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Page 1: Saúde Alimentar - apps.einstein.brapps.einstein.br/revista/arquivos/PDF/840-EC v6n1p41-3.pdf · clínica, segurança e higiene alimentar, gastronomia e saúde pública serão tópicos

einstein: Educ Contin Saúde. 2008, 6(1 Pt 2): 41-43

Saúde AlimentarEsta seção tem o objetivo de atualizar o leitor em relação à nutrição e saúde alimentar. A alimentação saudável e segura, baseada em informações atuais, pode se refletir na qualidade de vida dos indivíduos e nos tratamentos de saúde a ela associados. Nutrição clínica, segurança e higiene alimentar, gastronomia e saúde pública serão tópicos desta seção.

Silvia Maria Fraga PiovacariEditora da seção

ImunonutriçãoSilvia Maria Fraga Piovacari1, Mayumi Shima2, Rosana Cardoso3, Roselaine Maria Coelho Oliveira4 1 Especialista em Nutrição Clínica, Nutricionista do Hospital Israelita Albert Einstein –HIAE, São Paulo (SP), Brasil. 2 Especialista em Nutrição Clínica, Nutricionista da Unidade de Terapia Intensiva Adultos do Hospi-tal Israelita Albert Einstein – HIAE, São Paulo (SP), Brasil. 3 Especialista em Nutrição Clínica, Nutricionista do Centro de Diálise e Transplante Renal do Hospital Israelita Albert Einstein – HIAE, São Paulo (SP), Brasil. 4 Especialista em Nutrição Clínica, Nutricionista da Divisão de Prática Assistencial e Referência da Equipe Multiprofissional de Terapia Nutricional do Hospital Israelita Albert Einstein – HIAE, São Paulo (SP), Brasil.

Evolução dA imunonutriçãoMuito se tem discutido sobre a indicação do uso da nutrição enteral na manutenção do trato gastrintestinal, prevenindo a translocação bacteriana. Nos últimos anos, o sistema imunológico tem demonstrado importância cada vez maior em terapia intensiva. Sabe-se que diversas moléculas pró e antiinflamatórias desempenham papel fundamental no desenvolvimento de lesão orgânica e na susceptibilidade a infecções. Conhecimento recente mostra que diversos nutrientes têm capacidade de modular o sistema imunológico, via ativação de linfócitos e macrófagos, produção de moléculas vasodilatadoras, inibição da função neutrofílica e estímulo hormonal. Estudos sugerem a utilização de nutrientes específicos, os quais têm a capacidade de interferir tanto na resposta inflamatória quanto na resposta imune. Esse conceito tem conduzido à suplementação das dietas enterais com tais substâncias, denominadas nutrientes imunomoduladores, que incluem arginina, glutamina, cisteína, nucleotídeos, ácidos graxos, fibras, vitaminas A, C, E, zinco, que podem ter ação direta ou indireta no sistema imune.

ArgininAAuxilia na produção de uréia e na síntese protéica. É um aminoácido essencial em situações especiais como trauma, queimaduras e durante as fases de crescimento. A arginina tem múltiplas propriedades biológicas, incluindo sua habilidade de estimular a secreção de hormônios anabólicos. É precursora do óxido nítrico, que é um importante vasodilatador e agente oxidativo, danoso às células, devendo-se, portanto, ter cuidado com a sua suplementação em pacientes com problemas cardiovasculares. Sua deficiência compromete os mecanismos de imunidade celular, particularmente a função das células T. A suplementação de arginina tem como efeito o aumento do peso do timo e número de linfócitos T, crescimento tumoral diminuído e menor incidência de infecção. A recomendação é de 17 g arginina por dia ou 2 a 4% do valor calórico total (VCT). Outro autor recomenda acima de 12 g por dia (0,3 a 0,5g por kg por dia) ou 4 a 6% VCT.(1-3)

glutAminAÉ um aminoácido não-essencial e principal fonte de energia das células de rápida proliferação, como as células do trato digestório, além de ser utilizado como combustível para os imunócitos, principalmente, macrófagos e linfócitos. A glutamina também é necessária para a síntese de nucleotídeos das células em divisão e é precursora na síntese de glutationa. Auxilia na síntese da uréia, transportando a amônia da periferia para os órgãos viscerais. Baixa concentração intracelular de glutamina pode afetar adversamente o metabolismo protéico corporal em situações de estresse.

As principais fontes endógenas de glutamina são os músculos esqueléticos e os pulmões. Em algumas

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condições específicas como trauma, sepse, corticoterapia e atividade física, as reservas de glutamina diminuem rapidamente e as necessidades de glutamina podem ser maiores à capacidade corpórea de síntese deste aminoácido, levando à diminuição da concentração intracelular e plasmática de glutamina.

Esse aminoácido tem papel metabólico duplo nos linfócitos. É fonte primária de energia e de precursores de carbono e nitrogênio para a biossíntese de nucleotídeos necessária à proliferação celular. Foi proposto que a depleção pós-trauma de glutamina é fator fundamental para a supressão das funções macrofágicas nessa condição. A redução da disponibilidade de glutamina em pacientes graves pode provocar a quebra da barreira da mucosa intestinal nesses pacientes, que pode levar ao estado hipermetabólico crônico, falência de múltiplos órgãos e à sepse. A redução da concentração intracelular de glutamina parece estar correlacionada com a gravidade da lesão e da sepse, e está associada à alta mortalidade.

A glutamina é o combustível oxidativo preferencial dos enterócitos, essencial para manutenção da estrutura e funções normais do trato gastrintestinal, o que pode prevenir a translocação bacteriana. A recomendação de glutamina para adultos é de 0,57 g/ kg por dia.(1,4,5)

CiStEínAÉ um aminoácido produzido a partir da metionina, precursor da síntese de glutationa, que tem papel protetor do organismo contra o efeito dos radicais livres. Estes podem estar relacionados ao estresse oxidativo e resultar em morte celular e danos teciduais. No adulto saudável, a biossíntese endógena é suficiente para suprir as necessidades de cisteína e, conseqüentemente, glutationa. Em indivíduos sob estresse, a conversão entre metionina e cisteína pode acontecer de forma lenta, levando a aportes inadequados de cisteína e glutationa. A cisteína pode ser encontrada em diferentes concentrações nas fontes protéicas das formulações enterais. Nas formulações parenterais, a cisteína livre não é suplementada, pois é instável em solução. A suplementação de cisteína também não é recomendada porque é rapidamente metabolizada e se torna tóxica quando suplementada em excesso. Atualmente, a maior parte das formulações parenterais e enterais, utilizam a metionina em sua composição, pois ela funciona como precursora da cisteína. O papel da cisteína, entre um antioxidante protetor do sistema imune ou um imunomodulador ativo ainda é controverso.(3,5,6)

nuClEotídEoSSão representados pelas purinas e pirimidinas, precursores do ácido desoxirribonucléico (DNA) e ácido

ribonucléico (RNA) e são considerados condicionalmente essenciais em situações de estresse elevado. Participam em quase todos os processos bioquímicos e são reguladores metabólicos e componentes da maioria das coenzimas como NAD+

, FAD e Coenzima A. Sua presença na dieta é necessária para máxima função dos linfócitos T auxiliares e a sua deficiência prejudica a função fagocitária dos macrófagos, suprime a resposta imune celular in vitro, aumentando a susceptibilidade à infecção. A recomendação de nucleotídeos é de 1 a 2 g por dia.(3,5,6)

ÁCido linolêniCo (ÔmEgA-3 ou w3)Componente essencial das membranas celulares, o áci-do linolênico é também precursor de prostaglandinas, tromboxanos, prostaciclinas da série 3 (imunoestimu-ladoras) e leucotrienos da série 5. A deficiência pode causar deficit neurológico, dermatite e alterações imu-nológicas. O excesso inibe a produção de prostaglandi-nas derivadas do ácido linoléico, melhorando a resposta imune celular. A recomendação de ômega 3 é de 0,5 a 1% VCT. (1,3,6)

ÁCido linoléiCo (ÔmEgA 6 ou w6) Componente essencial das membranas celulares, o ácido linoléico é metabolizado para numerosos compostos biologicamente ativos, incluindo prostaglandinas, prostaciclinas, e tromboxanos da série 2 e leucotrienos da série 4. Estas prostaglandinas possuem ação inumossupressora, causam agregação plaquetária e vasoconstrição. A deficiência do w6 pode causar dermatite e retardo na cicatrização de feridas cirúrgicas. A oferta excessiva de w6 tem um impacto negativo sobre a imunocompetência e sobrevida. A composição das membranas é modificada pela composição de ácidos graxos da dieta, sendo que a quantidade de w3 e w6 veiculada pela alimentação modula o teor destes na parede celular. A recomendação de ômega 6 é de 10 a 15 g por dia e a relação W6:W3 é de 4 a 10:1, e para pacientes graves é 3:1.(1,3,6)

lípidES EStruturAdoSSão constituídos por uma mistura química de triglicérides de cadeia média/triglicérides de cadeia longa (TCM/TCL). A modificação dos ácidos graxos do triglicéride pode implicar em uma variedade de efeitos farmacológicos distintos. Dentre eles, a modulação da produção de prostaglandinas e leucotrienos, a alteração da resposta inflamatória, modificação estrutural das membranas celulares e formação de ateromas.(1,5,6)

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FibrASPodem colaborar na resposta imunológica por meio de uma ação sistêmica e local. A ação local é decorrente da própria presença das fibras no tubo digestivo e é resultado das características físico-químicas dessas. A ação sistêmica acontece após a fermentação das fibras pelas bactérias colônicas, resultando na produção de acetato, butirato e propionato, os quais, após absorção e metabolização pelo fígado, atuam sobre a manutenção da integridade das células intestinais, prevenindo a translocação bacteriana e desempenhando papel imunomodulador indireto.(1,5,6)

vitAminA AÉ necessária para resposta inflamatória normal. Deficiência de vitamina A vem sendo associada a aumento da susceptibilidade à infecções e diminuição da produção de leucócitos e linfócitos, de células T e B, complemento e síntese de colágeno, bem como reação de hipersensibilidade retardada e aumento da susceptibilidade a alguns tumores. O aumento da ingestão de vitamina A melhora a função imune em casos de queimaduras, traumas cirúrgicos e câncer.(1,5,6)

vitAminAS E E CDietas com suplementação de antioxidantes como vitaminas E e C são usadas com o objetivo de prevenir a atuação dos radicais livres, que são produzidos em muitas doenças agudas e crônicas e levam à peroxidação lipídica e à ruptura de membranas celulares, com conseqüente morte celular. Até o momento, os estudos sobre o papel protetor destes nutrientes imunomoduladores indiretos ainda são inconclusivos e limitados.(1,5,6)

ZinCoAtua como co-fator em uma variedade de sistemas en-zimáticos, sendo vital para a síntese protéica. A defi-ciência de zinco pode causar atrofia do tecido linfóide e produzir anormalidades, tanto na resposta imunitária

celular como humoral, além de aumentar a susceptibi-lidade à infecção. A redução da concentração de zinco nas membranas celulares tem sido associada ao aumen-to da probabilidade de danos oxidativos.

São poucas as informações disponíveis relativas aos efeitos de outros minerais tais como manganês, cobre, magnésio e selênio sobre a resposta imune.(1,5-6)

ConCluSõESExistem diversas dietas imunomoduladoras comercial-mente disponíveis e a grande maioria não contempla apenas um nutriente, mas fornece diversos elementos imunomoduladores. Contudo, o seu uso rotineiro deve ser visto com cautela pela falta de estudos adequados.

Os estudos clínicos com dietas imunomoduladoras ainda têm, em sua maior parte, desenho e metodologia insuficientes, sendo necessários estudos mais detalhados, limitando-se a estudar um nutriente por vez.

Deve ser considerado o uso de dietas imunomodu-ladoras ainda experimentais, exceto para pacientes em pré e pós-operatórios eletivos de cirurgias oncológicas, cirurgia eletiva do trato digestório superior. Os pacien-tes que recebem o maior benefício são aqueles que apresentam desnutrição pregressa.

rEFErênCiAS1. Kreymann KG, Berger MM, Deutz NE, Hiesmayr M, Jolliet P, Kazandjiev G,

Nitenberg G, van den Berghe G, Wernerman J; DGEM (German Society for Nutritional Medicine), Ebner C, Hartl W, Heymann C, Spies C; ESPEN (European Society for Parenteral and Enteral Nutrition). ESPEN Guidelines on Enteral Nutrition: Intensive care. Clin Nutr. 2006;25(2):210-23.

2. Sacks GS, Genton L, Kudsk KA. Controversy of immunonutrition for surgical critical-illness patients. Curr Opin Crit Care. 2003;9(4):300-5.

3. McCowen KC, Bistrian BR. Immunonutrition: problematic or problem solving? Am J Clin Nutr. 2003;77(4):764-70.

4. Schulman AS, Willcutts KF, Claridge JA, Evans HL, Radigan AE, O’Donnell KB, et al. Does the addition of glutamine to enteral feeds affect patient mortality? Crit Care Med. 2005;33(11):2501-6.

5. Waitzberg DL. Imunonutrição. In: Waitzberg DL. Nutrição oral, enteral e parenteral na prática clínica. São Paulo: Atheneu; 2001. p. 1511-38.

6. Consensus recommendations from the US summitt on immune-enhancing enteral therapy. JPEN J Parenter Enteral Nutr. 2001;25(2 Suppl):S61-3.