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SEMINÁRIO
VI ENCUENTRO INTERNACIONAL DE ECONOMÍA POLÍTICA Y DERECHOS
HUMANOS
ARGENTINA Y AMERICA LATINA DILEMAS DE UNA NUEVA ETAPA
ECONÓMICA, POLÍTICA Y SOCIAL
LA ECONOMÍA AL SERVICIO DE LOS PUEBLOS
Avaliação de Políticas Públicas Sociais: o caso do Fundo de Desenvolvimento
Industrial do Ceará
Eixo Temático: 2 – América Latina: Estratégias Nacionais e Integração Regional
Autor: Robert Paula Gouveia1
OBS: Autorizo a publicação deste artigo pela organização do evento.
Solicito, dentro das possibilidades, notebook e data show para a apresentação do artigo
através de slides.
1 Professor Assistente da Universidade Estadual Vale do Acaraú. Doutorando em Política Social pela Universidade de Brasilia – UnB.
Endereço Postal: SQS 412 – Bloco G – Apto. 207 – CEP: 70278-070 – Brasília/DF.
Fone: (61) 81534001
Email: [email protected]
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Avaliação de Políticas Públicas Sociais: o caso do Fundo de Desenvolvimento
Industrial do Ceará.
Robert Paula Gouveia2
Resumo
Este artigo visa apresentar a análise do Programa de Desenvolvimento Industrial do Estado
do Ceará, através do seu Fundo de Desenvolvimento Industrial - FDI no tocante à
configuração e abrangência dos direitos e benefícios previstos no Programa bem como
quanto à configuração do financiamento e gasto do mesmo, além da questão relativa à
participação e controle social democrático exercido pela sociedade envolvida.
Assim, segue as características da teoria de análise e avaliação de políticas sociais numa
perspectiva dialética, segundo a leitura do tema feita por autores como Boschetti (2009).
Ao final, espera-se perceber o verdadeiro caráter do referido Programa, em função do real
alcance social embutido em suas premissas.
Abstract
This article presents the analysis of the Industrial Development Programme of Ceará State, through its Industrial Development Fund - IDF regarding the configuration and scope of the rights and benefits under the program as well as the configuration of the financing and spending the same, beyond the question of the democratic participation and social control exercised by the company involved. Thus, it follows the features of the theory of analysis and evaluation of social policies in a dialectical perspective, the second reading of the subject made by authors such as Boschetti (2009). At the end, it is expected to realize the true character of that program, according to the real social impact inherent in its assumptions. Palavras-Chave
Política Pública; Política Pública Social; Avaliação de Políticas Públicas Sociais; FDI. 2 Professor Assistente da Universidade Estadual Vale do Acaraú – UVA e doutorando do Programa de Pós-Graduação em Política Social da Universidade de Brasília – UnB.
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Keywords
Public Policy, Public Social Policy, Social Assessment of Public Policies; FDI.
Introdução
As Políticas públicas sociais são ações no âmbito do Estado capitalista (embora não
necessariamente exclusivas dele) que visam desde minimizar os efeitos do sistema sobre os
agentes sociais menos protegidos, numa perspectiva institucionalista, até a proposição, a
tais agentes e à sociedade em geral, de possíveis modificações em suas realidades, aqui já
numa perspectiva dialética.
Nesse sentido, são essas políticas muito importantes para que a sociedade em questão possa
alcançar aquilo que se denomina Estado de Bem-Estar Social, no sentido de garantir
direitos e benefícios àqueles agentes menos protegidos socialmente, em princípio, e uma
abrangência universal desses direitos, isto numa visão idealista.
Assim, além de conhecer os conceitos inerentes ao tema, perpassando pelas principais
correntes teóricas a respeito, é indispensável uma análise avaliativa das mesmas, no sentido
de verificar se, de fato, estas políticas conseguem alcançar o objetivo de responder às
demandas sociais de forma efetiva e numa perspectiva promotora do bem-estar social.
Este trabalho visa então, apresentar a análise do Programa de Desenvolvimento Industrial
do Estado do Ceará, através do seu Fundo de Desenvolvimento Industrial - FDI no tocante
à configuração e abrangência dos direitos e benefícios previstos no Programa bem como
quanto à configuração do financiamento e gasto do mesmo, além da questão relativa à
participação e controle social democrático exercido pela sociedade envolvida. Assim, segue
as características da teoria de análise e avaliação de políticas sociais numa perspectiva
dialética, segundo a leitura do tema feita por autores como Boschetti (2009).
Nesse sentido, o objetivo aqui é apresentar os direitos e/ou benefícios previstos e/ou
implementados pelas políticas e/ou programas sociais, a fim de se aproximar do
estabelecimento das características essenciais do Programa (BOSCHETTI, 2009), além da
análise dos seus elementos de financiamento e gasto. Ademais, visa mostrar também a
organização e gestão da política do programa avaliado, bem como a participação e controle
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popular no âmbito desta política ou programa. Ao final, espera-se perceber o verdadeiro
caráter do referido Programa, em função do real alcance social embutido em suas
premissas.
Políticas Públicas e Políticas Públicas Sociais
A definição de política pública passa, em princípio, pela análise da atividade política
desenvolvida pelo Estado. A literatura sobre o tema, em geral, costuma definir este tipo de
política como um conjunto de decisões/ações relativas à alocação imperativa de recursos
públicos (RUA, 1998). A imperiosidade em questão vem do fato de que o Estado é o único
agente público a alocar de forma obrigatória, recursos públicos e, nesse sentido, é na esfera
política e na ação estatal, que surge a política pública, bem como a política pública social.
A definição mais sintética de política pública, apresentada por autores como Castro (2008),
apresenta política pública como sendo o Estado em ação. Nota-se em ambas as idéias, que o
Estado aparece como elemento central, norteador das políticas públicas, mas ambas,
igualmente, omitem o fato de que, não necessariamente, toda política pública é
exclusivamente estatal.
Nas últimas décadas, o tema políticas públicas tem estado na ordem do dia dos debates
nessa área. Autoras como Souza (2006) enfatizam que questões relativas à decisão,
implementação e avaliação das mesmas, têm tomado corpo e estado presente em todos os
bons debates sobre o tema. Isso pode ser atribuído, entre outros fatores, à adoção por parte
dos Estados, nos últimos tempos (notadamente os de caráter neoliberal), de políticas
restritivas dos gastos públicos, em substituição às políticas keynesianas do pós-guerra.
Nesse tipo de estratégia, que valoriza antes de tudo o ajuste fiscal e o equilíbrio
orçamentário, o Estado passa a se auto restringir em seu poder de intervenção em termos
de política econômica e social. Talvez esse fator inclusive, explique a incapacidade de
países em desenvolvimento em equalizar suas políticas públicas sociais.
Sabe-se que as políticas públicas sociais surgiram como disciplina acadêmica nos Estados
Unidos, com ênfase específica nos estudos sobre a ação governamental. Com o surgimento
da Guerra Fria (no período pós-Segunda Guerra, chegando ao clímax nos anos 1980), e a
chamada Teoria dos Jogos, a questão da ação governamental com base em estratégias
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ganhou mais corpo na academia americana. Em contrapartida, na Europa, a discussão era
mais complexa, passando pelos estudos explicativos acerca do papel do Estado (e não só do
governo) na produção de políticas públicas.
Desses debates, derivaram algumas outras definições de políticas públicas, a maioria
enfatizando o papel da política pública na solução de problemas, numa clara valorização de
aspectos racionais e de procedimentos relativos à questão. Nesse sentido, ficou claro, como
menciona Souza (2006), que as decisões e análises sobre políticas públicas implicariam
responder a questões do tipo: quem ganha o que com determinada política pública; por que
há esse ganho; e que diferença isto faz na sociedade. Críticos a essas definições de cunho
estruturalista, afirmam que elas ignorariam a essência do que realmente vem a ser uma
política publica, qual seja, um embate em torno de idéias e interesses.
De maneira geral, política pública, e política pública social em particular, seriam, a partir
dessas visões teóricas, campos multidisciplinares, focados nas explicações sobre a natureza
da política pública e seus processos, haja vista que ambas (políticas públicas e políticas
públicas sociais) repercutem diretamente nas economias e sociedades onde são
implementadas, mostrando as inter-relações existentes entre Estado, política, economia e
sociedade.
Nesse sentido, a política pública estaria definida a partir de quatro fases distintas: a
primeira seria a da formulação, onde Estado e setor econômico privado, além da sociedade
civil participariam, a partir de processos de discussão e deliberação entre todos, no sentido
de balizarem a fase subseqüente: a tomada de decisão. Na esfera estatal estariam presentes
políticos, burocratas, parlamentares; da parte do setor econômico privado, empresários e
representantes do capital (nacional e multinacional); pela sociedade civil, movimentos
sociais organizados, organizações não-governamentais, associações profissionais, entre
outros.
A segunda fase (decisão) geraria ações mais contundentes do Estado, com uma maior ou
menor participação privada, a partir da escolha entre as alternativas geradas anteriormente.
Aqui as demandas sociais seriam atendidas através de soluções para os problemas
apresentados. Na terceira fase, haveria a implantação das políticas, onde ocorreriam as
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ações para alcançar os objetivos, a partir da ação de indivíduos ou grupos públicos ou
privados.
Por fim, na última fase, seriam avaliados os resultados, a partir do
acompanhamento/monitoramento das políticas, comparando-se os objetivos traçados na
fase de formulação, com esses resultados específicos.
Resumidamente, pode-se afirmar que a política pública analisa amplamente a ação do
governo, propondo inclusive, quando oportuno, mudanças nessa ação. Percebe-se pela
segmentação apresentada, que através das políticas públicas os governos explicitam (ou
não) suas plataformas eleitorais em programas ou ações para a realidade onde atuam, e que
estes programas ou ações, ao serem implementados, estão sujeitos a acompanhamento e
avaliação.
Nota-se também a presença da chamada autonomia relativa do Estado em todo esse
processo. Souza (2006) menciona, nesse sentido, que essa autonomia seria o espaço próprio
do Estado, permeável a influências externas e internas, vindas de grupos de interesses
públicos ou privados, de movimentos sociais, etc.
A evolução dos estudos nessa área deu origem às análises no campo do Estado de Bem-
Estar Social (Welfare State, no original), a partir da visão de Marshall (1967), onde a
política pública social passa a ser o centro, definida como todo bem produzido para
promover socialmente as coletividades em diferentes campos.
A partir daí, várias análises sobre o tema se sucederam, como a formulada por Gasta
Esping- Andersen (2000), vinculando políticas públicas a fatores tais como, o regime
político da sociedade em questão (que responderia às questões de como e porque são
formuladas as políticas públicas sociais); a organização dos partidos políticos (os quais
aumentariam o controle social sobre a implantação das políticas públicas sociais); e a
organização sindical e os movimentos sociais (importantes em influenciar a formulação e a
implantação dessas políticas). Percebe-se aqui, como no tocante às políticas públicas em
geral, o papel central do Estado, responsável pelas ações, instituições e programas
específicos para a implantação das políticas e programas nesse sentido.
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Uma outra corrente de pensamento teórico sobre política social, de cunho dialético, sugere
uma definição da questão não apenas sob o olhar técnico-científico, mas também a partir de
conceitos baseados na ética. Autoras como Pereira (2008) lembram que este outro olhar
sobre as políticas públicas sociais afeta fortemente a vida social, uma vez que enfatiza a
necessidade de que direitos sociais se efetivem no atendimento às chamadas demandas
sociais, o que amplia a perspectiva de cidadania das coletividades envolvidas.
A identificação por esta vertente teórica, e por Pereira (2008) em particular, da política
pública social como uma política de ação, que tem todo um perfil próprio e que produz
efeitos onde atua, mostra que ela é pensada não apenas como uma disciplina teórica, que se
dispõe a conhecer e explicar a realidade, mas também como uma ferramenta prática, no
sentido de agir sobre essa realidade, visando alterá-la. Aqui a autora chama atenção para
um fato importante: sendo a política pública social também, e fortemente, prática no
sentido mencionado, ela não deve confundir-se com o conceito de administração social,
bem mais limitado ao âmbito pragmático e empírico, que nega a relação das políticas ou
programas sociais com a sociedade em geral. Isto porém, não nega o fato de que a política
pública social e a administração se influenciam mutuamente (toda ação posta em prática
afeta a conjuntura, levando a novas decisões a serem geridas pela administração), embora
não signifiquem a mesma coisa.
Em relação às políticas públicas, é correto afirmar que política social se enquadra enquanto
um tipo de política pública, ou uma espécie do gênero, como afirma Pereira (2008). Ambas
seriam políticas de ação, lembrando que o termo público não significa ação exclusiva do
Estado, como já mencionado, mas sim como algo que faz referência a todos (a toda a
coletividade envolvida), no atendimento de demandas sociais.
Cabe ainda ressaltar, o caráter contraditório inerente as políticas públicas sociais. Em tese e
de forma bastante resumida, como se supõe pelas definições apresentadas (tanto as
tradicionais quanto a dialética) política pública social significa a promoção do bem comum.
Entretanto, chama atenção o fato de que, na prática, a política pública social sempre
atenderá a interesses específicos, estando ou não efetivamente, a promover esse bem
coletivo. Na verdade, Pereira (2008) chama atenção para esse fato mostrando sua
tendenciosidade de acordo com a correlação de forças existentes, o que a tornaria, na sua
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visão, dialeticamente contraditória. A autora, entretanto, afirma que é essa contradição que
possibilita à classe trabalhadora e aos desprotegidos socialmente de modo geral, a também
utilizá-la a seu favor.
A teoria tradicional afirma ainda que isso ocorre porque grupos de poder, portadores de
interesses organizados, atores com voz ativa, capazes de pressionar por suas demandas
específicas (sendo ou não atores estatais), afetam o desenho e, conseqüentemente, a
implantação dessas políticas.
Conclui-se, portanto, que por trás do marco regulatório de qualquer política, haverá sempre
interesses ideológicos associados. No Brasil, os exemplos do Sistema Único de Saúde
(SUS), a partir do movimento sanitarista, e a montagem do sistema de ensino público
superior durante o regime militar, voltado às elites, e que abriu espaço para a atuação do
setor privado em outros “nichos mercadológicos” da sociedade brasileira, são clássicos
nesse sentido.
Notadamente no caso brasileiro, as especificidades precisam ser analisadas desde a origem
do papel do Estado enquanto fomentador de políticas públicas sociais. Nesse caso, sua
“opção” inicial foi a geração de emprego e renda e o barateamento do custo de produção
do capital, a partir dos investimentos geradores de infra-estrutura a serviço do setor
capitalista privado. Ambas as ações, inclusive, com um mesmo objetivo: a consignação de
lucratividade e expansão do capital em âmbito interno (capital nacional e multinacional),
haja vista que fornecer mão-de-obra e infra-estrutura significa “abastecer” de fatores
produtivos qualquer processo capitalista de produção e troca.
Essa lógica, todavia, foi, e é incompatível com a universalização de serviços públicos
sociais, notadamente em países reconhecidamente pobres (caso brasileiro), dada, entre
outros fatores, a necessidade de priorização de recursos. Assim é que, somente a partir da
Constituição Federal de 1988, o Estado brasileiro assume (tardiamente, em relação a
muitos dos países capitalistas – desenvolvidos ou não) efetivamente a formulação e a
gestão das políticas públicas sociais. Mas apesar do advento do que se convencionou
chamar constituição cidadã, muitas dessas políticas seguem até hoje mais como arremedos
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de ações sociais que propriamente com modelos nesse sentido, embora tenha havido certos
avanços em algumas áreas (casos da saúde e educação, por exemplo).
Dados recentes mostram que o Brasil, teoricamente, investe razoavelmente bem em
políticas sociais, o que gera contradição com o fato de ser uma das sociedades mais
desiguais do mundo. Disso resulta a compreensão de que a questão social brasileira é
urgente no tocante à ênfase a ser dada às políticas públicas sociais. Assim, a avaliação das
mesmas faz-se necessário enquanto instrumento primordial de esclarecimento da questão.
A Avaliação das Políticas Públicas Sociais
Antes de qualquer análise mais profunda sobre a questão da avaliação, faz-se necessário
definir o que vem a ser a avaliação de políticas públicas. Autoras como Arretche (2006),
enfatizam, de início, que se trata de um tipo de julgamento valorativo (medida de
aprovação ou desaprovação), que de forma alguma é técnico ou neutro.
Do ponto de vista analítico, lembra a autora, existem algumas tendências de avaliação de
políticas públicas sociais classificadas a partir das questões ligadas à efetividade, eficácia e
eficiência das mesmas. Efetividade é aquilo que relaciona a implementação de dada
política ou programa social e seus resultados, isto é, seu sucesso ou fracasso em mudar
uma realidade. A dificuldade aqui seria, de acordo com Arretche (2006), encontrar
precisamente a relação de causalidade entre os resultados encontrados e os produtos
oferecidos por aquela política ou programa.
Em termos de eficácia, entende a autora que se trata da relação entre os objetivos de uma
dada política ou programa social e os resultados alcançados (relação meta proposta/meta
alcançada). Trata-se da mais utilizada das formas de avaliação de políticas públicas sociais,
já que é mais factível e de mais baixo custo. Já em termos de eficiência, faz-se a relação
entre os esforços empregados na implementação de dada política ou programa e os
resultados obtidos a partir desses esforços. Segundo Arretche (2006), a mais necessária e
urgente forma de avaliação a ser desenvolvida, dada a escassez de recursos públicos, o
tamanho das populações (no Brasil, especificamente) a serem atendidas e o caráter
democrático que deve ser dado a essas políticas ou programas sociais.
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A autora enfatiza ainda dois aspectos importantes acerca da questão da avaliação de
políticas públicas sociais: primeiro a questão da avaliação como instrumento democrático,
vendo-a como uma das etapas inerentes à política pública social, e destinada a influenciar
sua reformulação (durante ou após sua implementação). Ademais, sinaliza ainda a autora
da necessidade de que essas avaliações se dêem de forma independente, a fim de um maior
e melhor controle sobre as ações públicas tanto dos cidadãos sobre o governo, como do
governo com relação a si próprio. Isto porque, segundo ela, instituições independentes
teriam mais condições e incentivos para montar instrumentos mais (mas não totalmente)
isentos de avaliação das ações governamentais.
Outros autores, de visão mais ou menos tecnicista, fazem análises de avaliação das
políticas públicas sociais a partir de uma questão para eles central: por que se deve
avaliar/monitorar políticas públicas sociais? Segundo Costin (2008), deve-se evitar a
tecnocracia e as más interpretações a partir da frieza dos dados. A autora mostra como
exemplo, o caso da educação brasileira, onde 97% das crianças entre 7 e 14 anos tiveram
acesso ao ensino fundamental no Brasil na década passada, correspondendo a um
investimento médio da ordem de 4,3% do PIB no período (maior relativamente que os
investimentos alemão, japonês ou irlandês). Todavia, os resultados brasileiros em testes
internacionais de desempenho escolar, mostraram-se, segundo ela, insatisfatórios, o que
claramente denota contradição e necessidade de uma investigação das causas desse
fenômeno.
Afirma ainda a mesma autora, sobre a necessidade, nesses processos de avaliação, da
definição prévia de critérios realistas de avaliação/resultados esperados ainda na fase de
planejamento (um tipo de avaliação ex ante), com um monitoramento dessa paralelo dessa
política pública social. No final, deve-se debruçar sobre os resultados, no sentido de
incrementá-los ou corrigi-los.
Tal avaliação exigiria ainda, segundo a autora, o uso de procedimentos sistemáticos de
pesquisa social, a fim de se verificar a efetividade dessas intervenções no âmbito da
sociedade. Nesse sentido, seria importante a participação dos chamados agentes de
avaliação, que seriam: os agentes internos (formuladores, ou representantes destes, da
política pública em avaliação, e que costumam ser pouco críticos nesse momento); os
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agentes externos (não formuladores da política pública e que podem vir a ser
exageradamente críticos, ainda que sejam política e eticamente isentos); os agentes
participativos (beneficiários das políticas públicas e fontes potencialmente positivas em
termos de críticas as mesmas, enquanto maiores interessados no seu sucesso); e os agentes
mistos (que englobariam um “mix” de avaliadores das três vertentes apresentadas).
Vale lembrar, ainda segundo a autora, que a atuação dos agentes avaliadores tem o
objetivo de garantir um controle social eficiente da implantação e efetividade das políticas
públicas, sendo este o principal meio de sustentação desta avaliação. Se este raciocínio
procede, talvez possa se associar aqui o exemplo brasileiro dos orçamentos participativos,
mesmo sabendo-se das limitações e dificuldades enfrentados pelos diversos níveis de
poder público para sua implantação e efetivação enquanto instrumentos de atuação social.
Ademais, nessa concepção, a avaliação de políticas públicas passa por uma cronologia
temporal que se inicia pelo levantamento objetivo do problema a ser combatido, a partir da
busca por informações, dados estatísticos e indicadores acerca da questão. Em seguida,
segundo ele, avalia-se a real capacidade de implantação de políticas públicas pelo Estado,
via observação quanto ao montante de recursos financeiros, humanos e infra-estruturais
disponíveis para esse tipo de ação pública. Por fim, faz-se necessário observar as
condições presentes do problema (conjuntura social), além de buscar apreender as visões
relevantes na sociedade sobre o mesmo, ou seja, sua interpretação acerca daquilo que a
aflige.
Aliás, essa interação entre setor público e sociedade, no sentido de garantir a qualidade
(em sentido amplo) das políticas públicas – especialmente as ditas sociais – em curso na
coletividade, é, ou deveria ser, a prioridade de movimento nesse tipo de ação.
Seguindo este raciocínio, percebe-se que os objetivos da análise/avaliação de políticas
públicas sociais passam por questionar a ação dessas políticas, seus determinantes, suas
finalidades, seus processos e suas conseqüências.
Aqui, o foco da análise seria, segundo a autora, a avaliação dos processos de tomada de
decisão voltados para a implantação de uma política ou de um grupo delas. Isso se daria:
pela descrição dos ordenamentos institucionais e sua influência sobre o processo decisório;
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pela identificação dos participantes das políticas e das coalizões que podem formar; e pela
avaliação dessas possíveis coalizões sobre as decisões de política pública. Seria assim,
indispensável a participação direta e atuante dos atores sociais mais fortemente ligados aos
potenciais resultados das políticas públicas sociais que estão sendo gestadas.
Numa perspectiva diferente, autores ligados à tradição dialética, como Behring e Boschetti
(2006), por exemplo, fazem uma análise mais crítica no tocante à relação das políticas e
programas sociais com o Estado e as classes sociais. Nesse sentido, segundo as autoras, as
políticas sociais não significariam apenas possibilidades de confronto quando das tomadas
de decisão, mas sim elementos de regulação política e econômica das relações sociais.
Assim, salienta Boschetti (2009), analisar e avaliar políticas sociais não se limita a usar
métodos e técnicas racionais e operativas, preocupados apenas com questões como relação
custo-benefício ou elementos do tipo eficiência e eficácia. Trata-se de algo bem mais
abrangente e complexo, já que busca compreender o papel do Estado e das classes sociais
na efetivação da cidadania de forma democrática. Isso se traduz, entre outras coisas, na
garantia de ganhos para a classe trabalhadora a partir dos limites impostos ao capital pelas
políticas sociais, como mostrou Marx (1984), em suas análises sobre as primeiras
legislações fabris na Inglaterra do século XIX.
Nesse sentido, conhecer elementos tais como o grau de desenvolvimento/estratégias de
acumulação do sistema capitalista no qual a política social está sendo implementada, o
papel do Estado na regulamentação e implementação dessa política, bem como o papel
desempenhado pelas classes sociais inseridas nesse contexto, é central no entendimento de
como surgiu e se desenvolveu certa política social. A partir disso, segundo Boschetti
(2009), é possível a constituição de indicadores de análise que permearão a avaliação dessa
política, determinando assim o grau de justiça social por ela produzido.
A partir dos elementos teóricos expostos, passa-se à análise de avaliação de uma política
pública pretensamente social implementada pelo Governo do Estado do Ceará (o FDI). Tal
análise, baseada na visão dialética de avaliação de políticas sociais, será feita na tentativa
de se perceber o alcance social da referida política.
FDI: uma política pública social?
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Para uma avaliação consistente de qualquer política pública social, Boschetti (2009) afirma
que se faz necessário conhecer sua configuração, no sentido de se ter um panorama geral
dessa política e de suas possibilidades de atendimento às demandas sociais a ela
relacionadas. Assim, alguns elementos como os direitos e benefícios por ela estabelecidos
e assegurados, seu sistema de financiamento (fontes, montantes e gastos), bem como sua
forma de organização (gestão), seriam valiosos na visão da conformação dessas políticas.
A começar pela configuração e abrangência dos direitos e benefícios previstos na política
social em questão, conhecer os tipos e a natureza dos benefícios/serviços previstos
significa, segundo Boschetti (2009), explicitar suas propriedades/qualidades, bem como sua
possibilidade de responder à determinada situação social e contribuir para reduzir
desigualdades sociais.
O Fundo de Desenvolvimento do Estado do Ceará – FDI, tem por objetivo fomentar a
política industrial do Estado do Ceará, compreendendo ações voltadas para a atração
seletiva de investimentos industriais, visando a formação e o adensamento das cadeias
produtivas selecionadas e a formação de aglomerações espaciais. Visa ainda disponibilizar
a infra-estrutura necessária para a implantação e pleno desenvolvimento da atividade
produtiva, através inclusive de treinamento e capacitação de mão-de-obra.
Trata-se assim, de incentivos a Pessoas Jurídicas empresárias ou cooperativas, de caráter
industrial, que se instalem ou venham a se expandir no Estado do Ceará, e que sejam
consideradas de fundamental interesse para o desenvolvimento econômico local, o que lhe
confere um caráter de seletividade na concessão dos benefícios previstos.
Tais incentivos se apresentam na forma de: aquisição e alienação de ações, debêntures
conversíveis ou não em ações e de cotas de capital de sociedades empresárias estabelecidas
no Estado do Ceará; concessão de empréstimos, a médio e longo prazos, inclusive com
subsídios sobre o principal e encargos financeiros, e a prestação de garantias às sociedades
empresárias com estabelecimento situado no Estado do Ceará; concessão de subsídios de
tarifas de água e de esgoto às sociedades empresárias com estabelecimento situado no
Estado do Ceará; concessão de incentivos fiscais relativos ao Imposto sobre Circulação de
Mercadorias e Serviços (ICMS) (através da dilação do prazo de pagamento de parcela do
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saldo devedor mensal do imposto, com dedução de percentual dessa parcela, no caso de
liquidação do débito até a data do vencimento da dilação, do diferimento do momento de
pagamento total ou parcial do imposto, com dedução de percentual total ou parcial do
montante diferido, no caso de liquidação do débito até a data do vencimento do
diferimento, da concessão de crédito fiscal presumido e de redução da base de cálculo do
imposto); concessão de incentivos financeiros relacionados ao ICMS, com a concessão de
empréstimos, a médio e longo prazos, inclusive com subsídios sobre o principal e encargos
financeiros. Nessas operações o percentual do empréstimo ou do incentivo não poderá
ultrapassar 75% (setenta e cinco por cento) do ICMS próprio gerado pela sociedade
empresária beneficiária, exceto para os seguintes segmentos: extração de minerais
metálicos; fabricação de produtos de minerais não metálicos; fabricação de produtos
famoquímicos e farmacêuticos; fabricação de automóveis, caminhonetas, utilitários,
caminhões e ônibus; fabricação de produtos químicos; indústria têxtil; e fabricação de
calçados.
No tocante ao aspecto da legalidade, o FDI, está descrito na Lei no. 10.367, de 07/12/1979
e alterações e sua regulamentação encontra-se no Decreto no. 29.183 de 08/02/2008.
O Programa prevê ainda, como requisito básico para a concessão dos benefícios previstos, a
regularidade fiscal prévia por parte dos pretensos beneficiários junto ao fisco Estadual.
No que concerne à continuidade do Programa, este prevê um prazo máximo de concessão
dos benefícios de cinco a dez anos (de acordo com critérios do FDI de pontuação),
prorrogáveis por igual período, atendidas as prerrogativas da legislação, que englobam
exigências quanto à geração de emprego, ao custo da transação, à localização do
empreendimento (distância em relação à capital do Estado), à responsabilidade social,
cultural e ambiental, às atividades de pesquisa e desenvolvimento, e à adequabilidade à
base de produção regional (avanços na consolidação de setores econômicos considerados
estratégicos pela administração estadual).
No tocante à abrangência dos benefícios, aspecto que revela o alcance da política ou
programa a ser avaliado, Boschetti (2009) chama atenção para o fato de que esse indicador
deve estar sempre relacionado ao universo a que a política ou programa se destina.
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Os benefícios previstos no FDI têm abrangência direta junto às pessoas jurídicas de caráter
industrial que venham a se instalar ou a expandir atividades no Estado do Ceará, dentro das
prerrogativas (já mencionadas) do Programa. Ademais, indiretamente, o FDI pretende
contemplar os mercados produtivo e de trabalho no Ceará (abrangência focalizada e
seletiva), atingindo diretamente os agentes inseridos nesses mercados.
Já em relação aos critérios de acesso aos benefícios de uma política ou programa social,
estes revelam, segundo Boschetti (2009), a capacidade de inclusão ou exclusão aos mesmos
por parte dos beneficiários. Quanto mais rigorosos, mais focalizados e seletivos tende a ser
a respectiva política.
Assim, para ter acesso aos benefícios do FDI, o potencial beneficiário deve seguir
procedimento específico, previsto na legislação que institui e regulamenta o Programa.
Nesse sentido, é necessário que o interessado requeira, através de formulário próprio, sua
inserção no Programa, submetendo para tanto um projeto de viabilidade econômico-
financeira do empreendimento correspondente. Esta submissão (cuja conformação está
prevista e descrita na legislação mencionada) deve se direcionar ao Conselho Estadual de
Desenvolvimento Econômico - CEDE, que o submeterá ao órgão gestor do FDI, sendo o
mesmo encarregado de examinar as demandas de incentivos sob os seguintes critérios:
discriminação de enquadramento do pleito; discriminação do tipo de operação; e
justificativa e estudo de viabilidade, abrangendo aspectos econômicos, financeiros,
administrativos e jurídicos.
Em se trantando das formas/mecanismos de articulação com outras políticas sociais e ainda
de acordo com Boschetti (2009), cada programa ou política social se destina a situações
específicas, o que torna importante identificar possíveis articulações/complementariedades
entre a política avaliada e as demais, facilitando uma avaliação mais precisa acerca das
possibilidades do poder público em assegurar os direitos básicos de cidadania à população
envolvida.
No tocante ao FDI, pode-se vincular (direta e/ou indiretamente) seus objetivos às políticas
fiscal, de desenvolvimento econômico e social, de trabalho e do meio ambiente.
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Em relação à política fiscal, a questão da preocupação quanto à regularidade junto ao fisco
estadual mostra a identificação do Programa com o princípio da anterioridade da política
pública. No que concerne ao mercado local de trabalho, há a referência quanto à
obrigatoriedade de estipulação de metas de geração de empregos enquanto parâmetro de
avaliação da proposta do beneficiário. O desenvolvimento econômico e social está
contemplado quando da preocupação com os tipos e natureza das atividades produtivas a
serem desenvolvidas a partir dos benefícios previstos pelo Programa, as quais devem
priorizar as conseqüências sociais (diretas e indiretas) junto à população local. Ademais, a
estipulação de metas fiscalizáveis de volume de investimentos e custos de frete para o
período de vigência do contrato, sugere atenção para a questão do desenvolvimento do setor
industrial.
Quanto à configuração do financiamento e gasto de uma política social, e especialmente em
relação às suas fontes de financiamento, Boschetti (2009) afirma que analisar esses
elementos seria útil para a compreensão de seus impactos na natureza e alcance dos direitos
a que se destina, partindo de sua estrutura orçamentária. Fagnani (1998) por sua vez, chama
atenção para o fato de que tal análise pode contribuir para definir a existência, concepção,
efetivação e extensão das políticas sociais.
No âmbito do FDI, o Decreto no. 29.183 que o regulamenta afirma, em seu artigo 5º., que
os recursos necessários à implementação do sistema de incentivos do Programa são aqueles
que o constituem, ou seja, são de origem orçamentáriaras ; são empréstimos de recursos a
fundo perdido oriundos da União, Estado e outras entidades; são contribuições, doações,
legados e outras fontes de receitas que lhe foram atribuídas; e/ou são receitas decorrentes da
aplicação de seus recursos.
No tocante aos incentivos do tipo fiscal, faz-se necessário definir o caráter da fonte do
financiamento (se regressivo ou progressivo) a fim de que se esclareça tratar-se ou não de
renúncia fiscal por parte do Estado ao conceder o benefício.
Nesse sentido, se a redução de alíquota do referido imposto for considerada uma renúncia
de arrecadação por parte do Estado, caracteriza-se o caráter regressivo da referida fonte,
17
uma vez que transfere o ônus do financiamento para os demais contribuintes que não têm
suas alíquotas diminuídas. E mais, em função da Lei de Responsabilidade Fiscal, qualquer
redução na arrecadação decorrente de incentivos fiscais deve ter seu impacto mensurado e
compensado por outras meios, como elevação de outros tributos ou aumento da base de
contribuintes.
Ademais, ainda onera a todos os cidadãos (contribuintes ou não), que vêem a arrecadação
diminuir, diminuindo também seu poder de resposta quanto às demandas sociais inerentes a
um estado como o Ceará, prejudicando a população menos protegida socialmente, na
medida em que aprofunda a concentração de renda e aumenta as desigualdades sociais.
Em contrapartida, se a redução de alíquota não é considerada renúncia fiscal, mas um fator
de atração/alavancagem de investimentos produtivos para o Estado, tem-se uma situação
inversa, ou seja, de progressividade da fonte de financiamento do benefício. Isso porque,
haveria incremento no nível da atividade produtiva, gerando um ciclo virtuoso de produção,
remuneração e consumo, apontando para uma potencial elevação da arrecadação.
Além disso, a simples inclusão de beneficiários no Programa geraria um adicional de
receita ao fisco que não aconteceria caso os incentivos não fossem concedidos (atração de
novas empresas/estímulo ao crescimento das empresas já instaladas). Esta é inclusive a
posição oficial do Estado do Ceará nesta questão (CEARÁ, 2011).
No que diz respeito à direção dos gastos, Boschetti (2009) afirma que este indicador
significa a análise da aplicação dos recursos de uma política ou programa social no sentido
de se verificar o grau de prioridade dos mesmos, segmentando essa prioridade por regiões e
relacionando com as necessidades e índices socioeconômicos locais.
No tocante ao FDI, cujas possíveis características de financiamento foram explicitadas,
pode-se afirmar que a idéia do benefício é a de ser um instrumento de atração de
investimentos produtivos que venham a fortalecer e/ou consolidar o mercado produtivo
local, incrementando, indiretamente o mercado de trabalho, o que se daria via geração de
emprego e renda, a partir do estabelecimento prévio de metas a serem alcançadas por parte
das sociedades empresárias beneficiadas. O Decreto no. 29.183, que regulamenta o FDI,
menciona ainda, em seu artigo 2º., a formação e o adensamento das cadeias produtivas
18
selecionadas e a formação de aglomerações espaciais, além da disponibilização da infra-
estrutura necessária para a implantação e pleno desenvolvimento da atividade produtiva,
através inclusive de treinamento e capacitação de mão-de-obra. Todas essas possíveis
ações, diretamente vinculadas à atração e posterior ação empresarial.
Nesse sentido, o documento de revisão do Plano Plurianual 2088/2011 do Governo do
Estado do Ceará é bastante claro ao salientar que o objetivo do Programa é executar a
política de incentivos fiscais concedidos, através do FDI, visando ampliar a base industrial
do Estado, sendo os empresários interessados em investir no Ceará, seu público-alvo
(CEARÁ, 2011).
A magnitude dos gastos é o indicador que verifica, segundo Boschetti (2009), o volume de
investimentos feitos nas políticas ou programas sociais, analisando se houve manutenção,
crescimento, redução ou realocação de recursos, o que explicita seu comportamento ao
longo do tempo.
Nesse mister, nos últimos três anos, entre 2008 e 2010, o FDI tem mostrado uma diferença
da ordem de 30% (trinta por cento) entre o que foi orçado inicialmente enquanto dotação
orçamentária para o Programa e o que foi efetivamente pago, conforme mostra a Tabela 1.
Já em relação à arrecadação total do Estado e à arrecadação de ICMS, para o mesmo
período, notam-se magnitudes muito próximas, o que denota a relativa importância do
volume de recursos do Programa em relação à arrecadação do Ceará, além da proximidade
entre o total arrecadado e o total de receita proveniente do ICMS, conforme mostra a
Tabela 2.
Quando se compara as magnitudes dos orçamentos do FDI e das áreas de educação e saúde
para o mesmo período, percebe-se uma maior relevância do orçamento do FDI em relação
aos demais, ainda que em trajetória de queda (Tabela 3).
Tabela 1 – Orçamento do Fundo de Desenvolvimento Industrial - FDI
Programa Ano Variação
FDI 2008 2009 2010 %
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Orçamento R$ 119.540.000,00 R$ 113.275.387,54 R$ 84.464.000,00 -29,34%
Autorizado R$ 103.566.686,92 R$ 102.528.387,54 R$ 71.674.001,32 -30,79%
Empenhado R$ 101.784.710,05 R$ 77.331.615,31 R$ 70.967.372,41 -30,28%
Pago R$ 101.784.710,05 R$ 73.512.549,72 R$ 70.967.372,41 -30,28%
Fonte: QDD 2008/2009/2010 – Governo do Estado do Ceará. Elaboração própria (valores
atualizados)
Tabela 2 – Participação FDI na arrecadação total e arrecadação ICMS
Ano FDI (Pago) ICMS Arrecadado Arrecadação Total % FDI-ICMS % FID-Arrecação Total
2008 R$ 101.784.710,05 R$ 5.641.428.300,26 R$ 5.960.807.995,05 1,80% 1,71%
2009 R$ 73.512.549,72 R$ 5.517.929.548,03 R$ 5.857.358.695,81 1,33% 1,26%
2010 R$ 70.967.372,41 R$ 6.492.061.029,62 R$ 6.871.484.903,30 1,09% 1,03%
Fonte: QDD 2008/2009/2010 – Governo do Estado do Ceará. Elaboração própria (valores
atualizados)
Tabela 3 – Magnitude orçamento FDI em relação aos orçamentos da Educação e Saúde
Ano FDI (Pago) Orçamento Educação
(Pago) Orçamento Saúde (Pago) % FDI-EDUCAÇÃO % FID-SAÚDE
2008 R$ 101.784.710,05 R$ 2.638.821.357,00 R$ 749.981.970,80 3,85% 13,57%
20
Fonte: QDD 2008/2009/2010 – Governo do Estado do Ceará. Elaboração própria (valores
atualizados)
Dados do Conselho Estadual de Desenvolvimento Econômico do Estado do Ceará – CEDE,
apontam no ano de 2008, para um total de 14 empresas implantadas a partir do FDI, que
geraram um total de 1.445 empregos diretos. Se dividirmos o valor do FDI pago em 2008
pelo número de empresas implantadas segundo o CEDE, teremos um valor médio de
incentivo da ordem de aproximadamente R$ 6.000.000,00/empresa, e em torno de 100
empregos criados por empresa, totalizando um custo por emprego da ordem de R$
60.000,00.
Por fim, no que concerne à gestão e controle social democrático das políticas sociais, e
especificamente quanto às relações entre as esferas governamentais nesse sentido, Boschetti
(2009) afirma que o objetivo deste indicador é verificar os papéis assumidos em cada uma
das esferas governamentais no tocante ao objeto da política ou programa avaliado. Se há
respeito à descentralização na formulação/execução da política ou programa, a quem cabe a
delimitação de normas, a responsabilidade de financiamento, se há superposição de
ações/competências, se há estrutura institucional adequada e necessária à implantação da
política ou programa.
A administração do FDI cabe ao seu órgão gestor, segundo critérios propostos pelo CEDE e
pelo Conselho de Desenvolvimento Industrial do Estado do Ceará – CEDIN, que é um
colegiado de deliberação superior e de definição normativa da política de incentivos sendo
presidido pelo Governador do Estado e integrado pelo Presidente do CEDE, pelos
Secretários de Estado da Fazenda, do Planejamento e Gestão, do Desenvolvimento Agrário,
e pelo Presidente da Agência de Desenvolvimento do Estado do Ceará – ADECE. Além do
CEDIN, foi instituída a Comissão Técnica do FDI, com a finalidade de proceder à
avaliação econômica, financeira, operacional e tributária dos projetos apresentados pelas
2009 R$ 73.512.549,72 R$ 2.793.871.120,00 R$ 890.320.079,20 2,63% 8,25%
2010 R$ 70.967.372,41 R$ 3.311.648.711,00 R$ 1.099.645.052,00 2,14% 6,45%
21
sociedades empresarias interessadas em investir no Ceará, bem como gozarem dos
benefícios disciplinados na legislação do FDI.
Ambos os grupos têm hierarquia e competências legalmente definidas, previstas no Decreto
no. 29.183, de 08/02/08, que regulamenta o FDI.
No tocante à relação entre estado e organizações não governamentais Boschetti (2009)
recomenda a avaliação e compreensão da relação existente entre os órgãos públicos e as
organizações não governamentais que atuam na implementação da política e/ou programa
avaliado.
No caso do FDI, não há qualquer referência da participação de organizações não
governamentais na implementação do Programa.
Já em termos de participação e controle social democrático há, segundo a referida autora, a
necessidade de análise quanto aos mecanismos de controle de que dispõe a sociedade civil
para acompanhar o andamento dos programas e políticas avaliados. Nesse sentido, visa
discutir as atribuições dos movimentos sociais e conselhos de gestão que por ventura
participem deste processo avaliativo.
A legislação que estabelece e regulamenta o FDI não faz qualquer previsão no sentido da
participação e controle social do Programa. Assim, do ponto de vista da ação popular, não
há qualquer participação da sociedade quanto à definição de agenda, ao planejamento,
acompanhamento e fiscalização do Programa. Apesar de previsto e orçado nas contas
públicas do Estado, este não dispõe de um instrumento como o orçamento participativo,
restringindo a observação/avaliação popular ao seu chamado portal da transparência, no seu
website (CEARÁ, 2011).
No tocante à composição e confronto das forças políticas inseridas no contexto do FDI, o
que se percebe é um amplo apoio ao programa de entidades classistas empresariais, como a
Federação das Indústrias do Estado do Ceará – FIEC, além de parte crescente do
movimento sindical local (observação direta, in loco), no caso o Sindicato dos
Trabalhadores da Indústria de Calçados de Sobral/CE, numa clara postura que Alves (2005)
chamaria de cooperação conflitiva, em lugar da confrontação direta.
Considerações Finais
22
A partir do que foi exposto até aqui, se faz necessário, antes de qualquer coisa, explicitar se
o FDI é de fato uma política pública social ou apenas uma prática de atração de
investimentos e fomento ao capital baseada no uso de recursos públicos. A visão
institucionalista, que afirma ter a política pública em seu núcleo, a luta por recursos entre
grupos sociais, privilegiando alguns destes em detrimento de outros, indicaria talvez, neste
caso, pela segunda opção. Se a leitura for feita pela visão dialética, Behrin e Boschetti
(2006), por exemplo, apontam provavelmente para o mesmo caminho, uma vez que vêem
política pública social como uma resposta a ser dada ao movimento do capital de
exploração sobre o trabalho, algo que de fato, os números e informações acerca do FDI não
demonstram.
A avaliação do FDI, em todos os indicadores analisados, mostra uma tendência de
privilégio do capital de forma prioritária, desde a formatação inicial do Programa (público-
alvo, definição da agenda3), até a questão da participação popular na avaliação do mesmo,
perpassando pela questão orçamentário-financeira e no custo aproximado dos empregos
criados.
Assim, cabe o questionar se esta seria a melhor política pública para gerar trabalho,
emprego e renda para uma coletividade, priorizando o grande capital em termos de
recursos e incentivos. Na busca por uma política pública efetivamente social, parece ser
mais interessante que se comece a discutir a possibilidade de implantar ações alternativas
de geração de trabalho, emprego e renda que possam indicar uma mudança no perfil de
aparente dependência estrutural da relação existente entre capital e trabalho.
Nesse sentido, políticas públicas sociais mais interessantes poderiam ser aquelas que
considerassem, por exemplo, o aporte direto de recursos públicos e que englobassem
também o setor informal da economia, onde está inclusive a maioria da PEA, ou ainda
experiências de economia solidária, microcrédito, enfim, aquelas que privilegiassem os
agentes menos protegidos nesse sistema de mercado. O caso do FDI não é esse, sendo seu
financiamento baseado num grau de regressividade considerável (vide fontes dos recursos
3 Não há qualquer referência sobre o FDI acerca das questões clássicas de definição de agenda de políticas públicas. Sobre essa questão, ver Kingdon (2006).
23
do Programa), onde todo o ônus, indiretamente fica com o trabalhador, que acaba
financiando o capital e a estrutura necessária para sua implantação (SALVADOR, 2010).
Os poderes públicos devem atentar para a necessidade de por seus fundos públicos
(geralmente escassos) a serviço da coletividade, no sentido de dotar as comunidades de
instrumentos efetivos de consolidação do bem-estar social universal, aliás, o objetivo para
o qual esses fundos foram originalmente concebidos.
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