segundas lenguas e inmigracion, nº7

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ENSINO DO PORTUGUÊS LÍNGUA SEGUNDA EM PORTUGAL

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Monografico nº 7 Segundas Lenguas e Inmigracion

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Page 1: Segundas Lenguas e Inmigracion, nº7

www.segundaslenguaseinmigracion.es

SegundasLenguaseInmgiración

VOL1 . Nº 7 MONOGRÁFICO

ISSN: 1 989-1 954201 3

Maria Helena AnçãPerpétua Santos SilvaAndreia FerreiraRosa BizarroLuísa SollaTeresa Ferreira

REVISTA DE INVESTIGACIÓN

Y DIDÁCTICA

ENSINO DO PORTUGUÊS LÍNGUASEGUNDA EM PORTUGAL

Page 2: Segundas Lenguas e Inmigracion, nº7

Edita: segundaslenguaseinmigracion.es Dirección: Félix Villalba y Maite Hernández. © segundaslenguaseinmigracion.es (de esta edición) © Los autores Noviembre (2012) –Abril (2013) ISSN: 1989-1954

Segundas Lenguas e Inmigración en red Vol I, nº7.

CONSEJO DE REDACCIÓN

Maite Hernández Lourdes Ortega (Universidad de Hawai) Susana Pastor (Universidad de Alicante) Josep María Serra (Universidad de Girona) Félix Villalba Marcin Sonsiski (Universidad de Granada)

Fotografía de portada: © João Menna Barreto

Publicidad iniciativa de SL&i

Fotografía

http://www.sxc.hu/browse.phtml?f=view&id=650582

COMITÉ CIENTÍFICO

Juana Muñoz Liceras (Universidad de Ottawa) Mercè Pujol (Universidad de París 10) Ignasi Vila (Universidad de Girona) Ernesto Martín Peris (Universidad Pompeu Fabra) Lourdes Miquel López (EOI Barcelona). Isabel Santos Gargallo (Universidad Complutense de Madrid) Fermín Sierra (Universidad deAmsterdam) Beatriz Blecua (Universidad de Girona)

Las ideas y opiniones recogidas aquí son propiedad de los diferentes autores y no reflejan necesariamen-te la posición de segundaslenguaseinmigracion.es La versión electrónica de este documento ha sido preparada por segundaslenguaseinmigracion.es y en-viada a la web con el permiso de los autores

Page 3: Segundas Lenguas e Inmigracion, nº7

Português língua segunda: alguns estudos em Portugal

Mª Helena Ança

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Portugal y las políticas de integración para los inmigrantes

Perpétua Santos Silva

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El juego lingüístico: una vía para el desarrollo de la consciencia metalingüística de los niños nativos y no nativos

Andreia Ferreira y Maria Helena Ançã

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La educación intercultural en el 3 º ciclo de la educación básica: la voz de los docentes en formación

Rosa Bizarro

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Estrategias y materiales para la enseñanza de Portugués Lengua No Materna: un proyecto desarrolado con escuelas de educación básica

Luísa Solla

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Novos públicos, novos desafios: alguns traços comuns a imigrantes adultos eslavófonos na apropriação do Português

Teresa Ferreira

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Page 4: Segundas Lenguas e Inmigracion, nº7
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Português língua segunda: alguns estudos em Portugal

Maria Helena AnçãCIDTFF. Universidade de Aveiro (Portugal)

[email protected]

Num cenário de uma Europa sem fronteiras, onde os encontros e os contactos se tornaram mais fáceis e mais rápidos, cruzam-se sujeitos de diversas proveniências, com línguas e culturas diferentes. Estes fenómenos continuam a ser, sobretudo, marcados por movimentos migratórios e Portugal não escapou a esta realidade, dado que, na sequência de mudanças históricas e sociopolíticas, ocorridas a partir de 1974, este país se começa a desenhar como multicultural.

Os primeiros movimentos populacionais ‘exteriores’ partiram das ex-colónias portu-guesas em África (PALOP/Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa): Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique e São Tomé e Príncipe que, em 1975, se constituíram como países independentes.

Até ao dobrar do milénio, as comunidades africanas foram as mais expressivas em Portugal, sendo os cabo-verdianos os mais numerosos. No entanto, com a abertu-ra a Leste e com a independência das repúblicas da ex-União Soviética, uma vaga significativa de cidadãos provenientes da Europa Oriental e da Ásia Central entrou em Portugal. Depois de esgotado o Norte da Europa, estes procuraram a Península Ibérica, em busca de melhores condições de vida. Embora Portugal não tivesse aparentemente laços históricos ou linguísticos com esta população (excetuando os moldavos e romenos, falantes de uma língua românica), nesse período, Portugal não oferecia grandes obstáculos à instalação da população estrangeira e à obten-ção de trabalho. A partir de 2001, os estrangeiros mais numerosa eram os ucrania-nos que, de um número reduzido, 163 indivíduos, em 2000, passou para 42252, no ano seguinte (Hespanha et al. 2002).

De destacar a comunidade brasileira que, na sequência da visita do Presidente Lula da Silva e do chamado “Acordo Lula”, representava, em 2004, a maior comunida-de. Aliás, esta primeira posição tem-se afirmado, desde 2007, mesmo quando a si-tuação económica e financeira de Portugal se agrava e o Brasil ‘floresce’, em ter-mos económicos.

De 2005 a 2010, tendo em conta a situação preocupante do país, numerosos es-trangeiros abandonaram Portugal. No entanto, as comunidades africanas proveni-entes dos PALOP (Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa) foram as que mais fielmente se mantiveram, sendo também estas, pelas razões acima referidas, as mais antigas no atual mosaico social. Contudo, também elas sofreram um ligeiro

Domingues, C. y Ança, Mª H. (2012) “Diversidade linguística na escola Capa-citação e discriminação através da Língua Portuguesa” en Segundas Lenguas e Inmigración en red, 6 pp. 3-25

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“Português língua segunda: alguns estudos em Portugal”

decréscimo, situação, porventura, explicável pelo facto de poder corresponder à atribuição da nacionalidade portuguesa. O ano 2010 marca efetivamente um de-créscimo geral da população estrangeira residente1 (SEF, 2011) de quase 2%, aco-lhendo, em final desse ano, 445 262 cidadãos estrangeiros legalizados (em 10 mi-lhões e quinhentos mil habitantes em Portugal2). Em 2011, regista-se uma nova di-minuição da população estrangeira: 436822 cidadãos residentes (SEF, 2012).

Sendo a escola o espelho da sociedade, numerosos alunos de diversas partes do mundo povoam os nossos espaços educativos, quer em contextos de aprendiza-gem formal, quer em contextos não formais (associações, centros, juntas de fre-guesia…). Num estudo encomendado pelo Ministério de Educação (Dionízio et al., 2005), relativo ao ano letivo 2004/ 2005, já havia 120 nacionalidades presentes nas nossas escolas e 80 línguas, sendo os Crioulos (de Cabo Verde, Guiné Bissau ou de S. Tomé e Príncipe) e o Ucraniano as línguas mais significativas. Estudos mais recentes (Mateus, 2011) referem 90 000 estudantes estrangeiros nas escolas portuguesas, registando-se nos primeiros anos de escolaridade o número mais ele-vado (36 730).

Esta panorâmica escolar, de diversidade linguística e cultural, apresenta-se como um enorme desafio para o professor, cuja formação académica não lhe permite dar resposta às atuais interrogações: que novas funções e estatutos tem agora a língua portuguesa (LP)? Quem são novos

aprendentes? Como rentabilizar a sua bagagem linguística e cultural na aprendiza-gem da LP? Como integrar através da língua? De facto, a importância do domínio da LP é inquestionável, dado ela ser o meio/instrumento pelo qual os aprendentes/cidadãos encontram o seu lugar na escola e na sociedade.

Neste número da Revista Lenguas e Inmigración en red pretendemos dar a conhe-cer alguns estudos desenvolvidos em Portugal, e refletir sobre questões em torno da língua segunda, na vertente língua de acolhimento, promotora também de uma educação para a cidadania e para a paz.

Os textos, que apresentamos, norteados por dimensões educativas, sociolinguísti-cas e políticas, narram contextos diversificados (formais, não formais; de forma-ção, de investigação), com diferentes tipos de aprendentes (crianças, jovens, adul-tos) e cujas autoras têm origens ‘académicas’ também diferentes.

Assim, o primeiro texto, de Perpétua Santos Silva, investigadora no Centro de In-vestigação e Estudos de Sociologia (CIES),do Instituto Universitário de Lisboa (IUL)

1 Este conceito foi recentemente introduzido pelo SEF (2011, p. 17) englobando “os estrangeiros de-tentores de um título de residência e os estrangeiros a quem foi prorrogada a permanência de longa duração”.2 O crescimento de meio milhão de habitantes, em Portugal, deve-se aos números da imigração.

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Maria Helena Ançã

e docente na Escola Superior de Educação /Instituto Politécnico de Santarém, lan-ça um olhar sobre o panorama da imigração em Portugal, considerando os aspetos das políticas de integração dos imigrantes atualmente em curso no país.

No texto de Rosa Bizarro, da Universidade Portucalense e do Centro de Investiga-ção Transdisciplinar Cultura, Espaço e Memória (CITCEM), do Porto, são levanta-das questões relativas à formação de professores para a interculturalidade, num cenário marcado pela diversidade nas escolas portuguesas. Para este efeito, são apresentados os resultados de um estudo realizado com professores de diferentes áreas no 3º Ciclo do Ensino Básico.

Luísa Solla, da Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Setúbal e investigadora do Instituto de Linguística Teórica e Computacional (ILTEC), de Lis-boa, apresenta um projeto desenvolvido pelo ILTEC em três agrupamentos de es-colas, nos quais se procurou estudar a situação de diversidade linguística e cultu-ral, e se traçaram percursos pedagógicos mais adequados para alunos que têm de aprender a LP, língua da escola, como objeto e como meio de aprendizagens curri-culares.

Andreia Ferreira, mestre pela Universidade de Aveiro, e Maria Helena Ançã, do CIDTFF/Universidade de Aveiro, dão a conhecer um estudo realizado numa escola do 1.º Ciclo do Ensino Básico, cujo objetivo principal foi compreender de que for-ma o jogo linguístico, em particular o jogo de ocultamento/ausência, é um recurso didático com reais potencialidades na aprendizagem da LP e no desenvolvimento da consciência metalinguística de crianças nativas e não nativas.

Por fim, Teresa Ferreira, recém-doutorada pela Universidade de Aveiro, dá conta das principais conclusões do seu projeto de doutoramento, cuja principal finalidade projeto consistiu na caracterização do perfil de apropriação do Português por aprendentes adultos eslavófonos, frequentando cursos de Português (contexto for-mal e não formal), em Portugal. A sua análise centrou-se em três grandes eixos: o perfil de apropriação da LP; a gestão dos repertórios linguísticos; e as dificuldades manifestadas na apropriação, compreensão e uso do sistema temporal-aspetual em Português.

Para finalizar, um agradecimento muito especial à Revista SL&I en red, pelo convi-te que nos foi dirigido para colaborar neste número e apresentar alguns estudos desenvolvidos em Portugal, no âmbito do Português, língua segunda, vertente lín-gua de acolhimento.

Aveiro, janeiro 2013

Maria Helena Ançã

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“Português língua segunda: alguns estudos em Portugal”

1 Bibliografia

Dionízio, S. (coord.) et al. (2005), Português Língua Não Materna. Análise do inquérito no âmbito do conhecimento da situação escolar dos alunos cuja língua materna não é o português. Lisboa: Instituto de Estudos Sociais e Económicos/Ministério da Educação.

Hespanha, P. et al. (2002), “Imigrantes de Leste” en Horizontes Sociais, 2 : 109-136.

Mateus, M. H. M (2011). “Diversidade Linguística na Escola Portuguesa” en Revista Lu-sófona de Educação, 18 : 13-24.

SEF/ Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (2011), Relatório de Imigração, Fronteiras e Asilo 2010. Oeiras: SEF. Disponível em : http://sefstat .sef.pt/Docs/Rifa_2011.pdf (consultado em agosto de 2011).

SEF/Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (2012), Relatório de Imigração Fronteiras e Asilo – 2011. Oeiras: SEF. Disponível em: http://sefstat.sef.pt/Docs/Rifa_2011.pdf (consultado em julho de 2012).

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Portugal y las políticas de integración para los inmigrantes

Perpétua Santos SilvaCIES /IUL e Escola Superior de Educação

Instituto Politécnico de Santarém (Portugal)

[email protected]

Com base em análise documental efetuada a partir de várias fontes de informação, apresentaremos um breve panorama da imigração em Portugal e discutiremos aspetos das políticas de integração dos imigran-tes atualmente em curso. Para além da identificação da posição de Portugal em relação a outros países da Europa, será dado destaque à dimensão linguística das políticas de integração e serão apresentados alguns dados a partir dos resultados do Inmigrant Citizens Survey (ICS), conduzido pelo Migration Policy Group, e do Migrant Integration Survey, desenvolvidos pelo Eurobarómetro, Comissão Europeia.

MIGRANT INTEGRATION POLICIES IN PORTUGALBased on data collection from different sources of information our work will present a short overview on immigration in Portugal and we will question aspects of ongoing immigration integration policies. In ad-dition to the identification of the stand of Portugal in the context of other European countries we will ap-proach de linguistic implications of those integration policies and some data will be presented based on the results published by the Immigrant Citizens Survey (ICS), led by the Migration Policy Group and the Migrant Integration Survey, developed by EC, Eurobarometer.

1 Introdução

Durante longo período de tempo, Portugal foi visto como país de emigração, sendo amplamente conhecidos os números e as razões na origem destes percursos mi-gratórios de saída.

A partir de 1974, assiste-se a uma reconfiguração das dinâmicas migratórias, com retração da emigração, retorno de emigrantes, repatriamento de portugueses oriundos dos países africanos de expressão portuguesa em processos de descoloni-zação e, progressivamente, vão-se intensificando os fluxos imigratórios (Pires, 2003:19).

Com o decorrer do tempo, vai sendo construída a imagem de um Portugal de imi-gração e, ainda que não tenham cessado os fluxos de saída, é esta dimensão das migrações que mais vai chamando a atenção – da academia, por um lado, e da opinião pública em geral, por outro. Neste último caso, muito por ação dos meios

Santos Silva, P. (2013) “Portugal y las políticas de integración para los inmigrantes” en Segundas Lenguas e Inmigración en red, 7 pp. 8-27

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“Portugal y las políticas de integración para los inmigrantes”

de comunicação e não raras vezes segundo uma perspetiva nada favorável, ali-mentando estereótipos e contribuindo para a formação de uma imagem negativa do indivíduo imigrante.

Não cabe num artigo desta natureza escrutinar nenhum dos dois domínios acima mencionados, nem tão pouco analisar o fenómeno da imigração em Portugal na sua multidimensionalidade.

Como é sabido, os padrões das migrações internacionais têm vindo a complexifi-car-se, com origens, destinos e motivações cada vez mais diversificadas e abran-gendo, igualmente, distâncias cada vez maiores, facto que vai obrigando os países a definirem e a articularem as suas políticas migratórias. Assim, de forma necessa-riamente breve, iremos discutir alguns aspetos das políticas de integração de imi-grantes atualmente em curso em Portugal e apontaremos, igualmente, a posição deste país no que respeita à sua aplicação e desenvolvimento no contexto da União Europeia, sendo este de particular importância por ser no mesmo que Portu-gal se integra.

Para o efeito, serão tomados como recursos os Planos I e II para a Integração dos Imigrantes, de 2007-2009 e de 2010-2013, respetivamente, a informação disponi-bilizada pelo SEF – Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, os resultados do MIPEX III – Migrant Integration Policy Index, do Migrant Integration Survey (2011) e do Inmigrant Citizen Survey (2012).

2 Breve panorama da imigração em Portugal

No que respeita à população estrangeira residente em Portugal, de acordo com a informação disponibilizada pelo SEF reportando-se a 31 de Dezembro de 2011, a mesma cifra-se nos 436 822 indivíduos, apresentando uma repartição segundo o género com ligeira predominância para o sexo masculino – representa 50,2% do total.

Quanto à distribuição por grupos etários, a população imigrada em Portugal, como expectável, encontra-se concentrada no grupo dos potencialmente ativos: com um peso relativo de 79% para as faixas etárias dos 20 aos 64 anos.

Considerando a sua distribuição geográfica, os distritos de Lisboa, Faro e Setúbal concentram a maior parte da população imigrada (69,2%), destacando-se a seguir os distritos do Porto, Leiria, Santarém e Aveiro, que em conjunto representam 15,9% do total, distribuindo-se os restantes 14,9% pelo resto do país.

Atentando aos países de onde são originários, verifica-se que, da população es-trangeira residente em Portugal o grupo mais numeroso é formado pelos naturais do Brasil (25,5%); seguem-se os nacionais da Ucrânia (11,0%), de Cabo Verde (10,1%), da Roménia (9,0%) e de Angola (4,9%). Embora com expressão numéri-ca menos significativa, se juntarmos a estes grupos os nacionais da Guiné-Bissau

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Perpétua Santos Silva

(4,2%), do Reino Unido (4,0%), da China (3,8%), da Moldávia (3,1%) e de São Tomé e Príncipe (2,4%), encontramos as dez nacionalidades mais expressivas – representando 78,1% da população estrangeira residente em Portugal (SEF, 2012).

Quanto ao fluxo registado no ano de 2011, considerando, portanto, a emissão de primeiros títulos de residência, o mesmo ascende a 45 369 novas emissões, núme-ro que representa uma quebra de 10,6% em relação ao ano anterior. Quanto aos países de origem, coincidem as nacionalidades com as dez mais significativas en-contradas para os stocks de residentes, com exceção da Moldávia que no fluxo imi-gratório do ano de 2011 é substituída por Espanha. As novas autorizações de resi-dência são concedidas, em primeiro lugar, por motivo de reagrupamento familiar (25,5%), seguido de exercício de atividade profissional (14,9%) e estudo (13,9%). Os certificados e cartões de residência emitidos a cidadãos da União Europeia re-presentaram 42,9% do total de novas emissões de autorização de residência (idem).

Finalizamos este breve retrato da imigração em Portugal apresentando a evolução da população estrangeira a residir legalmente em território nacional, tendo o con-tingente passado de 107 767 indivíduos em 1990 para 207 587 em 2000 e para 445262 em 2010; em 2011, como já referimos, atinge o número de 436 822. A partir de 2009, o crescimento que vinha a registar-se ao longo dos anos decai, apresentando um ligeiro decréscimo (variação negativa de cerca de 2% em 2010 e 2011), que pode ter como explicação fatores como o acesso por residentes estran-geiros à nacionalidade portuguesa e alterações nos processos migratórios em al-guns países de origem, podendo configurar, ainda, os primeiros resultados visíveis da crise económica e financeira que o país atravessa.

3 Políticas públicas para a integração de imigrantes

De acordo com Machado (2003), podemos olhar para as diversas questões que a imigração coloca às sociedades de acolhimento segundo duas perspetivas: a da re-gulação dos fluxos migratórios e a da integração social das populações migrantes. Encontrando-se ambas as perspetivas, evidentemente, interligadas, considera o autor que, no entanto, a discussão pública, política e académica se tem centrado mais na primeira do que na segunda. À necessidade de controlar e regular os flu-xos migratórios, acresce a necessidade de considerar um conjunto de sinais que parecem revelar algumas configurações de situações de exclusão social.

A par da atenção dada aos fluxos de entrada, importa, igualmente, considerar os fluxos de saída, ter em consideração fatores de ordem demográfica e económica na relação entre os dois tipos de fluxos, a reposição de mão-de-obra dos que saem pelos que entram, a diversificação e alargamento do trabalho migrante, tradicional-mente associado à construção civil, por vários sectores de atividade. Mas, para além de discutir volume e perfis das diversas vagas de imigração, há que questio-

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“Portugal y las políticas de integración para los inmigrantes”

nar as condições em que esses imigrantes se encontram, perspetivar os seus traje-tos de integração ou de exclusão na sociedade portuguesa analisando, para o efei-to, indicadores de natureza diversa – como, por exemplo, a condição socioprofissi-onal, o posicionamento na estrutura de classes, a mobilidade profissional e social, as qualificações e percursos de qualificação dos imigrantes e dos seus descenden-tes (idem).

Segundo Rocha-Trindade (2008), na última década do século passado, as políticas de imigração adotadas em Portugal foram, sobretudo, de caráter reativo, com pro-dução de legislação e de regulamentação visando corrigir situações anteriores me-nos conseguidas, não sendo evidente a existência de uma estratégia definida nem a médio nem a longo prazo. Existia a preocupação de legalizar e regularizar a situ-ação de um número significativo de imigrantes ilegais e existia, igualmente, a per-ceção de que a mão-de-obra imigrante era necessária ao país.

Ainda segundo a mesma autora, é possível verificar que de forma progressiva hou-ve uma aproximação do país às posições do Conselho da Europa, quer no que res-peita à ideia do contributo da imigração para reforçar as populações europeias com camadas mais jovens, quer no que respeita ao desenvolvimento do diálogo in-tercultural; o conjunto de princípios que viriam, no novo milénio, a dar forma às novas leis de imigração em Portugal são resumidos por Rocha-Trindade (2008) da seguinte forma:

− É reconhecida a necessidade de entrada anual de um número significativo de estrangeiros, tanto para satisfazer as necessidades de mão-de-obra para o desenvolvimento econômico, como para corrigir a tendência para o envelhecimento demográfico da população portuguesa;

− torna-se indispensável assegurar a todos os residentes o acesso aos bene-fícios da cidadania, independentemente de se tratar ou não de imigrantes legais, em nome do respeito pelos direitos humanos;

− para tal, é indispensável criar estruturas e mecanismos centrais e locais destinados a facilitar a resolução dos problemas de toda a ordem que se suscitem aos cidadãos estrangeiros e designadamente para promover o diálogo intercultural com a população maioritária;

− em suma, o mote desta posição política será acolher e integrar, agora numa perspectiva pró-activa, em vez de reactiva.

Ora esta postura pró-ativa implica não só a produção de documentação como leva também à criação de estruturas que coloquem em prática um conjunto de medidas desenhadas segundo uma nova orientação, perspetivando uma política integrado-ra.

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Perpétua Santos Silva

A Lei Orgânica n.º 2/2006, de 17 de Abril, vem introduzir alterações à Lei n.º 37/81, de 3 de Outubro (Lei da Nacionalidade) no que respeita aos regimes da atribuição e da aquisição da nacionalidade portuguesa. Das alterações introduzi-das, destaca-se o reforço do princípio do jus soli, concretizando o reconhecimento de um estatuto de cidadania a quem tem fortes laços com Portugal, como é o caso de muitos descendentes de imigrantes que, embora sendo estrangeiros, nasceram em Portugal e nunca conheceram outro país. Assim, de acordo com a nova lei, é atribuída a nacionalidade portuguesa de origem aos nascidos no território portu-guês, filhos de estrangeiros, se pelo menos um dos progenitores também tiver nascido no país e no mesmo tiver residência, independentemente de título, ao tempo do nascimento do filho, bem como aos nascidos no território português, fi -lhos de estrangeiros que não se encontrem ao serviço do respetivo Estado, se de-clararem que querem ser portugueses, desde que, no momento do nascimento, um dos progenitores aqui resida legalmente há, pelo menos, cinco anos. É, igual-mente, consagrado um direito subjetivo à naturalização por parte dos menores nascidos no território português, filhos de estrangeiros, se, no momento do pedi-do, um dos progenitores tiver residência legal há cinco anos ou se o menor tiver concluído o primeiro ciclo do ensino básico em Portugal (Lei Orgânica n.º 2/2006).

Para além da nova lei da nacionalidade e do novo regime jurídico de entrada, per-manência, saída e afastamento de estrangeiros do território português (Lei nº 23/2007 de 04 de julho, entretanto alterada pela Lei 29/2012, de 09 de agosto), com caráter eminentemente regulador, é o Plano para a Integração dos Imigran-tes (Resolução do Conselho de Ministros nº 63-A/2007, publicada a 3 de maio) que materializa uma nova forma de olhar o fenómeno da imigração em Portugal.

Neste primeiro Plano para a Integração dos Imigrantes (doravante, I Plano), o go-verno português reconhece que o país não tinha um plano global e integrado em que sistematizasse objetivos e compromissos no que respeita ao acolhimento e in-tegração de imigrantes e propõe um conjunto muito significativo de medidas (num total de 122) em diversas áreas de atuação, nomeadamente a do trabalho, da se-gurança social, habitação, saúde, educação e justiça, e numa perspetiva de trans-versalidade, abrangendo questões como racismo e discriminação, igualdade de gé-nero e cidadania. Este programa político prevê, também, uma atuação concertada de todos os ministérios, identificando as áreas de intervenção específica de cada um.

Através do I Plano, é estabelecido como objetivo geral efetuar “um salto qualitati-vo e eficaz nas políticas de acolhimento e integração dos imigrantes” desenvolven-do “um trabalho conjunto para um Portugal mais solidário e inclusivo”, incentivando à participação da sociedade civil e dos próprios imigrantes, prevendo a “co-responsabilidade dos imigrantes na concepção, desenvolvimento e avaliação das políticas de imigração, considerando o associativismo imigrante como expres-são” dessa participação (RCM nº 63-A/2007), e tendo como estrutura central para o desenvolvimento das orientações governamentais o ACIDI – Alto Comissariado

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“Portugal y las políticas de integración para los inmigrantes”

para a Imigração e o Diálogo Intercultural1. Foram, também, criadas estruturas descentralizadas para assegurar a ação do ACIDI – os Centros Locais de Apoio à Integração de Imigrantes/CLAII.

De entre os princípios orientadores expressos no I Plano, salienta-se a adoção de uma visão positiva da imigração, reconhecendo o seu contributo económico, social e cultural, assume-se a responsabilidade de promover um acolhimento com hospi-talidade e integração, o exercício da cidadania, a afirmação da interculturalidade como garante da coesão social e a aceitação das especificidades culturais e sociais, sublinhando o caráter relacional e interativo e o respeito mútuo entre diferentes comunidades. Reconhece-se e evidencia-se o direito a viver em família e à igualda-de de género, chamando a atenção para a dupla vulnerabilidade da condição mu-lher/imigrante, e acentua-se a necessidade de promover a igualdade de oportuni-dades para todos – no acesso à educação, ao trabalho, à saúde, à habitação e aos direitos sociais – rejeitando qualquer tipo de discriminação em função da etnia, na-cionalidade, língua, religião ou sexo.

A execução deste I Plano decorreu no período de 2007 a 2009, envolvendo 13 mi-nistérios em 122 medidas distribuídas por várias áreas setoriais, tendo 15 destas superado os 70% de execução, 4 registado uma execução acima dos 50% e fican-do apenas 1 área aquém dos 50%. Com uma execução global de 81%, as áreas mais fortes são: o Acolhimento; a Sociedade de Informação; a Liberdade Religiosa; o Acesso à Cidadania e Direitos Políticos; o Tráfico de Seres Humanos; o Trabalho, Emprego e Formação Profissional; A Educação; a Justiça; o Desporto; os Descen-dentes de Imigrantes; o Reagrupamento Familiar; o Associativismo Imigrante; os Media; a Solidariedade e Segurança Social; a Cultura e Língua. As áreas que apre-sentam uma execução entre os 50% e os 70% são as áreas da Habitação, do Ra-cismo e Discriminação, da Saúde e a das Questões de Género. À taxa de execução inferior, abaixo dos 50%, corresponde a área das Relações com os Países de Ori-gem (ACIDI, 20102).

Procurando dar continuidade a esta nova geração de políticas sociais no domínio da imigração, em 2010 é aprovado o II Plano para a Integração dos Imigrantes, atualmente em curso, traçado para o período de 2010 a 2013 (Resolução do Con-selho de Ministros n.º 74/2010, de 17 de setembro).1 O ACIDI surge como Instituto Público no quadro das orientações definidas pelo Programa de Rees-truturação da Administração Central do Estado (PRACE), na linha da modernização administrativa, melhoria da qualidade e eficiência dos serviços públicos, resultando da fusão do Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas, da estrutura de apoio técnico à coordenação do Programa Esco-lhas, da Estrutura de Missão para o Diálogo com as Religiões e do Secretariado Entreculturas (Decre -to-Lei nº 167/2007, de 3 de Maio). 2 Para mais informação, pode ser consultado o Relatório Final de Execução do I Plano de Integração dos Imigrantes no qual são apresentadas, para cada área setorial, as várias medidas previstas assim como as atividades desenvolvidas com vista à sua execução. Encontra-se disponível a partir de:http://www.acidi.gov.pt/acidi-i-p-/plano-para-a-integracao-de-imigrantes---pii http://ec.europa.eu/ewsi/UDRW/images/items/docl_15282_531646364.pdf

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Perpétua Santos Silva

Na sequência da avaliação de execução do plano anterior, são propostas algumas alterações, nomeadamente com a introdução de duas novas áreas de intervenção – a da promoção da diversidade e interculturalidade e a dos idosos imigrantes. Sendo o envelhecimento das populações um fenómeno crescente nas sociedades modernas e, apesar de as populações imigrantes corresponderem em larga medida às faixas etárias dos potencialmente ativos, os imigrantes idosos vão, igualmente, ganhando peso nas sociedades de acolhimento3 justificando que se pensem medi-das específicas para este segmento populacional – no caso deste plano de inter-venção procurando combater as vulnerabilidades socioeconómicas e dando a co-nhecer os tipos de apoios institucionais existentes. Quanto à promoção da diversi-dade e interculturalidade, a sua autonomização como área de intervenção reflete a importância do respeito e do direito à diferença como estratégia de apoio ao pro-cesso de acolhimento e integração dos imigrantes, na sua configuração dialogante entre quem chega e quem recebe (RCM nº 74/2010).

Este II Plano é composto por 90 medidas, integradas em 17 áreas de intervenção: Acolhimento; Cultura e Língua; Emprego, Formação profissional e dinâmicas em-presariais; Educação; Solidariedade e segurança social; Saúde; Habitação; Justiça; Racismo e discriminação; Acesso à cidadania e participação cívica; Associativismo imigrante; Descendentes de imigrantes; Idosos imigrantes; Relações com os países de origem; Promoção da diversidade e da interculturalidade; Questões de género; Tráfico de seres humanos (idem).

Encontrando-se a decorrer a sua aplicação, não é possível apresentar resultados de execução, contudo o Relatório Intercalar para 2011 dá já conta de um conjunto significativo de ações que tiveram lugar no decurso do primeiro ano da sua aplica-ção, pese embora o facto de no ano em questão terem decorrido em Portugal mu-danças políticas com alteração de Governo no mês de junho, e embora tenha sido dada continuidade ao II Plano, estas mudanças tiveram como efeito um abranda-mento na sua execução (ACIDI, 2012).

A nova linha das políticas públicas para a imigração desenvolvida em Portugal nos últimos anos tem obtido boas referências por parte de organizações internacionais como é o caso da OCDE, no “International Migration Outlook”, e da ONU, no “Rela-tório de Desenvolvimento Humano 2009”, com a atribuição de classificações muito positivas no que respeita aos direitos e serviços aos estrangeiros residentes no país. Também o MIPEX – Migrant Integration Policy Index evidencia bons resulta-dos das políticas desenvolvidas e destaca a sua evolução positiva nos últimos anos.

3 Como bem notam Machado e Roldão (2010), “As migrações e os imigrantes também envelhecem. Esta não será a primeira percepção que temos da demografia das migrações, mas é um facto concreto, cuja realidade decorre do desenrolar normal do ciclo migratório. Nem as migrações representam sem-pre um potencial de rejuvenescimento demográfico das sociedades de acolhimento, nem os imigrantes são sempre jovens adultos.”

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O MIPEX avalia os enquadramentos legais dos Estados membros em matéria de in-tegração de 31 países da Europa e da América do Norte4, utilizando 148 indicado-res de políticas, distribuídos por 7 áreas distintas, com o objetivo de aferir, através das políticas definidas e da sua implementação, se todos os residentes têm garan-tidos os mesmos direitos, deveres e oportunidades. Tem por base leis, políticas pú-blicas e ações de investigação, disponibiliza uma ferramenta interativa em linha que permite estabelecer comparações entre países (Huddleston, 2011).

Os resultados do MIPEX III5 apontam para a existência de políticas apenas media-namente favoráveis à integração, com uma classificação global para o conjunto dos países na ordem dos 50%, sendo os maiores obstáculos identificados referen-tes à cidadania ou participação política dos estrangeiros já estabelecidos e à apren-dizagem e integração das crianças na escola. Quanto a pontos fortes, o relatório divulgado aponta o facto de os trabalhadores migrantes, as famílias reagrupadas e os residentes de longa duração gozarem de condições básicas de segurança, direi-tos e proteção contra a discriminação (idem).

No que respeita ao caso de Portugal, de acordo com os dados do MIPEX, o relató-rio de 2011 apresenta Portugal com uma avaliação global de 79 pontos, a segunda mais alta entre os países avaliados (cf. Fg 2).

No que respeita a Portugal6, no Relatório MIPEX III considera-se que tem vindo a registar progressos em matéria de integração de imigrantes, sendo apontado como o país que mais se esforçou para assegurar o exercício do direito à residência de longa duração e para dar resposta específica à situação laboral dos imigrantes, no-meadamente através dos planos de integração desenvolvidos e de medidas imple-mentadas ao nível das qualificações e o seu reconhecimento; a Lei da Nacionalida-de portuguesa é apontada, entre os 31 países, como a que melhor promove a edi-ficação de uma cidadania comum. Entre as principais conclusões no que respeita às políticas de integração de imigrantes, Portugal é apontado, também, como o país com melhores condições de acesso ao mercado de trabalho e de reagrupa-mento familiar, e com melhores políticas educativas para migrantes, tendo todos os alunos acesso facilitado à escola e a uma educação multicultural (Huddleston, 2011).

Em matéria de trabalho, nos últimos anos Portugal encontra-se numa situação de perda de emprego entre todos os residentes, sendo os imigrantes vitimas da crise

4 Por ordem de classificação no III Índex (classificação global), os países membros do MIPEX eram: Suécia, Portugal, Canadá, Finlândia, Países Baixos, Bélgica, Noruega; Espanha, Estados Unidos da América, Itália, Luxemburgo, Alemanha, Reino Unido, Dinamarca, França, Grécia, Irlanda, Eslové-nia, República Checa, Estónia, Hungria, Roménia, Suíça, Áustria, Polónia, Bulgária, Lituânia, Malta, Eslováquia, Chipre e Letónia. Recentemente juntaram-se ao grupo Austrália e Japão, mas em fase posterior ao apuramento dos resultados de 2011.5 Cf. Fg. 1, resultados para os 10 países com melhores classificações, segundo as áreas políticas consi -deradas.6 Cf. Fg. 3, resultados globais para Portugal segundo as áreas de políticas

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económica e laboral que se vive no país da mesma forma que os residentes nacio-nais. Contudo, neste domínio, o enquadramento legal em Portugal prevê igualdade de todos os trabalhadores, independentemente da sua nacionalidade, no acesso ao trabalho, na mudança de emprego, na prestação de serviços públicos ou de gerir um negócio; os imigrantes têm o mesmo apoio na procura de emprego do que os nacionais do país e gozam dos mesmos direitos no emprego; no MIPEX, são referi-das as medidas previstas nos Planos I e II e a sua execução – concretizada ou em curso. Quanto ao reagrupamento familiar, destaca-se a perspetiva adotada em Portugal, segundo a qual é reconhecida a importância do viver em família para a integração em sociedade, estabelecendo o país as condições legais necessárias e o desenvolvimento de medidas tendentes à concretização da reunião de famílias mi-grantes (Huddleston, 2011).

No domínio da educação, de um ponto de vista global, o país não tem ultrapassa-do o patamar das medidas “ligeiramente favoráveis”, o que se deve, em larga me-dida, a um fraco aproveitamento das novas oportunidades e da resposta às neces-sidades dos migrantes em contexto escolar7. Com uma pontuação global de 63% neste sector de políticas, é referido que Portugal, no entanto, vai mais longe do que outros novos países de imigração na promoção da integração social na educa-ção, sendo apontado como referência o “Programa Escolhas” na promoção da in-clusão social de crianças e jovens, e destaca-se o facto de Portugal ocupar a pri-meira posição no que respeita a facilidades de acesso à educação: “todos os alu-nos, independentemente do seu estatuto têm acesso à escola e a um apoio dire-cionado para as famílias mais vulneráveis, aprendendo ainda a conviver num am-biente marcado pela diversidade” (idem).

Pontos fracos reportam-se às áreas da participação política, no que respeita a di-reitos eleitorais e de representação política (com uma pontuação respetiva de 33% e de 48%), e também em matéria de residência de longa duração – elegibilidade e condições de aquisição com fraca pontuação, rondando os 50% –, embora seja de destacar que neste domínio Portugal apresentou consideráveis melhorias relativa-mente à avaliação MIPEX dos anos anteriores, combinando, agora, as pontuações referidas com outras bastante mais favoráveis no que respeita aos direitos associa-dos (100%) e à segurança do estatuto (71%) de residente de longa duração (idem).

Foi publicado recentemente o relatório resultante do Projeto “Inmigrant Citizens Survey (ICS)”, tendo este como objetivo estabelecer uma comparação da opinião dos imigrantes sobre as políticas de integração nos países em que se encontram.

7 O MIPEX III refere que, nesta matéria e à semelhança de outros países e sobre outras línguas, Portu-gal poderia aplicar padrões de qualidade obrigatórios aos cursos de língua portuguesa e promover o ensino de mais línguas de comunidades migrantes, bem como seguir exemplos de boas práticas no que respeita no envolvimento dos pais na educação dos filhos, na formação específica de professores para os habilitar a maior e melhor capacidade de resposta às necessidades específicas dos migrantes e na avaliação das aprendizagens anteriores dos alunos recém-chegados.

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Portugal, através do ACIDI, participou neste projeto, coordenado pela Fundação Rei Balduíno e pelo Migration Policy Group, a par de seis outros países da União Europeia – Alemanha, Bélgica, Espanha, França e Hungria; no âmbito do projeto, cerca de 7500 imigrantes de 15 cidades dos países referidos (no caso de Portugal, áreas metropolitanas de Faro, de Lisboa e de Setúbal, tendo sido inquiridos 1259 indivíduos) foram inquiridos quanto às suas perceções no que respeita às políticas e programas de integração implementadas e ao impacto das mesmas nas suas vi-das, abordando seis áreas: acesso e situação no mercado de trabalho, conheci-mento e formação na língua do país de acolhimento, participação cívica e política, reagrupamento familiar, residência de longa duração e acesso à cidadania.

Destacaremos aqui apenas alguns dos resultados referentes a Portugal, sem a pre-ocupação de estabelecer comparações com os restantes países participantes no estudo. No que respeita às questões da participação política e cívica, esta área apresenta valores francamente baixos, sendo a pertença a associações (desporti-vas, culturais, sociais ou religiosas) ou a organizações ou grupos de imigrantes a assumir valores mais elevados mas, ainda assim, a não atingirem os 20%. Contu-do, mais de 70% votaria, se houvesse uma eleição geral, e cerca de metade dos inquiridos identifica a necessidade de existirem mais deputados de origem imigran-te – porque seria importante do ponto de vista simbólico, porque entenderiam me-lhor os imigrantes e representariam melhor os seus interesses são as razões apon-tadas, todas a rondar os 90% de peso relativo. Quanto às questões relacionadas com o mercado de trabalho, sobressaem as preocupações ligadas ao tipo de víncu-lo (precário) e às dificuldades decorrentes do não domínio da língua portuguesa (ICS, 20128).

Sendo este aspeto uma questão à qual é dada bastante importância no que respei-ta à integração – quer do ponto de vista dos próprios imigrantes, quer do ponto de vista de populações de acolhimento –, como demonstra o Relatório do Eurobaró-metro, “Migrant Integration9”, de 2011, abordaremos a questão linguística no pon-to seguinte.

4 A questão linguística nos planos de integração de imigrantes

O recentemente publicado estudo sobre o valor económico da língua portuguesa dedica um capítulo à importante relação da língua e fluxos migratórios, no qual se afirma que “(…) a partilha de uma língua comum funciona como facilitador e redu-tor de custos de transação, quer da população migrante quer dos hospedeiros que a acolhem, empregam e integram” (Reto et al, 2012).

8 Versão resumida para Portugal disponível em: http://www.oi.acidi.gov.pt/docs/pdf/2012_05_immi-grant-citizens-survey-portugal.pdf; Estudo completo disponível em: http://www.oi.acidi.gov.pt/docs/pdf/2012_ICS_ENG_Full.pdf9 Disponível em: http://ec.europa.eu/public_opinion/archives/quali/ql_5969_migrant_en.pdf

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Entre as questões analisadas pelos autores do referido estudo, é apontado que a língua funciona como elemento influenciador na escolha do país para onde imigrar e que, no caso de Portugal, mais de 50% dos imigrantes que escolheram este país de destino são originários de países de expressão portuguesa (idem).

Visto pela perspetiva contrária, cerca de metade dos imigrantes em Portugal têm uma língua diferente da do país de acolhimento ao que acresce, sem dúvida, que, embora originários de países de língua portuguesa, na outra metade encontramos diferentes níveis de proficiência e serão também muitos os que dominam as lín-guas locais dos países de origem e não dominam necessariamente, ou dominam mal, a língua oficial do país – no caso, o português.

Quer do ponto de vista da promoção do respeito pela diversidade nas suas inúme-ras manifestações e, também, no que pode significar como fator de enriquecimen-to mútuo a oportunidade de realização de intercâmbios linguísticos, quer de um ponto de vista utilitário e pragmático, o conhecimento das línguas ou, dito de outro modo, a efetiva capacidade de comunicar, entender e ser entendido, é da maior relevância no que respeita a processos de integração.

Facto que tem sido contemplado nas políticas de integração de imigrantes aciona-das em Portugal e que se afigura como de extraordinária relevância na perspetiva dos próprios imigrantes. De uma lista de fatores facilitadores da integração apre-sentados no âmbito do anteriormente referido estudo da Comissão Europeia, “Mi-grant Integration”, os quatro fatores mais referidos pelo público em geral foram, por ordem de importância, falar a língua, ter emprego, respeitar a cultura local e o estatuto legal. Já os imigrantes, embora tenham apresentado os mesmos quatro aspetos como mais importantes no processo de integração, apresentam outra or-dem de importância, igualmente com o domínio da língua em primeiro lugar mas seguido do estatuto legal, de ter um emprego e do respeito pela cultura local. Am-bos os grupos, alvo do estudo, reconhecem que a língua pode ser a chave para um processo de integração bem conseguido, sendo que para os nacionais o facto de os imigrantes procurarem aprender a língua local é indicativo da sua disposição para se integrarem. Para além desta questão, é evidenciada a importância do do-mínio da língua na obtenção de um emprego e, ainda, para a compreensão da so-ciedade local (CE, 2011).

Como referido em ponto anterior, as questões relacionadas com a língua e com a cultura estão contempladas nos planos de integração de imigrantes, constituindo uma das 17 áreas de intervenção claramente definidas no atualmente em curso II Plano. De acordo com a avaliação intercalar realizada para os anos de exercício de 2010 e de 2011, é dado destaque à importância do conhecimento da língua portu-guesa na integração dos imigrantes residentes em Portugal tendo sido consolida-

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dos os dois principais programas criados para o efeito – o Programa Português para Todos (PPT) e o Programa Português Língua não Materna (PLNM)10.

No âmbito do I Plano, já havia sido desenvolvido um conjunto de atividades com o objetivo de que se ultrapassassem problemas sentidos pelos imigrantes à chegada ao país, destacando-se, neste âmbito e diretamente relacionado com desenvolvi-mento de competências linguísticas, o Programa “Portugal Acolhe” direcionado para a inserção socioprofissional e que compreendia um conjunto de ações em lín-gua portuguesa e cidadania, tendo envolvido um número significativo de forman-dos e de ações de formação11. Este Programa, em 2008, veio a ser integrado no PPT lançado pelo ACIDI, enquadrado no Programa Operacional Potencial Humano (POPH) tendo nos dois anos decorridos até ao término do I Plano sido ultrapassa-da a meta inicialmente traçada de dar formação a 10 000 formandos12; no total do número de formandos foram abrangidas mais de 40 nacionalidades (ACIDI, 2010).

No que respeita ao PLNM, sob a tutela do então Ministério da Educação, para além do ensino desenvolvido em contexto formal, com vista à promoção da equidade entre alunos nacionais e não nacionais, foram produzidas provas de exame de por-tuguês língua não materna no âmbito dos Exames Nacionais de Português do 9º ano e do 12º ano (para os níveis de iniciação – A2 e intermédio – B1). Para o pú-blico adulto, foram disponibilizados cursos de nível A2, em parceria com o Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP) e a Agência Nacional para a Qualifica-ção (ANQ); de referir, ainda, os cursos de Português Técnico para fins específicos (Comércio, Hotelaria e Restauração, Cuidados de Beleza, Construção Civil e Enge-nharia Civil). Foram, também, produzidos materiais de apoio à aprendizagem e dis-ponibilizados a todas as escolas nacionais (idem, 2010).

Quanto ao II Plano, pese embora o facto de o mesmo se encontrar a decorrer e, consequentemente, não existirem ainda indicadores finais de execução, o Relatório Intercalar do ACIDI (2012), no âmbito do PPT no decurso de 2010 e de 2011, dá conta da realização de 784 ações de formação em língua portuguesa, abrangendo 16 738 formandos13, e do alargamento aos níveis B1 e B2; quanto aos cursos de português técnico, foram realizadas 25 ações de formação com 394 formandos.

10 Em Domingues e Ançã (2012) pode encontrar-se uma síntese muito pertinente, na qual são apresen-tados os principais diplomas legais produzidos nos últimos anos sobre esta matéria, pelo que nos cen-traremos aqui na apresentação das medidas concretas estabelecidas nos planos nacionais de integra-ção, remetendo o leitor interessado em informação complementar para a leitura do artigo referido.11 No ano de 2007, 1457 formandos e 90 ações de formação; no ano de 2008, 2761 formandos e 162 ações de formação; no ano de 2009, 2199 formandos e 140 ações de formação (ACIDI, 2010:36). 12 Já no âmbito do PPT, em 2008 foram aprovadas 376 ações de formação, com envolvimento de 6864 formandos; em 2009, as ações de formação aprovadas foram 306 e o número de formandos foi de 5330.13 As metas traçadas no Plano eram de realizar 320 ações de formação em língua portuguesa perspeti-vando abranger 9000 formandos, pelo que quanto a esta medida a taxa de execução foi claramente ul-trapassada.

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No que respeita ao Programa PLNM, assinala-se a sua integração com estatuto de disciplina nos curricula dos 2º e 3º Ciclos do Ensino Básico, deixando de funcionar apenas no âmbito do estudo acompanhado ou como apoio educativo (Despacho Normativo nº 12/2011, de 22 de agosto); desta forma, procura-se uma maior cor-respondência entre a oferta de formação neste domínio e as necessidades sentidas pelo público-alvo.

Conforme referem Domingues e Ançã (2012), o que merece a nossa concordância, apesar do reconhecimento da importância da língua portuguesa como fator de in-tegração nem sempre na prática se obtêm os resultados esperados, nomeadamen-te ao nível do sucesso educativo. Embora o MIPEX III considere Portugal o melhor entre os novos países de imigração no que respeita ao sector da educação, como vimos, globalmente, a pontuação do país nesta matéria não vai além dos 63%, o que significa que as políticas desenvolvidas são apenas “ligeiramente favoráveis” à integração dos imigrantes. Contudo, é preciso aguardar a execução do plano de in-tegração atualmente em curso, embora seja de referir que o ACIDI no seu relató-rio intercalar aponta melhorias a este nível – indica que existiu uma melhoria na taxa de sucesso dos alunos que não têm português como língua materna e que aumentaram, também, os apoios especializados às escolas.

Para finalizar, destacamos ainda alguns resultados do Inmigrant Integration Survey (ICS, 2012) no que respeita à aprendizagem de línguas.

Em termos globais, apurou-se que os imigrantes em geral dominam mais línguas do que a média dos residentes nacionais dos países de acolhimento, os participan-tes no estudo demonstram valorizar os cursos para aprendizagem dessas línguas e consideram-nos importantes nos seus processos de integração socioeconómica, consideram que a falta de tempo é o maior problema na aprendizagem de novas línguas e revelaram sentir algumas dificuldades em obter informação sobre oportu-nidades de aprendizagem; ainda assim, uma ampla maioria dos inquiridos afirmou ter participado em cursos de línguas ou de integração nos países de acolhimento.

Os resultados apurados para Portugal, no que respeita a cada uma das áreas me-tropolitanas alvo do estudo, revelam que a maior parte dos inquiridos não realizou qualquer curso de português (69% em Faro, 74% em Lisboa e 86% em Setúbal), tendo sido encontrada uma associação significativa com a variável nível de instru-ção: à medida que o nível de instrução aumenta, aumenta também a percentagem de pessoas que ingressa em curso PPT (p=0.026).

Quanto às razões apontadas como desencorajadoras para aprender português, os imigrantes apontaram, maioritariamente a falta de tempo (Faro: 50%; Lisboa: 52%; Setúbal: 34%) e a falta de motivação (Faro: 43%, Lisboa: 22%; Setúbal: 34%). O facto de considerarem que é demasiado caro fazer um curso (Faro: 17%; Lisboa: 20%; Setúbal: 19%) e a falta de informação sobre os cursos (Faro: 17%; Lisboa: 14%; Setúbal: 23%) foram igualmente razões apontadas.

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Contudo, apesar de se ter verificado que muitos inquiridos não haviam ainda fre-quentado cursos de português ou, nalguns casos, tinham iniciado a abandonado sem concluir, os que frequentaram consideram que o curso, de alguma forma, os ajudou. Tendo, no conjunto das três áreas metropolitanas, os inquiridos afirmado que o curso facilitou bastante: na aprendizagem de português básico (74%), no envolvimento com a comunidade local (62%), a adquirir um emprego ou um em-prego melhor (60%), a adquirir mais educação ou formação (56%) e a aprender vocabulário específico necessário na atividade/área profissional (50%). Para 32% dos inquiridos, os cursos PPT serviram ainda para aprender todo o português que queriam aprender.

5 Considerações Finais

Dados recentes sobre os fluxos imigratórios em Portugal revelam que o crescimen-to registado nos últimos anos decai a partir de 2009, apresentando variação nega-tiva nos dois últimos anos, o que poderá ser reflexo da difícil situação económica em que o país se encontra.

Não obstante, têm sido desenvolvidas políticas com vista à plena integração dos imigrantes que têm merecido a classificação de boas práticas por parte de institui-ções internacionais e que deixam perceber um novo olhar de Portugal sobre o fe-nómeno da imigração, concretizando-se através dos I e II Planos Nacionais para a Integração dos Imigrantes.

Apesar das classificações positivas, existem várias áreas sobre as quais é necessá-rio atuar com vista à obtenção de resultados mais satisfatórios e à concretização de melhores quadros integradores.

Entre os vários domínios de atuação, no que se refere às questões linguísticas des-tacam-se alguns programas como o Português para Todos e o Português Língua não Materna. Embora tenham sido desenvolvidas várias medidas neste âmbito, no-meadamente através do desenvolvimento de inúmeras ações de formação em lín-gua portuguesa cerca de metade dos imigrantes residentes em Portugal não fre-quenta os cursos de português, sendo as principais razões apontadas para não o fazer a falta de disponibilidade para se dedicar à aprendizagem da língua, dificul-dades no acesso à informação sobre os cursos, o facto de considerarem os cursos caros e a falta de motivação para o estudo.

Contudo, entre aqueles que já frequentaram formação em língua portuguesa, o re-conhecimento da importância e do impacto que esta formação teve nas vidas pes-soais e profissionais é elevada, confirmando o que a literatura sobre o assunto tem vindo a afirmar – as línguas são um elemento de grande importância, quer no que respeita à melhoria da situação profissional dos indivíduos, quer no que respeita à construção de redes de interconhecimento e ao desenvolvimento de relações inter-pessoais que em muito contribuem para uma mais profunda e de maior qualidade

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Perpétua Santos Silva

integração dos imigrantes. Acresce que o fator linguístico contribui ainda para o enriquecimento do país de acolhimento, que será tanto maior quanto maior for a sua capacidade de aceitar, respeitar e acolher a diversidade linguística e cultural.

FG. 1 – MIPEX III: 10 PAÍSES COM MELHORES CLASSIFICAÇÕES, SEGUNDO AS ÁREAS POLÍTICAS CONSIDERADAS

Acesso ao mercado de trabalho

100 94 85 84 81 77 73 73 71 690

20

40

60

80

100

Suécia

Portuga

l

P. Baix

os

Espan

ha

Canad

á

Aleman

ha

Dinamarc

a

Norueg

a

Finlând ia

Itália

Reagrupamento familiar

91 89 85 84 75 74 70 68 68 670

20

40

60

80

100

Portuga

l

Canad

á

Espan

haSuéci

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Eslové

nia Itália

Finlândia

Bélgica

Norueg

a

Luxem

burgo

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“Portugal y las políticas de integración para los inmigrantes”

Educação

77 71 66 63 63 63 58 55 52 510

20406080

100

Suécia

Canad

á

Bélgica

Fin lândia

Norueg

a

Portuga

l

Reino U

nido

EUA

Luxem

burgo

Dinamarc

a

Participação Política

94 87 79 79 78 75 70 64 62 590

20406080

100

Norueg

a

Finlândia

Irlan

da

P. Baix

os

Luxem

burgo

Suécia

Portuga

l

Aleman

ha

Dinamarc

a

Bélgica

Residência de longa duração

79 78 78 69 69 68 67 66 66 650

20406080

100

Belgica

EspanhaSuéci

a

Portugal

Eslovén

i a

P. Baix

osEstó

nia

Dinamarc

aItá

lia

R. Checa

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Aquisição de nacionalidade

82 79 74 69 66 66 63 61 59 59 590

50

100

Portugal

Suécia

Canadá

Bélgica

Luxem

...

P. Baix

osItá

liaEUA

França

Aleman

ha

R. Unid

o

Antidiscriminação

89 89 88 86 84 80 79 78 77 750

20406080

100

Canadá EUA

Suécia

R. Unid

o

Portugal

Bulgária

Bélgica

Finlândia

França

Hungri

a

Legenda da pontuação:0 Totalmente desfavoráveis1 – 20 Desfavoráveis21 – 40 Ligeiramente desfavoráveis41 – 59 A meio caminho60 – 79 Ligeiramente favoráveis80 – 100 Favoráveis

Fonte: MIPEX 2011 – www.mipex.eu

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Pontuaçã

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ação

7994 91

63 70 6982 84

02040

60

80

100

Fg. 2 - MIPEX III: Resultados Portugal

Fonte: MIPEX 2011 – www.mipex.eu

Fg. 3 - MIPEX III: Resultados Globais

83 79 72 69 68 67 66 63 62 60 59 57 57 53 51 49 49 48 46 46 45 45 43 42 42 41 40 37 36 35 31 52

0

10

20

30

40

50

60

70

80

90

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Bulg

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Litu

ânia

Mal

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Chip

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tóni

aM

édia

EU

Fonte: MIPEX 2011 – www.mipex.eu

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El juego lingüístico: una vía para el desarrollo de la consciencia metalingüística de los niños nativos

y no nativos

Andreia FerreiraUniversidade de Aveiro (Portugal)

[email protected]

Maria Helena AnçãCIDTFF1 /Universidade de Aveiro (Portugal)

[email protected]

Portugal tem vindo a sofrer alterações sociais, ao longo destas últimas décadas, sendo, atualmente, uma sociedade marcada por uma crescente diversidade linguística e cultural. Tal alteração do tecido social re-percute – se nas escolas portuguesas, as quais são espaços cada vez mais heterogéneos linguística e cultu -ralmente. Neste sentido, as escolas necessitam de desenvolver estratégias para apoiar as crianças com português língua não materna na aprendizagem da língua portuguesa (LP). Com este texto, pretendemos dar a conhecer um estudo realizado numa escola do 1.º ciclo do ensino bási-co (1.º CEB), cujo objetivo principal foi compreender de que forma o jogo linguístico, em particular o jogo de ocultamento/ausência, é um recurso didático com reais potencialidades na aprendizagem da LP e no desenvolvimento da consciência metalinguística (CM) de crianças nativas e não nativas.

THE LINGUISTIC GAME: A MEANS FOR THE DEVELOPMENT OF METALINGUISTIC AWARENESS IN NATIVE AND NON-NATIVE CHILDREN

Portugal has been undergoing social changes over time and is, currently, a society marked by a growing linguistic and cultural diversity. Such a change in the social tissue has an impact in Portuguese schools, which are spaces increasingly more heterogeneous linguistically and culturally. In this sense, schools need to develop strategies to support non-native children in learning Portuguese as a second language. Thus, with this text, we intend to disclose a study in a school of the 1st Cycle of Basic Education, whose main objective was to understand how the linguistic game, especially the game of concealment/ absence, is a teaching resource with real potentialities in learning the Portuguese language and in the development of metalinguistic awareness of native and non-native children.

1 Introdução

Portugal, até há relativamente pouco tempo, era conhecido por ser essencialmente um país de emigração, contudo, nas últimas décadas, a situação alterou-se, pas-sando a ser igualmente um destino de eleição de vários imigrantes (Rocha-Trinda-de, 2003). Deste modo, a sociedade portuguesa, atualmente, prima por uma crescente diversidade linguística e cultural. Efetivamente, a sociedade mudou e, de

1 Centro de Investigação Didática e Tecnologia na Formação de Formadores.

Ferreira, A. y Ança, Mª.H.(2013) “El juego lingüístico: una vía para el de-sarrollo de la consciencia metalingüística de los niños nativos y no nati-vos” en Segundas Lenguas e Inmigración en red, 7 pp. 28-59

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“El juego lingüístico: una vía para el desarrollo de la consciencia metalingüística de los niños nativos y no nativos”

igual modo, o cenário nas escolas portuguesas também mudou, visto que estas acolhem cada vez mais crianças oriundas de outros países, que possuem, na sua maioria, o português como língua não materna2. Esta realidade coloca algumas preocupações e questões aos profissionais. Um dos grandes desafios com que es-tes se deparam as nossas escolas, e para o qual têm de encontrar respostas, resi-de no facto de estas crianças possuírem poucos ou nenhuns conhecimentos em LP, pelo que, tal situação pode funcionar como um entrave à integração das mesmas. Como sublinham Pardal, Ferreira e Afonso (2007: 63): “A importância do conheci-mento da língua do país de acolhimento como fator de integração dos imigrantes é, de há muito, conhecida pelas comunidades científicas e admitida, mais recente-mente, no plano das políticas linguísticas de diversos países.” Face ao exposto, tor-na-se imperioso que as escolas e, particularmente, os professores meçam esforços para ajudar estas crianças na sua inclusão escolar, evitando que os índices de abandono escolar e exclusão social se mantenham elevados.

Partindo desta problemática, apresentamos, então, o jogo linguístico, em particular o jogo de ocultamento/ausência, como um recurso didático para auxiliar os apren-dentes de uma turma do 1.º CEB, não nativos, mas também os nativos, no proces-so ensino/aprendizagem da LP e, consequentemente, no desenvolvimento da CM.

As razões/motivações que nos levaram a escolher este tema cinge-se ao facto de estarmos conscientes de que as escolas portuguesas são cada vez mais multicultu-rais, sendo essencial encontrar estratégias para apoiar as crianças não nativas na aprendizagem da língua, fator essencial para a sua integração. De acordo com Grosso, Tavares e Tavares (2008: 5) “aprender a língua do país é poder adquirir os meios de comunicar, interagir, compreender, defender-se, confrontar-se com outra cultura e outros códigos, é poder escolher e abrir-se aos outros.” A escolha do jogo linguístico como um veículo para facilitar a aprendizagem da língua relaciona-se com o facto de acreditarmos, vivamente, que o jogo tem um valor educativo in-contornável. Através dos jogos, os índices de concentração, de motivação e de em-penhamento das crianças aumentam, tornando o jogo um processo optimizador do desenvolvimento de aprendizagens significativas nos alunos. Citando Ferran et al. (1979: 138): “A instituição escolar descuraria um importante triunfo se não tomas-se em conta, o mais amplamente possível, as potencialidades pedagógicas do jogo.”.

Em termos mais específicos, com base neste estudo, pretendemos contribuir para o esclarecimento de duas questões de investigação:

1. o jogo linguístico, em particular o jogo de oculta-mento/ausência, é um possível recurso didático efi-caz no processo ensino/aprendizagem da LP de

2 Para mais detalhes sobre a diversidade linguística na escola portuguesa, ver Mateus, Pereira, Fischer (2008) e ainda Solla, neste mesmo número, para os dois primeiros ciclos do ensino básico, e Silva e Gonçalves (2011) para o 3º ciclo do ensino básico e ensino secundário.

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Andreia Ferreira y Mª Helena Ançã

crianças nativas e não nativas?

2. o jogo linguístico, em particular o jogo de oculta-mento/ausência, é um instrumento no desenvolvimento da CM em crianças nativas e não nativas?

Por último, importa mencionar que o presente artigo se encontra organizado em duas secções principais: 1) enquadramento teórico do estudo, onde estão expostos os conceitos-chave que sustentam a investigação; 2) componente empírica da in-vestigação, onde damos a conhecer a metodologia, o corpus e os resultados da in-vestigação.

2 Enquadramento teórico

2.1 A imigração em Portugal

O presente tópico tem como objetivo ilustrar, de forma breve, os marcos mais rele-vantes da imigração em Portugal, em termos cronológicos, destacando as questões sociais e políticas que estão na base deste fenómeno.

De acordo com Ançã (2008a, 2010), o fenómeno da imigração não é algo recente, e sem remontar à sua “pré-história”, é possível distinguir três “gerações” de imi-grantes em Portugal: a primeira, antes do 25 de abril de 1974, a segunda, após 1975, na sequência da descolonização e, por fim, uma terceira, por volta do ano 2000.

Relativamente à “primeira geração”, durante os anos 60, o número de imigrantes residentes em Portugal era de 29.428 indivíduos, sendo maioritariamente europeus (67%), logo seguidos dos brasileiros (22%). Entre os de nacionalidade europeia destacavam-se os espanhóis (40%), que eram na sua maioria refugiados da Guer-ra Civil de Espanha (1936-1939). Atrás destes surgiam os ingleses (7%), os france-ses (6%) e os alemães (5%), ligados a setores da economia portuguesa: o comércio do vinho do Porto e a exploração mineira (Pires, 2003).

A “segunda geração” é marcada sobretudo por fluxos imigratórios com origem nos cinco países africanos que se tornam independentes em 1975: Angola, Cabo Ver-de, Guiné-Bissau, Moçambique e São Tomé e Príncipe. Desta forma, Portugal aco-lheu mais de meio milhão de indivíduos, de origem portuguesa e africana, que viviam nas antigas colónias. A vinda destes encontra-se estreitamente relacionada com a instabilidade política, económica e social que se fazia sentir nos novos paí-ses independentes (Machado, 1997; Rocha-Trindade (1995). Tal facto provocou al-terações significativas na percentagem e composição da população residente, pelo que, em 1981, o número de estrangeiros registados era de cerca de 109000.

Esta “geração” é ainda marcada pela entrada de Portugal na União Europeia (na altura CEE), em 1986. Visto que tal adesão “abriu portas” a outros povos e cultu-ras, o aumento do número de estrangeiros foi reforçado, não apenas vindos dos

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países lusófonos, mas também de países europeus e do continente americano. Tal processo foi-se intensificando, no caso dos imigrantes europeus, depois de ter sido aprovado e estabelecido o Espaço Schengen, em 1998, que facilitou a fixação de residência em Portugal.

A terceira “geração” é marcada por novos fluxos migratórios provenientes da Euro-pa do Leste. A motivação subjacente a esta vaga migratória é particularmente de ordem económica, tendo os cidadãos provenientes de Leste fixado residência em território português, com relativa facilidade, obtendo também, à época, a sua lega-lização e obtenção de trabalho, sem grandes obstáculos, o que não sucedia, em outros países europeus. O novo regime legal das autorizações de permanência, de 2001, veio facilitar a entrada e alterar a proveniência da imigração. Ainda, nesta “geração”, importa referir o surto de imigrantes vindos da América Latina, essenci-almente, brasileiros. Outros fluxos migratórios, oriundos da Ásia, também marca-ram presença, com algum destaque para a comunidade chinesa.

Atualmente, tendo em conta os dados divulgados pelo SEF/Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (2012), a população estrangeira, em Portugal, diminuiu 1,90 % em 2011, em relação ao ano anterior, totalizando 436822 cidadãos. As comunidades mais representativas são, por ordem decrescente, o Brasil, Ucrânia, Cabo Verde, Roménia e Angola. A Guiné-Bissau, Reino Unido, China, Moldávia e São Tomé e Príncipe constituem igualmente comunidades de dimensão assinalável a residir em Portugal.3

2.2 Um olhar sobre a Consciência Metalinguística

Um dos conceitos centrais da nossa investigação é o de CM. De salientar que, devi-do a diversas interpretações segundo diferentes escolas e países, este conceito não é unívoco (Ançã & Alegre, 2003). Neste sentido, para clarificar alguma ambi-guidade terminológica e conceptual, optámos pela perspetiva de Titone (1988). Este autor apresenta a CM como a capacidade de o sujeito refletir sobre as carac-terísticas gerais e as estruturas da língua, englobando um conhecimento explícito das operações linguísticas e implicando o controlo deliberado e a escolha de atos de linguagem, em que o indivíduo é capaz de explicitar as regras de funcionamen-to da língua e de refletir sobre elas.

Face a esta perspetiva, é possível constatar que esta remete para uma dimensão essencialmente cognitiva. Todavia, este conceito (tradução de language aware-ness), na senda de James & Garrett (1991), é mais amplo, abarcando vários domí-nios. Aliás, é nesta abordagem que o presente estudo se ancora.

James & Garrett (1991) consideram que as definições apresentadas até aos anos noventa, do século XX, eram vagas, pelo que definiram cinco domínios para carac-terizar a CM, nomeadamente: o domínio afetivo, o social, o cognitivo, o de poder e 3 Para mais detalhes, consultar Perpétua Santos Silva, neste mesmo número.

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o de realização. Embora o nosso estudo assente nos três primeiros domínios, pas-samos a especificar todos os domínios, propostos por estes autores.

Em relação ao domínio afetivo este diz respeito a “forming attitudes, awakening and developing attention, sensitivity, curiosity, interest and aesthetic response.” (James & Garrett, 1991: 13). Este domínio coloca a tónica no facto de que interio-rizar a gramática de um língua não é apenas uma ação de inteligência e cognição, mas também um ato afetivo. As motivações, a curiosidade e o interesse são critéri-os afetivos, que se assumem como elementos que determinam o sucesso ou insu-cesso na aprendizagem de uma língua. Neste domínio o conhecimento e os sentimentos relacionam-se entre si objetivando o desenvolvimento de uma atitude positiva face a uma língua e cultura novas.

O domínio social consiste no desenvolvimento de comportamentos que promovam o convívio harmonioso da diversidade de culturas que confluem na sociedade, re-sultado dos movimentos migratórios que se fizeram e fazem sentir. A promoção deste domínio visa a diminuição da exclusão social e, em contrapartida, o aumento de atitudes mais tolerantes e de relações interculturais, em sociedades onde os contactos interétnicos são cada vez mais frequentes. Desta forma, a escola tem um papel de destaque na promoção deste domínio, visto que “A acção da escola na diminuição das tensões entre grupos pode passar pela consciencialização dos alunos das origens e características da sua própria língua em relação com outras línguas também com as suas histórias e especificidades.” (Barbeiro, 1999: 58).

O domínio cognitivo implica “developing awareness of pattern, contrast, system, units, categories, rules of language in use and the ability to reflect upon them” (Ja-mes & Garrett, 1991: 15). Assim, este domínio visa uma tomada de consciência, por parte dos alunos, das formas da língua, sem, no entanto, porem de parte as suas funções. Os aprendentes que habitualmente falam sobre a língua tendem a ser mais ‘desenvolvidos’ cognitivamente. Neste último domínio, pode haver ainda uma transformação do conhecimento implícito em conhecimento explícito, ou, ain-da, pode surgir um novo tipo de análise contrastiva, em que os alunos se aperce-bem das diferenças, mas também das semelhanças entre as estruturas da língua materna e da língua aprendida (Ançã, 2008b).

O domínio do poder consiste no facto de a língua poder ser utilizada como instru-mento de manipulação. Neste âmbito, torna-se fundamental fazer referência ao termo conscientização, de Paulo Freire (1972). Assim, conscientização “involves alerting people to the hidden meanings, tacit assumptions and rhetorical traps laid by those who traditionally have most access to the media for verbal communicati-on.” (James & Garrett, 1991: 14). Deste modo, pessoas e instituições mais infor-madas, com um maior acesso aos mass media, podem utilizar essa informação para exercer poder sobre os que não têm acesso à mesma ou não a conseguem interpretar adequadamente. Esta manipulação pode ser utilizada pelos governos, pela Igreja, pelo comércio ou por sujeitos com menos escrúpulos. Face ao exposto,

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“El juego lingüístico: una vía para el desarrollo de la consciencia metalingüística de los niños nativos y no nativos”

o desenvolvimento da language awareness nas escolas, poderá alertar os alunos para o carácter manipulador da língua, dando-lhes “armas” para lhe fazerem fren-te.

Por fim, o domínio de realização prende-se com a questão de saber se o conheci-mento de uma língua melhora a utilização e o domínio da língua, ou seja, se o co-nhecimento analítico se reflete no comportamento linguístico (James & Garrett, 1991). Tendo por base as características dos bilingues, que são particularmente re-cetivos às correções, utilizando-as para construir o seu conhecimento linguístico, os autores anteriores generalizam e afirmam que o aprendente de uma língua es-trangeira apenas progride nas suas capacidades quando se consciencializa que as suas produções não são equivalentes às produções dos seus modelos, isto é, aprende-se quando se toma consciência daquilo que ainda não se sabe. A consci -encialização implica que o aluno compare aquilo que faz com aquilo que os outros fazem e, assim, explore as diferenças, para, consequentemente, progredir no seu desempenho.

Face ao exposto, podemos constatar que desenvolvimento dos diferentes domínios da CM, por um lado, favorece a diversidade linguística e cultural presente em sala de aula e na escola, visto que fomenta o convívio harmonioso e melhores relações entre grupos étnicos. Por outro lado, permite transformar o conhecimento implícito e intuitivo dos aprendentes sobre a língua (materna ou não materna) em conheci-mento explícito, bem como fortalecer as suas capacidades linguísticas e aumentar a eficácia na comunicação em línguas4.

Neste sentido, é de extrema importância o papel dos professores no desenvolvi-mento da CM dos aprendentes, pelo que apresentamos, então, o jogo linguístico como um possível recurso didático potenciador desse desenvolvimento.

2.3 Associação entre o jogo linguístico e a consciência metalinguística: o jogo de ocultamento/ausência

Durante muito tempo, o jogo para a escola era visto como um mero divertimento, sendo o seu propósito pedagógico algo questionável. Como sublinha Barbeiro (1998: 21): “A obrigação escolar, dado que se encontra legitimada, ocuparia todo o espaço de acção tendo como finalidade a instrução e afastaria o jogo, tomado como supérfluo, como desvio e perda de tempo, face aos objectivos a alcançar.”

Contudo, outras formas se encarar o jogo foram surgindo, com teóricos, como, por exemplo, Piaget (1967) e Château (1975). Estes autores estabelecem uma relação bastante estreita entre jogo e o desenvolvimento das aprendizagens, considerando

4 Para mais informações sobre o conceito Language Awareness e o seu desenvolvimento, consultar Svalberg (2007, 2009, 2012).

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o jogo uma atividade com um enorme potencial na promoção de aprendizagens significativas.

Nesta linha, a educação ministrada através do jogo auxilia a reflexão, a socializa-ção, a construção do conhecimento, sendo importante salientar que, paralelamen-te, é fonte de prazer e de motivação. Os jogos podem ser utilizados em qualquer disciplina, desde que sejam adaptados aos conteúdos e ao público-alvo. Sob este prisma, o jogo emerge como um recurso didático a utilizar no processo ensino/aprendizagem da LP, dado este propiciar oportunidades para o desenvolvi-mento de competências e habilidades linguísticas.

Neste âmbito, de acordo com Barbeiro (1998), a utilização do jogo em contexto de sala de aula permite ativar duas grandes dimensões fundamentais no processo en-sino/aprendizagem da LP: a competência linguística, que consiste na “capacidade de utilização da língua, enquanto falante/ouvinte ou escritor/leitor” (Barbeiro, 1998: 38) e a competência metalinguística, que diz respeito à “construção de um saber reflexivo sobre a língua, sobre o seu funcionamento.” (Barbeiro, 1998: 53).

No jogo linguístico podem ser exploradas duas vertentes: o jogo de ocultamento/ausência e o jogo de revelação/presença. Embora tenhamos optado pela primeira vertente, achamos pertinente proceder à diferenciação entre ambas as vertentes, para uma melhor perceção dos aspetos que lhes estão subjacentes.

No jogo de ocultamento/ausência os jogadores são incentivados a encontrar a so-lução para determinado desafio/enigma/problema, cuja solução já foi previamente estabelecida pelo criador do jogo. Neste sentido, para encontrar a solução os joga-dores têm de ativar e percorrer o seu conhecimento sobre a língua, “com vista ao reconhecimento de elementos linguísticos a partir de propriedades ou relações so-bre as quais se encontra fundado o jogo.” (Barbeiro, 1998: 61). Como exemplo deste tipo de jogo temos as Palavras Cruzadas, as Adivinhas (jogo utilizado no nosso estudo), o Scrabble, a Sopa de Letras e os Anagramas.

Como foi referido anteriormente, o jogo linguístico pode manifestar-se noutra ver-tente, nomeadamente no jogo de revelação/presença, que tem como propósito “não o reconhecimento de algo oculto por detrás de determinadas relações expres-sas, mas a percepção das unidades colocadas em relevo, a percepção desse rele-vo.” (Barbeiro, 1998: 84-85). Neste tipo de jogo, a informação encontra-se toda disponibilizada, sendo o objetivo determinar as relações e regularidades que a compõem, nas quais podem estar presentes características de vária ordem: fonoló-gicas, morfológicas, sintáticas, semânticas e de estrutura textual. Como exemplos deste tipo de jogos temos as Lengalengas (ver Santos, 2012), os Trava-línguas e as Aliterações.

Com base em tudo o que foi mencionado, o jogo linguístico constitui-se como um ótimo meio para os sujeitos experienciarem a linguagem, mobilizarem o seu co-nhecimento sobre a língua, constituindo uma abertura para o desenvolvimento da

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sua capacidade de análise e de reflexão sobre a língua. Citando Barbeiro (2001: 7): “lengalengas, trava-línguas, adivinhas – trazem-nos salientes as propriedades da linguagem. E a linguagem merece ser descoberta: a acompanhar a descoberta do seu poder, devemos fazer a descoberta da própria linguagem.”

Para terminar, gostaríamos de salientar que o jogo se assume não só como uma estratégia de ensino para aprofundar o domínio da língua materna, mas também como uma via bastante rentável para o ensino de uma língua não materna, uma vez que torna a aprendizagem mais significativa e prazerosa para o aluno. Através do jogo, as aulas adotam um carácter mais diversificado e estimulante, quebrando a monotonia e as aulas expositivas, nas quais o aluno tem um papel passivo, sem níveis elevados de implicação e motivação na aprendizagem.

3 Estudo empírico

3.1 A metodologia de investigação

O presente estudo enquadra-se numa metodologia de investigação de índole qualitativa com uma abordagem do tipo investigação-ação.

Apresenta, então, características da investigação qualitativa, segundo Bogdan e Bi-klen (1994), porque, nomeadamente: i) é naturalista: ocorre num contexto natural de trabalho, onde interagimos diretamente com os intervenientes do estudo; ii) é descritivo: a recolha de dados é de natureza predominantemente descritiva; iii) é indutivo: os investigadores analisam a informação, desenvolvem conceitos e che-gam à compreensão dos fenómenos a partir de padrões provenientes da recolha de dados; iv) é holístico: porque os sujeitos da investigação são vistos com um todo, sendo estudado o seu passado e o seu presente; v) o investigador interessa-se mais pelos processos do que pelos resultados ou produtos.

Por outro lado, tendo em consideração o seu objeto, consideramos que este possui contornos do tipo investigação-ação (sendo esta uma das modalidades da investi-gação qualitativa), uma vez que, de acordo com Bogdan e Biklen (1994: 293): “A investigação-acção é um tipo de investigação aplicada no qual o investigador se envolve ativamente na causa da investigação”, observando de perto e por algum tempo o que lhe interessa, com o intuito de modificá-la e sobre ela intervir.

Todo este envolvimento do investigador objetiva resolver problemas de prática, isto é, contribuir para a solução de problemas concretos e, dessa forma, efetuar mudanças sociais, através da intervenção e da inovação (Gagné et al., 1989).

Por último, gostaríamos de frisar que com o nosso estudo não pretendemos fazer generalizações, mas produzir algum conhecimento capaz de abrir novos caminhos de investigação relativa à problemática estudada5.

5 “A preocupação central não é a de se os resultados são susceptíveis a generalização, mas sim a de

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Definida a metodologia de investigação privilegiada, imporá referir, por último, os instrumentos de recolha de dados utilizados: i) observação direta; ii) vídeograva-ção de cada uma das sessões; iii) utilização de fichas de registo.

As fichas de registo tinham o objetivo de, no final de cada sessão, fornecer, por escrito, a opinião de todos os alunos relativa às aprendizagens efetuadas e às ati-vidades mais significativas por sessão. Em suma, estas fichas funcionaram como um espaço de reflexão, onde os alunos registavam livremente as suas ideias sobre as sessões.

3.2 População do estudo

A presente investigação foi implementada numa escola do 1.º CEB do concelho de Aveiro6, cujos participantes foram os alunos de uma turma do 1.º ano de escolari-dade.

A turma era constituída por dezasseis crianças: oito do género feminino e oito do género masculino. A maioria possuía seis anos de idade, dois ainda tinham cinco anos e um que já tinha sete anos. Contámos ainda com a colaboração de Santos (2012), nosso colega de estágio pedagógico, na escola referida, e com o apoio da professora responsável pela turma em questão (supervisora).

Um aspeto importante a sublinhar é a origem destes alunos: 13 portugueses, um aluno guineense, e ainda dois alunos de origem estrangeira: santomense7 e brasi-leira, mas já nascidos em território português.

3.3 O projeto de intervenção

Tendo em conta as características do público-alvo, construímos o projeto Uma via-gem contada em quatro cantos do Mundo, desenvolvido em 6 sessões8, que foi sustentado por uma história, criada por nós: Uma viagem contada em quatro can-tos do Mundo. Esta história acompanhou todo o desenrolar do projeto.

Os episódios foram contados recorrendo à técnica de acetato, com os vários cená-rios de cada país por onde as personagens passaram na sua viagem. As persona-gens da história eram incluídas através de sobreposição de acetatos, de forma a criar um ambiente e uma dinâmica especiais, a fim de cativar a atenção dos alu-nos. As personagens foram concebidas, tendo em conta a origem das crianças; as-sim, os seus nomes vão ao encontro dos apelidos de quatro meninos da turma: de um português, de um guineense, de um santomense e de um brasileiro. 9

que outros contextos e sujeitos a eles podem ser generalizados.” (Bogdan e Biklen, 1994: 66).6 No litoral de Portugal (Centro-Norte).7 De São Tomé e Príncipe, na costa ocidental de África.8 Em parceria com Santos (2012) que se ocupou das lengagengas.9 No final de cada episódio/sessão, cada investigador implementou a sua variante dos jogos linguísti-cos (Ferreira, 2012, as adivinhas; Santos, 2012, as lengalengas, como já referido).

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dos alunos. As personagens foram concebidas, tendo em conta a origem das crian-ças; assim, os seus nomes vão ao encontro dos apelidos de quatro meninos da tur-ma: de um português, de um guineense, de um santomense e de um brasileiro. 1

Na primeira sessão, ponto de partida de todo o projeto, foi contado o primeiroepisódio que dava a conhecer o projeto, sob forma de viagem. Assim, a históriaera protagonizada por quatro personagens, o “bando dos quatro”. (Fg.1): o Silva(de origem brasileira); a Tebús (de origem santomense); o Génio (de nacionalida-de portuguesa); e a Jeroboão (de nacionalidade guineense). Estes quatro meninosgostavam muito de brincar juntos e, um dia, decidiram brincar com a linguagem,pois o avô do Génio tinha-lhe ensinado várias adivinhas e lengalengas. Como tinhagostado tanto, incentivou os colegas a descobrirem mais adivinhas e lengalengas.Assim, iniciaram uma viagem pelos países de origem de cada um, para pesquisa-rem adivinhas e conhecerem jogos linguísticos em outros países.

Após narrado o primeiro episódio, foi iniciado um diálogo com os alunos, para par-tilha dos seus conhecimentos e experiências, relacionados com adivinhas e lenga-lengas, em peral. Posteriormente, estes foram convidados a trazer para a aula adi-vinhas e lengalengas originárias dos países dos seus pais/familiares. Esta recolhaveio a constituir o material utilizado na sessão de finalização do projeto, sessão 6,da qual falaremos posteriormente.

Em seguida, apresentou-se um mapa-mundo (Fg.2), – que acompanhou toda aviagem –, e cuja finalidade foi assinalar o percurso das personagens e colocá-lasno país onde se encontravam nos vários momentos da história. Deste modo, sem-pre que se alterava o destino, as personagens deslocavam-se no mapa, pelo queas crianças iam acompanhando as mudanças de países e continentes.

1 No final de cada episódio/sessão, cada investigador implementou a sua variante dos jogos linguísti-cos (Ferreira, 2012, as adivinhas; Santos, 2012, as lengalengas, como já referido).

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Finalizámos a sessão com a música do projeto. Aliás, esta música veio a acompa-nhar, de igual modo, todo o projeto, tornando-se o hino da viagem. Sempre que anave, o meio de transporte utilizado, levantava voo, iniciávamos com as criançasesta música que era cantada durante a viagem.

A segunda sessão teve como objetivo possibilitar às crianças o contacto com adi-vinhas e lengalengas tradicionais portuguesas.

Inicialmente foi apresentada uma caixa surpresa aos alunos, com o material que asquatro personagens recolhiam na sua viagem. Esta caixa intitulada Caixa das adivi-nhas e lengalengas, continha as atividades a realizar nesta sessão (o mesmo suce-deu nas restantes sessões).

Na primeira atividade, Dominó das adivinhas tradicionais portuguesas (Fg.3), o do-minó continha adivinhas e imagens, e era composto por 17 peças: uma peça já afi-xada para dar início ao jogo e uma peça por criança. Assim, para o construir, ade-quadamente, as crianças, com o apoio dos docentes, iam unindo as adivinhas àsua resposta. Quando respondiam corretamente,– através das relações que iamestabelecendo entre o enunciado oral e a imagem –, era pedido que justificassemas respostas. A criança que tivesse a peça correspondente na sua posse, vinha co-locá-la no cartaz onde se estava a formar o dominó. É de referir que a leitura dasadivinhas era realizada por um dos professores, uma vez que os alunos ainda nãosabiam ler. Após o dominó estar completo, foi distribuída pelas crianças uma fichade trabalho relacionada com adivinhas tradicionais portuguesas, com dois exercíci-os. O primeiro era composto por três adivinhas e, para cada uma delas, havia trêsopções de resposta, pelo que, após as crianças ouvirem a adivinha, pintavam oelemento que consideravam ser a resposta correta. O segundo exercício era cons-tituído por duas adivinhas. Após escutarem cada uma delas, deviam responder, de-senhando a sua resposta no local indicado.

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No final destas atividades, cada aluno recebeu uma ficha de registo para se pro-nunciar sobre o seu grau de satisfação e sobre as aprendizagens realizadas, “Comome senti ao aprender estas adivinhas oriundas de Portugal…” (o mesmo veio aacontecer nas restantes sessões). Esta tarefa foi efetuada com o apoio dos adul-tos, que, individualmente, falaram com cada criança, de forma a registar por escri-to os seus comentários.

A sessão terminou com a narração do segundo episódio da história, no qual aspersonagens decidiram continuar a sua viagem, indo para o Brasil, terra natal dospais da personagem Silva

A terceira sessão foi dedicada à exploração de adivinhas tradicionais brasileiras,através da atividade designada Balões das adivinhações tradicionais brasileiras(Fg.4). Para a sua realização foi afixado, no quadro, um cartaz construído em car-tolina com seis balões, cada um deles com uma adivinha e com nove imagens,sendo seis delas a resposta a cada uma das advinhas. Deste modo, o adulto proce-dia à leitura de cada uma das adivinhas, e as crianças tinham de encontrar a res-posta adequada. À medida que iam encontrando as respostas, era solicitado quefosse afixada a imagem no interior do balão respetivo. Posteriormente, foi distri -buída uma ficha de trabalho relacionada com adivinhas tradicionais brasileiras, estapossuía dois exercícios. O primeiro era composto por quatro adivinhas e quatroimagens, pelo que após ouvirem a adivinha, as crianças tinham de a ligar à ima-gem que consideravam ser a resposta adequada. Por sua vez, o segundo exercícioera formado por três adivinhas, sendo que cada uma delas possuía quatros opções

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de resposta. Desta forma, os meninos, após ouvirem cada adivinha deviam rodearo elemento que consideravam ser a resposta correta.

Para finalizar a sessão, foi contado o terceiro episódio da história: as personagensdecidiram continuar a sua viagem, indo para São Tomé e Príncipe, terra natal dospais de Tébus, onde se pretendiam descobrir jogos linguísticos deste país.

A sessão quatro teria como objetivo possibilitar às crianças o contacto com adivi-nhas tradicionais santomenses, no entanto, este objetivo não se concretizou, tendonós, imediatamente, contornado a situação2.

Num primeiro momento, foi estabelecido um breve diálogo sobre o episódio da his-tória lido na sessão anterior, seguido do habitual pedido de previsão do que seriatratado nessa sessão. Os alunos começaram por referir que iriam fazer atividadesrelacionadas com adivinhas e lengalengas oriundas de São Tomé e Príncipe. Po-rém, explicámos que, nesse dia, a sessão começaria de forma diferente. Nestesentido, procedemos à narração da primeira parte do episódio quatro da história.Este deu a conhecer às crianças que as personagens, infelizmente, não tinhamsido bem sucedidas na sua passagem por São Tomé e Príncipe, visto que não en-contraram jogos linguísticos neste país. Assim, decidiram não desistir e continuar asua viagem, indo, então, para a Guiné-Bissau, país natal de Jeroboão.

2 Por questões técnicas e logísticas, que não importa aqui desenvolver, não foi possível trabalhar jogoslinguísticos deste país.

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A primeira atividade efetuada denominou-se Mar das Adivinhas da Guiné-Bissau(Fg.5). Para a sua realização as crianças tinham ao seu dispor um aquário, comsete peixes, cada um deles com uma adivinha. Dentro do aquário, no cenário dofundo do mar, encontravam-se espalhadas várias imagens que eram a resposta àsdemais adivinhas. Deste modo, foi explicado às crianças que os peixes do aquárioestavam muito tristes e que precisavam da ajuda delas para poderem voltar para ooceano, local onde eram muito felizes. Para libertar os peixes, as crianças deviampescá-los com uma cana. À medida que as crianças iam pescando cada peixe, pro-cedíamos à leitura de cada uma das adivinhas, para obtermos resposta. Com adescoberta da resposta correta, o peixe era devolvido ao oceano. De seguida, osalunos realizaram uma ficha de trabalho relacionada com adivinhas tradicionaisguineenses, com dois exercícios. O primeiro apresentava quatro adivinhas e quatroimagens, pelo que, após ouvirem a adivinha, as crianças tinham de recortar a ima-gem que consideravam ser a resposta correta e colá-la no local respetivo. Por seuturno, o segundo exercício era composto por duas adivinhas, para cada uma delas,as crianças tinham três opções de resposta, tendo que rodear, somente, a respostaque pensavam ser a adequada.

Para finalizar a sessão, foi contada a segunda parte do quarto episódio da história.Neste, as personagens, após terem feito uma recolha de adivinhas e lengalengastradicionais guineenses, e dado que este era o último destino da viagem, regressa-ram ao país de partida: Portugal.

A quinta sessão teve como objetivo permitir às crianças a invenção de adivinhasatravés da atividade designada Agora é a nossa vez de várias adivinhas criar!. Paraa sua realização, as crianças tinham ao seu dispor um caixa com vários cartõesque continham imagens de objetos, de animais, partes do corpo e elementos da

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natureza. Deste modo, foi explicado às crianças que cada uma delas tinha que in-ventar uma adivinha, relacionada com o elemento que estivesse presente no seucartão. Por fim, cada uma delas veio apresentar a sua adivinha à turma. As adivi -nhas foram sendo registadas pelos adultos, que procederam, posteriormente, àelaboração de um cartaz com todas as adivinhas.

Para finalizar a sessão, foi contado o quinto episódio da história, que marcou o en-cerramento desta viagem do “bando dos quatro”.

A sexta, e última sessão, teve como objetivo compilar tudo o que foi realizado nassessões anteriores e, paralelamente, introduzir as adivinhas e lengalengas que ascrianças recolheram em contexto familiar – desafio proposto na primeira sessão.Deste modo, nesta sessão foi realizado um jogo que se intitulou Quem quer serMundionário?, baseado no concurso televisivo Quem quer ser Milionário? Paraeste efeito, as crianças foram divididas em quatro equipas de quatro elementos.Explicámos as regras do jogo, referindo que cada equipa teria de responder a dezquestões, pelo que, a que acertasse mais vezes, venceria o concurso. Chamámos aatenção para o facto de a cooperação entre os elementos de cada equipa ser mui-to importante para o êxito no maior número de questões. Convém sublinhar quecada equipa foi capitaneada por cada uma das personagens da história (as crian-ças em questão identificaram-se perfeitamente com as referidas personagens), asquais serviram como porta-voz, fazendo a ponte entre a opção combinada pelogrupo e a resposta. As equipas estiveram devidamente identificadas, tendo na suaposse um crachá de uma personagem da história, de acordo com a equipa ondeestavam inseridas. Finalizado o jogo, foi distribuído pelas equipas um pequeno pré-mio que marcou esta “aventura” com adivinhas (e lengalengas).

3.4 Análise e interpretação dos dados

Após a descrição das sessões do projeto, propomo-nos, nesta secção, apresentar aanálise, o tratamento dos dados e a sua interpretação.

Tendo em conta a natureza do estudo, privilegiámos, como técnica de análise, aanálise de conteúdo (Bardin, 2009) que se baseia numa descrição dos dados reco-lhidos e na sua respetiva interpretação (assente nas inferências do investigador)que permite compreender o objeto de estudo e, consequentemente, dar respostaàs questões investigativas. Neste sentido, para uma organização de todos os dadosrecolhidos, utilizámos, como instrumento de tratamento, as categorias de análise,que permitem apresentá-los, de forma organizada e objetiva.

A formulação das categorias do presente estudo resultou do cruzamento de quatroaspetos fundamentais em todo o trabalho: o quadro teórico inicialmente construí-do, os objetivos e as questões investigativas inerentes ao estudo e os dados. Noque concerne ao enquadramento teórico, focalizámos a CM, materializada na tipo-logia de atividades de linguagem de Dabène (1992), assim como três dos domínios

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da CM (afetivo, social, cognitivo), de James e Garrett (1991). Nesta sequência, apresentamos o seguinte quadro:

Categorias Subcategorias

C1.1. Atividades epi-linguísticas C1. Jogos linguísticos e aprendizagem da LP C1.2. Atividades ludo-linguísticas

C2.1. Nível afetivo C2.2. Nível social C2. Jogos linguísticos e desenvolvimento da

CM C2.3. Nível cognitivo

C3.1. Utilidade C3. Jogos linguísticos e o sujeito C3.2. Adesão

3.4.1 Categoria 1 – Jogos linguísticos e aprendizagem da LP (Categorias)

Nesta primeira categoria, baseámo-nos na tipologia das atividades de linguagem apresentada por Dabène (1992), referente à aprendizagem de uma língua. Assim, considerando a natureza dos dados, adotámos duas das atividades expostas por esta autora: activités épi-langagières e ludo-langagières.3

Quadro 1 – Jogos linguísticos e aprendizagem da LP(Categorias)

Sessão II

Correção da ficha de trabalho das adivinhas tradicionais portuguesas

Exercícios da ficha de trabalho

Tipo de resposta

N.º de alunos

N.º total de alunos

Resposta correta, sem sinais de hesitação

16 Primeiro exercício

Adivinha 1 [São duas pernas, não sabem

andar. Quando as vestes, elas vão

passear. (calças)]

Resposta correta, com sinais de hesitação

0

16

3As restantes denominam-se: “activités trans-langagières”, “méta-langagières” e “auto-langagières”.

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Selecionou duas opções 0

Resposta incorreta 0

Resposta correta, sem sinais de hesitação

16

Resposta correta, com sinais de hesitação

0

Selecionou duas opções 0

Adivinha 2

[É um bichinho engraçado que nunca anda a correr e se

alguém lhe tocar, em casa se irá esconder. (caracol)]

Resposta incorreta 0

16

Resposta correta, sem sinais de hesitação

2

Resposta correta, com sinais de hesitação

12

Selecionou duas opções 2

Adivinha 3 [Tenho folhas sem ser árvore e falo sem ter voz; se me abres,

não me queixo…adivinha quem eu sou. (livro)]

Resposta incorreta 0

16

Resposta correta, sem sinais de hesitação

13

Resposta correta, com sinais de hesitação

3

Adivinha 1 [Pode ter muitas cores e está cheio de ar. Se o apertares,

PUM! Pode arrebentar. (balão)]

Resposta incorreta 0

16

Resposta correta, sem sinais de hesitação

16

Resposta correta, com sinais de hesitação

0

Seg

undo

exe

rcíc

io

Adivinha 2 [Parece uma bola amarela,

aquece muito no Verão. Se não tivermos cuidado apanhamos

um escaldão. (sol)] Resposta incorreta

0

16

� Atividades epi-linguísticas4

Nesta primeira subcategoria daremos conta do conjunto de atividades, que pretenderam fomentar o desenvolvimento de competência linguística dos alunos, sem, todavia, pretender, neste âmbito, promover atividades puramente de reflexão.

É do conhecimento geral que as adivinhas são, por natureza, um tipo de texto que faz parte da cultura oral, transmitida de geração em geração, através da oralidade. Deste modo, todas as atividades desenvolvidas no quadro do projeto potenciaram o uso da troca verbal entre a investigadora e o público-alvo, promovendo o desenvolvimento da capacidade comunicativa dos alunos, que foram capazes de utilizar a língua e tomar a palavra enquanto ouvintes e falantes.

4 Tradução nossa da expressão “Activités épi langagières”.

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Foi visível que existiram atividades, cujo sucesso na sua concretização, dependiam bastante da comunicação entre os vários intervenientes do projeto. Verificámos tal situação, nomeadamente, em: o Dominó das adivinhas tradicionais portuguesas, os Balões das adivinhações brasileiras, o Mar das adivinhas da Guiné-Bissau e o Quem quer ser Mundionário?.

Por outro lado, após os alunos serem confrontados com as demais adivinhas, foi visível que estes se prontificavam de imediato para dar uma resposta ou para justi-ficar as suas opções, recorrendo ao seu reportório linguístico, ou, ainda, indagando o significado de alguma palavra ou expressão desconhecidas.

A título exemplificativo, na sessão em que foram trabalhadas adivinhas brasileiras, apareceu o termo pelado, desconhecido por todas as crianças, exceto pelo aluno de origem brasileira. Ao ser solicitado a explicar o significado, mostrou-se, de iní -cio, um pouco envergonhado, mas acabou por explicar: “despido, sem roupa, nu”.

Poderemos, ainda, acrescentar outro fator importante ocorrido aquando das ativi-dades realizadas. Por exemplo, as crianças muitas vezes proferiam frases deste teor: “Professora, já podes ler o que está no balão verde.” ou “Professora, lê a próxima adivinha.”. Perante tais testemunhos, podemos afirmar que as atividades realizadas contribuíram, também, para que os alunos tomassem consciência da im-portância da língua como veículo de comunicação.

Atividades ludo-linguísticas13

A presente subcategoria tem em conta a utilização da linguagem como instrumen-to de jogo. Aliás, no decurso da implementação do estudo, a linguagem foi sempre encarada como instrumento de jogo, uma vez que, por natureza, as adivinhas são uma atividade lúdica, que brinca com a linguagem.

Em todas as sessões do projeto, à exceção da quinta, foi sempre a investigadora a trazer para a sala as adivinhas a trabalhar, sendo função dos alunos encontrar a resposta para as mesmas, através da sua interpretação. Porém, só na quinta ses-são as crianças usaram a linguagem e se apropriaram, efetivamente, dela, como instrumento de jogo, pois foram incentivadas a criar/inventar as suas próprias adi-vinhas.

Centrada a atenção nas adivinhas criadas, verificámos que os alunos, dentro das suas capacidades, conseguiram realizar esta tarefa com sucesso. No entanto, devi-do ao background cultural, necessariamente heterogéneo, dos participantes, foi vi-sível a existência de adivinhas mais ricas em informação do que outras, o que nos permitiu inferir que alguns alunos tiveram mais ‘facilidade’ em brincar com a lin-guagem, do que outros. São exemplos do primeiro caso, as seguintes adivinhas: “Qual é coisa, qual é ela… que é vermelha, tem pintas pretas e pode-se comer?” [Morango], “Qual é coisa, qual é ela… que anda no mar e é amarela. Não vai ao

13 Tradução nossa de “Activités ludo-langagières”.

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fundo e tem bico laranja?” [pato], “Qual é coisa, qual é ela… que brilha?” [sol], “Qual é coisa, qual é ela… que tem manchas e nariz cor-de-rosa?” [vaca].

Pudemos verificar que os aprendentes foram capazes de recorrer à sua bagagem vocabular e selecionar dados que se relacionavam com o elemento para o qual ti-nham de criar uma adivinha, estabelecendo, então, significações e relações entre os vocábulos.

Verificámos, ainda, que as crianças, neste jogo com a linguagem, utilizaram, so-bretudo, enumerações nas suas adivinhas, que evidenciam características do ele-mento em questão, como é possível ver nas adivinhas descritas precedentemente. Por seu lado, é notória a presença de adjetivos nalgumas adivinhas criadas: “Qual é coisa, qual é ela… que é quentinha e tem mangas?” [camisola]. Uma criança, por sua vez, utilizou uma comparação: “Qual é coisa, qual é ela… que é parecida com uma viola, mas não é uma viola?” [guitarra]. Outra recorreu a uma hipérbole: Qual é coisa, qual é ela… que corta tudo, mas eu não sei o que é?” [tesoura].

É de ressalvar que estes processos utilizados pelos alunos na criação das suas adi-vinhas, apesar de serem levados a cabo de forma inconsciente e intuitiva, colocam em destaque a perceção por parte dos alunos de como as adivinhas são construí-das. Deste modo, face ao desafio proposto, as crianças souberam, autonomamen-te, utilizar a linguagem que mais se adequava, construindo cadeias fónicas dotadas de significado e conformes à gramática da língua.

Neste sentido, considerando tudo o que foi mencionado nesta categoria, o trabalho com adivinhas, que prima por um punhado de ludicidade e entretenimento, levou a que as crianças, paralelamente, tivessem a oportunidade de desenvolver compe-tências e habilidades linguísticas, aspetos fundamentais para a aprendizagem da LP.

3.4.2 Categoria 2 – Jogos linguísticos e desenvolvimento da CM

Um dos objetivos da nossa investigação foi verificar se o jogo de ocultamento/au-sência, era um meio para o desenvolvimento da CM das crianças nativas e não na-tivas. Neste sentido, damos conta nesta categoria das afirmações das crianças sobre as aprendizagens efetuadas, durante as sessões do projeto. É de referir que os conhecimentos apresentados remetem para os domínios afetivo, social e cogni-tivo, da CM, delimitados por James e Garrett (1991), a partir dos quais emergiram as subcategorias.

Nível afetivo

Em relação a esta subcategoria, pretendemos evidenciar o conjunto de atitudes manifestadas pelos alunos, no decorrer do projeto, no que diz respeito à curiosida-de em descobrir o Outro e elementos da sua cultura, bem como a vontade de inte-ragir e cooperar com o Outro. Deste modo, procuraremos verificar manifestações

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que se prendem com o desejo de comunicar e interagir com o Outro, revelando disponibilidade, curiosidade, interesse, sensibilidade e abertura perante uma língua e culturas novas.

Durante a implementação do projeto, foram evidentes a curiosidade e o gosto de-monstrado pelos alunos em descobrir o Outro, neste caso associado às adivinhas provenientes de outros países. É de referir que a escolha pelos países abordados teve na sua génese o facto de existirem na turma crianças com laços familiares e afetivos a esses países, como já referido anteriormente.

Desde a narração do primeiro episódio até ao fim da implementação do projeto foi notório que as crianças começaram a manifestar ligações com as várias persona-gens da história, identificando-se com elas, estabelecendo relações de proximida-de, entre o que era retratado na história e o que vivenciavam, no interior da sua sala de aula. Tal ilação é visível nos seguintes testemunhos proferidos por alguns alunos: “O Silva era brasileiro, como a mãe do M.LS.”, “A Jeroboão é da terra da M.J.C.”, “A Tébus é a Sissi”

Os alunos demonstraram, ainda, grande interesse e curiosidade, sobretudo na ati-vidade em que tinham de proceder à localização no mapa dos vários países, por onde as personagens da história iam passando, na sua viagem. Algumas perguntas que nos colocavam são exemplo disso: “Onde fica Portugal?”, “A terra do Silva, que é a terra da mãe do M.L.S. onde fica?”, “De onde veio a M.J.C.?”. Deste modo, na sequência destas questões, tínhamos o cuidado de solicitar aos alunos da sala que convivem diretamente com os países em questão, para serem eles a indicarem no mapa cada um deles. Tal processo foi sempre feito com a nossa ajuda, visto que as crianças eram bastante pequenas, não tendo, deste modo, ainda desenvol-vido competências relativas à localização dos países em mapas.

Durante a implementação do projeto, os alunos demonstraram sempre uma gran-de vontade de interagir com o Outro, associada a uma postura de grande curiosi-dade e interesse em ir mais além na descoberta de jogos linguísticos. Contudo, à medida que as crianças iam tendo um maior contacto com os diferentes jogos lin-guísticos dos vários países envolvidos no projeto, mais visível se tornava a sua vontade de interagir com o Outro culturalmente diferente, sendo cada vez mais co-muns episódios em que os alunos se dirigiam a nós, logo pela manhã, a perguntar se naquele dia íamos realizar jogos com adivinhas da terra da Jeroboão, por exem-plo. Ou então, quando entravam na sala, viam a caixa das adivinhas e das lenga-lengas e ficavam logo despertos, querendo saber que surpresa iria sair da caixa, se naquele dia íamos abrir a caixa e realizar os jogos que estavam lá dentro.

Fazendo um balanço do analisado nesta subcategoria, podemos afirmar que todos os alunos se envolveram de forma muito positiva no projeto, desenvolvendo atitu-des de valorização, sensibilidade, curiosidade e interesse em relação à diversidade linguística e cultural patente no seu ambiente de sala de aula, expandindo, então,

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o domínio afetivo da sua CM.

Nível social

No que diz respeito ao nível social, procuraremos dar conta do desejo evidenciado pelos alunos de cooperar com o Outro, do respeito pela diferença e do estabeleci -mento de relações interculturais, durante a implementação do projeto, no qual se procurou consciencializá-los para a diversidade de culturas presentes no nosso país, particularmente, na sala de aula.

Com efeito, a vontade e o desejo de cooperar com o Outro, bem como o respeito pela diferença, estiveram bem presentes desde cedo, com os alunos a afirmarem todo o seu interesse e entusiasmo na realização deste projeto através de frases como: “Quando é que vamos aprender adivinhas da terra da mãe do M.LS.?”, “Gostei de aprender adivinhas da terra do Génio” (frase proferida pelo aluno de origem santomense), “Gostei das adivinhas brasileiras.”, “Gostava de aprender mais adivinhas da Guiné-Bissau.”

Tais testemunhos demonstram uma grande vontade, por parte das crianças, de participarem ativamente neste projeto, bem como de estarem recetivas para co-nhecer o que é diferente, nomeadamente, as adivinhas de outros países, estando, por conseguinte a desenvolver uma atitude positiva face às outras culturas e po-vos. Ainda dentro deste campo, é imperativo mencionar uma situação que revela, por parte das crianças, a vontade de ir mais além no contacto com outros povos. Numa situação em que estávamos a explorar o mapa, a professora responsável da turma mencionou que tinha nascido em Angola (continente africano). Em face dis-to, as crianças pediram, de imediato, para ela indicar no mapa a localização do mencionado país. Seguidamente, as crianças começaram a referir que também gostavam de aprender adivinhas e lengalengas de Angola.

Desta forma, consideramos que a implementação do projeto veio despoletar nos aprendentes uma atitude mais tolerante face à diferença, nunca tendo havido ne-nhum momento em que as crianças se recusassem a fazer alguma atividade, nem tão pouco emitissem comentários desagradáveis em relação ao Outro.

Pensamos que a implementação deste projeto veio, de alguma forma, valorizar to-das as culturas presentes em sala de aula, permitindo que estas se familiarizassem com um pouco da cultura dos seus pares, o que, consequentemente, possibilitou, face a tudo o que foi mencionado, a promoção de respeito e valorização pela dife-rença, de compreensão mútua, de entreajuda e solidariedade. O fomento de tais comportamentos, neste nível etário e de escolarização, funciona como o motor para que as crianças não sejam no futuro, quer próximo, quer distante, atingidas por algumas “doenças culturais”, como, por exemplo, a xenofobia, a discriminação, a segregação, a violência, o racismo, entre outras. Deste modo, consideramos que através das atividades desenvolvidas se desenvolveu nos aprendentes o domínio social da sua CM.

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Nível cognitivo

No que concerne à presente subcategoria, foi nosso objetivo destacar os conheci-mentos de foro cognitivo desenvolvidos pelos alunos em torno do trabalho com as adivinhas dos países abrangidos pelo projeto.

Como já foi dito anteriormente, as adivinhas são um tipo de jogo em que o sujeito, com o intuito de poder chegar à resposta do jogo, é desafiado por um conjunto de operações de vários tipos: segmentar alternadamente uma estrutura, refletir sobre significações possíveis de uma sequência de sons ou signos, distinguir o “sentido li-teral” do “sentido metafórico”, entre outros processos. Neste sentido, pretende-mos, através das referências dos alunos assentes nas várias atividades levadas a cabo, constatar, até que ponto, tais processos foram desenvolvidos, para que estes chegassem às respostas corretas das várias adivinhas trabalhadas.

Deste modo, este espaço terá como foco as fichas de trabalho realizadas por cada uma das crianças nas sessões II, III e IV, bem como a atividade em que cada cri-ança teve que construir a sua própria adivinha, na sessão V.

Na segunda sessão dedicada à exploração das adivinhas tradicionais portuguesas, cada aluno teve o direito de realizar uma ficha de trabalho composta por adivinhas portuguesas distribuídas em dois exercícios (já descritos anteriormente), pelo que apresentamos, no Quadro 2, a análise da presente ficha.

Deste modo, constatámos que não houve dificuldades no primeiro exercício. No entanto, em relação à terceira adivinha os alunos mostraram sinais de maior difi-culdade de interpretação: a maioria, antes de pintar a resposta correta, pintou, em primeiro lugar outra opção, que depois apagou (neste grupo estão incluídas as cri-anças de origem brasileira e santomense e a aluna de nacionalidade guineense). Quanto ao segundo exercício desta ficha, verificámos que todos os alunos respon-deram acertadamente às duas adivinhas, assinalando apenas o facto de três alu-nos (a aluna guineense, a aluna santomense e um aluno português), na primeira adivinha, não terem dado uma resposta correta imediata.

Relativamente à terceira sessão, os alunos realizaram uma ficha de trabalho com-posta por dois exercícios (j alusivos a adivinhas tradicionais brasileiras, pelo que apresentamos a sua análise no Quadro 3.

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Quadro 2 – Sessão II: correção da ficha de trabalho

Sessão III Correção da ficha de trabalho das adivinhas tradicionais brasileiras

Exercícios da ficha de trabalho Tipo de respostaN.º de alunos

N.º total de

alu-nos

Pri

mei

ro e

xerc

ício

Adivinha 1[O que é, o que é… que só pode ser usado depois de quebrado?

(ovo)]Adivinha 2

[O que é, o que é… que tem per-nas e não pode andar? (mesa)]

Adivinha 3[O que é, o que é… que entra na boca da gente todos os dias e a

gente não come. (garfo)]

Adivinha 4[O que é, o que é…que sobe quan-

do a chuva desce? (guarda-chuva)]

Correspondências feitas corretamente, sem sinais de hesitação

9

16

Correspondências feitas corretamente, com sinais de hesitação

7

Seg

un

do

exer

cíci

o

Adivinha 1[O que é o que é… que vive pas-sando os dentes no cabelo? (pen-

te)]

Resposta correta, sem si-nais de hesitação

12

16Resposta correta, com si-nais de hesitação

3

Selecionou duas opções 1

Resposta incorreta 0

Adivinha 2[O que é, o que é…nasce grande e

morre pequeno? (lápis)]

Resposta correta, sem si-nais de hesitação

13

16Resposta correta, com si-nais de hesitação

1

Selecionou duas opções 2

Resposta incorreta 0

Adivinha 3[O que é, o que é… que tem cabe-ça, tem dente, tem barba, não é

bicho e não é gente? (alho)]

Resposta correta, sem si-nais de hesitação

10

16Resposta correta, com si-nais de hesitação

6

Selecionou duas opções 0

Resposta incorreta 0

50

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No que se refere ao primeiro exercício desta ficha, verificámos que um número considerável (sete) de alunos (neste grupo estão inseridos os aprendentes de ori-gem santomense e brasileira) evidenciou alguma dificuldade, manifestada por al-guma hesitação. Quando ao segundo exercício, constatámos que a adivinha em que os alunos tiveram menos dificuldades foi na primeira. Por seu turno, a que manifestaram mais dificuldade foi a terceira, pois seis aprendentes (alunos portu-gueses e a aluna de origem santomense), antes de darem uma resposta definitiva correta, rodearam primeiro outra das opções, ulteriormente apagadas.

Em relação à quarta sessão, dedicada à exploração de adivinhas tradicionais guine-enses, os alunos realizaram uma ficha de trabalho com adivinhas, distribuídas por dois exercícios (ver Quadro IV).

Quadro 4 – Sessão IV: correção da ficha de trabalho

Sessão IVCorreção da ficha de trabalho das adivinhas tradicionais guineenses

Exercícios da ficha de trabalho Tipo de resposta N.º de alunosN.º total de

alunos

Pri

mei

ro e

xerc

ício

Adivinha 1[Qual é coisa, qual é ela...

Por mais que chova, ela não se molha. (sombra)]

Resposta correta 14

16

Resposta incorreta 2

Adivinha 2[Qual é coisa, qual é

ela...Leva a comida, mas não come. (colher)]

Resposta correta 16

16

Resposta incorreta 0

Adivinha 3[Qual é coisa, qual é ela...fica onde a chuva a apanha, mas nunca se molha. (tartaruga)]

Resposta correta 12

16

Resposta incorreta 4

Adivinha 4[Qual é coisa, qual é

ela...Dorme só de um lado. (abóbora)]

Resposta correta 14

16

Resposta incorreta 2

Seg

un

do Adivinha 1

[Qual é coisa, qual é ela…Dois rapazes moram na mes-ma casa, mas não se veem?

Resposta correta, sem sinais de hesitação

1616

Resposta correta, com sinais de hesitação

0

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Andreia Ferreira y Mª Helena Ançã

exer

cíci

o

(olhos)]

Selecionou duas op-ções

0

Resposta incorreta 0

Adivinha 2[Qual é coisa, qual é ela…Es-tou no meio da comida mas não como. (colher de pau)]

Resposta correta, sem sinais de hesitação

11

16Resposta correta, com sinais de hesitação

2

Selecionou duas op-ções

1

Resposta incorreta 2

No que concerne ao primeiro exercício, verificámos que a adivinha com menor grau de dificuldade foi a número dois. Por sua vez, a que levou a que um maior número de alunos tivesse maios dificuldade foi a adivinha três: quatro aprendentes (neste grupo estão incluídas a criança de nacionalidade guineense e a de origem santomense) deram uma resposta incorreta. Quanto à primeira adivinha apenas dois aprendentes (a aluna guineense e um aluno português) erraram. O mesmo sucedeu na adivinha número quatro, tendo respondido erradamente a aluna de origem santomense e um aluno português.

Relativamente ao segundo exercício, os alunos manifestaram uma grande dificul-dade na adivinha número dois: dois deles antes de darem uma resposta definitiva correta, rodearam primeiramente outra das opções, e outros dois alunos não res-ponderam, de forma satisfatória, a esta adivinha e, ainda, outro rodeou duas op-ções…

Face ao exposto, consideramos que as crianças, no geral, tiveram uma prestação positiva, perante os demais desafios, dado que através das relações que iam esta-belecendo entre o enunciado oral e as imagens, foram chegando à resposta corre-ta das adivinhas. No entanto, é possível constatar que houve adivinhas mais complexas, do ponto de vista da descodificação.

A correção dos enganos constituiu-se como uma ótima oportunidade para ampliar a capacidade de reflexão dos alunos, visto que, com os seus conhecimentos, bem como das “pistas” dadas por nós, levaram-nos a selecionar a opção que mais se adequava à adivinha em questão.

Deste modo, a compreensão da solução dos enigmas inerentes às adivinhas pro-postas dependeu de algum tipo de ‘manobra linguística’ feito pelo aluno, manobra essa que reflete a sua compreensão e a consciencialização do funcionamento da LP, das suas regras e relações. É de referir que, uma vez que estamos a falar de crianças que se encontram pela primeira vez no primeiro ano de escolaridade, – al-tura em que estão ainda a aprender a ler e a escrever –, essa consciencialização ainda prima por uma boa dose de conhecimento intuitivo, não sabendo explicitar, efetivamente, que processos usaram. Porém, pensamos que atividades desta natu-

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reza funcionam como um “trampolim” para que os aprendentes comecem a desen-volver o conhecimento explícito sobre a língua. No entanto, nas fichas de registo que os alunos preenchiam, no final de cada sessão, alguns mencionaram “que as adivinhas têm pistas de alguma coisa.” Tal afirmação, que prima por um certo grau de simplicidade própria da faixa etária do grupo, permite-nos inferir que estes con-seguiram perceber o funcionamento das adivinhas, consciencializando-se dos seus princípios e regras.

A sessão V permite corroborar as conclusões por nós enunciadas, uma vez que na atividade de invenção de adivinhas, os resultados não poderiam ter sido mais satis-fatórios.

Analisando com detalhe as adivinhas construídas, certificámo-nos que a maioria dos alunos utilizou somente características físicas do elemento em questão, como podemos ver: “Qual é coisa, qual é ela… que é quentinha e tem mangas?” [cami-sola], “Qual é coisa, qual é ela… que tem manchas e nariz cor-de-rosa?” [vaca], “Qual é coisa, qual é ela… que tem cinco dedos?” [mão], “Qual é coisa, qual é ela… que brilha?” [sol], “Qual é coisa, qual é ela…que é castanho e tem quatro pa-tas?” [cão], “Qual é coisa, qual é ela… pode saltar e rebolar” [bola], “Qual é coisa, qual é ela… que anda no mar e é amarela. Não vai ao fundo e tem bico laranja?” [pato], “Qual é coisa, qual é ela… que anda no mar e no rio?” [peixe], “Qual é coi-sa, qual é ela… que pode ter dentro uma coisa amarela e essa coisa é lixo?” [ouvi-do]; “Qual é coisa, qual é ela… que é parecida com uma viola, mas não é uma viola?” [guitarra].

Outros alunos enunciaram apenas uma função relacionada com o elemento: “Qual é coisa, qual é ela… que corta tudo, mas eu não sei o que é?” [tesoura], “Qual é coisa qual é ela… que se pode colocar na cabeça?” [chapéu], “Qual é coisa, qual é ela… que se põe nos pés e ficam quentinhos?” [meias].

Por seu lado, outros alunos na sua adivinha referiram, paralelamente, característi-cas físicas e funções relacionadas com o respetivo elemento, ora vejamos: “Qual é coisa, qual é ela… que é vermelha, tem pintas pretas e pode-se comer?” [Moran-go], “Qual é coisa, qual é ela…que dá horas e é redondo?” [relógio].

Em síntese, os alunos foram capazes de selecionar, nomear e articular as unidades da língua mais adequadas e pertinentes à concretização de determinados objetivos numa situação concreta de uso oral da língua, neste caso particular, a criação de adivinhas. Por outro lado, todas as crianças utilizaram na enunciação das suas adi-vinhas, um dos seus traços característicos, nomeadamente a formulação interroga-tiva. A estrutura canónica “Qual é coisa, qual é ela…”, anuncia, sem sombra de dúvidas, que se está diante de uma adivinha.

3.4.3 Categoria 3 – Jogos linguísticos e o sujeito

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Esta terceira categoria emerge das afirmações efetuadas pelos alunos relacionadas com o projeto, no decorrer da sua implementação, visto que estes nos iam dando, através das fichas de registo de cada sessão, o seu feedback e apreciação quanto às atividades dinamizadas. Deste modo, estas afirmações assumem uma relevância inquestionável, pois permitiram-nos avaliar o projeto. Assim, utilizando o testemu-nho dos alunos acerca do projeto, organizámos as suas declarações em duas sub-categorias: utilidade e adesão.

Utilidade

No que concerne à utilidade do plano de intervenção, recolhemos as unidades de registo que revelam as opiniões dos alunos sobre a utilidade deste projeto para a sua formação.

A maior parte dos alunos admitiu que este projeto foi útil para aprender novas adi -vinhas, dando ênfase, também, ao facto de terem tido acesso a adivinhas de ou-tros países, pelo que inferimos que estes perceberam que as adivinhas não são algo exclusivo de uma só cultura, neste caso da cultura portuguesa. Tal ilação pode ser lida nas seguintes expressões proferidas pelas crianças: “Aprendi novas adivinhas giras. Porque ainda não conhecíamos.”, “Aprendi adivinhas de outro país”, “…aprendi adivinhas de origem brasileira.”, “Gostei muito de aprender adivi-nhas de outro país.”.

Alguns alunos referiram que o projeto serviu para aprender “que as adivinhas têm pistas de alguma coisa.” Deste modo, consideram que todo o trabalho desenvolvi-do lhes permitiu perceber de que forma são construídas as adivinhas e que proces-sos linguísticos comuns estão inerentes às mesmas, independente do país lusófono de onde provêm.

Com este projeto, foi notório que as crianças puderam consciencializar-se que al-gumas adivinhas trabalhadas, oriundas dos países contemplados, eram semelhan-tes, possuindo traços comuns, quer a nível da estrutura quer do conteúdo, aspeto visível nos seus testemunhos: “Eram adivinhas engraçadas e eram quase igual a Portugal.”, “Havia adivinhas parecidas com as de Portugal, só mudavam algumas coisas.”, “Algumas adivinhas eram parecidas com as de Portugal, a resposta era igual às de Portugal.”, “A adivinha do lápis e do garfo eram quase iguais às de Por-tugal, só davam algumas pistas diferentes.”, “Algumas adivinhas eram parecidas com as que aprendemos antes.”, “Algumas adivinhas eram mais fáceis de adivi-nhar, porque eram parecidas às que já aprendemos dos outros países.”.

Por outro lado, foi satisfatório saber que o projeto não foi apenas útil para aquisi-ção de conhecimentos, mas também para divertir os alunos, sendo a vertente da ludicidade e do divertimento indispensável, para este nível etário, no processo de desenvolvimento de aprendizagens e no nível de envolvimento dos alunos: “Apren-demos ao mesmo tempo que brincamos”, “Gostei de ver os colegas a pescar, foi

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divertido e aprendemos coisas novas.”, “O jogo foi muito divertido.”, “Gostei do jogo dos balões, foi divertido, porque aprendi advinhas brasileiras.”.

Adesão

Neste espaço, foram integradas as unidades de registo, evidenciadas no preenchi-mento das fichas de registo de cada sessão, que focalizavam os aspetos de que os alunos mais e menos gostaram no projeto. Importa mencionar que os alunos não preencheram ficha de registo na primeira e na sexta sessão.

Durante o preenchimento das demais fichas, vários foram os alunos que afirmaram gostar de tudo: “Gostei de tudo.”, “Gostei de tudo, gosto sempre.”, “Gostei muito de tudo.”. Todavia, apesar de ser um testemunho bastante positivo para nós, insis-timos com os alunos para irem referindo quais as atividades que mais gostaram de realizar em cada sessão.

Assim sendo, em relação à sessão II, uma das atividades de eleição diz respeito à construção do Dominó das adivinhas tradicionais portuguesas. Quanto à sessão III, a realização do jogo dos Balões das adivinhações tradicionais brasileiras foi a atividade apontada como sendo do agrado de muitos dos alunos. No que diz res-peito à sessão IV a maioria dos alunos afirmou ter gostado muito do jogo Mar das Adivinhas da Guiné-Bissau. O jogo Agora é a nossa vez de várias adivinhas criar le-vado a cabo na quinta sessão foi de igual modo ao encontro das preferências dos alunos.

De uma forma geral, em todas as sessões, houve sempre alguma atividade de que os alunos afirmaram ter gostado mais. Pensamos que as preferências dos alunos recaíram sobre as atividades que continham algum dinamismo e que implicaram a participação e o envolvimento deles, de forma bastante ativa na construção e re-construção dos seus conhecimentos. Foi possível constatar que, com estas ativida-des, os índices de motivação, concentração e interesse por parte das crianças foram elevados. Por outro lado, temos a perceção de que há sempre atividades ou tarefas de que os alunos não gostam tanto, e que temos de ter em consideração os seus comentários.

Neste sentido, um aluno nativo referiu não ter gostado das tarefas levadas a cabo na sessão III, onde foram tratadas as adivinhas oriundas do Brasil, apresentando a seguinte justificação: “…porque achei difíceis.” Deste modo, perante o seu teste-munho, consideramos que as dificuldades sentidas na realização das várias tarefas se deviam ao facto de estas implicarem algum conhecimento referencial (do mun-do, da cultura) e linguístico (sobretudo em termos lexicais).

A aluna de origem santomense, por sua vez, mencionou não ter gostado da sessão IV porque “Não gostei de ir pescar.”. Perante tal afirmação, consideramos que tal-vez a aluna em questão se tenha sentindo demasiado exposta, ficando com níveis

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de ansiedade elevados, dado tratar-se do país dos seus pais. São Tomé e Príncipe foi, com efeito, o único país a não ter estado representado nessa viagem…

4 Conclusão

Foi nossa intenção estudar as implicações do jogo linguístico, em particular do jogo de ocultamento/ausência, na aprendizagem da LP e no desenvolvimento da CM de crianças nativas e não nativas.

Neste âmbito, cruzando a revisão de literatura, a investigação de campo e, conse-quente análise do corpus recolhido, reunimos as condições necessárias para res-ponder às questões de investigação, levantadas no início do texto.

No que concerne à primeira questão, será o jogo linguístico, em particular o jogo de ocultamento/ausência, um possível recurso didático no processo ensino/apren-dizagem da LP de crianças nativas e não nativas?, os dados recolhidos e analisados permitem-nos verificar que o jogo linguístico pode ser integrado em atividades de aprendizagem da LP, visto favorecerem o desenvolvimento de competências espe-cíficas, como a compreensão e a expressão orais (Barbeiro, 1998). No decorrer da implementação do projeto, verificámos que os aprendentes ampliaram a sua capa-cidade comunicativa, dado que as atividades apelavam bastante às trocas verbais, quer entre a investigadora e alunos, quer entre os próprios alunos.

Relativamente à segunda, e última questão de investigação, será o jogo linguísti-co, em particular o jogo de ocultamento/ausência, um instrumento no desenvolvi-mento da CM de crianças nativas e não nativas, verificámos que todo o trabalho com as adivinhas levou a que os alunos desenvolvessem habilidades cognitivas, que lhes permitiram, de forma satisfatória, responder. Com as adivinhas, as crian-ças foram estimuladas a encontrar estratégias que lhes possibilitassem a decifra-ção das mesmas, ou seja, a compreensão da solução destas dependeu de algum tipo de ‘manejo linguístico’ (descodificação das adivinhas, compreensão dos princí-pios e das regras lhe estavam inerentes). Deste modo, tal processo evidencia a consciencialização do funcionamento da língua, das suas regras e relações, desen-volvendo o domínio cognitivo da sua CM (James & Garrett, 1991). Para além disso, e visto que a CM é um conceito bastante abrangente, – não se cingindo somente a áreas linguísticas –, o projeto forneceu-nos dados que nos levam a concluir que este, ao ter feito contactar os alunos com outras culturas e povos, promoveu com-portamentos de respeito e valorização pela diferença, de compreensão mútua, de cooperação e solidariedade. Os alunos envolveram-se, de forma bastante positiva, no projeto, com atitudes de valorização, sensibilidade, curiosidade e interesse em relação à diversidade linguística e cultural. Deste modo, podemos referir que o nosso projeto contribuiu, também, para o desenvolvimento dos domínios social e afetivo da CM dos sujeitos (James & Garrett, 1991).

Face a exposto, estamos convictas de que a integração do jogo linguístico na área

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curricular disciplinar de LP é possível, com resultados bastante positivos: ganhos significativos na motivação para a aprendizagem, no interesse dos alunos pela lín-gua e no desenvolvimento da CM. O jogo é também uma forma de sensibilizar os alunos para a diversidade linguístico-cultural patente nas escolas, e uma forma de aprendizagem e de partilha da diversidade.

Por fim, a última palavra para os professores do 1º CEB, em relação à integração das crianças que chegam às escolas portuguesas, vindas de outros pontos geográ-ficos, com passados linguísticos e culturais diferentes: a necessidade de adequa-rem as práticas educativas a esta nova realidade social e escolar (alunos nativos e alunos não nativos no mesmo espaço) para promoverem, então, a igualdade de oportunidades no sucesso educativo de todos, sem exceção.

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Andreia Ferreira y Mª Helena Ançã

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“El juego lingüístico: una vía para el desarrollo de la consciencia metalingüística de los niños nativos y no nativos”

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Tel: 234 370 358Gabinete : 2.1.8Email: [email protected]://www.ua.pt/dlc/PageText.aspx?id=6464(Cursos Livres)http://www.ua.pt/dlc/PageText.aspx?id=5966

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La educación intercultural en el 3 º ciclo de la educación básica: la voz de los docentes en formación

Rosa BizarroUniversidade Portucalense e CITCEM (Portugal)

[email protected]

Numa sociedade intrinsecamente marcada pela Diversidade, estará a escola pública portuguesa (do 3º ci-clo do Ensino Básico) atenta à importância do desenvolvimento da Educação intercultural? Que entendi-mento têm os professores em formação inicial dessa realidade? Que práticas de justiça social levam a cabo? Que formação académica receberam que os prepare para os desafios da Diversidade existentes nas suas escolas?INTERCULTURAL EDUCATION IN THE 3RD CYCLE OF BASIC EDUCATION: THE VOICE

OF TEACHER TRAINEESIn a society intrinsically marked by diversity, is the Portuguese public school (3rd cycle of Basic Educati-on) paying attention to the development of intercultural education? What kind of understanding this rea-lity have teachers trainees? What kind of practices of social justice do they carry out? Do they receive academic training to prepare them for the challenges of diversity existing in their schools?

1 Introdução

Numa sociedade pós-moderna marcada de modo profundo pelo fenómeno da mo-bilidade, com particular destaque para a que advém dos fenómenos da i/e-migra-ção, do encontro entre pessoas de diferentes etnias, religiões, géneros, gerações, ideologias, condições sociais, culturas, línguas maternas (entre outros inúmeros as-petos), a Diversidade emerge como a questão fulcral que, de resto, a simboliza (Carneiro, 2008).

Estarão as sociedades, contudo, preparadas para viver à luz desse símbolo, viabili-zando formas concretas de diálogo e respeito mútuos? À luz da análise do que se passa no mundo diariamente e nos é transmitido, por exemplo, pela comunicação social, diríamos que não.

Em Portugal, país de encontros culturais latu sensu desde há séculos, subscreveu-se a Declaração Universal dos Direitos do Homem (1948), a Declaração dos Direi-tos da Criança (1959) e a Declaração de Salamanca (1994), entre outros textos fundadores do princípio da Iguadade e do Respeito entre os seres humanos, por muito diferentes que sejam. Mas estará a escola pública portuguesa atenta a essa realidade e promoverá ela a inclusão mediante a qual cada um tenha o seu lugar,

Bizarro, R. (2013) “La educación intercultural en el 3 º ciclo de la educa-ción básica: la voz de los docentes en formación” en Segundas Lenguas e In-migración en red, 7 pp. 61-69

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Rosa Bizarro

de pleno direito, em interação com o Outro e em reconstrução de Si e das suas certezas? Estará a educação nela desenvolvida marcada pelos princípios da educa-ção intercultural? Que práticas nela sobressaem em prol do incremento da justiça social (Zeichner, 2009)? Que formação inicial recebem os professores do 3º ciclo do Ensino Básico que os prepare para estas exigências?

Numa tentativa de darmos resposta a estas dúvidas, ouvimos 6 professores esta-giários, de diferentes disciplinas, colocados, em 2012-13, em 2 escolas do 3º ciclo do Ensino Básico do distrito do Porto (Portugal), que gentilmente se disponibiliza-ram para participar neste estudo. Não são representativos senão deles próprios, mas podem servir como um despertador de consciências para que algo (mais) aconteça.

Antes de apresentarmos os resultados obtidos por esta via, recapitularemos alguns conceitos que consideramos fundamentais revisitar, em função dos objetivos des-tas reflexões.

2 A Pessoa

Se, no quotidiano, a noção1 de Pessoa parece ser transparente e estar intimamen-te ligada a todo o ser humano, a verdade é que, atendendo aos contributos dados por diferentes áreas de saber, essa noção se apresenta marcada por traços de po-lissemia. A título de exemplo e sem entrarmos numa análise histórica da evolução deste conceito2, relembramos que, para o Direito, ela significa todo o ente ou or-ganismo susceptível de adquirir direitos e contrair obrigações. Daí que haja dois ti-pos de pessoas: pessoas físicas (os seres humanos) e pessoas de existência ideal ou jurídicas (as sociedades, as corporações, o Estado, as organizações sociais, etc.). Para a Linguística, a noção de pessoa aparece relacionada com o estudo da gramática da língua, oferecendo-nos a hipótese de, no caso da língua portuguesa, falarmos da existência de 3 pessoas, no singular (eu, tu, ele/ela) e de 3 outras no plural (nós, vós, eles/elas). Para a Psicologia, uma pessoa é um indivíduo humano concreto (e a noção contempla tanto os aspetos físicos como os psíquicos do su-jeito, configurando-o como singular e único).

Para nós, a pessoa é um ser humano, caracterizado por um conjunto de marcas genéticas, éticas e ontológicas, que recebem a influência e também influenciam a sociedade onde ele atua e evolui. É assim, uma noção-síntese de vários contribu-tos, que, fundamentalmente, tenta chamar a atenção para a especificidade própria de cada um, mas também para o caráter dinâmico desta conceção e, de modo particular, para a necessidade de ter em conta a interação com o(s) Outro(s). A pessoa só o é, quanto a nós, no respeito pleno de Si e do Outro.

Na educação, a pessoa é o centro. Como lembra, Ferreira Patrício (2000: 95),

1 Tomaremos, neste texto, ‘noção’ e ‘conceito’ como sinónimos.2 Para este efeito, ver, por exemplo Rampazzo & Silva, 2010.

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Na educação é o ser do homem que está em causa. Não está em causa o ser da coisa, de qualquer coisa. Não está em causa o ser do vegetal, nem mesmo o do animal, mau grado Aristóteles ter atribuído a ambos a alma – a alma, enquanto princípio de vida. O vegetal cultiva-se, melhora-se ou piora-se, mas não se educa. O animal pode ser objecto de engenharia zootécnica, de engenha-ria genética, melhora-se ou piora-se, adestra-se, amestra-se, mas não se educa. Só o homem é sujeito ve-rídico de educação (...). (...), na educação é o ser do homem que está em causa.

Um ser único, mas plural, que tem, no reconhecimento da Diversidade, da Dife-rença, a condição da possibilidade de si mesmo.

3 Diferença e Identidade

Serão todos os seres humanos iguais? A resposta parece-nos óbvia. Que todos me-recem condições de vida dignas, longe de qualquer tipo de abuso e de exploração, sem violência nem exclusão – é um princípio inegociável. Mas tal não significa que a Diferença não exista. Na sociedade de hoje esta é, aliás, uma realidade incontor-nável – e, sublinhe-se, nem sempre correspondendo a algo de positivo.

Como McLaughlin (2000: 126) esclarece, “(...) diversity or difference (...) is not ipso facto a good thing. It is incoherent to ‘welcome’ diversity or difference per se. Some differences are immoral, harmful or problematic. The student who expresses allegiance to a neo-nazi party, or who becomes addicted to hard drugs is, after all, different”. Mas não é esta a Diferença que valorizamos.

Não entraremos, aqui, na discussão da natureza e extensão do valor da Diversida-de, mas adotá-la-emos como um princípio a preservar, desde que no respeito ab-soluto da dignidade humana.

Na escola portuguesa – durante vários séculos considerada homogénea, porque atravessada pela utilização de uma única língua materna -, ela é uma evidência que urge analisar.

Mas, afinal, o que é a Diferença?

Já na Filosofia da Grécia Antiga, e, de modo particular, no pensamento de Platão e de Aristóteles, esta noção aparece ligada à questão da Identidade, sendo a Dife-rença entendida como algo inerente ao Outro, relegado para um plano de impor-tância menor do que o próprio Eu. A Diferença é, assim, perspetivada como aquilo que o outro é (Tadeu da Silva (org.), 2000).

Para Stoer e Magalhães (2005), contudo, a Diferença “somos nós”. Segundo estes estudiosos, urge pensarmos que o Outro somos Nós e, como tal, que a Diferença

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Rosa Bizarro

também está em Nós. A relação é a base da ação de compreensão da Diferença. Há que desenvolver processos de negociação (nem sempre consensuais…) em busca de um lugar em que o individual, o local, o global convivam, tendo por base as próprias diferenças, sem que o Eu – ou o Outro – se anule.

Por Identidade, entenderemos o reconhecimento de que o Eu, apesar dos tempos e lugares que atravessou, permanece idêntico e específico. Assumindo-a enquanto traço psíquico caraterístico da Pessoa, não esqueçamos, contudo, que ela é refor-çada – e influenciada - pela existência do Outro com o qual estabelece uma rela-ção, desde o seu nascimento. O convívio com os Outros3 é fundamental para que a Identidade de cada um se desenvolva.

Do encontro Eu-Tu surge a aprendizagem de comportamentos, normas, valores, símbolos…., numa aprendizagem que se faz ao longo da vida, em diálogo com o Outro. E quanto maior for essa aprendizagem, essa partilha, maior a sensação de pertença a uma determinada comunidade.

Como refere Muñoz Sedano (1997: 108), “La cultura moldea la personalidade, principalmente porque proporciona soluciones ya preparadas y ensayadas para muchos de los problemas de la vida”, daí que, mais uma vez, defendamos que o Eu precisa do Outro para “ser”.

Com base nestes pressupostos, encaremos o papel que a Educação intercultural pode assumir, em prol do desenvolvimento pessoal e social.

4 A Educação intercultural: princípios e objetivos

Num mundo vincadamente marcado pela Diferença, no qual a Educação em con-textos formais de aprendizagem (e não só…) assume papel de relevo, para o de-senvolvimento pessoal, individual e coletivo, salientemos a importância dos 4 pilares definidos na década de 90 do século XX, sob a égide da UNESCO, cuja im-plementação ainda perdura como uma necessidade absoluta, nos nossos dias. Re-ferimo-nos a: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a ser e aprender a viver juntos. (Delors, J. (org.), 1999)

Nesta perspetiva, a sociedade atual e a escola que nela atua deverão reunir deter-minadas condições que Clanet (1990: 73) designou como interculturais. Delas, destacamos:

O reconhecimento explícito do direito à diferença cultural;

O reconhecimento de diversas culturas;

Relações e intercâmbios entre indivíduos, grupos e instituições de várias culturas.

3 Sobre a relação entre cultura e personalidade ver, a título de exemlo, Allport (1986).

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Neste âmbito, a educação intercultural “poderá ser entendida como a educação do Homem no conhecimento, compreensão e respeito das diversas culturas da socie-dade em que vive” (Muñoz Sedano, 1997: 120), constituindo um princípio geral da formação educacional dos nossos dias, que levará o ser humano e cidadão a atin-gir os objetivos de democratização, de igualdade de oportunidades e de desenvol-vimento cultural (Rey, 1983: 205).

Deste modo, sublinharemos, tal como Bizarro Miranda (2004: 21), que a educação intercultural visa, entre outros objetivos:

O reconhecimento e o respeito das diferenças culturais;

As responsabilidades humanas inerentes aos direitos do Homem e da cidadania;

A garantia da igualdade das oportunidades;

As estratégias que visam analisar as aptidões e os conhecimentos que as crianças trazem para a escola, utilizando umas e outros como recur-sos educativos.

Só ao adotar estes princípios e ao tornar seus estes objetivos, a escola portuguesa de hoje (de todos os níveis de ensino e, muito particularmente, ao nível da escola-ridade obrigatória) poderá fazer face aos desafios que o caráter plural dos seus atores lhe levantam, transformando a diversidade que os marca (ao nível do géne-ro, da idade, da etnia, da cultura, das histórias de vida, das condições sociais e económicas, das ideologias…) numa mais-valia educativa.

Saber até que ponto este desiderato se vive, hoje, na escola pública portuguesa do 3º ciclo levou-nos a realizar algumas entrevistas a professores-estagiários4 cujos principais resultados apresentaremos no ponto seguinte.

5 Ouvindo vozes…

Para conseguirmos perceber o que se passa na escola pública portuguesa, hoje, ao nível do entendimento da Diversidade, ouvimos, em maio de 2012, as vozes de 6 professores em formação inicial, colocados em duas escolas públicas de (ou com) 3º ciclo do distrito do Porto, onde os traços de Diversidade já enunciados são, quanto a nós, evidentes. Os critérios de escolha dos inquiridos submeteram-se, por um lado, ao facto de uns serem professores da área das Ciências Humanas (3 de-les) e outros, da área das Ciências Exatas (os outros 3). Também tivemos em con-ta o nível de escolaridade em que lecionavam (3º ciclo do Ensino Básico),

4 Optamos por evidenciar a opinião dos professores em formação inicial, por várias razões de que des-tacaremos, aqui, a seguinte: acreditamos que na formação de professores se semeiam as sementes do futuro que queremos construir. A voz de docentes de carreira, dos alunos e dos seus encarregados de educação está em vias de ser recolhida por inquérito por questionário.

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correspondendo os 7º, 8º e 9º anos de escolaridade a faixas etárias normalmente associadas à adolescência, fase da vida em que consideramos particularmente im-portante todo o trabalho educativo que possa ser feito na (re)construção de Identi-dades. Acresce referir que a escolha destes 6 docentes (cujo anonimato preservaremos) obedeceu a um outro critério: o conhecimento direto que deles te-mos, o que proporcionou a sua pronta disponibilidade para participar neste (pré-) estudo – o que muito agradecemos.

As entrevistas realizadas orientaram-se por um pequeno guião constituído por 4 perguntas:

1. Como caracteriza a sua escola, em termos de Diversidade? Existe ou não? Se existe, onde a deteta?

2. Que papel pedagógico lhe atribui? É um obstáculo ou um facilitador de aprendizagens? Como?

3. Na sua formação académica, aprendeu a lidar com a Diversidade? Em que medida?

4. O que faz para conhecer e dar a conhecer as diferentes culturas existentes na sua sala de aula?

Estas questões tiveram como objetivos:

Conhecer as representações de Diversidade que os inquiridos possuem;

Conhecer o tipo de preparação que os inquiridos recebem na Instituição de Ensino Superior que frequentam em prol do desenvolvimento da Educa-ção intercultural.

Fazer o levantamento de atividades pedagógicas desenvolvidas pelos pro-fessores inquiridos na ótica da valorização e/ou compreensão da Diversida-de.

Face aos dados recolhidos, é-nos possível sintetizar algumas ideias-chave sobre o modo como a Educação Intercultural é (ou não) posta em prática nas salas de aula.

Sobre a noção de Diversidade, verificamos que todos os inquiridos afirmam que ela existe nas escolas onde lecionam. As definições apresentadas pelos 3 estagiários da área das Ciências Humanas remetem explicitamente para a existência de lín-guas maternas, nacionalidades e etnias diferentes, na escola, enquanto os demais inquiridos enfatizam as questões do género e dos comportamentos distintos dos alunos (quer verbais, quer não verbais), bem como as origens socioeconómicas. Nenhum dos inquiridos refere traços ideológicos ou religiosos, como marcantes da Diversidade existente nas suas escolas, o que nos leva a concluir que, nas faixas etárias envolvidas indiretamente nesta análise (a que os alunos pertencem), estes dois fatores ainda não estarão desenvolvidos o suficiente, para que se manifestem

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“La educación intercultural en el 3 º ciclo de la educación básica: la voz de los docentes en formación”

de modo significativo.

Cinco dos inquiridos olham para a Diversidade existente nas escolas como um obs-táculo às aprendizagens. Dois destes cinco explicitam que o obstáculo advém do facto de os Programas a cumprir serem demasiado extensos, não permitindo rit-mos diferenciados de aprendizagem e os restantes 3 consideram não estarem pre-parados para saber lidar com a Diferença, em sala de aula. Dois destes 3 referem explicitamente que lamentam não conhecer a metodologia de ensino do Português como Língua Não Materna, que consideram ser vital para poderem trabalhar com os alunos estrangeiros que têm.

Os 5 inquiridos em questão afirmam que gostavam de ter recebido sugestões/in-formações, durante a sua formação universitária, que os levasse a entender a Dife-rença e a saber ultrapassar as barreiras profissionais que ela lhes levanta e afirmam nunca terem ouvido falar de Educação intercultural durante a sua forma-ção inicial de professores.

O sexto inquirido considera uma mais-valia a Diferença existente nas turmas com que contacta mais de perto. Diz ter aprendido na Faculdade a olhar para a Diferen-ça como um trunfo pedagógico e procura realizar, sempre que possível, reflexões com os alunos sobre as diferentes culturas presentes na sala de aula. A título de exemplo, diz ter promovido um trabalho em pequenos grupos sobre “Festas Tradi-cionais” na China, em França, na Ucrânia e em Portugal.

Face ao exposto, consideramos que há fortes indícios para que a formação inicial de professores e a planificação do trabalho educativo nas escolas precisem de de-senvolver (mais) esforços, no sentido de viabilizar a existência da escola inclusiva de que os textos legais citados anteriormente fazem a apologia.

De facto, parece-nos que ainda há muito caminho a percorrer para que a Educação intercultural seja uma realidade, entre nós. A título de exmplo das dúvidas que as respostas às entrevistas aqui referidas nos levantam, sublinhemos as seguintes:

- Onde está a componente Didática do Português Língua Não Materna5 na formação inicial de professores de Português, de História, de Geografia, de Educação Física, de Matemática....?

- Por que razão a Educação intercultural não integra curricularmente todos os cursos de formação inicial de professores?

- Em que Escolas é a Diferença alvo de reflexão conjunta, entre professores e funcionários não docentes?

- Onde é que se promovem, com regularidade, sistematicidade e princípios inclusivos, atividades, em sala de aula – e fora dela – em que se analisem “as aptidões e os conhecimentos” que as crianças trazem de suas casas,

5 Referimo-nos, obviamente, ao contexto do território português.

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das suas comunidades, dos seus mundos, para a escola?

- Que papel têm os encarregados de educação, no esforço de compreensão conjunto, da escola, dos professores e de todos os alunos, bem como na partilha e divulgação das diferentes culturas, dos diferentes “mundos” a que pertencem?

- O que se entenderá por “cumprir Programas”? Será a transmissão de con-teúdos? A obsessão pelo resultado? A negação do desenvolvimento de competências sociais? A anulação dos ritmos e dos meios de aprendizagem diferenciados? A anulação da Diversidade?

Estas questões – entre muitas outras possíveis – estão na base do entendimento da Escola e da Sociedade que queremos que exista. Sabemos que não estamos sós neste querer. O que faltará para que ele se concretize? Talvez que todos nós nos coloquemos no lugar do Outro e assim implementemos o que urge ser feito.

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6 Referências Bibliográficas

Allport, G. W. (1986), La personalidad, su configuración y desarrollo. Barcelona: Herder.Bizarro Miranda, F. (2004), Educação Intercultural e Formação de Professores. Porto: Porto

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En Carvalho, A. D. et al. (org.), Diversidade e Identidade. Porto: Gabinete de Filo-sofia da Educação, Instituto de Filosofia, FLUP: 91 – 99.

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Rampazzo, L. & Silva, P. C. (orgs) (2010), Pessoa, Justiça Social e Bioética. Campinas: Ali-nea.

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Stoer, S. R. & Magalhães, A. (2005), A diferença somos nós. A gestão da mudança social e as políticas educativas e sociais. Porto: Edições Afrontamento.

Tadeu da Silva, T. (org.). (2000), Identidade e diferença – a perspectiva dos estudos cultu-rais. Petrópolis: Vozes.

Zeichner, K. (2009), Teacher education and the struggle for social justice. New York: Rou-tledge.

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Estrategias y materiales para la enseñanza de Portugués Lengua No Materna: un proyecto desarrolado con escuelas

de educación básica

Luísa SollaEscola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Setúbal

Instituto de Linguística Teórica e Computacional (ILTEC) (Portugal)luí[email protected]

Neste artigo apresentarei, nas suas linhas gerais, um projeto que o ILTEC desenvolveu em três agrupa -mentos de escolas. Partindo do conhecimento das práticas dos professores, procurou-se estudar a situação de diversidade linguística e cultural aí presente, traçando e concretizando um percurso pedagógico mais adequado a alunos que, vivendo num contexto escolar diferente do seu país de origem, estão integrados em turmas regulares e têm de aprender, em tempo útil, a língua da escola como objeto e como meio de aprendizagens curriculares.Descreverei sumariamente o contexto em que o projeto se desenvolveu e a motivação que nos levou a concebê-lo, discutirei as linhas gerais da metodologia seguida, darei conta das limitações sentidas e das aprendizagens conseguidas, e divulgarei alguns dos produtos que dele resultaram, em particular um CD-ROM com sugestões de atividades e materiais, já disponível em linha, na página do ILTEC www.iltec.ptEste projeto foi financiado pela Fundação Calouste Gulbenkian e decorreu entre 2009 e 2012..

STRATEGIES AND MATERIALS FOR TEACHING PORTUGUESE AS A SECOND LANGUA-GE (PLNM): A PROJECT CARRIED OUT WITH SCHOOLS IN BASIC EDUCATION

In this article, I will broadly describe a project carried out by ILTEC in three school groups. Taking tea-chers' practical knowledge as a starting point, the project aimed to study the linguistic and cultural diver-sity in the school groups, as well as conceiving and implementing a pedagogic trajectory adapted to the needs of the L2 students. These students are integrated in regular classes and face considerable challenges adapting to a new educational context and acquiring in the shortest time possible the language used in school either as a subject in its' own right or as a means for learning other subjects.I will briefly outline he motivation behind the project and the context in which it took place. I will also discuss the general methodology, some of the limitations felt by the team and a sample of learning outco-mes of students and teachers. Furthermore, I will present some of the products that resulted from the pro-ject, in particular a CD-ROM containing activities and materials, currently available on-line at ILTECs' website (www.iltec.pt http://www.iltec.pt ).The project was financed by the Calouste Gulbenkian Foundation and carried out between 2009 and 2012. .

1 Introdução

Num tempo em que a Europa vive uma situação de grande mobilidade social, Por-tugal não é exceção, passando a ser também um espaço de confluência de dife-rentes culturas e línguas e tornando-se, como tantos outros, um país de

Solla L.. (2013) “Estrategias y materiales para la enseñanza de Portugués Lengua No Materna: un proyecto desarrollado con escuelas de educación bási-ca” en Segundas Lenguas e Inmigración en red, 7 pp. 70-88

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acolhimento. Naturalmente que esta mudança teve reflexos na escola portuguesa, tradicionalmente monolingue e detentora de um currículo escolar em que cada lín-gua tinha um espaço bem delimitado e funções bem definidas. A nova situação de coabitação linguística e cultural, mais difusa e complexa, foi assumida, desde 2001, com timidez pelos sucessivos responsáveis da educação e com voluntarismo, resul-tante da pressão do momento, pelas escolas.

Vejamos então. Para esta nova realidade educativa, o Ministério da Educação atra-vés da Direção-Geral para a Inovação e Desenvolvimento Curricular (DGIDC) pro-duziu despachos normativos e orientações que os diretores tentam concretizar no exercício das suas funções e no quadro de autonomia de que as escolas dispõem. Os professores, após um período de alguma desorientação e confinados a um es-paço de isolamento pedagógico, designado “apoios educativos”1, conciliando horá-rios dispersos, esticando o tempo e a paciência, procurando e alimentando, com esforço, o diálogo com os colegas das outras disciplinas, em suma, respirando an-siedade e somando angústias, tomam consciência da necessidade de melhor se or-ganizarem. Procuram as melhores soluções para esta situação de diversidade, aquilo a que chamam e sentem como “problema” mas que é, de facto, uma nova “realidade”, exigindo novas respostas.

Inspiram-se nas metodologias já conhecidas para o ensino de uma língua estran-geira, criam atividades e adaptam materiais para os seus alunos. Sabem que deve ser dada prioridade ao bom domínio da língua de ensino e língua do país de acolhi-mento, por ser esta uma condição essencial para o sucesso escolar e prossegui-mento de estudos, para a integração social e, consequentemente, para o exercício pleno de cidadania. Procuram formação e reconhecimento institucional para o seu trabalho. Não desistem dos seus alunos. E quem são estes alunos?

2 Os alunos de Português Língua Não Materna (PLNM): a situa-ção linguística e escolar

2.1 Caracterização sociolinguística dos alunos

Em Portugal, os alunos de origem imigrante cuja língua materna não é a portugue-sa são designados, no seu conjunto, por alunos PLNM. Esta infeliz designação, como mostrarei mais à frente, encobre realidades muito distintas, ao longo de todo o ensino básico e secundário.

Desde logo os alunos acabados de chegar tanto podem ingressar no 1.º ciclo como em qualquer outro ciclo de estudos. Podem ou não ter frequentado a escola no seu país de origem. Quer isto dizer que podem ou não saber ler e escrever na sua

1 Apoio pedagógico dado a todos os alunos que dele precisam. Neste horário, que cada escola definia e organizava, decorria o ensino do português a estes alunos. Esta situação foi alterada pelo Despacho normativo nº 12/2011.

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língua materna. São, portanto, alunos que ingressam, em termos de língua portu-guesa, no nível A1, em referência ao QECR. Existem ainda os alunos que tiveram algum contacto com a língua portuguesa, em situação escolar como os oriundos dos países de língua oficial portuguesa ou familiar como os filhos de emigrantes portugueses. O nível de proficiência destes alunos pode ser A2 ou B1.

Temos ainda os alunos que tendo frequentado, já em Portugal, aulas de PLNM, po-dem ser incluídos no nível A2 ou B1, conforme a proficiência revelada pela avalia -ção a que são submetidos.

Note-se que a esta “diversidade” acresce o mosaico de línguas e culturas de ori-gem dos alunos. Sem entrar em grandes explicações, e falando só de escrita, é de referir que as línguas maternas dos alunos podem ter sistemas de escrita mais dis-tantes (ucraniano, mandarim,...) da escrita do português. Temos ainda situações de maior proximidade em relação à escrita portuguesa e de maior facilidade em re-lação à intercompreensão como acontece com o crioulo de Cabo Verde ou da Gui-né-Bissau, que, como se sabe, são crioulos de base portuguesa.

Esta diversidade de situações coexiste num mesmo agrupamento de escolas, exi-gindo materiais e professores habilitados a lidar com alunos que, sendo do mesmo nível de proficiência linguística, têm idades, interesses e necessidades pessoais e académicas muito diferentes.

2.2 Situação escolar dos alunos de PLNM

Os números disponíveis para caracterizar com mais rigor esta população escolar não são fiáveis devido à sua rápida e recente evolução, por força de circunstâncias difíceis de controlar, em particular as de ordem económica. O projeto Diversidade Linguística na Escola Portuguesa apresentou, em 2004, alguns dados que carecem de atualização e se referem apenas à Grande Lisboa (www.iltec.pt).

Não sabemos como poderá esta situação evoluir nos próximos anos, de modo a que se justifique a concepção e implementação de um dispositivo de intervenção mais sustentado do que as orientações que existem, que são vagas e deixam às escolas a responsabilidade única de realização.

Uma preocupação comum aos professores de PLNM e aos responsáveis pelo seu ensino nas escolas é o que se deve ensinar a estes alunos, já que além das orien-tações, mais específicas para o Ensino Secundário, não há programas de PLNM.

Os alunos de PLNM frequentam as aulas nas mesmas turmas dos alunos portugue-ses enfrentando, assim, um duplo desafio: aprender a língua portuguesa e, simul-taneamente, aprender conteúdos escolares veiculados em português. As suas limitações linguísticas em português não só têm reflexos nas mais variadas situa-ções comunicativas, como conduzem, frequentemente, a dificuldades de aprendi-zagem de vária ordem no âmbito das mais diversas disciplinas. Se é verdade que

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do ponto de vista da comunicação interpessoal rapidamente vão conseguindo aprender português, para comunicar na escola com professores e colegas e fora da escola conforme as suas necessidades sociais, no que respeita às aprendizagens curriculares os problemas são outros. Precisam de outro acompanhamento e de mais tempo para desenvolver um nível de proficiência em português que lhes per-mita compreender a linguagem utilizada em todas as disciplinas do currículo. Cum-mins (1979) sustenta que estes alunos precisam de um a dois anos para satisfazerem as necessidades comunicativas em contextos informais (Basic inter-personal communicative skills) e de cinco a sete anos para desenvolver um domí-nio da língua que lhes permita conseguir obter resultados escolares (Cognitive academic language proficiency skills) equiparáveis aos dos seus colegas que têm a língua da escola como língua materna.

Mas há mais. A relação que estes alunos têm com o nosso país, com a escola e com o modo como os projetos de imigração dos pais se equacionam e perspeti-vam, a relação com o país de origem e com tudo aquilo que deixaram para trás, pode também ser diversa, influenciando a aprendizagem e não podendo ser igno-rada pela escola e pelo professor de PLNM. Para esse efeito, informações que per-mitem conhecer melhor o aluno podem ser recolhidas e registadas numa ficha sociolinguística que foi elaborada pelos investigadores do ILTEC e disponibilizada, em linha, pela agora Direção-Geral de Educação (DGE) (www.dgidc.min-edu.pt).

A direção e a gestão pedagógica das escolas, em geral e os professores, em parti-cular, devem conhecer e agir à luz do quadro legal de referência para o acolhimen-to e integração destes alunos na escola. É fundamental que conheçam e deem espaço às suas línguas e culturas, à sua forma de aprender e de estar na escola, que como sabemos apresenta marcas culturais diversas, equacionem formas de re-lacionamento com as famílias que potenciem uma melhor vivência em comum e permitam aos alunos crescer e aprender na harmonia possível com e no novo país.

Não menos importante é que a escola queira aproveitar a mudança que foi forçada a aceitar para aprender e crescer também. A formação dos professores e dos res-ponsáveis educativos para o trabalho com estes novos públicos tem de ser pensa-da e assumida e o quadro legal português é bastante promissor nesse âmbito.

3 Quadro legal português para o acolhimento de alunos migran-tes - breve síntese

Desde que a União Europeia assumiu ser um espaço de acolhimento para quem nela procura trabalho, paz ou segurança, que os países foram estimulados (induzi-dos?) a produzir legislação e orientações curriculares que os ajudem a acolher e in-tegrar os imigrantes. Portugal não é exceção.

No Relatório de Desenvolvimento Humano do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (2009), Portugal é considerado um país com legislação adequada

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nesta matéria. O mesmo relatório refere, ainda, que em alguns países os alunos migrantes frequentam geralmente escolas com professores e recursos educativos de qualidade semelhante àqueles a que os alunos nativos têm acesso, embora existam algumas exceções, e Portugal, neste caso, faz parte das excepções. Esta situação está relacionada com a qualidade das escolas, muitas vezes abaixo dos padrões nacionais. Contudo, o relatório refere que esta situação se relaciona mais frequentemente com os níveis de rendimento locais do que com o estatuto do imi-grante em particular.

Veja-se alguns documentos fundamentais que justificam a boa apreciação que é feita das medidas que Portugal tem tomado nesta matéria.

Em 2004, uma Resolução do Parlamento Europeu sobre a integração dos imigran-tes na Europa defende a integração de populações migrantes através de um con-junto de medidas em defesa do multilinguismo, de apoio à formação específica de professores e de apoio a projetos educativos que ensinem a língua e a cultura do país de acolhimento.

Nesse âmbito e posteriormente, uma Resolução do Conselho de Ministros datada de maio de 2007 apresenta um Plano para a integração dos imigrantes identifican-do 120 medidas sustentadas por 13 princípios orientadores. Destacam-se:

Igualdade de oportunidades para todos, com particular expressão na redução das desvantagens no acesso à edu-cação, ao trabalho, à saúde, à habitação e aos direi-tos sociais, rejeitando qualquer discriminação em função da etnia, nacionalidade, língua, religião ou sexo e combatendo disfunções legais ou administrati-vas.

Das 120 medidas apresentadas, 16 referem-se à Educação (31-46) e 9 à Cultura e Língua (51-59). Das medidas referentes à Educação destaca-se Formação dos do-centes para a interculturalidade :

Definir os referenciais de um Programa de Formação Contínua para professores, no sentido de incrementar as competências dos professores para o desenvolvimento do seu trabalho em escolas cada vez mais heterogéneas, considerando, nomeadamente, o português como língua não materna como área prioritária de formação.

Em relação à Cultura e Língua, sublinha-se a medida 52. Valorização do ensino do português como língua não materna, onde se lê:

Promover a implementação, acompanhamento e avaliação das atividades curriculares e extracurriculares espe-cíficas a desenvolver pelas escolas e agrupamentos no domínio do ensino da língua portuguesa como não mater-

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na (...).

Parece, portanto, poder afirmar-se que há um dispositivo legal de acolhimento com amplitude e profundidade, permitindo acreditar que não só é possível, como impe-rativo, agir. Só que para a ação ser adequada e consequente falta muito. A vonta-de política expressa pelo legislador, em diferentes instâncias, não encontra correspondência em programas, materiais e professores pedagogicamente prepa-rados para esta «nova» realidade. Pergunta-se agora: e há um dispositivo formati-vo?

3.1 Dispositivo para o ensino e a formação de professores

Começando por 2001, o Conselho Nacional de Educação dedica a sua Recomenda-ção nº1 a esta problemática, evidenciando conhecimento da realidade portuguesa e mostrando preocupação com a situação destes alunos e dos seus professores. Dela se retiram os tópicos fundamentais para o enquadramento, reforço e funda-mentação do trabalho formativo que tem de ser realizado:

- a realidade multicultural originada pela mobilidade dos migrantes seja mo-tivo de debate, quer numa perspectiva nacional, quer numa perspectiva europeia, de acordo com as orientações legais existentes ;

- a educação intercultural tenha como objectivo não só a promoção do co-nhecimento, mas também a adopção de atitudes e de comportamentos di-rigidos para a aceitação e o respeito da diversidade cultural e social;

- a formação dos docentes para a educação intercultural seja orientada no sentido de uma formação especializada contínua;

- tendo em conta os objectivos anteriores, sejam implementados programas adequados e produzidos materiais pedagógicos específicos que incluam re-ferências culturais e/ou históricas consideradas essenciais para o desenvol-vimento de sentimentos de pertença, a valorização da identidade e a abertura ao diálogo intercultural;

- seja promovida a educação inter-linguística de modo a facilitar o desenvol-vimento da aprendizagem das línguas maternas, devendo também ser dis-ponibilizados meios para o ensino do português como língua não materna, tendo sempre em conta que a língua é um instrumento de comunicação (...);

- os professores desenvolvam competências para usarem a diversidade exis-tente como um recurso educativo e, através de metodologias de coopera-ção, apoiarem os alunos na sua aprendizagem de vida harmoniosa, cooperativa e solidária.

Na linha desta Recomendação, o Currículo Nacional - competências essenciais

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(2001) apresenta uma grande abertura para o tratamento das questões que a di-versidade cultural trouxe à escola. Este documento foi recentemente revogado.

O Decreto-lei 6/2001 é muito específico em relação ao ensino do português à po-pulação escolar imigrante. Cita-se o artigo 8.º que refere: “As escolas devem pro-porcionar atividades curriculares específicas para a aprendizagem da língua portuguesa como segunda língua aos alunos cuja língua materna não seja o portu-guês.”

Na primeira década do século XXI, sob pressão das necessidades do sistema edu-cativo em relação a esta matéria, foram publicados vários despachos e orienta-ções, entre os quais o Despacho 7/2006 que apresenta várias linhas orientadoras para a organização de um currículo de PLNM nas escolas, tendo em conta a hete-rogeneidade sociocultural e a diversidade linguística da população escolar, de modo a que os alunos adquiram «um domínio suficiente da língua portuguesa en-quanto veículo dos saberes escolares, permitindo a sua integração no sistema edu-cativo nacional», cabendo às escolas encontrar as respostas adequadas.

Em 2008, e a pedido da DGIDC, o ILTEC elaborou um conjunto de instrumentos de diagnóstico para estes alunos que a DGIDC disponibilizou, em linha, aos professo-res.

Em 2011, e na sequência da publicação do Decreto-Lei nº 94/2011 (revisão curri-cular do 2.º e 3.º ciclos), o Despacho normativo nº 12/2011 veio trazer ao ensino do PLNM para os 2.º e 3.º ciclos condições mais vantajosas para os alunos, crian-do a disciplina de PLNM que inclui no seu propósito o ensino do português neces -sário às diversas aprendizagens curriculares. Esta medida equipara em número de horas a disciplina de PLNM à disciplina de Língua Portuguesa e refere que “deve ser reservado um período de 45 minutos da carga horária semanal atribuída ao PLNM para trabalhar a língua portuguesa enquanto língua veicular das restantes disciplinas. “ (artigo 4.º, ponto 2).

A língua deixa de ser considerada apenas como «objeto de estudo» assumindo agora, também, o seu lado instrumental em relação à aprendizagem dos conteú-dos escolares.

É um facto que a legislação vigente tem contribuído para que a ação das escolas e dos professores seja hoje legitimada por um quadro legal. Porém, não podemos deixar de referir que as orientações dadas às escolas vão mais no sentido «do que devem fazer», mas poucas vezes fornecem os meios e a orientação para o «como fazer».

Mas, como a experiência nos mostra, a legislação dificilmente pode ser considera-da um dispositivo pedagógico útil se não for acompanhada de um conjunto de ins-trumentos que ajudem à sua concretização. Deixar tudo, ou quase tudo, ao cuidado das escolas não é suficiente. Alguns poderão considerar ser esta posição a adequada, em referência ao quadro legal de autonomia das escolas, mas a autono-

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mia tem de ser acompanhada de meios suficientes e adequados para o seu exercí -cio. Não é isso que tem acontecido.

4 Projeto - Criação e experimentação de estratégias e materiais para o ensino do PLNM

4.1 Questões prévias

Foi neste ambiente de trabalho instável, mas estimulante e complexo, que o ILTEC aceitou responder ao desafio da Fundação Calouste Gulbenkian e concebeu o pro-jeto que a seguir se apresentará.

Desde logo se levantaram muitas questões. Como escolher as escolas? Como inter-vir para melhorar o seu trabalho? Que preocupações deve a escola ter sobre a lín-gua a ensinar e como a ensinar? Como trabalhar com alunos de diferentes línguas e diferentes idades? Que anos de escolaridade escolher? Que estratégias adotar? Com que materiais organizar o ensino?

Foi necessário fazer escolhas e foi justamente às duas últimas perguntas que pro-curámos responder de forma mais explícita dando ao projeto uma dimensão funda-mentalmente prática, experimental e estimulante para os professores.

A nossa ação, enquadrada pelos normativos e orientações do Ministério da Educa-ção (agora, Ministério da Educação e Ciência), é justificada também pelo conheci-mento que temos das escolas e por sabermos que podíamos dar uma contribuição útil. Nesse sentido, avançámos para uma intervenção apoiada pelos órgãos de ges-tão dos agrupamentos, em concertação com os professores e no quadro legal em vigor. Desta opção decorreram os objetivos, os eixos que enquadraram o sustenta-ram o projeto e metodologia que apresentamos nos pontos seguintes.

Após uma revisão crítica das metodologias de ensino de línguas (materna, estran-geira e segunda), gizámos o percurso metodológico que nos pareceu mais adequa-do aos agrupamentos selecionados. Identificámos quatro macroestratégias para o ensino de português apropriadas a um público escolar plurilingue e pluricultural, produzimos alguns materiais coerentes com as estratégias definidas que foram ex-perimentados pelos professores e, complementarmente, criámos oportunidades formativas, estimulando os professores a desenvolverem práticas de ensino inter-culturais integradoras, promovendo a sua atualização científica e pedagógica.

4.2 Objetivos do projeto

- -Desenvolver estratégias de ensino-aprendizagem de português, adequa-das a crianças e jovens com outras línguas maternas e com outras cultu-ras.

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- -Elaborar documentos e realizar ações de formação que contribuam para a atualização científica e pedagógica dos professores no domínio em ques-tão.

- -Construir e experimentar materiais didáticos.

4.3 Quatro eixos de trabalho: breve descrição do seu conteúdo e con-cretização

Os quatro eixos que a seguir se enunciam pretenderam enquadrar e sustentar o trabalho com as escolas e envolver os professores nas diferentes etapas de desen-volvimento do projeto. Foram previamente discutidos com os professores e deles receberam contributos, não só na procura e melhor definição do seu conteúdo como também na concretização esperada.

Experimentação controlada

Desejava-se um projeto de dimensão prática, como já se referiu. Para o efeito fo-ram experimentadas e acompanhadas quatro macroestratégias de ensino de uma língua segunda que desenvolvem a competência comunicativa e intercultural dos alunos, facilitam as aprendizagens curriculares e favorecem o sucesso educativo. Para melhor conseguir a articulação curricular, estimulou-se o envolvimento dos professores das outras disciplinas, através do acompanhamento dos professores e da observação dos alunos de 5.º e 6.ºanos, nas aulas de PLNM, Ciências Naturais e História e Geografia de Portugal. Alguns dos resultados farão parte de um capítu-lo de um livro a publicar pela Fundação Calouste Gulbenkian.

Autonomia e flexibilidade

A autonomia e a flexibilidade foram dois eixos importantes do projeto. Nunca foi nossa intenção interferir de forma intrusiva no modus faciendi das escolas. Preten-dia-se ajudar as escolas a regular o seu próprio trabalho, respeitando a sua especi-ficidade, ajudando a interpretar o que, em relação às orientações, se revelasse menos claro ou insuficiente. Facilitámos uma afirmação mais criativa e autónoma do trabalho dos professores, elaborando ou adaptando instrumentos de apoio ao seu trabalho docente e formativo. Alguns instrumentos e recursos serão também objeto de publicação na obra já citada.

Construção coletiva, partilha e comunicação na equipa

Desejava-se e esperava-se que a construção coletiva de materiais, textos, partilha e comunicação na equipa e entre os agrupamentos de escolas fosse um continuum estimulante e gratificante. Para isso promoveu-se o diálogo e a troca de materiais entre os agrupamentos, fomentando a dimensão formativa entre pares e o registo e discussão de práticas consideradas interessantes. Foram feitas apresentações de atividades nas sessões de formação e foi criado um sítio virtual de partilha de ma-teriais de acesso restrito à equipa, para a construção do qual usámos a ferramenta

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gratuita GoogleSites da Web 2.0. Toda a equipa a usou, quer disponibilizando os seus materiais, quer usando os dos colegas.

Visibilidade e disseminação

Sempre que foi possível e oportuno, o projeto foi apresentado em encontros e co-lóquios, quer em Portugal, quer no estrangeiro. Os professores foram motivados a divulgar o seu trabalho na comunidade educativa, mantendo atualizado um painel informativo em cada escola, falando com os colegas e expondo os trabalhos de alunos. Os professores que se sentiram mais seguros apresentaram comunicações nos encontros nacionais (junho de 2011 e maio de 2012) que realizámos durante a vigência do projeto.

Alguns materiais dos professores e produtos dos alunos farão parte de um CR-ROM apenso ao livro já referido.

5 Metodologia e recursos

5.1 Seleção dos agrupamentos de escolas2

Em função de três critérios previamente definidos (escolas com alunos de origem migrante diversa, professores interessados e com prática de ensino de PLNM, e in-teresse manifestado pelos diretores em acolher o projeto), e depois de vários con-tactos prévios, escolhemos, em Julho de 2009, três agrupamentos de escolas com os quais discutimos um documento orientador contendo os objetivos e princípios do projeto. As atividades tiveram o seu início no ano letivo de 2009/2010.

5.2 Investigação-ação-formação

O projeto foi sustentado por uma metodologia de investigação-ação-formação que vários estudos referem ser esta a metodologia que melhor mobiliza os professores, justamente porque exige a sua participação e colaboração, implica um trabalho de equipa em que todos são intervenientes num contexto que se pretende conhecer, sobre o qual se quer refletir e se deseja mudar.

No que diz respeito à ação em sala de aula, experimentaram-se estratégias e ma-teriais visando a mudança de práticas de ensino, otimizando a aprendizagem dos alunos de PLNM. Desejava-se uma ação comprometida com a resolução de proble-mas, traduzida na vontade de compreender o contexto em que ocorre a elabora-ção dos novos saberes, induzindo à reflexão crítica e implicando a intervenção dos docentes na produção de conhecimento. Sendo uma metodologia flexível, permite refazer planos e percursos e contribuir, complementarmente, para a formação dos professores envolvidos no projeto.

2 Os agrupamentos de escolas incluem escolas de 1.º, 2.º e 3.º ciclos do ensino básico, segundo critéri -os vários, entre os quais a proximidade geográfica e um melhor aproveitamento de recursos.

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5.2.1 Estratégias para a ação

Um dos objetivos da dimensão de investigação do projeto foi o acompanhamento de alunos na realização de atividades de ensino e aprendizagem de PLNM, preten-dendo-se verificar se as estratégias e os materiais produzidos proporcionavam as aprendizagens esperadas. Importa sublinhar que a abordagem que propomos as-senta num conceito de estratégia (Roldão, 2009: 57):

enquanto conceção global de uma ação, organizada com vista à sua eficácia (...) o elemento definidor da es-tratégia de ensino é o seu grau de conceção intencio-nal e orientadora de um conjunto organizado de ações para a melhor consecução de uma determinada aprendiza-gem.

Interessa aqui reforçar a noção de «intenção» e de «conjunto organizado de ações», já que são pilares que devem sustentar o Plano de Intervenção que cada professor elabora, concretiza, avalia os resultados dos seus alunos e realiza a sua própria reflexão.

Para o projeto escolhemos uma abordagem pedagógica centrada em tarefas: reali-zadas em presença e em interação com o professor de PLNM e com os colegas, ou realizadas em trabalho autónomo, regulado pelo aluno e orientado pelo professor. Esta é uma abordagem orientada para a ação, considerando o aluno como ator so-cial que tem de cumprir tarefas que não são só linguísticas, em circunstâncias e ambientes determinados, num domínio de atuação específico. (QECRL, 2001).

Para esse efeito selecionámos quatro estratégias: Instrução em sala de aula, Aprendizagem da língua em trabalho autónomo, Aprendizagens interculturais e A língua e a aprendizagem de conteúdos escolares.

Instrução em sala de aula

Consideramos que este é o espaço de ensino explícito do português, não só em termos gramaticais, mas também culturais e pragmáticos. São estimuladas práticas de reflexão sobre a língua que recorram à conceptualização e sistematização gra-maticais. Podem ser usadas abordagens contrastivas, sempre que oportuno e pos-sível.

Trabalham-se todos os domínios da língua, desejando-se que seja dada maior ên-fase à oralidade. Procura-se ir ao encontro das expectativas dos alunos, dos seus hábitos de estudo e aprendizagem. É ainda a partir deste locus que se estabelece a articulação com as outras três estratégias: aprendizagem da língua em trabalho autónomo, aprendizagens interculturais e aprendizagem de conteúdos escolares.

Aprendizagem da língua em trabalho autónomo

Os alunos de origem migrante têm à sua volta, na cidade, no bairro e na escola,

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oportunidades únicas de aprendizagem, muitas vezes solitária. Hartmann (2002: 149) chama a nossa atenção para o que à nossa volta é portador de significado quando afirma:

Quando andamos a pé ou de carro numa rua da cidade tudo o que vemos à nossa volta são manifestações de pensamentos. Cada edifício começou como uma ideia na mente de alguém. Alguém comprou o terreno. Alguém de-senhou a casa. Alguém teve a ideia de reunir as pesso-as para construir a casa, para ganhar dinheiro ou para viver nela. As árvores que vemos foram plantadas para dar sombra ao pátio, ao passeio, ao longo da rua. O passeio que aceitamos como parte «natural» da paisagem foi conceptualizado, projetado, construído, instalado e é conservado através do pensamento.

Por que razão não pode isto tudo ser objeto de aprendizagem da língua, por parte de quem vive no meio desta paisagem que Hartmann tão poeticamente nos revela? Como pode a escola potenciar essa aprendizagem?

Concordando com Holec (1988), defendemos que o trabalho autónomo em línguas permite, fundamentalmente, o exercício da responsabilidade do aluno e estimula a sua capacidade de aprender sozinho. Estando os alunos de PLNM permanentemen-te confrontados com input linguístico quer através da televisão, quer na escola, na rua, ou no bairro, devido à sua situação de imersão, consideramos ser útil e opor-tuno habituá-los a transformar em aprendizagem da língua e cultura portuguesas o que o meio em que vivem lhes oferece de forma constante e gratuita.

O trabalho autónomo pretende ainda que o aluno esteja menos dependente do professor no sentido tradicional, devendo realizar, sozinho, tarefas fora do espaço da sala de aula, nos diferentes espaços escolares, como, por exemplo, no Centro de Recursos. Sob a orientação do professor e recorrendo a guiões de orientação, esta modalidade de aprendizagem pode ser considerada o grau zero da autonomia. Contudo, acreditamos que o aluno se tornará tendencialmente mais ativo e autó-nomo na resolução dos problemas que forem surgindo na sua vida real, trazen-do-os para a aula, recorrendo ao professor e aos colegas se precisar de ajuda. Pretendemos que seja capaz de aprender em diferentes espaços e situações, de usar com maior destreza as fontes de informação ao seu dispor, de planear e de regular o seu tempo e a sua aprendizagem e de se autoavaliar com maior rigor.

Aprendizagens interculturais

Júlia Kristeva (1988: 26-27) fala do «silence des polyglottes» a propósito de quem, tendo de falar várias línguas, não pode falar a sua língua materna:

Ne pas parler sa langue maternelle. Habiter des sono-rités, des logiques coupées de la mémoire nocturne du

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corps, du sommeil aigre-doux de l’enfance. Porter en soi comme un caveau secret, ou comme um enfant handi-capé – chéri et inutile –ce langage d’autrefois qui se fane sans jamais vous quitter.

Referi anteriormente que voltaria a falar da situação linguística destes alunos a quem se colou uma etiqueta que os identifica e designa pela negativa: alunos PLNM, ou seja, de português língua NÃO materna! E, no entanto, verificámos que muitos deles «sabem» mais do que uma língua, como mostrou uma simples ativi-dade realizada com esse mesmo objetivo. Apresento apenas um exemplo, de uma aluna do Cazaquistão, de 16 anos, língua materna russa e de nível de proficiência em português A1 a quem foi pedido que desenhasse a sua silhueta e nela pintasse as línguas que conhecia. Foi ainda pedido um pequeno texto explicativo para o seu desenho. O resultado pode ser visto no exemplo que se encontra no final deste ar-tigo.

Como se pode então dar voz a estes alunos que vivem num silêncio «dos emigrados», que, como refere Adalberto Dias de Carvalho «vivem muitas vezes situações de extraordinária solidão». (2011: 14). E continua:

...a cristalização que eles fazem da sua própria cul-tura, dos seus vínculos culturais, faz com que não só fiquem isolados relativamente à chamada sociedade de acolhimento, como, entretanto, se isolam da própria sociedade de onde partiram, porque, entretanto, evo-luíram para uma cultura terceira, que nem é a que dei-xaram nem é a cultura onde estão. Quer dizer, ficam pelo menos duplamente desintegrados.

Desejando “dar voz” a estes alunos, pretende-se que realizem atividades e usem materiais que falem de si e do seu país e que fomentem o conhecimento e a ape-tência por viver em ambientes de diversidade cultural na sala de aula e no grupo. Sendo dado espaço à sua língua e à sua cultura, pensamos ser possível valorizá-las, facilitando o reconhecimento mútuo das diferentes culturas e das suas intera-ções. Para isso, é estimulada a utilização de materiais artísticos como meio de co-nhecimento de diferentes culturas, ou outros materiais com potencial intercultural (Jesus e Neves 2004).

O que seria verdadeiramente interessante e inovador era que a escola fosse capaz de mostrar a todos os alunos a nova Europa cultural de que nos fala António Pinto Ribeiro (2011: 85-86):

É o espaço de múltiplos centros de produção e de deci-são culturais; é uma Europa de circulação de criado-res, produtores, cientistas; é uma Europa multicultural com escritores africanos a residirem em Paris ou Lisboa, cineastas indianos a trabalharem em

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Londres e em Amsterdão, artistas plásticos chineses a criarem em Barcelona e Berlim, comunidades árabes, a sua cultura quotidiana e a sua língua, ocupando bair-ros inteiros em Bruxelas; ucranianos a viverem em Lis-boa; artistas portugueses a produzirem em Ljubliana e parisienses em Praga.

A língua e a aprendizagem de conteúdos escolares

Muitos estudos internacionais têm mostrado como os alunos multilingues de ori-gem migrantes não conseguem ter os mesmos resultados dos alunos nacionais monolingues. As escolas não têm conseguido reduzir a diferença que existe entre estes dois públicos que recebem, na mesma sala de aula e lado a lado, o mesmo ensino, apoiado nos mesmos materiais, direcionado a um público-alvo como se ele fosse linguisticamente homogéneo.

A nossa intervenção exigia uma estratégia que ativasse a dimensão instrumental que a língua desempenha enquanto língua de escolarização, estabelecendo uma espécie de interface entre o professor de PLNM e os professores das outras disci-plinas. Cabendo ao professor de PLNM dar apoio na leitura e escrita para a pesqui-sa e estudo, na identificação de áreas problemáticas e na procura de soluções, a sua ação deve ser feita sempre em colaboração com os professores das outras dis-ciplinas e estimulando, quanto aos alunos, a tutoria entre pares. Recorda-se o que se disse anteriormente (Cummins 1979): se as necessidades comunicativas, basic interpersonal communicative skills (BICS) podem levar um a dois anos a satisfazer, a linguagem académica, cognitive academic language proficiency skills (CALPS) precisa de cinco a sete anos para ser equiparável à dos alunos que aprendem e são avaliados na sua língua materna.

6 Em síntese

No primeiro ano tivemos como objetivo principal o conhecimento e caracterização dos contextos de intervenção. Fez-se o levantamento das formas de trabalho que aí eram desenvolvidas pelos professores de PLNM e das suas necessidades de for-mação. Foi analisado e discutido um documento contendo informação sobre estra-tégias de ensino adequadas aos alunos de PLNM. Lançaram-se as bases do trabalho, produziram-se materiais e criaram-se dinâmicas a nível das equipas do-centes. O trabalho realizado envolveu 94 alunos e 11 professores.

No final do ano letivo, a realização de uma entrevista coletiva, por agrupamento, permitiu aferir o nível de satisfação dos professores e avaliar o trabalho realizado. Foi equacionada uma intervenção mais consistente para o ano letivo seguinte, 2010/2011. (Relatório Um ano de trabalho com os agrupamentos, setembro de 2010).

No segundo ano (2010-2011), foram experimentadas quatro macroestratégias e os

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materiais que as concretizavam e que se disponibilizaram aos professores num CD-ROM. O trabalho envolveu 119 alunos e 14 professores.

A formação foi organizada em sessões temáticas mensais, alternadas com sessões de apresentação de experiências de sala de aula. O trabalho com os alunos de oito professores foi acompanhado e analisado por duas investigadoras do ILTEC. No fi-nal do ano letivo foi feita uma avaliação, por questionário, aos professores implica-dos (Relatório Segundo ano de trabalho com os agrupamentos, setembro de 2011).

Durante o período de vigência do projeto, o ILTEC organizou uma oficina de forma-ção (Aprender e Ensinar em contexto de Diversidade, 2009) e um seminário (De-senvolvimento, produção e utilização de materiais para o ensino de uma língua segunda, 2010) para os professores do projeto e três seminários com especialistas internacionais e nacionais, abertos aos professores portugueses que se interessam ou trabalham nesta área:

- Metodologias e Materiais para o ensino do Português como Língua Não Materna. Fundação Calouste Gulbenkian, outubro de 2010.

- Bilinguismo e Educação Bilingue. Fundação Calouste Gulbenkian, junho de 2011.

- Encontro 2012- Português Língua Não Materna: partilha de práticas e de experiências de aprendizagem. Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Lisboa, maio de 2012.

6.1 O que aprendemos com e sobre as escolas

O trabalho realizado neste projeto mostrou a necessidade de aprofundar questões relacionadas com aprendizagens multiculturais no contexto da escola portuguesa. Aprendemos que as escolas com ambiente multicultural têm desenvolvido modali-dades organizacionais visando a integração escolar dos alunos estrangeiros e que estes ambientes se caracterizam por serem constituídos por alunos de diferentes nacionalidades, línguas e culturas, idades e expectativas em relação à escola, ao país de acolhimento e à língua portuguesa, tendo em comum a necessidade de aprender, rapidamente, esta língua para comunicar e para estudar em Portugal. Ou seja, o que a escola considera ser “um problema”. Em nossa opinião e de acor-do com Lasagabaster e Sierra (2005: 17), a questão é outra. Vejamos qual:

El alumno recién llegado no es el problema. El proble-ma es nuestra rigidez en la organización escolar, nu-estra falta de metodologia innovadora para la atención a la diversidad, nuestras inseguridades com respeto al tratamiento de las distintas lenguas de la escuela, nuestra práctica educativa basada fundamentalmente en

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el aprendizaje de contenidos conceptuales donde el peso de los aspectos linguísticos es determinante. Es fundamental dar prioridad a la situación individual del alumno/a y a la atención de sus necessidades.

Para corresponder às necessidades específicas de um ambiente multicultural e plu-rilingue de modo a proporcionar a estes alunos uma aprendizagem eficiente do português, identificamos algumas áreas de investigação que poderão ser objeto de posterior estudo:

- Formação dos professores em ambiente plurilingue; referimo-nos não só aos professores de PLNM, mas também aos professores das outras disciplinas. Todos carecem de formação a nível da caracterização sociolin-guística dos alunos, do diagnóstico de aprendizagens anteriores nos países de origem, quando é caso disso, do planeamento de sequências de apren-dizagem focadas nas diferentes dimensões da língua de escolarização, de utilização de estratégias e de materiais adequados a este público.

- Utilização de realia, em diferentes suportes, que ajudem os alunos a com-preender e a interpretar o quotidiano em que vivem. Esta opção corres-ponde à necessidade de pôr o aluno em contacto com a língua, nas suas diversas variedades e permite abordagens mais reais às questões da cultu-ra do quotidiano. Pode ser, por essa razão, uma fonte de motivação maior para o aluno que se sente perdido no labirinto dos textos escolares.

- Educação intercultural que permita uma abordagem pluralista do co-nhecimento, ajude todos os alunos a perceberem que «viver com os ou-tros» não é hoje uma opção individual, mas uma imposição coletiva, pois como disse Martin Luther King «Todos os habitantes do mundo são vizi-nhos».

- Conhecimento e estudo de estratégias de apoio ao desenvolvimento de competências de leitura e escrita que permitam aos alunos uma me-lhor apropriação dos conteúdos escolares, quer através dos textos dos ma-nuais, quer através de outros textos do quotidiano.

Em muitas destas questões, aprendemos que os alunos de PLNM não se distin-guem muito dos seus colegas portugueses. Todos carecem ser apoiados na vivên-cia e aprendizagem multicultural. No mesmo âmbito, também os programas e os manuais precisam de ser revistos considerando este propósito.

6.2 Do que precisamos ainda

Parece-nos, portanto, possível afirmar que, apesar de haver um dispositivo legal para o acolhimento e para a ação pedagógica, há ainda muito caminho a percorrer

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para que as condições de aprendizagem destes alunos se aproximem das dos seus colegas falantes nativos de português. Do que precisamos ainda?

- De decisores políticos informados e interessados na mudança, que reco-nheçam e estimulem as boas práticas das escolas e que permitam experi-ências de ensino, apoiadas por investigadores experientes; que produzam programas e documentos de enquadramento e de orientação que sejam um suporte indispensável às práticas dos professores.

- De instituições de ensino superior mais motivadas e disponíveis para traba-lhar no terreno onde a hibridação cultural emerge e faz caminho. A discus-são sobre a problemática dos alunos de PLNM interessa muito aos professores e à comunidade educativa. A demonstrá-lo estão, por exem-plo, o grande interesse manifestado pelos resultados do projeto Diversida-de Linguística na Escola Portuguesa e o elevado número de inscrições nos seminários que o ILTEC organizou em 2009, 2010 e 2011.

A par da investigação que o ILTEC tem vindo a desenvolver desde 2003, também a nível nacional é visível um interesse crescente, neste domínio, não só a nível de trabalhos publicados, como também em teses de mestrado e doutoramento.

- De professores que aprendam a lidar com as situações de plurilinguismo presentes nas nossas escolas; que se interessem pela cultura das crianças, que integrem nas suas práticas as contribuições que a investigação mais recente proporciona em termos de atuação em contextos de diversidade linguística e cultural; que elaborem materiais que permitam melhorar a competência linguística em português dos seus alunos. Professores trans-formers (Schreeck 2009): criativos, comunicadores eficientes, problem-sol-vers, produtores de conhecimento, utilizadores de tecnologias, cooperantes e reflexivos, em suma, cuidando da sua competência profissi-onal e do seu desenvolvimento pessoal. Nestes últimos anos encontrámos alguns.

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www.segundaslenguaseinmigracion.es

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Novos públicos, novos desafios: alguns traços comuns a imigrantes adultos eslavófonos na apropriação do

Português

Teresa FerreiraUniversidade de Aveiro/ CIDTFF (Portugal)

[email protected]

As alterações no panorama social português que ocorreram no virar do milénio, marcadas pela chegada massiva de imigrantes provenientes de países que não tinham laços históricos e linguísticos com Portugal – com destaque para as comunidades do Leste europeu –, vieram colocar novos desafios à sociedade e à escola portuguesas.No presente artigo, iremos dar conta das principais conclusões de um projeto de Doutoramento cuja prin-cipal finalidade consistiu na caracterização do perfil de apropriação do Português de aprendentes adultos eslavófonos residentes em Portugal. No âmbito desse estudo, foram recol-hidos 87 questionários e testes linguísticos junto de adultos falantes de línguas eslavas que frequentavam cursos de Português em contex-to formal/ não formal. Complementarmente, fo-ram realizadas 17 entrevistas a aprendentes e professores. A análise de dados centrou-se em três eixos fundamentais: a) o perfil de apropriação da Língua Portugue-sa; b) a gestão dos repertórios linguísticos; e c) as dificuldades manifestadas na apropriação, compreensão e uso do sistema temporal-aspetual em Português. NEW AUDIENCES, NEW CHALLENGES: SOME COMMON TRAITS TO ADULT SLAVIC-S-

PEAKING IMMIGRANTS IN THE APPROPRIATION OF PORTUGUESE Changes in the Portuguese social scene that occurred at the turn of the millennium, marked by the massi-ve influx of immigrants from countries that had no historical and linguistic ties with Portugal – especially from Eastern Europe –, have brought about new challenges to Portuguese society and schools. In this article, we will give an account of the main findings of a PhD project whose main purpose was to characterise the learning profile of adult speakers of Slavic Languages learning Portuguese and living in Portugal. Within this study, 87 questionnaires and language tests were applied to adult learners who atten-ded Portuguese courses in formal/ non-formal context. In addition, 17 interviews were carried out with le-arners and teachers. The data analysis focused on three main areas: a) the Portuguese language learning profile; b) the mana-gement of language repertoires; and c) the difficulties experienced in the appropriation, comprehension, and use of Time and Aspect in Portuguese

1 Introdução

É já comum a constatação da mudança que ocorreu em Portugal nas últimas déca-das ao nível das migrações. Tradicionalmente perspetivado como um país de emi-gração, a qual continua a ocorrer (ultimamente com novo fôlego), Portugal assumiu, nos últimos trinta anos, o papel de recetor de imigrantes, até aí quase

Ferreira, T. (2013) “Novos públicos, novos desafios: alguns traços comuns a imigrantes adultos eslavófonos na apropriação do Português” en Segundas Len-guas e Inmigración en red, 3 pp. 90-114

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“Novos públicos, novos desafios: alguns traços comuns a imigrantes adultos eslavófonos na apropriação do Português

desconhecido. Assim, conjugam-se movimentos de saída e de entrada de pessoas à procura de melhores condições de vida, o que concede a Portugal uma configu-ração peculiar.

As principais nacionalidades que têm escolhido Portugal como destino têm sido provenientes de países de expressão portuguesa, principalmente do Brasil e Cabo Verde. A par destas, têm ganho relevância desde 2001 outras nacionalidades, constituindo uma novidade o facto de se distanciarem cultural e linguisticamente da sociedade de acolhimento. Referimo-nos, em particular, à imigração provenien-te do Centro e Leste europeu, destacando-se a Ucrânia. Efetivamente, segundo dados do último relatório do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (2012: 71-74), a relevância numérica das comunidades de Leste1 em 2011 correspondeu a 19% (82.070) do total da população estrangeira residente em território nacional (436.822) e a Ucrânia ocupou a segunda posição da lista de nacionalidades mais representadas em Portugal (48.022 ucranianos, o que perfaz 11% do total de es-trangeiros, a seguir ao Brasil, representado por 111.445 imigrantes, o que equivale a 25,5% dos estrangeiros a residir em Portugal).

As populações imigrantes caracterizam-se pela sua vulnerabilidade social, principal-mente quando se trata de imigração laboral. Pelo facto de serem, inicialmente, ex-ternos ao tecido social em que se inserem, os imigrantes estão mais expostos à exclusão social, atitudes discriminatórias, precariedade de emprego e habitação, insucesso escolar, dificuldade no acesso a cuidados médicos, entre outros, o que é agravado em casos de clandestinidade. Um imigrante acabado de chegar à socie-dade de acolhimento não se movimenta nas diversas esferas sociais como um nati-vo, pois não possui o saber, o saber-fazer e o saber-estar que são singulares ao contexto social onde se insere e exigidos por este na vivência quotidiana, e que um nativo foi acumulando ao longo da sua vida – tal como o imigrante, mas relati -vamente à sua comunidade de origem. Esse deslocamento inicial será tanto mais evidente quanto a distância cultural e linguística que se verificar entre a sociedade de origem e a sociedade de acolhimento, podendo perpetuar-se e, inclusivamente, propagar-se às gerações seguintes.

A importância da aprendizagem da língua de acolhimento2 na integração de imi-

1 Adotámos um critério linguístico mais do que geográfico, ou seja, definimos como público-alvo imi -grantes falantes de línguas eslavas. Assim, considerámos, nesta contagem, os nacionais de países que têm atualmente línguas eslavas com estatuto oficial ou cooficial, bem como os imigrantes provenien-tes das ex-repúblicas soviéticas que só em 1991 se tornaram independentes, dado o passado recente de adoção de uma língua eslava (o Russo), com consequências no panorama linguístico presente. Os paí-ses de proveniência considerados foram, então, os seguintes: Arménia, Azerbaijão, Bielorrússia, Bós-nia e Herzegovina, Bulgária, Cazaquistão, Croácia, Eslováquia, Eslovénia, Estónia, Geórgia, Kosovo, Letónia, Lituânia, Macedónia, Moldávia, Montenegro, Polónia, Quirguistão, República Checa, Rús-sia, Sérvia, Tajiquistão, Turquemenistão, Ucrânia e Uzbequistão.2 A expressão ‘língua de acolhimento’, cunhada por Ançã (2003), retoma a expressão ‘langue d’accu-eille’ de Lüdi & Py (1986).

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grantes é amplamente reconhecida, não só por investigadores mas também por entidades oficiais com responsabilidade nesta matéria (cf. Baganha, Marques & Góis, 2004; Rocha-Trindade, 2004; Comissão Europeia, 2008; Conselho da Europa, 2008). O domínio da língua de acolhimento, efetivamente, reflete-se nos diversos campos de atuação, desde o desempenho profissional/ escolar, acesso a oportuni-dades melhores (de emprego, habitação), sucesso no atendimento em serviços (de saúde, de aconselhamento, jurídicos), e, ao nível afetivo, no relacionamento inter-pessoal (com pessoas nativas e, eventualmente, com imigrantes de outras nacio-nalidades).

2 Estudo empírico

No âmbito do que foi dito anteriormente, o presente artigo pretende divulgar as principais conclusões do projeto de Doutoramento intitulado “Apropriação do Por-tuguês por adultos eslavófonos: o Tempo e o Aspeto”3, desenvolvido pela autora na Universidade de Aveiro sob a orientação de Maria Helena Ançã. Este estudo ti-nha como motivação e finalidade última contribuir para uma melhor integração na sociedade portuguesa de imigrantes adultos falantes de línguas eslavas, através do domínio da Língua Portuguesa (LP) enquanto língua de acolhimento. Pretendia-se, assim, estudar o processo de apropriação da LP por parte do público-alvo selecio-nado, com vista a contribuir para um ensino-aprendizagem da LP mais adequado às características específicas destes aprendentes. Para além de realizar uma carac-terização mais geral do perfil de apropriação da LP, este estudo focou em particu-lar a apropriação do sistema temporal-aspetual em LP, ou seja, a apropriação dos valores de localização temporal e valores aspetuais expressos através de tempos e modos verbais, perífrases verbais, expressões adverbiais e outros meios linguísti-cos.

Iremos, em primeiro lugar, contextualizar o mencionado projeto de investigação, nomeadamente no que se refere aos pressupostos teóricos, definição do públi-co-alvo, objetivos de investigação, dados recolhidos e caracterização dos informan-tes, para depois apresentarmos as principais conclusões que sobressaíram da análise dos dados.4

2.1 Pressupostos teóricos e público-alvo

Se considerarmos, como se defende atualmente, que a apropriação de uma nova

3 Projeto concluído em 2012, financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia, Programa Operacional Ciência e Inovação 2010 e Fundo Social Europeu no âmbito do III Quadro Comunitário de Apoio.4 Para uma compreensão mais aprofundada do enquadramento teórico, opções metodológicas, conce-ção dos instrumentos de recolha de dados, realização da recolha, etc., vide a tese final deste projeto (Ferreira, 2012).

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língua interage com os conhecimentos linguísticos prévios, ou seja, que ocorre transferência linguística (cf. Carvalho, 2004; Corder, 1981; James, 1998; Odlin, 2003), então podemos supor que pessoas com repertórios linguísticos próximos poderão experienciar algumas dificuldades semelhantes na apropriação de uma mesma nova língua. De igual forma, pessoas provenientes de sistemas de ensino análogos partilharão algumas características no que se refere aos seus perfis de apropriação de línguas.

Partindo destes pressupostos, optou-se por restringir o estudo a um público-alvo que partilhasse um background linguístico e de aprendizagem. Este critério, aliado à relevância, em termos numéricos, das comunidades de Leste residentes em Por-tugal, conduziu à opção por cingir o público-alvo a imigrantes adultos eslavófonos. Esta opção foi reforçada pelo facto de as línguas eslavas serem próximas entre si, em termos linguísticos (formando um grupo de línguas), e de a distância linguística entre estas e a LP ser, portanto, equivalente. Por outro lado, sabemos que as re-públicas que pertenciam à ex-URSS – durante o período em que esta existiu, ou seja, até há relativamente pouco tempo – partilhavam uma língua comum, o Rus-so, cuja influência ainda não desapareceu. Assim, sabemos que é frequente o do-mínio do Russo por parte de falantes de línguas eslavas – ou porque aprenderam enquanto jovens, ou porque o Russo ainda tem o estatuto de língua nacional/ ofici-al nos seus países, ou porque, não tendo esse estatuto, ainda é a língua veicular ou é ensinada como Língua Estrangeira. É igualmente relevante o facto de as ex-repúblicas soviéticas terem praticado um sistema de ensino semelhante, o que tem repercussões ainda hoje em dia.

2.2 Objetivos de investigação e recolha de dados

O ensino centrado no aprendente, como hoje se preconiza, só o pode ser se os responsáveis pelo ensino, nomeadamente os professores, detiverem um conjunto de conhecimentos sobre o aprendente. Para tal, será essencial a realização de ati-vidades de diagnóstico que não incidam apenas sobre a competência comunicati-va, mas que abranjam também, por exemplo, a biografia linguístico-cultural e de aprendizagem dos alunos, nomeadamente no que se refere às línguas que conhe-cem, estatutos, tempo e contextos de aprendizagem, nível de proficiência, repre-sentações sobre a aprendizagem de línguas e sobre as línguas que conhecem, experiências anteriores de migração ou viagens realizadas, estratégias de aprendi-zagem usadas e representações sobre a sua eficácia, motivações para a aprendiza-gem da língua-alvo, representações sobre a transferência linguística e sobre a distância entre as línguas que conhecem e a língua-alvo, entre outros aspetos. O QECR encoraja a realização deste tipo de atividades de diagnose, bem como a sua utilização para sustentar as práticas de ensino (ME/ GAERI, 2001: 12).

A necessidade de os professores conhecerem as características do público de

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aprendentes com quem trabalham, aliada ao facto de que a presença em território nacional do público-alvo é muito recente, e, como tal, pouco se sabe sobre o seu perfil de aprendizagem, motivou a recolha de informações que pudessem ser úteis a uma posterior adequação do ensino às características gerais deste público.

O objetivo geral do estudo consistiu, então, em reunir informação sobre o processo de apropriação da LP por imigrantes adultos eslavófonos e, mais especificamente, sobre a apropriação do sistema temporal-aspetual em LP, informação essa que pu-desse ser útil aos intervenientes no processo de ensino-aprendizagem da LP a este público (aprendentes, professores, autores de manuais, responsáveis pela organi-zação de cursos, entre outros), de modo a poderem adequar a sua ação às carac-terísticas específicas destes aprendentes.

Este objetivo geral traduziu-se nos seguintes três objetivos específicos:

- caracterizar o perfil de apropriação da LP destes aprendentes, nomeada-mente no que se refere a necessidades linguístico-comunicativas em LP e a representações, atitudes e práticas (contextos, recursos e estratégias) de apropriação da LP;

- identificar as representações e práticas de aprendentes e de professores relativamente a estratégias de ensino e de aprendizagem da LP com recur-so aos repertórios linguísticos dos aprendentes;

- analisar as principais dificuldades linguísticas manifestadas por estes aprendentes na apropriação, compreensão e uso do sistema temporal-as-petual em LP.

Neste sentido, foram recolhidos dados junto de aprendentes adultos eslavófonos e de professores com experiência de ensino da LP a este público. A recolha de dados foi realizada entre abril e agosto de 2009 através de:

- 87 testes linguísticos sobre o sistema temporal-aspetual em LP, recolhidos jun-to de aprendentes adultos eslavófonos;

- 87 questionários recolhidos junto dos aprendentes adultos eslavófonos que responderam ao teste linguístico;

- 17 entrevistas individuais:

6 entrevistas a professores com experiência de ensino da LP a este público (grupo A);

entrevistas a imigrantes em Portugal falantes de línguas eslavas com formação no ensino de línguas (grupo B);

8 entrevistas a imigrantes adultos eslavófonos que responderam

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aos questionários e testes linguísticos (grupo C).

O teste linguístico e o questionário constituíam um único documento e foram apli -cados em simultâneo.

O teste tinha como objetivo recolher dados que permitissem identificar as dificul-dades linguísticas dos informantes na apropriação, compreensão e uso do sistema temporal-aspetual em LP. A sua estrutura dividia-se em 7 grupos de frases, de acordo com as categorias e subcategorias apresentadas no Quadro 1. O teste era constituído por várias tabelas, cada uma referente a um conjunto de frases a que os informantes não tinham acesso escrito (à exceção dos grupos F e G). Para cada frase, e em cada tabela, tinham de assinalar a resposta correta de entre as opções apresentadas.

Quanto ao questionário, a sua conceção assentou em três eixos principais:

i) dificuldades linguísticas na apropriação e uso do sistema temporal-aspetual em LP – grau de dificuldade associado ao sistema temporal-aspetual; iden-tificação das Línguas Maternas (LMs) e (grau de) interferência destas na apropriação do sistema temporal-aspetual em LP;

ii) estratégias de aprendizagem utilizadas/ consideradas eficazes na apropria-ção da LP, em geral, e do sistema temporal-aspetual em LP, em particular – (grau de) transferência linguística entre as LMs e a LP no que se refere à apropriação do sistema temporal-aspetual; delimitação dos repertórios lin-guísticos e estratégias interlinguísticas de apropriação da LP; identificação de contextos e recursos de apropriação da LP utilizados e/ ou considerados eficazes; sugestões para melhorar o ensino do sistema temporal-aspetual em LP;

iii) perfil sociolinguístico – idade; sexo; nacionalidade; país de origem; nível de escolaridade; profissão em Portugal e no país de origem; tempo de es-tadia em Portugal; tempo de frequência de aulas de LP; desempenho em LP (autoavaliação em geral e em cada uma das competências específicas); necessidades linguístico-comunicativas em LP.

No que se refere às entrevistas, para o grupo A de entrevistados (professores de Português Língua Não Materna – PLNM) foram definidos os seguintes blocos temá-ticos:

A – Perfil sociolinguístico;

B – Experiência de ensino de PLNM;

C – Perfil de aprendizagem deste público;

D – Dificuldades linguísticas deste público;

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E – Estratégias de comparação interlinguística;

F – Sugestões.

Os blocos temáticos definidos para as entrevistas dos grupos B (aprendentes adul-tos eslavófonos) e C (imigrantes eslavófonos com formação em ensino de línguas) eram os seguintes:

A – Perfil sociolinguístico;

B – Contextos de aprendizagem da LP;

C – Dificuldades linguísticas;

D – Influência da LM;

E – Estratégias de comparação interlinguística;

F – Sugestões.

2.3 Caracterização dos informantes

A caracterização dos 17 informantes das entrevistas encontra-se sintetizada nos Quadros 2, 3 e 4, os quais se referem, respetivamente, aos entrevistados dos gru-pos A, B e C.

No presente tópico, iremos apresentar a caracterização dos 87 informantes dos testes linguísticos e questionários, no que se refere a: sexo, idade, nacionalidade, tempo de estadia em Portugal, tempo de frequência de aulas de LP, desempenho geral em LP, nível de escolaridade e situação profissional no país de origem e em Portugal:

- sexo : o número de respondentes do sexo feminino (56 sujeitos) era supe-rior ao número de respondentes do sexo masculino (30 sujeitos); 1 sujeito não respondeu.

- idade : o informante mais novo tinha 14 anos, o mais velho 59 anos e a média de idades situava-se nos 35 anos.

- nacionalidade : a maior parte dos inquiridos era de nacionalidade ucraniana (55 indivíduos) e a segunda nacionalidade mais representada era a russa (18); as restantes nacionalidades tinham expressão reduzida – 4 uzbe-ques, 3 bielorrussos, 2 lituanos, 2 moldavos, 1 georgiano, 1 polaco e 1 sér-vio.

- tempo de estadia em Portugal : os participantes enquadravam-se num flu-xo de imigração recente. Apenas 5 residiam em Portugal há mais de 8 anos; os restantes tinham imigrado para Portugal em 2001 ou depois.

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- tempo de frequência de aulas de LP : na maioria dos casos era reduzido, apesar de uma grande parte destes sujeitos (49) já se encontrar em Portu-gal há 6 anos ou mais. Para muitos dos respondentes, os cursos que se encontravam a frequentar aquando da realização dos questionários consti-tuíam a primeira experiência de frequência de um curso de LP. De facto, 23 indivíduos referiram menos de 2 meses de tempo de aprendizagem for-mal ou não formal da LP; 23 referiram entre 2 e 5 meses; e 23 entre 6 meses e 1 ano. Só 14 indivíduos tinham tido um tempo de frequência de aulas de LP igual ou superior a 1 ano.

- desempenho geral em LP : o número de autoavaliações positivas (57 res-postas nos níveis 3, 4 ou 5 – equivalentes a Suficiente, Bom e Muito Bom, respetivamente) superou o número de autoavaliações negativas (22 res-postas nos níveis 1 ou 2 – Mau e Insuficiente, respetivamente); 8 sujeitos não responderam. A média das autoavaliações individuais situou-se no ní-vel 3 (Suficiente). No que se refere aos resultados nos testes linguísticos, em média, os participantes responderam corretamente a 76% das pergun-tas.

- nível de escolaridade : cerca de metade dos informantes (44) possuía for-mação de nível pós-secundário, 25 dos quais no ensino superior (23 ti-nham Licenciatura e 2 Mestrado). Apenas 3 sujeitos referiram possuir formação pré-secundária, mas 2 desses sujeitos ainda eram estudantes nesse ciclo de ensino, tendo 14 e 15 anos. Havia ainda 33 indivíduos cuja escolaridade se situava no nível secundário e 7 indivíduos não responde-ram.

- situação profissional : de uma forma geral, as profissões desempenhadas nos países de origem exigiam um nível de competências mais elevado do que as profissões em Portugal. É ainda relevante o facto de 18 sujeitos es-tarem desempregados em Portugal, por oposição aos países de origem, em relação aos quais ninguém referiu estar desempregado.

3 Principais conclusões

A análise dos dados incidiu sobre três eixos principais: i) o perfil de apropriação da LP (atitudes; necessidades comunicativas; fragilidades de uso; contextos, recursos e estratégias de apropriação); ii) a gestão dos repertórios linguísticos (composição dos repertórios linguísticos; representações sobre a transferência linguística; repre-sentações e práticas sobre o recurso a estratégias interlinguísticas); e iii) dificulda-des relativas à apropriação e uso do Tempo e Aspeto em LP.

Evidentemente, a caracterização que apresentamos não pode ser interpretada

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como absoluta e representativa de todos os aprendentes que se enquadram no pú-blico-alvo. Consiste, antes de mais, numa primeira abordagem ao conhecimento do público selecionado, numa tentativa de identificar padrões que permitam já obter uma primeira imagem da realidade sob estudo, considerando que cada aprendente possui, por um lado, características únicas, resultado de experiências e percursos particulares, e, por outro, características comuns a outros aprendentes.

Assim, as conclusões que de seguida se apresentam consistem em tendências ge-rais manifestadas pelos sujeitos que participaram no estudo que podem ou não ve-rificar-se em outros sujeitos pertencentes ao mesmo universo populacional, e que devem ser interpretadas, pelos professores de LP, como um ponto de partida para a realização do diagnóstico do perfil dos seus aprendentes, ou seja, como linhas orientadoras que terão de ser verificadas em situação concreta, face a cada turma/ a cada aluno.

3.1 Perfil de apropriação do Português

Procurou-se traçar o perfil de apropriação da LP dos aprendentes adultos falantes de línguas eslavas que participaram no estudo, com base nas suas representações e práticas, complementando essas informações com a visão dos professores de LP entrevistados.

De uma forma geral, os professores entrevistados caracterizam os aprendentes fa-lantes de línguas eslavas com os quais têm contactado como alunos empenhados, curiosos e motivados para a apropriação da LP. No entanto, o facto de muitos te-rem profissões, em Portugal, que exigem um grande esforço físico e com horários laborais sobrecarregados resulta na falta de tempo e de predisposição mental para a realização de trabalhos extraescolares, principalmente quando os cursos de LP que frequentam são intensivos. Ainda assim, são vários os informantes que afir-mam que uma etapa importante no seu processo de apropriação da LP foi, ou ain-da é, o estudo autónomo, principalmente numa fase inicial da estadia em Portugal, quando não conheciam ou não existiam cursos de LP que pudessem frequentar; al-guns referem que iniciaram o estudo autónomo da LP ainda antes de virem para Portugal, quando tomaram a decisão de imigrar para este país; e outros continuam a estudar em contexto de autoaprendizagem5 como complemento às aulas de LP – uns dispõem de tempo para tal (note-se que existe uma percentagem significativa de desempregados) e outros realizam um esforço suplementar para conseguir con-ciliar esta atividade com a profissão, as aulas de LP, a família, etc. Este investi-mento por iniciativa própria no estudo da LP, assim como a procura e frequência de cursos de LP e o empenho que demonstram nas aulas, revelam a importância atribuída por estes imigrantes à língua como fator de integração, quer a motivação 5 O contexto de autoaprendizagem consiste, em nosso entendimento, nos espaços/ momentos dedica-dos ao estudo autónomo da LP, por iniciativa do próprio aprendente e em que este é responsável pela planificação e concretização das estratégias e pela seleção dos recursos.

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para a apropriação da LP seja a obtenção de um certificado de conhecimentos para acesso à nacionalidade portuguesa, a possibilidade de frequentarem outros cursos de formação, o acesso a melhores postos de trabalho ou simplesmente a possibili-dade de se moverem e atuarem nos diversos espaços sociais que frequentam. De uma forma geral, os recursos mais utilizados em contexto de autoaprendizagem são dicionários bilingues, predominantemente de LM-LP, manuais bilingues de en-sino da LP adquiridos nos países de origem e materiais portugueses, como gramá-ticas e manuais escolares (tanto destinados a falantes nativos como específicos de PLNM). Os recursos que implicam meios informáticos não são muito valorizados nem utilizados. Quanto às estratégias cognitivas privilegiadas no estudo autónomo, destaca-se a consulta de dicionários bilingues (não só para esclarecer dúvidas que surgem no dia a dia, mas também como exercício intencional de enriquecimento do vocabulário) e a realização de exercícios de treino gramatical e de atividades de compreensão escrita. Constata-se que não são trabalhadas as competências orais (apesar de o serem em contexto informal, através do visionamento de programas de televisão, interação oral em LP, etc.) nem a expressão escrita, que fica limitada à redação de frases curtas como resposta aos exercícios de compreensão escrita.

Os contextos formal e não formal6 são aqueles que são considerados os mais efica-zes, provavelmente por possibilitarem o acesso a explicações e esclarecimentos so-bre o funcionamento da língua por parte de um professor, pois este possui conhecimentos metalinguísticos que um falante nativo sem habilitações para o en-sino da LP não possui. Além disso, as aulas de LP são, por excelência, o espaço próprio para colocar dúvidas e vê-las respondidas, o que dificilmente acontece em outros espaços. Por outro lado, as estratégias cognitivas são muito mais diversifi-cadas do que em qualquer outro contexto, sendo desenvolvidas todas as compe-

6 Os contextos formal e não formal têm em comum o facto de serem contextos de ensino, isto é, de -correm em espaços próprios, normalmente salas de aula, e implicam a presença de um professor ou formador, o qual é o responsável pela gestão das atividades, dos recursos, das interações, etc. As pri-meiras respostas com vista à integração de imigrantes, nomeadamente através da capacitação de com-petências linguísticas, numa fase em que havia pouca oferta por parte do Estado, foram dadas pela so-ciedade civil, ao nível das associações de imigrantes, centros paroquiais, instituições de solidariedade social, entre outros. É ao ensino da LP ministrado por estas entidades que classificamos de não for -mal, caracterizado por ser pouco estruturado a diversos níveis (conteúdos programáticos, recursos di-dáticos, progressão do ensino, avaliação, habilitações dos professores, ...). Classificamos como ensino formal da LP aquele que tem lugar, atualmente, em escolas da rede pública e Centros de Formação Profissional da rede do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) no âmbito do Programa Português Para Todos. Tem conhecido um grande investimento nos anos mais recentes, a diversos ní-veis, e destaca-se do contexto não formal por ser mais estruturado – existe uma entidade que é respon-sável pela sua gestão (o ACIDI), segue um referencial que suporta a sua concretização ( O Português para Falantes de Outras Línguas – o Utilizador Elementar no País de Acolhimento – cf. Grosso, Ta-vares & Tavares, 2008), nomeadamente ao nível da organização, referenciais de competências, requi -sitos de acesso e carga horária (entre 150 e 200 horas), e recorre exclusivamente a professores habili -tados.

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tências (compreensão e expressão oral, compreensão e expressão escrita e funcio-namento da língua), e os recursos utilizados são mais variados, pois os professores não se limitam a utilizar materiais didáticos existentes; pelo contrário, recorrem também a recursos próprios do contexto informal e criam materiais novos ou adap-tam materiais existentes, de modo a irem ao encontro das necessidades do seu público.

Além dos contextos formal/ não formal e de autoaprendizagem, assume relevância o contexto informal7. O facto de aprenderem a LP em contexto de imersão linguís-tica não só é valorizado como é rentabilizado pelos informantes. Efetivamente, en-tre os recursos de apropriação da LP que os respondentes mais utilizam e, simultaneamente, consideram mais eficazes contam-se vários que pertencem ao contexto informal, nomeadamente a interação com portugueses (principalmente oral, mas também escrita), a televisão, a imprensa escrita e a música.

Quanto às áreas-chave a intervir, a expressão oral deverá ser privilegiada no ensi-no formal ou não formal da LP a este público de aprendentes. Por um lado, consta-tou-se que os respondentes têm mais necessidade, no dia a dia, de usar as competências orais, e não tanto as competências escritas; por outro, consideram que têm mais fragilidades nas competências de expressão, quer na oralidade quer na escrita. Particularmente no que diz respeito à expressão oral, verifica-se que não é treinada em contexto de autoaprendizagem. Em contexto informal, as com-petências orais são treinadas através da interação oral em LP com falantes nativos – estratégia que os informantes muito valorizam e, inclusivamente, procuram –, mas isso acontece mais no que se refere à compreensão oral, pois a expressão oral é, frequentemente, bloqueada pela vergonha (medo de errar, de ser julgado, desacreditado ou ridicularizado); acresce que o diálogo com nativos não proporcio-na as mesmas possibilidades de reflexão e aperfeiçoamento que o contexto formal ou não formal, onde o professor pode fazer correções, esclarecer dúvidas, sugerir alternativas, avaliar e dar feedback sobre a produção dos aprendentes. A expres-são escrita, apesar de não ser tão necessária no dia a dia, também merece aten-ção, pois é uma das competências em que os informantes consideram ter mais dificuldades (a par da expressão oral) e que pouco treinam em outros contextos. A abordagem da expressão escrita é particularmente premente no que se refere à realização de tarefas básicas que são necessárias para o desempenho de uma ci-dadania ativa.

Relativamente aos domínios sociais, o domínio público é aquele em que se verifica

7 Entendemos que o contexto informal consiste no meio social em que o aprendente está imerso e que proporciona oportunidades reais de uso da língua, nas suas diversas competências (de compreensão e expressão na oralidade e na escrita), como sejam a interação com outras pessoas em LP, a leitura de cartazes, anúncios, revistas e jornais, o visionamento de programas televisivos, o preenchimento de formulários, entre tantas outras atividades linguísticas com que os sujeitos se deparam no seu dia a dia.

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uma necessidade mais imediata de atuação, dado que é neste domínio que decor-rem a maior parte das interações em LP, e, maioritariamente, com consequências para o seu processo de integração e vivência quotidiana. É necessário ainda averi-guar as necessidades individuais de uso da LP, nomeadamente as que se relacio-nam com o domínio profissional (não só a profissão atual de cada um, mas também profissões que pretendam vir a desempenhar, e para as quais o domínio da LP seja determinante).

3.2 Gestão dos repertórios linguísticos

Relativamente aos repertórios linguísticos dos informantes, constatou-se que se caracterizam por ser limitados em número e diversidade de línguas: entre LMs e LNMs, cada sujeito domina, em média, cerca de três línguas8, tendo sido referidas, no total, 20 línguas. As línguas que dominam restringem-se maioritariamente a lín-guas eslavas, havendo um número elevado de indivíduos que têm mais do que uma LM (cerca de 45% dos informantes) – normalmente, a língua nacional e o Russo. Este facto conduz a outro: a grande relevância que o Russo assume nos re-pertórios dos sujeitos, apesar da diversidade de nacionalidades e países de origem representados. Efetivamente, o Russo só não é referido por 5 inquiridos.

Quanto a línguas pertencentes a outros grupos linguísticos, à exceção da LP, des-taca-se o Inglês, mas apenas presente no repertório de 15 sujeitos, todos com ida-de inferior a 35 anos. Este facto será, provavelmente, reflexo de políticas linguísticas recentes, diferentes das adotadas durante o período soviético.

Este perfil linguístico, caracterizado pelo predomínio quase exclusivo de línguas es-lavas (com destaque para o Russo) e pelos conhecimentos de Inglês por parte de aprendentes mais novos, reflete-se no perfil de apropriação da LP com recurso a outras línguas.

Apesar de, naturalmente, as LMs dos indivíduos interagirem com a apropriação da LP, sendo incontornáveis a transferência e a interferência linguísticas, essa intera-ção é percecionada, de uma forma geral, como negativa. De facto, são apenas 7 os informantes que reconhecem que os conhecimentos das suas LMs facilitam a apropriação da LP; por outro lado, no que se refere ao sistema temporal-aspetual, os indivíduos reconhecem mais evidentemente a interferência causada pelas dife-renças entre os sistemas linguísticos (3,5 numa escala de 1 a 5) do que a transfe-rência de estruturas/ valores linguísticos semelhantes (1,8 numa escala de 1 a 5).

Por oposição, o contributo dos conhecimentos prévios de Inglês, para os poucos que dominam esta língua, é percecionado como positivo na apropriação da LP, da-

8 Este número pode ser considerado reduzido se tivermos em conta que a margem para a existência de várias Línguas Estrangeiras é muito pequena, pois, em cerca de metade dos casos, duas dessas línguas são LMs, e, em aproximadamente um terço dos casos, uma das línguas é a LP, língua de acolhimento.

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das as semelhanças a nível do léxico, de alguns aspetos gramaticais e o uso, tal como em LP, do alfabeto latino. No entanto, este contributo parece ocorrer a nível epilinguístico, pois, nos testemunhos recolhidos, é reduzida a referência à adoção intencional de estratégias de rentabilização dos conhecimentos da Língua Inglesa, ou de outra língua, na apropriação da LP.

Em síntese, as estratégias de apropriação da LP com recurso a outras línguas que os informantes afirmam utilizar com frequência são:

- em todos os contextos de apropriação da LP: a consulta de dicionários bi-lingues, principalmente de LP-LMs;

- em contexto formal ou não formal: a utilização do Russo ou de outra lín-gua eslava como língua de mediação entre os próprios aprendentes, para clarificar vocabulário e explicar regras de funcionamento da língua; a tra-dução de vocabulário em sala de aula por parte do professor, recorrendo ao Inglês (ou, eventualmente, ao Russo, quando o professor tem conheci-mentos nesta língua); e, pontualmente, a comparação linguística entre a LP e o Inglês ou o Russo;

- em contexto de autoaprendizagem: a utilização de manuais de LP escritos nas LMs dos aprendentes;

- em contexto informal: o visionamento de filmes estrangeiros, principal-mente anglófonos, legendados em LP.

Quanto à comparação linguística, alguns professores afirmam recorrer a esta es-tratégia, quer com o Inglês quer com as LMs dos aprendentes, mas de forma pou-co estruturada e apenas esporadicamente. A tradução enquanto estratégia de ensino e/ou aprendizagem parece ser valorizada, mas, na prática, a sua utilização é pontual e resume-se a palavras ou expressões isoladas, como forma de clarificar vocabulário. O recurso sistemático e produtivo a estratégias de comparação lin-guística e de tradução seria otimizado se os professores detivessem conhecimentos linguísticos nas LMs dos aprendentes, ou em Russo, como alternativa. Os professo-res parecem sensíveis a esta questão, demonstrando recetividade à frequência de ações de formação nesta área – inclusivamente, alguns já frequentaram aulas de Russo e mobilizam esses conhecimentos no ensino da LP. Também entre os apren-dentes parece circular esta ideia de que seria muito útil que os professores tives-sem conhecimentos, ainda que básicos, sobre as suas LMs, de modo a melhor compreenderem as suas dificuldades e a conseguirem ajudá-los a superar as mes-mas. No entanto, não existe muita oferta formativa nesta área a que os professo-res possam recorrer.

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3.3 Dificuldades na apropriação do Tempo e Aspeto em Português

A análise dos resultados sobre as dificuldades manifestadas pelos informantes no que diz respeito ao Tempo e Aspeto em LP revelaram que a conjugação verbal é, em si, uma área problemática, por implicar um grande esforço de memorização de morfemas flexionais e a compreensão de diversos valores temporais, modais e as-petuais, por divergir do sistema linguístico das LMs, por ser incontornável na com-preensão e produção de enunciados, entre outros. No que se refere aos tempos verbais, foram identificadas algumas áreas em que os sujeitos manifestaram maio-res dificuldades, nomeadamente: os tempos verbais do modo conjuntivo e os tem-pos compostos, em geral; a compreensão dos valores secundários de alguns tempos verbais; a compreensão do valor iterativo veiculado pelo pretérito perfeito composto do indicativo quando combinado com situações eventivas; e a distinção entre o pretérito perfeito simples e o pretérito imperfeito do indicativo, com con-sequências na seleção de um ou outro destes tempos em contexto de produção. Quanto a este último aspeto, o grupo de questões que incidia sobre a oposição as-petual entre estes dois tempos do passado foi aquele em que os resultados foram mais baixos. Analisando as classes aspetuais das situações representadas nas fra-ses do teste e os tempos verbais que eram exigidos, conclui-se que os responden-tes revelaram muitas dificuldades em decidir corretamente o tempo verbal a utilizar com situações estativas, quer fosse exigido o pretérito perfeito simples ou o imperfeito. Por outro lado, notou-se uma tendência para associarem o pretérito perfeito a situações télicas, particularmente a culminações. No entanto, não se ve-rificou a tendência contrária, que seria associarem o imperfeito a situações atélicas (processos e estados).

As expressões adverbiais, de uma forma geral, parecem facilitar a compreensão dos valores temporais e aspetuais dos enunciados. Este facto é evidenciado pelos bons resultados obtidos em algumas frases que continham adverbiais de localiza-ção temporal, e em que o objetivo era testar a compreensão do valor temporal das mesmas; e em frases que continham adverbiais de frequência associados ao pre-sente, pretérito perfeito simples e pretérito imperfeito do indicativo e que veicula-vam o valor iterativo. Nesta linha, constata-se que, numa primeira fase, o ensino dos tempos verbais beneficiará da apresentação destes em conjunto com adverbi-ais que reforcem/ reiterem/ clarifiquem os diversos valores temporais e aspetuais que aqueles podem assumir, de modo a que os aprendentes possam aperceber-se desses valores, mediados pelos adverbiais. É preciso ter em conta, no entanto, que nem todas as expressões adverbiais são óbvias para um falante não nativo. A pre-sença de determinantes demonstrativos (ex.: ‘nesta/ nessa/ naquela semana’) ou de algumas preposições (ex.: ‘para a semana’) parece dificultar a compreensão das expressões em que comparecem. Por exemplo, os sujeitos demonstraram conhe-cer a expressão ‘durante x tempo’ – a que imediatamente associam duratividade (apesar de ignorarem que existem restrições no seu uso) –, mas não a expressão

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‘em x tempo’.

Verificou-se ainda que a distinção entre os verbos ‘ser’ e ‘estar’ coloca muitos obs-táculos aos informantes, principalmente quando os predicadores com que se com-binam admitem ambos os verbos – nestes casos, observou-se uma tendência para aceitarem apenas um dos verbos, com base nas representações limitadas que pos-suem do significado dos verbos ‘ser’ e ‘estar’, juntamente com as representações que possuem das propriedades predicadas (isto é, quando associam a propriedade a uma característica permanente, privilegiam o verbo ‘ser’; no caso de proprieda-des que perspetivam como temporárias, privilegiam o verbo ‘estar’).

Algumas dificuldades identificadas ao nível do Tempo e Aspeto em LP resultarão, em parte, como os próprios sujeitos reconhecem, da interferência das suas LMs, nas quais não existem estruturas paralelas a algumas existentes em LP, pelo que se torna mais difícil compreenderem qual o espaço que as mesmas ocupam no sis-tema temporal-aspetual da LP. É o caso, por exemplo, do modo conjuntivo, dos tempos compostos e da oposição aspetual entre os verbos ‘ser’ e ‘estar’. Por outro lado, a abordagem ou não em contexto formal ou não formal de determinadas es-truturas, isto é, a oportunidade que os aprendentes têm ou não de refletir sobre determinadas estruturas linguísticas em sala de aula, com a orientação de um pro-fessor, terá repercussões ao nível do seu desempenho linguístico. Verificou-se, por exemplo, que, no primeiro grupo de questões do teste linguístico, os informantes se basearam frequentemente na identificação dos tempos verbais para descodifica-rem o valor temporal das frases, o que resultou num desempenho menos positivo nos casos em que era estabelecido um ponto de referência diferente do momento da enunciação (através de orações temporais) e os tempos verbais assumiam valo-res secundários. Este facto indicia que os aprendentes estarão mais familiarizados com os valores prototípicos dos tempos verbais, o que leva a supor que estes se-rão privilegiados em contexto de sala de aula, em detrimento dos valores secundá-rios. Da mesma forma, constatou-se que, dos seis professores entrevistados, apenas uma professora aborda nas suas aulas o modo conjuntivo, pelo que a apro-priação dos tempos do modo conjuntivo se restringe, na maior parte dos casos, ao contexto informal e ao contexto de autoaprendizagem. Esta realidade justifica-se, em parte, pelo facto de a oferta formativa em Português para estrangeiros adultos, atualmente, se limitar ao nível de iniciação, e, logo, não ser possível abordar todos os tempos verbais, nem com a mesma profundidade. No entanto, verifica-se que, por vezes, a seleção que os professores fazem dos tempos verbais a abordar e dos valores temporais-aspetuais que estes podem veicular não é a mais adequada a este público e às suas necessidades comunicativas. Como se observou, estas pren-dem-se maioritariamente com a oralidade, pelo que não se justifica que sejam pri-vilegiados o pretérito mais-que-perfeito simples, o futuro (simples e composto) do indicativo e o modo condicional (simples e composto) em detrimento dos tempos do modo conjuntivo ou de certos valores dos tempos verbais, como o valor iterati-vo que o pretérito perfeito composto do indicativo pode assumir, ou o uso do pre-

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térito imperfeito do indicativo como substituto do condicional simples e do pretérito mais-que-perfeito composto como substituto do condicional composto. Acresce que muitos dos aprendentes que frequentam estes cursos de iniciação já estão em Portugal há vários anos, já dominam minimamente ou razoavelmente a LP e aca-bam por não refletir nas aulas sobre estruturas linguísticas que fazem parte do seu dia a dia há anos, mas que, frequentemente, ainda não conseguem utilizar com propriedade, correção e adequação. Daí, também, a urgência de serem criados cursos de LP de nível mais avançado, como está previsto no II Plano para a Inte -gração dos Imigrantes (cf. Presidência do Conselho de Ministros, 2010).

4 Considerações finais: pistas de intervenção

Tendo em consideração as conclusões que acabámos de apresentar, bem como as sugestões avançadas pelos informantes, sintetizamos, agora, algumas pistas de in-tervenção que acreditamos poderem contribuir para a melhoria do ensino/ apropri-ação da LP por parte do público-alvo.

Retomando o que acabámos de constatar, afigura-se como fulcral a criação de cur-sos de LP de nível mais avançado, dado que os existentes se limitam a um nível inicial da língua e, passada essa fase de aprendizagem, os aprendentes não dis-põem de qualquer outro meio que lhes permita aprofundar os seus conhecimentos e competências linguísticos e comunicativos em LP sob a orientação e com o apoio de um professor.

Também no que se refere aos contextos formal/ não formal de apropriação da LP, os dados apresentados sugerem que é pouco significativo o recurso a outras lín-guas. O facto de os aprendentes, na sua maioria, não dominarem línguas que facil -mente poderiam ser utilizadas no ensino da LP (por exemplo, Inglês, Francês ou Espanhol) parece ser um impedimento. No entanto, se o professor conseguir expli -car determinado conteúdo gramatical recorrendo aos conhecimentos de uma lín-gua que apenas um ou dois aprendentes compreendam, esses aprendentes poderão depois explicar esse conteúdo nas suas LMs ao resto da turma (como vi-mos, é frequente a interajuda entre os aprendentes recorrendo ao Russo ou a ou-tra língua comum), e o que poderia parecer uma estratégia útil apenas para uma minoria seria, na realidade, uma estratégia que beneficiaria a maioria.

Por outro lado, as LMs dos aprendentes desempenham, na maioria das vezes, um papel secundário na apropriação da LP, quando é aí que reside o grande capital linguístico que pode ser rentabilizado. O facto de os professores não dominarem as LMs dos aprendentes dificulta a sua inclusão na sala de aula, mas não tem de re-presentar necessariamente um entrave. O professor pode recorrer aos conheci-mentos dos próprios alunos, questionando-os sobre quais as formas de expressão de determinados significados nas suas LMs e sobre a proximidade e/ou divergência entre essas formas e as equivalentes em LP, levando-os, desta forma, a eles pró-

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prios compararem os dois sistemas linguísticos, com a sua orientação.

Estas estratégias serão ainda mais profícuas se o professor detiver, de antemão, alguns conhecimentos sobre o funcionamento das LMs dos aprendentes, ou, em alternativa, do Russo, que constitui uma língua comum à maior parte deste público e que funciona já como língua de mediação entre os aprendentes. Para isso, seria útil a frequência de ações de formação ou cursos especificamente sobre línguas eslavas, de preferência em que fossem abordadas formas de rentabilizar as dife-renças/ semelhanças com a LP em sala de aula. Estes conhecimentos, para além de poderem ser postos em prática em atividades de comparação linguística, seriam uma base de trabalho para o professor compreender as dificuldades dos aprenden-tes, bem como uma forma de se aproximar dos aprendentes, criando laços socioa-fetivos. Como se constatou, há uma predisposição por parte dos professores para a frequência de cursos deste género, havendo, no entanto, pouca ou nenhuma oferta formativa.

Também a nível de materiais didáticos se verifica a necessidade de um maior in-vestimento. Por um lado, seria útil existirem materiais bilingues, que os aprenden-tes pudessem inclusivamente utilizar sozinhos – dado que os informantes afirmam dedicar-se autonomamente ao estudo da LP; por outro, materiais de apoio ao pro-fessor, com atividades de comparação linguística que facilmente pudessem ser im-plementadas na aula, bem como explicitações linguísticas, em alternativa ou como complemento à frequência de cursos de formação sobre línguas eslavas.

Por fim, a integração efetiva de imigrantes na sociedade de acolhimento beneficia-ria da criação de mais oportunidades formais e informais de convivência e de inte-ração verbal entre imigrantes e nativos, quer para o desenvolvimento de competências comunicativas, quer para o estreitamento de laços socioafetivos, uma vez que, para muitos imigrantes, essas oportunidades são reduzidas e cir-cunscrevem-se, frequentemente, à interação casual em serviços de atendimento ao público.

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