sala preta edélcio mostaço - sobre a história do teatro brasileiro

Upload: tata-freitas

Post on 13-Jan-2016

9 views

Category:

Documents


0 download

DESCRIPTION

Sala Preta

TRANSCRIPT

  • Consideraes sobre Histria do teatro brasileiro

    Considerations on Histria do teatro brasileiro

    Edelcio Mostao

    Edelcio MostaoProfessor do Departamento de Artes

    Cnicas e do PPGT da UDESC

    DOI: 10.11606/issn.2238-3867.v15i1p249-264

    sala preta Em Pauta

  • Edelcio Mostao

    250 Revista sala preta | Vol. 15 | n. 1 | 2015

    Resumo

    O texto aborda defasagens metodolgicas e discursivas existentes no

    livro Histria do teatro brasileiro, obra coordenada por Joo Roberto

    Faria. Mencionado em dois de seus captulos, sinto-me na obrigao

    de refutar as objees ali presentes, salientando divergncias e pon-

    tos de vista.

    Palavras-chave: Histria, Teatro brasileiro, Historiografia, Moderno.

    Abstract

    This paper aims to analyze methodological and discursive gaps exist-

    ing in the book Histria do teatro brasileiro, work coordinated by Joo

    Roberto Faria. Since I have been mentioned in two of its chapters, I

    feel in obligation to refute authors objections and points of view.

    Keywords: History, Brazilian theatre, Historiography, Modern.

    Grande lanamento editorial recente, Histria do teatro brasileiro, em-

    preitada dirigida por Joo Roberto Faria (2013) para a editora Perspectiva, d

    um exemplo editorial dos mais meritrios cultura do pas. Empreendimento

    de alto voo que reuniu mais de quarenta pesquisadores para sua redao,

    demandou mais de cinco anos de tratativas para ser levado a termo, finan-

    ceiramente socorrido pelo SESC-SP na coedio da obra. Saudadas suas

    qualidades, resta discutir seu contedo.

    A leitura dos dois volumes d a impresso, num primeiro momento, de

    que poderiam ter sido forjados por Dcio de Almeida Prado. Como se sabe,

    o notvel crtico paulistano almejou tal projeto, tendo estudos nessa direo.

    Tal impresso diz respeito no apenas ao aproveitamento desse material nos

    trs captulos iniciais, mas tambm arquitetura conceitual que a presidiu

    em sua totalidade, fortemente lastreada na literatura dramtica a despeito

    de Dcio ter clareza da natureza performtica da cena. Adepto da postura

    metodolgica de Antonio Candido, o crtico fazia uma leitura de nosso pas-

    sado cnico paralela ao campo literrio, onde momentos decisivos foram

    valorizados em detrimento de outros componentes. Nesse vis, no foi outro

    o caminho empreendido por Joo Roberto Faria, autoconfesso seguidor do

    mestre, que idealizou os demais captulos, encomendou-os a especialistas e

  • Revista sala preta | Vol. 15 | n. 1 | 2015 251

    Consideraes sobre Histria do teatro brasileiro

    arrematou, por meio de discretas intervenes, as inter-relaes de redao

    entre uns e outros.

    Faltaram, desde o incio, delimitar e configurar uma plataforma concei-

    tual que amparasse sua redao, ficando cada pesquisador atirado prpria

    sorte. Ou confiou-se que todos partilhassem os mesmos conceitos, ou jo-

    gou-se no escuro, espera da colheita. O fato que a obra apresenta prob-

    lemas, dentre os quais gostaria de situar os que me soam mais evidentes.

    Em funo do aludido vis estetizante, a obra no efetiva correlaes

    bem articuladas entre a cena e os processos socioculturais do pas. Corre-se

    o risco de supor que a atividade cnica nacional deu-se acima dos acidentes

    de percurso da nao, de sua institucionalizao enquanto Estado, de seus

    conflitos de poder, de suas lutas internas e externas, seus golpes de Estado,

    perodos de censura ou suas oscilaes econmicas que geraram crises na

    circulao da moeda e, sobretudo, acima dos dilemas da sociedade para a

    qual tal teatro foi apresentado e que o sustentou ou deu-lhe as costas, ao

    sabor de suas preferncias. Sobre tais lacunas, bastam poucos exemplos: a

    poltica de encilhamento de Rui Barbosa, no incio da Repblica, depauperou

    a populao e os teatros ficaram s moscas, fato sequer mencionado. O Es-

    tado Novo de Getlio Vargas (1937-1945) criou um bem organizado aparato

    repressivo contra seus opositores, que constituiu o pano de fundo contra o

    qual lutou nosso modernismo artstico, ignorado na obra. O chamado mi-

    lagre econmico, forjado pelos militares no ps-1964, tambm ignorado, in-

    cluiu, entre outros procedimentos de atuao ideolgica, o revigoramento do

    Servio Nacional de Teatro (snt), bastante ativo a partir de 1974, socorrendo

    ideologicamente o regime. Cada um desses incidentes pode admitir leituras

    variadas, mas incidncias histricas no devem ser alteradas ou suprimidas

    ao bel prazer do historiador.

    Embora Dcio defendesse a trade obra, autores e pblico como fun-

    dadora do fenmeno histrico teatral, o terceiro elemento passou inclume

    nessa coletnea, no havendo qualquer considerao sobre o pblico, as

    plateias que acorriam aos espetculos, impedindo uma viso mais objetiva

    sobre o fenmeno. Se tal averiguao era particularmente espinhosa at o

    final do sculo xix, ao longo do sculo passado dispomos da Sociedade Bra-

    sileira de Autores (sbat) como fonte fidedigna para quantificar a recepo, mas

    esse detalhe passou longe da arquitetura da obra, uma vez privilegiados os

    textos dramticos e seus autores.

  • Edelcio Mostao

    252 Revista sala preta | Vol. 15 | n. 1 | 2015

    Captulos

    Reputo o primeiro captulo, dedicado ao teatro da misso jesutica, um

    dos mais problemticos do conjunto. Redigido por Dcio no incio dos anos

    1970, insiste sobre a leitura dos autos remanescentes de Jos de Anchieta,

    mas ignora fatos bastante relevantes e conhecidos sobre o que foram aqueles

    escritos. Ao menos uma dzia de dissertaes e teses j efetivadas localiza

    com acuidade diversos problemas ali existentes. Um deles o epteto teatro

    de Anchieta, uma vez que o material foi redigido e praticado por inmeras

    outras figuras alm do venervel novo santo brasileiro. Outro que no

    possvel desligar tal aparato catequtico-pedaggico em que tal produo se

    insere de um programa bem mais amplo articulado pela Companhia de Jesus

    em relao s suas funes de dominao, ponto inicial de um projeto de

    conquista espiritual consolidado tempos depois. Por ltimo, a total omisso

    cultura dos indgenas que aqui viviam, uma vez que aquela ao missionria

    foi um processo de luta intercultural, na qual o teatro era apenas uma das

    estratgias.

    Desde Levy-Strauss tem havido proveitosa releitura de nosso passado

    colonial luz, exatamente, desses intercursos socioculturais, com ampla van-

    tagem para a considerao das culturas indgenas. Tal compreenso, todavia,

    destoa do momento decisivo privilegiado por Dcio, razo pela qual ele sac-

    rificou a abrangncia histrica em funo da ideologizao desenhada e que

    revela insuficincia para enquadrar, no apenas aquele, outros momentos

    tomados como fundadores.

    Os demais captulos do volume 1 seguem essa acentuada tnica

    literria, priorizando o estudo pelos gneros e subgneros nos quais se ex-

    primiu. Tal modo de exposio no ajuda na compreenso do fenmeno cni-

    co, muito menos baliza e situa as efemrides histricas e simblicas de nos-

    so passado, como foram a implantao do Teatro So Joo, a abertura do

    Conservatrio Dramtico ou a inaugurao do Alcazar Lyrique, trs marcos

    do sculo xix diretamente associados ao desenvolvimento sociocultural de

    nossas prticas de palco, em detrimento daquilo que, como sugeriu Foucault

    (2002, 2012), poderia ser o fulcro de uma histria: a escritura da genealogia

    de uma prtica. Honroso destaque deve ser creditado ao captulo dedicado

    aos espetculos e interpretao dos romnticos, de Luiz Fernando Ramos,

    verdadeira escavao inovadora e arqueolgica.

  • Revista sala preta | Vol. 15 | n. 1 | 2015 253

    Consideraes sobre Histria do teatro brasileiro

    no segundo volume, todavia, dedicado ao teatro moderno e contem-

    porneo, que os maiores problemas se concentram. Joo Roberto encomen-

    dou-os a notrios especialistas e talvez por essa razo um tom ensastico e

    interpretativo percorra cada um deles, evidenciando outro rumo argumenta-

    tivo dos captulos do primeiro volume. H, em geral, maiores referncias s

    prticas de palco, embora a dramaturgia nele tambm cintile em destaque.

    Tnia Brando assina o captulo chave desse volume, dedicado s

    companhias profissionais modernas, fixando no apenas algumas idiossin-

    crticas balizas historiogrficas, bem como imprimindo o tom discursivo que

    o sustenta in totum. Para situar a questo moderna, ela evoca o termo reed-

    io querendo significar que a necessria superao da antiqualha cnica

    presente nas primeiras dcadas do sculo xx correspondeu quela almejada

    ao final da centria anterior, a mesma preocupao com a superao de um

    abismo, a distncia que separaria o pas do mundo dito civilizado (p. 80). Tal

    proposio, segundo ela, torna-se fundamental para sustentar o entendimen-

    to das mudanas do teatro brasileiro na segunda metade do sculo xx, isto ,

    a era do teatro moderno e do encenador (p. 80, grifo da autora).

    Tal clculo se evidencia excntrico: ou no se est chamando as cois-

    as pelo seu nome ou os fatos esto sendo atropelados ao sabor das letras.

    O pas no era civilizado no porque a cena nacional se mostrasse inculta,

    mas porque um tenebroso regime escravocrata andava de mos dadas com

    um Estado ainda imperial, num momento em que toda a Amrica j superara

    tais patamares brbaros. Por outro lado, as primeiras cogitaes estticas

    modernistas comeam a ganhar consistncia entre ns em meados da se-

    gunda dcada do sculo xx, num momento em que a Europa vivia estarrecida

    a Primeira Guerra. O fim da Belle poque significou, igualmente, no Brasil, a

    despedida do sculo xix e da srie de revoltas que, iniciadas em 1918 com o

    levante do Forte de Copacabana, culminaram na Revoluo Liberal de 1930,

    perodo da longa agonia da oligarquia fundiria.

    No se compreende, portanto, o raciocnio da autora em relao ao

    predomnio do encenador na segunda metade do sculo xx se, desde Renato

    Vianna e sua A ltima encarnao de Fausto, em 1924, j se sabia ser o mes-

    mo a figura mestra e indispensvel ao teatro moderno, a despeito daquele

    fracassado empreendimento. A crtica de Antnio Alcntara Machado, a atu-

    ao do casal lvaro-Eugnia Moreyra e sobretudo a encenao de Flvio de

    Carvalho para seu Bailado do deus morto, em 1933 lastrearam e dissemina-

  • Edelcio Mostao

    254 Revista sala preta | Vol. 15 | n. 1 | 2015

    ram em toda extenso o iderio e as implicaes cnicas modernas, dcadas

    antes, portanto, da segunda metade do sculo xx, como cogita Brando.

    Ao lado desse assincronismo estrutural, existem, porm, alguns des-

    vos pontuais problemticos. Dois captulos analisam a trajetria do Teatro

    de Arena e do chamado teatro de resistncia, mas no houve detalhamento

    assemelhado em relao aos grupos Oficina, Opinio ou atuao de Ruth

    Escobar, lacunas irreparveis, uma vez que ocuparam posies de absoluto

    destaque ao longo dos anos 1960.

    Escrevi sobre a questo experimental, atendendo demanda de pro-

    duzir um captulo interpretativo e ensastico, razo pela qual fiz referncias

    a tais nomes, mas sem aprofundar nenhuma de suas trajetrias por no ser

    esse o propsito. Pensava eu que estivessem sendo objeto analtico de outros

    captulos, o que resultou em um equvoco.

    Faltou ao teatro praticado nos anos 1970 e 1980 uma viso de conjun-

    to ou de seus detalhes, o que deixou de fora muita coisa, bem como alguns

    pontos chave para o entendimento do que veio depois, tais como a atuao

    de companhias como a de Othon Bastos, Antnio Fagundes e Antnio Abu-

    jamra, e, no Rio de Janeiro, o Teatro Ipanema e o Teatro dos Quatro, alm

    da atuao contnua de nomes como Renata Sorrah, Dina Sfat, Raul Cortez,

    Beatriz Segall, Juca de Oliveira, Christiane Torloni, Regina Duarte, Fernanda

    Montenegro, Paulo Autran, entre outros, divididos entre o palco e a televiso.

    Ainda, a segmentao temtica adotada relegou condio de apndice

    o teatro de rua e o teatro de animao como expanses secundrias, como

    se o pas no tivesse reconhecimento internacional nessas modalidades e

    inmeros artistas no se dividissem entre os modos de palco e esses outros

    meios expressivos, e um ininterrupto dilogo no tivesse se produzido entre

    todos eles na configurao global dos fenmenos cnicos das dcadas mais

    recentes.

    O fundo e a forma

    Sou citado por Tnia Brando (2013, p. 87) em seu texto por ter divi-

    dido na redao do verbete Moderno para o Dicionrio do teatro brasile-

    iro (GUINSBURG; FARIA; LIMA, 2006), em duas tendncias antagnicas as

    consideraes dos diversos analistas que at ento haviam se debruado

    sobre o tema: os adeptos de uma linha evolutiva e os da ruptura razo pela

    qual evidenciei o fato como um problema a ser deslindado pela teoria te-

  • Revista sala preta | Vol. 15 | n. 1 | 2015 255

    Consideraes sobre Histria do teatro brasileiro

    atral brasileira. Por que um problema? Porque as explicaes no partem de

    raciocnios convergentes ou metodologicamente compatveis, mostrando-se

    assimtricos em razo de que tal debate s pode ser coerentemente dimen-

    sionado por meio do entrecruzamento de duas ordens de consideraes: a

    emergncia da modernidade estrutural do pas e o modernismo artstico de

    seus agentes culturais. Se forem adotados outros raciocnios histricos, crti-

    cos e estticos, que priorizem outros valores em torno dos quais as posturas

    se encontram assentadas.

    Todos os que acompanham em mido esse debate esto cientes das

    progressivas contestaes, em diversas publicaes recentes, quanto s pos-

    turas crticas que disputam hegemonia em torno da questo, especialmente

    aps os anos 1990, quando a redemocratizao estimulou novas investidas

    sobre ngulos que, aparentemente, encontravam-se resolvidos (PEREIRA,

    1998; COSTA, 1998; MILAR, 2009; SIMES, 2010; RIEGO, 2010)1. Vejamos

    os termos dessas disputas.

    Se a oposio entre profissional versus amador revela, de sada, im-

    propriedade conceitual para separar as prticas cnicas em jogo, uma vez

    que a arte moderna foi, em todos os quadrantes, obra de amadores, salta

    aos olhos a oposio entre os debatedores sobre a valorao do que era ou

    no moderno, notadamente no captulo aqui em destaque. Por outro lado,

    o processo de modernizao ou o advento da modernidade nos pases in-

    dustrializados no foi uniforme nem cabal, fazendo que uma data ou evento

    isolado desfrute pouco peso quanto a tais processos amplos e diversificados

    que, em no raros casos, abarcaram mais de uma gerao. Num pas per-

    ifrico como o Brasil, com uma abolio da escravatura tardia e uma jovem

    repblica autoritria mantida por estamentos, mais formal que real, somente

    um ato de fora como a Revoluo de 1930 conseguiu pr fim poltica oli-

    grquica vigente desde o Imprio, onde se opunham liberais a conservador-

    es na manuteno de um mesmo status quo. Entre 1922 (a Semana de Arte

    Moderna) e 1937 (Estado Novo) alojam-se tenses, clivagens e disputas

    polticas em torno de direitos civis e estatuto da cidadania cujas lgicas so

    excludentes entre si, razo maior pela qual a alterao de mentalidades, e

    especialmente de prticas, no se deu por decretos ou atos voluntaristas.

    Ou seja, a despeito dos reclamos modernistas de um Alcntara Machado ou

    1. Embora o foco analtico continue privilegiando o eixo Rio/So Paulo, preciso no se esquecer de outros cenrios em disputa, em outras capitais do pas. Nesse sentido, ver Leo (2006) e Cadengue (2011).

  • Edelcio Mostao

    256 Revista sala preta | Vol. 15 | n. 1 | 2015

    das atuaes de Renato Vianna, lvaro-Eugnia Moreyra ou Flvio de Car-

    valho, as prticas cnicas profissionais no se alteraram em seus padres

    dezenovistas, embora um agudo debate intelectual tenha animado aquelas

    dcadas. At 1930 o modernismo foi uma ideia, mas sua real implantao s

    comeou aps essa data.

    A dcada compreendida entre 1938 e 1948 (fundaes do Teatro do

    Estudante do Brasil teb e do Teatro Brasileiro de Comdia tbc) foi crucial

    para a implantao da modernidade estrutural no pas e, igualmente, de nosso

    modernismo esttico cnico por meio da atuao de amadores subsumidos

    aos imperativos da encenao. Eles atuaram, bom frisar, contra um pano de

    fundo autoritrio e persecutrio sob censura. Vestido de noiva (1943), nesse

    contexto, apenas uma data simblica, que tanto pode regredir a 1938 com o

    Hamlet ou ser adiantada para 1948, com o tbc. O que esse decnio evidencia

    uma progressiva instalao do modernismo nos palcos, sua claudicante

    absoro por parte de nossas plateias e os embates causados com os profis-

    sionais. O termo ruptura foi empregado pela crtica moderna, vale dizer Dcio

    de Almeida Prado e Sbato Magaldi, para caracterizar Vestido de noiva. Mais

    tardiamente, Sbato voltou a invoc-lo a propsito de O rei da vela (1937),

    para regredir o marco simblico at o texto de Oswald de Andrade. Houve sim,

    para a mentalidade moderna, a necessidade de fixar balizas, de estourar a

    monotonia dos relgios, pois todas as revolues modernas almejaram iniciar

    um novo calendrio, um simblico ano zero de renovao.

    Tal , em sua mnima configurao, o quadro estrutural do problema a

    que aludi.

    Tnia Brando, todavia, se pretende ultramoderna ou, qui, ps-mod-

    erna. Para ela, discutvel a tentativa para localizar a ocorrncia de um mov-

    imento moderno no teatro nacional (2013, p. 81), uma vez que nosso teatro

    teria conhecido um desenvolvimento prprio, sem paralelo com a cena inter-

    nacional, atravs de uma trajetria muito peculiar de formulao do novo,

    capaz de desautorizar tanto a noo de progresso como a de quebra (2013,

    p. 82). Para estabelecer as bases desse esotrico raciocnio, distanciado quer

    de uma quer de outra posio, a historiadora recorre, sem artifcios, a um

    estratagema: o apelo ao impulso e ao clamor. Tal estratagema lhe d ensejo

    para relanar a figura do protagonista a personalidade empreendedora ,

    quer dizer, a contraparte cnica da desacreditada figura do heri cantada em

    verso, prosa e melodia por Hegel: a histria enquanto enredo de melodrama.

  • Revista sala preta | Vol. 15 | n. 1 | 2015 257

    Consideraes sobre Histria do teatro brasileiro

    Assim, pelo impulso e pelo clamor, seus heris da modernizao conhece-

    ram trs momentos: os esforos de atualizao, a instrumentalizao poltica

    e a incorporao e luto. O retorno, nessa novel acepo historiogrfica, no

    mais reluz como farsa, mas enquanto pera

    Vejamos o fio desses clculos. Segundo ela, a histria do teatro brasile-

    iro no pode ou no deve ser comparada quela internacional, uma vez que

    possui pulsao prpria e obedece designos peculiares. Devemos, portanto,

    esquecer que Oswald de Andrade passou longas temporadas em Paris, que

    Renato Vianna conhecia Stanislvski, Antoine, Bragaglia ou Meyerhold, que

    Eugnia e lvaro Moreyra assistiram ensaios no Vieux Colombier, que Flvio

    de Carvalho morou dez anos na Europa, que Paschoal Carlos Magno foi em-

    baixador em Londres, que Alfredo Mesquita foi aluno de Dullin, que Dcio

    de Almeida Prado conheceu o circuito teatral norte americano, que Sbato

    Magaldi foi aluno de Ettine Souriau em Paris, que Bibi Ferreira, Itlia Faus-

    ta, Dulcina de Moraes e at Maria Della Costa passaram longas temporadas

    atuando ou estudando em Lisboa, alm de inmeros outros nomes decisivos

    nesse processo que tornaram a ponte Brasil-Europa um vai e vem contnuo.

    Refutar, portanto, as conexes da renovao brasileira luz da ren-

    ovao internacional , no mnimo, estar desatenta a evidncias bem mais

    que peculiares. E o que dizer, ainda, da passagem de Louis Jouvet pelo Rio,

    fartamente referida pelos integrantes dos Comediantes como decisiva para

    que se lanassem aos palcos? Ou das participaes fundamentais de Esther

    Leo, Hoffman Harnish, Ziembinski e a turma da Polnia, e at mesmo de

    Ruggero Jaccobi na fase pr-TBC, todos estrangeiros em suas relaes com

    os amadores da poca?

    As clivagens entre a cena internacional e a nossa podem ser dimensiona-

    das na mesma medida em que a modernidade no conheceu, l e aqui, o mes-

    mo timing, por obra e graa das distintas configuraes sociopolticas, das dif-

    erenas estruturais existentes, dos pronunciados desnveis culturais entre norte

    e sul. Mas negar trnsitos e relaes ria difcil de ser sustentada, mesmo nos

    vocalises de Tnia Bando. Uma das incisivas linhas de investigao contem-

    pornea designada como histria da globalizao, interessada em averiguar

    como ocorreram e ainda ocorrem as desiguais relaes socioculturais entre

    regies do planeta. Nossa historiadora parece estar de costas a essa tendncia.

    Quanto aos esforos pela atualizao, ela destaca a dificuldade do

    teatro profissional em absorver as conquistas modernas dos amadores. Se

  • Edelcio Mostao

    258 Revista sala preta | Vol. 15 | n. 1 | 2015

    isso foi um fato, a continuidade de seu raciocnio volta a embaraar-se. Para

    ela, o ligame entre essas duas margens do Mar Vermelho orbitou ao redor

    de Itlia Fausta, ex-diretora do teb e agora reintegrada ao profissionalismo

    pelas mos de seu sobrinho, o empresrio Sandro Polnio. Tomado pelo

    impulso gerencial e cedendo ao clamor da inovao, concebeu essa per-

    sonalidade empreendedora um repertrio que unia o velho e o novo, o con-

    hecido e o inovador, para dar vida ao Teatro Popular de Arte (tpa), em 1948.

    Foi dessa sinergia operstica que nasceu a primeira companhia moderna,

    reunindo no mesmo palco a veterana atriz e a jovem e desconhecida Maria

    Della Costa.2

    Tal raciocnio insiste na diviso amador-profissional como um estigma

    a ser sustentado e, nesse caso, cooptado; em seguida, faz uma conciliao, e

    no um enfrentamento, como foi da natureza dos entrechoques entre as duas

    mentalidades e ainda, bem antes do tpa, outras companhias profissionais j

    davam sinais de mudanas e inovaes, como a de Dulcina-Odilon, de Bibi

    Ferreira e at mesmo Procpio Ferreira, o que enfraquece seu argumento.

    Alm disso, o tpa no aguentou mais que duas temporadas, desfazendo-se

    na prtica e migrando para So Paulo, para ressurgir apenas em 1954 com a

    inaugurao de sua casa de espetculos, aps Maria ter trabalhado para o tbc.

    Sua tese fundamental, portanto, se configura claudicante, dada a vacilao do

    projeto. Mas o aludido estratagema, contudo, parece ter tambm outro objetivo:

    dirimir a importncia e o decisivo papel desempenhado pelo tbc no processo

    de modernizao e, com isso, devolver sub-repticiamente ao Rio de Janeiro a

    hegemonia sobre a cena nacional. Em apoio a esse particularismo, a historia-

    dora chega a invocar, de modo bastante arbitrrio, a fase amadora do paulista-

    no tbc como evidncia de que Franco Zampari estaria apenas continuando a

    joie de vivre ao reformar um prdio de trs andares para nele abrigar uma efi-

    ciente casa de espetculos e constituir uma sociedade com mais de duzentos

    scios para amparar sua iniciativa, que no passaria de quimrica aspirao a

    ser autor teatral. O argumento abstruso, uma vez que no se conhece outra

    tentativa de Zampari como autor alm da malsinada A mulher de braos ala-

    dos, levada cena poucos anos antes como divertissement de gr-finos.

    bem verdade que na estreia Mme. Morineau e o elenco do gte uti-

    lizaram o ponto. Insistir nesse pormenor, todavia, como irrefutvel prova de

    2. A trajetria de Maria Della Costa e do tpa, bem como seus desdobramentos, foi estudada por Brando (2009).

  • Revista sala preta | Vol. 15 | n. 1 | 2015 259

    Consideraes sobre Histria do teatro brasileiro

    que o tbc no nasceu sob o signo da modernidade parece falar mal, inver-

    samente, dos prprios raciocnios da autora, que tanto exalta o clamor e o

    impulso como foras motrizes para sua peculiar historiografia. Tanto o Teatro

    de Arte de Moscou quanto o Teatro Livre de Antoine foram produtos de impul-

    sivos combatentes artsticos contra uma mentalidade tacanha e empregavam

    o ponto e a ningum nunca ocorreu negar ali estar em curso a revoluo

    cnica moderna. Tomemos tal passagem to somente como peculiar, por-

    tanto, e concentremo-nos naquilo que efetivamente detm importncia: foi o

    tbc, e no o tpa, a primeira companhia estruturalmente moderna do teatro

    brasileiro, diretamente inspirada nos melhores modelos europeus disponveis,

    criada em So Paulo em 1948. Sua profissionalizao deu-se poucos meses

    aps, j em 1949, segundo uma regncia de projeto cultural bastante arrojada

    e ambiciosa sob a batuta enrgica de Franco Zampari, cuja biografia, como se

    sabe, poderia tambm inspirar excelente libreto de pera

    Ao esmiuar pormenores e insignificncias do acontecer histrico,

    Tnia Brando pretende refutar algumas posturas mais ou menos assentadas

    sobre o processo de modernizao da cena nacional para alcanar, em seu

    ltimo raciocnio, um mximo de peculiaridade. Sob o signo da incorporao

    e luto, ela destaca a montagem de O comcio, em 1957, obscuro texto de

    Ablio Pereira de Almeida com direo e atuao de Srgio Cardoso, que fora

    o aclamado ator moderno do teb e convidara o monstro-sagrado Jayme Costa

    para o papel do poltico. Reuniram-se no mesmo palco, desse modo, as duas

    geraes cnicas que antes viveram um enfrentamento, selando um acordo

    cujo clamor pulsava exatamente sobre o duelo de interpretaes. Quer dizer,

    funcionando fortuitamente como diretor em sua companhia, Srgio Cardoso

    teria sido superado pelo intrprete que fora, abrindo espao para a peculiar

    canastrice de Costa. Assim, outras margens do Mar Vermelho voltam a se

    reunir para que brilhe, l no alto, o glorioso teatro ptrio, sepultando as dif-

    erenas. O moderno fez gua.

    Tal cogitao , de fato, excessivamente peculiar. A ningum consta

    que Srgio Cardoso tenha almejado alar-se como diretor, a no ser para

    tapar buracos na programao de sua companhia, remediando crises finan-

    ceiras que a assolaram. Alm do mais, a referida encenao no passou de ir-

    relevante incidente na vida de um conjunto que, em seus melhores momentos,

    levara cena produtos de maior envergadura. Alm disso, nem mesmo como

    smbolo um encontro entre Srgio e Costa parece ser digno de nota, uma vez

  • Edelcio Mostao

    260 Revista sala preta | Vol. 15 | n. 1 | 2015

    que inmeros outros conjuntos j haviam antes utilizado tal expediente, como

    incidncia do mtier, o dia a dia daqueles que precisam ganhar o suado po

    e no do a mnima importncia para os desequilbrios artsticos. Finalmente,

    soa estranho anunciar o luto do moderno nessa montagem biestelar quan-

    do a autora havia apostado todas suas fichas no tpa como a instaurao do

    moderno, estruturado em torno de Itlia Fausta, uma atriz indiscutivelmente

    da velha gerao, ainda que sincera e no designada no conhecido perfil de

    monstro sagrado. Mas tal desvo parece ser outra faceta, qui incnscia, da

    peculiaridade.

    Em 1957, quando tal fato ocorreu, o Teatro de Arena contava, des-

    de o ano anterior, com um novssimo elenco de base estudantil leia-se

    amador , e um jovem diretor recm-chegado dos eua, um e outro amadu-

    recendo a convivncia artstica, sem nenhuma peculiaridade em relao

    ao passado do nobre teatro nacional defendido pelo tbc e as vrias com-

    panhias que dele emanaram. Este sim foi um fato novo, que eclodiu no ano

    seguinte, dando incio guinada nacionalista na cena nacional, abrindo

    funda contradio em nossa modernidade cnica.

    Voltamos, assim, ao terceiro ponto antes assinalado como um prob-

    lema: a necessidade de outros raciocnios estticos conduzindo as investi-

    gaes. Para desenvolv-lo, vou remeter a novo captulo integrante da pre-

    sente Histria do teatro brasileiro: aquele assinado por Rosngela Patriota e

    Jac Guinsburg.

    O fato e a interpretao

    Sob o ttulo de O pensamento crtico e esttico, os autores assinam o

    texto destinado a fazer um balano da matria referente segunda metade

    do sculo xx. Constatando que as avaliaes crticas dos sculos xix e xx

    incorporaram-se escrita de sua histria e tornaram-se leitmotive de tais

    narrativas (p. 277), partem eles das anlises dedicadas longa durao e

    desdobraram, em relao s ltimas dcadas do sculo, as anlises que se

    impostam como recortes daquele tempo ou focalizaes sobre quesitos espe-

    cficos, com o intuito de mapear as investigaes mais consequentes. Patriota

    sugere alguns temas para enfeixar tal estudo: modernizao, modernidade,

    nacionalismo crtico, liberdade, identidade nacional, diversidade artstica e

    cultural, tomados sob a gide da validade, uma vez que ningum mais acred-

    ita ser a histria uma emanao da verdade.

  • Revista sala preta | Vol. 15 | n. 1 | 2015 261

    Consideraes sobre Histria do teatro brasileiro

    Volto a ser citado nesse captulo, agora em funo de meu ensaio de

    1982, dedicado a Arena, Oficina e Opinio. A passagem breve e incom-

    pleta, pois o texto apenas um resumo de outro maior, editado sob o ttu-

    lo de Teatro brasileiro: ideias de uma histria (2012), sugerindo constituir-se

    num roteiro interpretativo prvio Histria aparecida logo a seguir. Nesse

    novo escrito, abrindo as consideraes, afirmado que os numerosos estu-

    dos parciais efetivados na ps-graduao contriburam decisivamente para o

    aprofundamento da pesquisa sobre o teatro brasileiro, mas que articularam,

    igualmente, uma desconexo com o passado analtico antes efetivado pela

    crtica moderna. De minha parte, isso ocorreu, no por desconhecimento ou

    falta de sintonia, mas em funo de uma postura crtica guiada por paradig-

    mas divergentes. Consonantes, vale frisar, com outros analistas e pesquisa-

    dores do tempo que, quando partindo daqueles textos fundadores, com eles

    travaram polmicas ou empreenderam outras visadas, coerentes com novos

    instrumentais analticos.

    Patriota arguta ao surpreender os dois alicerces sobre os quais

    apoiei meus argumentos: a crtica a Althusseur e sua totalizante iniciati-

    va de recuperar o materialismo histrico pelo formato estruturalista e os

    divergentes posicionamentos de grupos de artistas engolfados nas pa-

    trulhas ideolgicas dos anos 1980. Mirando os discursos ideolgicos dos

    grupos da dcada de 1960, procurei, sim, trabalhar no atacado e no varejo,

    evidenciando como certas palavras, certos gestos e certos termos chave

    do discurso daquele momento espelhavam ou davam ressonncia s te-

    ses polticas do passado ou faziam com que se prolongassem at aquele

    instante.

    Eu no desconhecia as posturas crticas de Dcio de Almeida Pra-

    do, Sbato Magaldi ou Anatol Rosenfeld fui aluno dos trs , apenas as

    coloquei em suspenso, uma vez que meu foco no abarcava a questo da

    modernidade do teatro no Brasil nem almejava discutir, retroativamente, suas

    bases de argumentao. Menos ainda me preocupavam questes associadas

    identidade ou ao nacionalismo. Para ser claro, meu interesse precpuo cen-

    trou-se em averiguar o teor ideolgico do tropicalismo cnico e os contrapon-

    tos que estabeleceu em seu tempo. Avancei, ao final do estudo, para as im-

    plicaes que certas posturas e certas condutas produziram, especialmente

    por parte daqueles que, antes defensores do materialismo dialtico (leia-se

    os princpios que criaram e nortearam o cpc e o posterior grupo Opinio) en-

  • Edelcio Mostao

    262 Revista sala preta | Vol. 15 | n. 1 | 2015

    contravam-se, ao longo dos anos 1970 e 1980, testa do snt da ditadura civil

    militar.

    Nem todos os artistas brasileiros souberam, como Glauber Rocha ou

    Caetano Veloso, encontrar um modo dialgico de sobrevivncia com o re-

    gime autoritrio. Muitos ex-cepecistas convenceram-se de que um pouco de

    pessedismo no faria mal a ningum, como Oduvaldo Vianna Filho, Paulo

    Pontes ou Joo das Neves, e encontraram, nesse passo, apoio de antigos

    companheiros da militncia cepecista agora em posies chave dentro do

    rgo governamental, estendendo-lhes a mo. 3 Ou seja, o snt de Orlando

    Miranda constituiu-se como que uma clula esquerdista dentro de uma buro-

    cracia autoritria de direita.

    A principal objeo de Patriota s minhas consideraes gira em tor-

    no da pouca ou rala apreciao do chamado teatro de resistncia efetivado

    naqueles anos. De fato ele no foi objeto do estudo em questo, mas o con-

    siderei na sequncia, ao lanar O espetculo autoritrio (1983).

    Diante de tal considerao, o que dizer de Gota dgua, centro

    das crticas da autora? Era, sim, um espetculo vinculado resistncia,

    agrupando artistas importantes, mas concebido dentro de estritos padres

    do teatro convencional e de olho na bilheteria. No h nada de extraor-

    dinrio num artista que ganha a vida com seu trabalho, mas, para tanto, no

    me parece indispensvel a autopromoo como perseguido poltico pelo

    regime e, simultaneamente, requerer verbas oficiais ao snt e ser veiculado

    pela rede Globo, como fez Paulo Pontes e a montagem em questo. Ou

    seja, houve ali uma retrica de resistncia, mas no uma prtica de re-

    sistncia. Foi e ainda esse meu juzo sobre uma montagem e seu autor,

    em direta leitura de suas opinies declaradas e atitudes manifestas naquele

    momento. Se no me referi a Gota Dgua em meu estudo, foi porque ali no

    vislumbrei alguma novidade que a distinguisse especialmente. E porque sua

    montagem exprimia, naquelas circunstncias, em relevante postura, meus

    argumentos quanto ao pessedismo dos envolvidos.

    Minha visada, enfim, continha uma escolha. Escolha essa generica-

    mente solidria com o projeto construtivo brasileiro, procurando flagrar sua

    coerncia em relao a nosso desenvolvimento histrico-cultural. Tal percur-

    so e suas justificativas esto claramente delineados no captulo que escrevi

    3. Depoimentos de ex-cepecistas evidenciam tais liames, conexes e tticas. Ver Barcellos (1994).

  • Revista sala preta | Vol. 15 | n. 1 | 2015 263

    Consideraes sobre Histria do teatro brasileiro

    para a Histria do teatro brasileiro aqui em discusso. Seu esboo ou sua

    matriz, conforme queiram tom-lo est exatamente naquele ensaio ante-

    rior e alvo da anlise de Patriota. Quer em um ou em outro estudo, minhas

    referncias conceituais e propsitos se distanciaram daqueles empregados

    pela crtica moderna. O tbc, todavia, surge caracterizado como nossa pri-

    meira empresa moderna, ponto mais alto da organizao capitalista em nos-

    so passado cnico recente, ao lado da consolidao dos ideais estticos

    inovadores que o antecederam, julgamento antes efetivado por Dcio de

    Almeida Prado exclusivamente quanto dimenso artstica. Se no assina-

    lei tal desvo em meu estudo de 1982, o fiz por respeito. Passados tantos

    anos dos fatos, agora advogo em outro patamar crtico. No vejo desatino

    analtico em louvar os mritos artsticos da empreitada em consonncia ao

    bem sucedido comrcio ali efetivado, ao menos na primeira metade de sua

    existncia. Essa a incompatibilidade ontolgica ou o clculo conforme o

    ponto de vista do sistema econmico e simblico no qual vivemos, onde

    o inconsciente e a mais-valia retornam, como Outro, no somente sob o

    formato de prestgio, glamour e aplausos, mas tambm enquanto lucro.

    verdade, toda peculiaridade tem um custo.

    Com isso, voltamos arquitetura discursiva da presente Histria do

    teatro brasileiro, desatenta, em muitas de suas consideraes, para o es-

    pesso jogo dialgico de significaes adensando as instncias do real, cujo

    desenho ltimo ficou refm dos limites analticos modernos e peculiari-

    dade de seus idealizadores, como frisado.

    Para concluir, talvez seja elegante recordar um dstico de Franois

    Dosse, ao comentar a natureza dessa tarefa: a revisitao histrica tem,

    portanto, essa funo de abrir para o presente um espao prprio, marcan-

    do o passado para redistribuir os espaos dos possveis. A prtica histori-

    adora , por princpio, aberta a novas interpretaes, a um dilogo sobre o

    passado aberto sobre o futuro, a ponto que se fala, cada vez mais, de futuro

    do passado (2003, p. 87).

    Referncias bibliogrficas

    BARCELLOS, J. CPC da UNE, uma histria de paixo e conscincia. Rio de Ja-

    neiro: IBAC; MINC; Nova Fronteira, 1994.

    BRANDO, T. Uma empresa e seus segredos: Cia. Maria Della Costa. So Paulo:

    Perspectiva, 2009.

  • Edelcio Mostao

    264 Revista sala preta | Vol. 15 | n. 1 | 2015

    _______. As companhias teatrais modernas. In: FARIA, J. R. (dir.). Histria do teatro

    brasileiro, v. 2. So Paulo: Perspectiva; SESC, 2013. p. 80-96.

    CADENGUE, A. E. TAP, sua cena & sua sombra. v. 2. Recife: CEPE, 2011.

    COSTA, I. C. A produo tardia do teatro moderno no Brasil. In: ______. Sinta o dra-

    ma. Petrpolis: Vozes, 1998.

    DOSSE, F. A histria. Bauru: Edusc, 2003.

    FARIA, J. R. (dir.). Histria do teatro brasileiro. v. 2. So Paulo: Perspectiva; SESC,

    2013.

    FOUCAULT, M. A arqueologia do saber. Rio de Janeiro: Forense, 2002.

    ______. Nietzsche, a genealogia e a histria. In: ______. Microfsica do poder. Rio

    de Janeiro: Graal, 2012.

    GUINSBURG, J.; FARIA, J. R.; LIMA, M. A. (Orgs.). Dicionrio do teatro brasileiro.

    So Paulo: Perspectiva, 2006.

    LEO, R. M. Abertura para outra cena, o moderno teatro na Bahia. Salvador: Gre-

    grio de Mattos, 2006.

    MOSTAO, E. Teatro e poltica: Arena, Oficina e Opinio uma interpretao da

    cultura de esquerda. So Paulo: Proposta, 1982.

    ______. O espetculo autoritrio. So Paulo: Proposta, 1983.

    ______. Moderno (verbete). In: GUINSBURG, J.; FARIA, J. R. F.; LIMA, M. A. (Orgs.).

    Dicionrio do teatro brasileiro. So Paulo: Perspectiva, 2006, pp. 185-186.

    MILAR, S. Batalha da Quimera. Rio de Janeiro: FUNARTE, 2009.

    PATRIOTA, R.; GUINSBURG, J. Teatro brasileiro: ideias para uma histria. So

    Paulo: Perspectiva, 2012.

    _______. O pensamento crtico e esttico. In: FARIA, J. R. (dir.). Histria do teatro

    brasileiro, v. 2. So Paulo: Perspectiva, 2013. p. 277-299.

    PEREIRA, V. H. A. A musa carrancuda. Rio de Janeiro: Fundao Getlio Vargas,

    1998.

    RIEGO, C. B. Do futuro e da morte do teatro brasileiro. So Paulo: ECidade, 2010.

    SIMES, G. Veto ao modernismo no teatro brasileiro. So Paulo: FAPESP; Huci-

    tec, 2010.

    Recebido em 08/04/2015

    Aprovado em 23/05/2015

    Publicado em 30/06/2015