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Rev Port Cien Desp 7(2) 232–244 232 Situações de estresse no vôlei de praia de alto rendimento: um estudo de caso com uma dupla olímpica Joice Stefanello Departamento de Educação Física Universidade Federal do Paraná Brasil RESUMO O estresse competitivo é um dos factores psicológicos mais determinantes para o desempenho esportivo no alto rendimen- to, pois, neste contexto, os atletas são submetidos às mais diversas pressões competitivas. Este estudo, realizado com uma dupla masculina do vôlei de praia brasileiro, primeira colocada no ranking nacional/internacional da modalidade (2003), pre- tendeu analisar as situações geradoras de estresse aos atletas nas etapas do circuito mundial 2004 que antecederam sua par- ticipação nos Jogos Olímpicos de Atenas, como os atletas vivenciaram o estresse competitivo e que técnicas de controle do estresse utilizaram. Para a coleta de dados, usou-se um seg- mento específico do instrumento de feedback de execução (adaptado de Ravizza, 1991), onde os atletas registravam as situações estressantes de cada partida, o modo como vivencia- vam o estresse e as técnicas de controle empregadas. Os resul- tados demonstraram que os fatores situacionais foram os mais determinantes e, dentre estes, os aspectos relacionados ao jogo foram os fatores específicos mais influentes, tendo na facilida- de/dificuldade da partida a principal fonte de estresse para os atletas. Os pensamentos e as emoções/sensações corporais cor- responderam ao principal modo como o estresse foi vivenciado; e as técnicas cognitivas (auto-informe, concentração, imagina- ção), as mais empregadas pelos atletas. Palavras-chave: estresse competitivo, vôlei de praia, alto rendi- mento ABSTRACT Situations of stress in high performance beach volley: a case study with an olympic pair Competitive stress is one of the most determining psychological factors to high performance sport, for, in that context, the athletes face all kinds of competitive pressure. This research, done with a brasilian beach volley Olympic pair, first on the national/international ranking (2003), intends to analyse the stress-generator situations for athletes in the 2004 World Tour, which preceded their participation on the Athens Olympic Games, how the athletes lived competitive stress and what stress-controlling techniques they used. The data were collected with a specific performance feedback instrument (adapted from Ravizza, 1991), in which the athletes registered their every-game stressing situations, how they lived them and the controlling techniques used. Results show that situational elements were the most determina- ting and, among them, the game-related aspects were the most influent specific factors, being the difficulty/easyness of the match the main source of stress for the athletes. Thoughts and body emotions/sensations correspond to the main way through which athletes face stress; the cog- nitive techniques (self-information, concentration, imagination), the most used by the athletes. Key-words: competitive stress, beach volley, high performance

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Page 1: Situações de estresse no vôlei de praia de alto rendimento: um

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Situações de estresse no vôlei de praia de alto rendimento: um estudo de caso com uma dupla olímpica

Joice Stefanello Departamento de Educação FísicaUniversidade Federal do ParanáBrasil

RESUMOO estresse competitivo é um dos factores psicológicos maisdeterminantes para o desempenho esportivo no alto rendimen-to, pois, neste contexto, os atletas são submetidos às maisdiversas pressões competitivas. Este estudo, realizado com umadupla masculina do vôlei de praia brasileiro, primeira colocadano ranking nacional/internacional da modalidade (2003), pre-tendeu analisar as situações geradoras de estresse aos atletasnas etapas do circuito mundial 2004 que antecederam sua par-ticipação nos Jogos Olímpicos de Atenas, como os atletasvivenciaram o estresse competitivo e que técnicas de controledo estresse utilizaram. Para a coleta de dados, usou-se um seg-mento específico do instrumento de feedback de execução(adaptado de Ravizza, 1991), onde os atletas registravam assituações estressantes de cada partida, o modo como vivencia-vam o estresse e as técnicas de controle empregadas. Os resul-tados demonstraram que os fatores situacionais foram os maisdeterminantes e, dentre estes, os aspectos relacionados ao jogoforam os fatores específicos mais influentes, tendo na facilida-de/dificuldade da partida a principal fonte de estresse para osatletas. Os pensamentos e as emoções/sensações corporais cor-responderam ao principal modo como o estresse foi vivenciado;e as técnicas cognitivas (auto-informe, concentração, imagina-ção), as mais empregadas pelos atletas.

Palavras-chave: estresse competitivo, vôlei de praia, alto rendi-mento

ABSTRACTSituations of stress in high performance beach volley: a case study with an olympic pair

Competitive stress is one of the most determining psychological factorsto high performance sport, for, in that context, the athletes face allkinds of competitive pressure. This research, done with a brasilianbeach volley Olympic pair, first on the national/international ranking(2003), intends to analyse the stress-generator situations for athletesin the 2004 World Tour, which preceded their participation on theAthens Olympic Games, how the athletes lived competitive stress andwhat stress-controlling techniques they used. The data were collectedwith a specific performance feedback instrument (adapted fromRavizza, 1991), in which the athletes registered their every-gamestressing situations, how they lived them and the controlling techniquesused. Results show that situational elements were the most determina-ting and, among them, the game-related aspects were the most influentspecific factors, being the difficulty/easyness of the match the mainsource of stress for the athletes. Thoughts and body emotions/sensationscorrespond to the main way through which athletes face stress; the cog-nitive techniques (self-information, concentration, imagination), themost used by the athletes.

Key-words: competitive stress, beach volley, high performance

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INTRODUÇÃOO estresse competitivo tem sido considerado um dosfactores psicológicos mais determinantes para odesempenho esportivo, especialmente no alto rendi-mento. Nesse contexto, os atletas são, frequentemen-te, submetidos aos mais diversos tipos de pressãocompetitiva, tendo de superar limites de forma vigo-rosa e manter a efectividade e a regularidade do seudesempenho diante dos mais elevados níveis de ex i-gências físicas, técnicas, tácticas e psicológicas(8, 32, 36). Os diferentes tipos de pressão que o atleta sofredurante a competição podem gerar altos níveis deestresse, transformando-se em factores negativos eredutores do desempenho. Níveis elevados de estres-se, em geral, aumentam a tensão muscular e criamdéficits de atenção. Uma tensão muscular excessivareduz a flexibilidade, a coordenação motora e a efi-ciência muscular, impedindo que os atletas adoptemrápidos comportamentos e padrões motores paraevitar situações perigosas ou agir de maneira apro-priada a um bom rendimento. Os déficits de atençãocausam redução da capacidade de atenção, dúvidasacerca da capacidade pessoal, maior vulnerabilidadeou predisposição para a distracção e maior atenção aaspectos irrelevantes à tarefa(5, 17, 19, 25, 34).A competição esportiva, contudo, nem sempre repre-senta uma fonte de estresse para o atleta. A ex p e r i ê n-cia prática e a pesquisa empírica têm demonstradoque para alguns atletas a competição esportiva poderepresentar uma forte ameaça ao seu bem estar físico,psicológico e social e, para outros, pode ter um carác-ter desafiador e motivador. Compreende-se, assim,que o estresse pode ser gerado por situações directaou indirectamente relacionadas a elas ou por situa-ções inerentes ao processo competitivo, dependendodo próprio indivíduo e/ou do meio ambiente (10, 32, 33).Uma situação de estresse, portanto, só irá se manifes-tar quando houver um desequilíbrio entre a condiçãoda acção individual e a condição situacional; isto é,quando ocorrer uma discrepância entre as capacidadesda pessoa e as exigências da situação, ou entre as suasnecessidades e as possibilidades de satisfazê-las, comimportantes consequências para o indivíduo(35, 36). As respostas dos atletas para os eventos competiti-vos parecem, pois, depender da avaliação da deman-da e da qualidade de recursos que o indivíduo dispõepara lidar com cada situação. Assim, da mesma

forma que situações já vivenciadas poderão influen-ciar as respostas dos atletas, novos conhecimentos eexperiências poderão fazer com que o atleta desen-volva um sistema integrado de estruturas e conteú-dos que irão interferir na sua análise. Por outro lado,as características e especificidades da modalidadeesportiva também exercem um importante papel nacompreensão do estresse competitivo, pois quandoas características da modalidade são aliadas à pres-são da competição, as situações geradoras de estres-se para o atleta poderão assumir uma proporçãoainda maior(8, 9, 27).Nessa perspectiva, a compreensão do estresse com-petitivo num contexto específico torna-se fundamen-tal para que o atleta aprenda a manter o controle e oestado de fluidez e equilíbrio necessários para serbem sucedido. O conhecimento das situações gera-doras de estresse e do modo como os atletas viven-ciam essas situações em diferentes contextos sãopartes importantes do processo de tomada de cons-ciência, considerado um elemento crítico para que oatleta obtenha o necessário autocontrole para actuarnum alto nível de rendimento(34). A tomada de cons-ciência, além de permitir que o atleta reconheça seuspontos fortes e frágeis para potencializar suas capaci-dades e corrigir seus déficits, permite que o atleta seprepare mentalmente para a competição e desenvol-va estratégias apropriadas para fazer frente àquelassituações que podem afectar negativamente a suaactuação esportiva. Contudo, apesar de o vôlei de praia de alto rendi-mento ser um esporte extremamente dinâmico, noqual o atleta precisa desenvolver e colocar à provaum repertório de padrões e estratégias adequados aosmais elevados níveis de exigências competitivas,ainda há uma grande carência de investigações acercadas variáveis que predispõem atletas dessa modalida-de a experimentarem uma maior ou menor percepçãode ameaça na competição e, consequentemente,maior ou menor estresse, embora muitas investiga-ções tenham examinado a natureza e a intensidadedas respostas de estresse durante a competição emdiferentes modalidades esportivas(7, 17, 23, 28, 41). Assim, baseado no trabalho de suporte psicológicodesenvolvido com uma dupla masculina de atletasprofissionais do vôlei de praia brasileiro, este estudo

Situações de estresse no vôlei de praia

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procurou analisar as situações geradoras de estressepara os atletas nas etapas do circuito mundial queantecederam a sua participação nos Jogos Olímpicosde 2004, como os atletas vivenciaram o estresse com-petitivo nessas situações e quais as técnicas mais efi-cientes de controle do estresse utilizadas pela duplapara eliminar ou minimizar os efeitos das situaçõesestressantes sobre seu rendimento esportivo.

METODOLOGIAParticipantes do estudoEste estudo de caso descritivo foi realizado com umadupla masculina de atletas profissionais do vôlei depraia, primeira colocada no ranking nacional (cam-peã do circuito brasileiro) e internacional (campeãdo circuito mundial e campeã mundial) em 2003,tendo por base o trabalho de suporte psicológicodesenvolvido, por cerca de dois anos, durante a suapreparação para as Olimpíadas de Atenas (2004). Asidades dos atletas eram de 29 e 31 anos (Atletas A eB, respectivamente) e ambos já haviam participadode olimpíadas anteriores: em 1996 (Atleta B) e 2000(Atletas A e B). Importante ressaltar que não sãoconhecidos dados de atletas de alto rendimentonessa modalidade.

Cuidados éticosInicialmente, atletas e comissão técnica foram infor-mados a respeito do trabalho a ser realizado (aprova-do pelo Comitê de Ética em Pesquisa de umaUniversidade Federal) e das formas de divulgaçãodos resultados. Foi assegurado aos atletas que pode-riam afastar-se do estudo no momento em que dese-jassem, obtendo-se, assim, o consentimento, a ade-são e o comprometimento do grupo para o trabalhopretendido.

Coleta de dadosÉ importante ressaltar que o período referente àcolecta dos dados tratados especificamente nesteestudo (Maio a Agosto) correspondeu, apenas, auma das fases do programa de treinamento de com-petências psicológicas, contemplando seis etapas docircuito mundial que antecederam os JogosOlímpicos de 2004 (etapas da China, Sérvia eMontenegro, Portugal, Suíça, Alemanha e Noruega),totalizando 26 jogos. Durante essa fase do treina-

mento psicológico (fase de prática), os atletas deve-riam reconhecer seus pontos fortes e frágeis frenteàs diversas situações de pressão competitiva, procu-rando integrar, em situações competitivas reais e deforma sistemática na sua actuação esportiva, as com-petências psicológicas treinadas na fase anterior(fase de aquisição de técnicas e estratégias psicológi-cas), a fim de potencializar suas capacidades (pontosfortes) e corrigir seus déficits (pontos fracos), demodo a obter o necessário autocontrole para actuarno seu mais alto nível de rendimento.O treinamento psicológico envolveu várias competên-cias psicológicas, porém apenas os aspectos relacio-nados ao estresse competitivo foram abordados nopresente estudo. Dessa forma, um segmento específi-co do instrumento f e e d b a c k de execução, adaptado deRa v i z z a( 3 4 ), destinado à avaliação do estresse compe-titivo em situações competitivas reais, foi empregado.O instrumento f e e d b a c k de execução (modelo comple-to em anexo) é uma técnica que auxilia o atleta areconhecer as situações que tendem a afectar negati-vamente o seu rendimento, aumentando a sua cons-cientização acerca da sua própria actuação e permi-t i n d o-lhe desenvolver estratégias de confronto paraenfrentá-las apropriadamente. No segmento específi-co do f e e d b a c k de execução utilizado no presente estu-do, os atletas deveriam registrar as situações gerado-ras de estresse em cada partida, o modo como viven-ciavam o estresse (pensamentos, ações e/ou sensa-ções) e as técnicas e/ou estratégias psicológicas utili-zadas para manter ou recuperar o autocontrole diantedos diferentes agentes estressantes. O preenchimentoda ficha era feito por escrito pelos próprios atletas 30minutos após o encerramento de cada partida, paraque pudessem reflectir sobre os acontecimentos dojogo e sobre a sua actuação.

APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOSDe acordo com os objectivos propostos, serão apre-sentados, primeiramente, os resultados referentes àssituações consideradas pelos atletas como geradorasde estresse; em seguida, os dados relativos ao modocomo os atletas experimentaram as situações estres-santes (pensamentos, acções e/ou sensações) e, porfim, as técnicas psicológicas utilizadas pelos atletaspara eliminar ou minimizar os efeitos dos factoresestressantes sobre seu rendimento esportivo.

Joice Stefanello

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Os dados de cada atleta foram analisados, individual-mente, de acordo com os procedimentos propostospor Giglione e Matalon(11) para a análise de conteú-do. Dessa forma, inicialmente, os indicadores referi-dos pelos atletas em cada jogo (situações geradorasde estresse, modo como o estresse foi experimenta-do e estratégias utilizadas) foram listados tal comoexpressos pelos atletas, sem excluir ou agrupar qual-quer item. Em seguida, considerando os 26 jogosdisputados pela dupla, juntaram-se num único indi-cador os itens referidos pelos atletas que apresenta-vam significados comuns (proposições idênticas oucom o mesmo complemento), obtendo-se, assim, opercentual com que cada indicador foi apontadopelos atletas nos 26 jogos analisados. Todos essesindicadores foram, posteriormente, analisados e dis-cutidos conjuntamente com os atletas (uma vez quefaziam parte do trabalho de suporte psicológicodesenvolvido com a dupla), assegurando-se, assim, asua confiabilidade.

Situações causadoras de estresseTomando por base o estudo desenvolvido por DeRose Junior, Deschamps e Ko r s a kas com atletasprofissionais de basquetebol( 8 ), as situações consi-deradas pelos atletas do vôlei de praia como gera-doras de estresse que apresentavam característicassimilares foram agrupadas em fontes específicas deestresse (lesões, competência, conduta dos adversá-rios, facilidade/dificuldade da partida, arbitragem,torcida, condições climáticas, equipe, organizaçãodos jogos), que, por sua vez, foram classificadas emfactores específicos de estresse (aspectos físicos,estados psicológicos, jogo, planejamento/organiza-ção), que, quando novamente agrupados em funçãoda sua origem e/ou características, foram categori-zados em factores gerais de estresse (individuais es i t u a c i o n a i s ) .Os Quadros 1 e 2 mostram as situações, as fontes eos factores (específicos e gerais) de estresse viven-ciados pelos Atletas A e B, respectivamente.

Situações de estresse no vôlei de praia

Quadro 1. Situações, fontes e factores (específicos e gerais) de estresse vivenciados pelo Atleta A

O percentual apresentado entre parêntese no Quadro 1 corresponde ao número de jogos em que cada situação, fontee factores (específicos e gerais) de estresse foram vivenciados pelo atleta A, considerando os 26 jogos disputados.

Fatores

Situacionais

(61,3%)

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Conforme indicam os Quadros 1 e 2, os factoressituacionais predominaram em relação aos indivi-duais. Os factores situacionais, referindo-se aosaspectos objectivos do evento, estão relacionadoscom a natureza imediata da situação estressante eocorrem a partir de situações que são comuns ao

contexto competitivo. Os factores pessoais ou indivi-duais, voltados às tentativas individuais de resoluçãode um problema, dependem quase exclusivamentedo indivíduo(8). Apesar de representarem situaçõesdiferenciadas, vale ressaltar que ambos os factoresestão intimamente relacionados, isto é, a avaliação

Joice Stefanello

Quadro 2. Situações, fontes e factores (específicos e gerais) de estresse vivenciados pelo Atleta B

O percentual apresentado entre parêntese no Quadro 2 corresponde ao número de jogos em que cada situação,fonte e factores (específicos e gerais) de estresse foram vivenciados pelo atleta B, considerando os 26 jogos disputados.

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situacional está relacionada com a selecção indivi-dual de respostas para um dado problema(24).Dessa forma, o presente estudo dá ênfase aos pro-cessos de avaliação cognitiva, que, de acordo comalguns estudiosos(5, 14, 38), assumem o papel demediador entre as circunstâncias ambientais enfren-tadas, os objectivos e as crenças pessoais dos atletase sua resposta emocional, sendo considerados o pri-meiro estágio no processo de resolução de um pro-blema. De acordo com essa perspectiva teórica, oestresse competitivo depende da avaliação que oatleta faz das exigências, dos recursos que julga dis-por para lidar com essas exigências, da avaliação dasconseqüências se essas exigências não forem corres-pondidas e do significado que as possíveis conse-quências terão para ele(14). Assim, tal como se pode-rá perceber nos dados analisados a seguir, a avalia-ção de uma circunstância como ameaçadora, pare-cem não depender apenas do perigo objectivo ine-rente a cada situação, mas também das característi-cas individuais da pessoa, das suas experiências pas-sadas e da sua própria capacidade de controle.

Fatores competitivos situacionaisO jogo foi o principal factor específico situacional deestresse vivenciado pelos atletas, aparecendo em53,6% das partidas disputadas pelo Atleta A e em80,6% das partidas disputadas pelo Atleta B. Comofontes de estresse mais significativas relacionadas aesse factor, encontrou-se a facilidade/dificuldade dapartida, a competência dos atletas e a conduta dosadversários. A facilidade/dificuldade da partida pare-ceu ser a fonte de estresse mais influente, sendoreferida em 15,3% e 34,6% dos jogos, respectiva-mente, para os Atletas A e B e decorreram do bomdesempenho dos adversários, por um lado, e da infe-rioridade técnica destes, por outro. A facilidade/dificuldade da tarefa/jogo como fontede estresse também foi encontrada num estudo con-duzido com atletas adultos masculinos de basquete-bol, todos com participação em Jogos Olímpicose/ou Campeonatos Mundiais(8). Para os autoresdesse estudo, a displicência gerada em jogos consi-derados mais fáceis, leva muitas vezes a um aumen-to dos níveis de estresse e a um mau desempenho,ocasionando, inclusive, derrotas inesperadas.

Contrariamente, tem-se constatado que quando odesafio é maior do que a percepção da capacidade doatleta em superá-lo, sua preocupação poderá condu-zi-lo a um excesso de inquietude e ansiedade, impe-dindo-o de actuar no seu nível potencial(19), tal comopareceu ocorrer com os atletas do vôlei de praiadiante da inferioridade técnica dos adversários. A competência, envolvendo capacidades e habilida-des no desempenho de movimentos específicos,pareceu ser responsável pelo estresse competitivo doAtleta A em 11,5% dos jogos, sendo decorrente doserros de passe/levantamento e da dificuldade emmarcar pontos. No caso do Atleta B (15,3%), deu-sedevido aos erros cometidos (ataque/levantamento) eà ineficácia do ataque (ataque defendido consecuti-vamente). Em jogadores olímpicos de basquetebol(8),a competência também demonstrou ser uma impor-tante fonte de estresse. Os atletas desse estudo reco-nheceram que errar, repetir os mesmos erros ou nãotentar, omitindo-se no jogo, são situações comunsde estresse durante as partidas. Também, num estu-do sobre o estresse psíquico em atacantes de volei-bol(32), não superar uma marcação específica de umjogador durante uma partida constituiu-se numasituação muito estressante para os atletas, assimcomo a falha do levantador, colocando o atacante emuma situação de pressão e cobrança.A conduta dos adversários teve nas provocações/ati-tudes desafiadoras dos oponentes as situações deestresse mais significativas para ambos os atletas dovôlei de praia (em 11,5% e 15,4% dos jogos, respecti-vamente, para os Atletas A e B). Em atletas olímpicosde basquetebol( 8 ), os adversários também tiveram suaparcela de contribuição para elevar os níveis deestresse dos atletas. Para os autores desse estudo,isso ocorre mais em função de comportamentoscomo provocar e usar de deslealdade para tentarparar um jogador, do que da capacidade técnica ou daameaça que os adversários representam para a equi-pe. Estudos com jogadores de voleibol(29, 32) d e m o n s-traram que as intimidações ou provocações dosadversários partem de gestos, palavras e olhares,muitas vezes, sutis e imperceptíveis para a arbitra-gem e, em outras vezes, acontecem de forma maisacintosa e directa, podendo, inclusive, levar o atleta auma atitude mais agressiva. Tem-se evidenciado,

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ainda, que o uso sistemático, intencional e planejadoda guerra psicológica pelo adversário( 5 ) visa a debili-tar o rendimento do atleta, através do aumento daansiedade e/ou nervosismo, da diminuição da auto-confiança e dos consequentes erros e dificuldades,pois quebra a atenção/concentração, perturba a pre-paração psicológica e mental do atleta, quebra o ren-dimento e provoca estados emocionais e psicológicosextremamente vulneráveis e pouco adequados àstomadas de decisão ou processamento da informação. As condições climáticas (vento/frio durante as parti-das) também foram fontes de estresse para os atletasdo vôlei de praia (11,5% dos jogos), assim como oserros de arbitragem (para o Atleta A) e a torcidacontra (para o Atleta B), presentes em 3,8% dosjogos. O planejamento/organização, por sua vez, repre-sentando o segundo factor competitivo situacionalencontrado para os atletas dessa modalidade, tevecomo fonte de estresse mais significativa a organiza-ção dos jogos (7,7%), especialmente, devido a demo-ra em iniciar a partida.Tanto as condições climáticas quanto o planejamen-to/organização dos jogos, parecem constituir-se empotenciais fontes de estresse para os atletas do vôleide praia, por ocasionar alguma influência na actua-ção dos atletas e na sua preparação para a competi-ção, impedindo-os de actuar no seu nível potencial.Alguns autores(31, 35, 39, 40) têm referido que variaçõesclimáticas, ruídos/estímulos visuais (movimentaçãoe agitação da torcida), fadiga, pressão dos adversá-rios e arbitragem constituem distracções característi-cas de determinadas modalidades, podendo influen-ciar nos níveis de activação e de ansiedade dos atle-tas. Em outros estudos, englobando situações rela-cionadas à estrutura administrativa das equipes ouentidades esportivas, o planejamento/organizaçãodos jogos(8) e as situações ou acontecimentos impre-vistos(5, 21) também representaram significativassituações de estresse para os atletas.

Fatores competitivos individuaisNessa categoria, os aspectos físicos foram os factoresespecíficos de estresse encontrados para ambos osatletas do vôlei de praia, assim como os estados psico-lógicos para o Atleta B. Quanto aos aspectos físicos,as lesões pareceram ser as principais fontes de estres-

se para ambos os atletas (11,5% e 3,8% dos jogos,respectivamente para os Atletas A e B) e os estadosfísicos (para o Atleta B em 11,5% dos jogos), repre-sentados pelo desconforto muscular/corporal e cansa-ço físico. Por outro lado, a pressão interna (para oAtleta B, em 3,8% dos jogos), teve nas reacções dopróprio atleta frente aos erros cometidos a principalfonte específica de estresse. Os aspectos físicos, também para atletas olímpicosde basquetebol(8), têm sido apontados como umimportante factor individual de estresse, estandorelacionados às condições físicas dos atletas (talcomo jogar mal preparado) e às contusões.Resultados semelhantes também foram encontradosem esportes como atletismo, patinação artística,futebol, handebol e natação(1, 14, 21, 22).Os estados psicológicos, representados por fontescomo medos/inseguranças, expectativas/objectivos epressões internas, também corresponderam a facto-res específicos de estresse para atletas olímpicos debasquetebol(8). Nesse estudo, as pressões internastiveram destaque e mostraram que a maioria dosatletas tinha muita responsabilidade, conhecendoseu papel como atleta de alto nível, apresentandoum nível de autocobrança muito elevado e não acei-tando o erro. Ainda, as expectativas dos níveis derendimento esperados e exigidos (preocupação como fato de ter que render em nível de suas capacida-des; preocupação com companheiros e/ou expectati-vas dos outros; dúvidas pessoais quanto à actuaçãofísica, técnica e/ou psicológica; medo ou receio defalhar numa situação importante e/ou de ter um ren-dimento inadequado; medo ou receio de lesões)também foram apontados por diferentes estudio-sos(5, 13, 18) como principais factores geradores deestresse no esporte de alto rendimento. Esses dados parecem reforçar a ideia de que o graude ameaça percebido (do qual se originam os senti-mentos de preocupação e ansiedade, característicosde uma situação de estresse) depende da avaliaçãoque o atleta faz do contexto global da situação, ouseja, da comparação que ele estabelece entre as exi-gências da situação e a relevância, a congruênciamotivacional, as opções, os recursos pessoais e asperspectivas de confronto que o atleta julga disporpara conseguir o êxito desejado(5).

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Modo como os atletas vivenciaram o estresseNo presente estudo, o modo como os atletas viven-ciaram o estresse competitivo corresponde às conse-quências por eles percebidas como decorrentes dassituações geradoras de estresse. Dessa maneira, asrespostas dos atletas do vôlei de praia às situaçõesgeradoras de estresse foram agrupadas, tal comosugere Ravizza(34), em três categorias gerais: pensa-mentos, emoções/sensações corporais e acções(Quadro 3).Os pensamentos pareceram representar o principalmodo pelo qual o Atleta A vivenciou o estresse com-petitivo (38,4% dos jogos), enquanto as emoções/sen-sações corporais foram a forma como o estresse pare-ceu se manifestar no caso do Atleta B (61,5%). Ospensamentos voltados para a preocupação com aprópria actuação (15,4%) e com a necessidade debuscar novamente a concentração (11,5%) foram

comuns a ambos os atletas. Por outro lado, enquan-to o pensamento do Atleta A esteve voltado para oreceio de lesões (11,5%), os pensamentos do AtletaB estiveram centrados na necessidade de buscarnovos meios para pontuar (7,7%) e na dor originadapela contusão (3,8%). As emoções e/ou sensações corpo-rais pareceram estar, no caso do Atleta A, relaciona-das à irritação com erros, adversários e arbitragem(15,4%) e à falta de ânimo/motivação diante da infe-rioridade dos adversários (15,4%). Para o Atleta B, oestresse competitivo pareceu manifestar-se por meioda ira/irritação diante das provocações ou atitudesdesafiadoras dos adversários (15,4%), da impaciên-cia diante dos erros cometidos (7,7%), da falta demotivação (11,5%) e apatia (7,7%) diante dos adver-sários mais fracos, do cansaço/desconforto corporal(11,5%) e do despreparo no início do set (7,7%). Noque diz respeito às acções, o estresse competitivo

Situações de estresse no vôlei de praia

Quadro 3. Modo como o estresse foi vivenciado pelos Atletas

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vivenciado pelo Atleta A manifestou-se na poucaagressividade de algumas jogadas (11,7%), na suapassividade em outras (7,7%) e numa maior agressi-vidade em 7,7% das suas ações. No caso do AtletaB, o estresse competitivo tornou-o pouco agressivoem 11,5% dos jogos, displicente em 7,7% das parti-das e calado diante das provocações dos adversáriosem 7,7% dos jogos disputados. Alguns estudos também têm demonstrado que oestresse competitivo pode apresentar sintomas negati-vos na área mental, física e comportamental, manifes-t a n d o-se por meio da preocupação, medo, ansiedade,dificuldade de concentração(3, 31), confusão, esqueci-mento de detalhes, volta a antigos hábitos e incapaci-

dade para tomar decisões(5, 19), oscilação nos níveis dea c t i v a ç ã o(15, 37), sensação de fadiga, sensação de frio,aceleração do ritmo cardíaco, aumento da tensão arte-rial, respiração mais rápida(5, 19), perda da motivação,agressividade, nervosismo, irritabilidade (15), falta deconfiança e performances fracas(12, 30, 35). O que se percebe, é que pensamentos pouco apro-priados ou erróneos, geralmente, conduzem a senti-mentos negativos e a uma execução pobre e que ospensamentos que se centram na pessoa, especifica-mente, são os que causam maiores problemas aosatletas(20). Quando os indivíduos se orientam nosentido interno, preocupando-se demasiadamentecom o seu próprio bem-estar e sentimentos, a sua

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Quadro 4. Técnicas utilizadas pelos atletas para o controle do estresse.

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preocupação poderá conduzir a reacções físicas ementais aumentadas, interferindo consideravelmentena actuação dos atletas: a sua capacidade de prever einterpretar estímulos externos e informações rele-vantes reduz-se; a sua inquietude acerca de umaactuação iminente gera ansiedade (somática e/oucognitiva); a sua tolerância diante da frustração e dador diminui (tendendo à irritação e à queixa); e osseus erros são maximizados e interpretados comomais desastrosos do que na realidade o são(19, 20).A oscilação nos níveis de activação dos atletasdurante uma partida, por sua vez, tem sido referi-do(37) como um factor que pode levar um atleta des-tacado a performances fracas. Alguns estudiosos(2, 19,

31) têm constatado que as motivações para a compe-tição e as sensações positivas que acompanham asrealizações esportivas podem levar a um aumento daactivação positiva, promovendo um estado ideal deexecução, enquanto que a ansiedade, o aborrecimen-to, a raiva e o medo do fracasso parecem repercutirnum aumento da activação negativa, deteriorando odesempenho do atleta. Além disso, estados emocio-nais, como euforia, raiva, irritabilidade, entre outros,especialmente quando intensos e persistentes, pare-cem consumir rapidamente a energia do atleta, con-tribuindo para o surgimento de um estado de fadiga(cansaço físico ou emocional)(12, 30).Diante desses achados, parece ser plausível que oestresse competitivo não depende apenas do perigoobjectivo inerente à situação, mas também do modocomo o atleta o percebe e a ele reage.

Técnicas para o controle do estresseAs técnicas para o controle do estresse correspon-dem às estratégias de intervenção utilizadas cons-cientemente pelos atletas diante das situações gera-doras de estresse e das suas consequências sobre aactuação do esportista. Essas técnicas objectivamauxiliar o atleta a obter o necessário autocontrolepara actuar no seu mais alto nível de rendimentoesportivo, evitando interferências provenientes dedistracções internas e externas sobre o seu desempe-nho. No presente estudo, as técnicas ou estratégiasreferidas pelos atletas do vôlei de praia para mantere/ou recuperar o seu autocontrole foram agrupadasem técnicas cognitivas e somáticas.

As técnicas cognitivas, as mais utilizadas por ambos osatletas, baseiam sua acção na modificação ou noajuste dos principais determinantes do comporta-mento (pensamento, percepção, memória, afecto,linguagem). Essas técnicas ressaltam que, para ocor-rer uma melhora na conduta ou nos estados emocio-nais, o sujeito deve promover uma mudança nospensamentos subjacentes a esses comportamentos(5,

35). Essa ideia reforça o entendimento de que os pro-cessos de avaliação cognitiva cumprem um impor-tante papel como mediadores do estresse e da ansie-dade no contexto esportivo, auxiliando os atletas amanter o autocontrole e o equilíbrio necessários auma boa actuação.Dentre as técnicas cognitivas referidas pelos atletasdo vôlei de praia, o auto-informe ou monólogo inter-no foi a mais utilizada. O Atleta A valeu-se do auto-informe em 30,7% dos jogos, recorrendo à estratégiade pensamento positivo para a manutenção da tran-quilidade e autoconfiança. O Atleta B utilizou-se doauto-informe em 42,2% dos jogos, recorrendo aopensamento positivo (23%) e a mudança de pensa-mento para esquecer os erros cometidos (19,2%). O auto-informe, conversa interna do praticante comele mesmo(2), objectiva bloquear ou modificar pensa-mentos e estados emocionais negativos, compreen-dendo desde experiências silenciosas até vocaliza-ções em voz baixa. Alguns estudiosos(4, 20, 30) tam-bém têm apontado que o auto-informe pode ser uti-lizado para a reprogramação de técnicas/estratégias afim de evitar a repetição de erros, para manter amente focalizada, para o controle do esforço e manu-tenção do estado de ânimo e para apromoção/manutenção da autoconfiança e expectati-va de êxito. Dentre as estratégias mais referidas naliteratura(4, 20, 34) para manutenção do autocontroleestão também a interrupção de pensamentos negati-vos ou contraproducentes, a manutenção de pensa-mentos positivos e a mudança de pensamento. Os atletas do vôlei de praia fizeram, ainda, uso dastécnicas cognitivas de concentração e de imaginação.O Atleta A recorreu à técnica de concentração em11,5% dos jogos, voltando seu pensamento para apróxima acção. O Atleta B utilizou-se da técnica deconcentração em 24,5% dos jogos, procurando focarsua atenção nas próprias acções/jogo (7,7%), pensarno próximo ponto (11,5%), não ouvir as provoca-

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ções dos adversários (11,5%) e descobrir as falhasou os pontos fracos dos adversários (3,8%). As técnicas de concentração objectivam ajudar o atletaa desenvolver a conscientização sobre factores que des-viam sua atenção e por que o fazem, permitindo- l h emodificar aspectos do seu rendimento e/ou trabalhoque são ineficientes e distanciar-se de padrões de com-portamento e pensamentos negativos ou não produti-v o s( 3 1 ). Usar palavras-chave para focalizar a atenção,c o n c e n t r a r-se na situação presente, na tarefa a realizar,nos momentos decisivos da actuação esportiva e napróxima acção também foram algumas das estratégiasreferidas na literatura científica(31, 35, 40) para auxiliar osatletas diante dos agentes estressantes.A técnica de imaginação foi utilizada pelo Atleta Aem 11,5% dos jogos, por meio damentalização/visualização dos movimentos antes decada acção. O Atleta B usou a imaginação em 23%dos jogos para lembrar dos gestos (3,8%) e dasmelhores acções (11,5%) e vivenciar os bonsmomentos (7,7%). A técnica da imaginação consiste na repetição plane-jada da imaginação consciente de uma acção esporti-va, sendo apontada(6, 20, 35, 39, 40) como uma importan-te ferramenta psicológica para melhorar o rendimen-to dos atletas e utilizada com sucesso para a manu-tenção de competências motoras, para a regulação daactivação, para o controle de respostas emocionais epara a promoção da autoconfiança. As técnicas somáticas, embora num menor percentual,também foram empregadas pelos atletas do vôlei depraia (Atleta A em 19,2% dos jogos e Atleta B, em38,4% dos jogos). A técnica somática mais utilizadapelos atletas foi a respiração, em 19,2% dos jogos(diminuição da frequência respiratória, com umaexpiração mais forte). O Atleta B fez uso também domovimento para melhorar o seu nível de activação,movimentando-se mais rapidamente em 11,5% dosjogos e procurou extravasar a tensão e a raiva viven-ciadas durante alguns jogos, gritando (7,7%). As técnicas somáticas são intervenções voltadas parao ajuste de reacções corporais como tensão muscu-lar, frequência cardíaca e frequência respiratória, afim de oportunizar maior controle sobre o estresse, aansiedade e o aperfeiçoamento motor(2).Alguns estudos(2, 19, 35) também têm evidenciado queo aumento da frequência respiratória (com uma ins-

piração mais forte) é bastante eficiente diante desituações que requerem aumento nos níveis de acti-vação do atleta, assim como a diminuição da frequên-cia respiratória (com uma expiração mais forte) temconseguido reduzir os níveis de activação dos atletas,propiciando o relaxamento e a diminuição da tensãogerada pela pressão competitiva. Por outro lado, oaumento da intensidade do movimento (movimenta-ção mais rápida) tem sido eficaz para aumentar osníveis de activação dos atletas, na intenção de auxiliá-los a actuar mais proximamente ao seu estado idealde execução em diferentes momentos da competição,assim como a diminuição da intensidade do movi-mento (movimentação mais lenta) tem contribuídopara reduzir os seus níveis de activação, quando estesdemonstram ser ex c e s s i v o s( 2 ).

CONCLUSÃONo presente estudo, para ambos os atletas, as situa-ções geradoras de estresse relacionadas aos factoressituacionais predominaram em relação aos fatoresindividuais. Dentre os factores competitivos situa-cionais, o factor jogo foi o principal factor específicode estresse vivenciado pelos atletas, tendo na facili-dade/dificuldade da partida a fonte de estresse maisinfluente, devido, especialmente, ao bom desempe-nho dos adversários e à inferioridade técnica destes.A competência, a conduta dos adversários e as con-dições climáticas foram as demais fontes de estresserelacionadas ao factor jogo que se mostraram signifi-cativas aos atletas. A competência esteve associada,principalmente, aos erros cometidos; a conduta dosadversários, às provocações/atitudes desafiadorasdestes; e, as condições climáticas, ao vento/friodurante as partidas. Por outro lado, os factores com-petitivos individuais mais influentes para os atletasforam os aspectos físicos. Destes, o medo/receio delesões foi a fonte de estresse mais evidente para oAtleta A, enquanto os estados físicos, como descon-forto muscular/corporal e cansaço físico, foram osmais significativos para o Atleta B.O modo como os atletas vivenciaram o estresse com-petitivo manifestou-se nos seus pensamentos, nassuas emoções e/ou sensações corporais e nas suasações durante a partida. Os pensamentos decorren-tes das situações de estresse, comuns a ambos osatletas, centraram-se na preocupação com a própria

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actuação e perda da concentração. As emoções e/ousensações corporais originadas a partir do estressepercebido foram a ira ou irritação com os próprioserros, com os erros da arbitragem e com as provoca-ções/atitudes desafiadoras dos adversários, além dafalta de ânimo ou motivação diante dos oponentesmais fracos. No que diz respeito às acções, as res-postas às situações de estresse mais evidentes paraambos os atletas foram a pouca agressividade nasjogadas e a passividade ou displicência dos atletasnas acções.Para o controle do estresse, os atletas recorreram,predominantemente, às técnicas cognitivas, fazendouso, especialmente, do auto-informe para a manuten-ção do pensamento positivo ou mudança do pensa-mento. As técnicas de concentração (focalização daatenção nas próximas acções ou no próximo ponto) ede imaginação (visualização dos movimentos antesde cada acção e lembrança das melhores acções) tam-bém foram utilizadas pelos atletas. Em muitos casos,ambos os atletas recorreram, ainda, ao uso de técni-cas somáticas, sendo a respiração a mais empregada. Tal como se pode constatar no presente estudo, mui-tos factores, internos (pessoais ou individuais) eexternos (situacionais), foram responsáveis peloestresse competitivo no vôlei de praia de alto rendi-mento, sendo de fundamental importância que oatleta aprenda a lidar eficazmente com esses facto-res, a fim de conseguir recuperar e/ou manter onecessário autocontrole para actuar no seu mais altonível de rendimento esportivo. De tal modo, comono esporte de alto rendimento sempre existirão for-mas reais de pressão, mais importante do que elimi-nar totalmente o estresse competitivo (o que é prati-camente improvável), a preparação psicológica dosatletas deve procurar auxiliar o esportista a adquirirconhecimentos e estratégias mentais e físicas quelhe permitam responder de forma adaptativa àsdiversas situações de pressão que são inerentes aoprocesso competitivo. O reconhecimento das situa-ções geradoras de estresse que podem afectar negati-vamente a sua actuação esportiva e dos efeitos queessas situações exercem na sua conduta, poderá aju-dar o atleta a desenvolver a conscientização necessá-ria acerca do seu próprio padrão de comportamento,permitindo-lhe usar estratégias de confronto apro-priadas para enfrentá-las.

A utilização de técnicas cognitivas e somáticas, orade forma isolada, ora conjuntamente, buscou atenderas necessidades pessoais dos atletas, da equipe ousituacionais, compreendendo uma interessante pos-sibilidade de abordagem para o estresse competitivono vôlei de praia de alto rendimento. Contudo, valeressaltar que o seu uso requer cautela, pois as técni-cas e estratégias psicológicas antes de serem aplica-das em situações competitivas reais, necessitam serbem aprendidas e treinadas adequadamente, consi-derando a que se propõem e para quais situações eindivíduos adaptam-se melhor.Espera-se, por fim, que os resultados do presenteestudo sejam de grande valia para todos os profissio-nais envolvidos na prática esportiva (treinadores,atletas, preparadores físicos etc.). Contudo, paraampliar a compreensão do estresse competitivo,recomenda-se, que estudos com outros atletas,outras modalidades esportivas e níveis competitivossejam também realizados.

CORRESPONDÊNCIAJoice Mara Facco StefanelloRua Alferes Ângelo Sampaio, 2125 – Aptº 703Bigorrilho – Curitiba – ParanáCep: 80730-460 Brasile-mail: [email protected]

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