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SETEMBRO/2009

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SETEMBRO/2009

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CANA-DE-AÇÚCAR • AVANÇO CIENTÍFICO BENEFICIA O PAÍS2

Índice

O Conselho de Informações sobre Biotecnologia

(www.cib.org.br) é uma organização não gover-

namental e uma associação civil sem fins lucrativos

e sem nenhuma conotação político-partidária ou

ideológica. Seu objetivo básico é divulgar informa-

ções técnico-científicas sobre a Biotecnologia e seus

benefícios, aumentando a familiaridade de todos os

setores da sociedade com o tema.

EXPEDIENTECoordenadora-Geral: Alda LerayerEditor Executivo: Antonio Celso VillariRedação: Débora MarquesConsultores Técnicos: Eduardo Romano – Embrapa

Edgar Gomes Ferreira de Beauclair – Esalq/USPJesus Ferro – Unesp JaboticabalMarcelo Menossi – UnicampSizuo Matsuoka – Engenheiro Agrônomo e consultor

Apoio Operacional: Jacqueline AmbrosioJoão Paulo Mendes

Projeto Gráfico: Sérgio BritoFotos: Arquivo CIB, Sérgio Andrade e Unica/Tadeu Fessel

• Um pouco de história

• Chegada ao Brasil 4

• Cenário atual 4

• Domesticação 5

• Distribuição geográfica 5

• Genética

• Ciclo de vida 6

• Melhoramento convencional 7

• Biotecnologia 8

• Aplicações

• Produtos e subprodutos 9

• Potencial econômico

• Brasil no mercado internacional 14

• Mitos e fatos

• Principais questões sobre a produção de cana 15

• A cana e a natureza 16

• A cana e o etanol 18

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Avanço científico beneficia o País

O potencial de produção e o papel fundamental da cana-de-açú-

car e de seus subprodutos – açúcar, etanol e energia elétrica, en-

tre outros –, tanto na agricultura quanto na indústria, fazem dessa

cultura uma das mais importantes atividades da agroindústria na-

cional. O Guia da Cana foi desenvolvido para servir de fonte de

informações sobre esse cultivo, abordando sua origem histórica,

sua utilização atual e os mais recentes avanços científicos na área.

O Brasil é hoje o maior produtor mundial de cana, com 563 mi-

lhões de toneladas na safra 2008/2009, em uma área de 8,1 mi-

lhões de hectares, o que representa apenas 2,3% da área agrícola

do País (Conab, Mapa). Os bons números e o aprimoramento

tecnológico permitem que o País seja também o maior exportador

mundial de açúcar, respondendo sozinho por 45% de todo o pro-

duto comercializado no mundo. Na fabricação de etanol, que uti-

liza aproximadamente 1% da área agricultável do País e 57% da

área plantada com cana, o Brasil também ocupa liderança nas

exportações e compartilha, com os Estados Unidos (EUA), a posi-

ção de maior produtor mundial. Na prática, os dois países são

responsáveis por 70% de toda a fabricação desse combustível no

mundo.

A cana-de-açúcar sempre teve um papel importante na economia

brasileira, desde o período dos engenhos coloniais. Não é de hoje

que especialistas vêm buscando maneiras de aprimorar o cultivo

da planta, tornando-a mais produtiva e resistente, entre outras

vantagens agronômicas. Com o êxito do mapeamento de seu

genoma, abrem-se as portas para uma infinidade de possibilida-

des, entre elas, o melhoramento genético assistido por marcadores

moleculares e a biotecnologia aplicada à cana-de-açúcar.

Esperamos que, com que este guia, você possa saber mais sobre a

cana-de-açúcar e descubra curiosidades sobre uma das culturas

agrícolas mais antigas e relevantes do Brasil.

Boa leitura!

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Um pouco de história

• A importância da cultura da cana-de-açúcar tem raízes antigas

na economia brasileira. As primeiras mudas da planta chegaram

ao Brasil por volta de 1515, vindas da Ilha da Madeira (Portugal),

tendo sido o primeiro engenho de açúcar construído em 1532, na

capitania de São Vicente. Mas foi no Nordeste, especialmente nas

capitanias de Pernambuco e da Bahia, que os engenhos de açú-

car se multiplicaram. No século seguinte, já éramos o maior pro-

dutor e fornecedor mundial de açúcar, posição mantida até o fim

do século XVII. Historicamente, a cana-de-açúcar sempre foi um

dos principais produtos agrícolas do Brasil e, hoje, o País tem no-

vamente a primeira posição no ranking mundial da cultura.

• As variedades comerciais de cana-de-açúcar cultivadas atual-

mente se originam de cruzamentos realizados no início do século

XX, na Ilha de Java. Àquela época, algumas variedades da espé-

cie Saccharum officinarum – rica em açúcar, mas muito suscetível

a doenças – foram cruzadas com outra espécie, a Saccharum

spontaneum, que é pobre em açúcar e muito rústica, ou seja,

mais resistente aos problemas do campo. Os híbridos obtidos ti-

nham maior capacidade de armazenamento de sacarose, resis-

tência a doenças, vigor, rusticidade e tolerância a fatores climáti-

cos. Apesar de S. officinarum e S. spontaneum terem sido as espé-

cies que mais contribuíram para a obtenção das atuais varieda-

des comerciais de cana-de-açúcar, outras espécies, a exemplo de

S. sinense, S. barberi e S. robustum, ainda que em menor propor-

ção, também foram importantes para a composição genética das

variedades modernas de cana.

CANA-DE-AÇÚCAR • AVANÇO CIENTÍFICO BENEFICIA O PAÍS

• Em razão do potencial do mercado sucroalcooleiro no Bra-

sil, a cana-de-açúcar não é tratada apenas como mais um

produto agrícola nacional, mas como a mais importante fon-

te de biomassa energética. O setor sucroalcooleiro responde

por cerca de 1 milhão de empregos, dos quais 511 mil dire-

tamente envolvidos na produção de cana-de-açúcar e o res-

tante distribuído na cadeia de processamento de açúcar e

etanol. Isso representa 6% dos empregos

na agroindústria nacional.

• De acordo com a Empresa de Pesquisa

Energética (EPE), o etanol ultrapassou a

energia proveniente das hidrelétricas em

2007 e já é a segunda fonte primária de

energia do Brasil. Na safra 2008/2009,

segundo dados do Ministério da Agricul-

tura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), a

produção de etanol aumentou 22%, totalizando 27,3 bilhões

de litros. Em 2008, de acordo com informações da Agência

Nacional do Petróleo (ANP), o consumo de álcool hidratado

carburante – usado como combustível de automóveis – su-

biu 41,9%, somando 13,3 bilhões de litros. No mesmo ano,

mais 6,3 bilhões de litros de etanol foram misturados à ga-

solina vendida no País, à proporção de 25%. Esta, ao mesmo

tempo, perdeu espaço entre os combustíveis, com redução

de 3,9% em seu consumo.

Chegada ao Brasil Cenário atual

Linha do tempo

Cana no Brasil

As primeiras mudas decana-de-açúcar chegamao Brasil, vindas da Ilhada Madeira

Produção

O primeiro engenhode açúcar foiconstruído no Brasil

Melhoramento

A cana-de-açúcarplantada atualmenteno Brasil é umrefinamento decruzamentos realizadosno fim do século XIX

Genes

Início do Projeto Genomada Cana (Fapesp), o qualidentificou 50 mil genesligados a característicascomo desenvolvimento,produção e teor de açúcar

1515 1532 Fim do séc. XIX 1999

Biotecnologia

1999-presenteTestes de inserção degenes na cana paraaumento de sacarose,melhoria do porte,resistência a doenças epragas, entre outros

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Um pouco de história

• As espécies que originaram as cultivares

atuais de cana-de-açúcar são oriundas do

Sudeste Asiático. A origem de S. officinarum,

por exemplo, está intimamente associada

à atividade humana, pois ela tem sido cul-

Domesticação

O cultivo da cana-de-açúcar existe em todas as regiões tropicais esubtropicais do mundo e se estende ao Norte e ao Sul do Equador, seguindoa distribuição das palmeiras (“Palm Tree Line”, ou linhas que delimitam azona de crescimento das palmeiras e que caracterizam a zona tropical).

Como a cana-de-açúcar se adapta facilmente e é capaz de crescer em uma vasta

faixa de hábitats e altitudes, tanto nos trópicos quanto em regiões temperadas, ela

está atualmente dispersa em todos os continentes, como mostra o mapa.

Distribuição geográfica

Principais países produtores da cultura em 2007% da produção mundial

Brasil34,56%

Outros18,00%

Índia22,35%

China 6,69%

Tailândia 4,05%

Paquistão 3,44%

México 3,27%

Austrália 2,29%

Colômbia 2,01%

Estados Unidos 1,74%

Guatemala 1,60%

“Palm Tree Line”Área de cultivo de cana-de-açúcar

Fonte: FAO-2007.

tivada desde a Pré-História. Acredita-se que

o centro de origem de S. officinarum seja a

Melanésia (Oceania), onde ela foi domesti-

cada e depois disseminada pelo homem por

todo o Sudeste Asiático. A região tornou-

se centro de diversidade, tendo, como nú-

cleo, Papua Nova Guiné e Java (Indonésia),

regiões em que a maior parte das espécies

foi coletada a partir do fim de 1800.

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Genética

CANA-DE-AÇÚCAR • AVANÇO CIENTÍFICO BENEFICIA O PAÍS

Ciclo de vida• A cana-de-açúcar é perene na sua forma natural, mas

semiperene no cultivo extensivo. É necessário um novo plan-

tio, realizado geralmente entre a quinta e a sétima colhei-

ta. Isso ocorre porque o pisoteio por máquinas e veículos

no cultivo e, principalmente, na colheita, não apenas pre-

judica diretamente a planta, como também compacta o

solo. Além disso, há um progressivo acúmulo de doenças

no canavial. Consequentemente, ocorre uma diminuição

natural do número de plantas e o crescimento reduzido

das remanescentes com o avanço dos ciclos, ocasionando

queda de produção, que atinge níveis economicamente

inviáveis, exigindo a substituição por novo plantio.

• Existem dois ciclos de produção da cana-de-açúcar: o

que se inicia com o plantio da muda e se encerra com o

primeiro corte é chamado de cana-planta; os demais, que

começam após o primeiro corte, são denominados ciclos

da soqueira, ou canas-socas. O ciclo da cana-soca dura

geralmente de 12 a 13 meses, enquanto o da cana-planta

varia conforme a época de plantio das mudas. Nas condi-

ções climáticas do Centro-Sul do País, se as mudas forem

plantadas no início da estação chuvosa (de setembro a

novembro), o ciclo apresenta duração média de 12 meses

(cana-de-ano); se o plantio for feito na segunda estação

(de janeiro a abril), o ciclo pode variar de 14 a 18 meses

(cana de ano-e-meio).

• A duração do ciclo da cana pode variar também de acor-

do com a cultivar utilizada.

Ciclo de produção dacana pode ser de 12 a

21 meses, dependendoda época do plantio

Para manter a

produtividade, a cana

é replantada a cada

quatro colheitas

• Normalmente, os cruzamentos entre as variedades

de cana-de-açúcar são realizados em ambientes pro-

tegidos, como estufas e campânulas de contenção, ge-

ralmente dispostos em interiores de mata ou galpões

cobertos para evitar a contaminação indesejada por

pólen oriundo de outros genitores. Após o período de

hibridação, as hastes da planta são coletadas e

mantidas em um galpão por uma semana para

maturar. Passado esse período, as flores protegidas

por um saco são separadas das hastes, colhidas e co-

locadas em uma câmara aquecida para a retirada da

umidade das sementes.

Saiba mais

As espécies cultivadasno Brasil são origináriasdo Sudeste Asiático

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Melhoramento convencional

Genética

• Diante da importância da cana-de-açú-

car para a sociedade, a melhoria de sua

prática de cultivo foi um processo natural,

cujas bases são históricas. Ao longo de vá-

rias décadas, especialistas e pesquisadores

foram aprimorando a qualidade da planta,

apesar de sua complexa composição gené-

tica. No Brasil, três grandes programas de

melhoramento da cana-de-açúcar têm sido

realizados nas últimas décadas: o da Rede

Interuniversitária de Desenvolvimento do

Setor Sucroalcooleiro (Ridesa), antigo Pro-

grama Nacional de Melhoramento da Cana-

de-Açúcar, o do Centro de Tecnologia Cana-

vieira (CTC), antigo Centro de Tecnologia

da Copersucar, e o programa do Instituto

Agronômico de Campinas (IAC). As varie-

Brasil desenvolveu variedades de cana com produtividade até 50% maior nos últimos 30 anos

• Para que haja cruzamento entre duas variedades, ou híbridos,

de cana, é necessário que elas floresçam, o que só ocorre em

circunstâncias específicas de fotoperíodo (iluminação) e tempe-

ratura diurna e noturna. O ambiente ideal é encontrado apenas

entre 5° e 15° de latitude, razão pela qual todos os programas

de melhoramento brasileiro têm suas estações de cruzamento

no Nordeste (Alagoas e Bahia). Além da dificuldade de flores-

cimento, o pólen da cana perde rapidamente a viabilidade em

condições naturais, com algumas variedades apresentando ain-

da baixa fertilidade do pólen.

• Uma vez que tais dificuldades sejam superadas e ocorra o

cruzamento, a semente formada tem que ser adequadamente

armazenada para que mantenha uma taxa de germinação ca-

paz de permitir a obtenção de plântulas, que, por sua vez, pas-

sam por uma avaliação em um programa de seleção de novas

variedades comerciais. As novas variedades são selecionadas

contra florescimento, uma vez que este consome energia da

planta, levando à diminuição da produtividade. Todas as exi-

gências e dificuldades tornam improvável a ocorrência de cru-

zamentos entre variedades convencionais ou transgênicas.

Saiba mais

dades desenvolvidas por esses projetos res-

pondem hoje por quase todas as varieda-

des de cana-de-açúcar usadas para produ-

zir açúcar e etanol no Brasil. Graças a eles,

o País conseguiu aumentar a produtivida-

de da cana em mais de 50% nos últimos

30 anos.

• Recentemente, novos programas de me-

lhoramento de cana surgiram em empre-

sas da iniciativa privada, o que deve au-

mentar as variedades disponíveis para os

produtores nos próximos anos.

• As espécies que deram origem às varie-

dades comerciais de cana não são nativas

do Brasil. Elas permanecem em bancos de

germoplasma das estações de cruzamento

brasileiras para possibilitar sua utilização no

melhoramento da cana. É somente nas con-

dições dessas estações que essas espécies

podem ser cruzadas com sucesso com as

variedades convencionais ou geneticamente

modificadas.

• A probabilidade de ocorrer cruzamento

genético, em circunstâncias naturais, entre

os híbridos comerciais e espécies desses gê-

neros é extremamente baixa, sobretudo de-

vido à falta de condições ambientais propí-

cias para tal fim.

• Apesar de a maior parte da cana planta-

da comercialmente no mundo ser hoje fru-

to do cruzamento entre S. officinarum e S.

spontaneum, as análises de DNA mostram

preponderância da carga genética da pri-

meira.

• O cultivo comercial de cana-de-açúcar ocorre por propagação

vegetativa, e não por sementes, ou seja, um canavial é obtido

pelo plantio de colmos da variedade de cana desejada, com as

plantas-filhas tendo a mesma genética da planta-mãe – são

clones. Assim, mesmo que haja cruzamento, as plantas não mu-

dam suas características. Isso ocorreria apenas nas variedades

originadas do plantio de sementes, o que não é feito pelos agri-

cultores.

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Genética

8CANA-DE-AÇÚCAR • AVANÇO CIENTÍFICO BENEFICIA O PAÍS

• O melhoramento da cana-de-açúcar com

a utilização da biotecnologia teve início no

começo da década de 90, com os primei-

ros mapas genéticos e a obtenção das pri-

meiras plantas modificadas geneticamen-

te, em diversas instituições do mundo, in-

cluindo, à época, o Centro de Tecnologia

da Copersucar (CTC). No fim dos anos 90,

a Fundação de Amparo à Pesquisa do Esta-

do de São Paulo (Fapesp) começou o pro-

jeto Genoma da Cana (Sucest), no qual fo-

ram identificados 50 mil genes da planta.

A iniciativa possibilitou a identificação dos

genes envolvidos no processo de crescimen-

to, no teor de açúcar e na resistência a di-

versos tipos de estresses, entre outras ca-

racterísticas importantes para aumentar a

produtividade comercial da cultura. Os

genes identificados pelo Sucest também

têm permitido o desenvolvimento de

marcadores moleculares que estão associ-

ados a atributos relevantes e desejáveis nas

novas variedades. O sequenciamento com-

pleto do genoma da cana, que está sendo

realizado por um consórcio internacional no

qual o Brasil é um dos líderes, deverá ace-

lerar a determinação dos genes responsá-

veis por cada característica desejável na

planta. O uso dessa informação permitirá,

no futuro, o desenvolvimento mais rápido

de novas variedades por meio do processo

denominado seleção assistida por mar-

cadores.

• Vários genes vêm sendo introduzidos no

genoma da cana-de-açúcar por meio de

técnicas de transformação genética. Esses

genes conferem características a exemplo

de tolerância a herbicidas, resistência a

doenças e pragas, aumento do teor de

sacarose, tolerância à seca e até melhoria

do porte da cana para facilitar a colheita

BiotecnologiaCanas geneticamente modificadas devem estar no mercado nos próximos anos

mecanizada. Também estão sendo pesqui-

sados genes que podem ajudar a melhorar

a produção de açúcar e outros para que a

planta possa ser utilizada como uma

biofábrica, capaz de gerar produtos de alto

valor agregado, como os bioplásticos.

• Ciente do grande potencial de contribui-

ção que a engenharia genética pode trazer

à cultura da cana-de-açúcar, há cerca de

três anos a Embrapa investe em projetos

de desenvolvimento de cana-de-açúcar

transgênica. As características que serão

incorporadas à planta visam principalmen-

te a atender às demandas do Nordeste. A

escolha dessa região tem por objetivo a re-

dução das diferenças tecnológicas hoje exis-

tentes entre o Sudeste e o Nordeste. As varie-

dades em desenvolvimento serão mais tole-

rantes à seca e mais resistentes à broca gi-

gante (principal praga da Região Nordeste),

o que garantirá maior produtividade.

• Até o momento, não há no mundo ne-

nhuma variedade transgênica comercial de

cana-de-açúcar. No entanto, testes de cam-

po já foram feitos ou estão em andamento

na África do Sul, Argentina, Colômbia, Aus-

trália, nos Estados Unidos, em Cuba e, prin-

cipalmente, no Brasil. Tal fato indica que

vários grupos têm interesse em melhorar

essa cultura no sentido de produzir, por

meio da biotecnologia, variedades mais efi-

cientes do que as que temos hoje, de for-

ma a trazer benefícios para todo o setor

sucroalcooleiro, para a economia brasilei-

ra, para os consumidores e para o meio

ambiente.

• Como não existem, no Brasil, espécies na-

tivas sexualmente compatíveis com a cana-

de-açúcar, não se espera que ocorra “esca-

pe” gênico no caso de liberação comercial

de variedades transgênicas de cana-de-açú-

car.

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Aplicações

Produtos e subprodutos

Açúcar

• A sacarose, proveniente da cana-de-açúcar ou da

beterraba, é utilizada no mundo todo como adoçante

e energético. O açúcar cristal obtido da cana-de-açú-

car possui 99,8% de sacarose e 0,2% de impurezas

em sua composição (umidade – 0,04%; sais mine-

rais – 0,07%; açúcar invertido – 0,07%; material

insolúvel – 0,02%). Já o refinado provém da disso-

lução dos cristais de açúcar e da remoção do mate-

rial insolúvel e dos corantes naturais por processos

físicos.

Rapadura, açúcar mascavo e melado

• A rapadura, o açúcar mascavo e o melado são os

principais produtos do segmento artesanal do siste-

ma produtivo da cana-de-açúcar. O processamento

é realizado principalmente em pequenas proprieda-

des rurais, caracterizadas pelo baixo nível tecnológico

e uso intensivo de mão de obra. Há pouca integração

com o mercado, de forma que a produção é comer-

cializada em mercados locais e o processamento é

simplificado.

• A rapadura é o doce resultante do caldo da cana-

de-açúcar concentrado. É um produto integral, sem

refino, puro e passível de utilização como açúcar. A

produção do mascavo envolve um procedimento se-

melhante ao da rapadura, sendo o diferencial ape-

nas o ponto de concentração, que é mais alto. Esse

A cana-de-açúcar é uma planta que apresenta um longo histórico

de uso seguro para a alimentação humana e animal. Seu plantio

comercial no Brasil visa principalmente à obtenção do açúcar

(sacarose), que usamos todos os dias na nossa alimentação, e do

etanol, que abastece nossos carros. Entre seus subprodutos,

derivados da moagem da planta, estão o melado, usado como

componente de rações para ruminantes e como substituto do

açúcar na alimentação humana, e o bagaço, que, como fonte de

fibras, pode ser utilizado para alimentação animal – mas é

principalmente empregado para a geração de energia em usinas,

por meio de sua queima. Outro importante derivado da cana é a

cachaça, obtida da fermentação e da destilação do caldo (garapa).

O açúcar mascavoe a rapadura sãoprodutos que têm papelimportante naalimentação em algumasregiões brasileiras, sendouma excelente fonte deenergia e de sais mineraisde baixo custo

tipo de açúcar era mais utilizado até o surgimento

do açúcar branco, cuja cor se tornou mais atrativa

para consumo, levando o produto marrom a perder

mercado. Tanto o açúcar mascavo como a rapadura

possuem uma quantidade expressiva de minerais e

proteínas.

• Já o melado, conhecido no Nordeste como mel de

engenho, consiste numa substância obtida pela con-

centração do caldo da cana-de-açúcar. É chamado

de “rapadura líquida”, em virtude da semelhança

entre os dois produtos, que se estabelece por meio

do processo produtivo, das propriedades sensoriais,

do valor nutritivo e do perfil do consumidor. Tais ca-

racterísticas favorecem o processamento da rapadura

e do melado numa mesma unidade produtiva.

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Aplicações

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Produtos e subprodutos

CANA-DE-AÇÚCAR • AVANÇO CIENTÍFICO BENEFICIA O PAÍS

A vinhaça, umsubproduto do usoda cana, pode ser

usada na produçãode fertilizantes

Etanol

• Líquido e inflamável, o álcool etílico, ou

etanol, é uma substância obtida pela des-

tilação de produtos orgânicos fermentados,

como açúcar, amido e celulose. No caso do

etanol proveniente da cana-de-açúcar, o

principal componente da fermentação é a

sacarose do caldo, ou seja, o açúcar. A subs-

tância final dos processos de destilação e

retificação é uma mistura binária etanol-

água, que pode ser destinada diretamente

ao abastecimento de veículos ou, ainda, so-

frer desidratação e originar o álcool anidro,

que é utilizado como aditivo da gasolina.

O álcool etílico resultante do processa-

mento industrial é uma substância pura, li-

vre de proteínas e de DNA.

proteínas por fermentação anaeróbica; a

produção de gás metano; o tratamento para

a concentração a 60° Brix e posterior em-

prego na formulação de ração animal; a uti-

lização como adubo na lavoura; a queima

para a produção de fertilizante; e a utiliza-

ção agrícola do resíduo in natura, em subs-

tituição total ou parcial às adubações mi-

nerais.

Vinhaça

• A vinhaça, ou vinhoto, consiste em um

resíduo do processamento industrial para

a obtenção do etanol. É constituída por uma

suspensão de sólidos, sendo ainda rica em

substâncias orgânicas e minerais, com pre-

dominância de potássio. Algumas opções

de uso da vinhaça incluem a produção de

• A sacarose e o etanol provenientes

da cana-de-açúcar transgênica são

idênticos aos produtos obtidos da cana

convencional, por se tratar de substân-

cias puras, ou seja, sem outros com-

postos misturados, como DNA ou pro-

teína. Dessa forma, além de possuírem

as mesmas propriedades físico-quími-

cas, são equivalentes ao etanol e à

sacarose obtidos da cana-de-açúcar

não transgênica.

Saiba mais

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Bagaço pode ser queimado para gerar energia

Bagaço e palha

• Existem algumas técnicas capazes de pro-

duzir etanol com base no bagaço da cana

e de outros materiais vegetais. A maioria

desses processos ainda está em fase de

desenvolvimento da viabilidade técnica em

escala comercial, sendo ainda pouco com-

petitiva economicamente.

• O método, que ficou popularmente co-

nhecido como etanol celulósico, usa enzi-

mas (rota enzimática) ou ácidos (rota quí-

mica) para decompor as longas moléculas

da celulose em moléculas menores de açú-

cares. A partir desse ponto, o bagaço é in-

tegrado ao ciclo normal de produção de

etanol pela fermentação do açúcar por le-

veduras.

• Outra técnica disponível para o aprovei-

tamento do bagaço e da palha é a gasei-

ficação. Nesse processo, o material vegetal

é queimado na ausência de oxigênio para

produzir o gás de síntese. Este, então, pode

ser transformado em combustíveis e em

outros produtos químicos.

Cortesia Unica / Foto Tadeu Fessel

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Aplicações

CANA-DE-AÇÚCAR • AVANÇO CIENTÍFICO BENEFICIA O PAÍS

Produtos e subprodutosBiomassa

• Normalmente, as plantas convertem me-

nos de 1% da luz solar em energia quími-

ca, mas a cana-de-açúcar é capaz de con-

verter cerca de 2% da radiação incidente

em açúcares, dos quais dois terços estão

na forma de lignina e de celulose, que são

insolúveis, e um terço corresponde à

sacarose presente no caldo. Essa eficiência

a coloca como a principal planta quando

se pensa em biomassa. O bagaço da cana-

de-açúcar, constituído por lignina e celulo-

se, representa um terço da biomassa da

cana, enquanto outro terço é formado pe-

las folhas e pelo ponteiro, que ficam no

campo após a colheita. A quantidade de

bagaço obtida varia de 240 kg a 280 kg

por tonelada de cana processada.

• Em usinas de açúcar e etanol, é comum o

uso do bagaço como fonte energética para

alimentar caldeiras, resultando na geração

simultânea de energia térmica e mecânica

a partir do vapor (cogeração). A energia

térmica é utilizada no processo de fabrica-

ção do açúcar e do etanol e a energia me-

cânica entra na moagem da cana ou se

transforma em bioeletricidade por meio de

um gerador, seja para uso na própria usina,

seja para venda do excedente para as con-

cessionárias de energia elétrica.

• O bagaço da cana-de-açúcar pode servir

também como matéria-prima na produção

de etanol, porém essa tecnologia ainda está

em desenvolvimento.

Torta de filtro

• A torta de filtro é um subproduto do

processamento industrial da cana e vem

dos filtros rotativos após a extração da

sacarose residual da borra. De modo geral,

é um resíduo rico em minerais (nitrogênio,

fósforo, potássio, cálcio, magnésio e enxo-

fre) e matéria orgânica, principalmente pro-

teínas e lipídios. Por apresentar altos teo-

res de proteínas, a torta de filtro pode ser

utilizada para a alimentação de animais ou,

ainda, como adubo.

Energia elétrica

• Segundo dados da Agência Nacional de

Energia Elétrica (Aneel), o Brasil dispõe hoje

de 266 usinas que produzem eletricidade

proveniente da queima do bagaço de cana-

de-açúcar. Essas empresas têm capacidade

de geração de 3.682 MW, o equivalente a

3,5% do total do parque gerador brasilei-

ro, ou 16% da energia produzida por fon-

tes termelétricas no País.

• O potencial elétrico do setor ainda está

longe de ser completamente utilizado. Exis-

tem, no Brasil, mais de 400 usinas, o que

significa que 33% delas ainda não estão

outorgadas pela Aneel para produzir ele-

tricidade. E mesmo entre as que já geram

energia elétrica, a modernização do siste-

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13

• As unidades de produção da cachaça recebem várias denominações, de acordo com

a escala de produção e a região produtiva: as cachaças industriais são fabricadas em

destilarias; as cachaças artesanais nordestinas saem dos engenhos, herança do Brasil

colonial; e as cachaças artesanais das Regiões Sul e Sudeste vêm de alambiques, em

alusão ao equipamento no qual se realiza a destilação.

Curiosidade

Cachaça

• A produção da cachaça, ou aguardente,

no Brasil teve início no período colonial e

continua até os dias de hoje, artesanal ou

industrialmente. A bebida é obtida por meio

da destilação do caldo de cana fermenta-

do, contendo de 38% a 54% de álcool em

volume a 20°C. A cachaça, depois da cer-

veja, é a bebida alcoólica mais consumida

no País, totalizando sete litros per capita

por ano. Em termos mundiais, é a terceira

bebida destilada mais tomada no planeta,

ficando atrás apenas da vodca e do shoju

(bebida destilada coreana). Estima-se que

sua produção alcance 1,5 bilhão de litros,

o que seria, em princípio, o tamanho do

mercado interno, já que as exportações re-

presentam aproximadamente 1% do total

produzido.

Uma das bebidas alcóolicas maisconsumidas no Brasil, a cachaça é feita dade forma artesanal e industrial

ma de caldeira e turbina possibilitará um con-

siderável aumento da potência instalada.

Além disso, a palha da cana também poderá

ser usada como combustível quando a co-

lheita mecanizada estiver plenamente imple-

mentada. No caso de São Paulo, maior pro-

dutor do País, a queima da palha antes da

colheita será eliminada em 2017.

• O potencial de produção de energia elétri-

ca no Brasil em 2012 é de 5.300 MW, usan-

do-se apenas 75% do bagaço produzido,

segundo a União da Indústria de Cana-de-

Açúcar (Unica). Adicionando-se apenas 50%

da palha de cana, a capacidade de geração

pode ser ampliada para 10.100 MW, potên-

cia um pouco maior do que a da usina hidre-

létrica de Itaipu.

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14

Potencial econômico

CANA-DE-AÇÚCAR • AVANÇO CIENTÍFICO BENEFICIA O PAÍS

Brasil no mercado internacional• O Brasil é o maior exportador de açúcar, respon-

dendo sozinho por 45% de todo o produto

comercializado no mundo. Já em relação ao etanol,

o País divide com os EUA o papel de maior produtor

mundial – juntos, os dois países são responsáveis

por 70% de todo o etanol produzido no planeta. No

entanto, o produto norte-americano é exclusivamente

derivado do milho e voltado para seu mercado inter-

no. Assim, o Brasil é também, no caso do etanol, o

maior exportador mundial, respondendo por 54%

desse mercado. Em 2008, as vendas de açúcar e

etanol para o exterior renderam aproximadamente

7,8 bilhões de dólares em divisas para o País, levan-

do esse setor a ocupar o quarto lugar no ranking

das exportações brasileiras.

Crescimento da demanda

• O setor passa por um momento de crescimento do

mercado interno e externo em razão da tendência

da procura de outras fontes de energia para substi-

tuir o petróleo, do menor custo de produção de etanol

do mundo, do aumento da frota de veículos flex-fuel

e do efeito do Protocolo de Kyoto como resultado

da preocupação mundial com a preservação

ambiental e a consequente busca por alternativas

de energia renovável.

• Esse cenário positivo vem gerando interesse glo-

bal sobre o bem-sucedido programa brasileiro do

álcool combustível e seu potencial para atender a

uma parte da demanda mundial, que passaria a usá-

lo em substituição ao petróleo. A alternativa refletiu

em substancial aumento da produção brasileira de

cana-de-açúcar nos últimos anos, com 12% de in-

cremento da área plantada em 2007 e perspectiva

de elevação desse nível nas próximas décadas.

No Brasil, a produção está concentrada naRegião Sudeste, responsável por

aproximadamente 70% da produção nacional.O Nordeste, tradicional produtor, responde por

12%, enquanto o Centro-Oeste, considerado umaregião de avanço da cultura, representa 10%

Brasil é o maior

produtor mundial de

açúcar e o segundo

maior de etanol

• O Programa Nacional do Álcool, ou Proálcool,

foi criado em 14 de novembro de 1975 pelo

Decreto n° 76.593, com o objetivo de estimular

a produção de etanol, para atender às necessi-

dades do mercado interno e externo e à políti-

ca de combustíveis automotivos. Trinta anos de-

pois do início do Proálcool, o Brasil vive uma

nova expansão dos canaviais com o propósito

de oferecer, em grande escala, o combustível

alternativo. Neste contexto, variedades trans-

gênicas de cana com maior produtivi-

dade possibilitarão o aumento da pro-

dução de açúcar e etanol, sem a ne-

cessidade do avanço da cultura em ou-

tras áreas agrícolas. A nova escalada

não é um movimento comandado pelo

governo, como a ocorrida no fim da dé-

cada de 70, quando o Brasil encontrou

no etanol a solução para enfrentar o

aumento abrupto dos preços do petró-

leo que importava. A corrida para am-

pliar unidades e construir novas usinas

é movida por decisões da iniciativa privada, con-

victa de que o etanol terá, a partir de agora, um

papel cada vez mais importante como combus-

tível, no Brasil e no mundo.

Programa Nacional do Álcool

Produção da cana-de-açúcar nas diferentes regiões do Brasil

(em mil ha)

Norte

20 21

Nordeste

1.123 1.138

Centro-Oeste

605 699

Sudeste

3.9284.165

Sul

487 598

Safra 06/07

Safra 07/08

Fonte: Conab.

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15

Mitos e fatos

É verdade que a cana-de-açúcar degenera o solo?

• Não, não é verdade. Tal mito não tem nenhum embasamento

técnico ou científico. Antes de tudo, é bom que se esclareça que

qualquer atividade agrícola degrada o solo se as técnicas agronô-

micas corretas não forem aplicadas. Entre as principais culturas

agrícolas, a cana é a que apresenta uma das mais baixas taxas de

deterioração do solo, próxima à do milho.

• Graças às suas características botânicas, a cana é uma planta

que tem alto poder de conservação do solo – por possuir um siste-

ma radicular em cabeleira, bastante profundo, propicia a forma-

ção de um emaranhado de raízes no solo que auxilia a penetração

e a dispersão da água das chuvas, assim como a agregação do

solo. Esse conjunto de fatores diminui a erosão, a grande respon-

sável pela degeneração das áreas plantadas.

Principais questões sobre a produção de cana

• Além disso, utilizam-se as melhores práticas de controle da ero-

são exatamente no cultivo da cana. Tanto é que as lavouras são

permanentes em um determinado local, isto é, uma vez instalada

uma usina, ela ali fica por séculos, ao contrário de algumas cultu-

ras anuais, que são itinerantes justamente por degradarem o solo

após alguns anos de cultivo.

O aumento do cultivo da cana-de-açúcar no mundo,

e especialmente no Brasil, não diminuirá a área

destinada à plantação de alimentos?

• Não. Todos os estudos, tanto de órgãos oficiais quanto de em-

presas, mostram que a cana não compete com a produção de

alimentos. Tomem-se, como exemplo, os dados de projeção para a

safra 2018/2019 do Brasil. Até lá, de acordo com o Ministério da

Agricultura, Pecuária e Abastecimento, a cana se expandirá para

13 milhões de hectares, enquanto os grãos (milho, soja, trigo, ar-

roz e feijão), ocuparão 54,55 milhões de hectares. As pastagens, a

seu turno, passarão dos atuais 172 milhões para 162 milhões de

hectares.

• Para compensar as áreas de pastagens perdidas, a pecuária está

melhorando sua eficiência técnica, ou seja, aprimorando o cultivo

de pastagens para abrigar maior número de cabeças de gado por

área. Em termos mundiais, a expansão da cana se dará em poucas

regiões, devido às condições climáticas. Apenas a América do Sul

e a África podem obter significativa ampliação do plantio. Nesses

continentes, convém mencionar que também a eficiência agronô-

mica deverá ser melhorada para se produzir tanto grãos como

carne.

• Além do mais, como já foi dito, com o uso da biotecnologia é

possível aumentar a produção na mesma área hoje destinada à

cana.

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Mitos e fatos

CANA-DE-AÇÚCAR • AVANÇO CIENTÍFICO BENEFICIA O PAÍS

O cultivo de cana na Amazônia pode

aumentar a devastação da floresta?

• Segundo levantamento da Companhia Brasi-

leira de Abastecimento (Conab), a área de cana

cultivada no Amazonas e no Pará é de 15 mil

hectares, o que representa apenas 0,05% do

total de área desses dois Estados somados.

Como a legislação brasileira não permite no-

vos cultivos da planta nesses Estados e a gran-

de expansão da cana ocorre nas Regiões Cen-

tro-Oeste, Sudeste e Sul – ou nos Estados de

Tocantins e Maranhão, em local distante da Flo-

resta Amazônica –, não é correta a afirmação

de que a cana aumentará a devastação da

Amazônia (vide mapa).

• Vale ressaltar que as condições do solo e do

clima na região amazônica não são propícias

para o plantio da cultura da cana.

• A aplicação da biotecnologia na cana poderá

aumentar a produtividade do cultivo numa

mesma área, o que permitirá reduzir a pressão

pela expansão das fronteiras do cultivo.

A queima da cana é uma ação certamente

menos poluente que a queima de combus-

tível fóssil pela frota de automóveis do País.

Estudos mostram que um hectare queima-

do de cana libera o equivalente a menos

de uma tonelada de CO2, enquanto a

fotossíntese efetuada pela própria cana

durante todo o seu ciclo de crescimento

retira 15 toneladas do gás do meio ambi-

ente, o que dá um balanço altamente posi-

tivo. Ainda assim, todo o esforço está sen-

do feito para a eliminação dessa prática.

Gradualmente, o setor sucroalcooleiro, em

consonância com as legislações ambientais,

vem trabalhando nesse sentido. A Unica,

representando a indústria paulista produ-

tora de açúcar, etanol e bioeletricidade, e o

A cana e a natureza

Pantanal

Floresta Amazônica

Cana-de-açúcar

Mata Atlântica

Governo do Estado de São Paulo, assina-

ram, no dia 4 de junho de 2007, o Protoco-

lo Agroambiental do Setor Sucroalcooleiro.

Esse protocolo, de adesão voluntária, esta-

beleceu uma série de princípios e diretivas

técnicas, de natureza ambiental, a serem

observadas pelas indústrias da cana-de-

açúcar. O acordo prevê que, em 2010, 70%

da cana seja colhida sem queima, até che-

gar a 100% em 2014. Com a iniciativa, mais

de 20% da área colhida no Estado de São

Paulo na safra de 2008 já passou por pro-

cessos que não envolvem a queima.

A queima da cana não é uma ação altamente poluidora?

FONTE: MPE-Unicamp, IBGE e CTC.

Área mecanizável onde não se pode efetuar a queima da cana-de-açúcar

Ano Porcentagem de eliminação

2010 70% da queima eliminada

2014 Eliminação total da queima

Área não mecanizável, declividade superior a 12% e/ou com queima menor que 150 ha

2010 30% da queima eliminada

2017 Eliminação total da queima

Cronograma de eliminação da queima da cana-de-açúcarno Estado de São Paulo, segundo o Protocolo Agroambiental

Fonte: Protocolo Agroambiental, 2007.

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17

O mercado comprador dos

produtos gerados pela cana pode ser

resistente ao produto transgênico?

• Dificilmente teríamos um mercado de

etanol combustível com resistência ao pro-

duto transgênico. Não há justificativas

ambientais nem econômicas que sustentem

uma posição contrária à produção de cana

transgênica para tal fim.

• Em relação ao açúcar, tanto aquele origi-

nado de planta convencional quanto o pro-

veniente de plantas transgênicas vão apre-

sentar composição idêntica, uma vez que o

processo industrial degrada a proteína, até

mesmo a que diferencia a planta transgê-

nica da não transgênica. Vale lembrar que

assim como os outros produtos genetica-

mente modificados, a cana transgênica só

contará com aprovação para comerciali-

zação após preencher os requisitos de se-

gurança ambiental e alimentar da Comis-

são Técnica Nacional de Biossegurança

(CTNBio).

Quais as vantagens

da cana transgênica?

• A aplicação da engenharia genética nas

culturas – pelo menos nos produtos de pri-

meira geração – tem o objetivo de buscar

um aumento da produtividade, direta ou

indiretamente, que proporcione incremen-

to na renda de toda a cadeia, a começar

pelo produtor.

• Vantagens específicas da cana transgê-

nica dependem da característica incorpo-

rada geneticamente à planta. Por exemplo,

um gene que confere resistência à broca

da cana-de-açúcar e a outras lagartas ofe-

recerá ao produtor uma planta com menor

necessidade de medidas de controle des-

sas pragas, sejam biológicas, sejam quími-

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Mitos e fatos

CANA-DE-AÇÚCAR • AVANÇO CIENTÍFICO BENEFICIA O PAÍS

A cana e o etanol

cas, o que, por consequência, trará um

ganho monetário muito significativo, além

de benefícios ambientais muito grandes.

• Uma cana com maior teor de açúcar per-

mitirá a produção de maior quantidade de

açúcar e etanol nas mesmas áreas em que,

tradicionalmente, a cultura é plantada.

• Já uma cana tolerante à seca poderia ser

plantada em áreas de restrição hídrica, pos-

sibilitando o uso de locais hoje marginali-

zados. Ao mesmo tempo, permitiria melhor

aproveitamento da água nas regiões em

que é plantada atualmente.

Quais os perigos da polinização

(cruzamento) de cana transgênica

para a convencional?

• Nas condições de cultivo da cana no Bra-

sil, a polinização natural é raríssima, em ra-

zão da inexistência de condições climáti-

cas favoráveis para tanto. Mais importante

do que a possibilidade de polinização é a

de produção de sementes e, depois, de sua

germinação para o desenvolvimento de

uma nova planta. Isso porque a cana é ge-

rada pela multiplicação das gemas dos

colmos, e não das sementes (que são origi-

nadas do pólen). Contudo, mesmo nesses

casos, as condições climáticas são altamen-

te desfavoráveis.

• Também em tais casos as condições cli-

máticas são altamente desfavoráveis. Tan-

to é que não existem relatos de que uma

nova variedade de cana tenha sido encon-

trada no campo como resultado desse pro-

cesso. Ademais, os produtores procuram

evitar o florescimento da planta, pois, quan-

do isso ocorre, o teor de açúcar na cana –

índice que serve de referência para a remu-

neração do agricultor – cai.

A cana é natural do Brasil?

• Não, a cana é uma planta exótica oriun-

da de outra região do planeta, assim como

outras importantes culturas para o setor

agrícola brasileiro, a exemplo do milho, da

laranja e do arroz. A planta vem do Sudes-

te Asiático e foi introduzida no País pelos

portugueses, algum tempo após o desco-

brimento, da mesma forma como ocorreu

em todo o continente americano e em mui-

tos outros países tropicais.

O crescimento da produção de etanol

não tem sido exagerado?

• Não, até porque todo produto só é pro-

duzido se existe demanda. Assim tem sido

com o etanol, em razão da demanda inter-

na. A fabricação dos carros flex-fuel foi, sem

dúvida, um grande avanço, beneficiando os

usuários, que, democraticamente, podem

escolher o combustível que mais convém

economicamente. Quanto mais etanol for

produzido, mais barato ele ficará para o

consumidor e, consequentemente, maior

será sua vantagem em relação à gasolina.

Tanto é que, no ano de 2008, a venda de

etanol já suplantou em volume a de gaso-

lina.

O etanol polui menos

do que a gasolina?

• Sem dúvida. A gasolina é uma das gran-

des contribuidoras para o aumento dos ga-

ses de efeito estufa porque libera na at-

mosfera o carbono que estava armazena-

do no subsolo. Um estudo realizado em

2009 pela Embrapa Agrobiologia mostrou

que a substituição de gasolina por etanol

reduz em 73% as emissões de CO2. É que

cada hectare de cana diminui em 12 tone-

ladas o volume de CO2 na atmosfera.

• Isso sem considerar todas as vantagens

ambientais adicionais do uso do bagaço na

geração de energia elétrica. Hoje, com o

grande boom que houve no consumo de

etanol devido à introdução dos carros flex,

o benefício certamente é muito maior.

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A cultura da cana-de-açúcar traz van-

tagens para o meio ambiente?

• Sim, e por diversas razões. Uma delas é

que as pesquisas realizadas sobre a emis-

são de gases de efeito estufa (GEE) indi-

cam que o volume de carbono sequestrado

da atmosfera e incorporado ao solo pelo

sistema radicular da cana é da ordem de 3

a 5 toneladas de carbono por hectare ao

ano.

• Além disso, a substituição paulatina de

uma atividade (queima de combustíveis

fósseis) por outra menos poluente (amplia-

ção de cultivo de cana-de-açúcar e uso de

etanol como combustível) gera um cenário

ambientalmente mais atrativo, o que resul-

ta na redução do efeito estufa.

• Como já explicado anteriormente, o

etanol é muito menos poluidor do que a

gasolina. Além disso, o produto provenien-

te da cana-de-açúcar é ambientalmente

melhor do que o etanol produzido, por

exemplo, com base no milho. A maior van-

tagem ambiental da cana-de-açúcar em

relação ao milho ocorre pelo balanço

energético das duas culturas, o qual

corresponde à razão entre a energia libera-

da pela queima do etanol e a energia ne-

cessária para produzi-lo. Ou seja, para fa-

bricar etanol proveniente do milho é ne-

cessário gastar muito mais energia, até

mesmo energia fóssil poluidora do ambi-

ente, do que para produzir etanol com o

uso da cana-de-açúcar. Portanto, a contri-

buição do etanol de cana no combate ao

efeito estufa é muito superior à opção de

milho. Esse resultado ambiental positivo é

amplamente conhecido, o que garantiu vi-

sibilidade internacional ao programa de

etanol brasileiro.

O açúcar e o etanol obtidos

de cana-de-açúcar transgênica

oferecem perigo?

• Não. O açúcar e o etanol de cana trans-

gênica são idênticos aos produtos proveni-

entes da cana convencional. Tanto o açú-

car quanto o etanol são substâncias puras

e, portanto, independentemente da sua ori-

gem, apresentarão as mesmas característi-

cas físico-químicas, os mesmos riscos e os

mesmos benefícios. Por exemplo, o açúcar

que utilizamos no dia a dia é uma impor-

tante fonte de energia, mas se sabe que

seu uso em excesso está relacionado a pro-

blemas de saúde. Esses riscos, assim como

os benefícios, são inerentes ao açúcar, in-

dependentemente dele ter sido originado

de cana-de-açúcar transgênica ou da con-

vencional. Ou seja: não há nenhum risco

adicional em consumir açúcar ou utilizar

etanol obtido de cana transgênica.

• Além do fato de o açúcar e o etanol ex-

traídos de cana transgênica serem tão se-

guros quantos os já existentes, as varieda-

des de cana transgênica em si também só

serão liberadas após a comprovação cien-

tífica dessa segurança. Todas as variedades

transgênicas, antes de serem autorizadas

para comercialização, passam por rígidos

testes de avaliação de segurança, que se-

guem padrões internacionais. Somente

após a comprovação da segurança alimen-

tar e ambiental é que a nova variedade re-

cebe a autorização para ser comercializada.

É importante ressaltar que as principais so-

ciedades científicas do mundo declaram que

os transgênicos já comercializados hoje em

dia são tão seguros quanto seus equiva-

lentes convencionais. Esse é o entendimen-

to de renomadas instituições científicas, tais

como a OMS, a FAO, a Academia de Ciênci-

as do Brasil, do México, do Terceiro Mundo

e dos Estados Unidos, entre outras

(Consensus Document, 2004; FAO, 2004;

ICSU, 2003; The National Academy of

Sciences, 2000; WHO, 2002).

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Agência Internacional de Energia (IEA)http://www.iea.org

Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel)www.aneel.gov.br

Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP)http://www.anp.gov.br

Biocombwww.biocomb.com.br

Centro Nacional de Referência em Biomassahttp://cenbio.iee.usp.br

Centro de Tecnologia Canavieira (CTC)www.ctc.com.br

Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea)www.cepea.esalq.usp.br

Companhia Nacional de Abastecimento (Conab)www.conab.gov.br

Conselho de Informações sobre Biotecnologia (CIB)www.cib.org.br

Embrapawww.embrapa.br

Embrapa Agrobiologiawww.cnpab.embrapa.br

Empresa de Pesquisa Energéticawww.epe.gov.br

Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq/USP)www.esalq.usp.br

Etanol Verdewww.etanolverde.com.br

Food and Agriculture Organization (FAO)www.fao.org

Genoma da Cana (Fapesp)http://sucest.lad.dcc.unicamp.br/en

Inovação Unicamp Etanolwww.inovacao.unicamp.br/etanol

SETEMBRO/2009

Instituto Agronômico de Campinas (IAC)www.iac.sp.gov.br

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)www.ibge.gov.br

Instituto de Economia Agrícolawww.iea.sp.gov.br

Ministério da Agricultura (Mapa)www.agricultura.gov.br

Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT)www.mct.gov.br

Ministério das Minas e Energia (MME)www.mme.gov.br

Nacional Academy of Scienceswww.nasonline.org

Núcleo de Biotecnologia da Univ. Federal do Espírito Santo (Ufes)www.prppg.ufes.br/biotecnologia

Organização dos Plantadores de Cana da Região Centro-Sul do Brasil(Orplana)www.orplana.com.br

Programa Etanol Verdewww.ambiente.sp.gov.br/etanolverde

Rede Interuniversitária para Desenvolvimento do Setor Sucroalcooleirowww.ridesa.com.br

União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica)www.unica.com.br

União dos Produtores de Bioenergiawww.udop.com.br

Unesp – Universidade Estadual Paulistawww.unesp.br

Unesp Jaboticabalwww.fcav.unesp.br

Universidade de Campinas (Unicamp)www.unicamp.br

WHO – World Health Organizationwww.who.int

SITES RELACIONADOS