Esforço empresarial com suficiente eficácia para coordenar o P + D, a
produção e a comercialização;
x. Boas comunicações com o mundo exterior, assim como com os clientes.
Freeman apresenta uma classificação das estratégias inovadoras nas empresas:
estratégia ofensiva, estratégia defensiva, estratégia imitativa e dependente e estratégia
tradicional e oportunista. É relevante destacar que Freeman define o êxito inovador como uma
inovação que alcança uma penetração interessante no mercado ou que proporciona benefícios.
Rothwell (1987) também descreveu os fatores que fundamentalmente influem para o êxito de
uma inovação, classificando-os em dois grandes grupos, segundo sua natureza estratégica ou
tática:
• Fatores estratégicos ou pré-condicionantes para que uma organização inovadora
tenha êxito:
- Dedicação e visível apoio da alta direção da empresa à inovação;
- Definição de uma estratégia global de longo prazo em que a inovação
tenha um papel chave;
- Definição e realização de projetos de P + D de longo prazo, baseados em
futuras penetrações em novos mercados e no crescimento da empresa;
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- Disponibilidade de uma estrutura organizacional caracterizada por sua
flexibilidade e resposta à mudança;
- Aceitação do risco por parte da alta direção;
- Criação de uma cultura inovadora.
• Fatores táticos determinantes do êxito inovador:
- Disposição de boas comunicações internas e externas;
- Consideração da inovação como um objetivo de toda a empresa e não
somente de uma questão de P + D;
- Utilização de técnicas de gestão e planificação;
- Eficiência no desenvolvimento de novos produtos, realizando uma
produção de alta qualidade;
- Manutenção de uma forte orientação ao mercado;
- Possessão de um quadro de pessoal qualificado.
Morcillo (1997) cita outros traços característicos de empresas que se distinguiram por seu
elevado nível de inovação, os quais os consideramos fundamentais para a consecução de uma
cultura inovadora:
- Fomento de uma mentalidade aberta;
- Exigência de crenças, confiança e compromissos;
- Inovação impulsionada através dos líderes;
- Vigilância da conduta dos competidores;
- Compreensão da evolução do entorno e do negócio da empresa.
Ainda com relação aos fatores e valores comuns nas organizações com êxito, Peters e
Waterman (1982), descrevendo suas culturas, afirmam que:
- Em primeira instância, as organizações, com êxito, têm valores que
promovem uma margem para a ação e como característica cultural
possuem autonomia e espírito empresarial;
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- O segundo conjunto de valores provém da natureza na missão da
organização; a empresa deve aderir ao que faz melhor e manter o controle
sobre suas principais atividades;
- O terceiro conjunto de valores se refere a como manejar a organização;
uma companhia deve estabelecer um desenho organizacional que motive
os empregados para que façam o melhor, onde haja respeito pelo
indivíduo e uma atmosfera ideal de comportamento produtivo.
Hill e Jones (1996) consideram estes três grupos de valores como a essência da cultura
organizacional, mas não como suficientes para assegurar o êxito empresarial, posto que os
valores devem mudar para ajustar-se ao entorno onde opera a organização.
Voltando aos princípios teóricos defendidos por Morcillo (1997), este apresenta três
classes de atitudes básicas necessárias para a implantação de uma cultura de inovação nas
organizações:
• A direção da empresa assume riscos;
• A participação de todos os membros da organização;
• O incentivo à criatividade.
Acrescentamos uma quarta atitude, como básica também, que é a flexibilidade da
estrutura organizacional, embora não seja fácil para as organizações adotarem a flexibilidade de
suas estruturas. Aquelas que possuem poucos níveis hierárquicos o conseguem mais
facilmente.
Morcillo (1997), ao explicar as atitudes básicas acima citadas, afirma que o risco é
inerente à inovação e incumbe à direção da empresa assumir o risco, após a tomada a decisão
de inovar. A direção se envolverá e apoiará o projeto de tal forma que este último deixará de ser
o projeto de uma pessoa ou equipe para converter-se no projeto da organização.
O esforço integrado de todos os membros da organização constitui um fator relevante
para um bom resultado, especialmente quando derivam do trabalho de pessoas integradas em
equipes multidisciplinares. O incentivo à criatividade favorece o surgimento de novas idéias,
sendo necessário que a empresa tenha um clima de trabalho aberto, baseado na confiança, nas
boas interrelações pessoais, na capacidade de administrar conflitos, na capacidade de
comunicação, etc.
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Aludindo ao papel da direção na implantação de uma cultura da inovação, cabe destacar
outro elemento indissociável da cultura que é a legitimidade do impulsor da nova cultura ligada
ao reconhecimento de um poder, de uma liderança.
A cultura organizacional é determinada por uma liderança estratégica que proporciona o
fundador e os altos dirigentes da empresa. O fundador imprime seus valores e estilo
administrativo à organização. A medida que o tempo passa, o estilo de liderança estabelecido
pelo fundador é transmitido aos dirigentes e, à medida que a empresa cresce, atrairá, em geral,
novos dirigentes e empregados que compartilham os mesmos valores. Os valores e crenças
compartilhadas favorecem o comportamento das pessoas com as metas organizacionais (Hill,
1996).
14 O LÍDER COMO IMPULSOR DA MUDANÇA
O papel da liderança organizacional é importante uma vez que induz a visão, estabelece
a missão, formula a estratégia, define a tecnologia, desenha a estrutura, orienta o estilo
dirigente, modela comportamentos culturais e personifica as premissas de valor. A figura
do líder impulsor se converte em agente de mudança, dependendo dele, em grande parte, o
desenvolvimento e a aprendizagem, tanto das pessoas como da organização, assim como o
sistema global.
Entende-se a liderança como a capacidade de influenciar pessoas, de extrair de cada
colaborador o melhor de si, abrindo o caminho de sua independência e desenvolvimento, assim
como de sua inspiração e colaboração em um projeto comum. Partindo das idéias de Mintzberg,
Bueno (1996) destaca quatro classes de influência:
- De autoridade, personalizada em função das normas;
- Ideológica, relacionada com a liderança;
- Profissional, em função dos conhecimentos e experiência;
- Política, isto é, o conjunto de forças ou interesses no qual a cultura tem um
grande peso específico.
A influência do líder sobre os membros da organização está condicionada por diversos
fatores:
- Fatores externos, nível de competência externa;
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- Fatores internos, conflito de poderes;
- Capacidade de acesso à informação adequada e disponibilidade da
mesma no momento oportuno;
- Atitude e compromisso de defesa, respaldo e apoio da equipe de
colaboradores;
- Capacidade para recompensar e sancionar;
- Faculdade para relacionar-se com os superiores;
- Capacidade de atrair ou seduzir às pessoas de seu entorno (personalidade
ou carisma).
Se o papel da hierarquia é fundamental para introduzir na empresa a estrutura da
inovação, outro elemento, como veremos a seguir, também tem extrema importância: a
criatividade.
15 A CRIATIVIDADE
No ambiente mutante e competitivo atual, outro fator determinante para implantar uma
mudança de cultura e uma cultura de inovação é a criatividade, definida como a gênese de
idéias novas. Se as pessoas têm diferente capacidade para traduzir sua criatividade em
resultados, as organizações têm diferentes instrumentos para conseguir traduzir o talento de
seus empregados em produtos, processos ou serviços novos (Stoner, 1996). A criatividade
desenvolve novas soluções para os problemas percebidos e provê matéria prima para a
inovação; neste sentido, a inovação significa o resultado prático da criatividade. O conceito de
criação envolve dois subconceitos: a mudança e o inesperado.
O processo criativo das organizações consta de três etapas:
• A geração de idéias: depende do fluxo de pessoas e de informação entre a
empresa e seu ambiente. Segundo Rosabeth Moss Kanter (1999) é mais provável
que a geração de idéias propicie as inovações quando elas surgem dos níveis
básicos da organização. As empresas devem criar condições internas favoráveis,
alentando a seus empregados para que gerem idéias novas. A técnica do
brainstorming é muito utilizada na geração de idéias.
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• Desenvolvimento de idéias ou solução de problemas: depende da cultura e dos
processos utilizados pela organização. As características, valores e processos da
empresa podem apoiar ou inibir o desenvolvimento e o uso de idéias criativas. A
estrutura organizacional também influi no desenvolvimento de idéias e, mais
concretamente, são as estruturas flexíveis as que favorecem o processo de
criatividade, entendendo-se flexibilidade como a capacidade de resposta para
adaptar-se às mudanças e poder reagir de imediato aos desafios determinados
pela organização.
• Implantação: é o processo que leva à solução ou o invento ao mercado. No caso
dos produtos manufaturados, o processo consta da engenharia, dos instrumentos,
da manufatura, das provas de mercado e das promoções.
Por outro lado, Kanter define dez regras para fazer com que as inovações fracassem
(Stoner, 1996 e Morcillo, 1997); enquanto que o mesmo Stoner propõe seis receitas para
propiciar a criatividade nas organizações:
i. Lograr a aceitação mudança;
ii. Fomentar novas idéias;
iii. Permitir maior integração;
iv. Tolerar o processo;
v. Apresentar objetivos claros e liberdade para alcança-los;
vi. Demonstrar reconhecimento.
Desenvolvimento da criatividade
De Bono (1990) propõe um método simples para desenvolver a criatividade que
denomina método dos seis chapéus.
Chapéus Significados Decisões Branco Base da informação Que informações desejamos obter? O que necessitamos? Como obtê-lo? Vermelho Fogo e calor Irracional e intuitivo Intuição e sentimentos O que pensam as pessoas?
Emoções Como se sentem?
Negro Juízo primitivo Juízo crítico Dificuldades, perigos Racionalidade Problemas, cautela Destacam os defeitos e os erros a superar
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Amarelo Sol, otimismo Atenção construtiva, positiva Viabilidade Esforço para ver o lado bom das coisas Benefícios Verde Pensamento crítico Solicitação de esforço adicional Alternativas Novas alternativas Sugestões Outras possibilidades, hipótese Idéias adicionais Azul Conclusão final Resumos e decisões Visão geral Agenda para pensar Organização da reunião O papel dos seis chapéus define o funcionamento do stop and go do processo criativo.
Segundo De Bono (1990), para que uma empresa inicie um processo sistemático de criatividade
deve incluir em suas políticas os seguintes aspectos:
� Sensibilização em toda a organização;
� Método dos seis chapéus;
� Designar um chefe de projeto;
� Posicionar estruturas de criatividade independentes;
� Propor programas de criatividade (círculos de qualidade, I + D, trainning, etc.);
� Definir redes de contacto;
� Colocar especial atenção no departamento de Recursos Humanos (ou Gestão de
Pessoas na nomenclatura mais atual), motivando as pessoas;
� Estabelecer alguns instrutores para atuarem como agentes multiplicadores do
processo.
Seguindo a teoria sobre criatividade, é possível determinar as seguintes características
para definir uma organização criativa:
� Canais abertos de comunicação;
� Permanente contacto com o entorno;
� Trabalho em equipe;
� Atribuição dos problemas aos generalistas;
Descentralização; �
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� Aceitação do erro;
� Liberdade;
� Cultura pouco rígida;
� Sistema de retribuição dirigido à motivação.
Tanto a criatividade como a inovação, exigem quatro tipos de papéis a serem
desempenhados pelos membros da organização:
� O inventor, quem desenvolve as idéias;
� O campeão, que crê na idéia, visualiza seus benefícios, avalia a realidade
organizacional, obtém apoio financeiro ou político e supera os obstáculos;
� O patrocinador, um gerente de alto nível que remove as barreiras organizacionais,
aprova e protege a idéia dentro da organização;
� O crítico, quem proporciona a parte prática do projeto, define os critérios de
superação (Daft, 1994).
O desenvolvimento destes quatro papéis faz que, de maneira natural, as mudanças na
cultura sejam promovidas. Soichiro Honda, fundador da Honda Motor, assinala que o êxito só é
alcançado depois de vários fracassos seguidos e de analisadas as suas causas.
Se não erramos é porque não nos movemos; se não nos movemos, não mudamos; se
nós erramos, aprendemos com nossos erros (Chiavenato, 1996).
16 CONCLUSÕES
A realidade atual neste início do século XXI é complexa e impõe às organizações novos
desafios, novas formas de gestão, renovadas tecnologias, novos modelos de organização, assim
como o desenvolvimento de diferentes papéis no âmbito laboral, social, público e privado.
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A globalização da economia e da informação elimina as fronteiras, enfatiza as diferenças
culturais; estabelecem-se relações dinâmicas e criativas entre o local e o global; neste entorno
complexo devem adaptar-se as organizações através de mudanças contínuas.
Angel Ribas Pons, em artigo publicado na Harvard Deusto Business Review (sem
referência), destaca que é complicado conhecer as pessoas individualmente por seu caráter
livre e é ainda mais difícil conhecer as organizações, uma vez que estas são a conjunção de
muitas pessoas. A cultura será, então, o nexo que identifica cada organização com seus
membros; e tendo em conta que a sociedade muda continuamente, é fundamental que cada
empresa mantenha sua essência em termos de crenças e valores, mas que acompanhe as
transformações pelas quais passa a sociedade na qual está inserida.
Reconhecendo que implantar uma cultura de inovação é o caminho para que cada
organização no perca o rumo da eficiência, da competitividade e da rentabilidade, reconhece-se
também que garantir o êxito neste tipo de processo é impossível.
Consideramos que a participação voluntária no processo de todos os agentes internos
apoiados na liderança constitui fator primordial para que a mudança de cultura seja vista como
uma oportunidade e não como uma ameaça.
A inovação, a agressividade e o risco responsável, combinados com uma visão de futuro,
podem ser as chaves do êxito.
17 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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vol. 01, jan. / jun. 2007 ISSN 0000-0000 - v. eletrônica
A IMPORTÂNCIA DA INFORMAÇÃO E DO CONHECIMENTO NA SOCIEDADE MODERNA Ascensão Braga Escola Superior de Tecnologia e Gestão do Instituto Politécnico da Guarda
RESUMO A sociedade actual entrou numa nova era de desenvolvimento e transformação que aviva a
necessidade de enfrentar novos desafios num contexto de concorrência acrescida e de
globalização das economias. Segundo alguns autores Naisbitt (1982); Zorrinho (1991); Sousa
(2000), estamos a viver na Era da Informação, deixando para traz a Era Industrial, e que, por sua
vez, é caracterizada pelos intangíveis (Sonnenberg, 1994). De uma economia onde os recursos
físicos e financeiros constituíam poder passámos para uma economia onde a força do poder
reside nos recursos humanos e intelectuais (Santos; Sussman, 2000).
1 A INFORMAÇÃO E SUA IMPORTÂNCIA
Com as profundas e inéditas transformações ocorridas nas últimas décadas1, os processos de
tomada de decisão passaram a ser entendidos de forma diferente, num cenário pintado com
variáveis diferentes das que se julgavam conhecer e controlar. Se antes as mudanças eram mais
ou menos previsíveis, agora tudo muda a um ritmo cada vez maior. Como refere Zorrinho (2001)
“o império da velocidade, da volatilidade e do superficial inunda as nossas vidas”.
O elevado dinamismo e mutabilidade que caracteriza a nova sociedade, faz surgir uma
realidade instável e mais complexa, onde as fronteiras geográficas já não fazem sentido, e exige
uma nova maneira de pensar, de agir e de reagir num cenário de tempo real em que a
informação assume um papel crucial.
Com efeito, o comportamento humano necessita permanentemente de informação e a procura
da racionalidade nos comportamentos, nas actividades obriga cada vez mais à utilização de
1 Em diversos níveis: económico, tecnológico, organizacional, social, e cultural, que afectam voluntária ou involuntariamente, directa ou indirectamente, o dia a dia de qualquer individuo e/ou organização
1
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informação. As organizações, ao tentarem perceber de forma profunda todas as mudanças que
ocorrem no seu meio ambiente externo e interno, criam necessidades insaciáveis de informação
em relação a tudo o que directa ou indirectamente lhes diz respeito, para poderem desenvolver a
sua actividade em conformidade com os seus objectivos.
É neste contexto que a crescente presença e importância da informação nos mais diversos
domínios e o avanço tecnológico, que permite um melhor acesso, tratamento e transmissão da
informação, levam ao aparecimento da Sociedade da Informação.
A Informação sendo um conceito controverso e difuso, assume diversas formas, com
significados muito variados2 resultantes dos objectivos e realidades que caracterizam o utilizador
e que permite fundamentar as decisões individuais e colectivas. Para uns pode exprimir um
conjunto de dados recolhidos, processados, transformados, transferidos e tornados utilizáveis;
para outros, sistemas de imagens e, ainda, para outros pode significar conhecimento ou
armazém de conhecimentos. Mas, o fundamental é que cada um saiba o que é para si
Informação e de seguida procurar geri-la (Robertson, 1996).
A Informação é um recurso, como qualquer outro, e deve ser gerido como tal, mas contém em si
algo diferente, é intangível e não pode ser mensurável. Só recentemente muitas organizações a
entenderam como o recurso mais importante, tanto mais, que pode ser simultaneamente
matéria-prima e produto acabado de uma organização. É importante salientar que possui
características que a distinguem de outros recursos ao poder ser reutilizada, partilhada,
distribuída ou trocada sem que haja perda do seu valor, “a informação tornou-se um dos mais
importantes activos das organizações, o sucesso na gestão deste activo é de vital importância
para o sucesso futuro” (Lincoln, 1990,p.2).
A gestão da informação é uma disciplina recente “… que tenta fazer a ponte entre a gestão
estratégica e a aplicação das TI nas empresas, procura, em primeiro lugar, tentar perceber qual
a informação que interessa à empresa, para de seguida, definir processos, identificar fontes,
modelar sistemas” (Braga, 1996). Os recursos tecnológicos são indispensáveis para uma eficaz
gestão da informação, eles vão permitir uma melhor recolha, tratamento e transmissão da
informação (nas mais diversas formas) onde já não tem sentido as distâncias geográficas, o
tempo e o volume. As infra-estruturas da informação vão, por sua vez, possibilitar a sua
disponibilização na hora e local exactos com formato adequado e permitir a aquisição de
conhecimentos, a inovação e a criatividade.
2 Zhang (1988) referiu existirem mais de 400 definições de informação
2
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2 DA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO À SOCIEDADE DO CONHECIMENTO
A Sociedade da Informação apoia-se na produção e utilização massiva da informação. Mas, se
outrora dispor de informação era suficiente para tomar decisões, agora todas as etapas do
processo de tomada de decisão exigem conhecimentos, imaginação e capacidade de inovação
por parte do decisor e, as organizações no desenvolvimento da sua actividade, não poderão
descurar a componente de trabalho intelectual.
A Sociedade da informação evoluiu e transformou-se para dar resposta aos novos desafios e
mais do que dispor de informação e tecnologias são necessários o conhecimento e as
capacidades criativas do tomador de decisões. Se antes a revolução se centrou nos dados, sua
recolha, armazenamento e distribuição onde as tecnologias deram uma ajuda preciosa, agora a
revolução terá de ser na própria informação e no seu significado, aplicado a situações concretas.
Dá-se, assim, uma transição da Sociedade da informação para a Sociedade do Conhecimento,
em que o conhecimento é visto como o principal factor criador de riqueza. As vantagens
competitivas sustentáveis de longo prazo passaram a ser as competências, a inteligência e os
conhecimentos, ou seja, o que o indivíduo sabe, como usa o que sabe e a sua capacidade de
aprender coisas novas (Prusak, 1996). Numa economia onde a única certeza é a incerteza, a
fonte segura e persistente de vantagem competitiva é o conhecimento (Nonaka, 1991).
Informação e conhecimento são dois conceitos distintos3 apesar de muitas vezes serem
utilizados sem distinção, entendendo-se o conhecimento como informação enriquecida através
da interpretação e análise de contexto subjectivo do utilizador, sendo difícil ou quase impossível
de duplicar. É o valor acrescentado pelas pessoas que transforma os dados em informação e
esta em conhecimento, através das suas experiências, contexto e interpretações (Duffy, 2000).
São activos intangíveis, a informação porque pode ser utilizada por várias pessoas em
simultâneo, em vários locais, e formatos e com interpretações diferentes consoante os
conhecimentos e objectivos de cada uma; e o conhecimento porque “…é, algo de imaterial,
multiforme nem sempre facilmente transmissível, ou mesmo impossível de transmitir…”
(Murteira, 2001, p.16). Não diz respeito apenas ao conhecimento de factos ou informações, ele
é a aplicação desses conhecimentos às experiências reais, o que faz com que “diferentes
indivíduos podem ter acesso às mesmas informações mas o que fazem com elas pode ser muito
diferente” (Dosi, 1998).
3 São conceitos distintos, mas interligados, na medida em que um constitui a base do outro.
3
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Conhecimento é, é desta forma, mais do que informação, é matéria-prima a partir da qual se
obterá conhecimento e resulta da recolha selectiva dos dados e da análise de um conjunto de
informações relacionada com determinada situação real. “É informação processada” Dosi (1998),
conjugada com as experiências e saberes adquiridos de cada um.
Por conseguinte, no processo de conversão da informação em conhecimento é importante a
existência de interactividade entre informação e conhecimento, bem como, indispensável a
presença do elemento humano e da tecnologia.
3 A NATUREZA DO CONHECIMENTO
O conhecimento constitui, actualmente, uma mais valia para os indivíduos e para as
organizações e encontra-se disperso sob diferentes formas de saber, que segundo Polanyi
(1978) podem ser: conhecimento explícito e conhecimento tácito. O primeiro é uma forma de
conhecimento bem organizado na mente das pessoas e pode ser facilmente formalizado,
descrito, actualizado e partilhado, pois tem existência física (jornais, livros, etc)4. O segundo,
conhecimento tácito/implícito, diz respeito às pessoas individualmente, às suas experiências,
pensamentos, sonhos, intuições; é difícil de articular e não é codificado, dado que apenas existe
na mente. A sua principal característica é a dificuldade da sua transmissão, daí que seja, por
natureza incompleto5.
Deste modo, enquanto que o conhecimento explícito pode ser transmitido sem perda de
integridade, o conhecimento tácito, por oposição, é impossível ou muito difícil de traduzir num
discurso, não se conseguindo expressar com exactidão6 quer pela dificuldade de formalização,
quer por as pessoas não saberem o que possuem e não conseguirem transmitir o que sabem,
quer, ainda, por cada indivíduo saber mais do que aquilo que pode transmitir (Polanyi, 1978;
Brooking, 1998; Teece, 1998). Ele não é separável do seu detentor e seu contexto de utilização,
desenvolve-se directamente das experiências e das acções e, apenas, pode ser transmitido
através da partilha interactiva de experiências7.
4 As tecnologias da informação facilitam bastante a transmissão deste conhecimento bem como o seu arquivo e tratamento no tempo e no espaço. 5 Hu, Yao-Su (1995, p.82) apresenta razões que dificultam e encarecem a transmissão do conhecimento tácito 6 Mesmo a pessoa mais qualificada não consegue explicar, codificar as regras que suportaram certas decisões e acções. 7 Nonaka (1995) acrescenta que o conhecimento tácito assume duas dimensões: a dimensão técnica (que engloba as capacidades informais e difíceis de definir que constituem o know-how) e a dimensão cognitiva (consiste em esquemas, modelos mentais, crenças enraízadas nas acções dos indivíduos).
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Existem autores que, não obstante, concordarem com estas duas perspectivas do
conhecimento, consideram que não podem ser entendidas de forma estanque, “os dois tipos não
são completamente distintos” (Ambrósini; Bowman, 2001), ou seja, o conhecimento raramente é
totalmente tácito ou totalmente codificado, localizando-se algures entre dois extremos:
completamente tácito e completamente codificado. Saviotti (1998) acrescenta que “o
conhecimento é sempre parcialmente tácito nas mentes de alguém” e Polaniy (1978), por seu
lado, defende que é impensável um conhecimento completamente explícito, na medida em que o
conhecimento tácito pode ser inato e o conhecimento explícito exige a compreensão tácita e a
sua aplicação. Isto é, por mais explicito que seja tem de ter sempre uma base e/ou uma
componente tácita. “Mesmo quando o conhecimento é codificado, alguns elementos tácitos
permanecem incodificados” (Roberts, 2000, p.433).
As organizações, conscientes de que o conhecimento constitui uma mais valia, também elas
estão munidas destes dois tipos de conhecimento, quer nas pessoas que lá trabalham quer na
própria organização. Neste sentido, cada organização deverá criar condições que permitam a
gradual conversão do conhecimento tácito em conhecimento explícito para que se obtenham as
vantagens da partilha e transmissão dentro da estrutura organizacional e assim tomar decisões
de qualidade e de forma mais célere. Todos os elementos de uma organização têm necessidade
de criar, partilhar e usar o conhecimento, sendo cada pessoa gestora do seu próprio
conhecimento.
O conhecimento não é simples nem estático, transforma-se e evolui através de um processo
dinâmico e cumulativo que transforma o conhecimento tácito em explícito, adquirindo novamente
a sua forma tácita sendo apreendido e reutilizado por outros. Ele está sempre em mudança e
evolui à medida que contactamos com outros (interacção social) e com o nosso ambiente e ao
ganharmos experiência estamos também a desenvolver talento para aplicar e criar novo
conhecimento.
“O conhecimento é essencialmente um fim em aberto...” (Dosi, 1998) e resulta de um processo
dinâmico, “…apoiado pelas novas tecnologias da informação e comunicação e pelos recursos
humanos qualificados, desenrola-se como que em espiral, de forma a alcançar cada vez maiores
níveis de conhecimento” (Braga e Natário, 2003).
O conhecimento é um recurso intangível e está em permanente renovação, na medida em que
se processa dentro das pessoas, não se degrada nem perde valor quando difundido, pelo
contrário, o conhecimento só tem valor se for utilizado e só a sua partilha gerará novo
conhecimento. Segundo Davenport (1998) o conhecimento, o saber existe dentro das pessoas e
enquanto que os dados, a informação podem ser transmitidos por via electrónica, o
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conhecimento só pode ser transmitido através de uma rede humana, devendo fazer-se um
esforço no sentido de ser mais valorizada a sua partilha do que o seu entesouramento.
4 A GESTÃO DO CONHECIMENTO
O conhecimento é usado nas organizações já há muito tempo, mas a consciência de que é um
recurso que merece ser gerido é recente. A gestão do conhecimento é uma extensão lógica da
Sociedade da informação na tentativa de enfrentar a explosão da informação e aumentar o
conhecimento. melhor conhecimento pode levar a melhores decisões daí que as organizações
se passem a preocupar com o seu capital intelectual e sua inteligência competitiva, ou seja, com
a gestão do conhecimento.
A gestão do conhecimento pode ser entendida como um conjunto de processos que permite às
organizações “criar, partilhar e usar o conhecimento através de uma abordagem sistemática
integrada” (Shepard, 2000) de um conjunto de fluxos de conhecimentos internos e externos;
tácitos e explícitos através das tecnologias da informação e capacidades criativa e inovadora dos
activos intelectuais (Malhotra, 1998); (Snowden, 1999); (Seeley, 2000).
Todos os elementos de uma organização têm necessidade de criar, partilhar e usar o
conhecimento, sendo cada pessoa gestora do seu próprio conhecimento. Ao nível organizacional
a sua gestão deverá ser dinâmica de forma a constituir uma mais valia para a organização,
assegurando que o conhecimento, latente, adormecido e que tem a ver com os nossos
pensamentos, sentimentos, experiências, etc, possa transformar-se em conhecimento vivo,
activo, acessível, descrito e partilhado (livros, jornais), utilizado e reutilizado por outras pessoas.
Segundo Gantz (1998) implantar sistemas de gestão do conhecimento requer avanços em três
frentes: pessoas (cultural); organização (disciplina) e tecnologia (ferramentas), a que Ballay
(1999) acrescenta três recursos imateriais: recursos humanos, portadores de experiência;
processos operativos que instrumentalizem o saber e o saber fazer; e informações, que existem
nos sistemas de armazenamento e de troca.
Na gestão do conhecimento a tecnologia8 vai assumir um papel vital mas não faz tudo, a
memória do computador apenas serve a inteligência, não é ele próprio a inteligência9. A
inteligência deve incluir tanto a habilidade da experiência quanto a facilidade de extrair da
experiência, ou seja, criar conhecimento e aprender com o que pode ser memorizado. Enquanto 8 Segundo Stratigos (2001) a tecnologia constitui apenas um de quatro estágios da gestão do conhecimento (Tecnologia; Conteúdo; Processo;e Pessoas)
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que o conhecimento codificado pode ser distribuído pelo mundo inteiro instantaneamente e a
baixos custos graças às tecnologias da informação e comunicação, o mesmo não acontece com
o conhecimento complexo, tácito que muitas vezes requer proximidade entre emissor e o
receptor (por exemplo através de videoconferência) em que o contacto directo10 e o nível de
confiança são pré-requisitos para a transferência de conhecimento tácito.
A gestão do conhecimento “…representa um processo que integra a estratégia das
organizações, com a gestão de talentos humanos e as tecnologias de informação... com o
objectivo de fomentar a aprendizagem integrada” (Sousa, 1999). De acordo com Métais e
Moingeon (2001) estas três dimensões não são suficientes se a organização não reunir um
conjunto de características que a tornem única. São estas características que determinam a sua
identidade que deverá ser de aprendizagem permanente, pelo direito ao erro pela valorização da
criação e da partilha de conhecimentos e com o incentivo à aprendizagem colectiva.
Podemos afirmar que a sociedade do conhecimento tem por base pessoas inteligentes,
dinâmicas, versáteis com capacidade de iniciativa e de utilizar a informação e o conhecimento
para desenvolverem a sua actividade de forma original. Para Stewart (1997) os activos humanos
que criam e geram saber tornaram-se os mais importantes para as empresas e o investimento
real deverá ser feito no próprio trabalhador que detém conhecimento e não nas máquinas.
Deste modo, só o investimento na formação/qualificação permanente dos recursos humanos,
poderá permitir um desempenho excelente das organizações, satisfazer as exigências futuras de
recursos humanos mais talentosos, criativos, inovadores e rápidos solucionadores de problemas
inesperados. Também a capacidade de inovar está directamente ligada e dependente do capital
intelectual o que exige uma aprendizagem permanente, na medida em que a inteligência não
pode ser encarada como fixa, sendo uma qualidade do ser humano, ela é modificável e resulta
de um processo evolutivo de aprendizagem. “Uma pessoa instruída é o centro da sociedade do
conhecimento” (Drucker, 2001).
9 As tecnologias não criam saber nem geram conhecimento, apenas são instrumentos que permitem a troca de conhecimentos. 10 Para Sveiby (referido por Epstein; 1998) o melhor método de transferir conhecimento é através da experiência directa, mais do que ouvir de alguém ou ler sobre, que facilita a aprendizagem porque as pessoas adquirem conhecimento tácito
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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A vivência e/ou sobrevivência na Sociedade da Informação e do Conhecimento constitui um dos
desafios da actualidade. Enfrentar este desafio e vencê-lo terá de ser o objectivo de cada
indivíduo e de cada organização, em que a mudança deve ser encarada como uma oportunidade
e não como um obstáculo. As pessoas e/ou organizações que quiserem viver esta nova
realidade do lado dos vitoriosos terão de tomar decisões inteligentes baseadas na informação de
qualidade e em tempo útil; agir de forma pro-activa, apostando na criatividade, na inovação e na
diferença; fazer mais, melhor e mais rápido, pois só assim conseguirão ser competitivos num
mercado global e sem fronteiras.
A informação e o conhecimento desempenham um papel importante em toda a actividade
económica, quer na criação de riqueza quer na melhoria da qualidade de vida dos cidadãos. A
competitividade das empresas num contexto de globalização depende da sua capacidade de
criar, processar e utilizar a informação baseada em conhecimentos, com a ajuda da utilização
inteligente das tecnologias da informação e comunicação. Aqui, a aposta na qualificação dos
recursos humanos é indispensável ao aumento do conhecimento próprio e da empresa, podendo
tornar-se num factor de inovação essencial para o desenvolvimento económico e para a criação
de emprego.
Na economia do conhecimento as organizações estão a descobrir que os activos materiais são
agora menos relevantes na gestão das organizações e que os seus activos mais importantes
são os intangíveis, sendo o capital intelectual, recurso estratégico do futuro, criador de valor e
fonte de vantagem competitiva.
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vol. 01, jan. / jun. 2007 ISSN 0000-0000 - v. eletrônica
ANÁLISE CONCEPTUAL E ABORDAGEM TEÓRICA DO DESENVOLVIMENTO Ester Amorim Nogueira Fernandes1
Mestre em Gestão Doutoranda em Gestão Instituto Politécnico da Guarda RESUMO
Durante décadas a teoria económica não contemplou a variável espaço nos modelos de
crescimento ou nos modelos de análise. É nos anos 70, que a problemática do desenvolvimento,
conquistou importante espaço na teoria económica. A noção de crescimento económico é
essencialmente quantitativa, refere-se ao aumento regular do produto nacional a preços
constantes. A noção de desenvolvimento é qualitativa, é um conceito normativo que traduz
determinada concepção desejável da mudança social ou do processo histórico em cada
formação social referenciado no espaço e no tempo e pressupõe o alcance de fins que
transcendem o nível económico. O desenvolvimento é um fenómeno social global, dado por um
processo de estruturação e transformação social em sentido lato, de um sistema produtivo,
processo que pressupõe o atingir de metas de ordem quantitativa, mas que possui também um
carácter qualitativo. Os benefícios do desenvolvimento económico-social devem ser para os
indivíduos, pelo que a sua localização é factor que não deve ser dispensado, quer na análise
quer na adaptação de medidas de política económica. Neste artigo pretendemos abordar alguns
conceitos sobre a importância que o desenvolvimento terá como condicionante da actividade
económica, social e cultural, e identificar os estrangulamentos que estão associados a tal
conceito.
PALAVRAS CHAVE: Desenvolvimento, Crescimento Económico.
1 Ester Amorim Nogueira Fernandes, Av.ª R.ª D. Amélia, 142 – 3.ºDto, 6300, Guarda Telemóvel: 962 652 694 ; E-mail: [email protected]
1
ABSTRACT
For decades, economic theory did not contemplate the variable of space in either models of
growth or models of analysis. In the 1970s, the development controversy gained significant
ground in economic theory. The notion of economic growth is essentially quantitative, referring to
the regular increase of the National Product at the same price level. The notion of development is
qualitative; it is a normative concept that translates a specific desirable idea of social change or of
historical process in each social grouping referred to in space and time and presupposes the
reach of means that transcend the economic level. Development is a global social phenomenon,
triggered by a process of structuring and social transformation in its larger sense, of a productive
system whose process presupposes reaching ends of a quantitative order, but which also have a
qualitative nature. The benefits of socio-economic development should exist for individuals, such
that place is an important factor in both the analysis and adaptation of political/economic
measures. This paper will briefly outline some concepts related to the importance that
development will have as a conditioner of economic, social and cultural activity and will identify
the barriers associated with this concept.
KEY WORDS: Development, Economic Growth. 1 ANÁLISE CONCEPTUAL E ABORDAGEM TEÓRICA DO DESENVOLVIMENTO 1.1 O espaço como variável estratégica no contexto do desenvolvimento regional
As estratégias de crescimento seguidas nas duas últimas décadas derivaram, principalmente, da
teoria económica fortemente influenciada pelo pensamento neoclássico.
Surgiram, porém, teorias de desenvolvimento que, reequacionando o conceito de
desenvolvimento e destrinçando crescimento de desenvolvimento, apontam para novas formas
de posicionamento. As suas origens mais próximas situam-se no reconhecimento de que, nas
duas últimas décadas, a situação económica e social da generalidade dos países em
desenvolvimento estagnou ou registou um crescimento distorcido, com fortes e decrescentes
desigualdades, bem como na observação das deseconomias geradas pelas diferentes
poluições/agressões ambientais nos países ditos desenvolvidos.
É definida expressamente a realidade sócio-económica como uma unidade, daqui resultando a
tese de que não pode haver uma separação entre desenvolvimento económico e
desenvolvimento social. Desenvolvimento sócio-económico ou somente desenvolvimento serão
os conceitos considerados correctos. Dada a unidade da realidade sócio-económica, a
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interdependência é a característica essencial dos factores económicos e dos factores sociais. A
noção de crescimento económico corresponderá às alterações quantitativas dos elementos ou
variáveis económicas.
O desenvolvimento torna-se o tema central da economia, pretendendo dar resposta aos
problemas que se colocam quer em países em desenvolvimento, quer em países com um
elevado nível de desenvolvimento.
Também, nesse sentido, se contextualizam as teorias da dependência, de cariz marxista, que
partem da constatação de que a quase generalidade dos países submetidos à exploração
colonial apenas conseguiu uma política nominal. Estas acentuam a dependência face a toda
uma estrutura produtiva que, no âmbito da divisão internacional do trabalho, leva a uma
crescente degradação dos termos de troca e a uma espiral cumulativa de subdesenvolvimento.
O agente principal de dependência é protagonizado pelas empresas transnacionais, que
exportam know-how tecnológico apenas em fases adiantadas dos ciclos dos produtos,
mantendo, assim, uma eterna supremacia dos países que as desenvolvem (Hansen, 1981). Em
todo o caso, a tecnologia é sempre vista como uma variável estratégica no desenvolvimento
apenas estando em aberto o modo como se processa a sua implantação e o tipo de tecnologia a
adoptar em cada caso.
Surgem, neste contexto, as chamadas “correntes alternativas de desenvolvimento” baseadas
numa tripla conclusão:
- Inadequação das estratégias de desenvolvimento económico adoptadas pelos países em
desenvolvimento;
- Desigualdade nas relações internacionais;
- Existência de limites físicos (ecológicos/ambientais) ao crescimento dos países altamente
industrializados.
Segundo diversos autores (Stöhr, 1987a e Alves et al, 1988), as concepções de
desenvolvimento alternativas não constituem propriamente um paradigma, na medida em que
não possuem ainda um núcleo coerente e estável da teoria económica. No entanto, no âmbito
das políticas de desenvolvimento, as concepções alternativas estão já conotadas com
estratégias do tipo: redução do desemprego, erradiação da pobreza, satisfação das
necessidades básicas, autocentramento, desenvolvimento sustentável. Certo é que à medida
que as políticas se vão pondo em prática e o debate se vai, concomitantemente, aprofundando,
torna-se notório que essa heterogeneidade inicial de conceitos, objectivos e estratégias, se vai
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consubstanciando em algo mais concreto e definido, dando forma a um corpo teórico mais
estável.
A tecnologia constitui, nessa época, o fulcro do processo de desenvolvimento e está patente que
é a “qualidade” da tecnologia que induz o caminho que se percorre e o ritmo a que se faz esse
percurso. Isto é, depreende-se que a tecnologia é vista como determinante da dinâmica
produtiva do próprio posicionamento dos países em termos de competitividade internacional.
O acesso e controlo da tecnologia constitui, pois, um factor estratégico na “descolagem” das
regiões, em particular dos países e regiões periféricos, pelo que devem ser desenvolvidos e
estimulados todos os esforços que permitam reforçar o intercâmbio da informação tecnológica e
organizar e executar acções de interesse comum. É, assim, fundamental a noção de rede
(Ramos Santos, 1990). Isto é, a noção de espaço como local de integração da acção de actores
institucionais ganha um novo fôlego, tornando-se assim crucial pensar, informar e realizar em
rede, numa lógica de sistema interactivo.
No entanto, saliente-se que a Ciência Económica dominante foi até à década de 50 considerada
como espacialmente unidimensional (...) porque tanto os agentes económicos como as
actividades, eram consideradas como pontualmente concentradas, ou como distribuídas
uniformemente no espaço, o que, com a diferença de um escalar multiplicativo, tem o mesmo
significado (Alves e outros, 1988: 6). Pressupunha-se, portanto, a inexistência de preocupações
da economia pelo espaço como factor condicionante das opções dos agentes económicos.
A articulação entre as concepções de desenvolvimento e as consequências diferenciais da sua
espacialização não são indissociáveis, pelo que o apelo à Análise Regional, à integração da
variável espaço no conceito de desenvolvimento, se torna inevitável. A relação dos fenómenos
económicos com o espaço não é mais do que o resultado complexo das relações dos seus
actores com esse espaço, ainda que, evidentemente, não possamos deixar de acrescentar-lhe
factores de ordem natural. Introduziu-se, pois, nesta altura a noção de espaço como variável
estratégica no desenvolvimento, numa óptica funcionalista em que o espaço é visto, sobretudo, à
maneira neoclássica, como suporte no qual actuam as forças económicas, se localizam
actividades e, portanto, se define a estrutura e a hierarquia dos espaços económicos (Silva,
1983).
Assim, a opção por determinado modelo de desenvolvimento implica, também a obrigatoriedade
de desenhar uma estratégia de ocupação e transformação do espaço. As mutações recentes da
organização espacial questionam profundamente as anteriores linhas de pensamento económico
sobre o espaço. Enquanto que algumas regiões industriais parecem condenadas ao declínio,
outras regiões menos desenvolvidas parecem renascer com dinamismo na cena económica
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numa constante dinâmica de relocalização produtiva cuja lógica sócio-económica está ainda, em
grande parte, por aprofundar. O novo conceito de território irá assentar nessa interdependência
entre a problemática espacial e a problemática do desenvolvimento. Segundo Caria (1989),
rompeu-se definitivamente com o conceito de espaço como lugar de funções e parte-se para um
outro de “espaço vivido”, fruto de necessidades e actividades de actores territorializados e
interactivas, como local de acção social. É neste sentido que Reis (1992: 62) aborda o conceito
de território como (...) conjuntos estruturados, complexos, assentes em relações reticulares e em
modos próprios de comunicação e sociabilidade. Assim, da percepção dos territórios como
simples receptores de estratégias produtivas alheias e exteriores tende-se para uma perspectiva
que os encara, também como agentes de uma lógica própria de organização produtiva. O
território, nesta acepção, ganha valor de sujeito, deixando de ser apenas uma matriz inerte de
localizações de actividades e aparece, assim, a assumir a responsabilidade de determinadas
acções de desenvolvimento (Alves, 1987).
1.2 Moderna concepção de desenvolvimento: dimensão social e humana
Os indivíduos são a verdadeira riqueza de uma nação e o desenvolvimento tem como
objectivo fundamental criar um ambiente que ofereça às populações a possibilidade de
uma vida longa, feliz e saudável.
Nações Unidas, 1990
Esta filosofia de desenvolvimento que se preocupa em primeiro lugar com o bem-estar,
considerando os seres humanos mais como beneficiários do que como agentes do
desenvolvimento, difere das abordagens tradicionais respeitantes ao crescimento económico,
formação de capital humano, desenvolvimento de recursos humanos, do bem-estar e das
necessidades essenciais do ser humano. O conceito de desenvolvimento aprofunda-se com a
introdução de valores como o acesso à saúde, à cultura, ao lazer, à justiça, à liberdade, à
democracia e à participação das populações nas acções de desenvolvimento.
Neste sentido, há três princípios básicos que se associam correntemente ao conceito de
desenvolvimento:
- Um princípio é o do acesso de toda a população a certo grau mínimo de satisfação das
suas necessidades básicas, em alimentação, saúde, habitação, educação, ou seja, que a
todos os homens e a cada homem sejam oferecidas condições para o pleno
aproveitamento das suas capacidades, segundo as suas próprias aspirações;
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- Um segundo princípio refere-se à igualdade de oportunidades entre indivíduos, qualquer
que seja o sexo, a raça, a classe, a actividade, a religião a que pertencem. Nesta
acepção, desenvolver é integrar, isto é, homogeneizar, anular disparidades e
desigualdades;
- Um terceiro princípio respeita à autodeterminação ou independência do processo de
desenvolvimento. Não haverá, pois, desenvolvimento em cada economia nacional
quando as decisões fundamentais relativas à sua evolução dependerem de instâncias
exteriores ao estado nacional.
Através desta noção de desenvolvimento podemos interpretar que este tem como fim o próprio
indivíduo e como objectivo o seu bem-estar económico, social e cultural, o aumento do acesso
aos bens e serviços, o reforço da sua liberdade de escolha, a vivência democrática, as
possibilidades crescentes de participar na tomada de decisões relativas ao traçar dos seus
próprios destinos e do sistema onde se insere. O rendimento e a riqueza aparecem apenas
como um dos elementos, entre muitos, que contribuem para o desenvolvimento social e humano,
ou seja, um meio para que o indivíduo possa atingir uma vida longa e feliz.
Nestes termos, é claro que o crescimento económico é condição necessária mas de nenhum
modo suficiente do desenvolvimento. Com efeito, o desenvolvimento económico, social e
humano só é real quando se preocupa, não apenas com a satisfação das necessidades
essenciais mas também com a instauração de um processo dinâmico de participação, o que
pressupõe o assumir de medidas e acções que enraízam nas populações uma prática
democrática de gestão, de relacionamento e de convivência. Segundo Guy Rocher (1971), o
desenvolvimento económico consiste na utilização dos diferentes factores económicos com vista
a aumentar o rendimento nacional, elevar o nível de vida geral da população dum país ou duma
região e favorecer o bem-estar geral. O desenvolvimento económico supõe investimentos de
capitais, a realização de sistemas bancários e instituições financeiras, a criação de meios de
transporte e de comunicação diversos, serviços públicos, um regime fiscal e medidas de
previdência social.
É necessário investir no crescimento económico mas é importante que se preste particular
atenção à relação que existe entre o crescimento económico e o desenvolvimento humano, dado
que um bom número de países mostra que, apesar do crescimento económico acelerado, não
conseguiram resolver problemas sociais graves de grande parte das populações, assim como as
nações industrializadas revelam que o aumento do rendimento não constitui protecção contra o
crescimento de problemas sociais. Em contrapartida, alguns países, de baixos rendimentos per
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
capita, mostram que é possível atingir um razoável desenvolvimento humano com os meios
disponíveis desde que estes sejam aplicados em benefício do bem-estar das populações.
A identificação do desenvolvimento com o crescimento cede lugar a uma concepção de
desenvolvimento que faz apelo à introdução da variável acessibilidade (problema do acesso das
populações, diferentemente situadas social e geograficamente aos bens e serviços). O
desenvolvimento seria, então, segundo Simões Lopes (1987), o acesso das populações, onde
quer que se encontrem, aos bens e serviços básicos; este implicaria a justiça social na
distribuição dos frutos do crescimento e implicaria, concretamente, a disponibilidade de emprego
como fonte de acesso aos bens e serviços e factor de realização pessoal. Deste modo, factores
como a repartição de rendimento, a educação, a saúde, o acesso à cultura e às actividades
recreativas, a qualidade da alimentação, o acesso aos meios de comunicação e transporte,
ganham, na teoria do desenvolvimento regional, um papel não menos importante do que o
crescimento do rendimento médio per capita.
Nesta linha surgem as teses do desenvolvimento endógeno, a partir da base no dizer de Walter
Stöhr (1981b), realçando contudo a necessidade de apoios externos às zonas económica e
socialmente deprimidas, na fase inicial do processo de desenvolvimento. Para que o processo
de desenvolvimento regional ganhe uma dinâmica auto-sustentada é necessário que ele se
identifique integralmente com os problemas, os desejos e as aspirações das pessoas.
1.3 Desenvolvimento regional
1.3.1. Conceito
O conceito de desenvolvimento regional surge como resultado da integração do factor espaço na
teoria económica, ou seja, na sequência das primeiras formulações da teoria da localização das
actividades económicas. Esta associação do factor espaço ao desenvolvimento, no sentido
económico, em breve deu lugar à comparação das diversas regiões. Efectivamente, o
desenvolvimento, no sentido material, dá-se sempre nalgum lugar. E, nessa medida, todo ele é
regional. Mas, a constatação de que ele se dá de forma diferente de área para área conduziu a
que uma das preocupações do desenvolvimento regional passasse a ser a atenuação das
disparidades regionais, através da recuperação das mais atrasadas.
Por outro lado, como temos vindo a referir, a palavra desenvolvimento adquiriu, ao longo do
tempo, uma dimensão que ultrapassou o mero conceito do crescimento económico, passando a
ter o sentido também da forma como os benefícios desse desenvolvimento passam a estar
acessíveis a toda a população. Portanto, passou a abarcar a acessibilidade de todos, em termos
físicos e económicos, aos bens e serviços que a comunidade pode proporcionar (Simões Lopes,
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
1980). No fundo, este conceito de desenvolvimento regional acaba por estar intimamente
relacionado com outro, muito citado mas pouco aclarado, que é o da qualidade de vida. Esta
designação tem sido porventura demasiado ligada à qualidade do ambiente, mas vários autores
lhe dão uma significação bastante mais ampla, que abrange três componentes: o nível de vida,
as condições de vida e a qualidade do ambiente (Cunha et al., 1974). Portanto, podemos dizer
que o desenvolvimento regional tem também por objectivo a prestação de uma elevada
qualidade de vida às populações e a sua difusão até às mais carenciadas. Desta forma, será
necessário pensarmos o desenvolvimento como processo de transformação da estrutura social,
tendo em conta as dicotomias agricultura/indústria e rural/urbano, a deslocação de formas de
industrialização, o crescido interesse pelos actores locais e pelas dinâmicas endógenas.
1.3.2 Reformulação das perspectivas de Desenvolvimento Regional: abordagem a partir do nível
local
A crise económica que data do início dos anos 70 constitui o estímulo para a alteração completa
das formas de pensar o desenvolvimento. Na medida em que o desemprego e a pobreza
continuaram a crescer, quer nas chamadas economias ditas desenvolvidas, quer nos países
ditos em desenvolvimento, o termo desenvolvimento, como sinónimo de crescimento e
modernização, entrou em descrédito. A necessidade de um novo conjunto de perspectivas para
os problemas de desenvolvimento, que considerem as escalas global, regional e local, enfatizou
o nível local como o nível preferido, quer para a abordagem teórica, quer para a intervenção
prática. São complexas as razões que tornaram o nível local o principal objecto de atenção,
sendo estas decorrentes das formulações teóricas e do impacto das intervenções a nível local. A
falta de articulação entre a teoria e a prática nas investigações actuais sobre o desenvolvimento
económico local revela deficiências de compreensão e conceptualização e a necessidade da sua
reconciliação futura.
No princípio dos anos 70 a corrente radical da geografia do desenvolvimento iniciou uma série
de críticas às teorias de modernização comummente aceites. Enquanto a economia mundial
mergulhava numa crise económica profunda, o falhanço óbvio das políticas de desenvolvimento
trouxe novas perspectivas ao debate sobre o desenvolvimento. A evolução destas perspectivas
teve um enorme impacto nas formas de repensar o problema regional.
As políticas regionais são forçadas a procurar novos caminhos no novo contexto sócio-
económico. Havendo crescente dificuldade em distribuir espacialmente o crescimento, porque
inexistente ou parco, a questão fundamental para o desenvolvimento regional deixa de ser a
capacidade da região para atrair novos projectos, para ser a das capacidades das regiões para
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gerar internamente as condições de transformação das suas estruturas produtivas (Baptista,
1985: 25). Isto é, a questão fulcral passou a ser a do desenvolvimento regional endógeno, em
contraponto ao paradigma funcionalista anterior. Pressupõe-se um controle territorial das
economias regionais, tendo em vista o aumento da eficiência global de todos os factores
produtivos, e a sua estratégia baseia-se na utilização de PME’s, que aparecem,
preferencialmente, por iniciativa de agentes locais de desenvolvimento, visando a retenção dos
valores acrescentados dentro da própria região (Stöhr, 1984; Henriques, 1987).
Os trabalhos sobre a dependência e o crescimento das empresas multinacionais, sublinham
quanto os países em vias de desenvolvimento estão limitados na sua “margem de manobra”
(Seer, 1979), por uma estrutura de troca desigual. Como tal, surgiram os que viam a
necessidade de uma nação ou região, tentar reduzir tais relações de dependência, mantendo um
maior controle sobre as suas economias. Adicionalmente, a ideia de uma região parcialmente
fechada foi apresentada por diversos autores no final dos anos 70 (Friedman e Weaver, 1979;
Stöhr e Taylor, 1981). Estas abordagens, defendiam a necessidade de devolver às comunidades
regional e local maior poder, para poderem planear estratégias de desenvolvimento que,
respeitando as suas próprias necessidades, utilizem os seus recursos próprios e minimizem os
efeitos das relações de dependência externas.
O conceito de desenvolvimento endógeno entretanto surgido, procurou fornecer respostas ao
paradigma então dominante, que pressupunha:
- A subalternização dos aspectos estruturais do desenvolvimento, como os políticos,
sociais e ambientais;
- Uma visão economicista de desenvolvimento, assente em processos de acumulação
concentrada de capital;
- A preferência por investimentos em infra-estruturas pesadas, sem atender aos aspectos
qualitativos dos mercados locais de emprego;
- O recurso a estratégias exógenas às economias locais para definição dos recursos a
explorar;
- A imposição de mecanismos de decisão centralizados
Este apontava para a necessidade de políticas regionais cuja finalidade era a mobilização dos
recursos endógenos e das capacidades adaptativa e inovadora regionais (Stöhr, 1987:183).
Segundo este autor, as políticas regionais não se devem basear nos efeitos de dispersão, nos
estímulos resultantes do crescimento económico global, ou em vultuosos apoios financeiros
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
públicos, mas devem: poupar energia e recursos; realizar a mais vasta mobilização e interacção
mútua dos recursos regionais; adoptar estratégias diferenciadas, de acordo com aspectos
regionais específicos, económicos e não económicos, tais como a identidade cultural, estruturas
de participação e condições ambientais; promover o acréscimo das capacidades de solução
autónoma dos problemas regionais (estrangulamentos às exportações e situações-problema),
mais do que esperar que tal aconteça pela acção de factores externos; promover circuitos de
pequena dimensão em termos ecológicos, políticos, económicos e sociais, e ainda aumentar a
flexibilidade do sistema social regional, particularmente as suas capacidades inovadora e
adaptativa; aumentar o papel dos decisores a nível regional e local no processo de
desenvolvimento (Stöhr, 1987:193).
O novo paradigma, territorialista, de conceptualização do desenvolvimento regional, assenta no
pressuposto de que este se alcança através da mobilização integral dos recursos das diferentes
regiões para a satisfação prioritária das necessidades das respectivas populações (Henriques,
1990: 51).
De acordo com a visão perfilhada por Stöhr (1984), este modelo de desenvolvimento
territorialista acentua, sobretudo, a inovação a nível social, político e institucional. A forma
organizativa, apelando à participação alargada das populações, o grau de autonomia decisória
das comunidades locais/regionais e o papel dialogante das suas instituições constituem factores-
chave na estruturação do paradigma. Bassand e Guindani (1981) salientam a importância da
mobilização das energias sociais, numa dinâmica em que a intensificação de relações e de
pertença social não institucionais constituem, igualmente, modos estruturantes do evoluir social.
São valorizados os padrões culturais locais, como a existência de laços comunitários e o espírito
associativo, considerados de significativa importância para atingir os objectivos propostos. Uma
das ideias é que a descentralização, a nível local e regional, da política regional não só valoriza
o papel da administração pública local/regional mas permite ainda a participação das forças
sociais e económicas existentes na elaboração de estratégias de acção. A exploração racional
dos recursos naturais é outra vertente que caracteriza este modelo, acentuando que aqueles
devem constituir matéria-prima fundamental para a satisfação dos mercados locais, dentro do
princípio de uma mobilização integral dos recursos considerada óptima.
O trabalho de Massey tem sido particularmente influente em estudos de caso através da ligação
entre problemas locais e processos económicos mais amplos. Segundo Massey a estrutura
sócio-económica de uma determinada área local será o resultado complexo da combinação dos
diferentes papéis que tal área pode assumir nos contextos nacional e internacional, na divisão
espacial do trabalho (Massey, 1978: 116). Mais uma vez o nível local se torna a escala
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preferencial de análise, onde se traduzem os processos nacional e internacional, evidenciando
como aspectos de diferenciação local interactuam e modificam tais processos.
No mundo contemporâneo, os actuais meios de comunicação deram ao espaço um ascendente
sobre o tempo, enquanto a hiper-mobilidade do capital contrasta com o carácter fixo do factor
trabalho. Desenvolvendo os conceitos de divisão de trabalho de Lipietz (1985), este acentuou o
que considera a importância crescente da diversidade local na fase actual do desenvolvimento
capitalista, mostrando como as regiões são cada vez mais destinadas a um papel de
fornecedores de trabalho excedentário e, assim, menos integradas no processo de produção do
capital. Tais alterações têm, segundo este autor, quatro consequências importantes: alarga a
dicotomia entre o capital operando localmente e o capital nacional e internacional, que
transcendem o nível local; aumenta as possibilidades de aliança entre os residentes localmente,
diminuindo a influência das posições de classe; reforçando a influência local do trabalho e das
classes intermédias, enquanto se reduz a sua influência em termos nacionais e regionais; e,
finalmente, os locais competirão para mostrar o seu carácter distinto e a melhor qualificação da
sua força de trabalho.
1.3.3 A mobilização integral dos recursos regionais e locais para o desenvolvimento endógeno
O processo de desenvolvimento regional é cada vez mais endógeno às regiões a desenvolver e
grande parte da sua eficácia resulta da possibilidade de se conseguir a mobilização dos recursos
naturais e humanos existentes na região. A mobilização do potencial endógeno de uma
comunidade territorial para a satisfação prioritária das necessidades dos membros dessa
comunidade constitui, em síntese, a ideia central da proposta de um desenvolvimento regional
endógeno (Stöhr, W., 1981b). A constatação de que as desigualdades espaciais não têm vindo a
ser reduzidas através de uma maior integração funcional em mecanismos económicos de grande
escala (Stöhr, W., Tödtling, F., 1976; Stöhr, W., Tödtling, F., 1977), a constatação de que esse
tipo de integração espacial conduz inevitavelmente à desintegração regional (Stöhr, W., 1981b),
e as alterações gerais da conjuntura internacional após 1970 que caracterizam o actual contexto
de “crise” (Stöhr, W., 1984) têm vindo a estimular a hipótese de que um “estilo” alternativo de
desenvolvimento assentará na sua integração territorial através de estratégias de
desenvolvimento regional endógeno.
A integração territorial do desenvolvimento será determinada a partir do interior de cada
sociedade territorialmente organizada aos níveis local, regional e central, em estreita relação
com quadros culturais específicos e situações históricas concretas.
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A política de desenvolvimento deverá orientar-se, prioritariamente, para os problemas de
pobreza e deverá ser desencadeada e controlada de “baixo para cima”. As estratégias
resultantes serão orientadas para a satisfação de necessidades básicas, para actividades
económicas de pequena-escala e trabalho-intensivo, baseadas nos recursos regionais e em
tecnologias apropriáveis.
Walter Stöhr (1981a) defende que se trata simultaneamente de uma nova estratégia e de uma
nova ideologia do desenvolvimento. A concepção de desenvolvimento que partilha define-a
como um processo integral de expansão de oportunidades para os indivíduos, grupos sociais e
comunidades organizadas territorialmente, às escalas pequena e intermédia, através da
mobilização integral das suas capacidades e recursos para benefício comum em termos sociais,
económicos e políticos. Trata-se de um desenvolvimento endógeno determinado ao nível da
menor escala territorial possível e a partir da identidade territorial das populações. A proposta de
um desenvolvimento regional endógeno vem ao encontro do pressuposto de que é ao nível local
que o desenvolvimento se torna real. Às comunidades locais, como formas de organização
humana à menor escala territorial, é reconhecido um papel-chave na mobilização integral de
recursos disponíveis a partir de formas de motivação endógena (Stöhr, W., 1981a), e no controlo
dos efeitos de retroacção entre o crescimento económico e as dimensões ambientais, socio-
cultural e político-institucional do processo de desenvolvimento (Stöhr, W., 1984). Enquanto
dimensão local do processo de desenvolvimento, o desenvolvimento local respeitará a um
processo de diversificação e de enriquecimento das actividades económicas e sociais sobre um
território, a partir da mobilização e da coordenação dos seus recursos e das suas energias. Será
o produto dos esforços da sua população e pressuporá a existência de um projecto de
desenvolvimento que integre as suas componentes económicas, sociais e culturais e fará de um
espaço de contiguidade física um espaço de solidariedade activa. Henriques (1987) indica que o
processo de desenvolvimento passa a ser reequacionado pela própria comunidade
Local/Regional partindo, de dentro para fora, através da mobilização do seu potencial endógeno.
Em síntese, a participação das comunidades locais no processo de desenvolvimento encontra a
sua legitimação:
- Na resposta à diferenciação espacial da insatisfação de necessidades básicas tal como é
efectivamente vivida ao nível de contextos socio-comunitários de base territorial
facilitando a institucionalização de processos adequados à tomada de consciência, à
expressão da insatisfação dessas necessidades e à procura das formas de acção
colectiva ou individual para a superação dessa insatisfação;
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
- Na resposta à mobilização integral de recursos locais para a satisfação prioritária das
necessidades básicas das populações locais, na integração dos fenómenos globais de
“mudança” inerentes ao processo de desenvolvimento no contexto dos valores culturais
locais, e no aumento da capacidade de autonomia das comunidades territoriais de
pequena-escala (Silva, M., 1983).
O desenvolvimento regional endógeno implica a mobilização das colectividades locais de tal
forma que elas geram seu próprio desenvolvimento. Estamos a viver um período de
transformação em termos do que é hoje a política de desenvolvimento regional. Estamos a
lançar uma rede de iniciativas de desenvolvimento local, que necessariamente terão de nascer
de baixo para cima, que têm de ter uma lógica de desenvolvimento integrado e que,
principalmente, têm que envolver uma profunda mobilização social.
1.4 Desenvolvimento local/rural
No quadro das mutações profundas que se têm vindo a operar nas décadas de 70 e 80 e
assumindo particular incidência na presente década, a noção de desenvolvimento local tem-se
constituído como a referência base da defesa de um paradigma alternativo de desenvolvimento,
distinto da concepção ainda dominante de uma dinâmica centralizada e uniformizada. A política
de desenvolvimento local surge como a resposta activa dos espaços locais aos desafios globais
que enfrentam, assente em quatro referências de base (Yruela e Guerrero, citado por Mª. João e
Alcides Monteiro, 1995: 106):
- A ideia de desenvolvimento local passa pela recuperação de recursos inactivos,
actividades produtivas até então pouco potenciadas e que são fontes possíveis de
riqueza, explorando as oportunidades que são oferecidas por novas tecnologias, pela
melhoria das comunicações, pela abertura de novos mercados e alteração na procura,
pela reorganização dos processos produtivos;
- A descoberta dessas possibilidades não só nos espaços já identificados como potenciais
mas ainda escassamente explorados, mas igualmente em outras áreas territoriais ainda
não enquadradas num esforço de desenvolvimento;
- Uma tónica fundamental na identificação, estímulo e apoio aos actores com capacidade
para levar a cabo essas actividades;
- a concepção do desenvolvimento local como um mobilizar deste conjunto de factores no
contexto local, através de processos de intervenção económica e social com certas
garantias de viabilidade. O que certos autores designam por mobilização do potencial
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
endógeno passa pela mobilização integral dos recursos naturais, humanos e
institucionais de cada espaço local, com benefícios em primeira instância para esse
mesmo espaço.
De acordo com esta concepção, Desenvolvimento Local surge como um processo de
diversificação e enriquecimento das actividades económicas, sociais e culturais num
determinado território a partir da mobilização, animação e coordenação dos seus recursos
disponíveis, sejam eles naturais, humanos, culturais, financeiros ou institucionais, congregando
para tal as energias dos diferentes actores ou intervenientes. Assim, o desenvolvimento local
surgirá como o produto dos esforços destes actores e pressuporá a existência de um projecto de
desenvolvimento multidimensional, integrando as componentes económicas, sociais e culturais e
os diferentes parceiros sociais fazendo de um espaço de contiguidade física um espaço de
solidariedade activa (Frège, X., 1986), através da participação das comunidades locais.
Entendendo a participação como organização autónoma e voluntária para defesa de interesses
ou para a concretização de objectivos comuns. Sendo certo que só as ocorrências que se
prendem com o quotidiano têm capacidade transformadora da realidade social, é ao nível local
que o desenvolvimento se torna real, efectivo (Henriques, J. M., 1990).
Segundo Simões Lopes (1987) o desenvolvimento só faz sentido em função das pessoas e em
função das pessoas onde elas vivem. Este desenvolvimento também só faz sentido se valorizar
os recursos endógenos, incluindo nestes os patrimónios natural e histórico e os recursos
humanos, com as suas capacidades de iniciativa, culturas específicas, saberes-fazer de cada
um e das comunidades e se se mantiverem os equilíbrios ambientais.
Ao falarmos de desenvolvimento local, a primeira questão a definir é o que entendemos por
local. Esta realidade, de contornos difusos e que não se compadece com rígidas demarcações
geográficas ou administrativas, enquadra-se tanto nos contextos rurais, como nos urbanos. O
local pode ser definido como um espaço de geometria variável caracterizado pela sua
homogeneidade económica, social, cultural e política e com identidade, garantindo um forte grau
de legitimidade às políticas públicas. A fronteira da comunidade local é delimitada pelo
sentimento de pertença ou identidade, conferido pela naturalidade ou residência, e pelo sentir,
que sendo também um estar, leva um indivíduo a entender o lugar como seu e a referenciar
como vizinho os que se identificam pela mesma pertença. O sentimento de pertença sustenta a
construção da confiança e de solidariedades, afirma a dimensão crucial do participar na vivência
da comunidade.
A dimensão do Desenvolvimento Local, ancorada no sentimento de pertença, concretiza-se
através de três elementos: pequenas e muito pequenas empresas; serviços de proximidade e de
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base local; património construído e natural. É no apoio e na dinamização concertada destes três
elementos, servidos por infra-estruturas físicas adequadas e sistemas de comunicação como
instrumentos facilitadores, que se pode alcançar os objectivos do desenvolvimento local que, por
seu lado, mantém e consolida a dinâmica do sentimento de pertença.
O desenvolvimento local deve ser assumido como processo pessoal e colectivo de criação de
condições de vida e de realização de cada pessoa e de cada agregado social, num nível
considerado satisfatório (Hugues de Varine et al., 1993). Nesta perspectiva, quatro
características básicas identificam assim o desenvolvimento local:
- O reconhecimento de cada pessoa e dos agregados sociais de que faz parte, na
qualidade de agente por excelência e destinatária dos processos de desenvolvimento.
Daí a relevância do espírito de iniciativa, da cooperação ou parceria e da participação;
- A procura sistemática da satisfação de necessidades e da realização de aspirações, com
prioridade para as mais graves e para as mais comuns; a utilização das potencialidades
existentes no próprio meio, sem prejuízo do contributo do exterior. Revelam-se em
especial os recursos naturais, os conhecimentos herdados do passado ou adquiridos no
presente, as artes artesanais e as actividades resultantes da inovação local;
- A integração solidária de cada pessoa e iniciativa no esforço de desenvolvimento local e,
por sua vez, a integração deste nos processos de âmbito regional, sectorial, nacional e
comunitário.
Destas quatro características decorre que o desenvolvimento deixará de ser local sempre que
deixe à margem algumas pessoas ou grupos e que sacrifique a esfera social à económica.
Devido ao carácter social e/ou socio-económico do desenvolvimento local, é importante que
nele, se observe uma interacção permanente com a esfera económica (Albert Meister, 1969) de
tal modo que esta assuma as exigências decorrentes da satisfação das necessidades humanas
e da realização de aspirações. Assim, o desenvolvimento local implica crescimento económico,
mas também uma produção social importante. Ele mobiliza uma grande diversidade de actores,
tais como: empresários individuais prontos a participarem no fornecimento de bens colectivos,
instituições sócio-económicas e agentes de desenvolvimento local.
À medida que nos aproximamos de um ambiente do mundo real torna-se necessário clarificar se
a realidade local é dominada pelo meio urbano ou pelo meio rural. Assim iremos abordar a
dimensão rural do desenvolvimento local. Não vamos precisar categoricamente o termo rural,
muito menos quando numerosos autores (George, P., 1963, Jung, J., 1972, Chisholm, M., 1973,
Labasse, J., 1973, De Farcy, H., 1975, Clout, H.D., 1976, Gómez Orea, D., 1985) centraram
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nisso as suas investigações sem conseguirem uma definição homogénea e claramente limitada,
sendo antes um termo mais intuitivo que discursivo. Além disso devemos questionar-nos o que é
que entendemos por campo ou paisagem rural, num mundo cada dia mais virado para a
urbanização e no qual a agricultura perde constantemente terreno. Não obstante todos os
investigadores coincidirem em dizer que o território rural é um sistema constituído por um
conjunto de factores estreitamente interrelacionados e interactuantes, onde confluem elementos
de tipo meio ambiental, económico, administrativo, social e cultural. No entanto, nos últimos
tempos, é cada vez mais difícil estabelecer nítidas barreiras entre o rural e o urbano, já que a
maior conexão entre as suas respectivas sociedades está a dar lugar a um novo conceito
denominado “rurbanização”, onde não se considera o campo isolado da cidade mas sim como
dois entes territoriais que mantêm relações de reciprocidade e interdependência (Castells, M.,
1979), que anunciam uma sociedade integrada e dual (Rambaud, P., 1969), onde o espaço rural
tem outra utilização além da agrária como a relacionada com o ócio e o lazer, os parques
naturais, as reservas, os transportes e mesmo a função residencial. Hoje o espaço rural é
entendido num sentido moderno, quer dizer um espaço que possui outras funções a par das
agrícolas, ainda que logicamente conte com alguns centros de conotações urbanas que se
encarregam de articular e abastecer o território.
A existência de descontinuidade espacial entre cidade e campo deixa de ter sentido. O rural e o
urbano forma um sistema contínuo, um espectro, que comporta diferentes níveis de actividade
social e económica, mais elevados no urbano e inversamente no rural. Muitas pessoas
pertencem ao mesmo tempo à sociedade aldeã e à sociedade urbana, pessoas a residir no
mesmo lugar são desigualmente urbanas ou rurais. Os modos de vida não têm a ver com a
localização mas com a classe social e a posição das pessoas no ciclo da família. Assim,
podemos aceitar que o espaço rural se distingue por densidade relativamente fraca dos
habitantes e das construções, fazendo aparecer uma preponderância das paisagens de
cobertura vegetal; uso económico de dominante agro-silvo-pastoril; modo de vida dos habitantes
caracterizado pela sua relação particular com o espaço; identidade e representação específicas
fortemente conotadas com a cultura camponesa (B. Kayser, 1990: 13).
Mas a noção de mundo rural implica ainda mais, refere-se a todo um tecido económico e social
compreendendo um conjunto de actividades das mais diversas: agricultura, artesanato,
pequenas e médias indústrias, comércios, serviços. E, como zona tampão e espaço de
regeneração, é indispensável ao equilíbrio ecológico e torna-se cada vez mais lugar de
acolhimento privilegiado para o repouso e o recreio (CEE, 1988: 15).
A sociedade local é o domínio do pequeno, do micro em relação ao macro, o lugar da diferença
e da especificidade, o lugar onde a acção e o pensamento sociais entram em contacto com a
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matéria, (Kayser, 1990: 213), onde se manifesta uma identidade colectiva e certa solidariedade,
pelo menos no sentido de consciência colectiva dos problemas. Porém, é necessário haver
convergência das iniciativas locais, endógenas, com os estímulos exógenos, sejam estes de
proveniência estatal, sócio-profissional, sectorial público, empresarial, de propagação
descendente, para a concretização de projectos capazes de promover o progresso. Esta
dinâmica endógena deve procurar o encontro com as forças exógenas: para se fazer
reconhecer, para fazer admitir a sua capacidade, para, enfim, obter os meios indispensáveis, o
actor colectivo do desenvolvimento local não apenas recorre aos poderes públicos ou ao
investimento privado mas ainda desliza pelas estruturas institucionais (Kayser, 1990: 217).
Para a revitalização e o desenvolvimento das regiões rurais evoca-se a necessidade de manter
as populações existentes, através de uma agricultura de qualidade, do reforço do artesanato, de
pequenas indústrias e da fileira floresta-madeira, de assistência de serviços e recurso a novas
tecnologias de informação e telecomunicação e também de formação pós-escolar e profissional,
de promoção do turismo rural (conservação do património natural, paisagístico e cultural,
incluindo tanto o construído como o folclórico).
Desenvolvimento rural endógeno não pode significar desenvolvimento puramente auto centrado.
Significa valorização óptima das potencialidades de uma dada região: espaço natural e beleza
da paisagem, produtos agrícolas e florestais específicos, de qualidade, especialidades
gastronómicas, tradições culturais e artesanais, património arquitectural e artístico, ideias
inovadoras, disponibilidades de mão-de-obra, indústria e serviços já existentes e isso
mobilizando os recursos financeiros e humanos disponíveis na região e canalizando do exterior
os meios que faltam sob a forma de capitais ou de serviços de animação e de estudo (OCDE,
1988: 49-50). O futuro do mundo rural passa largamente pelo deslizar duma parte dos nossos
agricultores para a noção, mais adaptada à realidade económica dos nossos dias, de empresário
rural, vendendo bens e serviços para os quais existe uma procura (René Souchon, 1988: 17).
Neste cenário, a revolução tecnológica e a procura de inovação vão-se constituir como cerne do
sucesso da política de desenvolvimento regional. As regiões que estarão melhor colocadas na
batalha da sobrevivência, numa época em que as mudanças estruturais se processam a um
ritmo vertiginoso, serão as que puderem compensar a retracção dos mercados tradicionais pela
conquista de novos mercados, por modificações tecnológicas nas suas produções e pelo fabrico
de novos produtos.
Nos nossos dias o conceito de desenvolvimento apela a uma nova cultura de desenvolvimento, a
uma nova filosofia de formação profissional e a uma nova visão de inovação. Esta é fomentada
através do diálogo institucional, criador de sinergias, entre o aparelho produtivo e o meio
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académico/centros de investigação, sendo que as iniciativas empresariais inovadoras são
sustentadas pelo apoio do capital de risco regional. A inovação passa, pois, a ser a energia do
próprio processo de desenvolvimento regional.
1.5 Abordagem às etapas do desenvolvimento regional
No novo contexto sócio-económico, as políticas regionais são forçadas a procurar novos
caminhos. Havendo crescente dificuldade em distribuir espacialmente o crescimento, porque
inexistente ou parco, a questão fundamental para o desenvolvimento regional deixa de ser a
capacidade da região para atrair novos projectos, para ser a das capacidades das regiões para
gerar internamente as condições de transformação das suas estruturas produtivas (Baptista,
1985: 25). Isto é, a questão fulcral passou a ser a do desenvolvimento regional endógeno, em
contraponto ao paradigma funcionalista anterior. Pressupõe-se um controle territorial das
economias regionais, tendo em vista o aumento da eficiência global de todos os factores
produtivos, e a sua estratégia baseia-se na utilização de PME’s, que aparecem,
preferencialmente, por iniciativa de agentes locais de desenvolvimento, visando a retenção dos
valores acrescentados dentro da própria região (Stöhr, 1984; Henriques, 1987).
A teoria de desenvolvimento endógeno procurou fornecer respostas ao paradigma então
dominante, que pressupunha:
- A subalternização dos aspectos estruturais do desenvolvimento, como os políticos,
sociais e ambientais;
- Uma visão economicista de desenvolvimento, assente em processos de acumulação
concentrada de capital;
- A preferência por investimentos em infra-estruturas pesadas, sem atender aos aspectos
qualitativos dos mercados locais de emprego;
- O recurso a estratégias exógenas às economias locais para definição dos recursos a
explorar;
- A imposição de mecanismos de decisão centralizados.
O novo paradigma, territorialista, de conceptualização do desenvolvimento regional, assenta no
pressuposto de que este se alcança através da mobilização integral dos recursos das diferentes
regiões para a satisfação prioritária das necessidades das respectivas populações (Henriques,
1990: 51).
18
Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
De acordo com a visão perfilhada por Stöhr (1984), este modelo de desenvolvimento
territorialista acentua, sobretudo, a inovação a nível social, político e institucional. A forma
organizativa, apelando à participação alargada das populações, o grau de autonomia decisória
das comunidades locais/regionais e o papel dialogante das suas instituições constituem factores-
chave na estruturação do paradigma. Bassand e Guindani (1981) salientam a importância da
mobilização das energias sociais, numa dinâmica em que a intensificação de relações e de
pertença social não institucionais constituem, igualmente, modos estruturantes do evoluir social.
São valorizados os padrões culturais locais, como a existência de laços comunitários e o espírito
associativo, considerados de significativa importância para atingir os objectivos propostos. Uma
das ideias é que a descentralização, a nível local e regional, da política regional não só valoriza
o papel da administração pública local/regional mas permite ainda a participação das forças
sociais e económicas existentes na elaboração de estratégias de acção. A exploração racional
dos recursos naturais é outra vertente que caracteriza este modelo, acentuando que aqueles
devem constituir matéria-prima fundamental para a satisfação dos mercados locais, dentro do
princípio de uma mobilização integral dos recursos considerada óptima.
A par desta atitude mais defensiva de encarar o planeamento do desenvolvimento regional surge
uma outra, a partir de meados dos anos oitenta que, não levantando obstáculo à crescente
internacionalização da economia, aponta como grande arma a inovação. As regiões que estarão
melhor colocadas na batalha da sobrevivência, numa época em que as mudanças estruturais se
processam a um ritmo vertiginoso, serão as que puderem compensar a retracção dos mercados
tradicionais pela conquista de novos mercados, por modificações tecnológicas nas suas
produções e pelo fabrico de novos produtos.
Neste cenário, a revolução tecnológica e a procura de inovação vão-se constituir como cerne do
sucesso da política de desenvolvimento regional. A inovação passa a ser fomentada através do
diálogo entre o meio académico e o meio empresarial.
Como acentua Rodrigues (1991), os factores de vantagem competitiva são cada vez mais
factores avançados (tais como o sistema de I&D, os recursos humanos muito qualificados), e
não apenas factores de base (como os recursos materiais, a rede de transportes e
comunicações, uma mão-de-obra escolarizada). Aparecem, neste quadro, dispositivos
institucionais conceptualizados e implementados para produzirem de forma alargada estes
factores avançados, como o sistema de I&D e o sistema de ensino-formação.
Nos nossos dias o conceito de desenvolvimento apela a uma nova cultura de desenvolvimento, a
uma nova filosofia de formação profissional e a uma nova visão de inovação. Esta é fomentada
através do diálogo institucional, criador de sinergias, entre o aparelho produtivo e o meio
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académico/centros de investigação, sendo que as iniciativas empresariais inovadoras são
sustentadas pelo apoio do capital de risco regional. A inovação passa, pois, a ser a energia do
próprio processo de desenvolvimento regional.
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vol. 01, jan. / jun. 2007 ISSN 0000-0000 - v. eletrônica
AVALIAÇÃO DA ESTABILIDADE DO BETA NO MODELO CAPM (CAPITAL ASSET PRICE MODEL)
Emanoel Francisco dos Santos1
Professor de Economia e Administração Financeira Faculdades Integradas da Vitória de Santo Antão. Fábio Lúcio Rodrigues 2
Mestrando em Economia de Empresas PPGE/UFPB.
RESUMO
O objetivo deste trabalho é estimar e analisar o risco sistêmico (beta) do modelo CAPM (Capital
Asset Pricing Model) proposto por Sharpe (1964) de cinco empresas brasileiras representativas
de setores diversos da economia nacional, verificando a relação entre o coeficiente estimado e o
contexto econômico geral e específico à cada empresa. São realizados, também, testes de
hipóteses para verificar a validade do modelo no mercado brasileiro de ações. O período da
amostra está compreendido entre os anos de 2000 e 2004 e caracteriza-se por estabilidades
político-econômicas diversas (crise argentina, atentados terroristas aos EUA, recessão da
economia mundial, eleições presidenciais no Brasil). O retorno real das ações é comparado ao
desempenho do Ibovespa, utilizado aqui como Proxy da carteira de mercado brasileira.
Comparando os resultados obtidos ano a ano com o resultado do período completo, encontram-
se evidências suficientes para afirmar que o beta se mantém relativamente estável para este
período e esta amostra, com apenas três exceções (2000 para a Ambev PN, 2002 para o
Itaubanco PN e, 2003 para a Belgo Mineira PN), provavelmente devido a instabilidades político-
econômicas relativas ao mercado brasileiro e mundial no período.
PALAVRAS CHAVE: Precificação de Ações, CAPM e Fronteira Eficiente.
CLASSIFICAÇÃO JEL: G1, G11, G12
1 Email: [email protected] / [email protected] Email: [email protected]
1
ABSTRACT
The objective of this work is to estimate and to analyze the systemic risk (beta) of the CAPM
(Capital Asset Pricing Model) proposed by Sharpe (1964) of five Brazilian companies
representative of several sections of the national economy, verifying the relationship between the
coefficient estimated and the general and specific economical context to each company. They
are accomplished, also, tests of hypotheses to verify the validity of the model in the Brazilian
market of stocks. The period of the sample is understood among the years of 2000 and 2004
and it is characterized by several political-economical stabilities (Argentinean crisis, attacks
terrorists to the USA, recession of the world economy, presidential elections in Brazil). The real
return of the stocks is compared to the performance of Ibovespa, used here as Proxy of the
Brazilian portfolio market. Comparing the results obtained year to year with the result of the
complete period, they are enough evidences to affirm that the beta stays relatively stable for this
period and this sample, with only three exceptions (2000 for Ambev PN, 2002 for Itaubanco PN
and, 2003 for Belgo Mineira PN), probably due to political-economical instabilities relative to the
Brazilian and world market in the period.
KEY WORDS: Pricing of Stocks, CAPM, and Efficient Boundary. JEL CLASSIFICATION: G1, G11, G12 INTRODUÇÃO
Desde a década de 1950 que existe uma preocupação por parte dos teóricos em
finanças para identificar a relação existente entre risco e retorno na moderna teoria financeira,
mais precisamente no que diz respeito à Teoria da Carteira. Em seu trabalho pioneiro,
Markowitz (1952) desenvolveu um modelo no qual os resultados (lucros) dos investidores são
otimizados com base na diversificação dos ativos. Esse processo de diversificação reduz o risco
específico à cada empresa da carteira, na medida em que o capital será aplicado em títulos de
diferentes empresas, formando, com isso, uma carteira eficiente. Porém, mesmo que o
investidor diversifique a aplicação dos seus recursos de maneira eficiente, ainda existe o risco
relacionado com o contexto econômico como um todo. Esse risco, chamado risco sistêmico
(beta), pode comprometer a taxa de retorno que o aplicador de recursos espera ter sobre
determinado ativo.
O problema de avaliação do risco sistêmico foi resolvido por William F. Sharpe em
seu artigo seminal de 1964 intitulado Capital asset prices: A theory of market equilibrium under
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condition of risk. Neste trabalho, Sharpe desenvolveu um modelo que proporciona ao investidor
uma previsão, relativamente precisa, da relação entre o risco de um ativo e seu retorno
esperado. O modelo proposto por Sharpe (1964), o qual ficou conhecido na literatura financeira
como CAPM (Capital Asset Pricing Model), nos permite calcular uma taxa de retorno de
referência para a avaliação de possíveis investimentos com riscos mais baixos.
De acordo com o CAPM, a determinação de uma carteira eficiente será baseada na
avaliação do risco sistêmico (da carteira), já que o risco específico aos títulos que compõem a
carteira pode ser quase que totalmente eliminado por meio da técnica de diversificação proposta
por Markowitz (1952).
Alguns trabalhos foram realizados com o intuito de verificar a validade do modelo
para o mercado brasileiro. Cecco (1989), Leoncine (1999) e Mellone (1999) realizaram diversos
testes neste sentido, contudo não obtiveram evidências suficientes que comprovasse ou
descartasse a aplicabilidade do CAPM no mercado nacional. Ventura, Forte e Fama (2001) ao
analisar o comportamento de três empresas representativas de setores diversos da economia,
concluíram ser possível admitir um beta estável para a amostra analisada, com poucas
exceções. Já Carareto (2002), utilizando testes de hipóteses estatísticos para verificar a
estabilidade do beta em dois sub-períodos de uma mesma amostra com cinco empresas
diferentes, conclui não ser possível afirmar, com convicção, que há estabilidade do beta durante
o período considerado.
No âmbito internacional pode-se destacar o trabalho de Blume (1968) no qual se
verifica betas estáveis para diversas empresas entre os anos de 1927 e 1960. Outro relevante
estudo foi feito por Francis (1979) ao analisar 750 empresas no período de cinco anos e concluir
que, apesar dos desvios-padrão serem relativamente estáveis, os betas não são. Contudo,
neste mesmo trabalho, o autor sugere que o risco intertemporal apresenta relativa estabilidade,
sendo portanto, passível de análise mais aprofundada.
Neste sentido, o presente trabalho se propõe a estimar o risco sistêmico (beta) de
cinco empresas brasileiras de setores diversos da economia no período de cinco anos (2000-
2004), analisando a relação entre o beta estimado e o contexto econômicos geral e específico à
cada empresa, referente ao período da amostra. Também será testada a hipótese de que os
comportamentos de cada uma das cinco empresas em questão sigam o modelo de precificação
de ativos proposto por Sharpe (1964), analisando estatisticamente os estimadores obtidos por
meio do pacote econométrico Eviews 4.
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1 REFERENCIAL TEÓRICO
Em seus estudos, Markowitz observou que ao tentar minimizar a variância de uma
carteira “não é suficiente investir em muitos ativos. É necessário evitar investir em ativos com
covariância alta entre si” (NEVES, 2003, p. 7). Neste sentido, Markowitz (1952) desenvolveu um
modelo no qual é possível identificar um conjunto de carteiras que proporciona ao investidor o
maior retorno a um dado nível de risco, ou de maneira análoga, o menor risco dado um
determinado retorno. A análise da relação entre risco e retorno leva à determinação de uma
fronteira eficiente, na qual um investidor que se preocupa apenas com esta relação deverá
limitar sua escolha. Contudo, a técnica de diversificação proposta por Markowitz reduz apenas o
risco específico da carteira.
Foi então que Sharpe (1964) apresentou um modelo onde as ações apresentam co-
movimentos com o mercado. Em seu modelo, Sharpe supõe que,
Os retornos dos títulos são linearmente relacionados às flutuações de um índice
de mercado amplo com um grau conhecido de sensibilidade e, adicionalmente,
retornos específicos dos títulos são gerados com uma média e uma variância
conhecidas. Com apenas três parâmetros por título, as tarefas de medir o risco
e otimizar a carteira eram fortemente simplificadas (NEVES, 2003, p. 8).
Essa relação entre o retorno dos títulos e as flutuações de mercado ficou conhecida
como risco sistêmico, sendo, portanto, adicionado ao risco específico da carteira. Dado que, “o
risco total de um ativo é igual ao seu risco específico mais o seu risco sistemático” (CARARETO,
2002, p. 2) - como mostrado na equação ( )1 -, então, o risco inerente à economia como um todo
permanece latente na carteira eficiente, conforme está demonstrado no Gráfico 1.
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GRÁFICO 1 RISCO ESPECÍFICO E SISTÊMICO
σ
Risco específico
Risco sistêmico ativos
O risco total é dado, então, por:
[ ] [ ] [ ]
[ ] co s
i im m i
i ris istêmico risco diversificável
Var R Var R Var e
Var R
β
+
= +
=
( )1
Desta forma, se “o risco específico de um ativo pode ser reduzido consideravelmente
com a diversificação, é possível presumir que os investidores não exigem um prêmio de risco
como compensação para manter esse tipo de risco” (CARARETO, 2002, p. 8). Os investidores
“precisam ser compensados apenas por manterem o risco sistemático, o qual não pode ser
reduzido pela diversificação” (CARARETO, 2002, p. 8).
O modelo básico do CAPM proposto por Sharpe assume a existência de um ativo
livre de risco. Segundo Campbell, Lo e Mackinlay (1997), o modelo CAPM é dado por:
[ ] [ ]( )i f im m fE R R E R Rβ= + −
( )2
[ ][ ]
,i mim
m
Cov R RVar R
β =
( )3
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Onde:
[ ]iE R → Retorno esperado do ativo i no tempo t
iR → Retorno do ativo i
fR → Retorno do ativo livre de risco
mR → Retorno de mercado
imβ → Beta ou risco sistêmico
[ ]mVar R → Variância do mercado
[ ]( m f )E R R− → Prêmio de risco da carteira de mercado
( )2De acordo com a equação , o retorno sobre qualquer ativo excede a taxa de
retorno livre de risco por um prêmio igual à medida de risco sistêmico (beta) do ativo vezes o
prêmio de risco da carteira de mercado. Assim,
O prêmio de risco sobre os ativos individuais será proporcional ao prêmio de
risco sobre a carteira de mercado e ao coeficiente beta do título na carteira de
mercado. Isso implica que a taxa de retorno na carteira de mercado é um fator
único do mercado de títulos. O beta mede a extensão na qual os retornos sobre
as ações reagem aos retornos da carteira de mercado (BODIE, KANE,
MARCUS, 2000, p.219).
A relação entre o retorno esperado e o beta também pode ser representada pela
Linha do Mercado de Títulos (LMT), conforme mostrado no Gráfico 2. A inclinação da LMT é
dada pelo prêmio de risco da carteira de mercado.
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GRÁFICO 2 LINHA DO MERCADO DE TÍTULOS
[ ]iE R
LMT
mR
M → Carteira de Mercado
fR
β
De acordo com Carareto (2002), há três aspectos importantes associados à LMT.
São eles:
1. Quando β = 0, o retorno esperado de um ativo é dado pela taxa de retorno livre de risco,
fR , ou seja, seu risco é irrelevante.
2. Quando β = 1, o retorno esperado de um ativo é dado pelo prêmio de risco da carteira de
mercado.
3. A relação entre retorno esperado e beta é linear, isto é, é dada por uma linha reta. Como
o beta é a medida de risco apropriada, os ativos com betas maiores exigem maiores
retornos esperados.
Outra característica interessante do modelo CAPM diz respeito ao beta como medida
da sensibilidade relativa da taxa de retorno, i, às variações da taxa de retorno da carteira de
mercado. Desta forma, quando β < 0, o ativo é dito defensivo; e quando β > 0, o ativo é
chamado de agressivo. Assim,
Um ativo com beta igual a 1,44 deverá ter, a priori, 1,44% de variação de seu
valor (para cima ou para baixo) na mesma direção de variações de um ponto
percentual no valor da carteira de mercado. E é agressivo porque aplicar nesse
ativo é assumir a possibilidade de variações mais do que proporcionais à media,
que por sua vez é representado pela carteira de mercado (SANVICENTE,
MELLAGI FILHO, 1996, p.48).
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Apesar de ser um modelo amplamente aceito na avaliação de investimentos, o CAPM
sofre duas limitações básicas. A primeira se refere à dependência da carteira teórica de
mercado, que deveria ser composta por todos os ativos passíveis de negociação (ações,
imóveis, derivativos, debêntures, commodities, objetos de arte, etc.) em proporções
correspondentes aos seus valores reais no mercado, algo que na prática é inviável. Assim, é
mais comum a utilização do CAPM na forma de um modelo de índices de preços de ações para
representar o comportamento da carteira de mercado. A segunda limitação refere-se à utilização
de retornos esperados para implementação do modelo. É praticamente impossível obter
expectativas de retornos, qualquer que seja o ativo. Desta forma, faz-se uso dos retornos
realizados dos ativos ao longo do tempo, podendo não ser os mesmos retornos reais
proporcionados pelos mesmos.
2 METODOLOGIA
O período escolhido para análise foi de 03 de janeiro de 2000 à 30 de dezembro de
2004, perfazendo 5 anos com 60 meses de observações diárias, o que parece ser
estatisticamente significante. O período da amostra é caracterizado por instabilidades político-
econômicas diversas (crise argentina, atentados terroristas aos EUA, recessão econômica
mundial, eleições presidenciais no Brasil), fato que nos permite comprovar, ou não, a interação
do modelo com o mundo real. Os dados utilizados são do tipo séries de tempo e suas variações
foram calculadas com base no preço de fechamento diário. Os dados foram coletados a partir
do software Terminal Enfoque.
Os ativos escolhidos para observação são: Petrobras PN, Itaúbanco PN, Telemar PN,
Belgo Mineira PN e Ambev PN. Os ativos em questão representam empresas de diferentes
segmentos da atividade econômica nacional e são representativas em seus setores de mercado
(petroquímico, financeira, telefônico/tecnológico, siderúrgico e de bebidas).
Como Proxy de mercado foi utilizado o Índice da Bolsa de Valores de São Paulo, o
Ibovespa. O Ibovespa é o principal índice do mercado brasileiro de ações e sua determinação
baseia-se no volume de negócios de uma cesta de títulos de empresas com alto valor agregado,
o que o torna, portanto, representativo do comportamento geral do mercado acionário brasileiro.
Para Proxy do ativo livre de risco foi utilizada a variação diária do CDI (Certificado de Depósito
Interbancário).
Segundo Bodie, Kane e Marcus (2000), formalmente o beta é o coeficiente de
regressão do retorno do título no retorno da carteira de mercado. Desta forma, o modelo
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econométrico de estimação adotado neste trabalho é expresso pela seguinte equação de
regressão:
[ ]i im im mE R R itα β ε= + +
( )4
Os testes estatísticos se darão na amostra total de cada empresa (2000-2004) e apresentam-se
de três formas diferentes. Quais sejam:
1. Teste da Restrição : utilizando o modelo de regressão de mercado dado pela
equação e considerando a hipótese nula
( 0α = )
( )4 ( )0α = contra a hipótese alternativa
, teremos que, se for verdadeira, o modelo de regressão de mercado torna-
se:
( 0α ≠ ) 0H
[ ]i im mE R R itβ ε= +
( )5
Para determinar qual hipótese será rejeitada usa-se a estatística t de estudent, a qual é
dada por:
( )ˆ
ˆt
epβ μ
β−
=
( )0β =2. Teste de validade do Modelo de Regressão de Mercado : utilizando o modelo de
regressão de mercado dado pela equação ( e considerando a hipótese nula ( )0β =)4
contra a hipótese alternativa ( )0β ≠ , teremos que, se for verdadeira, o modelo de
regressão de mercado torna-se estatisticamente inválido:
0H
[ ]i imE R itα ε= +
Modelo estatisticamente inválido
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Neste caso, o retorno esperado de um ativo é dado pela taxa de retorno livre de risco, ou
seja, o risco é irrelevante. Para determinar qual hipótese será rejeitada usa-se a
estatística t de estudent, a qual é calculada como descrito anteriormente.
3. Teste da contribuição do ativo à variabilidade do risco da carteira : utilizando o
modelo de regressão de mercado dado pela equação
( 1β = )
( )4 e considerando a hipótese nula
contra a hipótese alternativa ( 1β = ) ( )1β ≠ , teremos que, se for verdadeira, o
modelo de regressão de mercado torna-se:
0H
[ ]i im mE R R itα ε= + +
Neste caso, o retorno esperado de um ativo é dado apenas pelo prêmio de risco da
carteira de mercado, sendo incorporado à carteira ótima apenas o risco específico
inerente ao ativo (o qual pode ser eliminado pela diversificação). Para determinar qual
hipótese será rejeitada usa-se a estatística t de estudent, a qual é calculada como
descrito anteriormente.
3 APRESENTAÇÃO E INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS
3.1 Análise dos betas estimados:
3.1.1 Petrobras PN Nota-se pela Tabela 1 que, no período compreendido entre 2000 e 2004, o risco
sistêmico da empresa não se manteve constante. Nos anos de 2000 e 2001 ocorre uma clara
queda do risco sistêmico da Petrobras que pode ser explicada por causas diversas, entre as
quais: o lançamento de ações da empresa na Bolsa de Valores de Nova York; mudança na
presidência da companhia; e, o maior lucro obtido por uma empresa brasileira até então (quase
10 bilhões de Reais).
TABELA 1 – PETROBRAS PN
Período Beta Int. Confiança de 95%
2000 0,657 [0,534 - 0,780]
2001 0,616 [0,511 - 0,721]
2002 0,828 [0,730 - 0,926]
2003 0,798 [0,690 - 0,906]
2004 0,835 [0,745 - 0,925]
2000-2004 0,734 [0,687 - 0,781]
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Em 2002 o risco sistêmico eleva-se de 0,616 para 0,828 e mantém-se relativamente
alto no restante do período se comparado com o início da década. Os motivos que levaram à
elevação do risco sistêmico a partir de 2002 poderiam ser: as altas sucessivas no preço
internacional do petróleo, o que aumentaria os custos com a importação do insumo; a queda na
produção nacional decorrente do atraso da entrada em operação de novas plataformas; além da
instabilidade política no Oriente Médio.
No período de 2000 a 2004, o beta estimado pelo CAPM foi 0,734, o que parece ser
um valor mediano se comparado com os betas estimados ano a ano. Desta forma, evidencia-se
que o comportamento o ativo Petrobras PN parece seguir o modelo de precificação de ativos de
capital (CAPM).
3.1.2 Itaubanco PN
Conforme pode ser visto na Tabela 2, no período entre os anos de 2000 e 2004, com
exceção de 2002, o risco sistêmico da empresa permanece relativamente constante. As
possíveis causas para a estabilidade do beta estimado neste intervalo de tempo são: as
aquisições de outras instituições bancárias (Banco Fiat, Creditanstalt, Sudaméris, etc.) e a
diversificação das receitas advinda com essas operações; além do lucro recorde de um banco
no setor bancário nacional (3,776 bilhões de Reais).
TABELA 2 – ITAUBANCO PN
Período Beta Int. Confiança de 95%
2000 0,709 [0,572 - 0,846]
2001 0,761 [0,649 - 0,873]
2002 0,923 [0,804 – 1,042]
2003 0,700 [0,579 - 0,821]
2004 0,763 [0,671 - 0,855]
2000-2004 0,778 [0,725 - 0,831]
Diversos fatores influenciaram a alta do risco sistêmico da empresa em 2002. os
mais importantes foram: o medo generalizado por parte dos investidores de que um iminente
governo do Partido dos Trabalhadores (PT) traria colapso financeiro e moratória; a crise
argentina deflagrada em 2001, que causou fortes impactos no sistema financeiro em 2002; e, a
recessão que acometia a economia internacional, agravada pelos atentados terroristas aos
Estados Unidos em setembro de 2001.
O risco sistêmico estimado para o período de 2000 a 2004 foi 0,778. O que, com
exceção de 2002, parece ser um valor relativamente estável se comparado com os betas
11
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estimados ano a ano. Portanto, as evidências apontam que o comportamento do ativo Itaubanco
PN parece seguir o modelo de precificação de ativos de capital (CAPM).
3.1.3 Telemar PN
O risco sistêmico estimado para a empresa apresenta comportamento
significativamente estável, conforme demonstrado na Tabela 3. Isso ocorre devido à solidez da
empresa, que é a maior operadora de telecomunicações do Brasil, presente em 16 estados
atendendo os sistemas de telefonia fixa e celular.
TABELA 3 – TELEMAR PN
Período Beta Int. Confiança de 95%
2000 1,272 [1,157 – 1,387]
2001 1,179 [1,095 – 1,263]
2002 1,224 [1,158 – 1,290]
2003 1,194 [1,108 – 1,280]
2004 1,063 [0,993 – 1,133]
2000-2004 1,191 [1,152 – 1,230]
O beta estimado para o ano de 2004 foi o menor obtido pela empresa em todo o
período da amostra. Algumas possíveis explicações para esse fato são: o aumento de
aproximadamente 250% do lucro neste ano se comparado com o ano anterior; e, o aumento da
receita obtida com os serviços de DDI (Discagem Direta Internacional).
O risco sistêmico obtido na amostra como um todo foi 1,191, e é relativamente
compatível com os betas estimados ano a ano. Sendo assim, as evidências mostram que o
comportamento do ativo Telemar PN segue o modelo de precificação de ativos de capital
(CAPM).
3.1.4 Belgo Mineira PN
O beta estimado para a empresa, conforme Tabela 4, apresenta relativa estabilidade
nos anos de 2000 e 2001. Em 2002 o risco sistêmico decresce e chega a 0,161 em 2003.
Possíveis fatores que determinaram o baixo risco sistêmico em 2003 são: a alta dos preços dos
produtos siderúrgicos no mercado internacional ao longo do ano; e, o expressivo aumento das
exportações, principalmente para a China. O aumento das vendas externas foi ainda maior no
segmento de aços longos, setor onde a Belgo é uma das principais produtoras.
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TABELA 4 – BELGO MINEIRA PN
Período Beta Int. Confiança de 95%
2000 0,434 [0,237 - 0,631]
2001 0,439 [0,302 - 0,576]
2002 0,345 [0,224 - 0,466]
2003 0,161 [0,048 - 0,274]
2004 0,619 [0,514 - 0,724]
2000-2004 0,412 [0,348 - 0,476]
Em relação ao beta estimado para o ano de 2004, o qual apresentou uma forte
elevação se comparado com o ano anterior, pode-se inferir que uma possível causa para este
aumento seria a apreciação do Real frente ao Dólar no ultimo trimestre do ano. Este fato
ocasionou uma alta de preços no mercado de metais de base para a siderurgia, elevando o
custo dos insumos.
Na amostra como um todo observa-se que o risco sistêmico não se manteve estável.
Contudo, o beta estimado para o período, que foi 0,412, parece estar de acordo com a
estimação ano a ano, à exceção de 2003. Desta forma, pode-se concluir que o comportamento
do ativo Belgo Mineira PN segue, de maneira tímida, o modelo de precificação de ativos de
capital (CAPM).
3.1.5 Ambev PN
Vemos na Tabela 5 que o valor estimado do risco sistêmico para o ano de 2000 é
muito baixo e incompatível com o restante da amostra. Este foi o ano de criação da empresa,
fato que pode ter levado o mercado a readaptar suas expectativas quanto às novas
circunstâncias do setor de bebidas, ocasionando um viés na estimação do beta para este ano.
Já no período compreendido entre os anos de 2001 e 2003, o risco sistêmico da companhia
apresenta um comportamento de queda, mantendo-se constante em 2004 no mesmo nível do
ano anterior. Essa queda no nível do risco sistêmico pode ser explicada, entre outros motivos,
por estratégias de crescimento de longo prazo adotadas pela empresa, fator que vem
aumentando sua rentabilidade a cada ano. Outra explicação plausível seria o aumento da
adesão de mais consumidores às marcas produzidas pela Ambev, devido as fortes campanhas
publicitárias promovidas desde a sua criação.
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TABELA 5 – AMBEV PN
Período Beta Int. Confiança de 95%
2000 0,144 [0,013 - 0,275]
2001 0,651 [0,520 - 0,782]
2002 0,534 [0,426 - 0,642]
2003 0,453 [0,335 - 0,570]
2004 0,454 [0,321 - 0,587]
2000-2004 0,447 [0,390 - 0,504]
O fim do movimento de queda do risco sistêmico da empresa em 2004 pode ser
explicado pela fusão da Ambev com a multinacional belga Interbrew. A união das duas
empresas fez cair os preços das ações de ambas no mercado financeiro, provocando um
movimento de cautela por parte dos investidores.
O risco sistêmico estimado para todo o período da amostra foi 0,447, o que parece
ser condizente com os betas estimados ano a ano, à exceção de 2000. Desta forma, pode-se
concluir que o comportamento do ativo Ambev PN parece seguir o modelo de precificação de
ativos de capital (CAPM).
3.2 Testando a Restrição ( ) : 0α =
3.2.1 Petrobras PN
Utilizando o modelo de regressão de mercado dado pela equação e estimando os
coeficientes de regressão, encontra-se a seguinte equação:
( )4
[ ] 0,068 0,734Petrobras mE R R= +
Testando a hipótese:
0
1
: 0: 0
HH
αα=≠
A estatística t estimada por meio do software econométrico Eviews 4 foi de 1,441.
Para rejeitar ao nível de significância de 5% é necessário que 2ˆ (0,025)Tt t −≥0H . O valor t
observado na tabela de distribuição t é de 1,960. Desta forma, tem-se que:
1,441 1,960<
14
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ˆ t 1,960<Como na regressão estimada, então, ao nível de significância de 5%, não se pode
rejeitar a hipótese nula, , e o modelo de regressão de mercado para o ativo Petrobras PN
pode ser definido pela equação ( .
0H
)5
3.2.2 Itaubanco PN
Utilizando o modelo de regressão de mercado dado pela equação e estimando os
coeficientes de regressão, encontra-se a seguinte equação:
( )4
[ ] 0,077 0,778Itaubanco mE R R= +
Testando a hipótese:
0
1
: 0: 0
HH
αα=≠
A estatística t estimada por meio do software econométrico Eviews 4 foi de 1,475.
Para rejeitar ao nível de significância de 5% é necessário que 2ˆ (0,025)Tt t −≥0H . O valor t
observado na tabela de distribuição t é de 1,960. Desta forma, tem-se que:
1,475 1,960<
ˆ t 1,960<Como na regressão estimada, então, ao nível de significância de 5%, não se pode
rejeitar a hipótese nula, , e o modelo de regressão de mercado para o ativo Itaubanco PN
pode ser definido pela equação ( .
0H
)5
3.2.3 Telemar PN
Utilizando o modelo de regressão de mercado dado pela equação e estimando os
coeficientes de regressão, encontra-se a seguinte equação:
( )4
[ ] 0,010 1,191Telemar mE R R= − +
Testando a hipótese:
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0
1
: 0: 0
HH
αα=≠
A estatística t estimada por meio do software econométrico Eviews 4 foi de .
Para rejeitar ao nível de significância de 5% é necessário que
-0,257
2ˆ (0,025)Tt t −≥0H . O valor t
observado na tabela de distribuição t é de 1,960. Desta forma, tem-se que:
-0,257 1,960<
ˆ t 1,960<Como na regressão estimada, então, ao nível de significância de 5%, não se pode
rejeitar a hipótese nula, , e o modelo de regressão de mercado para o ativo Telemar PN pode
ser definido pela equação .
0H
( )5
3.2.4 Belgo Mineira PN
Utilizando o modelo de regressão de mercado dado pela equação e estimando os
coeficientes de regressão, encontra-se a seguinte equação:
( )4
[ ]. 0, 237 0,412B Mineira mE R R= +
Testando a hipótese:
0
1
: 0: 0
HH
αα=≠
A estatística t estimada por meio do software econométrico Eviews 4 foi de 3,710.
Para rejeitar ao nível de significância de 5% é necessário que 2ˆ (0,025)Tt t −≥0H . O valor t
observado na tabela de distribuição t é de 1,960. Desta forma, tem-se que:
3,710 1,960>
ˆ t 1,960>Como na regressão estimada, então, ao nível de significância de 5%, pode-se
rejeitar a hipótese nula, , e o modelo de regressão de mercado para o ativo Belgo Mineira PN
pode, realmente, ser definido pela equação
0H
( )4 . Isso implica, ainda, em um retorno do ativo
acima do retorno da carteira de mercado em torno de 23%.
16
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3.2.5 Ambev PN
Utilizando o modelo de regressão de mercado dado pela equação e estimando os
coeficientes de regressão, encontra-se a seguinte equação:
( )4
[ ] 0,114 0,447Ambev mE R R= +
Testando a hipótese:
0
1
: 0: 0
HH
αα=≠
A estatística t estimada por meio do software econométrico Eviews 4 foi de 2,032.
Para rejeitar ao nível de significância de 5% é necessário que 2ˆ (0,025)Tt t −≥0H . O valor t
observado na tabela de distribuição t é de 1,960. Desta forma, tem-se que:
2,032 1,960>
ˆ t 1,960>Como na regressão estimada, então, ao nível de significância de 5%, pode-se
rejeitar a hipótese nula, , e o modelo de regressão de mercado para o ativo Ambev PN pode,
realmente, ser definido pela equação
0H
( )4 . Isso implica, ainda, em um retorno do ativo acima do
retorno da carteira de mercado em torno de 11%.
3.3 Testando a validade do Modelo de Regressão de Mercado ( )0β = e a contribuição do
ativo à variabilidade do risco da carteira ( )1β = :
3.3.1 Petrobras PN
Com base nos mesmos dados e, portanto, na mesma equação de regressão
estimada anteriormente, serão testadas as seguintes hipóteses:
0
1
: 0: 0
HH
ββ=≠
0
1
: 1: 1
HH
ββ=≠
A estatística t estimada por meio do software econométrico Eviews 4 foi de 30,105.
Para rejeitar ao nível de significância de 5% é necessário que 2ˆ (0,025)Tt t −≥0H . O valor t
observado na tabela de distribuição t é de 1,960. Desta forma, tem-se que:
17
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30,105 1,960>
No que se refere ao teste de validade do Modelo de Regressão de Mercado, como
ˆ t 1,960> na regressão estimada, então, ao nível de significância de 5%, pode-se rejeitar a
hipótese nula, , e a equação de regressão para o ativo Petrobras PN é considerada válida. 0H
Em relação ao teste de contribuição do ativo à variabilidade do risco da carteira, como
ˆ t 1,960> na regressão estimada, então, ao nível de significância de 5%, pode-se rejeitar a
hipótese nula, . Portanto, o retorno esperado do ativo Petrobras PN é uma função do prêmio
de risco da carteira de mercado e do seu risco sistêmico (beta).
0H
3.3.2 Itaubanco PN
Com base nos mesmos dados e, portanto, na mesma equação de regressão
estimada anteriormente, será testada a seguinte hipótese:
0
1
: 0: 0
HH
ββ=≠
0
1
: 1: 1
HH
ββ=≠
A estatística t estimada por meio do software econométrico Eviews 4 foi de 28,587.
Para rejeitar ao nível de significância de 5% é necessário que 2ˆ (0,025)Tt t −≥0H . O valor t
observado na tabela de distribuição t é de 1,960. Desta forma, tem-se que:
28,587 1,960>
No que se refere ao teste de validade do Modelo de Regressão de Mercado, como
ˆ t 1,960> na regressão estimada, então, ao nível de significância de 5%, pode-se rejeitar a
hipótese nula, , e a equação de regressão para o ativo Itaubanco PN é considerada válida. 0H
Em relação ao teste de contribuição do ativo à variabilidade do risco da carteira, como
ˆ t 1,960> na regressão estimada, então, ao nível de significância de 5%, pode-se rejeitar a
hipótese nula, . Portanto, o retorno esperado do ativo Itaubanco PN é uma função do prêmio
de risco da carteira de mercado e do seu risco sistêmico (beta).
0H
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3.3.3 Telemar PN
Com base nos mesmos dados e, portanto, na mesma equação de regressão
estimada anteriormente, será testada a seguinte hipótese:
0
1
: 0: 0
HH
ββ=≠
0
1
: 1: 1
HH
ββ=≠
A estatística t estimada por meio do software econométrico Eviews 4 foi de 59,295.
Para rejeitar ao nível de significância de 5% é necessário que 2ˆ (0,025)Tt t −≥0H . O valor t
observado na tabela de distribuição t é de 1,960. Desta forma, tem-se que:
59,295 1,960>
No que se refere ao teste de validade do Modelo de Regressão de Mercado, como
ˆ t 1,960> na regressão estimada, então, ao nível de significância de 5%, pode-se rejeitar a
hipótese nula, , e a equação de regressão para o ativo Telemar PN é considerada válida. 0H
Em relação ao teste de contribuição do ativo à variabilidade do risco da carteira, como
ˆ t 1,960> na regressão estimada, então, ao nível de significância de 5%, pode-se rejeitar a
hipótese nula, . Portanto, o retorno esperado do ativo Telemar PN é uma função do prêmio
de risco da carteira de mercado e do seu risco sistêmico (beta).
0H
3.3.4 Belgo Mineira PN
Com base nos mesmos dados e, portanto, na mesma equação de regressão
estimada anteriormente, será testada a seguinte hipótese:
0
1
: 0: 0
HH
ββ=≠
0
1
: 1: 1
HH
ββ=≠
A estatística t estimada por meio do software econométrico Eviews 4 foi de 12,488.
Para rejeitar ao nível de significância de 5% é necessário que 2ˆ (0,025)Tt t −≥0H . O valor t
observado na tabela de distribuição t é de 1,960. Desta forma, tem-se que:
12,488 1,960>
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No que se refere ao teste de validade do Modelo de Regressão de Mercado, como
ˆ t 1,960> na regressão estimada, então, ao nível de significância de 5%, pode-se rejeitar a
hipótese nula, , e a equação de regressão para o ativo Belgo Mineira PN é considerada
válida.
0H
Em relação ao teste de contribuição do ativo à variabilidade do risco da carteira, como
ˆ t 1,960> na regressão estimada, então, ao nível de significância de 5%, pode-se rejeitar a
hipótese nula, . Portanto, o retorno esperado do ativo Belgo Mineira PN é uma função do
prêmio de risco da carteira de mercado e do seu risco sistêmico (beta).
0H
3.3.2 Ambev PN
Com base nos mesmos dados e, portanto, na mesma equação de regressão
estimada anteriormente, será testada a seguinte hipótese:
0
1
: 0: 0
HH
ββ=≠
0
1
: 1: 1
HH
ββ=≠
A estatística t estimada por meio do software econométrico Eviews 4 foi de 15,319.
Para rejeitar ao nível de significância de 5% é necessário que 2ˆ (0,025)Tt t −≥0H . O valor t
observado na tabela de distribuição t é de 1,960. Desta forma, tem-se que:
15,319 1,960>
No que se refere ao teste de validade do Modelo de Regressão de Mercado, como
ˆ t 1,960> na regressão estimada, então, ao nível de significância de 5%, pode-se rejeitar a
hipótese nula, , e a equação de regressão para o ativo Ambev PN é considerada válida. 0H
Em relação ao teste de contribuição do ativo à variabilidade do risco da carteira, como
ˆ t 1,960> na regressão estimada, então, ao nível de significância de 5%, pode-se rejeitar a
hipótese nula, . Portanto, o retorno esperado do ativo Ambev PN é uma função do prêmio de
risco da carteira de mercado e do seu risco sistêmico (beta).
0H
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4 CONCLUSÃO
A interpretação dos dados revela que o comportamento dos preços das ações das
cinco empresas analisadas neste trabalho (Petrobras PN, Itaubanco PN, Telemar PN, Belgo
Mineira PN e Ambev PN) obedece aos pressupostos básicos do modelo de precificação de
ativos de capital (CAPM), proposto por Sharpe (1964). Desta forma, é coerente dizer que, para
este período e para a amostra analisada, temos um beta relativamente estável. Os valores
encontrados para os betas anuais são representações satisfatórias do que ocorreu no período
de cinco anos referente à amostra, as exceções se dão em 2000 para a Ambev PN 2002 para o
Itaubanco PN; e, 2003 para a Belgo Mineira PN..
Os possíveis fatores que influenciaram a alta do risco sistêmico do Itaubanco em
2002 foram: o medo generalizado por parte dos investidores de que um iminente governo do
Partido dos Trabalhadores (PT) traria colapso financeiro e moratória; a crise argentina
deflagrada em 2001, que causou fortes impactos no sistema financeiro em 2002; e, a recessão
que acometia a economia internacional, agravada pelos atentados terroristas aos Estados
Unidos em setembro de 2001.
Possíveis fatores que determinaram o baixo risco sistêmico da Belgo Mineira em
2003 são: a alta dos preços dos produtos siderúrgicos no mercado internacional ao longo do
ano; e, o expressivo aumento das exportações, principalmente para a China. O aumento das
vendas externas foi ainda maior no segmento de aços longos, setor onde a Belgo é uma das
principais produtoras.
O baixo valor estimado do risco sistêmico da Ambev em 2000 pode ser devido ao fato
de que este foi o ano de criação da empresa, provocando uma readaptação das expectativas do
mercado quanto às novas circunstâncias do setor de bebidas, ocasionando um viés na
estimação do beta para este ano.
( 0α )=No teste de restrição, , utilizando o Modelo de Regressão de Mercado,
observa-se que apenas as empresas Belgo Mineira PN e Ambev PN rejeitaram a hipótese nula,
0 :H 0α = . Todas as outras empresas - Petrobras PN, Itaubanco PN, Telemar PN - não
rejeitaram a hipótese nula. Isso implica que o retorno das empresas Belgo Mineira PN e Ambev
PN são acima do retorno da carteira de mercado em torno de 23% e 11%, respectivamente.
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
( )0β =Com relação aos testes de validade do Modelo de Regressão de Mercado e
de contribuição do ativo à variabilidade do risco da carteira ( )1β = , observa-se que todas as
empresas rejeitaram as hipóteses nulas, 0 : 0H β = 0 :H 1β = e . Portanto, as equações de
regressão estimadas para todos os ativos são consideradas válidas e, o retorno esperado de
todos os ativos é uma função do prêmio de risco da carteira de mercado e do seu risco sistêmico
(beta), como proposto pelo CAPM.
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23
Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica,
vol. 01, jan. / jun. 2007 ISSN 0000-0000 - v. eletrônica
BREVE DIGRESSÃO TEÓRICA SOBRE AS DETERMINANTES DA PRODUTIVIDADE
Rei, Constantino1
Doutor em Economia Instituto Politécnico da Guarda
RESUMO
O presente artigo tem por objectivo efectuar uma breve análise das determinantes macro e
microeconómicas da produtividade. A sua sistematização permite uma melhor compreensão das
interrelações que se estabelecem e que afectam um dos factores mais importantes que
condicionam evolução do nível de vida das populações.
ABSTRACT
The objective of the present paper is to do an abreviate analysis of the macro and microeconomic
determinants of the productivity. This systemization allows a better understanding of the
relationships that influence one of the most important factors that limits the evolution of the
standard of living of populations.
1 INTRODUÇÃO O crescimento da produtividade é o principal mecanismo conducente à melhoria do nível de vida:
no médio prazo, o aumento dos ganhos da produtividade andam a par com um crescimento mais
rápido dos salários reais dos trabalhadores e o consumo real por habitante.
A produtividade pode ser analisada quer do ponto de vista microeconómico, quer do ponto de
vista macroeconómico. De facto, a importância do aumento da produtividade faz-se sentir a
vários níveis:
• Ao nível mundial, porque, dada a escassez de recursos naturais e tendo em 1 Constantino Mendes Rei, Avª Dr Francisco Sá Carneiro, 50, 6300-559 Guarda - PORTUGAL Telef. 351 271 220 120; Fax: 351 271 220 150; Email: [email protected]
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consideração o acréscimo populacional, esta é uma condição de sobrevivência do
próprio homem;
• Ao nível nacional, porque o aumento da produtividade é condição para o aumento da
competitividade internacional dos países, assim como para a melhoria do nível de vida
das populações;
• Ao nível empresarial, o aumento da produtividade faz baixar os custos unitários dos
produtos ou serviços produzidos e, por consequência, permite reduzir os preços de
venda sem sacrificar as margens de lucro ou aumentar as margens de lucro, sem
aumentar os preços de venda.
2 TIPOLOGIA DE CLASSIFICAÇÃO DAS DETERMINANTES DA PRODUTIVIDADE
Por entre as muitas e variadas áreas de interesse dos investigadores, vários são os factores que
têm sido estudados e que afectam a produtividade. Alguns concentram-se nas relações mais
imediatas e directas como por exemplo o progresso tecnológico. Outros analistas, em particular
aqueles que se interessam pela história económica ou a explicação das diferenças de
crescimento entre países, salientam a importância de factores institucionais e políticos que
determinam em que medida as empresas e os indivíduos se envolvem em actividades
produtivas.
Carvalho (1992) distingue dois tipos de causas que estão na base das variações da
produtividade: causas fundamentais e causas próximas. Enquanto nas primeiras se englobam
factores como a cultura e os valores, a propensão para a poupança e o investimento ou a
formação científica e tecnológica, nas segundas incluem-se factores como a eficiência produtiva,
o mercado, a organização, a Investigação e Desenvolvimento (I&D), as economias de escala, a
formação profissional ou a diversificação de produtos.
Para além daquelas causas fundamentais e próximas ou imediatas, podemos acrescentar um
conjunto de factores “subjacentes”, para distinguir os factores que têm um efeito indirecto sobre
a produtividade através da sua influência sobre as causas próximas ou imediatas.
A diferença e interligação entre estes conjuntos de factores pode ser ilustrada com o seguinte
exemplo: o progresso técnico pode ser uma causa imediata para a melhoria da produtividade.
Mas, quais são as causas do progresso técnico? A resposta pode incluir a actividade de I&D. E
quais são os factores que podem incentivar as empresas a investir em I&D? O que condiciona
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estes factores? A resposta a estas questões leva-nos, progressivamente, aos factores
subjacentes e fundamentais.
Esta distinção é importante porque permite fazer luz sobre as influências potencialmente mais
importantes sobre o crescimento da produtividade no longo prazo.
A figura 1 ilustra o que acabámos de referir:
Factores
subjacentes
Factores
fundamentais
Factores
Imediatos
Melhoria
da Produtividade
Figura 1: As Determinantes da Produtividade
2.1 Os factores imediatos
As causas imediatas são os factores que têm uma relação próxima e tangível com a
produtividade e o crescimento económico. São pois os factores que têm um vínculo directo com
as relações input/outuput na produção. Um grande corpo da literatura centra-se na influência das
interrelações entre tecnologia, acumulação de capital físico, humano e I&D. A acumulação de
capital físico tem maior interesse quando confrontada com a produtividade do trabalho do que
com a produtividade total dos factores (PTF). A acumulação de capital físico aumenta o rácio
capital/trabalho (ceteris paribus) e este aumenta a produtividade do trabalho. Nos cálculos da
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PTF, a acumulação de capital físico é incluída como input, pelo que os efeitos sobre a
produtividade ocorrem indirectamente através de spillovers, como por exemplo a I&D.
Outras causas imediatas que podemos incluir na figura 1 são:
• As economias de escala e os ganhos decorrentes da especialização;
• Os avanços nas teorias e práticas das organizações empresariais, de gestão e de
trabalho (por exemplo, as técnicas de produção “lean” que ultimamente estão associadas
aos sistemas de produção, os arranjos de mercado, a gestão dos stocks, garantia de
qualidade, o trabalho em equipa, etc);
• A afectação de recursos (para reflectir a influência das variações na estrutura da
indústria);
• “turnovers” das empresas (as empresas numa indústria podem variar em termos dos
processos produtivos que utilizam, os mercados que servem, os riscos que tomam, etc).
Assim, a produtividade média num sector pode variar dependendo do crescimento ou
declíneo das diferentes empresas e das entradas de empresas “greenfields” ou a saída
de fábricas menos produtivas.
Existem pois interrelações entre as causas imediatas: por exemplo, a organização empresarial é
importante para o desenvolvimento e aplicação das tecnologias, especialização e economias de
escala.
2.2 Os factores subjacentes
Os factores subjacentes são aqueles que têm um efeito indirecto sobre a produtividade através
das suas influências sobre um certo número de causas imediatas, nomeadamente: concorrência,
abertura ao exterior e as condições de oferta e procura.
Conforme sustentado por Porter (1990), a concorrência, quer de empresas domésticas ou da
importação, podem propiciar incentivos à implementação de factores que promovem o
crescimento da produtividade. Pode incentivar a adopção de novas tecnologias, inovar para
ganhar vantagens de produto ou posição sobre os concorrentes, etc.
A concorrência pode colocar pressão sobre as empresas e as indústrias para se racionalizarem,
fazer sair as menos produtivas e modernizar. Pode incentivar as empresas a desenvolverem
novos mercados que podem trazer ganhos de especialização ou economias de escala.
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Nickel (1996) faz uma revisão da literatura sobre as relações entre concorrência e performance
da produtividade. Embora encontre alguns argumentos teóricos e evidência empírica em favor
de uma relação positiva, faz um juízo de valor no sentido que o peso do argumento e a evidência
da literatura não é convincente. Contudo, o seu próprio trabalho empírico sustenta a relação
positiva: estima que o poder de mercado está associado com menores níveis de produtividade e
que a concorrência está associada com maiores taxas de crescimento da produtividade.
A abertura de uma economia ao comércio e ao investimento, é considerada, tanto do ponto de
vista teórico como empírico, como sendo a determinante potencialmente mais importante da
produtividade. Para além do aspecto competitivo, podem salientar-se os seguintes mecanismos:
• A entrada de Investimento Directo Estrangeiro (IDE) traz consigo, em geral, tecnologia
(frequentemente protegida por direitos de propriedade), métodos de produção e know-
how humano;
• As importações de produtos finais, bens intermédios (para utilização nos processos de
produção locais) e o equipamento de capital podem ter tecnologia incluída que de outro
modo poderia não estar disponível;
• O comércio intra-indústria leva à especialização entre países na produção de bens e
serviços nos quais estão mais aptos e mais produtivos;
• O desenvolvimento de mercados externos através do comércio e do IDE (saída) pode
propiciar o acesso a ideias e tendências e pode trazer o volume de vendas que assiste
à exploração de economias de escala.
Sachs e Warner (1995) estimam que a abertura dos países aos fluxos de capitais e
transferências de tecnologia são importantes na explicação da convergência internacional do
rendimento. Também Taylor (1996) obtém resultados que indicam que a abertura é uma das
maiores explicações para as diferenças de crescimento entre países.
Outros factores subjacentes também têm um efeito significativo sobre as determinantes da
produtividade através daquilo que se pode designar de condições de oferta e procura. A
dimensão e comportamento da procura de bens e serviços, a dotação de factores, a demografia
e os preços podem afectar a acumulação de capital humano, os méritos dos diferentes métodos
de produção e os méritos da adopção e desenvolvimento de novas tecnologias. A estabilidade
macroeconómica também afecta a performance da produtividade no curto prazo. O crescimento
da produtividade tende a acelerar à medida que a economia recupera de um ciclo depressivo e
desacelera quando a economia sobreaquece.
5
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2.3 Os factores fundamentais
Os factores fundamentais são factores básicos que condicionam o potencial produtivo de um
país e a sua capacidade de realização daquele potencial ao longo do tempo. Três áreas são
geralmente mencionadas: a política governamental, as instituições e aquilo que é referido como
a "capacidade social".
A orientação e a estabilidade política são importantes na criação de condições conducentes ao
crescimento da produtividade. As políticas governamentais podem aumentar a ênfase que dão
aos objectivos económicos, assim como assistem no desenvolvimento das capacidades em
áreas promotoras do crescimento da produtividade (por exemplo, a educação e a formação, a
ciência e a inovação). A estabilidade política pode ajudar a criar um ambiente mais certo no qual
são tomadas as decisões de investimento de longo prazo que promovem o crescimento da
produtividade.
As instituições governam o modo como o elemento humano e o económico interagem. São
frequentemente referenciadas como as "regras do jogo" e podem ser formais (leis), ou informais
(costumes, tradições, códigos de conduta). Do ponto de vista económico, as instituições afectam
a poupança através da governação das interacções entre governos, empresas e indivíduos e,
consequentemente, afectando os custos de obtenção da coordenação e cooperação das
actividades económicas. Afectam os custos de produção e troca e fornecem incentivos a ser
produtivos. Exemplos são as leis corporativas, os sistemas de determinação salarial, os sistemas
de ciência, tecnologia e inovação, os sistemas de educação e formação.
A capacidade social, é um conceito geral que se refere genericamente às capacidades
económicas das nações e à orientação das suas populações no sentido da obtenção do
desenvolvimento económico. O conceito não está bem definido, mas é usado nos estudos para
considerar factores que sendo intangíveis, parecem importantes na explicação das diferenças de
performance. Podem abranger as capacidades técnicas dos países para abraçar técnicas de
produção modernas, a capacidade das pessoas para lidar com os valores culturais, etc.
O obtenção da verificação empírica destes factores fundamentais é em geral mais problemática
dadas as dificuldades de medição. Contudo, estudos como Sachs e Warner (1995) e Hall e
Jones (1996,1999) salientam a importância das políticas (abertura ao comércio, leis), qualidade
das instituições, assim como factores tais como a demografia, dotação de recursos e capital
humano.
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3 A INTERRELAÇÃO ENTRE FACTORES
Nenhum dos factores atrás referidos funciona isoladamente. Por exemplo, contributos recentes
na literatura enfatizam a interacção do capital físico, capital humano e I&D. Alguns factores
podem mesmo requerer influências complementares de outros factores para produzirem maior
efeito. Por outras palavras, para obter um resultado de produtividade substancial, pode não ser
suficiente basear-se em alguns factores isolados. Deste ponto de vista, os factores subjacentes
são importantes. Uma alteração na organização empresarial, nas práticas de gestão ou a
adopção e desenvolvimento de novas tecnologias podem não ocorrer sem o incentivo da
concorrência. O acesso a novas tecnologias e a experts de gestão pode não ser possível sem a
abertura ao comércio e ao investimento.
Os factores fundamentais podem ser importantes não apenas na criação de condições de
concorrência, mas também moldando a condução da política económica e a capacidade para o
sucesso.
A experiência do pós-guerra é um exemplo da importância das alterações sociais e institucionais
que deram a alguns países europeus a aceitação social e o sentido do dever na participação
num mais rápido processo de convergência. Por exemplo, Prais (1995) mostra que os menores
níveis de produtividade em fábricas inglesas relativamente às continentais se deviam em grande
parte a diferenças na capacidade técnica da força de trabalho que, por seu turno, deriva da
natureza e qualidade da vocação educacional e dos sistemas de formação nos diferentes
países.
4 A ABORDAGEM EMPÍRICA
Existe uma longa tradição na investigação teórica e empírica que procura explicar quais são as
determinantes da produtividade numa perspectiva causal. A metodologia empírica em geral
envolve análises cross-section e de séries temporais quer de indústrias quer de países. Partindo
de uma medida de produtividade (em geral a Produtividade do trabalho ou a Produtividade Total
dos Factores), são acrescentados outros factores ou variáveis que se pensa poderem explicar
ou “causar” o seu crescimento.
O modelo base subjacente a tais estudos, toma a forma de uma análise de regressão onde a
Produtividade é a variável dependente e do outro lado um conjunto de variáveis explicativas. Ou
seja,
∆P = β.X + γ.Z (1)
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em que X é o conjunto de factores tais como o Investimento, a Inovação, etc, e Z um conjunto de
variáveis de política como por exemplo os impostos. Na equação (1), os parâmetros β são
denominados de multiplicadores.
As variáveis de política podem ter um efeito directo sobre a produtividade ou um efeito indirecto
através das suas influências sobre X. Temple (1999) faz uma revisão dos estudos numa das
áreas mais importantes que derivam daquilo que conhecemos por literatura cross-section do
crescimento económico. Os resultados destes estudos, levam ao que podemos considerar como
uma visão consensual acerca das três principais variáveis correlacionadas com o crescimento da
produtividade: o investimento em maquinaria e equipamentos; o desenvolvimento do capital
humano e a abertura ao comércio e ao investimento. Existem de facto centenas de estudos que
mostram que estas 3 variáveis estão fortemente correlacionadas com o crescimento da
produtividade. Contudo esta (e outras) evidência de correlação entre as variáveis em estudo não
está isenta de um também elevado número de problemas, dos quais se destacam: 1)
causalidade não é o mesmo que correlação e muitas das variáveis são de facto endógenas; 2)
em muitos casos o período de tempo examinado está limitado ou a dimensão da amostra é
reduzida, e 3) a teoria económica em geral é ambígua quanto à predição dos efeitos sobre a
produtividade. A controvérsia é pois um factor comum na evidência existente.
Finalmente, os efeitos de feedback entre os factores são potencialmente enormes, complicando
ainda mais a capacidade de qualquer estudo identificar a direcção de causalidade.
5 CONCLUSÃO
A produtividade, e em particular o seu crescimento, é um factor importante para a sociedade, o
que tem estado na base de um elevado volume de investigação teórica e empírica em seu redor.
Neste artigo, tentámos fazer uma breve síntese no sentido de sistematizar e clarificar o conjunto
de factores que determinam a produtividade, bem como as suas interrelações.
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6 REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA CARVALHO, J.E. “Gestão da produtividade: técnicas de avaliação e métodos profissionais”.
Lisboa, Universidade Lusíada, 1992.
HALL, R.; JONES, C. “The productivity of nations”. National Bureau of Economic Research
Working Papers 5812, NBER, Cambridge: Nov. 1996.
_____________. “Why some countries produce so much output per worker than others”. In:
Quarterly Journal of Economics, n. 1, p. 83-116, Feb. 1999.
NICKEL, S. J. “Competition and corporate performance”. In: Journal of Political Economy, v.
104, n. 4, p. 724-46, 1996.
PORTER, M. “The competitive advantage of nations”. London: MacMillan Press, 1990.
PRAIS, S.J. “Productivity, education and training: an international perspective”. London:
The NIESR Occasional Paper, 48. 1995.
SACHS, J.D.; WERNER A. “Economic reform and the process of global integration, [S.l.]:
Brookings Papers on Economic Activity, 1995. p.1-118.
TAYLOR, A.M. “Growth and convergence in the Asia-Pacific Region: the role of openness, trade
and migration”. In: . LLOYD, P.J; WILLIAMS, L.S. (eds), International Trade and Migration in the APEC Region. Oxford: Oxford University Press, 1996.
TEMPLE, J. “The New growth evidence”. In: Journal of Economic Literature, a. 37, n. 1, p.
112-56, 1999.
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica,
vol. 01, jan. / jun. 2007 ISSN 0000-0000 - v. eletrônica
INDICADORES DE DESEMPENHO E DE GESTÃO DA DINÂMICA DAS CONTRATAÇÕES DAS OBRAS PÚBLICAS COMO INTRUMENTOS DE PLANEJAMENTO DA AUDITORIA
Gustavo Pimentel da Costa Pereira Inspetor de Obras Públicas TCE-PE Área Temática: Tipos de Auditorias – Auditorias de Natureza Operacional e de Gestão
1 INTRODUÇÃO O sistema de controle externo no Brasil privilegia a atuação a posteriori; porém, mesmo com a
competente identificação das irregularidades por parte dos Tribunais de Contas e a pronta ação
dos Ministérios Públicos, quando, em virtude destas irregularidades, as despesas já ocorreram,
os ressarcimentos dos valores aos cofres públicos arrastam-se em longas ações no Judiciário
(segundo relatório da FIA-USP, em 2001, apenas 4,81% dos débitos imputados pelos TC´s
foram recolhidos). Mesmo que um dia esses recursos voltem aos cofres públicos, o prejuízo para
a sociedade é irrecuperável, pois, durante este período, a sociedade foi tolhida de usufruir dos
benefícios da aplicação dos mesmos.
Torna-se fundamental o exercício do controle prévio e concomitante, para permitir a adoção de
medidas corretivas e não apenas punitivas. Mais recentemente, os Tribunais de Contas têm
antecipado as suas atuações no sentido de intervir, junto as administrações públicas, antes da
ocorrência das despesas indevidas, a exemplos das Auditorias de Acompanhamento e
Operacionais.
Neste sentido, a Lei de Responsabilidade Fiscal, Lei Complementar N.º 101 de 04/05/2000, no
§ 1º do Art. 59, de forma inovadora, estabelece um grande avanço na medida em que atribui
aos Tribunais de Contas o dever de alertar previamente os poderes e órgãos para possíveis
irregularidades.
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
O cumprimento dessas novas atribuições exigirá dos Tribunais de Contas o desenvolvimento de
novas técnicas de auditoria no sentido de antever prováveis irregularidades, bem como, o
aperfeiçoamento de técnicas já conhecidas, dotando-as da agilidade e precisão exigidas.
A quase uma década, o Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco, objetivando tornar sua
atuação mais eficaz e tempestiva, implantou no Estado um processo de interiorização. Criou
sete núcleos avançados denominados Inspetorias Regionais, privilegiando o interior do Estado.
Esta ação permite ao cidadão reclamar os seus direitos sem ter que se deslocar do interior do
Estado até a capital.
Normalmente os técnicos do controle externo e responsáveis pela fiscalização da economicidade
nas contratações das obras, permanecem nas Inspetorias por longos períodos, muitos
estabelecem-se de forma definitiva. A atuação em uma única região por períodos tão longos tem
por conseqüência a perda referencial do todo, ou seja, do que vem ocorrendo nas contratações
das demais regiões do Estado.
Ciente dessa deficiência, o Tribunal tem tentado compensar esta perda de paradigma com
encontros técnicos semestrais. Mesmo assim, a ausência de indicadores comuns a todos, ou
melhor, de uma escala de desempenho aplicada às contratações, de modo a possibilitar
comparações entre os resultados alcançados pelos Órgãos auditados, representa um dificultador
aos objetivos dos encontros.
Dentro desse espírito, utilizando-se de um “Plano Piloto” composto por 13 Órgãos e 1035
processos licitatórios, destacamos duas ferramentas de auditoria que representam o foco do
presente trabalho:
Indicadores Operacionais de Desempenho na contratação de obras públicas.
Indicadores de Gestão da Dinâmica das contratações de obras públicas.
2 INDICADORES OPERACIONAIS DE DESEMPENHO NA CONTRATAÇÃO DE OBRAS PÚBLICAS
Propõe-se a introdução de um índice que tem por objetivo, servir como escala de comparação
entre os resultados obtidos pelos Órgãos, nas contratações das obras e serviços de engenharia.
O índice proposto, denominado IPCO – Índice de Preço Custo do Órgão, representa uma
relação agregada entre os preços resultantes dos processos de contratação e os seus
respectivos custos estimados.
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Na determinação de um índice geral, como se propõe para o IPCO, há de se levar em
consideração o volume de recursos envolvidos por processo licitatório. Desta forma, torna-se
necessário fazer com que as Tomadas de Preço tenham um peso maior que os Convites, sendo
o mesmo raciocínio válido para as Concorrências em relação às Tomadas de Preço e Convites.
Outro aspecto merecedor de atenção é o número de licitações por modalidade, e uma vez que
os Órgãos apresentam suas licitações com composições de modalidades bem distintas, faz-se
necessário uma homogeneização de forma a permitir comparações entre os IPCO.
Inicialmente, para tornar-se possível uma comparação entre os preços propostos para as várias
obras ou serviços contratados, faz-se necessário a definição de um índice: o IPCC – Índice
Preço Custo do Contrato, como abaixo descrito:
IPCC - Índice Preço Custo do Contrato : Representa a relação entre o valor global proposto para
a realização da obra de engenharia pela empresa vencedora do certame licitatório ou
selecionada no processo de dispensa ou inexigibilidade e o custo da obra estimado com base
nos preços unitários dos serviços obtidos nas tabelas de preços.
CTOPGVIPCC =
onde: PGV é o preço global para uma obra vencedor do processo licitatório ou selecionado nos
processos de dispensa ou inexigibilidade;
CTO é o custo total estimado para a obra com base em tabelas de preço.
Para o cálculo do IPCO propõe-se uma média dos IPCC ponderada em função da modalidade
do processo licitatório, com a seguinte formulação.
( )∑
∑∑
=
=
=
⎥⎥⎥⎥⎥
⎦
⎤
⎢⎢⎢⎢⎢
⎣
⎡⎟⎟⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛
= m
jjj
m
j j
j
n
iji
A
FVn
FC
FVIPCC
IPCO
j
1
1
1
.
.
ou ( )∑
∑
=
=⎟⎠⎞
⎜⎝⎛
= m
jjj
m
j j
jjj
A
FVn
FCFVIPCCn
IPCO
1
1
.
..
Sendo:
)()(
Convite
jj PVmediana
PVmedianaFV = e
Convite
jj IPCC
IPCCFC =
3
Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
Onde:
IPCOA – Índice de Preço Custo do Órgão – A;
IPCCj – é o IPCC médio observado para a j-ésima modalidade licitatória do Órgão – A;
IPCCji – é o IPCC observado no i-ésimo processo da j-ésima modalidade licitatória no Órgão A;
nj - é o número de processos observados na j-ésima modalidade licitatória;
m - é o número de modalidades licitatórias (incluindo as dispensas e inexigibilidades);
FVj – Fator Valor do j-ésima modalidade licitatória;
FCj – Fator Competitividade da j-ésima modalidade licitatória ;
PVj – Preços globais para todas as obras que compõem a amostra (Plano Piloto) na j-ésima
modalidade licitatória;
PVConvite – Preços globais para todas as obras que compõem a amostra (Plano Piloto) na
modalidade Convite;
jIPCC - é o IPCC médio para todas as obras que compõem a amostra (Plano Piloto), na j-
ésima modalidade licitatória;
ConviteIPCC - é o IPCC médio na modalidade Convite para todas as obras que compõem a
amostra (Plano Piloto).
Como pode ser observada, a formulação proposta para o IPCO adota como referência a
modalidade Convite por ser esta uma modalidade de alta incidência nos processos licitatórios
envolvendo obras públicas. A adoção do Convite como referência faz com que o IPCO seja lido
como o Índice Preço Custo do Órgão na base Convite – significa que todos os processos foram
homogeneizados para a modalidade Convite.
De forma seqüenciada, apresenta-se o cálculo do IPCO nos Órgãos que compõem o “Plano
Piloto”:
a) Cálculo do FV – Fator Valor:
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Tabela 2.1 – Mediana dos valores globais das obras por modalidade de licitação
Modalidade do Processo Licitatório Preço Global Vencedor Convite Tomada de Preços Concorrência
Mediana dos Preços Vencedores observados no Plano Piloto por Modalidade de Licitação
R$73.195,00 R$244.167,00 R$695.931,00
3358,300,195.73$00,167.244$
)()(
===RR
PVmedianaPVmediana
FVConvite
TomadaTomada
5079,900,195.73$00,931.695$
)()(
===RR
PVmedianaPVmediana
FVConvite
iaConcorrênciaConcorrênc
0000,100,195.73$00,195.73$
)()(
===RR
PVmedianaPVmediana
FVConvite
ConviteConvite
b) Cálculo do FC – Fator Competitividade:
Tabela 2.2 – IPCC médio por modalidade de licitação
Modalidade do Processo Licitatório
IPCC Convite Tomada de Preços Concorrência
IPCC – Médio por modalidade no Plano Piloto 1,0307 0,9465 1,0124
9183,00307,19465,0
===Convite
TomadaTomada IPCC
IPCCFC
9822,00307,10124,1
===Convite
iaConcorrênciaConcorrênc IPCC
IPCCFC
0000,10307,10307,1
===Convite
ConviteConvite IPCC
IPCCFC
c) Cálculo do IPCO para o Órgão 01
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Tabela 2.3 – Composição do IPCC e número de processos licitatórios observados por modalidades de licitação do Órgão 01
Modalidade do Processo Licitatório Órgão 01 Convite Tomada de Preços Concorrência
Número de processos licitatórios por modalidade 213 77 5
IPCC – Médio por modalidade 0,9684 0,8671 0,8544
( )∑
∑
=
=⎟⎠⎞
⎜⎝⎛
= 3
1
3
101
.
..
jjj
j j
jjj
FVn
FCFVIPCCn
IPCO
( )( ) ( )( )( )( )
( )( )( )( )
( ) ( ) ( )( )5079,9.53358,3.771.2139822,0
5079,9.8544,0.59183,0
3358,3.8671,0.771
1.9684,0.213
01 ++
⎟⎠⎞⎜
⎝⎛+⎟
⎠⎞⎜
⎝⎛+⎟
⎠⎞⎜
⎝⎛
=IPCO
9474,001 =IPCO
Logo o IPCO para o Órgão 01, referenciado pela modalidade Convite, é de 0,9474. Apresenta-se, a seguir, a Tabela 2.4 contendo os valores dos IPCO para todos os Órgãos que compõem o “Plano Piloto”.
Tabela 2.4 – IPCO – Índice de Preço Custo do Órgão
ORGÃOS
IPCO Órgão 01 0,9474 Órgão 02 1,0415 Órgão 03 1,1108 Órgão 04 1,1228 Órgão 05 1,1792 Órgão 06 1,2909 Órgão 07 1,1892 Órgão 08 1,0615 Órgão 09 1,1182 Órgão 10 1,0078 Órgão 11 1,1775 Órgão 12 0,9749 Órgão 13 1,0079
Média 1,095
Como acima exposto, o IPCO apresentado encontra-se referenciado pela modalidade Convite.
Uma outra forma, e mais interessante, é referenciar o IPCO por um Órgão, podendo a escolha
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desse ser baseada em auditorias anteriores que demonstrem o seu desempenho nas
contratações e realizações das obras, função dos resultados observados para o IPCO ou outra
forma julgada mais adequada. No caso em estudo elegeu-se para referência o Órgão 01 (menor
IPCO).
O grande atrativo para referenciar-se o IPCO por um órgão se dá pelo fato desse deixar de
representar a relação entre preço e custo passando a representar uma relação de preço para
preço. Logo, quando o IPCO for referenciado por um órgão passará a ser denominado IPPO –
Índice de Preço-Preço entre Órgãos.
Apresentam-se, na Tabela 1.5, os novos índices denominados de IPPO ordenados de forma
crescente.
Tabela 2.5 – IPPO – Índice de Preço-Preço entre Órgãos
ORGÃOS IPPO Órgão 01 1,0000 Órgão 12 1,0291 Órgão 10 1,0638 Órgão 13 1,0639 Órgão 02 1,0994 Órgão 08 1,1205 Órgão 03 1,1726 Órgão 09 1,1803 Órgão 04 1,1852 Órgão 11 1,2429 Órgão 05 1,2448 Órgão 07 1,2553 Órgão 06 1,3626
Os resultados demonstram que o Órgão 06 contrata, na média, 36,26% acima dos valores
contratados pelo Órgão 01, já no Órgão 07 o percentual é de 25,53% e assim sucessivamente.
A Figura 2.1 apresenta a curva de crescimento do IPPO observada pelos Órgãos e referenciada
pelo Órgão 01.
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0,90
0,95
1,00
1,05
1,10
1,15
1,20
1,25
1,30
1,35
1,40
Orgão 0
1
Orgão 1
2
Orgão 1
0
Orgão 1
3
Orgão 0
2
Orgão 0
8
Orgão 0
3
Orgão 0
9
Orgão 0
4
Orgão 1
1
Orgão 0
5
Orgão 0
7
Orgão 0
6
Órgãos
IPPO
IPPO
Figura 2.1 – Comportamento ordenado dos IPPO dos Órgãos – referenciados pelo Órgão 01
3 INDICADORES DE GESTÃO DA DINÂMICA DAS CONTRATAÇÕES DE OBRAS PÚBLICAS
Os diferentes desempenhos observados nas contratações das obras públicas por parte dos
Órgãos, se dão, em muito, função da estrutura de competitividade observada nos seus
processos licitatórios.
A constatação da existência de Órgãos que apresentam seus processos licitatórios regidos, em
um instante, por uma alta competitividade e, em outro, por uma total ausência de
competitividade, é merecedora de atenção, pois nesse caso os indicadores observados até
então se mostram ineficazes na identificação da real dinâmica de contratação, sendo esta
dicotomia disfarçada por valores médios dos Órgãos.
Para melhor caracterizar o desempenho dos órgãos nas contratações, apresenta-se na Figura
3.1 um gráfico de médias móveis (para seis contratos) contemplando as três situações
observadas. O Órgão 06 – caracteriza os resultados quando da ausência de competitividade;
Órgão 10 – caracteriza os resultados quando da existência de competitividade; e o Órgão 01 –
caracteriza a prática em um mesmo órgão de processos altamente competitivos e com total
ausência de competitividade .
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
IPCC POR MÉDIAS MÓVEIS (6c)
0,6
0,7
0,8
0,9
1
1,1
1,2
1,3
1,4
1 15 29 43 57 71 85 99 113
127
141
155
169
183
197
211
225
239
253
267
281
295
PROCESSOS LICITATÓRIOS
IPC
C
Órgão 01 Órgão 06 Órgão 10
Figura 3.1 – Comportamento do IPCC para os Órgãos 01, 06, e 10, representados por médias móveis
com seis processos licitatórios
O gráfico de médias móveis demonstra que o Órgão 01, em muito, contrata igual ao Órgão 06
(Órgão com pior desempenho do Plano Piloto), como também contrata com preços abaixo do
Órgão 10, onde os processos apresentam-se dentro de uma estrutura com características
competitivas.
Como já colocado, este comportamento não foi alcançado pelos indicadores anteriormente
estudados, uma vez que esses se utilizam de valores médios, fazendo do Órgão 01, quase
sempre, o Órgão de melhor desempenho. Faz-se então necessário a implementação de novos
indicadores ou ferramentas que venham permitir a identificação da dinâmica de contratação dos
Órgãos, evitando que médias mascarem o verdadeiro mecanismo atuante.
3.1 Contratações eficientes e ineficientes
Atualmente, a caracterização do preço contratado para uma obra, no âmbito da auditoria, limita-
se ao seu enquadramento como: preço superfaturado, preço inexeqüível ou preço de mercado
ou aceitável. Para os dois primeiros casos existe todo um amparo legal que orientam as ações
dos Tribunais e das Administrações Públicas de uma forma geral, a terceira caracterização é que
constitui-se no objeto de análise.
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
Indiferentes ao observado no gráfico de médias móveis, os balizadores atualmente vigentes para
caracterização das contratações classifica os preços contratados pelo Órgão 01, e constantes
no “Plano Piloto”, como preços aceitáveis. Nesse caso convém indagar: se os preços estão
dentro de limites aceitáveis, caberia aos Tribunais de Contas questioná-los? Ou: se o preços
estão abaixo do limite de aceitabilidade do Órgão, que motivos teria a Administração do Órgão
para não contratá-los?
A contra argumentação é, contudo, imediata e muito forte: Por que contratar obras com um IPCC
de 1,25 quando se têm contratado obras de mesma natureza com um IPCC de 0,85, ou seja, o
simples fato do resultado ter sido objeto de processo licitatório é suficiente para justificar uma
contratação 47% acima dos preços observados nas outras licitações?
Sem dúvida, a atual estrutura de caracterização do preço de uma obra é muito pobre. Os
resultados observados no Órgão 01 refletem o erro de uma generalização. Não basta
caracterizar os preços apenas por aceitáveis; faz-se necessário especificar se o valor proposto
para realização da obra é um preço bom na estrutura atual do mercado, ou se é um preço ruim,
acima do que se tem obtido, possibilitando, para a Administração, um novo referencial para sua
decisão: de contratar com o preço obtido no processo licitatório ou realizar uma nova licitação.
É embuído desta visão de preço bom e preço ruim que se propõe à caracterização dos preços
contratados para uma obra em: “CONTRATAÇÃO EFICIENTE” e “CONTRATAÇÃO
INEFICIENTE”.
Caracteriza-se uma contratação como “CONTRATAÇÃO EFICIENTE” quando o preço vencedor
do processo licitatório apresentar um IPCC (Índice de Preço Custo do Contrato) limitado a um
determinado percentual, acima do IPCC médio observado nas contratações realizadas sob
condição de competitividade, garantindo-se a similaridade dos objetos de licitação. Em caso
contrário, o contrato caracterizar-se-ia como uma “CONTRATAÇÃO INEFICIENTE”.
No presente estudo, uma contratação foi caracterizada como ineficiente quando seu IPCC
ultrapassou o limite de 30% acima da média observada em processo competitivo, entendendo-se
como tal, o processo cujo número de participantes classificados ficou entre 7 e 9 - (IPCC do
processo competitivo = 0,85 logo IPCC >1,1 caraterizou-se como contratação ineficiente).
Como forma simplista, adotou-se o mesmo limite para todos os Órgãos, quando o mais
adequado seria cada Órgão ter seu próprio limite de caracterização.
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Com base na nova classificação para as contratações dos preços das obras, foi refeito o gráfico
de médias móveis (agora com 04 contratos) para 156 processos licitatórios realizados no Órgão
01, estando o resultado apresentado na Figura 3.2.
MÉDIAS MÓVEIS - ÓRGÃO 01 (4C)Contração Eficiente = 0 - Contratação Ineficiente = 1
-0,2
0,0
0,2
0,4
0,6
0,8
1,0
1,2
04
812
1620
2428
3236
4044
4852
5660
6468
7276
8084
8892
96100
104108
112116
120124
128132
136140
144148
152156
ÓRGÃO 01Ineficiente
Figura 3.2 – Comportamento por médias móveis (4) para as contratações do Órgão 01 após a
caracterização como eficiente ou ineficiente
O gráfico resultante das médias móveis para o Órgão 01 apresenta um arranjo característico; é
como se o Órgão operasse em um estado de contratações eficientes e, aleatoriamente, este
estado fosse acometido por perturbações externas, gerando um grupo de contratações
ineficientes, que vão se espaçando até que o sistema volte a operar de forma eficiente. No
gráfico podem ser identificadas três ocorrências dessas perturbações.
As chamadas perturbações externas podem ocorrer por vários motivos como: conluios entre as
empresas proponentes, fatores políticos, como a eminência de mudanças de administração ou,
até mesmo, motivadas por fatores internos do Órgão.
O efeito desta perturbação externa, será tanto mais duradouro quanto menor for a capacidade
do Órgão em atrair mais competitividade para seus processos. É evidente que essa capacidade
varia de Órgão para Órgão, ou até mesmo dentro do próprio Órgão, de Administração para
Administração.
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É esta capacidade de tornar-se menos vulnerável às perturbações externas e a velocidade com
que faz suas contratações retornarem a um estágio de eficiência que diferencia as
Administrações e permite caracterizá-las, quanto à sua Gestão na Contratação de Obras
Públicas, como eficiente ou ineficiente.
3.2 Um indicador de gestão
Nesta etapa, busca-se introduzir um indicador de forma a permitir a caracterização de um Órgão
ou da Administração do Órgão quanto à sua Gestão na Contratação de Obras Públicas.
Com este intuito lançou-se mão da Teoria dos Processos Estocásticos, mais precisamente
CADEIA DE MARKOV DE PARÂMETRO DISCRETO.
As Cadeias de Markov foram resultados dos estudos publicados pelo matemático russo Andrey
Andreyevisch Markov (1856-1922), e cuja fundamentação teórica pode ser encontrada em vários
autores entre eles Davenport (1970) e Clarke & Disney (1979).
O mecanismo de contratações eficientes e ineficientes pode se interpretado por uma Cadeia de
Markov de dois estágios, conforme a representação gráfica da Figura 3.3.
Figura 3.3 – Cadeia de Markov com dois estados
Onde: Contratação eficiente – estado 0
Contratação ineficiente – estado 1
Px,y – É a probabilidade de se passar do estado x para o estado y
Face ao caso em estudo apresentar apenas dois estados (eficiente e ineficiente) a matriz de
probabilidades de transição ou matriz de Markov é dada por:
⎥⎦
⎤⎢⎣
⎡=
1110
0100
PPPP
P
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Como estimativa das probabilidades de transição, utilizou-se as freqüências relativas obtidas a
partir do “Plano Piloto”, e, em sendo o número de observações razoavelmente elevado, pode-se
dizer que a estimativa será razoavelmente boa para as verdadeiras probabilidades de transição.
Apresenta-se a seguir o resultado obtido para o Órgão 01:
⎥⎦
⎤⎢⎣
⎡=⎥
⎦
⎤⎢⎣
⎡=− 5529,04471,0
1682,08318,0
1110
010001 PP
PPPÓrgão
Com os resultados apresentados na matriz de Markov do Órgão 01 conclui-se que, se o Órgão
apresentou uma contratação eficiente, a probabilidade da próxima ser também eficiente é de
83,18%, e, de forma complementar, a probabilidade da nova contratação ser ineficiente é de
16,82%. Todavia, se o Órgão apresentou uma contratação ineficiente, a probabilidade da
próxima ser uma contratação eficiente é de 44,71% e de manter-se de forma ineficiente é de
55,29%. Este último vem demonstrar a força das perturbações externas na tentativa de manter-
se induzindo os valores das licitações.
De imediato, surge a necessidade de se ter um paradigma para aferir se o desempenho
apresentado pelo Órgão 01 condiz com o que se espera de um Órgão que contrata de forma
eficiente. Passou-se a apresentar a matriz de transição esperada para um Órgão eficiente :
⎥⎦
⎤⎢⎣
⎡=⎥
⎦
⎤⎢⎣
⎡=
0500,09500,01500,08500,0
1110
0100
PPPP
PParadigma
A matriz Pparadigma revela que, quando em um estado de contratações eficientes, a possibilidade
de se ter, na próxima licitação, uma contratação ineficiente é de 15%. Esse percentual admite a
ocorrência de uma contratação ineficiente pelas mais diversas razões: ocorrência de uma obra
em particular, um desinteresse momentâneo das empresas, ou o acaso. Porém, quando da
ocorrência de uma contratação ineficiente, por razões quaisquer, faz-se necessário que o órgão
seja extremamente ágio e hábil para motivar a competitividade, de forma a fazer com que a
probabilidade da contratação seguinte continuar como ineficiente, seja de apenas 5%.
Quando da análise das matrizes de transição pode-se verificar que o comportamento do Órgão
01 está aquém do estabelecido para o Órgão paradigma. Porém, em muito, essa comparação
vai deixar margens para dúvidas, principalmente quando da necessidade de comparação da
eficiência entre Órgãos, motivo pelo qual propõe-se a utilização de um índice que permita aferir a
dinâmica de contratação dos Órgãos. Esse índice denominou-se GEN – Índice da Dinâmica das
Contratações, e apresenta a seguinte formulação:
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11100100
1000
PPPPPPGEN
++++
=
Apresenta-se a seguir a Tabela 3.1 com as probabilidades de transição e o GEN para os Órgãos
que compõem o “Plano Piloto”. Inclui-se, na análise, as probabilidades de mudança de
Administração observadas em alguns Órgãos.
A Tabela 3.1 demonstra que, dos treze Órgãos analisados, em apenas dois a dinâmica de
contratação do órgão apresentou-se superior ao referendado como paradigma (GEN = 0,90). Os
Órgãos 06 e 07 apresentam GEN abaixo de 0,1, o que vem a corroborar com os resultados
anteriormente observados e dar uma dimensão da ineficiência das suas administrações nas
contratações das obras públicas.
No tocante aos indicadores para os Órgãos que apresentaram mudança de Administração no
período 2000-2001, observa-se que, de uma forma geral, as exercidas em 2001 trouxeram uma
melhora no desempenho quando comparado com os seus antecessores.
Lista-se, na Tabela 3.2, a relação ordenada dos Órgãos em função da eficiência na dinâmica de
contratação, aferida pelo GEN, e baseada no desempenho global observado no biênio
2000/2001.
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Tabela 3.1 – Índice da Dinâmica de Contratações – GEN e as probabilidades de transição dos estados
Tabela 3.2 – Índice da Dinâmica das Contratações – GEN global por Órgão
ORGÃOS P00 P01 P10 P11 GEN
Órgão 01 G 0,8318 0,1682 0,4471 0,5529 0,63944 Órgão 01 -00 0,7905 0,2095 0,3770 0,6230 0,58376 Órgão 01 -01 0,8696 0,1304 0,6250 0,3750 0,74728 Órgão 02 G 0,7957 0,2043 0,3016 0,6984 0,54864 Órgão 02 -00 0,5484 0,4516 0,3191 0,6809 0,43377 Órgão 02 -01 0,9194 0,0806 0,2500 0,7500 0,58468 Órgão 03 G 0,5000 0,5000 0,2292 0,7708 0,36458 Órgão 03 -00 0,3333 0,6667 0,1951 0,8049 0,26423 Órgão 03 -01 0,7000 0,3000 0,4286 0,5714 0,56429 Órgão 04 G 0,4667 0,5333 0,1159 0,8841 0,29130 Órgão 04 -00 0,3333 0,6667 0,0465 0,9535 0,18992 Órgão 04 -01 0,5000 0,5000 0,2308 0,7692 0,36538 Órgão 05 G 0,5217 0,4783 0,3429 0,6571 0,43230 Órgão 05 -00 0,2000 0,8000 0,3000 0,7000 0,25000 Órgão 05 -01 0,7692 0,2308 0,6000 0,4000 0,68462 Órgão 06 G 0,0000 1,0000 0,0164 0,9836 0,00820 Órgão 07 G 0,0000 1,0000 0,0541 0,9459 0,02703 Órgão 07 -00 0,0000 1,0000 0,0588 0,9412 0,02941 Órgão 07 -01 0,0000 1,0000 0,0500 0,9500 0,02500 Órgão 8 0,8571 0,1429 1,0000 - 0,92857 Órgão 9 0,7391 0,2609 0,7500 0,2500 0,74457 Órgão 10 0,9697 0,0303 1,0000 - 0,98485 Órgão 11 0,7241 0,2759 0,1000 0,9000 0,41207 Órgão 12 0,9091 0,0909 0,5000 0,5000 0,70455 Órgão 13 0,9259 0,0741 0,6000 0,4000 0,76296
Referência 0,8500 0,1500 0,9500 0,0500 0,90000
ORGÃOS GEN
Órgão 10 0,98485 Órgão 8 0,92857 Órgão 13 0,76296 Órgão 9 0,74457 Órgão 12 0,70455 Órgão 01 0,63944 Órgão 02 0,54864 Órgão 05 0,43230 Órgão 11 0,41207 Órgão 03 0,36458 Órgão 04 0,29130 Órgão 07 0,02703 Órgão 06 0,00820
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3.3 Escala de eficiência
A determinação de uma escala de eficiência passa pela necessidade de se associar o Índice da
Dinâmica de Contratação - GEN à ocorrência de contratações ineficientes. Neste sentido lançou-
se mão da Regressão Logística como forma de estimar a probabilidade de ocorrência de uma
contratação ineficiente, dado que o Órgão apresenta um determinado valor para o GEN.
Para o caso em estudo, com base nos valores do GEN observados anteriormente, a Regressão
Logística apresenta o seguinte resultado:
( )
( )i
i
GEN
GEN
i eeP .8460,640562,3
.8460,640562,3
1 −
−
+=
O teste de hipótese para verificação da significância do modelo proposto, demostrou ser este
significativo ao nível de confiança de 99% (Chi2 =418,75, graus de liberdade = 1).
A significância do parâmetro GEN foi testada utilizando-se a distribuição “t de Student” e
apresentou-se também significativo ao nível se significância de 1%, com a estatística de teste
com resultado tobservado= -15,6710 que corresponde ao um “p-value”= 6,6409E-50.
Para a determinação de uma escala de gestão para as contratações das obras é necessário
estabelecer as probabilidade de fronteiras das categorias de gestão para a ocorrência de uma
contratação ineficiente, estabelecendo-se, assim, os intervalos do GEN que caracterizarão a
Gestão do Órgão.
A proposta para uma Escala de Gestão do Órgão na contratação das obras encontra-se
apresentada na Tabela 2.3 e a representação gráfica dessa Escala de Gestão proposta
encontra-se apresentada na Figura 3.4.
Tabela 3.3 – Escala de Eficiência em função do GEN do Órgão
ESCALA DE GESTÃO
Com base na Escala de Gestão apresenta-se, na Tabela 3.4, o enquadramento dos Órgãos que
compõem o “Plano Piloto”. O resultado chama a atenção, pois, dos treze Órgãos estudados,
PROBABILIDADE DE UMA CONTRATAÇÃO INEFICIENTE GEN
Gestão Crítica P ≥ 0,75 GEN ≤ 0,337 Gestão Ineficiente 0,50 ≤ P < 0,75 0,337 < GEN ≤ 0,497
Gestão baixa eficiência 0,25 ≤ P < 0,50 0,497 < GEN ≤ 0,658 Gestão eficiência moderada 0,10 ≤ P < 0,25 0,658 < GEN ≤ 0,817
Gestão eficiente P< 0,10 GEN > 0,817
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seis apresentam índices que representam probabilidade de realizar uma contratação ineficiente
em percentual superior a 50%.
Figura 3.4 – Probabilidade de uma contratação ineficiente em função do GEN
PROBABILIDADE DE UMA CONTRATAÇÃO INEFICIENTE X GEN
GEN
Pro
babi
lidad
e P
0,0
0,1
0,2
0,3
0,4
0,5
0,6
0,7
0,8
0,9
1,0
0,00 0,05 0,10 0,15 0,20 0,25 0,30 0,35 0,40 0,45 0,50 0,55 0,60 0,65 0,70 0,75 0,80 0,85 0,90 0,95 1,00
Logistica (GEN)P(0,10)P(0,25)P(0,50)P(0,75)
Tabela 3.4 – Classificação dos Órgãos quanto à eficiência da gestão (2000-2001)
ESCALA DE GESTÃO
ORGÃOS GEN
Órgão 10 0,98485 Gestão eficiente Órgão 8 0,92857 Órgão 13 0,76296 Órgão 9 0,74457 Gestão eficiência moderadaÓrgão 12 0,70455 Órgão 01 0,63944 Gestão baixa eficiência Órgão 02 0,54864 Órgão 05 0,43230 Órgão 11 0,41207 Gestão Ineficiente Órgão 03 0,36458 Órgão 04 0,29130 Órgão 07 0,02703 Gestão Crítica Órgão 06 0,00820
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Em análise similar à realizada para os Órgãos, procedeu-se a classificação para as
Administrações, sendo apresentada apenas para os Órgãos em que verificou-se mudança de
Administração no período 2000-2001 (Tabela 3.5).
A Tabela 3.5 demonstra que, de uma forma geral, as administrações do exercício 2001 tiveram
uma elevação na escala de gestão da dinâmica de contratação. Destaca-se a Administração
2001 do Órgão 05 que passou para uma classificação de Eficiência Moderada quando seu
antecessor apresentava-se com Eficiência Crítica.
A exceção da melhoria de eficiência citada no parágrafo anterior é verificada no Órgão 07 onde o
GEN em 2001 foi inferior ao obtido pela Administração de 2000.
Tabela 3.5 – Classificação dos Órgãos, que apresentaram mudanças de administração, quanto à
eficiência da gestão (2000-2001)
ESCALA DE GESTÃO
ORGÃOS – ADMINISTRAÇÕES GEN
Gestão eficiente
Órgão 01 - Adm. 01 0,74728 Gestão eficiência moderada Órgão 05 - Adm. 01 0,68462 Órgão 02 - Adm. 01 0,58468 Órgão 01 - Adm. 00 0,58376 Gestão baixa eficiência Órgão 03 - Adm. 01 0,56429 Órgão 02 - Adm. 00 0,43377 Gestão Ineficiente Órgão 04 - Adm. 01 0,36538 Órgão 03 - Adm. 00 0,26423 Órgão 05 - Adm. 00 0,25000 Órgão 04 - Adm. 00 0,18992 Órgão 07 - Adm. 00 0,02941
Gestão Crítica
Órgão 07 - Adm. 01 0,02500
3.4 Um modelo dedicado
A classificação da gestão de contratação para um Órgão representa um parâmetro para as
auditorias no sentido de possibilitar a escolha de estratégias e procedimentos adequados de
modo a melhor intervir junto ao Órgão, bem como manter um monitoramento constante, mesmo
que a distância, sobre as Administrações.
Porém, os Órgãos que apresentam suas licitações regidas por mais de um mecanismo
probabilístico ainda preocupa. A Figura 3.2 demonstrou, para o Órgão 01, que as contratações
ineficientes ocorrem em blocos que se mantém por alguns processos e depois vai perdendo
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força até o sistema retornar ao estado de eficiência inicial. Logo, se a ação não for quase
imediata, na identificação dos primeiros sinais da presença de perturbações externas, as ações
não mais serão eficazes.
Neste sentido propõem-se o monitoramento dos Órgãos que apresentem esta característica
(Órgãos 01 e 02 no “Plano Piloto”) por um modelo de regressão logística com parâmetros de
defasagem distribuída.
Para o caso em estudo ajustou-se um modelo simultâneo para os Órgãos 01 e 02, com
parâmetros defasados até a terceira ordem. Incluiu-se também uma variável para caracterizar a
mudança de modalidade do processo licitatório, uma vez que as perturbações externas
concentram-se em uma das modalidades, seja ela qual for.
O modelo proposto procura estimar a probabilidade de se vir a ter uma contratação ineficiente
em função das três últimas licitações apresentarem uma determinada seqüência de eficiência,
do processo ocorrer em um determinado órgão e se há ou não mudança na modalidade do
processo licitatório.
O modelo é dado por:
54321
54321
727066,0411627,0666041,0589490,0727815,143130,2
727066,0411627,0666041,0589490,0727815,143130,2
1 XXXXX
XXXXX
ee
+++++−
+++++−
+=ρ
Sendo:
ρ é a probabilidade de um processo licitatório, que irá ocorrer, apresentar uma contratação
ineficiente;
X1 - Eficiência observada na contratação ocorrida na licitação anterior (eficiente = 0; ineficiente
=1);
X2 - Eficiência observada na contratação ocorrida na penúltima licitação (eficiente = 0;
ineficiente =1);
X3 - Eficiência observada na contratação ocorrida na antepenúltima licitação (eficiente = 0;
ineficiente =1);
X4 - Órgão onde se realiza o processo licitatório (Órgão 01 = 0; Órgão 02 =1);
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X5 - Variação da modalidade do processo licitatório entre o processo em análise e o processo
imediatamente anterior. (Varia = 0; Não varia =1).
O teste de hipótese para verificação da significância do modelo proposto, demostrou ser este
significativo ao nível de confiança de 99% (Chi2 =123,63, graus de liberdade = 5, número de
observações = 457).
O modelo demonstra que o Órgão 02 é mais susceptível a uma contratação ineficiente que o
Órgão 01, bem como, quando a modalidade do processo licitatório se mantém inalterada em
relação ao processo imediatamente anterior, a probabilidade de uma contratação ineficiente
também é maior, corroborando a expectativa de que as perturbações externas agem
concentradas por modalidade de processo licitatório.
Com base no modelo observado, estima-se que a probabilidade da ocorrência de uma
contratação ineficiente após as três últimas licitações terem se apresentado como eficiente e em
havendo mudança de modalidade em relação ao último processo licitatório, é de 8,08% no
Órgão 01 e de 11,72% no Órgão 02 .
No outro extremo, se as três últimas licitações tiverem se apresentado como ineficiente, e em
não havendo mudança de modalidade em relação ao último processo licitatório, a probabilidade
da próxima contratação ser ineficiente é de 78,23% no Órgão 01 e 84,43% no Órgão 02 .
Apresenta-se a seguir na Tabela 3.6 várias combinações entre os parâmetros do modelo.
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Tabela 3.6 – Simulações para a probabilidade da ocorrência de uma contratação ineficiente
Probabilidade de umaContratação Ineficiente 8,08% 11,72% 15,39% 21,54% 33,10% 42,75% 50,59% 60,71%
Eficiência na Licitaçãoanterior. Efic. Efic. Efic. Efic. Inefic. Inefic. Inefic. Inefic.
Eficiência na penúltimaLicitação Efic. Efic. Efic. Efic. Efic. Efic. Efic. Efic.
Eficiência na antepenúltimaLicitação Efic. Efic. Efic. Efic. Efic. Efic. Efic. Efic.
Órgão (01=0; 02=1) Org.01 Org.02 Org.01 Org.02 Org.01 Org.02 Org.01 Org.02
Mudança de modalidade Sim. Sim. Não. Não Sim. Sim. Não. Não.
Probabilidade de umaContratação Ineficiente 47,15% 57,39% 64,86% 73,59% 63,46% 72,39% 78,23% 84,43%
Eficiência na Licitaçãoanterior. Inefic. Inefic. Inefic. Inefic. Inefic. Inefic. Inefic. Inefic.
Inefic. Inefic. Inefic. Inefic. Inefic. Inefic. Inefic. Inefic.
Inefic. Inefic. Inefic. Inefic.
Eficiência na penúltimaLicitaçãoEficiência na antepenúltimaLicitação Efic. Efic. Efic. Efic.
Órgão (01=0; 02=1) Org.01 Org.02 Org.01 Org.02 Org.01 Org.02 Org.01 Org.02
Mudança de modalidade Sim. Sim. Não. Não Sim. Sim. Não. Não.
Probabilidade de umaContratação Ineficiente 23,58% 31,77% 38,97% 49,07% 14,61% 20,53% 26,15% 34,83%
Eficiência na Licitaçãoanterior. Efic. Efic. Efic. Efic. Efic. Efic. Efic. Efic.
Eficiência na penúltimaLicitação Inefic. Inefic. Inefic. Inefic.
Inefic. Inefic. Inefic. Inefic. Inefic. Inefic. Inefic. Inefic.
Efic. Efic. Efic. Efic.
Eficiência na antepenúltimaLicitação
Órgão (01=0; 02=1) Org.01 Org.02 Org.01 Org.02 Org.01 Org.02 Org.01 Org.02
Mudança de modalidade Sim. Sim. Não. Não Sim. Sim. Não. Não.
Para os Órgãos de controle, o modelo proposto representa um indicador utilizado para motivar
as atuações junto aos Órgãos, pois a identificação da ocorrência de uma contratação ineficiente
representa um “alerta”, caso a seguinte seja também ineficiente “prepare-se” e em ocorrendo a
terceira “inicie o processo de auditoria” pois é muito provável que, sobre o Órgão, estejam
atuando as perturbações externas, frustando a competitividade em beneficio próprio.
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4 A ANÁLISE CONJUNTA INDICADORES DE DESEMPENHO E GESTÃO
Inicialmente apresentou-se o IPPO – Índice de Preço entre Órgãos, como um indicador de
desempenho para as contratações. Suas limitações, na identificação dos mecanismos
probabilísticos que regem a dinâmica de contratações motivaram o desenvolvimento de outro
índice, o GEN como um indicador de Gestão da Dinâmica de Contratações do Órgão. Na
verdade, os índices não se sobrepõem, mas sim se completam na caracterização do Órgão
quanto as contratações das obras públicas.
O presente trabalho propõe a utilização conjunta do IPPO e GEN como indicadores de
desempenho e gestão respectivamente, a serem utilizados como instrumentos de auditoria,
possibilitando um melhor diagnóstico das práticas na contratação de obras por parte dos Órgãos
Públicos, de forma a permitir a utilização de técnicas de auditoria diferenciadas para os Órgãos.
Apresenta-se a seguir a Tabela 4.1, com os IPPO e GEN para os Órgãos objeto de análise.
Tabela 4.1 – Análise conjunta IPPO e GEN
ÓRGÃOS IPPO GEN
Órgão 01 1 0,6394 Órgão 02 1,0994 0,5486 Órgão 03 1,1726 0,3646 Órgão 04 1,1852 0,2913 Órgão 05 1,2448 0,4323 Órgão 06 1,3626 0,0082 Órgão 07 1,2553 0,0270 Órgão 08 1,1205 0,9286 Órgão 09 1,1803 0,7446 Órgão 10 1,0638 0,9848 Órgão 11 1,2429 0,4121 Órgão 12 1,0291 0,7045 Órgão 13 1,0639 0,7630
A adoção dos IPPO e GEN sugere um novo agrupamento para os Órgãos. Os novos
agrupamentos foram observados utilizando-se a Cluster Análise, onde a distância de
mensuração foi D=1-r, sendo r é a correlação de Peason, e o método de agrupamento foi o
Método Ward. Nesta análise o IPPO do Órgão foi representado pelos IPCC de suas
contratações.
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CLUSTER ANÁLISE - DENDOGRAMAWard`s method - 1-Pearson r
Esca
la d
e D
istâ
ncia
0,4
0,6
0,8
1,0
1,2
1,4
1,6
1,8
OR
G_1
3
OR
G_1
0
GE
N_A
DM
AD
M1_
01
OR
G_1
1
IP
CC
OR
G_0
6
AD
M5_
00
AD
M2_
01
AD
M4_
00
AD
M4_
01
OR
G_0
9
OR
G_1
2
AD
M7_
01
AD
M7_
00
OR
G_0
8
AD
M5_
01
AD
M3_
01
AD
M3_
00
AD
M2_
00
AD
M1_
00
Figura 3.1 – Cluster Análise contemplando: Órgãos – Administrações – IPCC – GEN: Formação dos
Grupos 1 e 2
CLUSTER ANÁLISE - DENDOGRAMAWard`s method - 1-Pearson r
Esca
la d
e D
istâ
ncia
0,7
0,8
0,9
1,0
1,1
1,2
1,3
1,4
1,5
AD
M7_
00
AD
M7_
01
IP
CC
AD
M4_
00
AD
M3_
00
AD
M4_
01
AD
M5_
01
AD
M3_
01
AD
M2_
00
OR
G_1
2
GE
N_A
DM
OR
G_0
9
OR
G_0
8
AD
M2_
01
AD
M1_
00
Figura 3.2 – Cluster Análise contemplando: Órgãos – Administrações – IPCC – GEN: Formação
dos Grupos 3, 4 e 5
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Os dendogramas demonstram a formação de mais cinco grupos compostos pelos Órgãos como
abaixo descrito:
Grupo 1 – Órgãos 10, 13 e 01 (Administração 2001);
Grupo 2 – Órgãos 06, 11 e 05 (Administração 2000);
Grupo 3 – Órgãos 01(Administração 2000); 02(Administração 2001); 08; 09 e 12;
Grupo 4 – Órgãos 02 (Administração 2000); 03 (Administração 2001); 04 (Administração
2001) e 05 (Administração 2001);
Grupo 5 – Órgãos 03 (Administração 2000); 04 (Administração 2000) e 07.
5 REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA AITCHISON, J.; BROWN, J. A. C. The lognormal distribution. London: Cambridge University Press, 1957. BEKMAN, O. R.; COSTA NETO, P. L. O. Análise estatística da decisão. 1. ed. São Paulo: Editora Edgar Blucher, 1993. CABRAL, A. M. V. Gestão de obras públicas: avaliação gerencial x ordenamento jurídico. Dissertação (Mestrado), Universidad Autónoma de Madrid; Universidade de Pernambuco, Recife,PE: mar. 2002. 138p. SOUZA, F. M. Campello de. Decisões racionais em situações de incertezas. 1. ed. Recife,PE: Ed. Universitária da UFPE, 2002. ______. O processo de Markov. Recife,PE: 2002. (Não publicado). DANTAS, R. A. Engenharia de avaliações: uma introdução à metodologia cientıfica. 1.ed. São Paulo: Pini, 1999. DAVENPORT JR., W. B. Probability and Random Processes. [S.l.]: McGraw-Hill Book Company, 1970. FIGUEIREDO, C. M. C. et al. Comentários a Lei de Responsabilidade Fiscal. Recife, PE: Nossa Livraria, 2001. GUJARATI, D. N. Econometria básica. 3. ed. São Paulo: Makron Books do Brasil, 2000. HOFFMANN, R. Estatística para economistas. 3. ed. São Paulo: Pioneira, 1998. ______..; VIEIRA, S. Análise de regressão: uma introdução à econometria. 2. ed. São Paulo: Hucitec, 1983.
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vol. 01, jan. / jun. 2007 ISSN 0000-0000 - v. eletrônica
INOVAÇÃO E DINÂMICA EMPRESARIAL Ester Amorim Nogueira Fernandes1
Licenciada e Mestre em Gestão Doutoranda em Gestão Instituto Politécnico da Guarda Escola Superior de Tecnologia e Gestão RESUMO
Até há cerca de duas décadas, os estudos sobre inovação, limitavam-se ao diagnóstico da I&D e
das actividades a que ela dava imediatamente origem. Nos últimos anos, ganhou importância a
ideia de que, tão importante como o diagnóstico da I&D, senão mais, é o estudo do processo de
difusão das inovações, o que apela para o estudo dos factores não-I&D da inovação. Tendo em
conta que a tecnologia é um factor fundamental de estruturação do desenvolvimento económico,
concentramo-nos mais nos factores sociais a que está associado, dado que estes aspectos têm
sido descurados em detrimento dos factores tecnológicos. Neste artigo, pretendemos reflectir,
sobre o conceito de inovação, meio inovador e processo de inovação numa abordagem
sistémica e interrelacional. Ter-se-à também em conta o factor competitividade e os agentes
locais que podem potenciar o desenvolvimento económico duma região. O objectivo central é
mostrar alguns conceitos que, para além de suportarem uma apreciação intuitiva de que a
tecnologia é importante para o crescimento económico, permitam afirmar que há fortes razões
para se considerar que o ritmo e a direcção da mudança tecnológica interagem com factores
económicos, associando-se cada vez mais os desempenhos macro-económicos e a
competitividade das empresas aos comportamentos de inovação.
PALAVRAS CHAVE: Desenvolvimento, Inovação, Competitividade.
1 Ester Amorim Nogueira Fernandes, Av.ª R.ª D. Amélia, 142 – 3.ºDto, 6300, Guarda Telemóvel: 962 652 694 ; E-mail: [email protected]
1
ABSTRACT
Until two decades ago studies on innovation were limited to the evaluation of R&D and activities
immediately related to it. In recent years, the idea that study of the process of the spread of
innovations is as important as the study of the evaluation of R&D has gained importance, which
has in turn drawn attention to the non-R&D factors of innovation. Bearing in mind that technology
is a basic structuring factor of economic development, we will concentrate more on social factors
to which it is associated, given that these aspects have been put aside to the detriment of
technological factors. In this paper, the intention is to contemplate the concept of innovation,
innovative tools and innovative processes in a systemic and interrelated approach. The
competitive factor and local agents who can give force to the economic development of a region
are also considered. The principal objective is to show some concepts that, apart from supporting
an intuitive appreciation that technology is important for economic growth, allow us to affirm that
there are strong reasons for thinking that the rhythm and direction of technological change
interact with economic factors, relating them more and more with macroeconomic efforts and
competitiveness of companies towards the behaviour of innovation.
KEY WORDS: Development, Innovation, Competitiveness. 1 INOVAÇÃO E PROCESSO DE INOVAÇÃO 1.1 Evolução do conceito de inovação
O tema da Inovação tem sido tratado muitas vezes em estudos relacionados com o progresso
técnico ou com o crescimento económico. Nos últimos anos o conceito de Inovação assumiu
mudanças de conteúdo, designadamente na relação a montante e a jusante (tecnologia e
mercado), esbatendo-se a ideia de que a inovação é um acto isolado e acentuando-se a de
processo interactivo.
No actual contexto económico e social em que se verificam profundas transformações estruturais
da sociedade, pondo em causa maneiras de viver, métodos e relações de trabalho, conceitos de
organização e formas de gestão em instituições, serviços e empresas, a existência de uma
concorrência agressiva, de um mercado em constante mutação e com solicitações permanentes
e onde a informação é cada vez mais um instrumento chave para o sucesso, a Inovação
assume-se como sendo uma condição necessária no âmbito de uma visão pro-activa e de
dinâmica do desenvolvimento económico.
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A definição do que é Inovação constitui desde logo uma séria interrogação que pode merecer
diferentes respostas de acordo com os indicadores disponíveis e os objectivos em vista. A
maioria das definições associa o conceito aos aspectos tecnológicos da introdução de novos ou
melhores produtos ou processos. Contudo, são comuns outras concepções, mais gerais, que
fazem englobar, por exemplo, as mutações organizacionais e de gestão verificadas muito para
além da análise estrita ao nível dos equipamentos, sistemas e dispositivos. Já J. Shumpeter
(citado por J. Barata, 1991: 163), admitia cinco tipos de inovação:
- Introdução de um novo produto;
- Introdução de um novo método de produção;
- A abertura de um novo mercado;
- Exploração de novas fontes de matérias-primas ou produtos semi-acabados;
- Implementação de novas formas de organização industrial.
Shumpeter, identificando inovação com progresso tecnológico, desenvolve um conceito bivalente
das transformações tecnológicas, referindo-se quer à produção de novos bens, quer à utilização
de métodos para produzir os mesmos bens.
É comum confundir-se Investigação e Invenção com Inovação. São aspectos ligados mas não
necessariamente coincidentes já que a investigação e a inovação são fontes da inovação. A
investigação é uma actividade que visa a procura de conhecimentos e a invenção é uma nova
descoberta científica ou técnica, tendo ou não por base a investigação. Uma primeira distinção a
fazer-se é, por conseguinte, entre invenções e inovações. A generalidade dos economistas
considera que a Inovação requer a adopção de métodos e equipamentos até então não
utilizados. Assim, para Freeman (1982), Inovação é a primeira introdução de um novo produto,
processo ou sistema na actividade comercial ou social normal de um país.
Deve-se a Schumpeter (1939) a distinção entre invenção e inovação. Invenções são
contribuições identificáveis para as mudanças tecnológicas, mas nem sempre são objecto de
aplicação. Muitas invenções permanecem sem utilização e não influenciam o sistema
económico. Elas tornam-se economicamente significativas apenas quando incorporadas em
inovações. Invenção corresponderia à descoberta de novas possibilidades para resolver
determinados problemas. No caso das invenções tecnológicas elas não são necessariamente
transpostas em patentes ou utilizadas na produção. O seu impacte económico ocorre apenas
quando a invenção se transforma em inovação, isto é, tem uma utilização económica (Freeman,
1988). Podemos assim ter inovações financeiras, na abordagem do mercado, organizacionais e
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institucionais. Se a invenção é a descoberta, o fabrico ou a montagem de algum novo processo,
produto ou ideia, a Inovação é o acto da passagem à prática desse processo, produto ou ideia
com o objectivo da sua exploração comercial. A Inovação caracteriza-se por uma orientação
directa para um produto, protótipo ou processo, sendo seu objectivo último a respectiva
colocação no mercado. Deste modo, a inovação associa-se à comercialização, o que a separa
do invento ou descoberta científica (Veiga Simão, 1990:111).
O conceito de inovação, não raras vezes, é utilizado fora do seu correcto enquadramento.
Brandão Alves e outros (1987) referem que a inovação não deve ser confundida com:
- Alta tecnologia, dado que uma inovação nem sempre advém do recurso às novas
tecnologias e pode ser um simples produto novo, vendável, resultante da utilização de
tecnologias tradicionais;
- I & D, porque esta actividade, conceptualizando o modelo de geração da inovação pelo
lado da oferta é apenas uma fase do processo encontrando-se a montante da inovação,
que supõe implantação no mercado;
- Invenção, uma vez que esta é apenas uma ideia nova que requer posterior transformação
em novo produto ou processo e a sua “união” com o mercado, a inovação.
De acordo com a proposta de Freeman (1982), a noção de invenção tem a ver com a ideia ou
modelo para um processo, produto ou sistema novo ou melhorado, enquanto a inovação, já com
uma semântica económica, tem a ver com a entrada da invenção no campo do mercado, com a
primeira transacção económica. Hall (1986) vai mesmo mais longe, ao referir que o processo de
inovação se pode enquadrar em três fases: a invenção ou a fase pura da criação, a montante do
mercado, a inovação, que corresponde ”grosso modo” ao envolvimento da invenção com o
mercado e, por último, a difusão, ou seja, a subsequente produção e alastramento da inovação
por todo o espectro económico. Da mesma forma se pronuncia Monck (1988), para quem a
inovação engloba a invenção e todos os estágios de implementação, como a Investigação, o
Desenvolvimento, a Produção e o Marketing. Há, portanto, a salientar que a invenção decorre de
um processo altamente criativo dependendo, crescentemente, das actividades de I&D mas
podendo, no entanto, existir sem qualquer vínculo a laboratórios ou centro de I&D. A inovação
segue, contudo, uma tramitação económica, cujo conceito sugere que se trata da entrada da
invenção no mercado, como já se referiu. Quando se dá a primeira transacção comercial
concretiza-se a inovação, ou seja, só se verifica a inovação quando um novo produto ou
processo é comercializado.
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Tradicionalmente as teorias económicas limitavam o estudo da inovação à relação linear
mecanicista “Investigação e Desenvolvimento → Invenção → Inovação”.
INVESTIGAÇÃO → INVESTIGAÇÃO → DESENVOLVIMENTO → PRODUÇÃO → MERCADO
BÁSICA APLICADA
O modelo linear de inovação tem acompanhado o pensamento sobre a ciência e tecnologia
independentemente da inovação ser explicada pela procura (demand-pull) ou pela oferta de
ciência e tecnologia (science/technology-pull) (Barata, 1992:154). Nesta óptica surge implícita a
ideia de que é a ciência, ou o seu desenvolvimento, que enquadram e gerem a inovação. Esta
seria apenas o fruto, a consequência, dos avanços em determinados campos científicos,
segundo o modelo acima explanado - (science/technology-pull). Neste modelo o laboratório
profissionalizado de I&D desempenha papel fundamental, actuando como protagonista em todo
o processo. Assim, neste âmbito de modelo linear, a ciência está na base da inovação, sendo a
criação da oportunidade científica a determinante do processo de inovação. Neste contexto, a
forma de intervenção pública na promoção da inovação procurou sempre actuar pelo
condicionamento da oferta. Aumentando o stock de conhecimento científico estava-se, neste
sentido, a fazer paralelamente com que a economia os assimilasse (Clark, 1990).
Até à década de sessenta, o modelo linear foi aceite. Contudo, hoje, alguns estudos vieram
refutar este modelo. Segundo a nova formulação, as inovações decorrem de respostas em
relação a necessidades sentidas no mercado, ou seja, é a necessidade económica a geradora
de inovação. Nesta perspectiva, as tecnologias são como que depositadas pelos inventores
numa prateleira à qual as empresas recorrem de acordo com as suas necessidades (Godinho e
Caraças, 1988:939). De acordo com esta visão, a inovação é consequência exclusiva da procura
dependendo, tal como a produção de outros bens, da actuação das forças de mercado (Barata,
1992:154).
Hoje, reconhece-se a importância dos factores não-I&D no processo de inovação,
nomeadamente os comportamentos de imitação e todos os mecanismos de difusão das
inovações que fazem com que muitas empresas inovadoras não desenvolvam necessariamente
actividades de I&D. O fenómeno da Inovação é visto, antes de mais, como um “processo” que
comporta contínuas e numerosas interacções e retroacções dependendo de uma estrutura plural
de actores institucionais (Barata, 1992: 154).
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Figura 1. - Modelo Interactivo de Inovação: informação/mercado
FACTORES TECNOLÓGICOS
FACTORES SÓCIO-ECONÓMICOS
INFORMAÇÃO
MERCADO
Predominânciado ” material” Difusão
Geração
Predominância do “ imaterial” Invenção/ideia
INOVAÇÃO(acontecimento)
Fonte: Godinho, M., e Caraças, J. (1988), pp. 940
Na figura 2, que representa o modelo interactivo de inovação distinguem-se dois níveis
fundamentais do processo de inovação: um de carácter basicamente “imaterial” - a geração da
inovação - que precede a inovação propriamente dita e onde a informação é dominante; outro
que corresponde à corporização do “imaterial” no domínio do mercado - o acontecimento
inovação, após o qual se processa a difusão da inovação. Neste modelo a interacção entre os
diversos agentes inovadores e subsistemas são as principais características do processo de
inovação (J. Barata, 1991: 155). Inovações com sucesso levam a um processo de difusão que
conduz então a efeitos perceptíveis no crescimento da produtividade e da economia. Neste
contexto, é importante sublinhar que muitas inovações acontecem durante processos de difusão,
quer como resultado da experiência do utilizador quer como resultado da competitividade entre
fornecedores. Por outro lado, como foi dito atrás, a inovação sem a difusão não tem efeitos
perceptíveis sobre a actividade económica. Por conseguinte, é preciso ter consciência de que a
inovação tem de andar profundamente ligada ao aspecto da difusão, pois só assim é que há
propagação do fenómeno inovatório.
Actualmente, tem-se como correcto que a inovação não depende só de um modelo ou de outro,
mas da conjugação no tempo e no espaço dos dois. A maioria dos autores concorda que a
inovação depende de influências do lado da oferta e do lado da procura. O modelo interactivo
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agora prevalecente sustenta que os novos produtos e os novos processos resultam de um
complexo de interacções que não é redutível a um simples modelo universal. O processo de
inovação requer, por um lado, conhecimento técnico-científico e, por outro lado, também a
existência de uma necessidade na economia.
Várias tipologias de inovação podem ser usadas em função dos objectivos da análise. Freeman
propõe uma distinção em função da amplitude da inovação e do seu impacte sobre o sistema
económico. Assim poderíamos ter inovações incrementais, inovações radicais, novos sistemas
tecnológicos e novos paradigmas técnico-económicos. A inovação incremental teria lugar de
forma mais ou menos contínua e corresponderia a pequenas melhorias ao nível dos produtos e
processos. A inovação radical estaria associada à introdução de produtos e processos novos. Os
novos sistemas tecnológicos consistiriam de “cascatas” de inovações radicais técnica e
economicamente correlacionadas. Finalmente, um novo paradigma técnico-económico define
ciclos longos de crescimento do tipo Kondratiev exigindo não só um conjunto articulado de
inovações radicais mas também mudanças económicas, sociais e institucionais. Algumas
tipologias acrescentam uma outra classificação que seria a da inovação adaptativa. Este
aperfeiçoamento da tipologia associa a inovação incremental ao espaço de suporte e a inovação
adaptativa ao espaço-mercado das empresas. No primeiro caso as inovações basear-se-iam
num conjunto de fontes, nomeadamente cooperação entre empresas, relações informais,
conhecimentos transitados por fornecedores de equipamento. No segundo caso o que ocorreria
seria a adaptação de conhecimentos existentes transferindo-os para novas utilizações, de forma
a ajustar os produtos aos gostos dos consumidores.
Uma nova tipologia atribuída a Pavit (1984) organiza a inovação conforme os sectores
produtivos onde ocorre. Teremos “sectores dominados pela oferta”, “sectores de escala
intensiva”, “sectores de fornecimento especializado” e “sectores baseados na ciência”. Nos
primeiros, a inovação incide sobre a melhor combinação ao nível dos bens intermediários e bens
de equipamento. Nos sectores de escala intensiva, a inovação resulta predominantemente de
esforços desenvolvidos internamente à empresa que denota muitos recursos a essa finalidade e
que posteriormente se revertem numa vantagem competitiva significativa. Nos sectores
fornecidos especializados a inovação consiste basicamente em inovação-produto
(principalmente bens de equipamento). Finalmente, nos sectores baseados na ciência a
inovação depende de invenções que poderão ser aplicadas em bens produzidos por um conjunto
amplo de sectores como bens intermediários ou como bens de equipamento. Ocorre em grandes
empresas e uma estrutura de investigação significativa é necessária. Referimos acima os
conceitos de espaço-mercado e espaço das empresas. Com efeito, alguns autores propõem
uma classificação de inovação conforme esta ocorre no espaço-produção, no espaço-mercado
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
ou no espaço-suporte das empresas. A inovação no espaço de produção seria aquela que incide
directamente sobre a produção de bens e serviços. A inovação no espaço-mercado integra as
mudanças no sistema de comercialização e de distribuição e que indirectamente se reflectem no
espaço produto. A inovação no espaço suporte compreende as mudanças ocorridas no meio
onde a firma se insere e que têm impacto sobre a sua “performance”.
1.2 Processo de inovação
O processo inovador desenvolve-se no espaço e no tempo e surge integrado entre a inovação,
descobertas científicas e tecnológicas e o desenvolvimento económico. A variável espaço faz
apelo ao meio inovador, enquanto a variável tempo surge a realçar o carácter dinâmico e não
linear de todo o percurso, desde o processo de I&D até à competitividade empresarial e às
inovações sociais sem esquecer o efeito de retorno temporal que o desenvolvimento concede
sobre a investigação e o progresso técnico. O processo de inovação é visto como um complexo
evolutivo de factores, alguns dos quais são exógenos ao próprio sistema de inovação, entendido
em sentido estrito, como os factores sociais, culturais e institucionais. Nesta perspectiva, a
cultura, compreendida em sentido lato, acaba por ser o factor preponderante de todo o processo
de inovação. A hipótese é que o ambiente local, com a sua cultura, com as suas tradições sócio-
económicas, em larga medida determina o cariz de actividade inovadora. A empresa não é um
agente isolado do contexto, mas sim um elemento enquadrado no meio local que a influencia
decisivamente. Como refere Aydalot (1988), o ambiente local é, de facto, o agente inovador, em
vez da firma. White e outros (1988) referem que a estrutura dos mercados regionais aparece
intimamente relacionada com diferenças na capacidade de inovação. Aydalot descreve o
processo de inovação, como um processo de quebra e continuidade, que conjugado com as
características do meio facilmente fornece know-how básico, confiança e interacções sociais que
são as pré-condições para a criatividade económica e potencial inovação. Estes elementos são a
base do dinamismo económico e cultural das regiões.
O sistema de Ciência e Tecnologia, directamente ligado à I&D, é um dos componentes
fundamentais, mas tal como todos os outros, como o sistema produtivo, a estrutura demográfica,
o regime fiscal. Contudo é um dos factores mais importantes porque é, também, aquele em que
mais facilmente se pode actuar para dinamizar o processo de inovação. No entanto, o sistema
de C&T não deve ser pensado isoladamente, sob pena de não surgirem os efeitos desejados no
campo da inovação, embora se reconheça, por um lado, que os novos produtos e processos
estão crescentemente impregnados de informação científica e técnica, dada a sua
complexidade. O processo de inovação não pode ser pensado sobre a forma de uma adaptação
para o desenvolvimento de uma dada tecnologia, mas como um processo de pesquisa e
aprendizagem resultando no surgimento de tarefas inteiramente novas e qualificadas que
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
transformam o próprio meio e dessa forma permitem alargar a hierarquia existente de problemas
e soluções (Gaffard, 1986:24). Isto é, a inovação não se confina aos meandros da inovação
tecnológica, antes se alarga para englobar a inovação social, a cultural, a institucional. As
fronteiras esbatem-se e torna-se destituído de sentido procurar melhorar a competitividade de
uma economia no contexto internacional só com actuações no campo da inovação tecnológica,
se bem que se reconheça o papel importante que este desempenha. A inovação tecnológica
obriga, necessariamente, a um clima de inovação institucional e à existência de um padrão de
cultura que aceite e promova a mudança social. Assim, esta nova visão do processo de inovação
é fundamentalmente diferente das formulações tradicionais quer porque, por um lado, a
interacção entre a multiplicidade de actores institucionais desempenha, agora, papel de vulto,
quer porque, por outro lado, contextualiza a I&D no seu ambiente cultural mais lato que a
enquadra e condiciona.
Poderá pensar-se que a afirmação de uma inter-relação entre inovação e desenvolvimento
regional repousa, em primeira instância, no facto de se gerar uma interdependência entre os dois
níveis: se a inovação está associada a um conjunto de factores de ordem humana, material e
financeira na promoção do desenvolvimento ao nível de um espaço regional, por outro lado, a
presença e efectivação no território dos mesmos factores e consequentemente a elevação do
grau de desenvolvimento desse território, constituem o ponto central à eclosão de um processo
de inovação.
A inovação não se reduz apenas e tal como temos vindo a referir, ao acto através do qual se
adaptam em termos práticos e se concretizam em projectos empresariais as invenções
entretanto realizadas ou se melhoram os procedimentos já existentes através de novas
aquisições proporcionadas pelas descobertas; ela resulta, também, do contacto quotidiano com
o processo de fabrico e com o meio envolvente, em especial os clientes e fornecedores, que são
igualmente fontes geradoras de inovação e que representam menor risco referindo como
exemplos as joint-ventures, os acordos de cooperação comercial, as auditorias e estratégias
conjuntas em todas as áreas funcionais da Organização/Empresa. Este conceito de inovação,
baseado no contacto com o processo de fabrico, em particular, e com a organização, em geral, e
ainda com o meio envolvente, tem um efeito indutor sobre o aumento de produtividade, sobre a
redução dos custos, a melhoria da qualidade e a satisfação de clientes e fornecedores. Os
próprios recursos humanos, quando identificados com a cultura da empresa, são uma garantia
de agentes potenciais de inovação nas soluções encontradas para problemas eventualmente
surgidos. Assim, podemos definir inovação como o resultado do encontro de uma ideia
tecnicamente razoável com uma oportunidade económica e social.
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
A inovação, entendida como a consequência de uma dinâmica sócio-organizacional
territorialmente localizada, aponta para um conjunto de estudos e posições teóricas recentes, por
parte de vários autores que associam o processo de gestação e difusão de inovação, no
contexto actual de uma economia flexível, a conceitos como os de meio inovador e rede de
inovação.
1.3 Meio inovador e rede de inovação
O entendimento do processo inovação - desenvolvimento torna-se mais claro quando
enquadrado num contexto global integrando, na análise, as variáveis espacial, social e temporal.
As variáveis espaço social surgem esclarecendo as diferenças locais do meio em que a
inovação se desenvolve, o chamado meio inovador. A variável temporal é a que nos permite
transportar no tempo os efeitos, em cadeia, que integram e articulam o confronto de factores
ligados à inovação ao desenvolvimento, como temos vindo a referir.
O conceito de meio inovador foi desenvolvido para dar conta, no plano teórico, da modificação
da posição de certas regiões menos desenvolvidas na hierarquia espacial. Segundo Aydalot
(1984), este facto, constatado no início dos anos 70, não era explicado pelas teorias da época,
como a teoria da polarização ou a teoria da divisão espacial e funcional do trabalho, e é verdade
que essas teorias explicam a hierarquia dos espaços e não a transformação desta última. Esta
constatação levava à conclusão lógica da existência de uma dinâmica autónoma no interior de
certas regiões, permitindo-lhes melhorar a sua posição na hierarquia. Considerando que o
território não é dado à priori, mas que ele é construído graças à dinâmica dos meios, podemos
desde logo considerar que as colectividades regionais têm a possibilidade de promover uma
verdadeira dinâmica local fundada na acumulação, no seu território, dos recursos colectivos
específicos necessários ao dinamismo do seu aparelho tecno-produtivo (Perrin, 1992).
Segundo os autores Maillat e Lecoq (1992), Benko e Lipietz (1992), a modificação da hierarquia
das regiões observada ao longo dos últimos 20 anos é largamente devida a fenómenos de
desenvolvimento nascidos no interior dessa mesma região. O conceito de meio permite
compreender estes fenómenos e de os formalizar. Pode-se assim mostrar como dinâmicas
territoriais específicas funcionam de tal forma que o desenvolvimento de uma região não está
subordinado à sua única capacidade de atracção de estabelecimentos e de filiais de grandes
empresas, mas depende da sua atitude em originar iniciativas locais, em gerar um tecido de
novas empresas e colocar em funcionamento uma dinâmica territorial de inovação. Os estudos
realizados ao longo dos anos 60 punham em relevo o papel preponderante de grandes
empresas e de grupos multinacionais no funcionamento das economias dos países
industrializados. A atenção estava virada para a organização fordista do trabalho, na divisão
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
espacial das funções e na oposição entre as regiões centrais e periféricas. Desde o fim dos anos
70, o desenvolvimento do número de pequenas empresas, as manifestações da sua criatividade
e a sua capacidade de inovação, relançaram o interesse nas novas formas de organização de
produção e nos mecanismos do desenvolvimento territorial. Esta evolução pôs em evidência as
acções de interdependência ao nível territorial, em que as empresas criam redes de troca e de
cooperação no seu território de implementação participando, assim, na construção de um
ambiente apropriado que lhes permite beneficiar de “externalidades” e recursos específicos.
Assim, ao modelo de desenvolvimento vindo do exterior e difundido pelas grandes empresas,
substitui-se um outro no qual os territórios não aparecem mais como suporte passivo para a
localização de empresas, mas como meios activos no seio dos quais nascem a inovação e a
criatividade.
Foi de facto Aydalot (1986) que colocou a hipótese do papel determinante desempenhado pelos
meios locais como incubadores de inovação. Realçando que a empresa não é um agente
inovador isolado mas faz parte de um meio que a faz agir, ele sublinhava que o passado dos
territórios, a sua organização, os consensos que os estruturam era os maiores contributos da
inovação. Assim podemos considerar que os comportamentos inovadores não são nacionais
mas dependem de variáveis definidas a nível territorial.
Considerando os meios como incubadores de inovação, eles não correspondem a territórios
entendidos como simples suporte de actividades económicas. Cada meio apresenta-se como
uma configuração de agentes e de elementos económicos, sócio-culturais, políticos e
institucionais, possuindo modos de organização e de regulação específicos (Maillat e Perrin,
1992).
Esta análise diferencia-se da aproximação em termos de localização (presença de mão-de-obra
qualificada, centros de investigação, aeroportos, actividades culturais, de um clima de bem
estar), que era suposto explicar o desenvolvimento de novas actividades, nomeadamente a
emergência das actividades de alta tecnologia. Contudo esta aproximação não deu os resultados
esperados porque, considerando o território como um simples suporte de factores de
localização, ela não permitiu explicar o funcionamento dos processos de desenvolvimento. Pelo
contrário, colocando o acento na organização dos meios, nos quais as variadas relações de
cooperação se estabelecem entre empresas, clientes, fornecedores, centros de investigação e
formação, defendemos que o elemento essencial não é o território no sentido banal: o que
importa é o reagrupamento de agentes económicos e de recursos imateriais (formação e
investigação) que, pelas suas interacções desenvolvem as competências, o saber fazer, as
regras específicas. Convém não considerar o território como um dado à priori, mas como o
resultado de um processo de construção (fala-se de território construído) oriundo de estratégias
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
organizacionais dos actores e de fenómenos de aprendizagem colectivos (Lecoq, 1992). Esta
problemática está muito bem ilustrada por Gaffard (1992) quando escreve hoje nós temos que
fundamentar a nossa análise numa sólida teoria de mudança de tal forma que o território não
surja mais como um conjunto de factores de localização e de instituições, mas seja visto como
um recurso específico e neste sentido que a sua construção se torne um elemento essencial do
processo de mudança. Partindo desta premissa, o conceito de meio toma todo o seu sentido,
porque ele sublinha o papel de recursos imateriais (saber fazer), de proximidade, das diversas
formas de cooperação e de aprendizagem nas capacidades de uma região em dirigir o seu
desenvolvimento.
Estudos empíricos levados a cabo no seio do GREMI (Groupe de Recherche Européen sur les
Milieux Innovateurs), orientados sobre o conceito do meio inovador, têm sublinhado o papel
essencial da componente territorial no processo de inovação, nomeadamente na criação de
novos recursos. Em vez de se debruçar na eficácia dos factores regionais de produção, o
GREMI chamou a atenção para os aspectos territoriais dos diferentes recursos colocados em
acção nos processos de inovação. A sua reflexão reside na consideração de que a organização
territorial é uma componente essencial da criação técnico-económica, remetendo para o conceito
de meio inovador (Maillat, Crevoisier e Lecoq, 1991; Perrin, 1991, Barquero, 1993: 56-59).
Contrariamente às teorias tradicionais que separam a inovação e o espaço, as análises teóricas
do GREMI integram estas duas variáveis ao mostrar empiricamente que o processo de inovação
é diferente em cada meio e que este é uma das bases determinantes do processo de inovação.
Segundo Lecoq (1991:133), o meio inovador é um conjunto territorial reticularmente integrado de
recursos materiais e imateriais, dominado por uma cultura historicamente construída, vector de
saber e saber-fazer e repousando sobre um sistema relacional de tipo cooperação-concorrência
entre os actores localizados. Desta definição derivam três dimensões da noção de meio que
concorreram à identificação dos seus compostos principais:
- Uma dimensão territorial - o meio é um espaço geográfico sem fronteiras definidas à
priori, que não corresponde necessariamente a uma determinada região, identificada por
uma certa unidade e homogeneidade, traduzida em comportamentos identificáveis,
específicos e com uma cultura técnica, entendida como a elaboração, a transmissão e a
acumulação de práticas, saberes e saber-fazer, normas e valores ligados a uma
actividade económica. (Maillat e Perrin, 1992);
- Uma dimensão cognitiva - o meio reagrupa um todo homogéneo, um aparelho produtivo,
uma cultura técnica e os actores. A cultura da empresa, as práticas organizacionais, os
saberes-fazer, a maneira de utilizar as técnicas e apreender o mercado, são elementos
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
integrantes e partes constitutivas do meio. Neste residem um conjunto de práticas e de
saberes-fazer individuais e colectivos (Maillat, Crevoisier e Vasserot, 1992). Esta
concepção põe em evidência dois elementos essenciais do meio:
- Apresenta o meio como um processo e não como um conjunto estático de recursos
genéricos;
- Sublinha a importância do mercado local do trabalho, o qual assegura a circulação e a
troca do saber-fazer, a transmissão e a reprodução da cultura técnica local, como
consequência, contribui para a reprodução e para a transformação do meio.
- Uma dimensão organizacional - o meio constrói-se e desenvolve-se a partir de redes
territoriais que são a expressão de um sistema de interdependência entre os actores
(Perrin, 1991 e Quévit, 1991).
O conceito de meio inovador, desenvolvido por Camagni (1992: 430) inclui todos os elementos e
processos que afluem ao nível local, por isso ele define-o como um conjunto de relações que
ocorrem dentro de uma dada área geográfica que traz unidade ao sistema de produção, aos
agentes económicos, e uma cultura industrial que gera um processo dinâmico localizado de
aprendizagem colectiva e age como um mecanismo de redução das incertezas do próprio
processo inovador. Neste sentido o conceito de meio inovador incide a sua atenção no processo
de inovação. Este é a organização territorial onde nascem os processos de inovação. Segundo
Maillat, Quévit e Senn (1993) e Perrin (1991), o meio inovador pode-se definir como um conjunto
territorializado no qual as interacções entre agentes económicos se desenvolvem pela
aprendizagem que eles fazem de transacções multilaterais, de “externalidades específicas” à
inovação e pela convergência das aprendizagens tendo em vista formas comuns de gestão dos
recursos. A inovação é portanto, segundo esta concepção, considerada como um processo de
integração de elementos que determinam e favorecem a dinâmica e a transformação do sistema
tecno-produtivo territorial. Deste modo, o meio inovador caracteriza-se pela integração de
dinâmicas internas e de mudanças vindas do exterior (extra-locais) (Maillat, Quévit et Senn,
1993; Perrin, 1992). Assim, a inovação sendo um processo complexo e incerto é geralmente
posta em acção de maneira colectiva sob a forma de redes de inovação. O meio, tendo em conta
as suas características, nomeadamente da lógica de interacção e da dinâmica de aprendizagem,
é o contexto apropriado à sua formação, ao seu desenvolvimento e à sua difusão (Maillat, Quévit
et Senn, 1993; Perrin, 1992).
Uma rede de inovação é uma forma de organização das relações entre os actores dum processo
de inovação que, pela sua pluralidade das especialidades e diversidades dos saber-fazer, coloca
em acção uma aprendizagem individual e colectiva cujo efeito sinergético contribui de maneira
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
determinante para a criatividade do conjunto (Perrin, 1990). Outros autores (Maillat, Crevoisier e
Lecoq, 1991: 409) definem rede de inovação como um modo evolutivo de organização dos
processos de inovação, não estruturado sobre uma forma hierárquica ou sobre mecanismos de
mercado, que permite o desenvolvimento contínuo do processo de aprendizagem colectiva
repousando sobre combinações novas de tipo sinergético dos saber-fazer detidos pelos
diferentes parceiros. A rede de inovação constitui uma resposta organizacional apropriada à
complexidade do processo de inovação. Determina um espaço de trabalho colectivo adequado à
combinação criativa de saberes-fazer internos e externos à empresa. De acordo com este
conceito, a concretização de um processo de criação e difusão tecnológica supõe uma inovação
de carácter sócio-organizacional, criação de redes, com reflexo sobre esse mesmo processo de
inovação. Assim remete para a ideia do processo de inovação como um processo não individual
e isolado mas colectivo, fruto da interacção entre distintas categorias de actores: empresas,
centros de investigação e Universidades, instituições públicas e privadas, entidades
financiadoras, organizações de consultoria em inovação.
A organização em rede gera a soma de saberes-fazer individuais num saber-fazer colectivo que
é superior à soma de cada uma das partes. Quer se trate de um produto novo utilizando novas
técnicas ou de um produto que resulte de técnicas já difundidas, a inovação será o fruto de uma
combinação criativa de saberes-fazer e competências especializadas existentes ao nível local,
com recurso complementar a elementos extra-locais (humanos e/ou técnicos). O grau de
inovação reflecte-se nos saberes-fazer necessários, nos modos de aprendizagem colectiva e
nas próprias formas de organização em rede (Maillat, Crevoisier e Lecoq, 1991: 412-413). A
implementação de uma organização em rede transforma a inovação num processo não apenas
dependente de condicionantes técnicas e económicas, mas igualmente de factores históricos,
culturais e normativos; uma rede supõe uma tradição e experiência de relacionamento entre os
distintos actores, baseada em regras de confiança e conhecimento mútuo e implica a partilha de
uma cultura de inovação e de risco, associada a princípios de cooperação (Perrin, 1991: 352 e
Maillat, Crevoisier e Lecoq, 1991: 408-409).
Considerado na sua relação com as redes de inovação, o meio representa um conjunto de
recursos estratégicos fundamentais à constituição e eficácia daquelas, e consequentemente ao
sucesso de um processo de inovação. Para além dos recursos humanos, financeiros e materiais
mobilizáveis, referem-se igualmente os recursos imateriais: saberes-fazer e competências
especializadas, uma história de cooperação e interacção num quadro de competitividade, uma
cultura de inovação e risco, regras definidas e em ocorrência no meio (Barquero, 1993: 48-49). O
meio inovador participa na constituição de redes de inovação e intervém na sua dinâmica. De
igual modo se poderá dizer que, reciprocamente, as redes de inovação enriquecem o meio no
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sentido de um crescimento das capacidades criativas deste, do fortalecimento das articulações
cooperativas entre actores distintos, do reforço da cultura empresarial local (Maillat, Crevoisier et
Lecoq, 1991: 415 - 416).
Mas é evidente que nem todos os meios são necessariamente inovadores. A realidade mostra
que um meio é mais ou menos conservador ou mais ou menos inovador, de acordo com as
práticas que regulam a sua organização serem orientadas para a exploração das vantagens
adquiridas e/ou renovação e criação de novos recursos. A sua evolução dependerá da
capacidade que têm os agentes locais em compreender as transformações técnicas e de
mercado em relação ao que se passa no seu meio. Para se tornarem inovadores, eles têm de
ser capazes de reconhecer as mudanças que intervêm no seu meio ambiente e de se
apoderarem delas, ou seja, de gerar processos inovadores susceptíveis de assegurar a
adaptação do sistema territorial de produção, desenvolver novas competências (nomeadamente
saber-fazer) e novas formas de cooperação (acordos de cooperação tecnológicos e de
comercialização, alianças estratégicas) entre instituições de investigação e públicas com vista a
colaboração em projectos tecnológicos, educacionais e de infra-estruturas.
1.4 Inovação, competitividade e desenvolvimento
Uma nova era de Competição surgiu nos últimos 20 anos, principalmente relacionada
com a globalização dos processos económicos. A competição já não é a descrição de
um modo de funcionamento de uma configuração particular de um mercado (um
mercado concorrencial), para o distinguir dos mercados oligopolistas e monopolistas.
Ser competitivo (isto é, a competitividade) deixou de ser um meio, a competição adquiriu
um estatuto de ideologia.
(Grupo de Lisboa, 1994: 14)
No quadro das profundas mutações que se têm vindo a operar nas últimas décadas, o aumento
da produtividade e da eficácia económica e, consequentemente, o crescimento económico, são
actualmente cada vez mais consequência directa e dependente da constante evolução
tecnológica, do aumento da flexibilidade dos sistemas produtivos, da crescente globalização e
segmentação do mercado, do surgimento de sistemas produtivos locais competitivos (Barquero,
1993: 16). Neste contexto aumentam as pressões sobre os processos de inovação, a
necessidade de uma eficácia crescente na gestação e difusão de novas tecnologias, novos
produtos, novos modelos organizativos e novos mercados que possibilitem a manutenção do
crescimento e de uma capacidade competitiva. Como resultado da crescente globalização da
economia mundial, compreende-se que um país já não é competitivo por ter uma dada dotação
de recursos, porque esses recursos estão disponíveis no mercado. Um novo paradigma de
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competitividade surge: o êxito da competitividade assenta hoje na capacidade de adicionar valor
aos factores de produção disponíveis, sejam eles nacionais ou importados (Mira Amaral, 1994,
p: 47). À teoria das vantagens comparativas, sucede a teoria das vantagens competitivas. Ou
seja, o factor chave não é apenas ter recursos, mas sim a maneira como são utilizados. O
importante é o esforço e o avanço constante para novos produtos, novos processos de fabrico
que nos diferenciem da concorrência. Assim, o que está em causa são as estratégias
empresariais, pois tudo isso tem a ver com a capacidade de planeamento empresarial, com a
existência de gestores e quadros com elevada qualificação, de técnicos com a melhor formação,
com a motivação generalizada no sentido do aumento constante da produtividade e da resposta
às necessidades. Os recursos humanos altamente qualificados e motivados constituem o
elemento imprescindível e exigível às vantagens competitivas de um país ou região.
Numa economia global, as matérias-primas, as tecnologias e os capitais, além de disponíveis no
mercado internacional, têm uma acessibilidade extensiva a todos os que a esses recursos
quiserem recorrer. Por isso, com a globalização das economias e com a mobilidade de factores,
não podemos pensar somente em termos de existência de recursos, já que o que determina a
competitividade é a forma como esses recursos são utilizados, através da valorização e da
inovação, ou seja da diferenciação relativamente a outros, avançando para novos produtos e
novos processos. O “negócio” é global mas as vantagens competitivas geram-se localmente
sendo a localização importante pois que os “ingredientes” para a inovação são inerentemente
locais.
Hoje em dia, a competitividade reside na capacidade de ser muito inovador para evoluir para
novos produtos e novos processos, para ser muito rápido na resposta ao mercado através dos
processos industriais flexíveis, jogando nas economias de gama e não nas economias de escala.
A capacidade de inovar é então profundamente influenciada pela localização, dado que é
necessário uma base doméstica onde existam clientes sofisticados, capacidade empresarial,
empresas competitivas e clusters industriais dinâmicos para que a competitividade possa ser
aumentada através da investigação e desenvolvimento tecnológico, do desenvolvimento dos
mercados e dos fornecedores bem como da capacidade de gestão e organização, assumindo
relevância determinante a informação, o conhecimento e o saber fazer. Dentro deste contexto,
uma indústria desenvolve-se se for competitiva. É competitiva se conseguir que os seus
produtos se imponham no mercado. Os seus produtos conseguem-se impor, apenas, se forem
inovadores. Em qualquer dos casos é a tecnologia a base da competitividade, quer como fonte
de inovação, quer como factor de produção. A inovação é um factor de capital importância na
competitividade empresarial. Porter (1990: 86) realça como importante factor de competitividade
a inovação, que engloba não só a tecnologia mas também os métodos, abrangendo novos
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produtos, novos métodos de produção, novas formas de organização, novas maneiras de
comercializar e identificação de novos grupos de clientes (alteração de gostos, exigências de
qualidade pelos consumidores). A introdução no mercado de uma inovação procura
invariavelmente os benefícios de uma vantagem competitiva, crescente fracção de mercado,
altas taxas de crescimento, que sempre resultam em altos lucros. As inovações que conduzem à
vantagem competitiva envolvem uma acumulação de pequenos passos e esforços contínuos.
Assim a inovação e a competitividade têm um carácter dinâmico. Não estabilizam num estado de
equilíbrio, mas evoluem num perpétuo estado de mudança (Schumpeter, 1957).
Segundo Porter (1993), a inovação visa o desenvolvimento a nível local, regional e nacional e
isso passa pelo envolvimento empenhado de toda a população e instituições e em particular das
empresas com vista a obter ganhos de competitividade que deverão situar-se cada vez mais a
nível internacional. O esquema que se apresenta (figura 2) faz ressaltar todas os componentes
que acabamos de referir, ou seja, o envolvimento do meio, o processo de I&D, a invenção e o
processo de fabrico, como fontes de fornecimento da inovação, da competitividade e do
desenvolvimento.
Figura 2. - Relação entre Inovação e Respectivas Fontes: Competitividade e Desenvolvimento
INVESTIGAÇÃOE
DESENVOLVIMENTO INVENÇÃO
DESENVOLVIMENTO MEIOENVOLVENTE
PROCESSO DE FABRICO
COMPETITIVIDADE EMPRESARIAL
INOVAÇÃO
Fonte: Adaptado de Guide sur l’évolution/sélection des projects e des entrepreneurs, Edit. EBN, 1992.
A componente empresarial deve estar associada às restantes dimensões ou aos diferentes
factores de inovação. O espírito empresarial e os conhecimentos acumulados da população são,
segundo Maillat (1986), os gérmens do desenvolvimento. Maillat põe assim em relevo um
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processo dinâmico de inovação e desenvolvimento ligado à dinâmica histórica, com todos os
valores, costumes, cultura, que ela transportou até aos nossos dias e à dinâmica actual e futura,
ligada ao espírito empresarial que, em nosso entender, deve ser encarado não apenas como um
dado adquirido e estático, mas como algo que, iniciado no passado, se enraíza no presente e se
projecta no futuro. O espírito empresarial ou não existe ou, quando existe, desenvolve-se num
processo de retroacção com a inovação e o desenvolvimento.
De acordo com Barquero, o saber-fazer tecnológico e inovador integra um conjunto de factores
críticos que marcam o êxito de uma intervenção no desenvolvimento estratégico de um espaço
local. Factores esses que se agrupam em cinco categorias:
1. O hardware do desenvolvimento local, constituído pelas infra-estruturas de base que
sustentam os processos de mudança e onde se incluem as redes de transportes e
comunicações, as políticas de acondicionamento dos solos ou as infra-estruturas de
natureza social como hospitais e escolas;
2. O software do desenvolvimento local, formado por factores qualitativos e imateriais
necessários ao crescimento, ou seja, acções no sentido de melhorar a qualificação dos
recursos humanos, o saber-fazer tecnológico e inovador, a capacidade empreendedora
existente, o nível de informação, a cultura de desenvolvimento da população;
3. O Orgware do desenvolvimento, que se traduz na capacidade de organização do espaço
para enfrentar os desafios, uma capacidade que não concerne apenas à administração
pública e empresas, mas deve incluir todos os agentes;
4. O finware do desenvolvimento local, correspondente ao conjunto de instrumentos
financeiros, públicos e privados, utilizados no desenvolvimento estratégico de um
território;
5. O ecoware do desenvolvimento local, constituído pelo conjunto de instrumentos que
organizam o uso adequado dos recursos naturais existentes, permitindo
simultaneamente uma melhoria da qualidade de vida e o aumento da capacidade
competitiva.
Se a detenção de uma capacidade inovadora é condição estrutural, a par de outras, para a
efectivação de uma dinâmica de desenvolvimento ao nível de um espaço regional, vários autores
(Aydalot, 1986; Godinho e Caraça, 1988: 955-956; Blakely, 1994: 304-310) chamam a atenção
para o facto de que esta inovação, e em particular a sua difusão, só se verificará quando
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estiverem reunidos num determinado espaço territorial um conjunto de factores de base que a
potenciam e sustentam. Por exemplo, realçam a importância de:
- A presença de universidades e organismos públicos de pesquisa;
- O acesso a redes importantes de transportes e comunicações que, entre outras funções,
permitam absorver a informação científica e técnica proveniente do exterior;
- A presença de recursos humanos devidamente qualificados;
- A existência de uma qualidade ambiental, cultural, de serviços, propiciadora de condições
de vida atractivas;
- A inserção num quadro legal favorável à inovação, nomeadamente quanto ao regime de
patentes;
- A existência de capital de risco disponível para financiar inovações;
- Formas e espaços de interacção entre os diferentes agentes do sistema de inovação.
Como afirma Mira Godinho, se não existirem redes de inovação orientadas de acordo com o
desenvolvimento tecnológico interno, nas quais participem as empresas, as instituições públicas
e privadas de I&D, os estabelecimentos de ensino superior e os imprescindíveis fornecedores de
meios financeiros, o potencial de absorção e inovação da economia encontra-se francamente
limitado (citado por Godinho e Caraça, 1988:956). Por conseguinte, podemos referir que existe
um conjunto de parâmetros que surgem como factores estratégicos para o desenvolvimento
local e como requisitos para uma capacidade inovadora e para o fomento da difusão da
inovação, pelo que deverá haver uma inter-relação entre a inovação e o desenvolvimento
regional, de forma a atenuar dificuldades existentes, no desenvolver de factores de
competitividade, dado que existem ainda bloqueios à diversificação produtiva cuja
ultrapassagem, a não ocorrer, pode comprometer a modernização e o desenvolvimento local,
como sejam: as acessibilidades, uma cultura empresarial local apoiada em estratégias de
reprodução limitada e proteccionismo de mercado, modelos de gestão reprodutores de
comportamentos tradicionais reflectidos numa internalização das funções de gestão e resistência
ao recurso a competências externas, um quadro negativo em termos de potencial humano
mobilizável. O sistema produtivo local terá de passar necessariamente por um comportamento
que potencie a mudança ao nível dos produtos, dos mercados, das estruturas organizacionais da
produção de forma que assegurem mecanismos de adaptabilidade à concorrência de mercado.
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Segundo Porter (1993), o único conceito relevante para a competitividade a nível nacional é a
produtividade. O principal objectivo de uma nação é produzir para os seus cidadãos um alto e
crescente padrão de vida. A capacidade para o fazer depende da produtividade com que a mão-
de-obra e o capital são utilizados. Esta depende tanto da qualidade e características dos
produtos como da eficiência com que são produzidos. Este é o primeiro determinante do padrão
de vida de uma nação, a longo prazo, e é a origem do rendimento nacional per capita. Por sua
vez, a competitividade de uma nação depende da capacidade da sua indústria para inovar e
melhorar. É com a inovação que as empresas conquistam a vantagem competitiva. Têm da
inovação uma perspectiva alargada, que abrange tanto as novas tecnologias como as novas
maneiras de fazer coisas. Têm a percepção das novas bases da concorrência, ou concebem
métodos melhorados para competir dentro de esquemas já antigos. A vantagem competitiva cria-
se e sustenta-se através de um processo fortemente localizado. As diferenças de valores
nacionais, de cultura, estruturas económicas, instituições e histórias nacionais são importantes
contributos para o êxito na concorrência. O empresário deve surgir como um recurso tipicamente
territorial, no sentido de que ele é o produto de um meio, isto é, de uma combinação local
específica de factores económicos, sociais, culturais e institucionais.
As profundas alterações surgidas na Europa a partir de finais do século XVIII engendraram um
determinado modelo de sociedade e de esfera de valores, que orientou a gestão e o
desenvolvimento das empresas para uma configuração predominantemente economicista e
tecnicista, menosprezando os aspectos sociais, afectivos e ambientais. Tal configuração
resultou, no domínio empresarial, na sobrevalorização dos aspectos económicos da vida social,
no privilégio dos aspectos quantitativos em detrimento dos qualitativos, na predominância de
uma perspectiva tecnicista que não contempla os aspectos humanos e organizacionais e no
desenvolvimento de um racionalismo anacrónico que baniu a necessidade fundamental de se
manterem em equilíbrio as relações sociais, afectivas e ambientais. Um desenvolvimento
económico-social, sustentado em dinamismos regionais devidamente integrados, carece de uma
profunda interligação de objectivos de produtividade, qualidade e flexibilidade, com um corolário
de desenvolvimento das relações sociais e preservação do meio físico envolvente, para melhoria
da qualidade de vida das populações. A necessidade de elevação dos níveis de competitividade
empresarial face à integração no mercado interno europeu e à crescente mundialização da
economia, trouxeram a temática do desenvolvimento do potencial humano como um recurso
estratégico. É importante introduzir uma nova concepção de empresa, na qual a flexibilidade
sócio-organizacional se torne uma vertente fundamental de estratégias sócio-económicas, no
âmbito das quais os objectivos sociais e económicos são muito mais convergentes do que até
aqui têm sido assumidos. A flexibilidade sócio-organizacional, indispensável para a eficiência
dos meios técnicos ao dispor dos objectivos organizacionais e à eficácia que se pretende
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
alcançar, deve assentar no desenvolvimento do potencial humano como um recurso estratégico,
capaz de rentabilizar os demais recursos organizacionais. A flexibilidade que se pretende já não
é apenas técnica e quantitativa, mas também qualitativa. Isto é, importa encontrar um equilíbrio
dinâmico do sistema empresa, capaz de imprimir um ritmo de competitividade empresarial
assente na produtividade, na qualidade e na flexibilidade de uma forma integrada. Obviamente,
estas condições permitem a elevação do nível de vida das populações e com ele torna-se
possível o desenvolvimento das relações sociais e a preservação do meio ambiente, a caminho
de um equilíbrio sócio-ambiental indispensável à vida. Este aspecto é muito importante,
porquanto a optimização da competitividade não se pode realizar num quadro exclusivamente
económico; a optimização efectua-se mediante uma participação mais ampla dos indivíduos,
cuja origem se situa no eixo social - a resistência à mudança inviabiliza os resultados
económicos, enquanto as atitudes participativas desenvolvem os restantes sistemas da
empresa. Como refere Likert, a gestão humana é a tarefa central e mais importante de todas as
tarefas de gestão, porquanto a forma como se realiza condiciona as demais actividades (citado
por Martinet, 1990). Dito de outro modo, as empresas serão competitivas se os seus recursos
humanos forem qualificados. O desenvolvimento regional será uma realidade e obterá ganhos
significativos de produtividade e de competitividade se forem criadas oportunidades para a
realização das aspirações dos indivíduos.
1.4.1 O papel dos recursos humanos na competitividade empresarial
A introdução constante de novas tecnologias e a sofisticação na indústria têm
transformado as exigências de formação de pessoal nos últimos 20 anos.
Porter, 1994: 57
No actual contexto de mudança, novas exigências são feitas ao trabalhador e ao seu
desempenho. Cada vez mais as ideias e a capacidade de inovação de cada indivíduo têm um
papel fundamental no bom desempenho duma empresa ou organização. Ao trabalhador é-lhe
exigido o desenvolvimento de aptidões que lhe confiram essa flexibilidade de actuação. Porter
(1993), salienta como fundamental para a inovação e competitividade empresarial o papel da
formação dos recursos humanos pelo que a formação profissional assume, actualmente, um
papel de maior relevância no novo modelo de desenvolvimento - menos centrado na
administração dos recursos físicos e materiais e mais orientado para a valorização dos recursos
humanos. Presentemente, existe a convicção de que o futuro se jogará nos domínios da
qualidade, da produtividade e da inovação, partindo do “valor acrescentado” gerado pelo
investimento nas pessoas. Isto alerta-nos para o facto de ser indiscutível que a formação seja
um meio para atingir níveis superiores de competências competitivas, quer a nível estratégico,
21
Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
quer a nível técnico, quer a nível social. Ela é um dos mais perfeitos e eficientes processos de
comunicação e de lançamento de bases de inovação. A própria política comunitária reconhece
como essencial a formação profissional para a implementação de uma sociedade dinâmica
capaz de dominar as transformações económicas, tecnológicas, culturais e sociais, de enfrentar
os desafios criados pelas outras partes do mundo e de contribuir para o desenvolvimento. As
empresas encontram-se sujeitas a processos contínuos de mudanças para se adaptarem às
alterações do seu meio envolvente. O dinamismo ambiental afastou definitivamente o
planeamento tradicional, de cariz burocratizado, dando lugar a formas de planeamento flexíveis.
A rapidez, a inovação, a informação e a comunicação constituem armas estratégicas nos nossos
dias. Como consequência, os postos de trabalho têm que ser ocupados por pessoal motivado e
qualificado e, cada vez mais, a qualificação dos recursos humanos constitui um factor crítico de
sucesso. Os indivíduos são a alma da mudança e factor decisivo para a criação de empresas
competitivas, capazes de responder às aspirações de uma sociedade à procura de equilíbrios
económicos e sociais que se consubstanciem num desenvolvimento integrado. A formação deve
assumir um cariz estratégico, sendo factor catalisador de duas grandes premissas, na óptica do
desenvolvimento local: o reforço das dinâmicas e a valorização dos recursos, com relevo para os
humanos. Podemos então considerar que o desenvolvimento dos recursos humanos é um
aspecto crucial da criação das condições correctas para a inovação e para o crescimento
económico. A gestão dos recursos humanos é a mais importante área de interesse numa política
de modernização, pois a qualidade dessa gestão é vital simultaneamente para assegurar a
competitividade e para orientar as atitudes estratégicas, nomeadamente para facilitar a
assimilação e divulgação das novas tecnologias. É necessário de facto, investir em formação
dos recursos disponíveis, tirando partindo de características intrínsecas: criatividade,
adaptabilidade e flexibilidade. Ponto forte fundamental num mundo industrial cada vez mais a
depender da inovação e numa contínua adaptação às necessidades dos clientes.
1.4.2 Interacção universidade/empresa: factor de desenvolvimento
No contexto histórico e geográfico em que nos movimentamos importa realçar o reforço da
cooperação Universidade/Empresa à qual deve ser imprimida uma dimensão regional. Só assim
se poderão conhecer as necessidades do tecido industrial, garantindo o encurtamento do ciclo
investigação - desenvolvimento tecnológico - inovação - competitividade e desenvolvimento,
contribuindo para aumentar a rentabilidade económica da investigação. Esta cooperação exige a
convergência de esforços da parte dos empresários, das instituições de ensino superior e da
região.
Sendo claro que uma infra-estrutura saudável e vigorosa é caracterizada pela interacção intensa
entre os seus principais componentes, ela faz-se através do pessoal técnico e profissional que
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
gera conhecimento e o transmite para fora da organização onde trabalha. Neste sentido, o
sistema educacional, concretamente o ensino superior, assume uma relevância numa
perspectiva de longo prazo, já que o potencial humano, técnico e profissional de alto nível
constituem a verdadeira infra-estrutura científica e tecnológica de uma nação.
Basicamente e como é já sabido, dois agentes económicos podem desempenhar um papel
decisivo na criação de condições necessárias para um crescimento industrial menos
desequilibrado e mais distributivo: o Estado e as empresas privadas. A acção do Estado exerce-
se, basicamente, através da via indirecta, nomeadamente, através da incentivação e apoio à
iniciativa privada. É nesta perspectiva que Veiga Simão (1992) afirma é muito importante que o
Estado saiba diferenciar com precisão três núcleos distintos que o devem orientar: o Estado
parceiro e cliente da criatividade ligado ao cientista, ao inventor e ao empresário, o Estado
fiscalizador ao serviço do bem comum com função pedagógica e de educador e o Estado-Nação
símbolo da soberania nacional. O Estado deve operar em estreita ligação com o poder local,
resolvidos ou em franca resolução os problemas básicos do desenvolvimento regional ligados às
aspirações básicas dos cidadãos: comunicações, saneamento básico, energia eléctrica, etc. O
poder local ao estar associado ao desenvolvimento tecnológico-cultural promove uma activa
participação dos centros de saber e de investigação.
Os esforços de formação na indústria têm sido excessivamente dispersos e insuficientes face às
necessidades de modernização industrial. A reforma do sistema educativo, de modo a que os
jovens que abandonem a escola tenham uma formação profissionalizante, o esforço de
coordenação na utilização dos recursos disponíveis para a formação profissional na
Administração e o alargamento e adequação do sistema de formação profissional,
particularmente ao nível de empresas, permitiriam obter ganhos significativos de produtividade e
de competitividade, bem como melhorar a utilização dos recursos humanos da região. Não há
estratégia eficaz de mudança, de modernização e de desenvolvimento qualitativo de uma
comunidade que não passe pelo sistema educativo, em íntima coordenação com outras
estruturas e serviços de formação.
As Universidades e os Institutos Politécnicos deverão, assim, assumir-se como os pontos fulcrais
de uma rede de formação especializada, adequada aos tempos modernos, dado que constituem
uma privilegiada fonte de inovação. Essencialmente por três razões: em primeiro lugar, porque
neles se concentram, em quantidade mais elevada que em qualquer outra instituição, meios
humanos altamente qualificados, em segundo lugar, porque estão organizados, melhor que
qualquer outra instituição, para estimular a criatividade, em terceiro lugar, porque em grau
incomparavelmente superior ao de qualquer outra instituição, eles atingem o ideal da
universalidade.
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Os Institutos Politécnicos apareceram como centros de formação técnico-profissionais, aos quais
compete especialmente ministrar o ensino superior de curta duração, orientado de forma a dar
predominância aos problemas concretos e de aplicação prática e promover a investigação
aplicada e o desenvolvimento experimental, tendo em conta as necessidades no domínio
tecnológico e no sector dos serviços, particularmente as de carácter regional. O ensino
politécnico deverá constituir uma forte componente do sistema educativo nacional e o viveiro de
técnicos qualificados, dominando as tecnologias modernas da agricultura, da indústria e dos
serviços. As Universidades deverão acompanhar a evolução da sociedade, em estreita
cooperação com o poder cultural, tecnológico, económico e político. Tanto o Estado como a
Universidade representam o interesse público, mas para corresponder a esse interesse, esta
deve ligar-se, cada vez mais, ao desenvolvimento e à ocupação estrutural da sociedade. A
Universidade deve desempenhar ao nível do desenvolvimento regional um papel de incentivo à
criatividade, de forma a preservar e dinamizar as potencialidades próprias de cada região,
através de um sistema que interage do seguinte modo (Figura 3):
Figura 3 - A Inter-relação entre Universidade e o Desenvolvimento Regional
Meios Materiais UNIVERSIDADE Meios Humanos
Empresas, Outros agentes de Investi- gação e Desenvol-vimento
Processo deInvestigação
Processo de Ensino
Estudantes
DESENVOLVIMENTO
REGIONAL
Ciência, TecnologiaInovação, Planeamento Quadros Superiores
DinâmicaEconómica
Dinâmica Cultural
Alargamento do Mercado
Criação de Emprego
Fonte: Ester Amorim (1994)
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O impacto do Ensino Superior no desenvolvimento regional faz-se sentir nos domínios do capital
físico público, da criação de mercados locais, da formação de quadros superiores do apoio
técnico e científico e da dinâmica cultural e atracção da população jovem. Nesta perspectiva, a
Universidade será um recurso endógeno, um instrumento activo e directo do desenvolvimento. A
Universidade deve intervir na esfera produtiva, particularmente na produção de serviços, deve
fazer funcionar a economia dos recursos humanos qualificados pelo lado da oferta, até para por
essa via poder fazer despertar a procura: deve não só contribuir com os novos licenciados como
aboná-los com garantias de enquadramento institucional - pelas vias do apoio do seu corpo
docente mais qualificado e da oferta de serviços qualificados por parte dos seus centros de
estudos.
O desenvolvimento das regiões passa, cada vez mais, pela disponibilidade de recursos
qualificados; daí também a importância da formação permanente que as Universidades devem
assumir. É a mão-de-obra qualificada que permite a inovação, pelo que a sua oferta passa a ter
importância capital no desenvolvimento económico regional e no esforço e na diversificação da
base económica das regiões. No entanto, o sucesso na retenção/fixação dos recursos humanos
depende de factores intrínsecos ao funcionamento da Universidade (a adequação dos cursos à
estrutura produtiva da região) e depende de factores extrínsecos à Universidade (capacidade da
estrutura produtiva da região para absorver recursos humanos qualificados).
Hoje, um número significativo de cientistas e de empresários sabe quão importante é fortalecer o
espaço de ligação entre o saber e o fazer. A evolução da ciência e tecnologia e a sua intensa
ligação à economia tornou ainda mais nítida a necessidade de desenvolver esse espaço criativo
e inovador que interliga a Universidade à Empresa. Esta interacção implica a participação activa
da Universidade e da Empresa, as quais dividem entre si o trabalho, competindo à Universidade
a investigação pré-competitiva, que pode ir até ao produto ou protótipo de bancada e cabendo à
empresa a concretização das outras fases do processo inovador, desde o protótipo industrial, à
produção e comercialização. Esta cooperação aponta para uma potencialização harmónica do
saber, do saber fazer e do fazer, permitindo o aproveitamento pelas empresas da inteligência e
de conhecimentos científicos actualizados e o acompanhamento pela Universidade da evolução
tecnológica, da estrutura produtiva e dos serviços. Assim, cremos ser possível um incremento da
complementaridade entre a Universidade e a Empresa no quadro de estratégias de inovação
assentes no melhoramento e criação de novos produtos, pelo facto de estas exigirem o recurso
a competências de maior especificidade, eventualmente extensíveis ao processo produtivo, e
que implicam contactos muito estreitos entre os produtores e utilizadores das tecnologias
(Aydalot, 1986 e M. Luger et al, 1991). Esta estratégia, ao fazer depender, em parte, o sucesso
da inovação do aproveitamento dos efeitos de proximidade apresenta-se mais ajustada e
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
viabilizadora, em termos competitivos, de soluções regionais e locais baseadas na cooperação
Universidade/Empresa.
1.4.3 O papel das PME’s nas economias locais
É usual afirmar-se, quando se discute a problemática regional, que as estruturas industriais do
interior são frágeis, desarticuladas, sendo a maior parte das actividades ditas tradicionais
caracterizadas, entre muitas coisas, por uma forte predominância de pequenas e médias
empresas e um forte coeficiente de localização, ou seja, pela concentração espacial; em todo o
caso, a política industrial que lhes é oferecida é uma política de tipo vertical em que o espaço
não entra em linha de conta, ou entra muito pouco.
O problema da inovação e dinamização das indústrias tradicionais na perspectiva local, coloca
uma outra maneira de abordar a política industrial. É que as pequenas e médias empresas, hoje
em dia, têm porventura muito mais forte dependência e afinidade relativamente ao que se passa
à sua volta em termos de ambiente humano e económico, do que com aquilo que possa dizer
respeito à cadeia vertical de actividades em que nominalmente se integram. Isto é, em certo
sentido a noção do sector perdeu algum peso, ao mesmo tempo que a noção de localização
ganhou muito mais relevância. Esta transformação está associada à grande transformação da
base tecnológica e organizacional dos sistemas de produção e comércio à escala europeia e à
escala mundial. Passámos de concepções de indústria centradas no controlo físico, na
manipulação física da matéria-prima, a uma concepção que é fundamentalmente dominada, do
ponto de vista da estratégia competitiva, pela capacidade de criar valor através da qualidade,
através da gestão do tempo de produção e comercialização. A gestão do tempo e da qualidade
abriu novas concepções estratégicas para a orientação do desenvolvimento espacial. Os
factores determinantes da competitividade na nova ordem europeia, ou mundial, deslocaram-se
da simples minimização do custo de fabricação para o campo da maximização da prestação de
serviços ao utilizador, considerando também os tempos de ocorrência dessas prestações como
elementos da qualidade de oferta. Neste contexto, as PME’s reaparecem com uma nova
vitalidade nos espaços económicos locais pela capacidade empreendedora que revelam em
termos de adaptação às novas necessidades dos mercados e de relação mais personalizada
com os clientes. Por outro lado, surgem-nos com uma boa imagem social no que se refere à sua
contribuição para a criação de empregos a nível local. É aqui que a questão espacial assume
novo relevo. De certo modo, a pequena e média empresa, mais do que da sua boa integração na
cadeia vertical de actividades que definem o sector, depende sobretudo da sua inserção numa
região dinâmica, rica em estímulos e serviços de apoio à sua laboração num ambiente de
qualidade aberto à inovação.
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Importa sublinhar que as PME’s, enquanto elemento activo no processo de desmassificação dos
produtos, isto é, da necessidade de aumento da componente de prestação de serviços, poderá
representar um factor estruturante duma rede de actividades a nível local susceptível de alargar
a incorporação de serviços na produção industrial e, por isso, de possibilitar a requalificação
progressiva do sistema económico local, na base da valorização e qualificação dos recursos
regionais. As pequenas e médias empresas necessitam de viver num ambiente físico, humano,
geográfico, dotado de forte vitalidade que actue em simbiose com as forças de dinamização que
existem dentro da própria empresa. Hoje em dia, as empresas têm de buscar o húmus, o caldo
de cultura da inovação no ambiente humano que as rodeia, ou então dificilmente poderão ganhar
competitividade sem a profunda cooperação do ambiente que as circunda. Se não houver um
sentido comum de corresponsabilização dos vários tipos de actores, entre os quais empresários
que estarão em concorrência noutros campos, não haverá possibilidade de gerar uma oferta
regional abundante de mão-de-obra altamente qualificada ou de serviços que funcionem em
relação à maioria das empresas como agentes de dinamização. Este aspecto é absolutamente
decisivo, como o é também o facto de nenhuma empresa hoje, por si, ter sequer a capacidade
de reter no seu seio todos os elementos de comando estratégico da sua evolução. As pequenas
e médias empresas modernas necessitam de serviços externos, que as ajudem a pensar e a
executar a sua estratégia no pleno conhecimento quer das limitações, quer das potencialidades
características do seu ambiente operacional externo e interno. É preciso conceber o
desenvolvimento regional numa perspectiva do alargamento da cooperação numa base inter-
regional, suficientemente larga para vencer o obstáculo da formação humana de base geral
capaz de impulsionar a competitividade e dar modernidade, qualidade tecnológica e estética a
produções fundadas na cultura e no gosto investidos historicamente em certas regiões e suas
populações, fazendo-as participar da evolução do gosto e da cultura de outras regiões mais
dinâmicas. As regiões do interior deverão estimular a inovação regional através essencialmente
do apoio ao surgimento de iniciativas empresariais capazes de produzirem bens e serviços de
elevada qualidade e valor acrescentado. Esta linha de desenvolvimento permitirá não só reforçar
a “imagem” da região no exterior como também proporcionar um novo quadro para o
aproveitamento das potencialidades existentes e a consequente valorização dos recursos
regionais (materiais e humanos). Pelo que a integração e o desenvolvimento dos serviços de
apoio à actividade produtiva numa determinada região constitui, sem dúvida, uma condição
básica para o desenvolvimento de tecnologia própria e, ao mesmo tempo, um elemento chave
para a dinamização do sistema económico local e regional.
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica,
vol. 01, jan. / jun. 2007 ISSN 0000-0000 - v. eletrônica
MARKETING DE RELACIONAMENTO: A IMPORTÂNCIA DA UTILIZAÇÃO DO BANCO DE DADOS RETENÇÃO DE CLIENTES NOS ESTABELECIMENTOS GASTRONÔMICOS ASSOCIADOS À ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE RESTAURANTES E EMPRESAS DE ENTRETENIMENTO ABRASEL-PE.
Reginaldo José Carlini Júnior Mestre Especialista em Administração com ênfase em Marketing. Universidade Federal Rural de Pernambuco
RESUMO
Este artigo busca compreender a importância da utilização do banco de dados para o
sucesso do marketing de relacionamento com o cliente entre os estabelecimentos gastronômicos
associados à ABRASEL-PE (Associação Brasileira de Restaurantes e Empresas de
Entretenimento). Foram aplicados 49 questionários para coleta de dados. Os resultados
agrupados em tabelas, com posterior análise individual, demonstraram que os proprietários
desses estabelecimentos estão descobrindo que, nas condições atuais do mercado, para serem
vencedores, devem centrar-se em todos os clientes, porém, dando ênfase àqueles que são
freqüentes e/ou lucrativos, os quais devem receber valor superior. Está acontecendo uma
reorientação de mercado no sentido de criar e manter relacionamentos sólidos com os clientes
atuais, utilizando o marketing de relacionamento e tendo como base de todo processo o banco
de dados.
PALAVRAS CHAVE: Marketing de relacionamento, restaurante x clientes, conservação de clientes.
ABSTRACT
This article aims to understand the importance of using data bank for the success of
customer’s relationship marketing among gastronomical establishments associated with
ABRASEL-PE (Associação Brasileira de Restaurantes e Empresas de Entretenimento). 49
questionnaires have been applied by way of data collection. Results are grouped through tables,
with subsequent individual analysis. Such results demonstrate that the owners of such
establishments are observing that, in order to become winners in the current conditions of
1
market, they have to be focused on all customers, however emphasizing those who are most
frequent and/or profitable, and so must receive a higher value. A market redirectioning is
happening, aiming to create and preserve solid relationships with existing customers, by using
relationship market and having data bank as the base for the entire process.
KEY WORDS: Relationship marketing, data bank, restaurants, market and customers. 1 INTRODUÇÃO
No passado, a maioria dos estabelecimentos gastronômicos achava que seus clientes
eram eternos. Muitas vezes os clientes não tinham muita escolha, pois eram poucos os
estabelecimentos que ofereciam produtos e/ou serviços com qualidade. O rápido crescimento do
mercado, aumentando a concorrência, contribuiu bastante para mudar esse quadro. Hoje, é
diferente, quem dita as regras do mercado são os clientes. A concorrência existente entre os
estabelecimentos gastronômicos que atuam na Região Metropolitana do Recife, é bastante
acirrada. Os proprietários dos estabelecimentos gastronômicos associados à ABRASEL-PE,
estão descobrindo que uma das principais estratégias para driblar a concorrência e ter sucesso é
procurar manter a fidelidade de seus clientes, através do marketing de relacionamento.
Está acontecendo uma reorientação de mercado por parte dos estabelecimentos
gastronômicos associados a ABRASEL-PE no intuito de criar e manter relacionamentos sólidos
com os seus clientes. Esses estabelecimentos vêm utilizando estratégias de retenção dos
clientes para que eles permaneçam por um longo período. A profissionalização dos seus
proprietários está ajudando nessa mudança, fazendo com que haja uma preocupação excessiva
com a qualidade dos produtos e/ou serviços e a satisfação dos clientes.
”A satisfação do cliente com uma compra depende do desempenho do produto com
relação às suas expectativas” (KOTLER; ARMSTRONG, 1995, p.394). O cliente procura
relacionar, através de comparação, o valor que recebe ao adquirir um produto e/ou serviço com
suas expectativas e é isso que irá definir a sua satisfação. Quando as expectativas dos clientes,
em relação a sua satisfação são superadas, a conseqüência de todo esse esforço é a sua
retenção. Aos poucos os associados da ABRASEL-PE estão descobrindo a importância de tratar
cada cliente individualmente, oferecendo-lhes produtos e/ou serviços personalizados, além de
objetivarem sempre a sua satisfação.
“Há várias décadas, havia empresas direcionadas às vendas, concentrando suas
energias na modificação da mentalidade do cliente, de modo a adaptá-la ao produto – praticando
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a escola de marketing do “qualquer cor, desde que seja preto”. Com o desenvolvimento da
tecnologia e o aumento da competição, algumas empresas mudaram sua abordagem e
começaram a voltar-se para o cliente. Essas empresas desaram uma nova disposição em
modificar seu produto de modo a atender às exigências do cliente - “praticando a escola do diga
que cor prefere” (Mc KENNA, 1992, p.2-3).
O período correspondente à escola do “qualquer cor, desde que seja preto” foi marcado
pelo marketing de massa. Nessa época, as empresas trabalhavam com total foco nos seus
produtos: produzia, distribuía e promovia em massa um único produto para todos os
compradores. A forma de comunicação com os clientes era unidirecional, utilizando as mídias de
massa. Essas empresas buscavam um número cada vez maior de clientes para aumentar a sua
participação no mercado. No entanto, o aumento da concorrência em áreas antes
monopolizadas e o crescimento tecnológico forçaram essas empresas a desenvolverem as suas
estratégias com foco nos seus clientes, procurando conhecer os seus hábitos e as suas
necessidades para oferecer-lhes o melhor valor. As empresas que seguem a escola do “diga que
cor prefere”, utilizam os recursos tecnológicos disponíveis para satisfazer as necessidades
específicas de cada um de seus clientes, objetivando sempre a sua retenção.
Está acontecendo uma mudança de perfil dos proprietários dos estabelecimentos
gastronômicos associados à ABRASEL-PE. Alguns deles têm conhecimento sobre o perfil dos
seus clientes, sabem quem são, onde estão, o que consomem, além de conhecerem seus
concorrentes, como eles trabalham e o que executam para maximizarem seus negócios. Esses
profissionais fazem pesquisas de campo, procurando identificar e definir oportunidades de
mercado, além de buscarem a satisfação de seus clientes, procurando solidificar um
relacionamento longo e duradouro com eles.
“A obsessão pelo cliente é nada menos que o fator primordial para o sucesso de um
empreendimento. A prioridade fundamental de qualquer negócio é cativar e manter o cliente. A
incompetência nisso significa ausência de lucros, de crescimento, de emprego, enfim, não há
negócios” (BARRIE, 1995, p.9). É importante que as empresas procurem conquistar novos
clientes. No entanto, se elas não realizarem as suas atividades oferecendo produtos e/ou
serviços de qualidade e, além disso, não objetivarem a satisfação das necessidades de seus
clientes o risco do insucesso empresarial será alto. Espera-se que as empresas ao conquistarem
um novo cliente procurem retê-los, oferecendo-lhes máxima satisfação. Quando isso acontece, o
cliente sai da empresa com sensações positivas. Essa sensação vai fazer com que ele retorne e
conte a sua experiência a outros clientes potenciais. É importante destacar que o mercado vem
passando por uma reorientação, retenção em vez de conquista. Nesse caso, as empresas estão
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
procurando dar continuidade ao relacionamento com o cliente após a troca de valor, momento
em que o cliente adquire o produto e paga pelo mesmo.
“A cada interação e nova personalização – a cada vez que a empresa e o cliente
investem em sua relação – a companhia é capaz de adequar seus produtos e serviços um pouco
melhor às necessidades daquele cliente. Na realidade, a relação torna-se mais e mais
inteligente, satisfazendo cada vez mais as necessidades daquele cliente em particular”
(PEPPERS; ROGERS, 2001, p.6). O marketing de relacionamento tem início a partir do
momento em que a empresa identifica no seu banco de dados cada um de seus clientes, tendo
como referencial para enquadrá-los entre os melhores, a sua freqüência e a sua lucratividade.
Logo em seguida, as empresas irão interagir de maneira individual com cada um deles, com o
objetivo de identificar os seus desejos e as suas necessidades e assim desenvolver produtos
e/ou serviços para satisfazê-los.
O desenvolvimento do marketing de relacionamento será dificultado sem o uso da
tecnologia. Entre as quatro capacidades (pessoas, processos, conhecimento/percepção e
tecnologia) a serem desenvolvidas ou implementadas pela empresa, para que o objetivo da
estratégia de relacionamento seja alcançado, a tecnologia é uma das mais importantes com
destaque para o banco de dados onde estarão contidas todas as informações sobre os clientes
atuais em especial os fiéis e/ou lucrativos.
2 A IMPORTÂNCIA DAS EMPRESAS TEREM UM BANCO DE DADOS COM INFORMAÇÕES SOBRE OS SEUS CLIENTES
Caso as empresas desejem adotar estratégias de retenção, fundamentadas no
marketing de relacionamento, é imprescindível que possuam tecnologia que possibilite
desenvolver com eficácia essas atividades. O banco de dados, ao ser utilizado no marketing de
relacionamento, possibilita a empresa atender os seus clientes da maneira como eles desejam.
“Diálogo e informação será a nova ordem. Isso representa o início de uma reviravolta maior em
marketing. O computador modificou a produção. O computador modificou nossa forma de
trabalhar no escritório. Agora, o computador está mudando o marketing. A habilidade para ter um
banco de dados com os nomes e informações de usuários finais é a grande reviravolta no
marketing. Isso significa que você tem que pensar diferentemente se quiser manter-se, par e par,
com um concorrente que já está pensando dessa maneira” (VAVRA, 1993, p.51).
As empresas que adotam em seus processos os conceitos do marketing convencional
baseadas em segmentos de mercados, pouco conhecem sobre as características e as
necessidades individuais de seus clientes. Ávidos por novos clientes, todos os seus esforços são
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
direcionados no sentido de aumentar a sua participação no mercado e a conquista de novos
consumidores é regra dentro da empresa. Com esta reorientação de mercado, retenção em vez
de conquista, as empresas estão se preocupando cada vez mais em manter contatos com os
seus clientes. Agora, a regra dentro da empresa é manter contato com os clientes, objetivando o
conhecimento. O conhecimento e a percepção que as empresas têm dos seus clientes, será
importante na ampliação do relacionamento entre eles. É importante que toda interação entre
ambos, tenha como objetivo o aprendizado na busca do conhecimento sobre o cliente. O
compartilhamento de informações com os clientes trará grandes benefícios à empresa. A partir
do momento em que as empresas obtém essas informações, elas poderão atender os seus
clientes da maneira como eles desejam ser atendidos e assim alcançar os resultados com mais
facilidade, do que os seus concorrentes que praticam o marketing convencional baseado na
informação global sobre o comportamento do mercado.
“O marketing de relacionamento e seus componentes essenciais, incluindo a
customização em massa, é simplesmente impossível sem os efeitos capacitadores da tecnologia
para armazenar, recuperar, processar, comunicar e analisar os dados, incluindo aqueles sobre o
cliente” (GORDON, 1998, p.94). O banco de dados é condição primordial entre as tecnologias
que tornam possível o desenvolvimento do marketing de relacionamento. Sem esta ferramenta,
torna-se difícil às empresas conhecerem detalhadamente cada um de seus clientes e
desenvolverem estratégias para retê-los. “A tecnologia oferece suporte ao novo modelo de
negócio e possibilita o desenvolvimento de uma infra-estrutura estratégica com informações
eficientes. A tecnologia funciona como uma plataforma para transformar os dados em
conhecimentos” (BROWN, 2001, p.35). O grande desafio para as empresas é transformar dados
em conhecimento de forma que possam tomar as decisões de forma correta. A tecnologia, em
especial o banco de dados, dá oportunidade para as empresas identificarem os seus melhores
clientes e as suas necessidades individuais, podendo assim apresentar-lhes produtos e/ou
serviços adequados. Elas serão até capazes de antecipar-se às necessidades destes clientes
estratégicos com base em seus históricos de compra, além de identificar clientes potenciais
baseando-se no perfil de semelhança com os atuais.
“O Database Marketing envolve a criação de um banco de dados informatizado, que
contenha informações sobre consumidores e que possa ser acessado facilmente. Os dois usos
principais para o Database Marketing são:
* Marketing para clientes: em que se mantém um relacionamento estreito com os
clientes, oferecendo a eles serviços especiais e reconhecimento que resultarão em fidelidade
crescente, redução de atrito (“attrition”) e aumento de vendas.
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* Marketing para não clientes (“prospects”): em que se utiliza o conhecimento
desenvolvido no banco de dados de clientes, para compreender as motivações do consumidor,
levando à identificação de “prospects” parecidos com os clientes mais lucrativos da carteira
resultando na expansão da base de consumidores com custos decrescentes” (HUGHES, 1998,
p.4).
O uso do banco de dados servirá para criar perfis e modelos baseados nas
características dos clientes. As suas informações serão utilizadas tanto na criação de valor para
os clientes atuais quanto na aquisição de novos, já que através do banco de dados as empresas
poderão saber quem pode vir a ser um cliente fiel e/ou lucrativo. Com a base de dados, as
empresas poderão: identificar os clientes mais importantes e então lhes apresentar a oferta,
produto e/ou serviço, certo no momento adequado; interagir de maneira personalizada;
identificar mudança no comportamento de compra e prever mudanças futuras.
“O processo de reunir informações durante cada transação – na verdade, durante cada
contato com e sobre cada cliente – e o uso dessas informações é crucial para obter sucesso”
(BROWN, 2001, p.27). É com base nas informações sobre os clientes, contidas no banco de
dados, que as empresas criarão o valor que eles buscam e necessitam.
“O relacionamento está embutido nos dados. E a empresa que investe mais em dados,
administração de dados e informações associadas de negócios estará melhor posicionada para
prosperar do que o concorrente que voa cegamente” (GORDON, 1998, p.77). Para as empresas
terem sucesso com o marketing de relacionamento, é imprescindível que possuam uma grande
quantidade de dados sobre os seus clientes. Para isso as empresas devem dispor de tecnologia
de relacionamento, principalmente o banco de dados que permitirá o armazenamento, a
extração e a visualização de informações de forma seletiva, simples e sob diferentes pontos de
vista.
É importante que as empresas disponham de meios para conseguirem as informações
necessárias para a realização do marketing de relacionamento e descubram uma maneira
econômica e eficaz para implantar ou expandir o seu banco de dados.
“Às vezes, as empresas são relutantes em exigir que seus clientes respondam
perguntas típicas de marketing em um formulário ou questionário. Tais problemas podem ser
contornados abrindo-se o questionário com um título “Apenas para informação interna. O
preenchimento não é obrigatório”. Geralmente, as empresas ficam surpresas com o número de
clientes que dedicam tempo para dar informações voluntárias sobre si mesmos. Isso é resultado
de dois fenômenos. Primeiro, os clientes geralmente acreditam que uma empresa se preocupa
com eles e podem perceber que quanto mais a empresa os conhece, mais habilitada estará para
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satisfazer suas necessidades. Segundo, existe satisfação da maioria das pessoas em falar sobre
si mesmos” (VAVRA, 1993, p.79). As empresas não devem relutar em pedir qualquer tipo de
informação aos clientes, nem em pedir que os mesmos respondam qualquer tipo de formulários
e/ou questionários. Essas empresas, também, devem procurar utilizar outros meios para obter
informações.
É importante que as empresas utilizem, para obter informações sobre os clientes, o
telemarketing, as informações contidas nos pagamentos com cheques e/ou cartões de crédito,
os eventos especiais e as reservas dos clientes. É importante destacar que os formulários de
cadastro e/ou os questionários de avaliação devem ser utilizados, por serem mais eficazes e
completos no que diz respeito a busca pela informação.
3 INFORMAÇÕES, A RESPEITO DOS CLIENTES, QUE AS EMPRESAS DEVEM IMPLANTAR NOS BANCOS DE DADOS
“As informações incluídas no banco de dados de clientes devem ser, necessariamente,
sob medida às necessidades específicas do cliente, embora existam alguns componentes quase
universais. Tradicionalmente, os três componentes mais importantes de um banco de dados de
clientes têm sido os seguintes:
• "R" ecenticidade: Quando o cliente fez a última compra?
• "F" reqüência: Qual a freqüência de compra do cliente?
• Valor "M"onetário: Quanto dinheiro o cliente gastou em período específico de tempo?”
(VAVRA, 1993, p.63).
As informações contidas nos bancos de dados sobre os clientes, fazem com que todo o
processo de relacionamento seja direcionado apenas aos que são fiéis e/ou lucrativos. Antes de
tentar criar um relacionamento, a longo prazo, com os seus clientes, é importante que a empresa
tenha certeza que o seu perfil se enquadra no traçado, tendo como referencial a freqüência e a
lucratividade dos clientes atuais.
Hoje, o custo de armazenamento de um banco de dados vem diminuindo intensamente.
Devido a este fato, as empresas podem dispor de um banco de dados que contenha uma gama
de informações por um baixo valor.
Entre as muitas informações que podem constar no banco de dados, destacam-se:
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1 O número da conta ou de identificação do cliente, no estabelecimento.
2 O nome do cliente.
3 Endereço, telefone, data de nascimento e profissão.
4 Números de componentes da família
5 Categorização do cliente em termos de valor para a empresa.
6 Data das visitas a empresa, da primeira até a última.
7 Freqüência de visitas (por dia, semana, mês, etc.).
8 Valor médio gasto nas visitas.
9 Formas de pagamento.
10 Datas de todas as promoções e ofertas enviadas ao cliente e sua resposta a elas.
11 Produtos preferidos.
12 Serviços preferidos.
13 Meio de comunicação que contribuiu para a primeira visita (telemarketing, internet, televisão,
rádio, revista, etc.).
14 Hábitos de mídia.
15 Se houve reclamação do cliente e o que motivou essa reclamação.
16 Canal de distribuição que a compra foi realizada.
17 Sugestões de atendimento.
4 COMO AS EMPRESAS PODEM CONSEGUIR O SUCESSO COM O MARKETING DE RELACIONAMENTO, UTILIZANDO INFORMAÇÕES SOBRE OS CLIENTES CONTIDAS NOS BANCOS DE DADOS?
Com a base de dados, as empresas poderão identificar os seus clientes mais
importantes e então lhes apresentar produtos e/ou serviços adequados e de seu interesse, além
de interagir individualmente com eles.Também, será possível identificar mudanças no
comportamento de compra dos clientes e prever mudanças futuras. Através de quatro
mandamentos, as empresas poderão obter sucesso utilizando o banco de dados no marketing
de relacionamento:
1º MANDAMENTO: Identifique os seus clientes. Espera-se que as empresas ao implantarem
banco de dados, procurem identificar quais são os seus melhores clientes, (os mais fiéis e/ou
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lucrativos). É importante que utilizem um ou mais meios para obter informações, as quais devem
ser relevantes para que possibilitem a criação de valor para esses melhores clientes. Essas
informações devem ser atualizadas continuamente. Espera-se que as empresas desenvolvam
uma cultura interna para valorizar as Informações obtidas que ajudarão na criação de valor para
os seus clientes.
2º MANDAMENTO: Aprenda mais sobre os clientes que movimentam o seu negócio. É
importante que as empresas ao identificarem os seus melhores clientes, procurem interagir
constantemente com eles, para identificar suas necessidades. Vale ressaltar que as empresas
devem manter um nível de satisfação para todos os seus clientes, porém dando valor superior
aos fiéis e/ou lucrativos.
3º MANDAMENTO: Individualize as mensagens para os clientes. Espera-se que as empresas
desenvolvam ofertas e mensagens sob medida conforme as necessidades e interesses de cada
um de seus clientes. Esses devem participar diretamente de todo processo, conhecendo os
valores que serão criados para o seu benefício, além de ajudarem com informações na criação
desses valores. As empresas devem procurar saber por quais meios de comunicação os clientes
preferem ser informados sobre os produtos e/ou serviços ou sobre uma nova criação de valor. A
partir daí deve-se deixar de lado os veículos de comunicação de massa e iniciar uma interação
de forma individualizada.
4º MANDAMENTO: Aprofunde a lealdade dos clientes. Todos os esforços da empresa devem
ser realizados no sentido de satisfazer as necessidades dos clientes. Quando isso acontece, a
relação entre ambos começa a se estreitar e como conseqüência disso teremos a solidificação
de sua lealdade.
A partir do momento em que as empresas passam a utilizar o banco de dados, elas
serão melhores em termos de: acessibilidade, identificando cada cliente e procurando atingi-los
individualmente; mensuração, sabendo todo histórico de compra do cliente, o que consumiu,
quanto gastou, etc.; flexibilidade, tendo a oportunidade de atrair diferentes clientes, de diferentes
maneiras e em diferentes ocasiões e contabilização, com a possibilidade de saber a
lucratividade individual de cada um desses clientes.
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5 A CUSTOMIZAÇÃO EM MASSA COMO FATOR DE SUCESSO NO MARKETING DE RELACIONAMENTO COM O CLIENTE
“Se uma empresa pretende adotar totalmente o marketing de relacionamento, o
conceito de customização em massa não é uma opção: é uma necessidade” (GORDON, 1998,
p. 250). É importante que as empresas customizem em massa os seus produtos e/ou serviços,
ou seja, forneçam-nos de forma lucrativa e sob medida, principalmente, para os seus clientes
estratégicos, levando em consideração a preferência individual de cada um. A customização
deve ser realizada nas três dimensões: produtos, serviços e comunicação.
Para o sucesso da customização em massa, principalmente a dos serviços é importante
que as empresas invistam no capital humano, já que todo o pessoal envolvido no processo de
relacionamento será importante na busca da satisfação do cliente e na sua retenção. “O grande
objetivo do marketing, hoje, é fidelizar os clientes, e para isso acontecer é fundamental que as
pessoas que lidam direto com o consumidor também devam estar tão envolvidas no processo
quanto o dono da empresa” (JUNG, 2000, p.68-69). A partir do momento em que as empresas
têm a certeza da importância dos seus funcionários para que os seus objetivos sejam
alcançados, estes devem ser tratados como clientes. É impossível ela satisfazer o seu cliente
externo tratando os internos como simples empregados. Após a implantação do marketing de
relacionamento, os funcionários devem ser treinados para identificar as necessidades dos
clientes e ajudarem na criação de valor.
Antes das empresas tentarem implantar a customização em massa, alguns
questionamentos devem ser feitos:
• Nossos melhores clientes querem uma solução customizada? Eles pagarão mais por isso?
• Quais são as dimensões fundamentais da solução que deve ser customizada sob a
perspectiva do cliente?
• Nossas capacidades existentes, pessoal, processo, conhecimento/percepção e tecnologia
nos permitirão criar a customização em massa que os clientes querem?
• Podemos efetuá-la em etapas de acordo com nossa capacidade?
• Nossa estrutura organizacional se acomodará às mudanças?
• O que temos de mudar em relação a nós mesmos para criar o benefício da customização em
massa?
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6 A UTILIZAÇÃO DO BANCO DE DADOS PARA IDENTIFICAR E RECONQUISTAR OS CLIENTES QUE DEIXARAM DE FREQÜENTAR A EMPRESA
As empresas que dispõem de banco de dados, terão facilidades em identificar e
reconquistar seus clientes identificados como sendo estratégicos, ou seja, os clientes fiéis e/ou
lucrativos. “Enquanto a principal mensagem de pós–marketing é estabelecer e manter
relacionamentos com os clientes atuais, algumas das empresas mais conhecidas hoje estão
voltando atrás para recuperar os clientes perdidos” (VAVRA, 1993, p.235). Quando as empresas
implantarem estratégias para reter os seus clientes atuais, as atividades também devem ser
direcionadas para os clientes que por algum motivo deixaram de freqüentá-las. Espera-se que as
empresas sigam a risca os conceitos e direcionem as atividades de retenção tanto para os seus
clientes atuais, quanto para os clientes perdidos. Essas, ao identificarem os clientes que
deixaram de freqüentá-las, não devem ignorá-los, devem procurá-los e perguntar por que
deixaram de freqüentar seus estabelecimentos e tentar a todo custo fazer com que eles mudem
de idéia e retornem. A identificação do problema ajudará as empresas de duas maneiras:
primeiro, na elaboração de uma estratégia para tentar reconquistar os clientes e segundo, para
solucionar o problema que os afastaram, antes que outros deixem de freqüentá-las pelo mesmo
motivo.
Para o sucesso da estratégia, é importante que as empresas elaborem um programa de
reconquista de clientes perdidos. “Os programas para reconquistar clientes podem tomar muitas
formas, desde um altamente organizado, agressivo até a simples manutenção do nome do
cliente em um mailing list para mostrar-lhe que ele não foi esquecido pela empresa” (VAVRA,
1993, p.250). É importante que as empresas, ao identificarem seus melhores clientes que
deixaram de freqüentá-las, utilizem alguma técnica para reconquistá-los, pois não adiantará
identificar os clientes que deixaram de freqüentá-los e não fazer nada para reconquistá-los.
O programa de recuperação de clientes perdidos deve ser dividido em três etapas.
Na primeira, as empresas terão que identificar por que os clientes pararam de
freqüentá-las. Nesse caso, elas devem recorrer ao banco de dados e verificar há quanto tempo
isso vem ocorrendo e identificar o motivo, contatando com eles para tentarem solucionar o
problema.
A segunda diz respeito à situação atual do cliente. As empresas devem pesquisá-lo,
pois como o mercado anda muito rápido e novas demandas podem ocorrer, a situação do cliente
pode ter mudado como, por exemplo, seu hábito de consumo ou seu orçamento. Diante disso,
as empresas devem ficar atentas a essas mutações e proporcionarem oportunidades para
reconquistar o interesse dos clientes.
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A terceira e última etapa diz respeito ao contato com o cliente. É importante que as
empresas identifiquem qual a melhor maneira para entrar em contato com os clientes, como eles
preferem ser abordados e qual o meio de comunicação que preferem interagir.
Após elaborarem o programa de reconquista, as empresas devem desenvolver
estratégias com o objetivo de identificar e reconquistar esses clientes, oferecendo o valor que
eles desejam e não estavam recebendo, além de tentar fortalecer a parceria de forma que
ambos voltem a fazer negócios a longo prazo.
“Para aprender o máximo possível com ex-clientes e clientes perdidos em potencial,
envolva todo o pessoal de contato com os clientes (tais como vendedores, entregadores e
pessoal de atendimento) no processo. Eles podem lhe dizer o que ouvem das pessoas que
pararam de fazer negócios com você ou estão prestes a abandoná-lo” (CANNIE, 1995, p.52).
Todos os membros da empresa precisam trabalhar em conjunto para atingir a satisfação
de seus clientes, mas para que obtenham êxito é importante delegar autoridade aos seus
empregados, para que os mesmos possam resolver os problemas que surgem. O pessoal de
linha de frente da empresa, aquele que interage diretamente com o cliente, tem uma importância
fundamental na busca da satisfação deles. Se uma organização está realmente comprometida
com a excelência da qualidade e com a satisfação de seus clientes, o treinamento do pessoal de
linha de frente é muito importante e deve ser orientado para a busca da satisfação dos clientes
da empresa.
7 METODOLOGIA
7.1 Amostragem
Os objetos deste estudo foram os estabelecimentos gastronômicos: restaurantes, bares
e lanchonetes associados a ABRASEL-PE (Associação Brasileira de Restaurantes e Empresas
de Entretenimento). Dessa população, foi selecionada uma amostra de 49 estabelecimentos. “A
amostragem envolve o estudo de apenas uma parte dos elementos. A finalidade da amostragem
é fazer generalizações sobre todo o grupo sem precisar examinar cada um de seus elementos”
(STEVENSON, 1981, p.158). Utilizando-se a amostragem cada estabelecimento teve a mesma
chance de ser escolhido, o que garante à amostra o caráter de representatividade. Todas as
conclusões relativas à população estarão baseadas nos resultados objetivos, ou seja, na
amostra dessa população.
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Foi escolhida a amostragem aleatória simples sem reposição, onde os associados à
ABRASEL-PE foram selecionados apenas uma vez. Os estabelecimentos tiveram a mesma
oportunidade de serem incluídos na amostra. A ABRASEL-PE conta com 98 estabelecimentos,
que foram listados e numerados consecutivamente de 01 a 98 e escolhidos os 49
estabelecimentos que correspondem a amostra significativa.
O instrumento utilizado para a coleta de dados foi o questionário, que após contato com
os associados selecionados foi enviado via e-mail e fax, para que os mesmos pudessem
respondê-lo. Vale ressaltar que cada estabelecimento selecionado respondeu o seu
questionário, individualmente, inclusive aqueles que eram proprietários de dois ou mais
restaurantes.
8 ANÁLISE DOS RESULTADOS
Tabela 1 Estabelecimentos com banco de dados
N.º de respostas % Sim 31 Não 18
63,27 36,73
Total 49 100,00
• Afirmaram possuir banco de dados com informações sobre os seus clientes,
63,27% dos estabelecimentos. É importante que eles utilizem as informações
contidas no banco de dados para identificar os seus clientes fiéis e/ou lucrativos,
sua lucratividade e freqüência, com o objetivo de firmar uma parceria, um
relacionamento e criar o valor que esses clientes buscam e necessitam.
• Um percentual de 36,73% dos estabelecimentos afirmou não possuir banco de
dados com informações sobre os seus clientes. Esses estabelecimentos ficarão
impossibilitados de realizar o marketing de relacionamento, por não terem como
identificar os seus melhores clientes e, conseqüentemente, não poderão
desenvolver estratégias para retê-los. Diante da concorrência existente no
segmento gastronômico da Região Metropolitana do Recife, 36,73% é um
número bastante relevante.
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Tabela 2 Recursos utilizados pelos estabelecimentos para coletar informações sobre os seus clientes
N.º de respostas % Formulário de cadastro Guia de sugestões e/ou questionários de avaliação Telemarketing Informações nos pagamentos com cheques e cartões de crédito Eventos especiais e reservas
08
13 04
04 02
25,81
41,94 12,90
12,90 6,45
Total 31 100,00
• Responderam que utilizam o formulário de cadastro para obterem informações
sobre os seus clientes, 25,81% dos estabelecimentos. Eles as utilizam para
desenvolver estratégias de retenção de seus melhores clientes.
• Responderam que utilizam o guia de sugestões e/ou questionários de avaliação,
41,94% dos estabelecimentos.
• Afirmaram que utilizam o telemarketing como meio para obterem informações
dos clientes, 12,90% dos estabelecimentos. Eles divulgam um número de
telefone para os clientes ligarem e coletam informações que são utilizadas para
criação de valor. Os estabelecimentos que utilizam, apenas, o recurso do
telemerketing estão procurando utilizar outros meios para obter informações
como, por exemplo, questionários e formulários de cadastro, devido aos custos
caso o telemarketing seja ativo e a disponibilidade e credibilidade dos clientes
para darem informações pelo telefone.
• Outro recurso utilizado para coleta de dados são as informações contidas nos
pagamentos efetuados com cheques e/ou cartões de crédito por 12,90% dos
estabelecimentos. É importante que esses estabelecimentos, também, utilizem
outros recursos (questionários de avaliação, formulários de cadastro, etc.), para
obter informações, pois essas duas formas de pagamento são restritas e
insuficientes para esses estabelecimentos coletarem informações e realizarem
suas estratégias de retenção.
• Apenas 6,45% dos estabelecimentos afirmaram que obtêm informações dos
seus clientes através da realização de eventos especiais e das reservas feitas
pelos mesmos. Esses estabelecimentos só obterão sucesso com os eventos
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especiais, caso sejam realizados com freqüência. Mesmo assim, alguns clientes
considerados fiéis e/ou lucrativos podem não se identificar com o evento.
Constata-se que esse é um recurso um pouco falho.
Tabela 3 Estabelecimentos que possuem banco de dados versus a possibilidade de identificação dos clientes
freqüentes e/ou lucrativos através das informações neles contidas
Nº de respostas %
SIM 24 77,42
Estabelecimentos que possuem banco de dados
31
Identificação dos clientes freqüentes e/ou lucrativos através do banco de dados
NÃO 07 22,58 TOTAL 31 31 100,0
• Conseguem identificar os seus melhores clientes 77,42% dos estabelecimentos
que possuem banco de dados. A partir do momento em que isso acontece, os
estabelecimentos poderão direcionar as suas estratégias de relacionamento
individualizando as ações para cada cliente.
• Afirmaram que não conseguem identificar os seus melhores clientes, 22,58%
dos estabelecimentos. Isso se deve a dois motivos: não alimentação do banco
de dados com informações relevantes, sub-utilizando o mesmo, tornando o
sistema falho e o desconhecimento da estratégia. Não basta, apenas, possuir
banco de dados com informações sobre os seus clientes. É importante identificar
os melhores clientes e realizar estratégias de retenção no sentido de manter um
relacionamento a longo.
Tabela 4 Estabelecimentos que possuem banco de dados versus estabelecimentos que utilizam algum tipo de
estratégia de retenção.
Nº de respostas %
SIM 16 51,61
Estabelecimentos que possuem banco de dados
31
Estabelecimentos que utilizam algum tipo de estratégia para reter os seus clientes
NÃO 15 48,39 TOTAL 31 31 100,0
• É de 51,61% o percentual dos estabelecimentos que possuem banco de dados,
após identificarem os seus clientes utiliza algum tipo de estratégia para retê-los.
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Não adianta os estabelecimentos possuírem banco de dados e não utilizar as
informações contidas no mesmo, para criar valores individuais para os seus
melhores clientes. Esses estabelecimentos podem melhor direcionar suas
estratégias pelo fato de terem informações importantes como, por exemplo, a
preferência, a freqüência e a lucratividade de cada cliente.
• Afirmaram que não utilizam nenhum tipo de estratégia de retenção 48,39% dos
estabelecimentos que possuem banco de dados. Isso indica que eles não se
preocupam em realizar atividades com o objetivo de reter os seus clientes
estratégicos.
Tabela 5 Estratégias utilizadas pelos estabelecimentos que possuem banco de dados sobre os seus clientes para
retê-los
Tipos de estratégias N.º de respostas % Atendimento personalizado Brindes e cortesias Cartão fidelidade Descontos Eventos especiais
03 07 06 05 03
12,50 29,17 25,0 20,83 12,50
Total 24 100 OBS: Alguns estabelecimentos responderam que utilizam mais de um tipo de estratégia.
• O atendimento personalizado é utilizado por 12,50% dos estabelecimentos como
estratégia para retenção do cliente. Esses procuram individualizar as ações,
concentrando-se nos seus melhores clientes e mantendo um nível de satisfação
para os que não são considerados estratégicos, mas que poderão ser.
• Para os clientes identificados como fiéis e/ou lucrativos, 29,17% dos
estabelecimentos utilizam como estratégia de retenção dar brindes e cortesias.
Muitas vezes, esses brindes e cortesias são oferecidos aos clientes que
deixaram de freqüentar o estabelecimento ou aos clientes que tiveram algum
problema desagradável com o mesmo, ou seja, como forma de reconquista.
• Como estratégia de retenção, 25% dos estabelecimentos utilizam o cartão
fidelidade, oferecendo aos clientes benefícios ao utilizá-lo como, por exemplo,
descontos ou acúmulos de bônus.
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• Os descontos que são dados aos clientes que possuem o cartão de fidelidade ou
efetuam os seus pagamentos a vista, são usados por 20,83% dos
estabelecimentos como estratégia de retenção,.
• Atinge 12,50% o percentual de estabelecimentos que utilizam como estratégia
de retenção os eventos especiais, que são realizados no próprio
estabelecimento ou fora deles. Nesse caso, os clientes considerados fiéis e/ou
lucrativos são convidados.
Tabela 6 Identificação entre os clientes fiéis e/ou lucrativos que deixaram de freqüentar o estabelecimento
N.º de respostas % Sim Não Em branco
23 21 05
46,94 42,86 10,20
Total 49 100,00
• Afirmaram ter conseguido identificar, através do acompanhamento permanente
pelo banco de dados, quais os clientes fiéis e/ou lucrativos, que deixaram de
freqüentá-los, um total de 46,94% dos estabelecimentos. Eles procuram saber o
motivo e tentam resolver os problemas, antes que outros sejam atingidos.
• Entre os 42,86% de estabelecimentos que afirmaram não conseguir identificá-
los, verificou-se que isso ocorre por dois motivos: ou os estabelecimentos não
possuem um banco de dados ou não se preocupam com a perda de clientes.
• Deixaram a resposta em branco, 10,20% dos estabelecimentos. Esse percentual
torna-se relevante, principalmente, pelo fato desses estabelecimentos não
identificarem a perda de seus clientes. Levando em consideração que 42,86%
dos estabelecimentos afirmaram que não conseguem, esse percentual torna-se
preocupante. Esses estabelecimentos a partir do momento em que perdem um
cliente e não procuram saber o motivo que o deixou insatisfeito, estão perdendo
uma grande oportunidade de tê-lo novamente e de afastar o problema para que
outros não sejam atingidos.
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
Tabela 7 Estabelecimentos que conseguem identificar e procuram saber os motivos pelos quais os clientes
deixaram de frequentá-los
N.º de respostas % Procuram saber o motivo Em branco
18 05
78,26 21,74
Total 23 100,00
• Procurar saber o motivo porque seus clientes, fiéis e/ou lucrativos, deixaram de
freqüentá-los, é preocupação de 78,26% dos estabelecimentos. Isso é muito
importante, pois assim poderão resolver os problemas antes que outros sejam
atingidos pela insatisfação e os estabelecimentos percam mais clientes.
• Provavelmente pelo fato de não se importarem com a perda de clientes para a
concorrência 21,74% dos estabelecimentos deixaram a resposta em branco.
• Não adiantará, apenas, os estabelecimentos identificarem esses clientes e não
tentarem procurar saber o motivo gerador de sua insatisfação. É de extrema
importância que esses estabelecimentos entrem em contato com os seus
clientes que deixaram de freqüentá-los, para tentar amenizar e resolver a
situação.
Tabela 8 Utilização de técnica de reconquista para os clientes fiéis e/ou lucrativos que deixaram de freqüentar os
estabelecimentos
N.º de respostas % Sim Não
19 30
38,78 61,22
Total 49 100,00
• Um percentual de 46,94 dos estabelecimentos afirmaram que conseguem
identificar os clientes que deixaram de freqüentá-los (Tabela 6) desse
percentual, 78,26% além de identificá-los procuram entrar em contato com eles
para detectar o motivo pelos quais eles deixaram de freqüentá-los (Tabela 7).
Desses estabelecimentos, 38,78%, além de identificarem seus clientes perdidos
e entrarem em contato com eles, afirmaram que utilizam alguma técnica para
reconquistá-los, tentando a todo custo fazer com que voltem a freqüentá-los.
• Afirmaram que não utilizam nenhuma técnica para reconquistar os seus clientes
fiéis e/ou lucrativos que deixaram de freqüentá-los 61,22% dos
estabelecimentos. De nada adiantará identificar seus clientes perdidos se não
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
entrar em contato com eles para tentar trazê-los de volta. Neste intuito é
importante que esses estabelecimentos realizem estratégias, utilizando técnicas
de reconquista.
Tabela 9 Tipos de técnica de reconquista
N.º de respostas % Convite para retorno Contato telefônico e mala diretaVariação nos cardápios
13
04 02
68,42
21,05 10,53
Total 19 100,00
• Atingiu o percentual de 68,42% os estabelecimentos afirmaram que convidam os
seus clientes que, por algum motivo, deixaram de freqüentá-los para retornarem.
• afirmaram que utilizam o contato telefônico e a mala direta, onde o objetivo é
semelhante ao primeiro caso, 21,05% dos estabelecimentos.
• Afirmaram que utilizam a variação de cardápios como técnica de reconquista
10,53% dos estabelecimentos. Nesse caso, a técnica só será utilizada caso seja
comprovado que alguns clientes deixaram de freqüentar o estabelecimento
devido a insatisfação com a culinária do mesmo.
Tabela 10 Causas apontadas pelos estabelecimentos para realizar o marketing de relacionamento
N.º de respostas %
Aumentar a lucratividade
Devido a concorrência
Retenção do cliente
Melhoria do atendimento e da qualidade
Maximização da satisfação do cliente
Personalização no atendimento
08
14
20
10
07
13
11,11
19,44
27,78
13,89
9,72
18,06
Total 72 100,00
OBS: 20 estabelecimentos responderam mais de uma causa.
• Uma causa apontada pelos estabelecimentos para realização do marketing de
relacionamento é o aumento da sua lucratividade. 11,11% dos estabelecimentos
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
responderam que realizam o marketing de relacionamento para alavancarem os
seus resultados.
• Indicaram a concorrência como causa importante para realizar o marketing de
relacionamento, 19,44% dos estabelecimentos. O resultado obtido mostra que
apesar da mudança de orientação de mercado, a maioria, ainda, não se deu
conta de que a estratégia de relacionamento é uma vantagem competitiva para
essa concorrência ser driblada, principalmente, no mercado em que eles atuam
onde a concorrência é muito acirrada.
• Foi afirmado por 27,78 % dos estabelecimentos que a principal causa para a
realização do marketing de relacionamento, é a retenção dos clientes e que essa
estratégia deve ser realizada com os estabelecimentos oferecendo o valor que
eles buscam e necessitam.
• A causa apontada por 13,89% estabelecimentos para realização do marketing
de relacionamento é melhorar o atendimento e a qualidade. É importante que os
estabelecimentos, que se decidirem pela realização desse marketing, tenham
como regra a melhoria da qualidade e do atendimento. É a combinação da
qualidade dos produtos e/ou serviços, vendidos e/ou prestados, com o
atendimento que garantirá o relacionamento a longo prazo entre os
estabelecimentos e os seus clientes.
• Todas as empresas, independente do segmento em que atuam, devem
direcionar suas atividades com o objetivo de satisfazer os seus clientes. Pensam
dessa maneira 9,72% dos estabelecimentos, pois responderam ser a busca pela
maximização da satisfação dos seus clientes uma das causas pela qual se deve
realizar o marketing de relacionamento. É importante que essa causa apontada
chegue aos 100%, e que todos os estabelecimentos antes de pensarem em
realizar o marketing de relacionamento busquem, incansavelmente, o máximo
valor para os seus clientes.
• 18,06% dos estabelecimentos responderam que a personalização no
atendimento é uma das principais causas pela qual se deve realizar o marketing
de relacionamento. Os estabelecimentos que utilizam esse recurso criam o
máximo valor para os seus clientes fiéis e/ou lucrativos, agregando esse valor
em seus produtos e serviços para melhor atendê-los.
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
9 CONCLUSÃO
Com o resultado da pesquisa, ficou evidenciada uma mudança de orientação de mercado
por parte dos estabelecimentos gastronômicos associados à ABRASEL-PE, onde 63,27% dos
estabelecimentos possuem banco de dados com informações sobre os seus clientes.
Ao utilizarem as informações contidas nos bancos de dados, terão algumas vantagens
como, por exemplo, a identificação de seus clientes considerados fiéis e/ou lucrativos, podendo
apresentar-lhes produtos e/ou serviços adequados no tempo correto e preparar para eles
programas de marketing sob medida; interagir de maneira personalizada podendo desenvolver
as estratégias de retenção, visualizando os clientes individualmente; antecipar-se às
necessidades dos seus melhores clientes e identificar outros de alta probabilidade baseado em
seu perfil de semelhança com os clientes atuais e estratégicos.
Afirmaram que não possuem banco de dados com informações sobre os seus clientes,
36,73% dos estabelecimentos. Sem o banco de dados, que é a base do marketing de
relacionamento os estabelecimentos ficarão impossibilitados de implantar essa estratégia.
Mesmo assim, alguns vêm conseguindo reter uma certa quantidade de clientes. A principal
estratégia que eles utilizam e, não necessariamente, precisa do banco de dados é o cartão de
acumulação de bônus ou cartão de fidelidade, onde o cliente coloca os bônus que recebe cada
vez que freqüenta o estabelecimento. Quando o cartão é totalmente preenchido, o cliente ganha
alguma cortesia (na maioria das vezes, uma refeição ou um brinde).
Mostra ainda ser falha a maneira como os estabelecimentos associados à ABRASEL-PE,
utilizam o banco de dados. Isso fica comprovado quando 22,58% dos estabelecimentos que
possuem banco de dados, não conseguem identificar os seus melhores clientes e assim todos
os eles são tratados da mesma maneira, independente da freqüência e da lucratividade que
trazem para o estabelecimento.
Os estabelecimentos ao implantarem o marketing de relacionamento, devem identificar
entre os seus clientes atuais quais os que são fiéis e/ou lucrativos e dar-lhes valor superior. Vale
ressaltar que todos os clientes devem ter suas necessidades atendidas e serem trabalhados
para tornarem-se estratégicos.
Vale ressaltar que 46,94% dos estabelecimentos fazem um monitoramento constante no
banco de dados para identificarem quais clientes deixaram de freqüentá-los. Desses
estabelecimentos, 78,26% após identificarem esses clientes procuram saber os motivos pelos
quais os mesmos se afastaram para, posteriormente, rever os seus processos e afastarem os
problemas identificados para que outros não sejam atingidos.
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É importante destacar que, apenas, 38,78% dos estabelecimentos tentam reconquistar os
clientes perdidos. Não basta, apenas, os estabelecimentos identificarem e procurarem saber os
motivos que ocasionaram insatisfação nos clientes é importante a utilização de técnicas para
reconquistá-los.
É importante destacar a principal causa apontada pelos estabelecimentos para a
realização do marketing de relacionamento, onde 27,78% afirmaram que realizam a estratégia
com a finalidade de retenção de seus clientes, a fim de manter um relacionamento a longo prazo
com eles.
10 REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA BARRIE, Hopson. Atendimento ao cliente:12 degraus para o sucesso. São Paulo: Nobel, 1995.
BROWN, Stanley A. CRM – CUSTOMER RELATIONSHIP MANAGEMENT: uma ferramenta estratégica para o mundo e-business. São Paulo: Makron Books, 2001.
CANNIE, Joan Koob. Como recuperar clientes perdidos (eles valem ouro!). São Paulo: Nobel, 1995.
GORDON, Ian. Marketing de relacionamento: estratégias, técnicas e tecnologias para conquistar clientes e mantê-los para sempre. São Paulo: Futura, 1998.
HUGHES, Arthur M. Database marketing estratégico. São Paulo: Makron Books, 1998.
JUNG, Ana Paula. Endomarketing é questão de atitude. In: Revista de Marketing. São Paulo, a. 33, n. 325, p. 68-69, fev. 2000.
KOTLER, Philip.; ARMSTRONG, Gary. Princípios de marketing. Rio de Janeiro: LTC, 1995. McKENNA, Regis. Marketing de relacionamento: estratégias bem sucedidas para a era do cliente. 8. ed. Rio de Janeiro: Campus, 1992. PEPPERS, Don; ROGERS, Martha. CRM series: marketing 1 to 1. São Paulo: Makron Books, 2001. STEVENSON, William, J. Estatística aplicada à administração. São Paulo: Harper & Row do Brasil, 1981. VAVRA, Terry G. Marketing de relacionamento: after marketing. São Paulo: Atlas, 1993.
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica,
vol. 01, jan. / jun. 2007 ISSN 0000-0000 - v. eletrônica
O ENOTURISMO EM PORTUGAL: O CASO DAS ROTAS DO VINHO Adriano Costa Escola Superior de Tecnologia e Gestão do Instituto Politécnico da Guarda PALAVRAS CHAVE: Enoturismo, Marketing, Comportamento do Consumidor, Internet, Segmentação.
1 INTRODUÇÃO O Enoturismo – turismo em espaço rural ligado ao vinho e à vinha – é uma área forte e de
grande crescimento dentro do turismo (O’Neill e Chartes, 2000). Apesar de ser um sector
relativamente jovem, é um sector que tem grandes hipóteses de crescimento e que permite a
médio e longo prazo ter sustentabilidade e rentabilidade (Macionis, 1998). Como referiu
Cambourne (1998), o enoturismo substitui o ecoturismo como “buzzword” nova e quente e como
um nicho de mercado novo e importante de grande potencial de crescimento.
Assim o enoturismo, é um importante e inovador produto turístico, que permite divulgar as
potencialidades de determinadas regiões vitivinícolas e seu aproveitamento turístico quer em
termos de serviços, quer em termos de património. Com referiu Hall (citado em Johnson, 1997),
o enoturismo é a visita a vinhas, estabelecimentos vinícolas, festivais de vinho, e espectáculos
de vinho de modo a provar os vinhos dessas regiões, sendo estes os factores principais da
visita. O enoturismo é um tipo de turismo que se situa fora das áreas metropolitanas e,
conseqüentemente, assume um papel importante no desenvolvimento regional e na criação de
emprego em regiões mais desfavorecidas.
Portugal é um país rico em regiões vitivinícolas de norte a sul e com fortes tradições de consumo
de vinho, sendo o sector vitivinícola de grande importância para a economia nacional. Segundo
dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), relativamente à produção das principais
culturas, a vitivinicultura ocupa a maior área em termos absolutos, com uma superfície de
255.153 hectares, o que corresponde a aproximadamente 5% da superfície total plantada. Por
outro lado e segundo dados da União Europeia (EU), o sector do turismo é actualmente o maior
1
Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
da EU, contribuindo com 5,5% para o Produto Interno Bruto (PIB) comunitário, 6% do emprego e
30% do comércio de serviços da EU (DGT,2002).
Por outro lado, ninguém duvida hoje em dia que a Internet é uma realidade presente na
comercialização turística, nem das possibilidades que esta encerra. Assim o comércio
electrónico é uma alternativa de comercialização deste produto turístico e o seu êxito dependerá
da capacidade da oferta em aproveitar o comércio electrónico, dentro das suas estratégias e
assim satisfazer as necessidades dos seus clientes (Sahllberg, 1993). Isto vai gerar mudanças
desde a concepção do produto, canais de distribuição, preço e comunicação, bem como até da
estrutura do próprio sector. Daí que seja necessário realizar uma reflexão profunda sobre a
procura que se deseja satisfazer. Só assim, se está em condições de desenhar estratégias
oportunas para que o comércio electrónico seja uma ferramenta de marketing eficaz.
O objectivo deste artigo é demonstrar a importância do turismo “on-line”, fazendo a sua
aplicação ao enoturismo.
2 NATUREZA E DIMENSÃO DO COMÉRCIO ELECTRÓNICO
Existe uma ampla tipologia de definições de comércio electrónico, mas a mais vulgarmente
utilizada foi aquela que foi registada pela IBM como e-business e que consiste na optimização
das actividades de uma empresa, utilizando as tecnologias digitais, tais como as comunicações
digitais, o e-commerce e a pesquisa “on-line” (citado por Hortinha, 2001). O comércio electrónico
ocorre de diferentes formas, tendo por isso diferentes terminologias, tais como: entre empresas,
o qual é designado por business-to-business (B2B); entre empresas e consumidor final business-
to-consumer (B2C); entre consumidores, consumer-to-consumer (C2C); entre empresas e
administração pública, business-to-governement (B2G); e entre o estado e os seus cidadãos,
governement-to-consumer (G2C).
Em termos gerais, o comércio electrónico reflecte todas as formas de transacções entre
particulares e organizações, realizadas através do tratamento e transmissão electrónica de
dados, sons e imagens. Assim o termo de comércio electrónico não se utiliza unicamente nas
transacções que são efectuadas utilizando meios electrónicos (por exemplo, software que pode
ser distribuído de forma electrónica). É suficiente que algumas destas etapas (troca de
informações, apresentação de catálogos, publicidade) se realizem por este meio, para se
apelidar de comércio electrónico. Estes elementos, são na realidade não transaccionáveis.
Contudo estão orientados para uma transacção futura que se poderá realizar por meios físicos
(por exemplo a distribuição de livros).
2
Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
O desenvolvimento da Internet, uma rede aberta por excelência, pressupõe uma grande
mudança das perspectivas, especialmente no que concerne às pequenas empresas em relação
ao consumidor final. A publicidade, a produção, a compra, o pagamento e entrega podem
realizar-se electronicamente através da Internet. Os mercados electrónicos suportam todas estas
fases de uma transacção do mercado, desde a determinação das características de um produto,
concepção, distribuição e pagamento. A utilização da Internet para realizar transacções
comerciais contribui, consequentemente, para a realização de um mercado ideal, sendo este um
lugar abstracto de troca, com informações completas e na qual os custos de transacção não se
aplicam (Schimid, 1994). Por outro lado a Internet, permite passar do velho comércio, em que
havia restrições de tempo e lugar, e o mercado era visto como um mercado de massas, para o
novo comércio, em que não há restrições de lugar e se pode negociar 24 horas por dia e 365
dias por ano, sendo cada cliente analisado individualmente (Molenaar, 1998).
Assim não é de estranhar o elevado crescimento da Internet, que segundo a ActivMedia
Research (www.actimedia.com) já existem mais de 2 milhões de sites disponíveis, contendo
mais de 300 milhões de páginas, sendo enviados mais de 300 milhões de e-mails diariamente e
prevê que, em todo o mundo, as receitas de e-commerce atinjam 2100 mil milhões de euros no
ano de 2005. Contudo a tarefa de analisar quantitativamente a evolução do comércio electrónico
é muita difícil, existindo grandes discrepâncias derivadas da definição deste conceito. Mais
ainda, verifica-se que na grande maioria estas instituições são privadas e não especificam qual a
metodologia utilizada na obtenção desses valores. Para agravar esta situação esses estudos
são baseados na experiência dos Estados Unidos, o qual é o país mais avançado na adopção
do comércio electrónico.
No ano 2001, o comércio electrónico representou no mundo um valor de 60,3 biliões de $USD,
dos quais 16 são referentes ao turismo (Rita, 2002). Segundo um estudo da Forrester Research
(1999), durante o presente ano mais de 30% das vendas on-line serão geradas pelo sector do
turismo
O número de utilizadores que usam a Internet com fins relacionados com o turismo atinge os 70
milhões, metade dos quais consultam a Internet para obter informação sobre os destinos ou para
verificar preços e horários (Travel Association of América, 1999).
Viajar é uma das características mais populares de e-commerce, com 45% de compradores na
Internet adquirindo viagens on-line. Este número só é superado pelos livros com 54%
(PhoCusWright, 1999).
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Em Portugal apesar das diferenças existentes em relação ao e-commerce mundial, o número de
compradores on-line de viagens é de 3,1%, sendo superado pelos livros (39,1%), CDs (20,3%) e
Vestuário (7,8%) (www.vector21.com).
3 CARACTERIZAÇÃO DO CONSUMIDOR ON-LINE
No turismo, como em qualquer outro sector é importante conhecer o consumidor com o qual a
empresa ou organização se relaciona, para desta forma melhor adequar a oferta às
necessidades por ele manifestadas. Daí que seja importante saber o que leva os consumidores
a comprar algo na Internet. Segundo Margherio (1997), as razões que levam à compra na
Internet são:
• Escolha – existe um maior número de lojas on-line, que em qualquer cidade do mundo,
isto porque pode visitar não só as lojas da sua cidade, como de todo o país ou planeta.
Por outro lado, dentro de cada loja virtual, o consumidor têm à sua disposição um leque
de produtos muito mais vasto do que nas lojas tradicionais;
• Conveniência – realizar compras na Internet poupa muito tempo se comparado com as
compras tradicionais. Na Internet o consumidor não precisa de sair de casa, tem a loja
aberta vinte e quatro horas por dia, sete dias por semana e 365 dias por ano. As
empresas devem possibilitar ao consumidor a opção de realizar todo o processo on-line,
desde o pedido do produto e ou serviço, à informação se ele está disponível, ao suporte
técnico e mesmo as instruções para o uso do produto. Isto permite que o consumidor
faça as compras ou reservas dos serviços e peça ajuda quando necessita realmente,
sendo por isso um meio muito mais conveniente;
• Mais e Melhor Informação – as lojas virtuais são muito mais completas, em termos de
informação, do que as lojas tradicionais. Numa loja virtual pode e deve estar presente
toda a informação relativa ao produto ou serviço, desde modalidades possíveis, modos
de utilização, perguntas mais frequentes (FAQs), disponibilidade, forma de pagamento,
entre outras, informações essas, que numa loja tradicional, o vendedor poderá não estar
preparado para lhe dar imediatamente. Em processo de compra mais complexo (como
seja a escolha de um destino turístico), esta quantidade e qualidade de informação é uma
vantagem pois o consumidor tem um grande envolvimento no processo de compra e quer
ver respondidas as suas perguntas, que podem ser satisfeitas com maior qualidade e
maior rapidez on-line;
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
• Preços Mais Baixos – possibilidade de aceder a mecanismos de procura (shop agents)
que permitem encontrar a melhor oferta para um determinado produto ou serviço. Por
outro lado, o facto de a concorrência ser global, o que adicionado à redução de custos
que a Internet proporciona às empresas (custos com pessoal, instalações, stocks,
merchandising, etc), leva a que as empresas tendam a praticar preços mais baixos na
Internet;
• Produção à medida – a Internet possibilita uma comunicação consumidor-produtor
bastante estreita que leva a que o consumidor possa efectivamente adquirir o produto ou
serviço, que satisfaça as suas necessidades.
4 PORTAIS COMO FORMA DE ASSOCIATIVISMO VIRTUAL
A revisão da literatura sugere que a investigação utilizada para planear viagens será
provavelmente mais demorada e envolverá o uso de mais fontes do que a procura de informação
sobre outros produtos de consumo (Fodness e Murray, 1998).
A indústria do turismo é caracterizada por oferecer negócios complementares. Assim um viajante
utilizará uma companhia área, um rent-a-car, um quarto num hotel e consumirá refeições e
serviços que são oferecidos por diversas empresas. O objectivo do turista é adquirir uma
experiência agradável. Deste modo um website bem estruturado poderá facilitar o planeamento
e decisão, por parte do turista. Podem servir também como ponto de distribuição para os
serviços que os clientes precisarão, à medida que planeiam as suas férias.
Os destinos turísticos emergem como marcas umbrella e precisarão de ser promovidos no
mercado global como entidades para cada segmento-alvo que tentem atingir (Rita, 2001). Os
fenómenos emergentes da globalização e concentração da oferta aumentam o nível
concorrencial e requerem novas estratégias de marketing para destinos. Por isso, as
organizações (governamentais ou particulares), responsáveis pela promoção e comercialização
dos destinos turísticos, terão que identificar nichos de mercado e desenvolver a sua
interactividade com os turistas. A estratégia de distribuição e alocação de produtos turísticos
deverá seguir uma aproximação orientada para o cliente. Daí que um sistema de marketing
vertical deverá ser adoptado, de modo a agregar um conjunto de produtos inter-relacionados
para cada destino disponível para selecção.
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Isto implica que para o caso das rotas do vinho, estas deverão possuir um grande portal como
principal entrada, em vez de apostar apenas numa série de websites individuais, de natureza
comercial.
Assim o portal das rotas de vinho deverá ser desenvolvido por uma única organização, em
parceria com os maiores participantes do mercado (adegas, hotéis, casas de turismo rural, etc),
através de uma abordagem contratual ou empresarial. Isto teria ligações de e para os websites
das outras organizações que têm negócios relacionados com os destinos. Estas parcerias são
importantes, visto que permitem por um lado que as organizações responsáveis pela promoção
e divulgação de um destino acederem aos consumidores de outras empresa com ela
relacionada, bem como ajudam essas empresas a expandir a sua oferta.
Um portal para o marketing das rotas dos vinhos deveria oferecer a seguinte informação:
• Como lá chegar (exemplo: companhias aéreas);
• Com circular (exemplo: empresas de camionagem);
• Lugares para ficar (exemplo: hotéis, residenciais);
• Actividades (exemplo: locais para visitar, monumentos, espectáculos, feiras, etc).
Todos estes itens deverão incluir a disponibilidade e a capacidade de reservas. Isto poderá ser
oferecido através da ligação aos sites dessas empresas.
5 REGRAS PARA A CONSTRUÇÃO DE UM SITE
O design do website é uma questão fundamental para alcançar êxito no e-commerce (Dreze e
Zufryden, 1997; Loban, 1998; Morrison e Morrison, 1999; Plamer e Griffith, 1998; a/b; Wilson,
1999). Os sites bem sucedidos são desenhados em torno dos desejos e necessidades dos
segmentos-alvos (Rita, 2000).
O design do website deve ser visualmente atraente e amigável para o utilizador, mas também
para ser favorável à indexação nos motores de busca.
Hoje já existem websites que permitem a personalização de conteúdos. Neste tipo de sites
existe um software que analisa automaticamente os perfis dos visitantes, identifica o que tentam
fazer e ajusta partes da interface, apresentando uma capacidade de resposta mais customizada
ao perfil de cada visitante (www.amazom.com).
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Porém, toda esta funcionalidade dos sites tem um preço. À medida que os websites se
expandem para acomodar características adicionais, os clientes podem ficar confusos com a
quantidade de escolhas e trilhos de navegação complexos. Assim deve-se ter em atenção que
deve haver um equilíbrio entre a simplicidade no design dos websites e as suas características
tecnológicas, de modo a servir os clientes com maior eficácia (Rita, 2000).
O estado ideal de um site é quando os clientes visitam o site, encontram aquilo que pretendem,
cumprem as suas tarefas e saem.
Dado a evolução muita rápida verificada, neste sector das novas tecnologias, bem como da
crescente complexidade e volume de transacções efectuadas na Internet, um site deverá ter um
formato modular, de modo a que se possa expandir sem ter que efectuar mudança na sua
estrutura modelar. A filosofia subjacente é “pense em grande, comece pequeno, teste
rapidamente e escale de imediato” (Rita 2001).
Um site deverá ser relativamente simples e rápido de navegar para o consumidor. Um dos
factores que contribuem para a facilidade de navegação é um limitado número de elementos por
página.
A home page também necessita de gráficos para parecer atractiva. A melhor combinação é um
único gráfico cintilante combinado com texto, de modo que esta seja graficamente equilibrada,
agradável e informativa. A cor ou textura de fundo utilizada ao longo do site nunca deverá
sobrepor-se ao texto, mas sim complementá-lo. O domain name ou título da página é muito
importante, dado que a maioria das vezes é o que aparece nos motores de busca. Assim o título
deve ser descritivo, utilizando palavras chaves que as pessoas deverão utilizar para procurar a
página.
6 AS ROTAS DE VINHO EM PORTUGAL
Os principais objectivos da criação das Rotas do Vinho são o desenvolvimento do potencial
turístico das diferentes regiões em diversas áreas tais como: cultura vitivinícola e da produção de
vinhos de qualidade. Este turismo vitivinícola associa à volta do vinho as vertentes ambientais,
culturais e gastronómicas das regiões vitivinícolas, bem como as pequenas produções
ambientais. Como disse recentemente Costa (2001), "Autenticidade, tradição e património
cultural e natural, são valores que caracterizam e diferenciam os nossos produtos turísticos, indo
ao encontro de uma clientela cada vez mais diversificada e exigente".
7
Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
Esta ligação do sector vitivinícola ao turismo não é recente, nomeadamente na região do Douro,
já que diversas entidades, públicas e privadas, têm organizado visitas às Caves de Vila Nova de
Gaia, passeio de barco através do rio Douro para ver e visitar as quintas onde é produzido o
denominado Vinho do Porto, promoção do turismo de habitação em quintas de
produtores/engarrafadores de vinho.
A gastronomia identifica-se com a cultura de um povo e Portugal não foge à regra. Se tivermos
em consideração a tipicidade dos pratos que caracterizam cada região nacional, podemos
constatar que tal variedade retrata essa região de tal forma que se falarmos da Lampreia
rapidamente a associamos à região do Minho, as coentradas ao Alentejo, o leitão à Bairrada,
entre outras. E se o vinho é cultura, fazendo ele parte da gastronomia, ambos associados
reforçam a identidade cultural de um povo.
Dada a elevada riqueza histórica em termos paisagísticos, arquitectónicos, vitivinícola e a grande
diversidade gastronómica existente em Portugal as Rotas do Vinho assume um papel cada vez
mais importante e primordial na economia portuguesa, sendo um pólo de atracção turística,
devendo por isso ser devidamente promovidas e comercializadas juntamente com outros
destinos turísticos nacionais.
Assim não é de estranhar que actualmente existam em Portugal 11 Rotas do Vinho, que na sua
totalidade possuem 30 percursos (Calvão, 2000).
A Rota dos Vinhos Verdes, da responsabilidade da Comissão Vitivinícola dos Vinhos Verdes,
conta com 62 aderentes, entre os quais adegas cooperativas, produtores-engarrafadores,
armazenistas-vinificadores, associações de cooperativas, restaurantes e associações de
viticultores. Esta rota é composta por 3 percursos: Três Cidades de Encanto, Do Cávado ao
Lima e Da Costa à Serra.
A Rota do Vinho do Porto, da responsabilidade conjunta do Instituto do Vinho do Porto, Casa do
Douro, Região de Turismo da Serra do Marão, Região de Turismo do Nordeste Transmontano e
Região do Turismo Douro Sul, conta com 54 aderentes, situados na Região Demarcada do
Douro e concelhos limítrofes, que se encontram directa ou indirectamente relacionadas com a
vitivinicultura. Esta rota possui 3 percursos, sendo estes os seguintes: Pelo Baixo Corgo, No
Cima do Corgo, À Descoberta do Douro Superior.
A Rota das Vinhas de Cister, inserida na região do Douro Sul, é da responsabilidade da
Comissão Regional Naves Varosa. Conta somente com 7 aderentes. Apesar do reduzido
número de aderentes tem 2 percursos alternativos: O Caminho dos Mosteiros e Entre as Vinhas
e Castanheiros.
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
A Rota do Vinho do Dão, inserida na Região Demarcada dos Vinhos do Dão, conta actualmente
com 35 aderentes, sendo esta da responsabilidade da Comissão Vitivinícola do Dão. Possui 3
percursos: Caminhos de Granito, Entre o Vouga e o Paiva e Entre o Dão e o Mondego.
A Rota do Vinho da Bairrada, inserida na Região Demarcada da Bairrada, e da responsabilidade
da Comissão Vitivinícola da Bairrada, possui actualmente 23 aderentes distribuídos por 3
percursos alternativos: Trilhos do Monte, Caminhos de Barro e Estradas de Areia.
A Rota do Vinho da Beira Interior, da responsabilidade da Comissão Vitivinícola da Beira Interior,
conta somente com 5 aderentes, tendo esta rota, 3 percursos: Da Serra ao Côa, ao Longo da
Fronteira e pelos Castelos da Beira Alta.
A Rota do Vinho do Oeste, da responsabilidade da Região do Turismo do Oeste, tem 13
aderentes e possui 2 percursos: Caminho entre Vinhas e À Beira do Atlântico.
A Rota da Vinha e do Vinho do Ribatejo é da responsabilidade da Associação da Rota da Vinha
e do Vinho do Oeste, tendo actualmente 31 aderentes e 4 percursos: Tesouro Gótico, Beira Tejo,
Touro e Cavalos e Tesouro Manuelino.
A Rota dos Vinhos de Bucelas, Carcavelos e Colares, da responsabilidade da Comissão
Vitivinícola Regional de Bucelas, Carcavelos e Colares, conta presentemente 5 aderentes e tem
3 percursos alternativos: Circuito dos Palácios, Em Torno de Sintra e Circuito das Praias.
A Rota do Vinho da Costa Azul, situada na Península de Setúbal, é da responsabilidade da
Região de Turismo de Setúbal. Presentemente possui 9 aderentes e 1 único percurso, o qual
tem o nome de Dentro de Portas.
A Rota de Vinho do Alentejo, é da responsabilidade da Comissão Vitivinícola do Alentejo.
Presentemente conta com 27 aderentes, distribuídos por 4 percursos alternativos: Caminho de
S. Mamede, Tesouro Histórico e Nas Margens do Guadiana.
Das diferentes rotas de vinho anteriormente apresentadas, somente as Rotas da Vinha de
Cister, Vinho do Oeste e de Bucelas, Carcavelos e Colares não apresentam home page,
podendo este facto estar relacionado com o reduzido número de aderentes a cada uma das
rotas. Das restantes e após análise de cada uma das suas home pages, constatou-se que a
home page, em que existe um maior nível de interactividade, é a da Rota dos Vinhos Verdes.
Contudo, esta interactividade ainda se encontra a uma longa distância daquilo que deve ser feito
e que se preconiza para as Rotas do Vinho em Portugal.
As razões para tal facto são as seguintes:
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
• Falta de associativismo – o qual poderá ser constatado no elevado número de rotas
existentes num país tão pequeno, bem como da parte das empresas;
• Falta de Coordenação – pelo que anteriormente foi dito, verifica-se que em muitos casos,
a coordenação das rotas é feita por entidades diferentes, como sendo as comissões
vitivinícolas ou regiões de turismo;
• Falta de responsabilização – não existe uma responsabilização por parte dos diferentes
responsáveis;
• Falta de conhecimentos – falta de conhecimentos pelas pessoas responsáveis, quer em
termos políticos, quer em termos empresariais.
7 CONCLUSÃO
Sendo a Internet geradora de uma transformação social, ela terá, naturalmente repercussões a
nível empresarial. Assim, é necessário urgentemente proceder a ajustes na forma de divulgação
e promoção do enoturismo. Para que esses ajustes não sejam tardios, é preciso que os
diferentes responsáveis e intervenientes se unam numa conjugação de esforços, para criar o
associativismo virtual. Será este o grande projecto que se coloca às Rotas dos Vinhos de
Portugal.
8 REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA CALVÃO, D. "Rotas do vinho". [S.l.]: ICEP; Publicações D. Quixote, 2000. CAMBOURNE, B. “Wine tourism in the Canberra district, wine tourism: perfect partners. Proceedings of the First Australian Wine Tourism Conference. In: Bureau of Tourism Research; [S.l: s.n.], 1998. COSTA, G. "O turismo de hoje valoriza a cultura". In: Guia do Turismo de Habitação, Expresso. [S.l.: s.n.], 2001. DGT/Ministério da Economia. “Turismo em Portugal: politica, estratégia e instrumento de intervenção. [S.l.: s.n.], 2002. DREZE, X.; ZUFRYDEN, F. “Testing web site design and promotional contente”. In: Journal of Advertising Research, v. 37, n. 2, 1997. FODNESS, D. ; MURRAY, B. “A typology of tourist information search strategies”, In: Journal of Travel Research; 1998. FORRESTER RESEARCH. “Travel’s internet backbone”. Relatório editado pela FR. 1999. HORTINHA, J, “E-marketing: guia para a nova economia”. [S.l.]: Silabo, 2001.
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vol. 01, jan. / jun. 2007 ISSN 0000-0000 - v. eletrônica
O IMPACTO DAS ESTRATÉGIAS ADOPTADAS NA PERFORMANCE FINANCEIRA: O CASO DAS EMPRESAS DA BEIRA INTERIOR Aida Maria Brito Martins1
Escola Superior de Turismo e Telecomunicações de Seia Departamento de Ciências Empresarias PALAVRAS CHAVE: Estratégia, Performance Financeira.
1 INTRODUÇÃO A estratégia está relacionada com decisões e factores que condicionam a vida da empresa de
uma forma integrada e substancial, num horizonte temporal não só de curto, mas também de
longo-prazo. O impacto da estratégia não se limita a uma área confinada, mas afecta
significativamente toda a empresa, pelo que os custos de uma mudança estratégica poderão ser
elevados e relevantes no contexto empresarial.
De acordo com Franco (1996), para obter vantagens competitivas, as empresas deverão
adoptar, em função das condições do meio envolvente, as estratégias que sejam mais eficazes,
afirmando Raposo (1995) que a crescente internacionalização e interpenetração das economias
dos países, e a rápida evolução tecnológica, provocam uma maior necessidade das empresas
adoptarem as suas estratégias competitivas. Para Mintzberg e Lampel (2000) a estratégia evolui
não passiva mas criativamente e de forma imprevisível.
De acordo com Henriques (1998), o elemento-chave de uma boa estratégia é a qualidade e
especificidade da visão que lhe está subjacente; gerir estrategicamente é gerir por antecipação,
isto é, olhar para o futuro num contexto de permanente mudança.
Segundo Franco (1996), o tecido industrial português é dominado por pequenas e médias
empresas (PME), facto que juntamente com a propriedade familiar (superior a 70% do total) e
cultura condiciona a estratégia a seguir pelas empresas.
1 E-mail: aida.brito@clix
1
Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
As estratégias escolhidas pelas empresas assumem uma importância significativa na condução
dos seus negócios e consequente desempenho financeiro. Assim, este trabalho, baseado numa
amostra de empresas da região da Beira Interior, pretende identificar as diversas estratégias
seguidas por aquelas e analisar o seu impacto na performance financeira das mesmas.
2 ESTRATÉGIA
2.1 Definição e evolução do conceito O termo Estratégia, do originário grego strategos, combina stratos (exército) e ag (liderar), e
significa a liderança do exército ou a função do general. A estratégia militar remonta a Sun Tzu
no ano 400 A. C.
Segundo Farhangmehr (1999), o conceito de estratégia empresarial na literatura de gestão foi
introduzido formalmente em 1948 por Von Neunann e Morgenstern, tendo-se os primeiros
autores inspirado na linguagem militar.
De acordo com Mintzberg e Lampel (2000), a origem da estratégia encontra-se em princípios
básicos que assentam em disciplinas fundamentais, como a economia, a sociologia ou a
biologia; ou na cultura da organização, podendo a sua caracterização ser feita por dez escolas
importantes: três prescritivas (o que deveria ser) e sete descritivas (aquilo que é). As primeiras
tendem a adoptar uma abordagem do conhecimento em função de um “crescimento gerido”,
controlando as influências externas, enquanto as outras optam por um “crescimento mais
natural”. Das Escolas Prescritivas fazem parte: Desenho, Planeamento, e Posicionamento;
enquanto as Descritivas englobam: Empreendedor, Cognitiva, Aprendizagem, Poder, Cultural,
Ambiental e Configuração.
De acordo com Mintzberg e Lampel (2000), as escolas mais antigas contribuem para as mais
recentes, inserindo de forma ambígua novos enquadramentos, existindo fronteiras pouco claras
entre elas. Segundo os citados autores, ambas as abordagens comportam vantagens e
inconvenientes: as prescritivas são claras e coerentes, podendo, por outro lado, conduzir à
esterilidade no pensamento e na sua aplicação; as descritivas são mais completas, permitindo
maior experimentação e inovação, podendo, contudo, levar a uma certa confusão através da
geração de múltiplas perspectivas que dificultam a sua aplicação.
A teoria da estratégia foi, até há alguns anos atrás, dominada pela escola da Estratégia como
Plano, o qual deveria ser seguido sem alterações. Porém, a partir dos anos 70 e 80 a estratégia
tornou-se mais flexível e abrangente.
2
Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
Farhangmehr (1999) afirma que na literatura de gestão a palavra estratégia não só é utilizada
excessivamente, como também de forma incorrecta. Mintzberg (1994) refere que a razão do uso
excessivo da palavra estratégia se deve ao facto de ser bastante limitado dar uma única
definição a um conceito tão vasto, pelo que o referido autor sugere “5Ps”: plano, estratagema
(ploy), padrão, posição e perspectiva. Walker et al (1992) definem estratégia como um padrão
fundamental, que contempla: alcance (scope), metas e objectivos, afectação de recursos,
identificação de uma vantagem competitiva sustentável e sinergia.
Chicken e Hayns (1999) afirmam que a estratégia é a conjugação dos recursos disponíveis, com
vista à prossecução efectiva de um dado objectivo, devendo todos os elementos da empresa ser
envolvidos para que uma estratégia seja bem sucedida.
2.2 Da formulação à implementação Segundo Porter (1989), as acções específicas necessárias à implementação da estratégia
variam de indústria para indústria, afirmando igualmente o mesmo autor (1991) que a essência
da escolha e formulação de uma estratégia se baseia no relacionamento da empresa com o seu
meio ambiente, especialmente a indústria onde opera, centrando-se o ponto básico nas
capacidades daquela.
Porter (1991) refere que a formulação da estratégia implica a consideração de quatro factores
básicos: pontos fortes e pontos fracos; ameaças e oportunidades; valores pessoais (motivações
e necessidades) dos implementadores da estratégia; e expectativas da comunidade envolvente.
Mintzberg e Lampel (2000) afirmam que algumas das abordagens mais recentes da formação da
estratégia atravessam, de uma forma célere, dez escolas: Desenho, Planeamento,
Posicionamento, Empreendedorismo, Cognitiva, Aprendizagem, Poder, Cultural, Ambiental e da
Configuração.
Segundo os mesmos autores, as várias escolas representam partes da formação da estratégia.
A Escola Cognitiva, está na mente do estratega, enquanto a do Posicionamento tem em atenção
os dados estabelecidos anteriormente. A Escola do Planeamento programa as estratégias
delineadas, ao passo que a do Desenho tem uma visão mais alargada da perspectiva
estratégica. A Escola Empreendedora olha em direcção ao futuro; enquanto que as da
Aprendizagem e do Poder emergem em pormenores. A Escola Cultural tem por base certas
crenças, situando-se acima desta a Ambiental. A Escola da Configuração olha em torno do
processo, por contraste com a Cognitiva, que olhar para dentro daquele.
3
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Escola da Configuração
Figura 1: Processo de Formulação da Estratégia
Fonte: Adaptado de Mintzberg e Lampel (2000)
De acordo com Mintzberg e Lampel (2000), a formulação da estratégia baseia-se numa visão
intuitiva e numa aprendizagem emergente; envolve o conhecimento individual e a interacção
social, tanto cooperativa como conflitual; inclui uma análise prévia e uma negociação durante o
processo; devendo responder a um ambiente exigente.
No entanto, de acordo com os mesmos autores, o processo de formulação da estratégia pode
contemplar os atributos de uma dada escola, dependendo: da fase em que a empresa se
encontra; da sua dimensão; do sector de actividade e tipo de indústria onde se insere; e do
ambiente externo, afirmando aqueles que há etapas e períodos identificáveis na formação da
estratégia como tendências.
Segundo Ellis e Williams (1993), a formulação da estratégia requer a combinação eficaz dos
seguintes elementos: visão, objectivos, escolha da estratégia, implementação e ajustamentos de
correcção, estando todos eles relacionados.
3 TIPOLOGIAS ESTRATÉGICAS
Ireland e Hitt (1999) referem que para competir na futura economia global, as empresas devem
colocar a ênfase na inovação e desenvolvimento de produtos e serviços, descobrindo para o
efeito meios para reunir os recursos, capacidades e competências centrais. A mudança nos
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mercados e as alterações das condições concorrenciais levam as empresas a se questionar
constantemente sobre a adequação das estratégias implementadas.
3.1 Diferenciação
Porter (1989) afirma que com a adopção da estratégia de diferenciação uma empresa procura
ser única através da selecção de um ou mais atributos que os clientes consideram importantes,
tais como: produto ou tecnologia; sistema de entrega; serviços sob encomenda; acções de
marketing; imagem de marca. A diferenciação é uma estratégia viável para obter retornos acima
da média.
De acordo com Buzzell e Gale (1991), o factor mais importante que afecta positivamente o
desempenho, rentabilidade e crescimento de uma empresa é a qualidade dos seus produtos e
serviços, uma vez que proporciona margens de lucro superiores. Segundo os mesmos autores
podem ser alcançados dois tipos de qualidade superior: a qualidade percebida, através do
desenvolvimento de um conjunto de produtos e serviço; e a qualidade de conformação, pela
obediência às especificações apropriadas dos produtos e serviços.
Phillips, Chang e Buzzell (1983) estabeleceram uma relação entre qualidade relativa superior,
preços relativos mais elevados, aumento da quota de mercado, custos relativos mais baixos, e
maior rentabilidade, tendo concluído que a primeira desempenha um papel determinante na
última.
Muitas empresas líderes em qualidade obtêm vantagem através da antecipação das
necessidades dos clientes, tornando-se as primeiras a oferecer o produto ou serviço apropriado
ao mercado alvo e adoptando, assim, uma estratégia pró-activa.
3.2 Desenvolvimento de mercados
Ansoff (1977) refere que o desenvolvimento de mercados se traduz pela procura de novas
missões para os actuais produtos e serviços da empresa.
Goodstein et al (1993) afirmam que a estratégia de desenvolvimento de mercados consiste na
procura de novos clientes em mercados relacionados, através por exemplo da expansão
geográfica.
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3.3 Investimento
Buzzell e Gale (1991) afirmam que as empresas que realizam grandes investimentos têm como
objectivo o aumento das vendas e/ou redução de custos, de forma a aumentarem a sua
rentabilidade. Contudo, e de acordo com os citados autores, verifica-se que à medida que a
intensidade de capital e o seu custo aumentam, a relação entre lucro residual sobre as vendas é
negativa.
Segundo Buzzell e Gale (1991), tal relação negativa é motivada por diversas causas, tais como:
concorrência agressiva; o elevado investimento de capital funcionar como barreira à saída de um
sector sem rentabilidade; e a empresa fixar um objectivo de lucro sobre as vendas elevado. De
acordo com os autores, existem empresas que se tornam de capital intensivo, porque as suas
estratégias tinham outros objectivos, como sejam: aumento da disponibilidade do produto,
integração vertical, e estabelecimento de uma capacidade preventiva de produção.
Monteiro (1999) afirma que a decisão de investimento se baseia na procura de um compromisso
entre a rentabilidade, que se deseja como a mais elevada possível, e o risco, que se espera o
mais reduzido possível. De acordo com Buzzell e Gale (1991), embora as possibilidades de
superar uma determinada taxa de retorno sobre o investimento futuro estejam de forma limitada
relacionadas à rentabilidade corrente, verifica-se que são influenciadas pela actual posição
estratégica da empresa.
A actual e crescente concorrência entre as empresas obriga-as a possuírem meios de
processamento e gestão da informação, bem como meios de comunicação eficazes, que lhes
permitam tomar decisões acertadas e atempadas e comunicar rapidamente, pelo que o
investimento em tecnologias de informação e comunicação é imperativo. Como é afirmado por
Pinheiro (1999), as empresas têm de identificar as tecnologias de informação (TI) que são
importantes estrategicamente e implementarem-nas, integrando-as com a sua estratégia, de
forma a criarem vantagens competitivas, conduzindo à melhoria da rentabilidade.
3.4 Penetração no mercado
Lendrevie et al (1993) afirmam que a estratégia de penetração no mercado consiste na opção
pela obtenção de uma elevada quota de mercado e/ou de um volume de vendas, os quais se
encontram associados, em detrimento da rendibilidade no curto prazo, tendo como objectivo
assegurar uma posição forte face aos concorrentes.
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Contudo, as empresas ao estipularem como objectivo um volume de vendas elevado têm por
vezes associadas outras intenções, como seja: a utilização plena da capacidade produtiva,
manutenção dos postos de trabalho, redução dos custos, entre outros.
De acordo com os citados autores, a estratégia de penetração implica geralmente a
disponibilização de recursos financeiros importantes, e justifica-se sobretudo nos casos em que
um volume de vendas elevado ou uma quota de mercado importante favorece a rendibilidade a
longo prazo. É de salientar que a estratégia de penetração, ao ser acompanhada de uma
redução do preço de venda, desincentiva a entrada de concorrentes.
4 RELAÇÃO ENTRE AS ESTRATÉGIAS ADOPTADAS E A PERFORMANCE FINANCEIRA
Neves (2002) afirma que o valor de uma empresa é, em grande parte, função da posição
concorrencial da empresa, dependendo da estratégia o criar e utilizar vantagens competitivas.
De acordo com Rappaport (1991), enquanto a sofisticação do processo de planeamento
estratégico varia de empresa para empresa, a projecção de resultados financeiros é comum a
quase todas elas, o que serve de base para avaliar a atractividade da estratégia. Segundo o
citado autor, o planeamento estratégico ajuda a gestão a localizar os recursos e utilizá-los de
forma mais eficaz, obtendo consequentemente uma maior rentabilidade. O principal objectivo
daquele é a criação de valor para os accionistas, através do crescimento nos ganhos por acção,
com consequente aumento do valor de mercado das empresas.
Ellis e Williams (1993) afirmam que os gestores necessitam continuamente de questionar em
que medida a acção da gestão está a acrescentar valor à organização, enquanto Hopkins e
Hopkins (1997) referem que a intensidade com a qual os gestores se empenham no
planeamento estratégico, tendo consequências directas na performance da empresa, depende
dos factores de: gestão; ambientais, como a complexidade e mudança; e organizacionais, isto é,
tamanho e complexidade estrutural.
Ao longo dos últimos anos têm sido desenvolvidos vários estudos com o objectivo de averiguar
em que medida alguns factores, nomeadamente a adopção de estratégias pelas empresas
contribui para a melhoria da performance financeira das mesmas. Os investigadores que se têm
ocupado desta questão têm chegado a conclusões conflitantes.
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Quadro 1: Estudos sobre a relação entre as estratégias adoptadas e a performance financeira
Autores Conclusões do estudo
Thune e House (1970) Relação positiva entre o planeamento formal e a performance
financeira em metade das indústrias incluídas na amostra (36)
Ansoff et al (1970) Relação positiva entre o planeamento formal e a performance
financeira
Herold (1972) Relação entre o planeamento estratégico formal e a performance
financeira
Rue e Fulmer (1973) Inexistência entre a perfeição do planeamento de longo prazo e a
performance financeira.
Karger e Malik (1975) A performance financeira dos planificadores excede a dos não
planificadores em 9 de 13 variáveis
Grinyer e Norburn (1975) O planeamento formal não está associado com a performance
financeira.
Kallman e Shapiro (1978) Inexistência de associação entre planeamento e performance.
Burt (1978) As empresas com maior qualidade de planeamento têm
performances financeiras superiores
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Wood e Laforge (1979) Inexistência de relação consistente entre o planeamento e a
performance financeira dos planificadores compreensivos e formais
parciais; contudo, os planificadores ultrapassaram os não
planificadores, relativamente à alteração nas percentagens de
resultados líquidos e de retorno do investimento.
Kudla (1980) O planeamento estratégico não implica a tomada de melhores
decisões estratégicas, com consequente impacto nos retornos de
risco ajustado.
Leontiades e Tezel (1980) Inexistência de relação significativa entre qualidade do planeamento
e um dos cinco critérios financeiros considerados: retorno do capital,
retorno dos activos, ganhos múltiplos, crescimento dos ganhos por
acção e crescimento das vendas
Scott et al (1981) Não existe relação sistemática clara entre o planeamento
estratégico formal e a performance económica da empresa
Sapp e Seiler (1981) O aumento da sofisticação do planeamento estratégico formal está
positivamente relacionado com a performance financeira
Harju (1981)
As empresas com altos níveis de formalidade do planeamento e
atitudes positivas em relação a este obtiveram performance
financeira superior; os planificadores formais com atitudes menos
positivas em relação ao planeamento obtiveram pior desempenho
do que os planificadores informais com atitudes positivas.
Robinson e Pearce (1983) Os resultados obtidos não realçam as diferenças de performance
significativas entre planificadores formais e não formais
relativamente aos indicadores financeiros; contudo, os citados
autores acrescentaram a utilidade do planeamento estratégico
formal entre os bancos de pequena dimensão.
Lorange(1980), Hogarth e
Makridakis(81), e King(83)
A relação entre planeamento e performance, quando muito, é ténue.
Sheehan, citado por Pearce et
al (1987),
Não existência de relação consistente entre formalidade do
planeamento e sucesso financeiro.
Najjar, citado por Pearce et al
(1987)
Existe uma significativa e positiva associação entre a importância
percebida do planeamento e os benefícios gerais obtidos.
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
Guynes, citado por Pearce et al
(1987)
Positiva, mas não significativa relação entre os esforços de
planeamento e a satisfação da gestão com a performance
Buzzell e Gale (1991) Existem importantes ligações entre a estratégia adoptada pela
empresa e o desempenho alcançado
4.1 Indicadores de avaliação da performance financeira
As empresas avaliam o seu desempenho financeiro através da análise de alguns indicadores,
isto é, dos rácios, os quais são utilizados para resumir um grande número de dados. Moreira
(1999) afirma que um rácio é uma das técnicas mais importantes na análise das Demonstrações
Financeiras, devido à sua versatilidade ao permitir comparações intertemporais para uma dada
empresa e comparações inter-empresas.
Segundo Menezes (1993) os Resultados Líquidos anuais são um dos indicadores absolutos da
rendibilidade global mais importantes; constituem a base da remuneração dos capitais próprios
ou, quando retidos, contribuem para aumentar o valor contabilístico da empresa e consolidar a
sua autonomia financeira. Por outro lado, Brealey e Myers (1998) afirmam que os Resultados
Líquidos têm um comportamento aleatório, quase não existindo relação entre o crescimento
daqueles num dado período e no período seguinte. Os Resultados Líquidos são influenciados
por factores como: política de amortizações e provisões; custos financeiros de financiamento; e
taxa de impostos sobre lucros.
Um indicador importante também utilizado na análise financeira é a relação entre os Resultados Líquidos e as Vendas, o qual traduz a contribuição das vendas de produtos e/ou
serviços na obtenção dos lucros da empresa.
VendasquidossultadosLíRe
A rendibilidade do activo depende do rácio de vendas sobre o activo e da margem de lucro.
Porém, a capacidade das empresas terem uma rendibilidade do activo elevada é limitada pela
concorrência.
Vendassultados
ActivoVendas
Activosultados ReRe
×=
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A Rendibilidade do Activo Total mede o desempenho de uma empresa através do quociente
entre os resultados e o activo total. Os resultados são definidos como os lucros antes de juros,
mas após impostos.
Rendibilidade do Activo Total = lMédioActivoTotapostosRAJI Im−
5 OBJECTIVOS E METODOLOGIA DA INVESTIGAÇÃO EMPÍRICA
5.1 Objectivos e hipótese da investigação
Com a investigação conduzida através deste trabalho pretende-se averiguar em que medida as
estratégias alternativas ao dispor das empresas situadas na região da Beira Interior,
nomeadamente no distrito da Guarda, conduzem a resultados semelhantes na sua performance
financeira. Este estudo desenvolve-se sob a seguinte hipótese:
Hipótese: Estratégias diferentes correspondem a performances financeiras semelhantes.
5.2 Metodologia
Para os dados quantitativos utilizou-se a análise da variância (ANOVA). A população estudada
nesta investigação é composta pelas empresas do Distrito da Guarda que participaram numa
das três versões do Programa INPME (INPME1, INPME2, INPME3), concebido e patrocinado
pela AIP (Associação Industrial Portuguesa). Do total da população participante neste programa,
trinta e seis empresas, conseguiu-se obter a colaboração de vinte e seis delas, o que significa
que se estudou uma amostra de 72%.
6 ANÁLISE DE RESULTADOS 6.1 Estratégias implementadas
Relativamente às estratégias implementadas pelas empresas, salienta-se a de Penetração no
Mercado, apontada por 30,8% das empresas da amostra, seguida pelas estratégias de
Investimento e Desenvolvimento de Mercados (26,9%). A estratégia de Diferenciação é seguida
por apenas 15,4% da amostra considerada.
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Quadro 2: Estratégias Implementadas
Empresas que Implementaram a Estratégia
Designação
Numero %
Penetração no Mercado Investimento Desenvolvimento de Mercados Diferenciação
8 7 7 4
30,8 26,9 26,9 15,4
Total 26 100,0
6.2 Avaliação da performance financeira
De acordo com o objecto de estudo deste trabalho, avaliou-se o desempenho financeiro das
empresas através da utilização dos indicadores considerados de maior interesse para aquele:
Resultados Líquidos sobre as Vendas no Ano Posterior à Implementação da Estratégia e
Rendibilidade do Activo Total no Ano Posterior à Implementação da Estratégia. Saliente-se que
devido às empresas classificadas com os números 7, 9 e 22 apresentarem resultados bastante
dispares relativamente às restantes empresas da amostra, o que distorceria o conjunto dos
resultados obtidos, as mesmas foram retiradas do cálculo dos indicadores atrás mencionados.
O quadro a seguir apresentado mostra os resultados da análise da variância (ANOVA), das
variáveis utilizadas neste estudo.
Quadro 3: Resultados Obtidos da ANOVA
Variável F Significância
Resultados Líquidos sobre Vendas no Ano 1 Rendibilidade do Activo Total no Ano 1
3,104 2,635
0,051 (a) 0,079 (a)
(a) Significante a um nível de significância de 10%
Como se pode visualizar pelo gráfico a seguir apresentado, o indicador Resultados Líquidos sobre as Vendas registou, em termos médios, uma evolução mais significativa entre os anos
anterior e de implementação da estratégia, do que entre este e o ano seguinte. É de realçar a
evolução do referido indicador registada entre os Anos –1 e 0 na primeira versão do INPME,
como se pode constatar pelo Gráfico 2: Evolução dos Resultados Líquidos sobre as Vendas por
Versão INPME.
12
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0,0%
20,0%
40,0%
60,0%
80,0%
100,0%
120,0%
140,0%
160,0%
180,0%
200,0%
Valores
Entre os Anos -1 e 0 193,5% 20,2% 125,8%
Entre os Anos 0 e 1 7,6% 61,1% 15,1%
Entre os Anos -1 e 1 77,7% 39,2% 61,2%
INPME1 INPME2 INPME3
Gráfico 1: Evolução dos Resultados Líquidos sobre as Vendas
-0,040
-0,030
-0,020
-0,010
0,000
0,010
0,020
0,030
0,040
Ano -1 -0,032 0,026 0,013
Ano 0 0,025 0,025 0,022
Ano 1 0,022 0,031 0,023
INPME1 INPME2 INPME3
Gráfico 2: Evolução dos Resultados Líquidos sobre as Vendas por Versão INPME
Da aplicação da análise da variância, e tendo em atenção o Gráfico 3: Média dos Resultados
Líquidos sobre as Vendas no Ano 1
, a adopção da estratégia de Desenvolvimento de Mercados é aquela que conduz a melhores
níveis de desempenho neste indicador. Porém, do Quadro 4: Teste de Tukey HSD poder-se-á
referir que a um nível de significância de 10% não existem diferenças nos Resultados Líquidos
sobre as Vendas, quando são adoptadas as estratégias de investimento, penetração no mercado
ou diferenciação. Contudo, os resultados são estatisticamente diferentes quando se utiliza a
diferenciação ou desenvolvimento de mercado.
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Tipologia Estratégica
DiferenciaçãoDesenvolvimento de MPenetraçãoInvestimento
,07
,06
,05
,04
,03
,02
,01
Gráfico 3: Média dos Resultados Líquidos sobre as Vendas no Ano 1
Quadro 4: Teste de Tukey HSD – Resultados Líquidos sobre Vendas Ano 1
Subconjunto p/ Significância = 0,10 Tipologia Estratégica
Número de Empresas 1 2
Investimento Penetração no Mercado Diferenciação Desenvolvimento de Mercados
7 7 4 5
0,01571 (10)-2
0,01714 (10)-2
0,0225 (10)-2
0,0225 (10)-2
0,06400 (10)-2
A Rendibilidade do Activo Total, apresentou em termos médios valores quase nulos, sendo de
referir que no caso das empresas participantes no INPME1 este indicador atingiu valores
negativos na maioria daquelas. As participantes no INPME2 assistiram à evolução positiva
significativa deste rácio (0,001 e 0,100 nos Anos 0 e 1 respectivamente), enquanto as
participantes no INPME3 obtiveram um decréscimo do mesmo (0,016 e 0,005 nos Anos0 e1).
0,000
0,004
-0,0010,0000,0010,0010,0020,0020,0030,0030,0040,004
Ano 0 Ano 1
Gráfico 4: Evolução Média da Rendibilidade do Activo Total
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-0,020
-0,015
-0,010
-0,005
0,000
0,005
0,010
0,015
0,020
Ano 0 Ano 1
Ano 0 -0,015 0,001 0,016
Ano 1 -0,017 0,010 0,005
INPME1 INPME2 INPME3
Gráfico 0- I: Evolução da Rendibilidade do Activo Total por Versão INPME
Da observação do Gráfico 0:- Média da Rendibilidade do Activo Total no Ano 1 poder-se-ía
afirmar que a adopção da estratégia de Diferenciação seria a que conduz a resultados mais
satisfatórios do indicador em estudo, seguida pela estratégia de Desenvolvimento de Mercados.
Contudo, a análise do Quadro 5: Teste Tukey HSD conduz a afirmar-se que a um nível de
significância de 10% se poderá utilizar qualquer uma das estratégias, uma vez que não se pode
afirmar que elas sejam estatisticamente diferentes.
Tipologia Estratégica
DiferenciaçãoDesenvolvimento de MPenetraçãoInvestimento
4
3
2
1
0
-1
-2
-3
Gráfico 0:- Média da Rendibilidade do Activo Total no Ano 1
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Quadro 5: Teste Tukey HSD – Rendibilidade do Activo Total no Ano 1
Subconjunto p/ Significância = 0,10 Tipologia Estratégica
Número de Empresas 1
Penetração no Mercado Investimento Desenvolvimento de Mercados Diferenciação
7 7 5 4
-1,9743 -,1657 2,7160 3,4325
7 CONCLUSÕES
O estudo desenvolvido teve por objectivo averiguar se as empresas da Beira Interior,
nomeadamente do Distrito da Guarda, obtiveram performances financeiras semelhantes com a
adopção e implementação de algumas estratégias por si seleccionadas.
O indicador Resultados Líquidos sobre as Vendas registou, em termos médios, uma maior
evolução positiva entre os Anos –1 e 0, do que entre este e o Anos 1. É de salientar a evolução
positiva ocorrida entre os Anos –1 e 0 na primeira versão do INPME. A adopção de estratégias
alternativas pelas empresas conduziu a diferentes valores deste indicador, salientando-se
também aqui a estratégia de Desenvolvimento de Mercados.
A Rendibilidade do Activo Total, não obstante os baixos valores registados, apresentou melhores
resultados no Ano 1, tendência seguida pelas empresas do INPME2. O seguimento pelas
empresas de diferentes estratégias implicou a obtenção de diferentes resultados, com destaque
neste rácio para a estratégia de Diferenciação.
8 REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA ANSOFF, H.I. et al. “Does planning pay? the effect of planning on success of acquisitions in american firms”. In: Long Range Planning, v.3, n.2, p.2-7, 1970. ______. “Estratégia empresarial”. São Paulo: McGraw-Hill do Brasil, 1977. BREALEY, Richard A.; MYERS, Stewart C. “Princípios de finanças empresariais”, 5. ed. Amadora: McGraw-Hill, 1998. BURT, D.N. “Planning and performance in australian retailing”. In: Long Range Planning, v.11, n.3, p.62-66, 1978. BUZZELL, Robert D.; GALE, Bradley T. “O impacto das estratégias de mercado no resultado das empresas”. São Paulo: Pioneira, 1991. CHICKEN, John C.; HAYNS, Michael R. “Strategy and priority”. London: Business Press – Thomson Learning, 1999.
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica,
vol. 01, jan. / jun. 2007 ISSN 0000-0000 - v. eletrônica
O RECONHECIMENTO DA DISCIPLINA DO TURISMO NO INÍCIO DO TERCEIRO MILÉNIO
Manuel Salgado Doutorando do Instituto de Financiamento e Apoio ao Turismo Instituto Politécnico da Guarda Escola Superior de Turismo e Telecomunicações de Seia
RESUMO
O artigo aborda três questões essenciais para a compreensão da natureza académica/científica
do turismo: a sua imaturidade como área académica de estudo; a indefinição e imprecisão
filosófica e metodológica; e a sua definição como objecto de estudo – ainda o consideram como
área de estudo, aplicada, ou disciplina.
PALAVRAS CHAVE: Educação superior em Turismo; estatuto académico/científico; área de estudo ou disciplina.
1 INTRODUÇÃO Este artigo apresenta a discussão do estatuto académico alcançado pelo turismo, num momento
em que a humanidade começa a aperceber-se que, de facto, já está no terceiro milénio. A
conhecida atracção exercida pelos números redondos, focalizada simbolicamente no ano 2000,
permitiu a extrapolação de previsões acerca da realidade do turismo, após a entrada neste
milénio, o III DC. A Organização Mundial de Turismo e outras organizações congéneres
reconhecem, hoje, a indústria do turismo como sendo a mais importante do ano 2000, a nível
mundial, em termos de receitas geradas e empregos criados. Assim, parte-se do pressuposto de
existência do paralelismo entre o carácter disciplinar/académico do turismo e o crescente
reconhecimento da importância da indústria do turismo, a nível global.
Pretende-se contribuir para o esclarecimento da crescente maturidade do turismo.
Tradicionalmente, ele tem sido investigado e ensinado nas disciplinas tradicionais, como a
Economia, a Sociologia, a Geografia, e outras ciências sociais, que o usam sistematicamente
como uma área de estudo aplicada, o que lhes permitiu enriquecer o seu conteúdo, pelo uso de
um exemplo prático actual e interessante, na perspectiva de educadores e educandos. Nos
1
Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
nossos dias, verifica-se o crescente reconhecimento e utilização do turismo, como objecto de
estudo académico de direito próprio, quer em algumas universidades, quer na generalidade dos
institutos politécnicos portugueses.
Citando Cunha (2001; 127) “o desenvolvimento do sistema educativo e científico no domínio do
turismo, com vista ao seu melhor conhecimento, impõe-se por várias razões: (i) a carência do
estudo sistémico do turismo respeita, sobretudo ao seu estudo global e não só limitado aos
aspectos económicos; (ii) a carência do estudo do turismo liga-se também à inexistência da
formulação de uma teoria própria; (iii) a inexistência desta formulação causa graves
desequilíbrios de formação a todos os níveis, especialmente a nível superior; (iv) a teoria e a
formação devem estar estreitamente ligadas à pesquisa de base científica aplicada; (v) estas
carências são origem da adopção de políticas impróprias, erradas e, por vezes, negativas para o
desenvolvimento do turismo”.
Ao abordar o carácter multidisciplinar do turismo ele refere que “apesar do aprofundamento dos
estudos relativos ao turismo levados a cabo nos últimos anos, da investigação científica a que
tem dado lugar e de se reconhecer que o seu conhecimento, como fenómeno de múltiplas
implicações, exige um vasto conhecimento de saberes com características e âmbito específicos,
mas, não há ainda opinião unânime a considerá-lo ou não como uma disciplina”(ibidem).
2 A IMATURIDADE DO TURISMO COMO ÁREA ACADÉMICA DE ESTUDO
A imaturidade do turismo como área académica de estudo é uma das características que muitos
autores lhe atribuem. Na análise evolutiva do processo educativo em turismo, é atribuída a
primazia do processo de educação e formação à hotelaria, com início no final do séc. XIX. Com
o surgimento de um nova concepção, a actual, considera-se que a hotelaria pertence a um
sector (indústria) mais abrangente - o do turismo. Esta perspectiva holística induziu à
constituição do processo educativo e formativo em turismo, de uma forma muito heterogénea,
através de diferentes abordagens disciplinares, sobretudo a partir da segunda metade do séc.
XX. Até aos nossos dias, estas duas áreas científicas percorreram trajectos interdependentes.
No entanto, a gestão hoteleira apresenta-se como uma área académica mais madura, fruto de
um processo evolutivo mais longo e com uma definição mais precisa do seu objecto de estudo -
a hotelaria – é um importante sector da indústria turística. O turismo apresenta-se numa fase de
lenta maturação. Possui um objecto de estudo mais complexo e, baseado numa indústria global
muito fragmentada, procura afirmar decisivamente o seu objecto e o seu método, para impor a
sua independência académica. Para se obter a unificação necessária do turismo, é fundamental
perceber-se que, actualmente, a hotelaria é um dos sectores do turismo e, como tal, a gestão
2
Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
hoteleira deve constituir uma área da educação em turismo. Neste sentido, e como defende
Jafari (1997; 179), a gestão hoteleira deve ser considerada como sendo um “órgão” importante
do turismo, mas que necessita de um conhecimento holístico inicial do sistema turismo e, ainda,
da forma como depende e se interliga com os outros “órgãos” do sistema. Jafari utiliza a
seguinte analogia: “o corpo humano é um sistema total, composto de vários órgãos vitais que,
individual e colectivamente, asseguram a sobrevivência do sistema corporal ...”(ibidem), para
justificar a integração de uma estrutura e função coerentes do turismo.
Airey (1988) descreve a dificuldade de estabelecer, com exactidão, o nascimento da educação
em turismo e refere a existência de diversos grupos que opinam diferentemente sobre a sua
concepção. A sua origem pode estar relacionada com os primeiros cursos de chefes e
empregados de mesa, no inicio do século XX; mas há quem afirme que a educação, em turismo,
só surge na década de 50, com a formação de agentes de viagens, em processamento de
bilhetes. Na década de 60 surgem aqueles que o consideram como sendo um domínio em
separado, para consideração nos cursos de gestão hoteleira. Por outro lado, os geógrafos e os
economistas afirmam que os seus estudos sempre incluíram a temática do turismo, emergindo
assim o turismo como objecto válido para análise académica. Cooper et al. (1994; 46) reforçam
esta idéia, ao afirmar que os geógrafos têm tido em conta, o turismo, nos seus cursos e na
investigação, desde a década de 20.
Para Cooper et al. (1996; 32), o início da educação em turismo pode ser atribuído à abertura da
Escola Hoteleira de Lausanne em 1893. De igual modo, para Jonhson (1998; 74), a “L’Ecole
Hôtelière de Lausanne” iniciou as suas operações em 15 de Outubro de 1893, sendo os seus
graduados, ainda hoje, reconhecidos internacionalmente pelas suas qualidades profissionais e
pessoais. Baum (1998; 463) afirma também que, a educação em hotelaria no Reino Unido, aos
níveis técnico e de gestão, possui uma história que remonta a cem anos. Salienta ainda que esta
formação se iniciou, principalmente, para fornecer qualificações técnicas, evoluindo
posteriormente para estudos a nível de supervisão e gestão, até alcançar a pós-graduação. Para
Bonneau (in AIEST, 1990; 59), a organização do ensino superior em turismo e hotelaria constitui
uma aventura, relativamente recente, no mundo. A Universidade de Cornell, em 1922, a pedido
da Associação Americana de Hotéis, fez a primeira realização nesta área. Este movimento
generalizou-se a muitas universidades americanas, exemplo seguido, algum tempo depois, pelas
universidades européias.
Graburn et al. (1991; 2) afirmam que, no inicio do séc. XX, as ciências sociais se fragmentaram e
o estudo do turismo, ele próprio “um fenómeno totalmente social”, tornou-se mais difícil. Muitos
estudos separados analisaram aspectos específicos do turismo, como os impactos económicos,
os movimentos espaciais ou as motivações psicológicas, entre outras. Apenas os geógrafos e,
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
por vezes, os antropólogos, procuraram manter uma perspectiva holística do turismo. As
contribuições das várias disciplinas para o objecto do turismo iniciaram-se após os anos 30. Os
estudos de lazer e recreio abordavam a natureza histórica e ideológica do lazer. Os geógrafos
produziam trabalhos sérios, mas apenas descritivos. Após a Segunda Guerra Mundial, a maioria
da investigação em turismo funcionava como instrumento para o desenvolvimento,
principalmente nas nações coloniais. A pesquisa foi entregue a planeadores e economistas,
muitos dos quais trabalhavam para organizações como as NU, a OCDE, etc. Na década de 60,
os benefícios do turismo eram, já, inquestionáveis. A investigação concluía que o turismo era
uma indústria de trabalho intensivo em crescimento, beneficiando os países do terceiro mundo e
os países-metrópole. O turismo era sinónimo de desenvolvimento. Esta filosofia proclamava que
o turismo gerava divisas para os países, empregando mais pessoas; e que as despesas
turísticas tinham um grande efeito multiplicador, estimulando a economia local e aumentando o
nível de vida da população residente. Até agora, o turismo emergiu apenas como uma aplicação
de outras áreas de investigação ditas mais sérias. Raramente o turismo foi ensinado como um
“objecto de interesse próprio” e os dados estatísticos não eram recolhidos sistematicamente. A
maturidade do turismo foi assumida como tema de investigação quando os investigadores
abordaram especificamente o seu estudo, emergindo como objecto de discussão e envolvimento
académico, nos anos 70. A maturação que vimos referindo, foi também assinalada pela criação
de jornais de investigação: uns, de natureza multidisciplinar; outros, combinando a investigação
académica com a aplicada.
Cooper et al. (1992; 236) afirmam que, historicamente, o desenvolvimento da formação e
educação em turismo, na Inglaterra, tem sido dominado pelas suas orientações técnicas; mas,
apesar de os recursos humanos e as estruturas institucionais reflectirem estas influências, novas
tendências estão a emergir. Em particular, os cursos de turismo com uma base disciplinar, os
estudos de negócios que se desenvolveram nos anos 80 e constituem, actualmente, os
principais tipos de cursos. Recentemente surgiram programas de cursos de turismo e de
viagens, cujos primeiros graduados sairão para o mercado de trabalho nos anos 90. Os mesmos
autores (1996; 35) descrevem que a década de 80 e 90 assistiram a rápida expansão da
educação em turismo, nos países onde este constitui uma importante indústria, nomeadamente
ao nível do ensino superior.
Richards (1995; 5) afirma que os cursos de turismo se desenvolveram como uma ramificação da
hotelaria e catering, sendo abordados, principalmente, em estudos de gestão e negócios. Por
sua vez, os cursos de lazer desenvolveram-se a partir de uma perspectiva sociológica e política.
Estes factos, segundo o autor, reflectem a diferença básica existente entre turismo e lazer, como
áreas de produção social (turismo) e de consumo social (lazer). Hoje esta diferenciação tende a
4
Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
desaparecer, porque o lazer começa a ser visto como uma fonte de rendimento e de emprego,
sendo abordado, também, segundo uma perspectiva de produção.
Cooper et al. (1994; 58) descrevem o turismo como sendo uma área de estudo relativamente
nova, apresentando, nas estimativas mais liberais, um máximo de 50 anos. Neste sentido, ainda
não constitui uma área bem estabelecida para estudo académico, pois falta-lhe a história, a base
teórica e um processo de evolução, que são características essenciais de maturação das áreas
disciplinares. Sem o estabelecimento de uma base teórica sólida, sobre a qual o turismo possa
crescer e desenvolver-se, ele continuará a ser objecto de uma abordagem fragmentada que se
reflecte, também, na educação em turismo. Para estes autores, o ensino do turismo pode estar
em perigo de desintegração, e os diferentes elementos que compõem o seu currículo “podem
retroceder para as suas disciplinas antecessoras”. Pearce (in Pearce et al., 1993; 1) afirma que
os estudos pioneiros acerca do turismo remontam à década de 30, mas volta a dizer que só nos
finais da década de 60, começou a emergir um corpo substancial de literatura sobre esta
matéria; no entanto, esta literatura é entendida como fragmentada e sem uma direcção precisa.
A fragmentação do corpo do conhecimento do turismo é uma realidade, que resulta do facto de
ter sido estudado e usado, sistematicamente, por diversas disciplinas tradicionais, como o já
referido. Como actividade económica, Rebollo (1995; 12) afirma que o fenómeno turístico é
relativamente recente e não se deve estranhar que, perante especialidades tradicionalmente
cultivadas (como a agricultura e a indústria), os desenvolvimentos científicos sejam escassos e
isolados, e existam notáveis confusões conceptuais e metodológicas, em torno do conhecimento
científico do turismo.
Ritchie (1988; 2) acredita que o estudo do turismo, tanto na perspectiva escolar como na
aplicada, não precisa procurar a sua legitimação. A necessidade de educação de qualidade,
nesta área, é enorme; e as instituições de qualidade estão a responder agora, de forma
vigorosa, a essa necessidade. Riegel (1991; 6) afirma que a educação em turismo e hotelaria,
está ainda num processo de maturação, enquanto áreas académicas. No entanto, o futuro
parece conter uma promessa brilhante, para estas áreas, visando o aumento da sua
profissionalização. Acredita, contudo, que o turismo será, provavelmente, sempre marcado pela
diversidade, nas suas abordagens educacionais e programáticas.
Cooper et al. (1996; 51) ao reflectirem sobre os problemas associados à educação em turismo,
descrevem que estes são típicos da “crise da meia idade”: não sendo, já, uma área inexperiente,
também não alcançou a maturidade da meia idade. O estudo do turismo e da educação em
turismo assumem, perante esta realidade, um papel fundamental para assegurar que estes
objectos académicos, se desenvolvem da forma apropriada, ordenada e estruturada.
5
Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
3 A INDEFINIÇÃO E IMPRECISÃO FILOSÓFICA E METODOLÓGICA DO TURISMO
A filosofia de ciência definida por Kuhn (1970), em “The Structure of Scientific Revolutions”, faz
acreditar que os estudos do turismo parecem enquadrar-se numa “pré ciência”, ou numa fase
“pré paradigmática”. De acordo com o mesmo autor, uma ciência pré paradigmática é
“caracterizada pelo total desacordo e constante debate acerca dos princípios, e haverá tantas
teorias quantos forem os estudiosos na área, em que todo o teórico será obrigado a começar de
novo e a justificar a sua abordagem particular” (citado em Chalmers, 1982; 92).
Para a OMT (1995; 22), verifica-se a falta de uma definição operativa, que agregue a actividade
turística, para efectivar o seu estudo; e a conceptualização e avaliação da magnitude dos índices
turísticos mais importantes na produção, no investimento e no consumo. A heterogeneidade das
actividades turísticas dificulta uma definição uniforme, como se verifica nos diferentes
enquadramentos do turismo em diferentes ministérios, consoante os países considerados.
O principal problema que impede o desenvolvimento teórico do turismo, parece ser causado por
uma imprópria abordagem filosófica e metodológica dominante, segundo Bernstein (citado em
Echtner et al., 1997; 877). A evolução dos estudos de turismo, parece possuir a mesma fobia
que domina todas as ciências sociais, nomeadamente a necessidade de se tornarem mais
científicas, aproximando-se dos métodos tradicionais positivistas. As ciências sociais são, ainda,
julgadas como primitivas e subdesenvolvidas ou, como sugere Kuhn, pré paradigmáticas. No
entanto Bernstein contrapõe, afirmando que “os níveis específicos do racional que podem ser
apropriados para a actividade científica, não são necessariamente relevantes para a
compreensão normalizada ... em formas e de natureza diversa do conhecimento” (citado em
Echtner et al., 1997; 877).
A forma não crítica como a investigação em turismo têm sido realizada, levanta, segundo Pearce
(Pearce et al., 1993; 1), a questão de saber interpretar os resultados. Isto, porque os
investigadores têm adoptado os conceitos e as técnicas das suas disciplinas e aplicam-nas, sem
qualquer modificação racional, aos problemas do turismo, aumentando o debate acerca das
questões teóricas e metodológicas, na respectiva literatura.
O turismo constitui uma área de estudo de características únicas, no contexto académico. Estas
características, herdadas do objecto de estudo, são: a imaturidade; a complexidade do
fenómeno e da indústria; a interdisciplinaridade; a diversidade da indústria do turismo; a
importância crescente do turismo nos contextos social e económico, ao nível mundial; etc. Estas
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
características, que alguns autores teimam em associar ao turismo, têm de ser integradas de
forma a constituir uma perspectiva holística unificadora.
A utilização do termo turismo deve ser precisa, nomeadamente quando se refere o objecto do
seu estudo. As duas correntes de idéias estão expostas, de acordo com a opinião dos autores,
que as defendem. Por exemplo, Leiper (2000; 805-809) e Tribe (2000; 809-813), trocam
argumentos em defesa das suas opiniões opostas, na tentativa de justificar a existência ou não,
de um estatuto disciplinar do turismo. Leiper (2000; 807) faz questão de lembrar que o debate
acerca da disciplina dos estudos do turismo, é similar ao debate sobre a indústria do turismo; e
afirma que a evidência empírica em conjunto com a análise teórica, induz à conclusão de que as
indústrias específicas do turismo certamente existem e “compreendem um conjunto de negócios
e estratégias, das distintas necessidades de serviço aos turistas, operando em cooperação”
(Leiper, 1995; 121-138). Contrapondo esta perspectiva, Tribe escreve dois artigos provocadores:
“The Indiscipline of Tourism” (1997) e “Indisciplined and Unsubstantiated” (2000). Este último, em
resposta ao artigo de Leiper: “An Emerging Discipline” (2000). Mas, já Leiper afirmara, que as
disciplinas manifestam diferentes atributos em cada uma das suas fases, até à sua afirmação
categórica. Perante este processo, uma disciplina é “no seu íntimo, um corpo de conhecimento
que é organizado em certa extensão, idealmente, de forma sistemática, para ajudar no ensino,
na aprendizagem e na investigação” (1981).
4 DEFINIÇÃO DO TURISMO COMO DISCIPLINA OU ÁREA DE ESTUDO APLICADA
Cunha (2001; 127) refere que Goeldner e Leiper não têm dúvida que os estudos turísticos
constituem uma disciplina, mas segundo Gunn e Hoerner é uma ciência, e Tribe afirma tratar-se
um domínio de conhecimento multidisciplinar. Leiper sugere a utilização do termo turologia para
designar a disciplina que, no seu entendimento, é o desejável para os estudos científicos do
turismo. Por sua vez, Sessa (1984) utilizou o termo turismologia como um dos domínios de
aplicação da ciência dos sistemas ao turismo e Jovicic, argumentando que o estudo do turismo,
como um fenómeno complexo, não pode ser adequadamente efectuado por qualquer disciplina
existente, propõe a adopção do mesmo termo, tal como Hoerner (2000), para quem a ciência
turística estudará tudo quanto se liga à viagem. Contudo, nem um nem o outro dos termos
propostos tiveram a suficiente receptividade para serem utilizados universalmente continuando a
não serem reconhecidos pela comunidade científica do turismo.
De acordo com Tribe, epistemologicamente, o turismo não é uma disciplina mas antes um
domínio de conhecimentos que se socorre de um certo número de disciplinas para investigar e
explicar as suas áreas de interesse. Como o turismo abarca muitos aspectos do homem e da
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sociedade, o seu conhecimento tem um carácter multidisciplinar. Por exemplo, dado que as
pessoas se comportam de modos diferentes e viajam por diferentes razões é necessário o
estudo da Psicologia para determinar a melhor maneira de organizar e promover os produtos
turísticos. Da mesma maneira, o turismo ao transformar-se numa poderosa e gigantesca
actividade económica que afecta a vida de cada vez maior número de pessoas, atrai a atenção
dos órgãos legislativos que têm de criar, aplicar e interpretar leis e regulamentos, implicando o
conhecimento dos mecanismos económicos e das leis.
Jafari construiu, em 1981, um modelo de estudos do turismo que ilustra a natureza
multidisciplinar do turismo: de acordo com este modelo trata-se de uma ciência em
desenvolvimento para a qual converge a maior parte das ciências sociais. ou seja, o
conhecimento do turismo, como fenómeno com múltiplas incidências e influências, implica o
contributo de variados ramos do saber que tendem a alargar-se à medida que aumenta a sua
complexidade e se diversificam as motivações que conduzem à decisão das viagens e se
ampliam as necessidades turísticas.
Buergermeister et al. (1992; 139) descrevem o turismo como um fenómeno antigo. Apesar de as
suas contribuições económicas terem sido reconhecidas há algumas décadas, só em anos
recentes foi abordado como um objecto académico, tanto para a área da investigação como para
a formação e educação efectiva em universidades, em todo o mundo. Foi devido a esforços
cumulativos de associações e organizações, e a publicação de jornais temáticos associados à
magnitude sócio-económica do turismo, que este objecto proliferou em universidades pelo
mundo afora, num período de tempo relativamente pequeno. Echtner et al. (1997; 868) afirmam
que o turismo é um fenómeno complexo, abordado por muitas disciplinas, em que os
investigadores tendem a abordar os estudos de turismo, nas fronteiras específicas das
disciplinas da sua formação de base. Traduzindo-se, assim, numa teoria de turismo fragmentada
e fraca. Os académicos estão divididos na consideração do turismo, como uma disciplina
distinta, ou como uma área de especialização, entre disciplinas já existentes (idem; 869).
Neste sentido, as acepções principais que caracterizam o objecto de estudo do turismo são
duas: uma, mais prática e menos polémica, considera o turismo como uma área de estudo
aplicada, interessante para envolvimento académico; e outra, que vem considerando,
progressivamente, a autonomia do turismo como uma disciplina de pleno direito. Estas duas
correntes de ideias serão expostas, respectivamente, de acordo com a opinião dos vários
autores que as defendem. Antes de justificar esta dualidade, é importante entender que uma
disciplina obedece a um conjunto de características ou pré-requisitos.
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Segundo Cooper et al. (1996; 13) uma disciplina tem um corpo de teoria estabelecido, que foi
“alimentado” e ampliado através da investigação e debate, justificando o seu currículo; é um
ramo, formalmente reconhecido, de uma instituição que a legitima e valida. Tem um estatuto,
uma credibilidade e envolve uma formação de conhecimento mental, tanto da parte do educador
como do estudante. Muitos autores acreditam que, uma área de estudo, se constitui a partir de
uma fase, que induzirá à maturidade do objecto de estudo, até se transformar numa disciplina.
Uma área de estudo possui uma abordagem mais descritiva: está menos estabelecida e,
normalmente, é um assunto aplicado a um tópico; e existe pouca interligação na investigação
que possa justificar o currículo. O turismo como área de estudo constitui, segundo os mesmos
autores (1994; 62), uma temática interessante, excitante e dinâmica. No entanto, não constitui
um objecto fácil de estudar, pois “é difícil de ensinar e difícil de aprender”. Para lidar com a
educação em turismo, com eficiência, o objecto precisa de simplificação, mas sem que esta faça
perder a informação fundamental, para a sua interpretação correcta e integral. Neste sentido,
desenvolver um esquema de suporte ao desenvolvimento da educação em turismo, constitui
uma tarefa difícil; mas, pela sua importância e actualidade, é reflectida neste artigo.
León (1983; 129) refere que a hierarquização implícita ou explícita das matérias ensinadas,
visando descompartimentar as disciplinas ou organizar um ensino interdisciplinar, está associada
à ideia de existência de disciplinas maiores e disciplinas menores. A necessidade de
estruturação é apresentada pelo desejo dos homens das ciências “de elaborar um sistema
coerente e hierarquizado dos conhecimentos a ensinar ou difundir segundo uma ordem lógica”.
Para compreender melhor a natureza do estatuto de uma disciplina escolar, é necessário
designar “um complexo de relações; e há que analisá-las de um triplo ponto de vista: científico,
pedagógico e social”. León (1983; 141) afirma que o grau de aproximação da estrutura da nova
disciplina, às ciências de que procede, lhe confere o estatuto de disciplina. O objecto técnico é
assim percebido, ora no seu estatuto de “menoridade” (objecto de uso), ora no seu estatuto de
“maioridade” (através de um suporte de conhecimento racional) em relação ao seu “ângulo”
científico, pedagógico e social.
A perspectiva mais tradicionalista, que interpreta o turismo como área de estudo aplicada, é
defendida por Tribe (1997; 622), ao afirmar que os estudos do turismo não podem ser vistos
como uma disciplina. Primeiro, os estudos do turismo podem exibir diversos conceitos, que
incluem: o destino, o multiplicador turístico, os impactos turísticos, a motivação turística, etc. Mas
estes conceitos não são exclusivos do turismo. Nasceram em outro lado, sendo adaptados para
darem uma dimensão ao turismo. O segundo argumento, afirma que o turismo não forma uma
rede distinta. Tende a separar-se, necessitando de ser compreendido na estrutura lógica de uma
disciplina específica. A sua única ligação é o objecto dos seus estudos, que é o turismo.
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Portanto, não constitui um esquema teórico consistente. O terceiro define que os estudos
turísticos não têm expressões testáveis, contra a experiência de critérios, de uso particular, dos
estudos turísticos. Estes não possuem critérios seus; utilizam os encontrados nas disciplinas que
contribuíram para a sua criação. Apesar da sua opinião, afirma que o estatuto disciplinar
providenciaria as ferramentas necessárias e um esquema, que promovam o conhecimento do
turismo (idem; 621). Lawson (1974; 6) também defende que o turismo é mais uma área de
estudo aplicada do que uma disciplina, questionando-se, no entanto, sobre os conteúdos que
estes cursos de turismo aplicados devem incluir. Os cursos de turismo, na Europa, operam de
forma isolada. No entanto, são muitas vezes similares, verificando-se um elevado grau de
suspeição nas suas relações, ou até mesmo de rivalidade.
Entretanto, o reconhecimento progressivo de que o turismo está a tornar-se numa disciplina, é
defendido por diversos estudiosos. Goeldner (1988) refere o turismo como uma disciplina no seu
estádio inicial de afirmação, ou seja, o “turismo ainda está a emergir como disciplina”. Salienta o
facto de, no passado recente, o turismo ter servido simplesmente para enriquecer e servir de
exemplo a outras disciplinas, de modo particular a Economia e a Geografia. O maior desafio que
o turismo encara é o de se libertar dos preconceitos e das amarras do passado, por ter sido
usado, sistematicamente, como exemplo prático, por parte das disciplinas mais maduras. O
desenvolvimento da estrutura teórica, necessária na afirmação do turismo, como uma disciplina
de pleno direito, foi dificultado pelo facto de, no passado, o turismo ter sido visto como inferior,
pelas outras disciplinas do espectro académico.
Numa atitude já claramente definida, Jovicic (1988; 2) defende o estabelecimento da
tourismology, como uma ciência distinta de turismo. Argumenta que o estudo do turismo, como
fenómeno complexo, não pode ser adequadamente feito por qualquer disciplina existente.
Sugere ainda que as disciplinas que têm estudado o turismo “falham em abarcar a noção do
todo, na tentativa de explicar a natureza do turismo, através dos seus aspectos individuais”.
Jovicic afirma que a observação dos elementos, independentemente do todo, resultará em erros
da definição de turismo, como fenómeno apenas económico, geográfico, ou sociológico. De
acordo com Jovicic, apenas o surgimento de uma disciplina distinta, como a tourismology,
poderia permitir o desenvolvimento de uma teoria integrada de turismo. Ela facilitaria o
surgimento de estudos especializados que ocorrem nas diversas disciplinas, o que permitiria ao
turismo ser analisado como um fenómeno composto. O autor acredita que, no futuro próximo, se
possa estabelecer a tourismology como disciplina de pleno direito e de reconhecimento
adquirido.
Echtner et al. (1997; 871) acreditam que o debate acerca do desenvolvimento disciplinar do
turismo está prestes a ser resolvido num futuro próximo, contribuindo para a evolução dos
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
estudos do turismo como uma disciplina distinta; encara, no entanto, significativos desafios.
Neste sentido, apresentam algumas dimensões “chave” para a evolução do turismo (idem; 879).
Visa o aumento da sua credibilidade como área de estudo académico e a inclusão de um
estatuto disciplinar: investigação holística e integrada; a geração de um corpo de conhecimento
teórico; uma certa ênfase interdisciplinar; a teoria e metodologia claramente explicada; e a
aplicação de métodos quantitativos e qualitativos, de acordo com a tradição positivista e não
positivista. Uma disciplina distinta de turismo encorajaria o desenvolvimento integrado e uma
teoria holística de turismo, constituindo uma meta louvável para os investigadores, apesar de
ainda subsistirem graves problemas práticos. Por exemplo: onde é que essa disciplina será
enquadrada? Visto que muitas disciplinas que estudam o turismo, pertencem às ciências sociais
(Sociologia, Economia, Psicologia, Geografia), deverá a disciplina do turismo ser instalada numa
faculdade de ciências sociais? Porém, algumas considerações políticas podem contestar este
enquadramento, pelo facto de muitos investigadores estudarem o turismo sob o prisma da
indústria, como administração de negócios, de marketing, do estudo da hotelaria, etc.
Richards (1998; 3) afirma que, em resultado do projecto SOCRATES, a ATLAS procura
contribuir positivamente para o desenvolvimento do currículo em turismo e lazer ao nível
europeu. A ATLAS considera ser importante estabelecer o turismo como uma discreta área
académica na educação européia, em vez de ser um apêndice de outras disciplinas, como
aconteceu no passado. Ao mesmo tempo, é importante construir “pontes” com outras disciplinas,
e não isolar o turismo, dos desenvolvimentos em outras áreas. No contexto da ATLAS, é
particularmente importante tentar ligar o turismo e os estudos do lazer, como disciplinas, pois
trabalhos recentes têm descrito uma importante contribuição, que a teoria do lazer pode
adicionar ao estudo do turismo.
Neste artigo discute-se, essencialmente, o estatuto disciplinar do turismo. No entanto, muitos
autores também debatem o estatuto disciplinar de áreas conexas, que aqui se assumem como
parte integral do sistema turismo, como é o caso da hotelaria e do lazer. A discussão acerca da
disciplina da Hotelaria, segundo Baum (1998; 463), gera ainda um considerável debate em
ordem à sua legitimidade e às suas fronteiras. Esta discussão é pertinente no contexto da
hotelaria, devido à influência das suas tradições, práticas e desenvolvimentos nas ciências
naturais e sociais, nomeadamente, pelas investigações pós graduadas realizadas nesta área de
aplicação, por disciplinas mais maduras. Richards defende os estudos do lazer, igualmente
segundo uma perspectiva de disciplina autónoma.
Com a transformação do turismo num fenómeno de massas, que abrange todas as populações
de todas as raças, credos, níveis de educação e estratos económicos, alargaram-se as
necessidades decorrentes das viagens e da oferta turística passando a abranger áreas novas e
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cada vez mais diversificadas. Em consequência, o conhecimento do turismo passou a implicar o
recurso a novos ramos do saber que, contudo, passaram a permitir identificar a verdadeira
natureza do turismo como ciência, ou corpo de conhecimento com identidade própria.
5 CONCLUSÃO
O turismo constitui um fenómeno, que afecta a vida de todos os cidadãos do mundo. A
necessidade de educar o homem para bem gerir o tempo de lazer é cada vez maior, dada a
importância que o lazer e o turismo atingem, nas esferas da existência humana, no milénio que
começa. A indústria do turismo (leia-se, também, indústria da “hospitalidade” e indústria do
lazer), possibilita a realização da experiência turística e a satisfação das necessidades que os
turistas acumulam na sua estada no “ambiente usual” (entenda-se local de trabalho e de
residência). A “Calgary Declaration on Tourism Hospitality Education” (Buergermeister et al.,
1992; 140), deliberou que se aumente o reconhecimento do turismo e da hotelaria, como
fenómenos sócio-económicos e áreas de estudo académico; e encorajou a abordagem
multidisciplinar da educação em turismo e hotelaria. Da interpretação das correntes de opinião
expostas, há uma que afirma e justifica o turismo como área de estudo aplicada a outras
disciplinas, e outra que o defende como disciplina autónoma; pode-se concluir que os
argumentos apresentados pelas duas correntes são defensáveis. Contudo, o progresso científico
e as constantes mudanças de atitude sobre as relações entre a ciência e a sociedade, explicam
a evolução social, científica e pedagógica, de cada disciplina. Por um lado, temos que
compreender a sua hierarquização, ou seja, a estrutura do seu corpo de conhecimento; por
outro, entender os métodos de ensino próprios de cada disciplina. A utilização de um esquema
conceptual, pressupõe que se tenha esboçado a história própria de cada disciplina porque,
actualmente, coexistem ou sobrepõem-se representações relacionadas com as diversas funções
que a disciplina teve, no decurso da História.
A “meia idade” da educação, em turismo, fruto de um processo de evolução iniciado há,
aproximadamente, um século, permite-lhe a maturidade suficiente, aos níveis social, científico e
pedagógico, para que o Turismo se afirme como uma disciplina. O seu reconhecimento social e
económico crescentes, (dado que o turismo é um fenómeno indissociável, que caracteriza a
sociedade moderna, e a indústria turística está prestes a tornar-se a mais importante, ao nível
mundial), a maturidade científica (fruto do esforço de investigação e de um corpo de
conhecimentos cumulativos crescente) e o nível pedagógico (alcançado através do ensino em
instituições que constróem e validam, cada vez mais, os seus complexos processos de ensino-
aprendizagem), segundo León, permite validar e classificar o Turismo como uma disciplina.
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Se os mais leigos interpretam apenas, e de forma restrita, o turismo como sendo uma grande
indústria, os profissionais do turismo compreendem o papel estratégico da educação e formação,
com vista à sua qualificação. Mas, para que essa qualificação seja valorizada e amplamente
reconhecida, torna-se fundamental estabelecer o Turismo como uma disciplina autónoma. A
disciplina do Turismo permitirá assegurar o controle da qualidade do conhecimento, efectivar o
processo de educação e formação em turismo, e os académicos do Turismo terão o seu lugar
equiparado aos seus colegas de outras disciplinas. Já entrados no Terceiro Milénio, os
processos científicos e as mudanças de atitudes perante o Turismo, devem permitir-lhe,
inequivocamente, que assuma a sua condição de disciplina, por direito próprio. Este pressuposto
não invalida a corrente de opinião segundo a qual o Turismo pode ser, também, uma área
interessante para as disciplinas tradicionais estudarem e enriquecerem os seus conteúdos. Não
podemos esquecer-nos que o turismo possui uma natureza interdisciplinar.
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica,
vol. 01, jan. / jun. 2007 ISSN 0000-0000 - v. eletrônica
PESQUISA QUALITATIVA EM SISTEMAS DE INFORMAÇÃO: UM ESTUDO INTRODUTÓRIO DE SUAS POSSIBILIDADES
André Felipe de Albuquerque Fell Mestrando em Administração – PROPAD / UFPE. Especialista em Engenharia da Qualidade – UFPE. Assuero Fonseca Ximenes Mestrando em Administração – PROPAD / UFPE. Especialista em Gestão da Tecnologia de Informação – FCAP / UPE.
José Orlando Costa Nunes Mestrando em Administração – PROPAD / UFPE. Especialista em Hotelaria – UFBA.
RESUMO
O objetivo do presente trabalho consistiu em apresentar alguns aspectos conceituais da
metodologia de pesquisa qualitativa em sistemas de informação, bem como suas possibilidades
para este campo de estudo. Uma tentativa foi feita no sentido de expor a natureza dos estudos
qualitativos, historicamente presentes nas investigações de natureza social; e que apenas
recentemente, vem sendo vistos como alternativas para o estudo de S.I. nas organizações. A
questão que se coloca é que a predominância do paradigma positivista em pesquisas na área de
S.I., com suas inferências estatísticas (eminentemente reducionistas), empobrecem a
compreensão dos fenômenos sociais e culturais estudados nesse campo. Propõe-se que novos
enfoques, mais qualitativos, devam ser dados às pesquisas de S.I. no esforço de compreensão
da pluralidade do mundo social.
PALAVRAS CHAVE: Administração da informação; pesquisa qualitativa; sistemas de informação.
ABSTRACT
The main purpose of this paper is to introduce a few conceptual aspects of qualitative
methodology in Information Systems (I.S.) and its possibilities to I.S. research. Historically,
qualitative methodology has been used on investigations of social nature and only recently has it
been considered as a possible methodology to I.S. studies in organizations. A relevant matter to
the subject is that the predominance of positivist paradigm on I.S. researches, with its statistical
1
inferences (mostly reducionists), contribute to poor comprehension of social and cultural
phenomenos within this field of study. New qualitative perspectives are proposed to I.S.
researches in order to allow understanding of social plurality.
KEY WORDS: Information administration; qualitative research; information systems.
1 INTRODUÇÃO
Assim como o conceito de administração, a tentativa de conceituar Sistema de
Informação (S.I.) pode se tornar um esforço complexo, senão infrutífero, por ser um campo de
estudo altamente fragmentado; preocupando-se com questões como desenvolvimento, uso e
implicações das tecnologias de informação e comunicação nas organizações. Todavia, um
estereótipo há muito institucionalizado sobre S.I. parece ser o de um sistema altamente técnico,
cuja ênfase de suas suposições filosóficas é no empirismo lógico ou a epistemologia positivista.
Em outros termos, o enfoque teórico é considerar a tecnologia como “hardware”: algo que
modela a sociedade, mas não é reciprocamente modelado por ela. Daí Klein (1985) apontar as
seguintes anomalias paradigmáticas para os sistemas de informação:
- A construção de sistemas de informação como um artefato técnico, ignorando a
dimensão social;
- A definição da informação derivada de um dado objetivo, através de procedimentos
formais e impessoais;
- Aderência ao modelo burocrático de organização como máquina, cujo racionalismo causa
alienação e falhas na implementação dos sistemas de informação;
- Interpretação do desenvolvimento de sistemas de informação como um processo de
engenharia, evitando a participação do usuário.
Considerando-se essas anomalias é que se compreende o quanto o trato das
diferentes temáticas em S.I. segue o discurso da corrente dominante neste campo de
conhecimento, ou seja, o discurso gerencialista-reducionista ou técnico-funcionalista.
Além disso, há diferentes posições filosóficas e tradições científicas entre a ciência
da computação e as ciências sociais que desencadeiam diferentes interpretações ao campo de
estudo de S.I. Por conseguinte, a interpretação de S.I. como um sistema técnico é baseado em
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suposições diferentes daquelas que interpretam S.I. como um sistema social (Falkenberg et. al.,
1998).
Em virtude disso, as pesquisas qualitativas em S.I. representam um esforço recente
na forma de teorizar sobre a natureza e a prática de análise e desenvolvimento de sistemas de
informação – os quais vêm enfrentando situações conjunturais altamente imprevisíveis e
turbulentas; a ponto dos economistas, nos últimos anos, apresentarem dificuldades de
comprovar que os vultosos valores dos investimentos em Tecnologia da Informação (T.I.) são
compensatórios; levando o Prêmio Nobel, Robert Solow, a criar a expressão “Paradoxo da
Produtividade”: os computadores são vistos em toda parte, menos nas estatísticas sobre
produtividade.
Neste trabalho uma tentativa é feita para descrever alguns aspectos introdutórios,
bem como algumas possibilidades da pesquisa qualitativa em Sistemas de Informação (S.I.).
Além desta introdução, o trabalho apresenta na seqüência as seguintes seções: a metodologia
utilizada, alguns aspectos da pesquisa qualitativa, alguns aspectos dos sistemas de informação,
a pesquisa qualitativa em sistemas de informação. Na seção 6 são delineadas algumas
considerações finais.
2 METODOLOGIA
A análise desenvolvida neste artigo busca, através de uma revisão literária dos
últimos vinte anos, verificar alguns aspectos conceituais da metodologia de pesquisa qualitativa
em sistemas de informação, bem como suas possibilidades para este campo de estudo. O
presente estudo caracteriza-se por ser predominantemente qualitativo, do tipo descritivo-
interpretativo, tendo como unidade de análise, a organização.
3 A PESQUISA QUALITATIVA
A pesquisa qualitativa, apesar de ter sido utilizada com determinada regularidade por
antropólogos e sociólogos, só nos últimos trinta anos começou a ganhar reconhecimento em
outras áreas, como a psicologia, a educação e a administração de empresas (Godoy, 1995,
p.58). Em Sistemas de Informação, tanto a sua aceitação quanto a sua utilização vêm sendo
ampliadas nos últimos dez anos.
Seja na abordagem quantitativa ou qualitativa, busca-se pela pesquisa realizar
novas descobertas de informações ou relações, ou ainda verificar e ampliar o conhecimento
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existente; mesmo que os caminhos seguidos por essas abordagens assumam contornos
diferentes.
Em geral, na pesquisa quantitativa, o trabalho do pesquisador é orientado por um
plano estabelecido a priori, apresentando hipóteses claramente especificadas, além da definição
operacional das variáveis de interesse do estudo. Ainda há a preocupação com a medição, a
mais objetiva e precisa possível, evitando distorções ou enviesamentos nas inferências obtidas;
e por último, há uma busca por quantificar os resultados.
Diferentemente acontece na pesquisa qualitativa. Para Godoy (1995, p.58): “...a
pesquisa qualitativa não procura enumerar e/ou medir os eventos estudados, nem emprega
instrumental estatístico na análise dos dados. Parte de questões ou focos de interesses amplos,
que vão se definindo à medida que o estudo se desenvolve. Envolve a obtenção de dados
descritivos sobre pessoas, lugares e processos interativos pelo contato direto do pesquisador
com a situação estudada, procurando compreender os fenômenos segundo a perspectiva dos
sujeitos, ou seja, dos participantes da situação em estudo”.
3.1 Breve histórico da pesquisa qualitativa
Há indícios que sugerem o aparecimento dos estudos qualitativos nas
investigações de natureza social a partir da segunda metade do século XIX.
Frédéric Lé Play (1806-1882) em Lés ouviers européens, um estudo sociológico
sobre as famílias das classes trabalhadoras da Europa, publicado em 1855, é mencionado como
uma das primeiras pesquisas a usar a observação direta da realidade. Sua inovação reside no
desenvolvimento de um estudo comparativo de monografias constituídas a partir de dados
coletados em inúmeras viagens pela Europa, que a pouco e pouco, permitiram a identificação de
famílias “típicas” da classe trabalhadora, a partir de pessoas exercendo determinadas
ocupações.
Ainda tendo como foco de estudo a classe trabalhadora, a obra de Henry
Mayhew, London labour and the London poor, publicada em quatro volumes entre 1851 e 1862,
retrata as condições de pobreza, tanto dos trabalhadores, quanto dos desempregados de
Londres. Na fase da coleta de informações, o autor utilizou histórias de vida e entrevistas “em
profundidade”.
Há autores que consideram a obra de Sidney Webb (1859-1947) e Beatrice Webb
(1858-1943), Methods of social investigation, publicada em 1932; o primeiro esforço em delimitar
os aspectos metodológicos da abordagem qualitativa. Os Webbs desenvolveram grandes
4
Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
quantidades de estudos sociais e políticos que contribuíram para o desenvolvimento da
sociologia inglesa. Seus estudos apoiavam-se fundamentalmente na descrição e análise das
instituições, não necessariamente utilizando uma teoria, a priori, para explicá-las; valorizando,
ainda, as entrevistas, os documentos e as observações pessoais.
Nos Estados Unidos, o estudo pioneiro que representou uma tentativa de acoplar
dados qualitativos aos quantitativos na análise de problemas de cunho social, foi o Pittsburgh
Survey, publicado entre 1908-1909. Nele, entre outras coisas, há a apresentação de descrições
detalhadas, entrevistas, retratos e fotos da época. Durante o período de 1910-1940 é possível
encontrar o uso da abordagem qualitativa nos trabalhos realizados pelo Departamento de
Sociologia da Universidade de Chicago. Para Becker (apud Ciência Hoje, 1991), não se pode
falar em clareza metodológica naquela época porque os pesquisadores de Chicago
simplesmente inventavam, criavam métodos, a partir da coleta de autobiografias, análise de
cartas e outros documentos, além da realização de entrevistas. A contribuição do grupo de
Chicago reside na forma como interpretavam os resultados de suas investigações, isto é,
enfatizavam a natureza social e interacional da realidade (abordagem interacionista). Em outras
palavras, reconheciam que todas as opiniões, públicas ou privadas são frutos do meio; cabendo
ao pesquisador a função de captar a perspectiva daqueles entrevistados por ele.
Na antropologia, pode-se citar os estudos de campo de Franz Boas (1858-1942) e
Bronislaw Malinowski (1884-1942), realizados sob uma perspectiva qualitativa. O primeiro
pesquisador muito contribuiu para o processo de estruturação da antropologia na América do
Norte, e através de estudos essencialmente descritivos, defendia a perspectiva de pouca
possibilidade de generalização nas ciências sociais, já que culturas estudadas deveriam ser
abordadas indutivamente, a partir dos referenciais e valores dos seus membros. Malinowski
acreditava ser indispensável ao pesquisador permanecer “em campo” tanto tempo quanto
possível, para captar, como observador participante, a realidade social e interacional da cultura
em estudo.
Por outro lado, vale ressaltar a resistência, durante algum tempo, dos sociólogos à
abordagem qualitativa devido à significativa influência dos trabalhos iniciais de Durkheim,
predominantemente estatísticos, na organização e análise de dados.
O período entre os anos de 1930 e 1960 é marcado por uma diminuição na
realização de pesquisas qualitativas; merecendo destaque a contribuição da escola do
pensamento sociológico (a Escola de Chicago) em 1937, onde Herbert Blumer elaborou o termo
“interacionismo simbólico”: a sociedade é um processo em que indivíduo e sociedade mantêm
constante e estreita inter-relação; sendo o aspecto subjetivo do comportamento humano um
5
Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
elemento necessário na formação e manutenção dinâmica do self social. O sentido que as
coisas (idéias, situações vivenciais, objetos físicos, instituições) tem para as pessoas surge da
interação entre os indivíduos, sendo modificado e manipulado em consonância com o processo
interpretativo cotidianamente usado.
É a partir da década de 60 que a pesquisa qualitativa é incorporada em outras
áreas de estudo além da antropologia e sociologia. Na área de administração de empresas isso
começa a ser claramente delineado a partir dos anos 70, especificamente 1979, com a
publicação de um número da revista Administrative Science Quarterly, totalmente dedicada ao
tema “qualitative methodology”. O enfoque qualitativo foi se mostrando de grande utilidade e
adequado aos estudos organizacionais, como por exemplo, nos trabalhos publicados na
Administrative Science Quarterly, pelos estudiosos Lawrence & Lorsch (1967), Hirsch (1975) e
Sebring (1977).
Quanto ao uso da pesquisa qualitativa em S.I. só nos últimos dez anos percebe-
se uma progressiva aceitação e utilização desta metodologia no meio acadêmico dos Estados
Unidos, seguindo a liderança de países europeus e a Austrália (Lee & Liebenau, 1997). Em
algumas empresas líderes em seus segmentos, a política e os princípios para a T.I. estão
fundamentadas em suposições da metodologia de pesquisa qualitativa. Como exemplo, as
idéias de práticas comunitárias, cuja base é a sociologia fenomenológica de Bourdieu (1977) e a
etnometodologia de Heidegger (Wenger & Lave, 1991). Ou ainda, em recentes pesquisas de
desenvolvimento de infraestrutura para rede corporativa, algo tradicionalmente visto como
“puramente técnico”, as análises vem utilizando as descrições e impressões dos atores sociais
envolvidos (Monteiro & Hanseth, 1996; Ciborra, 2000), obtendo significativa capacidade
explanatória.
3.2 Algumas características da pesquisa qualitativa
Para Bogdan & Biklen (1982), apesar de uma grande diversidade de trabalhos
intitulados qualitativos, é possível identificar alguns aspectos essenciais dos estudos qualitativos.
São eles:
(1) A valorização da necessidade do pesquisador manter o contato direto e
prolongado com o mundo empírico em seu ambiente natural, uma vez que o
fenômeno pode ser mais bem observado e compreendido no contexto em que
ocorre e do qual é parte. Aqui, através de instrumentos de coleta de dados como
videoteipes e gravadores, ou um simples bloco de notas; o pesquisador nas fases
de observação, seleção, análise e interpretação dos dados coletados, conta com o
aspecto do seu próprio subjetivismo, suas interpretações reflexivas do fenômeno.
6
Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
(2) As pesquisas qualitativas são descritivas. Neste aspecto, o ambiente e as
pessoas não são reduzidos a variáveis estatísticas / numéricas; busca-se o
entendimento do todo, em toda a sua complexidade e dinâmica. Os dados
coletados aparecem sob a forma de transcrições de entrevistas, anotações de
campo, fotografias, desenhos e vários tipos de documentos. Não é possível
compreender o comportamento humano sem levar em conta o quadro referencial
e contextual de que os indivíduos se utilizam para interpretar o mundo em volta.
(3) As pesquisas qualitativas procuram compreender o fenômeno estudado a partir da
perspectiva dos participantes; considerando todos os pontos de vista importantes
para esclarecer, sob diversos aspectos interpretativos, a situação em estudo.
(4) Os pesquisadores qualitativos usam do enfoque indutivo na análise dos dados.
Não há preocupação em procurar dados ou evidências que corroborem com
suposições ou hipóteses estabelecidas, a priori. O pesquisador de orientação
qualitativa ao planejar desenvolver alguma teoria sobre o que está estudando, vai
a pouco e pouco construindo o quadro teórico, à medida que coleta os dados e os
examina.
4 OS SISTEMAS DE INFORMAÇÃO
Conforme já dito, a abrangência do estudo de Sistemas de Informação (S.I.) torna
sua definição problemática. S.I. constitui um campo de estudo preocupado com alguns
componentes básicos da Tecnologia da Informação (T.I.) como tecnologia, desenvolvimento, uso
e gerenciamento. Percebe-se, no entanto, que os esforços em conceituar S.I. estão evoluindo
significativamente, saindo de uma visão puramente técnica para uma visão social, ainda que a
palavra social tenha um significado vago na ciência da computação (Ivanov, 1998). Apesar
dessa evolução, para Rodrigues Filho (2001), as orientações de pesquisa são substancialmente
diferentes de um país para outro, inexistindo um paradigma universal de pesquisa em S.I.
Evidencia-se isso no fato de alguns pesquisadores diferenciarem o enfoque e epistemologia
entre pesquisas em S.I. nos Estados Unidos e nos países europeus (Evaristo & Karahanna,
1997).
No Brasil, a pesquisa em S.I. segue basicamente a literatura americana quanto as
suas suposições filosóficas do paradigma funcionalista (Rodrigues Filho, et. al., 1999). Tal fato
pode ser reiterado pela pesquisa de Hoppen et. al. (1998), ao analisarem 96 artigos científicos
baseados em estudos empíricos, publicados em várias revistas técnicas e científicas nacionais,
no período de 1990-1997. Os autores constataram que apenas 13% dos trabalhos possuíam
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
“posição epistemológica interpretativa”, isto é, que se fundamentam na idéia de que as pessoas
nas organizações atribuem intersubjetivamente significados ao mundo, construindo uma visão de
informação relevante. Os 87% dos trabalhos restantes, apresentavam a visão tradicional
dominante do papel dos sistemas de informação como apoio ao processo de tomada de decisão
em um contexto organizacional que busca alcançar objetivos (racionalismo organizacional).
Ademais, não existe no Brasil um debate acerca dos méritos e das falhas da pesquisa em S.I.,
ao contrário do que acontece em países desenvolvidos (Dahlbom, 1996; Ehn, 1995).
5 A PESQUISA QUALITATIVA EM SISTEMAS DE INFORMAÇÃO
É ao final da década de setenta que aumentam os questionamentos a respeito da
eficiência dos sistemas de informação, assim como insatisfações com falhas em projetos de S.I.
À realidade organizacional não bastava apenas automatizar as operações / transações básicas
das empresas. A complexidade das tarefas executivas demandava a introdução de sistemas de
apoio à decisão (SAD) que utilizassem conhecimentos diversos como psicologia, teoria da
decisão, pesquisa operacional, teoria das organizações, etc. Como conseqüência, o
desenvolvimento de S.I. tendeu a focalizar menos as características técnicas das aplicações
computacionais e mais a questão da natureza da decisão nas organizações. Desse modo, o
entendimento da difusão das tecnologias nas organizações pressupõe o conhecimento da
complexidade das organizações. Contudo, muitos pesquisadores apresentam um conceito
limitado sobre organização; dificultando os avanços na pesquisa em S.I. (Henfridsson et. al.,
1997; Rodrigues Filho et. al., 1999).
Quanto ao modo de classificar as metodologias de pesquisas, independente do
campo, a mais conhecida classificação é a que distingue métodos quantitativos de métodos
qualitativos:
- Métodos quantitativos de pesquisa. Inicialmente desenvolvidos nas
ciências naturais, objetivando estudar os fenômenos da natureza. Exemplos
de métodos quantitativos usados nas ciências sociais: o experimento
laboratorial, métodos numéricos como modelagem matemática,
econometria, etc.;
- Métodos qualitativos de pesquisa. Desenvolvidos nas ciências sociais
com o intento de permitir aos pesquisadores o estudo de fenômenos sociais
e culturais. Exemplos de métodos qualitativos: pesquisa-ação, pesquisa
interpretativa, etnografia, teoria crítica, “grounded theory”, etc.
8
Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
A pesquisa qualitativa pode ser encontrada nos diversos campos de
conhecimento. Na pesquisa em sistemas de informação observa-se uma gradual mudança de
questões técnicas / tecnológicas para gerenciais e organizacionais, e, por conseguinte, um
incremento na aplicação de métodos de pesquisa qualitativos, uma vez que permitem uma
melhor interpretação dos contextos sociais e culturais vividos pelas pessoas observadas pelo
pesquisador no estudo. Por isso, Kaplan & Maxwell (1994) argumentam que se perde o
entendimento do fenômeno, sob a perspectiva dos participantes e seu particular contexto social
e institucional, quando os dados se restringem ao conteúdo numérico / quantificável. Max Weber
(1949) reforça essa idéia ao afirmar enfaticamente ser ilusão acreditar na possibilidade de
observar um fenômeno social sem descrevê-lo, conforme suas próprias palavras, “sob um ponto
de vista particular”. O autor complementa: “(...) quando do pesquisador é requerido considerar a
distinção de certo “ponto de vista”, significa dizer que ele precisa compreender como relacionar
os eventos do mundo real com “valores culturais”, bem como selecionar as relações que são
significativas para nós”.
Para Guba & Lincoln (1994) a pesquisa qualitativa pode ser classificada em quatro
paradigmas: Positivismo, Pós-positivismo, Teoria Crítica (e afins), e Construtivismo. Já segundo
Orlikowski & Baroudi (1991), dependendo do paradigma adotado pelo investigador, a pesquisa
qualitativa pode assumir uma das seguintes categorias:
- Positivista: quando há evidência de proposições formais; medidas
quantificáveis das variáveis; testes de hipóteses; além do delineamento de
inferências em um fenômeno, partindo de uma amostra para uma
população. Esses estudos são fundamentados na existência, a priori, de
relações fixas, presentes ao fenômeno, e que são investigadas por uma
instrumentação estruturada. Basicamente, tais estudos procuram testar uma
teoria.
- Interpretativa: procura compreender o fenômeno através dos significados
que as pessoas atribuem a ele. A pesquisa interpretativa não define
antecipadamente variáveis dependentes e independentes; seu foco é na
inteira complexidade do processo humano de dar sentido às coisas na
medida em que as situações acontecem (Kaplan & Maxwell, 1994). A base
filosófica da pesquisa interpretativa é a hermenêutica e a fenomenologia
(Boland, 1985).
- Crítica: entende que a realidade social é historicamente constituída através
de um processo de construção e reconstrução feito pelas pessoas. Os
9
Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
pesquisadores críticos, apesar de reconhecerem que as pessoas podem
conscientemente agir no sentido de modificarem suas circunstâncias sociais
e econômicas, afirmam que essa habilidade para a mudança é constrangida
por diversas formas de dominação social, cultural e política. Portanto, o
principal desafio da pesquisa crítica é o da crítica social, onde as condições
restritivas e alienantes do status quo são trazidas à tona. A pesquisa crítica
focaliza as resistências, os conflitos e as contradições da sociedade
contemporânea, visando à emancipação e eliminação das causas de
alienação e dominação.
Segundo Orlikowski (1991), nos Estados Unidos, o que tem inibido na academia o
ensino de métodos alternativos, qualitativos de pesquisa, como a pesquisa-ação, a pesquisa
crítica e a pesquisa interpretativa, são as condições institucionais. Em outras palavras, ela
atribuiu essa inibição à perspectiva funcionalista e positivista no ensino de S.I. nas escolas de
administração americanas.
Como conseqüência da posição dominante do positivismo nas pesquisas em S.I.,
não é surpresa encontrar alguns trabalhos qualitativos norte-americanos seguindo a tradição
positivista (Eisenhardt, 1989; Lee, 1989; Markus, 1983; Paré & Elam, 1997); ou tentando
minimizar a divisão positivismo / quantitativo e interpretativo / qualitativo (Gallivan, 1997; Kaplan
& Duchon, 1988; Lee, 1991). Conforme já dito, a pesquisa em S.I. no Brasil segue a perspectiva
funcionalista-positivista norte-americana.
Trauth (2001) em seu livro “Qualitative Research in IS: Issues and Trends”,
identificou cinco fatores que poderiam influenciar a escolha de métodos qualitativos para a
pesquisa em S.I.: (1) a natureza do problema de pesquisa; (2) a base epistemológica de estudos
do pesquisador; (3) o grau de incerteza a circundar o fenômeno em estudo; (4) o conhecimento e
a habilidade do pesquisador com o método; (5) a política de legitimação acadêmica na instituição
a qual o pesquisador pertence.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Procurou-se, através deste artigo, mostrar alguns aspectos conceituais da
metodologia de pesquisa qualitativa em Sistemas de Informação, bem como suas possibilidades
para este campo de estudo. Uma tentativa foi feita no sentido de expor a natureza dos estudos
qualitativos, historicamente presentes nas investigações de natureza social; e que apenas
recentemente, vem sendo vistos como alternativas para o estudo de S.I. nas organizações.
Ressalta-se a tradição nas pesquisas em S.I. de quantificar a complexidade dos fenômenos
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sociais (paradigma positivista) em modelos matemáticos, desencadeando uma carência de
compreensão do contexto social e cultural vividos pelas pessoas, já que se busca
predominantemente validar hipóteses por meio de equações, médias e estatísticas. A pesquisa
qualitativa em S.I. desponta como abordagem metodológica para aprofundar a análise e
interpretação dos significados das ações humanas que não são perceptíveis ou captáveis em
inferências estatísticas; inferências estas, extremamente reducionistas para o esforço de
compreensão da pluralidade do mundo social.
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica,
vol. 01, jan. / jun. 2007 ISSN 0000-0000 - v. eletrônica
PESQUISA QUALITATIVA EM SISTEMAS DE INFORMAÇÃO: UM ESTUDO INTRODUTÓRIO DE SUAS POSSIBILIDADES
André Felipe de Albuquerque Fell Mestrando em Administração – PROPAD / UFPE. Especialista em Engenharia da Qualidade – UFPE. Assuero Fonseca Ximenes Mestrando em Administração – PROPAD / UFPE. Especialista em Gestão da Tecnologia de Informação – FCAP / UPE.
José Orlando Costa Nunes Mestrando em Administração – PROPAD / UFPE. Especialista em Hotelaria – UFBA.
RESUMO
O objetivo do presente trabalho consistiu em apresentar alguns aspectos conceituais da
metodologia de pesquisa qualitativa em sistemas de informação, bem como suas possibilidades
para este campo de estudo. Uma tentativa foi feita no sentido de expor a natureza dos estudos
qualitativos, historicamente presentes nas investigações de natureza social; e que apenas
recentemente, vem sendo vistos como alternativas para o estudo de S.I. nas organizações. A
questão que se coloca é que a predominância do paradigma positivista em pesquisas na área de
S.I., com suas inferências estatísticas (eminentemente reducionistas), empobrecem a
compreensão dos fenômenos sociais e culturais estudados nesse campo. Propõe-se que novos
enfoques, mais qualitativos, devam ser dados às pesquisas de S.I. no esforço de compreensão
da pluralidade do mundo social.
PALAVRAS CHAVE: Administração da informação; pesquisa qualitativa; sistemas de informação.
ABSTRACT
The main purpose of this paper is to introduce a few conceptual aspects of qualitative
methodology in Information Systems (I.S.) and its possibilities to I.S. research. Historically,
qualitative methodology has been used on investigations of social nature and only recently has it
been considered as a possible methodology to I.S. studies in organizations. A relevant matter to
the subject is that the predominance of positivist paradigm on I.S. researches, with its statistical
1
inferences (mostly reducionists), contribute to poor comprehension of social and cultural
phenomenos within this field of study. New qualitative perspectives are proposed to I.S.
researches in order to allow understanding of social plurality.
KEY WORDS: Information administration; qualitative research; information systems.
1 INTRODUÇÃO
Assim como o conceito de administração, a tentativa de conceituar Sistema de
Informação (S.I.) pode se tornar um esforço complexo, senão infrutífero, por ser um campo de
estudo altamente fragmentado; preocupando-se com questões como desenvolvimento, uso e
implicações das tecnologias de informação e comunicação nas organizações. Todavia, um
estereótipo há muito institucionalizado sobre S.I. parece ser o de um sistema altamente técnico,
cuja ênfase de suas suposições filosóficas é no empirismo lógico ou a epistemologia positivista.
Em outros termos, o enfoque teórico é considerar a tecnologia como “hardware”: algo que
modela a sociedade, mas não é reciprocamente modelado por ela. Daí Klein (1985) apontar as
seguintes anomalias paradigmáticas para os sistemas de informação:
- A construção de sistemas de informação como um artefato técnico, ignorando a
dimensão social;
- A definição da informação derivada de um dado objetivo, através de procedimentos
formais e impessoais;
- Aderência ao modelo burocrático de organização como máquina, cujo racionalismo causa
alienação e falhas na implementação dos sistemas de informação;
- Interpretação do desenvolvimento de sistemas de informação como um processo de
engenharia, evitando a participação do usuário.
Considerando-se essas anomalias é que se compreende o quanto o trato das
diferentes temáticas em S.I. segue o discurso da corrente dominante neste campo de
conhecimento, ou seja, o discurso gerencialista-reducionista ou técnico-funcionalista.
Além disso, há diferentes posições filosóficas e tradições científicas entre a ciência
da computação e as ciências sociais que desencadeiam diferentes interpretações ao campo de
estudo de S.I. Por conseguinte, a interpretação de S.I. como um sistema técnico é baseado em
2
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suposições diferentes daquelas que interpretam S.I. como um sistema social (Falkenberg et. al.,
1998).
Em virtude disso, as pesquisas qualitativas em S.I. representam um esforço recente
na forma de teorizar sobre a natureza e a prática de análise e desenvolvimento de sistemas de
informação – os quais vêm enfrentando situações conjunturais altamente imprevisíveis e
turbulentas; a ponto dos economistas, nos últimos anos, apresentarem dificuldades de
comprovar que os vultosos valores dos investimentos em Tecnologia da Informação (T.I.) são
compensatórios; levando o Prêmio Nobel, Robert Solow, a criar a expressão “Paradoxo da
Produtividade”: os computadores são vistos em toda parte, menos nas estatísticas sobre
produtividade.
Neste trabalho uma tentativa é feita para descrever alguns aspectos introdutórios,
bem como algumas possibilidades da pesquisa qualitativa em Sistemas de Informação (S.I.).
Além desta introdução, o trabalho apresenta na seqüência as seguintes seções: a metodologia
utilizada, alguns aspectos da pesquisa qualitativa, alguns aspectos dos sistemas de informação,
a pesquisa qualitativa em sistemas de informação. Na seção 6 são delineadas algumas
considerações finais.
2 METODOLOGIA
A análise desenvolvida neste artigo busca, através de uma revisão literária dos
últimos vinte anos, verificar alguns aspectos conceituais da metodologia de pesquisa qualitativa
em sistemas de informação, bem como suas possibilidades para este campo de estudo. O
presente estudo caracteriza-se por ser predominantemente qualitativo, do tipo descritivo-
interpretativo, tendo como unidade de análise, a organização.
3 A PESQUISA QUALITATIVA
A pesquisa qualitativa, apesar de ter sido utilizada com determinada regularidade por
antropólogos e sociólogos, só nos últimos trinta anos começou a ganhar reconhecimento em
outras áreas, como a psicologia, a educação e a administração de empresas (Godoy, 1995,
p.58). Em Sistemas de Informação, tanto a sua aceitação quanto a sua utilização vêm sendo
ampliadas nos últimos dez anos.
Seja na abordagem quantitativa ou qualitativa, busca-se pela pesquisa realizar
novas descobertas de informações ou relações, ou ainda verificar e ampliar o conhecimento
3
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existente; mesmo que os caminhos seguidos por essas abordagens assumam contornos
diferentes.
Em geral, na pesquisa quantitativa, o trabalho do pesquisador é orientado por um
plano estabelecido a priori, apresentando hipóteses claramente especificadas, além da definição
operacional das variáveis de interesse do estudo. Ainda há a preocupação com a medição, a
mais objetiva e precisa possível, evitando distorções ou enviesamentos nas inferências obtidas;
e por último, há uma busca por quantificar os resultados.
Diferentemente acontece na pesquisa qualitativa. Para Godoy (1995, p.58): “...a
pesquisa qualitativa não procura enumerar e/ou medir os eventos estudados, nem emprega
instrumental estatístico na análise dos dados. Parte de questões ou focos de interesses amplos,
que vão se definindo à medida que o estudo se desenvolve. Envolve a obtenção de dados
descritivos sobre pessoas, lugares e processos interativos pelo contato direto do pesquisador
com a situação estudada, procurando compreender os fenômenos segundo a perspectiva dos
sujeitos, ou seja, dos participantes da situação em estudo”.
3.1 Breve histórico da pesquisa qualitativa
Há indícios que sugerem o aparecimento dos estudos qualitativos nas
investigações de natureza social a partir da segunda metade do século XIX.
Frédéric Lé Play (1806-1882) em Lés ouviers européens, um estudo sociológico
sobre as famílias das classes trabalhadoras da Europa, publicado em 1855, é mencionado como
uma das primeiras pesquisas a usar a observação direta da realidade. Sua inovação reside no
desenvolvimento de um estudo comparativo de monografias constituídas a partir de dados
coletados em inúmeras viagens pela Europa, que a pouco e pouco, permitiram a identificação de
famílias “típicas” da classe trabalhadora, a partir de pessoas exercendo determinadas
ocupações.
Ainda tendo como foco de estudo a classe trabalhadora, a obra de Henry
Mayhew, London labour and the London poor, publicada em quatro volumes entre 1851 e 1862,
retrata as condições de pobreza, tanto dos trabalhadores, quanto dos desempregados de
Londres. Na fase da coleta de informações, o autor utilizou histórias de vida e entrevistas “em
profundidade”.
Há autores que consideram a obra de Sidney Webb (1859-1947) e Beatrice Webb
(1858-1943), Methods of social investigation, publicada em 1932; o primeiro esforço em delimitar
os aspectos metodológicos da abordagem qualitativa. Os Webbs desenvolveram grandes
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quantidades de estudos sociais e políticos que contribuíram para o desenvolvimento da
sociologia inglesa. Seus estudos apoiavam-se fundamentalmente na descrição e análise das
instituições, não necessariamente utilizando uma teoria, a priori, para explicá-las; valorizando,
ainda, as entrevistas, os documentos e as observações pessoais.
Nos Estados Unidos, o estudo pioneiro que representou uma tentativa de acoplar
dados qualitativos aos quantitativos na análise de problemas de cunho social, foi o Pittsburgh
Survey, publicado entre 1908-1909. Nele, entre outras coisas, há a apresentação de descrições
detalhadas, entrevistas, retratos e fotos da época. Durante o período de 1910-1940 é possível
encontrar o uso da abordagem qualitativa nos trabalhos realizados pelo Departamento de
Sociologia da Universidade de Chicago. Para Becker (apud Ciência Hoje, 1991), não se pode
falar em clareza metodológica naquela época porque os pesquisadores de Chicago
simplesmente inventavam, criavam métodos, a partir da coleta de autobiografias, análise de
cartas e outros documentos, além da realização de entrevistas. A contribuição do grupo de
Chicago reside na forma como interpretavam os resultados de suas investigações, isto é,
enfatizavam a natureza social e interacional da realidade (abordagem interacionista). Em outras
palavras, reconheciam que todas as opiniões, públicas ou privadas são frutos do meio; cabendo
ao pesquisador a função de captar a perspectiva daqueles entrevistados por ele.
Na antropologia, pode-se citar os estudos de campo de Franz Boas (1858-1942) e
Bronislaw Malinowski (1884-1942), realizados sob uma perspectiva qualitativa. O primeiro
pesquisador muito contribuiu para o processo de estruturação da antropologia na América do
Norte, e através de estudos essencialmente descritivos, defendia a perspectiva de pouca
possibilidade de generalização nas ciências sociais, já que culturas estudadas deveriam ser
abordadas indutivamente, a partir dos referenciais e valores dos seus membros. Malinowski
acreditava ser indispensável ao pesquisador permanecer “em campo” tanto tempo quanto
possível, para captar, como observador participante, a realidade social e interacional da cultura
em estudo.
Por outro lado, vale ressaltar a resistência, durante algum tempo, dos sociólogos à
abordagem qualitativa devido à significativa influência dos trabalhos iniciais de Durkheim,
predominantemente estatísticos, na organização e análise de dados.
O período entre os anos de 1930 e 1960 é marcado por uma diminuição na
realização de pesquisas qualitativas; merecendo destaque a contribuição da escola do
pensamento sociológico (a Escola de Chicago) em 1937, onde Herbert Blumer elaborou o termo
“interacionismo simbólico”: a sociedade é um processo em que indivíduo e sociedade mantêm
constante e estreita inter-relação; sendo o aspecto subjetivo do comportamento humano um
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elemento necessário na formação e manutenção dinâmica do self social. O sentido que as
coisas (idéias, situações vivenciais, objetos físicos, instituições) tem para as pessoas surge da
interação entre os indivíduos, sendo modificado e manipulado em consonância com o processo
interpretativo cotidianamente usado.
É a partir da década de 60 que a pesquisa qualitativa é incorporada em outras
áreas de estudo além da antropologia e sociologia. Na área de administração de empresas isso
começa a ser claramente delineado a partir dos anos 70, especificamente 1979, com a
publicação de um número da revista Administrative Science Quarterly, totalmente dedicada ao
tema “qualitative methodology”. O enfoque qualitativo foi se mostrando de grande utilidade e
adequado aos estudos organizacionais, como por exemplo, nos trabalhos publicados na
Administrative Science Quarterly, pelos estudiosos Lawrence & Lorsch (1967), Hirsch (1975) e
Sebring (1977).
Quanto ao uso da pesquisa qualitativa em S.I. só nos últimos dez anos percebe-
se uma progressiva aceitação e utilização desta metodologia no meio acadêmico dos Estados
Unidos, seguindo a liderança de países europeus e a Austrália (Lee & Liebenau, 1997). Em
algumas empresas líderes em seus segmentos, a política e os princípios para a T.I. estão
fundamentadas em suposições da metodologia de pesquisa qualitativa. Como exemplo, as
idéias de práticas comunitárias, cuja base é a sociologia fenomenológica de Bourdieu (1977) e a
etnometodologia de Heidegger (Wenger & Lave, 1991). Ou ainda, em recentes pesquisas de
desenvolvimento de infraestrutura para rede corporativa, algo tradicionalmente visto como
“puramente técnico”, as análises vem utilizando as descrições e impressões dos atores sociais
envolvidos (Monteiro & Hanseth, 1996; Ciborra, 2000), obtendo significativa capacidade
explanatória.
3.2 Algumas características da pesquisa qualitativa
Para Bogdan & Biklen (1982), apesar de uma grande diversidade de trabalhos
intitulados qualitativos, é possível identificar alguns aspectos essenciais dos estudos qualitativos.
São eles:
(1) A valorização da necessidade do pesquisador manter o contato direto e
prolongado com o mundo empírico em seu ambiente natural, uma vez que o
fenômeno pode ser mais bem observado e compreendido no contexto em que
ocorre e do qual é parte. Aqui, através de instrumentos de coleta de dados como
videoteipes e gravadores, ou um simples bloco de notas; o pesquisador nas fases
de observação, seleção, análise e interpretação dos dados coletados, conta com o
aspecto do seu próprio subjetivismo, suas interpretações reflexivas do fenômeno.
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(2) As pesquisas qualitativas são descritivas. Neste aspecto, o ambiente e as
pessoas não são reduzidos a variáveis estatísticas / numéricas; busca-se o
entendimento do todo, em toda a sua complexidade e dinâmica. Os dados
coletados aparecem sob a forma de transcrições de entrevistas, anotações de
campo, fotografias, desenhos e vários tipos de documentos. Não é possível
compreender o comportamento humano sem levar em conta o quadro referencial
e contextual de que os indivíduos se utilizam para interpretar o mundo em volta.
(3) As pesquisas qualitativas procuram compreender o fenômeno estudado a partir da
perspectiva dos participantes; considerando todos os pontos de vista importantes
para esclarecer, sob diversos aspectos interpretativos, a situação em estudo.
(4) Os pesquisadores qualitativos usam do enfoque indutivo na análise dos dados.
Não há preocupação em procurar dados ou evidências que corroborem com
suposições ou hipóteses estabelecidas, a priori. O pesquisador de orientação
qualitativa ao planejar desenvolver alguma teoria sobre o que está estudando, vai
a pouco e pouco construindo o quadro teórico, à medida que coleta os dados e os
examina.
4 OS SISTEMAS DE INFORMAÇÃO
Conforme já dito, a abrangência do estudo de Sistemas de Informação (S.I.) torna
sua definição problemática. S.I. constitui um campo de estudo preocupado com alguns
componentes básicos da Tecnologia da Informação (T.I.) como tecnologia, desenvolvimento, uso
e gerenciamento. Percebe-se, no entanto, que os esforços em conceituar S.I. estão evoluindo
significativamente, saindo de uma visão puramente técnica para uma visão social, ainda que a
palavra social tenha um significado vago na ciência da computação (Ivanov, 1998). Apesar
dessa evolução, para Rodrigues Filho (2001), as orientações de pesquisa são substancialmente
diferentes de um país para outro, inexistindo um paradigma universal de pesquisa em S.I.
Evidencia-se isso no fato de alguns pesquisadores diferenciarem o enfoque e epistemologia
entre pesquisas em S.I. nos Estados Unidos e nos países europeus (Evaristo & Karahanna,
1997).
No Brasil, a pesquisa em S.I. segue basicamente a literatura americana quanto as
suas suposições filosóficas do paradigma funcionalista (Rodrigues Filho, et. al., 1999). Tal fato
pode ser reiterado pela pesquisa de Hoppen et. al. (1998), ao analisarem 96 artigos científicos
baseados em estudos empíricos, publicados em várias revistas técnicas e científicas nacionais,
no período de 1990-1997. Os autores constataram que apenas 13% dos trabalhos possuíam
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“posição epistemológica interpretativa”, isto é, que se fundamentam na idéia de que as pessoas
nas organizações atribuem intersubjetivamente significados ao mundo, construindo uma visão de
informação relevante. Os 87% dos trabalhos restantes, apresentavam a visão tradicional
dominante do papel dos sistemas de informação como apoio ao processo de tomada de decisão
em um contexto organizacional que busca alcançar objetivos (racionalismo organizacional).
Ademais, não existe no Brasil um debate acerca dos méritos e das falhas da pesquisa em S.I.,
ao contrário do que acontece em países desenvolvidos (Dahlbom, 1996; Ehn, 1995).
5 A PESQUISA QUALITATIVA EM SISTEMAS DE INFORMAÇÃO
É ao final da década de setenta que aumentam os questionamentos a respeito da
eficiência dos sistemas de informação, assim como insatisfações com falhas em projetos de S.I.
À realidade organizacional não bastava apenas automatizar as operações / transações básicas
das empresas. A complexidade das tarefas executivas demandava a introdução de sistemas de
apoio à decisão (SAD) que utilizassem conhecimentos diversos como psicologia, teoria da
decisão, pesquisa operacional, teoria das organizações, etc. Como conseqüência, o
desenvolvimento de S.I. tendeu a focalizar menos as características técnicas das aplicações
computacionais e mais a questão da natureza da decisão nas organizações. Desse modo, o
entendimento da difusão das tecnologias nas organizações pressupõe o conhecimento da
complexidade das organizações. Contudo, muitos pesquisadores apresentam um conceito
limitado sobre organização; dificultando os avanços na pesquisa em S.I. (Henfridsson et. al.,
1997; Rodrigues Filho et. al., 1999).
Quanto ao modo de classificar as metodologias de pesquisas, independente do
campo, a mais conhecida classificação é a que distingue métodos quantitativos de métodos
qualitativos:
- Métodos quantitativos de pesquisa. Inicialmente desenvolvidos nas
ciências naturais, objetivando estudar os fenômenos da natureza. Exemplos
de métodos quantitativos usados nas ciências sociais: o experimento
laboratorial, métodos numéricos como modelagem matemática,
econometria, etc.;
- Métodos qualitativos de pesquisa. Desenvolvidos nas ciências sociais
com o intento de permitir aos pesquisadores o estudo de fenômenos sociais
e culturais. Exemplos de métodos qualitativos: pesquisa-ação, pesquisa
interpretativa, etnografia, teoria crítica, “grounded theory”, etc.
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A pesquisa qualitativa pode ser encontrada nos diversos campos de
conhecimento. Na pesquisa em sistemas de informação observa-se uma gradual mudança de
questões técnicas / tecnológicas para gerenciais e organizacionais, e, por conseguinte, um
incremento na aplicação de métodos de pesquisa qualitativos, uma vez que permitem uma
melhor interpretação dos contextos sociais e culturais vividos pelas pessoas observadas pelo
pesquisador no estudo. Por isso, Kaplan & Maxwell (1994) argumentam que se perde o
entendimento do fenômeno, sob a perspectiva dos participantes e seu particular contexto social
e institucional, quando os dados se restringem ao conteúdo numérico / quantificável. Max Weber
(1949) reforça essa idéia ao afirmar enfaticamente ser ilusão acreditar na possibilidade de
observar um fenômeno social sem descrevê-lo, conforme suas próprias palavras, “sob um ponto
de vista particular”. O autor complementa: “(...) quando do pesquisador é requerido considerar a
distinção de certo “ponto de vista”, significa dizer que ele precisa compreender como relacionar
os eventos do mundo real com “valores culturais”, bem como selecionar as relações que são
significativas para nós”.
Para Guba & Lincoln (1994) a pesquisa qualitativa pode ser classificada em quatro
paradigmas: Positivismo, Pós-positivismo, Teoria Crítica (e afins), e Construtivismo. Já segundo
Orlikowski & Baroudi (1991), dependendo do paradigma adotado pelo investigador, a pesquisa
qualitativa pode assumir uma das seguintes categorias:
- Positivista: quando há evidência de proposições formais; medidas
quantificáveis das variáveis; testes de hipóteses; além do delineamento de
inferências em um fenômeno, partindo de uma amostra para uma
população. Esses estudos são fundamentados na existência, a priori, de
relações fixas, presentes ao fenômeno, e que são investigadas por uma
instrumentação estruturada. Basicamente, tais estudos procuram testar uma
teoria.
- Interpretativa: procura compreender o fenômeno através dos significados
que as pessoas atribuem a ele. A pesquisa interpretativa não define
antecipadamente variáveis dependentes e independentes; seu foco é na
inteira complexidade do processo humano de dar sentido às coisas na
medida em que as situações acontecem (Kaplan & Maxwell, 1994). A base
filosófica da pesquisa interpretativa é a hermenêutica e a fenomenologia
(Boland, 1985).
- Crítica: entende que a realidade social é historicamente constituída através
de um processo de construção e reconstrução feito pelas pessoas. Os
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
pesquisadores críticos, apesar de reconhecerem que as pessoas podem
conscientemente agir no sentido de modificarem suas circunstâncias sociais
e econômicas, afirmam que essa habilidade para a mudança é constrangida
por diversas formas de dominação social, cultural e política. Portanto, o
principal desafio da pesquisa crítica é o da crítica social, onde as condições
restritivas e alienantes do status quo são trazidas à tona. A pesquisa crítica
focaliza as resistências, os conflitos e as contradições da sociedade
contemporânea, visando à emancipação e eliminação das causas de
alienação e dominação.
Segundo Orlikowski (1991), nos Estados Unidos, o que tem inibido na academia o
ensino de métodos alternativos, qualitativos de pesquisa, como a pesquisa-ação, a pesquisa
crítica e a pesquisa interpretativa, são as condições institucionais. Em outras palavras, ela
atribuiu essa inibição à perspectiva funcionalista e positivista no ensino de S.I. nas escolas de
administração americanas.
Como conseqüência da posição dominante do positivismo nas pesquisas em S.I.,
não é surpresa encontrar alguns trabalhos qualitativos norte-americanos seguindo a tradição
positivista (Eisenhardt, 1989; Lee, 1989; Markus, 1983; Paré & Elam, 1997); ou tentando
minimizar a divisão positivismo / quantitativo e interpretativo / qualitativo (Gallivan, 1997; Kaplan
& Duchon, 1988; Lee, 1991). Conforme já dito, a pesquisa em S.I. no Brasil segue a perspectiva
funcionalista-positivista norte-americana.
Trauth (2001) em seu livro “Qualitative Research in IS: Issues and Trends”,
identificou cinco fatores que poderiam influenciar a escolha de métodos qualitativos para a
pesquisa em S.I.: (1) a natureza do problema de pesquisa; (2) a base epistemológica de estudos
do pesquisador; (3) o grau de incerteza a circundar o fenômeno em estudo; (4) o conhecimento e
a habilidade do pesquisador com o método; (5) a política de legitimação acadêmica na instituição
a qual o pesquisador pertence.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Procurou-se, através deste artigo, mostrar alguns aspectos conceituais da
metodologia de pesquisa qualitativa em Sistemas de Informação, bem como suas possibilidades
para este campo de estudo. Uma tentativa foi feita no sentido de expor a natureza dos estudos
qualitativos, historicamente presentes nas investigações de natureza social; e que apenas
recentemente, vem sendo vistos como alternativas para o estudo de S.I. nas organizações.
Ressalta-se a tradição nas pesquisas em S.I. de quantificar a complexidade dos fenômenos
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sociais (paradigma positivista) em modelos matemáticos, desencadeando uma carência de
compreensão do contexto social e cultural vividos pelas pessoas, já que se busca
predominantemente validar hipóteses por meio de equações, médias e estatísticas. A pesquisa
qualitativa em S.I. desponta como abordagem metodológica para aprofundar a análise e
interpretação dos significados das ações humanas que não são perceptíveis ou captáveis em
inferências estatísticas; inferências estas, extremamente reducionistas para o esforço de
compreensão da pluralidade do mundo social.
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vol. 01, jan. / jun. 2007 ISSN 0000-0000 - v. eletrônica
SOCIEDADE DE INFORMAÇÃO E TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO (T.I.) NA EDUCAÇÃO: PROGRESSO RUMO À CONSTRUÇÃO DO SUJEITO HISTÓRICO, OU NOVA RECONSTITUIÇÃO FUNCIONAL DO CONHECIMENTO PARA A LÓGICA DO MERCADO E A PERPETUAÇÃO DO STATUS QUO?
André Felipe de Albuquerque Fell Mestre em Administração Especialista em Engenharia da Qualidade. Georges Antônio Sebastião Pellerin da Silva Doutor em Macroeconomia Professor do PROPAD / UFPE.
Nilke Silvania Pizziolo Aluna de Graduação em Pedagogia da Universidade Federal de Pernambuco - UFPE. Professora da Fundação Bradesco.
RESUMO
O objetivo do presente trabalho consiste em uma reflexão, como é visto na literatura, em que
medida a T.I. na educação, em uma sociedade da informação, vem contribuindo para a
construção do sujeito histórico através do conhecimento emancipatório e transformador, ou se
seu uso é mera reconstituição funcional do conhecimento para a lógica do mercado e a
perpetuação do status quo. A questão que se coloca é que nunca antes na história da
humanidade se teve a possibilidade sem precedentes de expansão do conhecimento que
proporcione condições mais favoráveis de desenvolvimento autônomo; paradoxalmente,
entretanto, a um momento em que a educação parece perder seu compromisso histórico com a
construção do conhecimento de interesse coletivo da humanidade, aprisionando-se à
seletividade de cursos utilitaristas, sistematicamente ditados / ordenados segundo a demanda
do mercado neoliberal. Como conseqüência, a literatura apresenta-se controvertida quanto ao
papel da T.I. na educação: alguns a vêem como reguladora social, ou mera propagadora
funcional do conhecimento para a lógica do mercado e a perpetuação do status quo; enquanto
outros defendem seu papel de elemento de emancipação social.
PALAVRAS CHAVE: Sociedade de informação; tecnologia da informação na educação; educação e sociedade.
1
ABSTRACT
The main purpose of this paper is to examine how research publications view the use of
Information Technology (IT) on education, within an information society perspective, in order to
allow the development of the historical citizen through an emancipatorial and tranformational
knowledge; or on the other hand, does it represent just a new functional constitution of the
knowledge to attend markets’ configuration and therefore perpetuate status quo. A relevant
matter to the subject is that never before on the history of mankind has it been so unprecedently
possible to develop the knowledge with wich autonomous development could be achieved.
Nevertheless, at the same time, education seems to loose its historical commitment to a
colective humankind knowledge construction and be imprisoned by selective utilitarian courses
that are sistematically dictated / ordered by neoliberalism market demands. Therefore,
publications are controversial towards IT on education. Some publications view it as a social
regulator or a functional constitution of the knowledge to attend markets’ configuration and
therefore perpetuate status quo, while others defend the point that it is an element of social
emancipation.
KEY WORDS: Information society, information technology on education; education and society.
1 INTRODUÇÃO
Segundo Wurman (1991), uma edição do The New York Times em um dia da semana
contém mais informações do que um cidadão comum poderia receber durante toda a vida na
Inglaterra do século XVII; nos últimos 30 anos foi produzido um volume maior de informações do
que nos 5.000 anos precedentes. Nos Estado Unidos, no estado da Califórnia, o intercâmbio de
dados na Internet por meio de uma rede de PCs (Personal Computers) foi, já na segunda
metade dos anos 90, maior do que as comunicações telefônicas tradicionais (Computernetze,
1996). Por fim, o cidadão do mundo ocidental hoje, utiliza em média, cerca de 200 chips
instalados em eletrodomésticos, automóveis, equipamentos de escritório e seus periféricos; além
daqueles que são implantados, por indicação médica, nos corpos de algumas pessoas
(Ludsteck, 1996).
Os avanços tecnológicos com a microeletrônica e telecomunicações, acelerando
enormemente o gerar, armazenar, veicular, processar e reproduzir a informação; contribuíram
para transformações técnicas, organizacionais e administrativas no modus operandi de uma
sociedade habituada a seguir o modelo fordista de produção, e caracterizada por ter como os
centros do poder de regulamentação social e econômicas, as grandes corporações – cujas
estruturas eram mecanicamente coordenadas dentro de uma rígida hierarquia com divisões de
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poder, autoridade formalizada e altamente especializada, além de apresentarem uma circulação
de informações extremamente compartimentalizada.
Já na década de setenta, em contraposição à rigidez do modelo fordista de produção, há
uma tentativa de se estruturar um novo modelo de produção com aspectos tais como
flexibilidade dos processos, dos mercados, dos produtos e dos padrões de consumo. Ademais,
vale ressaltar, que o domínio do conhecimento científico e técnico pelas organizações e/ou
nações sempre apresentou como pressuposição basilar o cálculo utilitário das condições para se
obter a vantagem competitiva, a qual seria alcançada mediante o controle da força de trabalho, o
aumento da produtividade, a conquista de novos mercados e a flexibilização da produção; e
tanto influenciando quanto sofrendo influência das novas tecnologias da informação. Para
Schiller (1985:37), isto significa que “as novas tecnologias da informação foram desenvolvidas
em, pelas e para as economias capitalistas avançadas (...) [sendo] de esperar-se, por
conseguinte, que elas estejam sendo usadas obstinadamente para servir a objetivos de
mercado” (grifo nosso).
Por outro lado, as novas tecnologias da informação, face à cultura, estética e ética do trabalho
fordista, abrem segundo Piore e Sabel (apud Harvey, 2000:177): “a possibilidade de uma
reconstituição das relações de trabalho e dos sistemas de produção em bases sociais,
econômicas e geográficas inteiramente distintas”. Alguns estudiosos anunciam o emergir da
sociedade da informação, onde para Seitz (1995): “não mais a produção industrial de produtos
materiais da vida cotidiana, mas códigos desmaterializados e digitais, como o arquivo de
informações em um computador, passam a ser o objeto central de todas as transações
econômicas”. Ainda em relação a sociedade da informação, Seitz (1998) complementa: “o
software para computadores – um mero produto do espírito humano – torna-se símbolo da
economia da informação”. Todavia, há outros autores que pressagiam o aumento das
desigualdades (Dahrendorf, 1987) e a ascensão de uma nova “aristocracia” do trabalho.
É nesta sociedade da informação em que “muda a própria fonte da criação de riqueza e os
fatores determinantes da produção. O capital e o trabalho, as variáveis básicas da sociedade
industrial, são substituídas pela informação e o conhecimento”(Kumar, 1997:24). Mas o autor
adverte: “a sociedade de informação não evoluiu de maneira neutra, isenta de juízo de valor. A
T.I., como todas as tecnologias, foi escolhida e moldada de conformidade com certos e
determinados interesses sociais e políticos”(Kumar, 1997:47).
Sob a perspectiva quanto ao papel da informação e o conhecimento nos padrões de vida,
trabalho e lazer na sociedade de informação, vale a tentativa, ainda que imprecisa, de distinguir
dados, informação e conhecimento (Quadro 1). Davenport (1998) define dados como
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
“observações sobre o estado do mundo”, e exemplifica: “existem 697 unidades no armazém”.
Neste caso, tanto pessoas quanto uma tecnologia adequada podem fazer a observação destes
fatos brutos, ou entidades quantificáveis. Peter Drucker (1988) definiu informação como “dados
dotados de relevância e propósito”. São as pessoas que, através da análise, atribuem à entidade
informacional relevância e propósito; sendo muito difícil a absoluta fidelidade na transferência da
informação porque o que é relevante e significativa para uns, nada representará para outros.
Ainda segundo Davenport (1998): “Conhecimento é a informação mais valiosa, e
consequentemente, mais difícil de gerenciar. É valiosa precisamente porque alguém deu à
informação um contexto, um significado, uma interpretação; alguém refletiu sobre o
conhecimento, acrescentou a ele sua própria sabedoria, considerou suas implicações mais
amplas”.
Quadro 1 – Dados, informação e conhecimento.
DADOS INFORMAÇÃO CONHECIMENTO
Simples observação sobre o
estado do mundo
Dados dotados de relevância
e propósito
Informação valiosa da
mente humana. Inclui
reflexão, síntese, contexto
* Facilmente estruturado * Requer unidade de análise * De difícil estruturação
* Facilmente obtido por
máquinas
* Exige consenso em relação
ao significado
* De difícil captura em
máquinas
* Freqüentemente quantificado * Exige necessariamente a
mediação humana
* Freqüentemente tácito
* Facilmente transferível * De difícil transferência
Fonte: adaptado de Davenport (1998, p.18)
Nonaka e Takeuchi (1997) perceberam que o conhecimento é dividido em dois tipos: o
explícito e o tácito. O conhecimento explícito pode ser facilmente identificado, mapeado,
“processado” por um sistema de informação, e transmitido ou armazenado eletronicamente em
banco de dados. Já o tácito possui uma natureza subjetiva e intuitiva, dificultando a identificação,
o mapeamento, o processamento ou a transmissão do conhecimento por qualquer mecanismo
sistemático ou lógico de categorização e localização. O Quadro 2 descreve as diferenças
básicas entre os dois tipos de conhecimento.
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Quadro 2 – Diferenças básicas entre os tipos de conhecimento
CONHECIMENTO TÁCITO (SUBJETIVO) CONHECIMENTO EXPLÍCITO (OBJETIVO)
* Conhecimento da experiência (corpo) * Conhecimento da racionalidade (mente)
* Conhecimento simultâneo
(aqui e agora)
* Conhecimento seqüencial
(lá e então)
* Conhecimento análogo (prática) * Conhecimento digital (teoria)
Fonte: Nonaka e Takeuchi (1997)
Atualmente, inúmeras são as possibilidades de “materializar” ou “manualizar” (tornar ao
alcance das mãos), o conhecimento explícito: cd-rom, Internet, softwares educativos, etc. Diante
disso, duas questões são apresentadas:
1) Até onde a relativa facilidade de acesso a um universo de informações dos mais diversos
campos do saber humano, hoje, contribui para a construção do sujeito histórico através
de um conhecimento emancipatório e transformador? Entenda-se aqui sujeito histórico,
de um modo geral, o ser humano conhecedor das resistências, conflitos e contradições
da sociedade contemporânea; consciente das diversas formas de dominação social,
cultural e política que constrangem a possibilidade de mudança; e que através de um
esforço de emancipação e eliminação das causas de alienação e dominação, traz à tona
e denuncia as condições restritivas do status quo.
2) Será que a T.I. na educação não passa a ser mera promotora / reprodutora funcional de
um conhecimento enfaticamente tecnicista, em resposta à exigência de um mercado
utilitarista e perpetuador do status quo?
2 METODOLOGIA
A análise desenvolvida neste artigo busca, através de uma revisão literária e pesquisa em dados
secundários dos últimos vinte anos; verificar se na sociedade da informação, a T.I. na educação
tem permitido o progresso rumo à construção do sujeito histórico através do conhecimento
emancipatório e transformador; ou ao contrário, é apenas uma nova reconstituição funcional do
conhecimento para a lógica do mercado e a perpetuação do status quo. O presente estudo
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
caracteriza-se por ser predominantemente qualitativo, do tipo descritivo-interpretativo, tendo
como unidade de análise, a T.I. na educação em uma sociedade de informação. Além da
introdução, e desta metodologia, o trabalho apresenta na seqüência as seguintes seções: a
teoria estruturacional da tecnologia de Orlikowski (1992); a sociedade da informação; educação
e sociedade; T.I. na educação. Na seção sete são feitas algumas considerações finais.
3 A TEORIA DA ESTRUTURAÇÃO
Uma questão presente na literatura quanto ao desenvolvimento tecnológico parece refletir uma
concordância implícita e silenciosa na sociedade, mais especificamente no senso comum; de
que o determinismo tecnológico é modelador da sociedade, mas não é reciprocamente
modelado por ela. Há uma passividade em aceitar a imagem estereotipada da inovação
tecnológica: um processo lento, extremamente sofisticado e criado em laboratório
hermeticamente fechado à complexidade antropsicomultisociocultural das relações humanas,
pelo mago solitário (o cientista), a trabalhar em um contexto de neutralidade científica, livre de
juízo de valor e de implicações político-sociais. Como conseqüência desta imagem, tende-se à
crença na soberania da ciência sobre todas as coisas e os homens; uma espécie de fé cega em
seu poder de tudo transformar e controlar.
Em contraponto, o pensamento de que a tecnologia é a única força que direciona a história vem
sendo denunciado e substituído por modelos mais complexos, a exemplo do modelo
estruturacional da tecnologia proposto pela Wanda Orlikowski, renomada pesquisadora do MIT
(Massachusets Institute of Technology), enfatizando a dualidade da tecnologia (Orlikowski,
1992). Esta pesquisadora estendeu a teoria da estruturação de Anthony Giddens (1989),
objetivando analisar a interação entre tecnologia e organização. Rodrigues Filho e Silva (2001,
p.7) entendem a dualidade da tecnologia (Figura 1) da seguinte forma: “a tecnologia é criada e
modificada pela ação humana e ainda é, também usada pelo homem para realizar alguma coisa.
Assim podemos dizer que:
- a tecnologia é tanto objetiva (fisicamente construída por atores trabalhando num contexto
particular social e histórico) quanto subjetiva (socialmente construída pelos atores através dos
significados atribuídos a ela);
- a tecnologia, uma vez construída, tende a se tornar reificada e perde a sua conexão com os
atores que a construíram e deram-na significado”.
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Revista da Ciência da Administração – versão eletrônica – vol. 01, jan. / jun. 2007
Figura 1 – Dualidade da tecnologia
Habilita / Limita
TECNOLOGIA
AÇÃO HUMANA
Cria e altera
Fonte: Rodrigues Filho e Silva (2001)
4 A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
Nos últimos anos, tem-se utilizado uma diversidade de denominações para representar o
momento histórico nomeado como “pós-industrial”, caracterizado pelo “novo paradigma técnico-
econômico” e tendo como base as tecnologias de informação e comunicação: sociedade de
redes, sociedade do conhecimento, sociedade da informação, etc.
Masuda (1982) considera a “sociedade da informação”, uma sociedade em que o peso do
sistema econômico produtivo é cada vez mais centrado no fator informação, assim como os
sistemas sociais anteriores ficaram conhecidos como a sociedade caçadora, sociedade agrícola
e sociedade industrial. O autor não limita sua análise à dimensão econômica, apontando outras
características que o futuro desenvolvimento das tecnologias da informação veio confirmar como
interação em redes, tendência à globalização, etc. Para ele, a base desta sociedade será a
produção de valores informacionais intangíveis, em substituição aos valores tangíveis; e
prevalecendo a indústria do conhecimento, quaternária, expandindo-se a partir de uma economia
sinérgica. A sociedade da informação será, para o autor, uma comunidade voluntária e voltada
para o benefício social.
Contudo, há estudiosos que enxergam nesta sociedade da informação, com a onda de
fusões e reorganizações de grupos econômicos; regulamentações e desregulamentações de
mercados; além da valorização sem precedentes do ativo “conhecimento” - de novo e sempre, o
capitalismo de progresso unilateral, extremamente concentrador de renda e poder. Para De
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Landa (1997), o resultado destas grandes fusões de empresas é o poder de eximir-se das
“regras” do mercado, constituindo-se em um “antimercado” porque passa a ser dono dele, uma
vez que as grandes literalmente “fazem” os preços, e não sendo à toa que elas tenham um peso
residual na produção do emprego.
Ainda sob a ótica econômica, há que se considerar a nitidez da conjugação da sociedade
da informação com a lógica abstrata da mercadoria (Bourdieu, 1996a), que é mostrada
enfaticamente por Aronowitz (apud Bourdieu, 1996b) em sua obra referente à “fábrica do
conhecimento”. Para o autor, “as universidades americanas praticamente abandonaram seu
mandato educativo e social para restringir-se ao atrelamento capitalista, perfazendo o pano de
fundo da competitividade sem limites”. O que isto significa? Significa abrir mão do compromisso
histórico com a construção do conhecimento de interesse coletivo da humanidade, e aprisionar-
se à seletividade de cursos técnico-funcionalistas, sistematicamente ditados / ordenados
segundo a demanda do mercado. Demo (2000) completa: “Com efeito, o conhecimento mais
inovador é provocado pelo mercado, que necessita do ímpeto desconstrutivo do conhecimento,
particularmente do conhecimento dito pós-moderno, colocando a inovação mercantilizada como
razão maior de ser”.
Em obra recente de Bauman (1999), tem-se a impressão de que a vida em sociedade é
ambígua, como são, ademais, as relações de poder. Para Foucault (apud Arantes et. al., 2000),
o poder se esgueira pelas beiradas, busca não ser percebido para influir tanto mais, procura a
obediência do outro sem que este a perceba, inventa privilégio que a vítima pensa ser mérito,
usa melhor o conhecimento para imbecilizar. Para Demo (2000) não seria diferente com a
informação, uma vez que desinformar pode ser seu principal projeto. Segundo o autor: “Não se
trata apenas de nos entupir com informação de tal forma que já não a saibamos manejar, mas
sobretudo usá-la para seu oposto, no sentido mais preciso de cultivo da ignorância. Mais que
tudo, o conhecimento é ambivalente: sempre foi nossa arma mais decisiva da emancipação, mas
não o é menos da colonização. O processo atual de globalização aponta para esta direção de
modo ostensivo: o que mais se globaliza são formas globalizantes de discriminação. Longe de
as chances estarem mais bem distribuídas, concentram-se em clivagens tanto mais drásticas”.
Matta (1980) afirma que a expansão quantitativa da informação pode levar à desinformação,
distorção e supervalorização de fatos não relevantes e ao silêncio sobre situações
comprometedoras para os interesses do sistema.
Portanto, há a possibilidade sem precedentes, na sociedade da informação, de
desenvolvimento do conhecimento que proporcione condições mais favoráveis de condução
autônoma, porém, apresentando-se eminentemente atrelada à competitividade econômica
determinada pela dinâmica do mercado neoliberal, representado pela volatilidade do capital, sem
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pátria, globalizado (Castells, 1997). Em termos teóricos, vive-se o que Marx assinalava como o
processo produtivo (não menos espoliativo) de “mais-valia relativa”: fundada em ciência e
tecnologia, a produtividade econômica é nutrida pela inteligência do trabalhador, e não mais pela
sua força física. A necessidade fundamental do mercado livre é por profissionais qualificados,
com alta capacidade operacional e que passaram por um processo educacional onde a
educação era um produto pronto e acabado a ser absorvido e reproduzido para resolver os
problemas técnicos deste mercado livre, a um menor custo; e não necessariamente sendo
exigido dos profissionais, a capacidade de análise crítica e denúncia das condições restritivas do
status quo.
5 EDUCAÇÃO E SOCIEDADE
Em um contexto onde a construção social da realidade acontece pela “existência de
significados culturalmente compartilhados” que permite o processo de interação, organização,
legitimação e institucionalização dos sistemas / estruturas sociais, poder-se-ia perguntar: Que
sentido vem sendo atribuído à educação, como um todo, dentro da sociedade? Qual o valor da
educação na, e para a sociedade? Da resposta a estas perguntas segue-se uma compreensão da educação e do seu direcionamento.
Ao longo da prática educacional é possível identificar três tendências filosófico-políticas
de entendimento do sentido da educação na sociedade:
• Educação redentora da sociedade: objetiva integrar harmonicamente os indivíduos
no todo social existente; ela deve “reforçar os laços sociais, promover a coesão
social e garantir a integração de todos os indivíduos no corpo social” (Saviani, 1987).
Nesta tendência, a educação atua sobre a sociedade como uma instância corretora
dos seus desvios, tornando-a melhor;
• Educação reprodutora da sociedade: a educação é vista como elemento da própria
sociedade, sendo determinada por seus condicionantes econômicos, sociais e
políticos, e consequentemente, a serviço dessa mesma sociedade e de seus
condicionantes. Louis Althusser em sua obra “Ideologia e aparelhos ideológicos de
Estado”, afirma que na sociedade moderna, a Escola substituiu a Igreja no esquema
da reprodução através da veiculação de valores. O autor é fatalista ao afirmar a
impossibilidade da escola em trabalhar pela transformação da sociedade porque ela
é instrumento de reprodução e manutenção do sistema social vigente;
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• Educação transformadora da sociedade: esta terceira tendência tem por perspectiva
compreender a educação como mediação de um projeto social, isto é; por si, ela nem
redime, nem reproduz a sociedade, mas serve de meio, ao lado de outros meios,
para realizar um projeto de sociedade; projeto que pode ser conservador ou
transformador. Os teóricos desta tendência, não negam que a educação tenha um
papel ativo na sociedade, nem recusam reconhecer seus condicionantes histórico-
sociais. Ao contrário, consideram a possibilidade de agir a partir dos próprios
condicionantes históricos.
As instituições educacionais são antes de tudo instituições sociais, refletindo o modo
como a sociedade que as construiu, atende às suas necessidades materiais, sua concepção do
homem, ou talvez, o sistema mais conveniente à reprodução das relações de poder que se
manifestam em seu seio (Gil, 1994). Como instituições sociais, elas são o reflexo do sistema
social que as inclui, com suas contradições internas e inerentes a esse mesmo sistema social.
Esta estreita relação entre educação e sociedade pode ser analisada, por exemplo, na
História da Educação no Brasil, onde as tendências pedagógicas, muitas vezes, são expressões
de posicionamentos divergentes quanto às questões sócio-econômicas e ao processo de ensino-
aprendizagem. Neste contexto, identificam-se duas forças antagônicas a coexistirem de acordo
com a diversidade de interesses presentes na sociedade: uma representando o
conservadorismo, e a outra a necessidade de transformação. Estas duas linhas de pensamento
são encontradas em dois tipos de práticas pedagógicas: liberal e progressista. É no primeiro
grupo que são localizadas as tendências conservadoras. Para Libâneo (1989): “a pedagogia
liberal sustenta a idéia de que a escola tem a função de preparar os indivíduos para o
desempenho de papéis sociais, de acordo com as aptidões individuais. Para isso, os indivíduos
precisam aprender a adaptar-se aos valores e às normas vigentes na sociedade de classes
através do desenvolvimento da cultura individual. A ênfase no aspecto cultural esconde a
realidade das diferenças de classes, pois embora difunda a idéia de igualdade de oportunidade,
não leva em conta a desigualdade de condições”. Este grupo é representado basicamente por
quatro tipos de pensamentos. O primeiro se expressa pela tendência liberal tradicional, o
segundo, pela tendência liberal progressiva renovada, o terceiro pela renovada não-diretiva e por
fim, a tecnicista.
Quanto às tendências progressistas, há três grupos: a libertadora, a libertária e crítico-
social dos conteúdos. Ainda segundo Libâneo (1989): “O termo progressista, emprestado por
Snyders, é usado aqui para designar as tendências que, partindo de uma análise crítica das
realidades sociais, sustentam implicitamente as finalidades sócio-políticas da educação.
Evidentemente a pedagogia progressista não tem como se institucionalizar numa sociedade
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capitalista, daí ser ela um instrumento de luta dos professores ao lado de outras práticas”. Trata-
se, por conseguinte, de um posicionamento frente à educação que expressa justamente o desejo
de transformação social.
Tanto o conceito de educação como o de ensino evoluíram a partir de pesquisas de
autores como Saviani (1987), Mizukami (1986), Libâneo (1994), Vasconcellos (1995), Campos
(1996) e Demo (1997) que relataram as principais características das teorias da educação, cujo
objetivo é a aprendizagem. Haydt (1996), por sua vez, sintetiza a evolução do conceito de ensino
da seguinte forma:
Conceito etimológico: “Ensinar é colocar dentro, guardar no espírito”.
Conceito tradicional (Aprender): “Ensinar é transmitir conhecimento”.
Concepção da Escola Nova (Aprender a aprender): “Ensinar é criar condições de
aprendizagem”.
Conceito tecnicista (Aprender a fazer): “O ensino deve se inspirar nos princípios de
racionalidade, eficiência e produtividade”.
5.1 As perspectivas educacionais
A análise da evolução do processo educacional e a possibilidade de relação com a
tecnologia da informação torna-se mais compreensível quando se apresenta um referencial
histórico das principais perspectivas educacionais facilitadoras ou não desta relação. O Quadro 3
apresenta as características das três principais concepções no século vinte.
Quadro 3 – As principais perspectivas educacionais no século XX
PERSPECTIVA CLÁSSICA PERSPECTIVA HUMANISTA
PERSPECTIVA MODERNA
* Adaptação dos alunos aos
objetivos da escola
* Adaptação da escola às
necessidades dos alunos
* Harmonização entre as
necessidades dos alunos e
os valores sociais
* Certeza * Dúvida * Probabilidade
* Competição * Cooperação * Crescimento
* Autocracia * Laissez-faire * Participação
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* Disciplina * Liberdade * Responsabilidade
* Reprodução * Descoberta * Criatividade
* Orientação para o conteúdo * Orientação para o método * Orientação para a solução
de problemas
* Ênfase no ensino Ênfase na aprendizagem * Ênfase no processo
ensino-aprendizagem
Fonte: adaptado de Gil (1994, p.27)
A experiência tem mostrado a predominância da perspectiva educacional clássica,
mesmo diante das potencialidades da T.I. na construção de um saber crítico, base para a
formação do sujeito histórico. E esta perspectiva voltada para a reprodução; o ‘como’, ao
contrário do ‘por que’, garante o exercício continuado do poder mantenedor do status quo, o qual
dispõe dos meios de comunicação de massa e um sistema educacional, que perpetuando o
pensamento dominante, fazem-no por um processo de condicionamento social cada vez mais
implícito que explícito – mais aceito como “natural” que aceito por convencimento, justamente
para obter a submissão, ainda que diante da prevalência de desigualdades em suas diversas
matizes. “Por isso, mais eficiente que impedir a educação formal do povo, privando-o inclusive
do acesso mais elementar – a alfabetização -, é implantar um sistema de ensino e de dominação
da mídia que seja capaz de reproduzir as estruturas sociais desejadas”(Silveira, 2000, p.82).
Uma denúncia em complemento ao classicismo educacional, feita por diversos autores, é
quanto à tentativa de aplicar às instituições educacionais os mesmos princípios e métodos
administrativos vigentes na empresa capitalista (Paro, 1998). A administração de uma empresa
capitalista essencialmente busca a “utilização racional de recursos para a realização de fins
determinados” (Paro, 1986, p.18), diferentemente da prática educativa que é a de formar sujeitos
livres, dentro de sua culturalidade, pela educação; esta última, “entendida como a apropriação
do saber historicamente produzido” (Paro, 1997, p.108). Não se está negando a importância da
administração escolar gerenciar a aplicação correta dos escassos recursos; questiona-se o ato
de transformar o controle rigoroso dos custos educacionais como única justificativa para a
manutenção da instituição escolar. Gentili (1995, p.158) completa: “Políticos, empresários,
intelectuais e sindicalistas conservadores não hesitam em transformar qualquer debate sobre
educação em um problema de ‘custos’(...). A esta altura dos acontecimentos, ninguém duvida
que temos de educar ‘para a cultura do trabalho’; o que em bom português, quer dizer ‘educar
para a cultura do mercado’. Os termos ‘eficiência’, ‘produtividade’, ‘produto educativo’,
‘rentabilidade’, ‘custo da educação’, ‘competição efetiva’, ‘excelência’, ‘soberania do consumidor’,
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‘cliente-aluno’, etc. não são um produto alucinado de nossa exagerada crítica ao mundo dos
negócios. Trata-se simplesmente do vocabulário que compartilham aqueles que professam sua
fé nesta nova retórica”.
6 T.I NA EDUCAÇÃO: A RELAÇÃO HOMEM-MÁQUINA NO PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM
A informática só começou a ser utilizada na educação na década de 70, a partir do
microcomputador, o qual foi usado para fins administrativos, evoluindo gradativamente para fins
pedagógicos à medida que a linguagem de computação se aproximava da linguagem humana. A
partir dos anos 80, o tema informática na educação foi bastante debatido uma vez que questões
graves foram levantadas como a influência deletéria da tecnologia sobre a cognição, ênfase no
pensamento lógico-simbólico e algoritmo em detrimento da criatividade, etc.
Atualmente, há uma vasta possibilidade de aplicação das novas tecnologias da
informação e comunicação ao campo da educação: educação à distância, os softwares
educacionais, as bibliotecas digitais, os Programas de TBT (Treinamento Baseado em
Tecnologia), grupos de “bate-papo”, etc. Mas será que todas estas alternativas facilitam o
processo de ensino-aprendizagem? Segundo Piaget, o aluno aprende quando elabora respostas
compatíveis com o seu nível de desenvolvimento, relacionando novos conceitos ou ações aos
previamente assimilados. O aluno deve ser agente do seu próprio conhecimento, aprendendo
por fazer, não receber instruções acabadas que por vezes estabelecem a dicotomia entre o que
o aluno já aprendeu e o novo conhecimento. Acontece, lamentavelmente, que os “produtos”
educacionais disponíveis no mercado atual, apresentam pouca interatividade, irrisória inovação e
escassa criatividade, direcionando o processo ensino-aprendizagem mais para a “domesticação”
à determinada informação do que propriamente para a aprendizagem efetiva, e muito menos à
construção do sujeito histórico crítico. Ressalta-se ainda, que a elaboração destas tecnologias
educacionais é feita, na maioria das vezes, por técnicos que não entendem de educação, o que
justifica a baixa qualidade didática dos pacotes pedagógicos impostos pelas escolas e empresas
como potencialmente revolucionadores do ensino.
Kerr (1996) aponta uma suscetibilidade na sociedade em aceitar a idéia de que a
tecnologia é inerentemente boa, fruto de um conhecimento neutro, e que “se a tecnologia torna
possível de se fazer alguma coisa, então, esta coisa deve ser feita”. No contexto educacional,
não é suficiente apenas equipar as instituições de ensino com modernos recursos tecnológicos,
e negligenciar a conscientização e treinamento docente para a tecnologia educacional. Tal
negligência, pode levar a situações onde muitas escolas possuem entulhos empoeirados de
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equipamentos de informática em completa ociosidade. Gomes (1999), em conferência, menciona
as dificuldades advindas da absorção das novas tecnologias pelo modelo brasileiro, destacando
a formação de recursos humanos na escola. São elas:
- “Inexistência de um componente curricular tratando das tecnologias de informação e de
comunicação, nos cursos de formação de professores para as séries iniciais.
- Na educação continuada, uma visão equivocada de que deve ser enfatizada uma preparação
técnica, em detrimento da exploração pedagógica das tecnologias de informação e
comunicação.
- Ausência de estímulos e orientação para atitudes de empreendedorismo”.
No panorama da sociedade de informação, apresenta-se um outro aspecto da influência
tecnológica no processo ensino-aprendizagem que é de ordem espaço-temporal. De forma
predominante na sociedade industrial, a aquisição de conhecimentos teóricos acontecia
gradativamente até um determinado grau de escolarização do indivíduo, obrigado a se deslocar
fisicamente até a instituição designada para a tarefa de ensinar e aprender. Era pressuposto
aceito, que completando o “tempo de escola” a pessoa possuía conhecimentos e informações
suficientes para iniciar-se em alguma profissão perene.
“Na atualidade, o que se desloca é a informação”, diz Virilio (1993). E este deslocamento
acontece em dois sentidos: o primeiro, o da espacialidade física, em tempo real, sendo acessada
através das tecnologias de informação e comunicação de qualquer localidade geográfica do
mundo. O segundo, pela sua alteração constante e veloz, sua transformação temporal intensiva
e fugaz. Daí se afirmar a impossibilidade de se considerar a pessoa totalmente formada,
independente do grau de escolarização alcançado.
6.1 Efeitos da utilização da T.I. no desenvolvimento social do indivíduo
Na interação com uma tecnologia da informação como é o computador, estão em jogo
diversos aspectos do funcionamento cognitivo, como a criação de outras formas de relação
espaço-temporal; o gerenciamento da memória; a forma de representação do conhecimento e
sua capacidade de modelar o real (Bittencourt, 1998). Por isso, o uso da T.I. na educação, de
um modo geral, tem gerado dois grupos de discussão: o primeiro que a considera como
instrumento de atuação pedagógica, ou seja, mais uma ferramenta disponível ao processo
ensino-aprendizagem, não necessariamente se apresentando como a única e a indispensável. O
segundo grupo, a preconiza como protagonista do ensino, o que significa dizer, a tecnologia
educacional pode substituir a função do professor nos anos de formação do indivíduo. Antes de
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se considerar algumas questões sobre os efeitos do uso da T.I. no desenvolvimento social do
indivíduo, vale o esforço de entender o que é a tecnologia educacional. Ely (1997) define
tecnologia educacional como teoria e prática do projeto, desenvolvimento, utilização,
administração e evolução dos processos e recursos para a aprendizagem. Não se pode
confundir o uso da T.I. no processo educacional, com o ensino de computação, simplesmente.
“O uso da informática é uma das facetas do uso da T.I. na educação e esta deve ser percebida
no e para o ensino e, de modo geral, para a educação”(Argenta & Brito, 1995, p.5).
Há sérias questões a serem consideradas no que diz respeito ao desenvolvimento das
aptidões sociais e das competências emocionais do educando. Especialmente nos anos de
formação do indivíduo, o inter-relacionamento é decisivo para que as habilidades sociais e
emocionais sejam desenvolvidas; entretanto, o incentivo à atuação individualizada / isolada
diante do computador, minimiza drasticamente qualquer possibilidade de estabelecer contato
pessoal com outro. Acrescente-se a isso o poder deletério e incisivo da mídia em pregar o
discurso de “moderno” ao uso indiscriminado da informática na educação, sem considerar os
potenciais problemas de ordem sócio-cognitivos. Como conseqüência, é imperativa uma
avaliação crítica do quão nocivo ao desenvolvimento de competências emocionais pode ser esta
utilização indiscriminada da informática na educação; devendo a T.I. ser considerada como
ferramenta a cumprir a tarefa de agregar valor ao trabalho docente e às relações pessoais, e não
substituí-los por recursos impessoais e automatizados. Goleman (1998) completa: “O ensino
com o auxílio de computador, um recurso muito em moda no treinamento hoje em dia, tem
limitações quando se trata de proporcionar prática e competência emocional. Embora essa
modalidade seja promissora em termos de ensino individualizado, fixação de ritmo próprio,
oportunidades em caráter privado de ensaio e prática, comentário imediato sobre o progresso
obtido e ajuda retificadora, e apresente outras vantagens análogas, as técnicas que usam o
auxílio de computador geralmente são mais adequadas para o treinamento de habilidades
técnicas do que para o desenvolvimento de capacidades pessoais e interpessoais”.
Adicionalmente, é preciso considerar a faixa etária e o desenvolvimento cognitivo do
indivíduo, objetivando estabelecer parâmetros para a introdução de recursos informatizados na
educação. Setzer (1999), Professor Titular de Ciência da Computação do Instituto de
Matemática e Estatística da USP, é contrário ao uso da informática na infância, particularmente
no processo educacional, porque esta utilização estaria precocemente estimulando um raciocínio
puramente abstrato. O professor justifica: “Porque o computador força o pensamento lógico-
simbólico e algoritmo. Esse é um pensamento muito particular que a gente até desejaria que
todos os adultos tivessem a capacidade de exercer – e eu acho que nem todos têm -, mas que é
absolutamente inapropriado para crianças e jovens antes dos 15, 16 anos. Porque a gente
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espera que uma criança pense mais qualitativa do que formal e quantitativa, como o computador
exige (...)”.
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Arnold Toynbee (apud Servan-Schreiber, 1974) considera as grandes crises
contemporâneas como resultado do abismo que se cavou entre o espetacular desenvolvimento
das ciências (e do poder colocado, deste modo, nas mãos dos homens) e a estagnação dos
conceitos éticos e políticos (que regem o modo de utilização desse poder). É o que se poderia
denominar “gap moral”, para o qual as novas tecnologias informacionais podem contribuir para
sua redução ou ampliação.
Para uns, vive-se em um contexto de sociedade da informação, para outros, o da
informatização, onde as soluções são aparentemente rápidas e pragmáticas, onde predomina a
multiplicidade e a superficialidade, onde o conhecimento é simulação de diversas situações,
categorias bastante presentes no discurso pós-moderno (Harvey, 2000). Diversas são as formas
de elaboração e distribuição da informação, e hoje, ela se apresenta estreitamente vinculada à
idéia de independência, quer seja econômica ou política (Matta, 1980); o que justifica o
agravamento dos desníveis entre os países, não mais a partir do poderio militar, ou unicamente
econômico; mas a partir da detenção de direitos intelectuais sobre tecnologias e da apropriação
do conhecimento, por meio do controle do acesso à informação (Silveira, 2000, p.87).
Anísio Teixeira (apud Rocha, 2000) dizia que “a educação faz-nos livres pelo
conhecimento”, e que democracia é, literalmente, educação. Dizia ainda que o processo
educativo não é apenas “treino e domesticação”, mas fundamentalmente, a formação do cidadão
livre e consciente, base e condição para a democracia e a construção do sujeito histórico.
Acontece, que para essa construção, entre outras coisas, o processo de qualidade na
informação não significa apenas rapidez de acesso ou circulação facilitada pelas tecnologias de
informação e comunicação; é preciso que ela (a informação) seja percebida e entendida, senão
criticamente rejeitada. E essa capacidade somente pode ser desenvolvida pela educação
“enquanto condição imprescindível da própria realização histórica do homem” (Paro, 1997,
p.108). Infelizmente, a educação está sendo vista como uma atividade que produz receitas, cria
empregos e gera lucros (EXAME, abr/2002) porque a pouco e pouco, institucionaliza-se o mito
de que ela é agente de preparação para o trabalho. Mas será que a Escola pode criar os
empregos que o sistema produtivo, por conta da crise do capitalismo, não consegue criar? Será
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que sua função é de apenas servir ao capital com a (re)produção funcional de um conhecimento
pragmático, “descartável” e superficial; perpetuando indefinidamente o status quo??
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vol. 01, jan. / jun. 2007 ISSN 0000-0000 - v. eletrônica
UMA ANÁLISE EMPÍRICA ÀS METAS DA EMPRESA FAMILIAR
Catarina Afonso Alves1 Licenciada em Gestão de Empresas Mestranda2 em Gestão Docente no Instituto Politécnico da Guarda Escola Superior de Tecnologia e Gestão
RESUMO
Longe de ser uma organização anacrónica, a empresa familiar, nas suas diversas formas, ocupa
um espaço importante nas economias industrializadas e emergentes. A relação entre família e
empresa confere-lhe características especiais em que se confundem as esferas económica e
familiar.
Nas últimas décadas, vários trabalhos têm surgido sobre esta realidade empresarial, em
particular nos Estados Unidos e, mais recentemente na Europa. No entanto, os temas abordados
centram-se mais nos problemas específicos como a sucessão, o conflito cultural e a
profissionalização, sendo escassos o estudo dos domínios da gestão propriamente dita.
O presente artigo tem por base uma amostra de empresas familiares do Sector Têxtil do distrito
de Castelo Branco em Portugal. Procura-se estudar a particularidade deste tipo de empresa,
identificando as metas de gestão que orientam a sua actuação como empresa.
PALAVRAS CHAVE: Empresa Familiar, Metas Organizacionais.
ABSTRACT
Far from being a anachronistic organisation, the family firm, in its diverse forms, occupies an
important space in the industrialised and emergent economies. The relationship between family
and business adds special characteristics in which economic and family spheres are fused.
In the last decades, various studies have appeared on this business reality, in the United States
in particular and, more recently in the Europe. However, the subjects touched on are centred 1 Catarina Afonso Alves, Quinta de São Lázaro, lote 10 – 3º Direito, 6200-087 COVILHÃ-PORTUGAL Telemóvel: 965418338; e-mail: [email protected]
1
more on specific problems such as succession, cultural conflict and professionalization, thus
dealing little with the study of the areas of the management specifically.
This paper is based in a sample of family firms in the Textile Sector located in the district of
Castelo Branco, Portugal. It seeks to study the particularity of this type of organisation, identifying
the management goals that guide its performance as firm.
KEY WORDS: Family Firm, Business Goals
1 INTRODUÇÃO O ponto de partida para o processo estratégico reside no reconhecimento das metas da empresa
e na definição dos seus objectivos, permitindo que os sócios ou dirigentes possam precisar o
seu pensamento quanto ao futuro da empresa e analisar o nível de acordo entre os seus
membros (Weill, 1995).
A empresa é um corpo social complexo, constituído por indivíduos e grupos cujas aspirações
podem ser as mais diversas. A noção de sistema que se afirmou nos últimos 30 anos considera
que as partes da empresa (pessoas) têm objectivos próprios e são cada vez menos
dependentes, mais educadas e ambiciosas (Cardoso, 1999). Quando se trata de uma empresa
familiar, o corpo social é ainda mais complexo, pois neste incluem-se três subsistemas – família,
propriedade e gestão – que interagem entre si, no qual, uma mudança numa das partes afecta
todo o sistema.
Em termos económicos e sociais, as empresas familiares são consideradas um tema de estudo
importante, uma vez que estas geram nos Estados Unidos entre 40 a 60% do Produto Nacional
Bruto (Ward e Aronoff, 1990) e empregam cerca de 50% da força de trabalho (Gersick e outros,
1997).
Sharma e outros (1997) apontam que as diferenças entre empresas familiares e não familiares
situam-se na definição das metas, na forma como o processo é conduzido e nos intervenientes
no processo. Complementando, Oliveira (1999) acredita que não é correcto afirmar que a
empresa familiar é igual a qualquer outra empresa, pelo simples facto de que uma estrutura
familiar, quando integrada numa empresa, proporciona uma série de abordagens e interacções
específicas de uma família, provocando algumas particularidades na sua actuação.
2Tese de Dissertação de Mestrado entregue em Julho2003, neste momento aguarda defesa da mesma.
2
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Este estudo foi desenvolvido tendo como tema central as metas das empresas familiares e
iniciar uma reflexão sobre as seguintes questões: Quais as metas de gestão que as empresas
familiares mais privilegiam, ou seja, poderão ser encontradas simultaneamente as duas
dimensões: a família e o negócio? Que diferenças, na natureza das metas, podem ser
encontradas tendo em conta factores associados à passagem do tempo?
Para que objectivo fosse alcançado foi desenhado um questionário que posteriormente foi
aplicado a uma amostra de proprietários ou fundadores de empresas familiares portuguesas.
2 CONCEITO DE EMPRESA FAMILIAR
No que respeita à definição de empresa familiar, não há uma que seja geralmente aceite
(Handler, 1989). O que se verifica frequentemente é que as definições sobre empresas
familiares propostas pelos investigadores assentam em elementos comuns, não
necessariamente coincidentes, mas complementares.
Da revisão da literatura realizada sobre o conceito de empresa familiar, encontra-se uma
diversidade de definições.
Donnelley (1996) considera tratar-se de uma empresa familiar quando esta se identifica com,
pelo menos, duas gerações de uma família, provocando esse elo de ligação influências mútuas
na política da empresa, nos interesses e objectivos da família.
Gallo e Ribeiro (1996) consideram uma empresa familiar quando existe um importante elo de
ligação entre uma empresa e uma família, o elo pelo qual parte da cultura de ambas, formada
nos pressupostos básicos de actuação e valores, é permanente e voluntariamente partilhada.
Esta definição aproxima-se muito da definição apresentada por Donnelley (1996) no que respeita
ao elo de ligação entre família/empresa e valores partilhados. No entanto, Gallo e Ribeiro (1996),
reconhecem que a influência da família sobre a cultura da empresa ou a influência recíproca
família/empresa são aspectos difíceis de operacionalizar.
Por outro lado, a detenção da propriedade e do poder de uma empresa familiar pode ser
alargada a várias famílias (Handler, 1989; Dyer, 1996). Dyer (1996) define como empresa
familiar toda a organização na qual as decisões relacionadas com a sua posse ou gestão são
influenciadas pela sua relação com uma família ou famílias.
Segundo Chua, Chrisman e Sharma (1999), a empresa familiar é aquela que é dirigida ou gerida
numa base de transmissão de geração em geração, para atingir uma visão formal ou implícita da
empresa, sendo propriedade de uma única família ou de um pequeno número de famílias.
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Alguns autores manifestam-se contra caracterizações muito estereotipadas de empresas
familiares (Guerreiro, 1996), que consideram pouco enriquecedoras e limitativas da sua
diversidade. Na sua investigação, Guerreiro (1996) considera duas realidades de análise
distintas: por um lado, as famílias empresariais e, por outro, as empresas familiares, cuja relação
se centra em torno de duas dimensões fundamentais: a composição do capital e a estrutura da
direcção da empresa.
À luz do que é dito, verifica-se que as diferentes abordagens ao conceito confirmam a existência
de dimensões que caracterizam claramente uma empresa familiar, tais como, a propriedade, o
controlo, a estrutura da direcção da empresa e a presença de uma ou mais famílias na
organização, e ainda aparecem outras dimensões menos fáceis de operacionalizar, nas quais se
destaca a cultura e valores existentes na empresa familiar.
Por tudo o que já foi apontado, pode salientar-se que a empresa familiar não coincide com a
imagem da empresa racional orientada para o lucro, antes se trata de um sistema organizado
em torno de relações com uma forte carga emocional (Davis e Stern, citados em Ussman, 1996).
Para Holland e Boulton (1996), os bons ou os maus resultados não dependem da empresa ser
familiar, antes da forma como as relações no seio da empresa familiar são geridas.
Em Portugal, a Associação Portuguesa das Empresas Familiares (APEF) toma por definição de
empresa familiar a seguinte: “A empresa familiar é aquela em que uma Família detém o controlo
em termos de nomear a gestão e alguns dos seus membros participam e trabalham na
empresa”.
Como se pode ver, está longe de ser encontrada uma definição única de empresa familiar.
Contudo, é necessário identificar uma definição que sirva como referência e seja operacional
para se prestar à selecção de amostras para investigação.
Assim, no presente trabalho, define-se empresa familiar como “aquela em que mais de 50% do
capital social é detido por um grupo unido por relações de parentesco (de sangue ou matrimónio)
e na qual é reconhecida como uma empresa familiar (pelo(s) responsável(s) e trabalhadores)”.
A escolha desta definição de empresa familiar deve-se ao facto de ser facilmente
operacionalizada, mas sobretudo porque tem em conta duas questões chave: a percentagem
maioritária do controlo do capital e a percepção de que a empresa é uma empresa familiar.
4
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3 A EMPRESA FAMILIAR: ALGUMAS REFLEXÕES
A investigação sobre empresas familiares, nos Estados Unidos, tem merecido uma considerável
atenção nas últimas décadas (Handler, 1989; Ward, 1987). Para Gilding (2000) esta crescente
atenção pode ser atribuída: 1) pela redução da tendência das empresas familiares protegerem a
sua privacidade (riqueza “secreta” – stealth wealth), 2) o ressurgimento das empresas de
pequena e média dimensão que acompanhou a “terceira revolução industrial” ou a
reestruturação económica da actual era da informação, e 3) o mais importante, a mudança do
conceito “família3” na sociedade ocidental.
A empresa familiar tem sido e continua a ser um dos principais agentes da economia, tanto no
âmbito nacional, como no internacional (Gallo e Ribeiro, 1996). Segundo estes autores, não se
observa a existência de uma verdadeira consciência dessa importância, tanto por parte da
Administração Pública, como por parte da sociedade em geral. Tal facto, pode ter origem na falta
de estudos que analisem a sua incidência na economia (Shanker e Astrachan ,1996), e no facto
dos poucos estudos existentes serem difíceis de comparar e agrupar, por não existir uma
definição geralmente aceite de empresa familiar (Gallo e Ribeiro, 1996).
Em termos europeus também se constata uma escassez de estudos especializados nesta
matéria e a inexistência de uma definição homogénea de empresa familiar. A carência de
informação sobre empresas familiares em Portugal tem suscitado o aparecimento de vários
trabalhos focando áreas diversas da sua actuação, tais como a problemática da sucessão
(Ussman, 1994, Guerreiro, 1996, Loureiro, 1998), as práticas de Gestão de Recursos Humanos
(Lopes, 1999), o desenvolvimento da gestão de recursos humanos e o sucesso
económico/financeiro (Martins, 1999) e a transição da gestão familiar para a gestão profissional
(Brás, 2000). Segundo a Associação Portuguesa das Empresas Familiares, em Portugal não
existe ainda um levantamento rigoroso sobre empresas familiares, mas estas estão fortemente
implantadas em quase todos os sectores da actividade económica e são responsáveis pelo
emprego da maioria da população activa e pela maior parcela do Produto Interno Bruto (PIB).
A dimensão numérica das empresas familiares na Europa conduziu à formação de duas
organizações internacionais: O Family Business Network (FBN) e o European Group of Family
Enterprises (GEEF-Groupement Europeén des Entreprises Familiales).
3 Para Gilding (2000), o termo “família” não é mais restrito à tradicional família nuclear unida pelos laços de sangue mas estende-se às famílias de três e quatro gerações e famílias adoptivas com várias culturas. O termo “família” sofre uma mudança na sua estrutura, conferindo-lhe uma maior flexibilidade.
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O Family Business Network foi fundado em 1990 e as suas operações são coordenadas pelo
International Institute for Management Development (IMD) sediado na Suíça. Em 1999, o Family
Business Network tinha aproximadamente 1700 membros em todo o mundo.
O European Group of Family Enterprises foi fundado em 1997 e é constituído por Associações
de empresas familiares da Europa, sendo inicialmente as Associações Nacionais de França,
Espanha, Grã-Bretanha, Alemanha e Itália. Em 2001, o GEEF compreendia oito associações de
empresas familiares como membros, incluindo a de Portugal.
De acordo com dados do International Institute for Management Development as empresas
familiares, na Europa Ocidental, são responsáveis por 45 a 70% do Produto Nacional Bruto,
sendo reconhecido o papel importante que este tipo de empresa desempenha a nível da criação
de emprego.
Tendo em consideração um relatório apresentado em 1998 pelo FBN da Finlândia (Lank, IMD,
s/d), os números disponíveis sobre a realidade europeia são os seguintes: Portugal - 70%, Grã
Bretanha - 75%, Espanha - 80%, Suíça - entre 85 e 90%, Itália - 99% e Finlândia - 70%. Na
União Europeia, as empresas familiares constituem mais de 70% do total de empresas e cerca
de 25% das 100 maiores empresas são empresas familiares (Lank, IMD, s/d).
Contudo, as empresas familiares apresentam uma elevada mortalidade. Muitas vezes, são
razões de ordem externa que afectam todo o tipo de empresas, como as crises económicas, as
mudanças no meio envolvente ou a evolução tecnológica, entre outras (Ward, 1987; Gallo e
Ribeiro, 1996). Contudo, são identificadas possíveis fraquezas originadas por uma gestão do tipo
familiar (Donnelley, 1996):
- Conflitos entre os interesses da família e os interesses do negócio como um todo;
- Carência de lucros e de desempenho na organização originada pelo excesso de disciplina;
- Incapacidade em encontrar novos desafios para o negócio em tempo oportuno;
- Ocorrência de nepotismo em detrimento da definição de critérios objectivos de contratação,
avaliação e desempenho dos empregados.
O desafio de gerir uma empresa familiar está em saber negociar construtivamente as relações
que se estabelecem entre os subsistemas (Ussman, 1996). Por vezes, a correcta gestão das
empresas familiares pode depender mais da gestão de factores relacionados com a família, do
que, propriamente, com as contingências do próprio negócio em si.
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4 A FORMULAÇÃO DAS METAS DA EMPRESA
Segundo Cardoso (1999) o primeiro passo para a formulação da estratégia é a identificação da
missão e os objectivos. A formulação da missão envolve o desenvolvimento de uma descrição
clara do tipo de negócio em que a empresa está empenhada (ou pretende vir a estar), uma
definição concisa dos propósitos que a organização pretende preencher na sociedade e/ou na
economia, (Goodstein e outros, 1993).
Quanto á empresa familiar, a formulação da missão deve traduzir o envolvimento e o tipo de
participação da família no negócio, incluindo as prioridades da família e, a forma como esta se
disponibiliza a participar no negócio, bem como aquilo que a empresa espera do negócio (Ward,
1988). Rock (1997) acrescenta que, numa perspectiva de interacção família/empresa, a
definição da missão deve incluir as aspirações culturais e éticas da família, assim como as
metas e os objectivos comerciais da empresa. Devido ao envolvimento da família, as metas e
objectivos da empresa familiar são naturalmente diferentes das metas e objectivos da empresa
não familiar (Sharma e outros, 1997). A definição das metas da empresa familiar deve ser uma
interacção das necessidades da família e da empresa (Tagiuri e Davis, 1992).
No entanto, vários autores têm tentado identificar quais as diferenças. Para Singer e Donoho
(citados em Sharma e outros, 1997), as metas da empresa familiar devem ser centradas na
família ou na empresa. Outros autores (Danco, Davis e Tagiuri, McGiven, citados em Sharma e
outros, 1997) definem as metas da empresa familiar como uma interacção das necessidades da
família e da empresa.
No ano de 1992, Tagiuri e Davis realizaram um estudo empírico sobre as metas da empresa
familiar no qual se verifica que os proprietários de empresas familiares detém uma influência
poderosa sobre a articulação e implementação das metas da empresa. Tal facto não se deve
apenas ao poder exercido na empresa mas, também à posição e a autoridade que detém dentro
do seio da família. No seu estudo, Tagiuri e Davis (1992) concluem também que a empresa
familiar é propensa a ter metas/objectivos múltiplos, complexos e em mudança, em vez de um
único, simples e constante objectivo. Esta questão poderá estar relacionada com o ciclo de vida
da empresa familiar.
Em termos de definição das metas é importante identificar em que fase se encontra a empresa
familiar. A interdependência entre a família e a empresa assim como a idade do negócio afectam
o crescimento e a selecção de uma estratégia (Ward, 1987).
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O decorrer do tempo, o esforço pelo desenvolvimento como empresa e pela manutenção do
carácter de empresa familiar, fazem com que este tipo de empresas passe por etapas que
apresentam profundas diferenças em relação às empresas não familiares. Segundo Gallo e
Ribeiro (1996), as etapas mais características costumam ocorrer no período inicial em que a
empresa familiar é conduzida pelo seu fundador, nos anos seguintes, em que é dirigida por
membros da segunda geração e no período de tempo que corresponde à incorporação da
terceira geração.
Em termos de definição das metas/objectivos é importante identificar em que fase se encontra a
empresa familiar. Ward (1987) propõe um modelo de três fases de desenvolvimento para a
empresa familiar.
- Numa primeira fase, as necessidades da empresa e da família são compatíveis; o fundador é
quem toma todas as decisões. Segundo Hollander e Helman (citados em Sharma e outros,
1997), esta fase é caracterizada pelo crescimento da empresa familiar, sendo possível
encontrar os indicadores para as metas/objectivos através de uma pesquisa das motivações
e características do fundador.
- Numa segunda fase, o fundador permanece no comando, mas o crescimento e
desenvolvimento dos filhos e da família são de grande importância. Como consequência, as
metas/objectivos da empresa familiar são provavelmente alteradas, reflectindo uma
preocupação em encontrar um lugar assegurado para o futuro dos filhos e/ou filhas.
- Na última fase, as necessidades da empresa e da família entram em conflito. A diminuição
na intensidade das vendas, devido à entrada no período de maturidade, indicia a
necessidade de revitalizar estrategicamente. Esta fase corresponde ao declínio da
capacidade directiva do fundador, sendo um dos principais objectivos a manutenção de uma
boa relação na família. Além disso, os objectivos da empresa podem sofrer alterações
resultantes das necessidades da família ou pelo desejo de implementar uma revitalização
estratégica para alcançar um novo desempenho económico da empresa.
De uma forma geral, para agir estrategicamente é importante entender o que se define como
metas/objectivos da empresa, quem estabelece os objectivos e porquê a empresa selecciona
objectivos particulares.
5 METODOLOGIA DE INVESTIGAÇÃO
Tendo em consideração os objectivos definidos e as características do campo de análise, optou-
se por utilizar o inquérito por questionário composto por três grupos. No primeiro grupo
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encontram-se questões introdutórias destinadas a averiguar se, de facto, se trata de uma
empresa familiar e se enquadra na definição adoptada na primeira parte deste artigo. Este grupo
tem como finalidade permitir a validação do questionário. No segundo grupo as questões
destinam-se à recolha de dados de identificação do principal responsável e caracterização da
empresa. Permite recolher informações sobre as características da empresa e da sua direcção.
No grupo 1 e 2, as variáveis foram medidas através de questões fechadas. Estas, foram
apresentadas sob a forma dicotómica ou de escolha múltipla, de acordo com a sua natureza. O
volume de vendas anual foi classificado numa escala ordinal (ordinal scale).
No terceiro grupo do questionário, utilizaram-se escalas de Likert para medir o grau de
importância das afirmações propostas, que dizem respeito à opinião dos inquiridos sobre as
metas. Os inquiridos foram solicitados a classificar as 20 variáveis apresentadas sobre as
diferentes metas de gestão, financeiras e da família, sendo medidas por uma escala de 5 pontos
(1- nada importante até 5- muito importante). A grelha de metas utilizada foi adaptada do
trabalho desenvolvido por McCann III e outros (2001) onde figura uma grelha de 16 metas, à
qual foram acrescidas quatro metas, de carácter individual, recolhidas do trabalho desenvolvido
por Tagiuri e Davis (1992).
A Figura 1, a seguir apresentada, reúne a ficha técnica do estudo.
Figura 1 – Ficha Técnica
Área Geográfica Distrito de Castelo Branco - Portugal Dimensão das Empresas Micro, pequena e média Unidades de Análise Empresários proprietários, fundadores ou
herdeiros de uma empresa familiar Tamanho da Amostra Inicial 102 Empresários Recolha de Dados Inquérito por questionário:
- 36 administração directa - 66 enviados por correio
Taxa de Resposta 53 questionários preenchidos dos quais 14 considerados não válidos Taxa de resposta: 38,23%
Data dos Dados Recolhidos Dezembro de 2001 Informador Chave Empresário
- Após a recolha dos dados tornou-se necessária a sua análise e interpretação. Para se
poderem utilizar os dados contidos nas respostas ao questionário foi efectuado um tratamento
estatístico dos mesmos, através do software estatístico SPSS (Statistical Package for Social
Sciences). Assim, utilizou-se a seguinte metodologia de trabalho: Análise descritiva das
questões introdutórias e das metas recorrendo a tabelas de frequência e algumas medidas
descritivas (média, moda, mediana e desvio padrão); Análise da variância (ANOVA) para testar a
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igualdade das médias dos diferentes grupos (idade do responsável, antiguidade da empresa e
geração actual) e a homogeneidade das médias relativas às metas que compõem cada
dimensão;
6 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
Das 102 empresas contactadas, obteve-se 39 questionários válidos, o que representa uma taxa
de 38%, em relação aos questionários enviados e uma taxa de 23,4% em relação à população
total (empresas familiares e não familiar) do Distrito de Castelo Branco. A taxa de resposta
obtida pode ser considerada satisfatória, quando comparada com a média de cerca de 25%
referida por Lakatos e Markoni (1996) para questionários enviados por via postal.
6.1 Caracterização das empresas familiares
Em termos de caracterização das empresas familiares (respondentes), do sector têxtil do distrito
de Castelo Branco verifica-se que relativamente ao ramo da indústria a amostra é constituída por
igual importância de empresas da indústria do vestuário (51,3%) e empresas da fabricação de
têxteis (48,7%), que é igualmente a situação que se verifica quando analisamos a totalidade das
empresas4 do distrito.
Na classificação das empresas familiares por dimensão utilizou-se o critério do volume do
emprego, um dos quatro critérios5 constante na recomendação da Comissão Europeia para a
sua definição. Verifica-se que a estrutura dimensional das empresas é caracterizada por
pequenas e médias empresas, uma vez que nenhuma das empresas inquiridas possui um
número de trabalhadores superior a 500 e apenas 2,56% tem um número superior a 250. Mais,
cerca de 18% das empresas são micro-empresas que empregam até 10 trabalhadores, 30,77%
das empresas situa-se entre os 10 e 49 trabalhadores e 48,72% entre 50 e 249 trabalhadores.
Quanto ao volume de vendas relativo ao ano de 2001, constata-se um peso significativo de
empresas que facturam entre 500.001 e 2.500.000 Euros (48,72%). Acima de 5 milhões de
Euros, estão representadas apenas 5,12% das empresas, entre 2.500.001 Euros e 5 milhão de
Euros situam-se 23,08% e, também 23.08% abaixo de 500.000 Euros (inclusivé).
As empresas são, na sua maioria, empresas maduras que já atravessaram um processo de
sucessão (48,72%) do qual resultou a transição para a segunda (35,90%) e terceira (12,82%)
geração.
4 As empresas do distrito incluem as empresas familiares e não familiares. 5 Constam quatro critérios na recomendação da Comissão Europeia: o volume de emprego, o volume de negócios, o balanço total anual, e o critério da independência.
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Quanto às empresas que se encontram na primeira geração (20), 40% tem idade compreendida
entre 20 e 29 anos e 15% tem uma antiguidade superior a 30 anos. Segundo Ward (1987) esta
situação caracteriza as empresas que atravessam um período de maturidade, o que pode
sugerir uma revitalização ao nível estratégico. Ward identifica esta antiguidade (entre 20 e 30
anos) por fase III, em que se coloca ao proprietário o desafio da preparação da transmissão da
posse da empresa para a próxima geração.
6.2 Caracterização dos empresários
O questionário enviado destinava-se aos proprietários ou fundadores da empresa familiar. Pelo
resultados obtidos constata-se que a idade média dos inquiridos é 46,77 anos, tendo o mais
novo 24 anos e o mais velho 75 anos. De notar, que a idade mais comum dos responsáveis pela
empresa é de 34 anos. Ao cruzar a idade do responsável com a geração em que se encontra a
empresa familiar, verifica-se que 91% dos responsáveis com idades compreendidas entre os 46
e 60 anos representam a primeira geração (fundador). A primeira geração é caracterizada por
um conjunto de responsáveis com idades superiores aos 45 anos, evidenciando que em 51,28%
das empresas respondentes, o fundador permanece no comando.
Quando inquiridos sobre a existência de potenciais sucessores, 22 dirigentes afirmam existir
uma ou várias pessoas nessas condições enquanto que 17 dirigentes ainda não consideraram
sequer essa hipótese. Tentando fazer uma apreciação sobre a continuidade da empresa, é
preocupante que mais de 43 % dos inquiridos ainda não tenham considerado a hipótese de um
sucessor, uma vez que todos os inquiridos afirmam ter a intenção de passar a posse da empresa
para um descendente familiar ou familiar próximo.
Em termos de capacidade de empreendimento, constata-se que 97,4 % das empresas foram
fundadas pela família no poder (ou herdadas). Por outro lado, a quase totalidade das empresas
(90%) são dirigidas por empresários do sexo masculino contudo as esposas dos empresários
também são membros quotidianamente envolvidos no negócio.
6.3 Classificação das metas da empresa
Um conjunto de vinte metas relacionadas com o negócio e a família, foi colocada aos
responsáveis de empresas familiares, para descrever o seu grau de importância, utilizando a
seguinte escala: 1- Nada importante, 2- Pouco importante, 3- Mais ou menos importante, 4-
Importante, 5- Muito importante.
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Em seguida, apresentam-se as tabelas 1, 2 e 3 que agrupam as classificações obtidas para
cada tipo de meta. De salientar que para o inquirido, esta listagem se encontrava num formato
contínuo e desordenado de modo a não influenciar a resposta.
A Tabela 1 apresenta os resultados médios e o desvio padrão obtidos da classificação do Grau
de Importância das Metas de Gestão.
Tabela 1 – Classificação do Grau de Importância das Metas de Gestão (negócio)
Metas Média Desvio Padrão
M8 Fidelizar bons clientes 4,82 0,39 M20 Melhorar o nível de qualidade dos produtos 4,77 0,48 M19 Construir uma equipa de gestão eficiente 4,62 0,59 M11 Dar ênfase às questões do negócio na empresa 4,31 0,73 M13 Desenvolver novos produtos 4,31 0,95 M6 Providenciar estabilidade de emprego aos recursos humanos 4,05 0,89 M16 Planeamento estratégico 4,00 0,83 M4 Manter o actual nicho de mercado 3,92 1,01
Observando os resultados da Tabela 1, verifica-se que as metas de maior importância estão
relacionadas com a empresa (negócio), como por exemplo, a fidelização de clientes (1º lugar) e
o melhoramento do nível de qualidade dos produtos (2º lugar). De acordo com Ward (1988), as
empresas familiares actuam mais frequentemente em determinados tipos de indústria.
Habitualmente, as empresas familiares tomam parte em negócios de baixo capital intensivo, nos
quais existam fracas barreiras à entrada. Por outro lado, a lealdade dos clientes e dos
fornecedores proporciona uma estrutura de indústria atractiva para as empresas familiares.
Também se pode verificar (Tabela 1) que os responsáveis das empresas familiares inquiridas
consideram como importante ter como meta o planeamento estratégico com um valor médio de
4. Contudo, em 1997, num estudo conduzido pela Arthur Andersen/MassMutual em 3.033
empresas familiares, constatou-se que 69% dos inquiridos não tinham um plano estratégico
formal.
A Tabela 2 apresenta os resultados médios e o desvio padrão obtidos da classificação do Grau
de Importância das Metas organizacionais relacionadas com o desempenho financeiro.
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Tabela 2 – Classificação do Grau de Importância das Metas Financeiras
Metas Média Desvio Padrão
M9 Assegurar um desempenho financeiro a longo prazo 4,64 0,58 M2 Garantir os recursos adequados para o crescimento do negócio 4,56 0,68 M17 Providenciar a melhor liquidez para os sócios/accionistas 3,72 0,86 M14 Obter lucro a curto prazo 3,72 0,83
Em terceiro lugar encontra-se uma meta financeira de longo prazo. De facto, os sete primeiros
lugares (com média > 4) são metas relacionadas com o negócio e não com a família ou um
membro da família em particular. Segundo Ward (1988) as empresas familiares tendem a
competir menos que as outras empresas por existir uma interacção entre a esfera social e a
esfera de negócio. Tendo em conta estas considerações, Ward conclui que se verifica uma
maior rentabilidade para a média das empresas familiares.
A Tabela 3 reúne a classificação dos valores médios e respectivo desvio padrão das metas de
cariz familiar ou pessoal (proprietário/fundador):
Tabela 3 – Classificação do Grau de Importância das Metas da Família
Metas Média Desvio Padrão
M7 Possibilidade de fazer aquilo que se gosta e ganhar dinheiro 4,18 0,82 M18 Garantir a separação entre interesses da família e do negócio 3,79 0,86 M3 Colocar-se um desafio 3,64 1,01 M10 Garantir a integração dos valores da familia na EF 3,41 0,94 M5 Identificar e treinar um sucessor membro da familia 3,28 1,28 M15 Ser o seu próprio patrão 3,13 1,13 M12 Alcançar um elevado Estatuto social 3,03 1,20 M1 Dar ênfase às questões da família na empresa 2,26 1,04
Em oitavo lugar, situa-se a única meta de carácter familiar ou particular tendo a ver directamente
com o principal responsável pela empresa, e que traduz a possibilidade de fazer aquilo que
gosta e ganhar dinheiro com um valor médio de 4,18.
Analisando as tabelas acima representadas no que respeita ao desvio padrão, constata-se que
às metas com valores médios mais elevados (> 4,5) corresponde um desvio padrão mais baixo
(< 0,7) o que evidencia uma dispersão menor em relação aos valores das metas relativamente à
média. As restantes metas com um valor médio superior a 4, também apresentam um desvio
padrão relativamente baixo (entre 0,73 e 0,95).
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Comparando estes resultados com o trabalho levado a cabo nos EUA por McCann III e outros
(2001), constata-se que são as metas relacionadas com o negócio e a empresa que aparecem
no topo da tabela com médias superiores a quatro. Nesse estudo, aparece em primeiro lugar a
construção de uma equipa de gestão eficiente, seguido do desempenho financeiro e da
manutenção do actual nicho de mercado, e em quarto lugar a preocupação em assegurar os
recursos necessário para o crescimento do negócio. De facto, também se constata que as metas
de carácter familiar e de curto prazo são metas de inferior importância para os respondentes.
Os resultados atrás apresentados mostram a articulação das metas entre as necessidades da
empresa e da família como metas importantes. É possível identificar alguma semelhança com o
estudo de Tagiuri e Davis (1992), que concluíram que as metas classificadas como as mais
importantes nesse tipo de empresa são: o bem estar e estabilidade de emprego dos recursos
humanos, a segurança financeira do proprietário, o desenvolvimento de novos produtos, o nível
de qualidade e por último, o crescimento pessoal, a promoção social e a autonomia do
proprietário.
Os resultados obtidos indicam alguma preocupação por parte dos responsáveis das empresas
familiares em relação ao negócio no longo prazo, o que vem contrariar a ideia da perspectiva
quotidiana de gerir a empresa, exclusivamente na lógica da sobrevivência de curto prazo.
Contudo, é de salientar que o planeamento da sucessão (média=3,28) continua a não ser uma
meta privilegiada, colocando em risco a continuidade da empresa, uma vez que todos os
inquiridos têm intenção de passar a direcção a um familiar.
6.4 A dinâmica do tempo, as gerações e as metas da empresa
Da revisão da literatura verificou-se que as metas das empresas familiares arriscam-se a sofrer
alterações, podendo este facto estar relacionado com o ciclo de vida da empresa (Tagiuri e
Davis, 1992) ou com a incorporação de uma nova geração (Gallo e Ribeiro, 1996). Por sua vez,
Ward (1987) identifica três fases importantes numa empresa familiar, que estão relacionadas
com a idade do negócio, a idade do responsável e dos filhos. Das evidências retiradas dos
trabalhos destes autores, é legítimo estudar se as metas diferem devido aos factores associados
à passagem do tempo.
Como tal, optou-se por analisar se as metas da empresa diferem, tendo em conta factores como:
a idade do responsável, a antiguidade da empresa e a geração envolvida.
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Desta forma, efectuou-se uma análise da variância que pretende avaliar qual o efeito de algumas
variáveis: a idade do responsável, a antiguidade da empresa e a geração envolvida nas variáveis
dependentes que são o grau de importância das metas. Os resultados são apresentados na
Tabela 4, optando por apresentar somente as variáveis onde existem diferenças significativas
entre os grupos.
Tabela 4 – Análise da Variância das Metas
Idade do Responsável Antiguidade Empresa Geração Actual Metas F Sig.* F Sig.* F Sig.*
M4 0,438 0,781 2,908 0,048 2,111 0,136 M5 1,251 0,308 4,612 0,008 7,655 0,002 M15 0,974 0,434 3,615 0,023 0,815 0,451
(*) - Nível de Significância de 0,05.
Através da Tabela 4 conclui-se que, para a variável “idade do responsável”, não existem
diferenças significativas entre qualquer dos grupos em termos da importância das diferentes
metas, uma vez que os níveis de significância obtidos são todos superiores a 0,05 (aceita-se a
hipótese das médias apresentarem valores semelhantes).
Desta forma, pedir-se-á dizer que, relativamente as metas apresentadas, não existem diferenças
significativas entre os diferentes escalões etários dos responsáveis pelas empresas familiares.
No que diz respeito a variável “antiguidade da empresa”, também não são verificadas
diferenças significativas nas diversas metas, exceptuando as metas M4-Manter o actual nicho de
mercado, M5-Identificar e treinar um sucessor membro da família e M15-Ser o seu próprio
patrão, onde existem diferenças significativas entre as médias dos grupos, isto é, os escalões de
antiguidade da empresa familiar.
Da análise das médias dos grupos conclui-se que, relativamente à meta M4-Manter o actual
nicho de mercado:
- As empresas familiares mais jovens (<10 anos) e as empresas com idade compreendida
entre 30 e 40 anos consideram importante manter o mercado actualmente explorado,
apresentando os valores médios de 4,14 e 4,20, respectivamente;
- Quanto às empresas familiares com idade compreendida entre 20 e 29 anos, esta meta
assume uma importância relativa, apresentando valor médio igual a 3,64.
No que respeita à análise das médias dos grupos conclui-se que, relativamente à M5-Identificar
e treinar um sucessor membro da família:
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- As empresas familiares mais antigas consideram importante a identificação e preparação de
um sucessor dentro da família, obtendo os seguintes valores médios: 3,80 (entre 30 e 40
anos) e 4,20 (>40 anos);
- A meta relacionada com a sucessão apresenta uma importância relativa para as empresas
familiares com uma idade compreendida entre 20 e 29 anos (valor médio=2,93).
Quanto à meta com características individuais, M15-Ser o seu próprio patrão, são as empresas
mais jovens (<10 anos) que a classificam como importante (valor médio=3,71); pelo contrário, as
empresas familiares mais velhas (>30 anos) atribuem pouca importância a esta meta (valor
médio=2,80).
Na Tabela 4, no que diz respeito à variável “Geração Actual”, também não são verificadas
diferenças significativas nas diversas metas, exceptuando a meta à M5-Identificar e treinar um
sucessor membro da família, na qual existem diferenças significativas entre as médias dos
grupos, em termos de geração envolvida na empresa.
Da análise das médias para os grupos, chegou-se à conclusão que a terceira geração está mais
atenta às questões da sucessão, ultrapassando a zona de fronteira do importante (valor
médio=4,40), enquanto que a segunda geração considera a identificação e formação do
sucessor uma meta com pouca importância (valor médio=2,43).
Face aos resultados obtidos, a análise realizada não permitiu retirar muitas conclusões
relativamente à natureza das metas, verificando-se que estas não diferem substancialmente,
tendo em conta factores associados à passagem do tempo.
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A manutenção e sobrevivência das empresas familiares depende de questões específicas como
a sucessão, a gestão de conflitos, as mudanças culturais, entre outras. Contudo a abordagem às
empresas familiares não pode negligenciar uma área importante como a gestão da “empresa
propriamente dita”, isto é, as metas, as práticas de gestão e a sua orientação estratégica,
questões essas que são comuns a qualquer outro tipo de organização, quer seja ou não de
natureza familiar.
Tendo por base os resultados a que chega esta investigação empírica, foi possível concluir que
são as metas relacionadas com a empresa (negócio) as que assumem um grau de importância
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mais elevado. As metas relacionadas com o negócio não estão desagregadas do contexto
familiar da empresa pois sem elas a empresa familiar compromete a sua continuidade.
Ao longo da revisão bibliográfica foi constatado que os termos “família” e “empresa” estão em
constante interacção na empresa familiar, coexistindo também nas metas identificadas entre as
empresas familiares do sector têxtil do distrito de Castelo Branco
Alguns estudos (Ward, 1987; Tagiuri e Davis, 1992; Gallo e Ribeiro, 1996) referem a
possibilidade do ciclo de vida da empresa familiar originar alterações na selecção das metas e
desenvolvimento das práticas que orientam a empresa. No presente estudo, verifica-se que o
grau de importância da identificação e preparação do sucessor (familiar) é mais elevado em
empresas mais antigas (> 30 anos) e de terceira geração.
Face ao exposto, é necessário que o responsável ou os membros da família desenvolvam meios
que permitam articular as suas necessidades e metas relativamente à empresa por forma a
desenvolver práticas que salvaguardem, no longo prazo, os interesses da família.
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