só yhwh é digno de adoração

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Só YHWH é digno de adoração! Deuteronômio 4.15-20 1 INTRODUÇÃO O ser humano sempre foi um fabricador de ídolos. Isso se explica pelo fato de o ser humano possuir a necessidade, creia nisso ele ou não, de adorar algo além de si mesmo. No primeiro volume de suas Institutas, João Calvino expressa essa idéia: O quanto os homens e mulheres durante toda a história prestaram cultos a criaturas; madeira, pedra, diversos deuses, mostra o quão forte é a noção de Deus impressa nos corações humanos 1 ”. O teólogo e pensador G.K. Chesterton afirma com ironia que “ O pior pensamento de um ateu é quando ele está grato e não tem ninguém a quem agradecer 2 ”. Nós realmente temos uma carência de Deus que só pode ser preenchida pela verdadeira adoração. Como bem diz a resposta a primeira pergunta do Breve Catecismo de Westminster : “o fim supremo e principal do homem é glorificar a Deus e se alegrarnele para sempre 3 ”. Parece ser essa a proposta do texto em questão: evidenciar quem de fato é Deus e como ele deve ser adorado. Por essa razão sugiro o tema de nossa reflexão: Só YHWH é digno de adoração! Precisamos tomar muito cuidado, porque no afã de adorar, podemos nos embriagar com falsos deuses, absorvendo a glória do Eterno, trocando os papéis do Criador pelas coisas criadas. Parece ser este o primeiro argumento do nosso texto em favor da adoração única a Deus. Só YHWH é digno de adoração, pois: 1. Deus é o Criador da criação, v. 15-19. A criação não é o criador e vice-versa. O autor desenvolve essa idéia em dois momentos. O primeiro deles é evidenciado pelo verbo “guardai”, no v. 15, que se refere especialmente ao ato de idolatrar e assemelhar as criaturas da terra em alguma espécie de culto (vss. 16-18). Os animais, pelos quais é feito essa exortação são: 1. Homem e mulher; 2. Animais da terra; 3. Os voadores; 4. Os rastejantes; 5. E os peixes. 1 CALVINO, João. As Institutas. v.1 Edição especial com notas para estudo e pesquisa. Tradução da edição francesa de 1541. São Paulo: Cultura Cristã, 2006. p.57-58. 2 Disponível em: < http://pensador.uol.com.br/ateu > Acesso em: 05 de outubro de 2011. 3 O BREVE CATECISMO DE WESTMINSTER. São Paulo: Cultura Cristã, 2001. Com a alteração do termo gozarpor se alegrar.

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Mensagem escrita no texto de Deuteronômio 4.15-20, por Jean Francesco

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Page 1: Só YHWH é digno de adoração

Só YHWH é digno de adoração!

Deuteronômio 4.15-20

1

INTRODUÇÃO

O ser humano sempre foi um fabricador de ídolos. Isso se explica pelo fato de o ser

humano possuir a necessidade, creia nisso ele ou não, de adorar algo além de si mesmo. No

primeiro volume de suas Institutas, João Calvino expressa essa idéia: “O quanto os homens e

mulheres durante toda a história prestaram cultos a criaturas; madeira, pedra, diversos deuses,

mostra o quão forte é a noção de Deus impressa nos corações humanos1”.

O teólogo e pensador G.K. Chesterton afirma com ironia que “O pior pensamento de

um ateu é quando ele está grato e não tem ninguém a quem agradecer2”. Nós realmente temos

uma carência de Deus que só pode ser preenchida pela verdadeira adoração. Como bem diz a

resposta a primeira pergunta do Breve Catecismo de Westminster: “o fim supremo e principal

do homem é glorificar a Deus e se „alegrar‟ nele para sempre3”.

Parece ser essa a proposta do texto em questão: evidenciar quem de fato é Deus e

como ele deve ser adorado. Por essa razão sugiro o tema de nossa reflexão: Só YHWH é

digno de adoração!

Precisamos tomar muito cuidado, porque no afã de adorar, podemos nos embriagar

com falsos deuses, absorvendo a glória do Eterno, trocando os papéis do Criador pelas coisas

criadas. Parece ser este o primeiro argumento do nosso texto em favor da adoração única a

Deus. Só YHWH é digno de adoração, pois:

1. Deus é o Criador da criação, v. 15-19.

A criação não é o criador e vice-versa. O autor desenvolve essa idéia em dois

momentos. O primeiro deles é evidenciado pelo verbo “guardai”, no v. 15, que se refere

especialmente ao ato de idolatrar e assemelhar as criaturas da terra em alguma espécie de

culto (vss. 16-18). Os animais, pelos quais é feito essa exortação são: 1. Homem e mulher; 2.

Animais da terra; 3. Os voadores; 4. Os rastejantes; 5. E os peixes.

1 CALVINO, João. As Institutas. v.1 Edição especial com notas para estudo e pesquisa. Tradução da edição

francesa de 1541. São Paulo: Cultura Cristã, 2006. p.57-58. 2 Disponível em: < http://pensador.uol.com.br/ateu > Acesso em: 05 de outubro de 2011.

3 O BREVE CATECISMO DE WESTMINSTER. São Paulo: Cultura Cristã, 2001. Com a alteração do termo

“gozar” por “se alegrar”.

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Só YHWH é digno de adoração!

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Segundo Christensen, grande estudioso do livro de Deuteronômio, “provavelmente

reflete a memória israelita de sua experiência no Egito, onde „divindades animais‟ eram

comuns4”. A segunda idéia de que não se deve trocar o Criador pela criatura mostra-se em um

segundo uso do imperativo “guardai”, agora no v.19. No entanto, não mais em relação à

animais, mas especificamente às coisas criadas expostas nos céus: 1. Sol, 2. Lua, 3. Estrelas.

Por mais belo que seja o Sol, a Lua e o exército dos céus (estrelas), eles são meras criaturas.

Até mesmo o grande deus Shemesh (Sol) dos babilônios, independente do seu tamanho é

mera criatura.

Certamente o povo de Israel estava cercado por uma imensidão de imagens e outros

deuses. A tentação para se incluírem na adoração da maioria era e foi, notadamente grande.

Não poucas vezes o povo de Deus curvou-se às criaturas; encontramos estes relatos

principalmente no livro dos Reis, que narram que até grandes homens de Deus se renderam

aos deuses locais.

Ouçamos a voz de Deus: idolatria é sinônimo de corrupção, v.16. Não apenas

corrupção, mas a perversão do nosso objetivo como criaturas: glorificar a Deus e nos

satisfazermos nele somente. O A.T. também dá outro nome à idolatria: prostituição. Isso é

declarado com mais força pela boca dos profetas, como em Isaías 1.21, Jeremias 3.3 e em boa

parte do enredo do profeta Oséias que se casa com uma mulher prostituta para ilustrar o

relacionamento lamentável que Israel tinha com o seu Deus.

Fazer imagens representativas de Deus é corrupção, prostituição, rebeldia ofensora à

santidade de Deus. Em Êx. 20.4 lemos: “Não farás para ti imagem de escultura, nem

semelhança alguma do que há em cima nos céus, nem embaixo na terra, nem nas águas

debaixo da terra”. Este segundo mandamento do Decálogo é repetido em Lev. 26.1, Dt. 5.8 e

reforçado no final do livro em Deuteronômio 27.15 quando lemos: “Maldito o homem que

fizer imagem de escultura ou de fundição, abominável ao SENHOR, obra de artífice, e a puser

em lugar oculto”.

Mais tarde, e por isso ainda é aplicável a nós, o apóstolo Paulo faz a mesma exortação

com outras palavras, Romanos 1:22-23: “Dizendo-se sábios, tornaram-se estultos, e mudaram

a glória do Deus incorruptível em semelhança da imagem de homem corruptível, e de aves, e

de quadrúpedes, e de répteis”. Desde o Antigo Testamento Deus tem revelado ao seu povo

4 CHRISTENSEN, Duane. Word Biblical Commentary: Deuteronomy 1-21:9, v.6A. Dallas: Word,

Incorporated, 2002, p. 89. Tradução minha.

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Só YHWH é digno de adoração!

Deuteronômio 4.15-20

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que um culto que o agrada deve ser simples, de coração, em verdade, sem imagens, ou

exaltação às coisas criadas. Ao Criador somente seja a glória para sempre!

Somente YHWH é digno de adoração, pois:

2. Ele é um Deus pessoal e libertador, v. 20

Essa é a segunda informação que podemos aprender do texto em questão. Deus é

pessoal e não uma coisa inanimada. Como bem diz o Salmo 115.5-7 a respeito dos ídolos,

representações falsas de Deus, dos outros povos: “Têm boca e não falam; têm olhos e não

vêem; têm ouvidos e não ouvem; têm nariz e não cheiram. Suas mãos não apalpam; seus pés

não andam; som nenhum lhes sai da garganta”. Esse é o diferencial de (הוה YHWH (י 5, ele é

pessoal e se relaciona com as suas criaturas.

O Deus que é digno de culto é o Deus que deseja tem um encontro pessoal conosco.

Por isso, ele é também chamado de o Deus da Aliança, segundo Groningen, “A Aliança é um

vínculo de amor real, de uma vida de amor caracterizada pelo relacionamento indestrutível

entre duas partes, especialmente no contexto bíblico, entre Deus e os seres humanos6”. Deus

nos amou primeiro e fez uma aliança conosco. Por isso, o momento de culto não é outra coisa

senão uma resposta afirmativa a esse amor revelado por Deus.

Mas Deus não é apenas pessoal, e o culto não é apenas uma resposta afirmativa ao

amor expresso por Deus. É uma oferta de gratidão pela libertação. Nós somos o povo herança

de Deus conquistada na libertação do Egito. Aqui, em especial, o texto bíblico se refere à Êx.

19.4-6:

Agora, pois, se diligentemente ouvirdes a minha voz e guardardes a minha

aliança, então, sereis a minha propriedade peculiar dentre todos os povos;

porque toda a terra é minha; vós me sereis reino de sacerdotes a e nação

santa. São estas as palavras que falarás aos filhos de Israel.

5 Para uma discussão sobre o uso e tradução do nome cf. BROWN, F., DRIVER, S.R & BRIGGS, C.A

(editores). The New BDB Gesenius Hebrew and English Lexicon - BDB. Peabody, Massachussetts:

Hendrickson, 1979. p. 217; BAKER, W. The complete word study dictionary in the Old Testament.

Chattanooga: AMG Publishers, 2003, p.426. Para uma visão sobre o termo (YHWH) e sua relação com Novo

Testamento, cf. GESENIUS, W., & TREGELLES, S. P. Gesenius' Hebrew and Chaldee lexicon to the Old

Testament Scriptures. Extraído do programa Logos BibleSoftware Gold. 6 GRONINGEN, G & H. Van. A família da Aliança. São Paulo: Cultura Cristã. 1997, p.27.

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Só YHWH é digno de adoração!

Deuteronômio 4.15-20

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Este texto é amplamente atualizado no N.T. simbolizando a promessa que foi

cumprida através de Jesus Cristo. Ele nos redimiu, por isso somos propriedade eclusiva dele

(Tt 2.14, 1Pe 2.9). E também é aplicado como a missão de sacerdotes da Aliança (Ap 1.6;

5.10), que é universal, para todos os crentes como representantes de Deus na terra. Essa

Aliança, por fim, será concluída no Novo Céu e Nova Terra, quando Deus habitará

definitivamente conosco em uma aliança plena (Ap. 21.3). Deus nos salvou para sermos o seu

povo exclusivo, por isso só ele é digno de receber a nossa adoração.

CONCLUSÃO

Nós fomos criados para a eternidade. Enquanto nós não dedicarmos a nossa existência

e satisfação na adoração do único Deus, Jesus Cristo, será impossível agradarmos a Deus e

agradarmos a nós mesmos.

Diante do vendaval de possibilidades idolátricas que se nos ofereceram no passado e

como continuam oferecendo ainda hoje, como a visão animista do mundo em que a criação é

o próprio Deus, os animais são deuses a serem venerados, isso de conformidade com o

panteísmo, onde tudo é Deus, e até mesmo eu sou Deus. Mas não apenas isso, o próprio

naturalismo inviabiliza a idéia de um Deus a ser adorado, criando implicitamente um deus

falso: a nossa razão, ciência, tecnologia, em outras palavras, a própria criatura.

Somente Deus deve ser adorado! Pois ele é Deus e não a criação; ele é maior que a sua

criação, sustenta-a e tem todo o controle sobre ela. Além disso, o Deus revelado em Jesus

Cristo é o Deus-Pessoal que veio até nós e nos chama para um relacionamento íntimo,

baseado no sacrifício efetuado na cruz que nos devolve o total acesso à Deus. Nós somos o

povo comprado por Jesus Cristo em sua morte, e somos chamados a uma vida de adoração

por intermédio de sua ressurreição.

Que assim também seja o nosso culto. Um culto para intensificarmos nosso amor pelo

criador e não por criaturas e um culto de ação de graças pela libertação oferecida

gratuitamente por Deus em Cristo Jesus. À Deus toda a glória para sempre, Amém.

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Só YHWH é digno de adoração!

Deuteronômio 4.15-20

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Referências bibliográficas

BAKER, W. The complete word study dictionary in the Old Testament. Chattanooga:

AMG Publishers, 2003.

BROWN, F., DRIVER, S.R & BRIGGS, C.A (editores). The New BDB Gesenius Hebrew

and English Lexicon - BDB. Peabody, Massachussetts: Hendrickson, 1979.

CALVINO, João. As Institutas. v.1 Edição especial com notas para estudo e pesquisa.

Tradução da edição francesa de 1541. São Paulo: Cultura Cristã, 2006.

CHRISTENSEN, Duane. Word Biblical Commentary: Deuteronomy 1-21:9, v.6A. Dallas:

Word, Incorporated, 2002.

Frase de G.K. Chesterton Disponível em: < http://pensador.uol.com.br/ateu > Acesso em: 05

de outubro de 2011.

GESENIUS, W., & TREGELLES, S. P. Gesenius' Hebrew and Chaldee lexicon to the Old

Testament Scriptures. Extraído do programa Logos BibleSoftware Gold.

GRONINGEN, G & H. Van. A família da Aliança. São Paulo: Cultura Cristã. 1997.