seleção natural camuflagem

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Lyria Mori, Maria Cristina Arias e Cristina Yumi Miyaki Departamento de Genética e Biologia Evolutiva, Instituto de Biociências, Universidade de São Paulo. Autor para correspondência: [email protected] MATERIAIS DIDÁTICOS 124 Genética na Escola | Vol. 8 | Nº 2 | 2013

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CAMUFLAGEM

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  • Lyria Mori, Maria Cristina Arias e Cristina Yumi Miyaki

    Departamento de Gentica e Biologia Evolutiva, Instituto de Biocincias, Universidade de So Paulo.

    Autor para correspondncia: [email protected]

    MATERIAIS DIDTICOS

    124 Gentica na Escola | Vol. 8 | N 2 | 2013

  • Esta uma atividade para o ensino Mdio e cursos de graduao em Cincias Biolgicas que visa desfazer o mito de que os organismos se camuflam propositadamente com o intuito de se esconder dos predadores.

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    Gentica na Escola ISSN: 1980-3540

  • ao da seleo natural. Espcies que apre-sentam camuflagem podem ter padres de cor, detalhes de formatos e compor-tamentos que os tornam menos visveis (crpticos ou mimticos) em seu ambien-te natural. Essas espcies so assim porque alguns de seus ancestrais possuam, devi-do variabilidade gentica, combinaes que resultavam em fentipos mimticos ao ambiente e, portanto, com mais chance de sobreviverem e se reproduzirem. Esse processo repetido e aperfeioado ao lon-go das geraes.

    Esta atividade tem por objetivo levar compreenso de que a camuflagem uma consequncia da ao da seleo natural sobre fentipos existentes e desfazer o mito de que os organismos se camuflam com o intuito de se esconder dos predado-res. A atividade deve ser aplicada no ensi-no Mdio ou na graduao para estudan-tes que j tenham conhecimentos bsicos de gentica.

    MATERIAIS DIDTICOS

    Camuflagem* vem do ato de se camuflar, que significa dissimular para guerra, diminuir a visibilidade, disfarar sob falsas aparncias. Nesse sentido, o termo inclui a intencionalidade. No entanto, em biologia, embora o termo signifique dissimulao de um organismo em seu ambiente, isso no ocorre de forma intencional, mas como resultado do processo de seleo natural.

    Adaptao consiste na propriedade dos seres vivos de sobreviver e se reproduzir na natureza, e um dos conceitos cruciais da teoria evolutiva. Darwin ressaltou a adap-tao como um problema chave que qual-quer teoria da evoluo tem que explicar. Na teoria de Darwin assim como na teo-ria moderna de evoluo - este problema foi explicado pela seleo natural.

    Seleo natural o processo que leva al-guns tipos de indivduos de uma popu-lao a deixar mais descendentes para a prxima gerao do que outros. Assumin-do-se que os descendentes se assemelhem aos parentais e que essas semelhanas se devam em parte ao patrimnio gentico, qualquer atributo de um organismo que lhe possibilite deixar mais descendentes do que a mdia, far com que representantes desse organismo aumentem em frequncia na populao ao longo das geraes.

    A camuflagem, uma forma de mimetismo, um exemplo de adaptao e da

    Adaptao* o resultado do processo de seleo natural. Organismos mais adaptados possuem determinadas caractersticas que permitem se desenvolver, sobreviver e reproduzir com maior xito do que aqueles menos adaptados.

    Crptico* carter de um organismo que o integra em seu ambiente, dificultando sua deteco por predadores e por suas presas.

    Mimetismo* a semelhana acentuada de um organismo (o mmico) a outro (o modelo).

    *Os termos foram definidos de acordo com Glossrio de Ecologia, 2a. Edio, ACIESP (1997).

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  • A. MATERIAL PARA CADA GRUPO:

    1. Uma caixa (35cmx2cmx5cm pode ser uma caixa de camisa) forrada com um tecido estampado representando o am-biente (Figura 1). Escolher uma estampa colorida e que apresente trs verses de composio de cores.

    2. 100 pequenos crculos de papel (cerca de 1,5 cm de dimetro) recobertos por tecido com o mesmo padro de estampa usado para forrar a caixa, sendo que 50 deles de-vem ter a mesma cor da caixa. Outros 50 crculos devero ser recobertos por tecido de mesmo padro de estampa, porm com

    Figura 1. Materiais utilizados na atividade: caixa forrada com tecido estampado representando o ambiente; crculos forrados com o mesmo padro de estampa, porm com cores diferentes (azul, rosa e rosa-azulado); saco com contas coloridas (azuis e vermelhas). Note que dentro da caixa foram colocados 30 crculos recobertos por tecido com o mesmo padro de estampa, sendo que dez deles possuem a mesma cor do ambiente (azul), dez crculos de cor rosa e dez crculos com cor rosa-azulado.

    cores diferentes (25 de cada cor), sendo que uma das cores deve ser uma mistura das outras duas. A cor misturada poder ser obtida pintando-se com lpis de cera o tecido aps ele ter sido colado no disco de papel. (Figura 1). Os crculos representam os indivduos (presas) de uma populao.

    3. Um saquinho com 30 contas azuis e 30 vermelhas (Figura 1) que representam alelos.

    4. Tabela para anotar os resultados (Tabela 1).

    5. Um protocolo de conduo da ativida-de. O professor poder fotocopiar o item Procedimento para os estudantes.

    Tabela 1. Os crculos estampados (rosa, rosa-azulado e azul) representam os fentipos das presas. Nesta tabela devem ser anotados os nmeros de indivduos de cada um dos fentipos que no foram predados aps os ciclos de reproduo assexuada e sexuada.

    Fentipos

    Reproduo assexuada

    1a gerao

    2a gerao

    Reproduo sexuada

    1a gerao

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    Gentica na Escola ISSN: 1980-3540

  • MATERIAIS DIDTICOS

    B. APLICANDO A ATIVIDADE1. A classe dever ser dividida em grupos de

    2 a 5 alunos;

    2. O professor dever entregar a cada grupo um conjunto de material acima descrito e solicitar que os alunos sigam as instrues do Procedimento para os estudantes.

    C. PROCEDIMENTO PARA OS ESTUDANTES

    1. O grupo dever escolher um organizador da atividade. Os demais participantes si-mularo ser predadores que usam a viso para localizar as presas, representadas por crculos estampados de trs cores.

    2. Organizador:

    Colocar na caixa 10 peas de cada cor (azul e rosa) sem que os predadores vejam.

    Cronometrar 3 segundos para que os predadores retirem um crculo (presa) por vez da caixa.

    3. Predadores:

    Retirar da caixa, durante 3 segundos, o maior nmero possvel de presas (crcu-los), uma de cada vez. S vale retirar o crculo que for visualizado, ou seja, no vale usar o tato.

    4. Organizador:

    Contar o nmero de crculos de cada uma das cores que restaram na caixa e preencher a Tabela 1.

    Com os crculos que restaram, simular uma rodada de reproduo por par-tenognese, ou seja, cada crculo que restou aps a predao originar dois descendentes iguais a ele; cada crculo, no predado, deve ser retirado da caixa e dois novos crculos iguais a ele devem ser colocados. No deixar os predadores olharem onde os crculos foram coloca-dos.

    Cronometrar 3 segundos para que os predadores retirem um crculo (presa) por vez da caixa.

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  • 5. Predadores:

    Retirar da caixa, durante 3 segundos, o maior nmero possvel de presas (crcu-los), uma de cada vez. S vale retirar o crculo que for visualizado, ou seja, no vale usar o tato.

    6. Organizador:

    Contar o nmero de crculos de cada uma das cores que restaram na caixa e preencher a Tabela 1.

    Contar na tabela o nmero de indiv-duos da populao que restou aps a primeira rodada de predao. Simular um ciclo de reproduo sexuada. Para isto, levar em considerao a cor destes indivduos e colocar em um saquinho as contas coloridas que representaro seus alelos; os indivduos rosa so re-presentados por duas contas vermelhas e, os azuis, por duas contas azuis. Co-locar no saco o nmero e o tipo corres-pondentes de contas que representaro os alelos dos indivduos (diplides) da populao.

    Sortear os alelos do saco sem reposio. Duas contas vermelhas correspondem ao fentipo rosa, duas contas azuis ao fenti-po azul e uma conta vermelha e uma azul ao fentipo rosa-azulado. Colocar na cai-xa os crculos correspondentes da combi-nao de cada par de alelos sem deixar os predadores verem onde foram colocados.

    Cronometrar 3 segundos para que os pre-dadores retirem um crculo (presa) por vez da caixa. Lembrar os predadores que eles s podem usar a viso e no o tato.

    Contar na tabela o nmero de indivdu-os da populao que restou aps a pri-meira rodada de predao.

    Todos os participantes do grupo: discutir e responder as questes:

    a) Houve aparecimento de outro fenti-po de presa aps a reproduo sexua-da?

    b) Um fentipo diferente daquele dos parentais pode surgir quando a repro-duo assexuada por partenognese?

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    Gentica na Escola ISSN: 1980-3540

  • MATERIAIS DIDTICOS

    Organizador:

    Simular mais um ciclo de reproduo se-xuada. Repetir as etapas do item 6 (com exceo da primeira etapa).

    Todos os participantes do grupo: discutir e responder as questes:

    c) Os organismos se camuflam visando se esconder dos predadores?

    d) Um indivduo bem camuflado em um determinado ambiente est necessa-riamente bem camuflado em qualquer tipo de ambiente?

    e) O heterozigoto foi predado? Em caso positivo, a frequncia foi similar a um dos demais tipos de indivduos da po-pulao?

    INFORMAES PARA O PROFESSOR Na presente atividade, os estudantes atuam como predadores, os crculos representam as presas e, o forro estampado das caixas re-presenta o ambiente. Esta atividade pode ser precedida da proposta feita no artigo A sele-o Natural em ao: o caso das joaninhas (MORI et al, 2009) que explora a ao da se-leo natural e introduz uma discusso sobre camuflagem.

    RESPOSTAS DAS QUESTES a) Houve aparecimento de outro fentipo

    de presa aps a reproduo sexuada?

    R.: Sim. Com o aparecimento do gentipo heterozigtico (uma conta vermelha e uma conta azul), caso no haja domi-nncia de um alelo sobre o outro, isso resultar em um fentipo intermedirio (codominncia), portanto, ocorre o apa-recimento de um terceiro fentipo.

    b) Um fentipo diferente daquele dos pa-rentais pode surgir quando a reprodu-o assexuada por partenognese?

    R.: No. Em caso de partenognese, todos os descendentes sero genotpica e feno-tipicamente iguais aos parentais, nesse caso a nica possibilidade de surgimento de diversidade se d pela eventual ocor-rncia de mutao.

    c) Os organismos se camuflam visando se esconder dos predadores?

    R.: No. Os organismos que se assemelhem mais ao ambiente tm maior chance de sobreviverem predao e deixar des-cendentes semelhantes a eles, caso es-tas caractersticas sejam hereditrias, aumentando assim a frequncia destes fentipos na populao.

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  • Figura 2. Caixas forradas com tecidos com o mesmo padro de estampa, mas com cores diferentes (rosa e azul), simulando diferentes ambientes. Cada caixa contm 10 crculos de cartolina cobertos com estampa da mesma cor da estampa da caixa, 10 crculos cobertos com estampas de cor diferente da caixa e 10 crculos cobertos com estampas de cor misturada (rosa-azulada).

    d) Um indivduo bem camuflado em um determinado ambiente necessariamente est bem camuflado em qualquer tipo de ambiente?

    R.: No. A vantagem adaptativa da camufla-gem ocorre em relao ao ambiente em que estas caractersticas foram seleciona-das. Portanto, o fentipo bem adaptado a um ambiente no necessariamente bem adaptado a outro ambiente.

    e) Na simulao que voc acabou de fazer, o heterozigoto tem uma cor intermedi-ria. Neste caso, ele foi predado em frequ-ncia similar a um dos demais tipos?

    R.: Os resultados podem variar de grupo para grupo, mas, de modo geral, o grau de predao dos heterozigotos seme-lhante ao das presas de cor diferente estampa da caixa.

    Observao: Caso dois ambientes tenham sido simulados (duas caixas, cada uma for-rada com tecido estampado de cor diferente como mostrado na Figura 2), solicite que os

    estudantes comparem os resultados e discu-tam as questes que se seguem.

    f ) H diferena no nmero restante dos dois tipos de presa em cada ambiente? Em caso positivo, por que essa diferena foi gerada?

    R.: A expectativa de que presas cor de rosa sejam mais predadas na caixa for-rada com a estampa em fundo azul por estarem mais visveis e que, pelo mesmo motivo, as presas azuis sejam mais pre-dadas na caixa forrada com a estampa em fundo rosa.

    g) Algum dos ambientes permite ter me-lhor camuflagem das presas?

    R.: A camuflagem resultado da seleo natural atuando na eliminao (preda-o) dos indivduos com fentipos mais visveis naquele ambiente, portanto a camuflagem mais perfeita no depende somente do ambiente, mas tambm do tempo em que a populao est exposta a essa seleo.

    PARA SABER MAISMORI, L., MIYAKI, C. Y. & ARIAS, M. C.

    A seleo natural em ao: o caso das jo-aninhas. Gentica na Escola 4(2): 41-46. 2009.

    AGRADECIMENTOSAos professores e alunos que executaram a atividade no evento Gentica na Praa, no 56 Congresso da Sociedade Brasileira de Gentica (2010), e que contriburam com sugestes para melhorar a atividade.

    Ao Prof. Dr. Carlos Ribeiro Vilela por ter digitalizado a tabela 1.

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    Gentica na Escola ISSN: 1980-3540