semelhanas monasticas e maonaria
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Semelhanças Desafiadoras: Uma Exploração das Ordens Monásticas
e Maçônicas
Tradução José Filardo
Ir.´.Karel Musch - Loja Middelpunt 280, Grande Oriente da Holanda
1. Introdução
Neste trabalho serão exploradas três dimensões das semelhanças entre as
ordens monásticas e maçônicas, concentrando-se na Regra de S. Bento. Mas,
primeiro uma palavra sobre a história da Maçonaria em geral. Este trabalho
evita definitivamente buscar as fontes de nossa Ordem, por mais honrado que
tal esforço possa ser. Sentimo-nos devidamente avisados por Daniel Ligou em
seu “Dictionnaire de la Franc-Maçonnerie”, onde ele cita o trabalho do Ir.´.
Bernardin em seu “Précis Historique du Grand Orient de France”. O Ir.´.
Bernardin estudou 236 autores sobre a história da Maçonaria e encontrou 38
explicações diferentes, que vão desde a torre de Babel e o Dilúvio até a Índia
antiga, a Torre de Killwinning ou a Atlântida, com uma maioria de descobertas
para a Grécia antiga, a Roma antiga ou os construtores de catedrais do
período romano ou renascentista. Parece-me melhor não adicionar coisa
alguma a esta lista.
Também é aconselhável respeitar as palavras na Introdução à História da
Maçonaria de Gould: “Muito da história inicial da Maçonaria é tão entranhado
com fábulas e romances, que, embora por mais ansiosos que estejamos para
lidar com ternura com lendas e tradições há muito acalentadas, pelo menos
algumas dessas superstições familiares – a menos que escolhamos violar
cada cânone da crítica histórica – devem ser autorizadas a passar
tranquilamente para o esquecimento”. Não se poderia concordar mais.
A razão real e pessoal subjacente à realização desta pesquisa é que eu sou
tão inspirado pela vida maçônica quanto pela vida monástica e a Regra
Beneditina, tendo o privilégio de trabalhar às vezes com um dos defensores
daquela Regra, o professor holandês Dr. Will Derkse. De tempos em tempos,
buscando a tranquilidade de um mosteiro na minha Borgonha natal, e por outro
lado trabalhando em lojas holandesas e francesas tornam-me não apenas
nômade entre dois países, mas também entre duas disciplinas. O conceito de
fronteiras ou limites, como uma forma de cerceamento, é portanto um anátema
crescente para mim. Mais e mais eu consigo perceber fronteiras como um
convite à comunicação.
Em Transactions of the Lodge Quator Coronati 1, o Ir.´. Woodward nos lembra
das “sugestões feitas em vários momentos de uma origem cavalheiresca,
beneditina ou monástica”. Eu tentei encontrar o material anterior em que o Ir.´.
Woodward pudesse ter baseado esta declaração, mas não tive sucesso. No
entanto, eu gostaria de compartilhar com vocês o material que prova a
existência de uma forma acessível.
Este documento lida muito rapidamente e, principalmente, em um sentido
introdutório com as ordens monásticas em geral, e dá algumas percepções de
Bento e sua Regra. Em seguida, serão analisadas as três dimensões das
semelhanças entre as ordens monásticas e maçônicas. Em primeiro lugar,
serão abordadas as semelhanças entre a Regra e o Ritual. Em segundo lugar.
algum material será apresentado sobre lojas fundadas em mosteiros. Em
terceiro lugar, um parágrafo muito modesto mencionará a linguagem gestual.
Tentando evitar a palavra conclusão, o trabalho terminará com algumas
considerações.
2. Ordens monásticas
O Monaquismo cristão como viemos a conhecê-lo nasceu na África e no
Oriente Médio. Nos séculos III e IV o fenômeno veio para a Europa, do que
hoje chamamos Egito e Síria. A primeira regra de monaquismo que
conhecemos é a de Pacômio escrita cerca de 320 E.C, que pode ser
considerada a regra de Agostinho a partir de 390 E.C.
As origens do monaquismo encontram-se no deserto e no ascetismo. Em sua
introdução a uma recente tradução holandesa de Regra de Agostinho, o
Professor Fens lembra-nos que provavelmente o mosteiro mais rigoroso na
terra, La Grande Chartreuse, perto de Grenoble, ainda é chamado de o
deserto.
Mosteiros eram centros de civilização, longes de serem povoado por monges
atrasados que se ocupavam em queimar livros e hereges. Ao contrário, os
mosteiros eram escolas de organização, desenvolvimento agrícola,
administração da Justiça (Klosterhaft) e desenvolvimento da ciência. A
inovação da religião começou em mosteiros: Erasmo e Lutero eram monges. É
significativo que a Igreja tolerasse os mosteiros de tal forma que o monaquismo
não se desvinculasse da Igreja. Escapar do mundo para seguir, imitar as
palavras estritas de Cristo era e ainda é um dos fundamentos do monaquismo.
Isso pode ser considerado um protesto contra a secularização da cristandade,
de acordo com o teólogo alemão Bonhoeffer. O Monaquismo não era apenas
um protesto, ele foi gradualmente se tornando um álibi para o cristianismo,
porque os mosteiros estavam mantendo a graça viva “à margem da Igreja”. Era
o desempenho especial de poucos, que permitia à massa continuar com a suas
atividades diárias.
Quanto mais o poder profano e econômico influenciava o monaquismo, mais
diminuia a influência religiosa, incluindo a erosão do ascetismo. A história das
ordens monásticas está cheia de exemplos do crescente poder secular do
mosteiro evoluindo lado a lado com a diminuição da autoridade religiosa.
Quanto mais os mosteiros mais influentes no sentido mundano, mais
suscetíveis eles se tornaram-se às regras do jogo de poder secular. E mais de
uma vez isso provocou clamores por movimentos de reforma, que queriam
voltar à vida simples e ascética: Citeaux em reação a Cluny, os Trapistas em
reação a Citeaux.
O monaquismo é centrado em rituais diários, prescrevendo o tempo e o
conteúdo de refeições, serviços a serem realizados, músicas a serem
cantadas, as horas gastas a estudar ou trabalhar. Para alguns, isso parece ser
uma existência monótona. Mas, em essência, a monotonia libera a mente,
permitindo-lhe vagar e se maravilhar. A monotonia é um fator de ligação em
Maçonaria e no monaquismo. Em Maçonaria ela é chamada ritual, que significa
a mesma coisa.
3. Bento de Núrsia
Nascido em Nursia (atualmente chamada Norcia, na Itália) ele viveu entre 480-
550 E.C. Ele nasceu em uma família abastada de proprietários de terras. O
que se sabe dele vem principalmente de um de seus monges que mais tarde
se tornou o Papa Gregório (590-604 E.C.). Gregório escreveu os Diálogos, um
livro sobre a vida de Bento e outros santos.
A vida de Bento foi um pouco paradoxal. Depois que se propôs levar uma vida
ascética como eremita, ele foi tão bem sucedido que reuniu seguidores (o que,
por sinal, deve ser uma experiência confusa para um eremita). O mestre
sempre atraía aprendizes. Ele começou um mosteiro, foi embora, começou de
novo: o famoso Monte Cassino que foi tão horrivelmente destruído pelos
americanos durante a segunda guerra mundial e que mais tarde foi restaurado.
Sua Regra data de cerca de 530 EC.
Se a Regra de Bento é comparada a outras regras monásticas, não se pode
deixar de notar a simplicidade e a facilidade com que ela dirige a vida
monástica. Algumas Regras, por exemplo, as versões celtas podem ser muito
rigorosas e são quase um código penal.
A Regra de Bento foi um dos manuscritos mais lidos e escritos na Idade
Média. A dele foi a regra mais influente. Isso pode muito bem ser devido à
intrigante mistura de rigor e perdão. Bento dá instruções muito detalhadas para
os rituais diários, incluindo quais Salmos devem ser cantados em quais dias.
No capítulo 18, no entanto, ele afirma que “se esta distribuição está
desagradando alguém, ele deve organizá-la de outra forma”. Uma sábia
aceitação de diferenças e possibilidades de mudança.
4. As semelhanças
Neste parágrafo, serão dados alguns exemplos da Regra, relacionando-os à
nossa Ordem. Tenha em mente que não são principalmente os aspectos
históricos ou analíticos que me inspiram, mas a maioria da sabedoria espiritual
que fala através dessas regras.
1. Ouvir
As primeiras palavras da Regra são: “Ouça, meu filho, aos preceitos de seus
mestres e incline o ouvido do teu coração.”
Alguns antigos maçons na Holanda lembram-se com alguma melancolia as
antigas regras em que o A.´.M.´. deveria abster-se de falar em Loja. Esperava-
se que eles ouvissem seu Mestre até que se considerasse terem eles feito
progresso suficientes para ser elevado. O termo usado no original em latim é
Ausculta;ausculta significa ouvir com devoção e concentração. Esta introdução
à Regra também ilustra a importância da obediência.
2. Os votos
A Regra conhece três votos: stabilitas, conversio e obedientia. Stabilitas
significa que você escolheu um mosteiro e que você permanecerá ali. É uma
questão de lealdade à Comunidade, no nosso caso à Loja. Pessoas crescerão,
cada um de nós tem essa capacidade e Bento acreditava fortemente nessa
qualidade. Mas devemos crescer onde fomos plantados. Fé e ser confiável são
qualidades que florescem na loja e que fazem uma loja florescer.
Conversio significa que ao entrar na ordem, você deve estar disposto a mudar
fundamentalmente. É como trabalhar em um teatro operacional. Não podemos
fazer isso se for um pouco estéril. Nem se pode ser meio grávida, meio monge
ou meio maçom. Temos nossa missão e e ela consome tudo. No ritual
holandês, ao fechar a loja, somos comandados por nosso Mestre a ir para o
ocidente e nos tornarmos conhecidos como maçons, ou seja, que devemos agir
como tal. Nosso mestre não nos convida a ser um pouquinho maçom, mas dar
o máximo de nós.
O voto de obedientia parece ser o mais difícil de todos, pelo menos para
alguns. Prometer obediência ao Mestre, como fazemos, não é uma obediência
a uma pessoa. Nesse sentido, não é uma questão de liderança, mas uma
forma de obediência ào cargo, que um dia nós mesmos poderemos ocupar.
Como nós obedecemos ao nosso Mestre, não fazemos o que nos é ordenado,
mas fazemos o que é necessário.
3. O ritual
A regra dá muita atenção ao que chamaríamos de ritual: o dia é dividido em
várias partes com base em instruções muito específicas, que e quando fazê-lo,
o que cantar. O ritmo no mosteiro é determinado pelo ritual, tal como o ritmo do
ritual em nossas lojas.
4. O Abade
Assim como o Venerável Mestre nas lojas, em mosteiros o Abade é a
autoridade suprema. Um Abade é escolhido entre os seus irmãos, de
preferência por unanimidade.
- Ele é escolhido para o seu mérito de vida e sabedoria da doutrina.
- Seu dever é beneficiar os irmãos, mais que presidi-los.
- Ele deve ser versado na lei, que ele pode ter um tesouro de conhecimento de
onde trazer coisas novas e antigas.
- Bom senso, prudência e ser atencioso são considerados qualidades
importantes.
Escolher seus mestres para obedecê-los é uma forma de ‘obedientia’, a
obediência à Regra. As Regra governa também os escolhidos, eles também
estão sujeitos à lei, assim como estão nossos VV.´. MM.´.
5. O Despenseiro
Na vida monástica, assim como na vida maçônica, o Despenseiro é um
funcionário importante. Ele precisa ser homem muito sábio, sóbrio, ele mesmo
não deve ser um glutão. Ele não deve envergonhar os irmãos com recusa
desdenhosa. Ele deve ser como um pai para a Comunidade e não deve ser um
avarento. Bento pensou em tudo, porque no capítulo 40 ele dá instruções para
a medida da bebida. Ele afirma que “vinho não é, de forma alguma, uma bebida
para monges, mas é impossível convencer os monges disso. Pelo menos
vamos concordar em beber com moderação”. Em algumas lojas, isso pode ser
um bom conselho, poder-se-ia pensar.
6. O Porteiro
Os mosteiros conhecem um funcionário que pode ser comparado ao nosso
Cobridor. Em todo caso, entre Mestre e Cobridor existe uma relação específica,
representando, respectivamente, o Oriente e o Ocidente. Este eixo constitui um
dos fundamentos da maneira em que a loja pode ser conectada ao mundo, ao
Ocidente. O Venerável Mestre e o Cobridor representam a abertura para o
Oriente e para o Ocidente, respectivamente. Na iniciação de um Candidato o
Cobridor desempenha um papel específico, verificando suas credenciais, antes
de admiti-lo em loja. Os Porteiros do mosteiro têm um papel semelhante. Eles
devem irmãos um pouco mais velhos e mais sábios, capazes de receber os
hóspedes e questioná-los sobre suas credenciais.
7. Os Ausentes
Irmãos que estão ausentes são sempre relembrados na última oração. Isso é
muito parecido com o brinde dos Cobridores que conhecemos em nosso ritual,
onde antes de fechar a Loja de Mesa, irmãos ausentes são lembrados e se
lhes deseja um retorno seguro à casa.
8. Noviços
De acordo com a Regra, supõe-se que os noviços fiquem em silêncio. Muito
raramente lhes é permitido falar.
No ritual maçônico holandês há a tradição de que antes da elevação e da
exaltação, o candidato se apresente com um discurso explicando o que ele
aprendeu durante o período em que era um Aprendiz ou um Companheiro.
Espera-se especialmente dos Aprendizes que comentem sobre a loja e seus
processos. Esta é uma semelhança peculiar com a Regra, porque no capítulo 3
afirma-se que cada vez em que negócio importante precisa ser feito, o Abade
deve reunir toda a Comunidade e declarar o assunto a ser discutido. Todos
estão convidados para essas reuniões, “porque o Senhor revela muitas vezes
aos mais jovens o que é melhor”. O discurso do Aprendiz destina-se a ser um
espelho para os irmãos mais velhos. Ele também confirma o fato de que
realmente existem apenas Aprendizes.
9. O bom zelo
O único zelo permitido aos monges é o fervor com o qual eles deve antecipar
um ao outro em honra, suportar as enfermidades dos outros(seja no corpo ou
no caráter), sempre se perguntando o que beneficia o outro. Um zelo digno de
qualquer Maçom, poder-se-ia pensar.
10. Recebendo irmãos
A cerimônia de iniciação é refletida no capítulo 58 da Regra. Nenhuma entrada
fácil é concedida a qualquer recém-chegado. Apenas se o recém-chegado
persistir em bater a porta, e for visto que ele suporta pacientemente o
tratamento áspero e a dificuldade de admissão por quatro ou cinco dias é que
ele deve ser admitido como noviço. Um veterano, o mestre de noviços, é
designado a ele para guiá-lo através de seu noviciado, um funcionário como
nosso Segundo Vigilante que é responsável pelos Aprendizes. Exatamente
como em nossas lojas, a Regra dispões sobre aqueles que, tendo deixado,
querem ser novamente recebidos.
11. A Oficina
As palavras usadas por Bento neste capítulo 4 são as mesmas que são usadas
em nossa Ordem. A versão francesa da Regra chama o lugar onde os monges
trabalham: “l’atelier”, que é exatamente a mesma palavra que os irmãos
franceses usam ao nomear a Loja. Em holandês, o nome da loja é “werkplaats”
ou “local de trabalho”, exatamente como é chamado na Regra.
12. Estrutura hierárquica
Os oficiais tanto de organizações monásticas quanto maçônicas podem ser
comparados muito bem:
Abade Venerável Mestre
Despenseiro Hospitaleiro
Porteiro Cobridor
Mestre de noviços Segundo Vigilante
Leitor Semanal Orador
Reitores Diáconos
Noviços Aprendizes
Monges Professos Companheiro
Seniores Mestre Maçom
5. Lojas Monásticas
Uma dimensão interessante das semelhanças entre as ordens monásticas e
maçônicas é a existência de lojas monásticas. Algumas fontes francesas até
mesmo indicam uma paternidade mais que espiritualmente compartilhada entre
as ordens monásticas e as ordens maçônicas. No entanto, isso parece ficar
aquém o aviso dado na “História” de Gould ou a conclusão de Brodsky, que
chama a história maçônica de “un domaine où les passions dominent la raison”,
um domínio onde a paixão governa a razão.
No século XVIII, diversas lojas maçônicas foram erigidas em mosteiros
beneditinos. Agora tendo em mente a atitude da Igreja Católica Romana oficial
com a Maçonaria isso parece bastante interessante.
As menções bem conhecidas de Ferrer-Benimeli em seus “Arquivos Secretos”
de que nos últimos 40 anos do século XVIII, um número impressionante de
maçons estavam ativos na Igreja Católica como monges ou como sacerdotes.
Ele dá exemplos de toda a Europa, concentrando-se, no entanto, na França e
quase nunca mencionando a Inglaterra a este respeito. O estudo de Ferrer-
Benimeli também é importante devido à sua impressionante lista de fontes,
bem como suas listas de clérigos, monges e outros oficiais (entre os quais
encontram-se bispos, priores etc.).
Este trabalho cita três exemplos entre mais de uma centena, as fontes dos
quais podem ser encontradas também fora de Ferrer-Benimeli.
* Em 24 de junho de 1778, uma loja foi fundada em Fécamp no mosteiro
“L’Abbaye Royale de la Très Sainte Trinité”. Entre 29 monges neste mosteiro, 9
obtiveram permissão do prior para entrar para esta Loja. A própria Loja foi
construída nos terrenos do mosteiro. O nome da loja era “La Triple Unité”.
Outros membros fundadores da loja incluiam um padre, um cobrador de
impostos, um oficial do exército, um engenheiro e um Comissário da Marinha.
Todos os membros fundadores eram Mestres Maçons, implicando que eles
tinham sido maçons há mais tempo. Nos anos subsequentes à Fundação,
outros monges entram, assim como alguns padres. Estas relações maçônicas
foram úteis para o mosteiro, durante a Revolução francesa. O Conselho da
cidade, onde um dos conselheiros també era Maçom recusou-se a executar as
leis para proibir os mosteiros na França. Esta Loja abate colunas (fechada) em
1790, refundada em 1811, novamente abate colunas em 1828, é refundada em
1860 e abate colunas no ano da guerra de 1940.
* No mosteiro em Ferrières-en-Gâtinais aconteceu a mesma coisa. A Loja
“Sainte-Émilie” é criada em 1786 e situa-se no mosteiro. Quatro dos oito
monges ingressam na Loja.
* Mesmo na famosa abadia de Clairvaux, uma loja chamada “La Vertu” foi
erigida no “Ano da Verdadeira Luz de 5785″, em 1785.
É necessária mais pesquisa aqui, provavelmente a ser conduzida pelo menos
em parte, em mosteiros beneditinos na França.
6. Linguagem gestual
A maioria, se não todas as ordens contemplativas monásticas conhecem uma
regra de silêncio. A Regra de Bento, capítulo 6 afirma que “o espírito de
silêncio deve nos levar, às vezes a nos abstermos até mesmo de bom
discurso”. Existem várias estátuas desde a Idade Média e posteriores,
mostrando o Bento fazendo o sinal de silêncio, segurando seu dedo sobre os
lábios cerrados.
Há uma exceção, a saber “que falar e ensinar pertence ao mestre”. Pergunta-
se, aliás, se esse “mestre” é o mesmo mencionado na introdução à Regra. Em
todo caso, esta tradição é aproximadamente a mesma na Maçonaria.
As raízes desta regra de silêncio devem ser encontradas na Bíblia. Para
mencionar apenas alguns exemplos entre muitos: Salmos 141,3; Provérbios X,
19; XIII, 3; Jó IX, 20; Mateus XV, 11.
Regras de silêncio são conhecidas em todas as regras monásticas antigas,
desde Pacômio em diante. A regra de silêncio nunca foi destinada a proibir
totalmente o discurso como forma de comunicação. Rijnberk diz sobre a regra
do silêncio: “(..) Il est bien sûr qu’elle n’a été absolue nulle part”, afirmando que
nunca se souber ter sido ela absoluta.
A língua gestual é interessante por causa do rico simbolismo. Por exemplo
após as Vésperas, aplicava-se a regra do silêncio. O texto de Salmos 140 (141)
introduziu o silêncio da noite. No primeiro serviço da manhã, cantando o salmo
50, era concedida permissão para falar novamente, destravando a boca pode-
se dizer.
A regra do silêncio destinava-se a determinados momentos e determinados
períodos. A linguagem gestual não foi concebida como um meio de
comunicação, substituindo a linguagem falada. Era simplesmente um meio de
se fazer entendido quando realmente necessário.
Exceto nos períodos de silêncio, se eles estivessem à mesa ou durante o dia
nos campos, a necessidade de alguma forma de comunicação é evidente.
Assim, desenvolveu-se uma linguagem gestual bastante elaborada, com
algumas interessantes raízes na sociedade secular mediterrânea.
A maioria dos sinais ajuda na vida diária, preparo de alimentos, trabalho nos
campos, cuidado dos doentes, reparo de edifícios ou de roupas.
No capítulo 38, sobre o Leitor Semanal, Bento ordena um silêncio total à mesa,
nem mesmo sussurros. Somente o leitor deve ser ouvido. Bento compreendia a
necessidade de comunicação, enquanto à mesa e conclui: “Se alguma coisa for
necessária, no entanto, permita-se que seja pedida por meio de algum sinal
sonoro ao invés de palavras”. Sherlock menciona uma história interessante
sobre Gerald of Wales, que visitou o Priorado da Catedral de Canterbury em
1180 EC. Os beneditinos deste Priorado usavam a linguagem gestual de Cluny.
Gerald, quando sentado à mesa alta, foi surpreendido pelo fato de que os
monges não falassem, mas se comunicavam com gestos e, assim, tinham uma
conversa muito animada. Ele sentiu-se “sentado diante de um palco ou entre
atores e palhaços”.
A linguagem gestual tem uma lógica toda própria. Na linguagem gestual
documentada para os monges de Ely para significar a própria Regra de Bento,
você faz o sinal de livro, seguido pelo sinal correspondente ao Abade. O sinal
para o Mestre de Noviços (que pode ser comparado ao Segundo Vigilante) faz-
se o sinal indicando noviço, seguido pelo sinal de ver.
A maioria dos sinais são bastante simples, com os sinais óbvios para beber,
comer e dormir, por exemplo. Rijnberk portanto, chama estes sinais de
“onomatopéia óptica”.
A maioria dos mosteiros tinham suas próprias listas de sinais, mas a
personalização diferia consideravelmente. Em Cluny, quase 300 sinais eram
conhecidos, enquanto que no mosteiro português de Alcobaça, os monges
tinham que se contentar com 55, e um dos mosteiros trapistas na França usava
mais de 450 sinais. Embora o número de sinais por mosteiro pudesse ser
diferente, a linguagem era mais ou menos a mesma. Ela era universal o
suficiente para permitir que monges de mosteiros diferentes entendessem uns
aos outros, mesmo além de fronteiras nacionais.
Alguns dos sinais podem ser os mesmos que nas Lojas. Rijnberk, por exemplo,
menciona o sinal Cisterciense do mártir, que é como cortar a própria garganta.
Este sinal também significa morte. Todos os maçons se lembram de ter sido
apresentado ao sinal do A.´. M.´. prometendo que eles preferem ter sua
garganta cortada a trair o segredo do nossa Ordem. Obviamente, este aspecto
exige muito mais investigação do que foi feito até o momento, mas pode provar
ser um percurso desafiador.
Diferenças
Além das semelhanças, há evidentemente diferenças, algumas das quais são
bastante interessantes, porque elas podem nos ensinar alguma coisa. Por
exemplo, no Capítulo 68 uma orientação é dada no caso de ser ordenado a um
irmão que realize uma tarefa impossível. Em tais casos o irmão deve aceitar o
encargo em obediência. Se a carga for superior à sua força, ele deve falar isso
com seu Superior “de forma tranquila e em um momento oportuno”. Se o
Superior insistir, o irmão deve obedecê-lo, por amor ao Superior e confiando na
ajuda de Deus. No Capítulo 69 os irmãos são proibidos de defender uns aos
outros por qualquer motivo. Quebrar esta regra exige o castigo mais severo.
Parece que os Maçons poderiam beneficiar-se de algumas destas regras.
Considerações
Não se pode senão concordar plenamente com Reynaud, quando afirma “Il
serai peu conforme à la vérité d’établir une filiation entre la Règle de saint
Benoît et les anciennes Règles du Métier de Maçonnerie (.). Mais on peut
parler d’une évidente parenté spirituelle”, dizendo algo como: seria pouco de
acordo com a verdade estabelecer uma ligação directa entre a Regra de Bento
e as regras maçônicas. Mas podemos falar de uma paternidade espiritual
compartilhada. Em essência, esta afirmação é a mesma que uma declaração
posterior de Neville Barker Cryer quando ele fala que “semelhanças não são
fontes”.
Cabe-nos sermos prudentes ao extremo para evitar especulações fantasiosas
sobre nossas raízes. Até agora, a pesquisa não permite tirar nenhuma
conclusão. Portanto, a palavra considerações serve melhor ao que podemos
fazer com o material coletado até agora. Trabalhamos em algumas dimensões
ou seja, semelhanças nas regras da vida monástica e maçônica, na existência
de lojas monásticas, e semelhanças na linguagem gestual. Estas podem
apontar em determinadas direções, mas elas não nos dizem nada sobre
nossas raízes, além de que podemos compartilhar um ancestral comum, uma
fonte de inspiração que nos guia através da vida monástica, maçônica ou
profana.
Porém, é importante que os maçons possam ouvir os Beneditinos e aprender
com eles. Maçons podem aprender com a dedicação necessária para fazer um
trabalho, trabalhando em um mundo melhor. A Maçonaria hoje também clama
por contemplação, podendo se considerar, e assim, aprender a se conhecer. N
necessidade de uma Maçonaria mais espiritual, a regra de Bento podem ser
uma inspiração importante, certamente para aqueles que estão preparados
para inclinar a orelha do seu coração.
Para mim, de toda forma, a regra de S. Bento e a vida monástica como tal,
ambas constituem uma fonte de sabedoria e inspiração, complementando a
prática maçônica e, nesse sentido, auxiliando o trabalho na minha pedra bruta.
(Revista Textos & Texts)